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8/20/2019 A Violência e a Responsabilização Nos Regimes Ditatoriais
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139Revista Internacional de Direito e Cidadania, n. 5, p. 139-150, outubro/2009
A VIOLÊNCIA E A RESPONSABILIZAÇÃO NOS REGIMES DITATORIAIS
RESUMO: A proposta deste artigo é compreen-der o papel da violência em tempos ditatoriaisa partir dos ensinamentos de Hannah Arendtapresentados em sua obra “Da Violência”2. Comorecorte temático, o estudo se restringe às dita-duras dos países latino-americanos nas últimastrês décadas. Não se trata, porém, de uma análisehistórica ou sociológica dos acontecimentos, masapenas de um exercício para compreensão do pensamento de Arendt diante de fatos concretos.
Palavras-chave: Responsabilidade. direitoshumanos. violência. crimes internacionais.
ABSTRACT: The proposal of this article is tounderstand the role of violence in dictatorial
times from the teachings brought by Hannah
Arendt in her work “On Violence”2. As thematicclipping, the study is restricted to the dictator-
ships of Latin American countries in last the threedecades. Nonetheless, this is not of a historical or
sociological analysis of the events, but only anexercise for understanding the thought of Arendtahead of concrete facts.
Keywords: Responsibility human rights violen-
ce international crimes.
A VIOLÊNCIA E ARESPONSABILIZAÇÃO NOSREGIMES DITATORIAIS
Lucia Elena Arantes Ferreira Bastos1
1 Pós-doutoranda pelo Núcleo de Estudos da Violência (NEV/USP), bolsista Fapesp, Doutora pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.2 ARENDT, Hannah. Crises da República. São Paulo: Perspectiva, pp. 91-169, 2004.
rt go
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1. Introdução
A escolha pela aplicação dos ensinamen-tos arendtianos sobre a violência aos regimes
ditatoriais se deve à crescente tendência quantoà punição das violações de direitos humanosque foram praticadas por agentes estatais, nos
períodos em questão, sob a fundamentação damanutenção no poder. Crimes estes que têm
mobilizado não somente a opinião pública local(nos países que passaram por ditaduras) como asociedade internacional, que por meio de organi-
zações internacionais como a ONU (Organizaçãodas Nações Unidas) e a OEA (Organização dos
Estados Americanos), vem atuando seja por meioda celebração de tratados que coíbem a torturae os desaparecimentos forçados e promovem o
respeito aos direitos civis e políticos ou atravésde julgamentos; a m de que se reforcem oacesso à justiça, as garantias processuais penaise as reparações às vítimas.
2. Os crimes internacionais e a
necessidade de responsabilização
O conceito de crime internacional, que se
caracteriza pela responsabilidade penal individu-
al, envolve violações ao costume internacional eàs previsões dos tratados, e se insere no âmbito da proteção de valores considerados essenciais por
toda a comunidade internacional, e que por isso
obriga a todos os Estados e indivíduos. Muitosdos valores relacionados aos crimes internacio-
nais encontram-se já previstos em instrumentosinternacionais3. Interpreta-se que nos casos de
crimes de guerra, crimes contra a humanidade,
genocídio, tortura, crimes de agressão e terro-rismo existe um interesse universal na repressão
destas violações, de tal forma que, em regra, osacusados podem ser processados e punidos por
qualquer Estado, desconsiderando-se o vínculoterritorial ou nacional com o perpetrador ou a
vítima.
Observa-se que, a partir da década denoventa, a responsabilização pelos chamados
crimes internacionais ganhou ênfase com a pri-
são do ex-ditador chileno Augusto Pinochet naInglaterra; cuja mais alta corte inglesa decidiu
que ele não gozava de imunidade nos casos de
processos que o acusavam de tortura e conspira-
ção para a prática de tortura praticados enquantose encontrava no governo chileno4, caso que, pos-
teriormente, teve continuidade com o julgamento
na jurisdição chilena, mas que se encerrou sem aobtenção de uma sentença, devido ao falecimento
do acusado, em dezembro de 2006. Outro mo-
mento signicativo ocorreu com a condenaçãodo ex-presidente do Peru, Alberto Fujimori, emabril de 2009, a 25 anos de prisão pelas mortes
de 25 pessoas e por sequestros durante o períodode seu governo, 1990 a 2000. Após um processoque durou mais de um ano, Fujimori foi conside-rado o mentor dos massacres de Barrios Altos5,
em 1991, e La Cantuta6
, em 1992, e também foiresponsabilizado pelos sequestros do jornalista
Gustavo Gorriti e do empresário Samuel Dyer.
O que se observa, enm, é que desde onal da Guerra Fria, devido a um novo ímpetonas relações internacionais, a comunidade inter -nacional tem instituído marcos importantes naluta contra a impunidade. A tendência somentese tornou ainda mais acentuada depois do caso
Pinochet, fomentando o nascimento do que
poderia ser denominado de movimento globalcontra a impunidade.
O grande uxo normativo que se formouinternacionalmente em decorrência dos horrores
da Segunda Guerra Mundial e, que produziu
3 Como por exemplo: a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, a Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídiode 1948, as Convenções de Genebra de 1949 sobre a proteção de vítimas de conitos armados e os seus Protocolos Adicionais de 1977, a ConvençãoEuropéia sobre Direitos Humanos de 1950, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de 1966, o Pacto Internacional sobre DireitosEconômicos, Sociais e Culturais de 1966, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969, a Carta Africana de Direitos Humanos e dosPovos de 1981 e, a Convenção contra Tortura de 1984.
4 Os procedimentos contra Pinochet na Espanha, entretanto, não tiveram continuidade porque o pedido de extradição do ex-ditador foi negado por parte da Inglaterra com base na saúde frágil do general.
5 O massacre de Barrios Altos deixou 15 mortos, foi cometido pelo grupo “Colina”, um comando militar que atuou no Peru durante o governo Fuji-mori, como parte de uma operação contra os supostos extremistas do grupo “Sendero Luminoso”. O mesmo caso já havia sido levado à julgamentono sistema da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Vide: Corte Interamericana de Direitos Humanos, caso Barrios Altos, julgamento de14.03.2001, série c, n. 75.
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o denominado international bill of rights ou
direito internacional dos direitos humanos,
enfraqueceu-se, porém, quando se alcançou o
estágio do estabelecimento de mecanismos queassegurassem a responsabilização individual por
crimes internacionais. Tanto é que os primeirosesforços para se criar uma corte internacional
penal de caráter permanente caram esmorecidos por muito tempo devido às tensões provenientesda Guerra Fria. O fato é que enquanto o direitointernacional dos direitos humanos se desenvol-
veu rapidamente, seus mecanismos de monitora-
mento no âmbito internacional continuaram a ser basicamente políticos ou na melhor das hipótesesquase-judiciais (como a Comissão Interamerica-
na de Direitos Humanos e a Comissão Africanade Direitos Humanos) ou amparados em cortesinternacionais com jurisdição voluntária sobos Estados e não contra os indivíduos, onde oEstado precisava manifestar a aceitação daquela
jurisdição (como na Corte Interamericana de
Direitos Humanos).
Depois de muitas décadas de progressos re-
lativos, este tema foi retomado, em 1993 e 1994,
com o estabelecimento dos tribunais penais ad
hoc para a Ex-Iugoslávia e Ruanda. Mesmo queo foco geográco dos dois tribunais seja diferen-te, em sua essência, ambos foram constituídos porque havia uma falta de comprometimento
ou uma ausência de habilidade das autoridades
nacionais para que se aplicasse a justiça ao
perpetradores de graves crimes internacionais.
Sem levar em consideração a totalidade das
suas jurisprudências e regras de procedimento
que deverão ser analisadas sob uma perspectiva
histórica ao longo dos próximos anos, o valordestes tribunais ad hoc não pode ser contestado7.
O estabelecimento destes tribunais interna-
cionais ad hoc abriram o caminho não somente
para as negociações a respeito do Estatuto de
Roma para a criação do Tribunal Penal Interna-cional, mas também, ao menos de forma indireta,
tornaram possível o trabalho de desenvolvimentode outros três importantes tribunais penais que
mesclam a jurisdição nacional e internacional:
o primeiro, que trata sobre crimes cometidos
durante o período de 1975 a1979 no Cambodja8;o segundo, responsável pelos crimes cometidoshá poucos anos em Serra Leoa9 e, o terceiro,relacionado aos crimes praticados antes e depois
do referendo coordenado pela ONU que levou àindependência do Timor Leste10, em 1999.
Por m, a adoção do Estatuto de Romatambém caracteriza o desenvolvimento na luta
pela justiça internacional, o que era impensávelhá décadas atrás. Além do ambiente políticoque facilitou a criação do Tribunal Penal In-ternacional, este é baseado no reconhecimento
de que muitas vezes as autoridades nacionais
têm provado que não estão aptas a julgarem os
crimes internacionais. O certo é que o TribunalPenal Internacional não irá suplantar a jurisdição penal do Estado, mas, de acordo com o princípioda complementaridade11, estará disponível paraatuar quando o procedimento doméstico provar
ser insuciente ou incapaz de julgar tais crimes.
Outra forma de se efetivar o cumprimento
do direito internacional dos direitos humanos
tem sido a jurisdição universal, que foi exer-
cida não só pela Espanha12 como também está
6 No massacre de La Cantuta 9 estudantes e um professor da Universidade Nacional Enrique Guzmán y Valle foram sequestrados e mortos. Referidocaso também foi analisado no âmbito da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Vide: Corte Interamericana de Direitos Humanos, caso LaCantuta, julgamento de 29.11.2006, série c, n. 162.
7 PEJIC, Jelena. “Accountability for international crimes: from conjecture to reality”. In: International Review of Red Cross, Geneve: v. 84, n. 845, pp. 13-33, 2002.
8 O “Tribunal do Khmer Vermelho” compõem-se tanto por juízes nacionais do Camboja quanto por seus pares internacionais, é regido por um sistemadoméstico, e tem jurisdição especíca sobre as graves violações cometidas sob os auspícios do governo de Pol Pot e dos membros do partido doKhmer Vermelho durante o período de 1975 a1979.
9 O movimento para o estabelecimento da corte especial para Serra Leoa foi iniciado pelo governo do próprio país, em agosto de 2000. O Conselhode Segurança da ONU respondeu aos esforços e, o Secretário Geral da ONU auxiliou na negociação de um acordo com o governo de Serra Leoa
para a criação de uma corte independente e especializada, cujo objetivo é processar as violações ao direito internacional humanitário naqueleterritório desde novembro de 1996.
10 O Tribunal do Timor Leste, instituído, em 2001, durante o processo de transição política coordenado pela ONU, é composto por juízes nacionais
e internacionais, tem competência para julgar crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra, tortura e violações especícasdo código penal indonésio.
11 Para uma abordagem mais detalhada, vide: MOISÉS, Cláudia Perrone. “O Estatuto do Tribunal Penal Internacional e a Soberania Contemporânea”.In: Política Externa, vol. 8, n.º 4, mar./abr./mai. 2000, pp. 4-11.
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prevista no ordenamento jurídico da Bélgica13.Pelo princípio da jurisdição universal um Estado pode processar indivíduos acusados de crimesinternacionais sem levar em consideração a sua
nacionalidade, o local de cometimento do crime,
a nacionalidade da vítima e, em certos casos se oacusado está ou não presente perante aquele foro.Ressalta-se, porém, que, em regra, os sistemas
legais não permitem os julgamentos à revelia,sendo que a presença do acusado no territórioonde será julgado torna-se uma condição para oinício deste tipo de processo.
Um outro obstáculo para o exercício da jurisdição internacional inclui a possível capaci-dade ocial (e, portanto, a imunidade) dos alega-
dos perpetradores, que se evidencia pelos efeitosdas leis de anistia domésticas. Muito embora jáexista a convicção, de acordo com os tratados e o
direito costumeiro, de que a concessão de anistia
aos suspeitos de graves crimes internacionais
viola o dever dos Estados de fazer justiça e punir
os ofensores, pois se no passado havia alguma
dúvida sobre a validade destas leis de anistia, ocrescente desenvolvimento do tema no âmbitointernacional acabou por dispersar qualquer
incerteza. Cada tribunal ou órgão internacionalque se propôs a vericar o tema concluiu que asleis de anistias aplicadas às graves violações aosdireitos humanos ferem os fundamentos princi-
pais do direito internacional dos direitos huma-
nos. A Assembléia Geral da ONU14, o ConselhoEconômico e Social15 (ECOSOC) e o Comitê deDireitos Humanos16 todos eles já se manifestaramcontrariamente à anistia aplicada para violações
aos direitos humanos, fundamentando que estaviola o direito internacional.
Assim, é possível crer que esta tendênciavoltada à responsabilização dos crimes cometi-dos em períodos ditadoriais está se acentuando, principalmente, no cenário latino-americano17,conforme já comentado, com a continuidade dos processos em território chileno contra o GeneralAugusto Pinochet; na Argentina a partir de 2005com a declaração de inconstitucionalidade das
leis de anistia; no Peru com a condenação deFujimori, em 2009; com os relatórios da Comis-são Interamericana de Direitos Humanos18, e as
sentenças da Corte Interamericana de Direitos
Humanos19 (apesar de que nestes últimos doiscasos o acusado ou o responsável sempre será oEstado e, não o indivíduo).
3. O contraponto da violência emface dos regimes ditatoriais
latino-americanosDevido à conscientização da própria socie-
dade a respeito da importância de se responsa-
12 Na Espanha, o art. 23 da Lei 1985 sobre o poder judicial prevê que os tribunais espanhóis têm jurisdição sobre crimes cometidos fora da Espanhaquando tais fatos constituam genocídio, terrorismo ou outros crimes os quais a Espanha está obrigada a processar de acordo com os tratadosinternacionais de que faz parte. Entretanto, segundo a lei espanhola, os julgamentos sem a presença do acusado (à revelia) não são permitidos.
13 No caso da Bélgica, de acordo com uma lei de 16 de junho de 1993, as cortes belgas têm jurisdição nos casos de violações às Convenções deGenebra de 1949 e seus Protocolos Adicionais de 1977, não importando o local onde tais ofensas tenham sido cometidas, por quem ou contra quaisvítimas e, sendo possível, inclusive, o julgamento à revelia. Posteriormente, uma lei de 3 de fevereiro de 1999 também concedeu competência aos
juízes belgas para julgarem questões relacionadas ao genocídio e crimes contra a humanidade.14 Ver Declaration on the Protection of all Persons from Enforced Disappearance, General Assembly Res. 47/133, 47th Session, de 1992, art 18,
armando que a anistia não deve ser concedida para beneciar aqueles que são responsáveis pelos crimes de desaparecimento. Neste sentido, ver
também: General Assembly Res. 3074, 28th Session, de 1973, art. 8; General Assembly Res. 2840, 26th Session, de 1971, art. 4; General AssemblyRes. 2712, 25th Session, de 1970, art. 5 e, General Assembly Res. 2583, 24th Session de 1969, art. 8.
15Ver Economic and Social Council Resolution n.1989/65 de 24 de maio de 1989, denominada Principles on the Effective Prevention and Investigationof Extra-legal, Arbitrary and Summary Executions.
16 Ver Report of the Human Rights Committee, U.N. Doc. A/47/40 (1992), Anexo VI, par. 15, p. 191, armando que anistias para tortura são geralmenteincompatíveis com as obrigações dos Estados perante o direito internacional: “15. El Comité ha observado que algunos Estados han concedidoamnistía respecto de actos de tortura. Las amnistías son generalmente incompatibles con la obligación de los Estados de investigar tales actos, degarantizar que no se cometan tales actos dentro de su jurisdicción y de velar por que no se realicen tales actos en el futuro. Los Estados no pueden
privar a los particulares del derecho a una reparación efectiva, incluida la indemnización y la rehabilitación más completa posible“.17 No Brasil, desde 2008, tramita perante o Supremo Tribunal Federal (STF), uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF
153) na qual se questiona a aplicação da lei de anistia aos agentes do Estado que, durante o regime militar, praticaram atos de tortura, porém, até
o momento de conclusão deste artigo ainda não houve o julgamento.18 Sobre este tema, vericar os seguintes Relatórios da Comissão Interamericana de Direitos Humanos: Relatório n. 28/92, relacionado aos Casos
10.147, 10.181, 10.240, 10.262, 10.309 e 10.311, contra a Argentina, datado de 2 de Outubro de 1992; Relatório n. 29/92, relacionado aos Casos10.029, 10.036, 10.145, 10.305, 10.373, 10.374 e 10.375, contra o Uruguai, datado de 2 de Outubro de 1992 e; Relatório n. 36/96, relacionado ao
Caso 10.843, contra o Chile, datado de 15 de Outubro de 1996.19 A respeito da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, observar o Caso Velásquez-Rodriguez, que foi julgado no dia 29 de
julho de 1988, série C n. 4 e; Caso Barrios Altos, julgado no dia 14 de março de 2001, série C, n. 75. Caso Almonacid Arellano e outros, julgadono dia 26 de setembro de 2006, série c, n. 154. Caso La Cantuta, julgado no dia 29 de novembro de 2006, série c, n. 162.
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bilizar tanto o Estado quanto o indivíduo pelasviolações dos direitos humanos, que o tema daviolência continua a ser atual e determinante no
mundo em que vivemos e, como recorte para este
artigo que objetiva o cruzamento das reexões
arendtianas sobre violência buscou-se analisar,em especial, as ditaduras latino-americanas,
que dos anos sessenta aos noventa foram mar-
cadas por violências extremas tanto do lado dos
Estados quanto por parte dos grupos armados
(guerrilhas) e, cujos atos de governantes e
governados, enquadrados muitas vezes como
crimes internacionais, têm sido cada vez mais
questionados não só localmente mas tambémno âmbito internacional conforme demonstrado
anteriormente.Antes do aprofundamento teórico acerca
da violência, porém, cabe a reexão sobre oconceito de ditadura para Arendt20 que é com- preendido, a partir da tradição romana, como um
regime planejado para servir como uma medida
de emergência de um governo constitucional e
legítimo, tendo uma validade restrita no tempo.Seria, então, um estado de emergência ou uma
lei marcial aplicável exclusivamente em tempos
de guerra ou em áreas de calamidade pública.Em especial, sobre as ditaduras militares, Arendtlembra que nestes casos, quando há a tomadade poder pelos militares, encerra-se o governo
civil e, os cidadãos são, em geral, privados de
seus direitos e liberdades políticas, entretanto, avida privada e a atividade não política não sãonecessariamente afetadas.
Arendt também revela que, na maioria dasvezes, os regimes ditatoriais perseguem os seus
opositores políticos com grande crueldade, eestes regimes, então, se distanciam do que seriam
as formas constitucionais, pois não se pode con-
ceber a existência de um governo constitucional
quando não são tomadas medidas que assegurem
os direitos dos próprios opositores.
A diferença substancial entre as ditaduras eos regimes totalitários encontra-se no fato de quenas ditaduras os crimes cometidos pelos gover-
nantes são dirigidos contra inimigos declaradosdaquele regime que se encontra no poder; ao
passo em que os crimes dos governos totalitários,como na Alemanha nazista, referiam-se a pessoasque eram “inocentes” até mesmo sob o ponto devista do partido no poder 21.
Para se reetir sobre o que Arendt chama de“estado de emergência” ou “lei marcial”, importalembrar que ainda hoje não há uma teoria sobre oestado de exceção no direito público, e na maio-ria das vezes a tendência22 tem sido no sentidode considerar o problema muito mais como uma
questão de fato do que como um legítimo proble-ma jurídico. Assim também a denição do estadode necessidade, sobre o qual se baseia a exceção,
mostra-se difícil porque se situa na fronteira entrea política e o direito; criando-se uma situação paradoxal, pois o estado de exceção traz consigo
uma série de medidas jurídicas que não podemser compreendidas no plano do direito, tanto que
nas palavras de Agamben23 o estado de exceçãose apresentaria “como a forma legal daquilo que
não pode ter forma legal”.
Feitas estas considerações prévias, a partirda análise do texto de Arendt sobre a violência,utilizando-se como contraponto as ditaduras
latino-americanas e, a responsabilização dos
indivíduos pelos crimes internacionais, propõe-se uma reexão sobre os seguintes aspectos quenorteiam “Da Violência” e que serão analisadosseparadamente: (1) o sentimento de vigança que
a violência gera nas pessoas; (2) a legitimidade
do uso da violência vinculada ao poder; (3) a
questão da burocracia e da ausência de respon-
20 ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento. São Paulo: Companhia das Letras, pp. 94-95, 2004.21 Neste mesmo sentido, Agamben também se manifesta: “O totalitarismo moderno pode ser denido (...) como a instauração, por meio do estado de
exceção, de uma guerra civil legal que permite a eliminação física não só dos adversários políticos, mas também de categorias inteiras de cidadãos que, por qualquer razão, pareçam não integráveis ao sistema político”. Ver: AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo, p.13, 2004.
22 AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo, p. 11, 2004.23 Giorgio Agamben justica a diculdade em se denir o conceito de estado de exceção porque nestas situações existe uma estreita relação com a
guerra civil, a insurreição e a resistência; pois o estado de exceção seria a resposta imediata do poder estatal aos conitos internos que se mostrammais extremos; e ilustra a sua armação citando o caso do Estado nazista, ao mencionar que logo após ter chegado ao poder Hitler promulgou oDecreto para a proteção do povo e do Estado, o qual suspendia os artigos da Constituição de Weimar relativos às liberdades individuais; de tal formaque todo o Terceiro Reich poderia ser considerado, sob o ponto do vista jurídico, como um estado de exceção que durou 12 anos. Ver: AGAMBEN,Giorgio. Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo, pp. 12-13, 2004.
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sabilidade; (4) o uso da violência pelo Estado e
as revoluções populares; (5) a constatação de quea violência não é capaz de sustentar um governo;
(6) o terror de Estado; e, (7) a questão da culpacoletiva e da falta de responsabilização.
3.1. O sentimento de vigança que a
violência gera nas pessoas
Nos períodos ditatoriais é muito comumque o governante tenha como prática a capturasistemática de seus opositores como se fosseuma fórmula para a sua manutenção no poder.De todos os crimes que são usualmente pratica-
dos, o exemplo mais marcante é o do chamado
“desaparecimento” – um processo pelo qual umcidadão suspeito de atividades subversivas éseqüestrado, detido e torturado durante algum
tempo antes de ser nalmente assassinado. Esteato costuma ser coordenado pela polícia secretaou por uma operação militar, o qual apesar de
ilícito, é aceito pelo governo, mas de maneiranão tão ostensiva.
A prática do desaparecimento forçado éutilizada como um método para dispor de dis-
sidentes suspeitos sem a “inconveniência” dese provar a culpabilidade em julgamentos que poderiam ser muito demorados, e serve também
como um meio para aterrorizar outras possíveisatitudes. Para as vítimas, e para a sociedade, odesaparecimento nas mãos da polícia ou dasforças armadas resulta na abnegação mais com-
pleta dos direitos humanos: prisão arbitrária,detenção sem julgamento, tratamento degradante
e tortura, seguido por assassinato e disposição
secreta do corpo.
O aparecimento dos esquadrões da morteé um fenômeno recente, e o tema encontra-seainda em desenvolvimento. Desaparecimentos,
em si, não são novos na história dos desrespeitosaos direitos humanos, porém, o seu uso de for-
ma sistemática e repetida, não só para causar odesaparecimento de certos indivíduos, de forma breve ou permanente, mas também como um
meio para criar um estado geral de angústia, in-segurança e temor, é que é considerado um fenô-
meno relativamente novo24; porque, no passado,
os tiranos costumavam deter publicamente os
seus oponentes como uma lição para outros que
pretendessem ser contrários aos seus regimes,entretanto, a partir dos anos sessenta, muitos
regimes latino-americanos zeram isto de forma
clandestina e questionável, numa tentativa deevitar a condenação internacional. É justamen-te porque os organizadores dos esquadrões damorte são parte da milícia moderna, totalmenteconscientes a cerca das exigências da lei, da
moralidade e dos costumes internacionais, que
os seus crimes se mostram ainda mais graves.
Dentre as mais diversas consequências que
esta violência praticada pelo Estado contra os
indíviduos pode gerar encontram-se não apenas
o sentimento de opressão, de incapacidade diantedo opressor, mas também um sentimento correla-
to de vingança, que a própria violência gera nas pessoas, que na maioria das vezes nem sequer é
discutido e, que Hannah Arendt soube muito bemexpressar: “Quem jamais duvidou que o violado
sonha com a violência, que o oprimido “sonha,
pelo menos uma vez ao dia, em colocar-se” nolugar do opressor, que o pobre sonha com as
posses do rico, o perseguido em trocar “o papel
de caça pelo de caçador”(...)?”25.
Trata-se na verdade de um tema delicado,
congura-se no estudo sobre as consequênciasque o uso da violência causa na sociedade;
no sentido de que naqueles indivíduos, quese tornaram vítimas da violência, pode nascerum sentimento de revanchismo e de ódio queserviria, em última instância, para legitimara secular pena de talião (olho por olho, dente
por dente), tão recriminada pelo Ocidente por
não apresentar como pressuposto da pena a sua
proporcionalidade, uma vez que ela traz consigoa idéia de correspondência entre o mal causado
a alguém e o castigo imposto a quem o causou:
para tal crime, tal e qual pena.
3.2. A legitimidade do uso da violência
vinculada ao poder
Conforme já mencionado no item anterior,muitos regimes ditatoriais são marcados pela
truculência de suas milícias, ou seja, a m de se24 ROBERTSON,Geoffrey. Crimes Against Humanity – The Struggle for Global Justice. New York: The New Press, 2000.25 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, p. 108, 2004.
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manter no poder, o ditador e o seu partido im-
põem-se por meio da violência contra os súditosque ousam desaá-los. Hannah Arendt analisaesta espécie de legitimidade ou aceitação do
governo, alcançada por meios violentos, e mostra
como é questionável esta prática pelo fato denão ser fruto do consenso e da vontade popular,que seriam requisitos do Estado Democrático deDireito, mencionando especicamente que: “Sea essência do poder está na eciência da ordementão não há maior poder que aquele que nascedo cano de um fuzil e seria difícil dizer “de quemodo a ordem dada por um policial é diferente
da dada por um pistoleiro”.”26
3.3. A questão da burocracia e da ausênciade responsabilidade
Consequência do desenvolvimento dos re-
gimes políticos, como uma organização detalha-da de cargos e funções, a burocracia nos sistemasditatoriais tem servido para criar obstáculos àidenticação dos reais responsáveis tanto pelacondução política quanto pela decisão do uso daviolência como instrumento de manutenção do
poder, pois ninguém toma para si a autoria dos
fatos, o indivíduo em sua função pública estariaapenas a respeitar ordens superiores, numa longa
cadeia de comandos.
Esta burocracia gerou as célebres excu-
sas apresentadas não só perante os TribunaisPenais de Nuremberg e de Tóquio, como no julgamento de Eichmann e, mais precisamente
na Argentina, por ocasião da chamada “lei daobediência devida”. Em todas estas situações,os burocratas defendiam-se no sentido de que
os atos criminosos que haviam cometido não
podiam ser punidos, pois estavam atuando no
exato cumprimento de seus deveres, os quais a
própria burocracia os havia incumbido.
Atenta a esta questão, Arendt apontou quea burocracia seria uma das formas mais terríveis
de dominação, pois representaria “(...) o domíniode um intrincado sistema de departamentos no
qual nenhum homem, nem o único nem o melhor,nem poucos nem muitos, pode ser considerado
responsável, e que poderia perfeitamente ser
chamado de domínio de Ninguém”27
. E, este“domínio de ninguém”, caracterizado por nãoexistir qualquer pessoa a quem se possa pergun-
tar o que está sendo feito, seria o mais tirânicode todos os regimes, pois impossibilitaria não sóa identicação do inimigo mas, acima de tudo, aresponsabilização pelos atos cometidos.
Não somente uma vez Arendt dedicou asua análise para as decorrências da burocracia ea ausência de responsabilização dos indíviduos,
em “Responsabilidade e Julgamento”28
, ao tratarsobre a responsabilidade individual em períodosditatoriais, a autora discorre sobre a teoria do
“dente da engrenagem”, entendida no sentidogurado como se cada funcionário do governorepresentasse um pequeno dente na imensa
engrenagem do sistema político, cada pessoateria uma função para manter a administração
em andamento; ao mesmo tempo em que cada
um desses funcionários pudesse ser substituído a
qualquer momento sem criar obstáculos ao bomdesenvolvimento do sistema, ou seja, apesar deter uma função, este indivíduo seria facilmentedescartável. Precisamente por causa desta des-cartabilidade, é que em suas defesas, os acusados
das violações aos direitos humanos, com muitafrequência alegavam que se não tivessem cometi-
do o crime, outros o teriam feito em substituição.
Feita esta constatação, surge a naturalinterrogação: isto signica que, com base na
teoria da engrenagem, ninguém mais poderia serconsiderado individualmente responsável? Aren-dt responde a esta indagação com base em sua
experiência ao assistir o julgamento de Eichmann
em Jerusalém29 – pois naquela ocasião os juízesdesconsideraram o argumento da defesa naquele
sentido – e apresenta a sua posição consoante
26 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, p. 117, 2004.27 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, p. 118, 2004.28 ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento. São Paulo: Companhia das Letras, pp. 79-111, 2004.29 Adolf Eichmann foi julgado em Jerusalém em 1961 e, Hannah Arendt fez a cobertura do processo para a revista The New Yorker e, posteriormente,
seu relato foi transformado no livro Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do mal. Nesta obra, Arendt apresenta o seu ponto devista sobre um julgamento que deveria ser de um dos maiores carrascos nazistas desde o Tribunal de Nuremberg, mas que ao seu ver tratava-se
de um funcionário medíocre e incapaz de tomar consciência de seus atos; posição esta que gerou severas críticas da comunidade judaica contraArendt. Esta visão de Arendt sobre Eichmann ca clara em vários trechos como este: “A justiça insiste na importância de Adolf Eichmann, lho
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BASTOS, L. E. A. F.
a dos juízes: “Pois como os juízes se deram aotrabalho de apontar explicitamente, na sala de
um tribunal não está em julgamento um sistema,uma história ou tendência histórica, um ismo, oanti-semitismo, por exemplo, mas uma pessoa, e
se o réu é por acaso um funcionário, ele é acusado precisamente porque até um funcionário aindaé um ser humano, e é nessa qualidade que ele
é julgado. Obviamente, na maioria das organi-
zações criminosas são os pequenos dentes daengrenagem que realmente cometem os grandes
crimes (...)”30.
3.4. O uso da violência pelo Estado e as
revoluções populares
Quando Hannah Arendt discorre sobre oemprego da violência pelo Estado ao tentar con-
ter movimentos populares contrários ao regime,surge um cenário comum ao fenômeno das dita-duras latino-americanas: a guerra de guerrilha,
que tem traços marcantes de violência tanto na
área rural quanto urbana.
A guerrilha é um tipo de guerra não con-vencional, no qual a principal estratégia é a ocul-
tação e a extrema mobilidade dos combatentes,
a força combatente normalmente é dividida em
pequenos grupos de combate que, embora hie-
rarquicamente organizados, são relativamente
autônomos em relação aos níveis hieráquicossuperiores. Nestes casos, geralmente, se atribui
uma região de ação e um objetivo de longo prazo
ao grupo de combate, que tenta controlar sua
região e executar seus objetivos sem xar sedeou base de operações.
Esta circunstância implica que os guerri-lheiros não possam ser regularmente abasteci-
dos, e tomam para si essas responsabilidades,utilizando-se dos recursos disponíveis da região,o que muitas vezes inclui a assistência da popu-
lação civil próxima ao local onde se encontram.Em geral, é possível se observar que as táticasde guerrilha são usadas por uma parte mais fraca
contra uma mais forte como ocorre quando uma
minoria política ou étnica se opõe a um governorepressivo. Se por um lado, os guerrilheiros mui-
tas vezes carecem de equipamento e treinamento
militar adequados, por outro, contam com a ajudade populações que os defendem e com ataques-surpresa ao inimigo, sem necessidade de manter
uma linha de frente; sendo que o conhecimento
do terreno de combate também é uma arma bas-
tante usada na guerra de guerrilhas.
O uso da guerrilha é muito comum em
guerras revolucionárias, onde é marcante o fator político-ideológico, que pode se difundir entre partidos ou facções de um mesmo povo, como
ocorreram no caso de El Salvador 31, da Guerrilhado Araguaia32, das Forças Armadas Revolucio-nárias da Colômbia33, etc.
Na análise sobre a violência aplicável aestes tipos de conito, Arendt reconhece que ofator principal, nestes casos, é o imenso distan-
de Karl Adolf Eichmann, aquele homem dentro da cabine de vidro construída para sua proteção: altura mediana, magro, meia-idade, quase calvo,dentes tortos e olhos míopes, que ao longo de todo o julgamento ca esticando o pescoço para olhar o banco de testemunhas (sem olhar nem umavez para a platéia), que tenta desesperadamente, e quase sempre consegue, manter o autocontrole, apesar do tique nervoso que lhe retorce a boca
provavelmente desde muito antes do começo deste julgamento. Em juízo estão seus feitos, não o sofrimento dos judeus, nem o povo alemão, nema humanidade, nem mesmo o anti-semitismo e o racismo”. Ver: ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do
mal. 3.° reimpressão. São Paulo: Companhia das Letras, p. 15, 1999.30 ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento. São Paulo: Companhia das Letras, pp. 91-93, 2004.31 No caso de El Salvador, a guerra civil durou 12 anos, custou as vidas de cerca de 75 000 pessoas, e chegou ao m em 1992, quando o governo de
direita e a guerrilha de esquerda assinaram um tratado que levou à reformas militares e políticas.32 A Guerrilha do Araguaia é como se costuma chamar um conjunto de operações militares ocorridas durante a década de 1970 promovidas por
grupos revolucionários, contrários ao Regime Militar em vigor no Brasil. O movimento foi organizado pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB).O local do conito se deu onde os estados de Goiás, Pará e Maranhão faziam fronteira. O nome foi dado à operação por se localizar às margensdo rio Araguaia, próximo às cidades de São Geraldo e Marabá no Pará e de Xambioá, no norte de Goiás (região onde atualmente é o norte doEstado de Tocantins). Na Guerrilha do Araguaia participaram em torno de setenta guerrilheiros sendo que, destes, a maior parte se dirigiu àquelaregião em torno de 1970. Na época as Forças Armadas iniciaram um estudo para efetuar as operações antiguerrilha. Estas foram envolvidas porum planejamento executado em sigilo e que durou em torno de dois anos. Para combater setenta guerrilheiros do PC do B, houve a mobilizaçãode cinco mil soldados brasileiros, além do auxílio de centenas de militares norte-americanos que atuariam na elaboração de planos estratégicosde dominação e consolidação de território. Os cerca de setenta guerrilheiros resistiram ao cerco militar que se iniciou em 1972 e durou por maistrês anos. Em janeiro de 1975 as operações foram consideradas ocialmente encerradas com a morte ou prisão da maioria dos guerrilheiros. Vide:MORAIS, Tais. SILVA, Eumano. Operação Araguaia: os arquivos secretos da guerrilha. São Paulo: Geração Editorial, 2005.
33 De orientação marxista, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) foram criadas em 1964. Naquele mesmo ano, os norte-americanos já pressionavam o Exército colombiano para eliminar um grupo rebelde que era formado por pequenos proprietários rurais, inuenciados pelosucesso de Fidel Castro em Sierra Maestra. As FARC possuem entre 12.000 a 18.000 membros e mantém presença em aproximadamente 35 a 40%do território Colombiano, a maioria em orestas e selvas a sudeste da base das montanhas do Andes.
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A VIOLÊNCIA E A RESPONSABILIZAÇÃO NOS REGIMES DITATORIAIS
ciamento instrumental e técnico existente entre
os lados opositores, ou seja, o governo tem a sua
disposição uma quantidade muito superior de
armamentos, que lhe assegura a superioridade
na prática da violência para conter os rebelados;
e esta supremacia se mantém, inevitavelmente,enquanto perdurar a aceitação do exército para
com o seu governante, de tal forma que, a únicachance plausível para a vitória do movimento popular seria a perda da legitimidade do governo
para com os súditos que estão a cumprir suasordens.
Nas palavras de Arendt: “Desde o começodo século, os teóricos têm nos dito que as chan-ces das revoluções têm decrescido bastante, na
mesma proporção em que aumentou o poderdestrutivo das armas à disposição unicamentedos governos. A história dos últimos setentaanos, com seu extraordinário recorde de revo-luções bem sucedidas ou não, mostra uma coisa bem diferente. Seriam malucos os que tentaram,
mesmo com uma desvantagem tão grande? (...) O
fato é que o abismo entre os meios de violência
do estado e do que o povo consegue juntar por
si mesmo – de garrafas de cerveja a coquetéis
Molotov e revólveres – sempre foi tão grande quemelhorias técnicas não fazem quase nenhuma
diferença. (...). Num confronto de violência com
violência a superioridade do governo sempre foi
absoluta; mas esta superioridade só dura enquan-to a estrutura de poder do governo estiver intacta
– isto é, enquanto as ordens forem obedecidas
e o exército e a polícia estiverem prontos a usarsuas armas”34.
3.5. A constatação de que a violência não é
capaz de sustentar um governo
Um governo cujo fundamento de auto-
ridade encontra-se na violência que é imposta
aos seus cidadãos não pode ter permanência no
tempo. Esta é a visão de Arendt sobre um regimeque se sustenta apenas baseado na prática daviolência. É preciso que, para além dos meios
violentos aplicados pelo ditador, haja poder no
sentido de autorização para atuar, conferida por
um certo número de pessoas, de consenso e acei-tação do povo para com o governante. É nítida amensagem de que, mesmo a longo prazo, o fator
humano continua a guiar os sistemas políticos. Na visão de Arendt até mesmo o mandante
totalitário, que se utiliza da tortura como instru-mento de dominação, tem a necessidade de uma
base de poder, que neste caso seria representada
pela polícia secreta e sua rede de informantese, acrescenta que “(...) Homens sozinhos, sem
outros que os apóiem, nunca têm suficiente poder para usar a violência com sucesso. (...) o
poder está realmente na essência de todo gover -
no, mas a violência não”35. Com isto, a autoravisa demonstrar que a violência é instrumental
por sua própria natureza e requer orientação e justicação para os ns que almeja.
3.6. O terror de Estado
O terror de Estado36 é utilizado como fór -mula para criar um sentimento generalizado de
angústia e atemorização nos indíviduos, a m de
que estes se mantenham consoante os desígniosdo governante e, abstenham-se de questionamen-tos quanto às suas tomadas de decisões. Arendtobserva que a prática do terror compõe-se de umestágio posterior ao mero uso da violência peloEstado contra seus cidadãos, no sentido de que
o terror se mostra ainda mais abominável do quea violência, porque seria a conrmação de quenão restou mais poder algum ao ditador, que se
encontra assim sem qualquer apoio popular para
continuar o seu governo.Porém, para Hannah Arendt, o terror de
Estado é uma característica mais fácil de serdetectada nos regimes totalitários do que nasditaduras propriamente ditas; para ela ao passo
em que as ditaduras são marcadas pela violência
aplicada contra os inimigos do regime, a domina-
ção totalitária é baseada no terror, porque nesteúltimo caso o Estado não se volta apenas contra
34 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, pp. 125-126, 2004.35 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, p. 128, 2004.36 O conceito de terror de Estado vincula-se à organização sistemática e institucionalização de um conjunto de instituições repressivas – por meio
de leis, prisões, execuções e julgamentos.
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seus inimigos, mas também contra seus amigos
e defensores, pois encontra-se num estágio decontínuo temor com qualquer poder, mesmo o deseus amigos: “(...) O clímax do terror é atingidoquando o estado policial começa a devorar seus
próprios lhos, quando o carrasco de ontem setorna a vítima de hoje”37.
3.7. A questão da culpa coletiva e da falta de
responsabilização
Na fase nal de uma ditadura, ou seja,no período de transição para um regime demo-crático, nos casos em que se adota uma anistia para as violações aos direitos humanos e demais
crimes praticados no período, e por consequênciaquando não se alcança o julgamento e a respon-sabilização individual, é comum que se tenha ao
menos uma reconstituição dos fatos ocorridos
por meio das chamadas “comissões de verdade e justiça”, a m de que se preserve a memória dosacontecimentos, como medida para evitar futuras
práticas condenáveis e, para que seja oferecidoàs vítimas e/ou seus familiares uma reparação pelos danos causados.
Nestes casos, em que o julgamento não éestabelecido, é usual se fundamentar esta ausên-
cia com base nas razões de Estado, armando-se que a estabilidade social e a paz somente se
tornarão possíveis se não houver o julgamentodos crimes políticos e das violações aos direitoshumanos praticadas em nome da manutenção do
regime no poder. Por isso, as leis de anistias têmsido justicadas ao nal de um conito armadoou na mudança de um regime como o preço
realístico a ser pago pelo nal de uma guerradestrutiva ou pela remoção de um governo que
cometeu graves violações aos direitos humanosno passado. Esta troca é apresentada como
sendo a condição necessária para garantir a paze a segurança e para evitar futuras violaçõesaos direitos humanos. A concepção é a de quese não for concedida anistia, o grupo que estáno poder irá continuar a perpetrar as referidasviolações. A interpretação, então, é a de que a
troca não é entre as vítimas dos abusos passadose a responsabilização dos perpetradores, mas
sim entre as vítimas do passado e as hipotéticasvítimas do futuro.
Porém, esta relação causal entre leis de
anistias, estabilidade social e Estado de direito parece não ser tão evidente. Tanto no Chile quan-
to na Argentina e no Peru, a responsabilizaçãoindividual foi restringida a m de que se facilitas-se a transição pacíca dos regimes políticos. Noentanto, é difícil de se apurar se tal proteção aosvioladores dos direitos humanos era realmente
necessária para favorecer a transição para a de-mocracia em cada caso, ou se as transformaçõesteriam ocorrido de qualquer forma, mas com um
grau maior de violência.
É possível observar que com o decorrerdo tempo os esforços para encerrar o desejo de
responsabilização dos culpados falharam tanto
no Chile quanto na Argentina e no Peru. Istodemonstra que, nestes casos, as tentativas para
se evitar a responsabilização em nome da esta-
bilidade social não funcionaram38.
O que parece evidente é que o argumento
de que as leis de anistias asseguram uma transi-ção pacíca foi limitado a um período particularda história, pois as leis de anistias que foramcriadas para valerem perpetuamente têm sido
desconsideradas em face da pressão nacional
e internacional em prol da responsabilização.
Assim, a utilidade da lei de anistia para motivarregimes autoritários a deixarem o poder tem di-minuído. Mesmo que se aceite a hipótese de quetais leis foram necessárias para facilitar antigas
transições e, que a impunidade foi o preço a ser pago para se alcançar uma futura estabilidadetal como ocorreu em Estados como no Brasil,
Argentina, Chile, El Salvador e Guatemala, nãoé possível armar com certeza que esta dinâmicairá funcionar no futuro.
A realidade parece ser de que as socieda-des somente irão tolerar tal impunidade por um
período limitado de tempo, e que eventualmenteaqueles que perpetraram graves violações dos
37 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, p. 132, 2004.38 SLYE, Ronald C. The Legitimacy of Amnesties Under International Law and General Principles of Anglo-American Law: Is a Legitimate Amnesty
Possible? In: Virginia Journal of International Law, Charlottesville: vol. 43, n. 1, p. 199, 2002.
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A VIOLÊNCIA E A RESPONSABILIZAÇÃO NOS REGIMES DITATORIAIS
direitos humanos no passado serão responsabili-
zados. Na opinião de Cassesse39, a racionalidade
que existe por trás da lei de anistia de que ao nalde um conito armado, de uma guerra civil oude uma revolução, o melhor para curar as feri-
das sociais seria esquecer o passado e liberar aresponsabilidade pelos crimes cometidos é ques-
tionável, pois é duvidoso armar que a anistia poderia curar feridas abertas, principalmente,
quando foram cometidas graves violações en-volvendo grupos étnicos, religiosos ou políticos,no qual restem marcas morais e psicológicas. Oressentimento e a raiva podem até ser tempora-
riamente suprimidos, mas estes não tardarão a
ressurgir e se espalhar, muitas vezes até de uma
forma mais violenta do que o esperado.
Este tema foi levantado porque Hannah
Arendt também se preocupou com as práticasestatais que, ao invés de promoverem a respon-
sabilização individual, preferem a disseminação
da idéia de uma culpa coletiva, como se a socie-
dade, na qual ocorreram as violações, se tornasseculpada e, faz uma crítica severa a estes fatos:“(...) Onde todos são culpados ninguém o é;
conssões de culpa coletiva são a melhor salva-guarda possível contra a descoberta de culpados
e quanto maior é o crime, maior é a desculpa paraque nada se faça”40.
Em “Responsabilidade e Julgamento”, aotratar também sobre a idéia de culpa coletiva,
Hannah Arent utiliza como pano de fundo osacontecimentos da Segunda Guerra Mundiale do julgamento de Eichmann, em Jerusalém,
para condenar veementemente a opção de não
se julgar os culpados e, incutir na sociedade o
sentimento de uma culpa coletiva: “(...) Alguns
anos atrás, a execução da sentença de morte paraEichmann despertou uma oposição amplamente
difundida, sob a alegação de que poderia aliviar
a consciência dos alemães comuns e “servir
para expiar a culpa sentida por muitos jovens na
Alemanha”, nas palavras de Martin Buber. Bem,se os jovens na Alemanha, jovens demais paraterem feito qualquer coisa, sentem-se culpados,
eles estão errados, confusos ou se utilizando de
jogos intelectuais. Não existem coisas como a
culpa coletiva ou a inocência coletiva. A culpae a inocência só fazem sentido se aplicadas aoindivíduo”41.
A disseminação da culpa coletiva comoabrandamento de um passado de violações
e reconciliação entre sociedade e governoencontra-se muito presente nos casos em que
há a instituição de uma comissão encarregadada investigação dos crimes, sem que se leve os
acusados ao julgamento perante um tribunal
penal. E, muito embora não se trate de uma si-
tuação latino-americana, um exemplo ilustrativo
foi o que aconteceu na África do Sul, onde achamada Lei de Reconciliação estabeleceu um
órgão quase-judicial e independente com o poderde conceder a anistia para crimes políticos. O processo de desenvolvimento da Comissão de
Verdade e Reconciliação Sul-africana envolveu
a consulta aos indivíduos, aos grupos comuni-tários e aos partidos políticos alcançando, em1996, o número de quarenta e sete audiências públicas por todo país. A Comissão de Verdade eReconciliação teve um propósito delimitado paraa concessão da anistia: (i) os crimes deveriam
estar relacionados aos objetivos políticos e, (ii)deveriam ter ocorrido no período de março de
1960 e dezembro de 1993. Os indivíduos que buscavam por anistia deveriam se apresentar
ao Comitê, o qual deveria decidir caso a caso
se o crime em referência havia sido cometido
com escopo político ou não. Embora houvessea exclusão da anistia para crimes comuns e pes-
soais, era possível que fosse concedida a anistiaaté mesmo para crimes relacionados às gravesviolações aos direitos humanos e ao direito in-ternacional humanitário desde que estivessem
vinculados aos objetivos políticos.Signicante no exemplo da África do Sul é
o requerimento de uma conssão obrigatória, ouseja, aqueles interessados na concessão da anistia
deveriam elencar todos os fatos relevantes para o
Comitê sobre Anistia antes que se iniciasse o pro-cesso para análise da anistia. O objetivo era queo processo de conssão obrigatória assegurasseum mínimo de memória sobre as atrocidadescometidas no passado.
39 CASSESE, Antonio. International Criminal Law. New York: Oxford University Press, pp. 312-313, 2003.40 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, p. 138, 2004.41 ARENDT, Hannah. Responsabilidade e Julgamento. São Paulo: Companhia das Letras, p. 91, 2004.
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BASTOS, L. E. A. F.
Nos casos de concessão da anistia, tanto a
responsabilidade civil quanto criminal do perpe-
trador e do Estado eram extintas. Entretanto, as
vítimas poderiam ainda solicitar uma reparaçãoao Comitê de Reparação e Reabilitação. O propó-
sito desta reparação não era impor sanção penalnem providenciar compensação econômica paraa vítima, mas sim restaurar a dignidade civil ehumana da vítima.
Argumentos estes que reforçam o pensa-mento de Arendt sobre a importância de se terum julgamento penal ou de se alcançar o perdão
como formas de pacicação dos ânimos e restau-ração democrática: “A punição é a alternativa do perdão, mas de modo algum seu oposto; ambos
têm em comum o fato de que tentam pôr m aalgo que, sem a sua interferência, poderia pros-
seguir indenidamente”42.
4. Conclusão: a mudança domundo por meio da violência e aconstatação de que quando não hápoder surge a violência
A lição que Hannah Arendt oferece aoshomens é a de que só pode haver racionalidadeno uso da violência se esta for aplicável a umobjetivo de curto prazo, como uma espécie de
reação imediata. Além disto, em qualquer situa-ção – seja envolvendo um grupo ou até mesmo
quando um único indivíduo decide fazer uso daviolência para manifestar o seu ponto de vista
ou assegurar a sua manutenção no poder – es-
taremos diante de um exemplo que não pode
ser construtivo ou benéco para a sociedade, pois a “(...) violência não estimula causas, nem
história nem revolução, nem progresso nemreação; mas serve para dramatizar ressentimen-
tos e trazê-los ao conhecimento do público”43.Existindo ainda o risco de que mesmo que num
primeiro momento a violência se traduza num
objetivo não-extremista e de curto prazo, “(..)
sempre permanecerá o perigo de serem os nssobrepujados pelos meios. Se os objetivos não
são alcançados rapidamente, o resultado não serásomente derrota, mas introdução da prática daviolência em todo o corpo político”44.
Para aqueles que ainda assim acreditam nouso da violência como uma prática a ser difundi-da e como meio para se alcançar a alteração do
mundo, Arendt nos deixa o testemunho de quemviveu num dos séculos mais conturbados por
revoluções: “(...) A prática da violência, comotoda ação, muda o mundo, mas é mais provávelque seja uma mudança para um mundo mais
violento”45.
Utilizando-se das reexões arendtianas
aplicadas ao fenômeno das ditaduras é possívellembrar uma derradeira passagem, aquela que
trata sobre o endurecimento dos regimes dita-
toriais quando há a percepção de que o poder,entendido como o apoio popular, está sendo perdido e tem-se a necessidade de mantê-lo a
todo custo. É exatamente nestas horas que osgovernantes se mostram mais tendentes ao uso da
violência: “Ainda uma vez não sabemos onde taisdesenvolvimentos vão nos levar, mas sabemos,
ou deveríamos saber, que todo declínio de poderé um convite aberto à violência – mesmo porqueos que detêm o poder e o sentem escapando das
mãos, sejam eles os governantes ou os governa-
dos, sempre acham difícil resistir à tentação desubstituí-lo pela violência”46.
Fica, portanto, a intenção de que se in-tensique nas gerações futuras a resistência aouso indiscriminado da violência como forma de
manutenção no poder e também como alternativa
revolucionária; e, que a exemplo dos gregos, a persuasão volte ser a forma política essencial para a sociedade: “O ser político, o viver numa polis, signicava que tudo era decidido mediante palavras e persuasão e, não através de força ou
violência. Para os gregos, forçar alguém median-te violência, ordenar ao invés de persuadir, eram
modos pré-políticos de lidar com as pessoas...”47.
42 ARENDT, Hannah. A Condição Humana. 10.° ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, p. 253, 2001.43 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, pp. 149-150, 2004.44 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República0. São Paulo: Perspectiva, pp.149-150, 2004.45 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, p.151, 2004.46 ARENDT, Hannah. Da Violência. In: Crises da República. São Paulo: Perspectiva, p. 156, 2004.47 ARENDT, Hannah. A Condição Humana. 10.° ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, pp. 35-36, 2001.