40
Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território. Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780 Escola e Violências Miriam Abramovay 1 A escola é espaço de construção de saberes, de convivência e socialização. Segundo Delors (2001), é uma via capaz de conduzir a um desenvolvimento humano mais harmonioso, combater formas de pobreza, exclusão social, intolerâncias e opressões. No Brasil a partir dos anos 60 a escola inicia um processo de mudança, o sistema se amplia e passa a receber uma parte da população que estava longe das escolas. A escola se depara com uma grande dificuldade para se adequar à nova população, apresentando-se como despreparada para receber um público que não estava habituada, ou seja, ela não sofre um processo de adaptação para poder se comunicar com novos códigos e novos valores, mais relacionados com os novos atores que freqüentam o espaço escolar. A massificação da escola não corresponde a um incremento de sua qualidade, ela acolhe e reforça as desigualdades entre as classes sociais e torna mais visível o bloqueio do sistema às crianças e jovens de classes populares. Quando falamos em massificação, que muitos chamam de democratização, estamos nos referindo que a maior parte de nossas crianças entram para a escola. Mas quantos a deixam antes de terminar a 4ª serie, quantos abandonam e quantos nunca aparecem nesse espaço? Mas quais são as obrigações da escola? Em princípio a educação tem que ser uma obrigação do Estado. Ela deve atender a todas as crianças e jovens e ser de boa qualidade. No entanto o que encontramos é uma escola 1 Miriam Abramovay é socióloga, pesquisadora, coordenadora da pesquisa Convivência Escolar e Violências nas Escolas da RITLA (Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana) Consultora da CUFA/DF Central Única das Favelas do DF; Pesquisadora Colaboradora Plena do NEIJ (Núcleo de Estudos da Infância e Juventude) da UnB (Universidade de Brasília) e Integrante do NPEJI (Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Juventudes, Identidades e Cidadania da UCSAL (Universidade Católica de Salvador /BA).

Abramovay, Miriam - Escola e Violências

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Texto sobre violência escolar.

Citation preview

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

Escola e Violências

Miriam Abramovay 1

A escola é espaço de construção de saberes, de convivência e

socialização. Segundo Delors (2001), é uma via capaz de conduzir a um

desenvolvimento humano mais harmonioso, combater formas de pobreza,

exclusão social, intolerâncias e opressões.

No Brasil a partir dos anos 60 a escola inicia um processo de mudança,

o sistema se amplia e passa a receber uma parte da população que estava

longe das escolas. A escola se depara com uma grande dificuldade para se

adequar à nova população, apresentando-se como despreparada para receber

um público que não estava habituada, ou seja, ela não sofre um processo de

adaptação para poder se comunicar com novos códigos e novos valores, mais

relacionados com os novos atores que freqüentam o espaço escolar.

A massificação da escola não corresponde a um incremento de sua

qualidade, ela acolhe e reforça as desigualdades entre as classes sociais e

torna mais visível o bloqueio do sistema às crianças e jovens de classes

populares.

Quando falamos em massificação, que muitos chamam de

democratização, estamos nos referindo que a maior parte de nossas crianças

entram para a escola. Mas quantos a deixam antes de terminar a 4ª serie,

quantos abandonam e quantos nunca aparecem nesse espaço?

Mas quais são as obrigações da escola? Em princípio a educação tem

que ser uma obrigação do Estado. Ela deve atender a todas as crianças e

jovens e ser de boa qualidade. No entanto o que encontramos é uma escola

1 Miriam Abramovay é socióloga, pesquisadora, coordenadora da pesquisa Convivência Escolar e Violências nas

Escolas da RITLA (Rede de Informação Tecnológica Latino-Americana) Consultora da CUFA/DF – Central Única das

Favelas do DF; Pesquisadora Colaboradora Plena do NEIJ (Núcleo de Estudos da Infância e Juventude) da UnB

(Universidade de Brasília) e Integrante do NPEJI (Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Juventudes, Identidades e

Cidadania da UCSAL (Universidade Católica de Salvador /BA).

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

que exclui os seus alunos, não respeita as diferenças, é elitista, baseada em

um modelo de escola que durante muitos anos atendeu a elite brasileira. Além

de ser excludente ela, muitas vezes, não respeita a criança e o jovem,

expulsando-os direta ou indiretamente do seu espaço.

O contexto de relações sociais ampliadas, assim como a estrutura sócio-

econômica, tem um lugar significativo nos tipos de relações que são

desenvolvidas nas escolas. As desigualdades sociais, econômicas e culturais

têm reflexos no universo escolar. E observa-se que a escola não só as reflete,

mas também as reproduz. A massificação do acesso à educação está

vinculada à idéia de exclusão escolar, que afirma uma igualdade de acesso e

uma desigualdade de desempenhos. Na atualidade, a escola integra mais,

porém, também exclui numa proporção maior. (Dubet;Martucelli, 1998)

No entanto, Charlot ressalta que a escola possui um papel central no

processo de aprendizagem. Ele lembra que, idealmente, a escola é encarada

pelos pais e estudantes como um espaço de aquisição do saber. No caso

específico das crianças e dos jovens brasileiros de baixa renda, a escola é

vista ainda como o único canal de mobilidade social e uma via para se

conseguir melhores oportunidades de trabalho (Abramovay; Rua, 2002: 201).

A escola tem que ser inclusiva, não pode ser discriminatória e tem que

criar mecanismos para que todos os alunos se interessem pelo que está

acontecendo no espaço escolar. A educação para Paulo Freire significa tanto a

necessidade de uma formação técnica, científica, profissional, como o

desenvolvimento de sonhos e utopias.

Os jovens buscam no sistema escolar desenvolver suas habilidades,

expandir relações sociais, realizar e construir desejos, impulsos, que colaboram

na formatação de suas respectivas identidades.

No entanto a escola é também locus de produção e reprodução de

violências nas suas mais variadas formas, na medida em que sua estrutura,

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

seu modo de organização, acaba impossibilitando que ela cumpra o seu papel,

que é o de formar, de maneira positiva, crianças e jovens.

Atualmente, verifica-se com maior nitidez uma tensão entre o sistema

escolar e as expectativas dos jovens. São vários os fatores que contribuem

para a singularidade dos conflitos e das violências no cotidiano escolar.

Charlot (1997) explica as dificuldades de analisar os diferentes aspectos

da violência escolar, onde nem sempre é fácil separar a análise dos

fenômenos, a referência às normas e a reflexão sobre as soluções.

Em primeiro lugar, há que se observar como é determinado o papel do

aluno na dinâmica escolar. A escola estabelece normas que visam organizar o

seu funcionamento, mas que, na maioria das vezes, não conseguem responder

aos seus objetivos, uma vez que formuladas e implementadas de forma

unilateral, sem se ponderar a palavra dos alunos e a de seus pais .

As regras e as normas são instrumentos que regulam e regem

procedimentos e atos, assumindo um caráter obrigatório acerca de uma

determinada forma de comportamento, sendo utilizadas para que se mantenha

a ordem escolar. Assim, valem-se de uma série de medidas formais, e até

mesmo informais, para lidar com os possíveis conflitos que possam emergir no

ambiente escolar, sendo pensadas para coibir ou minimizar ocorrências

violentas. Tais medidas, para que possam surtir o efeito desejado, devem ser

amplamente conhecidas, o que também não assegura que elas serão

respeitadas e cumpridas.

As regras são produzidas pelas instituições para que sejam cumpridas,

devem ser elaboradas “democraticamente e revisadas por todos os membros

da comunidade” (Ortega, 2003: 19). Na escola não se dá esse processo e os

estudantes não conhecem e não discutem os principais problemas que

acontecem no cotidiano, o que leva a um exercício de poder que “ao não ser

democrático, provoca disfunções no reconhecimento de identidades sociais dos

que dele participam” (idem:19). Assim os jovens não se sentem sujeitos do que

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

acontece na escola, mesmo que os assuntos tenham diretamente relação com

eles.

Algumas normas, em geral, são mal aceitas pelos alunos, seja porque

estes não as entendem ou porque as consideram sem sentido. As diferenças

entre a cultura escolar e a cultura juvenil aparecem constantemente nas

principais contradições presentes no cotidiano das escolas.

A manifestação da cultura juvenil no espaço escolar é um ponto de

tensão na relação entre alunos e docentes. Muitos adultos ainda vêem os

jovens como atores sociais sem identidade própria, não consideram a sua

diversidade e pensam a juventude por um dualismo “adultocrata” e maniqueísta

(Abramovay e Castro, 2006). A cultura escolar não tem demonstrado

receptividade à linguagem e às várias formas de expressão juvenil.

Assim, vemos na escola uma cultura adultocrata, baseada no não

diálogo e nas relações de poder entre estudantes e adultos da escola. A

relação é assimétrica e tensa, causada, muitas vezes, por adultos que partem

de posições conservadoras, rígidas, sendo desprovidos da capacidade de

diálogo. Vivemos, portanto, em uma sociedade adultocêntrica, com uma forma

de ver o mundo e uma ordem de valores que partem dos adultos.

O adultocentrismo, segundo Krauskopf (2002:124), é uma categoria que

mostra, na sociedade, uma relação assimétrica e de tensão entre adultos e

jovens. A representação dos adultos aparece, nessa concepção, como um

modelo acabado e está baseada em um universo simbólico e de valores que é

característico da sociedade patriarcal.

Segundo Fanfani as novas gerações são portadoras de diferentes

culturas, mais fragmentadas, abertas, flexíveis, e instáveis, onde o quadro

negro e o giz passam a não ter sentido e se contrapõem a agilidade dos

estímulos juvenis.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

A questão das regras aparece como um dos motivos para o conflito,

como, por exemplo, quando a escola proíbe a entrada de certos itens e

vestimentas que são próprias da cultura juvenil. Segundo entrevistados de uma

escola de Brasília, é proibida a entrada de jovens com celular, boné, piercing,

touca. Não podem mascar chicletes, comer balinhas, usar bermuda - exceto

preta ou azul- e as meninas não podem entrar de saia.

O boné é tido como um símbolo de gangues. Segundo os depoimentos

dos alunos, para os adultos, o boné é associado a códigos que, segundo eles,

não são verídicos: Colocar o boné para trás é pegar um menino, para o lado, é

matar; Dentro do boné, da touca, pode botar droga, pó.

Assim as regras e normas se convertem em problemas que geram

conflitos e violência, já que são pouco compreendidas na medida em que não

se dialoga e se desconhece como se dão as relações sociais na escola tanto

entre os pares como com os adultos. Tais proibições causam mal-estar por

parte dos alunos, já que estes não conseguem entender a lógica, o porquê de

determinadas regras. A roupa, a forma de vestir é uma marca juvenil que os

diferencia dos adultos. É como se fosse um modelo de diferenciação. Usar

piercing não é provocativo: é ser jovem. E os adultos têm dificuldade de

“suportar” tais marcas de “ser diferente”. A escola não apenas questiona a

conduta, como quer padronizar as aparências.

Quando as relações sociais são rigidamente hierarquizadas, a violência

é um recurso sistemático para a superação dos problemas. Assim, ao invés de

funcionarem os mecanismos institucionais, o que se encontra é uma situação

de conflito permeando os espaços escolares.

As regras são fundamentais para uma boa convivência, são

indispensáveis; no entanto, são muitas vezes coercitivas, na medida em que

em nenhum momento são discutidas por todos. As regras são violadas

constantemente - não se pode ir com celular à escola, mas todos vão, não

podem usar piercings, mas vários usam. Trata-se de um ambiente de “faz de

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

conta”, os alunos fazem de conta que não sabem e a direção faz de conta que

não enxerga.

Durante observações e entrevistas com grupo focais realizados em

Brasília, a maioria dos alunos diz possuir celular, que mantém ligado nas aulas;

dos entrevistados, vários usavam boné e piercing, principalmente os meninos.

Segundo Devine (1996), o processo de controle das regras pode levar ao que

ele chama de “efeito marshmellow”. Ou seja, as vezes que os jovens forçam a

mudança de uma regra, esta acaba sendo permitida (idem: 109), em um

processo que está longe de ser democrático, já que não é discutido, e os

alunos passam a ter voz ativa sem uma permissão explícita.

A escola não tem um “olhar supervisionador”. Ao contrário, no ambiente

escolar, faz-se de conta que não se está vendo - ou não se quer ver - o que

está acontecendo no dia-a-dia. Há diferentes mensagens para um mesmo

comportamento. Um exemplo é dado por alguns alunos que foram

severamente chamados à atenção quando corriam no recreio, além de

ameaçados de suspensão. Quando perguntados se é proibido correr na escola,

disseram que não, mas que “podem correr”. Citaram também o caso de outros

alunos menores que corriam em uma outra ocasião e foram somente

chamados à atenção, enquanto eles foram ameaçados de suspensão.

Quanto aos professores, queixam-se, por exemplo, de que apesar de os

alunos não poderem falar no celular, há docentes que o fazem durante as

aulas. Na escola de hoje, o papel do professor está fragmentado e este se

sente inseguro e despreparado, não sabendo como lidar com aquela população

que traz a “cultura da rua” para dentro das escolas. Com a massificação do

ensino, a cultura da rua se faz presente no cotidiano escolar, o que se

exemplifica, entre outros aspectos, nas diferentes formas de falar, de dirigir-se

ao outro.

A escola funciona como um espaço fechado para os jovens, impedindo o

trânsito das identidades nas suas fronteiras. Formas de pensar e de agir

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

contraditórias, que se ignoram e se rejeitam, que não se aceitam. Assim, os

jovens possuem valores, idéias, conhecimentos que não têm coincidido

exatamente com o que se ensina na escola, sendo que as diferenças se

tornam ainda maiores quando a escola se fecha ao diálogo com eles.

A mistura do reconhecimento dos direitos do jovem e a massificação da

escolaridade da população pode ser uma das origens do clima de tensão

verificado nas escolas. O poder já não é mais monopólio dos professores, o

saber possui outro sentido e os jovens pedem uma outra escola, onde o

professor, diretor e demais adultos terão, obrigatoriamente, o trabalho de

construir sua legitimidade para se fazer respeitar.

Bibliografia

ABRAMOVAY, M; RUA, M. G. Violências nas Escolas. Brasília: Unesco, Banco Mundial, UNAIDS, USAID, Fundação Ford, CONSED, UNDIME, 2002.

ABRAMOVAY, M. e CASTRO, M.. Caleidoscópio das Violências nas Escolas.Série Mania de Educação. Missão Criança, União Européia, OXFAM. Brasília, 2006

CHARLOT, B. e ÉMIM, J. C. (coords.) Violences à l’école - état des savoirs. Paris, Masson & Armand Colin éditieurs, 1997.

DELORS, J. Educação: um tesouro a descobrir. 6ª ed. São Paulo: Cortez; Brasília: MEC, UNESCO, 2001

DEVINE, J. Maximum security: The Culture Of Violence In Inner-City Schools. Illinois: The University of Chicago Press, 1996.

DUBET, F. ; MARTUCELLI, D. En la Escuela: Sociologia de la Experiencia Escolar. Losada, Buenos Aires, 1998

KRAUSKOPF D. Dimensiones críticas en la participación social de las juventudes in La participación Social e Política de los Jóvenes en el Horizonte del nuevo siglo. Sergio BALARDINI (compilador). Colección grupos de trabajo CLACSO, Buenos Aires, Argentina, 2002

ORTEGA, R. Programas educacionais de prevenção da violência escolar na Espanha: o Modelo Sevilha Anti-Violência escolar. In: Desafios e Alternativas: violências nas escolas. Brasília: UNESCO, UNDP, 2003.

ORTEGA, R. E DEL REY R. La Violencia Escolar Estrategias de Prevención. Editorial GRAÓ, Barcelona, 2003.

TENDI FANFANI, E. Disponível em http://www.lanacion.com.ar/783721. Acesso

setembro, 2006.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

EDUCAÇÃO COMO BASE DA SEGURANÇA

RESUMO

Educação como base da segurança. Na introdução são abordadas algumas das causas da insegurança de nossa sociedade. Em seguida se examina conceitualmente a violência em duas grandes categorias, a extrema e a material, apontando-se a situação do Brasil e Bahia em taxas de homicídios e de ocorrências por grupo de habitantes. Em seguida aborda-se o conceito de segurança cidadã e de educação para a cidadania como base para a segurança.

Palavras-chave: segurança cidadã; educação; violência extrema; violência material; Salvador-Bahia.

ABSTRACT

Education as base of the security. The introduction examines the Violence of our society. After she is examined in two conceptually great categories: extreme and material, pointing the situation on Brazil and Bahia in numbers of homicides and occurrences for group of 100.000 habitants. In followed the concept of citizen security and education for the citizenship is approached as base for the security.

Key works: citizen security; education; extreme violence; material violence; Salvador-Bahia.

INTRODUÇÃO

Falar sobre segurança implica em discorrer sobre a violência urbana no

Brasil, o que verdadeiramente dispensa uma introdução, todos nós a sentimos.

Resta-nos contextualizar: recordemos que a urbanização da América Latina foi

traumática, baseada mais na expulsão do homem do campo do que na sua

atração econômica para as cidades. Foram expulsos pela miséria, pela falta de

reforma agrária, falta de escolas, de assistência médica, etc. Em alguns países,

grupos armados órfãos do embate leste-oeste aderiram ao narcotráfico,

produzindo uma guerra mais violenta e insana do que todas as guerras já o

são, não só em seus países como em todos os outros nos quais a droga se alia

à pobreza e à educação precária.

Os índices de homicídios nas aglomerações urbanas Sul Americanas

são cem vezes superiores ao do Japão1, trinta vezes ao das cidades

Trabalho apresentado no Seminário Segurança Educação e Tecnologias Sociais, Salvador-BA, de 18 a

19 de setembro de 2008.

1 http://www.bookmice.net/darkchilde/japan/crime.html

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

européias2, dez a vinte vezes ao dos Estados Unidos3. É comum a todas as

grandes cidades da América do Sul a inexistência de serviços públicos

adequados, falta do aparato de defesa social eficiente, inexistência de

assistência social.

A principal vítima desta criminalidade endêmica é o jovem. Expostos à

violência desde a infância acabam por conhecer um mundo instável, com

condições difíceis e até impossíveis de vida onde a opção pela carreira

criminosa é uma opção real, próxima, factível, muito mais factível que a de ser

um simples operário. É assim no Brasil como um todo e mais ainda em nossa

Bahia.

A realidade do ensino de primeiro e segundo graus nas cidades

brasileiras está sob o impacto da violência urbana. As Escolas Estaduais e

Municipais4 enfrentam uma rotina caracterizada pela ameaça. Professores são

avisados do risco de determinados trajetos, de determinados horários, da

periculosidade de determinados grupos. É a realidade da criminalidade urbana

que ameaça toda a população, mas que especialmente afeta mais aos jovens,

presas fáceis da falácia comportamental ligada ao crime. Vive-se pouco, mas

com direito a tudo.

A violência urbana, principalmente a da delinqüência, considerando a

tipologia consagrada de Minayo (1994), tem inúmeros fatores geradores. O

leque vai de famílias desestruturadas, onde os pais que deveriam proteger são

agentes dos abusos, do convívio com criminosos em territórios de descoesão

social5, que formam a chamada condição de risco social, passando pela falta

de perspectiva de crescimento, de progressão, de sucesso, incluindo até a

modificação de valores sociais. A sociedade de consumo que enfatiza a posse,

o “ter” ao invés do “ser”. São inúmeras patogenias que terminam por criar as

2 http://www.angelfire.com/rnb//y/homicide.htm#intro

3 http://www.ojp.usdoj.gov/bjs/homicide/ageracesex.htm

4 Visita do IAT – SEC as escolas do bairro Tancredo Neves em Salvador, BA, e informações policiais.

5 Fragmentação social ou descoesão social resultante dos efeitos da disjunção entre

nação, economia e sociedade inerentes à nossa condição histórica de periferia da

expansão capitalista, acelerados pela subordinação à globalização hegemonizada pelo

capital financeiro.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

condições do ato infracional, onde todos sofrem danos, tanto o criminoso como

a vítima.

Os mecanismos de contenção da criminalidade são falhos quando não

são verdadeiros instrumentos de proliferação e de estímulo à criminalidade. A

polícia encarregada do policiamento ostensivo, aquele que visa prevenir o

crime não atua. Não age. Não interage com a população. Largas áreas das

cidades são verdadeiramente abandonadas, nunca vêem um policial em

atividade de prevenção ao crime, só no encalço de algum criminoso, de arma

na mão, invadindo e agredindo por não saber diferençar. Usando o preconceito

como instrumento de investigação, pois não possui equipamentos e materiais

que lhe permitam outra conduta. A justiça segue autista, afastada de qualquer

lógica do cotidiano, da linguagem usual, enclausurada em um formalismo

exacerbado, produz a resposta teoricamente certa em hora errada, após a

solução dos problemas ou a consumação dos crimes. As administrações

públicas não atendem as necessidades mínimas do ordenamento do uso do

solo, preferindo agir de forma burocrática contra aqueles que estão na

formalidade e ignorando as inúmeras invasões e construções irregulares e

seguem-se muitos outros sintomas de uma imobilidade e incoerência do

Estado. A complexidade exige uma abordagem cuidadosa.

DESENVOLVIMENTO

Vamos examinar este tema:

Iniciamos por violência. É definida sumariamente como aquilo que é

contrário ao direito e a justiça, definição sintética que não traduz o real

problema. Minayo (1994), Arendt (1994), assim como Freud (l974), Habermas

(l980), Sartre (l980), entre outros abordam as diferentes concepções da

violência, da que se origina do poder, do Estado, da sociedade, do indivíduo.

De uma forma ampla podemos adotar a abordagem de Maria Cecília S.

Minayo, grupando em três blocos: a Estrutural; a de Resistência; a da

Delinqüência.

A Violência Estrutural é aquela decorrente tanto das estruturas

organizadas e institucionalizadas como a família, como dos sistemas

econômicos, dos costumes culturais e da estrutura política que terminam por

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

resultar na opressão de indivíduos. Violência por diferenciação de etnia,

religião, origem, classe econômica, orientação sexual6. Com bases em critérios

semelhantes aos aplicados ao indivíduo, perpetuam-se violência contra grupos,

classes e até nações. A estes indivíduos componentes destes conjuntos são

negadas conquistas da sociedade. Tornam-se vítimas desta situação,

influenciando profundamente as práticas do viver em sociedade, levando-os a

aceitarem ou a infligirem toda sorte de ações contrárias ao que é justo e ao que

é do direito, segundo o seu papel nesta estrutura e de forma aceita pelo

conjunto, de forma dita “naturalizada”.

Já a Violência de Resistência é a resposta dos grupos, classes, nações

e indivíduos oprimidos à violência estrutural, porém não é aceita pela estrutura,

não é percebida como natural, ao contrário é reprimida pela estrutura que a ela

está ligada pela violência estrutural – os detentores dos poderes político,

econômico e cultural. É uma explicação do fenômeno da violência que não é

pacificamente aceita pelo senso comum, por cientistas sociais, por políticos em

decorrência da questão implícita: é justo responder a violência com mais

violência? A justiça, onde se localiza neste contexto? Existe ai um dilema, uma

verdadeira dialética social que envolve a quebra da estrutura que violenta e

que estabelece ao mesmo tempo o que é “natural”.

A Violência da Delinqüência, que é a que mais de perto está relacionada

com as questões atuais de segurança é aquela que se revela nas ações contra

a lei e sem um arcabouço moral. Ela é realizada única e exclusivamente com o

fim de vantagens pessoais. É lógico que está intimamente ligada aos demais

grupos ou categorias de violência, compreendendo-se a implicação da

violência estrutural, que provoca, degrada, corrompe e apresenta o crime como

uma saída para a desigualdade. A falta de trabalho, a falta de resolução de

conflitos, a justiça que não atua. Também são causas: a reação social como

uma espécie de forma de menosprezo aos valores e normas da “estrutura”; a

lógica em função do lucro sem risco – devido à incapacidade do aparato de

segurança; o culto ao consumo; o culto à força e o culto ao machismo. Esta

tipologia tem de ter maior prioridade para erradicação devido à imoralidade dos

atos geradores e os efeitos danosos sobre a vítima. A verdade é que tanto

6 Inclusão do autor, diferente do texto original, porém de acordo com o conceito da autora.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

aquele que foi vítima como os que perpetram os atos delituosos são vítimas de

nossa incapacidade em prevenir.

Outro aspecto formal ligado à violência é sua característica universal,

não está limitada a locais ou classes sociais ou condicionada a acesso a

determinados bens ou serviços, ela é peculiar à sociedade, porém é inegável

que existe com maior freqüência em espaços onde a desigualdade é

predominante, onde predomina a descoesão social.

A forma extrema da violência

No Brasil, no período 1996/2006, o número total de homicídios

registrados pelo Sistema de Informações Médicas - SIM passou de 38.888 para

46.660. Representa um incremento de 20%, Número 4,7% superior ao

crescimento da população no mesmo período (16,3%), portanto, passamos a

assassinar mais. Mas estas informações extraídas do Mapa da Violência da

Rede de Informação Tecnológica Latino Americana – RITLA - é um “valor”

nominal, não contextualizado. Poderíamos apresentar qualquer fato sob este

prisma sem indicar o absurdo que ele é de fato: em 1996, 38888 homicídios

significaram 26/27 homicídios por grupo de 100.000 habitantes e em 2006

significaram 25/26, uma década com 25/27 por cem mil, ou mais de 440.000

mortos por homicídio.

No mundo todo, em 2002, com todas as guerras e catástrofes,

ocorreram 460000 mortes consideradas “homicídios”. Levando-se em conta

uma população de 6 bilhões, estes números produzem uma taxa de 7,6

homicídios por cem mil habitantes no mundo. Isto significa que tínhamos em

2002 uma taxa de homicídios de aproximadamente três vezes a taxa mundial,

ou seja, superior em 328% à taxa mundo. Retiramos a máscara da sociedade

brasileira: Somos a sociedade em que a vida vem valendo cada vez menos.

Vejamos o que acontece na nossa Bahia. O número de homicídios no

Brasil manteve-se em crescimento até 2003, ano em que as ações de controle

da criminalidade através de investimentos em pessoal e material resultaram na

inflexão da razão de crescimento. O número de homicídios vem caindo,

considerando o número total, em praticamente todo o Brasil a partir de 2004.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

Este dado é bastante significativo e evidencia que as medidas adotadas

vêm apresentando um resultado positivo, de reverter a tendência de

crescimento iniciada em 1980 e que possuía uma razão constante de

crescimento. É necessário, por razão de lógica, alertar que a tendência de

queda dos homicídios no Brasil ainda é extremamente pequena e menor que a

taxa de crescimento em período igual de tempo anterior, e, o que é mais

relevante, muito longe do que poderia ser considerado como taxas normais de

homicídios em uma população de um estado legalmente constituído.

Na verdade as taxas brasileiras só encontram paralelo em países em

guerra, aliás, são superiores a muitas das taxas de mortalidade em guerra,

como, por exemplo, o violento conflito de Angola. Estes números são médios,

encontramos regiões onde esta situação ainda é pior, como é o caso da Região

Metropolitana de Salvador. A taxa de homicídios vem crescendo, em razão

muito superior a nacional, levando região metropolitana da 17ª posição entre as

mais violentas na década de 90, para a quinta em 2005 e hoje, em números

absolutos, passou a ser a segunda onde mais se morre por homicídios no

país7. Outro fato assustador é o aumento do número de mortes em confronto

com a polícia. Só no Estado de São Paulo, no dizer do ex-secretário nacional

de Segurança Pública, a polícia mata mais que a soma de todas as polícias

dos 50(cinqüenta) estados dos Estados Unidos da América. E mais, lá ocorre a

condenação de mais da metade dos policiais que matam. Aqui, no Brasil, em

São Paulo não sabemos do número de condenados (é insignificante). Na Bahia

nem sequer existe informação disponível.

Mas os Homicídios constituem uma variável com comportamento em

grande parte previsível, por incrível que pareça, senão vejamos: observa-se

que nos dados de pesquisas anteriores que na região metropolitana de

Salvador surgiram concentrações em determinadas faixas etárias, profissões e

locais, por outro lado estas indicações espacializadas recaem sobre as regiões

mais pobres da cidade, onde existe carência generalizada por falta de políticas

públicas adequadas. Os indivíduos residentes nesses espaços pobres ainda

são as principais vítimas da criminalidade e da violência. A cidade, repartida

em seus diversos territórios, segregados, que reproduzem a vida social das

7 “Mapa da Violência dos Municípios Brasileiros 2008”, disponível em www.observatorioseguranca.org

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

classes de acordo com seu poder econômico, contabiliza, sem cessar, taxas

criminais cada vez mais elevadas (GOMES. 2005). Nestes espaços, em um

movimento assíncrono com a evolução social e do entendimento de questões

relacionadas à cidadania e ao direito, existem motivações comuns ou temas

relacionados aos homicídios, como a classificação apresentada por Corrêa

(1983) sobre a região de Campinas, São Paulo: Infidelidade feminina;

abandono ou separação; briga ou agressão e, finalmente, a negação8.

Além desta recorrência temática, surge também a semelhança entre

vítima e agressor, demográfica e socialmente, considerando-se ainda que a

maior parte dos agressores seja masculina e os homicídios correm entre

pessoas cujas relações sociais podem ser consideradas próximas, envolvendo

o uso de drogas, álcool e ambientes públicos. Ainda se destaca a juventude

das vítimas e o baixo status social (PASTORE E VALLE SILVA, 2000;

CORREA, 1983; FAUSTO, 1984; dentre vários outros autores) – o homicídio

ocorre entre conhecidos, raras vezes entre pessoas totalmente desconhecidas,

neste caso estaremos lidando com psicopatas ou algum tipo de “serial Killer”

etc. Até mesmo as mortes perpetradas pelos “esquadrões da morte” obedecem

esta lógica, as vítimas são pessoas conhecidas destes assassinos ou dos

contratantes, os quais por viverem entre a legalidade e a ilegalidade são os

verdadeiros psicopatas.

A importância da compreensão do comportamento da variável homicídio

é oferecer uma possibilidade de planejamento urbano do serviço regional de

segurança pública com base na alteração do comportamento temporal da

variável. Esses tipos de análises, iniciadas por Wolfgang e Sellin (1969) e

também usadas por Cano e Santos (2001), nos ajudam a identificar possíveis

explicações causais e, também e principalmente, como evita-las. É ai que a

escola tem seu papel, veremos adiante.

A forma material da violência

A forma material da violência da delinqüência é explicitada pelo furto ou

roubo. Se as taxas referentes aos homicídios são elevadas as referentes aos

delitos de posse são enormes, mas ainda nem de longe representam a

8 Negar o direito a vida ao desafeto, ao diferente, ao que tenta mudar as regras. O observatório inclui

neste conceito ampliado as questões de gênero, homofóbicas e comportamentais desviantes.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

realidade. A lógica que predomina a perda material é do valor relativo da perda.

Ao ser furtado um telefone se considera a possibilidade do mesmo vir a ser

empregado em um ato criminoso e daí a imediata comunicação para a

delegacia e registro, feito por se pensar que se poderia vir a ocorrer um dano

maior. Mas quando temos um vale transporte furtado ou $10,00 ou $20,00

reais, imagina-se logo o tempo dedicado ao registro, à inexistência de

providências posteriores por parte da polícia e o valor perdido em relação a

mais outro prejuízo decorrente das horas ou dia de trabalho perdidos, gerando-

se uma sub-notificação.

Hoje se estima que a sub-notificação esteja na casa de 70%9 ou menos,

ou de 100 são informados apenas 30. Observemos que em Salvador

encontramos: 3397 ocorrências ou 1447,6 por grupo de 100000, ou seja,

incidem sobre a população em uma proporção de 49 vezes a de homicídios, ou

4825% superior a incidência dos homicídios.

Neste caso também teremos a ocorrência obedecendo a determinados

padrões: esta modalidade de crime, o roubo, se dá com o cidadão nos locais,

momentos e horários nos quais os criminosos esperam obter sucesso

(BAYLEY, 2001.p 112). Nos dias de pagamento do INSS, funcionários públicos

e empresas de grande e médio porte que contratam pessoas de baixo poder

aquisitivo que não possuem contas bancárias ou não as usam e necessitam

manusear dinheiro vivo. Nos locais de maior trânsito e nas suas áreas

próximas, como logradouros em que se costumam pagar tributos e taxas

municipais que necessitam ser recolhidas em espécie, escolas nos dias de

pagamento da mensalidade ou da cantina, empresas de transporte urbano ou

intermunicipal, alunos em seus percursos de ida e vinda das escolas, etc.

As discriminações de raça, credo, renda, orientação sexual, localização

no espaço urbano são importantes, uma vez que a segurança atinge de forma

diferenciada estes diferentes grupos. Assassinam-se mais negros e pobres que

brancos e ricos (CANO, 1999); Quando uma criança branca e rica morre

assassinada vemos a imprensa, a polícia e a sociedade como um todo se

9 Valor empregado pela SENASP. O IPEA trabalha com 90% para pequenos valores, 60 a 65% para

relativos valores – Texto para discussão 957 – de Waldir Lobão e Daniel Cerqueira. www.ipea.gov.br.

12 jan. 2004.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

mobilizar, quando morre uma criança pobre nas mesmas e até piores

condições, parece que era esperado, não existe dor, sentimento, reportagens,

apenas o abandono.

Segurança cidadã

A moderna gestão pública aponta para a transparência das ações

decorrentes das políticas públicas como forma de garantir o apoio e a pro

atividade da sociedade civil a consecução dos seus objetivos. O termo

accountability10 surge na moderna gestão pública, enfocando o procedimento

do administrador público em veicular informação de sua gestão para a

coletividade, bem como no sentido de prestação de contas acerca das

despesas e resultados.

O Estado da Bahia vem apresentando dados de toda a gestão pública,

porém na área de segurança pública, o faz de forma centralizada e negociada.

Tornam-se, apesar do esforço inegável dos órgãos policiais e da própria

Secretaria de Segurança Pública, dados dispersos e de difícil compreensão,

possibilitando a interpretação ou análise equivocada, quando não a própria

perda de credibilidade junto à população. Não se deseja a informação que a

polícia usa, mas a que já foi usada e terá valor para avaliar, compreender,

julgar os fatos e a ação da polícia para, em última na análise, ajudar a própria

polícia. A sociedade tende a exigir o cumprimento das políticas públicas11 e a

regularidade dos atos e fatos da administração (ZIFCAK, 2005).

Além disso, informações difíceis podem construir opiniões concernentes

à eficiência ou ineficiências, a eficácia ou erro do Estado à consecução do

Princípio Universal dos Direitos e da Dignidade do Homem a partir de indícios

10 O termo accountability, ainda não possui um similar na língua portuguesa. É muito abrangente e vai além da prestação de contas, pura e simples, pelos gestores da coisa pública. Diz respeito à sensibilidade das autoridades públicas em relação ao que os cidadãos pensam, à existência de mecanismos institucionais efetivos, que permitam interagir com o governo quando este não consegue resolver um problema.

11 O termo Política Pública (PP) deriva do inglês "public policy". Neste idioma, existem palavras distintas para

designar o que entendemos por política. A palavra "policy" se relaciona com iniciativas governamentais, diretrizes, ações, planos e interesses sociais, enquanto a palavra "politics" refere-se à política partidária, políticos, interesses partidários e interesses particulares. Pode-se exemplificar a diferenciação acima com o governo de Juscelino Kubitschek que estabeleceu entre sua grandes prioridades (diretrizes) a industrialização do país, o que se associa ao termo "politics", enquanto a formação de grupos executivos para dar um significado real às prioridades, é o que se denomina "policy". A expressão política pública possui conotações das mais diversas possíveis. É comumente associada: a um rótulo de campo ou atividade (política industrial, política econômica); a uma proposta geral (política progressista); a um meio (política de um sindicato); como sinônimo de decisão do governo (invadir o Iraque como política externa do governo norte americano); como diretrizes (gastos em determinado setor); como um conjunto de programas (programa de concessão de créditos) e a vários outros termos. Luiz Fernando Ballin http://www.pr.gov.br/capturado em 10 setembro de 2005.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

fragmentados. Estas opiniões veiculadas através dos meios de comunicação

podem gerar uma opinião pública construída a partir dos fragmentos e terminar

por ser prejudicial ao próprio objetivo do serviço. É neste ponto que a

informação correta pode e, de fato, coopera em muito com a administração

pública de serviços, em especial com o de segurança pública – garantindo que

estas opiniões sejam construídas sobre dados reais e conquistando o apoio da

população. Afinal como cooperar com o que não conhece ou não sabe, apenas

imagina-se?

O modelo da chamada segurança cidadã nada mais é que a segurança

que deveria existir e que passa pelo envolvimento da cidadania, da

cooperação, do conhecer, do aproximar as forças policiais da população, da

sociedade organizada, da modernização, da adequação ao papel de

preservadora da vida. Passou a ser usado com o objetivo de diferenciar-se da

segurança pública que não funciona, portanto não existe.

E quando e onde, de que forma a segurança, no sentido de evitar que se

venha a correr perigo poderá existir? A esperança e o apoio das pesquisas

indicam que existirá a partir da escola.

Segurança e educação

Muito se tem falado de segurança e de educação. A definição mais

simples de educação é: “Processo de desenvolvimento da capacidade física,

intelectual e moral do ser humano”. O que fazemos? Educar ou desenvolver a

capacidade física, intelectual, moral não significa preparar para a cidadania

plena? Pois bem, até onde se pode avaliar e de acordo com nossas leis, todo o

cidadão, ao concluir a educação básica (o fundamental I e II mais o ensino

médio) deveria estar pronto para participar de todos os atos e deveres da

sociedade, pois bem, quantos sabem executar as medidas básicas de socorro?

Quantos sabem matemática financeira básica? O cálculo de juros para viver

em um mundo cuja base de trocas e remuneração é o dinheiro? Quantos

conhecem as leis básicas de seu país e o espírito destas leis, o que estas leis

devem proteger? Quantos conhecem a base da vida saudável, dos meios

preventivos em relação às epidemias que grassam em nossa sociedade, como

a tuberculose, lepra, HPV, HIV e outras? Quantos estão aptos para o trabalho?

E quantos têm a convicção nos princípios morais de nossa nação? Quantos

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

estão preparados para enfrentar os perigos do assédio sexual e moral?

Quantos são preparados para viver na realidade do dia a dia da criminalidade,

com suas tentações e assédio? Quantos são preparados para o exercício da

cidadania? Quantos estão preparados para aceitar a diversidade de cor / raça /

orientação sexual / política / comportamental / cultural etc.? Explicitando ainda

mais, procurando chocar para evidenciar, nós criamos um sistema que não

educa para vida e queremos que estes jovens saibam viver em sociedade!

Só nestas simples perguntas já se identificam uma profunda relação

entre violência, educação e criminalidade: não educamos ninguém para ser

criminoso, mas, também, não educamos para ser cidadão pleno.

CONCLUSÃO

A escola na realidade é decisiva para a redução da criminalidade.

Espera-se que a escola seja o centro, a base da sociedade, da cidadania, da

eliminação da discriminação, do respeito à vida, da justiça, enfim da civilidade.

Lembrando o Prof. Gey Espinheira, sabemos que a população

distribuída pelos espaços da cidade não constituem comunidades, pois uma

comunidade pressupõe a existência de um "objetivo comunal", um objetivo

comum, o que não é o caso para a maioria da população de nossa cidade. Na

urbe que criamos cada morador está preocupado com a sua própria

sobrevivência, com seu trabalho, com seus próprios objetivos. Só existe um

local nestes aglomerados urbanos onde a população se transforma em

comunidade: em torno da escola.

A escola é um espaço sagrado. É o espaço que as famílias tradicionais

ou modernas e de qualquer origem ou religião vêem como o local onde seus

filhos irão aprender, crescer, evoluir, adquirir capacidades para enfrentar a

vida. A maioria diz claramente que esperam que seus filhos tenham melhores

condições que eles tiveram.

Na prática, a escola pode se articular com as redes de assistência

social, Conselho Tutelar (se for eficiente e se não o for deve articular para que

seja), com a Polícia Militar e Civil para prevenir, para impedir que um jovem

venha a se transformar em um criminoso e para evitar que um jovem venha a

ser vitimizado. A ação da escola na socialização e no acompanhamento dos

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

jovens em situação de risco é a principal forma de prevenção da criminalidade

e para isso ela deve ser efetiva, real, presente.

Sei que algumas das proposições podem parecer distantes de

professores que vão a um prédio em condições precárias, sitiado por

quadrilhas ou gangues, em uma favela, enfrentar uma turma de alunos com

inúmeras deficiências, muita das vezes com a própria turma desatenciosa,

desestimulada e desiludida, mas este é o verdadeiro desafio que se impõe à

sociedade brasileira: o desafio da civilidade, educar para proteger, educar para

a segurança, educar para a cidadania.

REFERÊNCIAS

ARENDT, Hannah. Sobre a Violência. Rio de Janeiro: Ed. Relume Dumará, 1994.

BAYLEY, David H. Padrões de Policiamento: Uma Análise Internacional Comparativa. Tradução de René Alexandre Belmonte. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2001 – (Polícia e Sociedade n.1).

CANO, Ignácio, SANTOS, Nilton. Violência letal, renda e desigualdade social no Brasil. Rio de Janeiro: 7 Letras, 2001.

CORRÊA, M. Morte em Família: representações jurídicas de papeis sexuais. Edições Graal.Rio de Janeiro. 1983.

FAUSTO, B. Crime e Cotidiano: a criminalidade violenta em São Paulo (1880-1924). Editora Brasiliense. São Paulo. 1984.

FREUD, S., 1974. Reflexões para os tempos de guerra e morte. In: Obras Completas de Sigmund Freud, pp. 311-339, Rio de Janeiro: Imago.

GOMES, Carlos Alberto da Costa. Espaço Urbano e Criminalidade: uma breve visão do problema. Revista de Desenvolvimento Econômico. Nr 11, p 57-68.UNIFACS.2005.

HABERMAS, J., 1980. O conceito de poder de Hannah Arendt. In: Habermas (B. Freitag & S. P. Rouanet, org.), pp. 100-118, São Paulo: Ática.

MINAYO, Maria Cecília de S. A Violência Social sob a Perspectiva da Saúde Pública. Cad. Saúde Pública. Rio de Janeiro, 10 (supl. 1): 07-18, 1994.

PASTORE, J e VALLE SILVA, N. Mobilidade Social no Brasil. São Paulo.Macron Books.2000.

SARTRE, J. P., 1980. A questão do método. In: Sartre, pp. 70-92. São Paulo: Abril Cultural. (Coleção Pensadores)

WOLFANG, M. e SELLIN, T. Delinquency: selected studies. John Wiley & Sons, Inc.University of Pensilvãnia.United States of América.1969.

ZIFCAK. Spencer Globalization and the Rule of Law, Rutledge, 2005.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

SOCIOLOGIA DA DELINQÜÊNCIA: A INICIAÇÃO DO JOVEM

Gey Espinheira13

Le crime se propose aux sprits comme une sorte de plus court chemin qui va du désir à as fin sans égard au désir d’autri. Il ne considere pas les sentiments d’autri comme obstâcles – mais Il ne connaît que les obstacles matériels.

Il en resulte que presque tous nos désirs sont criminels par essence.

VALÉRY, Paul. Oeuvres I Bibliotheque de la Pléiade. In Mêlange – Instants. Paris: Galimmard, 1997.

1. INTRODUÇÃO

Recupero algumas análises que fizemos em nossa prática de

intervenção social em que mesclamos pesquisa com ação social de arte

educação com jovens e disciplinas acadêmicas do programa ACC – ações

curriculares em comunidades, experiência da UFBA que demonstrou grande

eficácia no contato direto da Universidade com as comunidades. A nossa

experiência, de longa data, nos autoriza a fazer as considerações que logo

desenvolveremos neste seminário que ocupa um importante espaço de

discussão de um dos temas mais controversos, precisamente por se encontrar

ou em uma encruzilhada de diversas passagens, ou em um redemunho a puxar

para o fundo as impressões e sensações que o fenômeno da violência

proporciona.

13 Carlos Geraldo D’Andrea Espinheira, Doutor em Sociologia, Professor do Departamento

de Sociologia nos programas de Graduação e de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia; Pesquisador associado ao Centro de Recursos Humanos – CRH/UFBA; líder do Grupo de Pesquisa “Cultura, cidade e democracia: representações e movimentos sociais”. [email protected] ; [email protected]

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

Por que usamos estas imagens? Porque é um assunto em que todo

mundo se acha entendedor; diríamos: de domínio público. Isso, por um lado;

por outro, o fechamento do campo da Segurança que se considera detentor do

monopólio do conhecimento e não se abre para o diálogo, o que nos levou, em

seminário anterior, a acusar – e o termo é este – de autista em relação à

sociedade. Esta é, portanto, uma atividade que amplia a discussão e a

aprofunda, convocando, cada vez mais, outros atores e agentes que têm a

violência e a segurança como preocupações maiores.

Devemos reconhecer os esforços que o professor Carlos Alberto da

Costa Gomes e sua equipe têm desenvolvido para criar um fórum de discussão

e monitorar, com o Observatório Interdisciplinar da Segurança Pública esta

dimensão da vida humana que tanto compromete a sociedade brasileira. Neste

momento, saímos juntos de mais uma experiência comunitária, a finalização do

projeto Convivência, Arte & Criação, que realizamos no bairro da Mata Escura,

com o apoio logístico da Escola Estadual Márcia Méccia, da Secretaria

Estadual de Educação, conjugando ações de três Universidades: a Federal da

Bahia, através do Centro de Recursos Humanos – CRH; e as parceiras

UNIFACS e UNEB. Tivemos a autorga do edital: Novas tecnologias de

prevenção do crime e violência, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado

da Bahia – FAPESB (2007/2008), que contou, também, com recursos da

Secretaria da Segurança Pública, mas antes podemos contabilizar a nossa

ação ao longo de um ano no Subúrbio Ferroviário, com financiamento do

Ministério da Justiça e em parceria Universidade Federal da Bahia e Ministério

Público do Estado da Bahia, 2001/2002, resultando em 2004 na publicação do

livro: “Sociabilidade e Violência: criminalidade no cotidiano de vida dos

moradores do Subúrbio Ferroviário de Salvador”. Agora, publicamos:

“Sociedade do Medo: teoria e método da análise sociológica em bairros

populares de Salvador: juventude, pobreza e violência” e “Metodologia e prática

do trabalho em comunidade”, ambos pela EDUFBA, 2008.

Anteriormente tivemos outros trabalhos de grande envergadura

comunitária, mas não é o caso aqui de levantarmos o nosso currículo, mas

apenas algumas informações que ajudam a nos apresentar e a legitimar as

nossas reflexões, sobretudo diante de criaturas de pouca fé, que são muitas, e

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

estão sempre dispostas a torcer o nariz diante de palestrantes, e o nosso

tempo na mesa é sempre curto para a sedução, pois toda a nossa gente está

contaminada pelo marketing e o logos perde espaço porque exige mais algum

sacrifício.

Faço estas colocações como quem requer “habeas corpus preventivo”,

porque sabemos o quanto a nossa forma franca de falar tem irritado certos

segmentos que nos encaram como estranhos, quando o que queremos é

trabalhar em conjunto para o bem comum. Assim, na encruzilhada, fazemos o

Padê, abrimos os caminhos e por eles vamos adiante.

2. GENEALOGIA DA VIOLÊNCIA EM BAIRROS POPULARES

A violência não é algo em si mesma, isto é, alguma coisa, ou que tem

forma. É um fenômeno social que só pode ser capturado em suas

conseqüências. Essa natureza fugidia de algo que não é concreto, mas que se

realiza como ação em um dado momento e se realiza, isto é, se concretiza,

mas que também tem continuidade – não em si mesma – mas em

representações sociais que constituem um campo cultural que pode ser

concebido como comportamento ou habitus violento, qual seja a internação de

disposições para agir contra o outro, no ato contínuo, preventivamente ou a

posteriori, como vingança, toda vez que este outro venha a se constituir em

obstáculo, ou desafiar um ou vários códigos de preservação de arranjos de

convivência e de identidades em jogo.

Estes códigos estão ligados à construção de uma imagem necessária à

sobrevivência em um determinado meio social, a exemplo de liderança ou

comando, o que implica em desafio à honra, à coragem etc., além de exigir

atos heróicos (ou anti-heróicos) em busca de reconhecimento, da fama que

alimenta o imaginário de poder e liderança.

A cultura da violência está associada a um estado constante de anomia

em relação à sociedade envolvente, mas no conjunto anômico novas regras se

impõem e dão coerência a um modo especial de ser, e esta situação leva ao

estabelecimento de uma ambigüidade do viver em dois mundos que se

imbricam ao mesmo tempo em que se chocam.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

Diante das dificuldades de inserção no mundo formal e abrangente da

sociedade envolvente, as pessoas moradoras em bairros pobres criam,

recriam, inventam formas de obtenção de renda em uma ampla variedade de

jogos e negócios. São “jogos-de-cintura”, “agenciamento da malandragem”

(Lemos-Nelson, 2002), tráfico de drogas, roubo, assalto, seqüestro, furto e

assassinato, por um lado, quando as saídas são encontradas no campo da

transgressão.

Uma parcela da população, ainda que diminuta em termos proporcionais

orienta-se para a transgressão das leis para a realização de suas

possibilidades de ganho, muitas vezes como dedicação exclusiva; ou em uma

combinação de trabalho formal com operações criminosas. No imaginário

social – e com comprovação empírica – a sociedade é vista como corrompida e

corruptora, e a corrupção como uma expectativa a envolver altos escalões da

administração pública e conivência com empresários.

O crime compensa, e a prova disso é o fato de que menos de dez por

cento dos registros de crimes se transformam em processo legal. E esta

proporção, entre zero e dez por cento é variável no tempo e representa a

instituição da impunidade como um referencial estimulante para a preservação

das práticas criminosas e para novos contingentes que chegam para renovar e

aumentar o exército dos que se dedicam a atividades criminosas nas mais

diversas modalidades.

3. HERDEIROS E REPRODUTORES DA VIOLÊNCIA

Criminosos autônomos ou associados (gangues, quadrilhas, galeras)

sentem-se seguros em bairros em que o tecido social está dilacerado e,

portanto, sem coesão para resistir à presença de pessoas que agem

criminosamente e que se impõem pela intimidação dos outros através do

recurso à violência: ameaça de iminente agressão, agressão preventiva e

eliminação de todo aquele que esboçar reação ou ameaça ao domínio

estabelecido, e nisso inclui a testemunha que se obriga a obedecer e se calar.

O domínio pelo medo exige a prática de ações que mantenham a razão

do medo sempre atualizada. O medo, para ser constante e não apenas um

surto, exige a realização de rituais de renovação do sentimento. Assim, com

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

uma freqüência cada vez mais assídua, exemplos são dados de reafirmação do

domínio criminoso sobre a sociedade normal, que deve se acumpliciar pela

passividade, no que se convencionou chamar de “lei do silêncio”.

Esse estado de espírito e essa convivência entre criminosos e não

criminosos constituem a subcultura marginal ou submundo do crime, onde nem

todos são criminosos, assim como nem todos são não-criminosos, mas que os

não-criminosos podem se tornar criminosos passivos. Essa condição de vida

favorece a opção pela transgressão e pelo crime porque há obstáculos que se

interpõem entre os indivíduos e o modo formalizado de obtenção de renda, ou

seja, o trabalho, enquanto que, por outro lado, o crime torna-se compensador e

sedutor em uma sociedade de impunidade.

Comportamento violento é também uma forma de afirmação social de

muitos indivíduos que se recusam à diluição de sua personalidade no conjunto

social desvalorizado de consumidores falhos (BAUMAN, 1998). Há coisas que

só se conseguem “na raça”, e aquele que não tem “raça” sucumbe no cotidiano

altamente competitivo. Sucumbe em dimensões múltiplas: da experiência

erótica e afetual à realização de projetos pessoais de afirmação social pela

obtenção dos bens materiais de existência.

Não se pode entender as motivações para a violência sem entender que

a violência é um recurso social de sobrevivência, ou de um modo de viver

possível, entre outros, mas que se constitui para alguns como a orientação a

ser seguida como a mais vantajosa. O transcurso da vida cotidiana é mediado

pelo cálculo em relação às possibilidades, um jogo de “perde-ganha”, ou na

linguagem contábil, de cálculo de custo/benefício. Nesse jogo de racionalização

está também o não racional, sobretudo quando se leva em conta o uso de

drogas que provoca a alteração do estado de consciência e produz

comportamentos imprevisíveis, tanto para quem age, como para os que sofrem

a ação do indivíduo sob o efeito de substâncias psicoativas.

4. SOCIEDADE DO PRAZER E DO SOFRIMENTO: A PULSÃO

DO PRAZER

O jogo societal – para usar a terminologia tanto ao gosto de Maffesoli

(1985) – tem sempre múltiplas dimensões e uma das mais importantes é a

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

erótica, a fruição do prazer ligado ao erotismo; esta dimensão exige

compartilhamento, associação e a “necessidade de expressar sentimentos por

meio de atos exteriores” (1985, p. 28). A circulação do afeto submete a

circulação econômica ao mesmo tempo em que esta realiza aquela. No circuito

afetivo-econômico de representação da identidade e da realização das

animações da vida dos indivíduos, a violência torna-se um dos meios de

viabilização da existência nessa configuração social descontínua para os seus

membros, mas continua como condição para todos em conjunto.

A sociedade de consumo impõe a identidade de consumidor e o

reconhecimento dela de acordo com a capacidade aquisitiva de cada indivíduo.

Um conjunto de consumidores falhos reunidos em determinados lugares da

cidade constitui bairros pobres e pobreza; estruturas frágeis em que habitam

pessoas socialmente fracas, incapazes de resistência política eficaz e de quase

nenhuma iniciativa, também eficaz.

Não se pode viver – viver e existir – em uma cidade sem dinheiro. A

desvalorização de uma pessoa como consumidor falho a faz desvalorizar outra

nas mesmas condições e em condições superiores, ou seja, de consumidor

válido. Há, para usar a expressão de Sennett (2001), uma “corrosão do caráter”

que justifica o desprezo e a ação contra o outro. Essa corrosão advém da

deterioração social da pessoa e do conjunto social em que ela se insere; o

reconhecimento da falência social e a construção do ódio como alimento da

alma dilacerada.

O meio ambiente humano não é apenas o que o contém, a forma que

recebe o conteúdo, mas também o conteúdo mais sutil, o estado de espírito,

que se transforma em meio ambiente no qual os indivíduos experimentam

sentimentos e os manifestam em atos exteriores. Ódio, medo, desconfiança,

desespero, consumição, inveja, vingança, humilhação, frustração são exemplos

de sentimentos negativos que emergem nas pessoas que vivem em meio

ambiente socialmente deteriorado, deixando de ser estado psicológico

individual para ser uma forma social de sentir e existir, em suma, modo de

estar-no-mundo.

Todo este quadro descrito explica, de certo modo, a freqüência da

violência nos bairros populares, sobretudo em suas expressões mais radicais:

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

as agressões físicas e os assassinatos. Assim, a associação entre pobreza e

violência pode ser estabelecida.

A recordação de uma frase ouvida na rua, e que foi utilizada como

epígrafe do livro Divergência e prostituição (ESPINHEIRA, 1984) sintetizava o

ethos dos moradores de uma comunidade marginal: “Quem vive no Maciel tem

que tratar ladrão e maconheiro como irmão”, leva à reflexão sobre a existência

compartilhada com diferentes valores e práticas de conduta social. O

significado desta sentença é o do imperativo da convivência com o que não se

aceita sem se incomodar, isto é, quando se é obrigado a partilhar um mesmo

espaço, uma vizinhança heterogênea, e de valores discordantes sem agir

contra o que, ou de quem, se discorda. Eis o verdadeiro sentido do viver na

ambigüidade de dois mundos e o estado anômico que essa vivência acarreta,

quando não se pode conjugar as identidades em um e no outro mundo, na

medida em que o indivíduo não se bifurca em formal e informal, mas mantém

uma só identidade, e isso o obriga a submeter-se, em silêncio, à ordem

dominante da proximidade.

Viver nas comunidades populares significa ser tolerante, não como

consentimento, mas como estratégia. Os bairros populares – leia-se, pobres –

são os micro universos de uma sociedade (cidade) hierárquica. Os seus

problemas são, ao mesmo tempo, seus e da sociedade como um todo. Elias e

Scotson (2000, p. 16) observaram que:

Os problemas em pequena escala do desenvolvimento de uma comunidade e os problemas em larga escala do desenvolvimento de um país são inseparáveis. Não faz muito sentido estudar fenômenos comunitários como se eles ocorressem num vazio sociológico.

O mosaico urbano da área do Subúrbio é produto do modelo de

desenvolvimento do país; uma das conseqüências da concentração da renda

que se reflete na forma de urbanização das grandes cidades. Assim, as

condições para a emergência e reprodução da cultura de violência são efeitos

do modelo econômico, social e cultural que enfatiza a exclusão social e, por

isso, colhe como resposta a rejeição da exclusão pela via do uso da violência

como recurso social de inserção na sociedade.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

É importante afirmar que as condições macro-econômicas são

responsáveis pelas configurações micro-sociais, mas seria um grande

equívoco entender estas como meras conseqüências daquelas, como se neste

micro-universo não houvesse a geração própria de situações e condições que

dão à sua configuração um caráter particular. Vale a pena recorrer a Octavio

Paz (1992 p. 68):

Nossa atitude vital – que é um fator que jamais conheceremos totalmente, pois mudanças e indeterminação são as únicas constantes de seu ser – também é história. Quer dizer, os fatos históricos não são simplesmente fatos, mas estão embebidos de humanidade, isto é, de problematicidade. Tampouco são o simples resultado de outros fatos que os tenham causado, mas de uma vontade singular, capaz de reger sua fatalidade dentro de certos limites . A história não é um mecanismo e as influências entre os diversos componentes de um fato histórico são recíprocas, como tantas vezes já foi dito. O que distingue um fato histórico não é o produto dos chamados fatores da história, mas uma realidade indissolúvel. As circunstâncias históricas explicam o nosso caráter na medida em que nosso caráter também as explica. Ambos são o mesmo. Por isso toda explicação puramente histórica é insuficiente, o que vale a dizer que seja falsa.

Aqui a história é sinônima das condições macro-econômicas, ou seja, os

condicionantes externos, estruturantes, das realidades próximas das

comunidades, dos bairros no conjunto de uma cidade, por exemplo. O fazer da

vida cotidiana e o modo pelo qual ela se faz, se reproduz, tem a ver com as

forças e as estratégias com as quais o micro-social responde às pressões que

lhes são externas, envolventes. A vida social jamais se processa a revelia dos

indivíduos; são as relações que produzem as realidades e a realidade como

configuração de um lugar, de uma sociedade ou mesmo de uma época. Assim

se pode, na relação entre pobreza e violência, compreender , nas palavras de

Octávio Paz “o emprego da violência como recurso dialético, os abusos de

autoridade dos poderosos”.

Os que reagem, os que rompem a crosta da intimidação, precisam usar

meios adequados à ruptura da crosta que os envolve. A violência “urbana” não

é revolucionária ou política, mas responde à violência política que se exprime

na conformação da urbanização da cidade, na organização da economia, na

afirmação política do poder. A transgressão e o crime são formas alternativas

de obtenção de algum poder, do mesmo poder que oprime a quem transgride,

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

uma luta por igualdade de possibilidades dentro de um mesmo modelo social

de diferenciação social. Eis o vazio político da violência, mas também a sua

reciprocidade em relação à sociedade que a produz.

5. AGENTES E ATORES DA VIOLÊNCIA: UMA CONVIVÊNCIA

CONFLITUOSA

Como a violência só pode ser captada como conseqüência,

precisamente por não ter uma essência, a percepção da violência se associa a

formas de conduta e a ações que configuram um modo de ser ou de agir –

constante, ou efêmero e eventual – de modo que quando se fala em cultura da

violência ou da delinqüência, ou mesmo de lugar marginal, deve-se levar em

conta que essa imagem se preserva enquanto se reproduzem os fatores que a

fazem pulsar, mas que se desfaz quando esses fatores são alterados. Essa

“cultura”, portanto, não é algo duradouro, mas uma resposta à verdadeira

cultura de exclusão que o modelo econômico, político, social e cultural produz,

vácuo da ação política.

As pessoas não são – como muitos supõem – joguetes manipulados por

forças poderosas e externas; elas têm a capacidade de reagir e de criar um

mundo alternativo que permita alcançar estados de legitimidade adequados – e

na medida do possível – às suas personalidades e às expectativas que criam

como desejos desejados de realização de projetos que as animam. Goffman

(1974) observou que os indivíduos, mesmo quando submetido a instituições

totais, a exemplo de prisões, manicômios e conventos, são capazes de

subverter a ordem da organização não apenas no sentido de desobedecê-la,

mas de criar um modelo paralelo e independente de regras, normas e

significados que dão sentido a vida, preservando o caráter e a personalidade

desses indivíduos em um quadro apropriado de satisfação de desejos e

vontades.

No Brasil, nos últimos anos, o crime organizado entrincheirou-se nos

presídios e os transformaram em matrizes de suas organizações. O “lá fora”, a

família e os amigos, movem a liderança a manter uma ligação efetiva entre os

dois mundos, disseminando a força daqueles condenados sobre todos os

demais que devem lealdade, fazendo do mundo do crime uma organização

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

ampla e responsável pelos livres, assim como estes pelos aprisionados. Operar

o sistema atinge, nesses casos, o clímax, com a ajuda, sobretudo, do celular e

com ele a simulação de seqüestros e o comando de ações articuladas em todo

o país.

Estar de acordo, dissimular ou ir frontalmente contra a ordem depende

dos jogos das circunstâncias e dos objetivos postos em questão propostos

pelos indivíduos. Em outras palavras, o recurso à transgressão e à

criminalidade depende do cálculo de custo/benefício, mas também do capital

de valores sociais dos indivíduos. Assim, a sedução da formalidade legal

quando se associa à capilaridade econômica de mobilidade social oferece

recompensa aos que cumprem a ordem; em situação inversa, estimula a

transgressão e o crime, na medida em que a sociedade põe ênfase no êxito do

consumo sem peso equivalente nos meios para alcançar a condição de

consumidor válido. Ou nas palavras de Merton (1970 p. 207) “Uma sociedade

em que há ênfase excepcionalmente forte sobre objetivos específicos, sem

uma correspondente ênfase sobre os procedimentos institucionais”.

A racionalidade da vida cotidiana é acompanhada de uma não-

racionalidade da fruição da vida. Há um padrão de reprodução da vida social

que é o da família. A expectativa é a de que os filhos, à medida que cheguem à

vida adulta, façam o mesmo percurso que fizeram os pais: trabalhem, casem e

vão constituir família morando em um imóvel em algum lugar. Emprego,

moradia e família. Esse percurso, entretanto, é tumultuado por uma série de

fatores que se relacionam com pré-requisitos, a exemplo de: capital

educacional, capacitação profissional e articulação social. Baixo capital

educacional e baixa capacitação e falta de articulação limitam em muito as

possibilidades de realização de projetos. Há, para as pessoas que se

ressentem desses pré-requisitos, dificuldades em ter uma vida normal, e isso

inclui em sair da adolescência e tornar-se um adulto reprodutor da vida social

familial. Cada vez mais um número maior de jovens não consegue inserir-se no

mundo adulto familial e reproduzir o modelo social, provocando um desvio pela

incapacidade de auto-sustentação.

O fenômeno da gravidez na adolescência e de famílias cujos lares são

regidos por mulheres sem a presença masculina de cônjuge, denota uma

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

mudança no padrão social decorrente da impossibilidade de assegurar a

continuidade do modelo social tradicional. As jovens mães geralmente

abandonam os estudos, interrompem o processo de socialização moderno, se

distanciam mais ainda das possibilidades de trabalho e da cidadania. O tecido

social está se dilacerando a ponto de apresentar no pano de fundo da

sociedade empobrecida amplas esgarçaduras.

São essas carências sociais que contribuem para a construção da

violência como uma forma de ser na sociedade. As falhas institucionais

repercutem diretamente nas condutas individuais. São as instituições que

orientam os indivíduos, de tal forma que a vida social impõe, necessariamente,

a lógica do social sobre o individual, mas quando as instituições não são

capazes de orientar, acolher e condicionar a vida social, os indivíduos se

sentem mais aptos a escolher entre seguir as normas e as leis ou menosprezá-

las e mesmo transgredi-las. Em outros termos, quando o indivíduo não é

marcado por um papel social definido – porque todo papel social prescreve

normas de conduta e objetivos a realizar – ou seja, quando não se sabe quem

é e o que faz, ou ainda, não é reconhecido socialmente como um agente social

válido, esse “ninguém” é desvalorizado e sua visibilidade social é de

vagabundo: aquele que leva uma vida errante, vadio, mundeiro, leviano, entre

outras acepções.

O não reconhecimento implica em desconstruir o outro, desvalorizá-lo. O

ser desvalorizado, por sua vez, desvaloriza os outros, desqualifica-os e os vê

com o sentimento da frustração e da humilhação e vinga-se sempre que a

oportunidade se apresenta. A identidade é socialmente construída, socialmente

representada, socialmente sustentada e transformada socialmente. O indivíduo

está subordinado ao social e age sempre socialmente. Para Berger (1972 p.

113) a “identidade não é preexistente; é atribuída em atos de reconhecimento

social. Somos aquilo que os outros crêem que sejamos”. De modo mais

enfático, o mesmo autor concluiu: “Uma pessoa não pode ser humana sozinha

e, aparentemente, não pode apegar-se a qualquer identidade sem o amparo da

sociedade”. (p. 114).

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

6. A VIOLÊNCIA DA CIDADE: A URBANIZAÇÃO DA POBREZA

“Amparo da sociedade” e o seu oposto o desamparo a produzir

desamparados da sociedade. Em grande medida se está falando precisamente

de lugares da cidade onde está concentrado um grande número de

desafortunados. E essa concentração não é casual, mas uma determinação da

sociedade de classe que estratifica as pessoas segundo seu capital financeiro,

econômico, social e cultural, determinando seus lugares na sociedade e no

espaço urbano.

A estratificação urbana é nítida e as palavras “periferia” e “popular”,

estão a indicar descentralização, afastamento e isso que dizer: urbanização

precária (serviços e infra-estrutura deficientes ou inexistentes), moradia exígua

e desconfortável e muitas vezes insegura; feiúra, insalubridade e outras

deficiências que atormentam os moradores. Uma cidade é múltipla em sua

configuração, como vimos na análise da cidade do Salvador (ESPINHEIRA,

2002):

A complexidade social do espaço urbano está precisamente no fato de que a cidade e seus espaços são lugares e não-lugares: de pertença, ou de estar; de passagem, transitórios; muitas vezes esses lugares traduzem conforto, segurança e são propiciadores de realizações, de sensações que dão significado à existência; em outro pólo, podem ser lugares do desconforto, da insegurança, inibidores de realizações e, por isso, frustrantes. A busca de adaptação ao meio constrói um modo específico de vida nesses lugares e na cidade como um todo.

No mesmo estudo sobre o Subúrbio Ferroviário traçamos, em linhas

gerais, uma descrição da área pesquisada, sobretudo as suas formas de

convivência:

No Subúrbio a convivência com o feio, com o sujo, com a deterioração ambiental e com a violência gera uma autodesvalorização e, conseqüentemente, uma baixa solidariedade social, como se ali estivessem todos a cumprir um destino inexorável de sobrevivência competitiva nas mínimas coisas, sobretudo na ocupação de terrenos exíguos em lugares impróprios para a moradia, como se não houvesse nenhuma outra alternativa a não ser lutar por esse mínimo, pelo imediato, disputando palmo a palmo encostas, mangues e até mesmo a

superfície do mar.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

Não são opções dos indivíduos essa forma de morar e de viver. Não são eles os construtores do modo de vida que têm, mas a sociedade que os constrange, limita e impõe obstáculos que não podem transpor. O reconhecimento dessa forma de ser na trama urbana, leva à compreensão da complexidade do ser humano e da vida social, foca a sociedade em seu conjunto como uma força que pode brutalizar e “desumanizar” pessoas, levando-as a conflitos intensos e contínuos que constroem a violência como um recurso ao processo adaptativo para a sobrevivência.

Violência e crime, como visto, não decorrem de desvios pessoais, mas

são construções sociais quando a própria sociedade não oferta meios para que

as pessoas possam sobreviver e existir dignamente. Por sobrevivência se está

falando aqui do básico: alimentação, moradia, vestuário, acesso à saúde e à

educação; por existência: moradia, saúde, segurança, lazer, educação, fruição

do conforto, da higiene, da beleza e, sobretudo, da realização do que

denominamos animações da vida, tudo isso aliado a uma capacidade razoável

de consumo e de devaneio, que liberta de todas as “prisões da vida real”14.

São, portanto, as carências sociais da existência que produzem a

violência como recurso e a consolidam como um modo de vida, como uma

“cultura”. Quando se reconhece que “a gente vale alguma coisa quando tem

alguma coisa; quando não se tem nada, a gente não vale nada”. É um

pensamento corrente da sabedoria popular. Os “consumidores falhos” são

nada na vida social, mas eles não aceitam essa redução, reagem, querem

pertencer ao mundo e lutam ferozmente para isso, de tal modo que para eles

os fins justificam os meios.

Voltamos, novamente, ao estudo acima referido para melhor

compreender o sentido da construção social da violência ao proporcionar as

condições de desigualdade social com a imposição de carências e da exclusão:

A seleção de lugares e sua qualificação geram expectativas diferenciadas no que se refere à ordem/desordem, lugares “normais” e lugares “desviantes”. A pobreza contemporânea já não traduz qualquer dimensão moral da velha pobreza, que em certo sentido tornava-se sinônimo de ingenuidade, de pureza e de virtude, na acepção de “pobreza franciscana”. A pobreza urbana periférica é necessariamente constrangedora, excluída e,

14 Cf. BACHELARD, Gaston. A Poética do devaneio. Trad. Antonio de Pádua Donesi.

São Paulo: Martins Fontes, 1988.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

por isso mesmo, jamais aceita passivamente a exclusão e reage com todos os meios para se articular com o centro, ainda que seja na esfera da criminalidade e da transgressão. Há, assim, uma violência necessária que emerge como reação e que assume diversas formas, tanto nas relações interpessoais, como nas transgressões frente ao normativo, ao legal; e a organização do crime numa rede, ainda que esgarçada, que engloba indivíduos e grupos. A urbanização da pobreza não é, paradoxalmente, uma construção da pobreza, mas sim da

riqueza; assim como a periferia é um produto do centro.

Salvador, em seu conjunto, é uma cidade das desigualdades. Há uma

Salvador rica e bonita, que vê o mar; há uma outra, feia e desumana, ora

escondida do mar, fora da visão da cidade bonita; ora sobre o mar, sem terra

firme para erguer moradias, em palafitas. Nos morros íngremes, nas encostas

e nas cumeadas barracos e casas de alvenaria descarnadas revelando a

pobreza de seus moradores.

O mapa da violência em Salvador faz coincidir na cidade feia os maiores

índices de criminalidade, sobretudo assassinatos. “Impossível fugir a essa dura

realidade” – como disse o poeta Vinicius de Moraes diante do inexorável

sábado15 – pobreza urbana constrói a violência e a consolida como modo

cotidiano de ser. Casas gradeadas, estabelecimentos gradeados, bairros

inteiros com grades de ferro. Medo de sair de casa e ter os bens roubados, do

botijão de gás a eletrodomésticos; em alguns lugares medo de retornar e

encontrar a moradia ocupada por outros que dela se apossaram; medo de ficar

em casa; medo de viver; medo da espera de alguém que saiu e não sabe se

volta.

Enfocando o medo pressentido em Bate-Coração, (Espinheira, 1990), no

capítulo denominado “Os medos”, o sentimento é assim descrito:

Não dormir como dormem as crianças. Não descansar nunca. Saber-se espreitada e possível vítima de um assalto, estupro. Medo de ter os filhos tocados poro gente ruim. Medo dos outros, da escuridão, da noite, dos lugares ermos. Medo da chuva, do corrimento de terra que desaba e sufoca. Medo da morte, da dor, da solidão, da fome, da doença, do futuro. Medo dos mais fortes. Medo do ladrão, do criminoso, da polícia. Medo pelos filhos, de que sejam tragados pelo lado ruim do mundo. Medo de si mesmo, da ruindade e da brutalidade involuntárias. Medo do companheiro, da bebida do companheiro, de sua esquisitice, de

15 Referência ao poema de Vinícius de Moraes: O dia da criação.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

sua fala e de seu silêncio. Medo da companheira, de sua generosidade aparentemente excessiva, ou da secura, do que anda aprontando. Medo do pai, da mãe, dos irmãos, dos mais velhos, da turma. Medo do amor e do ódio. Medo do vizinho, da piada, do falar sério, da cachaça que desce errada, da exigência da mulher. Medo do patrão, da falta de patrão. Medo de notícia ruim, de chegar em casa, de sair de casa. Medo da vida, do

consolo da morte.

Sentimentos extremos e generalizados de desamparo. Naquele

passado, como agora, a condição de vida de muitos milhares de pessoas é

dramática. Vida de consumição, de desassossego, condição que pode se bem

entendida nos versos do poeta José Régio, em seu poema “Fértil desespero”:

Vida!, vida sarcasta,

Brutal, terrível madrasta

Dos filhos que mais te querem!:

Que fizeste daquele pobre herói

Que sonhava os reptos de Hércules,

E sorria com olhos de veludo?

Que fizeste daquele pobre herói?

- Fi-lo herói a valer... : tirei-lhe tudo.

E foi assim que a realidade de jovens, muitos jovens, “madrastamente” levou tudo o que poderia ser vontade de realização, de desejo, de possibilidade de uma vida diferente. O último verso é simplesmente terrível: “Fi-lo herói a valer... : tirei-lhe tudo”. E, por acaso, não foi isso que a sociedade fez com todos e todos que sorriam e tinham olhares de veludo? Crianças e adolescentes para suas mães, transformados em bandidos pela polícia?

7.VIOLÊNCIA NA VIDA COTIDIANA: O LUGAR EM SE MORA

A região da cidade do Salvador do Subúrbio é uma das que apresentam

os maiores índices de registros policiais de assassinatos ao longo dos anos. É

importante salientar que a violência pode estar associada a determinadas

pessoas ou grupos que durante algum tempo inquietam um bairro ou uma área

da cidade e isso é visto como um “caso de polícia”, ou seja, desde que aquelas

pessoas ou grupos sejam reprimidos a violência por eles desencadeada cede

lugar à tranqüilidade, à vida normal, como se supõe que assim deva ser a vida

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

em comunidade. Em outros lugares, entretanto, a violência tem uma duração

longa e parece não poder ser relacionada com identidades pessoais, mas com

condições sociais, ou seja, é despersonalizada, anônima e difusa. Os atores da

violência se sucedem, são os filhos da vida madrasta, feitos heróis a valer,

destituídos de tudo!

“Eu chego por volta das onze e meia da noite, escolho a rua mais movimentada, mas todas elas estão desertas a esta hora. Vou por uma que menos corra risco, mas todas são perigosas. É assim de segunda a sexta-feira” (depoimento de uma estudante).

Quando a violência se torna modo de ser, um ethos, ela é transmitida às

novas gerações e assim, como um fluxo constante, marca o cotidiano de vida

de uma comunidade. No mosaico do projeto Subúrbio há diferenças entre as

diversas configurações que o compõem, de modo que não se pode falar

genericamente, mas, por outro lado, deve-se reconhecer que a violência pode

ocorrer em surtos nos lugares considerados mais tranqüilos. O que importa

ressaltar é que a sociedade seleciona pessoas, umas são incluídas das mais

diversas maneiras, outras excluídas e outras tantas eliminadas por não

cumprirem os papéis que a sociedade exige delas, ou porque transpõem os

limites da tolerabilidade institucionalizada.

Quando se fala na inclusão ou exclusão, também há que se falar em

meios para que a inclusão se dê, por exemplo, o capital familial que vai permitir

às novas gerações posições bem definidas no contexto social. A educação é

um meio e ao mesmo tempo prática constante de socialização que permite aos

indivíduos ingressarem na ordem social hierarquizada. A escola, como ressalta

Bourdieu (1996), não apenas transmite conhecimentos, como também

credencia as pessoas com o diploma, dá status e passaporte para diversas

posições sociais e papéis que dependem de um determinado título.

Os pré-requisitos sociais são importantes para o itinerário de vida das

pessoas. O não preenchimento de um conjunto de condições previamente

exigidas para que outras, de hierarquia superior, possam ser alcançadas

desqualificam os indivíduos não possuidores desses antecedentes. Em

desvantagem social, esses indivíduos se vêem desfalcados e com dificuldades

de competir socialmente. É o caso dos jovens pobres, sem formação

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

educacional suficiente, sobretudo porque a sociedade não oferece a eles uma

educação capaz de ajudá-los em suas dificuldades pessoais e familiares, mas

um simulacro de aprendizagem que preenche a função social da socialização

externa à família, mas com baixo nível de aprendizagem e formação para a

vida social.

O tempo nos limita, a vida é homeopática e esta é uma dose inicial. Os que

tiverem boa-fé continuem a refletir, mais logo e sempre, exercício permanente

de construir o mundo tal como o desejamos, para a nossa sede, o nosso

apetite, para o nosso tempo, para a nossa vida, e assimilemos o que nos diz o

poeta T.S.Eliot: “e tudo é sempre agora”. Que o nosso país nos seja o país do

presente e para cada um de nós um presente Brasil para a nossa satisfação.

REFERÊNCIAS

ADORNO, Sérgio. A criminalidade urbana violenta no Brasil: um recorte temático. In Boletim Informativo e Bibliográfico de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, Nº 35.

ANDRADE, Cristovaldo envergonhado mata filho viciado a tiros. Salvador, A TARDE, Polícia, p. 8. Salvador, 15/2/2003.

ANDRADE, Cristovaldo. Dois homens morrem em confronto com a polícia. Salvador, A TARDE, Polícia, p. 14. 8/12/2002.

ANDRADE, Cristovaldo. Mãe perde dois filhos por causa de drogas. Salvador, A TARDE, Polícia, p. 6. 7/3/2003.

ARENDT, Hannah. Sobre a violência. Trad. André Duarte.Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2001.

ATAÍDE, Yara Dulce Bandeira de. Clamor do presente: história oral de famílias em busca de cidadania. São Paulo: Loyola, 2002.

BAUMAN, Zygmunt. O Mal-estar da pós modernidade. Trad. Mauro Gama e Cláudia Martinelli Gama. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

_________________. Ética pós-moderna. Trad. João Rezende Costa. São Paulo: Paulus, 1997.

BECKER, Howard S. Uma Teoria da ação coletiva. Trad. Márcia Bandeira de Mello Leite Nunes. Rio de Janeiro: Zahar, 1977.

CASTRO, José Sem segurança o subúrbio fica ao deus-dará. Salvador, A TARDE, Local, p. 4. 10/4/2002.

CHATELAIN, Graciela. Reconstituição e análise da história de vida de onze casos exemplares de crianças e adolescentes vítimas de violência, através da visão da comunidade. Salvador: CEDECA, 1994.

ELIAS, Norbert, SCOTSON, John L. Os Estabelecidos e os outsiders. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

ESPINHEIRA, Gey. Os tempos e os espaços do crime. In A Outra face da moeda – violência na Bahia/Nelson de Oliveira, Lutz Mulert S. Ribeiro, José Carlso Zanetti (orgs.). Salvador: Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de Salvador, 2000.

________________. A Cidade das desigualdades: raízes da violência. In Paz só com justiça social/Álvaro Gomes (organizador) et al. São Paulo: Anita Garibaldi, 2002.

________________. Violência policial. Salvador, A TARDE, Espaço do leitor, p. 2, 21/4/2002.

________________. Bate-coração: um estudo sociológico da urbanização periférica de Salvador. Salvador. Centro de apoio e Desenvolvimento de Organizações e Empresas – CADES, P&C – Consultoria e Negócios, 1990, 135 p. (Síntese publicada em Veracidade – Revista do Centro do Planejamento Municipal. Salvador-Bahia, ano 2, nº3, setembro 1992.)

________________. Crianças e adolescentes saídos de casa na paisagem das ruas. In Formação de educadores sociais: coletânea de textos/Fernanda Almeida Gonçalves (Org.). Salvador: Universidade Federal da Bahia/Secretaria do Trabalho e Ação Social – SETRAS, 2001.

________________. Crime sem castigo: impunidade na Bahia. Salvador: CEDECA, 2003.

________________. Desaparecimento e desaparecidos: um estudo da violência urbana. Salvador: Tribunal de Justiça do Estado da Bahia/CEFIJ, 1999.

________________. Proximidade e intolerância In Sociabilidade e violência: criminalidade no cotidiano de vida dos moradores do Subúrbio Ferroviário de Salvador. Salvador: Ministério Público do Estado da Bahia/Universidade Federal da Bahia/CRH, 2003.

________________. Sociabilidade e violência na vida cotidiana em Salvador. In Bahia Análise & Dados/Violência/ Salvador – v. 11 - nº 01 – junho, 2001.

___________________. Divergência e prostituição: uma análise sociológica da comunidade prostitucional do Maciel. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; Salvador: Fundação Cultural do Estado da Bahia, 1984.

FERREIRA, Adailton B. G. A Sociabilidade ameaçada: a forma, o conteúdo e a violência cotidiana na Soterópolis. In ESPINHEIRA, Gey (org.) Sociabilidade e violência: criminalidade no cotidiano de vida dos moradores do Subúrbio Ferroviário de Salvador. Salvador: Ministério Público do Estado da Bahia/Universidade Federal da Bahia/CRH, 2003

GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e conventos. Trad. Dante Moreira Leite. São Paulo: Perspectiva, 1974.

GOULDNER, Alvin W. The Coming crisis of western sociology. London: Heinemann, 1977.

KUMAR, Krishan. Da sociedade pós-industrial à sociedade pós-moderna. Trad. Ruy Jungman. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

LEMOS-NELSON, Ana Tereza. Criminalidade policial, cidadania e Estado de direito. In Cadernos do CEAS, n. 197, janeiro/fevereiro, 2002. Salvador: Centro de Estudos e Ação Social.

LIMA NETO, Fernando Cardoso. Limiares da sociabilidade suburbana. In Sociabilidade e violência: criminalidade no cotidiano de vida dos moradores do Subúrbio Ferroviário de Salvador. Salvador: Ministério Público do Estado da Bahia/Universidade Federal da Bahia/CRH, 2003.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

LIPOVETSKY, Gilles. Le Crépuscule du devoir. Paris: Gallimard, 1992.

LOPES, Regina. Considerações sobre ações voltadas para a desconstrução da violência no bairro de Escada: um novo olhar sobre o Subúrbio.

MAFFESOLI, Michel. Dinâmica da violência. Trad. Cristina M. V. França. São Paulo: Revista dos Tribunais, Edições Vértice, 1987.

__________________. A Sombra de Dionísio: contribuição para uma sociologia da orgia. Trad. Aloísio Ramos Trinta. Rio de Janeiro: Graal, 1985.

A Voz dos adolescentes. UNICEF, 2002.

MERTON, Robert K. Sociologia – teoria e estrutura. Trad. Miguel Maillet. São Paulo, Mestre Jou, 1979.

NORONHA, Ceci Vilar. Violência, etnia e cor: um estudo dos diferenciais na região metropolitana de Salvador, Bahia, Brasil/Ceci Vilar Noronha et al. In Ver. Panam Salud Publica 5(4/5), 1999.

O Rastro da violência em Salvador – mortes violentas de residentes em Salvador, 1997. Fórum Comunitário de Combate à Violência/Projeto UNI. Salvador: UFBA/UNICEF.

O Rastro da violência em Salvador – mortes violentas de residentes em Salvador, de 1997 a 2001. Fórum Comunitário de Combate à Violência/Instituto Médico Legal Nina Rodrigues. Salvador: UFBA/UNICEF.

OLIVEIRA, Flávio. Violência esconde a história do subúrbio. Salvador, A TARDE, Local, p 4. 21/8/2002.

PAZ, Octávio. O Labirinto da solidão e Post Scriptum. Trad. Eliane Zagury. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.

PINHEIRO, Paulo Sérgio e ALMEIDA, Guilherme Assis de. Violência urbana. São Paulo: Publifolha, 2003.

PINHEIRO, Paulo Sérgio. Pobreza, violência e direitos humanos/Paulo Sérgio Pinheiro, Malak El-Chichini Popovic, Túlio Kan. In Novos Estudos Nº 39, julho 1994. São Paulo.

RAMALHO NETO, Jaime Pinto. Capuz, ferro & extermínio: cerimônia privada de morte na Região Metropolitana de Salvador.(Monografia de graduação em Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2002.

REIS, Dyane Brito. A Marca de Caim: as características que identificam o suspeito segundo relatos de policiais militares. In Caderno CRH, nº 36, jan./jun. 2002. Salvador: CRH/UFBA.

SANTOS, José Raimundo de Jesus. Lugar marginal. In Sociabilidade e violência: criminalidade no cotidiano de vida dos moradores do Subúrbio Ferroviário de Salvador. Salvador: Ministério Público do Estado da Bahia/Universidade Federal da Bahia/CRH, 2003.

SENNETT, Richard. A Corrosão do caráter – conseqüências pessoais do trabalho no novo capitalismo. 5a. ed. Trad. Marcos Santarrita. Rio de Janeiro: Record, 2001.

________________. Autoridade. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro.São Paulo: Record, 2001.

SERPA, Ângelo. Fala periferia! Uma reflexão sobre a produção do espaço periférico metropolitano/Ângelo Serpa, organizador. Salvador: UFBA, 2001.

Revista Observare. A revista do Observatório Interdisciplinar de Segurança Pública do Território.

Volume 4. Outubro de 2008. www.observatorioseguranca.org ISSN 1981-1780

SIMMEL, Georg. Filosofia do amor. Trad. Paulo Neves. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

______________. Filosofia del dinero. Trad. Ramon Garcia Cotarelo. Madrid: LAEL, 1977.

SOARES, Antonio Mateus de Carvalho. Violência, crime e jovens empobrecidos. In Sociabilidade e violência: criminalidade no cotidiano de vida dos moradores do Subúrbio Ferroviário de Salvador. Salvador: Ministério Público do Estado da Bahia/Universidade Federal da Bahia/CRH, 2003.

SOARES, Luiz Eduardo. Uma radiografia da violência no Rio de Janeiro/Luiz Eduardo Soares et al. In Violência, crime e castigo/Maria Clara Luchetti Bingemer, Roberto dos Santos Bertholo Jr (Org.). São Paulo: Loyola, 1996.

SOREL, Georges. Reflexões sobre a violência. Trad. Orlando Reis. Petrópolis, RJ: Vozes, 1993.

VAZ, Andréia. População de Salvador tem medo da polícia. Salvador, A TARDE, Local, 24/4/2002.

WAISELFISZ, Jacobo. Mapa da violência: os jovens do Brasil. Rio de Janeiro: Garamond, 1998.

WALZER, Michael.. Traité sur la tolérence. Trad. Chaïm Hutner. Paris: Gallimard, 1997.

ZALUAR, Alba. Violence, easy money, and justice in Brazil: 1980-1995. UNESCO, 2001. Blackwell Publiher, UK.

_____________. Crime e castigo vistos por uma antropóloga. In Violência, crime e castigo/Maria Clara Luchetti Bingemer, Roberto dos Santos Batholo Jr (Org.). São Paulo: Loyola, 1996.