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Promotoria de Justiça Regional Ambiental com sede em Valença/BA EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE VALENÇA/BA O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por seu Promotor de Justiça infra firmado, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, lastreado no Inquérito Civil nº 597.0.82138/2012 ( autos em anexo), e com fundamento nos arts.129, inciso III, da Constituição Federal, e 138, III, da Constituição Estadual, na Lei nº 7.347/85, no art.25, inciso IV, alínea “a”, da Lei n.º 8.625/93, e no art.72, inciso IV, alínea “b”, da Lei Complementar Estadual nº 11/96, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE COM REQUERIMENTO LIMINAR em face do MUNICÍPIO DE VALENÇA, pessoa jurídica de direito público interno, inscrita no CNPJ sob o número 14,235.899/0001-36, com sede na Travessa General Labatut, s/n, Centro, Valença/BA, pelas razões fáticas e jurídicas a seguir elencadas: __________________________________________________________________________________________ Promotoria de Justiça Regional Ambiental com sede em Valença/BA Rua Luís Eduardo Magalhães, 258, Jardim Grimaldi, Valença/BA - CEP 45.400-000 Telefax (75) 3641-2172/6511 – E-mail [email protected]

Ação Civil Pública SISMUMA Valença

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Ação Civil Pública

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Promotoria de Justiça Regional Ambiental com sede em Valença/BAEXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DAFAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE VALENÇA/BA

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por seu Promotor de

Justiça infra firmado, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, lastreado no Inquérito

Civil nº 597.0.82138/2012 ( autos em anexo), e com fundamento nos arts.129, inciso III, da

Constituição Federal, e 138, III, da Constituição Estadual, na Lei nº 7.347/85, no art.25, inciso

IV, alínea “a”, da Lei n.º 8.625/93, e no art.72, inciso IV, alínea “b”, da Lei Complementar

Estadual nº 11/96, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE

COM REQUERIMENTO LIMINAR

em face do MUNICÍPIO DE VALENÇA, pessoa jurídica de direito público interno,

inscrita no CNPJ sob o número 14,235.899/0001-36, com sede na Travessa General Labatut,

s/n, Centro, Valença/BA, pelas razões fáticas e jurídicas a seguir elencadas:

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I – DOS FATOS

Instaurou-se, na Promotoria Regional Ambiental com sede em Valença/BA, o

Inquérito Civil tombado sob o número 597.0.82138/2012, para, em cumprimento a um

programa desenvolvido pela Gestão Estratégica do Parquet baiano, denominado “Município

Ecolegal”, averiguar a necessidade de regularização do Sistema Municipal de Meio Ambiente

de Valença, em especial a realização do licenciamento ambiental.

Durante este procedimento, a Câmara Temática de Sistema Municipal de Meio

Ambiente, do Ministério Público do Estado da Bahia, analisou extensa documentação

fornecida pela própria Administração do Município de Valença e apresentou o relatório

analítico de fls.222 a 271 dos aludidos autos.

O mencionado relatório analítico concluiu que o Município de Valença deveria, de

maneira imediata, adotar as providências aqui destacadas para regularizar o seu Sistema de

Meio Ambiente, colocando-o em conformidade com o ordenamento jurídico-constitucional

vigente:

“a. Comunicar através de ofício à Superintendência de Políticas e

Planejamento Ambiental – SPA / Secretaria Estadual de Meio Ambiente – SEMA

a sua não capacidade técnica e administrativa, para que o Estado exerça a

competência supletiva para o licenciamento dos empreendimentos e atividades

de impacto local (…);

e. Realizar concurso público para a investidura de servidores próprios

aos cargos de fiscalização e de sua estrutura técnica de licenciamento, caso

pretenda licenciar.

f. Realizar a fiscalização ambiental, para coibir ou evitar o dano

ambiental, de forma preventiva e repressiva e de maneira continuada, uma vez

que o município não pode se abster desta ação administrativa para proteção dos

seus recursos ambientais”.

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O trabalho da Câmara Temática não se resumiu em realizar um diagnóstico. Além de

apontar as correções necessárias a serem levadas a efeito pelos Municípios, elaborou diversos

documentos para guiá-los nesse processo de adequação.

Para tanto, expediu a nota técnica 001/2014 sobre a estruturação do Sistema Municipal

de Meio Ambiente e a nota técnica 001/2013, que versou sobre diretrizes básicas para a

elaboração ou revisão da Lei da Política Municipal de Meio Ambiente – PMMA. Outrossim,

elaborou ainda uma minuta de Lei de Referência para a Política Municipal de Meio Ambiente

e uma apostila que trata do “SISMUMA: O papel do Município e a importância do Conselho

de Meio Ambiente” (vide material do CD ROOM inserto na fl. 272 dos autos do Inquérito

Civil).

Este órgão de execução ministerial também se preocupou em discutir e proporcionar

ao Município de Valença as condições para que observasse as correções apontadas nas

conclusões dos relatórios analíticos da Câmara Temática.

Nesse sentido, este órgão do Parquet designou audiência extrajudicial e, na

oportunidade, propôs Termo de Ajustamento de Conduta ao ora Acionado para que

promovesse a regularização do seu Sistema Municipal de Meio Ambiente, nos termos

apontados pelo citado relatório analítico apresentado pela Câmara Temática de Sistema

Municipal de Meio Ambiente (vejam-se o ofício de fl. 275 e a ata de audiência extrajudicial

de fl. 277 do expediente tombado sob o número 597.0.82138/2012). No entanto, o Réu

apresentou resposta ao Ministério Público, afirmando que, não obstante tenha apenas uma

única bióloga para exercício da atividade de licenciamento ambiental, informou, sem assinalar

prazo, que contratará outros técnicos concursados para exercício desta atividade (vide fls. 334

a 380 dos autos do expediente anexo).

De outro lado, como se prova da consulta realizada no sítio eletrônico da Secretaria

Estadual de Meio Ambiente do Estado da Bahia, o Município de Valença continua apto ao

licenciamento ambiental, no nível 3, sendo sua a obrigação conceder licença ambiental para

empreendimentos e atividades de tal porte (não obstante a deficiência apontada na sua equipe

técnica) visto que o Estado somente poderia exercê-la com a declaração espontânea do

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Município-Acionado de sua incapacidade de fazê-lo e com a consequente ciência do ente

estadual do teor desta declaração. É o que evidencia a documentação de fl. 281 dos autos do

Inquérito Civil de número 597.0.82138/2012.

Referida situação foi objeto, inclusive, de uma Moção de Preocupação e Solicitação de

Providências apresentada ao Ministério Público pelo próprio Conselho Municipal de Defesa

do Meio Ambiente, que questiona a capacidade técnica do Município de Valença exercer a

atividade de licenciamento ambiental, contando, em seu quadro de funcionários, com apenas

uma única bióloga (vide fls. 381 a 383 dos autos do expediente ministerial).

Não se olvidam as dificuldades econômicas por que passam os entes públicos na atual

conjuntura do país, o que certamente dificulta a contratação, pelo Município-Acionado, de

técnicos concursados para exercício da atividade de licenciamento ambiental. Neste caso, é

perfeitamente possível que, até que se forme uma equipe interdisciplinar, como exige a lei,

que o Município declare sua incapacidade técnica para exercício da atividade, invocando o

ente estadual a atuar supletivamente neste setor, na forma prevista no ordenamento jurídico

vigente, conforme será demonstrado no tópico seguinte. O que não se pode admitir é que o

Réu, agindo contrariamente às regras jurídicas que tratam da matéria, declare-se capaz para

exercer a atividade de licenciamento com apenas uma bióloga no seu quadro de servidores.

Assim, alternativa não restou ao Ministério Público senão ingressar com a presente

ação visando resguardar o meio ambiente. Busca-se junto ao Poder Judiciário a determinação

para que o Município de Valença, ora acionado, proceda a adequação do seu Sistema

Municipal de Meio Ambiente, suspendendo até lá as ações de licenciamento e autorização

ambiental.

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II – DO DIREITO

A – DOS REQUISITOS MÍNIMOS PARA O EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES

DE LICENCIAMENTO E AUTORIZAÇÃO AMBIENTAL

Prescreve a Constituição Federal que é dever do Poder Público e da coletividade

defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado (art.225) e o licenciamento

ambiental mostra-se um importantíssimo instrumento para atingir tal objetivo.

É por meio dele que o Poder Público imporá condições e limites para o exercício de

atividades potencial ou efetivamente poluidoras, desde a concepção até o funcionamento do

empreendimento.

Sabemos que as atividades humanas dificilmente se desenvolvem sem a utilização de

recursos naturais e o escopo do licenciamento não é apenas adequá-las aos padrões ambientais

aceitos, mas também procurar evitar, diminuir ou compensar os seus impactos negativos.

A edição da Lei Complementar n.º 140/11 trouxe novos contornos e segurança jurídica

ao fixar normas para a cooperação entre os entes federativos, nos termos do art.23 da

Constituição Federal, especialmente para as questões relacionadas ao licenciamento

ambiental.

Foram definidas as atuações dos diversos entes federativos, sepulcrando as dúvidas

que existiam decorrentes da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) e da

Resolução nº 237/97 do CONAMA, principalmente no tocante ao reconhecimento de

atribuições municipais.

A LC nº 140/11 previu os empreendimentos e atividades que serão licenciados pela

União (art.7º, XIV), Estados (art.8º, inc.XIV e XV) e Municípios (art.9º, XIV), sendo

atribuídos aos últimos aqueles:

a) que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local,

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conforme tipologia definida pelos respectivos Conselhos Estaduais de Meio

Ambiente, considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da

atividade; ou

b) localizados em unidades de conservação instituídas pelo Município,

exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs)

No Estado da Bahia encontra-se em vigor a Resolução nº 4.327/13, do Conselho

Estadual de Meio Ambiente – CEPRAM, que dentre outros assuntos, dispõe sobre as

atividades de impacto local de competência dos Municípios (vide fls. 283 a 332 do expediente

ministerial anexo).

Para que o Município exerça as ações administrativas de licenciamento ambiental, nos

termos do art.4º da citada Resolução, deverá:

I – Possuir legislação própria que disponha sobre a política de meio

ambiente e sobre a polícia ambiental administrativa, que discipline as normas e

procedimentos do licenciamento e da fiscalização de empreendimentos ou

atividades de impacto local;

II – Ter implementado e estar em funcionamento o Conselho Municipal

de Meio Ambiente;

III – Possuir em sua estrutura administrativa órgão responsável com

capacidade administrativa e técnica interdisciplinar para o licenciamento,

controle e fiscalização das infrações ambientais das atividades e

empreendimentos e para a implementação das políticas de planejamento

territoriais;

Primeiramente, ao se exigir que o Município tenha legislação própria (inciso I), nada

mais foi feito senão observar o princípio da legalidade.

Ao tratar deste princípio, Maria Sylvia Zanella di Pietro claramente expôs que ele “(...)

nasceu com o Estado de Direito e constitui uma das principais garantias de respeito aos

direitos individuais. Isto porque a lei, ao mesmo tempo em que os define, estabelece também

os limites de atuação administrativa que tenha por objeto a restrição ao exercício de tais

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direitos em benefício da coletividade.” (Direito Administrativo, 17ª edição, Ed. Atlas, pg.67).

Nesse sentido, já havendo legislação própria que regulamenta a Política de Meio

Ambiente do Município-Acionado, o relatório analítico da Câmara Temática apenas apontou a

necessidade de cumpri-la e executá-la fielmente (vide fl. 269 dos autos do IC).

Também havendo Conselho Municipal de Meio Ambiente em Valença, o relatório

analítico citado indicou tão somente a necessidade de mantê-lo em funcionamento regular,

assegurando o seu caráter consultivo, normativo, recursal e deliberativo (neste último caso,

com destaque especial para apreciação dos processos de licenciamento ambiental).

Quanto à estrutura administrativa exigida no art.4º, inc. III, da Resolução CEPRAM n.º

4.327/13, o Município de Valença apresenta para o licenciamento uma única bióloga e, à

época da prestação das informações requisitadas pelo Ministério Público, para a fiscalização,

apenas um servidor. Somando-se aos bens e equipamentos informados, o relatório analítico

concluiu que o órgão ambiental não se caracteriza como capacitado.

O próprio inciso III fala em “equipe técnica interdisciplinar” para o licenciamento.

Como muito bem explicado na nota técnica nº 001/2014, da Câmara Temática de Sistema

Municipal de Meio Ambiente:

De tal modo, o Órgão Ambiental, de acordo com a sua demanda de

licenciamento, deve atentar que uma equipe multidisciplinar deve possuir

profissionais habilitados para o meio físico (abiótico), para o meio biológico

(biótico) e para o meio socioeconômico, bem como que os técnicos devem ser de

nível superior e não podem exercer atribuições que sejam privativas de outra

habilitação profissional, de tal forma que esta equipe tenha conhecimento e

habilitação equiparada para avaliar os estudos ambientais apresentados pelo

empreendedor, como mencionado no art.11 da Res. CONAMA 237/97 (vide

material do CD ROOM anexo).

Insta salientar que, como a norma jurídica que rege matéria exige que a equipe técnica

responsável pela atividade de licenciamento ambiental seja “interdisciplinar”, deve-se concluir

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que não basta apenas a incorporação ao quadro de servidores do Município de profissionais de

uma única área de conhecimento relacionada ao meio ambiente, mas sim de diversas

modalidades, a exemplo de engenharia, biologia, arquitetura, urbanismo, agronomia, direito,

sociologia, etc.

Neste caso, em observância ao princípio da razoabilidade, deve-se considerar que uma

equipe técnica, para atender as regras vigentes, deve ser composta por profissionais com

formação de nível superior ou de pós-graduação em áreas diversas de conhecimento

relacionadas à questão ambiental, para que se garanta a interdisciplinaridade e conhecimento

técnico exigidos pela norma jurídica ora sob análise.

Importante também frisar que tanto as atividades de licenciamento, quanto as de

fiscalização ambiental devem ser realizadas por servidores públicos concursados, como exige

a Constituição Federal vigente. Isso porque tais atividades são típicas do Poder Público, do

exercício do poder de polícia, devendo os atos que delas decorrem ser praticados por

servidores legalmente investidos nos seus cargos.

A respeito do assunto, o Supremo Tribunal Federal, na ADI 2310 MC, cujo relator foi

o Ministro Marco Aurélio, já firmou o entendimento que os agentes públicos responsáveis

pelo Poder de Polícia devem estar investidos em cargos públicos efetivos, já que “hão de

estar as decisões desses órgãos imunes a aspectos políticos, devendo fazer-se presente,

sempre o contorno técnico. (...) Prescindir, no caso, da ocupação de cargos públicos, com os

direitos e garantias a eles inerentes, é adotar flexibilidade incompatível com a natureza dos

serviços a serem prestados, igualizando os servidores das agências a prestadores de serviços

subalternos, dos quais não se exige, até mesmo, escolaridade maior, como são serventes,

artífices, mecanógrafos, entre outros. Atente-se para a espécie. Está-se diante de atividade na

qual o poder de fiscalização, o poder de polícia fazem-se com envergadura ímpar, exigindo,

por isso mesmo, que aquele que a desempenhe sinta-se seguro, atue sem receios outros, e isso

pressupõe a ocupação de cargo público, a estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição

Federal”.

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Vê-se, portanto, que o Município de Valença não está apto ao exercício das atividades

de licenciamento ambiental, eis que seu órgão ambiental não é tecnicamente capaz, tal como

exigido pelo ordenamento jurídico-constitucional para o exercício desta importante função.

Em conformidade com o art.15, da LC nº 140/11 o art.10, da Resolução CEPRAM nº

4.327/13 estabelece que a não capacidade municipal caracterizada pela inexistência e/ou

inaptidão de órgão ambiental capacitado ou de Conselho Municipal de Meio Ambiental, dará

ensejo à instauração da competência supletiva do Estado para o desempenho das ações

administrativas de licenciamento e da autorização ambiental.

Diante de tal quadro, o Município-Acionado deverá suspender imediatamente as ações

de licenciamento e comunicar o Estado da Bahia (art.10, §1º, da Resolução CEPRAM nº

4.327/13). Como já exposto, mesmo demonstrado que o Município de Valença não apresenta

capacidade para exercer as atividades de licenciamento e autorização ambiental, ainda não

houve a comunicação ao ente responsável para fins de atuação supletiva.

B) DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO MUNICÍPIO

A Lei Maior determina, em seu art.37, §6º, que as pessoas jurídicas de direito público

responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros.

Ainda no texto constitucional, o art.225, §3º, disciplina que “as condutas e atividades

consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a

sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos

causados”.

Assim, com base na Constituição, entende-se que a responsabilidade do Estado é

objetiva, na medida em que seus agentes, agindo nessa qualidade, responderão pelos danos

causados, independentemente da existência de dolo ou culpa, além do que um mesmo fato

danoso causado ao meio ambiente pode ensejar a responsabilização nas esferas cível, penal e

administrativa.

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A Lei Federal nº 6.938/81, em seu art.14, §1º, também previu a responsabilidade

objetiva daquele que causa dano ao meio ambiente, adotando, portanto a teoria do risco

integral. De acordo com essa teoria, o dever de reparar os prejuízos surge independentemente

da prova de culpa do agente, bastando a demonstração da existência do dano e do nexo causal

entre ele e a atividade exercida.

Nesta ordem de ideias, Juarez Freitas em obra coletiva1 entende que: “a

responsabilidade do Estado será objetiva caso (i) a sua conduta ilícita (na produção de atos ou

fatos jurídicos) faça deflagrar, no mundo fenomênico, uma situação causadora de lesão ao

patrimônio de terceiros; e, ainda, (ii) se o comportamento estatal comissivo ilícito causar dano

patrimonial a terceiros”.

Considerando a legislação acima citada e a situação do Município, pode-se considerar

que o ente federativo, no momento em que assumiu a responsabilidade de desenvolver a

atividade de licenciamento ambiental, para a qual não possui a infraestrutura adequada e

necessária, concedendo licenças ambientais para empreendimentos localizados em seu

território, assumiu os riscos da atividade, devendo, portanto, ser responsabilizado por tal

conduta.

Reforce-se que o Município, ao agir comissivamente de forma contrária às normas de

proteção ambiental, notadamente no que se refere aos princípios da prevenção e da precaução,

concedendo licenças de forma equivocada, se tornou corresponsável pelos danos ambientais

que possam ser causados pela atividade licenciada.

Outro aspecto que merece destaque é o fato de que o Município tem o dever de realizar

a atividade de fiscalização e monitoramento ambiental, isto é, o Estado está obrigado a exercer

o poder de polícia em relação a um determinado bem jurídico, no caso em tela o meio

ambiente.

A esse respeito, a Política Nacional de Meio Ambiente traz uma série de dispositivos

1FREITAS, Juarez (org.). Responsabilidade Civil do Estado. São Paulo:Malheiros, 2006, p.79.

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em que esse dever de fiscalizar do Estado se materializa, tais como o art.2º, caput e inciso III,

o art.6º, caput e inciso VI e o art.11, §§1º e 2º.

Da análise, portanto, de tais dispositivos, vê-se que há um dever do Estado, por meio

de seus órgãos e agentes, de fiscalizar o exercício de atividades que envolvam a utilização dos

recursos ambientais, de modo que o município não cumprindo este dever pode e deve ser

responsabilizado.

C) DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA

É sabido que a principal atitude a ser tomada por todos nós, de uma forma geral, é agir

preventivamente para evitar ou prevenir o dano ambiental quando pode ser antevisto. O

mesmo deve ocorrer quando há incerteza científica no desenvolvimento de certas atividades,

atitude que congrega o princípio da precaução.

A Declaração do Rio de Janeiro trouxe, em seu princípio 15, que “de modo a proteger

o meio ambiente, o princípio da precaução deve ser amplamente observado pelos Estados, de

acordo com suas capacidades. Quando houver ameaças de danos sérios ou irreversíveis, a

ausência de absoluta certeza científica não deve ser utilizada como razão para postergar

medidas eficazes e economicamente viáveis para prevenir a degradação ambiental”.

Paulo Affonso Leme Machado traz a acertada afirmação do italiano Sérgio Marchisiso

de que “o princípio da precaução emergiu nos últimos anos como um instrumento de política

ambiental baseado na inversão do ônus da prova: para não adotar medida preventiva ou

corretiva é necessário demonstrar que certa atividade não danifica seriamente o ambiente e

que essa atividade não causa dano irreversível” (Direito Ambiental Brasileiro, 21ª ed.,

Malheiros, p.117).

Cabe, então, ao suposto poluidor demonstrar que aquela atividade que lhe é creditada

não é impactante ou não causa qualquer impactação ao meio ambiente.

Na seara processual, o art.333 do CPC dispõe que o ônus da prova incumbe ao autor,

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quanto a fato constitutivo de seu direito, e ao réu, quanto à existência de fato impeditivo,

modificativo ou extintivo do direito do autor. Nada impede, porém, que a própria lei

determine uma mudança quanto ao ônus da prova, de forma taxativa ou mediante ato judicial.

Em se tratando de direitos transindividuais, vale lembrar que o CDC (Lei nº 8.078/90)

e a LACP (Lei nº 7.347/85) criaram um sistema próprio para regular os conflitos meta

individuais e devem ser interpretadas sempre conjuntamente.

O art.6º do CDC, por exemplo, dispõe que são direitos básicos do consumidor a

facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor,

no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele

hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências (inc.VIII).

O art.117 da Lei nº 8.078/90 (CDC) acrescentou à Lei n° 7.347/85 o seguinte

dispositivo, renumerando-se os seguintes: "Art.21. Aplicam-se à defesa dos direitos e

interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da

lei que instituiu o Código de Defesa do Consumidor".

O citado Título trata “Da Defesa do Consumidor em Juízo” e abrange os artigos 81 a

104 da Lei nº 8.078/90. No entanto, mesmo estando a regra da inversão do ônus da prova no

art.6º, VIII, como é ela de cunho eminentemente processual, deve ser também aplicada ao

direito ambiental.

Clóvis Eduardo Malinverni da Silveira, ao tratar do tema, corretamente argumentou

que “o referido título III concentra diversas disposições processuais de defesa do consumidor

em um só corpo. Contudo, outras disposições processuais não foram inseridas neste título III,

e sim em seções distintas: foi o método utilizado pelo legislador na busca de clareza,

objetividade e didática. O art.117 do CDC não fez referência ao título III com o intuito de

excluir as disposições esparsas, mas sim de evidenciar a questão da defesa processual do

consumidor em juízo” (Aspectos Processuais do Direito Ambiental, organizadores José

Rubens Morato Leite e Marcelo Buzaglo Dantas, 3ª ed., Forense Universitária, p.33).

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Nas demandas coletivas ambientais, o mesmo autor elenca as várias perspectivas da

hipossuficiência, podendo ser ela econômica, informativa e técnica. Todas são aplicadas aos

fatos ora em apuração, pois a Administração Municipal de Valença é a única que gere as suas

receitas e que detém (ou, ao menos, deveria deter) as informações detalhadas sobre as

atividades e empreendimentos desenvolvidos na cidade, inclusive sobre suas condições

técnicas.

A verossimilhança, por sua vez, também é facilmente verificada pela legislação de

regência e documentos juntados ao inquérito civil, que fartamente demonstram o desrespeito

aos termos das leis.

Dessa forma, visando restabelecer a isonomia de condições entre as partes em litígio,

reequilibrar a relação jurídica para suprir as suas desigualdades, cabe determinar a inversão do

ônus da prova tornando equivalentes as possibilidades de cada interessado em fazer valer seus

direitos.

A despeito de entendimentos diversos quanto ao momento processual de tal decisão,

defende-se que ela seja tomada logo no início do processo, a fim de se evitar qualquer

alegação posterior de prejuízo por parte do Acionado.

III – DAS LIMINARES

Preceituam os arts.798 e 799 do Código de Processo Civil que poderá o juiz

determinar as medidas provisórias que julgar adequadas, quando houver fundado receio de

que uma parte, antes do julgamento da lide, cause ao direito da outra lesão grave e de difícil

reparação. Para tanto poderá o juiz autorizar ou vedar a prática de determinados atos.

A Lei nº 7.347/85, em seu art.12, também prevê a possibilidade da concessão de

liminares nas demandas coletivas.

No presente feito, devem ser determinadas medidas que impeçam a continuidade das

ações de licenciamento e autorização ambiental pelo Município de Valença, ora acionado. Isso

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porque, principalmente pela falta de equipe técnica multidisciplinar capacitada, é

potencialmente maior a degradação ambiental pelo desenvolvimento de atividades e

empreendimentos.

Ressaltando a presença do periculum in mora, vale colacionar trecho da nota técnica nº

002/2012, quando afirma que “o instrumento do Licenciamento Ambiental visa preservar de

riscos potenciais ou efetivos a qualidade do meio e a saúde da população, riscos estes oriundos

de qualquer empreendimento ou intervenção que altere desfavoravelmente as condições do

ambiente” (fls.88).

Ademais, deve haver a comunicação formal pelo Acionado ao Estado, por meio da

Superintendência de Política e Planejamento Ambiental – SPA, na forma do art.15, II, da LC

nº 140/11 e art.10, §1º, da Resolução CEPRAM nº 4327/13, a fim de que exerça a sua atuação

supletiva.

A plausibilidade do direito, conforme exposto no item anterior, é evidenciado pelo

descumprimento da Lei Complementar nº 140/11 e da Resolução CEPRAM nº 4.327/13, bem

como da situação atual que se encontra o Sistema Municipal de Meio Ambiente de Valença,

demonstrada no relatório analítico de fls.222 a 271.

Ante a evidência de que lesões ambientais estejam sendo praticadas, não pode

permanecer inerte o Poder Judiciário, mormente considerando-se que, neste tema, o que se

pretende é a preservação ambiental e pelo fato de que os danos são, de uma maneira geral,

irreversíveis.

Tal medida deve vir acompanhada de uma penalidade cominatória caso não seja

observada, sendo então requerida a fixação de uma multa diária de R$1.000,00 (hum mil

reais), sem prejuízo da responsabilização pelo delito de desobediência.

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Rua Luís Eduardo Magalhães, 258, Jardim Grimaldi, Valença/BA - CEP 45.400-000Telefax (75) 3641-2172/6511 – E-mail [email protected]

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IV – DOS PEDIDOS:

Em face ao exposto, provada a necessidade de preservação do meio ambiente, e

juntando o inquérito civil nº 597.0.82138/2012, contendo XXX folhas, requer-se a Vossa

Excelência:

a) a deferimento da liminar, nos termos do item III da presente inicial, determinando-

se ao Município-Acionado que suspenda imediatamente a atividade de licenciamento e

autorização ambiental por ele exercida, e que, no prazo máximo de 48 H (quarenta e oito

horas), cientifique o Estado da Bahia, para que exerça atuação supletiva na matéria, nos

termos da legislação vigente;

b) a citação do Réu para, querendo, contestar a presente ação, no prazo legal, arcando,

caso contrário, com a declaração da revelia;

c) a produção de todos os meios de prova permitidos em Direito, especialmente prova

documental, pericial e testemunhal, cujo rol será apresentado dentro do prazo legal;

d) ao final do processo, seja condenado o Acionado a promover a regularização do seu

Sistema Municipal de Meio Ambiente, provendo a sua Secretaria Municipal de Meio

Ambiente com equipe técnica multidisciplinar, mediante concurso público, para atender as

demandas das ações administrativas de licenciamento e de fiscalização;

e) seja cominada multa diária em valor não inferior a R$ 1.000,00 (um mil reais), a ser

revertida em favor do Fundo Estadual de Recursos para o Meio Ambiente, em caso de

descumprimento de quaisquer das obrigações impostas ao Acionado por esse Juízo, em caráter

liminar ou definitivo; e

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e) dispensa de pagamento das custas processuais iniciais, uma vez que se trata de ação

proposta pelo Ministério Público.

Dá-se à causa o valor estimado de R$ 1.000,00 (um mil reais).

De Mata de São João para Valença/BA, 22 de setembro de 2015.

Oto Almeida Oliveira JúniorPromotor de Justiça – 2.o Substituto

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