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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 9.ª Promotoria de Justiça da Comarca de Natal __________________________________________________________________ ______________ EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DE UMA DAS VARAS DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DE NATAL, A QUEM ESTA COUBER POR DISTRIBUIÇÃO O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, por intermédio de sua 9ª Promotoria de Justiça, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 127 da Constituição Federal, artigo 67 da Lei Complementar Estadual nº 141/96 e artigo 3º da Lei Federal nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, na defesa das Crianças e Adolescentes com Deficiência da Comarca de Natal, vem, mui respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, promover a presente 1

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MINISTRIO PBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

9. Promotoria de Justia da Comarca de Natal________________________________________________________________________________EXCELENTSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DE UMA DAS VARAS DA INFNCIA E DA JUVENTUDE DA COMARCA DE NATAL, A QUEM ESTA COUBER POR DISTRIBUIOO MINISTRIO PBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE, por intermdio de sua 9 Promotoria de Justia, no uso das atribuies que lhe so conferidas pelo artigo 127 da Constituio Federal, artigo 67 da Lei Complementar Estadual n 141/96 e artigo 3 da Lei Federal n 7.853, de 24 de outubro de 1989, na defesa das Crianas e Adolescentes com Deficincia da Comarca de Natal, vem, mui respeitosamente, presena de Vossa Excelncia, promover a presente AO CIVIL PBLICA

contra o MUNICPIO DO NATAL, pessoa jurdica de direito pblico interno, com sede Rua Ulisses Caldas, n 81, Centro, nesta Capital, representado, nos termos do art. 12, II, do Cdigo de Processo Civil, pela sua Prefeita ou por seu Procurador Geral, com fulcro nos fundamentos de fato e de direito que passa a expor:

I - DOS FATOSO Ministrio Pblico do Estado do Rio Grande do Norte, por meio de sua 9 Promotoria de Justia, constatou, no mbito do Inqurito Civil n 108.01-09, que a ESCOLA MUNICIPAL NOSSA SENHORA DAS DORES, localizada na Rua Rio Potengi, n 3536, Quintas, nesta cidade, apresenta barreiras arquitetnicas que impedem o acesso, a circulao, a utilizao e a locomoo de pessoas com deficincia ou com mobilidade reduzida.

Colimando uma composio extrajudicial da lide, a Promotoria de Justia realizou vrias audincias, sem, contudo, lograr xito, relatando apenas o demandado a dificuldade de reformar um bem que no faz parte do domnio pblico, por ser alugado.

Em audincia realizada na data de 02/06/2011, no imo do PATAC n 013.06-09, o Secretrio Municipal de Educao afirmou que no tinha como cumprir termos de ajustamento de conduta outrora firmados com o Ministrio Pblico a respeito da acessibilidade em outras unidades de educao, em face da inexistncia de recursos.Em vista da evidente falta de interesse em cumprir a obrigao legal, revelada no referido procedimento, no foi designada nova audincia no bojo do Inqurito Civil n 108.01-09.Dessa forma, caracterizada a pretenso resistida, diante do tenaz desrespeito aos direitos das crianas e adolescentes com deficincia e mobilidade reduzida da Comarca de Natal, no restou alternativa a este rgo de Execuo seno a propositura da presente ao coletiva.

II NOTAS SOBRE LEGITIMIDADE DO MINISTRIO PBLICODispe o texto da Constituio Federal vigente que O Ministrio Pblico instituio permanente, essencial funo jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurdica, do regime democrtico e dos interesses sociais e individuais indisponveis.

Mais frente, a Magna Carta, em seu artigo 129, inciso III, cometeu ao Ministrio Pblico a funo de promover ao civil pblica, para a proteo de interesses difusos e coletivos, como um dos instrumentos para consecuo das suas finalidades institucionais, in litteris:

Art. 129. So funes institucionais do Ministrio Pblico:

(...)

III - promover o inqurito civil e a ao civil pblica, para a proteo do patrimnio pblico e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;A Lei n 7.347/85, no mesmo toar, prev a possibilidade de propositura de ao civil pblica para tutela de todo e qualquer interesse difuso ou coletivo (artigo 1, IV), bem assim a legitimidade do Ministrio Pblico para seu ajuizamento (artigo 5).

O artigo 3 da Lei n 7.853/89, por seu turno, cuidando especificamente da proteo aos interesses coletivos ou difusos das pessoas com deficincia, confere ao Ministrio Pblico a titularidade da ao civil pblica para tutela desses interesses, nos seguintes termos:

Art. 3 As aes civis pblicas destinadas proteo de interesses coletivos ou difusos das pessoas portadoras de deficincia podero ser propostas pelo Ministrio Pblico, pela Unio, Estados, Municpios e Distrito Federal; por associao constituda h mais de 1 (um) ano, nos termos da lei civil, autarquia, empresa pblica, fundao ou sociedade de economia mista que inclua, entre suas finalidades institucionais, a proteo das pessoas portadoras de deficincia.Assim, na medida em que se discute na presente actio matria que interessa coletividade indeterminada de crianas e adolescentes com deficincia, a legitimidade do Parquet inquestionvel, o que demanda o reconhecimento da sua pertinncia subjetiva para figurar no polo ativo da presente relao de direito processual.

III DO DIREITO DAS PESSOAS COM DEFICINCIA ACESSIBILIDADEO direito de ir e vir assegurado pela Constituio Federal de 1988 em seu art. 5, inciso XV, sem qualquer restrio quanto qualidade ou condio do destinatrio da norna, abrangendo, em seu ncleo essencial, o direito de permanncia e de deslocamento no territrio nacional.

Seguindo esse espectro protetivo do jus libertatis, o Poder Constituinte Originrio garantiu, por meio de norma de eficcia limitada definidora de princpio programtico, o direito de acesso das pessoas com deficincia aos logradouros e edifcios de uso coletivo,

Art. 227. Omissis. 2. A lei dispor sobre normas de construo de logradouros e dos edifcios de uso e de fabricao de veculos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado s pessoas portadoras de deficincia..

Art. 244. A lei dispor sobre a adaptao dos logradouros, dos edifcios de uso pblico e dos veculos de transporte coletivo atualmente existentes a fim de garantir acesso adequado s pessoas portadoras de deficincia, conforme disposto no art. 227, 2..Nesse mesmo sentido, a Conveno sobre os Direitos das Pessoas com Deficincia, com status de norma constitucional (aprovada pelo Congresso Nacional na forma do art. 5, 3, da Constituio Federal), estatuiu ainda, em seu art. 20, que Os Estados Partes tomaro medidas efetivas para assegurar s pessoas com deficincia sua mobilidade pessoal com a mxima independncia possvel.

Ainda nesse toar, a Conveno Interamericana para Eliminao de Todas as Formas de Discriminao Contra as Pessoas Portadoras de Deficincia, a qual possui status normativo supralegal (RE 466.343-SP, rel. Min. Cezar Peluso), estabeleceu ainda como obrigao dos Estados Partes Tomar as medidas de carter legislativo, social, educacional, trabalhista, ou de qualquer outra natureza, que sejam necessrias para eliminar a discriminao contra as pessoas portadoras de deficincia e proporcionar a sua plena integrao sociedade....

O legislador ptrio, atendendo determinao constitucional programtica, com esteio em seu poder de conformao (ausgestaltung), densificou o direito fundamental ao acesso universal por intermdio das Leis ns. 10.048/00 e 10.098/00, as quais foram regulamentadas pelo Decreto Federal n 5.296/04.

A Lei n 10.098/00, regulando o mbito normativo do direito fundamental, disps, em seu art. 11, que A construo, ampliao ou reforma de edifcios pblicos privados de uso coletivo devero ser executadas de modo que sejam ou se tornem acessveis s pessoas portadoras de deficincia ou com mobilidade reduzida.

Detalhando a preceito legal, no uso do poder regulamentar, o Chefe do Poder Executivo da Unio editou o Decreto Federal n 5.296/04, prescrevendo, em seu art. 24, que:Art.24.Os estabelecimentos de ensino de qualquer nvel, etapa ou modalidade, pblicos ou privados, proporcionaro condies de acesso e utilizao de todos os seus ambientes ou compartimentos para pessoas portadoras de deficincia ou com mobilidade reduzida, inclusive salas de aula, bibliotecas, auditrios, ginsios e instalaes desportivas, laboratrios, reas de lazer e sanitrios.

1oPara a concesso de autorizao de funcionamento, de abertura ou renovao de curso pelo Poder Pblico, o estabelecimento de ensino dever comprovar que:

I-est cumprindo as regras de acessibilidade arquitetnica, urbanstica e na comunicao e informao previstas nas normas tcnicas de acessibilidade da ABNT, na legislao especfica ou neste Decreto;

II-coloca disposio de professores, alunos, servidores e empregados portadores de deficincia ou com mobilidade reduzida ajudas tcnicas que permitam o acesso s atividades escolares e administrativas em igualdade de condies com as demais pessoas; e

III-seu ordenamento interno contm normas sobre o tratamento a ser dispensado a professores, alunos, servidores e empregados portadores de deficincia, com o objetivo de coibir e reprimir qualquer tipo de discriminao, bem como as respectivas sanes pelo descumprimento dessas normas.

2oAs edificaes de uso pblico e de uso coletivo referidas no caput, j existentes, tm, respectivamente, prazo de trinta e quarenta e oito meses, a contar da data de publicao deste Decreto, para garantir a acessibilidade de que trata este artigo. (Grifos acrescentados)Assim, as edificaes de uso pblico j construdas deveriam estar adaptadas desde a data de 02/06/2007, 30(trinta) meses aps a publicao do Decreto n 5.298/04.No caso concreto, a Escola Municipal Nossa Senhora das Dores enquadra-se no mbito semntico da expresso lingustica estabelecimento de ensino pblico, o que lhe impe, ipso facto, a obrigao legal de adequar-se s normas de acessibilidade, sob pena de patrocinar a excluso social, uma vez que, como lembram Duarte e Cohen, quando no so acessveis, os espaos agem como atores de um apartheid silencioso que acaba por gerar a conscincia de excluso da prpria sociedade.

Vale ressaltar, no ponto, que as normas contidas na Lei n. 10.098/2000 e no Decreto Federal 5.296/2004, segundo a dogmtica analtica, so imperativas, cogentes ou injuntivas, no dispondo o seu destinatrio de espao para escolha. Sobre outra perspectiva, as normas so preceptivas, pois impem uma obrigao (deontos: dever-ser), no caso, uma obrigao de fazer, consubstanciada na realizao de atos materiais que impliquem a total acessibilidade da edificao pblica.

Diante disso, no h alternativa ao destinatrio da norma: deve cumpri-la, sendo que, em caso de recalcitrncia, caracterizada a lide (conflito de interesses qualificado por uma pretenso resistida Carnelutti), deve ser compelido pelo Poder Judicirio a faz-lo, de modo autoritativo e em ltima instancia.

E no valem aqui escusas baseadas no fato de que o imvel alugado, tendo em vista que a lei no excepciona!Por tais razes, a presente pretenso deve ser julgada procedente, a fim de se determinar, por provimento jurisdicional de cunho mandamental, que o demandado, no prazo de 10 meses, torne completamente acessvel a edificao da Escola Municipal Nossa Senhora das Dores.IV - DO PEDIDODiante do exposto, requer o Ministrio Pblico a este nclito Juzo:

a) seja citada a parte r, por seu representante legal, para, querendo, contestar o pedido, no prazo legal;

b) seja julgada procedente a pretenso formulado na presente ao, com a consequente condenao do demandado em obrigao de fazer, consistente em proceder s reformas necessrias na edificao da Escola Municipal Nossa Senhora das Dores, no prazo mximo de 10 meses, de acordo com as normas tcnicas de acessibilidade, inclusive com a instalao da necessria sinalizao ttil e mobilirio acessvel, sob pena de multa diria no valor de R$ 10.000 (dez mil reais) por dia de atraso na efetivao das medidas, devendo esta importncia ser revertida, em caso de descumprimento, para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos; c) que as intimaes, quanto aos atos e termos processuais, sejam feitas de forma pessoal junto 9 Promotoria de Justia, com atribuies na defesa das pessoas com deficincia e idosos da Comarca de Natal/RN, situada na situada na Av. Floriano Peixoto, n550, Tirol; ed) a dispensa do pagamento de custas, emolumentos e outros encargos, desde logo, vista do disposto no artigo 18 da lei 7.347/85 e artigo 27 do Cdigo de Processo Civil;

Protesta-se provar o alegado por todos os meios de prova em direito admissveis, notadamente por documentos e percias.

Atribui-se causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Natal (RN), 22 de setembro de 2011.Flvio Henrique de Oliveira NbregaPromotor de Justia Substituto

SILVA, Jos Afonso da. Aplicabilidade das Normas Constitucionais. 7.ed. So Paulo: Malheiros, 2007.

Aprovada pelo Decreto Legislativo n 198/2001 e ratificada pelo Decreto n 3.956/2001.

Nesse mesmo sentido o artigo 1 da Lei Municipal n 4.090, de 03 de junho de 1992, dispe que obrigatria a adaptao dos edifcios e logradouros de uso pblico para acesso, circulao e utilizao das pessoas com deficincia, em conformidade com as normas oriundas da Associao Brasileira de Normas Tcnicas (ABNT).

In ORNSTEIN, Sheila Walbe, Org.; ALMEIDA PRADO, Adriana R. de, Org.; LOPES, Maria Elizabete, Org. Desenho Universal, caminhos da acessibilidade no Brasil. So Paulo: Annablume, 2010. Pg. 85.

FERRAZ JNIOR. Trcio Sampaio. Introduo ao Estudo do Direito. 3.ed. So Paulo: Atlas, 2001, p. 128.

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