Ácidos graxos poliinsaturados ômega

Embed Size (px)

Citation preview

cidos graxos poliinsaturados mega-3 e mega-6: importncia e ocorrncia em alimentosRESUMO Os cidos graxos poliinsaturados abrangem as famlias de cidos graxos mega-3 e mega-6. Os cidos graxos de cadeia muito longa, como os cidos araquidnico e docosaexaenico, desempenham importantes funes no desenvolvimento e funcionamento do crebro e da retina. Esse grupo de cidos graxos no pode ser obtido pela sntese de novo, mas pode ser sintetizado a partir dos cidos linolico e alfa-linolnico presentes na dieta. Neste artigo so considerados os principais fatores que podem inibir a atividade das enzimas dessaturases envolvidas na sntese dos cidos graxos de cadeia muito longa. So apresentadas as recomendaes da razo mega-6/mega-3 na dieta, propostas em diversos pases, sendo verificada a convergncia para o intervalo de 4 a 5:1. So relacionados alimentos que podem contribuir para aumentar a ingesto do cido alfa-linolnico e dos cidos graxos de cadeia muito longa. A essencialidade dos cidos graxos de cadeia muito longa muito dependente do metabolismo do indivduo, sendo que a razo n-6/n-3 da dieta exerce grande influncia nesse sentido.

INTRODUOOs componentes lipdicos, especialmente os cidos graxos, esto presentes nas mais diversas formas de vida, desempenhando importantes funes na estrutura das membranas celulares e nos processos metablicos. Em humanos, os cidos linolico (18:2n-6, AL) e alfa-linolnico (18:3n-3, AAL) so necessrios para manter sob condies normais, as membranas celulares, as funes cerebrais e a transmisso de impulsos nervosos. Esses cidos graxos tambm participam da transferncia do oxignio atmosfrico para o plasma sangneo, da sntese da hemoglobina e da diviso celular, sendo denominados essenciais por no serem sintetizados pelo organismo a partir dos cidos graxos provenientes da sntese de novo1,2. Em relao ao nmero de insaturaes, o AL e o AAL so denominados genericamente de cidos graxos poliinsaturados (AGPI), assim como outros cidos que apresentam duas ou mais insaturaes. Em relao ao tamanho da cadeia carbnica, os AGPI que possuem 18 ou mais tomos de carbono so denominados, por alguns autores, de cidos cadeia longa, no entanto no h consenso na literatura sobre essa denominao. Alguns autores consideram cidos graxos de cadeia longa aqueles que apresentam cadeia com nmero de tomos de carbono maior que 20 tomos1,3. Com o propsito de contribuir para o estabelecimento de uma nomenclatura que relacione as denominaes e siglas do tamanho da cadeia carbnica, sero considerados cidos graxos poliinsaturados de cadeia longa (AGPI-CL), os cidos que apresentam nmero de tomos de carbono maior que 16, conforme a terminologia geralmente adotada. Os cidos graxos poliinsaturados com cadeia carbnica maior que 20 tomos, sero denominados cidos graxos poliinsaturados de cadeia muita longa (AGPI-CML), tendo como base a terminologia que vem sendo empregada em artigos envolvendo o estudo dos cidos graxos e suas relaes com a nutrio humana4.

Os AGPI-CML das famlias n-6 e n-3, aqui descritos como AGPI-CML n-6 ou AGPICML n-3, respectivamente, tm sido alvo de inmeros estudos nas ltimas dcadas, os quais esclareceram muitas das suas funes no organismo humano e as reaes envolvidas na sua formao a partir dos cidos linolico e alfa-linolnico. Esses estudos, tambm tm destacado a importncia da ingesto dos AGPI-CML, na fase gestacional5,6, nos primeiros meses aps o nascimento5,7,8, na terceira idade2,9 e em diversas doenas1,2, principalmente degenerativas. Este artigo tem como objetivo analisar a importncia dos AGPI-CML na nutrio humana, considerando suas funes metablicas e os fatores que podem afetar a sua obteno a partir dos cidos graxos AL e AAL, reconhecidamente essenciais. So apresentadas as concentraes dos AGPI-CML, AL e AAL em diversos alimentos presentes na dieta do brasileiro, sendo tambm considerados os valores da razo entre os cidos graxos n-6 e n-3 que tm sido recomendados por diversos autores e rgos de sade. As famlias n-6 e n-3 As famlias n-6 e n-3 abrangem cidos graxos que apresentam insaturaes separadas apenas por um carbono metilnico, com a primeira insaturao no sexto e terceiro carbono, respectivamente, enumerado a partir do grupo metil terminal (Figura 1). A cadeia dos cidos graxos tambm enumerada a partir da carboxila, de acordo com a designao (delta), que mais aplicada ao estudar as reaes qumicas que envolvem esses cidos. Devido s diferenas fisiolgicas entre as famlias n-6 e n-3 e simplicidade da designao n, passou a ser mais apropriado empregar esta designao ao estudar aspectos nutricionais envolvendo os cidos graxos.

Os cidos graxos das famlias n-6 e n-3 so obtidos por meio da dieta ou produzidos pelo organismo a partir dos cidos linolico e alfa-linolnico, pela ao de enzimas alongase e dessaturase. As alongases atuam adicionando dois tomos de carbono parte inicial da cadeia, e as dessaturases agem oxidando dois carbonos da cadeia, originando uma dupla ligao com a configurao cis. No reino vegetal muito comum a sntese do cido linolico, ocorrendo tambm a sua converso em alfa-linolnico, pela ao de enzimas que originam dupla ligao

na posio 1510. Na classe dos mamferos tem sido isoladas e identificadas dessaturases capazes de introduzir duplas ligaes nas posies 5, 6 e 911,12. A 9 dessaturase atua, predominantemente, na sntese de cidos graxos monoinsaturados, tendo como principal substrato o cido esterico (18:0), que o precursor do cido olico (18:1 9). As enzimas 5 e 6 atuam na dessaturao de cidos graxos poliinsaturados (Figura 2), apresentando maior afinidade com os substratos mais insaturados, o que resulta em uma maior probabilidade da sntese dos AGPI-CL da famlia n-313.

Essas reaes ocorrem no retculo endo-plasmtico, predominantemente nas clulas hepticas, e tem sido aceito, por muitos anos, que a etapa final da sntese dos cidos docosahexaenico (22:6 n-3, ADH) e docosapentaenico (22:5 n-6, ADP) envolve a 4 dessaturase, que atua sobre os cidos 22:5 n-3 e 22:4 n-6. Embora sua existncia tenha sido reconhecida em algumas espcies vegetais e microorganismos14, a dificuldade em isolar e identificar essa enzima nos mamferos induziu busca por evidncias metablicas de outras etapas para explicar a produo do ADH (cido docosahexaenico) e ADP (cido docosapentaenico). Essas etapas envolvem ao das enzimas alongase e 6 dessaturase, levando formao dos cidos 24:6 n-3 e 24:5 n-6, que nos peroxissomos sofrem a remoo de dois tomos de carbono, denominada de -oxidao11,15.

Em crianas com anormalidades nos peroxissomos, que resultam na sndrome de Zellweger e em suas formas variantes, a reao de -oxidao no efetuada, o que impede a sntese do ADH. Nessa condio, a ingesto prolongada desse cido graxo tem-se mostrado eficiente para amenizar os sintomas relacionados com as funes visuais, hepticas, cerebrais e musculares16. Estudos recentes tm sugerido que a 6 dessaturase, envolvida na etapa final da sntese do ADH e ADP, corresponde mesma enzima 6 empregada na dessaturao dos cidos alfa-linolnico e linolico17,18. Assim, os fatores que influenciam a atividade dessa enzima tm um impacto ainda maior sobre a sntese do ADH e ADP. Tem sido verificado que a atividade das enzimas 6 e 5 dessaturase diminuda por fatores como tabagismo, consumo de lcool, diabetes, estresse, ingesto elevada de gorduras trans, e, principalmente, pelo envelhecimento. O estresse envolve a liberao de hormnios como as catecolaminas e os glucorticides, que inibem fortemente a 6 dessaturase19. No diabetes, a baixa quantidade de insulina inibe a 6 e a 5 dessaturases, pela modulao do RNA mensageiro dessas enzimas12. Estudos realizados com animais demonstraram que os cidos graxos trans monoinsaturados 18:1 3t, 18:1 4t, 18:1 7t e 18:1 15t exercem uma forte inibio sobre a atividade da 6 dessaturase, sendo que os ismeros 18:1 3t 18:1 9t, 18: 1 13te 18:1 15t so mais eficientes em inibir a 5 desaturase20. Considerando que as gorduras parcialmente hidrogenadas apresentam quantidades significativas dos ismeros 18:1 9t e 18:1 13t, a ingesto elevada dessas gorduras poder resultar em uma importante diminuio da atividade da enzima 521 dessaturase. Alm desses fatores, tem-se observado que a ingesto insuficiente de energia, protenas, zinco, magnsio, cobre e das vitaminas B3, B6 e C, contribui para limitar a converso dos cidos AL e ALA em AGPI-CML22,23. Em recm-nascidos tem sido verificado que as enzimas 5 e 6 dessaturases esto ativas, e mesmo bebs prematuros so capazes de produzir o cido araquidnico (20:4 n-6, AA) e o ADH24. Contudo, inmeros estudos tm mostrado que o leite humano apresenta os nveis mais elevados de AA e ADH nas primeiras semanas aps o parto, diminuindo a uma taxa que depende da presena desses cidos graxos na dieta materna25. Essa condio sugere que a quantidade de AA e ADH produzida pelo recm-nascido ainda insuficiente, sendo necessria a sua ingesto. Importncia dos cidos graxos de cadeia muito longa (AGPI-CML) O ADH (22:6n-3) tem importante funo na formao, desenvolvimento e funcionamento do crebro e da retina, sendo predominante na maioria das membranas celulares desses rgos. Na retina, encontra-se ligado aos fosfolipdios que esto associados rodopsina, uma protena que interage no processo de absoro da luz. Seu mecanismo de ao possivelmente est relacionado com o aumento na eficincia do processo de transduo da luz e com a regenerao da rodopsina. A diminuio dos nveis desse cido graxo nos tecidos da retina tem sido associada, em recm-nascidos, com anormalidades no desenvolvimento do sistema visual, e em adultos, com a diminuio da acuidade visual 26,27. Por ser altamente insaturado, o ADH atua influenciando as propriedades fsicas das membranas cerebrais, as caractersticas dos seus receptores, as interaes celulares e a atividade enzimtica2. Com o envelhecimento do indivduo, h um aumento do estresse oxidativo, que atua reduzindo os nveis do ADH e do AA no

crebro. Esse processo resulta em um aumento na proporo de colesterol no crebro e ocorre em maior intensidade nas doenas de Alzheimer, Parkinson e na esclerose lateral amiotrfica28. Em estudos efetuados com animais, observou-se que dietas deficientes em cidos graxos n-3 provocam o declnio da concentrao de ADH nos tecidos do crebro e da retina, elevando a quantidade de ADP. Esses resultados evidenciam que um alto grau de insaturao requerido no crebro, pois, na ausncia do ADH e de seus precursores, ocorre a sntese do AGPI-CL mais semelhante, o ADP29,30. O AA est fortemente relacionado com o desenvolvimento do crebro e da retina durante o perodo gestacional e os primeiros anos de vida. Embora seja encontrado no crebro em quantidades menores que o ADH, os fosfolipdios associados aos neurnios so altamente enriquecidos com este cido graxo, o que tem sugerido o seu envolvimento na transmisso sinptica1,31. Pela ao das fosfolipases, estimulada por neurotrasmissores e neuromoduladores, o AA obtido na forma de cido graxo livre. Nessa forma, o AA permanece por um curto espao de tempo, podendo alterar a atividade dos canais inicos e das protenas quinases 32. Os cidos araquidnico, di-homo-gama-linolico (20:3 n-6, ADGL), e eicosapentaenico (20:5 n-3, AEP) so precursores dos prostanides das sries 1, 2 e 3 e dos leucotrienos das sries 4, 5 e 6, respectivamente (Figura 2). Os prostanides so obtidos pela enzima cicloxigenase, que converte esses cidos graxos livres em endoperxidos cclicos, originando as prostaglandinas (PG) e tromboxanos (TXA). Os leucotrienos (LT) so obtidos pela ao da enzima lipoxigenase, que tambm est relacionada com a produo das lipoxinas1,9. Tanto os prostanides como os leucotrienos agem de forma autcrina e parcrina, influenciando inmeras funes celulares que controlam mecanismos fisiolgicos e patolgicos no organismo33. Entre os prostanides, a maior afinidade do AA pela ciclo-oxigenase resulta em uma maior probabilidade de obteno das prostaglandinas e tromboxanos da srie 2. A essa srie pertencem o tromboxano A 2 e as prosta-glandinas E2 e I2, que participam de inmeros processos inflamatrios no organismo. Contudo, os seus correspondentes da srie n-3 possuem propriedades anti-inflamatrias. Em funo dessas diferenas fisiolgicas tem-se proposto que a produo excessiva de prostanides da srie 2 est relacionada com a ocorrncia de desordens imunolgicas, doenas cardiovasculares e inflamatrias, sendo recomendado aumentar a ingesto de cidos graxos n-3 para elevar a produo de prostanides da srie 334. A razo entre os cidos graxos n-6 e n-3 Os cidos graxos das famlias n-6 e n-3 competem pelas enzimas envolvidas nas reaes de dessaturao e alongamento da cadeia. Embora essas enzimas tenham maior afinidade pelos cidos da famlia n-3, a converso do cido alfa-linolnico em AGPI-CL fortemente influenciada pelos nveis de cido linolico na dieta 35. Assim, a razo entre a ingesto diria de alimentos fontes de cidos graxos n-6 e n-3 assume grande importncia na nutrio humana, resultando em vrias recomendaes que tm sido estabelecidas por autores e rgos de sade, em diferentes pases. Os valores relacionados na Tabela 1 evidenciam a tendncia de convergncia da razo entre os cidos graxos n-6 e n-3 para o intervalo de 4:1 a 5:1. As razes de 2:1 a 3:1 tm sido recomendadas por alguns autores, por possibilitar uma maior converso do cido alfa-linolnico em ADH, que alcana o seu valor mximo em torno de 2,3:1, conforme demonstrado por Masters36. Assim, as razes entre 2:1 e

4:1 tm maior importncia para pessoas com hbitos alimentares que resultam em uma baixa ingesto de AEP e ADH. Por outro lado, dietas baseadas em razes n6/n-3 inferiores a 1:1 no so recomendadas, por inibirem a transformao do cido linolico em AGPI-CML.

Estudos cinticos efetuados em humanos, que foram submetidos a dietas com razes n-6/ n-3 entre 6:1 e 8:1, demonstraram que a converso do cido alfalinolnico em AEP e ADH varia de 8% a 21% e de 0% a 9%, respectivamente, sendo observado um nvel maior de converso nas mulheres 35,44,45. Essa diferena tem sido atribuda possvel influncia do estrognio sobre a atividade das enzimas dessaturases45. Estima-se que a razo n-6/n-3 na dieta das pessoas que viveram no perodo que antecedeu a industrializao, estava em torno de 1:1 a 2:1, devido ao consumo abundante de vegetais e de alimentos de origem marinha, contendo cidos graxos n-3. Com a industrializao, ocorreu um aumento progressivo dessa razo, devido, principalmente, produo de leos refinados oriundos de espcies oleaginosas com alto teor de AL e diminuio da ingesto de frutas e verduras, resultando em dietas com quantidades inadequadas de cidos graxos n-3. Nas ltimas dcadas tem-se determinado, em diversos pases, que a ingesto mdia de cidos graxos resulta em relaes n-6/n-3 que esto entre 10:1 a 20:1, ocorrendo registros de at 50:146,47. A necessidade de diminuir a razo n-6/ n-3 nas dietas modernas tambm tem sido sugerida pelos resultados de alguns estudos clnicos realizados na ltima dcada. Entre esses destacam-se: a diminuio de 70% na taxa de mortalidade em pacientes com doena cardiovascular, quando a razo AL/AAL na dieta foi de 4:1; a reduo nas inflamaes decorrentes da artrite reumatide, quando a razo n-6/n3 da dieta esteve entre 3 a 4:1, condio que foi alcanada pela suplementao com AEP, ADH e AAL; a diminuio dos sintomas decorrentes da asma, quando a razo n-6/n-3 da dieta esteve ao redor de 5:1, sendo que em 10:1 os sintomas foram intensificados48-50. Ocorrncia de AGPI em alimentos

Os cidos linolico e alfa-linolnico esto presentes tanto em espcies vegetais como animais empregados na alimentao humana. Nas hortalias, o cido alfalinolnico encontrado em maior quantidade em espcies com folhas de colorao verde-escura, por ser um importante componente da frao dos lipdios polares contidos nos cloroplastos47. Tambm ocorre em alguns cereais e leguminosas, sendo a sua concentrao muito dependente da espcie e de fatores sazonais 41. No reino vegetal, os AGPI-CML so encontrados em plantas inferiores, que se desenvolvem principalmente em ambientes aquticos marinhos47. A Tabela 2 apresenta as concentraes dos cidos linolico e alfa-linolnico em alimentos de origem vegetal. Embora as hortalias apresentem pequenas quantidades do cido alfa-linolnico, devido ao seu baixo contedo lipdico, o consumo de vegetais, como o agrio, a couve, a alface, o espinafre e o brcolis, pode contribuir para elevar a sua ingesto, principalmente em dietas vegetarianas. Entre os cereais e as leguminosas, a aveia, o arroz, o feijo, a ervilha e a soja, constituem importantes fontes desse cido. Nos leos vegetais, a maior concentrao do cido alfa-linolnico ocorre no leo de linhaa, sendo que os leos de canola e soja tambm apresentam concentraes significativas. O cido alfa-linolnico e os AGPI-CML esto presentes em alimentos de origem animal, como peixes e aves, sendo as suas quantidades muito dependentes da dieta a que esses animais foram submetidos46,47. Assim, inmeros estudos tm sido conduzidos com o objetivo de estabelecer as quantidades mais apropriadas para a incorporao do cido alfa-linolnico nas raes dos animais, que possibilitem o aumento da sua converso enzimtica para AGPI-CML, resultando em maiores quantidades de AEP e ADH nos alimentos provenientes desses animais. A Tabela 3 relaciona as quantidades de AL, AAL, AA, AEP e ADH em alimentos de origem animal. Entre os peixes, os de origem marinha, como a sardinha e o salmo, geralmente apresentam quantidades maiores de AEP e ADH que os peixes oriundos de guas continentais. Isso ocorre, devido expressiva quantidade desses cidos graxos no fitoplncton, que prov a sua distribuio ao longo da cadeia alimentar marinha. Nos alimentos provenientes de animais terrestres, que no foram submetidos a dietas com fontes adicionais de AAL, geralmente no se observa a presena de AEP e ADH. Contudo, alguns desses alimentos so fontes de AA.

CONSIDERAES FINAISEmbora o organismo humano seja capaz de produzir cidos graxos de cadeia muito longa (AGPI-CML), a partir dos cidos linolico (AL) e alfa-linolnico (AAL) a sua sntese afetada por diversos fatores, que podem tornar a ingesto desses cidos graxos essencial para a manuteno de uma condio saudvel. A razo n-6/n-3 da dieta tem grande influncia sobre a produo de AGPI-CML da famlia n-3, sendo que razes elevadas resultam na diminuio da produo do cido eicosapentaenico (AEP), condio que contribui para o desenvolvimento de doenas alrgicas, inflamatrias e cardiovasculares. Assim, preciso efetuar estudos que permitam estimar a razo n-6/n-3 na dieta da populao brasileira. O crescente estudo sobre os processos metablicos, que resultam na produo de inmeros derivados dos AGPI-CML, ampliar a compreenso das funes desses cidos graxos no organismo, intensificando o conceito da sua essencialidade. Nos prximos anos, certamente, estar disponvel para o consumidor um nmero cada vez maior de alimentos contendo AGPI-CML. Para os alimentos de origem vegetal,

isso poder ser alcanado por meio de alteraes genticas em espcies oleaginosas, que resultaro na biossntese desses cidos graxos. Alm disso, preciso diminuir a ingesto diria de AL para possibilitar o aumento da produo de AGPI-CML n-3 no organismo, pois o excesso de AGPI-CML n-6 aumenta a formao de prostanides da srie 2, condio, que desfavorvel ao organismo.

cidos graxos trans: doenas cardiovasculares e sade materno-infantil1Este estudo rev a literatura sobre o tema nas ltimas dcadas, destacando seu efeito no metabolismo humano quanto s doenas coronarianas e sade materno-infantil. Recentemente, os cidos graxos trans foram includos entre os fatores dietticos de risco para doenas cardiovasculares. Discute-se ainda sua relao com o processo de crescimento e desenvolvimento da criana desde a fase fetal e perodo gestacional. Os trans originam-se dos cidos graxos insaturados no processo de hidrogenao e bio-hidrogenao, apresentando ao diferenciada destes. Diversas pesquisas ressaltam seu efeito hipercolesterolmico e o bloqueio e inibio da biossntese de cidos graxos essenciais. Estas aes tm repercusses na sade materno-infantil e elevam o risco de doenas cardiovasculares. Recomenda-se a reduo do consumo de alimentos que contenham gordura hidrogenada, adotando os limites de 2% a 5% de gorduras trans/energia totais, j empregados em outros pases.

INTRODUO Os efeitos adversos dos ismeros trans na sade humana tm sido objeto de diversos estudos nas ltimas dcadas, associando-os s doenas cardiovasculares (DCV), ao processo de crescimento e desenvolvimento da criana e fase gestacional. As contradies nos resultados das pesquisas que os correlacionaramcom as doenas cardiovasculares contriburam para o surgimento, em 1995, de um consolidado do International Life Sciences Institute (International..., 1995), concluindo haver poucas evidncias de associao entre o consumo de cidos graxos trans e o aumento do risco destas doenas. No entanto, a Organizao Mundial da Sade (OMS), ainda em 1995, posicionou-se reconhecendo a relao entre cidos graxos trans e doenas coronarianas (World..., 1995), enquanto, em 1996, o mesmo International Life Sciences Institute, atravs da equipe Task Force on Trans Fatty Acids, baseada em diversos trabalhos apresentando associao entre trans e DCV, passou a reconhecer os trans como importante fator de risco para as DCV (American Society...,1996). Estudos sobre a associao entre os cidos graxos trans e a sade materno-infantil ainda so escassos em humanos, predominando em animais. Todavia, algumas pesquisas levantam hipteses sobre a possvel relao, enquanto outros apontam efeitos deletrios sobre o processo de crescimento e desenvolvimento, alm de interferncia no perodo gestacional (Carlson et al., 1997). No presente estudo, so revistas as publicaes que abordam as caractersticas bsicas dos cidos graxos trans e sua ao no organismo humano em relao s doenas coronarianas e sade materno-infantil, observando-se ainda as recomendaes de consumo adotadas em outros pases.

Foram consultados a base de dados do Medline correspondente ao perodo 1980-2000 e anais de seminrios e congressos durante a dcada de 90. Caractersticas bsicas dos cidos graxos trans A maior parte dos cidos graxos insaturados presentes nos alimentos existe na forma cis, significando que os hidrognios esto do mesmo lado da dupla ligao. Os cidos graxos trans formados a partir dos insaturados apresentam inverso na dupla ligao, colocando o hidrognio na posio transversal e provocando a linearizao da cadeia (Harper, 1994). Ao contrrio dos ismeros cis, os trans sopraticamente inexistentes em leos e gorduras de origem vegetal no-refinados. No entanto, pequeninas pores de ismeros trans podem ser formadas durante reaes qumicas, como a oxidao que ocorre durante a extrao, refinao e armazenamento dos leos vegetais (Geuking, 1995). Os cidos graxos trans, tambm denominados gorduras trans, no so sintetizados no organismo humano e resultam de processo natural de bio-hidrogenao ou de processo industrial de hidrogenao parcial ou total de leos vegetais ou marinhos. A biohidrogenao representa pequena contribuio adicional ao consumo e ocorre por digesto de gorduras ingeridas por animais ruminantes poligstricos, sendo conseqente da ao de enzimas do rmen (Geuking, 1995). No processo de hidrogenao, os cidos graxos trans originam-se da mistura de hidrognio aos leos insaturados, sob temperatura apropriada e com a presena de elemento catalisador o qual posteriormente retirado. A quantidade de trans formada na hidrogenao pode ser controlada pelo catalisador e pela temperatura (Geuking, 1995). As finalidades desse processo so conferir ponto de fuso mais elevado aos leos vegetais, prover maior estabilidade oxidao lipdica e reduzir o tempo de cozimento (Okonek et al., 1996). Os trans tm maior ponto de fuso que seus equivalentes cis. O ponto de fuso das gorduras insaturadas sempre inferior ao das saturadas e trans (Aro et al., 1997). O ponto de fuso do cido graxo olico de 13C, enquanto o de seu ismero trans, o cido graxo eladico, de 44C. Essa diferena tem sido atribuda orientao linear das molculas nos ismeros trans (Jones & Kubow, 2000). Os cidos graxos trans apresentam diversas configuraes em virtude da localizao onde ocorre a isomerizao, podendo estar na forma trans-cis (t,c), cis-trans (c,t) ou trans-trans (t,t). A apresentao da posio dos diferentes tipos de ismeros na cadeia carbnica pode ser expressa colocando-se primeiramente o comprimento da cadeia de carbono, seguido das informaes sobre a posio da dupla ligao e isomerizao (C 18:2 9c 12t) (Greyt et al., 1996). O metabolismo dos trans tem sido estudado e os resultados demonstram controvrsias quanto sua semelhana com os cidos graxos insaturados ou saturados. Debates ainda existem sobre as diferenas entre os trans originados de cidos graxos monoinsaturados e poliinsaturados. No entanto, acredita-se que os trans, embora apresentem duplas ligaes em suas estruturas como os insaturados, revelam metabolismo semelhante aos saturados (Booyens & Merwe, 1992; Judd et al., 1994; Mensink & Hornstra, 1995).

Os ismeros trans so digeridos, absorvidos e incorporados pelo organismo humano de forma similar aos cidos graxos com ismeros cis, no apresentando, entretanto, atividade como cidos graxos essenciais (Khosla & Hayes, 1996). Os ismeros cis so mais rapidamente metabolizados como fonte de energia que os trans, e so preferencialmente incorporados em fosfolipdios estruturais e funcionais. Em humanos a incorporao dos trans nos tecidos depende da quantidade ingerida, do tempo consumindo alimentos com esse tipo de gordura, da quantidade de cidos graxos essenciais consumida, do tipo de tecido e do tipo de ismero (configurao e posio da dupla ligao na cadeia) (Geuking, 1995). Os teores encontrados em tecidos adiposos refletem o consumo por longo perodo de tempo, apresentando normalmente correlao com relato de ingesto por mais de um ano (Garland et al., 1998). cidos graxos trans e doenas coronarianas O principal efeito metablico dos cidos graxos trans em relao s doenas coronarianas refere-se sua ao hipercolesterolmica, elevando o colesterol total e a lipoprotena de baixa densidade (LDL-c), reduzindo a lipoprotena de alta densidade (HDL-c) e resultando em significativo aumento na relao da LDL-c/HDL-c. Alguns autores consideram essa relao como o prognstico mais importante para DCV quanto aos nveis de lipdios plasmticos (Willett & Ascherio, 1995). Sugere-se que o efeito redutor dos trans sobre HDL-c se passe atravs da transferncia de steres de colesterol de HDL-c para LDL-c (Khosla & Hayes, 1996). Uma das aes dos lipdios trans relacionadas ao aumento de LDL-c refere-se supresso da atividade do LDL-receptor (Jones & Kubol, 2000). As LDL-c so resultantes do catabolismo de lipoprotenas de muito baixa densidade (VLDL) que contm apolipoprotena b (apo-b). Atravs da apo-b o LDL-receptor capta a LDL-c, removendo-a da circulao via heptica. Variaes mnimas de LDL-receptor no fgado afetam os nveis plasmticos de LDL-c. Assim, quando os nveis do LDL-receptor esto baixos por ao de nutrientes ou efeito gentico, ir ocorrer maior acmulo de LDL-c no plasma, elevando o risco de doena arterial coronariana (DAC) (Semenkovich, 2000). Lipdios da dieta podem tambm afetar a secreo de apo-b, contribuindo para o surgimento de hiperlipidemia (Aro et al., 1997). Acredita-se que aps os 20 anos o mecanismo de regulao de LDL-receptor diminui sua eficincia, afetando os nveis de LDL-c plasmticos. No entanto, esse processo provavelmente no progride aps os 50 anos. Isto sugere que, aps esta fase, os fatores externos podem desempenhar importante funo para o controle dos nveis sricos de colesterol. A atividade de LDL-receptor tambm diminui em mulheres aps a menopausa, em conseqncia da queda de produo de estrognio(Grundy, 2000). Outro aspecto relevante quanto ao efeito desse tipo de gordura sobre os nveis de LDL-c refere-se ao competitiva entre os cidos graxos trans e os poliinsaturados. Estes atuam elevando o nmero de receptores de LDL-c e aqueles interferem no metabolismo de cidos graxos poliinsaturados, atuando sobre a enzima dessaturase, a qual age no metabolismo do cidos graxos essenciais, constituindo-se em bloqueadores e inibidores na sntese dos cidos graxos essenciais de cadeia longa (Dupont, 1991).

Dietas ricas em competidores e moderadores de cidos graxos essenciais podem produzir mudanas na produo e formao de prostaglandinas e tromboxanos (eicosanides), que tm como precursores os cidos graxos poliinsaturados com cadeias acima de 20 carbonos. Esses efeitos no acontecem se a quantidade de cidos graxos essenciais for ingerida adequadamente. A ao dos trans sobre os poliinsaturados tambm ocorre por substituio destes nos tecidos (Jones & Kubow, 2000). Os eicosanides modulam a funo de muitas clulas cardiovasculares. Os tromboxanos facilitam a agregao plaquetria, enquanto as prostaglandinas atuam inversamente. O balano entre tromboxanos e prostaglandinas tem sido considerado importante para a adequada funo cardiovascular. Na aterosclerose, doena cardiovascular com maior ocorrncia em todo o mundo, ocorre a formao de placa fibrogordurosa (ateroma), resultante de agregao plaquetria (Harper, 1994). Alguns estudos levantaram a hiptese de que os trans elevam o nvel de lipoprotena (a), que afetada por poucos componentes da dieta, alm de contribuir para o aumento dos triglicerdeos. Todavia, desconhecem-se os processos metablicos causadores de tais efeitos (Katan, 1998). cidos graxos trans e sade materno-infantil Diversos estudos vm abordando a relao entre consumo de cidos graxos e a fase gestacional, sugerindo-se que os trans so transferidos ao feto atravs da placenta. Para Honstra (2000), deve haver prudncia quanto a considerar-se a associao entre estes fatores, pois as evidncias ainda so insuficientes. Koletzko e Mller (1990) encontraram teores de trans no plasma materno diretamente proporcionais aos do cordo umbilical. Essa quantidade elevada de trans, quando comparada aos teores encontrados em outros tecidos, pode ser conseqente do tipo de tecido do cordo umbilical, que apresenta maior concentrao de lipdios, levando maior incorporao de trans. Entre as pesquisas voltadas para a anlise da ao dos ismeros trans sobre a sade da criana, encontrou-se como relato comum o bloqueio e inibio na biossntese dos cidos graxos poliinsaturados de cadeia longa, na fase fetal e aps o nascimento (Koletzko, 1992). O estudo de Koletzko & Mller (1990) demonstrou correlao inversamente proporcional e significativa (r = -0,47 e p