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BIBLIOTECA PIONEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS PSICOLOGIA Aconselhamento Psicológico & Psicoterapia Auto-afirmação - um determinante básico OSWALDO DE BARROS SANTOS Conselho Diretor: Anita de Castilho e Marcondes Cabral Nelson Rosamilha Oswaldo de Barros Santos In memorian: Dante Moreira Leite LIVRARIA PIONEIRA EDITORA São Paulo Capa: Jairo Porfírio 1982 Todos os direitos reservados por ENLO MATHEUS GUAZZELLI & CIA. LIDA. 02515 - Praça Dirceu de Lima, 313 Telefone: 266-0926 - São Paulo índice Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

ACONSELHAMENTO PSICOLÓGICO E PSICOTERAPIA

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BIBLIOTECA PIONEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS

PSICOLOGIA

Aconselhamento Psicológico & Psicoterapia

Auto-afirmação - um determinante básico

OSWALDO DE BARROS SANTOS

Conselho Diretor:Anita de Castilho e Marcondes Cabral

Nelson Rosamilha

Oswaldo de Barros Santos

In memorian:Dante Moreira Leite

LIVRARIA PIONEIRA EDITORA São Paulo

Capa:Jairo Porfírio

1982

Todos os direitos reservados porENLO MATHEUS GUAZZELLI & CIA. LIDA. 02515 - Praça Dirceu de Lima,

313 Telefone: 266-0926 - São Paulo

índice

Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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PARTE I VISÃO GLOBAL DOS PROCEDIMENTOS ORIENTADORES ETERAPÊUTICOS

1. Diagnóstico, Orientação, Aconselhamento e Psicoterapia .. . . . . . . . . . . .

O longo caminho: do diagnóstico para a assistência psicológica. O uso detestes psicológicos. Orientação, aconselhamento e psicoterapia.

2. Métodos Centrados no Contexto Sócio-Cultural. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Fundamentos. Procedimentos comuns. Técnicas específicas.

3. Procedimentos Centrados no Contexto Pessoal. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Fundamentos. Procedimentos comuns. Técnicas específicas.

4. Métodos Mistos e Métodos Centrados no Problema. " . . . . . . . . . . . . . .

Fundamentos. Procedimentos comuns. Técnicas específicas.Aconselhamento e terapia em processos de grupo.

5. A Revolução Rogeriana no Campo do Aconselhamento Psicológico e daPsicoterapia . . .

Síntese histórica. Idéias básicas e originais. As condições terapêuticas essenciais. Evolução das idéias: o experienciar e as atuações em grupo.

PARTE 11 OBSERVAÇÕES PESSOAIS

6. Hipótese Sobre a Auto-Afirmação Como Determinante Básico do Comportamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Resultados de terapia e fundamentos para uma nova hipótese. Seria possível um neo-rogerianismo? A motivação e os determinantes do comportamento. A auto-afirmação como motivo básico e emocionalmente preponderante.

7. A Personalidade e a Auto-Afirmação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

O Eu Pessoal, o Eu Social e a emergência da auto-afirmação. A ocorrência patológica. Neurose e significado da vida. Valores sociais e a auto-afirmação. Perspectivas humanísticas e filosóficas.

8. Contribuições à Terapia Psicológica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..

Objetivos básicos: desenvolvimento pessoal e psicoterapia. Metodologia

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psicoterápica: a dinâmica do processo.

PARTE IIIAPLICAÇÕES EM SITUAÇÕES ESPECIAIS

9. Filhos e Alunos Difíceis. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Como ocorrem os problemas. Medidas gerais.

10. Ações Preventivas na Educação, na Família e no Trabalho. . . . . . . . . . . ..

11. A Vida na sua Terceira Fase: a Valorização do Idoso. . . . . . . . . . . . . . . .

Técnicas de orientação e psicoterapia

Referências bibliográficas. . . . . ., . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . ..English-abstract . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Introdução

Os métodos, técnicas ou modelos de atuação, originários de atitudes naturais ou de comportamentos direcionados, freqüentemente usados para ajudar as pessoas com problemas psicológicos, são extremamente variados; dependem de concepções filosóficas e sociais, como, igualmente, dos recursos situacionais, profissionais, éticos e operacionais. Ademais, as ciências do comportamento colocam dúvidas e interrogações sobre os efeitos dos procedimentos orientadores ou terapêuticos em virtude de pesquisas pouco elucidativas.

Os conceitos e as indicações ou lembretes existentes neste livro resultam, de um lado, de informações bibliográficas e, de outro, de observações e inferências pessoais que, em muitos anos, logramos realizar. É uma ligeira coletânea de posições teóricas e da metodologia correspondente, seguida de uma hipótese sobre a auto-afirmação como determinante básico do comportamento e, em conseqüência, de procedimentos e técnicas terapêuticas.

Todas as considerações, sugestões e hipóteses estão francamente abertas à

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crítica de todos aqueles que se dedicam ao estudo ou à aplicação prática do aconselhamento psicológico e da psicoterapia, seja na situação natural e espontânea dos relacionamentos humanos, seja na situação profissional. O que se pretende é colocar nossas observações - ainda que falhas ou limitadas - a serviço desses alvos. Serão especialmente acolhidas as apreciações e contribuições relacionadas com a proposição original, isto é, com a hipótese de ser a auto-afirmação o determinante básico do comportamento no plano psicológico.

Agradeço a meus alunos e ex-alunos da Universidade de São Paulo peloincentivo e pistas que me ofereceram e aos clientes que _e proporcionaram o mais,fecundo material para estudos e conclusões. Agradeço, também, às psicólogasAlice Maria de Carvalho Delitti e Walderez B.F. Bittencourt pela gentileza em rever ecomentar o texto do capítulo 4, oferecendo úteis contribuições.

O.B.S.

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PARTE I

VISÃO GLOBAL DOS PROCEDIMENTOS ORIENTADORES ETERAPÊUTICOS

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1 - Diagnóstico, Orientação, Aconselhamento e Psicoterapia

O longo caminho: do diagnóstico para a assistência psicológica

Poucos terão definido tão bem a evolução da Psicologia no plano operacional, como Rogers (1942) o fez ao examinar sua contribuição ao bem-estar e à assistência que dela se poderia esperar. Disse o fundador do método centrado na pessoa que, na década de 1920, o interesse pelo ajustamento do indivíduo era essencialmente de estilo analítico e de diagnóstico. "Floresceram os estudos de casos, os testes, os registros e observações e os rótulos de diagnóstico psiquiátrico. Com o tempo, essa tendência voltou-se da diagnose para a terapia, para a procura de meios e de processos pelos quais o indivíduo encontre a ajuda de que necessita. Atualmente, preocupamo-nos mais com a descoberta de recursos terapêuticos mais efetivos na assistência ao indivíduo. A dinâmica do processo de ajustamento substitui a longa fase de descrições e rotulações".

Realmente, se nos detivermos no estudo das teorias e das técnicas psicológicas, parece ser possível inferir que a maioria dos trabalhos psicológicos era orientada mais no sentido de conhecer a personalidade do que em intervir no complexo enredo do comportamento humano. As técnicas de diagnóstico tiveram seu apogeu nos anos de 1920 a 1960. A psicometria e os estudos estatísticos relacionados com a sensibilidade, a precisão e a validade dos instrumentos de avaliação psicológica desenvolveram-se de forma sensível dando origem, inclusive, a um conjunto de normas publicadas, em 1954, pela American Psychological Association, conseqüência natural do crescente interesse pelos pormenores sobre os métodos de construção e de aferição de testes. A classificação de reações ou de sintomas e o relacionamento de traços e de fatores da personalidade era a tendência dominante. E a psicologia, como estudo e avaliação do comportamento, passa a ser reconhecida como ciência na medida em que é capaz de prever e descrever, por testes, questionários, inventarmos e outros recursos, o comportamento de indivíduos ou de grupos. O próprio comportamento é analisado, identificado e classificado por idades, sexo, grupos sócio-econômicos ou em variáveis estatisticamente determinadas. Com Binet, Kuhlmann, Stern, Terman, Claparede, Spearman e outros, surgem o estudo e a elaboração de testes mentais e escalas métricas. Os conceitos de idade mental, quociente de inteligência e a psicometria atingem níveis de alta sofisticação; há preocupações em se desvendar as "habilidades" primárias ou básicas e têm lugar os estudos fatoriais com Thurstone, Goodman, Thomson, Vernon, Kelley, Cattell e outros mais; aparecem famosos testes tais como o "Differential Aptitude Test" , o "California Test of Mental Maturity" , o "Guilford Zimmerman Aptitude Sorve", o "General Aptitude Test Bater". Na década de 1940-1950, Wechsler estuda a inteligência e desenvolve as não menos famosas escalas denominadas W AIS e WISC. Por último, surge a contribuição de Guilford, baseada em estudos fatoriais pelos quais 120 combinações de habilidades são teoricamente possíveis (Guilford e Hoepfner, 1971)

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e os famosos estudos de Piaget sobre o desenvolvimento intelectual da criança. Na área da personalidade, além do Teste de Rorschach, do M.M.P.I., do T.A.T., do Teste de Machover surgem notáveis técnicas expressivas tais como o P.M.K. e inúmeros questionários, provas situacionais e clínicas (Anastasi, 1948, 1957; Van Kolck, 1975). Esses estudos e trabalhos de mensuração se distanciavam muito dos procedimentos terapêuticos como se estivéssemos em campos independentes.

O aperfeiçoamento das técnicas de diagnóstico conduziu o Psicólogo a um conhecimento razoável das reações humanas, mas não lhe ofereceu recursos suficientes no sentido de manipulá-las. O objetivo fundamental, que seria conhecer para orientar, prevenir, corrigir, recuperar ou tratar, continuava distante. Ainda encontramos essa situação em muitos serviços psicológicos: a preocupação com um bom diagnóstico. Se tal exigência é por vezes necessária, não menos o é a do estudo dos meios e dos recursos pelos quais possamos ajudar as pessoas atendidas, por uma razão ou outra, em uma clínica psicológica ou de orientação ou em um grupo assistencial.

O cenário retratado marca a longa trajetória da Psicologia para seu aspecto aplicado, assistencial. Professores, chefes, supervisores, orientadores, pais e até mesmo psicólogos tinham diante de si um quadro, tão perfeito quanto possível, do ponto de vista descritivo, etiológico, causal, mas poucos sabiam para alterá-lo. O mais acurado diagnóstico ficava, assim, inoperante, simplesmente porque os recursos de ajuda, de intervenção, não eram conhecidos ou não aplicados.

A literatura psicológica, farta em técnicas de exame psicológico, conservou.-se relativamente pobre em estudos e informações sobre procedimentos para atuação na conduta. Estes se limitavam, principalmente, a manipulações ambientais, a técnicas de apoio, avisos, recomendações e conselhos. Por outro lado, em outro universo, desenvolvia-se a Psicanálise com teorias e técnicas delas derivadas; surgiu a contribuição rogeriana, e brotaram os processos de Skinner bem como outras teorias e técnicas. A conjunção entre a medida dos fenômenos psíquicos de um lado e o tratamento desses mesmos fenômenos produziu-se de maneira lenta e até mesmo hostil como se fossem campos mutuamente exclusivos. O relacionamento entre a psicometria e a psicoterapia e as preocupações com solução de problemas psicológicos foram devidos, também, ao considerável impulso motivacional a partir da II Grande Guerra, quando contingentes imensos de ex-combatentes precisavam se reintegrar na vida civil. Como assinalam Sundberg e Tyler (1963), drásticas alterações ocorreram. "Uma nova ênfase nos problemas de adultos e de crianças desenvolveu-se rapidamente. Os exames de inteligência e de aptidões continuaram sendo necessários, porém, maior atenção foi dirigida aos complexos e difíceis campos da personalidade e da motivação. A Psicoterapia tornou-se a preocupação essencial".

o uso de testes psicológicos

Os testes e as medidas em psicologia remontam aos estudos da psicologia experimental iniciados por Wundt no século passado, desenvolvidos no começo do

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século por Binet e consideravelmente valorizados até a década de 1950-1960, quando teve início forte tendência contrária a seu uso. As razões que lhes foram opostas são, em geral, técnico.científicas e filosóficas. As primeiras questionam a validade técnica das medidas psicológicas e as últimas o direito que teriam as pessoas de invadir e medir um campo de fenômenos nitidamente pessoais ou de utilizar os dados obtidos em benefício de grupos ou de instituições, sejam estas educacionais, políticas ou empresariais.

Parece ao autor que estamos em vias de passar de um modismo psicológico a outro, ambos impregnados de vantagens e de desvantagens, eis que negar a existência de testes ou exames é desconhecer a realidade da própria vida. O que se faz, na verdade, é tentar substituir a avaliação psicométrica por entrevistas e observações clínicas, mudando-se o método mas não a intenção. A avaliação não pode, porém, deixar de existir seja por um processo seja por outro. O excessivo apego a resultados psicométricos sem a devida interpretação do contexto individual e social foi, e com razão, a origem da resistência aos testes.

O problema do diagnóstico e particularmente dos testes parece concentrar-se em dois pólos essenciais: 1) a validade das medidas; 2) o uso das medidas obtidas uma vez comprovada sua validade técnico-científica.

O primeiro ponto parece ser o mais relevante pois, se a medida for precária, insegura e instável, tudo o mais que dela partir é falso e altamente prejudicial. O segundo ponto envolve problemas sociais, políticos e essencialmente éticos. Testes e avaliações sempre existiram e sempre existirão, sob diferentes títulos e calcados no conhecimento acumulado e na filosofia da época. Nosso problema é aperfeiçoar as avaliações no seu sentido intrínseco e nas suas implicações culturais, éticas e terapêuticas.

Quando se coloca o problema do diagnóstico prévio em aconselhamento ou terapia, podem os testes ser necessários ou não. A tendência atual é esperar que o diagnóstico ocorra como produto de interação entre psicólogo e cliente e na qual este atue como participante no seu propalo Julgamento A .pessoa irá ao pouco firmando sua Imagem e, seu autoconceito. Para fins de pesquisa e para outras atividades no campo da psicologia, os testes funcionam como medidores ou indicadores de comportamento e sua utilização é, às vezes, indispensável, desde que válidos e adequadamente aplicados e Interpretados *

* . No Brasil como no restante do mundo, os testes e técnicas de diagnóstico também floresceram nas décadas de 1930 a 1950. Vários instrumentos de avaliação foram elaborados, dentre os quais o Teste SENAI AG-3 e o Teste DEP, a cargo do autor e de seus colaboradores. Tais testes destinam-se à medida da inteligência geral, em termos do Fator G.

Orientação, aconselhamento e psicoterapia

Orientar, do ponto de vista psicológico, significa facilitar o conhecimento e a

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análise de caminhos ou direções para a conduta, com base em referenciais pessoais e sociais. Aconselhar, paralelamente, refere-se: ao processo de indicar ou prescrever caminhos, direções e procedimentos ou de criar condições para que a pessoa faça, ela própria, o julgamento das alternativas e formule suas opções. Psicoterapia é o tratamento de perturbações da personalidade ou da conduta através de métodos e técnicas psicológicas,

É fácil admitir que esses três conceitos, expressos em atuações práticas de ajuda, estão constantemente se intercruzando, seja nos hábitos e costumes do dia-a-dia, seja nos processos educacionais ou psicológicos formais e intencionais. Às vezes, uma simples ação orientadora, em que se facilita o acesso a informações e se deixa à pessoa decidir por si só, pode ser muito mais eficaz do que um conselho ou controle da conduta; noutros casos, principalmente em situações de emergência e de grande ansiedade, um conselho pode ser mais produtivo da que um demorado processo de orientação ou de terapia; em muitos casos porém, orientações e conselhos não são suficientes para alterar a conduta, recorrendo à terapia, como processo mais complexo, mais difícil e mais demorado A efetividade de uma atuação depende de inúmeros fatores nos quais sobressaem a personalidade do cliente, as emergências existentes, os recursos disponíveis e principalmente, os objetivos que se quer atingir e os critérios sociais e filosóficos que os determinam.

Os conceitos de orientação e de aconselhamento, vistos pelo lado de seus efeitos, têm variado ao longo da história. Já dizia Sócrates quatro séculos antes de Cristo: "Conhece-te a ti mesmo", conceito que parece se renovar no posicionamento atual da linha existencialista e rogeriana, e que com algumas alterações de forma e de conteúdo vem prevalecendo através dos tempos. Todavia, há pensamentos diferentes,

Williamson (1939), um dos pioneiros do movimento acadêmico de Orientação, identificava, em certos aspectos, o aconselhamento com a Educação, considerando que "à parte da moderna Educação referida como aconselhamento é a que se refere a processos individualizados e personalizados, destinados a ajudar o indivíduo a aprender matérias escolares, traços de cidadania, valores e hábitos pessoais e sociais e todos os outros hábitos, habilidades, atitudes e crenças que irão constituir um ser humano normal e ajustado'" , .

Como uma das grandes expressões no campo do aconselhamento, Rogers (1942, 1951) não se preocupa em estabelecer conceitos e definições, De toda sua obra, porém, se depreende que o aconselhamento é um método de assistência psicológica destinado a restaurar no indivíduo> suas condições de crescimento e de atualização, habilitando-o a perceber, sem distorções, a realidade que o cerca e a agir, nessa realidade, de forma a alcançar ampla satisfação pessoal e social. Aplica-se em todos os casos em que o indivíduo se defronta com problemas emocionais, não importando se se trata de doenças ou perturbações não patológicas. O aconselhamento consiste em uma relação permissiva, que oferece ao indivíduo oportunidade de compreender a si mesmo e a tal ponto que a habilita a tomar decisões em face de suas novas perspectivas, O cliente passa a se dirigir através da liberação e reorganização de seu campo perceptual. A orientação

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rogeriana afetou profundamente os princípios e os métodos até então existentes, e em face dessa repercussão dedica este livro um capítulo especial (Cap. 5) à obra desse psicólogo,

Para Robinson (1950), baseado principalmente nas técnicas de comunicação, e originariamente colega de Rogers, o aconselhamento é a atuação que "cobre todos os tipos de situações de duas pessoas, na qual, uma delas, o cliente, é ajudado a ajustar-se mais eficazmente a si propalo e a seu melo", Sua técnica principal é a comunicação, através de entrevistas cuidadosamente conduzidas e testadas de momento a momento, que facilitam a tomada de decisões e atuam terapeuticamente.

De ponto de vista dos efeitos da relação ocorrida no processo de aconselhamento, Pepinskye Pepinsky (1954) os definem como resultantes da interação que ocorre entre dois indivíduos, conselheiro e cliente, sob forma profissional, sendo iniciada e mantida como melo de facilitar alterações no comportamento do cliente.

Hahn e Maclean (1955), representantes, como Williamson, da corrente clássica de aconselhamento, dão ênfase ao processo de diagnóstico e tomam o aconselhamento no sentido de informações prestadas ao cliente sobre alternativas que se oferecem na solução de seus problemas. Há casos, dizem esses autores, sobre os quais o cliente precisa ser instruído! Há fatos que precisa conhecer; há aprendizagem a ser realizada.

Patterson (1959) é de opinião que o aconselhamento pode ser focalizado em termos de áreas de problemas (educacionais, vocacionais, conjugais, etc.), assim como em termos de ajustamento pessoal ou mesmo terapêutico. Segundo esse mesmo autor, o aconselhamento não se limita a pessoas normais; aplica-se ao excepcional, ao anormal ou ao desajustado; manipula as tendências adaptativas do indivíduo a fim de que este possa usá-los efetivamente.

Shoben (1966), analisando as implicações científicas e filosóficas envolvidas nos processos de assistência psicológica, afirma que do ponto de vista educacional e clínico, há dois alvos: o primeiro é ajudar o estudante ou o paciente a desenvolver suas capacidades para aperfeiçoar sua auto-avaliação "sem, necessariamente, se determinar o conteúdo de suas conclusões". Um segundo alvo, de certa forma contraposto ao primeiro, é o de se recusar ajuda técnica sempre que esta possa ser solicitada num contexto que venha violar os princípios intrínsecos do valor pessoal.

Na corrente comportamentista, encontramos Bijou (1966) afirmando ser "o objetivo final do aconselhamento ajudar o cliente a lidar mais eficazmente com seu melo e a substituir o comportamento mal ajustado pelo ajustado". "Parece claro, do ponto de vista da análise experimental do comportamento, que uma das mais eficientes formas de produzir as alterações desejáveis é pela modificação direta das circunstâncias que as suportam, e um dos meios mais efetivos de manter essas alterações é organizar um melo que continue a suportá-las." A aplicação das leis de aprendizagem é o melo pelo qual se adquire comportamentos desejáveis.

Krumboltz (1966), da corrente comportamentista, coloca os alvos do aconselhamento na mesma direção dos psicólogos contemporâneos. Segundo seus conceitos, "orientadores e psicólogos dedicam-se a ajudar as pessoas a resolverem

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mais adequadamente certos tipos de problemas. Alguns desses problemas relacionam-se com importantes decisões escolares e profissionais, tais como: Que curso devo fazer? A que profissão devo me dedicar? Outros problemas se relacionam com dificuldades pessoais, sociais e emocionais, tais como: Como posso salvar meu casamento? Como poderei suportar esses horríveis sentimentos de ansiedade, solidão e depressão? Como deverei agir para fazer valer meus direitos? Como posso relacionar-me melhor com os outros?" A essas questões o conselheiro acrescenta outras: Como se conceituam os problemas? Como colocar alvos? Que técnicas serão úteis para atingir esses alvos? Como avaliarei meu propalo trabalho? Tais questões são tão familiares e nos apegamos tanto a elas que os novos procedimentos (refere-se ele ao método comportamental) podem justificar uma verdadeira revolução no aconselhamento

A posição européia, notadamente à francesa, face ao aconselhamento psicológico, é bem diferente da americana. Piéron (Nepveu, 1961), em um de seus últimos trabalhos, dizia que os métOdos americanos aproximam-se muito da Psicanálise e que a concepção francesa e a americana divergem muito no juízo que fazem sobre o papel do conselheiro. "No regime americano, onde a educação não tem caráter nacional e onde a tendência geral é a de favorecer em tOdos os domínios as iniciativas individuais. o conselheiro se aproxima muito do psicoterapeuta; dirige-se a 'clientes' e não participa, de modo algum, dos problemas gerais da educação, nem se preocupa em participar de uma obra coletiva. Na França, ao contrário, tem-se procurado reduzir, ao máximo, a comercialização em matéria de Orientação. Esta, que tende a se integrar, cada vez mais, na obra nacional de educação, não visa satisfazer clientes, mas a servir os interesses dos Jovens encarando o seu futuro..."

Embora haja movimentos renovadores, Nepveu pareceu exprimir bem a tendência na época dominante na França e, talvez, na Europa quando, analisando os métodos de Rogers, de Super e de Bordin e baseando-se em contribuições européias de Nahoum, Delys e de outros, afirma que uma das atitudes correntes é o "conselheiro adotar uma atitude de peritO, ou de amigo desinteressado". "Esforça-se em compreender os problemas e as pessoas, em prever uma certa possibilidade de êxito, em formular conselhos adequados, bem-vindos e liberais".

Não obstante algumas controvérsias, o aconselhamento psicológico parece ter tOmado corpo e expressão na década de 1950-1960. De acordo com relatO de Super (1955), "essa nova expressão resultou do consenso geral de um grande número de psicólogos reunidos no Congresso Anual da American Psychological Association, em 1951, na Northwestern University". O "Counseling Psychology" substitui os antigos conceitos e métodos, originários da orientação profissional, modelada por Parsons e seus seguidores, pela idéia de um trabalho mais sensível à "unidade da personalidade, mais sensível às pessoas do que aos problemas, pois que a adaptação a um aspecto da vida está em relação com todos os outros". "O novo movimento encerra dados teóricos e técnicos da psicoterapia, inclui orientação profissional e ocupa-se, sobretudo, do indivíduo como pessoa, procurando ajudá-lo a adaptar-se com sucesso aos vários aspectOs da vida. Os conselheiros ou orientadores, nesse novo ponto de vista, ocupam-se de pessoas normais podendo

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cuidar, ainda, daquelas que apresentam deficiências e são mal ajustados, porém, de uma maneira diferente daquela que caracteriza a Psicologia Clínica".

Stefflre e Grant (1976), ao escreverem sobre aconselhamento psicológico, chegam a algumas considerações que parecem exprimir a dimensão hoje dominante: a) "a definição de aconselhamento depende dos diferentes pontos de vista das autoridades no assunto. Essas diferenças têm origem em diferentes pontos de vista filosóficos..."; b) "não se pode fazer uma distinção muitO clara e precisa entre aconselhamento e psicoterapia"; c) "o aconselhamento é uma forma deliberada de intervenção na vida dos clientes". Esse mesmo autor classifica o aconselhamento em quatro diferentes posições ou "sistemas", baseado em quatro diferentes teorias: a) Teoria do traço-fatOr, segundo a qual a mudança do comportamento "depende do conhecimento que o cliente tenha de informações"; b) Teoria centrada no cliente, pela qual o comportamento é modificado pela "reestruturação do campo fenomenológico"; c) Teoria comportamental, segundo a qual, após um diagnóstico da situação, determina-se os comportamentos a serem extintos ou reforçados; d) Teoria psicanalítica, que se propõe' 'claramente a uma redução de ansiedade na crença de que daí resulte um comportamento mais flexível e discriminador".

Para Rollo May (1977), o campo do aconselhamento situa-se entre os problemas da personalidade, para os quais há necessidade de um terapeUta e o_ problemas de imaturidade ou de carência de instrução, para os quais há necessidade de um educador.

Uma revisão de alguns textos sobre aconselhamento, aliada a nossa própria experiência, poderia nos levar às seguintes considerações:

1. A orientação, o aconselhamento psicológico e a psicoterapia não são meros procedimentos técnicos ou operacionais. Subjacente a eles há todo um arcabouço de posições filosóficas operantes tanto no terapeuta ou 'conselheiro. como nas pessoas assistidas, o que estabelece marcantes diferenças entre a psicologia e outras ciências humanas. Mesmo na posição clássica de liberdade e de não-diretividade há, por parte do psicólogo, uma deliberada e consciente postura filosófico-social. Noutro extremo, em que o conselheiro visa instalar um comportamento específico, há, igualmente, um papel social idealizado.

2. O posicionamento conceitual do orientador, conselheiro ou terapeuta flutua, em geral, entre três premissas: a) o homem é um produto predominantemente social; possui impulsos naturais, bons ou maus, que precisam ser canalizados para um tipo de sociedade na qual nos localizamos e que nos assegura a sobrevivência e o bem-estar; b) o homem é suficientemente capaz de decidir por si mesmo e escolher as ações mais. adequadas para si propalo e p?ra os outroS desde que sejam criadas condições facilitadoras para avaliação auto e hetero-referente e para as opções individuais; c) a autodeterminação é uma utopia; o homem é o produto de múltiplas variáveis; temos que atuar nos agentes que o controlam e nos comportamentos tal como ocorrem na vida. quotidiana.

Na prática pedagógica ou psicológica é difícil à distinção entre orientação, aconselhamento e psicoterapia e a maioria dos autores não se preocupa muito com

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essa diversificação teórica. Alguns, entretanto, tentam traçar linhas demarcatórias. Assim, Perry (1960) distingue o aconselhamento da psicoterapia, baseando-se nos papéis e funções sociais visados pelo primeiro e na dinâmica da personalidade proposta pela psicoterapia. Outros autores parecem diferençar estas duas atuações atribuindo ao aconselhamento os procedimentos que se focalizam no plano intelectual, cognitivo, consciente, e à psicoterapia os que se relacionam com fatores afetivos e inconscientes. Rogers (1942; 1955) usa os dois termos de forma indiferente - como fará o autor neste trabalho - porquanto, segundo ele, não há o que distinguir na série de contactos individuais que visam assistir a pessoa na alteração de atitudes ou do comportamento. Wolberg (1977) salienta que a psicoterapia é uma forma de tratamento para problemas de natureza emocional e na qual uma pessoa, especialmente treinada, estrutura uma relação profissional com o cliente, com o objetivo de remover ou de modificar os sintomas ou padrões inadequados de comportamento e promover crescimento e desenvolvimento da personalidade. Analisando o relacionamento cada a vez mais intenso entre aconselhamento e psicoterapia, Albert (1966), por outro lado, declara que o mesmo processo informativo, concerne-se ao aconselhamento acadêmico e vocacional, não pode se limitar aos planos conscientes e racionais da personalidade, já que os níveis profundos refletem-se em todos os aspectos do comportamento.

Nossa experiência vem indicando uma razoável ocorrência de casos nos quais os métodos de orientação e aconselhamento confundem-se com os de terapia. Se um jovem tem dificuldade de relacionamento. Com os pais _ se aplicarmos determinadas técnicas de tratamento emocional, sejam elas rogenanas, comportamentais ou outras, estaremos fazendo aconselhamento ou terapia? Se uma mulher procura o psicólogo para libertar-se de um contínuo desinteresse sexual pelo marido, tendo-se constatado, previamente, não haver problemas na área orgânica que possam ser responsáveis pelo fato e verificar-se haver uma real incompatibilidade emocional entre mulher e marido e se técnicas psicológicas forem usadas para tentar soluções, seria essa tarefa aconselhamento ou psicoterapia? Se um jovem, movido por profundos sentimentos de insegurança na escolha de carreira, não consegue tomar decisões e o psicólogo passa a cuidar do problema nos seus aspectos emocionais, estaria efetuando intervenção terapêutica?

Atualmente, a tendência é distinguir aconselhamento de psicoterapia mais em termos de grau do que em forma de atuação. Esta última é semelhante e até certo ponto indistinguível do primeiro, tanto no seu feitio profilático como no de recuperação ou .. Cura' '. Deixar ao psicólogo os chamados" casos normais com problemas", diferenciando-os dos patológicos ou anormais para os psiquiatras, é praticamente impossível, mesmo porque o conceito de normalidade é apenas uma proposição teórica (Mowrer, 1954). Quer nos parecer, pois, que a psicoterapia ou o aconselhamento são melhor descritos em termos de um continuum, em lugar de um julgamento dicotômico. A flexibilidade do trabalho do orientador e do psicólogo deve ser assegurada, em benefício do propalo cliente por ele assistido. Essa atuação, face a casos claramente patológicos, pode ser associada à de outros profissionais. A evolução de cada caso indicará a colaboração pessoal de outros especialmente sem que tenhamos de determinar, com base em supostas demarcações, os limites

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da atuação orientadora e da ação terapêutica.

Uma das mais explícitas conceituações e descrições dos papéis atribuídos

aos que se especializam em Aconselhamento Psicológico é proposta por Jordaan

(1968), em seu levantamento sobre as funções do Conselheiro Psicológico.

Segundo dados por ele compilados, este atua em diferentes setores da vida social

(consultórios, centros universitários, escolas, hospitais, centros de reabilitação,

serviços de orientação profissional, departamentos de pessoal, serviços de

colocação e de treinamento, etc.). Analisando as eventuais diferenças entre Clínica e

Aconselhamento, assinala que alguns especialistas apontam diferenças entre essas

duas especializações, outros, porém, consideram tais diferenças como irrelevantes.

Segundo muitos especialistas, o psicólogo-conselheiro tende a trabalhar com

pessoas normais, convalescentes ou recuperadas e a encaminhar casos mais sérios

a outros especialistas. Usa técnicas psicoterápicas e outros recursos, tais como

exploração de condições ambientais, informações, testes, experiências

exploratórias e outros procedimentos mais freqüentemente do que o psicólogo

clínico. .Em geral, o conselheiro terá desempenho profissional de acordo com a

formação que recebeu e das expectativas de trabalho que se oferecem..

Os dados hoje existentes parecem caracterizar o psicólogo-conselheiro como o profissional da psicologia de formação mais eclética o que não impede, contudo, que se dedique também a um determinado tipo de atuação na qual, particularmente, venha a especializar-se, a exemplo dos que se dedicam a problemas psicológicos do Trabalho, da Educação, da Família, etc.

Do ponto de vista psicológico, a atuação assistencial, profilática, terapêutica ou corretiva pode assumir diferentes rótulos classificados por alguns autores como formas suportivas, reeducativas ou reconstrutivas de tratamento (Pennington & Berg, 1954; Wolberg, 1977). Sem nos apegarmos a essa classificação, pois parece-nos difícil distinguir o que realmente ocorre, em face de um rótulo predeterminado, vamos nos limitar a mencionar apenas exemplos de métodos mais conhecidos, dando maior extensão ãqueles com os quais está o autor mais familiarizado. Procurou-se, porém, agrupá-los, tanto quanto possível, em capítulos próprios, pelo critério de seu posicionamento conceitual. Essa divisão setorial não reflete, porém, nenhuma tentativa de introduzir uma nova taxionomia no campo da psicoterapia. O Quadro 1, a seguir, relaciona exemplos de métodos, devendo-se notar que muitos destes, consoante a situação, podem se enquadrar em outras categorias.

QUADRO 1EXEMPLOS DE MÉTODOS DE ORIENTAÇÃO, ACONSELHAMENTO

PSICOLÓGICO E PSICOTERAPIA

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MÉTODOS ENTRADOS NO CONTEXTOSÓCLO-CULTURAL

MÉTODOS CENTRADOS NO CONTEXTOPESSOAL

· Informação - orientação · Persuasão · Manipulaçãoambiental · Aproveitamento de interesses e recursospessoais e ambientais · Terapia ocupacional ·Socioterapia · Comunidades terapêuticas evivenciais; processos de grupo

· Psicanálise e técnicas analiticamente orientadas Técnicas de reorganização cognitiva · Técnicas decrescimento pessoal e autodeterminação · Técnicassuportivas ou de tranquilização · Terapia gestáltica Terapia biofuncional e bioenergética · Psicodrama Análise transacional · Terapia primal · Psicobiologia· Logoterapia · Existencialismo

Nota: Alguns métodos podem ser classificados em uma ou mais categorias:outros não são apresentados sob a nomenclatura habitual e enquadram-se na classegeral em que são colocados no texto (capítulos 2, 3 e 4).

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2 - Métodos Centrados no Contexto Sócio-Cultural

Fundamentos

A imposição de padrões culturais, nos seus vários aspectos, é, sempre, teoricamente repelida, na ânsia de liberdade e autenticidade que envolve o ser humano. O homem busca afirmar-se e talvez nisto consista todo o móvel da conduta humana e sobre o qual falaremos no Capítulo 6.

Não obstante o alvo tantas vezes cultivado, vê-se o homem julgado, aceito ou rejeitado pela forma como se ajusta aos padrões que o cercam. A acepção é válida em todas as épocas e em todos os lugares, em todas as classes e faixas etárias. Mesmo a adolescência contestatória, às vezes iconoclasta e irreverente, mas criativa e pura em muitos ideais que tenta opor à tradição e aos hábitos e costumes, cria, para si mesma, um modelo ao qual os adolescentes aderem, com normas e valores próprios. Estes passam a ser os critérios de conduta e de ajustamento pelos quais os próprios adolescentes são entre si aceitos ou rejeitados. O comportamento grupal, diluído em pequenas castas e classes ou generalizado em amplos segmentos populacionais, envolve princípios normativos. Chega-se ao paradoxo de propor-se a liberdade, a autenticidade, o ser-ele-próprlo e essa atitude transforma-se em valor Imposto, o que contraria a idéia fundamental de liberdade.

A adaptação da pessoa a certas normas, estilos ou formas de vida é, pois, um critério comum de ajustamento, embora tentemos rejeitá-lo. Daí se deduz que muitos procedimentos profiláticos ou educacionais, como técnicas de reeducação ou de terapia, pautam-se, inexoravelmente, por padrões sócio-culturais, alguns transitórios ou superficiais, frutos de modismos ou situações de emergência, outros permanentes e profundos, produtos da experiência acumulada na sucessão de gerações em uma espécie de inconsciente coletivo de que nos fala Jung. Como ser diferente, marginalizado, ou não reconhecido socialmente, pode, em certos casos ter o sentido de destruição, a pessoa procura adaptar-se aos sistemas existentes para atender à necessidade biológica, básica, de sobreviver. A sociedade indica-lhe os caminhos para se preservar; exige, de forma aparente ou velada, que se "eduque", isto é, que saiba falar, andar, vestir-se e usar o sistema social tal como existe; exige que estude, trabalhe, cuide dos filhos ou de pessoas, segundo certos padrões; espera que participe da vida comunitária, que pague impostos e que desfrute de seus bens, móveis e imóveis, segundo certas regras e limitações. Em suma, estabelece certos determinismos cuja observância é essencial para que a pessoa seja aceita. O aconselhamento e a terapia são, nestes casos, uma proposta de adaptação a uma vida pré-definida. A liberdade seria apenas a possibilidade de escolha entre os determinismos que nos pressionam.

Muitos procedimentos de aconselhamento psicológico e de psicoterapia visam atingir os alvo_ de que falamos: tentam conduzir as pessoas às situações que os valores sociais estabelecem como adequadas. Essa imposição, se, em muitos

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casos, produz reações de crítica e de oposição e até de uma alienação conducente a quadros patológicos, por outro lado pode gerar segurança aos que se incorporam à massa, às tradições, ao pensamento grupal. E coletivo. É a tendência sociocêntrica em oposição à linha individualista ou centrada na pessoa. Até que ponto as tendências socializantes ou personalizantes são benéficas ou prejudiciais, aprazíveis ou aterradoras não sabemos. É assunto Dara os filósofos, sociólogos e psicólogos sociais. O que nos parece evidente é a ausência de padrões, valores ou pressões que, de uma forma ou outra, balizam o comportamento humano.

Do ponto de vista do aconselhamento psicológico e de tratamento, há recursos terapêuticos que visam adaptar o homem a seu contexto sócio-cultural embora se procure, atualmente, limitar ao máximo a subserviência a valores preestabelecidos, sem, porém, ignorá-los; tenta-se colocar a pessoa em condições de opção, ampliando-se o leque de escolha; procura-se aproveitar as potencialidades individuais e abrir perspectivas para mudanças sociais; procura-se facilitar o questionamento de problemas e situações de vida. E de forma tal que as transições ocorram na pessoa e na sociedade sem violentá-las na sua essência, mas vigorosas no seu posicionamento. O aconselhamento imposto, extremamente autoritário, é coisa do passado, ainda que as informações, os conselhos, as advertências atuem em certos casos. Se os conselhos e recomendações fossem; por si sós, eficientes, as Prisões estariam vazias e os instrumentos; de repressão teriam amplo sentido. Há, pois, que estabelecer um sistema de comunicação, de orientação e de atuação psicológica que produza resultados benéficos para a pessoa e para a sociedade. E, no caso em que os valores sociais sejam predominantes, muitos processos são usualmente aplicados com maior ou menor benefício pessoal ou social consoante as exigências que, naquele momento, fluem da pessoa ou do grupo.

Procedimentos comuns

Como se verifica em vários autores (hahn & MacLean, 1955; Stefflre & Grant, 1976; Sundberg & Tyler, 1963; Wolberg, 1977), há grande variação nos procedimentos adotados nesta categoria metodológica de tipo "orientador" ou “diretivo" .

Ainda que prevaleça o sentido sociocêntrico,. Baseado em padrões culturais, tenta-se, do ponto de vista psicológico, reduzir ao mínimo a diretividade procurando-se reduzir tensões e preparar a pessoa para decisões socialmente desejáveis. Em geral, os procedimentos mais comuns são: 1) Discussão com o psicólogo dos prós e contras de cada situação; 2) Informação, pelo psicólogo, com base no diagnóstico, das possíveis causas e da possível evolução das reações observadas; 3) Opinião do psicólogo no sentido de estimular ou de impedir a consecução de certos planos; 4) Planejamento de situações, com o cliente, envolvendo assuntos relacionados com os problemas tratados.

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Dificilmente se encontra, na literatura, a citação de pormenores técnicos do método, isto é, sobre o tipo de diálogo e atuação pelo qual o psicólogo conduz o relacionamento com o cliente. Em geral" são citados métodos de interpretar resultados de testes face a uma situação considerada e prognósticos que podem ser levantados. Limitam-se os autores a afirmar que "o cliente deve ser informado", que" deve tomar conhecimento J' , que o psicólogo deve considerar isto ou aquilo e que o cliente deve decidir.

Em geral, qualquer dos procedimentos aqui citados, como outros, análogos, ,embora com nomenclatura diferente, compreendem três etapas:

Fase catártica

O psicólogo ouve o cliente mantendo atitudes não críticas, facilitando sua expressão. O cliente expõe seus problemas e o psicólogo usa várias intervenções, tais como repetição, sumário e proposição de questões, esperando que o problema seja devidamente enquadrado em hipóteses prováveis. Essa fase pode durar uma ou mais sessões, na medida em que seja necessário chegarem, psicólogo e cliente, a uma estruturação formal dos problemas a enfrentar.

Fase de diagnóstico

Preparado emocionalmente o cliente na fase catártica, pode seguir-se o diagnóstico, orientando-se sua execução de acordo com os problemas ou hipóteses fixados na etapa anterior. Anamnese, testes, questionários, entrevistas com familiares.e outras pessoas são usados. Exames médicos e pareceres escolares ou profissionais podem ser incluídos no diagnóstico. Este envolve mais de uma pessoa e, em algumas clínicas, uma grande equipe participa do estudo do caso e da formulação de hipóteses e de planos (Vide outros comentarmos sobre o diagnóstico, no Capítulo anterior).

Ao mesmo tempo, o psicólogo procura conhecer as oportunidades de estudos, de trabalho, de vida social, de recreação e de eventuais tratamentos específicos disponíveis para o cliente; precisa recorrer a diferentes especialistas, entre os quais orientadores educacionais, assistentes sociais, médicos, professores e até mesmo a outros profissionais. Como tem que julgar a disponibilidade de recursos da comunidade, seu trabalho pessoal geralmente é insuficiente.

Quando o diagnóstico é necessário, temos notado ser mais eficaz o procedimento que identifique: 1) o nível potencial do cliente, e que se estende desde suas condições de saúde até seus níveis de escolarização e de condições sócio-econômicas, incluindo nível de inteligência, de aptidões e reações sensoriais e motoras; 2) as condições de adaptabilidade que favorecem ou delimitam o uso de suas potencialidades, penetrando-se no estudo da personalidade do cliente e nos seus dinamismos. Todos os planos geralmente consideram as expectativas sociais e, de outro lado, as potencialidades individuais, inclusive as facilitações ou barreiras que a pessoa pode encontrar (Barros Santos, 1978).

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Fase de decisões

Com o quadro do cliente diante de si, o psicólogo é levado à compreensão do comportamento do cliente e à decisão sobre os procedimentos aplicáveis para prevenção, ajustamento ou alteração de conduta. A característica básica reside na maior dose de iniciativa e decisão atribuída ao psicólogo. Este espera o cliente colocar os problemas e as soluções, mas, se estas não surgirem, assume o psicólogo o papel de proponente. O diálogo é Uma troca de idéias. O psicólogo informa, de modo impessoal, sobre os dados apurados, baseando-se em interpretações clínicas e estatísticas (Meehl, 1954; Super, 1955; Coule, 1960; Goldman, 1961). Evita personalizar as situações e oferece panoramas gerais, impedindo o aparecimento de nova ansiedade quando certos dados possam contrariar os alvos do cliente. Ao discutir com este, o psicólogo, ao mesmo tempo que informa, tenta explorar em cada idéia ou fato novo os sentimentos manifestos. Essa atuação, informativa e exploratória, leva o cliente a conhecer suas possibilidades e, desde que não gere tensões, produz condições favoráveis para escolhas e decisões. É uma etapa difícil, principalmente quando existem dados fortemente contrários às expectativas da pessoa. Em geral, é mais cauteloso esperar que esta, pouco a pouco, com a atmosfera de conforto criada pelo psicólogo, possa ir, ela própria, inferindo conclusões. As interferências no sentido de ordenar, proibir, persuadir não têm, em geral, mostrado eficácia. A informação e a exploração subseqüentes e imediatas nos parecem ser o procedimento mais adequado até agora encontrado. O psicólogo julga e avalia as possibilidades do cliente, mas o faz atenuando qualquer grau de dependência ou de ansiedade, na medida em que seja capaz de, concomitantemente com a informação, incluir atitudes que conduzam o cliente a explorar-se a si mesmo e à tomada de decisões.

Variações no processo

Em inúmeros casos, na fase catártica ou na fase de decisões, o cliente se sente mais à vontade "falando dos seus problemas" do que dos motivos originariamente expostos como razões para consulta. A redução da ansiedade criada pelas atitudes do psicólogo permite, pois, distinguir os casos em que ocorrem problemas emocionais generalizados dos que procuram, apenas, informações para uso predominantemente intelectual. Nessas circunstâncias, vê-se o psicólogo na contingência de continuar o processo no esquema original previsto, de transformá-Lo em processo terapêutico específico ou, ainda, de combinar ambos.

O atendimento do caso pode ter início com atitudes e técnicas centradas na pessoa, o que, além de preparar o cliente para um melhor diagnóstico, quando este se revelar necessário, permite iniciar uma assistência terapêutica que será útil nas situações em que, ao lado dos aspectos intelectuais, haja situações emocionais a serem manipuladas.

Quando o método é aplicado principalmente em casos de orientação

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vocacional ou profissional, sem problemas emocionais graves, temos notado que os clientes, quando submetidos apenas à reflexão de sentimentos, mostraram pouco ou nenhum avanço no sentido de equacionar melhor suas opções. Sempre que o psicólogo intervinha apenas com técnicas rogerianas, não se notava o aparecimento de respostas que revelassem modificação de comportamento associada a eventuais decisões. Em se tratando de casos em que predominavam problemas cognitivos

O que se supôs antes e se verificou posteriormente - a técnica de informação, discussão e explanação refletiu-se favoravelmente no aumento das possibilidades de decisão. Tais efeitos concordam, em parte, com o que afirmam os partidários desse método e segundo os quais os problemas de escolha nem sempre são originariamente emocionais. Estudos de Watley (1967), concernentes à predição do sucesso de estudantes atendidos por conselheiros de orientação doutrinária e técnicas diferentes, demonstraram que os conselheiros filiados à teoria informativa (teoria e traços da personalidade) predisseram com mais exatidão o grau de sucesso dos indivíduos estudados do que os filiados à orientação não diretiva, dos chamados ecléticos ou dos que não tinham doutrina técnico-científica bem definida.

A maioria das técnicas ou de recursos terapêuticos baseados no contexto sócio-cultural não tem nomes consagrados. Muitos mesclam-se entre si. Vamos enumerá-los com pequenas explicações já que constituem variações do procedimento geral descrito.

Informação-Orientação

É um processo tradicional de interação, de natureza predominantemente Profilática. Visando oferecer. E discutir alternativas de ação conduzidas, em geral, Sob a forma de: a) procedimentos de apoio; b) análise de opções envolvendo Questões. Lembretes. Consulta a dados existentes. Observação da realidade circunstancial confrontação com modelos de conduta e resultados; c) reflexão dos sentimentos provocados pelas alternativas estudadas. Aplica-se, em geral, a pessoas que mantenham contato com a realidade. Motivadas e suficientemente desenvolvidas para análise de informações.

Os procedimentos informativos ou orientadores atuam geralmente no plano racional, desde. que haja prévia liberação de estados emocionais que perturbem a tomada de decisões. É um dos procedimentos mais usados através do tempo e útil sempre que a pessoa precise de informações para comparar os possíveis efeitos de suas opções. Enquadram-se estes procedimentos no campo habitual dos Orientadores ou conselheiros. Seja no campo familiar, escolar, profissional ou social.

Persuasão

Trata-se de imposição comportamental, no plano da ideação e da ação, baseada em padrões de conduta previamente definidos como únicos possíveis e válidos. De efeito sugestivo, atua sob a forma de dissuasão racional, geralmente associada a recompensas e punições. É de valor ético discutível e somente indicado em situações de emergência e de perigo para o cliente ou para outras pessoas.

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Inclui, muitas vezes, a doutrinação e a orientação das pessoas para comportamentos sociais ou políticos emanados de um grupo dominante. Um exemplo extremado deste procedimento é a chamada "lavagem cerebral".

Manipulação ambiental

Consiste em uma atuação planejada e diretiva sobre agentes externos, presentes na família, na escola, no trabalho ou na comunidade, visando eliminar ou atenuar a exposição do cliente às fontes de frustração ou de conflito. Pode exigir amplo diagnóstico do cliente e dos fatores externos atuantes em seu comportamento para localizar as variáveis nele intervenientes e a aplicação de medidas que conduzam alvos desejados. Muitas vezes o processo é indireto, ou seja, o próprio cliente não tem conhecimento dos alvos e das intenções que visam alterar seu comportamento, o que ocorre em casos de deficiência grave e incapacitante no plano intelectual ou emocional.

Aproveitamento de interesses e de recursos pessoais e ambientais

Partindo de prévio diagnóstico global! E diferencial, visa utilizar ao máximo o potencial e a estrutura individual, usando caminhos não bloqueados. Inclui o Estudo da dinâmica do comportamento e dos alvos e das necessidades individuais, procurando-se conciliá-las com as ofertas e as necessidades sociais. Multo usado no Campo da Orientação Vocacional e Profissional e na Educação, baseia-se nas possibilidades da comunidade ou da instituição, procurando-se facilitar à pessoa seu ajustamento a uma ou mais alternativas que a sociedade oferece. É menos diretivo Do que os procedimentos _tj.anteriores, já que oferece opções no campo do trabalho, Do lazer, da família, das atividades comunitárias ou em outras áreas do comportamento social.

Terapia ocupacional

Compreende atividades de lazer, de recreação e, principalmente, tarefas que revelem utilidade e sentimento de auto-afirmação. As atividades podem ser livres, dirigidas ou semidirigidas e propiciam redução de tensões, exploração de aptidões e de interesses, melhora de comunicação e: da expressão e podem ter ação preventiva. educativa ou terapêutica (Willard &Spackman. 1970). Pode atuar como procedimento complementar ou como técnica terapêutica essencial, principalmente quando outros métodos são inviáveis. Pode incluir outras atividades, tais como esporte, teatro, movimentos associativos, atividades artísticas, cívicas, sociais, religiosas, bem como trabalhos manuais e artesanais. É aplicável, também, no campo empresarial para liberação de tensões, desenvolvimento pessoal enriquecimento do trabalho e melhora da comunicação.

A laborterapia é algo paralelo que se diferencia de terapia ocupacional porque estabelece um padrão mínimo de (desempenho a atingir, periodicamente revisto e neste sentido, tem amplos efeitos pedagógicos e psicológicos tanto para

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pessoas ditas normais corno deficientes. Muitas vezes recorre-se a oficinas especiais ou "protegidas", mas a tendência atual é usar o ambiente normal de trabalho.

Socioterapia

Confunde-se com outros métodos e técnicas já que o aconselhamento e a psicoterapia de qualquer estilo são, também, socioterápicos. Mescla-se, mais comumente, com a manipulação ambiental, com comunidades terapêuticas e com as técnicas de grupo em geral. Em essência, visa um contexto grupal, de que são exemplos a terapia familiar (Bowen, 1978), a terapia institucional (para pessoas que têm vida em comum) e equipes de trabalho. Nestes e noutros casos, a ênfase é dirigida para os sentimentos e as relações intragrupos e intergrupos; concentra-se nos problemas de agrupamentos humanos em geral como, também, em grupos especiais tais como grupo de doentes, grupo de viciados (o A.A.A. é um exemplo), grupo de minorias raciais, grupo de delinqüentes, etc.

Os procedimentos aplicados correspondem, em geral, às técnicas de grupo, sob orientações psicológicas as mais diversas (vide capítulo 4).

Comunidades terapêuticas e vivenciais; processos de grupo

São geralmente usadas quando se busca um relacionamento grupal e um trabalho de grupo e, neste caso, assemelha-se à socioterapia. As comunidades terapêuticas e vivenciais são, também, destinadas aos casos que não possam ser atendidos em clínicas ou consultórios comuns por dificuldades diversas. Aplicam-se igualmente às pessoas que tenham problemas de residência, de locomoção e as que precisam de constante assistência, seja médica ou psicológica.

Em alguns casos caracteriza-se uma internação ou seja um regime de vida em clínica, hospital ou comunidade em que a pessoa submete-se a um tratamento médico, psicológico e social em geral programado pela instituição que a acolhe. Modernamente, os "internos" são convidados para colaborar, podendo até participar da direção dos programas em regime de co-gestão, visando-se confrontação com a realidade e auto-afirmação. A interação entre os participantes é discutida em sessões especiais prevendo-se, também, relações externas e o gradativo término da internação com o conseqüente autogoverno. .

Os procedimentos e todas suas variações médicas, psicológicas ou sociais são planejados e aplicados por equipes multidisciplinares, com a cooperação dos participantes, podendo ser usados tanto em hospitais como em escolas, empresas, estabelecimentos penais, centros de abrigo e proteção e obras assistenciais.

O hospital-dia, centro-dia ou centro terapêutico é uma variação metodológica na qual o cliente conserva o vínculo com a família e freqüenta o centro diariamente ou algumas vezes por semana. Aplica-se a pessoas para as quais a tarefa terapêutica de consultório ou de ambulatório é insuficiente e para as quais a internação comum é desnecessária ou contra-indicada.

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Tanto a internação ou hospitalização comum como o centro-dia implicam na existência de várias atividades que compreendem, em geral: 1) Assistência médica em geral; 2) Atividades psicoterápicas tais como sessões de grupo, jogos, dança, esporte, artes plásticas e musicais, artesanato, participação em tarefas para o centro; 3) Psicoterapia específica, conforme o caso; 4) Contacto com a realidade; 5) Trabalho com a família, fazendo desta uma ativa participante.

O centro-dia, ou centro terapêutico, vem sendo usado também no campo da gerontologia, pelo qual conserva o idoso seus vínculos familiares sendo, simultaneamente, assistido por uma equipe especializada, em um melo que lhe proporciona convivência e atividade produtiva.

A vivência comunitária é outra variação do procedimento de internação e

comunidade terapêutica. Pode assumir várias formas, desde instituições destinadas

a menores excepcionais ou desemparados, até instituições penais ou conjunto

residencial para idosos. Esse sistema tem algumas vantagens e algumas

desvantagens. Em geral provê meios assistenciais mais facilmente e menos

onerosos mas, por outro lado, afasta o indivíduo da realidade existencial

contribuindo, até certo ponto, para uma segregação social ou etária. Outro perigo é o

envelhecimento ou saturação da comunidade ou seja, o cansaço resultante de uma

constante vida em comum. Os inconvenientes apontados podem ser removidos com

uma organização suficientemente ampla e flexível, com programações variadas e

com população parcialmente rotativa. Pode-se, também, em certos casos, limitar a

estada residencial a alguns dias por semana ou intercalá-la com temporadas em

outros locais, principalmente junto à família.

3 - Procedimentos Centrados no Contexto Pessoal

Fundamentos

Ao longo dos tempos, a sociedade revê os focos de referência em que balisa seus alvos, concentrando-se ora na pessoa, ora no grupo ou 'sistema, o que acarreta, no campo do aconselhamento psicológico ou da psicoterapia, correspondentes alterações. O conceito humanístico, 'voltado para uma atitude antropocêntrica, geralmente se sucede ao período sociocêntrico, no retorno a um equilíbrio natural. Essas tendências se alternam e, às vezes, coexistem. Hoje parece estarmos diante de uma orientação predominantemente personalista em que o

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indivíduo é o centro. Nesta conceituação, acentuada depois da II Grande Guerra, o foco preferencial tem sido o homem, a pessoa antes do grupo, embora alguns sistemas sociais existam como alvo prioritário.

Embora essas colocações e a luta pelos direitos humanos definam uma marcante filosofia social, a distância é bem grande entre a idéia e a ação. Mesmo no aconselhamento tipicamente centrado na pessoa, quando terapeuta e cliente buscam libertar-se das amarras sociais, estas não conseguem ser eliminadas. Os seres vivos têm medo de mudanças e apegam-se às estruturas existentes. No humanismo psicológico, pois, o efeito máximo atingido parece limitar-se a uma proposição para o futuro, isto é, ao planejamento para geração posterior. O humanismo é um desenvolvimento e um aproveitamento daquilo que é a pessoa, com ênfase na inovação, no enriquecimento experiencial e no crescimento, o que não significa constante oposição social mas a capacidade e a habilidade de extrair do melo o que é útil à pessoa e, em contrapartida, oferecer ao melo o que pode ser a ele necessário para o equilíbrio geral. Neste ponto, o aconselhamento e a psicoterapia de linha chamada' 'humanística" são contrários à educação de massa, à modelagem social e à socialização planejada.

Os métodos e técnicas dirigidos pelo enfoque humanístico partem do princípio de que a pessoa, como organismo total, é um ser com características próprias, que age e interage de acordo com as coordenadas básicas, biopsíquicas e sociais de sua personalidade, em uma equação pessoal de que nos falam tantos autores. O meio social é um corpo à parte, tão significativo quanto O ente biopsíquico, mas não o alvo irremovível e indiscutível. A pessoa é o centro e não o sistema de valores e de hábitos sociais. Francamente opostos ao domínio sóclo-cultural, da primeira categoria de métodos (Capítulo 2), coloca como objetivo básico a satisfação e o bem-estar individual, sem que isto implique em rebeldia ou subversão mas, ao contrário, em busca de valores e de opções que conciliem o EU pessoal com o EU social.

Os métodos e os procedimentos práticos atuam tanto no plano consciente como no inconsciente da personalidade e tendem a ser fenomenológicos ou, como diz Tyler: "Lida com o mundo como a pessoa o vê mais do que com a realidade existente" (Sundberg e Tyler, 1963).

A pessoa atingida pela orientação individualista passa a sentir-se segura e tranqüila à medida em que entende e vivencia seus problemas pessoais e quando se torna capaz de enfrentar a realidade em todos os seus aspectos; sente redução de tensões; o autoconceito se eleva; a crítica a si mesmo e aos outros tende a diminuir e os sucessos e fracassos são percebidos como fatos naturais próprios do viver e do vivenciar de cada um no seu momento de vida.

O aconselhamento psicológico e as técnicas psicoterápicas que freqüentemente se intitulam humanísticas, ou centradas na pessoa, nem sempre assim atuam, quer colocando como referencial o contexto sóclo-cultural (ver capítulo anterior), quer focalizando o problema em si, a exemplo de outras ciências. No enfoque centrado na pessoa, o trabalho terapêutico ou profilático é intencionalmente voltado para o processo particular pelo qual os eventos psíquicos ocorrem em uma dada pessoa. I 'Os erros da vida ocorrem quando o indivíduo tenta representar algum

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papel que não o seu". Esta frase de May (1977) esclarece bem a individualidade de cada um de nós. Não há tipos, nem rótulos ou categorias de indivíduos ou de problemas. Há pessoas nas quais condições orgânicas ou sociais geraram dificuldades, as quais foram manipuladas de acordo com recursos pessoais em um dado momento. Todo psicólogo experiente sabe que não há dois clientes iguais, embora, aparentemente, os problemas sejam os mesmos. A vivência de cada um deles é sempre “sui-generis". Diz Jung que cada um de nós traz em si uma constituição específica de vida, indeterminável, que não pode ser substituída por outra. A singularidade de cada pessoa e sua harmonia intrínseca são os alvos. A Psicanálise de Freud, bem como as teorias e técnicas que dele se originaram, constituem exemplos clássicos da orientação antropocêntrica, embora o controle social e cultural esteja sempre presente.

Procedimentos comuns

A abordagem inicial, muitas vezes, é semelhante à usada na metodologia da

primeira categoria (capítulo 2), ou seja, há uma fase de relacionamento e catarse na

qual o cliente expõe seus problemas, formula sua "queixa" e o psicólogo o assiste,

refletindo seus sentimentos e demonstrando aceitação e empatia (o que não

significa aprovação ou reprovação). A partir dessa fase e de acordo com um

pré-julgamento que o psicólogo efetua sobre o cliente e as possibilidades de

atendimento, é fixado um sistema de encontros periódicos, individuais ou em grupo.

Pode ou não haver diagnóstico psicológico no seu sentido tradicional. Geralmente essa providência é dispensável em certas modalidades de atuação; noutras, faz parte do processo e noutras é contra-indicado, como na metodologia rogenana.

As técnicas de atuação são bastante variadas, subordinadas a uma nomenclatura clássica e bem definida, como a Psicanálise, o Psicodrama, a Gestalt e outras mais. Todas' lidam com a dinâmica do comportamento e procuram levar o cliente a descobrir e manipular fontes profundas de ansiedade que, conscientemente ou não, atuam sobre ele. À medida em que o cliente consegue recompor as situações traumatizantes, em termos que suavizem suas frustrações e conflitos, pela redução da sensibilidade (nível de tolerância), pela melhor compreensão de si mesmo, do outro e do mundo que o cerca, ocorre maior enriquecimento e fortalecimento do EU e conseqüentemente maiores e melhores recursos para enfrentar e resolver dificuldades emocionais. A seguir veremos, resumidamente, alguns exemplos de técnicas desta categoria.

Psicanálise e técnicas analiticamente orientadas

A Psicanálise parece constituir o mais significativo movimento no campo da Psicologia, em todos os tempos. Embora os efeitos de seus métodos terapêuticos sejam questionados por muitos, os referenciais teóricos por ela estabelecidos

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vieram contribuir poderosamente para que o homem entendesse muito do que se passa em seu comportamento. De tal forma suas proposições corresponderam à necessidade de explanação da conduta humana, que seus conceitos e sua terminologia tornaram-se elementos comuns, quer na linguagem científica ou profissional, quer no dia-a-dia; impregnaram muitos dos conceitos atuais sobre as reações humanas e tendem a universalizar-se pelo uso corrente.

Devida a Sigmund Freud, seu genial criador, as teorias e técnicas passaram, posteriormente, por grandes e minuciosas elaborações e que se classificam, hoje, em métodos freudianos ou ortodoxos, e muitos outros, classificados de analiticamente orientados; envolvem associação livre, catarse, interpretação de idéias, de atos, de atitudes, de sonhos, de resistências e a manipulação do fenômeno de transferência (Freud, 1949, 1958).

Os conceitos básicos, derivados da Psicanálise, não se limitam atualmente à tradicional relação terapeuta-cliente, no inviolável gabinete do psicanalista, mas estendem suas aplicações a quase todos os campos do comportamento humano, seja na educação, na política, na religião, como, mais recentemente, dento das organizações de trabalho, a serviço do bem estar e da produtividade. Assim, conflitos existentes nas relações profissionais, enriquecimento do trabalho e o desempenho de chefes e subordinados têm sido analisados e interpretados em termos freudianos.

Como processo terapêutico, a Psicanálise t': seus derivados constituem tratamentos demorados e dispendiosos, aplicáveis às pessoas com repressões e conflitos profundos, servindo o terapeuta como uma espécie de ponte pela qual o cliente revive suas experiências passadas e o "aqui e agora" e reorganiza seus sentimentos em relação a essas experiências e ao quadro geral da personalidade.

A topografia da vida mental é entendida em termos de Id, Ego e Superego, quando se utiliza a linguagem freudiana, ou com nomenclatura diversa, mas de conceitos equivalentes, quando empregada por outras correntes psicológicas. Na sua mais ampla acepção, o método empregado tem em vista o estudo e a manipulação das forças psicológicas inconscientes que motivam o comportamento humano. Este é analisado e interpretado, seja na atividade manifesta no dia-a-dia, seja nos seus simbolismos mais diversos no trabalho, na vida social, na arte e noutros aspectos do pensamento e da ação.

O alvo terapêutico básico e original é dotar a pessoa de consciência de suas características e dos dinamismos que emprega para lidar com suas experiências traumáticas anteriores, com seus instintos e suas energias. Como técnica, o terapeuta assume um comportamento neutro, distante, de certa forma ambíguo. A essência da terapia é a análise, interpretação e manipulação da transferência, isto é, o encontro, pelo cliente, na figura do terapeuta, de um substituto aceitável que simboliza seus problemas. Qualquer modificação profunda na personalidade implica em compreender e explorar ativamente essa transferência, de forma que o cliente perceba como seu passado interfere no presente. À medida que o processo continua, o cliente liberta-se, pouco a pouco, da dependência do analista e reformula suas atitudes básicas, o que geralmente exige longo tempo e considerável habilidade do terapeuta. .

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Muitas e profundas alterações ocorreram no campo aberto por Freud, de tal forma que algumas delas passaram a constituir “escolas" ou movimentos com concepções e métodos dificilmente ligados às raízes originais. Não vamos comentá-las, dada a magnitude do assunto mas, apenas, citar os nomes mais expressivos devendo-se notar que alguns destes aparecem nos itens seguintes, uma vez que suas concepções podem se enquadrar em classificação metodológica diferente. Dentre, pois, tais "escolas" ou movimentos significativos, poderiam ser lembrados, em ordem alfabética: Abraham (1927); Alexander e French (1946); Berne (1976); Binswanger (1956); Erickson (1950); Fenichel (1941); Ferenczi (1926); Fromm (1941); Horney (1950, 1959); Jung (1927, 1939, 1968); Klein (1949); Lacan (1968, 1977, 1979); Laing (1963, 1967); Lowen (1967); Perls (1976); Rank (1945); Reich (1945); Reik (1948); Rosen (1953); Stekel (1940); Sullivan (1940, 1954)*. Algumas das contribuições destes autores são mencionadas mais adiante.

. As datas mencionadas neste trecho, bem como em todo o livro, correspondem às datas das publicações citadas nas referências bibliográficas.

Técnicas de reorganização cognitiva

A ênfase terapêutica, nesta linha de ação, é dirigida para os conceitos e valores que o cliente desenvolveu e em função dos quais as dificuldades vivenciais emergiram. Procura o psicólogo descobriras concepções "errôneas" ou "inadequadas" do cliente e trazê-las a sua compreensão, modificando, assim, o que Adler denominou de "estilo de vida" (1917).

O processo varia muito entre seus aplicadores consistindo, genericamente, em entrevistas com o cliente, seus familiares, professores e outras pessoas da sua constelação de vida, a fim de se ter idéias precisas das desordens comportamentais. O mapa cognitivo é explorado; as dificuldades são francamente discutidas, apontando-se as incoerências, ilogicidades e erros interpretativos, atuando-se, principalmente, no plano consciente, racional e do chamado bom senso. Adler dá grande atenção ao clima e às relações familiares (1917); Ellis procura detectar as principais falsas concepções e tenta modificá-las (1958, 1971); Phillips (1956), Dreikurs (1959), Mowrer (1953) e Frankl (1955) têm idéias básicas correlatas, no sentido de uma abordagem cognitiva e racional dos problemas. Este último de quem falaremos mais adiante, salienta-se pelo foco dirigido ao encontro de um sentido de vida e à responsabilidade que a pessoa assume no contribuir para a vida mais do que no usá-la. Um extenso estudo da terapia cognitiva é encontrado em Beck (1976).

O cliente é instruído a lutar contra as falsas concepções, a ignorar as depressões ou ansiedades, enfrentando-as como algo passageiro, até certo ponto inevitável, e a aceitar seus efeitos, bem como a culpa e as falhas pessoais como indicadores de algo errado no seu estilo de vida.

A terapia cognitiva envolve técnicas especiais (Beck, 1976) que abrailgem, também, a análise do que o cliente pensa e diz para si mesmo, no seu monólogo

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interior. A teoria da dissonância cognitiva (Festinger, 1957) pode oferecer pistas para estratégias de tratamento na linha comportamentalista (Jensen, 1979). As técnicas de persuasão são também incluídas e analisadas por diversos autores (Harrell, 1981) e, além disso, muito relacionadas com a terapia comportamental na medida em que se cuida de um processo de aprendizagem. Neste enfoque, os procedimentos têm em vista manipular os sintomas e os problemas de ajustamento sem atentar para eventuais causas. As sessões terapêuticas assumem, muitas vezes, as características de instruções e de aulas. O uso de reforços, comportamento imitativo e observação de modelos são largamente usados (vide Capítulo 4).

Técnicas de crescimento pessoal e autodeterminação

Embora haja algo em comum com outras posições psicodinâmicas, coube a Rogers (1942) dar início a um posicionamento considerado, na ocasião, revolucionário em matéria de aconselhamento e de psicoterapia. Em virtude de sua larga repercussão e de tratar-se de uma linha de atuação que interessou particularmente ao autor e a seus alunos dos cursos de Psicologia, é dedicado um espaço especial sobre o assunto, apresentado no capítulo seguinte.

Técnicas diversas

Presenciamos, atualmente, uma babel de terapias, seja nesta categoria, seja em outras, assinaladas nos Capítulos 2 e 4. Há grupos, movimentos e serviços públicos e particulares (centros pastorais, centros de valorização da vida, centros de emergência e de assistência a ansiosos, viciados ou marginalizados, encontro de casais, encontro de jovens, grupos comunitários e grupos de encontro em geral, grupos de gestantes e de idosos e um sem-fim de proposições). Alguns se utilizam de lazer, entretenimentos, recreação comum; outros utilizam o' esporte e os exercícios físicos; alguns empregam o esforço, outros o repouso; uns propugnam o relaxamento e a descontração, outros, ao contrário, a assunção da responsabilidade e da preocupação; alguns promovem estados solitários e de meditação, outros o companheirismo e a convivência grupal; outros, enfim, propõem a criatividade, a libertação e a expressão de si mesmo, enquanto outros proclamam a submissão, a obediência e o conformismo. Todos eles têm em comum a busca de soluções para problemas emocionais ou circunstanciais, no plano existencial. As proposições terapêuticas parecem estar ao sabor da atividade de muitos, bem como do charlatanismo de alguns, embora haja um bom número de profissionais seriamente empenhados em aplicar, controlar e estudar novas técnicas e seus efeitos nos clientes. Dentre as técnicas que têm merecido considerável estudo, poderiam ser citadas algumas, tais como:

· As técnicas suportivas ou de tranquilização, individuais ou em grupo, geralmente destinadas a clientes em estado de grande ansiedade ou depressão.

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Usam-se vários procedimentos, dentre os quais a catarse, atividades físicas, compreensão e empatia, sugestão, persuasão, hipnose, relaxamento físico e mental, repouso, placebos, em geral como procedimentos iniciais seguidos, depois, por atividades programadas no sentido lúdico, artístico, filantrópico, profissional, etc.

Nas técnicas suportivas procura-se, inicialmente, baixar o nível de ansiedade, ou de depressão, elevando-se, por outro lado, o nível de tolerância às frustrações e conflitos, principalmente quando estes são irremovíveis (redução do autoconceito, perda de bens ou de parentes, incapacidade física, convivência forçada com fontes de atrito, etc.). Não se cogita de reorganizar a personalidade, mas de reduzir ou eliminar os sintomas agudos, propiciando condições para uma programação terapêutica posterior.

· A terapia gestáltica que parte da experiência organísmica, colocando o corpo, com seus movimentos e sensações, no mesmo plano da mente. A ênfase terapêutica consiste em colocar a pessoa em contacto com as necessidades correntes e imediatas do organismo, Perls (1976), seu principal fundador, coloca como fundamental a estrutura e a configuração da percepção, isto é, o processo ativo que leva à construção de um todo perceptivo organizado e significativo entre o organismo e seu meio. Os desajustes e neuroses são conseqüências de separações e espaços não naturais na formação das "gestalten" (configurações) e a ansiedade seria a sensação de ameaça a essa unificação criativa.

O tratamento é, em geral, grupal, sob a forma de "workshops", nos quais são usadas dramatizações, troca de posições e papéis, visando-se "minimizar o espaço vazio entre os processos subjetivos e objetivos e restaurar na pessoa a totalidade da experiência não-verbal concebida como uma espécie de elam vital" (Kovel, 1976). Uma extensão do método é a terapia gestáltica centrada na pessoa, como forma de conjunção entre a posição rogeriana e gestaltista e da qual falamos a seguir.

· A terapia gestáltica centrada na pessoa é, no dizer de Maureen MilIer * , uma' 'terapia de movimento; movimento através do espaço, do tempo e dos níveis de consciência. O objetivo é a libertação do movimento natural de energia de vida, através de ação espontânea e livre que leva a pessoa à percepção e à satisfação de suas necessidades através de harmonioso contacto com o universo de onde provém energia para a vida".

* Tradução do autor, de manuscrito a ele enviado pela autora.

Os seguintes conceitos são básicos:

1. O universo é um todo; é racional; comporta-se' de acordo com suas próprias leis e está em evolução;

2. A vida, inclusive a vida humana, segue um caminho de crescimento em

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direção à complexidade. Essa tendência formativa é um movimento no sentido da realização construtiva de possibilidades que lhe são inerentes e que não podem ser destruídas sem se destruir todo o organismo;

3. É da natureza da consciência humana procurar sempre contacto cada vezmais profundo com uma realidade absoluta;

4. A consciência tem capacidade para expandir-se aprofundando o contactocom a realidade absoluta.

A postura do terapeuta na abordagem gestáltica centrada na pessoa é a de fé nesses conceitos, de humildade face ao reconhecimento de que aquilo que é conhecido como personalidade é, apenas, um pequeno fragmento da totalidade. É uma postura de curiosidade à procura de uma visão mais ampla da realidade; é uma postura de incursão e experimento, do cliente e do terapeuta, em novos e mais ricos contactos com o mundo. O terapeuta é alguém em quem se confia como co-explorador dós mistérios internos e externos que constituem a existência do cliente e que o ajuda a descobrir os limites de sua energia.. de seu movimento e de sua capacidade para nutrir seu contacto com seu mundo (Miller, 1981).

· A terapia biofuncional e bioenergética, resultante das contribuições de Reich (1945), tem como núcleo a idéia de que o estado emocional depende da função. do organismo; vivemos e atuamos fundamentalmente através do corpo e de suas energias, expressas ou reprimidas. Neste sentido, a função vital e saturar do orgasmo é um exemplo frisante. É necessário penetrar na "couraça muscular" que o cliente desenvolve a fim de libertar o material inconsciente. Essa liberação de emoções reprimidas, através da manipulação dos estados e tensões corporais, permite a mobilização da energia orgânica. Daí Q nome de orgonoterapia a essa posição. Posteriormente, Lowen desenvolveu o pensamento reichiano, com algumas contribuições, sob o nome de terapia bioenergética.

· O Psicodrama criado por Moreno (1959) visa à .expressão de sentimentos gerados por situações propostas pelo terapeuta ou pelos clientes e pela audiência, através de determinados papéis desempenhados pelos participantes. O psicodrama pode atuar sob diferentes orientações doutrinárias e tem evoluído muito como técnica terapêutica, preventiva ou educativa. Dentre suas alternativas há situações que enfocam o "aqui e agora" no relacionamento pessoal e social, bem como situações que antecipam dificuldades futuras e outras que focalizam problemas já vividos e que possam ser revistos. Há, também, dramatizações de situações hipotéticas que possam trazer à tona repressões e comportamentos não suficientemente explorados.

O psicodrama, além de sua função terapêutica, é usado, também, como procedimento didático. .

· A análise transacional, criada por Berne (1976), enfatiza as respostas e os papéis que as pessoas adotaram nas relações

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ambientais e interpessoais, as situações de segurança, auto-estima e de inferioridade comumente assumida por clássicas figuras de Pai, Adulto e Criança e seus simbolismos. A terapia focaliza o Ego adulto e os estados de OK, ou seja, ser julgado positivamente por si mesmo e pelos outros, ajudando a pessoa a compreender seus papéis e seu significado.

· A terapia primal ou do grito primal, originária de Janov (1970), baseia-se na liberação de sentimentos profundamente reprimidos e que pode ocorrer sob forma dramática. O cliente é instruído para seguir uma programação terapêutica, tal como permanecer em um hotel durante três semanas e abster-se de drogas ou distrações redutoras,de tensão e dedicar-se intensa e unicamente ao tratamento, nesse período. Nessa fase, o cliente tem sessões de duas ou três horas diárias com o terapeuta, como único diante a ser atendido. Em cada sessão lida-se com um objetivo específico para levar o cliente a expressar seus mais profundos sentimentos relacionados com seus pais e isto ocorre através de palavras, gestos e vigorosas expressões físicas e verbais. Seu tratamento pode continuar, depois, em grupo no qual o cliente continua centrado no seu problema (Kovel, 1976).

· A psicobiologia, de A. Meyer (1958), que enfatiza as vantagens de um amplo diagnóstico e, a seguir, a integração de todas as formas de psicoterapia, bem como as atuações biológicas e médicas. O posicionamento é global ou holístico com base no senso comum e na vivência do cliente em seu meio.

· Já parcialmente mencionada no item relativo aos métodos de contexto sócio-cultural, a logoterapia é aqui citada por constituir um conjunto de princípios e de técnicas de certa forma deles independente. Criada por Victor Frankl (1955), sucessor de Freud em sua cátedra em Viena, opõe-se ao princípio do prazer e ao pansexualismo freudiano. Sua técnica consiste em facilitar ao cliente o encontro de um sentido em sua vida o que, paralelamente, implica em aceitação do Dever e da Responsabilidade. A saúde psíquica decorre do preenchimento do vazio existencial; de um espiritualismo que conduza à descoberta, em si mesmo, do significado da vida. A logoterapia esforça -se, especialmente, pela conscientização do espiritual. Como análise da angústia existencial, procura levar o homem a se perceber como ser responsável e, nesse parâmetro, achar o sentido de sua existência.

A intenção paradoxal é um dos procedimentos usados. Incentiva o cliente a enfrentar e a praticar aquilo que teme. Esse processo, já estudado por outros métodos, equivale a desenvolver uma resistência mental (ou espiritual) a certos fatos perturbadores ou ameaçadores. Além da heróica resistência, acompanha-se de ironia para com o fato ameaçador, destruindo-lhe a força.

A posição existencialista e o retorno à filosofia

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Partindo da Fenomenologia, o Existencialismo,além de seu conteúdo filosófico, assumiu uma série de posições orientadoras ou terapêuticas condizentes com seu entendimento do Eu e do Mundo. Esse posicionamento não se erige, porém, como um novo' 'sistema de terapia, mas uma nova atitude para com a terapia", como afirma May (1976).

A influência de Kierkegaard, de Husserl, de Heidegger e de Jaspers, como de outros filósofos, é sensível como assinalam alguns comentaristas (Foulquié, 1960; Forghieri, 1972), cumprindo destacar, mais tarde, as contribuições de Sartre (1943, 1953), de Binswariger (1956), de Buber (1958) e de May (1973, 1976, 1977). Há um dimensionamento humanístico com retorno às questões fundamentais do ser, da vida e dos valores humanos, em franca oposição à avaliação e à medida psicológica instaladas a partir da Psicofísica de Fechner e da Psicologia Científica ou Experimental de Wundt e que teve seu apogeu nos trabalhos de Binet e no surgimento dos testes psicológicos e da psicotécnica na primeira metade do século XX. Passa-se, assim, do furor de exames e verificações de quocientes de inteligência ou de outros atributos a uns posicionamentos globais, dinâmicos, em que esses dados continuam significativos, mas sua importância na vida e nas reações humanas é sentida e entendida noutras perspectivas. O comportamento da pessoa não se define mais em termos de perfis ou de traços independentes, mas em termos d€ sua experiência vital, nem sempre acessível aos instrumentos atuais de medida. Na perspectivas holísticas, compreensivas, incluem-se valores sociais e humanos, externos, oriundos de um contexto de necessidades e pressões grupais e, de outro, de auto-expressão, de ser o que é. Embora inconcebível o Eu sem o outro, existe no campo do pensamento e da ação um território marcadamente pessoal, parcialmente autônomo, que responde à solicitação. e exigências internas, geradas na relação Eu-Outro e que passa a pertencer à pessoa como patrimônio pessoal que vive e vivencia.

Pode-se admitir que não existe um conjunto de processos formais, metodológicos, de estilo terapêutico, na Fenomenologia ou no Existencialismo, pois isso iria de encontro a seus princípios básicos. Existem, porém, atitudes terapêuticas. A empatia abre as portas ao mundo do cliente para que ele se veja a si mesmo, se encontre e se aceite; tolere suas limitações e perceba o valor e a peculiaridade de ser ele mesmo. Importa descobrir-se e descobrir os outros, como o Eu emerge e evolui através do contacto com o mundo e com pessoas. Entender e sentir a totalidade da existência é o alvo. Alguns existencialistas, dentre os quais Boss (1979), traçam uma certa imagem de uma terapia existencialista ("daseinanalytic therapy"), opondo-se frontalmente aos conceitos freudianos, particularmente no que se refere aos fenômenos da transferência e do inconsciente (embora os relatem sob outros títulos).

RoBo May admite que a terapia existencialista não é uma cura, mas busca do autoconhecimento. A chave para o processo de aconselhamento, como textualmente declara May, está na empatia. É através desse sentimento que todos os conselheiros atingem as pessoas. Na medida em que essa comunhão de sentimentos ocorre na sessão de aconselhamento, o problema do cliente "é transferido para essa nova pessoa e o aconselhador arca com sua metade do

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problema. E a estabilidade psicológica do conselheiro, seu esclarecimento, coragem e força de vontade transferir-se-ão para o aconselhando, prestando-lhe grande assistência na luta que se desenvolve no interior de sua personalidade" (May, 1977).

A volta aos problemas filosóficos não se faz, porém, à moda antiga. Vem impregnada de conceitos operacionais e não se restringe à filosofia pura, Busca nesta uma praxis, algo que ajude o homem a extrair da vida o que ela tem de melhor para si e para os outros e não se identifica com a pura especulação. Nesse sentido, o retorno à filosofia pode vir, com o tempo, a explicar muitos dos fracassos dos diagnósticos e prognósticos psicológicos. Se conseguirmos enquadrar e entender o comportamento humano dentro de um quadro de valores sociais e pessoais, provavelmente a ação orientadora e psicoterápica ultrapassará os modestos resultados até hoje obtidos.

4 - Métodos Mistos e Métodos Centrados no Problema

Fundamentos

Embora a eficácia dos procedimentos orientadores ou terapêuticos esteja ligada à estrutura e à dinâmica da personalidade, segundo o velho aforismo "há doentes e não doenças", não se pode ignorar a ocorrência de situações externas que constituem razão suficiente para gerar frustrações e conflitos, ,até certo ponto independentes do funcionamento global da personalidade. Desde que tais ocorrências podem comprometer outras áreas do comportamento, pode-se, igualmente, agir no sentido inverso, isto é, eliminar ou reduzir as desordens comportamentais atuando-se sobre agentes externos ou indiretos. Problemas sexuais, por exemplo, podem ser tratados com técnicas e informações específicas (Master & Johnson, 1970); problemas escolares ou profissionais podem ter origem na relação professor-aluno ou chefe-subordinado e como tais serem removidos quando se atua nessa relação; uma dificuldade de aceitação grupal na adolescência, ou em outras idades, pode gerar sentimentos de inadaptação e comportamentos anti-sociais, a qual, quando removida, pode reinstalar comportamentos sadios; ausência de afeto e proteção na infância podem criar comportamentos patológicos; um desequilíbrio orgânico, desde uma leve intoxicação alimentar até uma grave disfunção hormonal, pode dar origem a mudanças no comportamento; uma deficiência intelectual ou sensorial pode dar como resultado uma redução da capacidade competitiva e uma conseqüência emocional desastrosa; uma deficiência nutritiva pode produzir baixo nível de rendimento e ser interpretada como um falso quadro de indiferença ou desatenção; uma atmosfera educativa no lar, tipo "laissez faire", com liberdade excessiva e pouca disciplina, pode gerar imaturidade, insegurança e comportamentos agressivos ou anti-sociais

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(Sears, 1961). Os exemplos são incontáveis.Como os efeitos emocionais das frustrações ou dos conflitos estão sempre

presentes, podem ser usados procedimentos mistos que atuem, concomitantemente, sobre os agentes externos (causas) e sobre a pessoa (efeito). Às vezes, os psicólogos se preocupam apenas com os estados emocionais, quando seria mais indicado atuar diretamente nas raízes circunstanciais do problema. A dificuldade consiste em identificar os agentes externos, não-psicológicos ou paralelos e as estratégias e táticas que atuem na pessoa e no meio.

A seguir vamos mencionar, apenas a título de lembrete, sem entrar em pormenores técnicos que escapam à competência do autor, alguns dos métodos e técnicas que atuam em vários aspectos. Alguns deles aproximam-se mais da abordagem cultural, outros da abordagem pessoal e oUtros são centrados em problemas específicos. A escolha dos procedimentos depende, também, como nos demais recursos terapêuticos, da formação e preparação profissional do Orientador ou Terapeuta das possibilidades práticas de atuação *

. Este capítulo, principalmente no que se refere à Modificação do Comportamento, foi gentilmente revistO por Alice Maria de Carvalho De1itti e Walderez B.F. Bittencourt que o enriqueceram e o corrigiram com valiosas contribuições.

Procedimentos comuns

Em geral, os processos de orientação, aconselhamento ou terapia, nesta categoria de métodos, incluem ampla avaliação das condições da pessoa (estudo de caso), das características do problema, da situação a manipular e das alternativas de tratamento existentes. A maioria das atuações processa-se no plano cognitivo, com ênfase no processo do problema, o que não significa desprezar a pessoa ou o contexto sócio-cultural nem excluir os processos emocionais. Os comportamentos, nas suas causas e conseqüências, são geralmente estudados em laboratórios, no campo da psicologia experimental e, com base nos dados obtidos, utilizados na assistência psicológica. As pessoas são estudadas face aos problemas que apresentam. O foco é interpretar os dados à luz de um processo genérico que tende a ocorrer como respostas organísmicas.

São características básicas do método a definição tão precisa quanto possível dos comportamentos a serem atingidos, quer para implantá-los, quer para removê-los ou alterá-los, e um sistema de controle pelo qual seja averiguado o processo de mudança. Em certos tipos de tratamento são usados medidores de estados de tensão ou de relaxamento, bem como outros indicadores - médicos ou psicológicos - de condições orgânicas ou de estados emocionais.

Tais procedimentos, como se poderá inferir, produzem efeitos satisfatórios em numerosos casos. A dificuldade consiste, como nas demais categorias de métodos, em identificar o método adequado a uma determinada desordem comportamental.

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Terapia médica ou somática

Como os exemplos são suficientemente significativos no que se refere a distúrbios de comportamento causados por fatores fisiológicos, a somatoterapia é um recurso aplicável em numerosos casos, seja como método básico, seja como coadjuvante fio tratamento. A literatura em geral menciona casos em que o tratamento com vitaminas reduziu a ocorrência de perturbações mentais associadas à pelagra; em que drogas energizantes melhoraram estados de depressão ou de desinteresse; em que correções do funcionamento hepático diminuíram estados de irritabilidade. São conhecidos, também, os efeitos de certas substâncias sobre o desejo ou o desempenho sexual, bem como os efeitos da desnutrição e as repercussões mentais de muitas doenças ou disfunções orgânicas.

Nesta modalidade profilática ou terapêutica há sempre necessidade de se recorrer a uma equipe multidisciplinar, em que atuem médicos, psicólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e outros profissionais. É possível conjecturar, embora haja poucos estudos concludentes, que muitos distúrbios do comportamento, chamados estruturais ou de temperamento e, portanto, de origem predominantemente genética, sejam beneficiados com esse tipo de assistência, bem como os que resistem aos tratamentos psicoterápicos conhecidos. Sobre o assunto deve o leitor reportar-se a obras no campo psiquiátrico e psicossomático (Baldessarini, 1977; Lion, 1978; Linden e Mass, 1980).

Pode-ser incluído neste tópico um variado elenco de procedimentos que vão desde exercícios físicos ou relaxamento, até fisioterapia e processos bioquímicos. Muitas ações cirúrgicas, bem como as plásticas, ortopédicas ou alimentares, podem ser úteis. As revistas médicas mencionam a ação sedativa de neurolépticos sobre o sistema nervoso, reduzindo estados de excitabilidade, bem como o efeito de várias drogas sobre o comportamento em geral (Coleman, 1973; Spoerri, 1974).

A quimioterapia parece apresentar dados promissores, na medida em que os processos patológicos tenham origem ou sejam desencadeados por fenômenos orgânicos. É um valioso recurso auxiliar também nos casos de desordens funcionais para remissão ou alívio de sintomas, facilitando à pessoa tornar-se acessível a atividades do dia-a-dia, a ocupações profissionais e à psicoterapia. Provocando redução, ainda que temporária, do medo, da angústia, da agressividade, da depressão ou de oUtras manifestações inadequadas à situação, consegue reambientar as pessoas, diminuir alucinações e delírios e abrir perspectivas para uma retomada de suas atividades habituais, o que as ajuda no plano emocional de auto-afirmação e de relacionamento social e, assim, indiretamente, contribui para a melhora do quadro geral. Beitman (1981), citando inquérito entre membros da Associação Psicanalítica Americana, menciona que cerca de 60% dos analistas usa medicamentos em alguns dos pacientes. Lesse (1978) afirma ter obtido 83% de resultados satisfatórios com o uso de psicoterapia e tratamento farmacológico combinado, em um período de três semanas, em um grupo de clientes com severa depressão. O mesmo aUtor assinala que no caso de depressões profundas, com idéias de suicídio, o tratamento puramente psicoterápico mostrou-se inferior ao

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tratamento combinado com drogas. .Ao mencionarmos a relação físico-psíquica naetiologia e no tratamento de

distúrbios mentais e emocionais, poder-se-ia distinguir as técnicas psicossomáticas das somatopsíquicas. No primeiro caso, estaria o tratamento de desordens corporais por processos psicológicos; no segundo, o tratamento das perturbações da personalidade por processos físicos ou fisiológicos. Essa distinção. é, apenas, didática, pois o organismo se comporta como um conjunto interdependente.O que se comenta, no momento, é a terapia de desordens mentais ou emocionais por procedimentos somáticos, geralmente afeto à Medicina e áreas paramédicas.

Reflexologia

A reflexologia, baseada nas contribuições de Pavlov e Bechteéew, na Rússia, e de Watson, nos Estados Unidos, foi à precursora da terapia comportamental de que trataremos mais adiante. Os fatos psicológicos são vistos como eventos fisiológicos, não havendo lugar para a consciência. As teorias sobre o associassionismo e os conceitos sobre Inibição e excitação são importantes na compreensão e no tratamento dos eventos comportamentais. O objetivo, segundo Salter, é "desinibir a inibição e atinge-se esse objetivo com o que podemos chamar de química verbal". O desajustamento é um processo de aprendizagem e assim é a psicoterapia. O "equilíbrio entre a excitação e a inibição é a base da vida normal" (Wolpe, Salter e Reyna, 1966). ; '. .

. . . Os procedimentos podem incluir diálogos, manipulação ambiental, drogas e aparelhagem variada que atuem para desinibir os focos da inibição condicionada. Muitas. técnicas de "controle mental", de "controle emocional", exercícios de concentração e de descontração sensorial, estimulação ou tranquilização enquadram-se nesta categoria, inclusive sistemas de controle eletromecânicos ou eletrônicos relacionados com o uso de biofeedback.

Fisicultura, esportes e manipulação corporal

Embora não haja pesquisas suficientes sobre os efeitos psicológicos decorrentes de determinadas práticas de educação física ou de esportes, a observação vem mostrando influência favorável dessas atividades, no ajustamento pessoal e social. A redução de tensões pela ativação de funções fisiológicas ou pelo relaxamento programado, assim como sentimentos de aUto-afirmação, são alguns dos efeitos observáveis.

Incluem-se neste grupo de procedimentos todas as atividades relacionadas com ginástica (diferentes modalidades), esportes individuais e coletivos e atividades de lazer combinadas com exercícios físicos. Podem incluir, também, regimes dietéticos, alteração de hábitos de higiene e de saúde física, trato da aparência, do vestuário, da postura e ele expressões corporais como, até mesmo, a redução ou eliminação de problemas ortopédicos (ver Terapia Somática e Fisioterapia).

Geralmente a terapia pela cultura física é feita individualmente ou em grupos

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através de: 1) Programação de exercícios físicos variados e agradáveis, diariamente ou algumas vezes por semana; 2) Organização de grupos para competições adequadas ao nível de desempenho, idade e interesse dos participantes; 3) Sessões de relaxamento e recreação, inclusive dança, música, meditação e repouso, articuladas com a programação física.

Solemon e Bumps (1978) apresentam um novo método para induzir o relaxamento físico empregando corrida lenta, de longa distância, combinada com meditação. O método baseia-se nas alterações fisiológicas e conseqüente mudança no estado de consciência ocorrida, similarmente, na corrida e na meditação. A combinação dos dois efeitos seria vantajosa como coadjuvante terapêutico.

Caberia considerar que os processos tradicionais de fisicultura (exercícios, condicionamento físico, esportes, competições) vêm sendo questionados e até combatidos pela antiginástica e pela kinesiterapia (Bertherat, 1979) com base na teoria de que o corpo nos seus estados de rigidez e tensão retrata, exatamente, os conflitos, repressões e angústias que permanecem insolúveis. Há toda uma linguagem corporal que precisa ser previamente interpretada e trabalhada tomando-se consciência do corpo nos seus movimentos e expressões. Assim, muitas práticas esportivas e de ginástica podem atuar no sentido inverso mantendo ou desenvolvendo desequilíbrios tensionais preexistentes. Há, no caso, uma estreita ligação entre esse posicionamento e a orgonoterapia de Reich (vide referências adicionais no Capítulo 3).

Técnicas sugestivas e hipnóticas

A sugestão sempre exerceu papel terapêutico e suas aplicações remontam à Antigüidade, inclusive no que se refere à influência de agentes extraterrenos ou místicos de que falaremos mais adiante.

Um dos procedimentos conhecidos, proposto por Coué (1936) e, posteriormente, desenvolvido por outros autores, consiste em levar o cliente a repetir que, dia-a-dia, acha-se melhor, bem melhor, praticando pouco a pouco um processo de encorajamento pessoal e de confiança em si. O treinamento autógeno (Schultz, 1959), forma mais atualizada de aplicação do método, combina a aUto-sugestão com o relaxamento.

A hipnose, geralmente usada como método auxiliar, teve seu valor redescoberto recentemente como procedimento válido e autônomo (Erickson, 1947). É útil em várias situações, principalmente na remoção de sintomas que facilite posterior introdução de outros agentes terapêuticas. Várias considerações sobre hipnose são encontradas em Spiegel (1978), em Moraes Passos (1975), nos já mencionados trabalhos de Erickson e em Wolberg (1977).

Arteterapia

Inclui grande variedade de ações no campo da música, pintura, escultura, literatura, bem como na expressão corporal (dança, ginástica, artes marciais,

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exercícios grupais), seja como trabalho terapêutica individual ou em grupo, como redutor de tensões (música no trabalho, na escola, em hospitais, etc.). Há trabalhos pioneiros como os de Licht (1946) sobre música, de May (1941), de Rosen (1957) e de Schoop (1974) sobre dança. Relaciona-se, em alguns aspectos, com a terapia ocupacional e com outras técnicas terapêuticas.

A dança-terapia e o uso do movimento corporal ver:J. sendo bastante utilizada na redução de tensões, no desenvolvimento motor e afetivo. Segundo afirma Serra (1981), coube à Laban (1950) abrir caminhos novos com base na qualidade do movimento e a Kestenberg (1967) enfatizá-los no desenvolvimento das estruturas psíquicas da criança. Há; nestes casos, íntima relação com as terapias de manipulação corporal citadas em item anterior. Vários programas de atividades artísticas vêm sendo desenvolvidos com doentes mentais que incluem, principalmente, a criatividade e a recuperação da própria identidade. Nessa área destaca-se o trabalho de J.M. Erikson (1976).

Ludoterapia

Aplicada principalmente em crianças, pode ocorrer sob várias orientações terapêuticas, sejam freudianas, rogerianas, comportamentais, ou outras. Utiliza-se das expressões livremente ensejadas pelos participantes ou decorrentes de jogos e situações provocadas pelo terapeuta. Baseia-se na acepção de que os sentimentos livremente expressos são importantes para a criança, independentemente do que diga ou faça, embora haja limites que lhe permitam ajustar-se à realidade e torná-la consciente de sua responsabilidade na relação estabelecida com pessoas e objetos (Axline, 1980; Gondor, 1954). Encontra-se em Schaefer (1976) amplo estudo sobre o uso do jogo infantil para finalidades terapêuticas no qual o autor especifica diferentes linhas doutrinárias.

Biblioterapia

Ocupa um lugar modesto no arsenal terapêutico, discutindo os psicólogos seu uso e seus efeitos. Consiste em um procedimento livre ou dirigido de leituras que propiciam ao cliente informação, instruções e encorajamento como, também, meios de reflexão e de auto-análise. Um dos inconveniente é não permitir o diálogo podendo, em certos casos, conduzir o cliente a interpretações inadequadas de sua situação. Menninger (1937) e Schneck (1945) foram alguns dos poucos especialistas que, em anos passados, tentaram sistematizar a literatura sobre esse procedimento.

Semântica

Consiste em rever, comentar e explorar o sentido de palavras e expressões que o cliente usa para se conceituar ou para explicar suas frustrações e conflitos. Os esclarecimentos lingüísticos permitem reduzir ou eliminar as ilogicidades de

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pensamentos, atos e conceitos codificados pela linguagem. Os símbolos lingüísticas são revistos e analisados em função das aspirações e necessidades da pessoa e da maneira como ela reage a esses conceitos. Korzybski (1941) é considerado o pioneiro do método.

Modificação do comportamento

As teorias e os procedimentos subordinados à teoria comportamentalista seguem, com algumas variações, o esquema tradicional da Psicologia Experimental e de seus estudos no campo da psicologia da aprendizagem, já que" aconselhando, orientando, intervindo na conduta, o psicólogo ou terapeuta visa modificar comportamentos existentes e promover a instalação ou aprendizagem de outros. A expressão "modificação do comportamento" ("behavior modification") tem prevalecido como título dessa nova abordagem, ainda que pareça imprópria, eis que todo processo de aconselhamento ou de psicoterapia tem como alvo modificações comportamentais.

Os estudos e preocupações com as mudanças de comportamento, entendidas como tais as respostas a certos estímulos, podem ser, sob nomes e situações diversas, localizados nas mais longínquas épocas, desde que o homem tenha modificado sua conduta face aos resultados ou conseqüências que sente ou observa. Os estudos de laboratório datam, porém, do século passado dentre os quais os de Ebbinghaus e de Thotndike. Posteriormente, Pavlov, Hull e outros pesquisadores ofereceram novas contribuições até que, com Watson (1930), Skinner (1938, 1967,1968), Bandura (1961), Lazarus (1971,1972,1977) e outros especialistas do campo, as implicações teóricas e práticas alcançaram quase todos os domínios da psicologia, inclusive o aconselhamento e a psicoterapia, ramificando-se em teorias e ações suplementares e, por vezes, um tanto divergentes entre si. O corpo teórico básico permanece, embora, para muitos, seja inaceitável, como foi a teoria psicanalítica no começo do século XX. Estudos, comentários e análise de resultados da terapia comportamental são fartamente apresentados em numerosas publicações das quais se destacam as de Eysenck (1952, 1960), de Hersen e outros (1979) e de Franks e Wilson (1980).

O princípio básico da teoria comportamentalista é o de que o comportamento humano, como o dos animais, é função de fenômenos que o precederam, isto é, de antecedentes que facilitam, dificultam ou impedem o surgimento de uma dada resposta. É claro, também, que essa mesma resposta pode ser afetada por fatores constitucionais, inatos, não observáveis o que, todavia, não invalida o princípio geral. As conseqüências de um comportamento podem, também, modificar a ocorrência de outro, do qual é um antecedente. Manipular os antecedentes, os conseqüentes e os mediadores (processos encobertos, não diretamente observáveis) torna, pois, o comportamento passível de mudança.

Os seguintes princípios teóricos e práticos são geralmente aplicáveis às situações de aconselhamento e de psicoterapia:

a) O comportamento é função do ambiente. Controlamos e somos controlados. Os eventos que ocorrem em torno de nós modelam o nosso

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comportamento. O controle ocorre principalmente pelo reforço e pela punição.b) O comportamento é aprendido quando, ao ocorrer, é de alguma forma

“recompensado”. A expressão “reforço” significa recompensa ou gratificação.c) Se a uma resposta casual ou espontânea seguir-se um estímulo reforçador,

a força dessa reação (resposta) será aumentada; se não o for, sua freqüência, no futuro, será menor. As respostas, reforçadas ou não, terão, assim, maior ou menor probabilidade de ocorrer no futuro.

d) Há reforços positivos e negativos. Os primeiros consistem na apresentação de estímulos, no acréscimo de alguma coisa à situação, tal como alimento. água, contacto sexual, etc. Os outros consistem na remoção de algo perturbador, por exemplo muito barulho, luz intensa, choque elétrico, frio ou calor intenso, etc. Além destes, há reforços secundários ou estímulos que, associados aos anteriores, atuam como eles.

e) Enquanto o reforçamento torna as respostas mais freqüentes, sua falta ouausência extingue a resposta.

f) A conseqüência da retirada do reforço positivo é uma redução na freqüência das respostas, e a conseqüência da remoção de algo desagradável (reforço negativo) é um aumento dessa freqüência.

g) Para que sejam eficazes os estímulos reforçadores, é preciso que eles surjam logo após a resposta casual ou espontânea. Um intervalo maior do que alguns segundos pode reduzir de muito o efeito reforçador. O reforçador deve ocorrer exata e imediatamente após a concretização do comportamento a ser aprendido. Caso isso não se verifique, um comportamento diferente pode instalar-se.

h) O ato de aprender é uma modelagem paulatina do comportamento através de reforços. Estes podem ser usados e planejados na situação de aconselhamento e terapia de várias maneiras, usando-se intervalos e meios para discriminar e generalizar.

i) Mudar o comportamento é mudar as conseqüências e rearranjar as“contingências do reforçamento”.

j) A aprendizagem ou mudança comportamental ocorre através de quatrotipos de processos:

- discriminação- generalização- encadeamento- modelação.

k) O comportamento seguido de conseqüências reforçadoras (recompensa) tem maior probabilidade de ocorrer novamente.

I) O comportamento seguido de conseqüências aversivas (punição) tem menor probabilidade de ocorrer novamente, mas a força relativa da punição em alterar o comportamento é pequena, comparada com a força do reforçamento positivo.

m) O comportamento que não for reforçado tende a se extinguir.n) Confirmar ao cliente que ele modificou seu comportamento em direção a

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um resultado desejado é reforçador para ele.o) A principal diferença entre os que aprendem é a rapidez com que ocorre a

aprendizagem, não a maneira como ela ocorre.p) Uma das contingências de reforçamento mais importantes é o tempo que

medeia entre o comportamento e o reforçamento. Quando as conseqüências positivas ocorrem imediatamente após o comportamento, as probabilidades de que este venha a ocorrer novamente são maiores do que se houver uma demora.

q) A transferência do comportamento de uma situação para outra depende de provocá-lo na situação mais próxima possível da realidade que se quer atingir.

r) Outra contingência importante é o esquema de reforçamento, isto é, a conseqüência intermitente ou contínua. O mais eficiente para instalar novos comportamentos é o esquema de reforçamento contínuo (que ocorre sempre após a emissão da resposta), e para manutenção do comportamento é o esquema intermitente (que ocorre de vez em quando sem que a pessoa saiba quando ocorrerá, mas espera que ocorra).

s) O intervalo entre os reforços é importante. Em geral é mais eficiente iniciar reforçando o comportamento toda vez que ele ocorra e, a seguir, deixar de reforçar em algumas ocasiões. Passa-se depois a reforçar ao acaso de maneira a manter-se o comportamento desejável.

t) Finalmente, para que o comportamento possa ser instalado, é precisoque o cliente emita esse comportamento.

As aplicações desses princípios em situação de aconselhamento ou terapia exigem muitas situações previamente programadas: Terapeuta e cliente procuram: a) identificar o comportamento que se quer instalar; b) determinar o critério ou nível de realização adequado ou desejável; c) criar condições em que apareça o comportamento desejado e os reforçadores adequados; d) aplicar o esquema de reforçamento mais adequado; e) escolher situações que mais se aproximem: do real; f) minimizar a possibilidade de erros ou punições; g) criar um procedimento para a ocorrência da resposta desejável e verificar a manutenção desse comportamento.

Fé, misticismo, parapsicologia e áreas correlatas

Neste conjunto de recursos, condenado por muitos, aceito por outros, mas aberto a conjecturas, haveria que distinguir algumas posições principais, a saber: 1) procedimentos que, embora sob denominações diversas, incluem-se no campo da fisiologia e da psicologia convencional ou da ciência em geral; 2) procedimentos relacionados com doutrinas ou práticas não ortodoxas, baseados em “forças” ou agentes sobrenaturais; 3) procedimentos parapsicológicos que incluem parte do primeiro grupo, parte do segundo e fenômenos ainda pouco esclarecidos.

A primeira posição pouco acrescenta, do ponto de vista científico atual, aos procedimentos que a ciência dispõe; apenas muda-se de nome e tenta-se criar uma doutrina própria. O ritual que os acompanha é, geralmente, parte de um revigorante

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influxo sugestivo ou um processo bem elaborado de condicionamento operante e, desse modo, produz resultados. Podem ser incluídos neste grupo: o Hinduísmo, para estados de tensão e que compreende, em geral, relaxamento muscular, meditação e, depois, concentração em soluções objetivas para os problemas; a Yoga, uma variante do hinduísmo que visa ao autocontrole, em vários estágios; o Budismo, que busca o controle de todos os desejos e o domínio de si mesmo como técnica para eliminar sofrimentos; o Zen-budismo, baseado na intuição e na iluminação, na procura de maneiras diferentes de solver problemas; muitas técnicas orientais, influências astrais e de fenômenos da natureza (Barter, 1967).

A meditação, outrora pertencente apenas ao campo do comportamento esotérico, próprio de certos rituais orientais, é hoje um procedimento aplicado como recurso terapêutico básico ou associado a outros métodos. Maupin (1965) é considerado um dos pioneiros nas investigações e aplicações experimentais do método. Deikman (1966), paralelamente, relata que a meditação pode induzir a pessoa a libertar-se de estereótipos mentais e atingir formas mais agradáveis de encarar as realidades existentes.

A meditação pode relacionar-se, no plano teórico ou operacional, a outros procedimentos, tais como o treinamento autógeno, de Schultz, à Yoga, à auto-regulação do processo cerebral e aos processos genéricos de tomada de consciência (Chang, 1978): Estudos citados por Hart e Tomlinson (1970) indicam a ocorrência de mudanças fisiológicas devidas à meditação e que a pessoa “pode aprender a controlar suas ondas mentais” (p. 588). Dizem os mesmos autores que “se o homem puder aprender a controlar sua própria consciência, através da combinação de antigas técnicas com a moderna tecnologia, estaremos entrando em uma nova idade cultural” .

A meditação lembra, ainda, a Terapia Morita (Chang, 1978) e implicações em áreas correlatas tais como a percepção do próprio Eu, um recurso para entender a consciência e o uso de processos subjetivos para controle mental. Infelizmente,

há poucas pesquisas significativas sobre tão fascinante campo e muitos métodos e técnicas são, apenas, comercialmente explorados.

Na segunda posição podem ser encontrados certos cultos e crendices com grande variedade de atuações físicas, materiais e espirituais; pode incluir superstições, magias e correlatos.

Embora a dimensão do transcendente em terapia não seja ignorada pela ciência psicológica, sua deturpação sob a forma de rituais exóticos é francamente questionada pelos riscos que a obsessão e a compulsão podem acarretar. Sacrifícios pessoais e atos anti-sociais podem ter origem em posições místicas inabaláveis. Muitos líderes carismáticos, atuando sobre pessoas emocionalmente imaturas ou em extremos graus de ansiedade ou sofrimento, podem converter-se em “agentes” de cura ou de solução de problemas. O culto de imagens, de pessoas vivas ou mortas, de gestos, de palavras e de hábitos, bem como as expiações deliberadamente impostas e deliberadamente aceitas, inclusive autotortura e flagelamento, em funções de certos “deuses” ou símbolos mágicos, é atuação comum notadamente em povos primitivos e nos habitantes marginalizados de grandes concentrações urbanas.

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Os sistemas com base na fé podem produzir curas, seja por efeitos sugestivos, seja por modificação biopsíquica resultante de redução de tensão, seja por outros fenômenos ainda não totalmente explicados. Neste grupo encontram-se toda sorte de ações, inclusive as que ocorrem em sessões espíritas.

Em uma terceira posição encontra-se um conjunto de fatos e de atuações na área da Parapsicologia e, a julgar pelos dados existentes até o momento, segundo a maioria dos autores, “os fenômenos parapsicológicos, na realidade, não passam de fenômenos psicológicos” (Ribas, in Amadou, 1969). Embora essa afirmação tenha certo conteúdo de verdade, não se pode negar a existência de outros fenômenos (as funções psi) que não se acham, ainda, suficientemente explicados pela psicologia comum ou científica.

É pensamento do autor que o aconselhamento e a terapia psicológica por procedimentos parapsicológicos enquadram-se, embora não nominalmente, na vasta gama de métodos e técnicas já conhecidos, principalmente nos procedimentos reflexolôgicos, comportamentais, persuasivos e sugestivos. Há que se admitir, todavia, a possível ocorrência de eventos que, embora possam se enquadrar no campo científico que conhecemos, ainda assim constituem áreas que precisam ser consideradas e investigadas.

Segundo Amadou, a utilidade da parapsicologia consiste em permitir melhor conhecimento da natureza psicológica e fisiológica do homem. “Se a psicologia profunda dá às manifestações paranormais o seu sentido pessoal e as recoloca no seu contexto individual, em compensação a parapsicologia enseja aos analistas não vaguearem acerca da interpretação de determinada manifestação paranormal e os habilita a compreender e a fazer compreender melhor ao paciente seu próprio inconsciente, permitindo-lhe que atue sobre ele” (Amadou, 1969). Em suma, não nos parece haver, até o momento, suficientes razões para se acreditar em métodos e técnicas exclusivamente parapsicológicas, com causas, procedimentos e resultados próprios de um novo sistema psicológico. Contudo, um estudo de procedimentos nessa área é indispensável.

Aconselhamento e terapia em processos de grupo

A literatura psicológica, em geral, cita Pratt como pioneiro do trabalho em grupo com finalidades profiláticas e terapêuticas, ao reunir tuberculosos, internos de um hospital, nos Estados Unidos, em 1905, e levá-los a discutir seus problemas de vida. Moreno, em 1920, é também citado e, especialmente, Kurt Lewin, ao propor, em 1947, os famosos “T-Group” (grupos de treinamento). Posterior mente surgiram inumeráveis proposições sobre o assunto e estudos sobre os processos grupais (Foulkes, 1951; Cartwright e Zander, 1953; Powdermaker e Frank, 1953; Glanz e Hayes, 1967; Rogers, 1970; Bion, 1974). Há grande variedade de alvos e de técnicas para aconselhamento e terapia em grupo e de grupo. Algumas formas de atuação têm objetivos claros e exclusivos; outros são semiconcentrados em determinadas áreas ou assuntos; outros, enfim, deixam a direção e o conteúdo dos assuntos a cargo do próprio grupo. Do ponto de vista da estrutura e da dinâmica

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grupal podem ser geralmente encontrados os seguintes estilos operacionais*:* Vide parte final do capítulo 51. Grupos orientados ou dirigidos, nos quais a discussão e as contribuições

dos participantes são concentrados pelo líder (monitor ou facilitador) em alguma

tarefa, sentimento ou atitude que constitua um alvo específico de interesse comum

do grupo ou de uma organização. Tais grupos geralmente se associam ao contexto

sócio-cultural ou ambiental e têm, na maioria das vezes, uma finalidade

psicopedagógica, isto é, visam desenvolver comportamentos considerados úteis ou

necessários;

2. Grupos de apoio ou de estímulo, destinados a encorajar e manter certas

atitudes e hábitos, bem como desestimular outros tais como o uso de drogas,

delinqüência, etc. São exemplos o A.A.A., para alcoólatras, o “synamon”, para

toxicômanos, os centros de valorização da vida e outros. Geralmente concentram-se

na solução de problemas específicos.

3. Grupos de livre iniciativa, dos quais os Grupos de Encontro são um exemplo, bem como certos tipos de comunidade terapêutica. Enfatizam a liberdade de expressão e de experienciação, a melhora das relações interpessoais e a redução de tensões.

Os grupos variam também quanto a sua composição, duração e instrumentação utilizada. Podem ser abertos (para qualquer pessoa, em qualquer momento) ou fechados (destinados a certas pessoas); podem ter duração ilimitada e não programada ou, ao contrário, obedecer a rígidos limites de datas, horários e locais; podem ser conduzidos em ambientes especiais ou não e podem utilizar apenas a verbalização, ou as posturas e a abordagem corporal, bem como leituras, atividades lúdicas, profissionais e de lazer ou entretenimento.

Todos esses estilos, sua fundamentação teórica e sua técnica são aplicados em diferentes situações tais como na terapia familiar, na terapia conjugal, na terapia profissional, na terapia infantil (combinada com a ludoterapia), na terapia de idosos, na terapia de doentes ou de pessoas segregadas nas prisões ou instituições sociais e assim por diante. Muitos dos processos grupais já adquiriram nomes próprios, tais como Psicodrama, A.A.A., Grupo de Encontro, etc.

Sabem todos quantos operam em grupos que os comportamentos em situação grupal podem ser muito distintos dos que ocorrem na relação diádica, entre terapeuta ou conselheiro e cliente. Embora possa parecer simples, mesmo em grupos não dirigidos, o trabalho do terapeuta, ou de dois ou mais terapeutas operando em conjunto, é um processo complexo. Em geral, os grupos são organizados e conduzidos (ou facilitados) de acordo com a fundamentação doutrinária a que se filiam seus condutores ou facilitadores. Há grande diferença de procedimentos, por exemplo, entre as ações manifestas ou conduzi das em um grupo liderado por um psicólogo comportamentalista e as decorrentes de um psicólogo de formação freudiana, adleriana ou rogeriana.

Além da diferenciação doutrinária que se caracteriza pelo tipo de verbalização, interpretação ou intervenção do terapeuta, há, ainda, que considerar

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dois alvos bem distintos: a) o grupo como alvo terapêutico e o grupo como agente terapêutico na pessoa. O grupo sempre representa uma dimensão social que envolve a. maneira como as pessoas se comunicam, como efetuam transações e interagem em geral. Pode haver, pois, uma concentração no plano coletivo, no grupo como um organismo ou, por outro lado, com a pessoa e com a forma pela qual responde ela à situação grupal. No primeiro caso temos a terapia de grupo; no segundo a terapia em grupo. .

Os efeitos das terapias em situação de grupo são difíceis de avaliar, dada a extrema variedade de casos e situações. Faltam dados concludentes sobre composição de grupos, sobre sua duração e característica metodológicas. A maioria dos autores concorda em que o grupo oferece apoio, estímulo e contacto com a realidade e, nesses aspectos, sobrepõe-se à terapia individual.

5 - A Revolução Rogeriana no Campo do Aconselhamento Psicológico

e da Psicoterapia

Síntese histórica

Não é fácil identificar as origens do movimento que, em orientação, aconselhamento psicológico e psicoterapia, marcaram as profundas mudanças conceituais e operacionais ocorridas nos meados do século em que vivemos. Os conceitos sociais se encaminhavam no sentido de valorizar o homem, a pessoa, seu ideais e seus direitos humanos e se verificava, paralelamente, em observações do comportamento dos clientes e dos terapeutas, que os métodos assistenciais para “desajustados “ para “ ansiosos” para “neuróticos” e até mesmo para “psicóticos”, vítimas de rótulos tradicionais, herdados da longa tradição psiquiátrica, atuavam melhor quando se respeitava as pessoas como elas são, quando se evitava dirigi-las ou impor normas de conduta. O sentido de liberdade do homem vem de longe e já a própria religião, na sua longa história, atribui ao homem a faculdade do livre arbítrio, sem o que o pecado e a virtude não teriam sentido. A antipsiquiatria e o existencialismo-fenomenológico (Laing, 1963) nos mostram o drama do ser humano pressionado por modelos e imposições sociais que o alienam e o conduzem a comportamentos tidos como anormais ou patológicos.

A procura de um alvo na vida e a auto-afirmação, como pessoa, o respeito aos interesses e ao estilo de vida de cada um parecem ter surgido, simultaneamente, em todas as esferas da atividade humana, como natural explosão de repressões acumuladas durante séculos. Passou-se de uma atitude impositiva, reflexo de uma ciência fragmentária que ditava valores e métodos, a uma concepção humanística na qual se colocava o organismo e a pessoa como entidades dominantes em função das quais os fatos psicológicos e a conduta são melhor

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explicados e compreendidos. Nesse contexto tomaram forma as idéias de Carl Rogers, a partir de seu revolucionário livro: Counseling and Psychoterapy: newer concepts in practice (Boston; H. Mifflin, 1942).

A repercussão das idéias rogerianas pode, pois, ter ocorrido por representar uma tendência que na época já germinava como, também, ser entendida como uma gigantesca descoberta no campo psicológico. É provável que, em certos limites, esses dois eventos tenham se agregado. E, como as novas idéias constituíram um meio assistencial de que antes não dispúnhamos ou que 'substituíam antigos e inaceitáveis conceitos operacionais, a elas nos dedicamos, como muitos psicólogos de todo o mundo. E, por esta razão, temos um capítulo todo especial deste livro.

Rogers descreve sua própria história e como se viu envolvido em métodos revolucionários no campo da Psicologia. Diz ele que por mais de trinta anos foi Conselheiro Pessoal ou Psicoterapeuta, tentando ajudar crianças, adolescentes e adultos,quer apresentassem problemas de estudos, de escolha de carreira, de vida matrimonial; quer fossem normais, neuróticos ou psicóticos (pois para ele esta última classificação indica, apenas, rótulos enganosos). Escreveu Carl Rogers vários livros e muitos artigos em revistas especializadas. Estes últimos ascendem a cerca de 140.

Rogers é psicólogo e dedicou-se, essencialmente, aos trabalhos de aconselhamento psicológico e psicoterápico, embora, na realidade, seja difícil distinguir onde terminam uns e começam outros. Seu interesse, como ele mesmo declara, prende-se ao sofrimento e à esperança, à ansiedade e à satisfação que se acham presentes na sala do conselheiro psicológico ou do terapeuta. Dirige-se às peculiaridades da relação que cada terapeuta desenvolve com seu cliente e, igualmente, aos elementos comuns que descobrimos em todas essas relações. Concentra-se nas grandes experiências pessoais de cada um de nós; no cliente que, no consultório, luta para ser ele próprio, ainda que com medo mortal de ser ele mesmo, tentando ver suas experiências como elas são, desejando vivê-las e, no entanto, profundamente temeroso do futuro.

Interessante é notar que Rogers defenda ardentemente os processos terapêuticos em que predominam a permissividade e a total ausência de julga. mento e de direção, com vida familiar, na infância e na juventude, marcada por disciplina rígida e árduo trabalho. Seus pais trataram-no e a seus irmãos como filhos queridos, embora controlassem, zelosamente, o comportamento de cada um. Nada de bebidas alcoólicas, danças, jogos de cartas ou teatro. A vida social era restrita ao mínimo e, em seu lugar, muito trabalho. A partir dos 12 anos, Rogers foi criado no meio rural onde, lendo e estudando agricultura, tomou contato com métodos científicos, grupos de controle e grupos experimentais e aprendeu, também, o quanto é difícil testar uma hipótese. Essas são suas próprias afirmações (Rogers, 1961). .

Rogers sentiu que estava se interessando por Psicologia quando começou a freqüentar cursos e conferências no Teachers College, da Columbia University, em Nova York. Ainda em fase de completar seus estudos, empregou-se como auxiliar numa clínica de crianças e, mais tarde, como psicólogo, em Rochester, Nova York. Aí

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passou 12 anos atendendo crianças delinqüentes e com problemas sócio-econômicos, enviadas, em geral por agências e pelos juizados de menores. Faziam-se diagnósticos e “entrevistas” de tratamento, nos quais a preocupação dominante era: “Será que dá certo?”; “Vale a pena?”. Vários casos de delinqüência ou de tendências anormais foram assistidos sem que se constatasse qual quer recuperação. Alguma coisa estaria errada ou ausente do trabalho psicológico. É quando começa a lhe ocorrer a idéia de que os clientes, e só eles, é que realmente sabem o que os traumatiza, que direções tomar, quais os problemas cruciais. Somente o cliente poderia, pois, oferecer a pista para o rumo a seguir.

Ao trabalhar na Universidade de Rochester, passou Rogers a alimentar dúvidas sobre se era ou não um psicólogo, pois essa instituição deixou bem claro que o trabalho por ele desenvolvido não era Psicologia. Seus contatos subseqüentes, porém, no ramo psiquiátrico e de serviço social e sua filiação à American Association of Applied Psychology, permitiram-lhe sentir-se mais à vontade no campo psicológico. Convidado pela Ohio State University, em 1940, após a publicação de seu primeiro livro, Clinical Treatment of the Problem Child (1939), começaram suas idéias a provocar discussões. Dois anos depois, em 1942, publicou seu mais famoso livro, Counseling and Psychotherapy, cujas vendas já ultrapassam a casa dos 70.000 exemplares. Com esse livro, inicia-se grande divulgação das idéias e técnicas que vieram transformar profundamente os procedimentos até então vigentes, principalmente no campo da orientação e da psicoterapia.

Em 1951, no livro Client-centered Therapy, expande Rogers suas idéias e analisa melhor várias situações do processo terapêutico, concluindo por apresentar uma teoria sobre a personalidade e o comportamento. Em 1961, publica On Becoming a Person, no qual insere, na mesma linha original, vários fatos e conseqüências como ele os vê, decorrentes de seus princípios.

Em 1965, com Kinget, escreve Rogers um livro extremamente prático sobre os procedimentos da terapia rogeriana, aproveitando parte de seus trabalhos anteriores. Em 1969, Rogers descreve seus métodos aplicados ao ensino e à educação. Em 1970, abordando o trabalho terapêutico com grupos, comenta Rogers os efeitos observados e as condições facilitadoras das mudanças operadas nos clientes. Sobre problemas matrimoniais relacionados com assuntos sexuais, escreve Rogers, em 1973, um livro em que expõe os sentimentos experimentados por casais face a algumas variações no modelo clássico de vida matrimonial. Outros livros se segui ram, inclusive A Pessoa como Centro, escrito em português com tradução e cooperação de Rachel L. Rosenberg, a qual, com o autor, organizou e dirigiu serviços psicológicos de orientação rogeriana na Universidade de São Paulo, a partir de 1967.

À vida profissional de Rogers é marcada, ainda, por várias posições profissionais, tais como as de professor da Universidade de Chicago, de 1945 a 1957, de professor da Universidade de Wisconsin, de 1957 a 1963, de membro diretor do Western Behavioral Sciences Institute, em LaJolla (.Califórnia), a partir de 1964, e, finalmente, de membro fundador do Center for Studies of the Person, na mesma cidade.

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Seus livros são marcos históricos na evolução e desenvolvimento de idéias humanísticas. Muitas destas acham-se insertas em conferências e artigos de revistas e jornais. Todo esse conjunto de conceitos e de orientação terapêutica tornou o método rogeriano muito conhecido e não menos discutido; passou a impregnar, direta ou indiretamente, as atuações dos terapeutas de todas as escolas; afetou os processos de orientação educacional e profissional e penetra, agora, no campo filosófico, desenvolvendo idéia sobre o ser humano, sua liberdade e suas possibilidades permanentes de vir a ser ele próprio.

Embora alguns terapeutas ainda se conservem alheios ou cépticos em relação ao método rogeriano, este progride mesmo no campo médico-psiquiátrico, abalando técnicas tradicionais de outras correntes e até mesmo da Psicanálise. Discípulos, colaboradores e seguidores existem em todos os países, inclusive no Brasil. Em nosso país, os estudos sobre o método rogeriano tiveram início nos cursos para formação de Orientadores Educacionais, sob a forma de disciplina teórica. Com a criação dos cursos de Psicologia, a divulgação do método, do ponto de vista teórico e prático, passou por grande desenvolvimento; Coube-nos a regência desses cursos na Universidade Católica de Campinas, em 1958-1960, na Universidade Católica de São Paulo, de 1960 à 1964, e a partir dessa data na Universidade de São Paulo. Neste última, um centro de aconselhamento psicológico, de orientação rogeriana, foi por nós criado em 1966, continuado, depois, por RacheI Rosenberg, Henriette Morato e outros colaboradores.

Idéias básicas e originais

As idéias de Rogers têm suas raízes em muitas e diferentes fontes, das quais a prática com clientes parece ser a mais significativa. Não obstante, e como ele próprio afirma, a terapia de Otto Rank, os trabalhos de Jessy Taft, de John Levy e de Frederic Allen são origens importantes. Dentre os modernos analistas, Horney poderia ser citada (Rogers, 1951).

Rogers declara que o desenvolvimento de seu trabalho não teria sido possível sem a apreciação dos impulsos inconscientes e dos complexos de natureza emocional que constituíram a contribuição de Freud. Embora seu trabalho tenha se desenvolvido de algum modo diferentemente dos pontos de vista terapêuticos de Horneye Sullivan, ou de Alexander e de French, mantém, todavia, muitas linhas de interconexão com essas modernas formulações do pensamento psicanalítico. Por outro lado, a psicologia da Gestalt teve, também, sua participação e, assim, outras correntes, de forma que a terapia centrada no cliente foi influenciada pelas teorias e técnicas atuais do campo clínico, científico e filosófico que se acham presentes em nossa cultura.

Segundo o próprio Rogers descreve (1942), os novos conceitos têm alvos completamente distintos dos anteriores. O indivíduo é o foco e não o problema. O objetivo é facilitar o “crescimento” do indivíduo e não resolver problemas específicos. É permitir que com maior independência e integração pessoais possa ele próprio, o cliente, enfrentar não só o problema presente como os do futuro, de forma mais

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adequada. Não consiste em fazer-se alguma coisa para o indivíduo ou induzi-lo a fazer algo; consiste, apenas, em liberá-lo para seu crescimento e desenvolvimento normal. Os conselheiros ou terapeutas são apenas facilitadores desse crescimento. Do problema o que importa são os aspectos emocionais e não os intelectuais. Salienta-se mais a situação presente que a passada. Os padrões emocionais de reação, aqueles que atuam no seu comportamento e que precisam ser considerados mais seriamente, apresentam-se tanto no passado como no presente. Finalmente, a própria entrevista psicólogo-cliente ou terapeuta-cliente é, em si mesma, uma experiência valiosa, uma experiência de crescimento. A conseqüência básica desses conceitos é que, ao contrário de muitas outras correntes, os alvos a atingir são os mesmos para todos os clientes, pouco significando se se trata de um jovem com dificuldades de escolha de carreira, de alguém com distúrbios psicossomáticos ou de pessoa com dificuldades matrimoniais.

Poder-se-ia afirmar que a técnica de Rogers foi bem aceita porque, de certa

forma, libertou muitos psicólogos e orientadores da angústia gerada pelo fato de não

saberem o que fazer com os clientes. Afeitos ao diagnóstico, mas não a medidas

para intervir no comportamento, vinham os conselheiros em busca de algo que lhes

sugerisse uma forma de atuar sobre o cliente, de intervir no seu comportamento com

vistas à recuperação, ao desenvolvimento ou à cura. Rogers ofereceu uma solução a

esse crucial problema, dando-lhes um instrumento de trabalho, permitindo que se

transpusesse o profundo fosso entre o diagnóstico e a assistência efetiva esperada

pelo cliente ou por seus responsáveis, como assinalamos no Capítulo 1

O caráter marcante do método é a clássica não-diretividade, embora muitos

psicólogos questionem essa posição e a vejam como utopia ou algo inoperante. Em

verdade, o não-diretivismo de Rogers não é tão inconciliável quanto parece com

outros métodos. Pesquisas diversas mostram ser possível utilizar uma combinação

de técnicas em benefício do cliente (Barros Santos, 1970, 1972).

Além de sua contribuição doutrinária, baseada em experiências

assistemáticas iniciais com centenas de casos, abriu Rogers as fronteiras das

entrevistas individuais, gravando-as e estudando-as. Iniciou uma nova era na

investigação sobre o que ocorre nas sessões terapêuticas tentando, com os poucos

recursos disponíveis, introduzir julgamentos e avaliações por critérios que não

fossem só os do terapeuta envolvido nas sessões. Em conseqüência, pesquisas e

experimentos dos mais variados tipos, sobre os fenômenos que surgem na relação

psicólogo-cliente, são hoje possíveis.

O método rogeriano, inicialmente absorvido por técnicas de diálogo na

entrevista, vem evoluindo em face do acúmulo de dados colhidos pelo seu criador e

por seus seguidores. As bases continuam, porém, as mesmas, ou seja:

1. O diagnóstico anterior ao tratamento é dispensável. O comportamento psicológico inadequado é caracterizado por tensões que dificultam respostas

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adaptativas. Reduzir as tensões para que o indivíduo manipule seus recursos

pessoais é a orientação básica, qualquer que seja o problema enfrentado pelo

cliente.

2. O indivíduo tem tendências pessoais, próprias, de auto-realização. O trabalho do terapeuta é libertar o indivíduo das barreiras psicológicas que impedem esse crescimento. Para tanto, deve criar uma atmosfera isenta de pressões, críticas ou direção, na qual as forças construtivas são liberadas.

3. Os conceitos e as imagens que o indivíduo faz de si e dos outros pautam-se pelo esquema fenomenológico. O mundo é, para ele, aquilo que ele sente. Durante o processo de tratamento, psicólogo e cliente tornam-se capazes de reconhecer o que representa para este o conceito de si mesmo e como se sente em face dessa imagem de si mesmo. No tratamento bem sucedido, essa imagem e os sentimentos que a acompanham são modificados; as percepções se tornam mais flexíveis; os sentimentos podem ser diferenciados e as experiências simbolizadas adequadamente.

4. A tarefa do terapeuta concentra-se, principalmente, em atitudes. Veremos, mais adiante, como o próprio Rogers descreve essas atitudes básicas como condições para modificações construtivas da personalidade.

5. O psicólogo não dá conselhos, informações ou apoio, nem interpreta. Como facilitador, reflete e vi vencia tanto quanto possível os sentimentos do cliente. Este deve sentir as relações entre seus problemas e sua experiência passada e presente. Estas, sentidas e simbolizadas, assim como planos de ação e tentativas de ajustamento, emanam naturalmente do cliente, sem qualquer atuação direta, nesse sentido, por parte do psicólogo. O indivíduo recompõe suas percepções e a vivência de seus sentimentos.

Embora a compreensão do pensamento rogeriano seja relativamente fácil, não o é sua aplicação orientadora ou terapêutica. Alguns a confundem com uma permissividade equivalente ao endosso ou aprovação de comportamentos social ou pessoalmente prejudiciais; outros, com uma excessiva neutralidade que conduziria a um relacionamento “frio e distante”; outros, ainda, com uma superficialidade de tratamento.

É usual nos clientes, nos seus pais ou responsáveis e no próprio público a expectativa de que a orientação inclua sugestões, indicações, lembretes, informações e conselhos. Se é verdade que em certos casos tais procedimentos são válidos, na maioria das situações essas técnicas são inócuas ou, às vezes, prejudiciais. Se tais conselhos fossem úteis na modificação do comportamento, a conduta humana poderia ser facilmente modificada; os delinqüentes poderiam ser recuperados com bons conselhos; os doentes mentais poderiam ser tratados com informações e indicações que lhes mostrassem e indicassem comportamentos “normais”; as situações de ansiedade e de dúvida poderiam ser resolvidas com informações adequadas.

Infelizmente muitos orientadores, e mesmo psicólogos, supõem que recomendações e advertências são sempre necessárias. Acreditam que se deva “fazer alguma coisa pelo cliente” e confiam nos seus informes e sugestões como

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sendo um produto concreto e final de sua atuação. Muitos desses profissionais assim agem por ignorância dos processos psicológicos, outros porque emocionalmente sentem necessidade de dirigir e guiar, outros, enfim, porque se sentem ameaçados pela crítica do cliente quando este não recebe indicadores concretos e objetivos. Para reduzir suas próprias tensões, acabam dando conselhos ou atuando de forma paternalista com a impressão de que assim agindo atuaram corretamente.

Manipular as expectativas do cliente, dos pais, de professores e de outros elementos envolvidos na orientação do caso não é fácil. Requer profunda habilidade psicológica do facilitado r no sentido de demonstrar suas técnicas de atuação e de levar o cliente a obter os efeitos desejáveis. Informar, previamente, o cliente sobre a maneira de agir seria incorrer na mesma falha; dizer-lhe que não há recomendações, sugestões ou conselhos pouco ou nada adiantaria. Precisa o cliente sentir, por si mesmo, a forma de atuar do facilitador, orientador ou do psicólogo, não no sentido de que a responsabilidade das decisões lhe pesará agora mais do que antes, mas no clima em que os problemas serão evocados e juntos - cliente e conselheiro - vão ambos senti-los e estudá-los sem pressões ou soluções externas.

É tão grande a expectativa de “guias” e “direções”, “resultados” e “pareceres” , que a maioria dos clientes se refugia nesses dados de forma profunda, não obstante eventuais informações do conselheiro sobre o procedimento a adotar. Podem os clientes sentir-se logrados, insatisfeitos, desgostosos com as atitudes de conselheiros contrárias a essas expectativas. Essa frustração pode durar uma ou mais sessões e pode levar muitos clientes a pensarem que o orientador ou nada sabe ou é um charlatão. Todavia, se as sessões psicológicas forem adequadamente conduzidas, esse sentimento desaparecerá facilitando opções ou mudanças construtivas.

Rogers, em vários de seus trabalhos, discute as condições que, no seu entender, facilitam o desenvolvimento psicológico e, em conseqüência, seu ajustamento ou sua recuperação. Inicialmente, diz Rogers, (e isto é comprovado por pesquisas) os “terapeutas, que realmente ajudam seus clientes, manifestam algo de comum entre si. Essa verificação, como era de prever, demonstrou notável interesse em todos os campos terapêuticas. A hipótese original é a de que modificação da personalidade do cliente ocorre não em virtude da qualificação profissional do terapeuta; não por causa de seu treinamento ou filiação doutrinária; não por motivo de suas técnicas de entrevista; não por ser hábil em interpretar, mas, essencialmente e somente, por causa de certas características de atitude que se formam na relação com o cliente” (Rogers, 1965b).

Os clientes aparecem para terapia com uma desconcertante variedade de

problemas e uma enorme gama de características pessoais; enfrentam os

terapeutas, que, de Outro lado, demonstram larga diversidade de vistas com relação

ao que será útil como terapia exibindo, também, diversas características de

personalidade no contato com seus clientes. Todavia, subjacente a toda essa

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diversidade, parece ser possível distinguir um processo básico no relacionamento

que permite a ocorrência de alterações terapêuticas ou construtivas na

personalidade do cliente.

As condições terapêuticas essenciais

Rogers (1957) concentrou suas preocupações em torno das atitudes que

devem ser desenvolvidas se quisermos, realmente, promover alterações benéficas

na personalidade do cliente. Três condições são necessárias por parte do psicólogo

ou terapeuta*:

* Grande parte deste capítulo contém frases e expressões do próprio Rogers,

transcritas pelo autor com pequenas alterações. As três condições básicas

apresentadas em 1957 são repetidas, posteriormente, em outros trabalhos

a) Congruência e autenticidade

É a relação genuína e sem fachada. O terapeuta é o que é, plenamente aberto

aos sentimentos e atitudes que “naqueles momentos fluem nele próprio”. E chamada

de congruência e significa, também, que o terapeuta é capaz de dispor dos

sentimentos que nele próprio ocorrem, acessível à sua percepção e apto a

comunicá-los, se necessário. Não se nega a si mesmo.

A congruência é maior na medida em que ele, terapeuta, seja capaz de ouvir,

com plena aceitação, o que ocorre em si mesmo e de vivenciar, sem medo, a

complexidade de seus sentimentos.

Na vida diária sentimos essa situação. Há pessoas que nunca são elas

mesmas; operam sob uma máscara ou fachada: dizem coisas que não sentem, são

incongruentes e dificilmente com elas nos abrimos. Confiamos, porém, naquelas que

são o que são, sem a fachada de polimento ou de profissão.

Diz Rogers que tem sentido uma confirmação clínica e experimental dessa

hipótese. Os terapeutas melhor sucedidos no lidar com clientes não-motivados,

resistentes, doentes crônicos, pobremente educados, são os que, antes de tudo, são

reais; que reagem de uma forma genuína, que exibem essa autenticidade e que são

assim percebidos pelo cliente. Ser congruente pode significar, às vezes, exprimir

aborrecimento, preocupação ou frustração no relacionamento com o cliente, mas de

forma tal que este sinta que isso parte do próprio terapeuta e não dele, cliente. Eis

por que técnicas psicoterápicas tão diversas podem ser efetivas na medida que haja

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essa condição de congruência, ainda que atingida de maneira diversa (Rogers,

1965b ).

b) Consideração positiva incondicional

Esta segunda condição significa estar o psicólogo ou terapeuta vivenciando atitudes positivas de aceitação e de calor humano para com o cliente. Envolve a genuína boa vontade do terapeuta para com tudo que se passa na relação com o cliente, seja medo, confusão, sofrimento, orgulho, cólera, ódio, amor ou coragem. O terapeuta vê o cliente como um ser com potencial e reações humanas. Preza o cliente de um modo tal que não aprova, nem reprova. É o sentimento positivo, sem reservas e sem julgamento.

Rogers diz que não se precisa ser profissional para sentir a efetividade dessa atitude. Menciona, como exemplo, o caso de Gladys, hospitalizada como psicótica durante muitos anos e que começou a melhorar quando uma família começou a recebê-la em sua casa, sem se importar com seus defeitos, aceitando-a sem julgá-la, criticá-la ou guiá-la. Disse Gladys certo dia: “Eles (a família) me ajudaram mais do que qualquer médico. Naturalmente os médicos ajudam também. Mas eles agüentaram mesmo quando eu lhes era desagradável e dizia coisas que não devia” (Rogers, 1965b).

O exemplo não é uma história incomum. Muitos casos se lhe assemelham. O significativo, porém, é que, pouco a pouco, o amor, o carinho, sem tutela ou guia, por essa jovem, transformou uma alucinada psicótica em alguém com boas possibilidades de sucesso fora do hospital. O casal que a aceitou deixou claro à cliente que eles a compreenderiam ainda que seu comportamento fosse estranho ou denotasse rejeição. Foi um respeito positivo incondicional que, gradualmente, modificou sua vida e sua personalidade. É essa uma das atitudes que torna efetivo o terapeuta.

c) Compreensão empática do cliente

Significa ter o terapeuta senso do .mundo interno e das significações pessoais do cliente como se fosse, ele próprio, seu próprio mundo, mas sem perder esse “se”. Sentir sua cólera, seu medo ou seus sentimentos de perseguição como se fosse ele mesmo e, entretanto, sem que o terapeuta se sinta completamente envolvido por eles. Quando o mundo do cliente é claro ao terapeuta, este pode mover-se nele livremente, podendo comunicar sua compreensão do que já é conhecido ao cliente e falar, também, dos significados das experiências pessoais que o próprio cliente pouco percebe.

Este tipo de empatia é extremamente raro. Não recebemos nem oferecemos tal atitude com grande freqüência. Em seu lugar, costumamos dizer mais ou menos assim: “entendo o que está errado com você” ou “entendo porque você age dessa maneira”. Tais compreensões envolvem julgamentos. Quando porém, o cliente sente

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que alguém entende seus sentimentos, sem desejar analisá-los ou julgá-los, pode florir e crescer nesse clima. Quando o terapeuta pode perceber o que se passa de momento a momento, no mundo interno do cliente, como este vê e sente, sem perder sua própria identidade, nesse processo de empatia, então a modificação é possível de ocorrer.

A menos que o cliente já tenha percebido as atitudes do terapeuta, acima descritas, é necessário que a transmitamos de alguma forma, pois só assim a autenticidade, a aceitação e a empatia podem produzir ou facilitar as modificações desejáveis. Esta é a condição por parte do cliente.

A hipótese essencial segundo Rogers

Rogers repete que a modificação construtiva da personalidade surge somente quando o cliente percebe a experiência, no clima psicológico, de sua relação com o terapeuta. Os elementos desse clima não consistem em conhecimentos, treinamento intelectual, orientação doutrinária em psicoterapia ou em técnicas especiais. São sentimentos ou atitudes que devem ser experimentados pelo terapeuta e percebidos pelo cliente.

Outro aspecto da hipótese é que ela pode ser verificada através dos termos em que foi formulada, de modo a se descobrir até que ponto as qualidades previstas no relacionamento terapeuta-cliente são ou não fatores causais na produção das alterações previstas pela psicoterapia. .

Rogers reconhece que suas idéias e atitudes são extremamente criticáveis e que os outros também as vêem desse modo. As hipóteses, porém, quando colocadas em termos operacionais, permitem o recurso aos fatos para verificar se são verdadeiras, falsas ou parcialmente verdadeiras.

Empiricamente, as hipóteses foram testadas de várias maneiras:

a) Estudos de Halkides (Hart e Tomlinson, 1970), referentes à análise da conversação entre cliente e terapeuta, revelaram ser as três condições (congruência, consideração positiva incondicional e empatia) associadas aos casos melhor sucedidos sob o ponto de vista terapêutico. Por outro lado, a intensidade emocional das expressões dos clientes não se correlacionou, significativamente, com as outras condições ou com o grau de sucesso.

b) Barret-Lennard (Rogers, 1965), utilizando-se de um inventário dirigido ao cliente e ao terapeuta, para pesquisa da maneira pela qual um e outro percebiam a relação terapêutica, concluíram o seguinte:

1. Os clientes que mostraram melhor alteração terapêutica perceberam

melhor as atitudes propostas por Rogers;

2. A correlação entre a percepção, pelo cliente, das atitudes propostas e o

grau de alteração foi maior do que a correlação entre a percepção do terapeuta e o

mesmo grau de alteração. Tais dados significam que o mais importante é o fato de o

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cliente perceber a autenticidade, o respeito e a empatia manifestados pelo

terapeuta;

3. A percepção das atitudes propostas ocorre com mais facilidade nos

terapeutas mais experientes e nos clientes menos desajustados.

c) No que se refere à psicoterapia com esquizofrênicos, Rogers verificou que:

1. Os esquizofrênicos percebem as atitudes propostas em nível muito mais

baixo do que os neuróticos;

2. Na medida em que o esquizofrênico percebe as atitudes, melhores são aspossibilidades para uma ação terapêutica;

3. Quanto maior for o grau de empatia e de congruência, tanto maior será o

índice de interação do cliente com outras pessoas;

4. Os clientes envolvidos por essas atitudes-demonstram maior grau dealterações construtivas da personalidade e, ainda mais, os que participam de umarelação terapêutica pobre em compreensão empática demonstram agravamento desua patologia esquizofrênica.

Outros trabalhos e pesquisas, citados por Rogers ou por outros psicólogos e

psiquiatras, embora não possam ser concludentes, quer pelo reduzido número de

casos, quer pelo esquema operacional com que se tratou a hipótese, são dados

informativos análogos aos que, habitualmente, se coleta na Medicina e em outras

áreas. A dificuldade de se medir modificações emocionais é de todos conhecida e

constitui o mais sério entrave a qualquer pesquisa nesse campo (Truax e Carkhuff,

1970).

Os primeiros estudos realizados, dos quais apenas alguns foram

citados,demonstraram, segundo Rogers, que:

1. É possível estudar as relações entre causa e efeito em psicoterapia. E, se

as conclusões se confirmarem, havemos de pensar que, realmente, o que

caracteriza a psicoterapia são as atitudes do terapeuta, ou seja, o clima psicológico

que este cria;

2. É possível prever, com certa base nos fatos, que a relação percebida pelo

cliente como sendo de alto grau de congruência ou autenticidade do terapeuta, de

sensível e acurada empatia, de alto grau de consideração, respeito e estima e de

sua aceitação incondicional, terá grandes possibilidades de tornar-se uma efetiva

relação terapêutica. Isto se aplica tanto a neuróticos que procuram o psicólogo por

sua' própria iniciativa, como também àqueles que não apresentam desejo

consciente de ajuda;

3. A relação terapeuta.cliente, tal como existe fenomenologicamente, apresenta associação significativa com a mensuração objetiva das alterações ocorridas no cliente. Seria o caminho para uma ciência das experiências internas, a

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medida das pistas ou das reações que conduzem ao mundo subjetivo do cliente;4. Julgando-se o relacionamento que se estabelece entre terapeuta e cliente,

pode-se prever se os contatos estabelecidos serão ou não produtivos;5. Desejando-se especialistas eficientes em seu relacionamento, devemos

nos concentrar menos no estudo do comportamento anormal, teorias psicoterápicas, teorias da personalidade, treinamento no diagnóstico e mais em dois grandes objetivos:

I) selecionar previamente os futuros psicólogos e psiquiatras que tenham asqualidades potenciais aqui descritas como necessárias ao terapeuta;

II) realizar programas de formação educacional de sorte que as pessoasassim selecionadas desenvolvam suas qualidades.

Infelizmente, diz Rogers, os programas atuais de Psicologia ou de Psiquiatria agem em sentido contrário, dificultando ao psicólogo ser ele próprio, sobrecarregando-o com uma bagagem teórica que o torna menos apto a entender o mundo íntimo de outra pessoa. O essencial não são os conhecimentos técnicos, mas as qualidades pessoais do terapeuta; não o que ele conhece, mas o que ele vivencia.

A dinâmica do processo

Diz Rogers (1961), “mas o que faz a pessoa mudar para melhor, quando durante um certo período mantém contato com um terapeuta que aplica as condições previstas?”

Respondendo, diz que as reações do cliente são uma recíproca das atitudes do terapeuta. Primeiramente, como o cliente encontra alguém que ouve, em atitude não-crítica a seus sentimentos torna-se, pouco a pouco, apto a ouvir a si próprio. Começa a receber comunicações de dentro de si mesmo; percebe que está zangado; reconhece quando se acha amedrontado ou, apesar disso, corajoso. À medida que se torna mais aberto ao que ocorre em si mesmo, passa a ouvir os sentimentos que antes negava ou reprimia. Passa a perceber os sentimentos que lhe pareciam tão terríveis, desorganizadores, anormais ou vergonhosos e que, anteriormente, não fora capaz de reconhecer. Enquanto aprende a ouvir a si mesmo, torna-se capaz de aceitar-se melhor. Expressa, cada vez mais, os aspectos desagradáveis e escondidos de si mesmo. Lentamente, ao verificar as atitudes de consistência e de consideração positiva e incondicional do terapeuta, passa a tomar as mesmas atitudes para consigo, aceitando-se e reconhecendo-se tal como é e, portanto, pronto a mover-se para frente, no processo de amadurecimento. Sente-se capaz de retirar as fachadas que tem usado, eliminar certas defesas e abrir-se ao que realmente é.

O cliente, ao passar por esse processo, move-se em um continuum. Vai do

estado no qual os sentimentos são irreconhecíveis, impessoais, inexpressos, para

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um fluxo no qual cada sentimento é experienciado no momento, percebido, aceito e

adequadamente expresso. Inicialmente, o cliente está distante de sua própria

experiência. Um exemplo bem claro é o das pessoas que intelectualizando- falam

sobre si mesmas de forma abstrata, deixando quem as ouve sem saber o que se

passa nelas mesmas. Dessa distância, move-se o cliente para uma experiência

imediata, na qual vive abertamente essa mesma experiência e começa a saber que

pode voltar a seus sentimentos e descobrir seu significado.

O processo envolve uma liberação dos mapas cognitivos da experiência.

Partindo de experiências construídas de forma rígida, percebidas como fatos

externos, dirige-se o cliente para uma situação moldável que se constrói e se revê a

cada nova experiência. O processo, portanto, move-se da fixação, distância, rigidez

de autoconceito, alheamento a pessoas, impersonalismo de funcionamento a um

estado de maior fluidez, permeabilidade, imediatismo de sentimentos e de

experiência, aceitação destes e descoberta de um “eu” que muda como fruto das

experiências que se vêm modificando. Surge maior realidade e estreitamento de

relações e uma unidade e integração de funcionamento.

Evolução das idéias: o experienciar e as atuações em grupo

De acordo com alguns autores (Hart e Tomlinson, 1970; De La Puente, 1970, Forghieri, 1972), a primeira fase da contribuição rogeriana estende-se de 1940 a 1950, caracterizada pela ênfase na não-diretividade e pela criação de uma atmosfera permissiva, pela aceitação do cliente e pela preocupação com a clarificação de seus sentimentos. As técnicas de entrevistas são estudadas; o diálogo tipo “espelho”, repetição das expressões do cliente, é exemplo de intervenção; as atitudes do terapeuta são dirigidas no sentido da promoção da catarse, do insight e das ações positivas por parte do cliente. O marco desta fase é estabelecido pelo livro de Rogers, Counseling and Psychotherapy (1942).

A segunda fase situa-se, aproximadamente, entre 1950 e 1957, surgindo sob a forma de conceitos teóricos mais profundos e por uma atuação terapêutica mais sistematizada. O livro Client-centered Therapy, publicado por Rogers em 1951, e o livro Psychotherapie et Relations Humaines (1965), com a colaboração de Kinget, são exemplos típicos desta fase. Neste momento Rogers passa a dar maior atenção aos aspectos emocionais do que ao conteúdo verbal das expressões do cliente. A reflexão dos sentimentos passa a ser a forma característica de atuação terapêutica em lugar da repetição e da clarificação de sentimentos. O terapeuta procura captar o sentimento subjacente à expressão do cliente e vivenciá-lo como se fosse ele

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próprio, comunicando ao cliente essa sua percepção. É no final desse período que Rogers (1957) menciona as condições necessárias e suficientes para psicoterapia e que constituem até hoje uma das orientações básicas do esquema rogeriano: a congruência, a consideração positiva incondicional e a empatia. Nesse mesmo período, Rogers elabora uma teoria da personalidade, constituída de 19 pontos essenciais e que, segundo ele próprio afirma, podem servir para explicar os fenômenos da organização ou da desorganização da personalidade, mas pouco interessam na efetiva atuação do terapeuta (Rogers, 1951).

Na década de 60, inicia-se uma terceira fase caracterizada pelo modelo experiencial, através do qual se procura atingir os núcleos emocionais do cliente. Experienciar é um constructo que se refere mais à maneira como decorrem os fenômenos que compõem a experiência do que ao conteúdo desta. A nova expressão, devida a Gendlin (1961), é incorporada por Rogers ao vocabulário e à ação terapêutica. Definir o experiencing não é fácil. Parece-nos ser possível, entendê-lo como vivência conceitual, isto é, como percepção, pelo indivíduo, dos conceitos que já possui, de seu simbolismo, de seus significados pessoais e das relações entre o que ele expressa e o sentido subjetivo, interno, pessoal, do que deseja expressar.

A orientação geral desse novo período encontra-se, parcialmente, no livro de Rogers, On Becoming a Person, de 1961. Posteriormente, ao procurarem os rogerianos atingir clientes não motivados ou de difícil comunicação, dentre os quais muitos psicóticos, novas vias de relacionamento foram tentadas e novas técnicas de atuação terapêutica surgiram. Estas passam a incluir, dentro do experienciar, algumas intervenções antes consideradas inoperantes ou inadequadas. Perguntas, expressão de sentimentos e de opiniões podem ser incluídas na medida em que elas atuem no mundo subjetivo do cliente. O clima de não-diretividade é mantido, assim como as condições de congruência, de calor humano, de consideração positiva incondicional e de empatia. Algumas intervenções, como a simples repetição, e a reflexão de sentimentos não são tão usadas, a menos que atinjam a vivência conceitual do cliente.

As alterações ocorridas no método rogeriano não alteram as concepções básicas que lhe deram origem. Constituem um aperfeiçoamento na forma de atuação com os clientes, como produto da grande experiência acumulada no atendimento de novos e variados casos. Rogers, em diálogo mantido com Hart (Hart e Tornlinson, 1970) e com Evans (1975), menciona muitos dos pontos cruciais de seu procedimento anterior e atual, por nós aqui sumariados e interpretados:

- O Rogers de outrora e o Rogers de hoje podem ser vistos como pessoas diferentes, .na medida em que eu, diz Rogers, como meus estudantes ou seguidores, movemo-nos para frente. É próprio do método permitir esse crescimento e diferenciação.

- Há casos nos quais se pode verificar que a orientação centrada no cliente em nada mudou; há outros, porém, que podem acusar drásticas mudanças. Permanece inalterado o conceito de que o “indivíduo tem dentro de si uma capacidade - que pode ser liberada sob condições adequadas para entender a si próprio, para conduzir sua própria vida, para lidar com problemas de sua vida ou

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para mover-se no sentido de um maior grau de auto-realização”. O respeito à dignidade e aos direitos do indivíduo conjuntamente com a idéia de sua capacidade própria são dois aspectos que jamais mudaram.

- O contato com esquizofrênicos internados, como também com indivíduos chamados “normais”, dentre os quais educadores, executivos, pessoas diversas da comunidade e o trabalho em grupo produziram muitas inovações, particularmente devidas a Gendlin, Hart e outros, como ao próprio Rogers. Sente este, conforme suas próprias expressões, desejo de exprimir abertamente seus próprios sentimentos, como recurso para a outra pessoa usar, não como guia ou imposição. “Se eu estiver zangado, poderei expressar esse sentimento como algo dentro de mim, não como um julgamento sobre a outra pessoa”. Há mais liberdade. em exprimir sentimentos pessoais em relação ao que o cliente disse ou fez. Torna-se o terapeuta, de certa forma, um participante da sessão, expressando problemas e preocupações todas suas. Somente quando o cliente luta.por achar-se a si próprio, procura o terapeuta exprimir os sentimentos de empatia que experiência. Nesses momentos, o trabalho de grupo assemelha-se à terapia individual, onde se cria a atmosfera que permite à pessoa explorar a si própria. Noutras vezes, o terapeuta interage sob muitas formas.

- As primeiras preocupações rogerianas reduziam-se às técnicas de atuação, o que se encontra bem explícito no livro Counseling and Psychotherapy. No livro Client-centered Therapy, ao lado de uma formulação teórica, concentra Rogers sua atuação nas intervenções de tipo empático. Em- seus artigos sobre as condições necessárias e suficientes em psicoterapia e sobre o processo que nela se observa, fixa Rogers pontos direcionais mais precisos e de mais ampla aplicação. O desenvolvimento de grupos de encontro tem sido uma conseqüência natural dessas novas direções ou, provavelmente, a causa de inovações. Nesses grupos várias formas de expressão são encontradas, seja através da arte, do movimento corporal, da verbalização. São exemplos de luta contra alienação, da melhor exploração de si próprios, do encontro de maior sentido nas relações com os outros. A experiência intensiva em grupo é uma das grandes descobertas da atualidade.

- O comportamento do terapeuta assume diferentes formas de intervenção, das quais expressar opiniões, expressar sentimentos e propor questões são alguns exemplos.

- As atitudes do terapeuta, mais do que suas técnicas, são essenciais ao início e à manutenção de uma relação terapêutica eficaz. A congruência, a consideração positiva incondicional e a compreensão empática são atitudes essenciais.

- A flexibilidade do comportamento do terapeuta “é estruturada dentro do fenômeno do experienciar. As respostas do terapeuta são baseadas seu próprio e imediato experienciar na relação, sendo dirigida para o processo subjetivo do cliente”. O seguinte trecho de diálogo, que nos foi enviado por Rogers em 1967, mostra um exemplo de um trecho da verbalização ocorrida entre o terapeuta e um cliente não-motivado, com sérios distúrbios psicológicos:

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T - Creio que seu silêncio significa que ou você não queria ou não podia ter

vindo agora. Está certo; não há problema. Assim, eu não vou incomodar você, mas

apenas quero que você saiba que estou aqui.

(Longo silêncio de 17 minutos.)T - Acho que daqui há pouco teremos de suspender nosso encontro.(Breve silêncio.)T - É difícil para mim saber como você tem se sentido. Parece-me que

talvez você prefira que eu não saiba como você se sente. De qualquer forma,

parece que, às vezes, é melhor a gente descansar... e relaxar os músculos. Mas,

como lhe disse, eu realmente não sei como você se sente. É a única coisa que

tenho para lhe dizer. A vida tem sido dura ultimamente?

(Breve silêncio.)T - Talvez esta manhã você preferisse que eu ficasse quieto. .. e, talvez

fosse melhor, não set; entrar em contato com você de algum jeito.

(Silêncio de 2 minutos - o cliente boceja.)T - Você parece desanimado ou cansado.(Silêncio de 40 segundos.)C - Não, somente chateado.T - Tudo é chato, hein? Você se sente chateado?(Silêncio de 40 segundos.) .T - Quer voltar sexta-feira, às 12 h, como sempre?C - (Boceja e diz qualquer coisa de forma ininteligível.)

(Silêncio de 48 segundos.)T - É uma espécie de chateação, na qual a gente se afunda. Sentimentos

chatos, hein? É alguma coisa assim?

C - Não.

T - Não?

(Silêncio de 20 segundos.)C - Não. Nunca fui bom para ninguém, não sou e nunca serei.T - Sente isso agora, hein? Que você não é bom para você, não é bom para

ninguém. Nunca será bom para ninguém. Completamente sem valor, hein? Essessão realmente sentimentos chatos. Você se sente sem valor nenhum, não é?

C-É. É aquilo que o sujeito que foi comigo para a cidade me disse outro dia..

T - Essa pessoa que foi com você à cidade realmente falou-lhe que você não serve para nada? É isto que você está dizendo? Será que ouvi direito?

C-É.T - Acho, se entendi direito, que aí há alguém que significa algo para você; o

que ele pensa de você, porque ele disse que você não serve para nada e tocounum ponto sensível.

(O cliente chora, quieto.)

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T - E isso faz você chorar.C - Eu não me incomodo.T - Você diz a você mesmo que não se incomoda; mas eu penso que parte

de você se incomoda, porque alguma parte de você chora...

A terapia centrada na pessoa, expressão que substitui a anterior (centrada no cliente), vem se desenvolvendo intensamente com contribuições de muitos psicólogos. Dentre estas destaca-se o expenrenciar, ou a experienciação que, como vimos (Gendlin, 1961, 1978), corresponde a um fenômeno presente no processo terapêutico. Trata-se de uma percepção do sentido que os eventos têm para a vida subjetiva da pessoa. É uma ”interação entre sentimentos e símbolos (atenção, palavras, fatos) tal como a vida corporal é uma interação entre corpo e ambiente” (Hart & Fomlinson, 1970). Experienciação é um processo percebido através de sensações concretas, físicas e psíquicas, de dados eventos, de seu desenrolar e de seu sentido para a pessoa. Seria, a nosso ver, um fenômeno física e mentalmente sentido. Uma vivência conceitual em que a pessoa, nesse momento, enfoca uma colocação nova ou reexplica para si mesma o que estava tentando descrever, verbalmente ou não. É um momento de movimento interior, de dentro para fora, em que as coisas se arranjam, se esclarecem e tomam sentido.

A experienciação nem sempre traz como conseqüência um ajustamento ou solução de problemas. É, porém, um passo que permite à pessoa o encontro de si mesma, pois a simples tomada de consciência das experiências não é, por si só, uma expressão de melhora. O que importa é a “disponibilidade destas à consciência” (Puente, 1979). A terapia experiencial passa a ser um passo adiante.

As idéias de Rogers evoluíram, também, para a direção grupal, sem menosprezar o contacto entre duas pessoas e a relação diádica em que terapeuta e cliente, como pessoas, se envolvem no experienciar. Os grupos de encontro e as comunidades surgem como formas de convivência e de terapia em que as pessoas possam expressar-se livremente e assim liberar a tendência atualizante presente em cada uma delas.

Na terapia de grupo centrada na pessoa, Wood (1980) lembra a existência de três situações: a) o grupo de duas pessoas; b) o pequeno grupo, de 8 a 12 pessoas;

c) O grande grupo ou comunidade de aprendizagem, de 100 a 250 pessoas. Esse mesmo autor resume as tendências de meio século de observações e de pesquisas; salienta que "o fundamento da teoria de terapia de grupo centrada na pessoa é a tendência formativa do universo" cujo teorema seria:

"Quando pessoas (algumas chamadas, às vezes, terapeuta, facilitador, promotor, e algumas chamadas cliente, membro do grupo, participante) trazem uma certa disposição para o seu encontro, à tendência formativa é permitido reorganizar capacidades mais complexas e percepções nos indivíduos e no conjunto.”

Esta disposição na pessoa chamada terapeuta é caracterizada pela habilidade para traduzir facilmente sentimentos em idéias e idéias em sentimentos, para ser congruente no relacionamento com os outros, para experienciar

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consideração positiva incondicional para com os outros e para experienciar uma compreensão empática do referencial interno dos outros e segui-lo intuitivamente sem um "entendimento”, obrigatório. Caracteriza-se, a seguir, pela capacidade para viver no momento, na incerteza e mesmo na dúvida, para seguir intuitivamente as expressões do "organismo coletivo", ser capaz de, com cada expressão, seguir, guiar, permanecer ainda em cooperação com a criatividade .dos ditames misteriosos do momento. Esta disposição é também caracterizada pela espontaneidade em acreditar na tendência formativa, à medida em que ela organiza o experienciar da outra pessoa. E existe nesta disposição uma boa vontade para ser guiado e modificado pelo próprio experienciar interno como terapeuta na relação.

Na pessoa chamada cliente, esta disposição inclui a espontaneidade em ser modificado por sua experiência direta e para desenvolver a habilidade para enfocar seu mundo interior e o mundo interior dos outros. Desta forma, esta pessoa permite a operação da tendência atualizante e percebe a consideração positiva incondicional e compreensão empática do outro por si.

Capacidade é percepções mais complexas incluem uma crescente consciência organísmica e aumentada receptividade à realidade organísmica total e redução da incongruência entre o eu e a experiência - transformando-se numa pessoa completa, como indivíduo e como membro da espécie humana. *

* Transcrição literal de trecho do folheto "Terapia de Grupo Centrada na Pessoa", de J.K. Wood, traduzido por Afonso H.L. Fonseca e distribuído aos participantes de um grupo de 64 pessoas reunidas em um Encontro de Comunidade realizado em Pirassununga, São Paulo (Brasil), de 18 a 26 de julho de 1981.

Na organização nos grupos não existem regras. A disposição da pessoa e do facilitador, seja em grupo diádico ou em grandes grupos, é o fator básico. Os grupos podem ser organizados para fins de semana ou para períodos contínuos de convivência, geralmente de duas semanas. Os programas do "Center for Studies of the Person" de La Jolla, Califórnia; (USA), onde se localizam Rogers e sua equipe, são um exemplo. O papel do terapeuta ou facilitador é criar um clima, e dele participar, como membro do grupo, em que cada participante possa sentir-se aceito e compreendido; em que cada um possa sentir-se ouvido e "facilitado" nas suas expressões ou no seu silêncio. O agente terapêutico é o experienciar, em que o participante é capaz de enfocar seus sentimentos e sua maneira de sentir e assim explicar-se a si mesmo e aos outros que o ouvem o que nele se possa. É o rearranjo de condições interiores, de dentro para fora, facilitado pela atenção e pela compreensão do grupo. .

PARTE IIOBSERVAÇÕES PESSOAIS

6 - Hipótese sobre a Auto-Afirmação como Determinante Básico doComportamento

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Resultados de terapia e fundamentos para uma nova hipótese

Os resultados práticos do aconselhamento psicológico e da psicoterapia são desconcertantes devido, em grande parte, à ausência de critérios que especifiquem estados comparáveis de clientes quando iniciam a terapia ou de alvos suficientemente aceitos como metas terapêuticas.

Analisando os efeitos do aconselhamento e da psicoterapia, Truax e Carkhuff (1969) assinalam que essas atividades podem ter efeitos positivos, inócuos ou mesmo negativos, face a alguns estudos publicados. Não obstante a evidência da inutilidade da psicoterapia em certos casos ou situações, há estudos que provam efeitos positivos concluindo esses autores que "quando certas características do terapeuta acham-se presentes, ocorrem resultados positivos enquanto, na sua ausência, uma deterioração aparece". Esses mesmos autores apresentam amplos, variados e excelentes informes sobre os efeitos de diversas terapias, razão pela qual achamos conveniente indicá-las à consulta sem necessidade de reproduzi-las neste livro.

Muitos resultados são mencionados por Wolpe, (1966), Eysenck (1952, 1965, 1973), Klein (1969), Lazarus (1971), Wolberg (1977), e muitos outros autores havendo sempre a dúvida sobre a comparabilidade desses dados. Lazarus, por exemplo, afirma que os resultados que se obtém são produtos de técnicas e não de teorias.

Quanto às nossas próprias observações, o que achamos conveniente relatar é, simplesmente, uma visão de fenômenos comportamentais que, durante cerca de 20 anos, a partir da década de 1960-1970, vimos percebendo no atendimento clínico de crianças, jovens e adultos em situações de aconselhamento psicológico ou de psicoterapia. Não se trata, evidentemente, de uma investigação científica segundo os modelos tradicionais das pesquisas sobre as ciências do comportamento. Assemelha-se parcialmente, ao estudo de casos individuais inspirado na metodologia de Piaget, do Skinner, e do próprio Freud. É um relato de fatos que pode coincidir com relatos semelhantes sobejamente conhecidos. Neste caso, seria uma confirmação de teorias ou de técnicas. Por outro lado, pode surgir como nova contribuição*

. Comunicação apresentada ao III Encontro Nacional de Psicólogos. Rio de Janeiro, 1981.

O julgamento do progresso terapêutico ou profilático sofre, como dissemos, dos defeitos da subjetividade e dos critérios biológicos e sociais que possam ser aplicados ao conceito de ajustamento, de equilíbrio, de adaptação ou de "normalidade". Para melhor conceituação da evolução terapêutica, teríamos necessidade de estabelecer alguns parâmetros, o que se fez através de um elenco de sinais de progresso constituído por 13 itens reunindo conceitos originários de posições teóricas bastante diferenciadas (psicanalíticas, comportamentais e rogerianas). Com base nesse critério de avaliação e em observações adicionais, foi possível percebe que ocorria evolução de quadros de depressão, de ansiedade ou de desestruturação. comportamental para um estágio em que esses

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comportamentos se atenuavam sempre que:a) o cliente atribuía a si mesmo a origem do problema, numa visão

auto-referente, ainda que crítica ou traumática. Esta primeira observação foi incluída na tese de doutouramento do autor, em 1970, e não despertou, na ocasião, interesse especial;

b) o cliente caminhava no sentido de avaliar a si mesmo, disposto a enfrentar as dificuldades que o traumatizam;

c) o terapeuta procurava explorar a auto-estima e o autoconceito, trabalhando com a imagem do cliente.

Dessas observações emergiu uma questão: haveria algum fato psicológico relacionado com a auto-imagem que estaria agindo em sentido construtivo e benéfico para o cliente, restaurando sua tranqüilidade e seu desempenho pessoal e social? Seriam as atitudes de congruência, calor humano, respeito positivo incondicional e empatia propostas por Rogers (1951)? Seriam as interpretações de sentimentos profundos, nem sempre verbalizados? Seriam reforços do comportamento adaptativo? Seria o tratamento objetivo e racional dos problemas, no esquema cognitivo? Seria o apoio ou apenas a ação catártica? EnfIm: que comportamento estaria sendo ativado no cliente e que teria facilitado a melhora? Uma conclusão passou a emergir: deveria existir uma necessidade, motivo, impulso ou tendência na pessoa que, ao ser adequadamente focalizado pelo terapeuta, produzisse as mudanças favoráveis. Procurar esse agente responsável pela modificação dos quadros de depressão e de ansiedade tornou-se o alvo essencial de observações subseqüentes. Prosseguiu-se, pois, com a atuação centrada na pessoa, alternando-a ou suplementando-a com outros alvos e, conseqüentemente, com atitudes e técnicas diferentes. A valorização da pessoa mediante verbalizações sobre a dinâmica de seus comportamentos, suas defesas, suas aspirações e sua auto-imagem tornou-se um dos pontos centrais na medida em que se podia perceber uma relação positiva entre essa abordagem e um progresso terapêutico suficientemente estável.

Seria possível um neo-rogerianismo?

Nosso contacto com as teorias e técnicas de Rogers teve início com a leitura de seu livro Counseling & psychotherapy, editado em 1942 e do qual tivemos conhecimento alguns anos depois. Começamos a adotá-las nos casos de orientação vocacional, procurando trabalhar com a resistência daqueles que exigiam "conselhos", "indicações" e até decisões vitais sobre eventos de sua vida. Em 1956 e 1957, em curso regular de pós-graduação realizado na Florida State University e na Columbia University, nos Estados Unidos, tomamos contacto mais profundo com os conceitos e com a metodologia rogeriana e ao regressar ao Brasil passamos a aplicá-los em clínica psicológica. Embora a observação indicasse êxitos na condução de alguns casos, havia ainda um longo caminho a percorrer para que sentíssemos, realmente, os efeitos profiláticos ou terapêuticos da posição rogeriana. Ao lecionar Aconselhamento psicológico nas Universidades Católicas de Campinas

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e de São Paulo e, posteriormente, na Universidade de São Paulo, tivemos ocasião de aplicar e estudar o método rogeriano com alunos do Curso de Psicologia e com clientes atendidos na Universidade, no SENAI e em nossa clínica particular.

As observações resultantes da aplicação do método, tanto quanto possível na forma proposta por Rogers, quando comparadas com a aplicação de outros métodos (Barros santos, 1970) parecem confirmar a suposição de que há algo de comum em todos os métodos e que responde pelo sucesso terapêutica': Reexaminando-se os resultados por nós colhidos na relação terapeuta-cliente e nos julga dores externos, seria possível inferir que as atitudes terapêuticas propostas por Rogers teriam, para o cliente, um sentido todo especial de auto-afirmação, não suficientemente aceito ou explicado por Rogers. E, a ser verdadeira a hipótese que levantamos, ou seja a de ser a auto-afirmação um ingrediente terapêutico essencial, seria esse sentimento um determinante básico do comportamento humano? Estaríamos, assim, diante de uma colocação teórica que, partindo da genial concepção de Rogers, poderia transformar-se em um neo-rogerianismo como fruto natural do enriquecimento teórico e prático de suas próprias teorias e técnicas.

A possibilidade de um neo-rogerianismo mais se acentua na medida em que alguns aspectos da posição de Rogers tornaram-se muito vulneráveis à crítica, ou seja:

1. Antes, como agora, opõe-se Rogers ao diagnóstico formal, inquisitivo, através do ritual de muitas clínicas psicológicas onde a pessoa se vê coisificada, manipulada, a mercê de "especialistas" que vão orientá-la. Nesse aspecto cremos que Rogers retrata com rara felicidade as preocupações dos psicólogos, não só pelas falhas intrínsecas dos recursos de avaliação (adaptabilidade, precisão e validade), como pelos agentes emocionais presentes na situação de exame, dentre os quais estão a motivação e a disponibilidade para ser avaliado e, em alguns casos, a tendência do cliente em refugiar-se em uma ajuda externa sem dela participar.

A exclusão total do diagnóstico é, porém, outro fenômeno. Parece-nos ingênuo, quando não fantasioso, admitir que podemos nos abster de diagnosticar. Conhecer o cliente e avaliar nossas possibilidades de ajuda, seja isso chamado ou não de diagnóstico, é uma atitude e uma operacionalização que, queiramos ou não, é normalmente existente. O simples fato de se conhecer o cliente pelo sexo, idade, escolaridade, ocupação e motivos de seu contacto com psicólogos são exemplos de "diagnósticos", embora superficiais. O próprio Rogers descreve seus casos usando adjetivos qualificativos ou situações de vida que não deixam de ser uma caracterização da pessoa em estudo. Aliás, o próprio Rogers diz que não existe percepção sem significado. Ao receber e nos relacionarmos com alguém estamos percebendo uma relação e seu significado para nós e para o cliente o que, evidentemente, está ligado a algum tipo de diagnóstico.

2. Quanto à dinâmica do processo, descarta Rogers a tendência homeostática do organismo no plano psicológico e crê que o homem está sempre procurando tensões, em um esforço a que se chamaria de curiosidade, na busca de estímulos mais complicados e enriquecedores (Evans, 1979). O que existe, diz Rogers, é que "todo organismo tem uma tendência a se manter, a se aperfeiçoar se

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possível e, finalmente, a se reproduzir" (Evans, 1979). Os conceitos e os títulos dessa motivação são menos importantes.

Ao comentar as idéias de Rogers, Richard Farson (in Evans, 1979, p. 35) diz que “Rogers mostrou que coisas maravilhosas aconteciam quando se confiava e se aceitava a pessoa, quando seus sentimentos eram respeitados e valorizados, quando ela se sentia segura e compreendida”.

Ao expressar suas idéias, Rogers mostra o efeito mas não a causa das' 'coisas maravilhosas “; identifica o produto e o procedimento (as três condições básicas, supõe-se...) mas não a etiologia do fenômeno. Nesse ponto, iguala-se a Skinner e a outros psicólogos, por ele mesmo criticados, que se baseiam nos efeitos observáveis mas se abstêm de se aprofundar nas origens do comportamento como fez Freud. Ora, se quisermos aperfeiçoar os procedimentos, torná-los mais amplos e mais acessíveis, temos que conhecer a gênese do comportamento, a partir dos primeiros elos da corrente que o guia ou da fonte de onde brotam os sentimentos e a ação racional. A abordagem puramente fenomenológica e a comportamentalista embora sugestivas parecem insuficientes na explicação do comportamento”.

A tentativa de análise dessa dinâmica comportamental nos conduz ao problema da motivação humana. Rogers pouco diz sobre algo que nos parece fundamental na longa experiência com pessoas e situações: a auto-afirmação. Concentra-se ele, sobretudo, no "desenvolvimento do conceito do Eu" (Evans, 1979). Durante a terapia torna-se mais consciente e mais claro o conceito que o cliente faz de si. Esse autoconceito muda e nisto consiste a terapia. Tentativamente, diríamos que justamente nesse ponto se focaliza o núcleo do ingrediente terapêutico: o autoconceito e a imagem favorável ou desfavorável que a pessoa tem de si; a afirmação de si mesma como ser-alguém, com percepção não traumática de seus limites e com percepção não narcisista de suas possibilidades. Rogers mostrou-nos um caminho no qual não quis, ou não pôde, prosseguir; abriu-nos, porém, as fronteiras e um novo território aflorou.

A motivação e os determinantes do comportamento

Colocada a possibilidade de um determinante básico, necessidade ou motivo que respondesse pela melhora do cliente, o primeiro passo foi procurar encontrarmos estudos, nas pesquisas e nas teorias existentes algo que explicasse o fenômeno.Estudar o problema da motivação humana foi o campo inicialmente explorado e, a seguir, resumidamente lembrado nos aspectos que interessam à hipótese que levantamos.

O que sabemos em Psicologia é que o pensar, o sentir e o agir são comportamentos resultantes de um grande número de fatores orgânicos ou biológicos que envolvem desde as mais simples reações alimentares ou digestivas até os mais complexos processos retículo-corticais. A estes somam-se os sociais, expressos pelas oportunidades, exigências e alternativas que o meio nos oferece.

Nesse intrincado cenário, no qual surge uma resposta física ou mental intuitiva ou prodigiosamente elaborada, há um componente emocional que atua na busca de um bem-estar ou na sensação subjetiva desse estado. Se nos virmos ameaçados,

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procuramos agir para reduzir a tensão decorrente da ameaça. O que é ameaçador ou produtor de tensão pode desorganizar o comportamento, na dependência do grau de insatisfação produzido, isto é, de necessidades não satisfeitas. Motivos, impulsos, tendências, pulsões, são, às vezes, sinônimos de necessidade e aqui usados na mesma acepção.

O que vimos até agora nada tem de novo e é provavelmente estudado desde os primeiros momentos em que o homem começou a desvendar ou tentou explicar o seu próprio comportamento. A partir daí, grande número de estudos, pesquisas e teorias vêm sendo apresentados e oscilam desde as explicações filosóficas, antigas e atuais, materialistas ou espiritualistas, centradas no ambiente ou centradas no organismo, até as mais sofisticadas analogias com conceitos físico-matemáticos.

A redução do sofrimento, seja este físico ou mental, parece ser uma necessidade ou um motivo básico, universal e soberano. Todavia, como assinala Allport (1966), essa colocação não explica todas as ações do homem. Argumenta-se, também, que uma necessidade básica e universal, além do evitar sofrimento, seria a busca do prazer. Essa concepção hedonista não explica, igualmente, todo o comportamento, pois o prazer é indefinido, da aUto-realização à autodestruição, como efeito de uma ação realizada. Usa-se, também, a teoria dos instintos, com base na observação do comportamento de animais e de vegetais. Todos esses seres seguem certa direção e se desenvolvem de acordo com certo sistema, num esquema genético ou biológico predeterminado. Certos comportamento "naturais" são chamados de instintos ou de atividade instintiva, execUtados em um determinado ritual, em certas situações, independentemente de aprendizagem. O comportamento pré-maternal, maternal e parental nos animais, ao preparar o ninho ou o local onde vão nascer os filhos e o cuidar do recém-nascido até que atinja autonomia de vida são exemplos. Esses e outros fatos físicos e psicológicos são necessidades e direções do comportamento suficientemente poderosos para criar e manter uma situação de vida. Qualquer alteração que bloqueie ou desvirtue o ato em si é destrutiva e a previsão dessa ocorrência uma ameaça.

O problema dos instintos é algo desafiante para a Psicologia há muito tempo, como também o é para a Biologia e outras ciências. No comportamento instintivo, podem ser identificados dois componentes: uma necessidade fisiológica e um ritual não aprendido, destinado a satisfazê-la. McDougall (1908) definiu o instinto como uma disposição psicofísica inata que impele o organismo a agir de determinada maneira. Esse determinante básico do comportamento, pelo menos a determinado nível de reações comportamentais, vem sendo deixado de lado pela Psicologia, mas não desapareceu do cenário; a terminologia mudou, mas o conceito permanece e a identificação dos instintos ou das necessidades ou dos motivos básicos da conduta é um campo aberto à teorização.

Reconhecem os psicólogos que a primeira categoria de necessidades é de natureza fisiológica ou orgânica. O organismo vivo procura nutrir-se (alimento, água, e outros componentes orgânicos), repousar, movimentar-se, proteger-se contra o excessivo frio ou calor, defender-se contra acidentes e fatos que afetam a

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sobrevivência. Aliás, Wolman (1977), como outros autores, aponta o sobreviver como sendo a necessidade básica. Muitas dessas necessidades são, porém, influenciadas por ação social na forma de satisfazê-las e assumem, então, dupla exigência, pessoal ou organísmica e social.

Freud (1938) formulou o conceito de ser a libido o propulsor de todo o comportamento e a fonte de energia psíquica. No pensamento freudiano encontra-se amplo substrato relativo à motivação do comportamento. Aliás, segundo alguns autores (Hilgard, 1975), a psicologia de Freud é, principalmente, uma psicologia da motivação. Os conceitos primitivos quanto aos instintos de vida, aos instintos de morte e ao princípio do prazer, embora revistos e reestudados no decorrer dos anos, abriram considerável espaço para compreensão do comportamento no plano consciente e, principalmente, no plano inconsciente. Os mecanismos de defesa seriam processos reguladores dos desequilíbrios, mas não explicam, por si sós, a predominância de uma necessidade básica. A formulação posterior de Adler, segundo a qual o homem busca superar sua inferioridade mediante auto-afirmação, é mais concreta nesse ponto. E o instinto do poder de que nos fala Nuttin (1955), acrescentando que tanto este como o instinto sexual, proposto por Freud, chocam-se violentamente como pontos de partida dos conflitos patogênicos.

Cannon (1932) formulou o conceito básico a que denorminou de homeostase, segundo o qual o organismo, enquanto ser vivo, busca manter um equilíbrio interior em suas condições fisiológicas. Esse equilíbrio, essencial à manutenção da vida, conduz o organismo a uma temperatura adequada, à pressão sangüínea dentro de certos limites, a uma regulagem da acidez ou da alcalinidade do sangue e à dosagem de vários componentes orgânicos. Esse princípio geral de auto-regulação é ativado pelo próprio organismo nas condições normais de vida e representa, a nosso ver, um processo que encontra paralelo psicológico na preservação do equilíbrio emocional, na busca de uma normalidade psíquica. Resta saber, porém, no campo psicológico, como reage o organismo às ameaças ou desequilíbrios que o afetam.

Lewin (1935) introduz o conceito de campo, oposto ao de classe (que categoriza as pessoas) e afirma que qualquer comportamento num campo psicológico depende somente desse campo psicológico naquele momento dado “(Martuscelli, 1959). As necessidades são a fonte de energia psíquica, mas não identifica Lewin as necessidades específicas. As tarefas, ou expectativas de tarefas, geram tensões que o indivíduo busca eliminar ou reduzir, executando-as. Lewin explica operacionalmente o comportamento em termos semelhantes aos da Física, excluindo a dinâmica das necessidades, e deixa a questão das” forças psicológicas “abertas à indagação no que se refere à predominância de umas sobre as outras”.

Henry Murray (1938) apresentou dois grandes grupos de motivos que ficaram conhecidos pela sua simplicidade: necessidades viscerogênicas ou primárias, de base biológica, e as necessidades psicogênicas ou secundárias, relacionadas com a interação do indivíduo no seu grupo social.

Na concepção behaviorista clássica, a motivação é colocada em perspectivas muito diferentes das demais teorias (Skinner, 1956, 1967, 1968; Keller e Schoenfeld, 1966; Birch e Veroff, 1970; Keller, 1974). A resposta ou reação do

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indivíduo e, portanto, sua atividade em uma direção qualquer é função do ambiente. A probabilidade de ocorrência de um comportamento depende, em geral, dos esquemas de reforço e de extinção que surgem em sua vida quotidiana. A natureza do fator reforçador não é, porém, suficientemente explícita.

Klineberg (1946), revendo os conceitos sobre motivação da conduta humana e ao estabelecer critérios para classificação dos motivos, refere-se à auto-afirmação como "algo mais complicado" e a coloca num terceiro grupo por não considerá-la universal. Os fatos que alinha para justificar essa posição não são, porém, convincentes ao dizer que a auto-afirmação não existe em algumas fases de infância e em certas tribos de índios. O problema, a nosso ver, é que a auto-afirmação diferencia-se nas várias culturas e, em conseqüência, sua própria expressão.

Maslow (1954) nos fala de necessidades inferiores e de uma seqüência hierárquica no comportamento. As primeiras, de natureza biológica, são fundamentais e predominantes enquanto não satisfeitas. A partir dessa satisfação surgem outras, tais como a segurança, a afeição e, no ápice, a auto-realização. Esta última só aparece quando as demais estiverem satisfeitas. O caminho do homem seria sua plena realização, sua capacidade em desenvolver e realizar suas potencialidades. Ser alguém e sentir-se capaz, ainda que com limitações, seria um motivo final.

As teorias monistas e as pluralistas, mencionadas por Angelini (1955), reduzem o comportamento a um motivo básico, único, ou o colocam em função de vários motivos, respectivamente. Esta última concepção parece predominar, citando seus defensores vários motivos ou grupos de motivos, aos quais sempre alguns mais são acrescentados. Essa intermináve1 lista de motivos é, por si só, uma indicação de que poderia haver uma base geral que mobiliza todos eles e que seria, provavelmente, a razão universal da conduta, apenas diversificada consoante os elementos de cada situação psicológica.

Festinger (1958), ao estudar o problema da dissonância cognitiva, afirma ser esse fator um determinante significativo do comportamento, comparável a um estado de carência ou de necessidade. Quando o indivíduo percebe incongruência (dissonância) entre suas opiniões, atitudes e valores e o comportamento que dele se espera, ou o que é "forçado" a adotar, surge um conflito interior. O indivíduo esforça-se por reduzir essa disparidade e essa tendência orienta seu comportamento.

Concentrando-se mais nos problemas de desenvolvimento cognitivo do que nos aspectos emocionais da personalidade, Piaget (1952; Flavell, 1975) crê que a motivação básica, pelo menos no terreno intelectual, emerge de uma necessidade intrínseca dos próprios órgãos ou das estruturas cognitivas. Não exclui Piaget a interferência dos impulsos primários ou de outros motivos socialmente desenvolvidos mas, na sua concepção, gerados os órgãos ou estruturas, estas buscam alimentar-se pelo próprio funcionamento. A atividade de assimilação parece ser um fato básico da vida psíquica (Piaget, 1952). A posição piagetiana poderia nos levar a conjecturar a existência de uma estrutura global, o organismo em si mesmo, em conseqüência do que o fato básico da vida seria seu pleno funcionamento ou sua função como pessoa.

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Como assinala Edward Murray (1967), o campo da motivação está desorganizado, tantos são os sistemas concorrentes. Esse autor sintetiza as várias explicações, mencionando as teorias cognitivas, hedonistas, do instinto e do impulso e analisa seus vários conceitos; apresenta, por seu turno, uma grande variedade de motivos e afirma que "a motivação depende de um cérebro que contém mecanismos para o prazer e a dor, que controla o seu próprio nível de excitação e que é sensível aos eventos tanto externos como internos". Não se refere Murray a algum motivo básico ou prioritário; apenas admite que estamos caminhando para uma melhor compreensão do comportamento humano e, ao referir-se ao motivo de auto-realização de Maslow, diz que "talvez o futuro leve a pesquisa ao âmago da tendência auto-realizadora do homem... da busca pelo homem de um significado para a sua existência". O motivo de realização, mencionado por vários autores (McClelland, 1953) assemelha-se a um motivo de auto-afirmação, na medida em que envolve dois aspectos: confrontação com outros e confrontação consigo mesmo. Semelhante à autocrítica, é operacionalmente mobilizado para avaliar os níveis de desempenho julgados satisfatórios pelo indivíduo em relação ao comportamento de outros e em relação às auto-imagens e fantasias. Envolve, na concepção psicanalítica, o próprio Ego no sentido de seu prestígio, segurança e poder.

Rogers (1942), ao revolucionar os procedimentos de orientação e de psicoterapia com o método então chamado não-diretivo, chega à conclusão de que um motivo básico, real, seria a auto-realização, o crescimento pessoal e o ajustamento. "O organismo tem uma tendência básica e poderosa para atualizar-se, manter-se e desenvolver-se". Esse seria um determinante do comportamento e, como se verificará posteriormente, foi um dos grandes inspiradores da hipótese que formulamos neste trabalho.

Rogers (1978), ao analisar a política dos relacionamentos humanos, afirma que esta apóia-se “basicamente na concepção do organismo humano e no que o faz funcionar". A tendência à realização é básica para a motivação. A vida é um processo ativo e "quer os estímulos provenham de dentro ou de fora, quer o ambiente seja favorável ou desfavorável, os comportamentos de um organismo serão dirigidos no sentido dele manter-se, crescer e reproduzir-se". O organismo move-se auto-regulando-se, autocontrolando-se. "Em seu estado normal, move-se em direção ao desenvolvimento próprio e à independência de controles externos". Evidentemente, Rogers ao descrever essa auto-realização como algo inexorável, está praticamente admitindo um determinismo biológico. Nada se cria em terapia. O que se faz é liberar a tendência direcional da pessoa.

A auto-afirmação como motivo básico e emocionalmente preponderante

Os motivos poderiam ser classificados em várias categorias estendendo-se em um elenco interminável de ações e de seus pressupostos psicológicos. Poucos psicólogos referem-se à auto-afirmação, embora muitos deles mencionem esse motivo sem, contudo, identificá-lo como variável dominante. É o caso da busca da superioridade, de Adler, da busca de individualidade, de Rank, do desenvolvimento

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e da autodeterminação de Rogers, de realização de McClelland, da realização do Eu, de Maslow e de algumas outras colocações. No campo biológico temos razoável segurança em constatar estados de carência ou de privação e da correspondente ativação em busca de alimento, de água, de oxigênio, de conforto térmico, de repouso, de defesa contra fatores destrutivos, de liberdade de movimentos, .de exploração sensorial e de sobrevivência em geral. No terreno psicológico, aí incluído o social, os alvos e a correspondente instrumentação comportamental não são assim tão claros e parecem provir de ações perceptuais e cognitivas, isto é, da forma pela qual percebemos e elaboramos, mentalmente, os fenômenos pessoais e sociais. Parece haver, nesta área, uma espécie de referencial de satisfação ou de não satisfação a que se seguem processos de defesa ou de adaptação do Ego a uma dada realidade e que aparece, simbolizado ou deformado, no relacionamento terapêutico tanto quanto nas atividades do dia-a-dia.

O conceito, mas não o conteúdo desse referencial, começou a emergir quando notamos a evolução dos comportamentos dos clientes em sessões de orientação e terapia psicológica. Como assinalamos na página 72 os clientes passavam a um estágio de maior satisfação, por eles julgado, quando conseguiam colocar-se em um plano auto-referente e interiorizar um julgamento favorável sobre si mesmos. Restaria hipotetizar sobre a natureza desse referencial que responderia pela melhora do quadro clínico, E, para responder a essa indagação, formulamos duas Possibilidades:

a) ocorre, na relação psicoterapêutica, a satisfação de alguma necessidade psicológica básica que responde pela satisfação em várias áreas vitais para a pessoa;

b) ocorre na relação terapêutica à satisfação de várias necessidades psicológicas simultaneamente, sendo difícil ou quase impossível identificá-las.

Para resolver esse impasse inicial, sobre duas formulações, revimos os casos atendidos e Passamos a observar melhor nossa própria atuação como terapeuta estudando, diante de cada verbalização, o possível efeito nos clientes. Foi possível observar que os estados de ansiedade aumentavam, às vezes até com perturbações, no desempenho da vida diária, sempre que a valorização pessoal e a auto-afirmação eram atingidas de forma traumática, quer o fato resultasse de ocorrências da vida diária (conflitos e frustrações, na área da valorização pessoal), que resultasse de atitudes ou verbalizações pouco confortadoras do terapeuta, Diante dessa situação, pareceu-nos válido conjecturar que:

1. Há necessidades, motivos ou agentes do comportamento que independem da opção individual e, conseqüentemente, atuam como automacismos físicos para gerar a vida, facilitar o crescimento e o amadurecimento e manter a sobrevivência. Ê a própria vida em contraposição à morte ou inexistência, Não há escolhas salvo na forma de viver, a pessoa não se avalia através dessas necessidades;

2. Noutro aspecto da vida, há necessidades ou exigências que geram auto-avaliação física e social. O individuo se vê como um ser vivo, alimentando-se, crescendo, amadurecendo, produzindo, como entidade física, à qual se agregam

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exigências socialmente definidas na cultura em que vive, tais como assumir os papéis de filho, de pai, de estudante, de profissional, de cidadão, etc. Essas expectativas sociais o pressionam e o indivíduo se avalia com alguém de quem algo se espera: surgem necessidades sociais que lhes asseguram a vida social, completando a sobrevivência apenas física. Esse sentido de vida, forma de auto-avaliação socialmente provocada e psicologicamente percebida, é vital para o equilíbrio emocional e, conseqüentemente, para a vivência social. A pergunta que a pessoa coloca para si mesma, em diferentes instâncias da vida, será esta: até que ponto vivo social e pessoalmente? Os padrões de desempenho, de adequação, de competência, de aprovação, de status, de poder e tantos outros são questionados. O conjunto de respostas que a pessoa emite a essas questões seria a auto-afirmação e, como tal, seria o determinante básico do comportamento.

Kreeh e Crutchfield (1963) definem parte do que desejamos expressar. Dizem esses autores que "o comportamento auto-afirmativo pode servir a diferentes objetivos, exprimir diferentes desejos e necessidades e apresentar inúmeras formas". Refere-se, "também, à manutenção e aceitação da auto-imagem, indiferente à maneira pela qual os outros possam vê-lo". No nosso entender, não se refere este processo mental à competição, nem à busca de superioridade de Adler, mas à identificação do EU, ao encontro de uma realidade pessoal, àquilo que somos e que usufruímos, ainda que pequena em um mundo cada vez mais gigantesco. É o assumir a si mesmo, compreender o que é e aceitar-se.

A insuficiência da auto-afirmação talvez explique a neurose de insignificância de nossos dias e o aumento crescente dos desajustes emocionais na razão direta do não-humanismo, isto é, da sociedade povoada pela tecnologia e pela tecnocracia. O indivíduo vê-se cada vez menos atuante, seja na escola, na família, no trabalho e um processo de auto depreciação se instala. O antídoto é a auto-afirmação. As conhecidas tensões dos primeiros astronautas - relatadas pela imprensa - podem ser um exemplo: um sentimento de insignificância diante de um mundo imenso, novo, ao qual não estavam acostumados. Em conseqüência, o sentimento de pequenez, de desvalia conduz ao medo de não ser alguém. Em proporções menores, esse niilismo pode surgir no dia-a-dia, na medida em que nos sentimos impotentes, marginalizados, desprezados. Muitos clientes, crianças, jovens, adultos e idosos, acabam por demonstrar, no decorrer de entrevistas e sessões terapêuticas, que seu problema básico é não serem devidamente considerados. Na situação familiar, conjugal e de trabalho, esta situação é bem evidente. Filhos se queixam de que seus pais não confiam neles; pais se queixam de que seus filhos não os respeitam; empregados se vêem angustiados quando são esquecidos ou marginalizados; todos sofrem quando se sentem relegados a um segundo plano. A recíproca é verdadeira: nota-se a satisfação e o bem-estar quando somos ouvidos, quando somos participantes, quando nossa presença é notada, quando, de alguma forma, sentimos ser alguém. Quando, pois, se consegue restaurar, por outras vias, na relação terapêutica, a percepção do Eu, quando se recoloca a pessoa em um sentido de valorização de seus papéis e de seu desempenho reduz-se a angústia existencial e as desordens comportamentais que dela se originam.

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Esse complexo sentimento de avaliação de si mesmo, de auto-afirmação, de ser alguém, uma pessoa definida no tempo e no espaço, com características próprias, com possibilidades e limites satisfatoriamente interiorizados estimula e direciona o comportamento psicológico e, em conseqüência, todos os demais aspectos da vida nos quais haja opções e decisões e que, em última instância, estabelecem a forma de ser, de viver.

A auto-afirmação, tal como a entendemos, está amplamente relacionada com a auto-realização na forma vista por vários teóricos da motivação* , dentre Os quais os citados por Cofer e Appley (1975) ou seja, Goldstein, Fromm, Horney, Rogers, May, Maslow e Allport, além de outros. Todavia, e isto nos pareceu importante como produto de nossas observações, a diferença entre um e outro motivo consiste no fato de que o primeiro não busca o fazer, o realizar, o criar ou o construir para efetivar-se. A auto-afirmação é preexistente em maior ou menor grau; a pessoa mantém uma confiança na própria individualidade, sem necessidade de prová-la a todo o momento. No seu ponto ideal seria a imagem completa, coerente, integrada de si mesmo e, portanto, produtora de tranqüilidade e segurança. A pessoa crê no que é e não no que deve ser. Envolve um sentimento mais profundo do que a aceitação de si mesmo, proposta por Rogers, porquanto não é um conformismo, mas uma valoração das experiências vitais e de seu Eu como um conjunto integrado de disposições e de disponibilidades, de energia e de produção, independentemente do que faça ou deixe de fazer, socialmente participante como elo indispensável a toda a cadeia de eventos que ocorre no cosmos. Uma descrição bem próximo do que se pretende definir é encontrada em Cofer e Appley (1975, pp. 652-75) quando esses autores comentam a natureza da ênfase na auto-realização. Entretanto, o que se deseja acrescentar à contribuição dos teóricos e dos comentários citados é que a aUto-afirmação, como motivo de deficiência ou como motivo de crescimento, no dizer de Maslow (1943, 1954), parece, a nosso ver, constituir a mola mestre e um determinante básico no comportamento humano.

*Muitos autores distinguem necessidade de motivo. Segundo essas distinções, a primeira corresponderia à deficiência ou falta de uma substância ou função necessária ao processo de vida ou de bem-estar. Motivo seria um padrão de comportamento complexo, socialmente aprendido, que envolve uma necessidade ou situação que o origina, o estímulo que o mantém e os mecanismos de ajustamento que dele resultam.

Neste livro. motivo é considerado como um impulso ativo, resultante de uma necessidade, consciente ou não. Esta, por sua vez, significa um impulso primário (proteger-se. por exemplo), aprendido ou não, cuja insatisfação pode provocar um estado de carência. Praticamente, os dois termos se equivalem.

Para suporte da hipótese levantada, somente dispomos de dados clínicos provenientes de um grande grupo de clientes, de condições pessoais as mais variadas, atendidos entre 1960 e 1980. Desse contingente, conseguimos observações regulares e sistemáticas em 80 casos os quais contavam com um atendimento terapêutico de um ano, no mínimo, com sessões semanais e com um acompanhamento de, pelo menos, igual duração.

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7 - A Personalidade e a Auto-Afirmação

O Eu Pessoal, o Eu Social e a emergência da auto-afirmação

As descrições da personalidade, variadas consoante os autores, nem sempre são apoiadas em pesquisas mas em constructos teóricos. Todavia, tais constructos não nascem do nada; têm origem em observações e na experiência quotidiana (Hall e Lindsey, 1966; Allport, 1969).

A experiência de cada teórico da personalidade, embora sujeita a distorções próprias do observador e profundamente subjetiva, pode nos levar, porém, a novos enfoques que, por sua vez, produzem novas interpretações e, possivelmente, novas aproximações da verdade. O que se relata, agora, pode ser um passo nesse sentido, embora coexistam explicações análogas, com outra nomenclatura.

Nossa experiência com pessoas ansiosas, jovens ou adultos, que procuram enfrentar conflitos e frustrações ou entender o que nelas se passa, com clientes pouco motivados para terapia e que a estas se dirigem por imposições paternas ou por modismos psicológicos, com pessoas fortemente desestruturadas e com casas chamados "normais", levou-nos a reafirmar a conhecida bipolaridade comporta mental: a área individual ou pessoal e a área extra-individual ou social. Essas duas áreas embora coexistam na pessoa, sendo até mesmo indistinguíveis em muitos comportamentos, podem, porém, revelar dois conjuntos de agentes os quais, uma vez ou outra, assumem ações independentes. O esquema a seguir poderia demonstrar o que ocorre nos dois conjuntos e na personalidade à medida que o indivíduo se desenvolve ou se socializa:

Na primeira infância geralmente até os 3 anos de idade o EU PESSOAL e oEU SOCIAL estão separados

A partir do terceiro ano de vida, em geral, o PESSOAL e o EU SOCIAL se juntam formando uma área de conexão entre os dois EU,com áreas de interpenetração pessoal e social extremamente variadas.

O EU Pessoal pode ser definido como o repositório de todo o patrimônio genético, inclusive temperamento, inteligência e outras aptidões, estrutura física, características sexuais, estrutura e dinâmica sensorial e motora, necessidades biológicas e, ainda, as experiências e seus efeitos introjetados e já incorporados ao funcionamento do organismo.

O EU Social seria a figura resultante do conjunto das expectativas, das direções, imposições e pressões sociais que atuam sobre o Eu Pessoal; é, sobretudo, um produto da Educação que elegendo valores manipula o indivíduo modelando-o nas ideologias, hábitos e costumes de uma dada sociedade, nos seus conteúdos políticos, religiosos, econômicos ou de qualquer outra natureza.

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O indivíduo estaria sob duas ordens de pressões: 1) Primeiramente, as que provêm de seu estado natural, orgânico, constitucional, predominantemente genético, que traça direções e limites de sua ação. É todo um comportamento natural, simples, de sobrevivência e de adaptação ao ambiente. A criança alimenta-se, excreta resíduos, chora, repousa, responde a estímulos sensoriais; mais tarde, anda, fala, explora o meio e o cultiva; percebe-se, pouco a pouco, como Um ente vivo, atuante, consciente de certas características suas, inerentes a seu funciona mento como pessoa; 2) Progressivamente passa a sentir Uma manipulação externa que provém de outros seres, iguais a ele, e que, isoladamente ou em grupo, o influenciam e passam a dirigir suas ações. Sente-se levado a comer, a dormir, a colocar-se em posturas ditadas por outros. É levado a falar, a vestir-se, a interagir com seus semelhantes da maneira pela qual estes agem ou estabelecem normas de conduta. Precisa ir à escola, aprender uma profissão, orientar sua atividade sexual de certas maneiras, participar de ações comunitárias de acordo com padrões grupais e assim por diante.

A sociedade impõe normas e exige conformismo a seus estilos de pensar, de agir e de sentir. Para não ser marginalizado, punido ou destruído, o indivíduo obedece a essas imposições; conforma-se. O processo de acomodação faz-se, às vezes, às custas da perda de seu EU Pessoal; de concessões. O estilo pessoal, primitivo, natural, cede lugar aos gabaritos sociais e à alienação de si mesmo, com graus variados de aceitação ou de repulsa às imposições e referenciais externos. A pessoa passa a sentir-se invadida no seu território, a perder o que é seu e que lhe dá segurança existencial. Quando as pressões sociais assumem formas traumáticas, a pessoa vê-se aniquilada, sem ser alguém. Busca, então, recompor-se; mostrar que existe; afirmar-se. Quanto mais profunda e traumática a imposição, maior é o sentimento de não-ser e maior a necessidade de auto-afirmação.

O fenômeno exposto ocorre todos os dias, todas as horas, em pequenas ou grandes dimensões. É a criança que vê o novo irmão tomar-lhe o lugar e as preferências dos pais e dos parentes; é o menino ou menina que, deixado de lado pelos seus amigos em um jogo ou brinquedo, sente-se rejeitado e, portanto, não-sendo; é o empregado que vê seu colega promovido e ele não; é o exemplo clássico de alguém que está em uma fila e vê um outro passar-lhe à frente. Esses exemplos banais servem para indicar a ocorrência de formas muito mais complexas emergentes em outras circunstâncias, tais como a busca do poder, do prestígio, do renome; a liderança; a publicidade em torno de seu nome; a luta pelo dinheiro ou pelos títulos e pelo status cuja essência nada mais é do que a auto-afirmação, tanto mais sensível quanto maior a pressão que destruiu o EU Pessoal.

Por outro lado, há pessoas que, embora queiram aparecer ou auto-afirmar-se, o fazem em escala moderada; não foram aniquiladas ao ponto de procurarem constante evidência de si mesmos; conservam grande parte de seu EU individual e com isso se satisfazem.

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O processo de ser inicia-se com a percepção organísmica, já afetada pelas experiências ambientais e sociais. O "self” seria, de acordo com Chein (1944) e outros autores, o conjunto de conteúdo auto-referentes, relativos a si mesmo; é aquilo que percebemos como sendo nosso. A conseqüência é a percepção de uma identidade que, no dizer de Erikson (1971). seria a reflexão e a observação do indivíduo sobre si mesmo. Essa percepção de si pode incluir dimensões no tempo e no espaço com noções de continuidade e de contigüidade e de igualdade e de comparabilidade, que permitem responder à pergunta" quem sou eu"?

Inerente à identificação de si mesmo, surge o processo avaliativo no plano consciente ou inconsciente das ações do "self" como respostas ao EU Pessoal e ao EU Social, isto é, aos impulsos naturais da pessoa e às pressões ambientais e sociais. Tem início um julgamento do EU na sua totalidade e em aspectos particulares da existência. A simples imagem de espelho que caracteriza sua identidade é completada pela autocrítica, dando lugar a mudanças adaptativas que a pessoa tenta operar no sentido de impor-se a si mesma com respeito e admiração; procura satisfazer seus impulsos e considera as pressões sociais.

Com o processo adaptativo, seu Ego se instala (Hartman, 1957); passa a conhecer-se melhor e sua identidade, antes fluida e superficial, passa a estabelecer-se e a definir-se, embora em constante mudança. Do conhecimento de si surgem a auto-estima e o autoconceito e, em conseqüência, o sentimento de inadequação, impotência, incapacidade ou, por outro lado, o sentimento de valor pessoal e de poder. No primeiro caso, sufocado e humilhado pelo quadro de incapacidade, revolta-se, exibindo comportamentos anti-sociais ou ingressa no campo das descompensações psicológicas. No segundo caso, suportado pelo sentimento de valor pessoal, emocionalmente satisfeito, mobiliza seu potencial para entender a realidade e para a ela adaptar-se. A auto-afirmação no sentido positivo somente se instala na medida que a pessoa tenha plena consciência do que com ela ocorre, o que corresponderia ao que Wolman (1977) afirma: "what counts is not only power as it is but power as perceived by oneself" .

A auto-imagem, auto-estima e autoconceito sempre foram tidas como agentes importantes na conduta humana (Honey, 1966; Moustakas, 1966; Rosenberg, 1965) como se verifica pela simples observação de que os comportamentos individuais se alteram consoante a flutuação dessa percepção na própria pessoa. Todo ser humano tende a agir de acordo com o que acha que é. "A estrutura da auto-imagem determina dia após dia, de momento a momento, o comportamento da pessoa" (Anderson, 1952). Trabalhar, pois, com a auto-afirmação como produto de auto-imagem, da auto-estima e do autoconceito é operar sobre a pessoa, educando-a ou reinstalando comportamentos pessoal e socialmente úteis. O gráfico da página 87 pretende ilustrar como ocorre o processo da auto-afirmação.

Após a formulação das hipóteses mencionadas neste trabalho e relendo Laing (1963), pudemos encontrar apoio às nossas observações, quando menciona esse autor a segurança ontológica. Diz Laing que o indivíduo pode' 'sentir seu próprio ser como real, vivo, total, diferenciado do resto do mundo, em circunstâncias normais, tão claramente que sua identidade e autonomia nunca são duvidadas; como contínuo no tempo; como possuidor de uma estabilidade, importância e

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autenticidade e merecimento internos coexistindo espacialmente com o corpo e, geralmente, como iniciado pelo nascimento e passível de extinção pela morte. Assim, ele apresenta uma essência firme de segurança ontológica" (p. 46). Ao explicar os comportamentos psicóticos, continua dizendo, "se o indivíduo não pode ter certas a autenticidade, a vida, a autonomia e a identidade de si e de outros, então se deixará absorver inventando meios de tentar ser real, de se manter e, aos outros, vivos; de preservar sua identidade num esforço, como freqüentemente o diz, para evitar perder o seu eu" (p. 47). Essa desvinculação do Eu ocorreria, também, segundo Laing, no sentido material, havendo pessoas rotuladas como esquizofrênicos que se sentem dissociadas de seu corpo, perdem sua identidade física e conseqüentemente ingressam em profunda angústia existencial; é o Eu dividido, segundo Laing; o indivíduo é uma coisa e não uma pessoa.

Conhecer o eu, senti-lo como real, sentir-se como alguém, apreciar seus valores físicos, intelectuais ou afetivos, bem como suas limitações nesses e noutros campos e, assim, sentir-se como pessoa a quem cabe um espaço no mundo e um sentido de vida, seria o motivo básico do comportamento em função do qual giram seus pensamentos e ações. Quando não percebe sua identidade perde-se na imensidão das coisas e confunde-se com o tudo ou com o nada e desaparece no seu autoconceito. Esse desaparecer pode causar os mais variados comportamentos, desde o autismo ou a tentativa de criar um mundo para si próprio, até a negação do que existe ou o uso de fantasias que satisfaçam a necessidade de ser alguém.

Muitos exemplos da vida diária ilustram os fatos aqui assinalados, seja na busca de uma identidade, do reconhecimento de ser alguém, seja nas desordens comportamentais, de rótulo neurótico ou psicótico, que ocorrem quando o indivíduo não encontra essa posição psicológica. Um dos casos mais evidentes da experiência do autor refere-se a uma cliente que, não obstante dispor de condições sociais e materiais de elevado nível, sem problemas ou queixas objetivamente distinguíveis, ingressava, ansiosamente, em um grande vazio existencial: a vida não tinha sentido, principalmente na relação familiar e conjugal; não se sentia válida e útil na própria família e em conseqüência esquivava-se, o mais que podia, da atmosfera e das decisões familiares. Procurava atividades longe do círculo familiar, na busca de alguma forma de ser alguém, mas nem mesmo noutros campos achava o seu Eu; parecia difícil explicar a si mesma certos comportamentos que assumia e, muitas vezes, entrava em ansiedade quando tinha que revelar seu próprio nome e sua identidade. Nas sucessivas sessões focalizou a cliente a história completa de sua vida: com pais separados desde sua infância, sentia-se incerta na sua origem, questionando até mesmo suas raízes biológicas com seu pai e sua mãe. Sempre se tornava extremamente ansiosa ao evocar seu passado, suas origens ou quando tinha que expor opiniões pessoais. Não se sentia uma pessoa, alguém capaz de emitir um juízo ou opinião e se o fazia era para impor um ser que procurava existir, que não havia ainda nascido. A redução da angústia resultante desse niilismo somente foi possível quando passou a se valorizar como pessoa, com vida e alvos próprios, quando foi possível perceber sua existência como indivíduo, quando pôde, abertamente, dialogar com sua mãe sobre sua origem e identificar-se, na família,

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como participante desse grupo e de outros, no trabalho e na vida social.A auto-afirmação é vista, também, como auto-estima e, nesse sentido, como

aponta Chrzanowski (1981), um construto que constitui fundamentos para entender a motivação humana na vida diária, tanto quanto na situação terapêutica. É uma realidade mais tangível do que o Ego. Segundo esse mesmo autor, a auto-estima, que pode ter vários sinônimos tais como auto-respeito, autoconsideração, é a imagem favorável de si mesmo, de dignidade pessoal. Esses conceitos, pouco considerados por Freud e outras correntes psicológicas, são agora reapresentados como algo de máxima significância na conduta e em qualquer forma de terapia. .

GRÁFICO 1Etapas Principais do Processo de Auto-Afirmação

Percepção dos eventos pessoais e sociais(Respostas sensoriais, motoras e mentais aquaisquer estímulos pessoais, ambientais ousociais)

|SELF

|IDENTIDADE

|Avaliação no plano consciente ou inconsciente dasrespostas aos estímulos pessoais, ambientais esociais

|AUTO IMAGEM

|Adaptação dos impulsos naturais e pessoais àspressões e condições ambientais e sociais

|EGO

|Auto afirmação negativa;insatisfação pessoal;deteriorização docomportamento

AUTO ESTIMAAUTOCONCEITO

Auto-afirmação positiva,satisfação pessoal; equilíbrioemocional

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A ocorrência patológicaParece evidente ao autor que a maioria, senão a totalidade dos distúrbios

emocionais, dei origem não-biológica, provém do aniquilamento do EU Pessoal e da conseqüente necessidade de fazê-lo emergir. A percepção de ser desvalorizado, desprezado, preferido, parece ser a mais contundente experiência humana. E o homem assim percebido ingressa em defesas para compensar essa desvalorização de algum modo e, enquanto isso não ocorre, permanece em estado de real sofrimento. Não importa se esse sentimento de desvalia seja real ou imaginário. Desde que a pessoa o sinta, atua como se fosse real.

As compensações psicológicas explicadas pelos mecanismos de defesa (Freud,Ana Freud e outros) são meios pelos quais o indivíduo recompõe seu equilíbrio emocional, revendo-se como alguém, bom, útil e expressivo. Às vezes essa defesa é socialmente inaceitável, não adaptativa, como no caso do indivíduo que rouba, assalta ou mata para vingar-se, para aparecer, ou para mostrar que existe e que é alguém. Nesses casos, o indivíduo está psicologicamente equilibrado mas socialmente condenado. Noutras vezes, busca afirmação em obras ou atividades que substituem suas deficiências ou pseudo deficiências e que são aceitas e socialmente valorizadas. Obtém-se, nesse caso, um equilíbrio social e psicológico adequado. Outras vezes, porém, permanece o indivíduo no plano da nulidade ou da não-existência e esse sentimento, profundamente traumático, gera angústias às vezes insuportáveis. Aí estariam, pois, as nascentes de todos os problemas psicológicos. Manipulá-los, terapeuticamente, com compensações ou com nova visão de si e dos referenciais externos, é todo o trabalho da reeducação, da reabilitação ou da psicoterapia e os casos que mencionamos em páginas anteriores são exemplos que podem ser significativos.

O problema psicológico, manifesto por tensões, angústias ou comportamentos socialmente indesejáveis, parece brotar como conseqüência da aniquilação individual, ou, em menor grau, do sentimento de incapacidade ou de rejeição. Isto porque a própria sociedade exige o conformismo a seus padrões e, logo a seguir, a expressão individual, ou seja, uma capacidade individual de ser alguém, de resolver problemas, de tomar iniciativas e de dar contribuições à sociedade. Diante dessas exigências antagônicas, conformismo versus expressão, o indivíduo vê-se perplexo. Precisa adaptar-se e precisa ser alguém, para não ser tragado pelo niilismo. Pode conformar-se totalmente e mergulhar no anonimato, no nada ser, como defesa. É o seguidor sem restrições, para quem tudo está bom. Aceita o niilismo sem tensões. Noutro oposto, está o contestador extremado, que movido pelo seu EU Pessoal tudo questiona e somente por maiores pressões submete-se às imposições sociais. Entre tais extremos situam-se, porém, grande parcela de pessoas que lutam por um equilíbrio entre o não-ser e o ser. Não o atingindo ,ingressam em estados permanentes de tensão e de sofrimento. Esses casos são comuns e os vemos no dia-a-dia, sofrendo ou gerando sofrimento em

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outros. Muitas das personalidades neuróticas ou psicóticas, para usar a rançosa nomenclatura tradicional, enquadram-se nessa situação: estão à procura de um equilíbrio entre o ser e o dever-ser; entre o que são (EU Pessoal) e o que acham que exigem de si (EU Social). Essas pessoas, às vezes, imaginam que as expectativas dos outros,sobre si mesmas, são de tal ordem que não podem a elas corresponder: é o sentimento de incapacidade, real ou imaginário; outras procuram vencer as “exigências” ou expectativas, impondo o seu EU Pessoal, como forma de se libertarem dessas exigências e temos os comportamentos de prepotência, de dominância ou de culto de si mesmos. Tanto num caso como noutro, a pessoa sofre ou provoca sofrimentos e torna,se indesejável para si ou para os outros. A auto-afirmação parece ser o móvel constante, o regulador da conduta humana. Conduzi-la a níveis pessoais e sociais adequados, sem ferir a individualidade e a sociedade,seria o objetivo máximo do bem-estar individual e social.

O determinánte básico, por nós chamado dé auto-afirmação, não é tão simples como o nome indica; não se confunde com o comportamento de "chamar à atenção sobre si", como é, às vezes, interpretado. É um produto intelectual e emocional muito mais abrangente e profundo. Intervêm nesse comportamento muitos outros elementos, dos quais se destacam:

a) O nível mental, no sentido de ler a pessoa capaz de avaliar e comparar diferenças dentre fatos e objetos e entre situações diversas;

b) O nível intelectual, no que se refere às cognições e à acumulação de informações que permitam à pessoa emitir juízos de valor, sobre si e sobre osoutros, e extrair conclusões quantitativas e qualitativas;-

c) Condições de percepção sensorial, através da qual possa a pessoa receber os estímulos ambientais ou autogerados;

d) As imagens introjetadas de si e dos outros, do Eu-real e do Eu-ideal, ouseja, todos os agentes derivados do autoconceito resultantes de frustrações e conflitos, bem como de sentimentos positivos e negativos.

A auto-afirmação não significa, igualmente, o sentimento narcisista estudado por Kohut (1978) na Sua posição antifreudiana, mas o equilíbrio entre o amor por si e pelas pessoas e fenômenos que o rodeiam. As desordens psíquicas ocorreriam quando a pessoa não é capaz de estimar-se a si própria, buscando nos outros, a todo momento, extremamente vulnerável às críticas, a valorização que lhe falta. O seu EU fragmentado é ambíguo, confuso, instável e não estruturado, com origens que podem estar na sua relação com seus pais e sua família. Quando esta descarta os vínculos entre seus membros deixando a criança entregue a si mesma, sem a troca de experiências afetivas constantes, ou quando excessivas exigências subjugam a visão de si mesma, a criança sente-se privada da estima e desenvolve auto.imagem depreciativa. Como exemplo, basta lembrar os milhões de menores desamparados ou abandonados que passam a sentir-se injustiçados e rejeitados embora não possam identificar esse sentimento. Tiveram eles o Eu destruído ou parcialmente anulado pela falta de progenitores ou pelas atitudes de indiferença ou de não empatia que freqüentemente encontraram.

O comportamento de auto-afirmação pode ser entendido como resultante dos

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juízos que a pessoa faz em relação a si mesma e de seu Eu em relação ao mundo. Quando esses juízos indicam conceitos grandemente desfavoráveis, que geram sentimentos de nulidade, de não ser ele próprio, de alienação, ou mesmo de incapacidade face a necessidades imperiosas, a pessoa ingressa em estados de depressão ou de angústia, que variam de acordo com o grau de insatisfação percebido. É a conseqüência da reação do Ego à ameaça de não-ser. Todos nós, em um momento ou outro da vida, sentimos ocorrer tais sentimentos. No indivíduo dito “normal", ou normalmente ajustado, essas imagens de incapacidade ou de nulidade são aceitas e incorporadas como algo não-destrutivo, que ocorrem como fatos comuns da vida; não afetam a integridade e o conceito básico do EU e, conseqüentemente, a pessoa continua a viver na busca de outros caminhos; procura soluções menos frustradoras, aceita os fracassos como parte da experiência normal de vida e não. se sente invalidado ou rejeitado. Em certos casos, porém, seja por um acúmulo constante de insucessos, seja pela ocorrência de uma grande e profunda insatisfação, a pessoa começa a interiorizar conceitos depreciativos sobre-si mesma; tudo lhe parece ameaçador, reforçando a imagem negativa que está se gerando, ou já implantada. Dois pólos extremos podem caracterizar os efeitos da auto-afirmação:

1. Comportamento de nulidade, ou seja, o da percepção e conseqüente posicionamento de que pouco ou nada adianta fazer, face aos problemas existenciais, já que seu EU não tem condições de superar problemas. Evita atividades ou quaisquer realizações porque, de antemão, não confia no seu próprio desempenho. É o comportamento de fuga, de esquiva, de negação da realidade e outros semelhantes, explicados como defesas pela linha freudiana, pela não aceitação de si mesmo, na posição rogeriana, ou pela ausência de reforçamento de valor pessoal, na linha comportamentalista. A conseqüência emocional, é geralmente, a depressão temporária ou permanente, a inibição ou bloqueio de comportamentos, resultante do medo de fracasso; .

2. Comportamento de ativação, que se refere à não aceitação de um juízo depreciativo, isto é, o organismo reage contra o baixo conceito que lhe é profundamente traumatizante. A reação, porém, é não-adaptativa, uma vez que, gerada sob a percepção de incapacidade, cria tensões severas. A pessoa sente-se incapaz e, em lugar de manter-se em estado depressivo, expresso no comportamento anterior, procura lutar contra essa imagem, às vezes de forma impulsiva e irracional.

Predominando o medo do insucesso, o comportamento se desorganiza e novos fracassos ocorrem. A seguir, mais medo e mais fracassos e os níveis de excitação aumentam gerando, no plano emocional, estados de intranqüilidade, agitação, fobias, falhas do desempenho e conseqüente agravamento das condições existenciais.

Os dois comportamentos, acima mencionados, poderiam corresponder a dois processos básicos de equilíbrio, quer no plano psicológico como no biológico,e se referem a estados de inibição e de excitação, fartamente conhecidos no campo da fisiologia e da psicologia.

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Neurose e significado da vida

A auto-afirmação é o reconhecimento e a valorização da própria individualidade que, no dizer de Rollo May (1977), deve ser preservada. É o alvo da psicoterapia, no pensamento de Rank (1945), e, como busca da própria individualidade, uma característica básica do comportamento segundo Jung (1927, 1939).

Analisando métodos de aconselhamento, diz May que forçar o indivíduo a ser ele mesmo é "piorar ainda mais a confusão. Ele precisa, em primeiro lugar, achar a si mesmo".

Mais adiante, o mesmo May define o quadro do neurótico e sua teorização muito tem a ver com o que encontramos sobre a auto-afirmação. Diz May: o problema do neurótico é sua incapacidade de afirmar. "Afirmar significa mais do que simplesmente aceitar. É mais um aceitar ativo, um dizer Sim, não apenas verbal ou mentalmente, mas com resposta de toda a personalidade".

Essa falta de capacidade de afirmar a si próprio, a seus semelhantes e ao universo está ligada ao acentuado sentimento de insegurança do neurótico. Temos observado ser comum entre os depressivos, os angustiados e os ansiosos, em geral, a existência de um sentimento de medo ou de falta de confiança em si e nos outros. Agem para se defender de perdas, reais ou imaginárias. No neurótico, ao contrário do psicótico, geralmente o medo e o sentimento de fracasso tem origem em alguma perda ou ameaça real de perda. A pessoa envolvida teve, na realidade, alguma dificuldade material ou moral, objetiva, praticamente verificada. A neurose é, porém, o exagero e a generalização desse medo, causada pela falta de confiança em si, que assumiu a forma de baixo conceito pouco a pouco interiorizado, seja por uma visão deformada dos fatos (plano cognitivo), seja por reais e repetidos insucessos que geraram uma visão negativa de si mesmo (plano emocional). Em conseqüência, a pessoa não consegue ser alguém; não se afirma como pessoa e a vida não tem um significado, ou se o tem, o que é pior, surge como inatingível. A pessoa tem planos ou objetivos e necessidades subjacentes que lhe parecem muito além de sua capacidade. Nestes casos, coloca alvos acima de suas reais possibilidades ou, se é capaz, não se vê suficientemente dotado para alcançá-los. No primeiro caso, suas informações e os dados de que dispõe para manipular o problema são errôneos ou incompletos. É o caso de pessoas que almejam alto nível de desempenho, seja no campo profissional, social, sexual ou outro qualquer, baseado em concepções ou imagens que lhe foram transmitidas e em função das quais acredita que certos padrões de desempenho são os únicos aceitáveis e que justificam sua conduta. Esquecem-se de seu próprio Eu e tomam como diretriz o Eu de outrem. Alienam-se de si mesmos e vivem à sombra de outros, buscando igualá-los ou superá-los. A satisfação e o bem-estar ficam associados e esses alvos; não elaboram seus próprios planos e suas próprias decisões. No segundo caso, simplesmente não se avaliam positivamente.

Na medida em que a pessoa constrói para si mesma seu próprio mundo, com as limitações e aspirações que derivam de sua auto-imagem, torna-se capaz de

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afirmar-se, de traçar seu próprio rumo, relacionado com o mundo externo, mas não por este dominado. Nesse momento, enquanto pessoa, dá um sentido à sua vida, fixa metas e estratégias e com elas opera, adaptando-as a eventuais revezes e impropriedades. Pode sofrer com as frustrações e conflitos, porém reformula planos, mantém as diretrizes essenciais que coloca para si mesmo. Nesse sentido, reconhece-se como alguém, que tem condições próprias e que luta para adaptar-se, com suas potencialidades e limitações. Esse sentido de luta pessoal, ainda que acarrete derrotas, seria a essência da auto-afirmação. Não é o resultado visível em si que interessa, mas o sentimento de não-passividade, de independência, de ser capaz de reconhecer em si algo que permanece, que não foi destruído, apesar dos fracassos.

A auto-afirmação seria também a percepção da própria existência e o preenchimento do vácuo existencial, tão bem colocado por Victor Frankl e que, segundo ele, corresponde à ausência de um sentido de vida. Esse mesmo autor menciona a pesquisa da Universidade de Harvard, realizada com 100 antigos estudantes dessa Universidade, e na qual se encontrou grande porcentagem de pessoas que, depois de formadas e mesmo bem sucedidas na vida profissional, queixavam-se de "falta de uma missão especial vital", "andam à procura de uma vocação e de valores pessoais que os sustentem". Ocorre, segundo Frankl, um novo tipo de neurose, não psicógena, mas noogênica, isto é, resultado de uma carência de iniciativa, de interesse, que mobilize o homem em uma certa direção. Os sintomas dessa neurose podem ser semelhantes aos da neurose psicógena (causada por grandes traumas psíquicos) ou da neurose somatógena (causada por desequilíbrios orgânicos). O sintoma básico é a angústia existencial, a falta de razão para viver, o desinteresse, a apatia, produtos do baixo autoconceito e da percepção de uma nulidade individual. Muitas fobias e ansiedade difusa podem ser o efeito dessa percepção de nulidade, em que o Eu pouco significa, esmagado pelos outros ou pela imensidão do Cosmos. Encontrar um sentido para a vida seria reconhecer-se como alguém, crer em si mesmo, no seu papel e no seu desempenho, ainda que com limitações e falhas. Esse crer em si e reconhecer-se como pessoa poderia ser o caráter básico da Psicologia Humanística, hoje em franco desenvolvimento, em oposição à Psicologia que vê no homem um meio para alguma coisa e não um fim em si mesmo.

Valores sociais e a auto-afirmação

A auto-afirmação, como determinante básico, seria culturalmente estruturada com base nos valores introjetados pela pessoa, durante seu desenvolvimento. É, conseqüentemente, um conceito pessoal, totalmente individualizado, que a pessoa cria para si mesma. E isto é verdade quando comparamos os alvos comportamentais que cada um de nós impõe para si próprio. O que representa valorização pessoal para certas pessoas pode não ser significativo para outras. Esta acepção corresponde a alguns conceitos de Rogers

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quando propõe sua teoria sobre a personalidade (Rogers, 1951). Todavia, o conceito pessoal sobre si mesmo não existe senão em decorrência de influências ambientais, isto é, que dão ao indivíduo os parâmetros de comparação entre si e os outros. É pessoal, enquanto se incorpora à conduta e nela se reflete a todo momento, gerando idéias, planos, fantasias e imprime direção à conduta; é, porém, social na sua origem e somente pode ser manipulado através da confrontação entre as expectativas sociais que o geraram e a conduta que se instalou. .

Afirmar que estamos em uma fase crítica de transição social, em que alguns valores são substituídos por outros, tornou-se uma linguagem comum e até certo ponto, no nosso entender, sem muito sentido. O homem sempre esteve em fase de transição; a juventude, como grupo, sempre foi contestadora e os adultos, como indivíduos, em sua maioria conservadores, embora como grupo se fantasiem de renovadores e progressistas. Os valores ligados à estrutura legal da família, à religião, ao domínio político e a outros campos sempre foram questionados, em diferentes formas, de acordo com a cultura e os recursos de comunicação e de interação social. Provavelmente, o acontecimento mais traumático da atualidade é o de ser a pessoa, hoje, mais facilmente agredida por confrontações e desafios, porque os conceitos, os valores e as afirmações chegam mais rapidamente a seu conhecimento e exigem pronunciamentos mais numerosos e em menos tempo do que antigamente. Em conseqüência, ela é obrigada a pensar e a decidir mais depressa. Isto gera grandes tensões. O indivíduo não se sente apoiado em dados definidos, pois as informações que obtém sobre a vida e seus valores, no estudo, no trabalho, na família, no campo sexual, no casamento, na política, na religião, fluem sem cessar e até antagonicamente. E o homem começa a perguntar a si mesmo: Quem sou eu? O que quero? Qual é o meu papel face a todas essas expectativas e face às decisões que me pressionam cada vez mais?

A crise existencial se instala quando a pessoa vê um conflito entre os valores introjetados e com os quais, bem ou mal, vai sobrevivendo e a necessidade de decisão, urgente e imperiosa, sobre assuntos familiares, sexuais, políticos, religiosos, culturais, etc., os quais muitas vezes contrariam fortemente a estrUtura que desenvolveu para sobreviver e afirmar-se. O efeito é um sentimento de desvalia ou incapacidade, diante do mundo complexo, para o qual o tempo de decisão é encurtado. Os padrões que introjetamos como úteis sofrem o impacto crescente da urgência de decisões e o sentimento de afirmação de si mesmo entra em colapso. É comum os pais, e mesmo os jovens , em situações de aconselhamento comum ou de terapia, afirmarem com plena consciência de seu estado: "não sei o que fazer, sinto-me perdido", "tenho medo de mudar", "não sei o que vai acontecer".

A mudança de valores às vezes afeta uma área em particular, seja nos costumes sexuais, seja na valorização do status pelo dinheiro ou pelo poder, seja na subordinação a princípios éticos, religiosos ou políticos. De qualquer forma, o indivíduo se vê pressionado, avaliado, julgado pelo que faz ou pelo que não faz. A tentativa de proteger-se, como o engajamento em opiniões e movimentos, é igualmente contestada e o produto emocional é a angústia pela tomada de posições. A pessoa deixa de ser ela mesma para transformar-se em um produto puramente social para o qual é impelida. Perde o sentido de si mesma e procura equilibrar-se

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em valores contraditórios, ou assume posições rígidas para as quais não lhe faltaram críticas e ameaças. Em muitos casos, o foco de avaliação passa de si mesma para o mundo externo e a pessoa se anula. Com esse sentimento de não existir vê-se como robô, manipulado por outros, ou transforma-se em uma fortaleza individual, em luta permanente com convicções que não são as suas. A angústia existencial se avoluma e o indivíduo questiona sua própria individualidade.

Quando a pessoa é capaz de manter seu quadro de referências e, no panorama complexo de opções, conseguir distinguir o seu Eu e valorizá-lo, o caminho para o crescimento e a tranqüilidade é novamente aberto. Quantas vezes observamos, em terapia, a pessoa questionar uma opção como algo imposto, indesejável, e vir, posteriormente, a adotá-la. Nesses casos o fenômeno poderia ser explicado porque, na revisão de seus valores e de seu Eu, ela pode aceitar a opção não mais como imposição externa que a anula, mas como decisão que passa a ser sua e que, por situações diversas, pode coincidir com o alvo das pressões externas.

Uma atitude eficaz na assistência prestada a pessoas que se defrontam com problemas existenciais seria considerar o que diz Rogers: "Uma forma de ajudar o indivíduo a aproximar-se da abertura para a vivência é utilizar uma relação em que é apreciado como uma pessoa em si, em que as descobertas que ocorrem em seu íntimo são compreendidas e avaliadas empaticamente e na qual tem liberdade de' vivenciar seus sentimentos e o de outros sem que, ao fazê-lo, seja ameaçado"(Rogers, 1967).

A proposição de Rogers indica uma atitude terapêutica. Apenas acrescentamos que a justificação dessa atitude estaria.na necessidade de auto-afirmação. Encontrar-se "como uma pessoa em si", ter liberdade de "vivenciar seus sentimentos e o de outros" parece-nos suficientemente claro como um processo de auto-afirmação.

Perspectivas humanísticas e filosóficas

O próprio movimento filosófico atual reporta-se ao motivo de auto-afirmação como componente essencial do comportamento humano. O existencialismo é um notável exemplo ao se contrapor ao tecnicismo que, tratando o homem como objeto, o anula na sua individualidade, Surge, pois, o humanismo na psicologia que nada mais significa do que um movimento de inaceitação do homem-objeto; visa restaurar o seu EU, como pessoa, reconhecendo-o como participante e não como espectador ou produto da vida. Kierkegaard é tido como um dos inspiradores desse movimento, seguido por Hussed, Heidegger e Jaspers. Em continuação encontramos Sartre, Camus, Marcel Ponty, Binswanger, Buber e RoBo May enquanto outros, como Victor Frankl, Rogers e Laing, caminham na mesma direção, embora sob placas diferentes. O encontro existencial é a situação educativa ou terapêutica, de pessoa para pessoa, cada uma com seus valores e seu Eu. Não se busca impingir ou modelar comportamentos, mas vivenciar o que existe dentro de cada um. É o ser no mundo que prevalece.

Esse humanismo na Psicologia é bem o reflexo do homem que se revolta e se desajusta quando se vê alienado de si mesmo; quando é ignorado ou

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"coisificado" ou, ainda, e principalmente, quando perde o autoconceito, a auto-estima, resultante de depreciação externa aceita como válida e assim introjetada e incorporada ao “self”. Quando se facilita à pessoa questionar a si própria, no seu em-si e para-si, pode ela retomar a uma visão de si mesma, a se avaliar face a seus alvos e aspirações, a se reconhecer como um ente próprio, como seu EU subjetivo, todo único e pessoal. Reabre-se, assim, o caminho da tranqüilidade e do bem-estar individual e pode-se constatar quanto é decisivo no ajustamento humano a retomada do valor pessoal, do sentimento de que, apesar dos conflitos e frustrações, a pessoa ainda é capaz de sentir-se a si mesma, de ter a consciência de existir e de com ela selecionar seus valores e seus alvos. A essência, do homem é a percepção de si mesmo, como pessoa, capaz de sentir, pensar e agir dentro de sua individualidade.

Muito freqüentemente observa-se, na assistência terapêutica, que o cliente coloca duas imagens, o "dever ser" e o "ser", as quais entram em conflito e geram angústia. E quanto mais se enfatiza uma ou outra imagem, mais se acentua a dissonância pessoal e o conflito, pois que a pessoa se vê mais profundamente atingida pelos "seus" valores e pelos valores externos.

Os testes, as medidas, assim como as avaliações puramente externas que a todo momento enfrentamos no dia-a-dia tendem a enfatizar o "dever ser", as expectativas sociais, os critérios pelos quais somos julgados, em função de um clima externo, frio e inquestionável. O humanismo em psicologia tende a reduzir essa imposição existencial, retomando o EU, o "ser" como o aspecto importante, não como soma ou função de partes, mas como um todo capaz, inclusive, de superar as deficiências parciais avaliadas isoladamente. Reduz-se, assim, a distância entre as duas imagens, o "dever ser" e o "ser" e a pessoa entra na plenitude de si mesma e assim sentindo usa toda sua potencialidade da qual é biologicamente dotada. O humanismo é, no fundo, um retorno parcial da Psicologia ã Filosofia e ã Biologia sem, contudo, abdicar de seu campo próprio. Não retoma a moderna Psicologia à mera especulação filosófica, nem regride a simples explicações neurofisiológicas mas reabre, na concepção do homem, a existência de um sentido de vida, algo que provém da fé ou de um juízo superior, que pode ser dele mesmo, mas que lhe dá, como assinala Frankl, uma condição caracteristicamente humana. Esse sentido de vida é a razão da existência, e, como afirmação de si, parece emergir como a mais poderosa fonte de ajustamento psicológico aos problemas de vida.

O homem, porém, só chega a encontrar um sentido de vida quando se defronta, sem pressões ou direções, consigo mesmo e com o mundo. Quando é capaz de analisar o “dever ser" e o "ser"; quando pode admitir as exigências e as expectativas sociais como perfeitamente naturais e justificadas no contexto em que se inserem e não como invasões ao seu EU. É o caso, por exemplo, dos filhos, ajustados, que entendem as exigências dos pais e seus papéis de “controladores" e não se sentem rebaixados no seu autOconceito porque são assim controlados. Admitem a naturalidade desses controles sem que isso lhes afete o seu próprio valor. É o caso do empregado, do aluno, do cônjuge, do membro de um grupo ou clube ou de qualquer cidadão que tem que se ater a certas regras e regulamentos. Na medida em que se sinta afetado, rebaixado, humilhado pelas imposições

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existentes, sente estar perdendo o seu EU, ou seja, não o tem suficientemente forte para entender que, fora de si, há outros “Eus" , sociais e pessoais, com conteúdos próprios igualmente válidos. Quando sente que seu Eu persiste, não obstante essas barreiras e que seu "ser" é algo real, próprio, individual, que sobrevive, apesar das limitações, ou por causa delas, então sua imagem pessoal se fortalece e o conflito entre o dever e o ser deixa de existir; afirma-se perante? si mesmo e o ajustamento se instala. Não se confunda, porém, esse comportamento com o conformismo barato, pois isso equivaleria à anulação de si mesmo. A auto-afirmação implica também em luta pela conquista do espaço de vida:, exige o questionamento constante do "dever ser", dos valores e dos sistemas de vida, sempre que essas regras e regulamentos estigmatizem, explorem e escravizem o homem, sempre que a ele se negue o direito de ser alguém na integridade de sua vida cognitiva, afetiva ou sócio-econômica. A luta pela auto-afirmação atinge a pessoa, os grupos, o trabalho, a política e as nações consoante seu caráter nacional. Assume muitas vezes a luta pela posse do poder, inclusive pela violência, quando não pode a pessoa conquistá-la pela inteligência. Nesses casos há um processo de conflito em que as reações não-adaptativas predominam, isto é, buscam indivíduos e grupos destruir a fonte frustradora de sua auto-afirmação e configura-se um estado de patologia social em que inexistem a democracia e o respeito à personalidade humana. Grupos dominam grupos e impõem valores e regras de vida como nos regimes totalitários. Nessas circunstâncias, o homem revolta-se e passa a ser agressor, tão forte é o sentimento de não-afirmação que nele brota. A profilaxia e o remédio são evidentes. Somente quando ocorre a livre expressão e a valorização de cada pessoa pode esta construir o seu EU, conhecer seus limites de competência e agir dentro deles. A violência não terá mais sentido; desaparecerá por desnecessária ou contraproducente; a auto-afirmação elaborada na pessoa e nos grupos, por eles próprios, indicará os limites e as características da luta, o encontro com a comunidade e consigo mesmo.8 - Contribuições à Terapia Psicológica

Como produto de nossas observações ao lángo de muitos anos, a partir das teorias e técnicas de Rogers (Barros Santos, 1968) foi possível inferir que algumas diferenciações teóricas e operacionais estavam se revelando úteis e que poderiam ser classificadas como urna posição neo-rogeriana. Tais distinções são mais sensíveis nos seguintes pontos: 1º) Do ponto de vista teórico, a tendência ao crescimento e a auto-realização proposta por Rogers como fundamental na motivação humana é sensivelmente ampliada com a busca de auto-afirmação, isto é, a necessiçlade básica do ser humano em sentir-se alguém, em existir e em mover-se como pessoa em um mundo que é seu. 2º) As três condições necessárias e suficientes para terapia propostas por Rogers são colocadas de forma um tanto diferente, ou seja: a congruência e a autentiddade são mantidas e até mesmo enfatizadas no sentido de ser o Terapeuta uma pessoa clara e transparente ao cliente, vivenciando suas experiências e seus sentimentos e expondo-os ao cliente

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sempre que este desejar conhecê-Ios; a aceitação ou consideração positiva incondicional é pouco enfatizada pois sua ocorrência pode significar um conformismo pouco pragmático ou um artificialismo que se opõe à congruência ou autenticidade; a empatia é consideravelmente reforçada e ampliada como sendo a mais eficaz das três condições.

Objetivos básicos: desenvolvimento pessoal e psicoterapia

Geralmente, as pessoas que procuram terapia psicológica ou a assistência de orientadores e outros profissionais são movidas por um desejo de resolver relações conturbadas, seja no plano familiar, conjugal, profissional, social, religioso, sexual.ou em qualquer outra área. Não se sentem suficientemente capazes de enfrentar os problemas com os dados da realidade em que vivem. Outros sentem-se em constantes situações de "stress" físico ou mental. Outros, enfim, dirigem-se à terapia para melhor e mais profundo aproveitamento de suas potencialidades; sentem que podem ser mais do que são. Em todos os casos há um estado de incongruência em que sobressai uma discrepância entre o Eu real e o Eu ideal, entre o Eu pessoal e o Eu social (videcapítulos anteriores). A imagem de si é percebida como algo incerto; há um sentimento de incapacidade ou, por outro lado, de injustiça, insegurança ou de medo.

Os procedimentos destinados à assistência psicológica repousam, basicamente, nos conceitos sobre a vida mental e sobre os determinantes do comportamento. Nesses referenciais incluem-se, igualmente, a psicopatologia e a acepção do que é "normal", "útil" ou "desejável". Mowrer (in Pennington & Berg, 1954) apresenta excelente súmula das diferentes posições em que se coloca o comportamento normal, visto pela estatística, pela psicologia, pela filosofia e pela teologia e pelo qual se infere que as influências culturais nessa conceituação parecem ser dominantes.

Atualmente, com a ênfase nos direitos humanos, nos conceitos de liberdade individual e de livre opção, para não se falarJna, teologia do prazer, os caminhos terapêuticos parecem abrir-se no sentido de considerar normal, útil ou desejável aquilo que assim parece à pessoa.. Dá-se a esta a opção e, em conseqüência, a direção do processo assistencial nem sempre se destina a "curar". O alvo transforma-se em desenvolvimento pessoal, no sentido de mobilizar ou de ampliar. os recursos humanos, facilitando à pessoa uma vida mais fértil e mais agradável. O bem-estar, o prazer, a consciência de ser-se alguém e a eliminação de barreiras ou atritos passam a ser a tônica do processo. Esse sentimento parece resultar de um balanço final que a pessoa faz de seu papel na vida, face às expectativas que derivam dele e dos outros e de seu desempenho, ou seja, da maneira como efetiva seu papel.

Metodologia psicoterápica: a dinâmica do processo

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Como assinala Karasu (1979), o repertório de teorias e técnicas psicoterápicas tem-se avolumado e se categorizado em modelos freudianos, neofreudianos e não-freudianos. Uma explosão de formas terapêuticas vem ocorrendo, das quais são exemplos a terapia "racional" de Ellis, o "realismo" de Glasser, o "gritO primal" de Janov, a "terapia orgástica" de Reich, o "sentido da vida" de Frankl, a . inibição recíproca" de Wolpe e até a "meditação transcendental", para citar apenas algumas.

Tanto no caso de desenvolvimento pessoal como no de terapia, os procedimentos têm variado desde a antigüidade e se estendem através do uso de recursos biológicos (quimioterápicos, cirúrgicos, manipulativos, bioenergéticos, etc.), de recursos sociológicos (mudanças ambientais, ocupacionais, situacionais, institucionais, etc.) e de recursos psicológicos (diálogos, dramatizações, catarse, hipnose, condicionamento, atuações no plano cognitivo e emocional, etc.) e se acham descritos por vários autores (Pennington, 1954; Ford, 1963; Sundberg & Tyler, 1963; Wolberg, 1977) e por nós mencionados nos capítulos iniciais deste livro.

Parece estarmos, agora, na era de valorizar o sentimento, o sensualismo e, principalmente, a experiência imediata, o “aqui e agora” , desprezando o passado e o amanhã, o que se explica como repulsa à excessiva dependência do homem à tecnologia e a conseqüente ameaça de perda da própria individualidade. Realmente, a massificação e a tecnocracia levaram o homem a buscar reafirmar-se como alguém que existe; que não é um simples número ou objeto, mas um ser que tem certo conteúdo pessoal e ao qual devem caber alternativas e opções. Se o homem se revolta contra esse anonimato em que é colocado é porque o sentimento profundo de ser (ou de não-ser) foi de alguma forma atingido ou simplesmente ameaçado. Em qualquer campo o homem parece buscar, sobretudo, o reconhecimento de que é alguém, que deve ser conhecido e respeitado. Esse sentimento nos pareceu básico em todos O,s clientes e sua utilização muito útil na técnica terapêutica, na medida em que nossa observação do quadro clínico seja válido. Aliás, sobre os efeitos da técnica terapêutica, há muito que ser ainda descoberto e as pesquisas existentes não são totalmente esclarecedoras, embora revelem alguns marcos operacionais (Ga:rfield e Bergin, 1978). O que parece mais comum, se analisarmos os modelos terapêuticos que vêm sendo usados com nomes diversos através do tempo, é a atenção dada à pessoa, considerando-a, respeitando-a e desenvolvendo seu poder de opção e de decisão.

Embora seja discutível a generalização de modelos metodológicos em terapia psicológica, face à diversidade de casos e, principalmente, às atitudes que se exigem do terapeuta, há certas premissas e conseqüentes formas de atuação que se têm revelado úteis. Procurou o autor reunir os conceitos da dinâmica terapêutica em 8 proposições a saber:

1. É possível inferir que as proposições de Rogers referentes às atitudes essenciais à prática terapêutica e que se referem à congruência, respeito incondicional ao cliente e empatia, em um clima de calor humano, permaneçam

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constantes. O que se propõe, como ingrediente terapêutico complementar e igualmente útil, é a análise cognitiva e emocional do fenômeno da auto-avaliação que o cliente realiza.

A avaliação supra referida é um processo habitual de vida, efetuada a todo momento e tende a ocorrer com mais profundidade em situações de terapia. Consciente do julgamento que ocorre no cliente, pode o terapeuta facilitar essa avaliação através de reflexões de idéias e sentimentos e de comentários esclarecedores sobre:

· eventos que o cliente considera positivos ou negativos em sua experiência;· fantasias que elabora em torno de seu Eu ideal;· dificuldades ou barreiras que percebe, internas ou externas.À medida em que terapeuta e cliente analisam, reflexivamente e em conjunto,

em clima receptivo e não-crítico, os temores e insatisfações, bem como os SUcessos e gratificações, o cliente tende a modificar a concepção sobre si mesmo. A competência profissional do terapeuta - que o diferencia dos leigos e da situação comum de vida - consiste em explorar os elementos cognitivos e emocionais que dão origem às defesas e aos comportamentos do cliente.

Seria possível argumentar que o processo de avaliação facilitado pelo terapeuta venha a se contrapor às três condições propostas por Rogers, particularmente às que se referem à consideração positiva e incondicional e à empatia. A divergência assim suposta não ocorre, porém, uma vez que a avaliação é realizada pelo cliente. O terapeuta, no decurso do processo, sente que o cliente está se avaliando e sua função é reunir os dados e as interpretações deste originárias e abrir caminho para que o cliente reveja as razões de seus pensamentos, sentimentos e ações e os interprete sob outras óticas encontrando explicações menos traumatizantes para os fatos que considera. O papel do terapeuta é o de oferecer, como hipóteses, várias interpretações alternativas focalizando a dinâmica de necessidades e motivos que fluem no cliente e as defesas que vem utilizando para satisfazê-Ios.

As colocações ou interpretações não seguem, jamais, o modelo analítico tradicional em que as expressões físicas ou intelectuais do cliente são captadas pelo analista no seu sentido inconsciente, simbólico, em termos dos conceitos psicanalíticos. O material exposto pelo cliente é comentado pelo terapeuta com expressões usuais do dia-a-dia, ao nível consciente. É um diálogo ativo em que o significado da existência, o sentido de vida, as aspirações e as fantasias são exploradas, dentro de realidades fenomenológicas e existenciais.

2. Ocorrendo a auto-avaliação, surge o conceito do eu-real e do eu-ideal, daquilo que se percebe que é e daquilo que deveria ser; a segurança e a auto-estima são atingidas. Dessa confrontação surgem problemas no sentido de examinar eventuais deficiências pessoais, face às exigências e pressões ambientais. O estado de tranqüilidade, de bem-estar e de produtividade dependerá dessa confrontação. Não se trata de uma simples aceitação de si mesmo, de acordo com a posição rogeriana, mas de um julgametito muito profundo em que as ações e a conduta geral são revistas, com dois sentimentos paralelamente dispostos: 1)

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reconhecimento de necessidades, de deficiências e de pontos positivos; 2) definição de papéis do sentido d_ vida face ao sentimento anterior. Em outras palavras, a pessoa tem a percepção aceitadora do que é, do que precisa, de suas potencialidades e de suas dificuldades e, iÍo mesmo tempo, define sua trajetória de àção, face à avaliação realizada. Não é a aceitação conformista e até certo ponto impregnada de passividade (nada posso fazer, se sou assim...) mas de um planejamento operacional de sua vida face a esse julgamento (tenho limitações, agi com elâsou contra elas, mas posso fazer algo, porque sou alguém e como pessoa existo e tenho um papel a desempenhar) .

Com base no material verbal apresentado pelo cllente, o terapeutafaz comparações entre seu desempenho e as barreiras ou dificuldades que enfrenta. Essa intervenção consiste, de um lado, em vivenciar com o cliente as experiências positivas ou negativas que enfrentou e os recursos de que dispunha para agir.

O terapeuta procura despertar as fantasias do cliente e seu nível de aspirações. Nesse momento o cliente faz um julgamento de si mesmo no que se refere a seu futuro. Surgem imagens sobre o sentido de vida que colocou para si mesmo ou, o que é mais comum, ausência de um sentido. Esse sentido não é apenas um objetivo, tal como entrar em uma faculdade, arranjar um determinado emprego, viver harmoniosamente com o esposo, esposa ou filho, com o chefe ou com os outros, usufruir melhor a vida sexual ou, como me disse um adolescente certa vez: "meu único problema é ter uma moto". Não se trata de manipular esses fatos na sua superfície, nem no seu aspecto operacional, mas no significado que o alcance desses objetivos tem para sua própria avaliação como pessoa.

3. A relação assistencial, seja profilática ou terapêutica, caracteriza-se por uma troca de percepções, cognições e sentimentos, entre o psicólogo e a pessoa assistida. Não se configura, em momento algum, o caráter de discussão ou confrontação de opiniões, mas o posicionamento do psicólogo, quando este sentir que sua verbalização e a expressão de sentimentos possa contribuir para aprofundar o processo de avaliação do cliente sem traumatizá-Io. A discrepância ou a concordância de sentimentos são fatos reais da vida e por isso são essenciais à relação psicológica. O que diferencia essa relação da vida real é a ausência de imposições, luta, domínio ou submissão. Cada um, psicólogo e cliente, tem sua individualidade e podem pensar igualou diferentemente sobre os mesmos assuntos, com base nas percepções e vivências de cada um. Esse é o agente positivo que provavelmente facilita à pessoa sua auto-afirmação.

A aceitação do outro como ele é, deslocando-se o foco referencial do terapeuta para o cliente, entendendo seu comportamento em função da pessoa que ali está, é o procedimento básico rogeriano. Essa condição porém, embora teoricamente compreensível, é praticamente rara, senão na totalidade, pelo menos na maioria das atuações dos psicólogos, conselheiros e outros profissionais. Vê-se constantemente, até nas discussões técnicas e na conversação normal, como o psicólogo julga seu cliente e o está sempre julgando.

4. O diálogo entre o psicólogo e a pessoa assistida processa-se no plano emocional e cognitivo. Há espaço para apreciação racional dos fatos da vida, para discussão de planos de ação e obtenção de informações. O material tratado provém

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do cliente, não havendo direção por parte do psicólogo, o que não deve impedir este último de formular perguntas relativas a situações já exploradas ou que estimulem o cliente a uma ação catártica. Pode haver interpretações superficiais ou profundas, expressas pelo psicólogo, como hipóteses a serem julgadas pelo cliente. Essa colocação facilita o vivenciar e o experienciar proposto por Gendlin (1961).

5. O processo terapêutico é, sobretudo, uma revisão de .critérios, não no sentido de ignorá-Ios, mas na direção de um foco auto-referente. A pessoa muda no sentido de tranqüilizar-se, quando faz um cotejo de suas próprias potencialidades e das barreiras que enfrenta; quando verifica em si mesmo suas aspirações e suas necessidades e as confronta com seu nível de realização. A função do psicólogo é permitir que essa confrontação se faça de forma "consistente com o self" , porém muito mais ativa. Se o cliente verbaliza, por exemplo, "fracassei nos meus estudos", ou "fracassei no meu casamento" ou no "meu trabalho", esse "fracasso" é explorado pêlo terapeuta em função dos agentes que promoveram esse fracasso; o enfoque cognitivo e racional conduz, posteriormente, ao enfoque emocional. Parte-se do cognitivo para o emocional e não deste para aquele.

6. É evidente que os procedimentos e as "técnicas" psicoterápicas, aqui expostas, freqüentemente se relacionam com outras atuações, particularmente com as técnicas cognitivas (Beck, 1976; Beck e Rush, 1978), com as técnicas rogerianas (Rogers, 1951, 1978; Hart e Tomlinson, 1970), com os procedimentos existencialistas (May, 1977) e logoterápicos (Frankl) e provavelmente com procedimentos comportamentalistas (Lazarus, 1972, 1977). Não se trata de uma simples mistura de métodos, mas de um conjunto integrado e coerente de atitudes e de intervenções, que caminham em uma direção definida, isto é, na exploração, pelo cliente, do que representa, para ele, o seu EU, e a abertura de espaço para que ele encontre sua individualid,ade e sua pessoa, para que avalie suas limitações e suas possibilidades e o resultado de suas atuações vivenciais dentro dessas coordenadas, ao mesmo tempo em que define, para si mesmo, um sentido de vida e as razões para existência. A orientação terapêutica é essencialmente baseada na auto-afirmação e nisto se diferencia das demais teorias e técnicas psicoterápicas. Opera-se em uma visão humanística da pessoa, em que o indivíduo, como pessoa, é o foco principal, embora possa haver freqüentes referências a aspectos particulares do comportamento os quais são entendidos na situação organísmica e global da pessoa, no seu contexto existencial.

7. A posição terapêutica, tal como a sentimos, pode envolver, também, um questionamento dos valores vigentes, sejam educacionais, profissionais, familiares ou pol1ticos, não no sentido de oposição pura e simples, mas na acepção de confrontá-Ios com as necessidades e os motivos do cliente, quer pessoais, quer como componentes de grupos ou instituições. Não se restringe unicamente à pessoa, pois estaríamos, se assim fosse, tratando-a em um mundo particular, alienando-a das contingênciais sociais e ambientais. Por essa razão, a personalidade do cliente e suas reações comportamentais são relacionadas com todos os agentes externos que o cercam; o domínio de seus pensamentos e ações é ampliado e discutido face às pressões, valores, necessidades e expectativas

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sociais. O distúrbio psicológico é visto mais como algo resultante de raízes sociais e a pessoa do cliente e seu Eu pessoal são confrontados com essas exigências e características culturais, econômicas e até ecológicas, sem se perder de vista a pessoa do cliente e sua individualidade. Facilitar a percepção de si mesmo, do papel que como pessoa ela reserva a si mesma e assim define sua vida, é o alvo básico. .

8. A ser válida a hipótese de que a auto-afirmação seja o deterrninante básico do comportamento e que os problemas psicológicos ocorram, embora sob nomenclatura e formas diversas, no campo do valor pessoal (poder, prestígio, segurança, confiança em si e sentimentos similares), explicado diferentemente em outras colocações teóricas, é óbvio que o desenvolvimento pessoal, ou a meta terapêutica, seja orientado na valorização da pessoa. Não se trata, porém, de simples elogios, exortações ou justificativas mas, essencialmente, de ênfase na individualidade da pessoa e nas reações que provêm de seu Eu Pessoal e de seu Eu Social. A confrontação entre o Ser e o Dever-Ser, ou seja, entre os impulsos pessoais e as pressões sociais procede-se em termos da pessoa, isto é, daquilo que éomo indivíduo foi nele produzido. Os erros, limitações ou impropriedade de atuações, como tais vistos pelo cliente, são reexaminados face a várias alternativas para que possam ser entendidos na sua dinâmica. *

* Ruth Scheeffer e uma equipe de estudiosos do aconselhamento psicológico, em excelente trabalho descritivo e crítico de métodos e técnicas nessa área. citam a proposição de Dinkmeyer publicada no The Personnel and Guidance Jounal (v. 51, n? 3, pp. 177.81, 1972), segundo a qual o encorajamento e a valorização do cliente são elementos indispensáveis ao processo de aconselhamento. Essa contribuição coincide com o que propomos, neste livro, como produto de nossa experiência pessoal.

O fato psicológico que se julga ser de efeito terapêutico no processo de auto-afirmação é o momento em que a pessoa, ao verbalizar um comportamento e o, sentimento traumático que dele flui, defronta-se com outras alternativas que reexplicam tanto a conduta como a sensação havida. Essas alternativas ou reinterpretações, oriundas dela própria ou do terapeuta, interrompem o caminho da jnterpretação traumática até então existente. Facilita-se, assim, o surgimento de novas alternativas ou respostas que, em geral, reduzem a ansiedade ou angústia (medo das conseqüências que a pessoa interiorizou) porque oferecem explicações menos traumáticas com relação ao Eu-pessoal. A pessoa tende a refazer, para melhor, o juízo sobre si e como essa apreciação é, na linguagem comportamentalista, um poderoso reforçador positivo, a pessoa tende a incorporar essa resposta a seu quadro de reações.

Há o risco de emergirem alternativas ou respostas ainda mais traumáticas, robustecendo o quadro de deficiência e de baixo conceito, já instalado, com aumento da ansiedade e maior desordem comportamental. São os efeitos negativos que podem ocorrer em qualquer terapia. A habilidade do terapeuta consiste em discutir com o cliente todas as alternativas possíveis, traumáticas ou não,

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acompanhadas, sempre, de calor humano, apoio e empatia que tendem a neutralizar os efeitos traumáticos de qualquer nova explicação.

Muitas observações, originárias de outros autores, parecem conformar a dinâmica do processo tal como a vemos, ou seja:

- A qualidade da relação pessoal é, sempre, o fato mais importante. As atitudes criadas pelo psicólogo e o clima psicológico são o que leva o cliente a mudanças constrUtivas. "Um alto grau de empatia talvez seja o fator mais relevante numa relação sendo, sem dúvida, um dos fatores mais importantes na provocação de mudanças e de aprendizagem" (Rogers e Rosenberg, 1977). A empatia é uma forma de valorizar a pessoa, provavelmente mais operante do que o "respeito positivo incondicional" e a "congruência".

- Pesquisas de Burler, sobre o método rogeriano, citadas e comentadas por Pagés (1976, p. 113), envolvendo mudanças no Ego Ideal e na concepção do Ego como conseqüência de terapia, medindo-se as variações pelo processo "Q-sort", indicaram "que se produzem mudanças, não atribuíveis ao acaso, no sentido da redução das distâncias entre ego e ego ideal, antes de e após a terapia" (Pages, 1976, p. 114).

A pergunta que os comentaristas e pesquisadores colocam é sobre onde ocorre a mudança: no ego ideal ou na concepção do ego e a análise dos dados parece indicar que "na maior parte dos clientes o ego ideal permaneceu admiravelmente estável no curso da terapia... É principalmente a concepção do Ego que mudou na maioria dos casos". E Rogers diz, ao referir-se ao resultado da terapia, "que o cliente tornou-se essencialmente a pessoa que desejava tornar-se quando começou a terapia" (Pages, 1976).

Mais adiante diz Pages que a terapia produz modificações na maneira como a pessoa se julga, permanecendo inalterados seus valores. O cliente passa, em função da terapia, a reconhecer seus próprios valores, a torná-Ios seus, o que exclui a resignação e a indulgência consigo como produtos da terapia. Nesse caso, a nosso ver, ocorre o processo de auro-afirmação: o cliente passa a sentir-se como pessoa e a reconhecer seu potencial e suas limitações, sem efeitos traumáticos. Cremos, pois, que a resultante terapêutica é a auto-afirmação, embora não seja esse fator assim identificado por Rogers ou seus comentaristas.

No processo de valorização de si mesmo, surge a confrontação dos valores introjetados na infância e na adolescência. Toma-se um quadro de valores que ditam o certo e o errado, na forma pela qual os introjetamos e que muitas vezes entram em oposição com a nossa própria percepção e nossas experiências. Ocorre uma acomodação pela escolha de um dos lados, mas pode ocorrer, também, um conflito, a percepção de uma nítida disparidade entre o que somos e o que "devemos" ser. Corresponde esta colocação àquilo que Rogers (1978) afirma passar-se na terapia bem conduzida: a pessoa é valorizada na sua individualidade e singularidade. Este é o caminho psicoterápico que temos visto como frutífero.

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PARTE III

APLICAÇÕES EM SITUAÇÕES ESPECIAIS

9 - Filhos e Alunos Difíceis

o texto abaixo resultou de um levantamento dos problemas mais freqüentemente citados pelos pais e professores, realizado pelo autor, entre alunos de curso de I? e de 2? grau. Como constitui amostra de um amplo panorama ed)lcacional e social foi aqui incluído, com algumas modificações na sua redação original.

Como ocorrem os problemas

1. Vimos nos Capítulos 6 e 7 que a auto-afirmação como necessidade básica do ser humano transforma-se em determinante do comportamento. Há, porém, outras necessidades que precisam ser satisfeitas, seja para simples sobrevivência, seja para desempenhar os papéis que o meio ambiente espera ou impõe. Assim, a pessoa tem necessidade de alimento, de água, de repouso, de conforto, no plano físico como, também, necessidade de segurança, de afeto, de contacto humano, de realização e muitas outras que surgem na confrontação entre o Eu Pessoal e o Eu Social (ver Capítulo 7). Cada necessidade é expressa por alvo consciente e aparente, embora seu conteúdo possa ser inconsciente.

2. Quando a pessoa satisfaz uma necessidade, consciente ou inconscientemente, sente-se bem; está psicologicamente ajustada.

3. Quando a necessidade não pode ser satisfeita, por algum impedimento material ou barreira colocada pelos pais, colegas, professores ou por outros agentes quaisquer, a pessoa sente-se frustrada. Outras vezes, a satisfação de uma necessidade impede a satisfação de outra e o organismo vê-se em conflito. Qualquer das situações produz estados desagradáveis ou ameaçadores e a pessoa entra em estado de tensão que se torna maior na medida do grau de insatisfação.

4. Diante de uma necessidade não satisfeita a pessoa tenta vários recursos para superar as dificuldades e, conseqüentemente, reduzir o inconfortável estado de tensão. Do ponto de vista psicológico, o ajustamento ocorre quando se elimina ou se reduz a tensão:

5. Enquanto não se reduz a tensão, a pessoa permanece em crise (ansiedade, agitação, mal estar, etc.) que é um efeito emocional. E quando a tensão é severa outras conseqüências danosas podem surgir. Está a pessoa, do ponto de vista psicológico, com um problema que pode afetar seu desempenho e este fato, em um círculo vicioso, agrava a tensão.

6. As respostas ou "soluções" encontradas pela pessoa frustrada ou em conflito consigo mesma são extremamente variadas. O ataque direto ao problema, isto é,

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comer se tem fome, beber se tem sede, refazer um trabalho falho, tratar-se quando doente, é, em geral, a melhor resposta. As vezes, essa solução é impossível ou cria outros problemas e a pessoa adota processos de ajustamento ou, como afirmou Freud, mecanismos de defesa. Estes podem variar desde uma negação do fato (não toma conhecimento) até comportamentos inadequados ou mesmo anti-sociais. O processo de ajustamento é impulsivo e pode ocorrer tanto no plano consciente como no inconsciente.

7. A solução ocorre, pois, quando a pessoa satisfaz a necessidade ou quando, não podendo satisfazê-Ia, adapta-se de outro modo, de maneira benéfica para si mesma e para o ambiente físico e social em que se acha. Reduzir as tensões criadas pela insatisfação é, sempre, o primeiro passo, a fim de que a pessoa mobilize seus recursos pessoais na direção mais satisfatória.8. Esquematicamente, o processo é exposto na figura abaixo:Pessoa --------------------------------------|||||||-----------------------------------àAlvo 1 2 3 4

1. Pessoa com necessidade a ser satisfeita;2. Atividades dirigidas para o alvo;3. Barreiras que dificultam ou impedem a satisfação da necessidade;4. Alvo (necessidade, consciente ou não).

Um exemplo prático pode ilustrar os fatos apontados:

a) Suponhamos um jovem que, por qualquer deficiência, sinta-se marginalizado, não

aceito ou não compreendido por seus pais, por seus professores ou por outros

agentes sociais. Note-se que esse sentimento de rejeição pode corresponder a uma

ocorrência real ou ser imaginária;

b) Como o sentimento de ser alguém, valorizado e aceito é uma necessidade, ocorre

um estado de motivação e tensão que o leva a atingir certos alvos;

c) Busca o jovem alguma maneira de tornar-se aceito e por caminhos vários acaba

encontrando uma situação com imagem satisfatória de si mesmo e que lhe reduza a

tensão. Pode ser um sucesso em alguma atividade ou um grupo que o apóia. Se a

atividade ou os padrões dessse grupo forem pessoal e socialmente aprovados -

segundo os habitos e os valores individuais e sociais do momento - a pessoa

adapta-se positivalmente; caso contrário, reduzirá a tensão mas pode adotar

comportamentos que, cedo ou tarde,lhe serão também funestos, ingressando em um

quadro de reações negativas;

d) A solução pode ocorrer quando encontrar, na família, nos estudos,no trabalho ou

em qualquer outra situação signiificativa, a valorizaçãoe o reconhecimento que

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procura. Se, por outro lado, houver reais deficiências físicas, intelectuais ou

socioeconôrmicas que dificultemou impeçam sua valorização nos grupos "normais",

temos que ajudar a pessoa a encontrar soluções, o que pode, genericamente,

fazer-se sob as seguintes formas: 1) descobrir situações compensatórias que

restaurem sua valorização e a auto-afirmação; 2) reduzir a tensão mediante uma

revisão, pela pessoa, de suas necessidades, de seus alvos e do significado que

eles apresentam na sua personalidade; 3) combinar as duas soluções.

Medidas preventivas

Muita coisa já se conhece na ciência, por experimentos e pesquisas, a respeito de certos problemas e a maneira mais eficiente de evitá-Ios ou de recuperar os indivíduos que deles sofrem. Em Psicologia, não se pode prescrever regras de ajustamento de uso geral, igualmente efetivas. Como cada caso tem vivências e experiências próprias, as soluções devem ser individualizadas. Há, tão somente, alguns princípios gerais que podem ser considerados válidos Pela a grande maioria dassituações e que atuam como medidas preventivas, a saber:

1. A pessoa precisa sentir-se aceita, querida e considerada. Isso não significa aprovar ou reprovar sua conduta, mas apenas reconhed-Ia como alguém, com individualidade própria e com interesses, atitudes e problemas que existem em sua vida.

2. A pessoa precisa estar informada e encontrar sentido no que faz. Essa informação consiste em colocar à sua disposição, sem pressões, todos os dados de que precisa para enfrentar seus grandes ou pequenos problemas. Não se pode esperar que a criança ou o jovem resolva problemas de Matemática, ou que saiba aplicar seu dinheiro, quando não conhece certos cálculos ou não está informada sobre o que comprar com sua mesada ou ordenado. A informação visa, também, facilitar contacto com vários tipos de atividade, a fim de que, ela mesma, sinta suas possibilidades e suas limitações.

3. É preciso conhecer e aceitar as necessidades próprias de cada idade e cuja satisfação é essencial nessa respectiva fase da vida. Privar um jovem de ir a festas ou passeios com seus amigos ou interromper uma atividade sadia, apenas por razões de somenos importância, é uma boa maneira para criar frustrações e conflitos.

4. O aluno precisa mais ser assistido do que guiado. Quando mamifesta desatenção, displicência, falta de capricho ou de esforço no trabalho escolar, há um fator emocional presente, quase sempre a falta de confiança em si ou nos outros. É preciso demonstrar que se deposita confiança nele. Discuta as alternativas e as expectativas existentes.

5. Para corrigir erros e desenvolver o comportamento desejável, valorize a pessoa e procure reforçar, de imediato, o comportamento correto. Reforço significa algo que "recompense" o indivíduo. Evite, por outro lado, qualquer recompensa ou

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reforço dos atos errados.6. Não se pode esperar que todos os alunos tenham igual aproveitamento. Um

aluno intelectualmente limitado, que consegue resultados médios com esforços intensos, deve ser considerado por essas condições e não porque deixou de conseguir resultados iguais aos de outros, melhor dotados.

7. Aprende-se pela própria experiência. É preciso, em conseqüência, quando não ocorre perigo grave, ter-se oportunidade de fazer por si mesmo seu trabalho, intervindo o professor ou instrutor apenas a seu pedido. Quando, por inibição ou por medo (outro problema), o aluno evita à professor, essa inibição, ou medo, deve ser tratada antes, ou concomitantemente, com os outros problemas.

8. Tente analisar, com o próprio aluno, as indecisões que este manifesta em certas situações. Muitas vezes não sabe ele que curso deve seguir e custa decidir. Essa incerteza pede ser devida à falta de informações adequadas (não conhece os cursos nem a si mesmo) mas pode, também, ser devida ao medo de nãco corresponder às expectativas como fruto de experiências antigas. Essa indecisão exige que o aluno se expresse livremente e que, em atmosfera isenta de pressões ou de medo, faça sua escolha. Decidir por ele equivale a aumentar sua incapacidade de decisão.

9. Quando se identificam dificuldades específicas (de saúde, de: baixo nível escolar, de socialização ou de outro tipo), é preciso um esquema especial de recuperação, seja médico, escolar ou psicológico, a ser estudado individualmente.

Quem atende os casos difíceis? Quem coopera?

Pensam muitos leigos quando seu filho, ou seu aluno, apresenta problemas, que basta mandá-Io para o psicólogo, para o orientador, para o médico ou para outro especialista. Ignoram essas pessoas que a maioria dos problemas tem origem ambiental e somente se obtém êxito quando são mobilizados todos os agentes do meio. A cooperação dos pais, dos professores e de outros agentes, inclusive às vezes dos próprios colegas, é essencial e não se pode esperar melhora de desempenho, atitude ou ajustamento sem a contribuição dessas pessoas.

Há, geralmente, três atitudes que os pais, professores e outras pessoastomam, face aos casos difíceis:

1. Atitude “comodista", expressa pelo encaminhamento do caso à autoridade, ao Assistente Pedagógico, ao Orientador, ao Psicólogo ou ao Assistente Social, "lavando as mãos", como se a recuperação fosse obrigação apenas do "especialista" e que o pai, ou o professor, nada tivesse com o problema;

2. Atitude "coercitiva", segundo a qual tudo se resolve com advertências, disciplina, punição e controle. O que falta, dizem alguns, "é autoridade". "Nada de especialistas: o que a pessoa precisa é aprender a andar na linha'". Ignoram essas pessoas que o indivíduo inadaptado nãose desadapta porque assim o quer. Muitas vezes ele sabe distinguir entre o certo e o errado, entre o que deve ou não ser feito, mas não consegue mudar seus próprios hábitos;

3. Atitude "cooperadora", que se expressa pela compreensão das dificuldades dos problemas e pela predisposição a ajudar no que couber.

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Há casos em que um psicólogo, psiquiatra ou orientador, como também um diretor ou professor, pode manipular sozinho, sem precisar da cooperação escolar ou familiar. Isto ocorre na intimidade de entrevistas ou contactos pessoais e quando os problemas são essencialmente individualizados. Freqüentemente porém, as dificuldades, as pressões, as exigências e insatisfações decorrem de um complexo de agentes situacionais e a atuação isolada do profissional especializado não é suficiente. É o caso, por exemplo, do aluno rejeitado pelos colegas ou constantemente criticado pelos pais ou professores. A redução dos efeitos desse problema pode ocorrer em sessões individuais, das quais essa situação é ventilada e o aluno pode manipular melhor suas tensões. Quando, porém, se consegue modificação no comportamento do grupo ou dos pais e professores que o rejeitam, o processo é mais rápido e, às vezes, o único realmente efetivo.

Em comunidades escolares, a participação de diretores, assistentes, professores, instrutores e monitores é imprescindível. Muito raramente o orientador ou o psicólogo podem trabalhar sozinhos. Ninguém vive isolado, em ilhas; os fatores ambientais que produziram o desajustamento são, também, os fatores que promovem ou restauram o ajustamento; ignorá-Ios é ser comodista, irrealista ou simplesmente desinformado.

De que tipo de assistência precisam os casos difíceis?

A experiência e os estudos sobre Educação e Psicologia vêm demonstrando que as principais providências, quando se suspeita de "problemas", são as seguintes:

1. Verifique, preliminarmente, se pode haver fatores orgânicos ligados aos problemas. Pode a pessoa estar doente, mal alimentada, fatigada, com excesso de atividades ou de estimulação ou ter deficiências físicas (visão, audição, problemas neurológicos, etc.). Um exame médico pode ser necessário.

2. Tente identificar os momentos e os lugares ou circunstâncias outras em que ocorrem os problemas (período do dia, relação com outros hábitos da vida diária, relação com pessoas, etc.).

3. Evite julgamentos e crie um clima de compreensão e ajuda, o que não significa aprovação de atos' 'errados", nem tolerância ou permissividade mas, apenas, que se constata um problema e se quer ajudar.

4. Quando houver uma causa identificada e removível, pode-se reduzir oueliminar o problema atuando sobre essa causa.

Exemplos:

a) Aluno que não consegue fazer os trabalhos escolares, não consegue fazer cálculos ou operações necessárias a certas tarefas:

É possível que o aluno tenha dificuldades físicas ou mentais ou não tenha aprendido o necessário e tenha nível potencial baixo.

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Se houver problemas físicos estes devem ser previamente tratados; se a causa for falta de escolaridade, isto é, falta de conhecimentos, é óbvio que a solução é levá-Io a aprender o que lhe falta ou adaptar os programas a seu nível.

b) Aluno que falta constantemente aos trabalhos escolares:Pode haver várias causas tais como: 1) medo de crítica do professor; 2) medo

de encontrar colegas ou situações que o ameaçam; 3) dificuldades econômicas e sociais, inclusive vergonha por não ter o que os colegam têm; 4) atração por. outras atividades que colidem com o horário da escola; 5) sentimento de revolta, procurando não ir à escola para agredir o mundo que o perturba; 6) necessidades familiares que impedem a freqüência à escola, etc. .

c) Aluno indisciplinado, que transgride constantemente as recomendações familiares ou escolares:

Pode haver várias causas, como as citadas no exemplo anterior e outras, de tipo emocional, que levam o aluno a buscar impor-se e a chamar a atenção sobre si, ao inconformismo, a reações agressivas provenientes de outras frustrações, etc.

Na imensa maioria dos casos, os problemas acima e outros, não mencionados,

embora oriundos de causas objetivas (físicas, intelectuais ou sociais) geram

condições emocionais desagradáveis para a própria pessoa. Ela sente que há

algoerrado; seu autoconceito se deteriora. Há, pois, dois componentes do

problema,como vimos:

a) uma deficiência potencial; física, social, econômica ou intelectual;

b) a percepção da deficiência, gerando conseqüências emocionais no aluno que

passa a sentir-se diferente ou deficiente o que, por sua vez, agrava uma eventual

deficiência potencial.

Na vida habitual, os pais, professores e instrutores podem colaborar,

observando e registrando as situações em que o comportamento indesejável ocorre.

Podem eles, também, tentar várias situações, para observar a respectiva variação

no comportamento. Essas últimas providências devem, porém, se limitar às

variações habituais da situação familiar ou escolar, ou seja, mudanças de local, de

horário, de tipo de trabalho, de relacionamento com colegas, de atitudes do

professor, deseqüência de atividades, de participação em grupos, de contactos

pessoais, etc., que não ofereçam riscos ou criem outros problemas.

Ajuda emocional, sempre necessária

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Ajudar a pessoa a enfrentar estados emocionais é sempre possível e

conveniente. Variam as técnicas, desde a atitude amiga, compreensiva, estimulante,

de um pai, professor ou colega, até os processos mais complexos de intervenção, a

carga de psicólogos, orientadores educacionais e outros especialistas, cada um em

sua área. O que geralmente se usa, na situação familiar ou escolar, é o seguinte:

a) informação, explanação e discussão: a criança ou o jovem é convidado a

discutir suas dúvidas e suas dificuldades e o conselheiro (Pais, Diretores,

Professores, Orientadores), ouve e informa sem críticas, pressões ou comparações,

sem atemorizar ou criar repressões e defesas no indivíduo. É, apenas, uma

ventilação do problema, na qual se estuda, em conjunto, possíveis soluções. O

conselheiro pode propor novos planos e estudar como aluno os "prós e contras" de

cada um;

b) apoio, tranqüilização: consiste em examinar-se o lado positivo das

dificuldades e, mostrando calor humano e compreensão, levar o indivíduo asentir-se

mais animado em enfrentar seus problemas. Não consiste em dar conselhos ou fazer

recomendações mas, ao contrário, em procurar mostrar compreensão das

dificuldades existentes e procura de meios para eliminá-Ias ou para reduzir seus

efeitos;

c) recreação, compensação e atividades substitutas: aplicam-se aos casos que

têm condições de êxito em certas atividades, de modo a compensar, dessa forma,

os insucessos em outras áreas. Muitas pessoas podem melhorar seu ajustamento,

desde que, em esportes, atividades sociais ou de outro tipo, sintam resultados

favoráveis que não podem ser obtidos em estudos, no trabalho ou na vida familiar;

d) facilitar a auto-afirmação sempre que a oportunidade surgir.

Medidas gerais e casos graves

A solução de problemas de conduta não é fácil. Pode demorar algumas semanas, alguns meses e até alguns anos. As vezes, não há soluções e o que faz o especialista é impedir que o caso se agrave. Essa circunstância é muito comum e freqüentemente os pais, diretores e professores dizem: "o caso continua na mesma". Não vêem eles que continuar na mesma, às vezes, já é um grande passo, pois o

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caso poderia deteriorar-se mais, se algumas providências não tivessem sido tomadas.

Há normas e procedimentos gerais que precisam ser considerados, ou seja:

a) em um clima de autenticidade, compreensão e empatia os problemas são reduzidos. Criar esse clima é função de todos os elementos da família ou da escola; lembremo-nos de que a auto-áfirmação pode ser um determinante básico do comportamento (ver capítulos anteriores);

b) a aplicação de técnicas especiais, quando o caso exige, é função técnica e legal de médicos, psicólogos e orientadores, conforme o caso e a técnica empregada (os profissionais sabem disso) ; algumas vezes é indispensável articulação com os professores e os pais * ;* Outros especialistas podem ser necessários. tais como o fonoaudiólogo, o fisioterapeuta, o pedagogo e outros.

c) quando o caso é muito difícil e a escola ou a família não têm recursos para ajudar os alunos com problemas graves, é recomendável proceder-se da seguinte forma:

- esgotar todos os recursos escolares e familiares (ver itens anteriores);

- encaminhar a pessoa a tratamento especializado, em organizações públicas e

particulares que possam atendê-Ia e acompanhar a evolução do caso, cooperando

com os recursos familiares e escolares.

- o afastamento dó aluno da vida escolar é a providência menos adequada e

somente se justifica quando a atuação escolar for impossível; quando o aluno se

beneficia com esse afastamento; quando há perigo evidente de que a presença do

aluno certamente contamine o comportamento de todo um grupo (exemplo: traficante

de tóxicos, líder de delinqüentes, portador de graves distúrbios mentais que exigem

internação, etc.). Mesmo o afastamento' só se justifica após todas tentativas de se

recuperar o aluno. Já vimos que há muitos métodos e atitudes que facilitam essa

recuperação.

Atuação de professores

Os professores são pessoas muito significativas na vida do aluno, não só

porque a convivência com eles é intensa, como porque o docente é um modelo para

o aluno. As atitudes dos docentes, às vezes mais do que seus conhecimentos

técnicos, tendem a criar situações de conforto, de apoio, de entusiasmo e de

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confiança; noutras vezes, podem gerar insegurança, medo e revolta. Nessa posição

estratégica, a ajuda do docente é indispensável, sempre que haja um aluno com

dificuldades, sejam elas físicas, intelectuais ou emocionais. As técnicas variam

conforme o caso, mas as sugestões contidas nos itens anteriores são sempre

benéficas epor si sós representam grande ajuda. A articulação com psicólogos e

com orientadores é indispensável. Para que os professores possam atuar

eficazmente na modificação do comportamento do aluno, quer para ensinar-lhe

habilidades ou conhecimentos, quer paracorrigir comportamentos inadequados, as

seguintes medidas podem ser úteis:

a) observar cada aluno individualmente, como pessoa; procurar detectar suas

necessidades, seus motivos, suas aspirações, suas dificuldades e seus pontos

positivos;

b) verificar quando um comportamento útil ocorre. Por exemplo: quando e em

que condições executa um cálculo correto; quando e em que con dições toma

uma atitude adequada;

c) uma vez identificada a situação em que ocorre o comportamento útil,

descobrir o que reforça esse comportamento. Exemplo: se uma operação,mental ou

manual, ocorre quando se divulga o que se fez ou quando se elogia, ou quando se

utiliza o trabalho feito, etc. É importante verificar oque satisfaz o aluno e associar o

comportamento desejado a essa satisfação. Esse comportamento assim

recompensado tende a se repetir e o aluno "aprende". É o reforço;

d) quando o aluno errar, não dar importância ao erro. Descobrir o caminho

(reforço) que o leva agir do modo desejável;

e) subdividir cada assunto ou tópico do programa em pequenas partes e dosar

as operações ou tarefas de acordo com cada aluno; reforçar (ou recompensar) de

imediato quando ocorrer um acerto.

O relacionamento com a família do aluno

Quando a direção da Escola ou o Orientador procura articular-se com a

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família, podem ocorrer muitas reações emocionais que prejudicam a adaptação do

aluno. É sempre um grande desconforto e ameaça para o aluno ter seus pais

chamados à escola. Como esse contacto, às vezes, agrava os problemas, é sempre

recomendável tratar do caso, primeiramente, com o aluno, na situação escolar.

Quando se impõe o contacto com os pais, o aluno deve ser consultado a respeito.

Essa prática prévia é benéfica ao aluno que se sente valorizado e responsável

(Nunca dizer: "Vou falar com seus pais se você não melhorar"). Essa ameaça é

prejudicial. Deve-se confiar no aluno e mostrar que se confia nele. Se, apesar

desseestímulo à autoconfiança, o problema persiste, é recomendável o uso de

técnicas especiais, na simação escolar, para a recuperação do aluno. Somente em

casos graves promove-se a articulação com a família, contrariando a decisão do

aluno e, mesmo nestes casos, o aluno é cientificado do que pode ocorrer.

Para tornar menos traumatizante o contacto com a família e para solicitar a

cooperação desta na solução de problemas, usa.se o recurso de reuniões gerais,

para as quais todos os pais são convidados e os problemas dos alunos são

focalizados sem se identificar as pessoas. No final da reunião pode-se,

isoladamente, conversar com os pais mais diretamente envolvidos em certas

situações.

A "conversa" com os pais ou responsáveis externos é sempre delicada. É

preciso saber que os pais, quando notificados sobre problemas de seus filhos

sentem-se diminuídos, humilhados, angustiados e até agredidos. Começa-se a

entrevista aceitando e compreendendo a simação dos pais. Não se criam

reprimendas ou advertências que, como no caso do aluno, complicam o problema. É

preciso confiar, também, nos pais e mostrar que se confia neles e que, juntos,

podemos achar soluções. As intimidações ou ameaças aos pais refletem-se no

aluno e, por isso, devem ser evitadas. Quando os pais sentem essa confiança por

parte da escola passam, em geral, a cooperar de forma benéfica.

Muitas vezes os pais respondem de forma indireta, isto é, tornam-se

accessíveis à cooperação, quando convidados a assumir tarefas na escola

(participação em festas, campanhas, associações, etc.). É mais um recurso de que

se dispõe para obter a contribuição familiar.

Exemplos de problemas com suas possíveis causas e medidas assistenciais

Sintomas Possíveis Causas Possíveis Medidas Assistenciais

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Conforme o Caso

Desinteresse, apatia, fadiga Problemas de saúde e de nutrição.Falta de repouso. Dificuldadesintelectuais. Fatores emocionais.

- Assistência médica. - Atuação deProfessores. - Criação de nívelrazoável de competição, apelandopara o que for motivador(necessidades).

Dificuldades em acompanhar o nívelde estudos; não consegue realizartarefas, operações e outrosexercícios

Atraso escolar. Dificuldadessensoriais, motoras ou mentais(falta de coordenação motora ououtras aptidões).

- Recuperação de estudos (aulas etrabalhos especiais). - Atuação deProfessores, com tarefascompensatórias.

Falta constante às aulas; nãocumpre as tarefas escolares.

Medo de fracasso. Medo de críticado professor ou de colegas .Dificuldades de transporte e dehorário. Problemas domésticos.Sentimento de revolta,procuraandonão fazer as tarefaspara agredir a escola. Problemasde saúde. Interesse maior poroutras atividades que conflitam coma atividades escolar .

- Solução de problemas de saúde,de transporte, de horário, etc. -Ajuda emocional. - Modificaçãoambiental para conciliar interesses.

Dificuldades de raciocínio oudiscreto atraso mental.

Fatores orgânicos. Agravamento doproblema pela percepção daincapacidade e pela atitude deparentes, amigos e colegas

-Trabalhos individualizados,repetidos, concretizados, para queo aluno use os sentidos e possapegar, ver, ouvir, etc., de formalenta e progressiva; nada exigiralém da capacidade individual; nãocomparar com outros. -Ajudaemocional.

Desenvolvimento mental ou dealgumas aptidões muito acima damédia do grupo (superdotados).

Estrutura orgânica favorável.Facilitação sócio-econômica

- Aproveitamento das aptidões ecapacidades em tarefas especiais.- Ensino individualizado aberto àcriatividade

Deficiência sensorial ou motora(visão, audição, etc.) ou defeitoortopédico.

Fatores constitucionais, de saúdeou ambientais

- Aproveitamento de outras aptidõese capacidades. - Mudança deaspirações. - Modificaçõesambientais

Comportamento sexual. Fatores constitucionais epsicossociais conjugados

- Psicoterapia. - Ausência de críticaquando envolver problemaemocional. - Ajuda emocional.

Rivalidade e briga entre alunos ougrupos de alunos.

Hábitos domésticos. Sentimento deinferioridade e necessidade deauto-afirmação. Insatisfaçõesfreqüentes. Perturbações mentais.

- Atividades físicas para descargaafetiva. - Sessões de grupo paradiscussão de problemas. -Remanejamento de grupos outurmas.

Medo de realizar exercícios etarefas dizendo que "não sabefazer" o que se pede.

Experiências traumáticasanteriores. Atitudes inadequadas depais ou professores.

- Emprego de tarefassucessivamente graduadas emdificuldade. - Observação de outroscolegas fazendo o trabalho; tarefassimples. - Valorização da pessoa(auto-afirmação

Toxicomanias(farmacodependência)

Fatores ambientais e psicossociaisconjugados.

- Reduzir ou eliminar a dependênciafisiológica. - Reduzir ou eliminar adependência psicológica por

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técnicas terapêuticas individuais ede grupo. - Ajuda emocional. -Atividades de auto-afirmação

Situação econômica muito superiorà dos colegas, gerando"exploração" por parte destes,críticas constantes ou rejeição pelogrupo.

Status sócio-econômico e hábitosdiferentes dos colegas. .Imaturidade social.

- Ignorar os comportamentos deesnobismo.

Situações ou problemas familiares:que levam aluno a senti-sefocalizado, desprezado oucriticado' pelos colegas (Ex.: pai ouparentes alcoólatras oucondenados pela justiça, ou comatividades socialmente inaceitáveis;desconhece o pai ou a mãe, etc.).

Fragilidade no autoconceito eproblemas domésticos:

- Ajuda emocional.

Comportamento anti.social,pré.delinqüente ou' delinqüente(vandalismo, furto, indisciplinageneralizada, instigação àdelinqüência em caráter freqüente.).

Falta de educação e de "modelos"adequados na infância e nameninice. Agressividade resultantede sérias privações.

- Reeducação em outro ambiente,com outros “modelos". -Desenvolver confiança recíprocaentre as pessoas do grupo e oespírito de equipe.

Furtos, agressões, indisciplina evandalismo em caráter ocasional.

Frustrações, conflitos e privaçõestemporárias.

- Ajuda emocional. - Mudanças deturmas e de ambientes.

Comportamentos psicológicosanormais tais como fobias,obsessões, compulsões e outrasreações de tipo neurótico oupsicótico.

Fatores orgânicos e psicossociais. - Ajuda emocional. - Psicoterapia. -Assistência médico-psiquiátrica.

Deficiência concentrada apenas emcertas atividades tais como emPortuguês, em Matemática, emEducação Física, na execução deoperações manuais etc.

Deficiência de aprendizagem narespectiva atividade. Dificuldadessensoriais ou motoras. Medo defracassar na atividade oucondicionamento aversivo(associado a experiênciastraumáticas).

- Aulas e exercícios especiais. -Atividades compensatórias. - Ajudaemocional. - Contracondicionamento.

Desinteresse pelas atividades nãorelacionadas com o curso quefreqüentam.

Falta de informações,Necessidades não satisfeitas.

- Atuação de professores. -Exploração pessoal de novosinteresses.

Grande hesitação na escolha deprofissão.

Falta de informações. Medo detomar decisões (insegurança).Dependência familiar ou social(imaturidade) .

- Dar informações. - Ajudaemocional. - Desenvolvimento ecrescimento pessoal.

Deficiência em roupas, em dinheiroou mesmo em lanches, que leva oaluno a sentir-se envergonhado ouhumilhado.

Problemas econômicos, - Atividades compensatórias. -Auxílio escolar quando possível.

Atitudes sociais e grupais muitodiferentes da dos colegas, gerandoatritos com estes.

Necessidade de auto-afirmação ou,ao contrário, sentimento deonipotência e superestima de simesmo.

- Ignorar os comportamentosexcêntricos.

Pais que se recusam a participarda vida escolar,

Falta de informações. Inabilidade dediretores, orientadores, psicólogose docentes,

- Convites para reuniões gerais depais. - Convite pessoal paraexecução de certas tarefas. -

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Convite para atividades sociais erecreativas como "ponte" decontacto.

Nota: A ordem em que aparecem os sintomas não tem nenhuma significação especial.

10 - Ações Preventivas na Educação, na Família e no Trabalho

A educação e a família

A ser válida a constatação de que o motivo de auto-afirmação seja básico como determinante da conduta, muitos dos atuais esquemas educacionais deveriam ser questionados. Embora se apregoe em múltiplos e variados cursos de planejamento educacional, de relações humanas no trabalho e até na própria política, que a pessoa deve ser ouvida, participante e atuante nas decisões, o que realmente se faz pouco concorda com essas idéias. Os agentes controladores, como assinala Skinner (1967), estão sempre presentes, reduzindo o indivíduo à insignificância. A liberdade seria um mito e, portanto, menos perceptível o sentido da própria individualidade.

A massificação nos sistemas educacionais, além de rebaixar o nível de ensino, pois que o atendimento de massas o reduz ao padrão mais baixo do grupo, tende a conduzir a pessoa à perda de sua individualidade na medida em que padroniza os conteúdos e os processos pedagógicos. O resultado é, como assinalada Patricia Cross (1976), não atingir a educação 91 % das habilidades humanas de forma a assegurar uma contribuição à sociedade desse ponderável contingente. Deficientes,. "normais" e superdotados, são tratados provavelmente pela média ou pelo menor nível e o aluno deixa de ser alguém.

A atual legislação educacional brasileira prevê flexibilidade curricular para atender as diferenças individuais, ao estabelecer que "os currículos do ensino de I? e 2? graus terão um núcleo comum, obrigatório em âmbito nacional e uma parte diversificada para atender, conforme as necessidades e possibilidades concretas, às peculiaridades locais, aos planos dos estabelecimentos e às diferençasindividuais dos alunos (Art. 4º, Lei nº 5692, de 11/8/71)". A auto-realização é prevista, igualmente, no Artigo 1º da mesma Lei.

A distância entre a proposição legal e a realidade educativa é muito grande e, a nosso ver, reside principalmente, na metodologia pedagógica pouco favorável à expressão individual. Não é tanto a falta de liberdade de aprender, lembrada por

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Rogers mas, sobretudo, a da oportunidade de aprender. Pouco adianta a liberdade, se não tivermos possibilidades de opções concretas, que permitam a crianças e jovens elaborarem, dentro dos limites sócio-econômicos, seus próprios programas ou parte deles, embora não desconheça o autor a dificuldade de construir escolas e aplicar processos pedagógicos individualizados. A solução seria, como propusemos em estudo sobre superdotados*, enfatizar a educação individualizada, aplicável em determinada fase do sistema educacional, mas sem a característica de seriação. O aluno teria uma seqüência de tarefas. Não haveria exames ou reprovações e o avanço no currículo se faria pela execução satisfatória da tarefa anterior. O aluno progredirá, assim, de acordo com suas possibilidades, terá opções e, conseqüentemente, auto-afirmação e mobilização de seu potencial.* Seminário sobre Superdorados realizado pelo SENAC em 1979, em São Paulo.

A implicação básica, essencial, decorrente da colocação deste problema é a de que a educação não só na escola, como no lar, deva atentar para essa busca de auto-afirmação, criando condições para que crianças e jovens encontrem um sentido na vida e tenham possibilidade de se reconhecer como alguém. Preservar a individualidade de cada estudante e liberá-Io para seu próprio crescimento seria o alvo básico.

Do ponto de vista profilático, a educação dos pais no sentido de alerrá-Ios para o reconhecimento da individualidade de cada um dos filhos seriá outro alvo. Evidentemente, os pais são também pessoas e a sua própria individualidade e aUto-afirmação precisam ser consideradas. O movimento da "Escola de Pais" no Brasil é um típico exemplo de como podem os pais ser informados, sem serem guiados; de como podem se reconhecer como alguém e respeitar a individualidade de seus filhos (Lopes, s/d.).

No que se refere à família, os assuntos e os problemas precisariam ser discutidos nas duas perspectivas, considerando-se os filhos; na sua individualidade e os pais, igualmente. Na medida em que se consegue criar, tanto para uns como para outros, um sentido de vida e condições de auto-afirmação, as possibilidades de ajustamento aos problemas de vida aumentam significativamente.

Todos os psicólogos e orientadores que atendem adolescentes, ou seus pais, sabem que a queixa mais freqüente dos jovens em relação à família é sobre a falta de confiança dos pais em relação aos filhos. Estes são tratados como objetos de valor, mas vistos como incapazes de se governarem ou de se dirigirem e um processo de desvalorização instala-se nas crianças ou nos adolescentes. É evidente que aos filhos falta a informação ou o desenvolvimento físico e mental que os habilita a agir de forma social e pessoalmente úteis em muitas circunstâncias. Por isso são criados e assistidos pelos pais desde a gestação, o nascimento e os anos da infância. Não é menos verdade, porém, que vão eles adquirindo, com o próprio desenvolvimento, condições próprias de julgamento e de autodireção que os habilita a se tornarem pessoas, adultas e aUto-suficientes. E muitos pais, por motivos vários, continuam tratando seus filhos como se estivessem, ainda, em estágio inferior de desenvolvimento mental e emocional. A conseqüência é óbvia: instala-se um clima

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mutuamente perturbador, em que a "autoridade" e a "capacidade" dos pais, não sendo tão necessárias, geram sentimentos de falta de confiança recíproca, com imagens de não-afirmação do próprio EU em ambos os lados. Dosar essa libertação é todo o processo sadio de formação do adulto e do homem capaz. Permitir a expressão de si mesmo, de ser alguém, de optar, é o recurso psicológico eficaz que muitos pais podem adotar; é a prevenção contra futuros desajustes que o jovem enfrenta como produto de sua não-afirmação. Na medida em que a criança ou o adolescente possa, dentro de seu mundo, fazer suas opções, está se afirmando como pessoa e preparando-se para enfrentar, posteriormente, outras opções. Os conhecidos comportamentos de superproteção ou de rejeição são fontes geradoras da falta de auto-afirmação e, se pudermos eliminá-Ias, ou reduzi-Ias, estamos evitando problemas de ajustamento no futuro.

A satisfação no trabalho

Como se sabe, a motivação é o ingrediente essencial ao ajustamento e

aodesempenho no trabalho. O que falta saber é no que consiste essa motivação.

Seria a aUto-realização no dizer de Maslow, Herzberg ou McClelland? Esse motivo

básico manifesta-se sob a forma de uma “ampla síndrome de comportamentos que

inclui exposição moderada a riscos, a proposição de altos níveis de qualidade,

odesejo de independência e, geralmente, a necessidade de atingir alvos

considerados excelentes tanto do ponto de vista pessoal como social”; (Fineman e

Warr,1972). No nosso entender, essa conceituação está bem próxima da

auto-afirmação, a tal ponto que pode ser com esta confundida.

Ao examinarmos as situações de ajustamento e de satisfaçao em atividades

profissionais, temos notado que o que mais atinge os empregados é o

reconhecimento pelo trabalho efetuado. Esse reconhecimento, gratificante e

estimulante parao empregado, ou qualquer profissional, geralmente ocorre sob a

forma de partictpação nas decisões (ser consultado, receber atribuições, ter suas

opiniões consideradas,etc.) sob a forma de retribuição financeira e material (salário

compatível com o nível funcional dentro de um plano de eqüidade salarial, benefícios

colaterais, etc.). Por outro lado, a desconsideração, a marginalização, o ostracismo

em que são colocadasas pessoas são, provavelmente, os mais poderosos agentes

de depressão psicológica na situação profissional. O indivíduo vê-se à margem da

empresa ou entidade; sua auto-afirmação simplesmente não ocorre; um quadro de

insatisfação emerge, com repercussões em outras áreas da vida. Em pesquisa feita

pelo autor em duas categorias de profissionais (médicos e enfermeiros) verificou-se

que os eventos mais perturbadores de sua satisfação profissional referiam-se à falta

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de consideração pessoal no exercício da atividade profissional*

* A pesquisa aqui aludida refere-se a um levantamento de opiniões, sob forma de questionário, entre 80 médicos e 25 enfermeiros, participantes de um curso sobre Psicologia do Trabalho, realizado em São Paulo, em três turmas sucessivas, nos anos de 1974, 1975 e 1976. As respostas à pergunta sobre fatos desestimulantes no trabalho, agrupadas em categorias, revelaram, em geral, maior freqüência das situações que desprestigiavam o trabalho médico ou a pessoa do profissional envolvido (interferência nas funções médicas ou de enfermagem, desconsideração do profissional, simulação de doenças e pedidos de falsos atestados, desobediência às instruções médicas e outras situações, inclusive socialização da medicina, as quais de uma forma ou outra significavam não afirmação ou desprestígio pessoal).

Os dados por nós colhidos, embora originários de pequena amostra, concordam de certo modo com os estudos de Herzberg (1959), segundo os quais a realização e o reconhecimento são os fatores mais relacionados com a satisfação no trabalho (Tiffin, 1969). Os mesmos dados parecem concordar com os obtidos em situação terapêutica (Cap. 6); no sentido de que há uma prevalência no ajustamento a vida, seja em atividades do dia-a-dia, seja em situação específica (a do trabalho como exemplo) de uma necessidade básica de reconhecimento e de consideração da individualidade de cada um e do respeito ao território que lhe é próprio.

No campo do trabalho, a implicação perceptível seria a de que se desejarmos maior produtividade e, ao mesmo tempo, maior satisfação profissional, com benéficos efeitos para a pessoa, as atitudes de empresários, chefes, diretores e de todos quantos lideram movimentos ou atividades, deveria dirigir-se no sentido de promover maiores níveis de auto-afirmação. Essa atitude exigiria radical transformação nos sistemas organizacionais, de maneira a tornar cada profissional ou empregado participante dos planos e das atividades; a respeitar suas opiniões e suas tarefas; a evitar serviços "de fachada" e a valorizar adequadamente o que é dito ou produzido na situação profissional. O muito que se fala e se propõe no campo das relações humanas através de "cursos" e "recomendações", seria redutível a um princípio geral: considerar não apenas o trabalho, isto é, o produto elaborado, mas a pessoa que o fez, suas dificuldades e como as superou. Na medida em que a pessoa seja assim considerada, instala-se uma ampla prevenção contra os desajustes pessoais e promove-se melhor satisfação comunitária e social.

11 - A Vida na sua Terceira Fase: A Valorização do Idoso

Provavelmente o mais angustiante problema a partir da meia-idade é o sentimento de envelhecer porquanto o passar dos anos _ partir dessa fase - hoje conhecida como terceira idade - cria a imagem de desvalia, de redução da eficiência, da marginalização, da falta de consideração e, em conseqüência, drásticos efeitos na auto-estima e na auto-afirmação. Poucos fatos impressionarão mais uma pessoa da faixa dos 50 ou 60 anos do que o de ver-se ela esquecida, não considerada, em virtude da idade. A necessidade de auto-afirmação que apontamos

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como determinante básico da conduta encontra, novamente, uma nova forma de comprovação.

Nestes últimos anos têm-se acentuado os trabalhos e as preocupações legais, técnicas e sociais com relação às pessoas idosas. Esse despertar de atitudes tem raízes em vários fatos, notadamente nos seguintes: 1) a vida prolonga-se; 2) os recursos médicos e tecnológicos propiciam melhores condições de conforto físico, de saúde e de atividades sociais; 3) o tempo útil destinado ao trabalho profissional, de sobrevivência econômica, encurta-se, aumentando os períodos de lazer, quer anteriores ou posteriores à aposentadoria; 4) os planos de aposentadoria e de pensões para os indivíduos que ultrapassam os sessenta anos ocorrem, gradual mente, em melhores termos econômicos, passando a constituir um alvo para grandes e crescentes contingentes humanos que esperam um lazer de longo prazo; 5) observações e pesquisas vêm demonstrando que grande parte dos idosos conservam excelentes qualidades físicas, intelectuais e profissionais, constituindo um grande segmento da força de trabalho do país.

Um levantamento de dados sobre o trabalho de pessoas idosas realizado pelo autor (1960) revelava, na ocasião que:

1. A habilidade motora declina com a idade. Enquanto o máximo de desenvolvimento ocorre na adolescência, ou na etapa dos vinte anos, há declínio porcentual, sobre o máximo, aos 60 anos. Um dos estudos assinala uma redqção de 16,5%, cumprindo notar, porém, que esse declínio não é suficiente, por si só, para impedir o trabalho normal. Certos indivíduos aos 60 anos possuem, não obstante o declínio, maior habilidade do que pessoas muito mais jovens;

2. Não ocorre declínio da habilidade de vocabulário com o avançar da idade e sim, um aumento do tempo de reação em tarefas que envolvam tal habilidade;

3. Quanto à idade e a eficiência profissional, em atividades comuns, em geral, atinge-se o máximo de desenvolvimento entre 18 e 30 anos. Em tarefas tipicamente industriais, verificou-se que a eficiência aumentava dos 20 aos 30 anos, declinava aos 40 e, mais ainda, aos 50 anos. Porém, o declínio - de cerca de 13,5% - ainda mantinha o grupo dos idosos na zona média da curva de desempenho, o que vem demonstrar que a desvantagem da idade não é tão séria quanto parece;

4. Quanto à idade e as perspectivas de ajustamento no futuro, aparecem necessidades novas e, conseqüentemente, novos motivos com o correr dos anos e, com elas, modificam-se as reações psicológicas que passam a ser dirigidas para outros alvos.

Outros fatos podem ser assinalados, segundo Patricia Kasscchau (1976) do Andrus Gerontology Center (USA):

a) A expectativa de vida no Brasil, em 1970, era de, aproximadamente 60 anos, e tende a elevar-se; é de 64 na Argentina, de 63 na Venezuela, de 61 no México e de 67 nos Estados Unidos. Este tempo amplia-se tratando-se de indivíduos do sexo feminino.b) Embora ocorra gradual e lenta diminuição de capacidades, a partir da vida adulta, seus efeitos não são tão dramáticos como se supunha. Essa diminuição é mais devida ao decréscimo do nível de prática do que à idade em si mesma.

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Experiências com jovens conservados em inatividade no leito mostram que também neles ocorre essa diminuição.c) Nas atividades psicomotoras, os idosos demonstram menos potência muscular, maior tempo de reação aos estímulos e desempenho menos eficiente em tarefas tais como correr, nadar,etc. Contudo, quando estão eles familiarizados com essas atividades, não sendo estas muito complexas, as diferenças devido à idade tornam -se mínimas.d) O tempo de reação aumenta com a idade. O aumento desse tempo é mais sensível nas tarefas complexas e muito menor em tarefas simples. A _aior extensão do tempo de reação parece estar associada ao desejo de verificar o acerto' da resposta e não à impossibilidade de agir prontamente. Isto poderia significar que, psicologicamente, o indivíduo idoso sente-se mais responsável pelos seus atos e que as pressões para fazê-los agir depressa provocam movimentos e atos desejeitados., Os idosos necessitam de mais tempo para formular e controlar suas respostas.

e) Nas tarefas complexas, os jovens agem mais por tentativa e erro, enquanto o idoso procura pensar e usar menos tentativas. Nos problemas complexos e sem pressão do tempo, o desempenho do idoso iguala o dos jovens. Quando essa pressão existe, o desempenho do idoso é menor, porque este é forçado a usar o método de tentativa e erro. Em síntese, se dermos ao idoso mais tempo (e menos pressões) para realizar uma tarefa, seu desempenho iguala o do adulto (assinala a autora que este conceito é fundamental).f) No campo da inteligência e manutenção do nível mental potencial, há dados extremamente importantes. Baseado nos resultados de testes que medem a inteligência, os dados indicam somente ligeiro declínio e mesmo assim devido, provavelmente, a estadOs patológicos não identifi. cados. O nível mais alto atingido parece estar em torno dos 55 anos e não aos 35. Observou-se, também, que em muitos casos o desempenho mental na idade dos 70 é mais alto do que na idade de 25. Muitas das diferenças devidas à idade derivam do fato de que os testes usados enfatizam habilidades e conhecimentos correntes, dos quais o idoso está afastado pelos seus hábitos de vida. Isto significaria que não há declínio na inteligência mas, tão somente obsolência, ou seja, falta de atualização do idoso à vida ambiental. Se a ele fosse dada estimulação ambiental, estas diferenças tenderiam a desaparecer; se o quociente de inteligência não diminui em termos de capacidade para aprender, mas por falta de estimulação, é possível concluir que o idoso pode reaprender novas habilidades.g) Quanto à aprendizagem e à memória, envolvendo o registro e a retenção, o idoso necessita mais tempo para processar seus dados e está mais sujeito a menor desempenho, quando as tarefas não têm muito sentido (motivação). Em geral, o idoso faz mais tentativas para estabelecer um critério do que os jovens.h) No que se refere ao pensamento e solução de problemas, o idoso prefere operar com fatos concretos do que abstratos, tendo mais dificuldades para formar conceitos e resolver problemas que envolvem muitas peças de informação a serem manipuladas simultaneamente; tende a repetir soluções anteriores, o que é

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desvantajoso quando há necessidades de soluções ao mesmo tempo rápidas e inovadoras, mas que se torna favorável quando há situações que se mantêm estáveis ou de lenta modificação, que não exigem grande e pronta criatividade.i) O idoso pode aprender e ser empregável. Muitos empregadores nos Esta-dos Unidos e na Europa relatam que após um período inicial de experiência, sentem-se mais felizes com eles porque inspiram mais confiança sobretudo no que se refere a assiduidade, pontualidade e rotatividade.j) No que se refere à personalidade, em geral, o idoso pouco muda com o advento da idade, embora ocorram mudanças biológicas e sociais. Citando vários autores, Kasscchau declara que há considerável estabilidade no curso de vida no que se refere à descrição de si mesmo, aos constructos pessoais e aos estilos cognitivos. O idoso torna-se apenas mais rígido do que o jovem; há certo grau de dogmatismo e menos tolerância à ambigüidade e às pressões sociais. Torna-se o idoso, também, menos impulsivo e mais cauteloso que os jovens. O comportamento do idoso é mais consistente e melhor previsível do que o do jovem e sua estrutura de personalidade é mais claramente perceptível. Há mais introspecção e um sentido mais claro de sua própria identidade.

Em síntese, as pessoas idosas movem-se mais lentamente em resposta ao ambiente mas se lhe damos tempo para reagir (perceber, avaliar e decidir) o decréscimo do desempenho é reduzido. Se as apressarmos, tendem a responder com erros e movimentos desajeitados. Essa circunstância eleva seu nível de ansiedade, com efeitos sobre o desempenho. As pessoas idosas podem aprender tanto quanto as jovens ocupando, apenas, maior lapso de tempo. Seu treinamento para o trabalho é mais eficaz quando feito diretamente na atividade e não em situações de escola ou classe, de maneira que sintam motivação mais profunda, originária de situações concretas.

Técnicas de orientação e psicoterapia

O autor teve oportunidade de atender várias pessoas idosas em sessões de psicoterapia e atividades de grupo. Em todos os casos a necessidade de auto-afirmação esteve sempre presente, como resultantes da marginalização e da desconsideração familiar, profissional e social em relação ao idoso. É evidente que um processo de satisfazer essa necessidade é imperioso, o que poderia ser atingido através de: 1) restauração, ainda que parcial, de habilidades anteriores; 2) descoberta de novas habilidades e interesses que dêem sentido à vida; 3) ajuda emocional para enfrentar as limitações existentes ou novos interesses. Barns e outros autores (1973) citam alguns procedimentos que podem ser aplicados, a saber:

Orientação da realidade espaço-temporal

Aplica-se aos casos de idosos em que ocorre acentuada perda da memória,

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confusão mental e desorientação espaço-temporal. Pode ser formal (em classes ou grupos formais, diariamente) ou informal (de acordo com as circunstâncias da vida). Exige equipamento (quadros, relógios, calendários e outros recursos audiovisuais) e melhor aplica-se em instituições (clínicas, comunidades, centros de convivência, etc.).

Método: Repetição programadas de dias, horas, nomes, locais e outros eventos, usando-se forma motivadora de apresentar os dados. Geralmente os dados são escritos em um grande quadro e alterados conforme a ocorrência dos eventos e algum tipo de reforço, em programa a ser estudado conforme a situação.

Desenvolvimento de atividades que despertem o sentido de auto-afirmação e

de valorização pessoal. O encontro de novas ocupações

Tais atividades podem ser realizadas em movimentos sociais, associações, trabalhos de equipe e similares. Consistem, essencialmepte, em desenvolver um espírito competitivo que restaure o conceito de si mesmo. A simples atividade, despida de competição, pode ser temporariamente vantajosa, mas não mobiliza os recursos potenciais, por ausência de motivação suficiente; como conseqüência, tem pouco significado de ajustamento e sucesso. O idoso feliz parece ser aquele que luta, que utiliza seus recursos e que se empenha em vencer obstáculos. Mesmo que não os supere, a atividade mobilizada nessas direções parece ser altamente bené fica, restaurando os conceitos de que é alguém que produz e que luta.

Em geral, o idoso acha úteis essas atividades, mas não se empenha em procurá-Ias, quando delas precisa. Refugia-se, às vezes, nas próprias limitações e essa situação o torna agressivo ou, por outro lado, conformista e deprimido. Para vencer essa barreira, seria necessário que o comportamento desejável fosse refor çado, paulatinamente, pela ocorrência de "produtos" ou "resultados" que tivessem efeito reforçador. Cada caso particular precisaria ser estudado.

Hoje, busca-se evitar o vazio causado pela aposentadoria, principalmente, nos indivíduos que se conservam plenamente ativos durante muitos anos. Há uma débil, mas crescente tendência em buscar-se nova ocupação, isto é, atribuir ao idoso que se aposenta, ou que por outras razões não mais trabalha, uma forma diferente de ocupação que o mantenha ocupado e . 'Útil" algumas horas ou alguns dias da semana. Essa forma de agir diminui acentuadamente os sentimentos negativos que o indivíduo faz de si e não só mantém seu autoconceito, como o prepara para um progressivo afastamento profissional ao correr dos anos.

O procedimento consiste em utilizar os serviços de pessoas idosas em tarefas adequadas a seu nível de desenvolvimento intelectual, a seu status sócio -econômico e as suas possibilidades físicas*.

* O autor teve ocasião de constatar, em alguns países europeus, o emprego de pessoas idosas e de alto nível social e intelectual na tarefa de relações públicas, atendendo e conduzindo visitantes estrangeiros. Esse tipo de trabalho parece ser

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bem adaptado para essas pessoas, porque as coloca em posição de prestígio e não exige esforços físicos ou psíquicos especiais.

Ressocialização

Aplica-se, principalmente, quando ocorrem dificuldades de comunicação, de

participação social, de verbalização, de expressão.

Método: É um programa estruturado em que são usadas técnicas de grupo a

fim de conscientizar escolhas e decisões no meio comunitário. Busca-se a

cooperação dos participantes nas decisões comunitárias ou de grupo. Os objetivos

são: 1) fortalecer relações interpessoais; 2) ajudar o cliente a renovar seu interesse

pelo mundo em que vive focalizando sua atenção em aspectos e atividades simples

da vida diária e que não envolvam dificuldades emocionais; 3) ajudar o cliente a

buscar, no passado, algo que possa fazer novamente.

Remotivação

É uma técnica destinada a encorajar o idoso a desenvolver novos interesses

em seu ambiente focalizando sua atenção em atividades e eventos comuns da vida

diária. É semelhante ao anterior e atua como complemento da orientação da

realidade.

Método: Escolhe-se um motivador e um grupo de pacientes compondo-se o

grupo com 5 a 12 pessoas que se reúnem uma vez por semana, durante uma hora,

durante cerca de 12 semanas. Discute-se um tópico específico, escolhido pelo

grupo. O motivador deve ser hábil para fazer fluir as escolhas e opiniões.

O clima é de aceitação; constitui uma ponte para a realidade. Podem ser

usadas como tarefas motivadoras: leituras, atividades manuais, recursos

audiovisuais, discussão de assuntos, etc. O trabalho individual, de cada um, é

planejado pela própria pessoa ou pelo grupo.

Como equipamento há necessidade de livros, artigos, filmes, recursos

audiovisuais, etc.

Terapia de atitudes

É uma forma de modificação do comportamento que envolve certas atitudes

predeterminadas em todos os contactos com os clientes. Visa-se reforçar o

comportamento desejável e eliminar o indesejável.

Há, segundo os autores, cinco atitudes principais a serem usadas, as quais

podem ser escolhidas, sendo importante que qualquer pessoa que entre em

contacto com o cliente participe da terapia usando, sempre, a mesma atitude

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atéobtenção do comportamento desejável.

As 5 atitudes são:

- Firmeza: mais usada com clientes depressivos. Criticam-se as tarefas feitas mas

não o cliente e não se dá atenção aos sentimentos e lamentações.

- Amizade ausente: mais usada com clientes apáticos, pouco sociáveis, autistas.

Consiste em dar atenção ao cliente antes que este a solicite ou demonstre

desejá-Ia. Despende-se tempo extra, especial com o caso atribuindo-se-Ihe tarefas

significativas e que dificilmente errariam.

- Amizade passiva: mais usada com clientes que não se adaptam a uma amizade

mais íntima. Consiste em mostrar interesse e atenção para com a pessoa do cliente

sem procurar movê-Io em qualquer direção. Espera-se que o cliente dê o primeiro

passo.

- Sem exigências: mais indicada para os clientes desconfiados, que se sentem

ameaçados ou encolerizados. Nada se pede; mostra-se que se espera, apenas, que

ele não prejudique ninguém.

- Objetividade: mais indicada para os clientes manipuladores que procuram envolver

ou conquistar o terapeuta. As respostas a esses clientes devem ser consistentes,

casuais e calmas, demonstrar afeto, restringindo-se aos fatos em si.

É evidente que essas atitudes precisam ser adequadamente estabelecidas

conforme a situação e adequadamente inseridas em um esquema de modificação

do comportamento. Não sendo tomadas essas cautelas, o processo pode reforçar

atitudes indesejáveis funcionando o processo no sentido contrário.

Terapia de reforçamento

Consiste em escolher e definir com a pessoa o comportamento a ser alterado.

O reforço (recompensa) segue-se imediatamente à emissão do comportamento

desejado. Podem ser usados "tokens" (vales, fichas e similares) que representam

direito a certos privilégios.

Os procedimentos envolvem vários tipos de reforçamento e cuidados

especiais. As áreas comportamentais mais usadas são as que envolvem

comportamento social (comunicação, auxílio aos outros, expressão, etc.)

comportamento referente aos cuidados pessoais e tarefas especiais (cuidar da

alimentação, do quarto, da comunidade, etc.)

Terapia ambiental

Aplicável a grande número de casos, consiste em aproveitar as oportunidades

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do próprio meio para desenvolver motivos, interesses e atitudes. O objetivo é facilitar

ao cliente o contacto com novas pessoas e atividades, criando-se condições ef que

haja pouca possibilidade de frustrações e conflitos. Parte do princípio de qu toda

pessoa tem, sempre, parte de seu Ego aproveitável. O cliente é convidado

participar, oferecendo-se oportunidades práticas de participação.

Terapia rogeriana

É aplicável a grande variedade de situações e consiste, essencialmente, em criar-se um clima de tal modo permissivo que o indivíduo expressa seus sentimentos e problemas. Esse fato reduz suas tensões, facilita uma revisão de seu "self" e favorece o ajustamento do indivíduo aos problemas que enfrenta. É um processo sobretudo emocional, mais indicado quando o indivíduo enfrenta problemas de relacionamento humano, de juízos e valores, de compreensão e aceitação de si e dos outros, de solução de problemas existenciais.

Não há objetivos comportamentais específicos, a não ser o bem-estar e a retomada da vivência e do crescimento do cliente. A atitude do terapeuta no seu relacionamento com o cliente é a chave do processo e concentra-se em três pontos: 1) Congtuência e autenticidade, ou seja, uma relação genuína e sem fachadas entre terapeuta e cliente; 2) Respeito positivo incondicional ao cliente, o que significa aceitá-Io como ele é, sem julgamentos ou críticas; 3) Empatia ou ter o terapeuta senso do mundo interno do cliente, como se fosse ele próprio (vide Capítulo 5).

O procedimento pode ser desenvolvido em grupos nos quais os indivíduos expõem seus problemas e se organizam livremente (grupos de encontro) ou em sessões individuais.

Terapia de apoio

Geralmente é mais indicada quando a pessoa apresenta limitações de origem física, social, econômica ou de outra natureza, dificilmente removíveis, ou quando a estrutura da personalidade é tal que contra-indique alterações profundas nas defesas existentes. Os efeitos terapêuticos são limitados mas abrem oportunidades para o desenvolvimento pessoal.A terapia de apoio no idoso pode assumir várias formas, tais como:

- Discussão de problemas em grupo, usando-se técnicas reflexivas ou interpretativas;- Exercícios e atividades em grupo, combinadas com discussão de problemas. Um programa de exercícios físicos, quando adequado, tem efeito tranqüilizador sendo mais indicadas as atividades que envolvam movimentação rítmica de grandes massas de músculos e atividades naturais de passear, andar lentamente, correr, nadar, etc.

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Vivência em comunidade

É pensamento do autor que a colocação de idosos em instituições ou clínicas geriátricas é um procedimento discutível, com vantagens e desvantagens. Pode dar origem a um sério problema emocional decorrente do sentimento de solidão, desprezo ou marginalização. Por outro lado, pode contribuir para um'l melhor assistência médica e psicológica e pode ser efetivamente recomendada quando constitui uma espécie de clube ou de local para lazer, dura!"lte algumas horas diárias ou alguns dias por semana, sem que o idoso se desligue de sua família e de seus hábitos pessoais no ambiente em que sempre viveu.

Uma solução que provavelmente possa ser eficaz consistiria em organizar-se um tipo de residência coletiva, com apartamentos e demais serviços, paralelos, de hotel e de tratamento de saúde, com atividades sociais, esportivas, culturais, artísticas, etc., onde cada residente conservasse sua autonomia e sua propriedade, com facilidade de contacto com parentes e amigos, à semelhança de um novo lar. Neste caso, uma parcela dos residentes poderia ser constituída de pessoas jovens ou de adultos comuns, que se utilizariam dos mesmos serviços, evitando-se a imagem de instituição destinada à segregação ou amparo de idosos.

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PSYCHOLOGICAL COUNSELING AND PSYCHOTHERAPY:

Self-assertion as a basic determinant of human behavior

Paper for presentation in an interactive session at the 20th International Congress of Applied Psychology, Edinburgh, 1982

The author relates his experience as a Clinical Psychologist after having worked

for many years in the field of Industrial Psychology and Vocational Guidance. The

book which is now being published and this communication refer to his work in

Clinical Psychology started in the sixties after having completed his graduate course

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at Columbia University (USA) and after his doctoral dissertation at the University of

São Paulo (Brazil).

First of all, the author comments on the long course from diagnosis to

psychological help and proposes a classification of the methods of counseling and

psychotherapy into three main categories: 1) Social-cultural-context-centered

methods; 2) Personal-context-centered methods; 3) Problem-centered methods an

others. One specific chapter is dedicated to Rogerian ideas and techniques and

neo-Rogerian position is suggested.

Initially, starting from person-centered therapy, according to Rogers theories and

techniques, the author relates his observations over twenty years. Those observations

led him to explore an important fact that occurred during therapy: the majority of clients

who attended counseling or therapeutic sessions would improve as long as they were

able to attribute the reasons for their problems and difficulties to themselves and not

to external causes. At this moment an important question was then raised by the

author: would there be any psychological phenomenon related to the self-concept that

could be responsible for the reduction tension and better adjustment to life

conditions? Using this as a reference point over the years it was observed with all

clients, independent of their social or economic status, that the improvement was

strongly associated with .alterations in their self-image, self-esteem, self-concept and

self assertion.

Obviously, the above conclusion is not new. All systems and psychological theories have shown that, including Freud, Adler, Jung, Same, May, Rogers and many others. However, the important point - which might be considered as a new contribution - is the role of self assertion in human behavior.

In order to clarify those ideas it was necessary to review some basic concepts on motivation. Following those lines, the author arrives at the hypothesis that se/f -assertion is one o/ the most significant determinants o/ human behavior,' perhaps the most prevailing goal of human life, except in the biological field namely natural needs of survival.

Self-assertion is a complex phenomenon: it could be understood as a large and varied revision of the Ego, both cognitive and emotional, followed by the judgment made by the person about himself (Personal I) and about his adaptability to the expectations from the outside world (Social I). The basis of human behavior, that is, the needs and motives that consciously or unconsciously would establish the goals of the activity, excluding purely organic factors, would be centered on the concepts about himself and about his role in life. To be someone recognized as a person would be the significant goal, even with limits and failures. Examples can be found every day in all kinds of human behavior: children who want to do things for themselves; adolescents who try to show that they are grown up; adults who search for status and power. On the other hand, the most traumatic experience seems to be the feeling of being ignored, of having no value, of being forgotten or placed in an inferior position in any aspect of life. It also means the feeling of being incapacited when faced with social values and social expectations.

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The consequences of such observations over the years may seem trivial; a kind of well know and unimportant conclusion. Nevertheless, the success of therapy was always associated to the revision of the self and to the attainment of a stronger feeling of self-assertion. The book on that matter and this communication aim to call attention to this focus of emotional life and to indicate the possibility of giving direction to a new understanding of human behavior. This direction would also mean new ways in the therapeutic process as well as in prophylactic attitudes in other fields.

Many modem positions like the humanistic movement, existentialism and anti-psychiatry have already arrived by different ways at similar conclusions. Many other therapeutic theories and techniques have suggested that the feeling of personal value, the self-image and the self-concept have significant influence in therapy. This is more perceptible in Adler and Rogers. Even the reinforcement in Skinner' s theory is somewhat connected to the main idea: the effect of having completed a task might be in itself a kind of self-assertion. Although many theories have postulated some effect derived from the feeling of seIf-esteem and self value, there is no theory or technique which emphasizes &elf-assertion as the most significant factor in human existence and, as a consequence, in psychological therapy.

The main contribution of the book and of this communication to a psychological congress is outlined as follows: 1. Human motivation is highly influenced by self-assertion; this concept raises the hypothesis of self-assertion being the most significant determinant of behavior; 2. In the author experience, better results have been found with Rogerian and similar theories and techniques, when there is emphasis on self-assertion, that is, when Therapist and client act in the cognitive and emotional areas examining together successes or failures throughout life, without fears and anxieties; when both are able to conciliate the Personal I (characteristics and personal needs) with the Social I (group and social characteristics and needs); 3. Psychological structure becomes stronger as long as the person recognizes himself as a real living organism with characteristics that are his own; when he is able to appreciate his own territory; when he feelds himself as someone with his own ideas and way of being, open to the world and able to feel, to think and to act in function of his capacities and limitations, without permanent feelings of loss or inferiority.

Meanwhile there is only clinical data supporting the hypothesis. The contribution which is now presented comes from a sample of 80 clients (adults and adolescents, male and female, of different social and economic status) who were observed in their behavior during counseling or therapy. A check-list with 13 indicators of progress was informally used to guide the observation.

There is a strong need for research in this field. The author tries only to open a new way, with an empirical foundation, for expanding our understanding of human motivation. The consequences might be of high value for the improvement of the psychotherapeutic process as well as in handling other aspects of life.Many examples are given by the author related to the family, school life, the work situation and elderly people.

Oswaldo de Barros Santos São Paulo, Brazil, 1982