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www.canalmoz.co.mz 30 Meticais Maputo, Quarta-Feira, 03 de Outubro de 2012 Director: Fernando Veloso | Ano 7 - N.º 868 | Nº 168 Semanário de Moçambique de Moçambique publicidade Aqui a sua Publicidade vale mais publicidade “Promoção” para juiz-presidente de Nampula Académico explica preferência de Guebuza Presente envenenado para juiz Marrôa “Aires Ali será um presidente fraco” Página 06 Adriano Nuvunga em entrevista ao Canal de Moçambique

Adriano-Nuvunga Em Entrevista Ao Canal de Mocambique

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Entrevista

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Page 1: Adriano-Nuvunga Em Entrevista Ao Canal de Mocambique

www.canalmoz.co.mz 30 Meticais

Maputo, Quarta-Feira, 03 de Outubro de 2012

Director: Fernando Veloso | Ano 7 - N.º 868 | Nº 168 Semanário

de Moçambiquede Moçambique

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“Promoção” para juiz-presidente de Nampula

Académico explica preferência de Guebuza

Presente envenenado para juiz Marrôa

“Aires Aliserá um

presidente fraco”

Página 06

“Promoção” para juiz-presidente de Nampula

Presente envenenado Presente envenenado

Académico explica preferência de Guebuza

“Aires Ali“Aires Aliserá umserá um

presidente presidente fraco”fraco”

Adriano Nuvunga em entrevista ao Canal de Moçambique

Page 2: Adriano-Nuvunga Em Entrevista Ao Canal de Mocambique

Canal de Moçambique | Quarta-Feira, 03 de Outubro de 20122

Entrevista

Borges Nhamirre

Jovem académico chegou agora à direcção máxima do Centro de Integridade Pública (CIP), a mais activa organiza-ção da sociedade civil nacional que actua na fiscalização da go-vernação, promoção da transpa-rência e combate à corrupção. Está a terminar o seu Doutora-mento em Estudos de Desen-volvimento e estuda a “Frelimo, como Partido Dominante”. De-dica-se à academia desde 2000, quando começou a Ciência Po-lítica na Universidade Eduardo

Mondlane. Quando pedimos a entrevista para fazer antevisão do X Congresso da Frelimo. Re-cusou, tacitamente. Disse que não gosta de aparecer na Im-prensa nem na televisão e que as suas ideias expõe em livros e em artigos científicos, onde, segundo suas palavras, “conse-gue manter o método”. Nós não desistimos, continuamos a pe-dir, afinal aqui também há mé-todo. Acabou aceitando falar ao Canal de Moçambique, só que o congresso tinha já termina-do. Então se não pôde antever, pode analisar o pós-congresso.

Chama-se Adriano Nuvun-ga. A sua tese é de que o pre-sidente Guebuza quer continuar a controlar o poder depois de terminar o seu mandato pre-sidencial em 2014. E para que isso se efective, Guebuza esco-lheu um presidente fraco para lhe suceder: Aires Ali, o actual primeiro-ministro, nomeado por Guebuza. Assim, na tese de Nuvunga, a derrota de Aires Ali na corrida à comissão polí-tica do partido Frelimo, é uma mera equação do jogo de poder montado por Guebuza. Enten-da nas próximas linhas como

Nuvunga sustenta e defende a sua tese. Falou também doutros assuntos do país, como os inte-resses empresariais dos dirigen-tes do Estado, a transparência e até dos partidos da oposição.

De resto, podemos adian-tar que ele é de facto um bom professor. Defende a sua tese ao pormenor e nunca se desvia dela. Até chega a atribuir nota zero ao entrevistador, quan-do, na sua óptica, faz questões “irrelevantes”… Desfrute!

Canal de Moçambique (Ca-nal): Como académico, como analisa o X Congresso da Fre-limo. O que viu naquela reu-nião?

Adriano Nuvunga: Pareceu ser congresso de reafirmação da hegemonia do partido. Há muito tempo que nós, os acadé-micos, chamamos a Frelimo de partido dominante. Mas, prova-velmente, os recentes resultados eleitorais, a derrota em Que-limane, a extensão do MDM, mancham todo o sentimento da grandeza que o partido Fre-limo tem. Me pareceu que todo este esforço do X Congresso, um evento daquela dimen-são, era mesmo para dizer que olha, “20 anos depois do mul-tipartidarismo, o partido Freli-mo domina e é hegemónico”.

Canal: Está a dizer que toda aquela pompa era uma mensa-gem para mostrar os de fora?

Adriano Nuvunga: Para

mostrar a sociedade que o parti-do Frelimo é hegemónico. Exis-te os demais partidos que fazem o xadrez do multipartidarismo, “mas nós o partido Frelimo so-mos o partido hegemónico”. Era esta a preocupação, para além daquilo que é a preocupação do presidente Guebuza, em con-trolar o xadrez político do par-tido. Mas entanto que partido a Frelimo tinha que provar isto.

Canal: E conseguiu?

Adriano Nuvunga: Penso que passou esta ideia, porque mostrou também que… até pode ter visto mais do que eu, de facto a Imprensa não falava de mais nada senão do congres-so, naquela semana. Paralisou o Estado. A única pessoa que esteve a fazer outra coisa foi Oldemiro Baloi (ministro dos Negócios Estrangeiros e Coo-peração) que foi à Nova Iorque falar em nome do presidente, mas que ainda assim, Oldemi-ro Baloi conseguiu ser eleito. Quer dizer que foi o partido que lhe mandou, “disse que pode ir fazer uma coisa, mas aqui nós estamos a controlar as coisas”.

Canal: Então podemos di-zer que o partido Frelimo saiu deste X Congresso com poder reforçado?

Adriano Nuvunga: Penso que passaram muitas mensa-gens. Uma mensagem é da orga-

“Para os interesses do presidente Guebuza, é importante que Aires Ali não seja membro da Comissão Política”, Adriano Nuvunga

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“Luísa Diogo, de certeza, não conseguiu, mas também acredito que deve ter havido uma mobilização no seio do partido para…, não vou dizer ‘excluir’, mas era uma pessoa que

vou dizer que era preciso contornar” – Idem

“Armando Emílio Guebuza tem intenção sim, não de continuar a dirigir o Estado moçambicano, porque tem um impedimento constitucional, mas ele quer manter-se no xadrez político nacional,

que é para continuar, porque há um tipo de negócios que você consegue quando controla o poder” – Idem

Adriano Nuvunga em Entrevista ao Canal de Moçambique

Guebuza quer Ali como presidente da República por ser fraco

Adriano Nuvunga

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Entrevista

nização, ser um partido organi-zado. Isto para muitas pessoas, que estão mais concentradas na dimensão urbana, pode passar a mensagem de que sim senhora, o partido Frelimo é dominante na medida em que reivindicou mostrar no congresso, mas para quem conhece a fundo aquilo que é a dinâmica política na-cional, sabe muito bem que este congresso acontece numa altura em que a Frelimo cada vez mais está a perder a legitimidade no seio dos votantes. É só olhar para número de votantes em 94, reduziu em 99, reduziu em 2004, reduziu em 2009 e não sabemos o que é que vai ser em 2014.

Canal: Mas a Frelimo au-mentou a percentagem com que ganha as eleições? Estou a dizer, por exemplo, que em 1999, o presidente Chissa-no ganhou as eleições com 52% dos votos e em 2004, o presidente Guebuza ga-nhou com acima de 75%...

Adriano Nuvunga: Um dos primeiros indicadores de legiti-midade do sistema político é a participação eleitoral. Quantos votantes deixaram seus afaze-res para irem votar. O segundo é o número de votos que cada partido obteve. E este número também se calcula em função do número dos votantes, re-gistados para votar. É preciso tomar essa consideração que em 1999 tinha mais votantes registados do que temos ago-ra. Claro, ter em mente que os números fornecidos pelo STAE não são totalmente fiáveis.

Mas o que eu pretendo dizer no fundo é que o partido Fre-limo até consegue muito bem mobilizar os seus membros para

irem votar. O presidente Chissa-no numa das suas locuções no Congresso dizia que “vamo-nos organizar. Da mesma forma que as pessoas foram partici-par no congresso, se organizar da mesma forma certamente que vão votar”, mas a história não é esta. Quelimane mos-tra que a realidade não é esta. Veja que a Frelimo reivindica ter seiscentos e tal mil mem-bros em Quelimane, mas penso que teve apenas cerca de um terço desses votos. Então, não é conclusiva esta ideia de que se haver três milhões de mem-bros, é porque necessariamente hão-de ir votar. A realidade não mostra isto. Não só Quelima-ne, mas noutros locais também, na Beira como noutros sítios.

Aquilo que pretendo dizer no fundo é que a Frelimo domina e controla a agenda do dia, muito mais facilmente consegue se or-ganizar e projectar aquela ima-gem que mostrou no congresso em Pemba, mas aquilo que eu iria dizer é que não é pela ca-pacidade de mobilização…. Há o fenómeno MDM, e não sabe-mos também como a Renamo irá aparecer, então, não é pela mobilização do congresso de Pemba que a Frelimo confir-ma esta posição hegemónica.

Canal: E o presidente Gue-buza, que como disse, pre-tendia cimentar seu poder no xadrez político, acha que o conseguiu? Com os resulta-dos da constituição do Comi-té Central, comissão política, mostram isso?

Adriano Nuvunga: Penso que Guebuza conseguiu até um pouco mais daquilo que eu pensava que ele ia conseguir.

E é aqui onde vai o meu pon-to. Aquilo que me pareceu que era a preocupação dele, é que ao fazer aquele trabalho que ele fez nas conferências pro-vinciais de assegurar que os delegados ao congresso sejam pessoas alinhadas com os se-cretariados, segundo nós pen-sávamos, a preocupação era de manter o nível de controlo sobre a comissão política e Comité Central. Ele não só conseguiu isso, você vê, por exemplo, e a eleição de Celso Correia e a eleição da Valentina Guebuza (filha mais nova de Armando Guebuza), são pessoas que são conhecidas aqui na cidade de Maputo, nos meandros empre-sariais, mas naquilo que é o grosso dos congressistas, que veio dos distritos, não acredito que eles tenham popularidade naqueles delegados que vieram dos distritos, mais do que Lu-ísa Diogo, que ficou de fora, mais do que o próprio Aires Ali.

Aqui é onde vai aquilo que é a minha tese e que discordo da-quilo que alguns jornais dizem. Veja “O País”, diz que “Aires Ali é um dos perdedores, junta-mente com Luísa Diogo” e ou-tros. Não concordo muito com isso. Luísa Diogo, de certeza, não conseguiu, mas também acredito que deve ter havido uma mobilização no seio do partido para…, não vou dizer ‘excluir’, mas era uma pessoa que vou dizer que era preciso contornar. Esta é a primeira ideia. A segunda ideia é de que para os interesses de presidente Guebuza, é importante que Ai-res Ali não seja membro da Co-missão Política. Portanto, Para mim, Aires Ali não perdeu. Isso faz parte da equação estratégica de Armando Guebuza, que é de ter Aires Ali como um presiden-te (da República) fraco, a partir

de 2014 e ele continuar homem forte a controlar o partido.

Ora, aqui entra a equação de dois poderes. A equação de dois poderes só funcionaria bem numa situação em que o Presi-dente da República não fosse membro efectivo da Comissão política. Então temos o presi-dente do partido a presidir es-tes dois importantes órgãos e o Presidente da República é con-vidado para vir prestar contas. Ele (o PR) sendo membro efec-tivo, vai complicar a equação. Então, penso que aqui houve uma engenharia eleitoral para assegurar que Aires Ali não fosse para a Comissão Política.

Canal: Qual é o interesse do presidente Guebuza para que isso aconteça. Ele já apareceu publicamente a dizer que não queria se candidatar para um terceiro mandato, inclusive há membros da sua família que já disseram na televisão que Guebuza queria mais tempo para descansar e se dedicar à família. Então afinal ele quer continuar a controlar o poder?

Adriano Nuvunga: O pon-to é que o poder e a política são arenas complexas. Não são muito lineares assim, como di-zer que o líder está cansado vai sair para se dedicar à família. É mais complexo do que isso. Mas aquilo que estou a dizer é que Armando Emílio Guebuza tem intenção, sim, não de conti-nuar a dirigir o Estado moçam-bicano, porque tem um impedi-mento constitucional, mas ele quer manter-se no xadrez políti-co nacional, que é para continu-ar, porque há um tipo de negó-cios que você consegue quando controla o poder. Então é da conveniência dele que Aires Ali seja conduzido à Presidência

da República. E ele quer conti-nuar como presidente da Freli-mo até ao próximo congresso.

Canal: Não acredita na tese de que Guebuza vai renun-ciar à presidência do partido assim que for eleito o próxi-mo Presidente da República, caso seja da Frelimo, tal como aconteceu com o presidente Chissano?

Adriano Nuvunga: Nota que Chissano não renunciou. Chissano foi… foi… foi… (ri-sos) aquilo que aconteceu, por pressão de dentro, porque não convinha a ideia de dois po-deres. E o presidente Guebuza quer o cenário de dois pode-res. Esse cenário só funciona se tiver um Aires Ali que sob ponto de vista de poder real ele não está nos órgãos que no partido definem essas coisas.

Canal: Partindo do pressu-posto de que o voto lá no seio da Frelimo é secreto. Que os milhares de delegados que foram votar têm ideias pró-prias, o que teria acontecido então para que os delegados votassem de modo a satisfa-zer essa equação do presi-dente Guebuza? Está a dizer que houve manipulação para pôr Aires Ali fora do poder?

Adriano Nuvunga: Não, não é isto que estou a dizer…

Canal: Estou a perguntar: acabou de dizer que o presi-dente Guebuza queria Aires Ali para lhe suceder na pre-sidência. E queria Aires Ali fraco, portanto fora da comis-são política. Foi exactamente isso que aconteceu. A minha

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Canal de Moçambique | Quarta-Feira, 03 de Outubro de 20124

Entrevista

pergunta é, será que houve arrumação das peças do jogo para que o resultado fosse esse ao gosto de Guebuza?

Adriano Nuvunga: Eu não estive em Pemba. Gosto muito de fiscalizar as eleições, mas desta vez não estive em Pem-ba, não tive acesso ao processo, mas aquilo que me interessa dizer é que é do interesse do presidente que as coisas este-jam como estão agora. Aires Ali, para mim, não saiu como perdedor. Não acredito que ele esteja triste. Acredito que neste momento ele vê as coisas den-tro daquilo que o chefe quer.

Canal: Ainda estamos no campo das hipóteses, que po-dem ser validadas ou não. Na sua opinião, o que teria levado Aires Ali, o primeiro--ministro, a se candidatar para a comissão política, se ele sabia que iria sair com a imagem chamuscada, pelo menos na opinião pública que o toma como perdedor?

Adriano Nuvunga: Não acredito que ele esteja com ima-gem chamuscada. O jogo de po-lítica é isso.

Canal: Mas ninguém quer perder… Aires Ali perdeu, pelo menos nas urnas.

Adriano Nuvunga: Mas a minha tese é de que ele não per-deu. Esta é que é a minha tese. A minha tese é de que ele não perdeu. Ele chegou ao lugar de ministro, porque foi indicado por Guebuza, chegou ao lugar

de primeiro-ministro, porque ele foi indicado pelo presidente Guebuza. Naquela posição em que está, chegou pela mão de Guebuza. Portanto, pela mes-ma mão de presidente acredito que poderá chegar a Presidente da República, mas sendo um Presidente da República fraco. Aquilo que provavelmente deve ser a preocupação do presidente Guebuza é de evitar o sindro-ma que aconteceu na Zâmbia, com o presidente Chiluba, que foi feito por Levi Nwanawassa. Portanto, não quer efectivamen-te um presidente que seja forte.

Canal: E Guebuza conse-gue eliminar essa ameaça, sabido que o nosso sistema eleitoral é de voto directo e universal ao Presidente da República. Não persiste a ameaça de que uma vez no poder, Aires Ali possa se rebe-lar e não prestar obediência à pessoa que lhe promoveu?

Adriano Nuvunga: A ideia aqui, repito aquilo que é o meu ponto de vista, é o seguinte: quando alguém tem poder, o po-der tem uma fonte. A fonte real do poder, são aqueles órgãos que, na minha forma de ser, para que funcione a ideia de um presidente fraco, era preciso que ele (Aires Ali) não pertencesse a esses órgãos. Estamos no campo hipotético, no campo de conjec-turas. Aquilo que me parece – e é aqui onde discordo de muitas das análises que eu ouvi, de di-zer que Aires Ali saiu como per-dedor – é que ele neste momen-to está tranquilo. Está tranquilo mais ou menos sabendo o que é

que vai acontecer. Obviamente que ele sabe que não fazendo parte daqueles órgãos, perde a possibilidade pessoal de se mo-vimentar para dentro daqueles órgãos para obter uma eleição ao nível pessoal, mas tudo de-pende da pessoa que lhe promo-ve, que é o presidente Guebuza.

Nesta circunstância tem Mu-lémbwè que faz parte daquele órgão (comissão política), muito mais facilmente pode-se movi-mentar e até se aliar com o pre-sidente Guebuza para conseguir a eleição. Tem a própria Luísa Diogo que é membro do Comité Central, que pode ter muito es-paço para trabalhar a título indi-vidual, mas acredito que a estra-tégia do presidente Guebuza, de ter um presidente fraco que ele possa controlar como presiden-te do partido, recai a Aires Ali.

Canal: E o que é que o Es-tado ganha ou perde com esta situação, de ter um Pre-sidente da República que não manda. Teleguiado pelo par-tido, que presta vassalagem a uma organização de direi-to privado, que é o partido?

Adriano Nuvunga: Eu acho que podemos entrar num outro dia neste debate de que o que são partidos, como órgãos de di-reito privados. Eu não sou mui-to assim, desse campo teórico…

Canal: Sim, mas estou a querer entender, na sua in-terpretação, o que os moçam-bicanos ganham ou perdem, ao ter um presidente que não tem poder real, efectivo. Que está a cumprir ordens de quem o promoveu para o lu-gar e não dos moçambicanos que o elegeram, neste caso?

Adriano Nuvunga: Eu penso que o debate não é muito nes-sa dimensão. É mais no senti-do de que tipo de interesses se pretende proteger, por um lado, mas, por outro lado, aquilo que são as perspectivas para a go-vernação política de um país.

Canal: Que tipo de interes-ses se pretende defender?

Adriano Nuvunga: Primeiro são os negócios. Os negócios, aqueles que acontecem por via de conflito de interesses de polí-tica. Que são aquilo que é a área de trabalho do Centro de Inte-gridade Pública, OK? Que tem vindo a denunciar. O CIP tem uma base de dados de interesses empresariais, onde claramente

se vê que interesses cada um dos dirigentes tem. E estes dirigen-tes conseguem pôr estes negó-cios a andar, estando na esfera política, na esfera de controlo. Ora a questão do fundo é que esse sindroma vai continuar, o sindroma de falta de transparên-cia, muitos dos negócios públi-cos e aqui mais uma vez a ex-pectativa que tinha de que esta poderia ser a vez da ruptura en-tre a geração 25 de Setembro e uma outra geração, assumindo, liderando os negócios, poderá não acontecer. E a expectativa que havia é de que a outra gera-ção ‘8 de Março’, da qual Aires Ali faz parte, é mais tecnocrata, menos recuada do ponto de vis-ta da história da Frelimo, mas mais aberta para o debate sobre a transparência dos negócios públicos. Mas isso poderá ficar prejudicado por mais 5 anos.

Canal: Isso é mau para o Estado...

Adriano Nuvunga: Isso é muito mau. É exactamente o que neste momento nos preocupa, a questão da promoção da trans-parência na indústria extractiva. Isso vai continuar tal como está agora. Porque os debates que te-mos travado agora não mostram muita tendência progressista nesse sentido. E a expectativa que se tinha era de que com uma outra geração, as coisas podiam mudar. Isso significa, portanto, que o nosso trabalho como so-ciedade civil tem que continuar.

Canal: Há um aspecto que gostava de ouvir da sua análi-se, que não sai daquilo que é o rescaldo do congresso. Como vê a eleição de pessoas que nunca foram vistas a fazer po-lítica, mas que agora entram para cargos directivos no par-tido Frelimo. São pessoas co-nhecidas como estando próxi-mo dos negócios do presidente Guebuza. A sua filha Valenti-na e o jovem empresário Celso Correia. Qual é a lógica disto?

Adriano Nuvunga: Eu penso que aí não. Definiu bem os par-tidos. Na verdade devem fazer aquilo que acham que querem fazer. Os partidos são instru-mentos para concorrer a elei-ções e ganhar o poder. Então se convém ao partido Frelimo ter Celso Correia e Valentina Gue-buza naqueles órgãos, para con-quistar eleitorado a esse nível, ao nível empresarial, aí penso que o partido Frelimo é livre de o fazer. Agora, desde que isso

não seja em prejuízo, primeiro da estabilidade política, porque o partido Frelimo é diferente do PLD, por exemplo, que pode ter quem quiser, mas não está na governação, na gestão dos ne-gócios públicos. As pessoas pre-ocupam-se mais com o partido Frelimo porque este está a go-vernar. Está a gerir os negócios públicos. Mas em termos de que grupos quer ver representado nos órgãos, isso a eles cabem.

Canal: Então, resumindo tudo o que aqui falamos, po-demos dizer que este foi o congresso da consagração dos interesses do presidente Gue-buza?

Adriano Nuvunga: Sim… sim. Esta era a intenção, a preocupação que havia, era consagração da hegemonia da Frelimo e de Guebuza, e Gue-buza porque sabe que este pode ser o último congresso em que ele é presidente, quer deixar um marco daquilo que é a tra-jectória política do partido.

Canal: Como analisa a ac-tual situação política, e eco-nómica e social do país. Acha que, com a direcção de Gue-buza na Frelimo, o país per-deu ou ganhou em termos da transparência, liberdades, de-mocracia e progresso? Com-parativamente com a direcção de Chissano?

Adriano Nuvunga: Eu pen-so que Chissano era mais uma pessoa de desenvolvimento orientado para o conceito das nações unidas, mais desenvol-vimento dos direitos humanos, da democracia, como factores de desenvolvimento. E Guebu-za é uma pessoa que quando entra no poder, ele é visto como uma pessoa de modelo desen-volvimentista orientado para aquilo que chamamos de de-velopmental state. Um Estado desenvolvimentista, um Estado como actor. Um modelo ins-pirado mais ou menos no caso asiático, dos tigres asiáticos. Se for a olhar aquilo que são os tigres asiáticos, que é a inspira-ção de Guebuza, a questão dos Direitos Humanos, das liberda-des, tendem um pouco a serem negligenciadas, olhando mais para a questão de desenvolvi-mento económico. A forma de Guebuza é de desenvolvimento económico. Ele exprimiu isso nos primeiros anos, fomos a

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Entrevista

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SUB-CHEFE DA REDACÇÃOMatias Guente | [email protected] | Cel: 823053185

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REGISTO: 001/GABINFO-DEC/2006

IMPRESSÃO: SGRAPHICS, Lda, Matola

conferências de developemental stastes em Moçambique. Mas no fundo o presidente Guebuza é um homem de negócios, e esta questão às vezes os conceitos se misturam, os modelos se mistu-ram e os interesses se misturam. E aquilo que acabou acontecen-do é cada vez mais o alinhamen-to do Estado com partido. É isso que muitas vezes os partidos da oposição reclamam, como, por exemplo, a questão que se debateu muito nos últimos dias, de se exigir cartão de membro (da Frelimo) para ser dirigen-te no Estado, embora para isso não haja provas. Agora sobre o congresso, muitas pessoas (fun-cionários do Estado) foram des-contados salário… é uma visão de um Estado que cada vez mais está alinhado com o partido.

Canal: E quem ganha mais com isto? Partido, negócios do Estado ou negócios do pre-sidente Guebuza?

Adriano Nuvunga: Eu penso que Guebuza fez muitas coisas. A questão de deixa-andar era uma realidade e ele combateu o deixa-andar. A questão de auto--estima, que está a ser muito politizada agora, mas penso que houve um pouco o sentimento de orgulho que as pessoas têm, que os funcionários públicos sentem que estão a ser valori-zados. Penso que houve exces-so na questão de voltar para a história do partido. Mas não há belo sem mas… Esta ideia de negócios e conflitos de po-deres, toda a gente fala disto. Até o pacote anti-corrupção está na Assembleia da Repú-blica. Mas é difícil abordar isso quando o Presidente da Repú-blica é um homem de negócios.

Canal: E é recomendável esta situação de termos um Presidente da República que é um business-man?

Adriano Nuvunga: Em políti-ca não há coisas recomendáveis.

Canal: Estou a falar des-

ta situação de ter um chefe de Estado que é ao mesmo tempo dono de grandes ne-gócios, que inevitavelmente faz com o Estado. É sabido que presidente Guebuza tem negócios em todas as áreas, transportes, comunicações, telefonia móvel, infraestrutu-ras. Isso é bom para o Estado?

Adriano Nuvunga: É… aí está a cometer um erro. Se

fosse meu estudante lhe daria zero (valores). Porque quem vota são as pessoas. Acabou de me dizer que Guebuza teve mais (percentagem de) vo-tos do que Chissano. Quem sou eu para dizer se é bom tê--lo como presidente ou não?

Canal: Na sua opinião, como analista acha que é salu-tar ter um Estado cujo gestor máximo é senhor de negócios?

Adriano Nuvunga: A ques-tão de fundo não é essa. Aí de novo eu te dava zero, me desculpe. Vamos ver, o can-didato oponente de Barack Obama é um homem de ne-gócios. Mas isso não é pro-blema lá nos Estados Unidos.

Canal: Então, qual é o pro-blema aqui?

Adriano Nuvunga: O proble-ma é a questão de boa governa-ção, da transparência e prestação pública de contas. Num cenário que estes mecanismos estão lá, se a declaração pública de contas existe, ter um presiden-te empresário não é problema.

Canal: Talvez para termi-nar: nesta tese que sustenta de que tanto Guebuza como Aires Ali saíram vitoriosos do X Congresso, e que Aires Ali será provavelmente o presi-dente, neste cenário, que Mo-çambique devemos esperar no futuro?

Adriano Nuvunga: Futu-

ro optimista. Eu sou optimis-ta. Não só com Aires Ali, mas com todos aqueles que estão na lista dos prováveis presidenci-áveis, a partir do próprio Aires Ali, Luísa Diogo, Mulémbwè e Vaquina. Vocês não dão por Vaquina. O Vaquina deve ser considerado... São todos eles pessoas de uma geração dife-rente da geração de 25 de Se-tembro, são pessoas com quem facilmente podemos debater.

Canal: Futuro optimista com estas pessoas que, como disse, algumas delas entra-riam na presidência por mão de Guebuza? Não estariam lá para satisfazer Guebuza?

Adriano Nuvunga: A tran-sição, Borges, não acontece de uma forma simples e pacífica. Mesmo o Estado mais democrá-tico que temos, os Estados Uni-dos da América, não construiu a sua democracia de uma forma pacífica. Foi um processo com-plicado. Houve guerras, guerra civil e outros tantos problemas que escreveria livros e livros, só de coisas negativas. Eu acredi-to que Moçambique está numa trajectória, não a desejada. Aquilo que é o meu ponto de vista, Moçambique está numa situação de dois cenários. Que é o cenário de Angola, de um lado, e o cenário de Botswana, doutro. O meu desejo como director do CIP, que é o meu trabalho, é que Moçambique vá pela direcção de Botswana e não pela direcção de Ango-la. (Canal de Moçambique)

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