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Aerovisão 2 Astronauta retorna do espaço depois de concluir missão de oito dias à bordo da Estação Espacial Internacional (ISS); Brasil é o 36º país na história a enviar representante ao espaço. “A s palavras movem, os exem- plos arrastam.” Esse antigo pensamento sintetiza a importância do feito do tenente-coronel-aviador Marcos Cesar Pontes, o primeiro as- tronauta brasileiro, que, no início do mês, completou com êxito a Missão Centenário e retornou da Estação Espacial Internacional (ISS) após realizar uma série de experimentos científicos e educacionais. Por Tenente Alessandro Silva e Karina Barrros “Com esses recursos, certamente, poderiam ter sido formados doutores e mestres, como têm sido formados. Mas quantos jovens você acha que vão se incentivar e deslanchar em carreiras de ciência e tecnologia? Há custos e benefícios”, respondeu o tenente-coronel ao ser questionado, ainda na ISS, sobre a importância do investimento feito pelo país, de cerca de US$ 10 milhões, por meio de um acordo firmado com a Rússia em outubro do ano passado. O astronauta decolou em 29 de março do Cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão, tendo como companheiros de vôo o russo Pavel Vinogradov e o americano Jeffrey Williams. Em 1º de abril, a Soyuz acoplou na ISS e o brasileiro deu início aos experimentos selecionados pela Agência Espacial Brasileira (AEB).

Aerovisão Nº 215 VENCEMOS!

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Astronauta retorna do espaço depois de concluir missão de oito dias à bordo da Estação Espacial Internacional (ISS); Brasil é o 36º país na história a enviar representante ao espaço.

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Astronauta retorna do espaço depois de concluir missão de oito dias à bordo da Estação Espacial Internacional (ISS); Brasil é o 36º país na história a enviar representante ao espaço.

“As palavras movem, os exem-plos arrastam.” Esse antigo

pensamento sintetiza a importância do feito do tenente-coronel-aviador Marcos Cesar Pontes, o primeiro as-tronauta brasileiro, que, no início do mês, completou com êxito a Missão Centenário e retornou da Estação Espacial Internacional (ISS) após realizar uma série de experimentos científi cos e educacionais.

Por Tenente Alessandro Silva e Karina Barrros

“Com esses recursos, certamente, poderiam ter sido formados doutores e mestres, como têm sido formados. Mas quantos jovens você acha que vão se incentivar e deslanchar em carreiras de ciência e tecnologia? Há custos e benefícios”, respondeu o tenente-coronel ao ser questionado, ainda na ISS, sobre a importância do investimento feito pelo país, de cerca de US$ 10 milhões, por meio

de um acordo fi rmado com a Rússia em outubro do ano passado.

O astronauta decolou em 29 de março do Cosmódromo de Baikonur, no Cazaquistão, tendo como companheiros de vôo o russo Pavel Vinogradov e o americano Jeffrey Williams. Em 1º de abril, a Soyuz acoplou na ISS e o brasileiro deu início aos experimentos selecionados pela Agência Espacial Brasileira (AEB).

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Do espaço, o tenente-coronel conversou com crianças de escolas brasileiras, relatando o que estava presenciando e como era o seu trabalho na estação. “A vista da terra daqui de cima é impressionante. Nós temos que cuidar do Meio Ambiente. E essa responsabilidade é, principalmente, de vocês, crianças”, disse o astronauta, que nasceu em família humilde e, antes de se tornar piloto da Força Aérea Brasileira (FAB), foi eletricista em Bauru (SP).

Entre os seis projetos científicos levados ao espaço está o experi-mento da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) para o desenvolvimento e aperfeiçoamento do conhecimento sobre o controle térmico de componentes eletrônicos para satélites. Essa tecnologia, além de incentivo à indústria nacional, pode garantir autonomia nesse setor para o país.

Outros dois trabalhos feitos pelo astronauta, de caráter educacional, foram acompanhados de perto, pela internet, por estudantes da rede pública de São José dos Campos (SP): um deles, por exemplo, revelou que as raízes de feijão, na terra, brotam direcionadas para a terra, apesar da falta de luminosidade, enquanto que, no espaço, cada uma segue num sentido devido à ausência de gravidade.

Durante a missão, o tenente-coronel homenageou o inventor do avião, Alberto Santos-Dumont. Usou uma réplica do chapéu que ele vestia e mostrou um lenço original com as iniciais dele. A missão do astronauta, batizada de Centenário, faz alusão aos cem anos do vôo do 14 Bis, comemorados em outubro deste ano. “É para a gente se lembrar da nossa

história e ter orgulho dela.”Graças à viagem, além do

conhecimento adquirido, a Missão Centenário fez o país refletir sobre a importância do Programa Espacial Brasileiro. Apenas em março, os principais veículos impressos (jornais e revistas) e de televisão do país dedicaram espaço equivalente a 24,5 páginas de jornal e quase cinco horas de programação. Esse dado não inclui as reportagens de abril, após a acoplagem, nem as entrevistas concedidas por ele da Estação Espacial.

A nave Soyuz pousou com sucesso no Cazaquistão em 8 de abril. Ao ser resgatado, o astronauta afirmou: “Vencemos!” A operação de reentrada na atmosfera é o procedimento mais

arriscado no retorno.De volta à Terra, o tenente-

coronel recebeu uma mensagem de congratulações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: “Em nome da Força Aérea Brasileira, do Ministério da Ciência e Tecnologia e de todo o nosso povo, quero dar as boas-vindas em seu retorno à casa. O êxito extraordinário de sua missão e os experimentos feitos na Estação Espacial foram motivo de grande orgulho e satisfação para nós”, afirma nota distribuída à imprensa.

Retorno – Decorrido o período em que os astronautas passam por exames médicos e recuperam-se do desgaste da missão, o tenente-coronel retornou ao Brasil para visitar a

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família, sua cidade natal, encontrar antigos amigos e para participar de uma série de homenagens. Uma verdadeira maratona.

Na madrugada do dia 20 de abril, o astronauta desembarcou em São Paulo, sendo recebido pelos irmãos Luiz Carlos e Rosa Pontes, além do fi lho Fábio, amigos e autoridades da FAB e da AEB. Mal saiu de um avião embarcou em outro, com destino a Brasília, a primeira parada da agenda de retorno.

A cerca de 400 km da capital do país, caças F-5 da FAB interceptaram o avião em que ele viajava e o escoltaram até a Base Aérea de Brasília.

No Palácio do Planalto, o astronauta recebeu das mãos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Ordem do Mérito Nacional. “Sua viagem foi mais um passo na trajetória do país para a conquista do espaço”, afi rmou o presidente.

No Comando da Aeronáutica, o tenente-coronel recebeu a Ordem do Mérito Aeronáutico. “Ele representou todos os integrantes que vestem azul. O orgulho que sentimos transcende a FAB e é sentido por toda a sociedade”, afi rmou o comandante da Aeronáutica, tenente-brigadeiro-do-ar Luiz Carlos da Silva Bueno.

No dia seguinte, o astronauta brasileiro chegou a Bauru, no interior de São Paulo, sendo recebido no aeroporto da cidade por quase cinco mil pessoas, segundo estimativa da Polícia Militar. Crianças e adultos, vestidos de verde e amarelo, queriam autógrafos, uma foto ao lado do tenente-coronel ou até mesmo falar com ele. “Vim aqui para agradecer a ele o que fez pelo país. Meu coração está explodindo de orgulho”, afi rmou Sandra Aparecida, que viajou mais de oito horas para participar das comemorações na cidade natal do astronauta.

Ali, o astronauta teve o primeiro contato com o pai, Virgílio Pontes, 88, que acompanhou de perto todas as homenagens prestadas ao filho na cidade. Nos céus da cidade, sete aviões da Esquadrilha da Fumaça escreveram “Parabéns Pontes” e “Brasil”, emocionando a todos que participavam das festividades. Nesse mesmo local, ainda criança, o garoto Marcos Pontes teve o primeiro contato com os aviões da Fumaça e decidiu disputar o concorrido processo de seleção para a Academia da Força Aérea, em Pirassununga (SP).

Uma carreata com mais de cinco quilômetros de extensão conduziu o astronauta, em carro do Corpo de Bombeiros, até o teatro municipal, onde estudantes o homenagearam. “Ele estudou na mesma escola que eu estou hoje. Posso me espelhar nele”, afi rmou o adolescente David

Kaw Ramos de Souza, 13, aluno do Sesi. Estudante de escola pública, o tenente-coronel Pontes fez curso profi ssionalizante e trabalhou como eletricista antes de ingressar na FAB.

No terceiro dia da maratona de homenagens, o astronauta pousou na Base Aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, a bordo de um caça A-1, no dia em que a aviação de caça brasileira comemora o seu dia heróico: a data em que os pilotos do 1º GAVCA (Grupo de Aviação de Caça) voou um número recorde de missões na Itália, num esforço aliado para acelerar o fi nal da 2ª Guerra Mundial.

Aos pilotos de caça, detalhou a preparação recebida na Rússia e destacou que o fato de ser aviador e piloto de caça ajudou bastante a enfrentar a dura rotina de exames médicos e testes físicos. Emocionados, veteranos do 1º GAVCA homenagearam o tenente-coronel.

Nos dias seguintes, o astronauta visitou a Academia da Força Aérea, em Pirassununga, o CTA (Comando-Geral de Tecnologia Aeroespacial) e o ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), em São José dos Campos (SP), repetindo o caminho que o levou ao espaço. Aos cadetes, estudantes de engenharia e profissionais que o ajudaram nessa jornada, o tenente-coronel contou detalhes da missão e buscou transmitir mensagens de otimismo e incentivo. “Muito se fala dos experimentos das sementes. As sementes foram plantadas, mas não em saquinhos no espaço, mas no coração de cada criança que sonha em ser astronauta, que sonha em ser da FAB, cientista ou engenheiro. São crianças que vão estar, no futuro, dominando o país”, afi rmou.

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Um novo dia e uma noite a cada 45 minutos. No espaço, o organismo reage de modo diferente e o desgaste físico dificulta o trabalho dos astronautas. Leia a seguir entrevista com o tenente-coronel Pontes, em que ele relata o que sentiu e os problemas que teve de contornar durante a missão:

Aerovisão - Como era a rotina de trabalho no espaço?Tenente-Coronel Pontes - O tempo no espaço é muito precioso. É muito difícil você chegar no espaço e trabalhar lá. Existem desgastes físicos, fisiológicos, psicológicos. Na verdade, não dá tempo de fazer quase nada. A primeira coisa era esquecer que tinha dia e noite, já que a cada 90 minutos eu via o nascer e o pôr -do-sol. Depois, tinha um momento reservado para dormir, comer e fazer as experiências. Se o comandante não nos reunisse para comermos, com certeza esqueceríamos disso.

Aerovisão - Como foi a adaptação ao espaço e o que sentiu no retorno?Ten Cel Pontes - Tive a felicidade de ter uma ótima adaptação ao espaço, já que não aconteceram muitas alterações e sensações ruins quanto ao aspecto fisiológico. No primeiro dia já estava ativo para trabalhar nos experimentos. O retorno é interessante porque aconteceram várias coisas que meu organismo já estava desacostumado. Depois da reentrada, por exemplo, ainda dentro da cápsula,

ENTREVISTA:

Espaço muda fisiologia do corpo

estava esperando para ser retirado. O comandante saiu e me deixou com o chek list no colo. Para sair, tinha que deixá-lo no banco ao meu lado. Quando fui fazer isso, não consegui levantar o check list e cheguei a pensar que ele estava preso em alguma coisa. Tempo depois percebi que era apenas o peso dele, que eu já não estava mais acostumado a fazer força. Além disso, ao sair da cápsula percebi que meu sistema de equilíbrio ainda não tinha voltado ao normal. Tudo a minha volta rodava. Levei seis horas para voltar a ter o equilíbrio normal.

Aerovisão - Quais são as alterações fisiológicas mais freqüentes experimentadas no espaço?Ten Cel Pontes - Perda do sistema vestibular, rosto inchado, perda de densidade óssea principalmente na coluna, nos calcanhares e no joelho, o que colabora para osteoporose. Durante o vôo, a coluna distende e há, perda do tônus muscular. Por isso temos que fazer muito exercício. A pele começa a descascar, o ritmo cardíaco no espaço fica lento, e há perda de sensibilidade no paladar e no olfato.

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A caminho do espaço, o Ten-Cel Pontes acenou para a câmera a bordo da Soyuz.

Logo após sua chegada, o Ten Cel Pontes conhece a sala de computadores da Estação Espacial Internacional.

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