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ECONOMIA SOCIAL E SOLIDÁRIA EM CABO VERDE

Génese, entidades, atualidade e perspetivas.

JACINTO SANTOS

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É expressamente proibido reproduzir, no todo ou em parte, sob qualquer forma ou meio, NOMEADAMENTE FOTOCÓPIA, esta obra. As transgressões serão passíveis das penalizações previstas na legislação em vigor.

Editora: Pedro Cardoso Livraria

FICHA TÉCNICATítulo: Economia Social e Solidária em Cabo Verde: Génese, entidades, atualidade e perspetivasAutor: Jacinto Abreu dos SantosPaginação, fotografia contracapa, montagem e imagem da capa: Bino SantosFotografias da capa: Manuel Brito (Vivi) e Alfa ComunicaçõesRevisão: Josefa Lopes©Autor. Direitos de edição reservados à Pedro Cardoso Livrariapara edição em Língua Portuguesa1ª Edição, 2017Impressão e acabamentos: CAFILESA - SOLUÇÕES GRÁFICAS, LDA.

ISBN: 978-989-99610-9-8Depósito Legal: 422574/17Tiragem: 500 exemplares

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HOMENAGEM

Nos países democráticos, a ciência da associação é a ciência mãe; o progresso de todas as outras depende do seu. Entre as leis que regem as sociedades humanas, há uma que se afirma mais precisa e mais clara do que as outras. Para que os homens se mantenham civilizados ou venham a sê-lo, é necessário que entre eles a arte de se associarem se desenvolva e se aperfeiçoe na mesma medida em que aumenta a igualdade de condições.

Alexis de Tocqueville (2008, p.494)1

Em homenagemaos primeiros cooperadores e cooperativistas

de Cabo Verde.

1 Da Democracia na América – Antropos Relógio d’Água, 2008,Lisboa, p.494

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AGRADECIMENTOS

Começo por agradecer à Milucí, esposa, amiga, companheira e parceiraneste percurso de mais de 40 anos de vida familiar, profissional, política e social e aos meus filhos, Bino, Sté e Hélio, por me terem permitido que lhes “roubasse” tempo, tempo este que foi consagrado à causa política, social, pública e ao desenvolvimento do meu país, com profissionalismo e muita paixão.

Um agradecimento especial aos camponeses, pescadores, operários e artesãos, que me ensinaram a ver o mundo, a vida e as pessoas na sua multidimensão e que muito contribuíram para moldar a minha compreensão sobre a realidade do Homem rural, urbano e a minha maneira de estar na vida. Lembro com saudades Nho Mochino, Nho José, Armando Marques, Alcindo Freire e Dona Clementina de Várzea Santana, Nho Maninho do Serrado, Farinha de Praia Formosa, Tchalé de Achada Fazenda, Puchim e Antão Barreto de Achada Ponta, Nho Miguel de Loura, Mimi de Boa Entrada, Codé di Dona, Sema Lopi, Nha Nácia Gomes, Nha Bia Velhinho, Dona Albertina di Nho Raul e Djoni/Feliciano.

Os meus agradecimentos vão também para o meu amigo José Floresvindo Barbosa (Lito) por se ter disponibilizado a ajudar-me na recolha e sistematização de dados financeiros junto das Câmaras Municipais, ao José Marques por me ter permitido o acesso à base de dados da Plataforma das ONG e colaborado na sua análise, ao Ramiro Azevedo amigo, companheiro e Coordenador do Programa Nacional de Luta contra a Pobreza, por me ter facilitado o acesso à riquíssima base de dados sobre as associações ligadas ao Programa de Luta contra a Pobreza no Meio Rural. Ao amigo, António Carlos Gomes (Toká), pela paciência e dedicação do seu tempo à leitura e pela chamada de atenção e sugestões em relação a determinados aspetos conceituais e de interpretação da estatística.

Na realização deste trabalho tive o privilégio de receber incentivos e contribuições de pessoas altamente qualificadas e amigas, no campo das ciências sociais, de entre as quais destaco Cláudio Furtado, Daniel Menezes, Clébia Freitas, Rogério Roque Amaro, António de Jesus, todos professores universitários, Roberto de Meglio do Departamento da Economia Social e

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Solidária da Organização do Internacional do Trabalho(OIT) e Emmanuel Kamdem Secretário-Geral do Instituto Panafricano de Desenvolvimento (IPD) e Professor Reitor da Universidade Africana para o Desenvolvimento Cooperativo (UADC), Abdeljalil Cherkaoui, Presidente da Rede Africana de Economia Social e Solidária e Vice-Presidente do Instituto Panafricano de Desenvolvimento (IPD) e Arminda Barros, jornalista e grande ativista social.

Não posso terminar sem fazer uma menção especial ao amigo Leão Lopes, aos meus ex-colegas de trabalho da Central das Cooperativas e do Instituto Nacional das Cooperativas, aos amigos e parceiros Jacques Bastin, Gunther Heidrich Semedo, Luís Araújo e Gilles Petit de Mirbeck; aos meus Diretores de Pesquisa, Henri Grenier e Marcos Guerra e ao assistente pedagógico Pierre Forrat, pessoas que muito contribuíram para o meu desenvolvimento profissional e intelectual.

Uma palavra de carinho à Tia Josefa Lopes que cuidou da revisão do livro, assegurando a qualidade do trabalho e ao amigo Mário Silva que tornou possível a publicação deste trabalho pela Livraria Pedro Cardoso, o que muito me honra.

Um agradecimento muito especial ao meu filho Bino Santos pela conceção da capa e de todo o grafismo do livro ao amigo Manuel Brito/Vivi pela linda foto e à Alfa Comunicações pela cedência da foto principal da capa.

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PREFÁCIO

Cláudio Alves Furtado

Professor do Programa de Pós-Graduação em História e do Programa Multidisciplinar de Estudos Étnicos e Africanos da

Universidade Federal da Bahia- Brasil

A escolha de um/a prefaciador/a é um ato discricionário do autor que ne-le/a (prefaciador/a) vê alguém de confiança, hipoteticamente capaz de apre-sentar ao público leitor, de forma sintética, a relevância da obra dada à es-tampa. Não se trata, claro está, de uma resenha ou uma crítica do trabalho, mas antes, de um convite à leitura capaz não apenas de motivar a aquisição da obra como também de relevar os aspetos mais significativos da narrativa.

Neste sentido, prefaciar a obra “ECONOMIA SOCIAL E SOLIDÁRIA EM CABO VERDE: Génese, entidades, atualidade e perspetivas”, da pluma de Jacinto Santos é, menos um trabalho no sentido de dispêndio de energia intelectual e física, e mais um ato de prazer, de aprendizagem e, de certa forma, de cumplicidade. Confesso que sou um leitor suspeito, na sua positividade, dos textos do autor. Sempre nutri uma relação de estima pes-soal e intelectual por Jacinto Santos, isto há mais de três décadas. Trata-se, em minha opinião, dos raros cabo-verdianos que podem ser denominados, recuperando António Gramsci, de um verdadeiro intelectual orgânico. Na verdade, a sua práxis resulta de uma ação dialética entre o pensar e o agir, pensando agindo e agir como condição de pensar. É por isso que, em regra, seus textos e suas reflexões, mesmo quando orais, se ancoram num profundo conhecimento empírico e prático das realidades sobre as quais ele discorre.

É, nesta esteira, que emerge o ensaio “Economia Social e Solidária em Cabo Verde: Génese, entidades, atualidade e perspetivas”. Interessan-te relevar, desde logo, o significado não explicitado da primeira parte do enunciado do título do livro. Quem conhece o autor e acompanha sua

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trajetória tende a associá-lo, de imediato, aos movimentos cooperativo e associativo. É, aliás, o que ele mesmo sustenta ao se situar, na introdução ao livro, no lugar de fala do narrador.

Titular o livro de “Economia Social e Solidária” insere o autor numa reflexão teórica que se tem aprofundado na última década sobre um novo setor da atividade econômica - o terceiro setor - e que não pode ser sub-sumido nem no setor privado nem no setor público. O terceiro setor seria o que Boaventura Sousa Santos (2001, p.13) define como um “conjunto de organizações sociais que não são nem estatais nem mercantis, ou seja, organizações sociais que, por um lado, sendo privados não visam fins lucra-tivos e, por outro lado, sendo animadas por objetivos sociais, públicos ou coletivos, não são estatais”.

Nesta acepção, os movimentos cooperativos e associativos que constituem a centralidade de análise do autor são assumidos teoricamente como inte-grantes do terceiro setor e que dão corporeidade econômica e socio-históri-ca à economia social e solidária. Utilizando uma linguagem um pouco mais rebuscada, diria que Jacinto Santos considera os movimentos cooperativo e associativo como categorias nativas e descritivas e economia social e so-lidária como categorias analíticas e teóricas. Aliás, uma discussão reflexiva sobre o conceito/campo de estudos da economia social e solidária é objeto de atenção do autor nas partes 12, 16 e 17, fazendo uma arqueologia deste campo de estudos, enquanto espaço académico, mas ancorado em realida-des socio-históricas bem concretas.

A obra de Jacinto Santos tem a qualidade de, partindo de um ator social-mente engajado e parte ativo dos processos por ele analisados, sistematizar de forma aprofundada, historicamente bem documentada e reflexivamente crítica, a trajetória dos movimentos cooperativos e associativos cabo-verdia-nos sua base social de ancoragem, sua articulação com os poderes políticos e públicos, suas vicissitudes, resultados e potencialidades.

Escrita numa linguagem clara, precisa e concisa, sem ser simplista, a obra tem a vantagem de inscrever-se no quadro do que tenho vindo a tentar sugerir, da emergência e consolidação de um pensamento social cabo-ver-diano.Quer isto dizer que estamos vivenciando um processo crescente de produção de conhecimentos que objetivam pensar, interpretar e propor for-mas legítimas (científica, política e socialmente) de entender Cabo Verde.

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O texto não faz apenas um sobrevoo da história do movimento cooperativo e associativo cabo-verdiano, de forma particular, no contexto do pós-in-dependência, quanto propõe um modelo de explicação das determinantes sociais, políticas, econômicas e culturais de sua emergência, bem como das inflexões verificadas em momentos históricos bem precisos. Refiro-me aqui ao momento da independência até 1990, para o movimento cooperativo, e de 1990 até hoje para o movimento associativo. Sublinhando, embora, o caráter essencialmente top-down e exógeno dos processos de dinamização dos movimentos cooperativo e associativo, não deixa o autor de pontuar a progressiva endogeneização desses processos, significando uma apropriação por parte dos cooperadores e dos associados de suas organizações econômicas e sociais, num jogo sinuoso, de busca de manipulações várias, nomeada-mente com os poderes públicos instalados, como sugere o autor num diá-logo com António Tavares de Jesus (2016).

Uma outra dimensão profundamente analisada por Jacinto Santos é, de um lado, o quadro normativo de enquadramento deste setor de economia e, de outro, as formas como as políticas públicas têm buscado uma interlocução com esses movimentos. No que diz respeito à primeira dimensão, o autor busca na(s) Constituição(ões) da República, nas Leis-quadro e demais le-gislação infraconstitucional a normatização do setor, o que pode indiciar a relevância deste setor para a sociedade cabo-verdiana. Uma vez mais, o autor nos proporciona linhas reflexivas importantes e interessantes na justa medida em que fornecem argumentos heuristicamente relevantes. Sabia-mente, deixa o autor aos leitores e a pesquisadores uma análise mais cir-cunstancial e também mais sincrônica do quadro legal, sugerindo, contudo, que a mera hermenéutica jurídica não nos permite captar todos os sentidos dos processos de tentativa de conformação jurídica da economia social e solidária, bem como das ausências, silenciamentos e vazios jurídico-legais.

Na segunda dimensão o autor analisa como as políticas públicas incorpo-ram e assumem a importância das organizações econômicas solidárias na estratégia de desenvolvimento, tanto nas políticas macros como microeco-nómicas, bem como no âmbito das políticas setoriais. Esse tipo de abor-dagem inclui, claro está, a análise das ausências de políticas públicas para o setor fazendo ressaltar a miopia dos formuladores das políticas públicas não apenas em relação à realidade existente quanto pungente bem como nas potencialidades de uma parceria real e potencialmente eficaz e eficiente.

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Referimo-nos já ao diálogo reflexivo e crítico que, de forma direta ou indireta, o autor enceta com outros pesquisadores cabo-verdianos que trabalharam, num passado remoto ou mais atual, sobre a economia social e solidária, em termos gerais, e os movimentos associativos, em particular. Com efeito, a presente obra vem na esteira dos trabalhos já produzidos, de forma particular nas últimas duas décadas, cabendo apontar os trabalhos de Iolanda Évora (1996), Cláudio Furtado (2002; 2004), José Maria Coelho de Carvalho (2012), Paulo Veríssimo (2012 e 2015) e António Tavares de Jesus (2016). A obra de Jacinto Santos, no entanto, parece ter, a meu ver, a vantagem de recobrir um período histórico mais vasto e assentar-se numa abordagem holística, o que lhe garante a possibilidade de mobilizar uma multiplicidade de determinantes, numa análise eminentemente multidimensional e multicausal.

Aliás, Jacinto Santos não se satisfaz com a reconstrução do movimento coo-perativo e associativo, suas determinantes sócio-históricas, seu peso no pro-cesso de inclusão social dos estratos socioeconomicamente não possidentes, sua função na emergência de uma sociedade civil ainda em construção, mas também as suas debilidades socio-organizacionais, as fragilidades econômi-co-financeiras e gerenciais e as armadilhas das injunções politico-partidá-rias. Antes, numa análise prospetiva, o autor busca as potencialidades para o movimento cooperativo e associativo, os nichos passíveis de serem ocupa-dos, as interlocuções possíveis, tanto a nível interno quanto internacional, enfim, uma inserção econômicamente eficiente e socialmente solidária.

De entre as múltiplas temáticas trabalhadas no livro, gostaria de destacar mais duas que me parecem ser fundamentais para entender algumas das vicissitudes por que passaram os movimentos cooperativo e associativo e a economia social e solidária.

A primeira tem a ver com o ”triunfo” do neoliberalismo político e econô-mico e suas implicações ao nível dos sistemas político e econômico a nivel global. Na sua vertente política, o neoliberalismo traduziu-se no triunfo da democracia liberal, da “sacralização” da democracia representativa e da institucionalização, fundamentalmente ao nível normativo-institucional, do pluralismo político (e menos ideológico) consubstanciado no multipar-tidarismo. Em Cabo Verde, como demonstra a obra, essas transformações impactaram de forma indelével o movimento cooperativo que, pratica-mente, desapareceu nos anos 90. A transformação pela narrativa política dominante à época do movimento cooperativo como um dos “aparelhos

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ideológicos” do regime de partido único levou as organizações cooperativas ao ostracismo e desaparecimento que viria a ter sua concretude normativa e institucional com a extinção da Lei de Bases das Cooperativas e da institui-ção pública de enquadramento e fomento do setor. Ainda do ponto de vista normativo, como bem analisa Jacinto Santos, e da narrativa que o legitima, a economia de mercado é erigida como o setor econômico por excelência, subsumindo nela o terceiro setor.

É verdade, no entanto, sustenta ainda o autor que, de certa forma, o movimento cooperativo ressuscita sob a forma de associações, num impulso essencialmente externo. As experiências da ACDI-VOCA, no âmbito do PL480 e as que se lhe seguiram no quadro dos projetos inscritos no PNLP são disso demonstrativos. Resta saber, no entanto, até que ponto essa (re) emergência de organizações econômicas do terceiro setor constitui, não obstante a sua inscrição no quadro legal e, mesmo, nos documentos formu-ladores de políticas públicas, uma visão efetivamente assumida e não apenas estratégica e contextualmente tolerada.

Na dependência da resposta à questão atrás formulada, a visão prospetiva de Jacinto Santos sustentando a relevância económica e social de primeira ordem da economia social e solidária e que, dificilmente, poderá ser coberta por outros setores da economia, poderá concretizar-se.

A segunda temática que eu gostaria de relevar é a problemática das relações de género no seio dos movimentos cooperativo e associativo apontada in-diciariamente na obra. A participação das mulheres na esfera pública e nos espaços de decisão tem sido, em Cabo Verde, reduzida, não obstante consti-tuir uma reivindicação das organizações de mulheres e também das teóricas feministas cabo-verdianas, e que tem vindo a ecoar de forma crescente na sociedade cabo-verdiana. A obra de Jacinto Santos, baseando-se em outros estudos e inquéritos, mostra a situação paradoxal por que passam as orga-nizações de economia social e solidária cabo-verdianas. De um lado, as mu-lheres constituem a maioria dos membros dessas organizações e, de outro, estão sub-representadas nos órgãos de direção, por conseguinte, de decisão. Na verdade, o eco da equidade de género parece que ainda não ganhou terreno nas organizações de economia social e solidária, a exemplo do que ocorre em outras esferas da vida econômica, política e social cabo-verdiana. O empoderamento das mulheres visando transformar o status quo parece ser uma exigência, o que leva o autor, nas proposições de desenvolvimento e sustentabilidade dessas organizações, a recomendar um eixo estratégico

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específico de intervenção por ele denominado de “governação democrática, participação e género”.

Economia Social e Solidária em Cabo Verde: Génese, entidades, atua-lidade e perspetivas constitui, na minha perspetiva, uma referência bi-bliográfica incontornável para os estudos futuros sobre a economia social e solidária, em geral, e de forma específica sobre o movimento cooperativo e associativo em Cabo Verde. Estou em crer que, para além das temáti-cas em relação às quais Jacinto Santos conclama a necessidade de estudos mais aprofundados e específicos, alguns trabalhos já publicados poderão demandar uma releitura com novos dados e novas análises feitas no livro que neste momento se dá à estampa. Mais ainda, a obra sugere importantes eixos estratégicos que podem ser fundamentais no quadro da formulação das políticas públicas.

Afinal, como já referido, estamos perante a obra de um homem da práxis e um intelectual orgânico.

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LISTA DE SIGLAS

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LISTA DE SIGLAS

ACD – Associação Comunitária de Desenvolvimento

ACDI-VOCA – Agricultural Cooperative Development International/Voluntears in Over-seas Cooperative Assistance

ACRIDES – Associação de Apoio às Crianças Desfavorecidas

ADA – Apoio ao Desenvolvimento Autónomo de Luxemburgo

AGECABO – Agência Caboverdiana de Trabalhos Públicos

CEESE – Associação – Centro de Estudos de Economia Solidária do Atlântico

CIEPAC – Centre International par l’Éducation Permanente et d’Aménagement Concerté

CITI-Habitat – Centro de Inovação em Tecnologias Sociais para o Habitat

CEA – Código de Ética Associativa

CRCV – Constituição da República de Cabo Verde

CRP – Comissão Regional de Parceiros

DECRP – Documento de Estratégia de Crescimento e Redução da Pobreza

ESS – Economia Social e Solidária

FAC – Fundo de Apoio às Cooperativas

FAIMO – Frentes de Alta Intensidade de Mão-de-Obra

FAM-F – Federação das Instituições de Finanças que Operam no Setor de Microfinanças

FAMI-PICOS – Associação de Apoio às Iniciativas de Auto-promoção Familiar

FAO – Fundo das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura

FESDEL-CV – Fórum da Economia Social e Solidária e do Desenvolvimento Económico Local de Cabo Verde

FFM – Fundo Financeiro Municipal

FIDA – Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola

FORPROSA – Projeto de formação em metodologia participativa, financiado pela FAO

IMF – Instituição de Microfinança

INC – Instituto Nacional das Cooperativas

INE – Instituto Nacional de Estatística

INGRH – Instituto Nacional de Gestão dos Recursos Hídricos

INIDA – Instituto Nacional de Investigação e Desenvolvimento Agrário

IPFA – Instituto Panafricano de Formação Cooperativa

IPD – Instituto Panafricano de Desenvolvimento

IUP – Imposto Único sobre o Património

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IVA – Imposto sobre o Valor Acrescentado

LOPE – Lei da Organização Política do Estado

MAHOT – Ministério de Ambiente, Habitação e Ordenamento do Território

ONU – Organização das Nações Unidas

MCA- II – Milennium Challenge Account Cabo Verde – Compact II

MDR – Ministério do Desenvolvimento Rural

MJEDRH – Ministério da Juventude, Emprego e Desenvolvimento dos Recursos Huma-nos

MpD – Movimento para a Democracia

NOVIBOxfam – Holanda

ODS – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável

OIT – Organização Internacional do Trabalho

ONG – Organização Não Governamental

ONU – Organização das Nações Unidas

OSC – Organizações da Sociedade Civil

OSCD – Organizações da Sociedade Civil de Desenvolvimento

PAICV – Partido Africano da Independência de Cabo Verde

PAIGC – Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde

PEA – Provedoria de Ética Associativa

PLPR – Programa de Luta contra a Pobreza no Meio Rural

PNLP – Programa Nacional de Luta contra a Pobreza

PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

POSER – Programa de Oportunidades Económicas Rurais

Red’ANIMAR :Rede das Organizações Promotoras do Desenvolvimento Participativo

REMPE – Regime Especial de Micro e Pequenas Empresas

RMSPS – Rede Mutualista de Proteção Social

SS – Solidarité Socialiste

TOPC – Técnicos em Organização e Promoção Cooperativa

UADC – Universidade Africana para o Desenvolvimento Cooperativo

UCCLA – União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa

UCI – Universidade Cooperativa Internacional

UNTC-CS – União Nacional dos Trabalhadores Caboverdianos – Central Sindical

UPI – Unidade de Produção Informal

USAID – Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional

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Jacinto Santos em sessão de animação em Achada Ponta Santiago, Cabo Verde 1984

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INTRODUÇÃO

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ECONOMIA SOCIAL E SOLIDÁRIA EM CABO VERDE:Génese, entidades, atualidade e perspetivas

InTroDução

O presente trabalho tem por finalidade contextualizar o surgimento das diversas entidades, organizações e práticas que integram a Economia Social e Solidária – ESS - em Cabo Verde, fornecendo algumas informações pertinentes e uma abordagem que possam servir para o aprofundamento da reflexão sobre a problemática do associativismo de fim não lucrativo, à luz da nossa “ praxis”, dos textos constitucionais e jurídicos e das fontes diversas, nomeadamente bibliografias pertinentes, artigos e estudos sobre a evolução do conceito da ESS, nas suas diversas dimensões, contextos e perspetivas.

A ESS, não sendo um conceito rígido, pode ser analisada em várias perspetivas, desde um ponto de vista ideológico, como no que se refere aos modelos de desenvolvimento em que se inserem as suas diversas entidades, organizações e práticas, bem como ao estádio de desenvolvimento económico e social de cada sociedade.

Devido à importância crescente da ESS no mundo, e, tendo em conta as crises sistémicas do capitalismo de mercado autorregulado, as Organizações das Nações Unidas(ONU) definiram a Economia Social e Solidária como um “desafio do desenvolvimento sustentado”, elencando 8 domínios relevantes para a sua intervenção, a saber:

“1.Transição da economia informal para o trabalho decente; 2. Ecologização da economia e da sociedade; 3. Desenvolvimento económico local; 4. Cidades e assentamentos urbanos sustentáveis; 5. Bem-estar e empoderamento das mulheres; 6. Segurança alimentar e empoderamento dos pequenos agricultores;7.Cobertura sanitária universal e 8. Finanças solidárias.”2

“Contudo, no contexto dos países em desenvolvimento da África, América Latina e, em grande parte da Ásia, as experiências de produção coletiva necessitaram de adaptações teóricas e práticas, levando à afirmação de que nestas regiões há uma terceira corrente da Economia Social e Solidária que é

2 ONU – La Economía Social y Solidária y el Reto del Desarrollo Sostenible : un documento de posición elaborado por el Grupo de Trabajo Interinstitucional de las Naciones Unidas, no âmbito, no âmbito da preção da Assembleia da ONU sobre os ODS e a Agenda 2030. (documento acessado na Internet, em 14.02.2014).

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composta por Políticas Públicas de inclusão social e económica. Esta corrente específica para os países em desenvolvimento busca a autonomia teórica e prática, necessitando convergir as experiências práticas e teóricas destas regiões. No entanto, as políticas públicas não podem agir isoladamente, necessitando de um diálogo permanente para planejamento e execução destas políticas, criando um referencial teórico”3,

Impondo que o Estado intervenha na sua dupla condição de regula-dor e de ator do processo de desenvolvimento.

Em Cabo Verde, a abordagem da ESS na sua relação com as políticas públicas é ainda uma realidade incipiente, mas está, largamente, respaldada na Constituição, num leque considerável de leis e numa “praxis” que lhe dá conteúdo e alcance social. Efetivamente, a Constituição define que uma das tarefas fundamentais do Estado é:

“Incentivar a solidariedade social, a organização autónoma da sociedade civil, o mérito, a iniciativa e a criatividade individual” (Art. 7. al.f ). p.26).

Decorre da Constituição, uma partilha de responsabilidades entre o Estado e a Sociedade Civil Organizada na:

“Promoção do bem-estar e a qualidade de vida do povo cabo-verdiano, designadamente os mais carenciados e remover progressivamente os obstáculos de natureza económica, social, cultural e política que impedem a real igualdade de oportunidades entre os cidadãos, especialmente os factores de discriminação da mulher na família e na sociedade.”

O presente trabalho, surge,também,no momento em que se regista um novo “olhar” sobre o papel da Economia Social e Solidária na construção de um modelo de desenvolvimento, assente numa economia cada vez mais plural, inclusiva, sustentada e solidária, que reforce a cidadania e a democracia participativa no controlo social das políticas públicas, com vista à coprodução do bem público, tendo como quadro de referência principal a efetivação dos direitos humanos em todas as suas vertentes.

3 Nota Conceitual do Iº Congresso de Economia Social e Solidária, realizado na Cidade da Praia, de 5 a 7 de Maio de 2016.

Introdução

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ECONOMIA SOCIAL E SOLIDÁRIA EM CABO VERDE:Génese, entidades, atualidade e perspetivas

Na realização deste trabalho, uma espécie do estado de arte resu-mida sobre a ESS em Cabo Verde, o autor tomou como ponto de referência, o período de 1975, ano de ascensão de Cabo Verde à In-dependência e do início da construção do Estado de Cabo Verde e o ano 1991, ano da instalação do Estado de Direito Democrático e da implementação da economia de mercado, ainda em processo de desenvolvimento.Esta contextualização torna-se pertinente pelo facto de nos permitir analisar o associativismo institucionalizado no quadro do regime de Partido Único, e o mesmo fenómeno no qua-dro do regime democrático, partes integrantes do nosso processo de desenvolvimento nesses 41 anos de Independência.

A preocupação principal é informar aos que se interessam por esta problemática, bem como suscitar reflexões e leituras sobre a génese e a evolução do associativismo de fim não lucrativo em Cabo Verde, do ponto de vista do seu enquadramento constitucional, da sua orga-nização e intervenção no processo de desenvolvimento do país, bem como do seu alcance social na vida das pessoas e das comunidades locais, economicamente mais desfavorecidas.

Pretende-se, ainda, contribuir para o registo de uma prática social, parte ativa da nossa memória coletiva, que carece de uma sistemati-zação – construção do conhecimento – apesar da existência de vários estudos levados a cabo.

Os dados recolhidos e tratados, constituindo o significado e a signifi-cação do fenómeno associativo de fim não lucrativo em Cabo Verde e, ainda, pelo debate de que é objeto a nível político e partidário e na sociedade, são reveladores de que se está em presença de uma realidade social, com dinâmica própria, a qual milhares de cabo-ver-dianos têm utilizado nas suas lutas pela sobrevivência e pela mobili-dade social ascendente.

Apesar de muitas fragilidades de que padece, assim como o país, a realidade associativa de fim não lucrativo é incontornável na vida das pessoas e nas atividades e/ou opções de desenvolvimento, independentemente da forma como é percecionada e inserida nessas opções. Trata-se de um ganho coletivo cujo papel terá que estar em sintonia com os grandes objetivos de desenvolvimento de Cabo Verde e os do Desenvolvimento Sustentável do Planeta (ODS).

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