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AFFONSO PENNA E O ENGRANDECIMENTO MINEIRO:
INSTRUO PROFISSIONAL E IDERIO REPUBLICANO (1874-1906)
Autor: Brbara Braga Penido Lima, mestre em Educao Tecnolgica/CEFET/MG
Resumo:
Ao reconstituir a trajetria profissional e intelectual do poltico Affonso Penna, entre1874 e 1906,
este trabalho busca discutir os repertrios de seus discursos, relacionados organizao do ensino
profissional em Minas Gerais, com objetivo de alcanar o engrandecimento mineiro. Pretende
compreender o horizonte de expectativas referente s noes de progresso associadas a um
projeto de modernidade, segundo as perspectivas de Affonso Penna sobre os programasde
instruo pblica que procurava instituir no Estado, utilizados como argumentos polticos para
atingir o desenvolvimento econmico e social, com destaque para o perodo entre 1891 e 1906.
Palavras-chave: Affonso Penna, Instruo Profissional, Progresso Mineiro
rea temtica: 1. Histria Econmica ou Demografia Histrica.
AFFONSO PENNA E OS REPERTRIOS DO ENGRANDECIMENTO MINEIRO:
INSTRUO PROFISSIONAL, FERROVIA E
IDERIO REPUBLICANO (1874-1906)1
Affonso Augusto Moreira Penna
Respeitado como uma das figuras polticas eminentes de sua poca (CARVALHO,
2013:44), Affonso Augusto Moreira Penna2 nasceu em 30 novembro de 1847, na cidade de Santa
Brbara do Mato Dentro3, Minas Gerais. O stimo dos doze filhos do imigrante portugus
transmontano Domingos Teixeira, natural de So Salvador da Ribeira de Penna, e filho
primognito de Ana Moreira Teixeira Penna, esposa de suas segundas npcias, foi criado para
seguir os passos de seu pai, tornar-se fazendeiro e minerador (GUEDES, 1977:09). Domingos foi
Major da Guarda Nacional (VALADARES, 1978) e possuidor de grande nmero de escravos.
Envolveu-se com a poltica da regio, ligando-se ao potentado local por meio do matrimnio com
Ana Moreira. Sua esposa vinha de uma importante famlia, detentora do controle poltico sobre a
cidade de Santa Brbara (LACOMBE, 1986:10).
A famlia de Affonso Penna, desse modo, integrava, juntamente com outros importantes
troncos familiares mineiros, uma rede de parentesco que detinha o poder poltico-econmico em
Minas Gerais. Cid Rebelo Horta afirmou que a histria poltica mineira se relaciona histria de
suas grandes famlias, que fazem o jogo da cena poltica desde a Colnia (HORTA,1956:59).
Constituram uma verdadeira cadeia de crculos familiares, ou parentelas, cujos membros ora se
sucedem nas tarefas de chefia local e regional, ora se alternam. a constelao governamental de
Minas Gerais (HORTA, 1956:59). O casamento entre membros provenientes das elites4,
polticas e/ou agrrias, permitia obter o suporte necessrio s candidaturas polticas e ao
preenchimento de vagas na administrao pblica e, concomitantemente, possibilitava estabelecer
e expandir uma rede de relaes no poder poltico e na administrao pblica (CANDO, 2011).
Ao fazer a genealogia da poltica mineira, Rebelo Horta demonstrou que 33 dos 55
Presidentes da Provncia e 80% dos governadores republicanos pertenceram a esses troncos
familiares (HORTA, 1956). As famlias governamentais constituam uma oligarquia bem
estruturada, segundo regras claramente definidas, o que permitiu sua sobrevivncia na ocupao
de cargos da administrao pblica, apesar da mudana de regime poltico encetada a partir de
1889. Affonso Penna, ento, participava de uma tradicional dinastia poltica, os Ribeiro-Oliveira-
Pena, que surgiu no cenrio da Assembleia Provincial e na Cmara Geral nas primeiras dcadas
do sculo XIX. Durante o perodo Imperial, Rebelo Horta apontou que mais de duas dezenas de
membros deste tronco familiar ingressaram nas cmaras polticas (HORTA, 1956:74).
1Este texto um dos resultados da pesquisa da pesquisa de mestrado de Brbara B. P. Lima, intitulada Affonso
Penna e os repertrios do engrandecimento mineiro: instruo profissional, ferrovia e iderio republicano (1874-
1906), realizada no Programa de Ps-Graduao de Mestrado em Educao Tecnolgica do Centro Federal de
Educao Tecnolgica de Minas Gerais (CEFET-MG), sob orientao do Prof. Dr. Irlen Antnio Gonalves e co-
orientao do Prof. Dr. James William Goodwin Jr. 2O nome do poltico Affonso Penna tem sido grafado com apenas uma letra f e uma letra n ou com apenas uma letra f
e duas letras n. Ao observar sua assinatura no Caraa e na Tese de Doutorado na Faculdade de Direito do Largo de
So Paulo, percebi que sua assinatura constava com duas letras f e duas letras n, sendo esta a grafia de seu nome
mantida ao longo deste trabalho. 3 Atual municpio de Santa Brbara.
4O conceito de elites, formulado por Jos Murilo de Carvalho (2013:17) refere-se aos grupos especiais de elite,
marcados por caractersticas que os distinguem tanto das massas como de outros grupos de elites, de acordo com o
critrio de posio. Sob perspectiva semelhante, Claudia Viscardi (2012) definiu as elites polticas mineiras segundo
os indivduos que ocupavam cargos no Executivo e no Legislativo estadual e federal na Primeira Repblica. Para
Otavio Dulci, a elite poltica e a elite agrria remontam a uma estrutura socioeconmica tradicional, em que
predominavam as atividades rurais (1999:107). Neste trabalho, o conceito de elite ser utilizado para designar os
ocupantes dos cargos na administrao pblica no cenrio mineiro e nacional.
O talento para as letras, percebido pelos primeiros preceptores, foi acentuado durante os
anos que estudou no Colgio e Seminrio do Caraa, onde iniciara seus estudos aos 12 anos,
junto com seus irmos, em 1859, sob a matrcula de nmero 1495. Em 1866, dirigiu-se cidade
de So Paulo para cursar direito na Faculdade de Direito de So Paulo, localizada no Largo de
So Francisco. De sua turma, quatro personalidades se destacaram na vida poltica e literria do
Brasil: Rui Barbosa, Joaquim Nabuco, Castro Alves e Rodrigues Alves (GUEDES, 1977:26). A
inaugurao da Academia de Direito, em 01 de maro de 1828, assim como da Academia de
Direito de Olinda, fundada no mesmo ano, tinha por objetivo conformar quadros autnomos de
atuao e de criar uma intelligentsia local destinada a ingressar, futuramente, nos quadros da
administrao pblica (SCHWARCZ, 2012:185)6. No Brasil, assim como em quaisquer naes
recm constitudas, havia necessidade de formar a elite que comandaria o pas. O perfil e o modo
de formao dessa elite, bacharelesca e humanstica, foi uma das influncias que a herana
burocrtica portuguesa legou elite nacional (HOLANDA, 2013).
poca, dois movimentos ocuparam o primeiro plano do debate poltico nacional: o
abolicionismo e o republicanismo. Affonso Penna comprometeu-se com o primeiro e recusou o
segundo. O estudante se recusou a assinar o Manifesto Republicano de 1870, por achar que o pas
ainda no estava culturalmente preparado para uma mudana de regime.Como parte dos demais
polticos da poca, percebia no povo brasileiro a falta de educao necessria para participar de
um governo republicano (VISCARDI, 2015:4028-4030). Importa destacar que seu pensamento
abolicionista era bastante complexo, ao considerar que a manumisso imediata acarretasse em
danos econmicos irreversveis para os proprietrios. Isto posto, colocava-se a favor de
indenizao aps a abolio e da imigrao como alternativa mais eficiente para substituio da
mo de obra. Para Claudia Viscardi, esse posicionamento se aproximava ao de muitos outros
polticos, especialmente os conservadores, responsveis pelo progressivo atraso do fim da
escravido (VISCARDI, 2015:4030).
Affonso Penna, formado em 1870, colou grau com Bias Fortes, Francisco de Assis
Tavares, Tom Pires de vila e Rui Barbosa. No ano seguinte defendeu sua tese de
doutoramento, sendo o nico aluno a defender tese sobre letra de cmbio7. Se considerarmos
5 Situado no trecho da Serra do Espinhao, prximo cidade de Santa Brbara, o Colgio do Caraa foi fundado pela
Congregao Lazarista em 1820 e fechado em 1912, e seu ensino enfatizava as humanidades. Considerado como
uma casa de excelncia para formao de jovens, representava um modus operandi de formao da juventude
abastada que a ele recorria, a elite mineira e brasileira (ANDRADE, 2000). Segundo Mariza Guerra de Andrade
(2000), a instituio de ensino tinha por objetivo moldar o carter, estruturar a personalidade e incutir a f e os
valores cristos afora o ensino das humanidades e de cultura geral. Para a autora, o colgio buscava produzir
sujeitos com competncias e sensibilidades necessrias atuao na manuteno e reproduo da ordem social.
Logo, a promoo social, provocada por meio da educao humanstica ministrada pelo colgio, significava uma
maneira de diferenciao e de destaque cuja finalidade seria assumir a responsabilidade da direo poltica, social e
espiritual da sociedade (ANDRADE, 2000). 6Conforme Lilia Moritz Schwarcz, as academias de direito foram empreendimentos cuja responsabilidade era
desenvolver um pensamento prprio e promover nao uma nova constituio. Foram criadas com a aprovao do
projeto de 31 de agosto de 1826 (convertido em Lei em 11 de agosto de 1827), que versava sobre a instituio de
dois centros de estudos de direito no pas. Segundo a au