Ainda sobre Vigílio

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  • 8/9/2019 Ainda sobre Viglio

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    Ainda sobre Viglio

    Viglio procedia de uma nobre famlia romana, e tinha sido ordenado dicono porBonifcio II, que queria que fosse o seu sucessor. Contudo, a nomeao foi anuladapelo prprio Bonifcio por ser contrria aos cnones.

    "Em 535 ou 536, Viglio foi enviado por Agapito I, sucessor de Bonifcio II, aConstantinopla como seu representante perante a corte imperial. A imperatrizTeodora tratou de ganh-lo como aliado, para vingar a deposio do patriarcamonofisita Antimo de Constantinopla por Agapito, e tambm para obter ajuda emseus esforos a favor dos monofisitas. Diz-se que Viglio esteve de acordo com osplanos da ambiciosa imperatriz, que lhe prometeu a sede papal e uma grande somade dinheiro (700 libras de ouro). Depois da morte de Agapito a 22 de Abril de 536,Viglio voltou a Roma equipado com cartas da corte imperial e com dinheiro.Entretanto, Silvrio tinha sido feito papa por influncia do rei dos godos. Poucodepois o comandante bizantino Belisrio ocupou com tropas a cidade de Roma, aqual foi porm novamente sitiada pelos godos. Viglio deu a Belisrio as cartas dacorte de Constantinopla, as quais recomendavam o prprio Viglio para a sedepapal. Falsas acusaes fizeram ento que Belisrio depusesse Silvrio. Devido presso exercida pelo comandante bizantino, Viglio foi eleito papa em lugar deSilvrio e consagrado e entronizado a 29 de Maro de 537. Viglio fez com que oinjustamente deposto Silvrio fosse posto sob o seu cuidado, onde o antigo paparapidamente morreu por causa do rude tratamento recebido. Depois da morte doseu predecessor, Viglio foi reconhecido como papa por toda a clerezia romana."(Catholic Encyclopedia, s.v. "Vigilius, Pope").

    Viglio no somente procedeu da maneira mais ruim contra Silvrio, masrapidamente se esqueceu do seu compromisso com a imperatriz, a quem devia ocargo, e no fez absolutamente nada para restaurar Antimo nem a favor domonofisismo. Em contrapartida, se dedicou activamente a consolidar o seu podermetendo o nariz em dioceses alheias.

    Em 540 lembrou-se do assunto, e escreveu ao imperador e ao patriarca Menas deConstantinopla cartas onde sustentava a ortodoxia de feso e Calcednia.

    Quando o imperador, a pedido do bispo Teodoro Askidas de Cesareia na Capadcia,condenou trs telogos antioquenos (os "trs captulos") provavelmente paraganhar a simpatia dos monofisitas, exigiu que os bispos do Oriente e Ocidentesubscrevessem a condenao. Viglio se negou, e como resposta o imperador o fezcomparecer perante a corte em Bizncio. Enquanto era levado para o navio que oaguardava no Tibre, muitos o acompanharam atirando-lhe pedras e lixo, enquanto

    gritavam: "Leva a fome, leva a morte! Mal fizeste aos romanos; o mal sejacontigo!".

    Viglio chegou finalmente a Constantinopla aps uma prolongada estadia na Siclia em finais de 546 ou princpios de 547. Embora fosse um prisioneiro na corte,nenhuma das fontes consultadas diz que tivesse sido objecto de tortura. Pelocontrrio, ps-se sua disposio uma residncia na casa Placidiana. Opunha-se acondenar os "trs captulos" porque sabia que isso lhe traria srios inconvenientesno Ocidente, mas ao mesmo tempo devia o seu bispado ao poder imperial e no seencontrava em condies de resistir vontade de Justiniano.

    Aps muitas idas e voltas, admitiu condenar os "trs captulos" enquanto

    sustentava as decises de Calcednia, no seu Iudicatum de 548. Com isto evidente que queria ficar bem tanto com os bispos gregos e com o imperador, paraque o devolvesse sua sede, como com os seus pares ocidentais.

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    Contudo, os bispos do Ocidente no morderam o anzol, e reagiram em massa,considerando-o como herege. Um snodo de Cartago, presidido pelo bispo dessacidade, Reparatum, excomungou Viglio em 550 e o excluiu da Igreja catlica atque se arrependesse formalmente.

    Perante esta reaco generalizada, o papa Viglio se retratou de seu Iudicatum eapelou a um conclio ecumnico, com representao equitativa de bispos ocidentaise orientais, solicitando aos gregos que no emitissem juzo at celebrao dosnodo.

    Isto causou a ira de Justiniano, que reiterou a condenao dos "trs captulos"noutro decreto de 551. Viglio protestou e, temeroso do imperador, se refugiounuma igreja, onde permaneceu at que se lhe garantiu a sua segurana e a suaantiga residncia. No entanto, dava-se conta da volatilidade da sua situao, demodo que fugiu para Calcednia, onde se refugiou em Santa Eufmia (onde tinhareunido o conclio de 451). Recusou-se tenazmente a voltar a Bizncio, apesar dasordens de Justiniano.

    Ento o imperador retirou o seu decreto e convocou um conclio ecumnico, o II deConstantinopla. Apesar de Viglio ter comprometido a sua participao, se negou aconcorrer. Em vez disso, junto com dezasseis bispos, em 553 condenou nodocumento Constitutum sessenta proposies de Teodoro de Mopsustia, masproibiu a condenao de Teodoreto e Ibas.

    No sculo VI podia haver conclio ecumnico com bispo de Roma ou sem ele. "Sema sua presena e, apesar do seu protesto, inaugurou o patriarca Eutquio o conclio o segundo de Constantinopla - a 5 de Maio na sacristia da igreja episcopal, empresena de 150 bispos. Cento e sessenta e quatro bispos subscreveram a oitava

    sesso, de encerramento, a 2 de Junho de 553." (Hubert Jedin, S.I., Breve historiade los concilios. Barcelona: Herder, 1963; p. 39).

    Contra a opinio de Viglio, o Concilio condenou os "trs captulos" e de passagemacusou Viglio de nestorianismo e o condenou ao desterro. "O seu nome foi apagadodos registos dos bispos, dpticos das igrejas e documentos oficiais." (JavierGonzaga: Concilios. Grand Rapids: International Publications, 1965, 1:213).

    Perante o fracasso de todas as suas cartas, e em finais de 553, aps seis meses deexlio, Viglio acatou a deciso conciliar: Num novo Constitutum condenoufinalmente os "trs captulos" e reconheceu as resolues do recente conclio deConstantinopla. Pouco depois, em 554, escreveu a Eutquio que ele, Viglio, "tinha

    sido um instrumento nas mos de Satans, que trabalha para destruir a Igreja eassim se separou de seus colegas, mas finalmente tinha sido iluminado por Deus".

    Como disse antes: De Viglio pode dizer-se com justa razo que os seuscontemporneos, primeiro do Ocidente e depois do Oriente, o tiveram porherege. Os seus avanos e recuos no terreno doutrinal o tornavam extremamenteinepto como mestre e pastor supremo da cristandade (ideia que, suspeito, teriaresultado ento igualmente ridcula tanto aos bispos do Oriente como aos doOcidente).

    Acrescento agora que usurpou o seu bispado (facto interessante para quem crna "sucesso apostlica ininterrupta"), atraioou at os seus seguidores, e para

    obter a sua restaurao teve que submeter-se total e incondicionalmente a umconclio ecumnico que o tinha condenado. Quo diferente da actual doutrina

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    romana de que os ensinamentos do papa so irreformveis em si e no peloconsentimento da igreja!