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FACULDADE DE ECONOMIA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA Licenciatura em Sociologia Algumas Lateralidades Sociais das Forças Armadas em Portugal Realizado no âmbito da disciplina de Fontes de Informação Sociológica Coimbra, Julho de 2003 Tiago Ribeiro 20021995

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FACULDADE DE ECONOMIA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA

Licenciatura em Sociologia

Algumas Lateralidades Sociais das

Forças Armadas em Portugal

Realizado no âmbito da disciplina de

Fontes de Informação Sociológica

Coimbra, Julho de 2003

Tiago Ribeiro

20021995

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Índice

Introdução _________________________________________________________ 1

1. Estado das artes

1.1. Ameaças externas e identidade nacional _______________________________ 2

1.2. Enquadramento futuro das Forças Armadas ____________________________ 7

1.3. Recrutamento militar e democraticidade ______________________________ 11

2. Desenvolvimento da pesquisa ________________________________________ 15

3. Ficha de leitura ___________________________________________________ 17

4. Avaliação de uma página da Web _____________________________________ 22

Conclusão _________________________________________________________ 24

Referências Bibliográficas _____________________________________________ 25

Declaração de objecção de consciência perante o serviço militar ___________ anexo I

Declaração abonatória ____________________________________________ anexo II

Capítulo “Os três tempos simbólicos da relação entre as Forças Armadas

e a sociedade portuguesa” de O Estado e a Sociedade em Portugal (1977-

1988) de Boaventura de Sousa Santos (1992) - fotocopiado ______________ anexo III

Página do Ministério da Defesa Nacional ____________________________ anexo IV

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Introdução

O presente trabalho tem como objecto de análise as Forças Armadas em

Portugal. Nesse sentido, a pertinência sociológica da sua abordagem provem da forma

como tenta interpretá-las à luz da sua interacção com a sociedade. Daí que constituam

“lateralidades sociais”, na medida em que a sua dimensão social não se esgota na

amplitude das Forças Armadas, mas por elas é traduzida, e por elas apreende o sentido

atribuído ao poder militar.

Para tentar dar conta do estado das artes, procuro centrar o trabalho em três

problemáticas: a intensidade do sentimento identitário português como condicionante da

atitude social perante as Forças Armadas, a par da forma como a sua relação com a

percepção de ameaça nacional lhes atribui legitimidade social; o enquadramento futuro

das Foças Armadas, onde se procura distinguir diferentes sensibilidades acerca das

preocupações que perpassam no seu âmbito; e, finalmente, o recrutamento militar e

democraticidade, em que se esboça uma análise e interpretação dos variados factores

que se manifestam prementemente na fase do recrutamento militar, que poderão

reproduzir ou fragilizar a tentativa de democratização das Forças Armadas, no seu

contacto com a sociedade civil.

O trabalho contempla ainda uma ficha de leitura, do capítulo “”Os três tempos

simbólicos da relação entre as Forças Armadas e a sociedade portuguesa” do livro O

Estado e a sociedade em Portugal (1974-1988) de Boaventura de Sousa Santos (1992),

que diferencia três naturezas distintas das Forças Armadas em Portugal, com base em

processos de transformação social interna, que influíram no modelo em que se

constituíram e o que efectivamente significaram para a sociedade, no século XX.

Finalmente, avalio o site do Ministério da Defesa Nacional, procurando analisar

as suas várias vertentes, ao nível da informação veiculada, públicos, e ainda marcas

ideológicas e imagéticas que dele fazem parte.

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Algumas Lateralidades Sociais das Forças Armadas em Portugal

1. Estado das artes

1.1. Ameaças externas e identidade nacional

"Dois grandes factores afectam as atitudes dos cidadãos face às Forças Armadas:

o sentimento de identidade nacional e a percepção das ameaças externas1 que impendem

sobre a comunidade." (Matos e Bacalhau, 2001: 23) É precisamente na forma como se

desenvolvem em conjunto a identidade nacional e a percepção de uma capacidade

externa que se tenciona aplicar e que, enquanto existe, constitui um risco (Loureiro dos

Santos apud Martelo, 1997: 129) que foi ganhando expressão e sentido a existência das

Forças Armadas, enquanto extensão de um Estado contemporâneo que reinvindica "para

si mesmo, com êxito, o monopólio de violência física legítima" (Weber apud Marques,

1999: 9). Caminhando recíproca e conjugadamente, a intensidade do sentimento

identitário português, enquanto "poderoso factor de integração social" que "reforça

particularmente as atitudes positivas perante a instituição castrense" (Matos e Bacalhau,

2001: 23), tanto mais se fortalece quanto mais é afectado por uma percepção colectiva

de ameaças externas, que adquirirá, segundo P. Huntington, uma forte preponderância

na dinâmica do Estado-Nação: "Os Estados, acima de tudo, respondem a ameaças

percebidas como ameaças." (apud Matos e Bacalhau, 2001: 23) Por conseguinte, a

consolidação deste sistema de relações, atitudes e reacções perante a fragilidade ou

afirmação nacional estará na base da legitimação das Forças Armadas, segundo o

pretenso consenso do "interesse nacional":

“No nosso país, à semelhança de todas as democracias, consideram-se as

Forças Armadas uma instituição fundamental do Estado ao ser tida como garante da sua

segurança e instrumento imprescindível da sua afirmação externa. Trata-se de uma força

pública não no interesse particular daqueles a quem é confiada, mas sim no interesse de

todos os cidadãos, logo a inserção das Forças Armadas na Administração-Geral do

Estado e a sua inequívoca subordinação ao poder político.” (Baltazar, 2000: 12)

O sentimento e expressão da nacionalidade adquire significados e profundidade

diferenciados, de acordo com a heterogeneidade da sociedade portuguesa. Para prová-lo

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1 “A Lei n.º 29/82, de 11 de Dezembro, Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, define que a

missão genérica das Forças Armadas consiste em assegurar a defesa militar contra qualquer agressão ou

ameaça externas.” (Carrilho, 1991: 121)

é possível analisar o estudo efectuado por Luís Salgado de Matos e Mário Bacalhau

relativamente ao "orgulho de ser português". A ambivalência desse sentimento pátrio,

apesar de assimétrica, é antecipada desde logo: "Um pouco mais de metade dos

inquiridos atribuía-se a nota máxima no orgulho de ser português. Só menos de um em

cada cem se autoposiciona na categoria diametralmente oposta, e não tem nisso nenhum

orgulho." (2001: 24) Como possíveis factores sociais que motivariam posições variadas

acerca do "ser-se orgulhosamente português" são destacados a origem de classe do

inquirido, a sua naturalidade regional, o grau de ensino e a qualidade da informação

acerca das Forças Armadas. No entanto, esta última estará manifestamente sujeita a uma

interpretação pervertida: sendo os inquiridos os próprios a qualificarem a sua

informação, verifica-se que "sendo boa, reforça a identidade nacional; sendo má ou

insuficiente, enfraquece-a." (2001: 26) Ora, a articulação entre as duas variáveis em

estudo (conhecimento e sentimento) poderá levar a que se perca o limite de cada uma:

será que o sentimento identitário não influirá na opinião do inquirido acerca da sua

informação sobre as Forças Armadas? Mas decerto que a tenuidade do sentimento

nacional poderá provocar um desinteresse deliberado pela informação respeitante às

Forças Armadas.

Outras variáveis são ainda discriminados, nomeadamente a dimensão das

cidades onde os inquiridos residem, o cumprimento ou não do Serviço Militar

Obrigatório (SMO) (ligeiramente associado, quando cumprido, a um aumento do

orgulho nacional), assim como um contacto mais alargado com os meios de

comunicação social. "As diferenças na valoração do orgulho de ser português

determinadas pela idade e pelo sexo são estatisticamente insignificantes." (2001: 27)

Mas mais do que apreender a homologia estatística entre homem e mulher, adquire

maior pertinência sociológica a eventual distinção conceptual que poderá existir entre o

universo identitário nacional do homem associado às Forças Armadas, e o da mulher, de

onde por muito tempo foi excluída e de que, portanto, não faria parte.

Na análise retrospectiva relativamente à acuidade do sentimento identitário é

manifesto que, de 1988 até 1999, se verificaram alterações ao nível do sentimento

nacional mais extremado:

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“É reduzida a variação temporal nas categorias do orgulho de ser português. A

que existe, porém, vai no sentido da diminuição do «muito» orgulho e do aumento do

orgulho. Aquela diminuição tem significado estatístico e este aumento é desprovido

dele. Ignoramos se aquele decréscimo significa o começo de uma lenta alteração no

sentido da diminuição do orgulho.” (Matos e Bacalhau, 2001: 31)

No que diz respeito ao contexto de ameaça nacional como pretexto justificativo

das Forças Armadas, uma crise de legitimação poderá estar presente:

“No que toca ao presente, predomina pois nitidamente a ausência de ameaças

externas: apenas um décimo dos inquiridos considera que havia à data do inquérito uma

ameaça externa à segurança de Portugal; mais de dois terços são taxativos ao afirmarem

que não. São valores praticamente idênticos aos dos espanhóis.” (2001: 32)

A descrença tendencialmente generalizada na possibilidade de conflitos

localizados que envolvam as Forças Armadas portuguesas de forma directa e exclusiva

poderá constituir um elemento de dissipação da legitimidade das Forças Armadas, no

que diz respeito à sua vocação até então instituída, pois “se a guerra se tornou irreal para

os cidadãos das democracias modernas, preocupar-se-ão eles em limitar e controlar a

violência que é exercida em seu nome?” (Iguatieff apud Pureza, 2001: 99)

Simultaneamente, uma outra realidade associada à defesa nacional poderá perturbar a

consciência directa de ameaça nacional por parte dos cidadãos remetida para o exercício

funcional das Forças Armadas:

“A guerra desempenhou sempre um papel importante na política, mas a sua

natureza tem mudado imenso ao longo dos anos. Com o desenvolvimento da sociedade

moderna, ocorreu um processo de industrialização da guerra.” (Giddens, 2002: 437)

Ora, este processo de industrialização da guerra ganhará também incidência na

correlação Guerra – Forças Armadas, o que constituirá, de alguma forma, um processo

de desfasamento entre o conceito incorporado de ameaça nacional e a sua compostura

com a indústria bélica que alterará as "regras do jogo", descaracterizando desde logo a

percepção imediata de ameaça nacional enquanto condição exclusiva de legitimação das

Forças Armadas.

“O debate sobre a existência, a legalidade estatutária ou o aspecto moral do

recurso às empresas militares privadas (EMP’s), bem como as suas acções concretas,

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tem privilegiado as perspectivas ético-jurídicas. Consequentemente, têm sido

desvalorizados aspectos subjacentes fundamentais à percepção contextualizada do

fenómeno, retirando, designadamente, objectividade analítica à avaliação do impacto

estratégico, do significado societal, das alterações de atitude e de comportamento dos

actores, que transcendem, inequivocamente, o plano estratégico-militar.” (Marques dos

Santos, 2001: 89)

É exactamente essa transcendência que, não sendo ponderada ou

negligenciando-se sem lhe atribuir a devida centralidade, que não pode deixar de ser

avaliada, sob o risco incalculável de consensualização descurada, assim evidente:

“Assim, tradicionalmente, a razão de ser das Forças Armadas tem sido a de

conferir segurança a determinada sociedade. De um modelo inicialmente misto,

incluindo funções de manutenção da ordem pública e funções de defesa militar perante

ameaças externas evoluiu-se, ao longo deste século, para esta segunda definição, ou

seja, as Forças Armadas deixaram de desempenhar tarefas do tipo judicial para

passarem a desempenhar tarefas de defesa perante ameaças externas, atingindo, assim,

legitimação muito mais vasta e incontroversa.” (Carrilho, 1994: 72)

Com desenvolvimento de uma indústria armamentista aliada a um percurso de

internacionalização, a transferência indirecta da soberania das Forças Armadas à escala

supranacional poderá vir a constituir também um sistema de deslegitimação,

manifestamente ausente de incontrovérsias. A lógica empresarial que poderá presidir às

estratégias das Forças Armadas poderá, em si, recriar e inculcar "o desejo de segurança

a todo o custo" (Ross apud Fiévet, 1992: 230) que perverterá o conceito estritamente

definido de ameaça nacional.

Convém, todavia, não deixar de referir que resistem, de qualquer forma, vários

factores que afectam a percepção da ameaça presente, distinguidos sob o mesmo

enquadramento estatístico elaborado acerca da identidade nacional. Segundo Luís de

Matos e Mário Bacalhau, a proximidade fronteiriça e a residência em arquipélagos

constituem, pela situação convencional e geograficamente limite, espaços de maior

intensidade do sentimento de ameaça presente. O sexo feminino, tendencialmente mais

afectado, as diferenciações segundo o grau de instrução, a idade (com valores mais

acentuados entre os 18 e os 24, bem como entre os 45 e 64), a posição perante a

actividade económica, a classe, o contacto com os meios de comunicação social (que

faz aumentar o sentimento de risco de ameaça nacional), a informação e o cumprimento

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do SMO, constarão igualmente como factores condicionadores da percepção de ameaça

Nacional. (2001: 35-36)

Relativamente à ideia e percepção de ameaça futura, delineando-se em função

das expectativas tidas para o presente, é possível verificar que essa realidade acarreta

consigo outras questões fundamentais, provindo dessa cognição a opinião acerca das

Forças Armadas no futuro.

“Com efeito, os valores que prevêem ameaças iguais correlacionam-se

positivamente com a concordância em abolir o SMO, com o valor do salário médio do

soldado, com a afirmação de que Portugal não pode existir sem Forças Armadas

próprias, com a melhoria da sua eficácia e com o orgulho de ser português.

[...]

Quem prevê uma alteração do quadro de ameaças, deve racionalmente requerer

uma alteração do actual comportamento da defesa: mais meios, se previr ameaças

maiores; menos meios se as ameaças forem menores. Sendo assim, as correlações

deverão ser negativas.

Com efeito, as ameaças maiores correlacionam-se negativamente com todos os

factores considerados, excepto dois: a concordância com o SMO e o orgulho de ser

português.” (2001: 42)

É portanto evidente que todo o imaginário social associado às Forças Armadas

enquanto instituição legitimada terá por base um sistema de representações políticas e

sociais acerca do futuro e da circunstância em que ele ocorresse. Há, no entanto, ainda a

necessidade de repensar a forma como o estudo caracterizado transporta perdas

sociológicas consideráveis: o princípio de que a opinião acerca de questões externas tem

como inevitabilidade intermediária a presença das Forças Armadas, a tentativa de

codificação das reacções à instituição segundo um modelo quantitativo

significativamente superficial, dado que isola o conceito de ameaça militar da sua

natureza política, social e irremediavelmente ideológica, equipara números

relativamente ao sentimento identitário masculino e feminino, descurando o processo

excludente das mulheres ao nível das Forças Armadas e a influência que daí se obteria

numa perspectiva quer de apreciação de ameaça, quer de valorização do “orgulho em

ser português”, que muito embora se aproximam estatisticamente, de um ponto de vista

sociológico tenderão a interpretações desencontradas.

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1.2. Enquadramento futuro das Forças Armadas

O debate acerca do futuro das Forças Armadas, da sua caracterização, suas

finalidades e inerentemente da reconstrução da sua natureza, atravessa transversalmente

o debate político em Portugal. Simultaneamente, a capacidade estratégica que elas

comportam é também definida segundo os horizontes para que se destina, daí que seja

efectivamente oportuno confrontar as possibilidades que se lhe vão afigurando e o

sentido que adquirem na sua relação com a sociedade.

"As missões (...) são essenciais para determinar o que é uma dada instituição

castrense. Com efeito, as Forças Armadas são estruturadas pelas tarefas que a sociedade

lhes atribui – pelas missões que lhes dá." (Matos e Bacalhau, 2001: 47) Será portanto a

perspectiva com que se desenvolve o sentido das incumbências das Forças Armadas que

encontrará diferenciados projectos de acção e legitimação. De acordo com o inquérito

efectuado por Luís Salgado de Matos e Mário Bacalhau, a sociedade privilegiará as

missões incluídas na protecção civil, melhoria das condições de vida e missões de paz,

relegando para último plano o combate ao inimigo externo (todas previstas na Lei

Fundamental), razão pela qual se encontrara legitimidade no contexto de ameaça

nacional. Todavia, apesar da prioridade dada a missões de natureza civil e não

necessariamente militar, a hipótese levantada pelos autores citados de um futuro de

Forças Armadas para não combater? não é confirmada, apesar de se poder recusar a

ideia de uma "instituição castrense como um organismo cuja única função é militar."

(2001: 60)

Sobre o "Futuro das Forças Armadas" foi levada a cabo pela Comissão de

Defesa Nacional, em 1994, um colóquio parlamentar, onde se esboçam possibilidades e

caminhos para a instituição, tendo como intervenientes não apenas os parlamentares,

mas também as chefias das Forças Armadas nacionais e investigadores nesse domínio.

O General Loureiro dos Santos encontra como primeiro desafio para um futuro

das Forças Armadas em Portugal uma lógica de reforço, ausente da possibilidade

transformadora da sua natureza e finalidades: "Claro que podem dizer que há uma

questão de prioridades, tanto relativamente à Defesa como a outros meios. Muito bem,

eu compreendo. No entanto, se definimos um sistema de forças é porque ele é

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necessário (...)." (Santos, 1994: 29) Em concordância com a mesma óptica estará José

Luís Nunes, cuja preocupação se centra em "manter, de forma intransigente, o seu status

institucional." (Nunes, 1994: 35) O deputado (independente, pela UDP) à Assembleia

da República (na legislatura terminada em 1995) Mário Tomé refaz o debate acerca das

Forças Armadas apontando para a transferência das competências e soberania que até

então as legitimaram para organismos que adulterariam a sua missão:

“Como as Forças Armadas ficarão sempre dependentes de interesses muito

mais poderosos prosseguidos por outras forças armadas também muito mais poderosas,

estaremos subsidiariamente a intervir, se é que se pode admitir que tais intervenções

fora do nosso território são legítimas e adequadas, quando é certo que actualmente se

fazem grandes esforços para que o Direito Internacional assuma uma importância cada

vez maior, nomeadamente reforçando o papel das Nações Unidas.” (1994: 51)

Pedro Pezarat Correia, a esse respeito, denuncia a perversidade do

desenvolvimento a uma escala supranacional do poder e dos interesses militares,

apontando, também, para a necessidade de privilegiar a dimensão regulatória das

relações internacionais, sob o risco de unilateralidade dominadora:

“Globalmente, como os restantes países do mundo, Portugal está condicionado

pela emergência de um sistema internacional que, substituindo-se ao sistema bipolar

dominante na Guerra Fria, se apresenta cada vez mais com sinais de unipolaridade,

hegemonizado por uma única hiperpotência.” (2002: 84)

Por seu turno, o General Garcia dos Santos (1994: 52) demonstra uma

preocupação efectivamente tocante na temática da relação entre o social e o militar:

"Um aspecto que deve ser analisado é o do militar-homem versus cidadão.", questão

recuperada também pela socióloga Maria Carrilho. O modo como reproduz e concretiza

esta realidade prende-se com a forma como "as pessoas atribuem facilmente às Forças

Armadas, em tempo de paz, determinadas tarefas que não são propriamente habituais no

foro militar, sendo uma delas, curiosamente, a protecção aos idosos, (...) acções de

protecção do ambiente, com as quais quase toda a gente estava de acordo." (1994: 73)

Ora, a forma como se reconstrói o universo militar no seu cruzamento com a sociedade

civil será aquela que traz consigo a necessidade de repensar um novo conceito de

"cidadão-militar".

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Adriano Moreira, antigo ministro do Ultramar no período do Estado Novo e

representando o grupo parlamentar do CDS, faz ainda referência ao processo de

internacionalização que, segundo ele, "nos vai tornar sempre dependentes da

cooperação externa", o que poderá constituir uma ameaça à "identidade e capacidade

nacional de manter uma intervenção responsável em todas as organizações.", o que terá

como exigência um investimento na formação militar (1994: 56-57). João Granja da

Fonseca, deputado pelo PSD, aproxima a sua posição à desenvolvida por Adriano

Moreira, apelando à compatibilidade que deve ser assegurada entre a autonomia e

investimento nas Forças Armadas portuguesas, e o grau de defesa nacional que também

é obtido através da institucionalização das Forças Armadas portuguesas no plano

internacional (1994: 57-59). Uma opinião igualmente partilhada pela socióloga Maria

da Saudade Baltazar:

“É certo que tal envolvimento das Forças Armadas à escala internacional, e

concretamente para Portugal, tem-se revestido de enorme importância, quer no próprio

domínio militar (factor de modernização da organização militar e aumento do seu

prestígio / legitimidade na sociedade portuguesa, quer ao nível da política externa e do

desempenho global do Estado ao credibilizar a imagem externa de Portugal.” (2000: 13)

Nuno Rogeiro centra a sua análise numa perspectiva das relações internacionais

entre diferentes modelos de Forças Armadas, que tendem para uma forte assimetria: a

ideia de que "o soldado moderno é um saldado gestor, técnico ou cientista", que "foi ou

tem sido alicerçada em doutrinas militares contemporâneas" (1994: 90) americanas,

empenhada na profissionalização da "guerra", é fortemente confrontada com "um

regresso histórico de outro tipo de funções", como uma "tropa de infantaria mal

preparada, cuja distância entre o soldado profissional e o miliciano, ainda por cima, é

difícil de traçar" noutras zonas do mundo.

A expressão mais aproximada entre as Forças Armadas e a sociedade encontra-

se, politicamente, na posição de Jaime Gama, deputado pelo PS, pela preponderância

que atribui ao lugar do Serviço Militar Obrigatório no pensamento estratégico e

conceptual das Forças Armadas, bem como às contrapartidas sociais que perverteriam a

essência do voluntariado militar. Porém, não antevê “uma solução em que cada um (dos

sistemas) só tem benefícios” (1994: 120). No entanto, segundo a Lei n.º174/99, o

Serviço Militar Obrigatório será extinto em Portugal, após um período de transição de

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quatro anos, iniciado em 2001, o que será, desde logo, uma das primeiras premissas que

poderão adiantar efectivamente o futuro da relação Forças Armadas – sociedade.

Sob o título de “Militares preocupados com transformação da defesa nacional”,

noticia o jornal Público (2003), o seminário “Portugal e a Transformação na Segurança

e Defesa”, expressou-se a “preocupação com a possibilidade de se fazerem parcerias

futuras em projectos de investigação e defesa, caso se mantenha a tendência de

decréscimo do orçamento militar e as consequências da iminente (…)

profissionalização” (Público, 2003: 18). Será portanto nesta equação que se sustentará,

em Portugal, a ideia de modernização das Forças Armadas para o futuro.

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1.3. Recrutamento militar e democraticidade

Os processos de recrutamento militar instituídos em Portugal são

privilegiadamente aqueles que mais influenciam a relação entre as Forças Armadas e a

sociedade, podendo sociologicamente ser interpretados como um vínculo que reproduz

a influência que elas adquirem ou não nos quotidianos. Um artigo publicado no jornal A

Cabra (2003) retrata uma experiência de recrutamento, no âmbito do Serviço Militar

Obrigatório (SMO), num processo de "triagem", designado Inspecção Militar: "em série

e em alta velocidade por uma fiada de especialistas aos quais cabia decidir da existência

e formatação de uma minha possível aptidão para o cumprimento do SMO." (Nande,

2003: 20)

A justificação e legitimação que se encontram relativamente ao SMO integra

discursos bastante diferentes, bem como projectos e interpretações diferentes acerca das

Forças Armadas. "Não consigo admitir que o SMO não seja fundamental para a

integração das gerações, para a manutenção de valores, etc. E também tenho a

impressão (...) que esta questão é mais geracional do que depende de formações e de

filiações políticas." (Moreira, 1994: 56) Esta posição defendida por Adriano Moreira

encontra eco em João Granja da Fonseca que, em nome do PSD, assume a necessidade

de valorizar o SMO. (1994: 58) No entanto, o PSD entra em relativa ambiguidade

acerca dessa matéria: a forma como nele se cruzam formações políticas mais

conservadoras e o realce atribuído ao cumprimento do SMO enquanto espaço de

formação patriótica e inculcação ideológica, com um pensamento liberal, que tende para

a profissionalização enquanto estratégia de eficiência e modernização das Forças

Armadas, não permite uma opinião unívoca acerca dessa possibilidade. Do lado

socialista, Jaime Gama reporta-se à "raiz de filosofia política" (1994: 117) que preside

às orientações respeitantes ao SMO. O próprio retrata esse período como uma "espécie

de conceito de aulas regimentais de civismo e patriotismo" (1994: 119), que em nada

contribuirá para uma renovação das Forças Armadas. A forma como, nesse sentido, se

procura uma redefinição do conceito cívico exige um diagnóstico: “Supor que a

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identidade é uma essência primordial a transmitir e que o Estado é uma totalidade

imposta, é o caminho mais fácil para tornar a educação cívica numa variante da

socialização vertical e autoritária.” (Silva, 2000: 33) Como já foi dito, o fim do SMO

estará previsto para 2005, o que reconverterá a natureza do debate.

Outra questão que também levanta prende-se, por outro lado, às consequências

que a formação de um Serviço Militar Profissional poderia levantar, dado ser

"indissociável de problemas que têm a ver com a expressão dos militares, com a sua

organização" (Gama, 1994), exceptuando a sindicalização. Maria Carrilho incide

também nessa possibilidade, apontando o caso dos EUA: "o militar, enquanto cidadão,

tem determinadas liberdades. Ele pode concorrer, inclusivamente em eleições, desde

que não se apresente como militar mas, sim, como cidadão." (1994: 129)

Inclusivamente recoloca a questão na sua natureza democrática, insistindo na liberdade

de expressão e associação que deverá ser contemplada nos sectores militares.

Ainda relativamente à perspectiva política com que se olha o SMO, a Juventude

Comunista Portuguesa apresenta uma posição favorável. A perspectiva com que

formula um discurso acerca das Forças Armadas e a sua correlação com o SMO prende-

se fortemente com o universo simbólico "Povo / MFA" desenvolvido por Boaventura de

Sousa Santos (1992: 58-64). Encontrando na profissionalização das Forças Armadas um

veículo de "acções externas ao serviço dos interesses (...) do imperialismo", o projecto

de Resolução do 6º Congresso da JCP (1999) aponta como fundamental o recrutamento

obrigatório, enquanto garantia de aproximação do poder militar à sociedade. Contudo, o

desfasamento que existe entre a capacidade militar no cumprimento do SMO e o

exercício efectivo de poder militar desconstrói a ideia de que seria um recrutamento

obrigatório aquele que impediria o desenvolvimento de políticas militares imperialistas.

Pelo contrário, o Bloco de Esquerda, com vocação libertária e antimilitarista, aponta

precisamente para o fim do SMO: a sua natureza belicista e conservadora será suficiente

para o pôr em causa, bem como o modelo de formação cívica que atraiçoa os seus ideais

pluralistas:

“O Serviço Militar Obrigatório continua a existir. Os jovens que são obrigados a frequentá-lo são

vítimas da violência e da imposição de valores que se opõem aos que defendemos, como a igualdade, a

tolerância, a autonomia, a emancipação. Contra a lógica militarista, defendemos o fim do SMO […] Não

aceitamos entrar na lógica da guerra, nem ser carne para canhão ao serviço dos interesses do

imperialismo” (2ª Conferência de Jovens do Bloco de Esquerda, 2003)

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Algumas Lateralidades Sociais das Forças Armadas em Portugal

Outra questão indexada à democraticidade com que se processa o recrutamento

militar corresponde exactamente a uma história de exclusão das mulheres das Forças

Armadas. Segundo Helena Carreiras, este processo implementa-se com base na

sobreposição de variados factores de índole política, cultural, socioeconómica e,

naturalmente, militar: o exercício da cidadania e o grau de inclusão no sistema político,

a construção social do género e a reprodução de valores sobre masculinidade e papéis

sexuais, num plano familiar, a entrada e posição da mulher no mercado de trabalho e,

finalmente, o fechamento com que se masculinizou a instituição militar estarão na base

dessa contínua exclusão. (2002: 18) No entanto, "na sociedade pós-militar existe uma

tensão entre a decadência dos ideais de masculinidade (...) e a entrada da mulher na

esfera pública." (Giddens, 1997: 209) Outra correlação sociologicamente pertinente

entre o SMO e a entrada das mulheres no Exército português traz consigo a ideia do fim

do primeiro associado à democratização do sector militar:

"O Exército, do mesmo passo, vê abalado o serviço militar obrigatório – e

corre o risco – quase certo – de o perder, desaparecendo assim a ligação que, todos os

dias, a todas as horas, consagrava a sua identificação com a nação. Essa perda, porém,

tem uma compensação simbólica: a abertura às mulheres, que aprofunda em identidade

qualitativa com a sociedade o que o Exército tem perdido em identificação

quantitativa." (Matos, 1997: 409)

Esta ligação é ainda reiterada através da interpretação que é feita relativamente à

introdução de um sistema de voluntariado como tendência, nos países ocidentais, de

recrutamento:

“A questão do ingresso das mulheres nas Forças Armadas começou a ser posta

nos anos 1980, em conexão com a reestruturação da instituição castrense e, em

particular, com a susbtituição do serviço militar obrigatório pelo voluntariado.” (Matos

e Bacalhau, 2001: 79)

Contudo, a entrada da mulher nas Forças Armadas, podendo ser vista como uma

conquista social significativa, em muito pouco significou uma conquista emancipatória,

na medida em que o registo em que ela é feita continua a acentuar e a reproduzir a

realidade discriminatória presente em todas as esferas (económica, familiar, cultural)

que envolvem a tensão emancipação – regulação, que perpassa modeladamente pelos

circuitos interactuantes em que a expressão feminista se vai arriscando.

Fontes de Informação Sociológica 13

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Algumas Lateralidades Sociais das Forças Armadas em Portugal

Para finalizar, a facultação do estatuto de Objector de Consciência constitui, em

si, um indicador da democraticidade da realidade militar em Portugal. Estando na

dependência da Secretaria de Estado de Juventude e Desportos, a sua natureza

desmilitarizada constitui, efectivamente, um avanço, na medida em que não coloca a

facultação em subordinação ao Ministério da Defesa Nacional (Secretaria de Estado da

Juventude, 2003), o que poderia enviesar a requisição e o seu intuito, dado que é,

manifestamente, uma declaração de repúdio ao sistema militar, pela recusa em usar

“meios violentos de qualquer natureza contra o seu semelhante, ainda que para fins de

defesa nacional, colectiva ou pessoal” (Declaração de Objecção de Consciência perante

o Serviço Militar – anexo I). No entanto, alguns processos de asfixia dessa possibilidade

estarão incorporados no sistema de requisição: a necessidade de apresentação de uma

declaração abonatória de testemunhas (anexo II), como se a rejeição do cumprimento do

SMO tivesse por dependência uma militância exteriorizada e comprovada por

testemunhas, a necessidade de apreentação de registo criminal, a inexistência de

informação significativa aquando do recenceamento militar e o cumprimento de serviço

cívico, facilmente confundido com trabalho semestral não remunerado.

Neste sentido, é possível concluir que são variados os empecilhos sociais com

que se desenvolve o processo de recrutamento (vínculo preponderante da correlação

entre as Forças Armadas e a sociedade), fragilizando a exigência democrática que não

poderá ser secundarizada: o critério de género no cumprimento do SMO, que continuará

a vigorar até à sua extinção, a tenuidade do exercício cívico, quando este é sobreposto

pelo estatuto de militar, e a ofuscação da alternativa de Objecção de Consciência serão

manifestamente realidades das Forças Armadas portuguesas, cuja revisão e

transformação se nos apresentam com urgência.

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Algumas Lateralidades Sociais das Forças Armadas em Portugal

2. Desenvolvimento da pesquisa

O processo de pesquisa bibliográfica desenvolvido neste trabalho teve como

ponto de partida a escolha do tema: sendo o meu objectivo a caracterização sociológica

de algumas lateralidades sociais das Forças Armadas portuguesas, o sentido da minha

recolha confinou-se à informação acerca das três áreas que desenvolvi. Nesse sentido,

recorri à literatura científica que aborda essa temática na biblioteca da FEUC, onde pude

optar pelos (escassos) livros existentes, que se revelassem oportunos. Assim, recorri aos

livros “As Forças Armadas em Tempo de Mudança” de Luís Salgado de Matos e Mário

Bacalhau, por onde estruturei grande parte do trabalho, nomeadamente o primeiro

capítulo, “Mulheres em Armas” de Helena Carreiras, com bastante pertinência ao nível

da participação e entrada da mulher no universo das Forças Armadas, “Sociologia” e

“Para além da Esquerda e da Direita” de Anthony Giddens, onde se caracteriza a ligação

Guerra - Forças Armadas e se afere da sua masculinização, “Exército, mudança e

modernização” de Fernando Pereira Marques, importante na correlação entre o poder

militar e a sua legitimação institucional e ainda “Da estratégia militar à estratégia

empresarial” do general Gil Fiévet. Consultei ainda algumas revistas científicas

nacionais, constatando que, relativamente à Revista Crítica de Ciências Sociais a

maioria dos artigos inerentes às Forças Armadas foram produzidos num número

temático (1984), mas que se remete para a revolução de 25 de Abril e a sua

interpretação militar. No entanto, um artigo de Luís Salgado de Matos de 1997 na

Análise Social revelou bastante pertinência pela articulação que de alguma forma

efectua entre o SMO e o género feminino perante as Forças Armadas. A excepção

reside na revista Nação e Defesa, que tem precisamente por objecto discussão e

publicação científicas acerca da realidade militar em escalas diversas.

Ao nível da literatura cinzenta, foi bastante importante o recurso à publicação de

um Colóquio Parlamentar, intitulado “O Futuro das Forças Armadas”, onde se

esgrimiam posições políticas e também académicas acerca da modernização das Forças

Armadas em Portugal. Porém, sendo de 1994, poderá perder um valor cientificamente

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significativo e até pelos acontecimentos internacionais mais recentes que afectaram

invariavelmente o pensamento militar; no entanto, não deixa de ser oportuno, na medida

em que é possível caracterizar as diferentes preocupações e sensibilidades respeitantes à

temática em estudo. Recorri ainda a um artigo das actas do IV Congresso Português de

Sociologia, redigida por Maria da Saudade Baltazar (2000), onde se desenvolve um

raciocínio interessante acerca de “O estado das Relações Civil-Militares em

Democracia”.

Tive também como fontes de informação o jornal diário Público de 22 de Maio

de 2003, onde oportunamente se relatava um debate acerca das estratégias e políticas de

Defesa para Portugal e ainda o jornal da Associação Académica de Coimbra, A Cabra,

de 13 de Maio de 2003, em que, num artigo de opinião, de descrevia uma experiência de

“chamada à inspecção militar”.

Para a ficha de leitura optei pelo capítulo Os três tempos simbólicos da relação

entre as Forças Armadas e a sociedade portuguesa do livro (anexo III)“O Estado e a

Sociedade em Portugal (1974-1988) de Boaventura de Sousa Santos, essencialmente

pela obordagem histórica dos três processos diferenciados de relações entre as Forças

Armadas e a sociedade, numa perspectiva quase paradigmática.

Finalmente, em relação à pesquisa on-line, não necessitei de recorrer a nenhum

motor de busca, na medida em que não desenvolvi a recolha de informação tendo a

internet como ponto de partida, mas sim como complemento informativo. Nesse

sentido, apenas pesquisei a página da Secretaria de Estado da Juventude

(http://www.sej.pt), que contempla informações relevantes ao nível da Objecção de

Consciência e processo de requisição. Pude, dessa página, retirar quer um modelo da

Declaração de Consciência perante o Serviço Militar Obrigatório (anexo I), quer da

Declaração Abonatória de Testemunhas (anexo II). No âmbito da avaliação de uma

página página da Web, recorri à página do Ministério da Defesa Nacional

(http://www.mdn.gov.pt/primeira.asp), (anexo IV), na medida em que, sendo

institucional, apresenta validade e autenticidade instrínsecos e, por outro lado,

correspondendo a um organismo político decisor e responsável ao nível das estratégias

de defesa nacional, ganha pertinência no âmbito do trabalho.

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5. Ficha de leitura

A presente ficha de leitura reporta-se a um capítulo do livro "O Estado e a

Sociedade em Portugal (1974-1988)" de Boaventura de Sousa Santos. O capítulo (Os

três tempos simbólicos da relação entre as Forças Armadas e a sociedade portuguesa),

(anexo III), é efectivamente pertinente no âmbito do trabalho a realizar, na medida em

que transporta a problemática da relação entre a sociedade e as Forças Armadas numa

perspectiva histórica, permitindo compreender o trajecto que esta relação desenvolveu,

nomeadamente no século XX, e a forma como sugere a possibilidade, presente e futura,

de uma construção renovada, na medida em que ao longo de toda a reflexão está

presente uma abordagem crítica da realidade, não a esgotando no passado.

A relação desenvolvida entre as Forças Armadas e a sociedade portuguesa

adquire significativa relevância sociológica na forma como combina o contributo da

defesa no domínio social com a forma como este condiciona e promove a sua

institucionalização. Assim, o percurso interactuante entre as duas realidades reveste-se

por diferentes contornos: a sua natureza política (onde se distingue um acrescido

compromisso político em países periféricos) e ainda a permeabilidade da organização

militar perante os padrões culturais da sociedade civil, bem como a possibilidade

reversa de militarização do social. Em Portugal, se, por um lado, o golpe militar de 25

de Abril de 1974 indiciou uma apropriação política da sociedade pelo poder militar, a

crise revolucionária que se lhe seguia propiciou um debate avançado sobre essa

dicotomia, tendendo para uma subordinação das Forças Armadas ao poder político civil.

Esta evolução registada entre 74 e 85 contraria ainda desencontros respeitantes à global

consolidação democrática da sociedade portuguesa, revelando, de alguma forma, a

condição semiperiférica de Portugal.

Vários serão, portanto, os tempos históricos que assinalam o universo simbólico

das Forças Armadas no plano do imaginário social que o reproduzia. Nesse sentido,

diferenciam-se três momentos específicos da relação entre as Forças Armadas e a

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sociedade, de acordo com a influência que estas detinham na estruturação e expectação

social, construindo, desta feita, diferentes mitos e representações sociais.

O tempo primeiro, interpretado como uma construção mítica da ideia de «ir à

tropa», prolonga-se no contexto do Portugal rural: "O imaginário social da sociedade

rural sobre as forças armadas distingue-se, quer pelo processo de inculcação simbólica,

quer pela carga de cognição prático-ideológica por que socialmente se manifesta."

(Santos, 1992:47) Desde logo um cruzamento entre a ritualização do processo de

recrutamento militar, e a forma como essa realidade integra os quotidianos e

expectativas, embora de forma contraditória: se, por um lado, a "ida à tropa" perturbava

a estrutura familiar afectiva e interferia na economia camponesa, por outro constituía

um processo "natural" de libertação e promoção individual, pois compunha-se como

elemento de ruptura com as vivências e representações locais de até então. O Serviço

Militar Obrigatório seria, portanto, um contraste de sedução/repulsão, ainda que

abarcasse uma capacidade aspiracional para quem o cumpria. Daí que a sua concepção

instrumental, dado que pressupunha uma espécie de "contrato" entre a dominação

política e a sociedade, "que se reconhece inferior e relativamente bloqueada e que serve

a instituição militar, servindo-se dela" (1992: 57) com finalidades promocionais, seja

concebida como um modelo populista, que as correlaciona.

O segundo tempo histórico que equaciona a relação Forças Armadas – sociedade

portuguesa encontra como representação mítico-simbólica «A Aliança POVO/MFA».

Na sequência do golpe militar de 25 de Abril de 1974, o curto período que se

reconheceu neste imaginário foi de tal forma revolucionário, que a intensidade com que

se construiu marcou verdadeiramente a relação (aproximação) entre o poder militar e a

sociedade civil. Se até aqui as Forças Armadas eram compreendidas numa perspectiva

emancipatória dos circuitos sociais locais, de forma individual, a revolução revisitou

essa perspectiva, mas num projecto socialmente colectivo e ideologicamente

comprometido. Apesar da existência de interpretações bifurcadas acerca dos

movimentos sociais de Abril (de um lado a defesa da genuinidade e espontaneidade

naturais de um processo revolucionado, asfixiado pelas pressões institucionalizantes das

forças políticas organizadas; de outro o enquadramento dos movimentos populares

como produto das organizações partidárias, que restabeleceram a sua preponderância

pela legitimação eleitoral), Boaventura de Sousa Santos procura ultrapassar as referidas

posições sociologicamente extremadas, desdobrando quatro dimensões que se erigiram

na relação Forças Armadas – sociedade: "a ratificação popular do golpe militar",

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imediata no dia 25 de Abril; "a resolução dos problemas concretos das classes populares

no meio rural e urbano", evidente na transferência de competências, antes socialmente

reconhecidas através do governo e administração pública. O COPCON desempenhou

efectivamente um papel promocional, de notar "a riqueza dos processos de mediação e

de negociação social que ele protagonizou." (1992: 60-61); "as campanhas de

dinamização cultural", onde a capacidade técnica dos militares adquiria uma visível

vantagem, apesar da "pouca atenção à dimensão cultural das carências materiais" e do

"controlo partidário, sobretudo por parte do PCP", e respectivo "afunilamento

ideológico" (1992: 61); finalmente, "a tentativa de desenvolver uma nova forma política

de Estado capaz de articular e institucionalizar a relação entre o povo e o MFA": a

oficialização desta tentativa de contratualização intermediária entre o MFA e a

sociedade, no espaço de controlo da complexidade das lutas populares, revelou-se

precisamente um "nado-morto"; a tradução dos movimentos e acções populares em

lógicas subpartidárias estava portanto na origem do fracasso deste empreendimento. No

entanto, Boaventura de Sousa Santos não vê na debilidade da democracia directa a

panaceia que restaria pela via da democracia representativa. Pelo contrário, sugere "uma

terceira via entre o modelo representativo social-democrático e o modelo soviético"

(1992: 62), como possível construção original à luz da complexidade e especificidade

portuguesa. Nesse sentido, o processo emancipatório no caminho da democracia directa

e continuado nas expectativas libertárias de Abril encontraria na democracia

representativa "a melhor defesa contra a vertigem insurreccional de algumas forças

políticas organizadas." (1992: 63) Foi então, na tensão entre a instrumentalização ou a

marginalização das Forças Armadas, que tudo pesou para esta última, estando, portanto,

associada ao terceiro tempo histórico proposto. A relação Forças Armadas – sociedade

que neste segundo momento se discerne é portanto designada como uma relação

revolucionária, pela convocação com que as classes populares se depararam e a forma

como intervieram activamente na edificação utópica partilhada com as Forças Armadas

(MFA).

Para finalizar, o tempo terceiro, iniciado após 25 de Novembro de 1975, é

introduzido como "As Forças Armadas modernas e profissionais segundo o modelo

ocidental": um resultado cozinhado com a crise militar do "terceiro tempo histórico",

este período clarificou o papel a desempenhar pelas Forças Armadas, reduzidas à sua

intervenção militar, legitimada pelo poder civil constitucional. A sua associação

simbólica proveio essencialmente de um processo de oficialização política: a redução do

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discurso acerca do poder militar às forças políticas organizadas e ao seu refúgio

tecnicista e linguagens especializadas terá também proporcionado uma atenuação do

processo criativo de um imaginário social intrínseco, ao contrário do que se verificou

nos tempos anteriores. Em marcha, desde logo, um afastamento das Forças Armadas em

relação à sociedade, conseguido, quer pelo distanciamento da utilidade do poder militar

face aos quotidianos, quer pela sua estandardização esquemática à luz das estratégias

supranacionais ocidentais, perdendo o contacto com a realidade portuguesa. No entanto,

tanto mais este distanciamento que transfere a ideia de Forças Armadas para uma

entidade abstracta corre o risco de perder a sua legitimação social quanto mais se

desintegra da sociedade civil, nomeadamente quando é reconhecida a necessidade de

participação civil nas Forças Armadas como garante da sua eficiência.

A problematização do relacionamento civil / militar fará, todavia, parte de uma

realidade muito mais ampla, que diz respeito ao relacionamento entre a sociedade e as

grandes instituições. E essa questão não pode de forma alguma ser limitada à sociedade

portuguesa, na medida em que o debate institucional se harmoniza como a teia de

relações desenvolvida entre os Estados e as sociedades liberais. Caracterizando estes

complexos institucionais dos últimos duzentos anos, Boaventura de Sousa Santos

encontra um processo de permanente clausura e hermetisto perante a sociedade civil,

que ao contrário de ser encarado com um problema, tem sido continuado como uma

solução: "as instituições estavam fechadas, [e que] o seu discurso, por ser hermético, era

também socialmente vazio, por ser profissionalizado, era incontrolável e, por ser

ritualizado, era irracional." (1992, 69-70)

Assim, este terceiro tempo inscreve-se exactamente num processo de apelo

profissionalizante / modernizante, mas que encontra o seu maior obstáculo numa crise

profunda de legitimidade não só das Forças Armadas, mas de natureza institucional. Ao

contrário da relação populista (embora também despolitizada) ou revolucionária, esta

nova relação "pressupõe um bloco político-social hegemónico dominado pela burguesia

e congregando a adesão das classes médias e de largos estratos do operariado; este bloco

cristaliza-se num Estado moderno empenhado no desenvolvimento capitalista" (1992:

72) – uma relação, portanto, social-democrata.

O trabalho de reflexão desenvolvido por Boaventura de Sousa Santos neste

capítulo é de facto fundamental para compreender e mesmo redesenhar a ideia principal

que permita interpretar algumas lateralidades sociais das Forças Armadas em Portugal.

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Diferenciando três momentos de relevo na formulação da relação entre o militar e o

social, é possível concluir a forma como a totalidade do social e a sua transformação

influem forçosamente e reconstróem essa relação, transformando imaginários e

representações sociais da instituição militar nos caminhos e debates acerca da transição

paradigmática. E a emergência de um novo paradigma, social e político, e portanto

também militar (não militarizado), é aquela que se vai esboçando no quadro da evolução

registada por Boaventura de Sousa Santos, nomeadamente quando contraria a ideia de

que o terceiro tempo simbólico seria a inevitabilidade mais incontroversa que restaria da

relação revolucionária que descreve como segundo tempo simbólico.

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6. Avaliação de uma página da Web

A página da Web que seleccionei está naturalmente associada à temática do

trabalho (anexo IV). Pertencendo ao Ministério da Defesa Nacional, é evidentemente de

fácil acesso. Relativamente aos conteúdos que veicula no momento da consulta (Junho

de 2003), apresenta informação diversificada, no âmbito dos propósitos do Ministério:

contempla as alterações efectuadas pelo actual ministro, Dr. Paulo Portas, à Lei de

Programação Militar, a resolução do Conselho de Ministros relativa ao Conceito

Estratégico de Defesa Nacional e grandes opções a esse nível, e dá ainda destaque à

cerimónia de condecoração dos ex. prisioneiros de guerra portugueses. Denota-se

efectivamente uma grande ligação da página a, pelo menos, um público particular: os

antigos combatentes, quer pela divulgação já referida, quer pela presença em fotografia

do Secretário de Estado da Defesa e dos Antigos Combatentes, ao lado de informações

respeitantes a esse grupo social específico. A presença em fotografia do Dr. Paulo

Portas é também de salientar, pois encima uma nota de boas-vindas, a sua biografia, os

discursos proferidos e comunicados, e a ainda a principal legislação relativa às Forças

Armadas. Convém acrescentar a presença de um especial enfoque que percorre a

totalidade da página: a concentração no ministério da capacidade de sedução patriótica e

tendencialmente nacionalista. A confirmá-lo, é possível verificar a nota de boas-vindas,

concluída com a “consagração do direito e do dever fundamentais de todos os

portugueses que é a defesa da Pátria”. A forma como aponta para os primeiros dos

primeiros desses direitos e deveres dos portugueses como os “fundamentais” é, de facto,

a expressão máxima de um discurso conservador, que reduz conotadamente o exercício

da cidania ao sentimento pátrio. A simbologia que igualmente preenche a página baseia-

se no “imaginário de Zamora”, fundacional, com a imagem do território português,

sobreposto pela espada e escudo nacionais. Convém ainda acrescentar, a esse respeito, a

presença de um “sabia que…” acerca da história do hino nacional, onde se pode ver a

partitura da sua composição e a respectiva letra, complementado pelo historial da

bandeira portuguesa. São ainda elencados os Postos e Distintivos, dando a conhecer a

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hierarquia de funções, estatutos e prestígio militar das Forças Armadas. A criação de

todo este imaginário simbólico é, sem dúvida, uma das mais fortes características do

página em análise.

Há também uma divisão categorial que permite aceder à natureza da Defesa

Nacional, a Eventos, Galeria (onde se encontram ligações aos três ramos das Forças

Armadas: Marinha, Exército e Força Aérea), Publicações, Recrutamento (onde também

estão presentes os incentivos aos regimes de contrato e voluntariado), Links e Contactos

(para os departamentos do ministério e outros ministérios da defesa), Glossário,

Perguntas típicas, nomeadamente relacionadas com os processos de recrutamento) e

ainda o Destaque, em que se dá maior relevo, como já foi referido, à cerimónia de

condecoração dos ex.prisioneiros de guerra portugueses.

Para finalizar, resta adicionar que toda a informação é gratuita, sendo o o site de

fácil navegação e de carregamento bastante rápido.

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Conclusão

É de alguma forma evidente que no que diz respeito às Forças Armadas é

bastante difícil encontrarmos posições unívocas. Mais difícil ainda é conseguir

comparar interpretações que se efectuam entre o seu relacionamento com a sociedade,

que possuam pontos idênticos de análise, isto é, que encontrem plataformas teóricas

comuns de discussão. De qualquer forma, foi possível verificar a existência de

diferentes perspectivas, nomeadamente acerca do futuro que se lhes avizinha e da forma

como as Forças Armadas reproduzem, em si, um modelo conservador, muitas vezes em

hiato com as possibilidades democratizantes, insistindo em ganhar legitimidade nos

mais nobres propósitos de defesa. No entanto, “sempre que se fala de insegurança, a

esquerda joga à defesa e a direita ao ataque. Tanto basta para que nos obriguemos a uma

nova síntese que assuma a complexidade (…).” (Portas, 2002: 239) Não será esse o

caminho de reconstrução e modernização das Forças Armadas? Um desafio à

capacidade de encontrarmos “novas sínteses” entre a democracia e o militar (rumo à

desmilitarização), em que o exercício de cidadania não se aliena perante o estatuto

militar (que, em todo caso, não deixa de ser um compromisso cívico) e recuperando a

ideia de “novas missões”, que poderão dar anuência à dúvida levantada por Luís

Salgado de Matos e Mário Bacalhau (ainda que por eles infirmada): Forças Armadas

para não combater? Se assim se esboçar o futuro das Forças Armadas, a sua

modernização só poderá ser o caminho tanto mais responsabilizado, quanto mais

desmilitarizado.

“Porque o dever era quase gratuito e o ‘sangue’ se tornou mais barato, os

exércitos aumentaram o volume e passaram a ser mais facilmente chamados a intervir.”

(Barrento, 2001: 20)

Não será, com toda a certeza, a utopia das utopias anarquistas (Baltazar, 2000)

tudo aquilo que não pensa militarmente.

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Algumas Lateralidades Sociais das Forças Armadas em Portugal

Referências Bibliográficas

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Anexo I Declaração de objecção de consciência perante o serviço militar

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Anexo II Declaração abonatória

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Anexo III Capítulo “Os três tempos simbólicos da relação entre as Forças Armadas

e a sociedade portuguesa” de O Estado e a Sociedade em Portugal (1977-

1988) de Boaventura de Sousa Santos (1992) - fotocopiado

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Anexo IV Página do Ministério da Defesa Nacional