97
Allan Kardec O Principiante Espírita Introdução ao conhecimento do mundo invisível pelas manifestações espíritas; Resumo da Doutrina Espírita; Respostas às principais objeções. Contendo: Biografia de Allan Kardec Conteúdo resumido Este valioso livrinho contém uma introdução ao conhecimento do mundo invísivel, um resumo da Doutrina Espírita, além de respostas às principais dúvidas e objeções que se levantam em relação ao Espiritismo. Contém ainda a biografia de Allan Kardec, por Júlio Abreu Filho.

Allan Kardec - O Principiante Espírita · PDF fileOs médiuns ... cada uma delas exigiria como que um curso, em que as coisas fossem expostas desde o princípio. Como essas objeções

Embed Size (px)

Citation preview

Allan Kardec

O Principiante Espírita

Introdução ao conhecimento do mundo

invisível pelas manifestações espíritas;

Resumo da Doutrina Espírita;

Respostas às principais objeções.

Contendo:

Biografia de Allan Kardec

Conteúdo resumido

Este valioso livrinho contém uma introdução ao

conhecimento do mundo invísivel, um resumo da

Doutrina Espírita, além de respostas às principais

dúvidas e objeções que se levantam em relação ao Espiritismo.

Contém ainda a biografia de Allan Kardec, por

Júlio Abreu Filho.

Sumário

Primeira Parte

» Noções de Espiritismo ................................................................3 Noções preliminares ......................................................................3

Os Espíritos ....................................................................................5 Comunicação com o mundo invisível ...........................................9

Fim providencial das manifestações ............................................20

Os médiuns ...................................................................................21

Escolhos da mediunidade ............................................................26

Qualidades dos médiuns ..............................................................29 Charlatanismo ..............................................................................33

Identidade dos Espíritos ...............................................................34

Contradições.................................................................................36

Conseqüências do Espiritismo .....................................................37

Segunda Parte

» Solução de Problemas pela Doutrina Espírita ......................43 Pluralidade dos mundos ...............................................................43

A alma 44

O homem durante a vida terrena..................................................47

O homem após a morte ................................................................57

Biografia de Allan Kardec ..........................................................67

Primeira Parte

Noções de Espiritismo

Noções preliminares

1. É engano pensar que, para se convencerem, basta aos

incrédulos o testemunho dos fenômenos extraordinários. Aqueles que não admitem a existência da alma, ou Espírito, no homem,

também não o admitem fora do homem. Assim, negam a causa e,

em conseqüência, negam os efeitos. Via de regra têm uma idéia

preconcebida e um propósito negativo, que impossibilita a

observação exata e imparcial. Com isso levantam problemas e objeções que não podem ser respondidas de modo completo porque

cada uma delas exigiria como que um curso, em que as coisas

fossem expostas desde o princípio.

Como essas objeções derivam, em grande parte, do

desconhecimento das causas dos fenômenos e das condições em que os mesmos se verificam, um estudo prévio teria a vantagem de

as eliminar.

2. Imaginam os desconhecedores do Espiritismo que os

fenômenos espíritas podem ser produzidos do mesmo modo que as

experiências de Física ou de Química. Por isso pretendem submetê-los à sua vontade e se recusam colocar-se nas condições exigidas

para poder observá-los.

Como, de início, não admitem a existência dos Espíritos e a sua

intervenção, assim desconhecendo a sua natureza e o seu modo de

agir, essas pessoas se comportam como se lidassem com a matéria bruta. E porque não conseguem aquilo, concluem que não há

Espíritos. Entretanto, se se colocassem em ponto de vista diverso,

compreenderiam que os Espíritos não passam de almas dos

homens; que todos nós, após a morte, seremos Espíritos; e que,

Eric Auad
Realce
Eric Auad
Realce

então, não teremos disposição para servir de joguete e satisfazer a

fantasia dos curiosos.

3. Mesmo quando certos fenômenos possam ser provocados, não se acham, de modo algum, à disposição de ninguém, por isso

que provêm de inteligências livres. Quem se dissesse capaz de os

obter sempre que quisesse apenas provaria ignorância ou má-fé.

Há que esperar, para os colher de passagem. E, muitas vezes,

quando menos se espera é que se apresentam os fatos mais interessantes e convincentes.

Nisto, como em tudo, os que desejam seriamente instruir-se

devem ter paciência e perseverança e se colocar nas condições

adequadas. Sem isto melhor será não cogitar do assunto.

4. As reuniões que visam as manifestações espíritas nem sempre se acham em condições adequadas à obtenção de resultados

satisfatórios, ou a afirmar convicções. É forçoso, mesmo, convir

que por vezes os incrédulos saem menos convencidos do que

entraram e lançam em rosto dos que lhes falaram do caráter sério

do Espiritismo as coisas ridículas que testemunharam. É verdade que neste particular não são mais lógicos do que aquele que

pretendesse julgar uma arte pelas primeiras demonstrações de um

aprendiz, ou uma pessoa pela sua caricatura ou, ainda, uma tragédia

por sua paróquia.

Também o Espiritismo tem os seus aprendizes. E quem quiser informar-se não deve buscar os ensinos numa fonte única, porque

somente o exame comparado pode permitir se firme uma opinião.

5. Têm as reuniões frívolas o grande inconveniente de dar aos

novatos, que as assistem, uma falsa idéia do caráter do Espiritismo;

e os que só hajam freqüentado reuniões de tal espécie não podem levar a sério uma coisa que aos seus olhos é tratada com somenos

importância pelos que se dizem seus adeptos. Um estudo prévio

ensinar-lhes-á a avaliar o alcance daquilo que vêem e distinguir

entre o bom e o mau.

Eric Auad
Realce
Eric Auad
Realce

6. Idêntico raciocínio se aplica aos que julgam o Espiritismo

pelo que dizem algumas obras esquisitas, que o apresentam de

modo ridículo e incompleto.

Não pode o Espiritismo sério responder pelos que mal o

compreendem, ou o praticam em desacordo com os seus preceitos,

do mesmo modo que não responde a Poesia pelos que fazem versos

maus.

Deplora a existência de tais obras, prejudiciais à verdadeira ciência. Na verdade seria preferível que só as houvesse boas.

Entretanto, o maior mal está em que não se dêem ao trabalho de as

estudar todas.

Aliás, todas as artes, como todas as ciências, estão no mesmo

caso. Não aparecem tratados cheios de erros e de absurdos sobre as coisas mais sérias? Por que seria, em particular, o Espiritismo

privilegiado, principalmente em seu início?

Se os que o criticam não julgassem pelas aparências, saberiam

aquilo que ele admite e aquilo que ele rejeita e não o

responsabilizariam por aquilo que ele repele em nome da razão e da experiência.

Os Espíritos

7. Os Espíritos não constituem, como supõem alguns, uma classe à parte na criação: eles são as almas dos que viveram na

Terra e em outros mundos, mas despojadas de seu invólucro

corporal.

Os que admitem que a alma sobreviva ao corpo admitem, por

isso mesmo, a existência dos Espíritos. Negá-los importa negar a alma.

8. Em geral se faz uma idéia muito errada do estado dos

Espíritos. Não são seres vagos e indefinidos, como muitos pensam,

Eric Auad
Realce

nem chamas semelhantes aos fogos-fátuos ou fantasmas tais quais

os descrevem os contos de almas do outro mundo.

São seres semelhantes a nós, com um corpo como o nosso, apenas fluídico e, normalmente, invisível.

9. Quando unida ao corpo, durante a vida, tem a alma um

envoltório duplo: um pesado, grosseiro e destrutível – o corpo;

outro leve, fluídico e indestrutível – o perispírito.

10. Assim, há no homem três elementos essenciais:

I - a alma ou Espírito, princípio inteligente, no qual residem o

pensamento, a vontade e o senso moral;

II - o corpo, envoltório material, que põe o Espírito em relação

com o mundo exterior;

III - o perispírito, envoltório fluídico, leve, imponderável, que serve de ligação e de intermediário entre o Espírito e o

corpo.

11. Quando o envoltório exterior se acha usado e não pode mais

funcionar, cai; o Espírito o abandona, assim como a noz se despe

da casca, a árvore da cortiça, a serpente da pele; numa palavra, do mesmo modo que deixamos uma roupa que não nos serve mais. A

isto chamamos morte.

12. A morte é somente a destruição do envoltório corporal,

abandonado pela alma, como a borboleta abandona a crisálida. Mas

o Espírito conserva o corpo fluídico, ou perispírito.

13. A morte do corpo liberta o Espírito do laço que o prendia à

Terra e lhe causava sofrimento. Liberto desse fardo, só lhe resta o

corpo etéreo, que lhe permite percorrer os espaços e vencer

distâncias com a rapidez do pensamento.

14. Alma, perispírito e corpo unidos constituem o homem; alma e perispírito separados do corpo constituem o ser que chamamos

Espírito.

Eric Auad
Realce
Eric Auad
Realce
Eric Auad
Realce

Observação: Assim, é a alma um ser simples, o Espírito um

ser duplo e o homem um ser triplo. Seria mais preciso reservar o

vocábulo alma para designar o princípio inteligente; espírito para o semimaterial, constituído desse princípio e do corpo

fluídico. Como, porém, não é possível conceber o princípio

inteligente isolado da matéria, nem o perispírito sem que esteja

animado pelo princípio inteligente, alma e espírito são, em

geral, empregados indistintamente: é a figura que consiste em tomar a parte pelo todo, da mesma maneira por que se diz que

uma cidade é habitada por tantas almas, uma vila constituída de

tantos fogos. Entretanto, filosoficamente é essencial que se faça

a diferença.

15. Revestidos de corpos materiais, os Espíritos constituem a Humanidade, ou mundo corpóreo visível; despojados desses

corpos, constituem o mundo espiritual, ou invisível; este enche o

espaço. Vivemos em seu meio, sem disso nos apercebermos, assim

como vivemos no mundo dos infinitamente pequenos, do qual não

suspeitávamos antes que tivesse sido inventado o microscópio.

16. Assim, os Espíritos não são seres abstratos, vagos e

indefinidos, mas concretos e circunscritos; só lhes falta a faculdade

de serem vistos, para que sejam semelhantes aos homens. Disso

decorre que, se de momento fosse levantado o véu que no-los

oculta, constituiriam eles uma população em redor de nós.

17. Possuem todas as percepções que tinham na Terra, mas em

grau mais alto, pois suas faculdades não se acham amortecidas pela

matéria; têm sensações que desconhecemos, vêem e ouvem coisas

que os nossos limitados sentidos nem vêem, nem ouvem.

Para eles não há obscuridade, salvo para os que, por castigo, se acham em trevas temporárias.

Todos os nossos pensamentos neles repercutem: lêem-nos como

num livro aberto. Assim, aquilo que lhes poderíamos esconder

durante a vida terrena, não mais o poderemos após a sua

desencarnação.1

18. Os Espíritos se acham em toda parte, ao nosso lado, acotovelando-nos e nos observando incessantemente. Por sua

constante presença em nosso meio são agentes de vários

fenômenos, representam papel importante no mundo moral e, até

certo ponto, no mundo físico. Constituem, se assim podemos dizer,

uma das forças da Natureza.

19. Admitida a sobrevivência da alma ou Espírito, é racional

admitir que continuem as suas afeições. Sem isto as almas dos

nossos parentes e amigos estariam totalmente perdidas para nós

depois da morte. E como os Espíritos podem ir a toda parte, é

também racional admitir que os que nos amaram durante a vida terrena ainda nos amem depois de mortos, venham até junto de nós

e se sirvam dos meios encontrados à sua disposição. Isto é

confirmado pela experiência.

Realmente, prova a experiência que os Espíritos conservam as

afeições sérias que tinham na Terra, alegram-se em se aproximar dos que amaram, sobretudo quando atraídos pelos sentimentos

afetuosos, ao passo que revelam indiferença pelos que se lhes

mostram indiferentes.

20. O fim do Espiritismo é demonstrar e estudar a manifestação

dos Espíritos, as suas faculdades, a sua situação feliz ou infeliz, o seu porvir. Numa palavra, a sua finalidade é o conhecimento do

mundo espiritual.

Evidenciadas essas manifestações, conduzem à prova

irrefragável da existência da alma, da sua sobrevivência ao corpo,

da sua individualidade após a morte, isto é, da vida futura. Assim, é ele a negação das doutrinas materialistas, não só mediante o

raciocínio, mas, e principalmente, pelos fatos.

21. Uma idéia muito generalizada entre os que desconhecem o

Espiritismo é supor que, pelo simples fato de estarem desprendidos

Eric Auad
Realce

da matéria, os Espíritos tudo devem saber e estar de posse da

sabedoria suprema. É um erro grave. Não passando de almas dos

homens, os Espíritos não adquirem a perfeição ao deixar o envoltório terreno: seu progresso só se faz paulatinamente, à

medida que se despojam de suas imperfeições e conquistam os

conhecimentos que lhes faltam.

Admitir que o Espírito de um selvagem ou de um criminoso

repentinamente se tornasse sábio e virtuoso seria tão ilógico quanto seria contrário à justiça de Deus admitir que continuasse

eternamente na inferioridade.

Há homens em todas as gradações do saber e da ignorância, da

bondade e da malvadez. O mesmo se dá com os Espíritos. Alguns

destes são apenas frívolos e brincalhões; outros, mentirosos, fraudulentos, hipócritas, vingativos e maus; outros, ao contrário,

possuem as mais sublimes virtudes e o saber em medida

desconhecida na Terra.

Essa diversidade na situação dos Espíritos é um dos mais

importantes pontos a considerar, pois que explica a natureza, boa ou má, das comunicações que se recebem. E todo cuidado deve ser

posto em distingui-las.2

Comunicação com o mundo invisível

22. Desde que sejam admitidas a existência, a sobrevivência e a

individualidade da alma, reduz-se o Espiritismo a uma questão

principal: “Serão possíveis as comunicações entre as almas e os

homens?”

A experiência demonstrou tal possibilidade. Estabelecido o fato das relações entre o mundo visível e o invisível, conhecidos a

natureza, o princípio e a maneira dessas relações, abriu-se novo

campo à observação e foi encontrada a chave de inúmeros

Eric Auad
Realce

problemas. Eliminando a dúvida sobre o futuro, é o Espiritismo um

poderoso elemento de moralização.

23. A idéia falsa que se tem do estado da alma após a morte é que faz brotar na mente de muitos a dúvida sobre a possibilidade

das comunicações de além-túmulo. Imaginam-na como um sopro,

um vapor ou uma coisa vaga, só admissível ao pensamento e que se

evapora e se esvai, não se sabe para onde, mas, talvez, para tão

longe que não compreendem possa voltar à Terra.

Se, entretanto, a considerarmos ligada a um corpo fluídico

semimaterial, constituindo, assim, um ser concreto e individual,

suas relações com os homens não serão incompatíveis com a razão.

24. Vivendo o mundo visível de permeio com o mundo

invisível, em permanente contacto, origina uma contínua reação de um sobre o outro. Disso decorre que desde que houve homens,

também ouve Espíritos e se estes podem manifestar-se, devem tê-lo

feito em todos os tempos e entre todos os povos.

Entretanto, as manifestações dos Espíritos tiveram enorme

desenvolvimento nos últimos tempos e adquiriram um cunho de maior autenticidade, porque estava nos desígnios de Deus pôr

termo à incredulidade e ao materialismo, por meio de provas

evidentes, permitindo aos que deixaram a Terra que viessem

demonstrar a sua existência, revelando-nos a sua situação feliz ou

infeliz.

25. Podem as relações entre o mundo visível e o invisível ser

ocultas ou patentes, espontâneas ou provocadas. Atuam os Espíritos

de modo oculto sobre os homens, sugerindo-lhes idéias, e os

influenciando de modo acintoso, por meio de efeitos registrados

pelos sentidos.

As manifestações espontâneas ocorrem inopinadamente, de

improviso. Freqüentemente se dão entre pessoas inteiramente

estranhas às cogitações espíritas, as quais, por isso mesmo, não

tendo meios de as explicar, as atribuem a causas sobrenaturais. As

provocadas dão-se por influência de certas pessoas dotadas de

faculdades especiais, e designadas pelo nome de médiuns.3

26. Os Espíritos podem manifestar-se por várias maneiras: pela vista, pela audição, pelo tato, fazendo ruídos ou movimentos de

corpos, pela escrita, pelo desenho, pela música, etc..

27. Às vezes se manifestam espontaneamente, por meio de

pancadas e ruídos. É o meio que muito freqüentemente empregam

para indicar a sua presença e chamar a atenção, como fazemos nós ao bater a uma porta, para dar aviso de nossa presença.

Alguns não se limitam a ruídos leves: fazem uma bulha

semelhante à de louça que cai e se parte em pedaços, de portas que

se abrem e se fecham com estrondo, de móveis atirados ao chão;

chegam, até, a produzir grande perturbação e verdadeiros estragos.4

28. O perispírito é matéria etérea, posto que invisível no estado

normal.

Em alguns casos pode o Espírito submeter-se a uma espécie de

modificação molecular, assim se tornando visível e, até, tangível. É

assim que se produzem as aparições, fenômenos que não são mais admiráveis do que o do vapor que, invisível quando muito rarefeito,

torna-se visível pela condensação.

Quando se tornam visíveis, quase sempre os Espíritos se

apresentam com a aparência que tinham em vida, tornando-se,

assim, reconhecíveis.

29. A visão permanente e geral dos Espíritos é muito rara; mas

as aparições isoladas são bastante freqüentes, sobretudo no

momento da morte. Quando deixa o corpo, parece que o Espírito

tem pressa de rever parentes e amigos, como que para os avisar de

que não mais está na Terra, mas que vive ainda.

Se passarmos em revista as nossas recordações, verificaremos

quantos casos verídicos dessa ordem ocorreram conosco, sem que

Eric Auad
Realce

os soubéssemos explicar adequadamente – e não só à noite, durante

o sono, mas de dia, na mais perfeita vigília.

Antigamente esses fatos eram tidos como sobrenaturais e maravilhosos e atribuídos à magia e à feitiçaria. Hoje os incrédulos

os consideram como produtos da imaginação. Mas desde que a

ciência espírita nos deu os elementos para os explicar, ficamos

sabendo como eles se produzem e, ainda, que pertencem à classe

dos fenômenos naturais.

30. Em vida, é por meio do perispírito que o Espírito atua sobre

o corpo; é ainda por esse fluido que ele se manifesta, agindo sobre

a matéria inerte, produzindo ruídos, movendo mesas e levantando,

derrubando ou transportando outros objetos.

Tal fenômeno nada tem de surpreendente, desde que se considere que nossos mais poderosos motores saem dos fluidos

mais rarefeitos e até dos imponderáveis, como o ar, o vapor e a

eletricidade. É também por meio do perispírito que o Espírito faz

que os médiuns falem, escrevam ou desenhem. Desde que não tem

corpo tangível para agir ostensivamente, quando quer manifestar-se serve-se o Espírito do corpo do médium, de cujos órgãos se apossa,

movendo-os como se fossem seus, por meio de um eflúvio com o

qual os envolve e os penetra.

31. No fenômeno das mesas girantes e falantes é ainda pela

mesma maneira que os Espíritos agem sobre o móvel, fazendo-o mover-se sem objetivo determinado ou dando golpes intencionais,

que indicam as letras do alfabeto e formam palavras e frases. É o

fenômeno da tiptologia.

A mesa é simples instrumento de que se serve o Espírito, como

se serve do lápis para escrever; dá-lhe uma vitalidade momentânea, por meio do fluido com que o penetra, mas não se identifica com

ela. As pessoas que, emocionadas, abraçam a mesa diante da

manifestação de um ser amado, praticam um ato ridículo, pois seria

o mesmo que abraçar a bengala com a qual um amigo batesse à

porta. Outro tanto poderíamos dizer das que se dirigem à mesa,

como se o Espírito se achasse entranhado na madeira, ou se a

madeira se tivesse transformado no Espírito.

Por ocasião dessas comunicações o Espírito não está na mesa, mas a seu lado, como aconteceria se estivesse vivo. Aí seria visto,

se então pudesse tornar-se visível.

O mesmo acontece nas comunicações escritas: o Espírito

coloca-se ao lado do médium, dirige-lhe a mão ou lhe transmite o

seu pensamento por meio de uma corrente fluídica.

Quando a mesa se ergue do solo e se libra no espaço sem ponto

de apoio, não é pela força física dos braços que o Espírito a levanta:

é por meio de uma atmosfera fluídica, que a envolve e a

interpenetra. Esse fluido neutraliza a força de gravidade, do mesmo

modo que o ar com os balões e os papagaios de papel. Interpenetrando a mesa, o fluido lhe dá, momentaneamente, menor

peso específico. Quando ela repousa no solo está no mesmo caso da

campânula da máquina pneumática, quando se faz o vácuo.

Isto é uma simples comparação, para mostrar a analogia dos

efeitos, mas não uma identidade de causas.

Quando a mesa persegue alguém, não é o Espírito que corre: ele

pode estar tranqüilo, em seu lugar e apenas lhe dar, por uma

corrente fluídica, o impulso necessário para que se mova à sua

vontade. Nas batidas que se ouvem na mesa ou noutros objetos, não

é o Espírito quem bate com a mão, ou com qualquer objeto: ele lança um jato de fluido no ponto de onde vem o ruído e produz o

efeito de um choque elétrico, modificando os sons, do mesmo

modo que podem modificar-se os que se ouvem no ar.

Fácil é, pois, compreender-se como o Espírito pode erguer uma

pessoa no ar, levantar um móvel qualquer e transportar um objeto de um lugar para outro, ou atirá-lo onde quiser.

Tais fenômenos são regidos por uma mesma lei.

32. Por estas poucas palavras pode-se ver que, seja qual for a

sua natureza, as manifestações espíritas nada têm de sobrenatural

Eric Auad
Realce

ou de maravilhoso: são fenômenos produzidos em virtude da lei

que rege as relações entre o mundo visível e o invisível e que é tão

natural quanto as leis da eletricidade ou da gravidade.

É o Espiritismo a ciência que nos dá a conhecer essa lei, do

mesmo modo que a Mecânica nos ensina as leis do movimento e a

Ótica as da luz. Desde que são um fato natural, as manifestações

espíritas ocorreram em todos os tempos. Uma vez conhecida a lei

que as rege, ficam explicados grande número de problemas que eram tidos como insolúveis; essa lei é a chave de uma porção de

fenômenos explorados e aumentados pela superstição.

33. Afastado o maravilhoso, tais fatos nada apresentam que

repugne à razão, de vez que passam a ter um lugar próprio entre

outros fenômenos naturais. Em tempos de ignorância eram tidos como sobrenaturais todos aqueles efeitos cuja causa era

desconhecida. Mas as descobertas da ciência foram restringindo

continuamente o âmbito do maravilhoso, que o conhecimento da

nova lei acabou por aniquilar.

Assim, pois, os que acusam o Espiritismo de restaurar o maravilhoso provam, por isso mesmo, que falam de uma coisa que

desconhecem.

34. As manifestações espíritas são de duas ordens: efeitos

físicos e comunicações inteligentes. Os primeiros são fenômenos

materiais ostensivos, tais como movimentos, ruídos, transportes de objetos, etc.; os últimos consistem na permuta regular de

pensamentos, quer por meio de sinais, quer por meio da palavra –

principalmente da palavra escrita.

35. As comunicações obtidas dos Espíritos podem ser boas ou

más, exatas ou falsas, profundas ou frívolas, conforme a natureza dos que as transmitem. Os que dão mostras de sabedoria e de

erudição são Espíritos adiantados na senda do progresso; os que

mostram ignorância e maldade ainda são atrasados. Mas com o

tempo hão de progredir.

Eric Auad
Realce

Os Espíritos podem responder apenas sobre aquilo que sabem,

de conformidade com o seu adiantamento e, ainda assim, dentro

dos limites do que lhes é permitido dizer – pois há coisas que não podem revelar, de vez que nem tudo é dado ainda ao homem

conhecer.

36. Da diversidade de aptidões e de qualidades dos Espíritos

decorre que não basta nos dirigirmos a qualquer um para que

obtenhamos resposta certa sobre um assunto qualquer. Em relação a muitas coisas só lhes é possível dar-nos uma opinião pessoal, que

tanto pode estar certa, quanto errada. Se for prudente, não deixará

ele de confessar sua ignorância sobre aquilo que desconhece; se for

frívolo ou mentiroso responderá a todas as perguntas, pouco se

importando com a verdade; se for orgulhoso, dará sua opinião como se fosse uma verdade absoluta.

Por isso diz São João Evangelista:

“Não creiais em todos os Espíritos, mas examinai se eles são de

Deus.”

Mostra a experiência a sabedoria deste conselho. Seria imprudência e leviandade aceitar sem exame tudo aquilo que vem

dos Espíritos. É necessário conhecer bem o caráter dos que estão

em relação conosco.5

37. Pela linguagem se conhece a qualidade dos Espíritos. A dos

verdadeiramente bons e superiores é sempre digna, nobre, lógica e isenta de contradições; transparece sabedoria, benevolência,

modéstia e a mais pura moral; é concisa e sem palavras inúteis. A

dos inferiores, ignorantes ou orgulhosos quase sempre compensa a

nulidade das idéias pela abundância de palavras. Todo pensamento

evidentemente falso, todo ensino contrário à sã moral, todo conselho ridículo, toda expressão grosseira, banal ou apenas

frívola, enfim toda manifestação de malevolência, de arrogância ou

de presunção é sinal inconteste de inferioridade do Espírito.

Eric Auad
Realce

38. Os Espíritos inferiores são mais ou menos ignorantes; seu

horizonte moral é limitado, sua perspicácia reduzida. Têm das

coisas uma idéia geralmente incompleta ou falsa e, ainda mais, conservam os preconceitos terrenos que, muitas vezes, tomam

como verdades. Por isso são incapazes de dar opinião em várias

questões. Voluntária ou involuntariamente podem induzir-nos em

erro sobre coisas que eles próprios não compreendem.

39. Pelo fato de serem inferiores, os Espíritos não são todos maus: alguns são apenas ignorantes e levianos; outros são

brincalhões, alegres e espirituosos e sabem empregar a sátira fina e

mordaz. Ao seu lado, no mundo espiritual, como na Terra,

encontram-se todos os gêneros de perversidade e toda a gradação

de superioridade moral e intelectual.

40. Os Espíritos superiores só se ocupam de comunicações

inteligentes e instrutivas; as manifestações físicas, ou simplesmente

materiais, são antes obra de Espíritos inferiores, vulgarmente

chamados Espíritos batedores, assim como entre nós as provas de

força física são executadas por saltimbancos e não por cientistas.

41. Quando entramos em comunicação com os Espíritos

devemos estar calmos e concentrados; nunca perder de vista que

eles são as almas dos homens e que é inconveniente transformar o

trabalho num brinquedo ou num pretexto para um divertimento. Se

respeitamos os seus despojos mortais, mais ainda devemos respeitar as almas que os animaram.

As reuniões frívolas ou sem objetivo sério fogem, assim, a um

dever. Os que a compõem esquecem que, de um momento para

outro podem passar ao mundo dos Espíritos; e não ficariam

satisfeitos se fossem tratados com desatenção.

42. Há que considerar outro ponto, de idêntica importância: é

que os Espíritos são livres. Só se comunicam quando querem, com

quem lhes convém e quando os seus afazeres o permitem. Não

estão às ordens ou à mercê dos caprichos de quem quer que seja; e

ninguém poderá obrigá-los a vir quando não querem ou a revelar

aquilo que desejam silenciar. Assim, ninguém poderá garantir que

tal Espírito há de responder a esta ou aquela pergunta que lhe for feita. Afirmá-lo é demonstrar ignorância dos princípios mais

elementares do Espiritismo. E só a charlatanice tem princípios

“infalíveis”.

43. Os Espíritos são atraídos pela simpatia, pela semelhança de

gestos e de caracteres ou pela intenção dos que desejam a sua presença. Os superiores não vão às reuniões fúteis, do mesmo modo

que os cientistas da Terra não vão a uma assembléia de jovens

estúrdios. Diz-nos o simples bom-senso que não pode ser de outro

modo. Entretanto, se por acaso algumas vezes ali se mostram é

visando dar salutares conselhos, combater os vícios e reconduzir ao bom caminho aqueles que se haviam transviado. E se não forem

atendidos, retiram-se.

Um juízo completamente errado faz aquele que pensa que os

Espíritos sérios se prestem a responder a futilidades, a perguntas

ociosas, nas quais se revela a pouca afeição e o desrespeito para com ele, bem como o pouco desejo de se instruir. Menos ainda que

venham dar espetáculo para divertir os curiosos.

Se não fariam tal coisa em vida, também não o farão depois de

mortos.

44. A conseqüência das reuniões frívolas é a atração de Espíritos levianos, que apenas buscam ocasião para enganar e

mistificar. Pela mesma razão que os homens graves e sérios não

tomam parte em reuniões de importância medíocre, os Espíritos

sérios só se manifestam em reuniões sérias, que não visem a

curiosidade, mas a instrução. É em tais reuniões que os Espíritos superiores dão os seus ensinamentos.

45. Decorre do que precede que, para ser proveitosa, toda

reunião espírita deve, como primeira condição, ser séria e

homogênea; nela tudo deve passar-se respeitosa, religiosa e

dignamente, desde que se deseje o concurso habitual dos bons

Espíritos. É preciso não esquecer que se essas mesmas entidades a

ela tivessem comparecido em vida, teriam sido tratadas com toda consideração a que têm ainda mais direito depois de mortas.

46. Em vão alegam que certas experiências frívolas, curiosas ou

divertidas são necessárias para convencer os incrédulos. Assim

chegam a um resultado diametralmente oposto. Inclinado a

escarnecer das mais sagradas crenças, não pode o incrédulo ver algo de sério naquilo de que zomba, nem respeitar uma coisa que

lhe não é apresentada de modo respeitável. Por isso habitualmente

se retira com uma impressão má das reuniões banais e levianas, das

reuniões onde não encontra ordem, nem seriedade e recolhimento.

O que principalmente pode convencê-lo é a prova da presença de seres cuja memória lhe é querida; diante de suas palavras sérias

mas suaves, de suas revelações íntimas, é que se comove e

empalidece. Ora, o fato mesmo de respeitar, venerar e amar a

criatura cuja alma lhe apresentam, deixa-o chocado e

escandalizado, por vê-la numa reunião irreverente, entre mesas girantes e piruetas de Espíritos brincalhões. Sua consciência de

incrédulo repele essa mistura de coisas sérias com coisas ridículas,

do religioso com o profano. Então considera tudo como

charlatanice e às vezes sai menos convencido do que ao entrar.

Reuniões dessa natureza ocasionam sempre mais mal do que bem, pois afastam da doutrina mais gente do que atraem. Além do

mais, elas se prestam à crítica dos detratores, que aí encontram

razões fundadas para a sua zombaria.

47. É erro considerar as manifestações físicas como um

brinquedo. Se elas não têm a importância do ensino filosófico, têm utilidade do ponto de vista da fenomenologia, porque constituem o

ABC da ciência, cuja chave nos trouxeram. Posto sejam hoje menos

necessárias, concorrem para a convicção de algumas pessoas.

Mas, de modo algum, são incompatíveis com a ordem e com a

decência que devem presidir essas reuniões experimentais. Se

fossem sempre praticadas com a necessária conveniência,

convenceriam mais facilmente e, sob todos os pontos de vista,

produziriam resultados muito melhores.

48. Alguns fazem das evocações uma idéia muito falsa: crêem

que elas consistem em atrair os mortos com todo o lúgubre aparato

dos túmulos.

O pouco que já dissemos sobre isto basta para dissipar este erro.

Só nos romances, nos contos fantásticos de almas penadas e no teatro é que aparecem os mortos desencarnados saindo dos seus

sepulcros enrolados em mortalhas e chocalhando os ossos.

O Espiritismo jamais fez milagres: nunca os produziu e jamais

pretendeu ressuscitar um corpo morto. Quando o corpo está na

sepultura, dela jamais sairá; mas o ser espiritual, fluídico e inteligente ali não se acha com o invólucro material do qual se

separou no momento da morte. Uma vez operada tal separação,

entre eles nada mais existe de comum.

49. A crítica malévola apresentou as manifestações espíritas

como uma mescla de práticas ridículas da magia e da necromancia. Se as pessoas que falam de Espiritismo sem o conhecer tivessem o

trabalho de o estudar, teriam poupado esse esforço de imaginação,

que apenas serve para demonstrar a sua ignorância e a sua má-

vontade.

Cabe dizer às pessoas estranhas ao Espiritismo que para nos comunicarmos com os Espíritos não há dias, nem lugares, nem

horas mais propícios que outros. Para os evocar não há formas

sacramentais ou cabalísticas; não há necessidade de qualquer

preparação ou iniciação; o emprego de qualquer sinal ou qualquer

objeto material, visando atraí-los ou os repelir nenhum efeito produzem: basta o pensamento. Finalmente, os médiuns recebem as

comunicações tão simples e naturalmente como se recebessem um

ditado de uma criatura viva, sem saírem de seu estado normal.

Só o charlatanismo emprega maneiras esquisitas e acessórios

ridículos. O apelo aos Espíritos é feito em nome de Deus,

respeitosamente e com recolhimento: é o único preceito recomendado às pessoas sérias, que desejam comunicar-se com

Espíritos sérios.

Fim providencial das manifestações

50. O fim providencial das manifestações espíritas é convencer

os incrédulos de que nem tudo se acaba com a vida terrena e dar

aos crentes uma idéia mais justa do futuro. Os bons Espíritos vêm

instruir-nos, visando o nosso melhoramento e o nosso progresso e

não para nos revelar aquilo que ainda não podemos saber ou que apenas o deve ser como resultado do nosso trabalho.

Se bastasse interrogá-lo para conseguir a solução de todas as

questões científicas, ou para fazer descobertas e invenções

rendosas, qualquer ignorante poderia, sem estudar, tornar-se um

cientista e todo preguiçoso poderia ficar rico sem trabalhar. Mas é o que Deus não permite. Os Espíritos ajudam o homem de gênio pela

inspiração oculta, mas não o eximem do trabalho nem o libertam da

investigação, a fim de lhe deixar o mérito.

51. Uma idéia muito errada dos Espíritos formaria aquele que

neles visse apenas os ajudantes dos ledores da buena-dicha. Os Espíritos sérios recusam ocupar-se de coisas fúteis; os frívolos e os

brincalhões tratam de tudo, a tudo respondem, predizem tudo

quanto se queira, sem nenhuma consideração à verdade, e

encontram um malévolo prazer em mistificar as criaturas

demasiado crédulas. Por isso é essencial estar perfeitamente atento sobre a natureza das perguntas que podem ser dirigidas aos

Espíritos.6

52. Fora daquilo que poderá ajudar ao nosso progresso moral,

só incertezas encerram as revelações feitas pelos Espíritos.

A primeira conseqüência má para quem desvia sua faculdade do

seu objetivo providencial é ser mistificado pelos Espíritos

enganadores, que pululam em torno dos homens; a segunda é ficarem dominados por esses mesmos Espíritos que, por meio de

conselhos pérfidos, podem conduzi-lo a verdadeiras desgraças

materiais na Terra; a terceira é perder, após a vida terrena, o fruto

do conhecimento do Espiritismo.

53. Assim, as manifestações espíritas não se destinam a servir aos interesses materiais: sua utilidade reside nas conseqüências

morais decorrentes. Entretanto, se seu resultado fosse unicamente

demonstrar, de modo material, a existência da alma e a sua

imortalidade, já seria muito, porque temos um novo e largo

caminho aberto à filosofia.

Os médiuns

54. Apresentam os médiuns uma grande variedade de aptidões,

que os tornam mais ou menos adequados para a obtenção deste ou daquele fenômeno, deste ou daquele gênero de comunicações.

Conforme tais aptidões eles se dividem em médiuns de efeitos

físicos, de comunicações inteligentes, videntes, falantes, audit ivos,

sensitivos, desenhistas, poliglotas, poetas, músicos, escreventes,

etc..

Não devemos esperar do médium nada que esteja fora dos

limites de sua faculdade. Sem o conhecimento das aptidões

mediúnicas, o observador não achará explicação para certas

dificuldades ou para certas impossibilidades encontradas na

prática.7

55. Os médiuns de efeitos físicos são particularmente mais

aptos para a produção de fenômenos materiais, como os

movimentos, as batidas, etc., com o auxílio de mesas ou outros

objetos. Quando tais fenômenos revelam um pensamento, ou

obedecem a uma vontade, são efeitos inteligentes e, como tal,

denotam uma coisa inteligente. É este um dos modos pelos quais se

manifestam os Espíritos.

Por meio de um número de batidas, previamente

convencionadas, obtém-se a resposta pelo sim ou pelo não, ou,

ainda, a designação das letras do alfabeto, com as quais se formam

palavras e frases.

Esse método primitivo é muito demorado e não permite grande desenvolvimento.

As mesas falantes foram o início da ciência. Hoje, porém, já

existem meios de comunicação tão rápidos e completos como entre

os vivos, de modo que ninguém mais emprega aqueles, a não ser

acidentalmente e como experiência.

56. De todos os meios de comunicação, é a escrita ao mesmo

tempo o mais simples, o mais rápido, o mais cômodo e aquele que

permite maior desenvolvimento. Também é a faculdade que se

encontra com mais freqüência.

57. A princípio, para obter a comunicação escrita, usaram-se meios materiais, como a cesta, a prancheta, etc., munidas de um

lápis.8 Mais tarde foi reconhecida a inutilidade desses acessórios e a

possibilidade dos médiuns escreverem diretamente com a mão,

como nas condições ordinárias.

58. O médium escreve influenciado pelos Espíritos, que dele se servem como de um instrumento. Sua mão é tangida por um

movimento involuntário, que muitas vezes não pode dominar.

Certos médiuns não têm consciência do que escrevem; outros têm

uma vaga idéia, posto que o pensamento lhes seja estranho. E é isto

o que distingue os médiuns mecânicos dos médiuns intuitivos ou dos semimecânicos.

A ciência espírita explica a maneira por que o pensamento do

Espírito é transmitido ao médium e o papel que tem este nas

comunicações.9

59. O médium possui apenas a faculdade de transmitir a

comunicação. Esta, porém, depende da vontade dos Espíritos. Se

eles não se quiserem manifestar, nada conseguirá o médium: será um instrumento sem músico para tocar.

Como os Espíritos só se comunicam quando podem, ou quando

querem, não se acham sujeitos ao capricho de ninguém: nenhum

médium pode forçá-los a se apresentarem. Isto explica a

intermitência da mediunidade – mesmo nos melhores médiuns –, que, por vezes, chega a durar meses.

É, pois, um erro pensar que a mediunidade seja derivada do

talento do médium. O talento se adquire pelo trabalho e quem o

possui é sempre seu senhor, enquanto que o médium jamais é

senhor de sua faculdade: ela depende de uma vontade estranha.

60. Quando os médiuns de efeitos físicos obtêm a produção de

certos fenômenos à vontade e com regularidade – desde que não

haja dolo – é que se acham em relação com Espíritos de baixa

categoria, que se comprazem em tais exibições e que,

possivelmente, foram prestidigitadores na Terra. Seria, então, absurdo pensar que Espíritos – mesmo de pouca elevação – se

divirtam em espetáculos teatrais.

61. A obscuridade necessária à produção de alguns dos efeitos

físicos presta-se a suspeitas, mas nada prova contra a autenticidade

dos fatos. Sabe-se que em Química certas combinações não podem ser realizadas em plena luz; muitas composições e decomposições

se dão sob a ação do fluido luminoso. Ora, todo fenômeno espírita

resulta de uma combinação de fluidos próprios do Espírito com os

fluidos do médium. Como tais fluidos são matéria, não admira que,

em determinadas condições, sua combinação seja contrariada pela ação da luz.

62. As comunicações inteligentes também se realizam pela ação

do fluido do Espírito sobre o médium; é preciso que o fluido do

médium se identifique com o do Espírito. Assim, a facilidade das

comunicações depende do grau de afinidade que se estabeleça entre

os dois fluidos. Cada médium se torna, assim, mais ou menos apto

a receber a impressão ou a impulsão do pensamento deste ou daquele Espírito. Pode ser um bom instrumento para um e péssimo

para outro. Em conseqüência, estando dois médiuns, igualmente

bem dotados, sentados lado a lado, um Espírito talvez só por um

possa manifestar-se.

63. É erro pensar que basta ser médium para receber com a mesma facilidade comunicações de qualquer Espírito. Não há

médiuns universais para as evocações, como não os há com

aptidões para toda sorte de fenômenos. Os Espíritos buscam, de

preferência, os instrumentos mais adequados. Então querer impor-

lhe o primeiro médium de que disponhamos seria o mesmo que querer obrigar um pianista a tocar violino, apenas porque, de vez

que sabe música, poderá tocar qualquer instrumento.

64. As comunicações são impossíveis, ou incompletas, ou,

ainda, falsas, desde que não haja a harmonia só realizada pela

assimilação dos fluidos. Podem ser falsas porque, em lugar do Espírito que se deseja, não faltarão outros que estejam sempre

dispostos a manifestar-se e que pouco se incomodam com a

verdade.

65. Por vezes a assimilação fluídica é absolutamente impossível

entre certos Espíritos e certos médiuns. Outras vezes – e é este o caso mais comum – ela só se estabelece gradativamente, e com o

tempo. Assim se explica que certos Espíritos encontrem maior

facilidade em manifestar-se por certos médiuns, com os quais estão

mais habituados. Também ainda assim se explica por que, quase

sempre, as primeiras comunicações são menos explícitas e denotam um certo constrangimento.

66. Tão necessária é a assimilação fluídica nas comunicações

pela tiptologia quanto pela escrita, visto como, num caso como no

outro, se trata da transmissão do pensamento do Espírito, seja qual

for o meio material para isso empregado.

67. Não se pode impor um médium ao Espírito que se deseja evocar; convém deixar que escolha ele mesmo o seu instrumento.

Em todo caso, é preciso que, antes, o médium se identifique com o

Espírito, pelo recolhimento e pela prece, durante alguns minutos,

ou até durante alguns dias, se possível, de modo que seja ativada a

assimilação fluídica.

68. Quando as condições fluídicas não são favoráveis à

comunicação entre Espírito e médium, pode ela ser feita através do

guia espiritual deste último. Então o pensamento é transmitido de

segunda mão, isto é, atravessa dois intermediários. Compreende-se

a importância de ser o médium bem assistido. Porque, caso seja por um obsessor, ou por um Espírito ignorante ou orgulhoso, a

comunicação poderá ser adulterada.

Neste caso as qualidades pessoais do médium representam,

necessariamente, um papel muito importante, pela natureza dos

Espíritos que atrai. Os mais incorretos médiuns podem possuir faculdades muito poderosas, mas os mais seguros serão os que

aliarem a esse poder as melhores simpatias no mundo espiritual.

Ora, tais simpatias de modo algum são demonstradas pelos nomes,

mais ou menos retumbantes, que subscrevem as comunicações

recebidas pelo médium, mas por ser o seu fundo constantemente bom.

69. Qualquer que seja a forma de comunicação, do ponto de

vista experimental, apresenta a prática espírita numerosas

dificuldades e não se acha isenta de inconvenientes para quem não

tenha a necessária experiência.

Quer se experimente em si mesmo, quer seja apenas um

observador das experiências alheias, é imprescindível que se

saibam distinguir as várias naturezas dos Espíritos que se podem

manifestar, conhecer a causa de todos os fenômenos, as condições

em que os mesmos podem ser produzidos e os obstáculos que é

preciso vencer, a fim de que não se perca tempo pedindo coisas

impossíveis.

É também indispensável conhecer todas as condições e todos os

escolhos da mediunidade, a influência do meio, a das disposições

morais, etc..10

Escolhos da mediunidade

70. Um dos maiores escolhos da mediunidade é a obsessão, ou

domínio que certos Espíritos podem exercer sobre os médiuns,

apresentando-se com nomes supostos e impedindo que por eles se

manifestem outros Espíritos. Isto constitui, também, um perigo em que esbarra todo observador novato e inexperiente, que,

desconhecendo as características desse fenômeno, pode enganar-se

pelas aparências, do mesmo modo que aquele que desconhece a

medicina pode enganar-se quanto à causa e a natureza de uma

doença.

Se, neste caso, o estudo prévio é vantajoso para o observador,

torna-se indispensável para o médium, pois lhe fornece os meios de

prevenir um inconveniente que lhe pode acarretar desagradáveis

conseqüências. Por isso toda recomendação é pouco para que o

estudo preceda sempre a prática.11

71. Apresenta a obsessão três graus bem característicos: a

obsessão simples, a fascinação e a subjugação. No primeiro tem o

médium inteira consciência de que nada obtém de bom; não se

engana quanto à natureza do Espírito que teima em se manifestar e

do qual deseja livrar-se. Tal caso não oferece gravidade: é um simples aborrecimento, do qual se liberta o médium se deixar, no

momento, de escrever. Cansado por não se ver atendido, o Espírito

acaba se retirando.

A fascinação é muito mais grave, porque o médium fica

perfeitamente iludido. O Espírito que o domina conquista-lhe a

confiança a ponto de lhe paralisar a capacidade de julgar as comunicações recebidas e lhe fazer considerar sublimes os maiores

absurdos.

O caráter marcante desse gênero de obsessão é a provocação de

uma extrema susceptibilidade do médium, o qual é levado a só

admitir como bom, justo e certo aquilo que ele próprio escreve, ao mesmo tempo em que repele todo conselho e toda crítica. Então

rompe com os amigos, ao invés de se convencer de que é enganado;

alimenta inveja contra os outros médiuns, cujas comunicações

sejam consideradas melhores que as suas; e, por fim, quer impor-se

nas reuniões espíritas, de onde se afasta, desde que não as possa dominar.

Essa atuação do Espírito pode ir ao ponto de arrastar o indivíduo

a dar passos ainda mais ridículos e comprometedores.

72. Um dos caracteres distintivos dos Espíritos maus é a

imposição. Dão ordens e querem ser obedecidos. Os bons jamais impõem: dão conselhos e quando não escutados retiram-se.

Decorre daí que a impressão deixada pelos maus Espíritos é

sempre penosa e fatigante. Muitas vezes causa uma agitação febril,

movimentos bruscos e desordenados. Ao contrário, a dos bons é

calma, suave e agradável.

73. A subjugação, outrora chamada possessão, é um

constrangimento físico que exercem Espíritos da pior espécie e que

pode chegar até à anulação do livre-arbítrio do paciente. Muitas

vezes, porém, se reduz a simples impressões desagradáveis; outras

vezes provoca movimentos desordenados, atos insensatos, gritos, palavrões, frases incoerentes, cujo ridículo o subjugado por vezes

compreende mas não pode evitar.

Esse estado difere fundamentalmente da loucura patológica,

com a qual erroneamente a confundem, por isso que a sua causa

não é uma lesão orgânica. Assim, diversa sendo a origem, diversos

devem ser os processos de cura. A aplicação do processo ordinário

de duchas e tratamento corporal por vezes chega a determinar uma loucura verdadeira naquele que apenas sofria uma enfermidade

moral.

74. Na loucura propriamente dita a causa do mal é orgânica. É

preciso restituir ao organismo o seu estado normal; na subjugação a

causa é espiritual; é preciso livrar o doente de um inimigo invisível – não por meio de medicamentos, mas opondo uma força moral

superior à dele.

Em tal caso a experiência tem provado que jamais os

exorcismos deram resultados satisfatórios: ao invés de minorar a

situação, agravam-na.

Apontando a verdadeira causa do mal, só o Espiritismo pode

oferecer o meio de combatê-lo: a educação moral do obsessor. Por

meio de conselhos bem dirigidos, consegue-se torná-lo melhor e

fazer que renuncie voluntariamente aos tormentos que causa ao

enfermo. Este, assim, fica livre.12

75. Geralmente a subjugação é individual. Entretanto, quando

uma legião de Espíritos maus cai sobre uma povoação, pode

apresentar um caráter epidêmico.

Foi um fenômeno idêntico que se verificou ao tempo de Jesus.

E, então só um poder moral superior poderia dominar esses seres malfazejos, chamados demônios, e restabelecer a calma das

vítimas.

76. Há que considerar um fato importante: é que, seja qual for a

sua natureza, a obsessão independe do exercício da mediunidade e

se manifesta em todos os graus, principalmente no último, em grande número de criaturas que jamais ouviram falar de

Espiritismo.

Na verdade, desde que os Espíritos têm existido de todos os

tempos, sempre têm exercido influência; a mediunidade não é causa

– é simples meio de manifestação dessa influência. Assim, pode-se

dizer com segurança que todo médium obsidiado sofre de um modo

qualquer e, freqüentemente, nos atos mais comezinhos da vida, os efeitos de tal influência. Se não fora a mediunidade, a influência

seria levada à conta de certas enfermidades misteriosas, que

escapam à investigação dos médicos. Pela mediunidade o Espírito

malévolo denuncia a sua presença; sem ela, permaneceria oculto e

ninguém o suspeitaria.

77. Aqueles que negam tudo quanto não afeta os sentidos não

admitem essa causa oculta. Quando, porém, a Ciência tiver saído

do caminho materialista, reconhecerá na ação do mundo invisível,

que nos envolve, e em cujo meio nós vivemos, uma força que tanto

reage sobre as coisas físicas quanto sobre as morais. Será um novo caminho rasgado ao progresso e a chave de uma porção de

fenômenos até agora mal compreendidos.

78. Desde que a obsessão jamais poderá ser causada por um

bom Espírito, é essencial saber-se reconhecer a natureza daqueles

que se apresentam. O médium não esclarecido pode ser enganado pelas aparências; mas o médium prevenido percebe o menor sinal

suspeito. Então, percebendo que nada poderá fazer, o Espírito se

retira.

O conhecimento prévio dos meios de distinguir bons e maus

Espíritos é, assim, indispensável aos médiuns que não querem expor-se a uma armadilha. Também o é ao mero observador, que,

por esse meio, pode aquilatar o valor do que vê e do que ouve.13

Qualidades dos médiuns

79. A faculdade mediúnica é uma propriedade orgânica; não

depende das qualidades morais do médium; mostra-se-nos em

diversos graus da escala moral. O mesmo não se dá, entretanto,

com a preferência que os bons Espíritos dão aos médiuns.

80. Os bons Espíritos comunicam-se mais ou menos

espontaneamente, por este ou aquele médium, conforme a simpatia

que lhes inspiram. A boa ou má qualidade dos médiuns não deve ser aquilatada pela maior ou menor facilidade com que recebe as

comunicações, mas por sua aptidão em receber apenas bons

Espíritos e não ser joguete de Espíritos zombeteiros.

81. Por vezes os médiuns de menor padrão de moralidade

recebem excelentes comunicações que não poderiam vir senão de Espíritos bons. Isto, porém, não deve causar espanto; elas sempre

vêm com o objetivo de lhes dar sábios conselhos.

Se os médiuns os desprezam, maior será a sua culpa, porque

lavram a sua própria condenação. Deus, na sua infinita bondade,

não pode recusar assistência àqueles que dela mais necessitam. O virtuoso missionário que vai pregar aos criminosos procede como

os bons Espíritos com os médiuns imperfeitos.

Por outro lado, querendo dar a todos um ensino útil, servem-se

os bons Espíritos do instrumento de que dispõem; mas o deixam

assim que encontram outro mais simpático e que melhor aproveite as suas lições.

Com a retirada dos bons, os Espíritos inferiores, que pouco se

incomodam com as qualidades morais dos médiuns, encontram o

campo livre.

Em conseqüência, os médiuns moralmente imperfeitos, os que não procuram emendar-se, mais cedo ou mais tarde são presas dos

maus Espíritos, que por vezes os conduzem à ruína e às maiores

desgraças, ainda na vida terrena. Então a sua mediunidade,

inicialmente tão bela, e que assim poderia ter sido conservada, se

perverte e finalmente se perde, abandonada dos bons Espíritos.

82. Não se acham os médiuns de maior merecimento a salvo

das mistificações dos Espíritos embusteiros. Primeiro, porque entre

nós ainda não há criaturas suficientemente perfeitas e que não

apresentem um lado fraco, o qual dá acesso aos maus Espíritos;

segundo, porque às vezes os bons Espíritos permitem que os maus

se manifestem, a fim de que exercitemos a nossa razão e

aprendamos a distinguir a verdade do erro e fiquemos de prevenção, não aceitando cegamente e sem maior exame tudo

quanto nos vem dos Espíritos. Entretanto, jamais um bom Espírito

nos virá enganar. O erro, seja qual for o nome com que se acoberte,

vem sempre de uma fonte má. Podem, ainda, essas mistificações

ser uma prova para a paciência e para a perseverança de um espírita, quer seja médium, quer não o seja. Os que desanimam com

as decepções dão aos bons Espíritos uma prova de que não são

instrumentos de confiança.

83. Não é para admirar que os maus Espíritos possam obsidiar

criaturas de valor, pois na Terra também se encontram homens de bem perseguidos pelos que não o são.

É digna de nota a diminuição do número de médiuns obsidiados

após a publicação de O Livro dos Médiuns. Compreende-se que,

estando prevenidos, conservem-se vigilantes e notem os mais leves

indícios que denunciam a presença dos mistificadores.

A maioria dos que ainda se mostram em tal estado ou não

fizeram o recomendado estudo prévio, ou não deram importância

aos conselhos recebidos.

84. Aquilo que realmente constitui o médium é a faculdade

mediúnica. Sob tal ponto de vista, pode ser mais ou menos formado, mais ou menos desenvolvido.

Médium seguro, que pode, na verdade, ser considerado bom

médium, é aquele que aplica a sua faculdade visando tornar-se apto

a servir de intérprete aos bons Espíritos. O poder que tem o

médium de atrair bons Espíritos e repelir os maus está na razão direta de sua superioridade moral e da posse de maior número de

qualidades que constituem o homem de bem. É por elas que

atraímos a simpatia dos bons Espíritos e adquirimos ascendente

sobre os maus.

85. Pelas mesmas razões, as imperfeições morais do médium o

aproximam da natureza dos maus Espíritos, tiram-lhe a força

necessária para os afastar de si e, ao invés de se lhes impor, sofre a imposição deles.

Isto não só se aplica aos médiuns, mas a todas as pessoas,

indiscriminadamente, visto como não há ninguém que não esteja

sujeito à influência dos Espíritos.14

86. Com o fito de se imporem ao médium, os maus Espíritos sabem explorar com habilidade todas as suas fraquezas. E dos

nossos defeitos, é o orgulho aquele que mais os atrai, por ser o

sentimento predominante na maior parte dos médiuns obsidiados e,

notadamente, dos fascinados. É o orgulho que os leva a se

considerarem infalíveis e a repelir todos os conselhos. Infelizmente, tal sentimento é excitado pelos elogios que lhes são feitos. Basta

que um médium apresente uma faculdade levemente transcendente

para que o procurem e o adulem. Isso dá lugar a que exagere a sua

importância e se considere indispensável – o que constitui a sua

perda.

87. Ao contrário do médium imperfeito, que se orgulha dos

nomes ilustres – mas quase sempre apócrifos – que subscrevem as

comunicações por ele recebidas, e se julga um intérprete das forças

celestes, o bom médium jamais se crê bastante digno de tal favor:

tem sempre uma saudável desconfiança do mérito daquilo que recebe e não confia em seu próprio julgamento. Como é apenas um

instrumento passivo, compreende que as boas mensagens nenhum

mérito pessoal lhe conferem, do mesmo modo que nenhuma

responsabilidade teria se fossem más; e mais: que seria ridículo

acreditar na identidade absoluta e insofismável dos Espíritos que se manifestam por seu intermédio.

O bom médium deixa que pessoas desinteressadas julguem o

seu trabalho, sem que o seu amor-próprio se sinta ferido por

qualquer opinião desfavorável, da mesma maneira que um ator não

se sentirá melindrado pelas críticas feitas à peça que representa.

Seu caráter marcante é a simplicidade e a modéstia. Sente-se feliz

com a faculdade que possui, não por vaidade, mas porque lhe é um

meio de tornar-se útil – o que faz de boa-vontade, sempre que se lhe oferece uma oportunidade – e jamais se incomoda quando

outros médiuns são preferidos.

São os médiuns os intermediários, os intérpretes dos Espíritos.

Ao evocador, como ao simples observador, cabe apreciar o valor do

instrumento.

88. Do mesmo modo que as outras faculdades, é a mediunidade

um dom de Deus, que tanto pode ser empregado para o bem quanto

para o mal e do qual, pois, pode-se abusar. Seu fim é nos pôr em

comunicação direta com as almas dos que viveram, a fim de

recebermos ensinamentos e nos adaptarmos às necessidades da vida futura. Do mesmo modo que a vista nos põe em relação com seu

mundo visível, a mediunidade nos põe com o mundo invisível.

Aquele que utiliza a mediunidade para o adiantamento próprio e

o de seus irmãos desempenha uma verdadeira missão, pelo que será

premiado. Aquele que abusa, empregando-a em coisas fúteis ou para satisfação de interesses materiais, a desvia de seu objetivo

providencial e, mais cedo ou mais tarde, será punido, como todos

aqueles que fazem mau uso de qualquer faculdade.

Charlatanismo

89. Certas manifestações espíritas muito facilmente se prestam

a ser imitadas. Mas, pelo fato de terem sido exploradas por

charlatães e prestidigitadores, assim como o fazem com tantas

outras coisas sérias, seria absurdo pensar que não sejam reais e que sejam sempre produto do charlatanismo.

Quem estudou e sabe quais as condições normais em que as

mesmas podem dar-se, logo distingue o que é realidade do que é

imitação. Além do mais, a imitação nunca pode ser completa: só

engana os ignorantes, os incapazes de distinguir as características

do verdadeiro fenômeno.

90. As manifestações que se podem mais facilmente imitar são as de efeitos físicos e as de efeitos inteligentes mais vulgares, tais

como os movimentos, as batidas, os transportes, a escrita direta, as

respostas banais, etc.. Já o mesmo não acontece com as

comunicações inteligentes e de elevado alcance. A imitação das

primeiras apenas exige habilidade e destreza; enquanto que para simular estas últimas quase sempre é necessário uma instrução

acima do comum, uma excepcional superioridade intelectiva e, por

assim dizer, uma faculdade onímoda de improvisação.

91. Geralmente, aqueles que desconhecem o Espiritismo são

levados a duvidar da boa-fé dos médiuns. Só o estudo e a experiência lhes poderão fornecer meios de verificar a

autenticidade dos fatos. Fora disso a melhor garantia reside no

absoluto desinteresse e na honestidade do médium. Pessoas há que,

dados o seu caráter e a sua posição, se acham acima de qualquer

suspeita. Se a tentação do ganho pode excitar a fraude, diz o bom-senso que o charlatanismo não pode estar onde não houver

possibilidade de lucro.15

92. Como em tudo, entre os adeptos do Espiritismo encontram-

se entusiastas. São os piores propagandistas, pois a facilidade com

que tudo aceitam sem exame desperta a desconfiança. O espírita esclarecido repele esse entusiasmo que cega: observa fria e

calmamente, assim evitando as ilusões e as mistificações. De lado a

questão de boa-fé, deve o observador novato atender à gravidade

daqueles a quem se dirige.

Identidade dos Espíritos

93. Desde que todos os defeitos da humanidade são encontrados

entre os Espíritos, não é possível deixar de haver a mentira e o

ardil. Alguns não têm o mínimo escrúpulo em se apresentar sob

nomes muito respeitáveis, a fim de inspirarem maior confiança.

Devemos, então, abster-nos de acreditar de modo absoluto na autenticidade de todas as assinaturas deixadas pelos Espíritos.

94. Uma das grandes dificuldades do Espiritismo prático é a

identidade. Por vezes impossível é estabelecê-la, principalmente no

caso de Espíritos superiores, que viveram em épocas muito

remotas.

Entretanto, muitos dos que se manifestam não têm nomes para

nós. Então, para fixarem as nossas idéias, podem adotar o nome de

um Espírito conhecido e do seu próprio nível. Assim, se um

Espírito se comunicar dizendo-se, por exemplo, São Pedro, nada

prova que seja realmente o apóstolo do mesmo nome. Tanto pode sê-lo, quanto pode ser outro da mesma ordem ou, ainda, um

enviado seu. Em tais casos, a questão de identidade é

absolutamente secundária e seria pueril ligar-lhe maior

importância: importante é a natureza do ensinamento; importante é

saber se é bom ou mau, digno ou indigno de quem o assina, se o autor aceitaria ou não. Este é o problema.

95. Verifica-se mais facilmente a identidade quando se trata de

Espíritos contemporâneos, cujos hábitos e cujo caráter eram

conhecidos, de vez que é por esses hábitos e por essas

peculiaridades da vida privada que a identidade se estabelece com mais segurança e, por vezes, até, de modo incontestável.

Ao evocar-se um amigo ou um parente, o que interessa é a

personalidade; então é muitíssimo natural que se procure

estabelecer a identidade. Entretanto os meios geralmente

empregados para tal fim por aqueles que só imperfeitamente conhecem o Espiritismo não são suficientes e podem induzir em

erro.

96. A identidade do Espírito é revelada por inúmeras

circunstâncias, que se patenteiam nas comunicações; nelas ele

reflete os seus hábitos, a sua linguagem, o seu caráter e, até, certas

expressões familiares. Revela-se ainda nos detalhes íntimos em

que, espontaneamente, participa com as pessoas que lhe são queridas.

São estas as melhores provas. Entretanto é raro que respondam

às perguntas diretas feitas a esse respeito, principalmente quando

tais perguntas partem de criaturas que lhes são indiferentes e que o

interrogam por curiosidade ou visando obter provas.

O Espírito prova a sua identidade como quer, ou como pode.

Isso depende do gênero de mediunidade do seu intermediário. Por

vezes tais provas são abundantes. O mal está em querer-se que o

Espírito as dê conforme deseja o evocador. Neste caso ele recusa

sujeitar-se às exigências.16

Contradições

97. As contradições notadas com mais freqüência na linguagem

dos Espíritos só devem causar admiração às pessoas que possuem do Espiritismo um conhecimento incompleto. São elas devidas à

própria natureza dos Espíritos que, conforme temos dito, têm das

coisas um conhecimento proporcional ao seu adiantamento e entre

os quais muitos sabem menos que certos homens.

Relativamente a uma porção de assuntos, muitos apenas externam uma opinião pessoal, que pode estar mais ou menos certa,

mas conserva ainda um reflexo dos preconceitos terrenos, dos quais

ainda não se libertaram. Outros arquitetam sistemas a respeito de

coisas que desconhecem, principalmente a propósito de questões

científicas e da origem das coisas. Assim, pois, não é de admirar que nem sempre eles estejam de acordo.

98. Admiram-se certas criaturas quando encontram

comunicações contraditórias, assinadas com o mesmo nome.

Só os Espíritos inferiores mudam de linguagem, conforme as

circunstâncias. Os superiores, porém, jamais se contradizem.17

Por pouco conhecedores que sejamos dos segredos do mundo espiritual, é sabida a facilidade com que certos Espíritos trocam de

nome, a fim de darem mais prestígio às suas palavras. Daí poder

concluir-se, com toda certeza, que de duas comunicações

essencialmente contraditórias mas subscritas pelo mesmo nome

respeitável, pelo menos uma é apócrifa.

99. Há dois meios para fixar as idéias sobre as questões

duvidosas. O primeiro é submeter todas as comunicações ao severo

exame da razão, do bom-senso e da lógica; é a recomendação feita

por todos os bons Espíritos, mas a que fogem os maus, pois sabem

que só terão a perder com um exame severo. Por essa razão evitam a discussão e querem ser acreditados sob palavra.

O segundo critério da verdade está na concordância do ensino.

Quando o mesmo princípio é ensinado em vários lugares, por

Espíritos diversos e médiuns que reciprocamente se desconhecem,

que não se acham debaixo das mesmas influências, pode-se concluir que ele mais se aproxima da verdade do que o que deriva

de uma fonte única e é contraditado pela maioria.

Conseqüências do Espiritismo

100. Ante a incerteza das revelações feitas pelos Espíritos,

perguntar-se-á: Então, para que serve o estudo do Espiritismo?

Para provar materialmente a existência do mundo espiritual.

Sendo este formado pelas almas dos que viveram, daí decorre a

prova da existência da alma e da sua sobrevivência ao corpo. Manifestando-se, manifestam as almas, do mesmo passo, alegria ou

sofrimento, conforme a maneira por que viveram a vida terrena.

Daí a prova das penas e recompensas futuras. Quando nos

descrevem o seu estado ou a sua situação, as almas ou Espíritos

corrigem as falsas idéias que faziam da vida futura e, sobretudo, da

natureza e da duração de suas penas. Assim, a vida futura passa de

vaga teoria insegura a um fato adquirido e positivo; desperta a necessidade de trabalhar-se o mais possível na existência presente,

tão breve, em favor da existência futura, que é infinita.

Admitamos que um rapaz de vinte anos adquirisse a certeza de

que iria morrer aos vinte e cinco anos. O que faria nesse lapso de

cinco anos que lhe restam? trabalharia para o futuro? Certo que não: procuraria gozar o mais possível, pois acreditaria que fosse

uma tolice sujeitar-se sem proveito a fadigas e privações.

Entretanto, se tiver a certeza de viver até os oitenta anos, outro será

o seu procedimento, porque compreenderá que necessita sacrificar

alguns instantes do repouso atual a fim de assegurar o repouso futuro durante longos anos.

Dá-se o mesmo com os que têm certeza da vida futura. A dúvida

sobre este ponto conduz naturalmente a sacrificar tudo aos gozos da

vida presente e, conseqüentemente, a ligar demasiada importância

aos bens materiais. A importância atribuída a estes excita a cobiça, a inveja, o ciúme daqueles que têm pouco contra os que têm muito.

Da cobiça ao desejo de adquirir a qualquer preço aquilo que o

vizinho possui vai apenas um passo. Daí os ódios, as disputas, os

processos, as guerras e todos os males gerados pelo egoísmo.

Com a dúvida sobre o futuro e acabrunhado pelo infortúnio e pelos desgostos desta existência, somente na morte vê o homem um

termo aos seus padecimentos. Então, nada esperando, considera

racional abreviá-la pelo suicídio. É natural que, sem esperança no

futuro, o homem sofre e se desespera com as decepções

experimentadas. Os abalos violentos que sente repercutem no seu cérebro e são a causa de muitos casos de loucura.

Sem a vida futura a existência terrena se converte para o homem

em coisa capital, em objeto exclusivo de suas preocupações, e a ela

tudo se subordina. Por isso mesmo quer desfrutar, a qualquer preço,

não só todos os bens materiais, como também as honras. Deseja brilhar e elevar-se acima de todos, ofuscar o próximo com o seu

luxo e posição. Daí a desordenada ambição que liga aos títulos e a

todos os enfeites da vaidade, aos quais chega a sacrificar a própria

honra, de vez que nada enxergue além disso.

A certeza da vida futura, com todas as suas conseqüências,

transforma completamente a ordem de suas idéias, fazendo-lhe ver

as coisas por outro prisma: é um véu que se ergue e lhe desvenda

um horizonte imenso e esplêndido.

Diante da infinidade e da grandeza da vida além da morte, a existência terrena desaparece, como um segundo na contagem dos

séculos, como um grão de areia ao lado da montanha. Tudo se torna

pequeno e mesquinho e nos admiramos por havermos dado tanta

importância às coisas efêmeras e infantis. Daí, em meio às

vicissitudes da existência, uma calma e uma tranqüilidade que constituem uma felicidade, comparados com as desordens e os

tormentos a que nos sujeitamos, ao buscarmos nos elevar acima dos

outros; daí, também, ante as vicissitudes e as decepções, uma

indiferença, que tira quaisquer motivos de desespero, afasta os mais

numerosos casos de loucura e remove, automaticamente, a idéia de suicídio.

A certeza do futuro dá ao homem esperança e resignação; a

dúvida lhe tira a paciência, porque ele nada espera do presente.

O exemplo dos que viveram prova que a soma de felicidade

futura está na razão do progresso realizado e do bem que se haja praticado, enquanto que a soma de desventuras está na razão dos

vícios e das más ações. Isto produz naqueles que estejam convictos

desta verdade uma tendência naturalíssima para fazer o bem e

evitar o mal.

Quando a maioria dos homens estiver convencida dessa verdade, quando professar esses princípios e praticar o bem, o bem

triunfará sobre o mal aqui na Terra; os homens não mais se

molestarão reciprocamente; reorganizarão as suas instituições

sociais visando o bem geral e não o proveito de uns poucos; numa

palavra, compreenderão que a lei da Caridade, ensinada por Jesus

Cristo, é a fonte da felicidade, já aqui na Terra, e basearão as leis

civis sobre a lei da Caridade.

A constatação da existência do mundo espiritual, que nos rodeia, e de sua ação sobre o mundo corpóreo é a revelação de uma

das forças da Natureza e, conseqüentemente, a chave de uma

porção de fenômenos até agora incompreendidos, quer na ordem

física, quer na ordem moral.

Quando a Ciência tomar em consideração essa nova força até agora desconhecida, corrigirá um grande número de erros

resultantes de se atribuir tudo a uma causa única – a matéria. O

reconhecimento dessa nova causa nos fenômenos da Natureza será

uma alavanca para o progresso e terá um efeito semelhante ao de

outro agente novo qualquer.

Com o auxílio da lei espírita, alargar-se-ão os horizontes da

Ciência, como se alargaram com o da lei da gravitação. Quando, do

alto de suas cátedras, os cientistas proclamarem a existência do

mundo espiritual e a sua participação nos fenômenos da vida, eles

inocularão na mocidade o antídoto das idéias materialistas, em vez de as predisporem para a negação do futuro.

Nas aulas de filosofia clássica ensinam os mestres a existência

da alma e os seus atributos, de acordo com as várias escolas, mas

sem as provas materiais. Não é esquisito que, ao se lhes fornecerem

as provas de que carecem, eles as repilam e as classifiquem de superstições? Não será a mesma coisa que se dissessem aos seus

discípulos: ensinamos a existência da alma, mas o nosso ensino não

se baseia em nenhuma prova?

Quando um cientista erige uma hipótese sobre determinado

ponto de ciência, empenha-se e acolhe com prazer tudo quanto possa demonstrar a exatidão daquela hipótese. Como é, então, que

um professor de filosofia, cujo dever é provar aos seus alunos que

eles possuem uma alma, impugna os meios de lhes dar disso uma

demonstração patente?

101. Admitamos sejam os Espíritos incapazes de informações

sobre algo além daquilo que sabemos ou além daquilo que, por nós

próprios, podemos vir a saber. Mas a demonstração da vida espiritual, que nos dão eles, conduzirá indubitavelmente a uma

revolução no terreno das idéias. Ora, uma revolução neste terreno

não poderá deixar de produzir uma outra, na ordem mesma das

coisas. Tal é a revolução que o Espiritismo prepara.

102. Entretanto os Espíritos fazem mais do que isso. Se suas revelações estão cercadas de umas tantas dificuldades e exigem

grandes precauções para que sua exatidão fique bem comprovada,

não é menos certo que, quando bem interrogados, ou quando lhes é

permitido, os Espíritos esclarecidos nos possam revelar fatos

desconhecidos, dar explicações daquilo que não compreendíamos e nos encaminhar para um progresso muito mais rápido.

É principalmente nisto que o estudo completo e cuidadoso da

ciência espírita se torna indispensável, para que a ela só peçamos

aquilo que ela nos pode dar e só o peçamos de modo por que no-lo

pode dar. Ultrapassando estes precisos limites, arriscamo-nos a ser enganados.

103. As menores causas podem produzir os maiores efeitos.

Assim é que da pequenina semente brota a árvore gigantesca; que a

queda de um fruto permitiu se descobrisse a lei que rege o

equilíbrio dos mundos; que a pata de uma rã revelou a energia galvânica; e que do fenômeno banal das mesas girantes saiu a prova

da existência do mundo invisível e, daí, uma doutrina que, em

poucos anos, fez a volta ao mundo e poderá regenerá-lo, fazendo-o

reconhecer a realidade da vida futura.

104. Não ensina o Espiritismo verdades absolutamente novas, pois, conforme o provérbio, nada há de novo debaixo do Sol. Só as

verdades eternas são absolutas; as que o Espiritismo proclama estão

baseadas nas leis da natureza e, pois, existiram de todo o tempo;

seus germes são encontrados em todas as épocas; mas agora se

acham mais desenvolvidos por estudos mais completos e

observações mais cuidadas. Assim, as verdades ensinadas pelo

Espiritismo são mais conseqüências do que descobertas.

O Espiritismo nem descobriu, nem inventou os Espíritos; também não descobriu o mundo espiritual, no qual se acreditou em

todas as épocas. Mas prova essa existência pelos fatos materiais;

apresenta-a em sua verdadeira luz; desembaraça-a dos preconceitos

e das regras supersticiosas, que geram a dúvida e a incredulidade.

* * *

Nota: Posto que incompletas, essas explicações são suficientes

para demonstrar a base sobre a qual se assenta o Espiritismo, assim

como o caráter das manifestações e o grau de confiança que,

conforme as circunstâncias, estas podem merecer.

Segunda Parte Solução de Problemas pela

Doutrina Espírita

Pluralidade dos mundos

105. Serão habitados, como a Terra, os vários mundos que

rolam no espaço?

– Os Espíritos o afirmam e diz-nos a razão que assim deve ser.

Desde que a Terra não ocupa nenhuma posição especial no

Universo, nem pelo volume, nem pela posição relativa, não deve

possuir o privilégio exclusivo da habitabilidade. Além disso, Deus

não teria criado essas miríades de globos com o fim exclusivo de recrear os nossos olhos, tanto mais quanto é certo que a maioria

deles se acha fora do nosso alcance visual.18

106. Se esses mundos são habitados, seus habitantes serão em

tudo semelhantes a nós da Terra? Por outras palavras, poderiam

viver entre nós e nós entre eles?

– A forma geral poderia ser mais ou menos a mesma; entretanto

o organismo deve ser adaptado ao meio onde há de viver, do

mesmo modo que os peixes o são para viver na água e os pássaros

no ar. Se o meio for diferente – e tudo leva a crer que o seja,

conforme parece demonstrado pelas observações astronômicas – diferente deve ser a organização. Assim, então, não é provável que,

no seu estado normal, os seres mudem de mundo com os corpos

que tinham em outros. Aliás é o que afirmam os Espíritos.

107. Supondo que esses mundos sejam habitados, estariam eles

na mesma categoria que o nosso, do ponto de vista moral e intelectual?

– De acordo com o ensino dado pelos Espíritos, muito variados

são os graus de progresso dos mundos. Uns se acham no mesmo

ponto que o nosso; outros mais atrasados, com uma humanidade

mais bruta, mais material e mais inclinada para o mal. Outros,

porém, já se encontram muito mais adiantados quer física, quer moral e intelectualmente. Nesses mundos o mal moral é

desconhecido, as ciências e as artes já atingiram um grau de

perfeição que não nos é dado compreender; sua organização física,

menos material, não se acha sujeita ao sofrimento, às enfermidades:

aí os homens vivem em paz, não procuram prejudicar os seus semelhantes, estão livres de desgostos, de cuidados, de aflições e

das necessidades que os preocupam na Terra.

Finalmente existem mundos ainda mais adiantados, nos quais o

envoltório corporal é quase fluídico e se aproxima sempre mais da

natureza angélica.

Na série gradativa dos mundos, o nosso não ocupa o primeiro

nem o último lugar; é um dos mais materializados e dos mais

atrasados.19

A alma

108. Qual a sede da alma?

– A alma não se acha localizada num determinado ponto do

corpo, como geralmente se pensa: ela forma com o perispírito um

conjunto fluídico penetrável e se assimila a todo o corpo, com o qual constitui um ser complexo. Assim, a morte não passa de um

desdobramento. Poderíamos comparar a criatura a dois corpos

semelhantes na forma, interpenetrados um no outro durante a vida,

mas separados depois da morte.

Por ocasião da morte um é destruído, enquanto que o outro subsiste. Durante a vida a alma atua mais particularmente sobre os

órgãos do pensamento e do sentimento: é, ao mesmo tempo, interna

e exterior, isto é, irradia de dentro para fora. Pode até isolar-se do

corpo, transportar-se para longe e manifestar a sua presença.

Provam-no as observações e os fenômenos do sonambulismo.

109. A alma é criada ao mesmo tempo que o corpo ou lhe é anterior?

– Depois da existência da alma esta constitui uma das mais

importantes questões, por isso que de sua solução decorrem

conseqüências de alta significação. É a única capaz de explicar um

grande número de problemas até aqui insolúveis, por não o haverem analisado.

Uma de duas: ou existia a alma antes da formação do corpo, ou

não existia. Não há meio termo.

Com a preexistência da alma tudo é explicado natural e

logicamente. Sem a sua preexistência surgem dificuldades a cada passo: certos dogmas da Igreja ficam sem justificação. Isto tem

conduzido à incredulidade muitos homens que pensam.

A questão foi resolvida afirmativamente pelos Espíritos; e os

fatos, bem como a lógica, nenhuma dúvida deixam a respeito da

preexistência. Admitida esta, ao menos como hipótese, a maior parte das dificuldades serão aplainadas.

110. Se a alma existisse antes da formação do corpo, tinha

individualidade e consciência de si mesma?

– A não individualidade e a não consciência equivaleriam à não

existência.

111. Antes de unir-se ao corpo a alma já havia realizado algum

progresso ou se encontrava estacionária?

– O progresso anterior da alma tanto é demonstrado pela

observação dos fatos quanto pelo ensino dos Espíritos.

112. Criou Deus as almas moral e intelectualmente iguais ou teria feito umas mais inteligentes e perfeitas do que outras?

– Se Deus as houvesse feito umas mais perfeitas do que as

outras, tal preferência seria inconciliável com a sua justiça.

Todas são criaturas suas. Por que, então, isentaria estas do trabalho que àquelas impõe, a fim de alcançarem a felicidade

eterna? A desigualdade original das almas seria a negação da

justiça divina.

113. Se criadas iguais, como explicar a diversidade de aptidões

das almas e as naturais predisposições que notamos entre os homens?

– Tal diversidade é resultante do progresso realizado pela alma

antes de sua união com o corpo. As almas mais evoluídas em

inteligência e em moralidade são as que viveram mais e

progrediram antes da presente encarnação.

114. Qual o estado da alma originalmente?

– Elas são criadas simples e ignorantes, isto é, sem ciência e

sem noção do bem e do mal, mas com igual aptidão para tudo.

Inicialmente encontram-se numa espécie de infância, sem vontade

própria e sem a perfeita consciência de sua existência. Pouco a pouco se vai desenvolvendo o seu livre-arbítrio, ao mesmo passo

que as suas idéias.20

115. Esse progresso anterior foi feito como alma propriamente

dita ou em precedente existência corpórea?

– O ensino dado pelos Espíritos a esse respeito, bem como o estudo dos diversos graus de adiantamento do homem na Terra,

provam que esse progresso anterior da alma deve ter sido realizado

em diversas existências corpóreas, em número variável conforme o

grau atingido. E a prova está na observação dos mesmos fatos que

se acham, a cada passo, sob os nossos olhos.21

O homem durante a vida terrena

116. Como e quando se realiza a união da alma com o corpo?

– Desde a concepção. Posto que ainda errante, o Espírito fica

preso ao corpo, com o qual se deve unir, por meio de um cordão

fluídico. Esse laço se estreita cada vez mais, à medida que se

desenvolve o corpo. Desde aquele momento sente o Espírito uma perturbação crescente, até às proximidades do nascimento; nesse

momento ela é completa. Então o Espírito perde a consciência e só

gradativamente vai recobrando as idéias, a partir do momento em

que a criança começa a respirar. Então a união é completa e

definitiva.

117. Qual o estado intelectual da alma da criança ao nascer?

– Seu estado intelectual e moral é o que era antes de unir-se ao

corpo. Por outras palavras, a alma possui todas as idéias adquiridas

anteriormente; mas, por causa da perturbação que acompanha a

mudança de estado, suas idéias ficam momentaneamente em estado latente. Mas pouco a pouco vão se esclarecendo, posto que não se

possam manifestar senão na medida do desenvolvimento dos

órgãos.

118. Qual a origem das idéias inatas, das disposições precoces e

da instintiva aptidão para uma arte ou para uma ciência, abstração feita da instrução?

– Só duas fontes podem ter as idéias inatas: a criação de umas

almas mais perfeitas que outras, caso fossem criadas ao mesmo

tempo que o corpo, ou o progresso por elas realizado antes de sua

presente encarnação.

A primeira hipótese é incompatível com a justiça divina. Então,

só a segunda hipótese resiste. As idéias inatas são resultantes dos

conhecimentos adquiridos em existências anteriores e conservados

sob forma de intuição, a fim de servirem como base para a

aquisição de idéias novas.

119. Como podem revelar-se gênios nas camadas sociais

privadas de toda cultura intelectual?

– Isto é uma prova de que as idéias inatas independem do meio em que o homem é educado. Ambiente e educação desenvolvem as

idéias inatas, mas não as produzem. O homem de gênio é a

encarnação de um Espírito adiantado e que já havia evoluído

bastante. Pode a educação fornecer-lhe a instrução que lhe falta,

mas não o gênio, caso este não exista.

120. Por que há crianças instintivamente boas, vivendo em

meio perverso e apesar dos maus exemplos que recebem, enquanto

que outras são instintivamente viciosas, posto que vivam em meio

bom e recebam bons conselhos?

– É a conseqüência do progresso moral realizado, do mesmo modo que as idéias inatas o são do progresso intelectual.

121. Por que de dois filhos dos mesmos pais, educados em

idênticas condições, um é inteligente e o outro estúpido? Um é bom

e o outro é mau? Por que, às vezes, o filho de um homem de gênio

é tolo, enquanto o filho de um tolo é um homem de gênio?

– Isto vem em apoio à origem das idéias inatas, além de provar

que a alma dos filhos de modo algum procede da alma dos pais; ao

contrário, em virtude do axioma de que a parte é da mesma

natureza que o todo, os pais transmitiriam aos seus filhos as

próprias qualidades e defeitos, como lhes transmitem o princípio das qualidades físicas. Na geração só o corpo procede do corpo. As

almas são independentes umas das outras.

122. De onde vem o recíproco amor de pais e filhos, se as almas

são independentes umas das outras?

– Os Espíritos se ligam por simpatia; o nascimento nesta ou naquela família não se dá por acaso: é o resultado de uma escolha

às vezes feita pelo próprio Espírito, que vem unir-se àqueles a

quem amou no plano espiritual ou em vidas anteriores.

Além do mais, a missão dos pais é ajudar o progresso dos

Espíritos que encarnam como seus filhos. E, para os estimular,

Deus lhes inspira uma recíproca afeição. Entretanto, muitos falham nessa missão, pelo que são punidos.

22

123. Por que há maus pais e maus filhos?

– São Espíritos que não se ligaram por simpatia na mesma

família; ligaram-se com o fito de servirem de instrumento de

provas recíprocas e, muitas vezes, para castigo daquilo que foram em vidas anteriores. A este é dado um mau filho, porque também

foi mau filho; àquele um mau pai, pela mesma razão. Assim sofrem

a pena de talião.23

124. Por que se encontram pessoas de condição servil, com

pendores de dignidade e de grandeza, enquanto que outras, nascidas nas classes altas, só apresentam sentimentos baixos?

– É uma reminiscência intuitiva da posição social que o Espírito

teria ocupado, bem como o seu caráter na vida anterior.

125. Qual será a causa das simpatias e das antipatias manifestas

entre criaturas que se encontram pela primeira vez?

– Quase sempre são seres que se conhecem e que, por vezes, se

amaram em vidas anteriores. Encontrando-se na presente existência

sentem uma atração recíproca.

As antipatias instintivas podem originar-se de outra causa: o

perispírito irradia em torno do corpo e forma uma espécie de atmosfera impregnada das qualidades boas ou más do Espírito;

duas pessoas que se encontram, ao contacto desses fluidos

experimentam a impressão da sensitiva; tal impressão pode ser

agradável, como pode, ao contrário, ser desagradável; os fluidos

tendem a confundir-se ou a se repelirem, conforme a natureza deles seja semelhante ou diferente.

Assim, também, pode explicar-se o fenômeno da transmissão do

pensamento. Pelo contacto dos fluidos duas almas lêem, por assim

dizer, uma na outra; adivinham-se e se compreendem sem se

falarem.

126. Por que não conserva o homem a recordação das existências anteriores? Não seria isto necessário ao seu progresso

ulterior?

– Posto que um véu encubra, em cada nova existência, a vida

anterior do Espírito, não perde ele as suas aquisições, apenas

esquece a maneira por que as fez. E se longos parecem os sofrimentos da vida, como não seriam piores se a eles se juntasse a

lembrança dos sofrimentos passados?

127. Qual a origem desse sentimento chamado consciência?

– É uma recordação intuitiva do progresso realizado em

existências anteriores e, ainda, das resoluções tomadas pelo Espírito antes de encarnar-se, as quais, como homem, muitas vezes

esquece.

128. O homem possui o livre-arbítrio ou é sujeito à fatalidade?

– Se ele fosse sujeito à fatalidade não teria responsabilidade

pelo mal que espalha nem mérito pelo bem que pratica. Então, toda punição seria injusta e toda recompensa um contra-senso.

No homem o livre-arbítrio é uma conseqüência da justiça

divina; é um atributo que o dignifica e o eleva acima dos outros

seres. E isto é tão real que a estima dos homens entre si é baseada

na admissão do livre-arbítrio. O homem que, por enfermidade, loucura, embriaguez ou idiotismo perde essa faculdade

acidentalmente, ou é lamentado ou desprezado.

O materialista que subordina ao organismo todas as faculdades

morais e intelectuais, reduz o homem à condição de autômato, sem

livre-arbítrio e, conseqüentemente, sem responsabilidade do mal e sem mérito do bem que pratica.

24

129. É Deus o criador do mal?

– Deus não criou o mal: estabeleceu leis; estas são sempre boas,

porque ele é soberanamente bom. Quem observa essas leis

fielmente será perfeitamente feliz. Como têm o livre-arbítrio, nem sempre as criaturas as observam. É da inobservância daquelas leis

que provém o mal.

130. Já nasce o homem bom ou mau?

– É mister distinguir, antes, entre o homem e a alma.

A alma é criada simples e ignorante, isto é, nem boa nem má; como, porém, goza do livre-arbítrio, é livre para seguir este ou

aquele caminho, de observar ou de infringir as leis de Deus. O

homem nasce bom ou mau, conforme seja a reencarnação de um

Espírito adiantado ou atrasado.

131. Qual a origem do bem e do mal na Terra? Por que o mal predomina?

– A origem do mal na Terra está na imperfeição dos Espíritos

que aí se encarnam. A predominância do mal provém da

inferioridade do planeta, cujos habitantes são, em sua maioria,

Espíritos inferiores ou de pouca evolução. Em mundos mais avançados, nos quais só se reencarnam Espíritos depurados, o mal

se acha em minoria ou, até, nem aparece.

132. Qual a causa dos males que afligem a Humanidade?

– O nosso mundo pode ser considerado como uma escola para

Espíritos pouco evoluídos e, ao mesmo tempo, um cárcere para criminosos. Os males de nossa Humanidade são conseqüentes da

inferioridade moral da maior parte dos Espíritos que a constituem.

Pelo contacto com os seus vícios, não apenas se infelicitam

mutuamente, mas também se castigam uns aos outros.

133. Por que tão freqüentemente vemos a prosperidade dos maus, enquanto que o homem de bem sofre aflições?

– Para aquele cujo pensamento não ultrapassa os limites da vida

presente, para aquele que acredita que esta seja a única, se afigura

uma injustiça clamorosa. Já o mesmo não acontece com quem

admita a pluralidade das existências e pense na brevidade de cada

uma destas, em comparação com a eternidade.

Demonstra o estudo do Espiritismo que a prosperidade do mau

terá horríveis conseqüências nas suas existências posteriores; que

as aflições do homem de bem serão, ao contrário, seguidas de uma

felicidade tanto maior e mais durável quanto maior tiver sido a

resignação com que tiver sabido suportá-las: para ele não serão mais que um dia mau numa longa e próspera existência.

134. Por que alguns nascem na indigência e outros na

opulência? Por que vemos tantas criaturas que nascem cegas,

surdas, mudas, ou afetadas de doenças incuráveis, enquanto outras

possuem todas as vantagens físicas? Será efeito do acaso ou de um ato da Providência?

– Se fosse apenas um produto do acaso, então a Providência

teria deixado de existir. Entretanto, admitindo-se a Providência,

pode-se perguntar: Como conciliar esses fatos com a sua bondade e

a sua justiça? Muitos chegam a acusar Deus pela falta de compreensão das causas de tais males.

Compreende-se que aquele que se torna infeliz ou enfermo por

causa de suas imprudências e de seus abusos seja castigado naquilo

em que pecou. Entretanto, se a alma fosse criada ao mesmo tempo

que o corpo, que teria ela feito para merecer tamanhas aflições desde o seu nascimento, ou para ficar isenta das mesmas aflições?

Desde, porém, que se admita a justiça de Deus, não se pode

deixar de admitir que essas coisas sejam efeito de uma causa. Se a

causa não for encontrada na presente existência, deve encontrar-se

numa existência anterior, porque em tudo a causa deve sempre preceder ao efeito. Assim, é necessário que a alma já tenha vivido,

a fim de que possa merecer a expiação.

Efetivamente, mostram os estudos espíritas que muitos homens

nascidos na miséria foram ricos e considerados numa existência

anterior, que nesta fizeram mau uso da fortuna que Deus lhes havia

encarregado de administrar. Também mostra que alguns, nascidos

na abjeção, em vidas anteriores tinham sido orgulhosos e poderosos

e haviam abusado do poder para oprimir os fracos. Muitas vezes esses estudos nos apresentam essas criaturas submetidas àqueles

mesmos a quem haviam tratado duramente: então se acham

entregues às humilhações e maus-tratos a que tinham submetido os

outros.

Entretanto, nem sempre uma vida penosa significa uma expiação. Por vezes ela é escolhida pelo Espírito a fim de se

adiantar mais rapidamente, por meio da coragem com que saiba

suportá-la.

A riqueza também representa uma prova – e muito mais

perigosa do que a miséria, dadas as tentações que ensancha e os abusos a que expõe. O exemplo dos que passaram por ela também

demonstra que é uma prova na qual a vitória é mais difícil.

A diferença de posições sociais seria uma das maiores injustiças

se não fosse uma conseqüência do comportamento anterior e se não

comportasse uma possibilidade de compensação. A convicção dessa verdade, adquirida no Espiritismo, é que nos dá forças para

suportarmos as vicissitudes da vida e, assim, para aceitarmos a

nossa sem invejar a sorte dos demais.

135. Por que há idiotas e cretinos?

– A situação dos idiotas e dos cretinos também não se concilia com a justiça divina, desde que se admita a unicidade da existência.

Por mais miserável que seja a condição em que nasce uma

criatura, dela pode sair pela inteligência e pelo trabalho. O idiota e

o cretino, entretanto, desde o nascimento até à morte são votados ao

embrutecimento e ao desprezo. E o são sem possibilidade de compensação.

Por que, então, sua alma foi criada idiota? Os estudos espíritas

relativos à idiotia e à cretinice provam que essas almas são tão

inteligentes como as das demais criaturas; sua inferioridade é uma

expiação a que se submetem Espíritos que abusaram da

inteligência. Sofrem cruelmente ao se sentirem presos por laços que

não podem romper e, ainda, pelo desprezo de que se sentem objeto, pois que, possivelmente, foram muito consideradas em existência

anterior.25

136. Qual o estado da alma durante o sono?

– Durante o sono só o corpo repousa; o Espírito não dorme.

Provam as observações práticas que em tais condições goza o Espírito de toda a liberdade e da plenitude de suas faculdades;

aproveita o repouso do corpo, os instantes em que o corpo dispensa

a sua presença para agir independentemente e ir aonde queira.

Durante a vida o Espírito está sempre preso ao corpo por um

cordão fluídico, seja qual for a distância a que se transporte. O cordão serve para o chamar, desde que sua presença se torne

necessária. Só a morte rompe esse laço.

137. Qual a causa dos sonhos?

– Os sonhos são o resultado da liberdade de que goza o Espírito

durante o sono. Por vezes são recordações de lugares e de pessoas vistas ou visitadas pelo Espírito naquele estado.

26

138. O que são os pressentimentos?

– São lembranças vagas e intuitivas daquilo que o Espírito

aprendeu em momentos de emancipação; por vezes são avisos

ocultos dados por Espíritos bondosos.

139. Por que existem na Terra homens selvagens e homens

civilizados?

– A questão seria insolúvel sem a preexistência da alma, a não

ser que se admitisse que Deus tivesse criado almas selvagens e

almas civilizadas. Isto, porém, seria a negação de sua justiça. Além do mais, a razão não pode admitir que, após a morte, a alma do

selvagem fique eternamente naquele estado de inferioridade, nem

que se encontre no mesmo grau de elevação que a alma do homem

civilizado. Admitindo que todas as almas tenham o mesmo ponto

de partida – única doutrina compatível com a justiça divina – a

presença simultânea da barbárie e da civilização na face da Terra é um fato material que prova os progressos realizados por uns e a

realizar por outros.

Assim, a alma do selvagem atingirá, com o tempo, o mesmo

grau que a alma esclarecida. Mas, como morrem selvagens

diariamente, essas almas não podem atingir aquele grau senão em sucessivas reencarnações, cada vez mais aperfeiçoadas e adequadas

ao seu progresso, percorrendo todos os degraus intermediários entre

aqueles dois extremos.

140. Será impossível, conforme pensam alguns, que não se

encarnando mais que uma vez, faça a alma o seu progresso no estado espiritual ou em outras esferas?

– Isto seria admissível se todos os habitantes da Terra se

encontrassem no mesmo nível moral e intelectual. Neste caso

poderia dizer-se que este mundo se achava afeiçoado para um

determinado grau. Quantas vezes, porém, temos provas em contrário!

Realmente não é compreensível que não possa o selvagem

civilizar-se aqui na Terra, desde que, ao lado dele, vemos

encarnadas almas mais adiantadas. Disso resulta a possibilidade da

pluralidade de existências terrestres, o que, aliás, é demonstrado pelos fatos que temos à vista. Se assim não fosse, seria necessário

explicar-se: I – por que só a Terra teria o monopólio das

encarnações; II – por que, com tal monopólio, nela se encontram

encarnadas almas de todas as categorias.

141. Por que nas sociedades civilizadas se encontram seres de uma ferocidade só comparável à dos mais bárbaros selvagens?

– São Espíritos muito atrasados, vindos das raças bárbaras e

encarnadas em meio que não lhes é próprio; aí se acham

deslocados, assim como se acharia um matuto que de repente fosse

colocado na alta sociedade.

Observação: Não se pode admitir que a alma do criminoso endurecido tenha, na existência atual, o mesmo ponto de partida

que a de um homem eminentemente virtuoso. Isto fora negar a

Deus os seus atributos de bondade e de justiça.

142. Como explicar o caráter distintivo dos povos?

– São Espíritos que possuem mais ou menos os mesmos gostos e inclinações e que se encarnam num meio simpático. Muitas vezes

exatamente no meio onde podem satisfazer os seus pendores.

143. Como progridem os povos? Como degeneram?

– Se a alma fosse criada ao mesmo tempo que o corpo, as dos

homens atuais seriam tão novas e primitivas quanto as dos homens da Idade Média. Então seria o caso de perguntar: Por que têm elas

agora costumes mais brandos e inteligência mais desenvolvida? Se

pela morte do corpo a alma deixasse definitivamente a Terra,

poder-se-ia, também, perguntar: Qual o fruto do trabalho feito para

o melhoramento de um povo, desde que ele tivesse de ser recomeçado com as almas novas, que chegam todos os dias?

Encontram-se os Espíritos num meio simpático e relacionado

com o seu grau de adiantamento. Assim, um chinês que progrediu

bastante e não mais encontra em sua raça um meio correspondente

ao grau atingido, encarnar-se-á num povo mais evoluído.

À medida que uma geração avança um passo, atrai, por

simpatia, Espíritos mais avançados. Estes talvez já tivessem vivido

no mesmo país, dali se afastando em conseqüência de seu progresso

pessoal. Assim, pouco a pouco, progride uma nação.

Se a maioria de seus novos habitantes fosse de natureza inferior; se os antigos diariamente emigrassem e não descessem a um meio

inferior, o povo iria degenerando e, por fim, extinguir-se-ia.27

Observação: Tais questões provocam outras tantas, cuja

solução está no mesmo princípio. Por exemplo: Como se explica

a diversidade de raças na Terra? Há raças infensas ao progresso? A raça negra é susceptível de atingir o nível das raças

européias? A escravidão é útil às raças inferiores? Como se

poderá realizar a transformação das humanidades?

O homem após a morte

144. Como se dá a separação entre alma e corpo? É brusca ou

gradual?

– O desprendimento se realiza gradativamente e com velocidade

variável, conforme os indivíduos e as circunstâncias da morte. Os laços que ligam a alma ao corpo não se desatam senão pouco a

pouco e tanto menos rapidamente quanto mais material e sensual

tiver sido a existência.28

145. Em que situação fica a alma imediatamente após a morte

do corpo? Tem consciência de si instantaneamente? Numa palavra: que vê? que experimenta?

– No momento da morte tudo se apresenta confuso: necessita ela

de algum tempo para se reconhecer; encontra-se tonta como uma

criatura que saísse de um sono profundo e procurasse compreender

a situação. A clareza das idéias e a memória do passado lhe vão voltando à medida que desaparece a influência da matéria, da qual

acaba de se separar, e à medida que se dissipa a névoa que lhe

obumbra os pensamentos.

Muito variável é o período de perturbação que se segue à morte:

pode ser apenas de algumas horas, como de muitos dias, muitos meses e, até mesmo, de muitos anos. É menos longo naqueles que

em vida se identificam com o estado futuro, por isso que eles

compreendem imediatamente a sua situação. É tanto mais longo

quanto mais materialmente tiver vivido o homem.

Também muito variável é a sensação nesse momento

experimentada pela alma. A perturbação que se segue à morte nada

tem de penosa para o homem de bem: é calma e em tudo semelhante ao estado que acompanha um suave despertar.

Para a criatura cuja consciência não é pura, que amou mais a

vida material que a espiritual, esse momento é cheio de angústias e

de ansiedades, que crescem à medida que ela se reconhece. Então

sente medo, uma espécie de terror diante daquilo que vê e, principalmente, diante daquilo que antevê.

A sensação, por assim dizer, física, é de um grande alívio, de

um enorme bem-estar. Fica-se como que livre de um fardo e o

Espírito se sente feliz por não mais experimentar os padecimentos

físicos que o atormentavam momentos antes; sente-se livre e desembaraçado, como se tivessem tirado as cadeias que o

prendiam. Em sua nova situação a alma vê e ouve outras coisas que

antes escapavam à grosseria de seus órgãos físicos. Tem, então,

sensações e percepções que nos são desconhecidas.29

Observações: Estas respostas, bem como as que se reportam à situação da alma após a morte ou durante a vida, não são

produto de uma teoria ou de um sistema, mas de estudos diretos

feitos em milhares de criaturas, observados em todas as fases e

períodos da vida espiritual, desde o mais baixo até o mais

elevado degrau da escala, conforme os hábitos da vida terrena, o gênero de morte, etc..

Referindo-se à vida futura, freqüentemente dizemos que não

se sabe o que nela se passa, desde que ninguém voltou para no-

lo dizer. É um erro, pois são exatamente os que nela se acham

que nos vêm instruir sobre o assunto. E hoje, mais que em qualquer outra época, Deus o permite, como um último aviso à

incredulidade e ao materialismo.

146. A alma que deixou o corpo pode ver a Deus?

– As faculdades de percepção da alma são proporcionais à sua

pureza: só as eleitas podem gozar da presença de Deus.

147. Se Deus está em toda parte, por que os Espíritos não o

podem ver?

– Deus está em toda parte porque em toda parte ele irradia. Pode-se dizer que o Universo está mergulhado na Divindade, como

nós estamos na luz solar. Os Espíritos atrasados, entretanto, acham-

se envoltos numa espécie de névoa, que o oculta aos seus olhos.

Essa névoa só se dissipa à medida que eles se vão

desmaterializando e purificando. Quanto à vista, os Espíritos inferiores estão em relação a Deus assim como os encarnados em

relação aos Espíritos – como verdadeiros cegos.

148. Após a morte a alma tem consciência de sua

individualidade? Como a verifica? Como poderemos verificá-lo?

– Se, após a morte, as almas não conservassem a individualidade, tanto para elas como para nós seria o mesmo que

não continuar a existir. Não teriam elas nenhum caráter distintivo; a

alma do criminoso ficaria no mesmo nível que a do homem de bem.

Como conseqüência, nenhum interesse haveria em praticar-se o

bem.

A individualidade da alma é demonstrada, por assim dizer, de

um modo material, nas manifestações espíritas, através da

linguagem e pelas próprias qualidades de cada uma, de vez que

pensam e agem cada uma a seu modo; umas são boas, outras más;

umas sábias, outras ignorantes; estas querem o que aquelas não querem. Tudo isso prova a evidência que não se acham elas

confundidas num todo homogêneo. Nem é preciso falar das provas

patentes, que elas nos trazem, de haverem animado este ou aquele

indivíduo na Terra.

Graças ao Espiritismo, a individualidade da alma deixou de ser uma coisa vaga, para ser o resultado da observação. A alma

reconhece mesmo a sua individualidade, por isso que possui

vontade e capacidade de pensar próprias e distintas. Essa

individualidade é constatada por seu envoltório fluídico ou

perispírito, espécie de corpo limitado, que a torna um ser distinto.

Observação: Pensam alguns que se subtraem à pecha de

materialistas, pelo fato de admitirem um princípio universal

inteligente, do qual ao nascer cada um absorve uma porção que constitui a alma e que, após a morte, volta ao reservatório

comum, onde todas as almas se confundem, do mesmo modo

que as gotas d’água no oceano.

Este sistema, que é um meio-termo, até nem merece o nome

de espiritualista, porque é tão desesperador quanto o materialismo. O reservatório comum do todo universal seria o

mesmo que o nada, de vez que nele não haveria individualidade.

149. Influi o gênero de morte sobre o estado da alma?

– O estado da alma é imensamente variável, conforme o gênero

de morte; mas o é, sobretudo, conforme a natureza e os hábitos que se tinha durante a vida.

Quando a morte é natural, o desprendimento se opera

gradativamente, sem choques, e às vezes começa mesmo antes que

a vida se extinga. Quando a morte é violenta, como nos casos de

suplício, de suicídio ou de acidente, os laços se rompem bruscamente. Surpreendido, o Espírito como que fica tonto com a

mudança operada e não pode compreender a sua situação.

Em tais casos um fenômeno mais ou menos constante é a

convicção em que ele se acha de não estar morto. Essa ilusão pode

durar meses, até anos.

Em tal estado ele vai para cá e para lá, pensando que se ocupa

com seus negócios, como se ainda vivesse no mundo, e fica

admirado de lhe não responderem quando fala. Também se observa

a mesma ilusão em casos outros que não de morte violenta,

principalmente nos indivíduos cuja vida foi dedicada aos prazeres e aos interesses materiais.

30

150. Deixando o corpo, para onde vai a alma?

– Não se perde na vastidão infinita dos espaços, como em geral

se pensa: vaga, geralmente entre aqueles que em vida conheceu,

sobretudo entre os que amou. Mas pode instantaneamente

transportar-se a grandes distâncias.

151. A alma conserva as afeições que tinha em vida?

– Guarda todas as afeições morais; só esquece as materiais, pois

não mais são de sua essência. É por isso que tem satisfação em ver

parentes e amigos e sente-se feliz em ser por eles lembrada.31

152. A alma conserva a lembrança daquilo que fez na Terra?

Continua interessada pelos trabalhos que não pôde concluir?

– Isso depende de sua elevação e da natureza daqueles

trabalhos. Os Espíritos desmaterializados pouco se preocupam com

as coisas do mundo material: sentem-se felizes por se acharem

livres das mesmas. Relativamente aos trabalhos iniciados,

procuram inspirar a outras pessoas o desejo de os concluir.

153. No mundo dos Espíritos a alma encontra parentes e amigos

que a precederam?

– Não encontra apenas estes, como a muitos outros, conhecidos

de existências anteriores. Em geral, aqueles que a amam vêm

recebê-la à entrada no mundo espiritual e ajudar o seu desprendimento dos laços terrenos. Contudo a impossibilidade de

ver as almas mais queridas é uma punição para as que têm culpas.

154. Na outra vida qual é o estado intelectual e moral da criança

morta em tenra idade? Suas faculdades permanecem infantis, como

o eram em vida?

– O desenvolvimento incompleto dos órgãos da criança não

permite ao Espírito plena liberdade de manifestação. Libertando-se

do invólucro, suas faculdades são aquilo que eram antes de

encarnar-se. Como o Espírito apenas passou alguns instantes no

corpo, suas faculdades não sofreram modificações.

Observação: O Espírito de uma criança, dando uma

comunicação espírita, pode falar como o de um adulto, porque

pode ser um Espírito adiantado. Se, por vezes, emprega uma

linguagem infantil, é para não tirar à sua mãe o encanto que está

intimamente ligado à afeição de uma criatura frágil, delicada e

ornada com as graças da inocência.32

A resposta precedente pode ser dada à mesma pergunta, se

formulada em relação ao estado da alma dos cretinos, dos

idiotas e dos loucos.

155. Após a morte, qual a diferença entre a alma do sábio e a do

ignorante, ou entre a do selvagem e a do homem civilizado?

– Pouco mais ou menos a mesma que entre elas existia durante a

vida. A passagem para o mundo espiritual não dá à alma os

conhecimentos que não tinha na Terra.

156. Após a morte as almas fazem progresso intelectual?

– Fazem-nos mais ou menos, conforme a própria vontade. Algumas até fazem grandes progressos. Entretanto têm necessidade

de pôr em prática, durante a existência corpórea, aquilo que

aprenderam em conhecimento e em moralidade.

Aquelas que permanecem estacionárias recomeçam uma

existência semelhante à que haviam deixado. As que progrediram fazem jus a uma encarnação de ordem mais elevada.

Como o progresso é proporcional à vontade dos Espíritos,

muitos conservam, durante maior ou menor período, os gostos e as

inclinações que tinham em vida, isto é, prosseguem nas mesmas

idéias.33

157. Na vida futura a sorte do homem está irrevogavelmente

fixada após a sua morte?

– A fixação irremissível da sorte do homem, após a sua morte,

seria a absoluta negação da justiça e da bondade de Deus, por isso

que muitos não puderam esclarecer-se bastante na vida terrena. Além disso, há que considerar os idiotas, os cretinos, os selvagens e

o imenso número de crianças que morrem sem que hajam entrevisto

a vida. Mesmo entre os homens esclarecidos, não há tantos que se

julgam muito perfeitos e se consideram isentos do dever de estudar

e trabalhar mais? Não será uma prova da bondade de Deus a sua

permissão para que o homem faça amanhã aquilo que não lhe é possível fazer hoje?

Se a sorte fosse fixada irrevogavelmente, como explicar que os

homens morram em idades tão diversas? Por que, na sua justiça,

não concede Deus a todos o tempo necessário para realizarem a

maior soma de bem e repararem o mal que fizeram? Quem sabe se o criminoso, que morre aos trinta anos, não se teria transformado

num homem de bem, se tivesse vivido até os sessenta? Por que lhe

tira Deus os meios que aos outros concede?

O caso da variedade de duração da vida e do estado moral da

enorme maioria dos homens por si só constitui uma prova – desde que se admita a justiça divina – da impossibilidade de ser a sorte da

alma fixada de forma irremissível após a morte.

158. Na vida futura, qual será a sorte das crianças mortas em

tenra idade?

– Esta é uma das questões que melhor provam a justiça e a necessidade da pluralidade das existências.

Uma alma que viveu apenas alguns instantes, que não chegou a

praticar o bem nem o mal, não pode merecer prêmio nem castigo.

De acordo com a máxima de Jesus Cristo – cada um é punido ou

premiado conforme as suas obras – seria ilógico e contrário à justiça divina admitir-se que essa alma, que não trabalhou, fosse

chamada a desfrutar a bem-aventurança dos anjos ou que, sem

motivo, dela fosse privada. Entretanto deve ter uma sorte qualquer.

Também seria injustiça se ficasse por toda a eternidade numa

situação mista. Nenhuma conseqüência para a alma poderá ter uma experiência interrompida logo no começo. Conseqüentemente sua

sorte atual foi merecida numa existência anterior, do mesmo modo

que a sua sorte futura será a que tiver merecido em existências

ulteriores.

159. As almas têm preocupações na outra vida? Pensam

n’alguma coisa além de suas alegrias e seus sofrimentos?

– Se as almas apenas cuidassem de si durante a eternidade, seria egoísmo. Ora, se Deus condena essa falta na vida corpórea, não iria

aprová-la na vida espiritual. As almas ou Espíritos têm ocupações

relativas ao seu grau de progresso. Ao mesmo tempo procuram

instruir-se e melhorar-se.34

160. Em que consistem os sofrimentos da alma após a morte? As almas criminosas serão torturadas em chamas materiais?

– Hoje a Igreja reconhece perfeitamente que o fogo do inferno é

moral e não material. Mas ela não explica a natureza dos

sofrimentos.

Estes são postos aos nossos olhos pelas comunicações espíritas. Por esse meio podemos apreciá-los e nos convencermos de que,

posto não sejam esses sofrimentos o resultado de um fogo material,

que, na verdade, não poderia queimar almas imateriais, nem por

isso deixam de ser mais terríveis, ao menos em certos casos.

As penas não são uniformes: variam ao infinito, conforme a natureza e o grau das faltas cometidas; quase sempre as próprias

faltas são o instrumento do castigo. Assim, certos assassinos se

vêem obrigados a conservar-se no próprio local do crime e

contemplar incessantemente as suas vítimas; o homem de gostos

sensuais e materiais conserva esses mesmos gostos, mas é torturado pela impossibilidade de os satisfazer; certos avarentos julgam

sofrer o frio e a fome que suportaram durante a sua vida de avareza;

outros se conservam junto aos seus tesouros enterrados, numa ânsia

perpétua, temerosos de que lhos roubem. Numa palavra, não há um

só defeito, uma só imperfeição moral ou uma única ação má que não tenha o seu reverso e as suas naturais conseqüências no mundo

dos Espíritos. E para isso não é preciso um lugar circunscrito e

determinado. Onde quer que se ache um Espírito perverso, com ele

está o inferno.

Além das penas espirituais há penas e provas materiais, que o

Espírito não depurado sofre, em nova encarnação, onde é posto em

condições de sofrer aquilo que fez sofrer aos outros: ser humilhado, se tiver sido orgulhoso; miserável, se tiver sido mau rico; infeliz

com os filhos, se tiver sido mau filho, etc..

Conforme já o dissemos, a Terra é um dos lugares de exílio e de

expiação; é um purgatório para os Espíritos dessa natureza. Cada

um poderá libertar-se se se melhorar suficientemente até merecer viver num mundo melhor.

35

161. A prece será útil às almas sofredoras?

– Os bons Espíritos a recomendam; os sofredores a suplicam,

como meio de aliviar os seus padecimentos.

Experimenta a alma, por quem se pede, uma consolação, porque vê nisso uma demonstração de interesse. E o infeliz sente-se

aliviado sempre que encontra criaturas que se compadecem de suas

dores. Por outro lado a prece o estimula ao arrependimento e ao

desejo de fazer aquilo que é necessário para ser feliz. É assim que

suas penas podem ser aliviadas quando, por seu lado, coadjuva a ação por sua boa-vontade.

36

162. Em que consistem os gozos das almas felizes? Passam a

eternidade em contemplação?

– Quer a justiça que a recompensa seja proporcional ao mérito,

do mesmo modo que a punição proporcional à gravidade da falta. Assim, há infinitos graus nos gozos da alma, desde o instante em

que entra na via do bem até o momento em que atinge a perfeição.

Consiste a felicidade dos bons Espíritos em conhecer todas as

coisas, não sentir ódio, inveja, ciúmes, ambição ou qualquer das

paixões que infelicitam os homens. Para os bons Espíritos, o amor que os une é fonte de suprema felicidade, pois não experimentam

necessidades, nem sofrimentos, nem as angústias da vida material.

Um estado de eterna contemplação seria uma felicidade estúpida

e monótona; seria uma ventura de egoísta e uma existência

perpetuamente inútil.

Ao contrário, a vida espiritual é uma incessante atividade pelas

missões recebidas pelos Espíritos do Ser Supremo, como seus

agentes, que são, no governo do Universo. Essas missões são

proporcionais ao adiantamento de cada um; seu desempenho os

torna felizes, porque lhes oferece oportunidade de serem úteis e de fazer o bem.

37

Observação: Os adversários do Espiritismo e os que não

aceitam a reencarnação se acham convidados a dar aos

problemas acima uma solução mais lógica, baseada noutro princípio que não seja o da pluralidade das existências.

– 0 –

Biografia de Allan Kardec

Aos 3 de outubro de 1804, às 19 horas, a casa do magistrado

Jean-Baptiste-Antoine Rivail, na cidade de Lyon, rue Sala, 76,

ouvia os primeiros vagidos de uma criança destinada a influir poderosamente nos destinos da humanidade.

Naqueles dias estava em uso o calendário da Revolução, no qual

os meses tinham outros nomes e começavam com a entrada do Sol

nas casas do Zodíaco. Estava-se a 11 de vindemiário. O registro

civil, feito no dia seguinte, indicava o nascimento supra de Denizard-Hippolyte-Léon Rivail, sendo seus pais o magistrado

acima mencionado e sua esposa Jeanne Duhamel; assinaram como

testemunhas, a pedido do médico Pierre Radamel, os senhores

Syriaque-Frédéric Dittmar e Jean-François Targe. Remata o

documento o sr. Mathiou, presidente do Tribunal.

Há entre os espíritas uma certa confusão quanto ao nome do

Codificador, por falta de acomodação entre o sistema francês e o

nosso de citar o nome das pessoas. Para uns o menino em questão

era Léon, para outros Denizard e, ainda para um terceiro grupo,

Hippolyte. É que, de um modo geral, nós ignoramos que:

I – na França é comum acrescentar-se ao prenome do menino

o de um ou dois avós;

II – nas famílias nobres esse acréscimo se torna abusivo;

III – por vezes adiciona-se ao prenome do ascendente

masculino o do padrinho;

IV – nos documentos oficiais é praxe escrever em primeiro

lugar o nome da família e depois os prenomes.

Assim, no caso vertente, o prenome é Hippolyte; os prenomes

adicionais, Léon e Denizard e o nome de família, Rivail.

Comumente se escreve Hippolyte-Léon-Denizard Rivail, enquanto que nos documentos oficiais escrever-se-ia Rivail Hippolyte-Léon-

Denizard.

E, escrevendo certo, justo é se exija a pronúncia correta.

Perdoem-nos os espíritas a exigência: é que não

compreendemos não se saiba grafar e, menos ainda, pronunciar nome tão respeitável e que nos é sobremaneira caro. Seria uma falta

de respeito.

Até hoje são escassos os dados biográficos daquele que mais

conhecido se tornou sob o pseudônimo de Allan Kardec. Pouco tem

sido acrescentado ao que disse o astrônomo Camille Flammarion à beira do túmulo que ia receber os seus despojos terrenos e à

conferência do escritor Henri Sausse, em sua cidade natal, vinte e

sete anos mais tarde.

Afirma-se que em linha paterna descende de tradicional família

de juristas e, em linha materna, de teólogos ilustres, matemáticos e escritores, alguns dos quais teriam pertencido à Academia de

Ciências e à Academia Francesa, pontos culminantes para homens

de ciência e para homens de letras. Mas não nos estiremos por este

caminho, que a elevação espiritual nem obedece às leis da genética

nem às condições sociais e, sobretudo, financeiras, da família. Os grandes gênios não nasceram em berço de ouro; por vezes

conheceram a miséria; Sócrates era filho de uma lavadeira e um

carpinteiro foi o pai de Nosso Senhor Jesus Cristo. Via de regra,

entretanto, a natureza coloca Espíritos de escol em ambiente

adequado, que lhes facilite as tarefas que constituem o sentido de sua vida.

Antes, porém, de entrar no estudo do seu ambiente, vejamos a

razão de ser do pseudônimo Allan Kardec, que viria apagar o nome

de Hippolyte-Léon-Denizard Rivail.

Um dos princípios fundamentais do Espiritismo, na Codificação Kardeciana, é a reencarnação, isto é, o das vidas sucessivas e

interdependentes. No início de seu trabalho filosófico, um Espírito

revelou ao Codificador que o conhecia de remotas existências, uma

das quais passada no mesmo solo da França, onde a sua

individualidade tinha revestido a personalidade de um druida,

chamado Allan Kardec. Sabe-se a posição social desses sacerdotes,

sorteados entre a juventude da nobreza; mas, também, é sabido que

os druidas proibiam a construção de templos e a representação figurada dos Deuses ou Espíritos. Porque lhe teria agradado o

nome? Porque lembrasse essa fuga às exterioridades e ao culto

externo? Por uma como que memória intuitiva do muito de

espiritismo contido no Druidismo? Pela sonoridade do nome? Pela

intuição da necessidade de subtrair-se ao mal-estar causado aos familiares e companheiros no mundo científico e educacional, onde

vivia, com a publicação, sob a responsabilidade de seu nome

verdadeiro, de princípios filosóficos fadados a abalar o velho

formalismo da religião e da ciência?

É difícil dizer.

Como quer que seja, é de notar-se a coincidência entre certos

princípios do Druidismo e a obstinação de Allan Kardec em

subtrair o Espiritismo à tendência das massas menos cultas em

transformá-lo numa religião. Neste particular, a concessão máxima

que se pode fazer fê-la Sir Arthur Conan Doyle, chamando-o de religião psíquica, isto é, uma filosofia prática que leva a criatura

para uma etapa religiosa muito superior à moral comum, desde que

“a moral é a média do comportamento do grupo social” e aquele

conduz para um limite superior, no qual, tornando-se altamente

consciente, a criatura é, simultaneamente, templo, sacerdote e penitente.

Fique esta observação logo à entrada destas notas, a fim de

advertir o leitor de que, até o último instante, Allan Kardec

sustentou que o Espiritismo era “uma filosofia científica de

conseqüências religiosas, mas não uma religião”. Certos pseudo-espiritistas pretendem negá-lo, para o que fazem um tremendo

trabalho sofístico, esquecidos de que, torcendo as palavras do

Codificador, aproximando afirmações distantes e díspares, até

pertinentes a temas diversos, colocam-se entre as farpas do dilema:

ou Allan Kardec, pela insegurança de conhecimentos, pela tibieza de caráter, teria falhado como missionário da terceira revelação,

ou teriam falhado todos os Espíritos daquela plêiade ilustre, que lhe

ditavam mensagens, lhe inspiravam os estudos e lhe criticavam as

obras, quando não as refundiam completamente, como foi o caso de O Livro dos Espíritos. Em qualquer dos casos, o desfecho seria um

só: a falência da doutrina.

Haverá quem possa admiti-lo?

O meio físico

O observador que demora o olhar sobre a carta da França, ao mesmo tempo em que projeta a mente sobre a sua história, tem logo

a atenção atraída para a cidade de Lyon. Situada na confluência do

Rhodano e do Saona, é o ponto de encontro do primeiro que,

atravessando o Lago Leman, desce revolto as montanhas do Jura,

atravessa toda a Sabóia e vem unir-se às águas mansas do segundo, vindo do sul da Lorena e cortando o Franco-Condado e a região da

Borgonha. Sua junção se dá ao pé de uma encosta abrupta do

maciço das Cévenes, em contraste com as planícies limitadas pelo

Saona e pelo Ain, afluente do Rhodano. Na confluência daquelas

duas massas líquidas está a terceira cidade da França, originária de uma colônia fenícia ou, mais provavelmente, rhódia, – de onde o

nome do grande rio, Rhodanus, segundo a forma latina, que não

apagou o velho nome celta da região – Lugdunum – que quer dizer

a colina do sol nascente. Ao tempo da ocupação romana para aí

convergiram as grandes estradas; por aí passaram ou hibernaram Augusto, Cláudio e Cararala. Incendiada, reconstruiu-a Nero, para

que, mais tarde, foco do cristianismo, sofresse a perseguição de

Marco-Aurélio e outra, mais terrível ainda, de Sétimo-Severo.

Depois de suportar inúmeras vicissitudes, durante o período feudal,

desde o Império de Carlos Magno até o fim do século XIII, tornou-se uma cidade do Império.

Foi em Lyon que em 1245 Inocêncio III excomungou a

Frederico II, da Alemanha; que em 1274 Gregório X reuniu o

segundo concílio ecumênico, para regulamentar a eleição dos papas

e a união entre as Igrejas Grega e Latina. Durante as guerras de

religião foi saqueada pelos protestantes em 1562 e, dez anos mais

tarde, pelos católicos. Durante a Revolução Francesa a Convenção

ordenou a sua destruição a tiros de canhão, mas Collot d’Herbois e Fouché apenas metralharam os seus prisioneiros.

Posteriormente os acontecimentos mais notáveis foram a

insurreição operária de 1831, o complot de 1851, dirigido pelos

republicanos da Nova Montanha, para não falar do movimento

socialista de 1871, posterior, portanto, à morte de Allan Kardec.

Dado esse ligeiro esboço físico e histórico da grande cidade,

referindo apenas aquilo que poderia falar à mente de um lionês

culto, não devemos esquecer que aquelas mesmas águas, já

avolumadas por outros cursos alpestres, como o Isère e o Drôme,

vão banhar a cidade de Avinhão, tristemente célebre na história das lutas políticas que mancharam a Igreja Católica; depois de haverem

tumultuado nas altas montanhas marginais, nos oferecem um

símbolo de serenidade no seu curso baixo e no seu perfil de

equilíbrio, antes de se lançarem, mansas, no velho Mare Nostrum,

pouco abaixo da não menos evocadora cidade de Arles, que deu nome a um reino.

O meio social

Entretanto não passemos muito por alto: focalizaremos mais de

perto alguns aspectos da cidade e do meio social.

À margem direita do Saona, subindo pelos funiculares, alcança-se o velho forum, Forum Vetus, a velha cidade romana, bairro

eclesiástico, com a sua Catedral de São João, monumento dos

séculos XII a XIV e seus belíssimos vitrais. No centro, entre os

dois rios, o mais velho edifício de Lyon – a Igreja de Saint-Martin

d’Ainay, construída no século XI, sobre as ruínas do Templo de Augusto; velhos hospitais, a parte administrativa, residências

burguesas, o comércio e os bancos. Aí ainda se destaca, pela sua

vetustez, a Igreja de Saint-Nazier, dos séculos XV e XVI; o

Conselho Municipal, do século XVII; palácios, museus, faculdades,

etc.. À margem esquerda, na planície que se estende para leste, a

Prefeitura, os bairros operários e o parque.

São célebres os seus tecidos, as suas sedas, os seus veludos estampados, assim como as suas faianças, uns e outras relembrando

uma tradição legada pela arte italiana de Florença e de Veneza, da

época dos Doges.

*

Nesse ambiente passou a infância o jovem Rivail.

Lyon era uma cidade envolta na garoa, que atenua os contornos

e espiritualiza as formas, mas onde se agita uma população

laboriosa e realista, prática e fria, embora não infensa à beleza que

fala aos sentidos, e àquela beleza mais profunda, que as almas

eleitas sentem mas não encontram expressão material. Não é difícil imaginar-se a influência, sobre o menino precoce, do meio lionês e

da intimidade do lar de um juiz austero, de formação severa,

segundo os velhos moldes hoje evanescentes.

Que motivos teriam levado o velho magistrado a mandar o filho

estudar na Suíça? Falta de bons colégios na França? Idéias próprias em relação à influência clerical no ensino local? Interesse pelo

sistema de Pestalozzi?

Talvez isso. Talvez um pouco de tudo.

O pedagogo suíço Jean-Henri Pestalozzi, versado em línguas,

em história e em direito, se havia consagrado à economia rural. A leitura do Emílio, de Rousseau, lhe revelara a vocação; aperfeiçoou

as idéias de Rousseau, do ângulo da pedagogia. Seu ideal foi, então,

desenvolver, gradualmente, as faculdades humanas e organizar o

ensino mútuo. Para tanto dedicou-se à educação das crianças

pobres. Ensinou em várias cidades, até que lhe cederam o Castelo de Yverdon. Yverdon é uma cidadezinha do sul do Lago Neuchatel,

onde os Duques de Zaehringen possuíam um célebre castelo que

data do século XII. Nessa antiga cidade romana de Eburodunum, e

em seu castelo, os duques abrigaram a Escola de Pestalozzi durante

vinte anos – de 1805 a 1825.

Nesse ambiente de uma pequena cidade fabril, num velho castelo medieval, o menino Rivail fez os estudos básicos que iriam

prepará-lo para uma tarefa que basta, por si só, para marcar o

século – já chamado século das luzes.

Estudo e trabalho

Pestalozzi estimava o jovem rivail como um filho. Teve-lhe maior intimidade, que o adolescente soube aproveitar a tal ponto

que, aos quatorze anos, por vezes substituía o diretor na condução

dos cursos. Aprendeu praticamente várias línguas, além do

conhecimento clássico do grego e do latim. Com aquela idade

diplomou-se professor. Continuando os estudos, fez o seu bacharelado quatro anos mais tarde. Por nos faltarem dados

seguros, não diremos, como outros biógrafos, que foi o bacharelado

em ciências e letras, posto nos inclinemos pela afirmativa. É que o

bacharelado foi instituído na França em 1808, nas faculdades de

ciências e letras, como sanção de estudos secundários. Inicialmente, porém, o bacharelando era puramente literário; em 1830 e 1840

sofreu o sistema profundas reformas que não atingiram o nosso

estudante: em 1830 já Rivail era médico.

Por outras palavras, não podemos garantir qual o título obtido

pelo jovem Rivail ao fazer o seu bachot, como se costuma dizer na gíria estudantil. Sabe-se, entretanto, que o obteve, com ele entrou

na escola de medicina, onde se doutorou aos vinte e quatro anos.

Enquanto fazia o curso de medicina o estudante punha em

execução a experiência feita junto a Pestalozzi, relativamente ao

ensino mútuo.

Com efeito, o acadêmico-professor lecionava Matemática,

Astronomia, Química, Retórica, Anatomia Comparada e Fisiologia,

além de sua própria língua. Parece que tirou proventos de parte de

tais cursos, mas é certo que em parte os ministrou com absoluta

gratuidade, consoante os princípios de seu mestre.

Em Paris fundou um Instituto Técnico à rua Sèvres, nº 35, nos moldes de Pestalozzi. É provável que ainda não tivesse concluído o

curso de medicina; sabe-se, entretanto, que teve como sócio um tio

materno, jogador inveterado, que levou o Instituto à liquidação. A

quota do dr. Rivail foi colocada em comandita na firma de uns

amigos que, pouco depois, declararam falência. O jovem não desanimou: passou a fazer traduções, a preparar cursos em colégios

e institutos, e ainda achava tempo para dar cursos gratuitos.

Teve tais contactos com o mundo das letras e das ciências que

chegou a possuir vários diplomas de sociedades científicas e de

incremento ao progresso. Não os teria obtido se não estivesse em ligação continuada e eficiente com estabelecimentos públicos

oficiais ou oficializados, onde os grandes serviços prestados à

sociedade eram publicamente reconhecidos, através de diplomas

honoríficos. Entre outras distinções, possuía as seguintes:

A – no setor da direção do ensino:

I - de fundador da Sociedade de Previdência dos Diretores de

Colégios e Internatos de Paris;

II - da sociedade de Educação nacional (constituída por

diretores de Colégios e internatos);

B – no setor do ensino propriamente dito:

I - da Sociedade para a Instrução Elementar;

II - da Sociedade Gramatical;

III - do Instituto de Línguas;

C – no setor da divulgação científica:

I - da Sociedade de Ciências Naturais da França;

II - do Instituto Histórico;

III - da Sociedade Francesa de Estatística Universal;

D – no setor das aplicações práticas das ciências:

I - da Sociedade de Emulação Agrícola do Departamento do

Ain;

II - da Sociedade de Incentivo à Indústria Nacional.

A maioria desses diplomas lhe foram conferidos entre os vinte e

os trinta e um anos de idade; o último lhe veio aos quarenta e três.

Tudo isto indica uma inteligência invulgar, servida por uma

vontade poderosa e um método de vida que, de certo modo,

justifica aquele conceito de Augusto Comte “o gênio é uma questão de método”. Era um idealista, mas não um lunático; seu

idealismo era orgânico e prático. O estudante de medicina e depois

o médico atuava na vida prática como professor de várias matérias,

não só como divulgador de conhecimentos teóricos, mas como

propulsor da agricultura e da indústria, através dos aperfeiçoamentos científicos dos meios de produção, como do

aperfeiçoamento moral e espiritual das criaturas.

Esse aspecto de sua vida não foi suficientemente analisado por

seus turiferários. Um exame percuciente revela que o seu interesse

nos estudos se derramou sobre um conjunto de conhecimentos selecionados, não para servirem de atavios ao Espírito, mas de

verdadeiros instrumentos para a promoção do bem-estar geral, do

mesmo passo que para a evolução espiritual, pelo conhecimento de

si mesmo e pelo da situação do homem no cosmos.

Era um altruísta na mais alta acepção do vocábulo, porque não esperava adquirir muito para dar as sobras: tinha um sentido prático

da solidariedade humana, dessa solidariedade feita de

companheirismo, de camaradagem fraterna, de simpatia pelo alheio

esforço, de boa disposição para ajudar os outros com a própria

experiência, de bom ânimo para ensinar – principalmente de graça –, pois a gratuidade nivela espiritualmente as criaturas e elimina

aquela barreira psicológica, algo paradoxal, que se estabelece entre

o ignorante que paga e o mestre que é pago diretamente. Ele sentia

as imperiosas obrigações do indivíduo para com a sociedade,

visando o progresso desta e procurando servi-la e servir-se dentro

daquele magnífico conceito: “a cada um segundo as suas

necessidades; de cada um conforme as suas possibilidades”.

Por outras palavras: foi um Espírito altamente cônscio de sua função social. E a realizou magnificamente, sem estardalhaços,

sereno e compenetrado. Na Índia há uma lição muito interessante

para o nosso comportamento social. Ensinava Ramakrisma que, ao

atravessar uma aldeia, um elefante fora assaltado pelos cães.

Cônscio de sua superioridade, o elefante não se desviou de sua rota, não deu atenção aos latidos, não perdeu o passo hierático. Sem

orgulho, apenas compenetrado de seu valor e de suas

responsabilidades como fator social, o moço Rivail tinha um

secreto sentimento de que era bem como aquele elefante, posto

jamais o revelasse: agiu bem como um mestre – ensinando.

Por isso pôde realizar a sua tarefa imensa.

*

Entre os anos de 1824 e 1849 publicou o dr. Rivail, entre outras,

as seguintes obras:

I - Curso Prático e Teórico de Aritmética (2 volumes, segundo o método Pestalozzi);

II - Plano para o melhoramento da Instrução Pública;

III - Gramática Clássica da Língua Francesa;

IV - Qual o sistema de estudos mais adequado à época?

V - Manual dos exames para certificado de capacidade.

VI - Soluções racionais de perguntas e problemas de Aritmética

e Geometria;

VII - Catecismo Gramatical da Língua Francesa;

VIII - Programa dos Cursos ordinários de Química, Física,

Astronomia e Fisiologia;

IX - Pontos para os exames na Municipalidade e na Sorbonne;

X - Instruções sobre as dificuldades ortográficas.

Na sua folha de serviços à mocidade de seu tempo está a

regência das seguintes matérias, em cursos parcialmente gratuitos –

repetimo-lo –, onde, de par com os seus conhecimentos enciclopédicos, patenteia-se o esforço em bem servir os seus

semelhantes: Matemática, Física, Química, Astronomia, Retórica,

Anatomia Comparada, Fisiologia e Língua Francesa. Falava

corretamente inglês, alemão, holandês, espanhol e italiano e era

grande conhecedor do grego e do latim.

Magnetismo

Cabe aqui destacar, em poucas linhas, um aspecto da cultura do

sr. Allan Kardec: os seus estudos sobre magnetismo e hipnotismo,

matérias que lhe foram de valioso auxílio nos estudos iniciais do

Espiritismo e que não deveriam desconhecer todos quantos se aplicam a trabalhos práticos e ao manejo de médiuns.

Allan Kardec interessou-se pelo magnetismo ainda nos bancos

acadêmicos. Naquela época a nova ciência apaixonava e dividia os

estudiosos: de um lado a chamada ciência oficial, a lhe negar foros

de cidade; do outro, homens espiritualmente emancipados, a lhe proclamar os fatos. Estes últimos constituíram uma sociedade – a

Sociedade dos Magnetistas da França –, mais tarde cindida em duas

entidades, por divergências de interpretação dos fenômenos.

Kardec pertencia à primeira, mas era festejado por ambas.

*

Torna-se aqui necessária uma ligeira digressão histórica, para

que melhor se compreendam as ligações do magnetismo e do

hipnotismo com o Espiritismo e não se confundam aqueles com as

exibições charlatanescas a tanto por cabeça.

Sem remontar às práticas esotéricas, que são de todos os tempos e lugares, o magnetismo animal dos tempos modernos parece ter

surgido com Paracelso, tendo sido aceito e praticado por

Burgraeve, Van Helmont, o Padre Kircher e, principalmente, por

Mesmer que, pelas alturas do ano de 1779, lhe deu grande

incremento e chegou a lhe emprestar o próprio nome; mesmerismo

era como então se chamava o magnetismo.

Mas, que vinha a ser o chamado magnetismo animal?

Pensava-se que fosse um fluido que penetrava os corpos

animados, dando-lhes propriedades particulares. Mesmer

desenvolveu essa teoria, sustentando que os corpos animados e

inanimados eram submetidos à influência de um agente universal, a

que chamou fluido magnético. Esse fluido podia acumular-se e transmitir-se ao homem, pelos passes e toques, e era capaz de curar

certas moléstias nervosas, mas também podia provocá-las.

Em certos casos especiais, as pessoas submetidas à ação

magnética apresentavam crises convulsivas, atitudes passionais e

até tendências eróticas, o que levou o mundo científico à condenação do mesmerismo ou magnetismo prático, no interesse da

moralidade pública. Isso ocorreu em 1784. Mas não paravam aí as

contraditórias conclusões do relatório oficial da comissão chefiada

pelo ilustre Bailly: ela concluía pela inexistência dos fenômenos.

Repetia-se o caso de Galileu.

Já disse alguém que as idéias são como os gases: quanto mais

comprimidas, maior a sua força de expansão. Os repetidos golpes

desferidos no magnetismo lhe trouxeram novos e valiosos adeptos,

entre os quais Du Potet, o Abade de Faria e Puységur, na França.

Continuaram-se os estudos na França, tornando-se evidentes os seus efeitos e a fenomenologia geral, com a sugestão, o

sonambulismo provocado, as paralisias, as anestesias, etc..

Um pouco mais tarde, na Inglaterra, Braid demonstrou que o

hipnotismo era uma realidade e determinou meios práticos para a

sua aplicação. Tais processos foram muito divulgados nos Estados Unidos, graças aos trabalhos de Grims. Os estudos de Braid e

Grims situam-se entre os anos de 1840 e 1848.

Assim, quando, mais uma vez, o magnetismo foi condenado por

volta de 1859, nas lições professadas na Salpetrière pelo ilustre

Charcot, já Allan Kardec andava às voltas com os fenômenos

espíritas, aos quais trouxera uma experiência de trinta e cinco anos

de trato com o Magnetismo e o Hipnotismo.

Fácil é compreender-se tudo isso.

*

No momento assistia-se, na França, a falência das filosofias

espiritualistas. A elas se opunham as correntes materialistas – com

o marxismo à frente – e, num termo médio, o agnosticismo da

escola positivista, fundada por Augusto Comte.

O genial Comte havia dado uma nova ordenação aos

conhecimentos científicos; tinha fundado uma nova ciência – a

Sociologia. Sua obra, muito inteiriça, constituía a Filosofia

Positiva; seu ponto mais fraco é a religião tirada de seus princípios

gerais. Mas Comte fora repetidor da Escola Politécnica, depois examinador; dera cursos populares de Astronomia. Tudo isto lhe

granjeara um certo prestígio nos meios cultos. A falta de síntese

nos conhecimentos científicos deixava as classes mais altas em

caótico estado mental, não sendo difícil encontrar grandes figuras

positivistas em ciência, materialistas em política e católicas ou protestantes em religião.

Poucos abarcavam essas coisas em visão panorâmica; e quando

os percebiam davam de ombros, justificados de seu silêncio e de

sua acomodação pelo motivo de se não sentirem culpados.

As mesas girantes

Estavam as coisas nesse pé quando os fenômenos espiríticos,

ditos das mesas girantes e falantes, iniciados “oficialmente” nos

Estados Unidos, com as Irmãs Fox e pouco depois transplantados

para a Europa, adquiriram foros de cidade. Manda a verdade,

entretanto, se diga que antes mesmo de 1848, já na França, na Alemanha e na Inglaterra se haviam registrado os fenômenos de

efeitos físicos e outros, inclusive os intelectuais – mesmo sem

recorrer às vastas referências, posto que discretas, encontradas na

obra escrita, que chegou até os nossos dias, dos melhores

historiadores e poetas latinos, bem como da tradição druídica. Allan

Kardec tratou do assunto nas páginas luminosas da Revue Spirite,

muito embora não o fizesse de forma exaustiva, visando estabelecer irretorquivelmente a primazia da Europa e, particularmente da

França, no que se refere a acintosas manifestações de Espíritos.

Como quer que seja, o relato do que se passava com as Irmãs

Fox, as “chantagens” de que foram vítimas, a malevolência dos

opositores à fenomenologia, ansiosos por manterem o prestígio, já um tanto abalado, de seu velho aliado Satã, tiveram o efeito de

propaganda. De modo que na alta sociedade francesa foi uma nota

requintada dos salões elegantes convidar, para a companhia de

poetas, deputados, senadores, ministros, escritores, artistas,

príncipes de toda parte, inclusive grãos-duques russos, alguns Espíritos de escol, que vinham afirmar: “Não há morte”.

Quem eram esses Espíritos?

Vultos marcantes de todos os tempos: filósofos e poetas,

generais e imperadores da Grécia e de Roma; destacadas figuras do

clero medieval; escritores, poetas e artistas do renascimento; antigos reis da França. Todos eles produziram admiráveis provas de

sua identidade e muitos lançaram grandes clarões sobre a parte

mais nebulosa de algumas de suas ações públicas. Os poetas se

exprimiam em versos perfeitos, através de sensitivos que jamais

haviam perpetrado uma simples quadrinha rimada.

A moda atingiu o palácio imperial. Napoleão III solicitou de

elementos experimentados que fossem ao palácio evocar Espíritos

em sua presença. E manteve interessantes palestras, em presença

das mais destacadas figuras do mundo político, militar e

diplomático.

Entre esses salões brilhantes, força é destacar o da Senhora de

Girardin, encantadora figura de vanguarda nas letras e nas artes e,

indiscutivelmente, uma das maiores expressões do bandeirismo

espiritista na França, quiçá do mundo. Nascida no mesmo ano que

Allan Kardec, Delphine Gay era física e espiritualmente bela.

Muito cedo começou a sua produção poética, publicando

seguidamente volumes, entre os quais se destacam: Les Soeurs de

Sainte Camille, Madeleine, Ourika, Le Bonheur d’être belle, La Vision de Joanne d’Arc. Após uma viagem à Itália, durante a qual

foi coroada no Capitólio, publicou Le Retour, Palerme, Le Dernier

Jour de Pompéi, Napoline e outras impressões da península.

Aos vinte e sete anos casou-se com o Conde Camile de

Girardin, que desfrutava invejável posição social e política, além de grande prestígio como escritor, sociólogo e dramaturgo. Casada, foi

uma inspiradora da política. Escreveu vários romances e bom

número de peças para teatro; entre aqueles vale destacar Le

Lorgnon, Le Marquis de Pontanges, Les Contes d’une vieile fille à

ses neveux e, o mais notável de todos, La Canne de M. de Balzac, e, ainda, La Croix-de-Berny, este em colaboração com Théophile

Gautier, Joseph Méry e Jules Sandeau, três nomes que dispensam

referências; entre estas não devemos esquecer L’École des

journalistes, Judith, Cléopatre, Lady Tartufe, Le Chapeau d’un

horloger e La Joie fait peur, peças estas pertinentes ao repertório da Comédie Française. Deixou ainda farta coleção de Cartas

Parisienses e de artigos e folhetins na imprensa periódica e nos

diários de Paris.

As sessões espíritas nos salões da Senhora de Girardin contaram

com o que havia de mais fino nas letras, nas artes e na política; assistiram-nas Balzac, Lamartine, Chateaubriand, Théophile

Gautier, para citar apenas alguns dos mais expressivos nomes das

letras francesas e de renome mundial, à frente dos quais justo é

colocar a figura magnífica de Alexandre Dumas, filho.

Pode-se dizer que a Senhora de Girardin preparou a receptividade nas altas esferas sociais e intelectuais da França para

a obra que em breve deveria encetar Allan Kardec. Morreu de um

câncer, em 1855.

Um desses grupos praticantes do Espiritismo nascente se deu ao

trabalho de visitar o grande Victor Hugo, então exilado na Ilha de

Jersey, por força de seu antagonismo ao governo monárquico da

França. E o converteu aos princípios espiríticos.

Entretanto – coisa notável! –, entre tanta gente de alta cultura, ninguém lobrigou o alcance filosófico das batidas nas mesas e

móveis e, em geral, das manifestações dos Espíritos. Só um fato

impressionava: a sobrevivência do ser humano, com os seus gostos,

os seus cacoetes, os seus impulsos, enfim, a sua personalidade!

A França, cognominada a filha primogênita da Igreja, assistia ao naufrágio da fé, resultante do choque entre a Ciência e a

Religião. Dona de um mais largo e profundo conhecimento das leis

da natureza, a humanidade estava preparada para passar da fé

imposta à fé raciocinada, isto é, da crença para a certeza. A ciência

oficial desdenhava tudo quanto pudesse, direta ou indiretamente, conduzir a um postulado da religião; em contrapartida, a religião,

fechada numa filosofia apriorística, verberava toda tentativa

intelectual que pudesse atuar como um sopro sobre o castelo de

cartas do dogmatismo.

Temor da divulgação da verdade ou intuição do seu crescente desprestígio político, em conseqüência da emancipação espiritual

das criaturas?

O único homem que teve a visão da importância moral e

sociológica de fenomenologia espírita foi Rivail. Por isso mesmo

deveria ele apagar-se no mundo oficial da instrução pública, onde se fizera respeitado e querido, para se dar a uma nova obra: a da

construção de toda uma filosofia derivada – que importa – dos

golpes que os chamados mortos vibravam sobre mesas, paredes e

móveis. Ia desaparecer o cientista Rivail para surgir o filósofo Allan

Kardec. Era aquele renascimento espiritual, de que falava Jesus Cristo a Nicodemus; era a profecia do Nazareno reportada por João,

no Capítulo XIV, versículo 26, sobre aquele “a quem o Pai enviará

em meu nome”, e que “ensinará todas as coisas, e vos fará

lembrar de tudo o que vos tenho dito”.

Se nos adentrarmos no texto e em outras passagens correlatas,

veremos que se trata de um ser despersonalizado, o Consolador, o

qual figura nas versões evangélicas que nos chegaram com o Espírito Santo. Cabe, entretanto, notar que não se trata de uma

individuação, nem da suposta terceira pessoa da Trindade católica:

estamos em frente a uma expressão genérica, onde o vocábulo

santo é apenas um adjetivo qualificativo muito respeitoso e, por

isso mesmo, historicamente respeitável, posto que sem a necessária força para, com o dogma, sobrepor-se à razão.

O escolhido foi Allan Kardec e não o dr. Rivail, para significar

uma individualidade eterna e não uma personalidade transitória e,

ainda, para a ligar a uma etapa em que os valores espirituais eram

mais expressivos do que as formas exteriores do culto.

O Codificador

Foi em 1854 que Allan Kardec tomou conhecimento das mesas

girantes e falantes, através de uma conversa com o sr. Fortier, seu

colega na Sociedade de Magnetistas. Ao ser informado de que,

magnetizadas, as mesas podiam mover-se e davam respostas às nossas perguntas, a resposta de Kardec foi de absoluta descrença,

desde que a mesa não possuía nervos nem cérebro, nem podia

tornar-se sonâmbula.

Pouco depois um outro magnetista, o sr. Carlotti, lhe fez

minuciosos relatos de experiência a que assistira, em conseqüência do que pôde ele dispor-se a assistir às primeiras sessões práticas,

em maio de 1855, em casa da sra. Roger, em presença do já citado

fortier, do sr. Patier e da sra. Plainemaison. Deste último cavalheiro

ouviu relatos num tom diferente, frio e grave, cheio de argumentos

que se acomodavam aos princípios científicos.

Surgiu daí a possibilidade de assistir a reuniões regulares, em

casa da sra. Plainemaison, à rua Grange-Batelière, 18, ainda no mês

de maio já referido.

Repetiram-se as sessões, numa das quais conheceu ele a família

Baudin, residente à rua Rochechouart. Convidado para as sessões

hebdomadárias da família Baudin – é Allan Kardec quem o diz – “aí fiz os primeiros estudos sérios em Espiritismo, mais por

observação do que por efeito de revelações”. E prossegue: “A essa

nova ciência apliquei, como tinha feito até então, o método

experimental; jamais formulei teorias preconcebidas”. E logo mais

adiante: “Nesses fenômenos entrevi a chave do tão obscuro e controvertido problema do passado e do futuro e a solução que,

durante toda a vida, tinha buscado. Numa palavra, era uma

revolução completa nas idéias e nas crenças, sendo, pois,

necessário proceder com circunspecção, e não com leviandade, ser

positivista em vez de idealista, para não ser arrastado por ilusões”.

Eis a evidenciação do homem de ciência.

Allan Kardec vira nessas manifestações uma prova da existência

da alma e de sua sobrevivência ao transe da morte. Mas, também,

percebera que cada Espírito possuía um grau de conhecimento e de

moralidade, pelo que esse mundo invisível, que nos envolve, oferecia uma gradação infinita. Estudá-los, classificá-los e explicá-

los seria uma tarefa hercúlea e Kardec a teria abandonado se não

fora a insistência de alguns amigos dedicados, que desde algum

tempo se davam àquelas investigações. Entre esses amigos cabe

uma referência particular ao sr. Carlotti, já citado; ao editor Didier, médium, e ao seu filho, também médium; ao lexicógrafo Antoine-

Léandre Sardou e seu filho, o médico, escritor e dramaturgo

Victorien Sardou, também médium, que prestou relevantes serviços

à doutrina, no papel de intérprete dos Espíritos que ofereciam

minuciosas descrições e belíssimos desenhos de outros planetas, muito embora o dr. Sardou fosse a negação para o desenho; o sr.

René Taillandier, membro da Academia de Ciências, e outros.

Desde algum tempo esses senhores faziam sessões e possuíam

cinqüenta cadernos de comunicações.

Graças a esses amigos, Allan Kardec tomou desse material, classificou as mensagens, eliminou as repetições ociosas; anotou

circunstanciadamente as falhas, as dúvidas e as lacunas, para

futuros esclarecimentos.

Teve o cuidado de ouvir outros Espíritos, através de outros médiuns, que não os da casa do sr. Roustan – o qual não deve ser

confundido com o sr. Jean-Baptiste Roustaing –, onde lhe fora de

poderoso auxílio a mediunidade da senhorinha Japhet. Em

conseqüência – fato raríssimo e de notável beleza! – ao apresentar

aos Espíritos a forma definitiva da obra fundamental, estes lhe fizeram grandes objeções. É que Allan Kardec apresentava o

Espiritismo como uma religião nova, com o que não concordaram

os seus conselheiros espirituais. Teve ele a honestidade de aceitar a

crítica justa e refundir completamente a obra, cuja primeira edição

apareceu a 18 de abril de 1857. Daí por diante jamais Kardec deixou de dizer que o Espiritismo era uma ciência ou uma filosofia

científica – porque estabelecida sobre a base dos fatos – tendo

conseqüências religiosas, mas nunca uma religião. Tal ponto de

vista ficou muito bem desenvolvido no seu canto de cisne, isto é, a

última conferência por ele pronunciada cinco meses antes de desencarnar-se, e que se acha na íntegra no fascículo de novembro

de 1868 da Revue Spirite.

O êxito dessa obra – O Livro dos Espíritos –, cujo nome bem

exprime a sua origem e sob o qual a sua autoria apenas aparece

como “recolhidos e ordenados por Allan Kardec”, o levaram a pensar na propaganda da doutrina. Mas achava-se sozinho para tal

empreendimento. Contudo, aconselhado pelos Espíritos em meados

de novembro de 1857, a 1º de janeiro de 1858 lança a Revue

Spirite, pequena revista de 32 páginas em média, destinada não só à

propaganda, mas – e principalmente – à provocação da opinião pública e ao estudo da fenomenologia espírita e à discussão das

hipóteses provisórias, até que, bem verificados os fatos, se lhes

pudesse dar uma explicação científica e uma posição no quadro

geral da filosofia espírita.

Lamentavelmente, em nossa terra ainda não foi devidamente apreciada a coleção da Revista Espírita, que Allan Kardec

escreveu, por assim dizer, sozinho, durante onze anos e quatro

meses, num total de cerca de 4.500 páginas – rico manancial de

fatos bem controlados e de ensinamentos para os dirigentes de trabalhos práticos, para os médiuns e para os espiritistas em geral.

Allan Kardec sentiu a necessidade de manter um grupo de

estudo prático e contactos com outros grupos, da França e do

exterior. Em conseqüência, seus estudos e observações foram

determinando ligeiras alterações em O Livro dos Espíritos, assim como pequenas adições, até que na 22ª edição a obra tomou um

caráter definido, que é o que hoje se apresenta. Dessa edição nós

nos servimos para a tradução feita para a coleção lançada pela

editora Pensamento.

Era O Livro dos Espíritos uma exposição geral da filosofia espírita. Outras obras deviam seguir-se. Trabalhava Allan Kardec

na Revista Espírita, cujos fascículos mensais apareciam com toda a

regularidade; no campo experimental dirigia sessões onde eram

obtidas respostas às suas perguntas, organizadas de plano, de par

com mensagens espontâneas, que viriam servir para volumes futuros. Paralelamente, grupos de outras cidades e do estrangeiro

lhe remetiam copioso material ditado pelos Espíritos, que ele ia

arquivando, depois de convenientemente estudado e classificado.

Ainda achou tempo para lançar, em julho de 1859, um pequeno

volume com a doutrina condensada, sob o título O que é o

Espiritismo?. Este interessante opúsculo teve sucessivas edições,

podendo assegurar-se que em 1868 já estava na oitava. Era um

livrinho destinado a dar um conhecimento perfunctório, mas

suficiente, às pessoas jejunas que, se se tomassem de interesse pelo

assunto, poderiam então passar a obras de mais fôlego.

Em 1861, logo em janeiro, a casa Dider & Cia. lança o seu

segundo livro básico – O Livro dos Médiuns –, onde temos um

verdadeiro tratado clássico, indispensável a médiuns e dirigentes, a

técnica do manejo da mediunidade.

Em 1862 lançou duas pequenas brochuras de propaganda

doutrinária, posteriormente abolidas, à vista da larga aceitação da

Revista Espírita. Eram elas: O Espiritismo na sua expressão mais

simples e Refutação às críticas ao Espiritismo.

Com um volume encerrando a filosofia da Doutrina Espírita e

outro a técnica para a utilização dessa nova ciência, em breve a

trilogia se completava pelo estudo da parte moral. Esse terceiro

livro fundamental teve a sua primeira edição em abril de 1864, sob o nome de Imitação do Evangelho Segundo o Espiritismo.

Refundindo em nova edição, que lhe deu caráter definitivo, o nome

primitivo foi substituído pelo atual: O Evangelho Segundo o

Espiritismo.

Outro seria o conceito que os espiritistas formam da doutrina se tivessem estudado atentamente as primeiras linhas, de notável

significação, que abrem a sua Introdução.

Vale a pena transcrevê-las, porque em geral elas são lidas sem

meditação, apenas uma vez. Dizem assim:

“Podem dividir-se em cinco partes as matérias contidas nos Evangelhos: os atos comuns da vida do Cristo; os milagres; as

predições; as palavras que foram tomadas pela Igreja para

fundamento de seus dogmas; e o ensino moral. As quatro

primeiras têm sido objeto de controvérsias; a última, porém,

conservou-se constantemente inatacável. Diante desse código divino, a própria incredulidade se curva. É terreno onde todos os

cultos podem reunir-se, estandarte sob o qual podem todos

colocar-se, quaisquer que sejam suas crenças, porquanto jamais

ele constituiu matéria das disputas religiosas, que sempre e por

toda parte se originaram das questões dogmáticas. Aliás, se o discutissem, nele teriam as seitas encontrado sua própria

condenação, visto que, na maioria, elas se agarram mais à parte

mística do que à parte moral, que exige de cada um a reforma de

si mesmo. Para os homens, em particular, constitui aquele

código uma regra de proceder que abrange todas as circunstancias da vida privada e da vida pública, o princípio

básico de todas as relações sociais que se fundam na mais

rigorosa justiça. É, finalmente e acima de tudo, o roteiro

infalível para a felicidade vindoura, o levantamento de uma ponta do véu que nos oculta a vida futura. Essa parte é a que

será objeto exclusivo da presente obra.”

Eis aí, numa clareza meridiana, não apenas o ponto de vista de

Allan Kardec, mas o dos altos Espíritos que lhe ditaram a doutrina.

Aí estão nitidamente separados os textos dos Evangelhos em cinco partes: a principal – referente ao ensino moral – tratada nesse

terceiro volume; duas outras, a saber, os milagres e as profecias,

que iriam constituir o objeto de A Gênese; as palavras que

serviriam para o estabelecimento dos dogmas da Igreja, que iriam

fornecer tema para O Céu e o Inferno e, possivelmente, para outras obras, se ele tivesse tido vida mais longa, para concluir o seu plano

de trabalho.

Assim, em começo de agosto de 1865 as livrarias exibiam

O Céu e o Inferno ou A Justiça Divina Segundo o Espiritismo,

magnífico estudo em que se explica o simbolismo desses supostos lugares de ventura e de sofrimento de um ponto de vista racional,

positivo e conforme a suprema justiça, que é um dos mais nobres

atributos da Divindade.

A já a 6 de janeiro de 1868 aparece A Gênese, os milagres e as

predições segundo o Espiritismo. Como se vê pelo título, a obra não só restabelece a verdade sobre a cosmogonia cristã, baseada

nos princípios da ciência, como encara a teoria católica do milagre

como exceção das leis da natureza, mostrando, do ângulo

espiritista, que tais leis não comportam uma derrogação; no que se

refere às predições ou profecias, estuda o fenômeno sob a luz da mediunidade, tirando-lhe, assim, qualquer veleidade de mistério e

de milagre. Esse volume compendia, até certo ponto, os três

primeiros livros básicos, podendo, por isso mesmo, ser considerado

como a melhor obra do Codificador.

É certo que a crítica moderna lhe faz restrições um tanto apressadamente, pelo fato de, quer o Codificador, quer os Espíritos

que lhe deram algumas mensagens, terem usado uma linguagem

hoje superada, à vista dos mesmos progressos da ciência. Mas os

Espíritos estavam certos, de vez que, falando aos homens, não poderiam usar de explicações baseadas em teorias que só muito

mais tarde deveriam estabelecer-se, à luz de novos conhecimentos.

É aos homens, e não aos Espíritos, é que cabem tais descobertas. O

mais que se poderia fazer no particular seria uma edição com o

texto primitivo, mas largamente comentado, que possibilitasse às pessoas de cultura mediana transportar-se de uma linguagem

científica e de um sistema expositivo velhos de um século, para o

sistema da era atômica. isto, porém, requer uma grande bagagem de

conhecimentos, principalmente no campo da Física, da Geologia,

da Mecânica Celeste e da Biologia, principalmente da Biologia Pré-histórica, além de uma bagagem maior de respeito e de

compreensão pela obra de Allan Kardec, o que infelizmente nem

sempre tem havido. Já temos ouvido de alguns estudiosos

apressados a manifestação do desejo de que fosse atualizada a obra

kardeciana. Consideramos isto um perigo, máxime porque não sabemos até onde pode chegar a febre de modernização, com o

risco de alterar a compreensão kardeciana da Doutrina dos

Espíritos.

Ao invés disso fora preferível que, em separado, se fizesse, a

exemplo do que aconteceu com tantos pensadores de renome, a apreciação global de sua obra, sob o aspecto filosófico e

sociológico. Então em o Pensamento vivo de Kardec seriam

apreciadas as linhas gerais da Doutrina dos Espíritos, os critérios

científicos que presidiram à Codificação, A Filosofia nela contida,

a sua atitude para com as religiões dogmáticas, e não contra as religiões em geral, como erroneamente muitos a interpretam, a

filosofia penal espiritista e, principalmente, a sociologia espírita,

que ofereceria as linhas mestras de um programa político que,

dentro dos princípios cardinais do ensino de Jesus Cristo, realizaria

a verdadeira democracia, sem lutas de classe, sem antagonismos raciais ou religiosos. Porque – nunca é demais lembrá-lo – dentro

do ponto de vista espiritualista, se a vontade de Deus é onipotente,

aqueles mesmos aspectos das religiões que para nós se acham

superados coexistem em nossa sociedade e em nossos dias, porque

ainda têm uma mensagem a dizer a uma parcela da humanidade não preparada para receber mensagem mais elevada.

Parece-nos que o Espírito de Kardec está à espera de que

alguém realize essa tarefa, que a ele não poderia caber,

principalmente porque ela necessitava de tempo para que se

pudesse avaliar os frutos produzidos pela doutrina e aqueles que ela ainda pode dar.

Allan Kardec tinha vindo já maduro para os trabalhos da

Doutrina dos Espíritos. Contava cinqüenta e um anos e era portador

de uma lesão grave no coração. Trabalhara intensamente desde

mocinho. Os Espíritos lhe recomendavam certa moderação, que ele não se podia permitir porque, olhando em seu redor não via

companheiros que enxergassem as coisas do seu mesmo ponto de

vista. Tanto assim que através de sua elegância espiritual, por mais

de uma vez teve que publicar na Revista Espírita resumos de

sessões da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas ou discursos-relatórios de sua gestão, que terminavam com um pedido de sua

substituição. Sente-se aí que alguns diretores desejam imprimir

uma orientação diversa à sociedade e, conseqüentemente, à marcha

do Espiritismo. Nesses discursos-relatórios Kardec não só

justificava a sua orientação, inspirada pelos espíritos, como demonstrava a inviabilidade dos planos dos que lhe eram adversos.

Felizmente o bom-senso triunfava.

Mas é de convir que uma luta continuada de cerca de quatorze

anos contra forças externas e, também, contra os que agiam

internamente na Sociedade deveriam extenuá-lo.

Sua última luta foi após a publicação de A Gênese, os milagres

e as predições segundo o Espiritismo.

Em 1869 tratou de reconstituir a Sociedade Parisiense de

Estudos Espíritas sob novos moldes, que permitissem manter uma

livraria espírita, sustentar a publicação da Revista Espírita e a

reedição das suas obras, já citadas. Então ele residia à rua Sant’Ana

25, Galeria Sant’Ana, e pretendia mudar-se a 1º de abril de 1869

para a Avenue Ségur, onde anos antes havia comprado um terreno e estava concluindo a construção de seis casinhas destinadas, após a

sua morte, para asilo de velhos espíritas. A livraria estava sendo

instalada à rua Lille nº 7, e sua inauguração deveria dar-se a 1º de

abril.

Sua casa estava completamente desarrumada, em ablativos de mudança, a sala em desordem, cheia de pacotes que iam sendo

transportados quando, ao entregar um pacote da Revista Espírita, o

Codificador caiu fulminado, pela ruptura de um aneurisma da aorta,

na véspera de sua instalação em novo e definitivo endereço e da

inauguração da livraria, isto é, a 31 de março de 1869, quando ele contava 65 anos de idade.

Mesmo assim, a livraria foi inaugurada no dia seguinte. Foi

opinião de sua viúva e dos amigos mais íntimos que esse ato

representava a execução de sua última vontade.

Foi sepultado no cemitério do Père Lachaise, onde os discípulos e amigos fizeram erigir um modesto mausoléu.

Allan Kardec não deixou descendência. Casara-se em Paris, a 6

de fevereiro de 1832, portanto aos 28 anos de idade, com a

Professora Amélie Gabrielle Boudet, nascida a 23 de novembro de

1795, portanto nove anos mais velha do que ele, muito embora não o parecesse. Era de família rica.

Ela continuou a auxiliar os trabalhos da livraria, zelando pelo

patrimônio espiritual de seu esposo. Faleceu a 21 de janeiro de

1883, aos oitenta e nove anos de idade.

*

Allan Kardec deixou muita coisa inédita, mas também deixou

um plano de trabalho, conforme ficamos sabendo pelo que,

posteriormente, se publicou num volume de Obras Póstumas.

Nesse volume há uma ligeira biografia do Codificador, que foi

publicada na Revista Espírita de maio de 1869 e o célebre discurso

proferido pelo astrônomo Camille Flammarion à beira de seu

túmulo.

Entretanto a leitura do volume nos deixa a impressão de que

muita coisa ficaria ainda desconhecida do público. O próprio título

do livro, no plural, nos deixa supor que outros volumes iriam

aparecer.

Por que não vieram?

Mistério.

Há alguns anos, antes da segunda grande guerra, ilustre

confrade nosso esteve durante alguns anos em Paris e teve

oportunidade de manusear muitos originais inéditos, deixados por

Kardec, na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, chegando mesmo a tomar alguns apontamentos. Acontece, entretanto, que se

arrastava no forum parisiense uma velha demanda entre parentes da

sra. Amélie Boudet, Viúva de Allan Kardec e a Sociedade

Parisiense de Estudos Espíritas. Queriam aqueles a posse dos

escritos inéditos de Allan Kardec.

Como os reclamantes eram confessadamente católicos, não era

de esperar que os quisessem publicar. O que é que ambicionavam?

Fazer um bom negócio vendendo raridades?

Não se pode afirmá-lo.

O que se sabe é que esse material está desaparecido. Segundo uns, destruído pelos alemães, quando invadiram a França na

segunda Grande Guerra; segundo outros, destruído pelos próprios

colaterais da Viúva Alan Kardec.

Para a maioria dos Espíritos uma boa parte do trabalho deixado

pelo Codificador continua desconhecida: são os doze volumes que encerram a Revista Espírita escrita quase que exclusivamente por

ele. Tais volumes são hoje raríssimos.

Tentamos traduzi-los e chegamos a lançar dois volumes. Na

Argentina houve igual tentativa e não chegaram a concluir nem o

primeiro. Conhecerá um dia a massa espírita do Brasil essa

preciosidade?

Esperemos.

São Paulo, dezembro de 1955.

Júlio Abreu Filho

FIM

Notas:

1 Vide O Livro dos Espíritos, nº 237.

2 Vide O Livro dos Espíritos, nº 100, Escala Espírita; O Livro dos

Médiuns, cap. XXIV. 3 A palavra médium em francês foi criada em 1856, com o sentido

usado no Espiritismo; em inglês foi criada por Swedenborg, no

fim da primeira metade do século XVIII. Em ambas essas línguas

foi mantida a grafia latina (médium), que é forma neutra: tanto se

deriva do substantivo medium, medii, quanto do adjetivo de primeira classe medius, medium. Como as demais línguas, a

nossa consagrou a mesma grafia latina. Desde, porém, que não há

gênero neutro em português, os dicionários atribuem-lhe o gênero

masculino; mas é, visivelmente, um vocábulo epiceno. Assim,

quer se trate de intermediário masculino, quer feminino, penso que se deve dizer, invariavelmente, o médium, um médium, como

por exemplo: João é bom médium; Dona Maria é um bom

médium. E não: ela é uma boa médium, e, muito menos ainda, ela

é uma boa média.

É verdade que Larousse deriva a forma francesa do masculino latino medius. Como, porém, explicar que, contrariando o espírito

daquela língua, fossem buscar uma terminação invulgar e

tipicamente estranha? Talvez um cochilo de Homero. (N.T.) 4 Vide Revista Espírita, 1º volume: O Espírito batedor de

Bergzabern. - pág. 129, 157, 192. Ibidem: O Espírito batedor de Dibbelsdorf - pág. 232. Edipo editora. Ainda: Revue Spirite, 3º

volume: Le boulanger de Diepper - pág. 76; Le fabricant de

Saint-Pétersburg - pág. 115 ; Le chiffonier de la rue das Noyers -

pág. 236. 5 Vide O Livro dos Médiuns, nº 267.

6 Vide O Livro dos Médiuns, nº 286: Perguntas que podem ser

dirigidas aos Espíritos.

7 Vide O Livro dos Médiuns, cap. XVI, nº 195.

8 Vide O Livro dos Médiuns, cap. XIII, nºs 152 e segs.

9 Vide O Livro dos Médiuns, cap. XV, nºs 179 e segs.; cap. XIX,

nºs 223 e segs. 10

Vide O Livro dos Médiuns, 2ª parte. 11

Vide O Livro dos Médiuns, cap. XXIII. 12

Vide O Livro dos Médiuns, nº 279; Revue Spirite, de fevereiro, março e junho de 1864; La jeune obsédée de Marmande.

13 Vide O Livro dos Médiuns, cap. XXIV.

14 Vide acima, nºs 74-75.

15 Vide O Livro dos Médiuns, cap. XXVIII – Charlatanismo e

Embuste, Médiuns interesseiros, fraudes espíritas, nº 300; vide, também, Revue Spirite, 1862, pág. 52.

16 Vide O Livro dos Médiuns, cap. XXIV, Identidade dos Espíritos;

Revue Spirite, 1862, pág. 82: “Carrère – Constatation d’un fait

d’identité”. 17

Vide O Livro dos Médiuns, cap. XXVII, Contradições e mistificações; Revue Spirite, 1864, pág. 99, Autorité de la

doctrine Spirite; O Evangelho Segundo o Espiritismo,

Introdução II, Autoridade da Doutrina Espírita. 18

Vide O Livro dos Espíritos, nº 55; Revista Espírita, vol. I,

Pluralidade dos Mundos. 19

Vide Revista Espírita, ano de 1858, págs. 68, 113 e 236; Revue

Spirite, ano de 1860, págs. 317, 319 e 321; O Evangelho

Segundo o Espiritismo, cap. III. 20

Vide O Livro dos Espíritos, nºs 114 e segs. 21

Vide O Livro dos Espíritos, nºs 116 e 222, Revue Spirite, ano de 1862, págs. 97 e 106.

22 Vide O Livro dos Espíritos, nº 379 – A infância.

23 Vide Revue Spirite, ano de 1861, pág. 270.

24

Vide Revue Spirite, ano de 1861, pág. 76 – La téte de Garibaldi;

idem, ano de 1862, pág. 97 – Phrenologie espiritualiste et spirite. 25

Vide Revue Spirite, ano de 1860, pág. 173 – L’Esprit d’un idiot ;

Idem, ano de 1861, pág. 311 – Les Crétins. 26

Vide O Livro dos Espíritos – Emancipação da alma, nºs 400 a

454; O Livro dos Médiuns – Evolução de pessoas vivas, nº 284;

Revue Spirite, ano de 1860, pág. 11; idem, pág. 81. 27

Vide O Livro dos Espíritos – Lei do Progresso, nºs 776 a 801;

Revue Spirite, ano de 1862, pág. 1 – Essai sur l’interprétation de

la doctrine des anges déchus; pág. 97 – Phrénologie

espiritualiste et spirite. – Perfectibilité de la race nègre. 28

Vide O Livro dos Espíritos, nº 155. 29

Vide Revista Espírita, ano de 1859: Morte de um Espírita, pág.

244; Idem, ano de 1860: Le reveil de l’Esprit, pág. 323; Idem,

ano de 1862: Obsèques de M. Sanson, pág. 129 e Entretiens

familiers d’outretombe, pág. 171. 30

Vide O Livro dos Espíritos, nº 165; Revista Espírita, ano de 1858, pág. 172: O suicídio da Samaritana; pág. 351: Um Espírito

nos funerais de seu corpo; Idem, ano de 1859, pág. 319: Um

Espírito que não se julga morto; Idem, ano de 1863, pág. 87:

François – Simon Louvet, du Havre. 31

Vide Revue Spirite, ano de 1861, pág. 202 : Les amis ne nous oublient pas dans l’autre monde; Idem, ano de 1862, pág. 132, in

fine e 133. 32

Vide Revista Espírita, ano de 1858, pág. 16: “Mãe, aqui estou!” 33

Vide Revista Espírita, ano de 1858, pág. 87: A rainha de Ouda;

pág. 145: O Espírito e os herdeiros; pág. 195: O tambor de Beresine. Idem, ano de 1859, pág. 344: O antigo carreiro; idem,

ano de 1860, pág. 325: Progrès des Esprits; idem, ano de 1861,

pág. 126: Progrès d’un Esprit pervers. 34

Vide O Livro dos Espíritos, nº 558.

35

Vide O Livro dos Espíritos, nº 237: Percepções, sensações e

sofrimentos dos Espíritos; Idem, Parte Quarta, caps. I e II, Esperanças e Consolações; Revista Espírita, ano de 1858, pág.

80: O assassino Lemaire; pág. 172: O suicídio da Samaritana;

pág. 357: Sensações dos Espíritos; Idem, ano de 1859, pág. 275:

Pai Crepin; Idem, ano de 1860, pág. 61: Estelle Riquier; pág.

247: Le suicidé de la rue Quincampoix; pág. 316: Le Chátiment; pág. 383: Entrée d’un coupable dans le monde des Esprits; pág.

384: Chátiment de l’égoiste; Idem, ano de 1861, pág. 53: Suicide

d’un athée; pág. 270: La peine du talion. 36

Vide O Livro dos Espíritos, nº 664; Revista Espírita, ano de

1859, pág. 315: Efeitos da prece sobre os Espíritos sofredores. 37

Vide O Livro dos Espíritos, nº 558: Ocupações e Missões dos

Espíritos; Revue Spirite, ano de 1860, págs. 320 e 321: Les purs

Esprits e Séjour des bienheureux; Idem, ano de 1861, pág. 179:

Madame Gourdon.