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Almanaque Brasil 152 - Dezembro 2011

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O Almanaque Brasil é um verdadeiro armazém da memória nacional, capaz de promover uma viagem pela história do País, em temas como música, cinema, teatro, literatura, dança. Marcam presença curiosidades, fatos históricos e matérias especiais, sempre de maneira envolvente e com surpreendente tratamento gráfico. A revista é editada pela Andreato Comunicação e Cultura, distribuída nos vôos da TAM e vendido nas Bancas de todo o Brasil. Mas não espere para viajar. Assine o Almanaque e viaje nas boas histórias do Brasil.

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ARMAZÉM DA MEMÓRIA NACIONAL

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O Natal não é uma data. É um estado da mente.

Mary Ellen Chase, educadora norte-americana.

Diretor editorial Elifas AndreatoDiretor executivo Bento Huzak AndreatoEditor João Rocha RodriguesEditor de arte Dennis VecchioneEditora de imagens Laura Huzak AndreatoEditor contribuinte Mylton SeverianoRedatores Bruno Hoffmann e Natália Pesciotta Revisora Liliane BenettiDesigners Guilherme Resende, Rodrigo Terra Vargas, Soledad Cifuentes e Daniela Santiago (estagiária)

Redatora web Marisa Nascimento (estagiária) Gerente administrativa Eliana FreitasAssistentes administrativas Viviane Silva e Geisa Lima Assessoria jurídica Cesnik, Quintino e Salinas AdvogadosJornalista responsável João Rocha Rodrigues (MTb 45265/SP)Impressão Gráfica Oceano

PUBLICIDADEFernanda Santiago (11) 3873-9115E-mail: [email protected]

Um último apelo a Papai Noel

Elifas Andreato

rezado Papai Noel, mesmo sabendo que você não existe, escrevo esta cartinha como fazem milhares de crianças em todo o mundo para também te fazer um pedido. Logo chegará o verão, e, com ele, uma multidão de homens vestirá pesa-

das fantasias para alentar a imaginação dos pequenos. Fantasias talvez adequadas para ter-ras geladas, mas absolutamente impróprias para a nossa estação mais quente do ano.

Há tempos tenho filho e filha – e agora, além deles, netas e neto. Foi difícil para mim revelar a eles que você é uma invenção, uma ilusão que eu gostaria de apagar do imagi-nário das crianças destes quentes trópicos.

No passado, resignado por razões que você conhece bem, menti para os meu filhos, mas agora não me permito mais fingir nem mesmo dizer que você existe. Essa decisão agora passo adiante, aos que têm filhos pequenos e talvez precisem vestir aquelas fantasias para encantar suas crianças, que esperam ansiosamente por presentes junto a pinhei-rinhos enfeitados.

Devo dizer, no entanto, que me entristece ver velhos senhores vestidos como você, atuan-do a serviço de lojas abarrotadas de verdadeiros papais noéis que fazem o que podem – e alguns, o que não podem – para que você continue existindo na imaginação dos pequenos.

Muitos, ao lerem este meu pedido, vão dizer que tenho mágoa por você nunca ter visitado aquela modesta casa metida na roça, no interior do Paraná. Talvez tenham razão. Durante algum tempo acreditei que as minhas velhas e surradas alpargatas te afugen-taram. Ou que aquele remoto lugar certamente estava fora das rotas costumeiras que suas renas percorreram anos a fio sem qualquer desvio.

Mas não é isso, não. Logo aprendi que não deveria esperar por você. Por isso, talvez já me aproximando da sua idade, me permito fazer este último apelo. Largue mão des-sas longas viagens, deixe suas renas descansarem em paz e não carregue mais esse imenso fardo de brinquedos imaginários que nos obrigam todo natal a torná-los reais numa corrida às lojas.

Já é passada a hora da aposentadoria da imaginação, meu caro. Se não for por vergo-nha de ser apenas uma ilusão, que seja pelo menos para dar fim a um longo tempo de mentiras passadas de pai para filho.

O Almanaque está sob licença Creative Commons. A cópia e a reprodução de seu conteúdo são autori-

zadas para uso não comercial, desde que dado o devido crédito à publicação e aos autores. Não estão incluídas nessa licença obras de terceiros. Para reprodu-ção com outros fins, entre em contato com a Andreato Comunicação & Cultura. Leia a íntegra da licença no site do Almanaque.

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Distribuição em voos nacionais e internacionais

[email protected] www.almanaquebrasil.com.br twitter.com/almanaquebrasil

O Almanaque é uma publicação da Andreato Comunicação & Cultura.Rua Dr. Franco da Rocha, 137 - 11º andar Perdizes. São Paulo-SP CEP 05015-040 Fone: (11) 3873-9115

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Parceria

índice 5 carTa ENigMáTica

8 vOcê Sabia?

14 PaPO-cabEÇa

18 iLUSTrES braSiLEirOS

24 ESPEciaL

30 viva O braSiL

33 braSiL Na Tv

34 JOgOS E briNcaDEiraS

35 O TEcO-TEcO

36 EM SE PLaNTaNDO, TUDO Dá

38 bOM HUMOr

rio branco

Tia Dag

Natal dos ilustres

Nássara Laranja – parte 2

capa Guilherme Resende

caNTOS E LETraS

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Dezembro 2011

Figueiredo foi o único dos generais do período militar a fazer uma espécie de campanha antes de assumir a presidência da República pelo Arena. Em 1979, sobressaiu-se aos adversários do partido tirando o pesado par de óculos que usava quando chefe do obscuro Serviço Nacional de Informações. Cartazes com sua foto estampavam: “Hei de fazer deste País uma democracia”. Ele próprio fazia aparições pelas ruas ensaiando um “Me chame de João” para os populares. As pesquisas de opinião mostravam que o povo achava simpático o novo presidente, que aparecia de sunga em capas de revistas e fazia exercícios físicos diários, como se vê na inusitada foto ao lado.

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aúcho de São Borja como Getúlio Vargas, ele era consi-derado o herdeiro político do famoso conterrâneo. Am-bos alcançaram o cargo mais importante do País. Os dois

também tinham o trabalhismo como principal bandeira política. Tanto que uma frase sua entrou para a história: “Não troco um só trabalhador brasileiro por cem grã-finos arrumadinhos”.

Nem sempre ele quis saber de política. Na adolescência, che-gou a ser lateral-direito do time juvenil do Internacional. Depois foi cursar Direito. Os rumos mudariam em 1945, ao receber con-vite para se tornar presidente do Partido Trabalhista Brasileiro. Em 1950 já era deputado federal. Três anos depois, ministro do trabalho. Uma de suas primeiras atitudes foi dobrar o salário mínimo. Ganhou de cara a simpatia dos mais pobres.

Depois, foi vice-presidente de Juscelino Kubitschek e Jânio Quadros. Com a renúncia de Jânio, tornou-se presidente. Mas quase não conseguiu pôr a faixa presidencial. Os militares e alas conservadoras fizeram de tudo para impedir sua posse. Consideravam que o gaúcho era alinhado ao comunismo internacional.

Suas principais bandeiras como presidente foram a reforma agrária, a educação de qualidade e o aumento de impostos para os mais ricos. Mas o clima ficava mais insustentável a cada dia. Até que, em abril de 1964, um golpe militar o tirou do poder e lançou o País numa ditadura de mais de 20 anos. Morreria no exílio argentino, em 6 de dezembro de 1976, sem nunca mais ter colocado os pés no Brasil. (BH)

SOlUçãO NA P. 34

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d e z e m b r o

8/12/1672É inaugurado o elevador

lacerda, um dos símbolos turísticos de salvador, idealizado

pelo engenheiro augusto Frederico de lacerda.

8/12/1891 É inaugurada a avenida

paulista, um dos símbolos turísticos de

são paulo, idealizada pelo engenheiro Joaquim

eugênio de lima.

www.almanaquebrasil.com.br

s limites brasileiros poderiam ter mudado em 1895. Foi quando militares vindos da Guiana

Francesa ultrapassaram o rio Oiapoque e exigiram 260 mil quilômetros quadrados do Amapá. A colônia francesa aumentaria em quatro vezes o seu tamanho.

Há tempos o governo francês reivindicava o território, apesar do Tratado de Utrecht, assinado entre França e Portugal em 1713, que indicava a fronteira de então como válida. Só que o documento determinava que a fronteira era um tal “rio Japoque”. Os franceses diziam que se tratava do rio Araguari, enquanto os brasileiros defendiam que era o rio Oiapoque.

A decisão do Contestado Franco-Brasileiro, como o episódio ficou conhecido, coube ao presidente da Confederação Suíça, Walter Hauser. Depois de uma histórica argumentação do Barão do Rio Branco, Hauser determinou, em 1º de dezembro de 1900: o Amapá era todinho do Brasil.

Por pouco o Amapá não virou francês

(BH)

No site do AlmANAque, leia sobre os encantos do Amapá e as batalhas diplomáticas do Barão do Rio Branco.

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No site do AlmANAque, acesse vídeo em que a neta do atleta fala sobre ele.

Paraense conquistou nosso primeiro ouro olímpicoG

(NP)

uilherme Paraense era o único do batalhão que conseguia pegar a flor da árvore

mais alta da vila militar para agradar a neta do comandante. mirava a espingarda bem no talo e nunca errava. Além de ser militar, também atirava por esporte, no Fluminense Football Club. em 1920, embarcou por conta própria, assim como sete companheiros, para representar o Brasil na Olimpíada da Antuérpia.

era a primeira vez que o País tinha atletas nos jogos olímpicos, reorganizados depois da Primeira

Guerra. A participação foi um tanto quanto conturbada, mas, graças ao paraense, foi na Bélgica que comemoramos nosso primeiro triunfo.

Os percalços começaram ainda no navio em direção à europa: os atletas

ficaram sabendo que não chegariam a tempo das provas e que o melhor era descer em lisboa e terminar o trajeto de trem. Assim seguiram para Paris. Só que, na conexão em Bruxelas, tiveram as armas e munições roubadas.

Apesar de terem chegado à Antuérpia sãos e salvos, não tinham como competir. Além do moral abalado, simplesmente haviam ficado sem equipamento. Por sorte, contaram com a solidariedade da equipe dos estados unidos, que se impressionou com a situação e emprestou aos atletas suas armas e munições.

De igual para igual, os brasileiros derrotaram os benfeitores. Na categoria Pistola Rápida, Paraense conquistou nosso primeiro ouro em provas olímpicas, deixando para trás o norte-americano Raymond Bracken. levou ainda um bronze na Pistola livre por equipe, que se somou à prata de Afrânio da Costa na Pistola livre individual – nossas três primeiras medalhas em olimpíadas.

Fases da Lua1 . 2 . 3 . 4 . 5 . 6 . 7 . 8 . 9 . 10 . 11 . 12 . 13 . 14 . 15 . 16 . 17 . 18 . 19 . 20 . 21 . 22 . 23 . 24 . 25 . 26 . 27 . 28 . 29 . 30 . 31

novacrescente minguantecheia

Guilherme Paraense

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Por pouco o Amapá não virou francês

uem pensa que não é possível fazer ciência sem laboratório, microscópio de última geração e computadores, não conhece os

índios Caiapó. Ali, às margens do rio Xingu, no Pará e no Mato Grosso, não é de hoje que esse povo estuda a natureza apenas a partir do olhar.

Os Mebêngôkre-Kayapó, como eles mesmos se chamam, conhecem e diferenciam os reinos animal e vegetal, fazem a classificação de bichos e plantas. Identificam 56 espécies de abelhas, 64 de formigas e 85 de vespas. Mas paixão mesmo eles têm pelos marimbondos. O inseto é famoso pelo forte ataque ao invasor de seu ninho. Os Caiapó copiam o comportamento do bichinho, sua formação e organização em batalha, e acabaram sendo reconhecidos por sua habilidade de guerrear. E não é só isso: os ritos de passagem de criança para jovem e de jovem para adulto são marcados por uma luta contra os amuh – os tais marimbondos, na língua nativa.

Acostumados a observar a floresta, os Caiapó sabem como tirar proveito dela sem agredir. Ecologia por lá é moda antiga: há séculos plantam e colhem os alimentos sem degradar o ambiente, respeitando o tempo da terra.

Para descobrir tudo isso, William Leslie Overal, pesquisador do Museu Goeldi, se embrenhou na mata pela primeira vez 34 anos atrás. Nascido nos Estados Unidos, gostou tanto da experiência que repetiu a dose muitas outras vezes. A cada viagem, passava de quatro a cinco semanas mergulhado na cultura das aldeias Caiapó e na sabedoria desses brasileiros escondidos pela Amazônia. E é de lá que o estudioso sacou a conclusão: “Eles é que deveriam nos ensinar”.

Kolombolo revive tradição do samba paulistano

(Carol assis, de São Paulo-SP - OVErMuNDO)

Biólogos sem diploma, caiapós são cientistas da florestaQ

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(Laís Duarte)

SAIBA MAIS Visite o portal Povos Indígenas do Brasil, mantido pelo Instituto Socioambiental: http://pib.socioambiental.org.

SAIBA MAIS Confira outros conteúdos sobre o samba paulista em www.overmundo.com.br.

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uase sempre, quando pensamos em São Paulo, nos vem à mente a correria,

o trânsito, o comércio. mas a cidade é, entre outras coisas, terra de samba. muito antes do modelo das escolas de samba do Rio ter sido implantado, na capital paulista os cordões já eram tradição carnavalesca.

Se hoje o samba é símbolo cultural do Brasil, não era assim na década de 1950, época da formação do primeiro cordão. Naquele tempo, havia muito mais preconceito racial, social e cultural no País. e o samba em São Paulo era tido como coisa de vagabundos, arruaceiros e bêbados. Neste contexto, foram muitos os problemas que arrastaram os cordões para a derrocada: a repressão policial, o preconceito, a falta de recursos.

Desde maio de 2002, porém, o Grêmio Recreativo de Resistência Cultural Kolombolo Diá Piratininga sai às ruas para resgatar a tradição carnavalesca paulistana. O grupo também realiza pesquisas, desenvolve oficinas, estimula o surgimento de novos compositores, produz CDs e realiza rodas que já são populares na Vila madalena.

líder do grupo, Renato Dias afirma que o Kolombolo não tem pretensão de fazer uma réplica do que ocorria no passado. Há a presença de alguns elementos fortes, como a marcha-sambada e a figura do baliza, que abre as passagens e guarda as porta-estandartes da agremiação. mas, entre todos os elementos preservados, diz ele, o mais importante é a alegria contagiante do povo brincando carnaval nas ruas, com suas fantasias, irreverência e criatividade.

10/12 dia inter

nacional

dos povos

indígenas

enigma figurado

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R.: confira a resposta na página 34

Raul Seixas? Não. mas a figura ao lado também é um nome

fundamental do rock brasileiro. Tornou-se conhecida nos

anos 1960, como integrante de uma banda que se destacou

em festivais da canção. Depois, a paulistana nascida em 31

de dezembro de 1947 continuou a emplacar sucesso atrás

de sucesso em carreira solo. Tanto que é considerada a rainha

brasileira do rock e um símbolo de mulher de atitude.

2/12 dia dosamba

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m Rua dos Cataventos, primeiro livro que mario quintana publicou, o soneto de

número 20 é dedicado ao também poeta gaúcho Athos Damasceno Ferreira: Joguei a minha bússola quebrada / Às águas fundas... E afinal sem norte, / Como o velho Sindbad de alma cansada / Eu nada mais desejo, nem a morte.

mesmo sem bússola alguma, mais tarde mario e Athos se encontrariam novamente em uma outra rua. Não na ficcional dos Cataventos, mas na rua do Rosário, onde os dois se estabeleceram no centro de Porto Alegre, nos anos 1960. Ter o mesmo CeP colocou os dois escritores em uma discussão sem fim. Não cansavam de dizer por aí: “Sou o melhor poeta da rua do Rosário”.

Até um dia em que mario procurou Athos, sério: “Olha, cheguei à conclusão de que tu és o melhor poeta da rua do Rosário”. O amigo não teve como reagir, senão agradecendo a humildade do poeta rival. mas quintana, irônico como sempre, terminou em tom de deboche: “Não é nada disso. É que acabo de me mudar para a Riachuelo”.

O centro de Porto Alegre se mantém eternizado nas crônicas de Athos, mas a rua do Rosário já nem se chama mais assim. leva o nome de Vigário José Inácio desde que morreu o padre da igreja do Rosário. Os dois melhores poetas que viveram por lá, por sua vez, não ficaram com menos: Athos Damasceno Ferreira dá nome a uma praça no bairro Auxiliadora. Já na rua dos Andradas encontra-se o belo e movimentado Centro Cultural mario quintana.

Quintana e Athos dividiam a rua, mas não o posto de melhor poeta

SAIBA MAIS Ora Bolas – O humor de Mario Quintana, de Juzarez Fonseca (lP&m, 2006).

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(NP)

fato aconteceu é notícia”, soou a vinheta da rádio Difusora, de

São Luís, na manhã de 30 de outubro de 1971. O locutor Rayol Filho então anunciou, com voz grave: “O observatório de Monte Palomar informou ter observado várias explosões de gás incandescente em intervalos regulares sobre a superfície do planeta Marte”. E brincou, antes de colocar mais uma música no ar: “Pois é, vamos seguindo com o nosso programa, antes que as partículas cheguem por aqui”. Logo depois, porém, Rayol retomou os microfones para anunciar uma invasão marciana em vários pontos estratégicos da Terra: Estados Unidos, Europa, Rio de Janeiro e, é evidente, São Luís.

Não é preciso dizer que marciano algum havia sido visto do lado de cá do sistema solar. Tratava-se de uma brincadeira do produtor Sérgio Brito, convidado a criar um programa especial em comemoração ao aniversário da emissora. Brito se inspirou no norte-americano Orson Welles, que, em 1938, produziu uma transmissão radiofônica intitulada A Guerra dos Mundos. Em tom tom jornalístico, o futuro diretor de Cidadão Kane dizia que a Terra estava sendo invadida por marcianos, causando pânico nos Estados Unidos. Brito talvez não esperasse tamanho estardalhaço, mas provocou algo parecido entre os ludovicenses.

A Difusora entrou em rede com uma emissora fictícia do Rio de Janeiro, pela qual um “especialista” confirmava a invasão. O sonoplasta Manoel Pereira criou ruídos que soavam como espaçonaves. O repórter Jota Alves foi “deslocado” para o aeroporto Tirirical, onde conversou com populares que confirmavam o ataque alienígena. Também anunciou que aviões comerciais estavam sendo perseguidos por naves, e que havia avistado um objeto não identificado no Campo de Perizes, que ligava São Luís ao continente. Não foi à toa a presença de um OVNI no local: “Eu tinha medo de uma fuga em massa acontecer, então coloquei uma nave espacial ali”, afirma Brito.

O clima de desespero foi maior quando Jota Alves saiu abruptamente do ar durante uma entrevista. O repórter só podia ter sido morto pelos marcianos. Logo entraram músicas tristes, até a marcha fúnebre. Não havia dúvidas: o mundo estava para acabar. O centro da cidade fechou as portas e os taxistas tiveram trabalho dobrado – todos queriam passar os últimos instantes junto aos entes queridos.

Ao longo do programa, por duas vezes, uma vinheta entrou no ar explicando que se tratava de uma peça de ficção. De pouco adiantou. Quando o povo percebeu que tudo não passava de uma brincadeira, era tarde. O exército já havia invadido e lacrado a emissora, que ficou três dias fora do ar.

“As pessoas ficaram com muita vergonha de terem sido enganadas, o que ajudou a esfriar o assunto”, explica Manoel Pereira, o responsável pelos assombrosos efeitos especiais. Para sorte da equipe da rádio, ninguém foi preso. E nem o mundo acabou.

Ataque marciano causou pânico em São Luís 8/12

dia do produtor de rádio e tevê 23/12

dia do vizinho “O

(BH)

No site do AlmANAque, ouça trechos da versão brasileira de A Guerra dos Mundos. Outubro de 71 – Memórias fantásticas da Guerra dos Mundos, de Francisco Gonçalves da Conceição (edufima, 2011).

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Jornal Pequeno noticia a “brincadeira de péssimo gosto”.

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o baú do Barão“Ciúme é mais amor-próprio que o próprio amor.”Nossa homenagem a Aparício Torelly, o Barão de Itararé.

m 1997, o conservador mundo do tênis se surpreendeu com o surgimento de

um tenista brasileiro que tinha um visual mais parecido com o de um surfista: o catarinense Gustavo Kuerten. Naquele ano, Guga se sagrou o vencedor do tradicional torneio de Roland Garros pela primeira vez e ainda acumulou outras 20 vitórias em torneios importantes.

O grande momento de sua carreira, porém, se deu três anos depois, quando tornou-se o único brasileiro número um do mundo. Disputando partidas contra lendas do esporte, como Pete Sampras e Andre Agassi, o “manezinho da ilha” conquistou cinco torneios, inclusive em quadras rápidas, que não eram a sua especialidade.

A coroação ocorreu em 3 de dezembro de 2000, ao vencer Agassi na final do master de lisboa. Festa da torcida portuguesa e de seu

Guga ignorou ídolos e tornou-se o número um

(BH)

E

ra 7 de dezembro de 1971, 40 anos atrás. Imagens enviadas de Washington mostravam médici

chegando com sua esposa à Casa Branca, onde eram aguardados pelo casal Nixon. O encontro do presidente brasileiro com o norte-americano foi coberto por toda a pompa: visitas, jantares, recepções, pronunciamentos.

Numa das cerimônias, Nixon brindou o “milagre econômico” brasileiro e saudou o “grande vizinho do sul”. A mensagem que médici trazia “do povo brasileiro” falava em aliança para “justiça, progresso e paz”.

Foi só em 2009, entretanto, que veio a público a conversa reservada que os chefes de estado tiveram, enquanto o Brasil vivia os anos de chumbo do regime militar, e os estados unidos, a Guerra do Vietnã. O tema do amigável encontro foi a destituição do presidente chileno Salvador Allende, com promessas de ajuda finaceira americana e cooperação estratégica brasileira.

Dois anos depois, Allende sofreu o golpe que lhe custou a vida. e também a democracia chilena por quase 17 anos.

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(NP)

No site do AlmANAque, assista a trechos da partida final do master de lisboa em 2000.

dezembrotambém tem

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23 24 25 26 27 28 29 30 31

Dia do Imigrante

Dia Nacional do Samba

Dia do Selecionador de Pessoal

Dia do Pedicuro

Dia do Voluntário

Dia da Extensão Rural

Dia do Casal

Dia do Cronista Esportivo

Dia do Alcoólatra Recuperado

Dia do Palhaço

Dia do Tango

Dia do Avaliador

Dia Nacional do Forró

Dia Nacional da Ópera

Dia do Jornaleiro

Dia da Levitação

Dia do Presbiteriano

Dia Nacional Contra o Trabalho Infantil

Dia da Bondade

Dia do Biomédico

Dia do Atleta

Dia da Consciência Ecológica

Dia da Carteira de Habilitação

Dia do Reisado

Dia de Natal

Dia do Pedreiro

Dia da Sagrada Família

Dia do Salva-Vidas

Dia Internacional da Biodiversidade

Dia da Engenharia

Dia da Esperança

No site do AlmANAque, assista ao vídeo oficial do encontro entre Nixon e médici em 1971.

Médici foi à Casa Branca tramar contra colega chileno

treinador, larri Passos, que foi às lágrimas. “este é o dia mais feliz da minha vida”, resumiu Guga, emocionado.

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médici e Nixon: conspiração contra Allende.

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s ruas do Recife e de Olinda se encheram de gente, festa e batuques antes proibidos.

A comemoração de 1817 daria inveja ao Galo da madrugada, mas nada tinha a ver com carnaval. Brindava o casamento da versão brasileira de Romeu e Julieta – um dos enlaces mais importantes da nossa história republicana.

De um lado, o noivo, patriota e republicano rebelde. De outro, a noiva, de família tradicional, filha do mais rico português do Recife. O matrimônio entre Domingos martins e maria Teodora da Costa foi o maior trunfo dos rebeldes que instalaram uma república em Pernambuco, quando o Brasil ainda fazia parte do Império de Portugal.

Os dois namoraram às escondidas por quatro anos, desde o momento em que o comerciante capixaba chegou a Pernambuco e caiu de amores

pela moçoila de 13 anos. Os dois sabiam que era um romance improvável: português algum daria a mão de sua filha a um “mazomba”, como pejorativamente chamavam os brasileiros. que dirá a um revolucionário.

Com a proclamação da República Pernambucana, liderada pelo rebelde apaixonado, o cenário mudou. em troca da mão da jovem, Domingos ofereceu a seu pai, Bento da Costa, vantagens no novo governo. Além de dar vazão ao amor do casal, o gesto legitimou a nova república e representou a pacificação entre brasileiros e portugueses.

Os princípios republicanos e o casamento, no entanto, foram pouco além da lua de mel. em 75 dias, as tropas portuguesas esmagaram a revolução. e, em 12 de junho daquele ano, ironicamente quando hoje se comemora o dia dos namorados, Domingos martins foi fuzilado.

“Romeu e Julieta” pernambucano acabou no paredãoA 7/12 dia do casal

SAIBA MAIS A Noiva da Revolução, de Paulo Santos de Oliveira (Comunigraf, 2006).

(BH)

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ão Paulo é a terra da primeira agência de publicidade do País, A eclética, fundada em 1914. A empresa foi

também pioneira ao organizar setores próprios para cada etapa do processo, como arte, criação e texto. “É um verdadeiro marco do empresariado publicitário brasileiro”, afirma Rodolfo lima martensen em A História da Propaganda no Brasil.

Criada por Jocelyn Benaton e João Castaldi, a agência chamou a atenção por colocar nas páginas do Estadão, em 1917, o primeiro anúncio em cores da publicidade nacional. A eclética inaugurou um modelo que entraria rapidamente na moda. muitos pequenos e médios comerciantes despertaram para a importância da

publicidade, e em pouco mais de três anos já havia outras cinco concorrentes na cidade.

A agência contou com a colaboração de muita gente boa, como os ilustradores Belmonte, Vicente Caruso e Pery de Campos. Já na área de texto, Afonso Schmidt, Guilherme de Almeida e até menotti del Picchia emprestaram suas penas para vender os produtos anunciados.

A eclética encerrou as atividades no início dos anos 1960, mas está na história pelo pioneirismo e por ter ajudado a criar, em 1937, duas das principais entidades que até hoje congregam os profissionais da área: a Associação Brasileira de Propaganda e a Associação dos Profissionais de Propaganda.

Nossa primeira agência tinha até Menotti del Picchia na redaçãoS

(NP)

Origem da expressãoPagar o Pato o primeiro registro da expressão é de 1450, ao ser usada na

obra Facetiae, de giovani bracciolini. na história, uma mulher queria comprar patos,

mas estava sem dinheiro. propõe, então, favores sexuais ao vendedor em troca das aves.

no meio da negociação, são surpreendidos pelo marido que, sem saber o que estava

acontecendo, paga pelos patos. desde então, a expressão é usada quando alguém arca

com as consequências de atitudes erradas de outras pessoas.

4/12 dia mundial da propaganda

o que se colhe em dezembro

estação colheita

lichia, abacaxi, nectarina, pêssego, manga, melancia, melão, uva, laranja.

No site do AlmANAque, confira um especial sobre a história da publicidade no Brasil.

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1 quinta Elói2 sexta Viviana3 sábado Francisco Xavier4 domingo Bárbara5 segunda Sabas6 terça Nicolau7 quarta Ambrósio8 quinta Romário9 sexta Leocádia10 sábado Melquíades11 domingo Damaso12 segunda Vicelino13 terça Luzia14 quarta Esperidião15 quinta Nina16 sexta Adelaide17 sábado Olímpia18 domingo Rufo19 segunda Timóteo20 terça Domingos de Silos21 quarta Pedro Canísio22 quinta Francisca Xavier23 sexta João Câncio24 sábado Charbel Makhlouf25 domingo Eugênia26 segunda Estevão27 terça João Evangelista28 quarta Teófila29 quinta Tomás Becket30 sexta Egwin

31 sábado Silvestre

Capricórnioa característica mais marcante dos capricornianos é a vontade de ser importante para a sociedade. são intensamente dedicados às causas coletivas e centrados na busca do que acreditam. não costumam bajular superiores para alcançar o intento – algo que abominam. também levam as relações amorosas muito a sério. É difícil que gastem tempo numa relação que desconfiam não ter futuro.

22-12 a 21-01

ão é de hoje que governos criam campanhas para incentivar a emissão de

nota fiscal no comércio. uma das primeiras, promovida no fim dos anos 1950, chamava “Seu talão vale um milhão”. Cada três mil cruzeiros em notas fiscais dava direito a concorrer a um sorteio de um milhão de cruzeiros. O que não se imaginava é que isso, somado a um reles pente, desencadearia um motim sem tamanho em Curitiba no dia 8 de dezembro de 1959.

Tudo começou com uma discussão entre um cliente e o dono de um supermercado. O comerciante libanês se recusara a emitir a nota pela compra de um pente, pois o valor era muito baixo. O acontecimento disparou a raiva dos clientes do estabelecimento. e depois, de todo o comércio da região.

em pouco tempo, centenas de curitibanos insatisfeitos com o aumento dos preços aderiram ao quebra-quebra, no episódio que ficou conhecido como Guerra do Pente. Para conter a multidão, a polícia teve que apelar até para a ajuda dos bombeiros e do exército.

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SAIBA MAIS A Guerra do Pente – O Dia em que Curitiba Explodiu, filme de Nivaldo lopes (1986).

Curitibanos descabelaram-se na Guerra do Pente

A siciliana viveu no século 9 e era uma mulher muito rica. mas também muito temente a Deus. um dia, decidiu renunciar a todo o dinheiro

e o entregou aos mais pobres. Ao confessar a fé em Jesus, o prefeito da cidade ordenou que fosse decapitada. É considerada a protetora contra as doenças dos olhos.

Santa Luzia

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confira a resposta na página 34

de quem são estes olhos?

A campineira nascida em 23 de dezembro de 1966 começou a carreira artística cedo. Aos

13 anos, foi estudar balé nos estados unidos. mas se preocupava por crescer rápido demais.

Antes dos 15, já tinha mais de um metro e setenta. Depois, tornou-se atriz em quadros

humorísticos de Jô Soares, o que abriu caminho para a dramaturgia na tevê. Hoje é uma das

atrizes mais conhecidas do País, com participações marcantes em 20 novelas.

Policiais tentam conter manifestantes em Curitiba.

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Seu nome é Dagmar Garroux, mas basta caminhar pelos labirintos da Casa do Zezinho para perceber que há tempos o tratamento afetivo suplantou o nome de batismo. De minuto em minuto, a conversa é interrompida por um “Oi, Tia Dag”, geralmente acompanhado de um abraço, um beijo

ou simplesmente um sorriso. E não há quem a trate de outra forma – seja empresário, artista, jovem ou velho. Quando ela chegou a esse mesmo endereço, no início dos anos 1990, o imóvel que

hoje abriga o projeto não passava de um “três cômodos” na região mais violenta de São Paulo. Para batizá-lo, inspirou-se no poema de Drummond que fala de um José sem saída. Arrancou-lhe a dúvida

e sapecou uma exclamação: é agora, José! A Casa do Zezinho cresceu. Alavancada pelo carisma singular da educadora e pelo que ela atribui a uma “conspiração do universo”, a entidade atende hoje 1.200 jovens e crianças. Já passaram por lá mais de 10 mil pessoas – Zezinhos que hoje não

apenas conquistaram espaço no mundo do trabalho, mas que passaram a enxergar o mundo de um outro modo. “Devolva o sonho para alguém e ele irá aonde quiser”, ensina. Tia Dag não se atém aos

números: “O que vivemos aqui todos os dias não cabe nas planilhas”. Mas quem for afeito a elas pode tirar conclusões reveladoras: na Fundação Casa, a antiga Febem paulista, gasta-se cerca de 3.700

reais por mês com cada criança. Na Casa do Zezinho esse custo não passa de 350 reais.

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Por João Rocha Rodrigues

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Educar é devolver sonhos

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Como começou a história da Casa do Zezinho? O embrião do projeto se deu ainda nos anos 1970. Depois que me formei em Pedagogia, comecei a trabalhar com crianças exiladas – crianças que vinham do Chile, da Argentina, do Líbano, de Israel. Uma das ferramentas pedagógicas que usava era le-var essa turma para conhecer outras realidades tão difíceis quanto às delas, que persistiam por séculos, passando das senzalas às periferias. Depois de conhecer mais de perto a vida das crianças das favelas, não tive como não me envol-ver. Em dado momento, começaram a aparecer os grupos de extermínio. Eles punham num poste quem ia morrer se não saísse da favela em sete dias. Matavam meninos que ti-nham roubado canetinhas – crianças de 10, 12 anos. Com meu marido, comecei a rodar São Paulo para encontrar um lugar para abrigar esses meninos. Mas, por medo, ninguém queria se envolver, nem mesmo os orfanatos. Eu não podia deixar aqueles meninos morrerem. A única solução era levá-los para a minha casa. Logo ela ficou pequena, e nós encontramos essa aqui, que hoje tem 3.200 metros quadrados de área construída, mas que naquela época era só sala, cozinha e banheiro. Então, com as minhas colegas da USP, começamos a Casa do Zezinho.

Como o projeto se bancava no início? Éramos nós e nós. No começo, todos éramos volun-tários, colocando parte do dinheiro que ga-nhávamos com outras atividades. A cada dia, um de nós era responsável por tudo: limpeza, comida, aulas. Em termos pedagógicos, esco-lhemos atuar com a cultura. Todo mundo sabia o que havia de ruim na periferia, então parti-mos para descobrir o que havia de bom e fize-mos disso o nosso conteúdo. Um menino foi contando para o outro o que acontecia por aqui, e o espaço foi ficando pequeno. E lá foi a Tia Dag fazer puxadinhos. Fiz questão que essa casa fosse construída igual a uma favela, um labirinto de puxadinhos.

Como esse esforço transformou-se em um projeto tão estruturado co-mo é hoje? Eu diria que houve uma conspiração do universo – a gente pensa que tem as rédeas na mão, mas não tem, não. Num dia em que a Casa do Zezinho estava sob a minha res-ponsabilidade, uma criança quebrou o dedo. Levei-a corren-do para o ortopedista e, na volta, a estúpida aqui decidiu fa-zer um agrado à criança: passamos no McDonald’s. A crian-ça voltou com o dedo engessado e um McLanche Feliz. No dia seguinte, havia três crianças com o dedo quebrado. Isso me assustou: se hoje o menino quebra o dedo para comer um sanduíche, daqui a 10 anos vai fazer o quê?

Como você contornou a situação? Primeiro conversamos com as crianças, dizendo que aquilo não era solução para coisa alguma. Depois, não teve jeito: tive que levar a turma toda para a lanchonete. Mas quando chegamos lá, com umas 60 crianças, um sujeito que estava lanchando com os filhos se aproximou e perguntou o que estava acontecendo. Quando contei a história do dedo quebrado, ele perguntou se não po-dia ajudar a levar as crianças de volta. E lá fomos nós. Che-gando aqui, passamos por um lugar onde acontecia a desova de corpos – essa região era chamada de Triângulo da Morte, juntando Jardim Ângela, Parque Santo Antônio e Jardim São Luiz. Nossa rua era assaltada 17 vezes por dia, havia morte o tempo todo, chacinas. Os coveiros do cemitério deixavam 60 covas preparadas para os mortos que iam chegar no fim de semana. No caminho, fui contando isso tudo. Quando ele viu o terreno vago ao lado da nossa casa, perguntou quantas

crianças a gente conseguiria cuidar se tivés-semos esse espaço. Eu respondi que mais de mil, sem acreditar que a pergunta tinha algu-ma intenção. No dia seguinte, chegou aqui um caminhão de arroz, feijão, dois freezers. Só então fui ler o cartão que o cara tinha me dado: era o João Batista Cardoso, dono do Moinho Santo André. Ele mobilizou sua rede de relacionamentos, comprou o terreno e co-meçamos a obra. O Batista, que até hoje é o nosso vice-presidente, diz que foi a obra mais cara da vida dele. Não tinha jeito: às vezes, diante das dificuldades por que passávamos, eu ligava para ele e perguntava: “E aí, Batista? Compramos cimento ou feijão?”. E comprá-vamos feijão.

Foi essa a grande virada da Casa do Zezinho? Não. Acho que isso, de certa forma, já estava acer-tado para acontecer. Para mim, a grande virada foi quando assassinaram meu pai. Nessa época, eu já cuidava de 200 Zezinhos. Um menino in-

vadiu o sítio em que morávamos – em Itapecerica da Serra, pertinho daqui –, meu pai reagiu e levou três tiros. Foi um baque. Desaluguei o sítio e fiquei um mês sem aparecer na Casa do Zezinho. Um dia, uma criança me ligou e falou: “Tia Dag, você tá muito triste, né? Se a gente for lá na Febem e mandar matar o cara que matou seu pai, você volta?”. Aquilo me deu um frio na barriga. Falei para mim mesma: “Caraca, meu pai morreu defendendo aquilo em que ele acreditava, que era a família. Eu vou morrer em pé”. Aí voltei. Voltei como uma louca, com uma energia sem fim. Essa foi a grande virada para mim. E não acho que isso foi uma prova. Não acho que faço missão alguma. Pode tirar estas palavras. Eu adoro o que faço, sou abençoa-da porque posso fazer o que gosto do jeito que gosto. Sou uma felizarda.

“Não acho que o assassinato do

meu pai por um adolescente

foi uma prova. Não acho que faço

missão alguma. Pode tirar estas

palavras. Eu adoro o que faço.

Sou uma felizarda.”

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para o céu, pedi desculpa ao “patrão” e toquei em frente. Três dias depois, a menina me procurou: “Tia Dag, quero ser puta em Brasília”. Era a minha oportunidade: “Então vem para a Casa do Zezinho. Você vai ter que arrumar os dentes, estudar, aprender outra língua, fazer atividade física”. Ela veio, e hoje é dentista.

O diálogo é parte importante da pedagogia da Casa do Zezinho? É esse tipo de situação que os educadores enfrentam todos os dias aqui. Nada é julgado, tudo é questionado. Não julgamos se a criança está cheirando, roubando. Uma carteira de identidade que eles roubam e levam para a “biqueira” vale 100 reais. É difícil competir. Paulo Freire dizia que educar é seduzir. Qual é a sedução que a Casa do Zezinho tem contra 100 reais imediatos? Então não adianta julgar o menino. Nesse mundo em que a

gente vive, ele também quer o brin-quedo, o tênis. É por isso que essa época para mim é um horror. No Natal desses meninos não tem ceia, não tem presente – no máximo, um frango assado em cima da mesa. Mas na tevê, no comércio, os meninos veem os presentes, as lojas enfeita-das... Como é que fica? É por isso que na Casa do Zezinho não faze-mos Natal. A gente faz confraterni-zação de fim de ano. E não aparece Papai Noel algum, porque se apare-cer vai ser expulso. Natal para mim é todo dia. A gente tem que exercer essa condição humana de gratidão, compreensão e tolerância. Não fa-zemos nem Dia das Mães nem Dia dos Pais. Imagina aqui quantos já perderam o pai assassinado, ou o pai está preso, ou sumiu. A escola co-memora todas essas datas – uma prova de como está distante da rea-lidade dos alunos.

Há algum método para reproduzir a pedagogia que foi criada aqui? O que fazemos aqui se inventa todo dia. Basta exercitar os cin-co sentidos, e batalhar. Se realmente estiver disposto a com-preender o outro, pode-se fazer em qualquer lugar. É só ouvir. E saber fazer as perguntas.

O que você espera para esse lugar nos próximos anos? O mesmo sonho continua, que cada criança, cada jovem, cada ser huma-no, cada bairro seja ouvido. Educar é um ato total de amor. É preciso ter a humildade de saber que não somos onipotentes, onipresentes. Que também somos educados dia após dia. Edu-car é devolver o sonho para alguém. Devolva o sonho para al-guém e ele irá aonde quiser.

A presença da Casa do Zezinho nessa região tem algum significado especial? Sempre acreditamos no desenvolvimento humano e local. O que adianta tentar tirar 100 mil pessoas do Parque Santo Antônio? Por que não melhorar o Parque Santo Antônio? O Capão Redondo tem quase um milhão de habitantes, e só há dois cinemas pagos na região. Mas há também o contra-ataque. Há 10 anos o Sergio Vaz toca a Cooperifa. Tem a turma do Ferréz, os Racionais, que colocaram a região na música e no mapa. Quando há saraus nos botecos, ninguém bebe, nin-guém fuma – é só poesia. Nesses 18 anos oficiais de Casa do Zezinho, além de 35 de área social, eu finalmente vi a popula-ção fazendo e reivindicando por ela. Esses caras são, para mim, os maiores pedagogos da região. Eles transformaram o Capão. Heliópolis também tem seus agitadores, Paraisópolis também – pessoas do lugar que in-vestiram na própria periferia. Esse movimento refletiu na entrada de ONGs, de pessoas que começaram a cutucar, mostrar, falar.

Como você define a sua participação nesse movimento? Eu sou simples-mente a “Tia Dag”. Eu vou morrer educadora. Para mim, a Casa do Zezinho é uma ponte. Ponte para os empresários, para os agitadores cul-turais daqui, para as crianças, para o pessoal do outro lado da ponte. É esse o papel da Casa do Zezinho.

Como vê a recente enxurrada de críticas às ONGs? Recentemente, numa discussão com outras entidades, estava tão brava com a situação que pensei em sugerir que todas as ONGs do Brasil fizessem uma semana de greve. Todas: ambien-tais, de saúde, educacionais, cultu-rais. Eu queria ver o que aconte-ceria com o Brasil. O terceiro setor não pode ser tomado de forma pejorativa.

Como é possível restabelecer vínculos sociais com crianças que cami-nham desde cedo no território da marginalidade? Uma vez, cheguei numa menina de uns 12 anos que estava se prostituindo na favela. Perguntei para ela: “Escuta, quanto é que você ganha por pro-grama?”. E ela: “Dez real”. A menina ganhava 10 reais e ficava com cinco. “Por que, Tia Dag, tá pensando em ser puta?” “Eu não”, respondi. “Se fosse pra ser puta, seria puta em Brasília. Lá ganharia três mil por transa, compraria um apartamento e casa-ria com um conde italiano cheio da nota. Muito melhor do que ficar aqui ganhando essa mixaria.” Depois que disse isso, olhei

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Nascido em São Cristóvão e criado em Vila Isabel, ambos bairros tradicionais da zona norte, Nássara produziu, entre um chope e outro, um importante legado artístico. Compôs exatas 235 músicas, todas com parceiros da pesada, como Noel Rosa, Wilson Baptista, Lamartine Babo, Mário Lago, Ari Barroso. Mas celebrizou-se mesmo por suas ilustrações, publicadas nos mais importantes jornais e revistas do Rio. Seus traços fortes, porém precisos, registraram os personagens da cidade: políticos, es-critores, sambistas, gente do povo. Não era preciso olhar duas vezes para seus desenhos para identificar o homenageado – ou a vítima. “Ele capturava, com linhas fortes, a alma frágil de quem estivesse desenhando”, define o jornalista Ruy Castro.

Primeiro jingle da históriaNássara sempre gostou de desenhar. Aos 17 anos, passou a tra-balhar como ilustrador do jornal O Globo. Logo depois entra-ria na Escola de Belas Artes, curso que abandonou no quarto ano. Já não dava conta das ilustrações que tinha de entregar, a essa altura em vários outros veículos.

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ão

im da década de 1960. A cidade do Rio de Janeiro estava em processo de rápida transformação. Prédios altos surgiam na orla das praias, edifícios antigos do cen-tro eram demolidos, a violência urbana começava a

sair do controle. Antônio Gabriel Nássara, então com quase 60 anos, via as mudanças sem muita preocupação, mesmo tendo sido testemunha dos momentos áureos da Cidade Maravilhosa. “O autêntico carioca é aquele que depois de ter sofrido na carne todos os pesadelos que desabaram sobre o Rio moderno, ainda encontra em si amor e ternura pela cidade”, disse em entrevista ao jornalista Joel Silveira.

Nássara havia passado as últimas décadas praticando com louvor as principais características cariocas: o papo-furado em botecos, o bom humor, o otimismo diante das dificulda-des, os sambas compostos sob o ritmo de caixinhas de fósfo-ro. Só temia pelo fim da espécie: “O bom carioca é uma raça em processo de extinção. Acabará quando acabar gente como eu. Ou como o Bororó, a Aracy de Almeida, o Marques Rebelo e o Di Cavalcanti”.

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NÁSSARA

Nascido na zona norte do Rio de Janeiro ele tornou-se um dos maiores caricaturistas da história do País. Não se limitou à atividade. Também compôs mais de 200 canções, boa parte marchinhas cantadas até hoje. Entre os parceiros, gente da pesada, como Noel Rosa, Wilson Baptista e Ari Barroso. Transpirando carioquice, Nássara nunca abriu mão de viver na boêmia, entre intelectuais, artistas e vagabundos.

Um carioca autêntico

Por Bruno Hoffmann

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O melhor produto do Brasil é o brasileiroCÂMARA CASCUDO

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Dezembro 2011

Aos poucos, foi se afastando das músicas e das ilustrações. Mas nunca dos bares e da boêmia. Havia quem disputasse a cadeira mais perto de Nássara para ouvir suas histórias, sempre surpreendentes. “Ele tem um bom humor conta-giante, boa educação inata, o irresistível amor pela noite. Tem também o bate-papo colorido no qual as palavras, ar-rumadas com maestria e propriedade, jamais repetem as mesmas histórias”, exaltou Joel Silveira.

Inventor do RioA carreira de Nássara ganharia novo fôlego em meados dos anos 1970, ao ser convidado para fazer parte da equipe de O Pasquim. Era o lugar ideal para seus traços – num tempo em que a imprensa começava a se tornar mais carrancuda, com menos espaço para experimentalismos. Se antes retra-tava Noel Rosa, Getúlio Vargas, Mário Lago, agora punha no papel Martinho da Vila, Pelé, Paulinho da Viola.

A partir dos anos 1980, passou a trabalhar menos, até por uma gradativa perda de audição. Mas não perdia o bom hu-mor. “Em Nássara nunca dará cupim”, havia profetizado Ari Barroso décadas antes.

Em 1996, aos 85 anos, ainda ilustrou o delicado livro in-fantil Moça Perfumosa, Rapaz Pimpão, de Daniela Chindler. Mas não chegou a ver o resultado ganhar as livrarias. Morreu em casa, em 11 de dezembro de 1996, vítima de enfarte. “A gente é que nem lâmpada. Um dia apaga”, disse a amigos, poucos meses antes da morte.

Dos tais bons cariocas em extinção a que um dia se refe-riu, foi o último a se despedir da Cidade Maravilhosa. Mas já havia deixado uma herança. “De uma certa maneira, o Rio é uma invenção de Nássara, Orestes Barbosa e Noel Rosa. Inventores também do papo-furado, foram se distraindo e a cidade cresceu em volta deles”, escreveu Millôr Fernandes.

Além dos desenhos, também tornou-se locutor do Programa do Casé, o mais importante programa de mú-sica da rádio carioca. Já começou inovando ao criar o pri-meiro jingle da história do rádio brasileiro: Ó padeiro des-ta rua / Tenha sempre na lembrança / Não me traga outro pão / Que não seja o pão Bragança. Era um fado, pois imaginou que o dono de padaria só poderia ser português.

Para anunciar um laxante e não chocar a “tradicional fa-mília carioca” – e nem a censura, que encrencava com anún-cios dessa natureza –, saiu-se com a historinha: “Um casal de noivos brigou. Ele, arrependido, resolveu fazer as pazes, mas a moça estava irredutível. Conversou com a futura sogra, que o aconselhou que presenteasse a filha com algo de valor. Comprou-lhe, então, uma joia caríssima. E não fez efeito. Deu-lhe um casaco de peles. Mas não fez efeito. Então, lembrou de dar a ela um vidro de Manon Purgativo... Ahhh! Fez efeito! Manon Purgativo, à venda em todas as farmácias e drogarias”.

AlalaôA composição musical começou a tomar papel importante na vida de Nássara a partir de 1932, ao emplacar nas rádios a música Formosa, em parceria com J. Rui. Outras grandes canções surgiriam nas décadas seguintes, principalmente marchinhas. A que causou mais comoção foi Alalaô, com-posta em parceria com Haroldo Lobo, que contou com uma genial orquestração de Pixinguinha. Os versos “Alalaô / Mas que calor / Atravessando o deserto do Saara/O sol estava quente e queimou a nossa cara” foram o maior sucesso do carnaval de 1941. E de todos que viriam pela frente.

Outras importantes canções surgiriam: Retiro da Saudade (com Noel Rosa), Mundo de Zinco (com Wilson Baptista), Quem Não Chora Não Mama (com Roberto Martins). Apesar disso, Nássara sugeria que tratava a músi-ca como um hobby. “Eu não me considero compositor. Eu fiz música, é diferente. Não tenho nem um décimo da força de Noel Rosa”, afirmava, modestamente.

Saiba maiS Nássara Passado a Limpo, de Carlos Didier (José Olympio, 2010).

Um carioca autêntico

Para Ruy Castro, o cartunista capturava a alma

frágil de quem estivesse desenhando. Já Ari Barroso

profetizou: “Em Nássara nunca dará cupim”.Sa

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biodiversidade é o conjunto das diferentes formas em que a vida se manifesta e interage compondo os vários tipos de ambientes. Por isso, sua

conservação é tão importante. Cada ser vivo se desenvolve nas diversas regiões do planeta Terra sob condições específicas de acordo com as características de cada local, tais como clima, relevo, hidrologia e geologia, se adaptando aos espaços que ocupam e, no caso do homem, desenvolvendo as várias culturas e civilizações, que também fazem parte da biodiversidade.

Conciliar a conservação da biodiversidade com o crescimento populacional e as demandas que acompanham o desenvolvimento econômico é um desafio cada vez maior para a humanidade. A velocidade com que as mudanças nos ambientes naturais ocorre é muito maior do que a capacidade de desenvolvimento de tecnologias necessárias para proteger o patrimônio natural e, ao mesmo tempo, permitir o crescimento econômico e social.

A preocupação com a redução da disponibilidade dos recursos naturais e a ocorrência de impactos negativos e danos aos ecossistemas está fazendo com que os mercados adotem uma nova forma de produção. Nesta nova economia, o valor da biodiversidade, bem como os custos associados à sua perda e/ou à sua recuperação, começam a ser incorporados aos negócios.

Nesse novo cenário, as empresas devem estar preparadas para investir em novos produtos e mercados, buscando o aumento da eficiência de seus processos produtivos e, como consequência, a redução dos custos de produção, incentivando o desenvolvimento de inovações tecnológicas voltadas para a adequada gestão e uso sustentável dos recursos naturais e dos ecossistemas.

A gestão da biodiversidade deve estar focada no equilíbrio entre as atividades operacionais da empresa e a

proteção do meio ambiente. Lidar com essa relação torna-se um grande desafio levando em consideração a complexidade do tema biodiversidade e o fato dele ainda estar na fronteira do conhecimento tecnológico e, principalmente, institucional e político.

Por que se preocupar com a biodiversidade?

A Vale é uma das maiores empresas de mineração do mundo e reconhece a importância da biodiversidade para manutenção da vida no planeta, incluindo a vida humana, e estabelece diretrizes para a gestão da biodiversidade nas regiões onde atua. A mineradora integra a conservação de espécies e dos ecossistemas às suas atividades operacionais para utilizar de forma sustentável os recursos naturais e os serviços ecossistêmicos, protegendo a biodiversidade e disseminando boas práticas em desenvolvimento sustentável.

NEGÓCIOS

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iNforme PubLiCiTário

Page 21: Almanaque Brasil 152 - Dezembro 2011

Linhares, Espírito Santo Vista aérea da Reserva Natural Vale

Foto: Ernest Schneider

Você sabia?Após a perda de habitat causada principalmente pelo desmatamento, a remoção de espécimes, seja pela coleta de animais para domesticação ou caça, é a segunda maior ameaça à fauna silvestre brasileira.

Por que se preocupar com a biodiversidade?

o longo dos séculos o homem vem se comportando como proprietário e usuário dos recursos naturais, não se

reconhecendo como parte integrante desse sistema.Nos últimos anos, entretanto, tem-se observado uma crescente

preocupação com a perda da biodiversidade e o reconhecimento de seu importante papel na manutenção da vida, o que demonstra mudanças de consciência e, em alguns casos, de conduta.

o brasil, enquanto país de grande diversidade natural, torna-se um importante ator nas discussões globais, as quais incluem agendas sobre conservação da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos. As lideranças dos diversos setores – sociedade civil, governos, empresas e investidores – precisam estar preparadas para atuar como protagonistas nos debates em busca de soluções para o crescimento econômico com sustentabilidade.

Essencial para a vida

é considerado um país megadiverso, campeão mundial em biodiversidade

terrestre. Quatro dos biomas mais ricos do mundo estão em seu território: mata Atlântica, Pantanal, Amazônia e Cerrado.

O Brasil

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Você sabia?A economia Verde consiste em um caminho para se alcançar o desenvolvimento sustentável e representa um novo paradigma de favorecer o crescimento econômico sem que sejam criados riscos ambientais. ela deve ser abordada não apenas como a busca pelo desenvolvimento sustentável, mas também como uma forma de “fazer a diferença”, sendo o setor privado considerado um ator-chave.

entre as ações relacionadas à economia Verde, citam-se: criação de novos empregos (reaproveitamento e reciclagem de materiais, cultivo e comercialização de produtos orgânicos, etc.), redução da emissão de carbono, uso eficiente de energia, emprego de fontes renováveis de energia e uso sustentável de recursos naturais.

iNforme PubLiCiTário

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Por que devemos conservar a biodiversidade?

partir das funções desempenhadas pelos ecossistemas, a biodiversidade assume papel fundamental na manutenção das condições que propiciam a existência de

vida no planeta. os ecossistemas são responsáveis pelo desenvolvimento de processos essenciais à vida, tais como a regulação do ciclo da água, a proteção do solo contra erosão, a manutenção da qualidade do ar, a ciclagem de nutrientes, a degradação de dejetos e a polinização, além de contribuir para a amenização de catástrofes naturais.

os serviços ecossistêmicos podem ser classificados em dois tipos: os de uso direto, que estão representados por todos os produtos oferecidos pela biodiversidade (alimento, madeira, fibras, etc.); e os de uso indireto, que estão relacionados às funções ecológicas desempenhadas por eles (regulação do clima, aspectos paisagísticos e culturais, entre outros).

o bom funcionamento da relação entre seres vivos e o meio ambiente garante itens básicos para a sobrevivência das espécies, como água boa para o consumo, ar puro, solo saudável para a produção de alimentos, além do fornecimento de matérias-primas utilizadas em diferentes tipos de produção.

Convenção sobre Diversidade Biológica

termo biodiversidade só se consolidou após a Conferência das Nações unidas sobre o meio Ambiente e o Desenvolvimento,

conhecida como rio 92, realizada no rio de Janeiro em 1992, onde países aprovaram a Convenção sobre a Diversidade biológica (CDb).

Para reduzir a perda da diversidade genética, de espécies e de habitats no mundo, a CDb prevê que cada país signatário estabeleça suas estratégias e planos nacionais, para integrar a conservação da biodiversidade com as políticas de desenvolvimento social e econômico.

países assinaram e ratificaram a Convenção sobre Diversidade biológica, que propõe regras para

assegurar a conservação da biodiversidade e o seu uso sustentável.157

Carajás, Pará Arara na Floresta de Carajás Foto: Beto Felício

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biodiversidade abrange ecossistemas e espécies, bem como a variação genética dentro de cada espécie. essa diversidade biológica é a base para uma série de

serviços, denominados serviços ecossistêmicos, que mantém as condições de vida no planeta. os serviços ecossistêmicos podem ser classificados em:

Serviços de suprimento: Abrangem o fornecimento de produtos e matérias-primas elementares como água, alimentos, madeira, fibras, fontes de energia e medicamentos.

Serviços de regulação: os ecossistemas desempenham um papel fundamental no ciclo da água, na manutenção da qualidade do ar, na proteção do solo contra erosão, na ciclagem de nutrientes, na degradação de dejetos e na polinização, bem como na regulação do clima e de eventos extremos, como inundações.

Serviços culturais: Abrangem valores emocionais, espirituais, estéticos e recreativos, servindo como fonte de inspiração para o homem, além de proporcionar oportunidades de lazer.

O que biodiversidade e serviços ecossistêmicos significam?

mbora a intensidade do uso dos recursos naturais e os impactos e danos causados aos ambientes (incluindo a geração de

resíduos) sejam avaliados como indicadores de desempenho, a valoração da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos ainda é um desafio para setores empresariais e governos.

No ambiente empresarial existem iniciativas que buscam o gerenciamento e a minimização dos riscos à biodiversidade e que, consequentemente, agregam valor aos negócios. o estudo global “economia dos ecossistemas e da biodiversidade” (sigla Teeb, em inglês), propõe análises que permitem ao setor empresarial medir, valorar e reportar seus impactos e sua dependência em relação à biodiversidade e serviços por ela prestados, contribuindo para a análise de suas externalidades e para a melhoria de suas atividades.

No longo prazo, os compromissos assumidos pelas empresas deverão se expandir para além dos requisitos legais vigentes, contribuindo para a sustentabilidade dos negócios e ampliando a participação do setor empresarial em iniciativas para conservação da biodiversidade.

Um desafio para as empresas

é a extensão de áreas naturais destinadas à

conservação da biodiversidade em diferentes ecossistemas ao redor do mundo que a Vale protege ou ajuda a proteger. São mais de um milhão de campos de futebol (um campo de futebol mede 1 ha = 0,01 km2).

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Natal dos ilustres

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É Natal no ALMANAQUE BRASIL. E nessa festa reunimos histórias e lembranças de gente que, nas mais variadas áreas, marcou a cultura brasileira. De Darcy Ribeiro a Noel Rosa, de Manuel Bandeira a Padre Cícero, saiba como ilustres brasileiros celebraram (ou lamentaram) a chegada do 25 de dezembro.

ma antiga pintura de um príncipe português ao lado de um cavalinho de madeira, a olhar para a mesa de Natal com árvores adornadas, mostra que nossos hábitos natalinos vêm de longe. A Família Real já chegou ao Brasil com

uma mistura de tradições não só portuguesas: o costume germânico de enfeitar pinheiro com bolas, velas e frutos, por exemplo, já tinha se espalhado por todos os reinos da Europa no século 16.

O pintor francês Debret anotou que, no Brasil Colônia, quem podia viajava para os sítios no Natal. Outros viajantes descreveram os caprichos da Missa do Galo nas cidades. O presépio que reconstrói o nascimento de Cristo é um símbolo católico em voga por aqui desde que um franciscano montou o primeiro em Pernambuco, no século 17.

Nos anos 1930, os costumes que passaram a ser importados dos Estados Unidos puseram os cabelos de muita gente em pé. O Papai Noel “de barbas brancas e metido em grosso casaco

vermelho a resguardá-lo de neves, de frios não brasileiros, descidos de chaminés que as casas não têm entre nós” estarrecia o sociólogo Gilberto Freyre. Darcy Ribeiro também se indignava com “esse negócio de fazer homenagem a Papai Noel, que dá bicicleta para quem está rico e dá pirulito para quem é pobre”. Integralistas chegaram a propor um tal Vovô Índio para substituir o bom velhinho. Apesar do presidente Getúlio Vargas ter adorado, a ideia não pegou.

Depois vieram apresentações de Roberto Carlos, campanhas de solidariedade e árvores gigantes com show de luzes. Os hábitos natalinos estão sempre se transformando e, de uma forma ou de outra, marcando os dezembros dos que vivem por aqui, sejam eles meros desconhecidos ou ilustres brasileiros.

Neste especial, reunimos lembranças, acontecimentos e também aborrecimentos natalinos de gente que ocupa um lugar de honra na cultura brasileira. É bom caprichar na ceia, que no Natal do ALMANAQUE tem de Getúlio Vargas a Chico Buarque, de Padre Cícero a Darcy Ribeiro.

Texto: Natália PesciottaArte: Guilherme Resende

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UM NATAL BEM BRASILEIRO é o nome que Gilberto Freyre deu ao manifesto que publicou em 1926. O sociólogo provavelmente é o primeiro a propor fechar as portas nacionais ao Papai Noel. Para ele, era preciso dizer sim “ao Menino Deus, a lapinhas, a pastoris, ao pastel da ceia de Natal”. Mas não via sentido algum na celebração de um sujeito de “barbas brancas e metido em grosso casaco vermelho a resguardá-lo de neves, de frios não brasileiros, descido de chaminés que as casas não têm entre nós”.

Não espere presentes do Poeta da VilaNoel é natal, em francês. Seu Manoel Rosa, grande admirador do país da Torre Eiffel, escolheu o nome para o filho que nasceria perto do dia 25 de dezembro de 1910. Apesar da criança ter chegado adiantada, no dia 11, Noel Rosa ficou.

Ironicamente, o sambista de Vila Isabel nunca ligou para as comemorações natalinas. A mãe todo ano esmerava-se na árvore e no presépio, tradições na sua família. Noel só fazia um muxoxo, e não comprava presente para ninguém: “Pra que esperar um ano para se dar presente a quem se gosta?”, poetizava, escapando das obrigações.

Para Getúlio, bom velhinho era Vovô ÍndioEsqueça a bengala, a barba branca e o gorro. Nos anos 1930, em uma festa de Natal da Casa do Pequeno Jornaleiro, no estádio do Vasco da Gama, o velhinho que chegou com uma sacola de presentes usava cocar, tanga, zarabatana e tacape. Era esse o figurino do Vovô Índio, personagem tropical criado pelo jornalista Cristóvam Camargo para substituir o Papai Noel americanizado.

Vovô Índio fez sucesso entre os integralistas. O presidente Getúlio Vargas, nacionalista de primeira, fez questão que o Estado Novo promovesse a figura. O público infantil, no entanto, não encampou a ideia. No gramado do São Januário, a criançada fez uma barulheira danada e, em coro, pediu a volta do bom e velho Noel.

As pessoas que esperavam o ônibus carregadas de presentes se escandalizavam em silêncio com a cena: um rapaz magérrimo e uma moça altiva, também aguardando no ponto, alteravam a voz: “Se eu pudesse, matava o Natal!”.

Caetano Veloso e Maria Bethânia, recém-chegados a Salvador, bradavam contra os enfeites natalinos da capital: árvores cobertas de

algodão imitando neve, Papai Noel de vermelho. “Esse Natal nos parecia odiosamente vulgar”, explica o baiano em Verdade Tropical.

Não que odiassem a comemoração. Gostavam dos presépios e da festa como era em Santo Amaro da Purificação, com os chãos das casas especialmente cobertos de areia e os cômodos decorados com ramos de pitangueira. Apesar de desconfiarem que a areia branca e as pitangas também tentassem imitar neve e azevinho, os baianos as preferiam: “O resultado dava a impressão de um costume arraigadamente tropical”.

Caetano e Bethânia queriam natal tropical de Santo Amaro

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Nada de Papai Noel: Bandeira acreditava em fadas

“Esse negócio de fazer homenagem a Papai Noel, que dá bicicleta para quem está rico

e dá pirulito para quem é pobre, isso é ruim, é falta de tradição.” Quem disse foi o sociólogo Darcy Ribeiro, que sempre guardou a lembrança dos natais

de quando era pequeno, em que a mãe

Uma das vivências mais caras da infância de Manuel Bandeira era um costume da véspera de Natal. De noite, ele colocava chinelinhos atrás da porta do quarto e, no dia seguinte, os encontrava cobertos de presentes. Mas não os atribuía a Papai Noel. Segundo a “encantadora mentira dos verdadeiros mimoseadores”, como o poeta definia a artimanha dos pais, os agrados eram trazidos por uma fada.

No poema Versos de Natal, em que Bandeira escreve sobre a sensação de se ver adulto no espelho, lembra que, apesar da idade, guardava a antiga sensação de otimismo: O menino que não quer morrer, / Que não morrerá senão comigo, / O menino que todos os anos na véspera de Natal / Pensa ainda em pôr os seus chinelinhos atrás da porta.

Para Darcy Ribeiro, quem dava presentes era o presépio

montava um grande presépio com pedras envoltas em panos, ocupando metade da sala. Ele e os irmãos colocavam sapatos embaixo do cenário para receber os presentes no dia seguinte. “Todo mundo pensava que era um presente do Natal, um presente do presépio, não de nenhum personagem.”

Adoniran fez samba para entrar na festaOutro sambista que encontrou como tema um 25 de dezembro sem final feliz foi Adoniran Barbosa: Falei com minha nega de lado / Eu vou subir no telhado / E descer na chaminé / Enquanto isso você pega a criançada / E ensaia o dingo-bel. Mas os planos do sujeito não saem lá muito bem: Ai meu deus que sacrifício / O orifício da chaminé era pequeno / Pra me tirar de lá foi preciso / Chamar os bombeiro.

Com sua malandragem característica, Adoniran contava que havia feito a música para uma festa de fim de ano em que cada amigo devia colaborar com o que pudesse para a ceia: peru, champanhe, panetone, rabanada... “Eu entrei com o samba, é claro.”

Sapatinho vazio inspirou nosso maior clássico natalinoAssis Valente não tinha do que reclamar de 1932. Foi o ano em que começou a compor, e logo teve uma música gravada por Araci Cortes. Mas no mês de dezembro, sozinho em um hotel em Icaraí, no Rio de Janeiro, bateu uma tristeza danada ao olhar um quadro na parede: era a imagem de uma menina com os sapatinhos sobre a cama, esperando o presente de Natal.

Longe da família e sem notícias dos seus, pensou na efemeridade da alegria – mote para a canção natalina mais famosa do País: Anoiteceu, o sino gemeu / E a gente ficou feliz a rezar / Papai Noel, vê se você tem / A felicidade pra você me dar / Eu pensei que todo mundo / Fosse filho de Papai Noel...

Apesar da amargura da música – curiosamente cantada até hoje como símbolo da felicidade natalina –, o sambista comemorou: “Quando passou a tarde, a música estava feita. Papai Noel não tinha vindo, mas eu ganhara um presente – a melhor de minhas composições”.

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Rondon e sua turma passaram Natal no meio da florestaSe os animais da mata entendessem toques militares, saberiam que a corneta que ecoou na floresta amazônica no dia 25 de dezembro de 1909 significava vitória. Não que fosse exatamente o Natal dos sonhos do marechal Rondon e de outros 40 homens – entre operários, cientistas, fotógrafos, cartógrafos, antropólogos e geólogos –, que aceitaram desbravar a Amazônia em nome da integração nacional. Depois de passar seis meses na selva para implantar o telégrafo do Mato Grosso ao Amazonas, a comissão finalmente chegaria a um povoado a tempo da virada do ano.

Chico Buarque, quem diria, também encarnou Papai NoelO escritório imobiliário Clineu Rocha resolveu inovar no brinde de fim de ano para os clientes em 1967: contratou um músico para gravar uma canção exclusiva. O texto da capa do disco-presente comemorava “uma das melhores ideias” que a empresa já teve: “Ídolo de velhos, moças e crianças, quem melhor do que Chico Buarque para levar-lhes nossa mensagem Natal?”. E continuava: “É ele o portador ideal das mensagens de paz, amor e fraternidade que, afinal de contas, é tudo quanto desejamos a todos”.

Chico compôs e gravou uma marcha com versos natalinos entre refrão rimado: Tão bom tão bom tão bom que foi o Natal / Ai quem me dera fosse o ano inteiro igual.

Dez anos depois, tomou um susto ao descobrir que a canção natalina continuava a ser tocada como jingle da empresa.

Toque natalino de Pixinguinha arrasou Jacob do Bandolim

UM BRINDE DE NATAL foi o argumento que faltava para finalmente Paulo Vanzolini lançar o primeiro disco, em 1967. O elepê pioneiro do autor de Ronda e Boca da Noite, entre outras composições, reuniu sambas inéditos para presentear clientes da agência de propaganda do amigo Marcus Pereira.

Natal nunca foi dia de folga para quem trabalha no rádio.

Na Transmissora, nos anos 1930, não era diferente. Em uma noite natalina, o apresentador seguia

com o programa quando recebeu um telefonema: uma ouvinte pedia que Pixinguinha, então flautista e

arranjador da emissora, tocasse uma música em homenagem a um

filho que tinha morrido naquele ano.Jacob do Bandolim foi atrás do

companheiro e, sem surpresa, o encontrou dormindo no canto de um salão ao lado, depois de beber umas e outras. “Pixinguinha tocou com tanto sofrimento, que tive um choque emotivo. Fui carregado para a casa do diretor da rádio e depois fiquei acamado por vários dias”, contou mais tarde o bandolinista.

PRA REZAR A MISSA DO GALO, Padre Cícero visitou Juazeiro do Norte pela primeira vez, em 1871. A cidade nunca mais foi a mesma depois daquele 25 de dezembro. Os habitantes do lugar ficaram impressionados com o jovem de 28 anos. Logo ele se mudaria para a terra onde hoje é representado por uma estátua de quase 30 metros de altura.

No site do ALMANAQUE, ouça uma seleção de músicas natalinas brasileiras.

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Para pertencer ao Brasil, foram necessárias batalhas e diplomacia. Hoje, Rio Branco mostra como integrar tradições populares,

belezas naturais e modernidade, conjugando passsado e presente para criar um pedaço singular do País.

Acre é um dos mais iluminados estados brasileiros. E pensar que perigamos ficar sem ele... Era o que aconte-

ceria se não fosse a sanha valorosa de homens que compreende-ram que há coisas mais importantes do que a própria vida.

O Acre possui uma história feita de grandezas, mas também de luto. Porém, o nome do estado não se refere a algo amargo ou áspero. Tão longe disso quanto a localização remota desse recanto, que faz fronteira com o Peru e a Bolívia. O acreano é cordial, hospi-taleiro e acolhedor. O nome deriva de Aquiri, do idioma dos índios, escolhido para batizar o rio onde havia jacarés de montão. Quando os brancos chegaram por aquelas bandas, foram logo simplifican-do para Acre e, num só pacote, nomearam mais tarde todo o es-tado. Mas demorou um bocado para o lugar se tornar mais uma estrela da bandeira nacional.

No fim do século 19, quando essas terras ainda pertenciam à Bolívia, chegava mais gente do que jacaré pelos rios. Eram brasi-leiros vindos de várias regiões, sírio-libaneses, espanhóis, portu-gueses e judeus. Desembarcavam com a ideia de enriquecer com o látex retirado das seringueiras, um dos produtos mais valiosos do mundo. Foi quando a Bolívia tentou expulsar os colonos e arrendar as terras para um consórcio anglo-americano. Em 1899, o espanhol Luiz Galvez de Arias liderou um movimento popular e proclamou: “Se a pátria não nos quer, criamos outra”, fundando o Estado Independente do Acre.

Só que o povo e a elite acreana teimaram em ser brasileiros. En-tão, o militar gaúcho Plácido de Castro lutou e resistiu por quase 200 dias. A batalha terminou em uma emboscada, que causou sua morte. O pulo do gato foi dado só em 1903, pelo diplomata José

rio branco

O

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Capital da luta

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Dezembro 2011

Preste atençãoUma frondosa gameleira com dois metros e meio de diâmetro é um dos patrimônios históricos da

cidade. A árvore marca o local onde o desbravador cearense Newtel Maia aportou com seu navio

Afuá e mais tarde fundou o Seringal Empresa, que daria origem a Rio Branco. Na calçada em frente,

o casario colorido de arquitetura preservada abrigava o primeiro comércio da cidade, além do

disputado Cine Teatro Recreio.

Maria da Silva Paranhos Júnior. Sem disparar um único tiro, ele tomou posse do Acre. Por suas vitórias no campo da diplomacia, Paranhos recebeu o título de Barão do Rio Branco – daí a home-nagem com o nome da capital. Mesmo assim, somente 60 anos mais tarde é que o Acre foi elevado à categoria de estado.

“Os brasileiros dos estados do sul, quando ouvem falar em Acre, pensam logo em índio e floresta. Somos muito mais do que isso”, defende a secretária de Turismo Ilmara Lima. “É um destino verde, sim, mas com vários segmentos em turismo de aventura, ambiental e cultural. Além disso, temos uma gastronomia diferenciada, que mistura influências dos migrantes no Norte e do Nordeste com a dos árabes e indígenas.” Ilmara convida a provar, por exemplo, o “kebe”, um quibe de arroz ou de macaxeira, uma “rabada ao tucupi” e um delicado “charutinho”, enrolado de folha de uva que aqui virou um charutão recheado no capricho.

Capital renovadaSe foi primeiro a natureza que caprichou, a cidade de Rio Branco quer agora ajudá-la, embelezando-se. Sobre o rio Acre, de águas ambarinas, a nova passarela Joaquim Macedo une o centro histó-rico à Cidade Nova. A passarela chega ao calçadão restaurado do Novo Mercado Velho, com lampiões, bancos e mesinhas ao ar li-vre. Divide espaço com as esculturas que retratam o povo acreano, criadas pela artista Christina Motta. Cores vivas recobrem as facha-das do antigo casario. Foram construídos centros de convivência, praças, parques, museus e bibliotecas, de onde se pode acessar gratuitamente a internet sem fio. É a chamada Floresta Digital.

Só para citar os que estão pertinho do centro, há o parque Ca-pitão Ciríaco, com o único seringal urbano do mundo; o parque Plácido de Castro, com esculturas em bronze que representam a emboscada que o vitimou; o Horto Florestal, com grande varie-dade de espécies da flora acreana; e o parque Chico Mendes.

O líder seringueiro e, antes dele, Wilson Pinheiro, morreram para defender a floresta e regularizar a situação das famílias re-manescentes do ciclo da borracha. Chico parava tratores com trabalhadores cantando em cordão. O modelo criado pelos he-róis gerou a primeira reserva extrativista do País, e ecoou na lu-ta de castanheiros, ribeirinhos, pescadores e de trabalhadores e ambientalistas do mundo todo.

Que bom que esses acreanos arvoraram a bandeira da teimosia e ficaram do lado de cá, não?

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Onde ficarInácio Palace Hotel • Destaca-se pela localização próxima dos principais museus e lojas de artesanato. www.irmaospinheiro.com.br.Pinheiro Palace Hotel • Situa-se na região central e oferece café da manhã com produtos regionais. www.irmaospinheiro.com.br.

Onde comerEspaço Inácio’s • Pratos da gastronomia regional. Destaque para o feijão acreano, com folhas rasgadas de couve, servido com farofa amarela. Fone: (68) 3214-7100.Tacacá da Dora • O melhor lugar da cidade para provar o tradicional tacacá servido na cuia, com tucupi, goma de mandioca, jambu e camarões graúdos. Fone: (68) 9972-9426.

Rio Branco tem mais

Não tem hora, nem restrições. Pode ser logo no café da manhã ou de tardezinha. Sempre é hora de experimentar uma baixaria

das boas. É um prato feito de carne moída bem temperada, com tomate e ovo cozido, servido com broinha de milho. A origem

do nome? O que se conta é que os boêmios da cidade, antes de chegarem em casa depois de mais uma noite de farra, davam uma passadinha no mercado e pediam uma gororoba para repimpar a barriga, prevenindo a ressaca que estaria por vir no dia seguinte.

Não deixe de conhecer

Casa das plantas medicinaisErvas secas, cremes, chás, pastas, unguentos e óleos essenciais elaborados a partir de ervas e plantas medicinais. Um saber de raiz para curar as mazelas do corpo se encontra na loja Milagre da Floresta, localizada no Novo Mercado Velho.

Biblioteca da FlorestaOs frequentadores a definem como “biblioteca viva”. Há um clube de cinema, grupos temáticos de pesquisa sobre astronomia, publicações sobre as perspectivas históricas e sociais do Acre, além de amplo material sobre a cultura indígena, dos ribeirinhos e dos movimentos seringalistas.

Museu da BorrachaLocalizado em casarão de estilo colonial, o museu reúne em seu acervo documentos e publicações que contam a história dos primeiros povos que habitaram o Acre e formaram o estado. Destaque para a saga da borracha – de sua época áurea até a luta dos seringueiros.

Como chegar A TAM oferece voos diretos para Rio Branco, partindo das principais cidades brasileiras. Confira em www.tam.com.br.

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Cecilia Stanzione e Mário Sève – Canción Necesaria (independente). Ele é brasileiro e um dos mais refinados flautistas e saxofonistas do País. Ela, cantora e compositora argentina de voz firme e boa de ouvir. Os dois se uniram (ao lado de outros músicos de primeira grandeza) para lançar o disco. No repertório, estilos musicais de ambos os países, como samba, tango, chamamé, choro e milonga.

Água – Conservação e Cultura, de Adriano Gambarini e Laís Duarte (Cultura Sub). O prestigiado fotógrafo se une mais uma vez à repórter da TV Cultura e colaboradora do ALMANAQUE BRASIL para fazer um inventário dos recursos hídricos do planeta. Entre as mais de 130 imagens do livro, os autores chamam atenção para um fato: em 2030, haverá escassez de água para quase metade da humanidade.

Escritos em Verbal de Ave, de Manoel de Barros (Leya). Um ano depois de editar toda a sua obra em Poesia Completa, o poeta vivo mais celebrado do País volta à seção de lançamento com poemas inéditos. Aos 94 anos, retoma o personagem de uma poesia antiga. Desta vez, Bernardo morre, mas torna-se o eu lírico do autor: os tais “escritos” do título seriam as anotações do morto em vida.

Toninho Ferragutti e Bebê Kramer - Como Manda o Figurino (Borandá). Dois dos mais importantes acordeonistas brasileiros se juntaram no início do ano para apresentações. A união resultou neste CD com 11 músicas, cinco de cada um e mais outra numa parceria da dupla com Guto Wirtti. Há tangos, forrós, valsas e até temas experimentais, como uma prova da versatilidade do instrumento.

Em se plantando, tudo dá - programa 17• Elas atraem casamento, espantam mau-olhado e curam qualquer mal: as plantas brasileiras.• No Papo-Cabeça, diretamente de Pernambuco, o cordelista e xilogravurista J. Borges. • Afinal, como é que se faz um bom café? Esse é o assunto do Ciência Doméstica.• No Ilustres Brasileiros, as letras e as ideias da poetisa Cecília Meireles.

Nossa gente entre pontos e vírgulas programa 18• Chicó, Macunaíma, Policarpo Quarema. Conheça personagens da literatura que ajudam a explicar o Brasil.• O bebê não para de chorar? Confira dicas populares para acalmá-lo no Ciência Doméstica.• Por causa de lagostas, Brasil e França quase entraram em guerra em 1960. Você sabia?• Sinônimo de dicionário: no Ilustres Brasileiros, a palavra é Aurélio Buarque de Holanda.

Patrimônios: do Brasil e da humanidade programa 19• Azulejos, casarões e ruelas que guardam segredos. No Coisas Nossas, os patrimônios históricos do Brasil.• História de pescador? Que nada. Eles contam e mostram como é que se faz uma boa rede de pesca.• No Cantos do Brasil, Paulo Freire faz soar toques de viola que encontrou no sertão de Guimarães Rosa.• E no Papo-Cabeça, uma conversa com o cineasta pernambucano Lírio Ferreira.

Pequenos retratos do Brasil - programa 20• Histórias, acontecimentos, homenagens. Coube um pouco de tudo nos selos brasileiros, que estampam o Coisas Nossas. • Pegou carona com uma trupe e virou Ilustre Brasileiro: estrelando, Grande Otelo!• Peixinho, o brasileiro que mais participou de olimpíadas.• De Pernambuco, toda a versatilidade da Orquestra Contemporânea de Olinda.

Natal bem brasileiro - programa 21• Tem até onça no presépio: conheça costumes e tradições de natais bem verde e amarelos.• O primeiro gol de placa foi de Pelé. Mas a placa do gol foi de Joelmir Beting. Você sabia? • No Papo-Cabeça, uma conversa inspiradora com o filósofo Mário Sérgio Cortella.• Calvice tem solução? Fomos às ruas para saber o que o povo faz para o cabelo não cair.

Choro: brasileirinho, brasileiríssimo programa 22• Tango brasileiro, corta-jaca ou simplesmente choro: curiosidades desse ritmo tão nosso.• Jair Rodrigues traz toda a bossa e muita história para o Cantos do Brasil. • Zé Carioca: o dia em que Walt Disney conheceu nosso papagaio. • Fazer churrasco é arte? O povo diz que é uma verdadeira Ciência Doméstica!

TV Brasil: 18/11, 20h TV Cultura: 4/12, 15h

TV Brasil: 2/12, 20h TV Cultura: 11/12, 15h

TV Brasil: 30/12, 20h TV Cultura: 8/1, 15h

TV Brasil: 9/12, 20h TV Cultura: 18/12, 15h

TV Brasil: 16/12, 20h TV Cultura: 1/1, 15h

TV Brasil: 23/12, 20h TV Cultura: 25/12, 15h

Verde e amarelo têm Vez

no nosso natal!

O ano chega ao fim e o ALMANAQUE BRASIL na tevê continua com a corda toda. Nosso presente

natalino, já sabe: muita brasilidade novinha em folha para a programação da sua telinha. Andamos

por várias partes do País – levando o sempre aclamado Almanaquias, personagem de Robson

Nunes – para trazer novidades e velharias, entrevistas e músicas de todos os lados. Luciana Mello

comanda as atrações no estúdio. Presente bom é sempre surpresa, mas aqui você pode dar uma

espiada no que te espera todas as sextas, na TV Brasil, e, aos domingos, na TV Cultura. E quando

não estiver lendo nem assistindo ao ALMANAQUE, não esqueça: é só nos encontrar online no

Twitter (@almanaquebrasil) ou no Facebook (página do ALMANAQUE BRASIL).

Dezembro 2011

Para se certificar das datas e horários de exibição, consulte o site das emissoras: www.tvbrasil.org.br

e www.tvcultura.com.br.

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sO Calculista das Arábias

Nossa homenagem a Júlio César de Mello e Souza, o Malba Tahan

Para decidir qual das três filhas herdaria seu cobiçado trono, o rei de Bássora propôs às donzelas um astucioso desafio. Daria a cada uma certo tipo de pedra e duas ampulhetas de tamanhos diferentes. A areia da ampulheta menor terminaria de escorrer em 7 minutos; a da maior, em 11 minutos. Com apenas esses rústicos instrumentos de medição do tempo, as princesas deveriam deixar a pedra sobre a brasa por exatos 15 minutos. Se acertassem

com precisão, a pedra mudaria de cor sem queimar. Ao final da prova, o rei não pôde escolher a herdeira: usando o mesmo procedimento, suas três filhas lhe devolveram a pedra com a cor correta. E você, caro leitor, saberia dizer qual foi o raciocínio empregado pelas donzelas de Bássora?

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Respostas

CARTA ENIGMÁTICA O gaúcho de São Borja foi presidente do Brasil durante dois anos e sete meses. (João Goulart)

ENIGMA FIGURADO Rita Lee. O QUE É O QUE É? Arraia.

SE LIGA NA HISTÓRIA 1b; 2d; 3a; 4c.

BRASILIÔMETRO 1a; 2b; 3b; 4c; 5c; 6a; 7c; 8d.

O CALCULISTA DAS ARÁBIAS Para acertar o tempo correto de aquecimento, evitando que as pedras se queimassem, as princesas primeiro viraram as duas ampulhetas ao mesmo tempo. Quando a de 7 minutos terminou de escorrer, colocaram as pedras na brasa. Esperaram então os 4 minutos que faltavam para a ampulheta de 11 minutos terminar de escorrer e a viraram novamente, somando mais 11 minutos aos 4 primeiros.

Claudia Raia

DE QUEM SÃOESTES OLHOS? 3 4

21

0

56

7

8Conte um ponto por resposta certa

valiação

teste o nível de sua brasilidade

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2

3

4

ligue os pontos

letícia

mo

reira/ fo

lha

press

Em 5/12/1967, é fundada a Funai, cuja sigla significa:(a) Fundação Nacional do Índio

O Botafogo de Futebol e Regatas é criado, em 8/12/1942, a partir da união de:(a) Intelectuais e jornalistas (b) Clubes de futebol e de regatas (c) Armando Nogueira e Vinicius de Moraes

Obra fundada em Salvador, em 8/12/1872:(a) Fonte Nova (b) Elevador Lacerda (c) Farol da Barra (d) Universidade da Bahia

Cidade que deixou de ser capital de Minas Gerais em 12/12/1897:(a) Diamantina (b) Belo Horizonte (c) Ouro Preto (d) Camanducaia

Cidade pernambucana declarada Patrimônio da Humanidade em 14/12/1982:(a) Recife (b) Sirinhaém (c) Olinda (d) Cabrobó

Idealizador da Academia Brasileira de Letras, fundada em 15/12/1896:(a) Machado de Assis (b ) Olavo Bilac (c) Guimarães Rosa (d) Paulo Coelho

Primeira telenovela brasileira, que entrou no ar em 21/12/1951:(a) Tieta (b) Irmãos Coragem (c) Sua Vida me Pertence (d) Sassaricando

Partido político fundado em 27/12/1965, que deu base ao governo militar:(a) PFL (b) PDS (c) DEM (d) Arena

a O baiano é um ícone da música brega no País. Não ligava para as críticas. “Enquanto houver corno, mulher sofrida e bêbado no Brasil, vou ser sucesso”, dizia.

b Ficou conhecido por, numa música, prometer a uma prostituta que a tiraria daquela vida. Noutro sucesso estrondoso, suplica à amada: “Pare de tomar a pílula”.

c Seu primeiro disco trazia sambas tradicionais, mas logo enveredou pela música ultrarromântica. Diz ter em casa mais de 15 mil calcinhas jogadas pelas fãs apaixonadas.

d O recifense já contestou o título de brega. “Sou só um cantor. A distinção entre brega e chique surgiu nos anos 60. Quem falasse mal dos militares era chique”.

Odair José

Reginaldo Rossi

Waldick Soriano

Wando

(b) Federação Única dos Indígenas

(c) Fundação de Artistas e Intelectuais

(d) Fundação Nacional do Imigrante

(d) Garrincha e Nilton Santos

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ilustrações: luciano tasso

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www.lucianotasso.blogspot.com

Capoeira: era mata, foi crime, virou arte

Você sabe quem abriu a primeira escola de capoeira do mundo, logo que a arte foi legalizada? O mesmo mestre baiano que desenvolveu a capoeira regional, com método de treinamento, menos malandragem no corpo e mais regras rígidas para os alunos. Ele dizia que fazia “capoeira para o mundo”. Até Getúlio Vargas quando era presidente foi assistir a uma apresentação sua.

O Brasil poderia ter um exército de seis milhões de lutadores de capoeira. É o que aconteceria se todos os praticantes espalhados pelo País usassem a arte para a guerra. Afinal, a luta surgiu entre os escravos para o combate. Esse contingente seria 17 vezes maior que as Forças Armadas do Brasil, que congregam 350 mil pessoas na Marinha, no Exército e na Aeronáutica. Mas os capoeiristas são da paz. Os seguidores praticam a atividade não para a guerra, mas como um esporte que faz bem para o corpo e o espírito.

Já Pensou nisso?

Capoeirista chutou chuchu do tacho sujo.

Trav

a-Língua

pa

ra ler e repetir em v

oz al

ta

Para descobrir o nome do homenageado do mês, basta preencher o diagrama abaixo. O número de cada quadrinho indica uma letra escondida na linha correspondente do texto lá de cima. Por exemplo: primeiro quadrinho, linha 1: M. E assim por diante.

1 2 3 4 5 2 87 1 7 9

m

capoeira vem da África, certo? Errado. A mistura de luta, dança e música é 100% brasileira. Quer dizer, foi criada pelos africanos, mas só depois que gente de vários cantos da África se

encontrou por aqui. Foi provavelmente no Rio de Janeiro que os golpes e os toques de berimbau começaram a surgir. Com eles, os escravos se comunicavam, se divertiam e, principalmente, se preparavam para a briga sem que os senhores e capitães do mato pudessem proibir.O próprio nome dá dicas sobre essa história. Em tupi, capoeira quer dizer “mata que foi”. Era nesses lugares de vegetação baixa, em volta das fazendas, que capoeiristas se escondiam dos capitães do mato.

Se hoje é fácil encontrar escolas e cursos, saiba que por mais de um século jogar capoeira dava cadeia. Sim, capoeira foi crime até 1937.

Quando Getúlio Vargas foi presidente do Brasil, acabou com a lei que proibia a prática. Até incentivou apresentações. “A capoeira é o único esporte verdadeiramente nacional”, disse. Hoje, pode acreditar: fora do Brasil, 2 milhões de pessoas, em mais de 150 países, fazem roda e cantam em bom português.

A

Você já deve ter ouvido falar que existem dois tipos básicos de capoeira. A angola é a mais parecida com a luta que os escravos praticavam séculos atrás: mais lenta, precisa e cheia de astúcias. A regional usa a movimentação básica de um jeito mais performático, com chutes altos e piruetas de impressionar qualquer um. Apesar de alguma rivalidade e do nome diferente de alguns dos golpes, há também semelhanças. Por exemplo: o golpe meia-lua de compasso, da regional, faz o desenho de metade de um círculo com a perna. Você imagina como é o famoso golpe rabo de arraia da angola? É só pensar em um peixe desses mexendo o rabo para concluir que é igual a uma meia-lua. Não é mesmo?

Tem angola e regional

SOluçÃO nA P. 34

Qual peixe nAo pode

faltar no prato do

capoeirista?

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LARANJA - PARte 2

Tio Sam, aquele abraçoEla nos revitaliza antes mesmo que a descasquemos. É a fonte mais barata de vitamina C.

A flor acalma o corpo e eleva o espírito. Proibida para pobres até início do século 20,

disseminou-se e, graças aos americanos, viramos os maiores produtores do mundo.

oje, em qualquer bar, padaria ou restaurante,

de qualquer categoria, por toda parte, qualquer época do ano, de manhã, de tarde, de noite, você possivelmente vai ouvir o carac-terístico ruído dzzzz, do espre-medor de laranja. Contudo, até o começo do século 20, mesmo no rico hemisfério norte, mui-ta gente só a punha na mesa na ceia de Natal. Laranja era luxo reservado às famílias abastadas de Paris e de outras metrópoles. Até que, com a disseminação das fer-rovias, a modernização dos navios e a introdução da refrigeração nos trans-portes, muitos europeus que nunca tinham provado laranja provaram.

A fruta cítrica tinha saído do sudeste asiático para a Ásia ocidental, de onde árabes e portugueses a trouxeram para a bacia mediterrânea. Itália e Espanha a cultivavam. No sul da França, a planície de Hyères virou no século 16 um laranjal – que desapareceria 300 anos depois, com a concorrência do cítrico recém-chegando das plantações da África do Norte, da Califórnia, até do Brasil.

Então, na década de 1930 os Estados Unidos dão uma revira-volta na história. Cada norte-americano já consumia anualmente 30 quilos de laranja, o dobro de um inglês e quatro vezes mais

que um francês. Com o avanço das ciências médicas na América do Norte, o americano

médio descobre que, além de atraente, o alaranjado fruto é rico em vita-

minas, especialmente a C. Nutri-cionistas passam a recomendar cítricos em dietas de baixas calorias. E as pessoas comuns do já populoso e poderoso país incorporam definitivamente a laranja ao café da manhã.

Ora, “os Estados Unidos dão o tom”, observa Paolo Sorcinelli em História da Alimentação. O suco de laranja vira obrigatório no breakfast mundo afora. Até em Tucacas, modesto balneário da Venezuela, o encontramos nas pousadas mais simples.

Seriam óbvias as consequências dessa popularidade para um país do

hemisfério sul, de clima propício e dispo-nibilidade de terra, como é o nosso caso. Pois a fruta, típica de zonas temperadas ou frias, faltava aos do hemisfério norte no verão. E o hábito que os americanos espalharam, como veremos na próxima edição do ALMANAQUE, contribuiria para transformar o Brasil no maior produtor e exportador mundial de laranja e seu suco. Neste caso, nós tiramos o chapéu e dizemos: obrigado, Tio Sam.

Citrus sinensis

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Consultoria: nutricionista Aishá Zanella ([email protected])

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SAIBA MAIS

História da Alimentação, de Jean-Louis Flandrin e Massimo Montanari (Estação Liberdade, 1998).

Vitaminas e Proteínas – Fonte de vida e saúde, de Edgar T. William (UPF, s/d).

essência e os óleos da flor de laranjeira estão pre-sentes na perfumaria, na medicina popular, na

doçaria. Árabes usam a essência como aromatizante em quase todos os seus doces. No Brasil, o povo adota a flor em chás – para chamar o sono, acalmar a ten-são, ajudar a digestão.

Os “médicos municipais” italianos, há bem mais de século, quando chamados, prescreviam, mais que re-médios, a “dieta terapêutica”: caldo de carne, vinho, pão, café, ovos e – para coroar – ratafiá (licor), obtido da maceração, em aguardente, de pétalas de rosas e flores de laranjeira.

A branca florzinha exala perfume de delicada sensu-alidade. Símbolo da pureza, da graça. É a mais tradi-cional flor usada em casamentos, costume que vem de séculos. Já na Grécia antiga era de laranjeira a flor do buquê e da grinalda que engalanavam a noiva.

Manuel Bandeira encerra com ela seu Poemeto Erótico: Teu corpo... a única ilha / No oceano do meu desejo... / Teu corpo é tudo o que brilha, / Teu corpo é tudo o que cheira... Rosa, flor de laranjeira.

A flor inspira o médico,

o confeiteiro, o poeta

osso corpo não a fabrica. Uma laranja, a fonte mais barata, garante a dose diária recomendada, 45 mg. E é

bom relembrar: exposta ao ar e ao calor, ela esvanece. Entre os benefícios, a vitamina C nos defende contra

infecções; ajuda a absorver ferro, a cicatrizar feridas; previne doenças respiratórias.

Uma curiosidade: nosso corpo não consegue armazená-la em quantidade – por isso devemos consumi-la todos os dias. E não adianta chupar 10 laranjas, o organismo vai usar apenas aqueles 45 mg. O resto ele joga fora.

NVitamina C, a tal

Cor da alegria, da vitalidade,

da criatividadentre amarelo e vermelho, a cor da laranja é, dentre aquelas do espectro solar, a que mais influi em transfor-

mações químicas. Representa o equilíbrio entre corpo e es-pírito. Está nas vestes de monges budistas; de Dioniso/Baco, deus greco-romano da fecundidade.

Depressão? Use alaranjado, cor da alegria, da comunicação, do estímulo físico e mental. Recarrega. Transforma energia se-xual em criatividade. Liberta de inibições. Em suma, o laranja da laranja nos vitaliza antes mesmo que a descasquemos.

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Causos de Rolando Boldrin

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Tive o privilégio de conhecer pessoalmente o grande e saudoso Cornélio Pires, escritor e contador de anedotas caipiras. Famoso por estudar as características do nosso caipira paulista, Cornélio era da cidade de Tietê, per-tinho de São Paulo. Ouvi esse causo, e outros, durante um pequeno show dele em praça pú-blica, alinhavado por modas de uma dupla de viola e violão. Foi na cidade de São Joaquim da Barra, quando eu tinha meus 10 anos de idade e já gostava muito dessas coisas.

A história foi assim: um caipira estava no meio do mato, caçando passarinho com chum-binho. Naquele tempo, era muito comum que as casas comerciais da cidade alugassem aqueles aviõeszinhos pra jogar papeizinhos de propaganda pros caboclos lerem lá embaixo: “Compre nas Casas Tal”.

Mas o caboclo caçando passarinho nunca tinha visto um avião na vida, nem mesmo um teco-teco. Quando de repente escutou o barulho lá em cima, não teve dúvida: pegou a espingardinha e “pou”. Mandou ver um tiro de chumbo. Por acaso, bem nessa hora que ele atirou, o aviador jogou os papeizinhos de propaganda lá de cima. O caboclo viu aquilo e ficou todo orgulhoso: “Matar, não matei. Mas arranquei umas boas penas!”.

O caipira e o teco-teco

Uma pechinchaAltas da madrugada, o rapaz chega bêbado em casa. Assim que põe o pé para dentro, a mulher lhe enfia o relógio no nariz:– Olha aqui! São quatro e cinquenta!E ele, sem tirar os olhos do relógio:– Por este preço está ótimo. Pode comprar que eu pago!

Mundo animalA ovelha provoca o carneiro:– Você tem tão pouca lã, querido.O carneiro então responde:– Ora, viemos aqui para namorar ou fazer tricô?

FicçãoUma mulher entra numa biblioteca e pergunta à atendente:– A senhora pode me ajudar a encontrar um livro?– Claro, qual é o título?– Homem: o sexo forte.– Ah, o setor de ficção é no andar de baixo.

No altarNo casamento, o padre diz:– Se houver alguém contra este matrimônio, que fale agora ou cale-se para sempre.Eis que alguém levanta a mão. O padre exclama:– Meu filho, não vale... Você é o noivo!

História de pescadorO sujeito chega em casa depois de um dia de pescaria com os amigos e diz para a mulher:– Hoje foi um dia atípico, amor. Não consegui pescar peixe algum.– Eu sei, querido. Você esqueceu a carteira em casa!

Notícia bombásticaDurante o jantar, a menina anuncia para a família:– Mamãe! Papai! Estou grávida!Ambos olham assustados. A mãe pergunta:– De quem, minha filha?– Ah, sei lá! Vocês nunca me deixaram namorar sério!

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