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1 A GEOGRAFIA ESCOLAR E A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE MEIO AMBIENTE EM ESCOLAS DO CAMPO NO MUNICIPIO DE IPORÁ/GO Silvaci Gonçalves Santiano Rodrigues Universidade Federal de Goiás - UFG [email protected] Jackeline Silva Alves [email protected] Universidade Estadual de Goiás - UFG Resumo Neste trabalho, buscamos compreender a contribuição da geografia escolar para a construção do conceito de Meio Ambiente, em escolas do campo, em Iporá/GO. À guisa de alcançar o objetivo, foram feitos: levantamento e revisão de referencial teórico; leitura das propostas pedagógicas sobre a construção do conceito em questão; leitura das propostas curriculares e também as expectativas de aprendizagem elaboradas pela Secretaria Estadual de Educação; elaboração, aplicação e interpretação de questionários fechados para alunos e entrevistas semi- estruturadas para as professoras; elaboração de desenhos pelos alunos envolvidos na pesquisa. Concluímos que o conceito de Meio Ambiente para os alunos aparece, quase sempre, como sinônimo de natureza, estando relacionado apenas aos ambientes naturais. Logo, a geografia escolar nas escolas investigadas pouco tem contribuído para construção do conceito. Palavras-chave: Meio Ambiente. Conceitos geográficos. Ensino de Geografia. Introdução A geografia escolar cumpre importante papel na formação do indivíduo em sua integralidade; a saber, pode auxiliá-lo a ampliar suas concepções de mundo, a compreender as transformações e processos que ocorrem através da interação dinâmica entre os elementos da natureza, possibilitando ainda uma melhor apreensão das relações que se estabelecem entre sociedade e natureza. Entretanto, reflexos dos ranços e dicotomias históricas presentes nas bases epistemológicas desta ciência, em cada uma das correntes de pensamento que o fundamentam, se mesclam à geografia ensinada na educação básica (ensino fundamental e médio). Conforme proposto pelos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s (BRASIL, 2001, p. 109), consiste como “[...] objetivo da Geografia explicar e compreender as relações entre a sociedade e a natureza, e como ocorre a apropriação desta por aquela”. Assim,

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A GEOGRAFIA ESCOLAR E A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE MEIO AMBIENTE EM ESCOLAS DO CAMPO NO MUNICIPIO DE IPORÁ/GO

Silvaci Gonçalves Santiano Rodrigues Universidade Federal de Goiás - UFG

[email protected]

Jackeline Silva Alves [email protected]

Universidade Estadual de Goiás - UFG

Resumo

Neste trabalho, buscamos compreender a contribuição da geografia escolar para a construção do conceito de Meio Ambiente, em escolas do campo, em Iporá/GO. À guisa de alcançar o objetivo, foram feitos: levantamento e revisão de referencial teórico; leitura das propostas pedagógicas sobre a construção do conceito em questão; leitura das propostas curriculares e também as expectativas de aprendizagem elaboradas pela Secretaria Estadual de Educação; elaboração, aplicação e interpretação de questionários fechados para alunos e entrevistas semi-estruturadas para as professoras; elaboração de desenhos pelos alunos envolvidos na pesquisa. Concluímos que o conceito de Meio Ambiente para os alunos aparece, quase sempre, como sinônimo de natureza, estando relacionado apenas aos ambientes naturais. Logo, a geografia escolar nas escolas investigadas pouco tem contribuído para construção do conceito.

Palavras-chave: Meio Ambiente. Conceitos geográficos. Ensino de Geografia.

Introdução

A geografia escolar cumpre importante papel na formação do indivíduo em sua

integralidade; a saber, pode auxiliá-lo a ampliar suas concepções de mundo, a

compreender as transformações e processos que ocorrem através da interação dinâmica

entre os elementos da natureza, possibilitando ainda uma melhor apreensão das relações

que se estabelecem entre sociedade e natureza.

Entretanto, reflexos dos ranços e dicotomias históricas presentes nas bases

epistemológicas desta ciência, em cada uma das correntes de pensamento que o

fundamentam, se mesclam à geografia ensinada na educação básica (ensino

fundamental e médio).

Conforme proposto pelos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN’s (BRASIL, 2001,

p. 109), consiste como “[...] objetivo da Geografia explicar e compreender as relações

entre a sociedade e a natureza, e como ocorre a apropriação desta por aquela”. Assim,

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ao produzir sua própria existência, os homens organizados socialmente, constroem não

só a sua história, conhecimento e processo de humanização, como produzem também o

espaço geográfico; espaço este, que deve ser interpretado e apreendido em suas

múltiplas dimensões.

Nesse sentido, a geografia cotidiana possibilita ao indivíduo experiências fundamentais

para a formação da consciência de si e do mundo em que vive. Portanto, as questões

atinentes aos estudos ambientais não podem ser ensinadas e compreendidas dissociadas

do estudo da geografia e da concepção de apropriação do espaço geográfico.

Diante do exposto, este texto constitui-se como resultado de um projeto de pesquisa

vinculado à Pro-reitoria de Pesquisa e Pós Graduação da Universidade Estadual de

Goiás durante o ano de 2010, .intitulado “A contribuição da Geografia na construção

dos conceitos de Meio Ambiente e Cidadania no ensino fundamental do Colégio de

Aplicação em Iporá” e como desdobramento deste, a realização do trabalho de

conclusão de curso “A importância da Geografia escolar para a construção dos

conceitos de Meio Ambiente e Cidadania em escolas rurais do município de Iporá/GO”.

Entendemos que para compreender o espaço em que vive, o aluno não dever ser

considerado um receptor passivo de um conhecimento socialmente construído pela

humanidade, ou seja, para que a produção do conhecimento aconteça a contento, há de

se considerar os referenciais que o aluno traz consigo, somando-se a estes, novos

conhecimentos, para que a partir de então, ele consiga (re)elaborar e construir o seu

conhecimento geográfico.

De acordo com Callai (1998, p. 56) apud Cavalcanti (2002, p. 13):

A Geografia é a ciência que estuda, analisa e tenta explicar (conhecer) o espaço produzido pelo homem e, enquanto matéria de ensino, ela permite que o aluno ‘se perceba como participante do espaço que estuda’, onde os fenômenos que ali ocorrem são resultados da vida e do trabalho dos homens e estão inseridos num processo de desenvolvimento.

À medida que o ser humano aumentou a sua capacidade de intervenção sobre os

elementos compositores do meio, seja para satisfazer suas necessidades imediatas ou

para acumular bens, bruscas transformações foram desencadeadas sobre os sistemas

naturais, acarretando instabilidades que, por vezes, colocam em risco a disponibilidade e

ou a continuidade de utilização de muitos dos recursos naturais disponíveis.

Vários segmentos da sociedade demonstram preocupação no que concerne à urgência

em buscar alternativas que minimizem os efeitos gerados pelas alterações ambientais

provocadas e que ameaçam a manutenção da vida em suas diversas escalas. Precisamos

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desenvolver melhor as nossas capacidades de entender os processos dinamizadores da

sociedade ao longo dos tempos, bem como a forma como está, tem produzido o espaço

geográfico em função do modelo econômico vigente, que impõe, cada vez mais,

múltiplas transformações de ordem socioambiental.

Acreditamos que por meio da educação (formal e não formal), muitos dos problemas

existentes em nosso meio poderiam ser minimizados ou até mesmo solucionados se

fossem tomados como prioridade para a sociedade e governos.

Segundo o Caderno do Educador do Programa Escola Ativa (BRASIL, 2010, p. 47),

“Pelo estudo da Geografia, os educandos podem desenvolver hábitos e construir valores

importantes para a vida e sociedade.” Assim, a educação escolar pode auxiliar a

minimizar e até mesmo a solucionar muitos problemas de ordem socioambiental.

Os componentes curriculares não devem ser trabalhados e compreendidos de forma

compartimentada, uma vez que a inter-relação entre todos eles auxilia de forma

considerável na produção de conhecimentos. Nesse sentido, a geografia enquanto

componente curricular constitui-se de extrema relevância, dada a multiplicidade de

ramos que agrega, bem como da possibilidade desta em relacionar-se com outras

ciências ou disciplinas escolares, propiciando assim a compreensão e criticidade sobre

as relações que se estabelecem entre seres humanos e natureza, e também entre a

sociedade.

Destarte, a geografia ensinada nas escolas associada a outros componentes curriculares

pode auxiliar o aluno a tornar-se um cidadão crítico e com capacidade de atuar em prol

da transformação de sua realidade social. Contudo, esse fato dependerá da forma como

este componente curricular for ensinado, pois para fazer a diferença, o aluno deve sentir

prazer em aprender Geografia, uma vez que ela está presente em nosso cotidiano. Nesse

raciocínio, vivemos no espaço geográfico e é nesse espaço que se estabelecem as

relações cotidianas dinâmicas entre sociedade e desta com a natureza.

Para que haja construção de conhecimento é necessário que o aluno entenda qual o

sentido das informações que lhe estão sendo apresentadas, levando em consideração as

diversas problemáticas existentes no mundo e que necessitam de resoluções. Torna-se

fundamental a contextualização dos conteúdos, para que o mesmo possa compreender a

construção do espaço pelas sociedades ao longo do tempo.

Nesta pesquisa, buscamos compreender como a geografia escolar tem contribuído para a

construção do conceito de Meio Ambiente no ensino fundamental (2º ao 5º ano), em

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escolas do campo, no município de Iporá/GO. Participaram da pesquisa as seguintes

escolas: Escola Municipal Boaventura Domingues de Araújo; Escola Municipal Bugre;

Escola Municipal Mangelo Pedro Borges e Escola Municipal Professora Vilma Batista

Teixeira.

Concebemos que espaços, urbano e rural, estão sendo degradados. Enquanto no espaço

urbano temos os problemas socioambientais relacionados à pobreza, ao excesso de

produção de resíduos sólidos, às inundações, no campo ocorre a contaminação dos

mananciais por meio de agrotóxicos, muitas vezes extinguindo inúmeras espécies –

retirada da cobertura vegetal para plantações de soja, pastagens, cana de açúcar. Como

resultado, os problemas sociais são gerados no campo, ou expropriando a população, ou

tornando-a força de trabalho explorada pelo capital.

Material e métodos

Para elaborar esta pesquisa, buscando compreender de que modo a geografia escolar

tem contribuído para a construção do conceito de Meio Ambiente nas escolas do campo

do município de Iporá/GO, adotamos o seguinte caminho metodológico: Levantamento,

seleção e leitura de fontes bibliográficas que tratam sobre o tema, visando embasar a

construção do referencial teórico que subsidiou as constatações empíricas; levantamento

e análise das Diretrizes e Propostas Curriculares elaboradas pela Secretaria Estadual de

Educação, para o componente curricular de geografia, destacando o enfoque dado às

temáticas que versam sobre Meio Ambiente.

Buscamos, aqui, compreender a forma como estavam organizadas as Unidades

Temáticas tratadas e Procedimentos de Operacionalização sugeridos por estas propostas

oficiais; consideramos esses procedimentos no tratamento didático utilizado pelos

professores no processo ensino/aprendizagem do conteúdo Meio Ambiente.

A revisão e apreciação das propostas oficiais que orientam os conteúdos que abordam o

tema em pauta foram realizadas junto aos PCN’s elaborados para a Geografia, e também

do Projeto Escola Ativa, sendo este um documento oficial elaborado pelo Ministério da

Educação e Cultura – MEC, que trata especificamente de propostas para escolas do

campo (BRASIL 2010).

A escolha das escolas-campo (escolas do campo), do município de Iporá, justifica-se

pelo fato de pesquisa similar ter sido realizada em uma escola pública estadual no

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município (Colégio de Aplicação em Iporá). Optamos em realizar a mesma pesquisa em

escolas do campo, a fim de que, posteriormente, tivéssemos elementos que nos

permitissem comparar a forma como é abordado e construído por meio do componente

curricular de geografia o conceito de Meio Ambiente, considerando a abrangência de

ramos que tratam a geografia e ainda por ser este um tema transversal.

As escolas-campo, participantes desta investigação, caracterizam-se por serem escolas

pequenas; atendem no total 44 estudantes – um número bem reduzido se comparado as

escolas urbanas. Entendemos que o número reduzido de alunos, nestas escolas,

explica-se em razão de muitos pais não serem os proprietários da terra, e que para se

manterem economicamente junto de suas famílias, trabalham nas fazendas próximas às

comunidades, nas quais se localizam estas escolas. Assim, quando os pais não têm mais

trabalho nestas localidades, migram para outros lugares levando consigo os filhos.

Participaram da pesquisa 24 alunos do primeiro ao terceiro ciclo do ensino

fundamental1. Para isso, elaboramos e aplicamos um questionário fechado e solicitamos

também aos alunos que, através de desenhos, representassem o seu entendimento sobre

Meio Ambiente.

Desenvolvimento

Embora considerada um componente curricular desinteressante por grande parte de

muitos alunos e até mesmo por professores, a geografia escolar em conjunto com as

demais disciplinas que fazem parte dos currículos escolares, pode, se bem trabalhada,

auxiliar o indivíduo em sua formação intelectual e humana, tornando-o um cidadão

crítico, reflexivo e atuante na sociedade em que se insere.

Rica em conteúdos e conceitos, a geografia escolar pode ser trabalhada em todas as

fases do ensino, devendo ser relacionada, tanto na teoria como na prática, à realidade

dos alunos, possibilitando-lhes assim melhor compreender e atuar no espaço em que

vivem.

Dentre os objetivos que deve cumprir a Geografia escolar destaca-se que esta deve

permitir ao educando realizar aprendizagens significativas2. Assim, no processo de

aprendizagem se faz necessário o desenvolvimento de habilidades e competências, para

que educador e educando possam: comparar, analisar e relacionar os conceitos como um

processo essencial na construção do conhecimento.

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Dentre os conceitos que são usualmente utilizados pela geografia escolar, bem como por

outros componentes curriculares, consideramos que a construção dos conceitos de Meio

Ambiente associado ao de cidadania seja de extrema relevância para a formação do

cidadão crítico, reflexivo, participativo, com capacidade de intervir na realidade

socioambiental com consciência de seus direitos e deveres. Assim, por se tratar de um

componente curricular que aborda tanto os aspectos físicos como os humanos, a

geografia escolar se destaca no tratamento das questões ambientais.

Para compreender o papel da educação e da geografia, em especial na formação do

sujeito capaz de resolver problemas ambientais, é necessário que se faça a leitura das

propostas educacionais, e em especial as propostas para o ensino de Geografia, ao

entendê-las como pilares para uma educação para o ambiente.

Cumpre à geografia:

Identificar e avaliar as ações dos homens em sociedade e suas conseqüências, em diferentes espaços e tempos, de modo a construir referenciais que possibilitem uma participação propositiva e reativa nas questões socioambientais locais (BRASIL, 1997 p. 89).

O debate ambiental parece ser um tema fácil, por envolver o espaço de vivência do

educando; porém o educador, ao trabalhar essas questões deve estar disposto a assumir a

tarefa de sair das bases tradicionais, que ainda caracterizam o ensino de Geografia, à

guisa de construir um conhecimento geográfico que permita a compreensão ambiental.

Essa postura deve acontecer, não apenas a partir das definições de conceitos

relacionados ao meio ambiente, como o que é preservar, o que é conservar, o que é meio

ambiente, mas buscando a compreensão da interação entre as partes.

Como se infere da visão aqui exposta, a principal função do trabalho com o tema Meio

Ambiente é contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos para decidirem e

atuarem na realidade sócio-ambiental de um modo comprometido com a vida, como o

bem estar de cada um e da sociedade, local e global. Para isso é necessário que, mais do

que informações e conceitos, a escola se proponha a trabalhar com atitudes, com

formação de valores, com o ensino e a aprendizagem de habilidades e procedimentos.

(BRASIL, 2001, p. 29)

Através da análise dos desenhos elaborados pelos educandos, pudemos perceber que

prevalece uma visão de Meio Ambiente, pautada no entendimento aproximado do meio

natural. Embora o ser humano apareça em alguns desenhos, não é tido como alguém que

intervém e que degrada o meio natural.

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Durante a pesquisa, junto às professoras, constatamos que todas elas são pedagogas

(uma vez que trabalham com as séries iniciais). Indagamos sobre a formação específica

a fim de compreender se a formação específica poderia interferir sobre a relevância do

ensino de geografia e a importância dada aos conceitos geográficos, entre os quais estão

o de Meio Ambiente.

Ao questionarmos os educandos sobre suas concepções sobre Meio Ambiente, eles

relacionaram esse conceito, principalmente, a “árvores, plantas, bichos, animais

selvagens, rios”. Em alguns, porém existem casas e ruas, se por um lado notamos o

ambiente transformado, por outro estes ambientes estão em perfeitas condições,

principalmente com muitas árvores. O que não é realidade, especialmente, no espaço em

que estas escolas estão localizadas.

Há, nessas concepções, um ambiente transformado e não degradado, com os mais

variados problemas ambientais, ou seja, uma visão romântica da relação

sociedade/natureza. Vários dos desenhos mostram o ser humano como

expectador/apreciador do meio.

Por meio das entrevistas realizadas junto às professoras, diagnosticamos que o tema é

tratado de forma tradicional, simplista também com maior ênfase ao meio natural. Elas

não utilizam textos com bases científicas consistentes, que possibilitem uma boa

compreensão e fundamentação teórica acerca do tema meio ambiente. Assim,

questionamos como trabalhar de forma transversal, desconhecendo a visão de autores

diferenciados sobre o tema e sem aprofundar no conhecimento sobre os mesmos?

Verificamos que tal situação é recorrente nas escolas pesquisadas, pois ao levantarmos o

material didático utilizado pelas professoras, percebemos que o livro didático ainda é o

material mais usado. No entanto, não podemos estigmatizar o uso do livro, como se

fosse algo errado, pois da maneira como a escola exige que ele seja trabalhado não

oportuniza ao professor buscar outros materiais didáticos.

Nesse sentido, o ensino/aprendizagem acaba ficando comprometido, pois como o ensino

se pauta pelo conteúdo do livro didático, por mais que as professoras busquem outras

fontes de informação, a ideia de construção de conceitos não se efetiva na prática, uma

vez que é desconsiderado o conhecimento prévio do aluno. Portanto, acreditamos que o

problema não é o livro didático, mas o uso quase exclusivo do mesmo como material

didático.

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As educadoras, por orientação da SME, devem cumprir todo o conteúdo do livro,

desconsiderando o que seja ou não relevante para a aprendizagem de seus alunos,

contrariando o que diz Passini (2007, p. 38), “A escolha do conteúdo para ensinar

geografia deve ser feita pensando na responsabilidade de formação do cidadão que

precisa entender o mundo”.

Portanto, para que isso se efetive, os professores deveriam estar aptos a trabalharem

com o tema Meio Ambiente, de modo que os seus alunos pudessem compreender o seu

meio como lugar em que também acontecem problemas ambientais, e assim intervir

para resolução destes.

Meio Ambiente e Cidadania e as diretrizes educacionais

O MEC, embasado nos PCNs, institui diretrizes educacionais, a partir de 1996, com a

Lei de Diretrizes e Bases da educação nacional; contudo, muitos são os limitantes para

efetivá-las. O sistema educacional organiza uma política nacional para todo o território

brasileiro, não sendo consideradas as particularidades regionais e/ou locais.

Outras vezes, o professor não consegue articular propostas dos PCNs com o que é

proposto nos livros didáticos. Ressaltamos aqui o livro didático, porque em muitas

situações esta é a única ‘ferramenta’ que o professor dispõe para realizar o seu trabalho.

Considerando a construção do conceito de meio ambiente, não há possibilidade de o

indivíduo entender o meio em que ele vive se estiver limitado ao espaço da sala de aula.

Um trabalho apenas referindo ao meio ambiente, à educação para atitudes

ambientalmente corretas, não é suficiente. Não basta ter consciência ambiental, é

necessário ser educado/formado para tomar atitudes. Para que ocorra essa “tomada de

atitude” a educação deve ser repensada, e descolada dos interesses políticos que

cerceiam a educação do povo brasileiro. A elite continua sendo bem formada para o

mercado e cumprindo sua função de manter a ordem, na desordem.

A maior parte dos professores está sensibilizada contra a degradação da natureza, e se

mobiliza, com empenho sincero, para enfrentar essa questão, mas as práticas resultantes

geralmente são pouco eficazes para mudar, de forma significativa, a realidade mais

imediata com a qual está lidando e, reciprocamente, com uma realidade mais ampla. O

melhor resultado que não deixa de ser importante, mas revela-se insuficiente para o

enfrentamento da crise ambiental, é a difusão de informações sobre a importância da

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preservação da natureza. Essas informações parecem eficientemente disseminadas por

todo o mundo e, com certeza, presentes nas novas gerações em idade escolar.

(GUIMARÃES, 2004)

É nesse sentido que defendemos uma educação geográfica voltada para a cidadania,

uma educação para a compreensão dos problemas ambientais, baseada num

questionamento em prol do meio ambiente. Acreditamos que se o indivíduo entender

seu papel na sociedade, ele passará a compreender o porquê tomar atitudes

ambientalmente corretas.

A contribuição do ensino de geografia para a construção dos conceitos de meio ambiente nas escolas do campo no município de Iporá

Sabemos que o espaço rural é também um ambiente que se transforma tanto quanto o

urbano. Essas transformações se dão de acordo com a população que habita esse espaço

e o grau de intervenção nele provocado; logo as alterações provocadas serão em maior

ou menor intensidade, dependo dos interesses das sociedades nestes espaços. Assim,

educar para atitudes, ambientalmente, corretas os cidadãos que vivem nos espaços rurais

é também papel da geografia.

Embora o ambiente rural tenha características físicas diferentes do espaço urbano, os

atores e transformadores desse espaço são seres humanos, o que torna a pesquisa

relevante, pois tanto a população rural quanto a população urbana têm as mesmas

responsabilidades no que se refere à manutenção, preservação e conservação do meio

em que vivem. Esse comportamento contribui para melhor qualidade de vida das

populações e para bem fazê-lo é necessário que estejam conscientes dos seus deveres e

direitos enquanto cidadãos. Nesse sentido, a população do campo tem seu papel

enquanto cidadão no que se refere à luta pela preservação socioambiental.

Portanto, nesta pesquisa, tivemos informações que com o objetivo de reduzir gastos, o

poder público municipal conduz os estudantes dos ambientes rurais para os ambientes

urbanos3. Entendemos que tal prática, seja uma estratégia utilizada pelo poder público

para desterritorializar o homem do campo, mesmo que indiretamente. As futuras

gerações4 campesinas não serão estimuladas a viver no campo, pois ao vir para as

cidades acabam se adaptando e fazendo deste espaço seu lugar de vivência.

O privilégio à cultura, conteúdos adequados às realidades, são assuntos debatidos nas

diretrizes educacionais, porém, na prática nem sempre ocorre o que se estabelece

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através das políticas educacionais; desta feita, a realidade camponesa acaba por ser

ignorada quando as políticas elaboradas desconsideram estes aspectos.

Segundo Kolling, Nery e Molina (1999), essas questões devem ser valorizadas, com

políticas de criação de um calendário próprio, de conteúdos que se aproximem do povo

do campo. Os autores citados argumentam ainda que a educação no espaço rural deveria

ser diferenciada da educação do espaço urbano; currículo diferenciado, professores

qualificados para o campo, ou seja, uma educação para o povo do campo.

Entendemos que, com a mecanização do campo e a ideologia capitalista, muitos

camponeses se sentem excluídos deste processo e para se incluírem acabam aderindo ao

sistema. Uma das formas de adesão é terem filhos nos espaços urbanos com a

expectativa de “melhoria de vida”.

Entretanto, existem camponeses que preferem a escola do campo à urbana; com um

currículo especial para o campo, com um calendário próprio entre outros aspectos que

não são considerados.

Assim, uma educação geográfica voltada para a construção do conceito de Meio

Ambiente, permitiria ao aluno pensar o ambiente rural nesta perspectiva, objetivando

melhorias para o homem do campo por meio de políticas públicas que possibilitassem

sua fixação no campo.

As escolas pesquisadas são pequenas e que atendem no total 44 estudantes do ensino

fundamental. A estrutura física são boas, se comparadas à algumas do espaço urbano. A

Escola Municipal do Bugre é a única que possui duas salas de aula; atende Educação

Infantil e 1º ano do ensino fundamental em uma sala, enquanto a outra sala fica a

disposição dos alunos do 2º ao 5º, do ensino fundamental. São quatro as professoras que

atuam nestas escolas, entretanto, participam da pesquisa três delas, que neste trabalho a

fim de preservar-lhes a identidade são designadas: A, B, C. A professora que não

participou da investigação atua na educação infantil, modalidade esta não inclusa na

pesquisa. Todas as educadoras possuem graduação em pedagogia. Como vimos a partir

das descrições acima, o número de educandos que frequentam estas escolas é

relativamente pequeno. Segundo afirmação da Professora B, quando os pais não têm

mais trabalho, nestes locais, migram para qualquer outro lugar, levando consigo os

filhos, e que na escola em que ela trabalha, há evasão, em razão desta situação.

Diante do exposto, as escolas do campo perdem rotativamente parte de seus alunos,

ficando com um número reduzido de estudantes, e chegando até mesmo a ser fechada

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como foi o caso da Escola Boaventura Domingues de Araújo5 localizada na comunidade

do Buriti, e fechou no ano de 2009, sendo também o caso da escola Mangelo Pedro

Borges6, localizada na comunidade Cruzeirinho, em 2010, ano em que a pesquisa foi

realizada possuía apenas quatro estudantes e seria fechada no final do semestre.

Outro fator importante, que corrobora para justificar o reduzido número de alunos,

nestas escolas, é que, à medida, em que as propriedades rurais (fazendas) passaram pelo

processo de mecanização, o camponês acabou se desterritorializando, logo reduzindo o

número de trabalhadores no campo, refletindo no número de alunos que frequentam as

escolas do campo:

[...] essas propriedades são altamente mecanizadas, o que demanda um número reduzido de trabalhadores rurais. Isto acarreta a redução do número de trabalhadores e consequentemente, o fechamento de escolas no meio rural (SOUZA, 2010, p. 23).

Ainda, nesse raciocínio, Lopes (2010, p. 41) argumenta que a “Geografia deve oferecer

instrumentos para a compreensão e intervenção na realidade social”. Contudo, para que

tal prática se efetive, os educadores devem estar aptos ao trabalho com o tema Meio

Ambiente, de forma que compreendam o meio como lugar onde também são

desencadeados problemas socioambientais, a fim de intervir para solucioná-los e/ou

amenizá-los.

Nas entrevistas realizadas com as educadoras participantes da pesquisa, observamos que

o tema Meio Ambiente ainda é tratado de forma tradicional e simplista, não percebemos

uma visão crítica entre as educadoras, como, por exemplo, questionar os motivos pelos

quais o ser humano altera seu espaço de vivência.

O MEC aponta os PCNs como norteadores do processo educacional no sentido da

formação do cidadão, porém, para Pontuschka (1999, p.16) a linguagem dos PCNs é

para professores que tem um nível avançado de conhecimento.

Parafraseando Pontuschka (1999, p. 16), o objetivo do MEC para o ensino de Geografia

não pode ser concretizado, se tomarmos os PCNs como referência, pois, “O texto é

teórico demais para o professor que ainda utiliza o livro didático como sua única ou

principal bibliografia”. Com base no exposto, argumentamos os resultados alcançados

na pesquisa.

As professoras pesquisadas não utilizam textos com bases científicas consistentes, que

possibilitem uma boa compreensão e fundamentação teórica sobre o tema Meio

Ambiente. Assim, trabalhar de forma transversal, desconhecendo a visão diferenciada

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dos mais diversos autores que tratam o tema, e sem a compreensão do modo como

outras ciências abordam o mesmo assunto, torna a construção deste conhecimento

superficial ou até mesmo equivocada.

Quando perguntamos às educadoras sobre quais são as principais fontes que utilizam

para trabalhar as temáticas relacionadas ao Meio Ambiente, nenhuma obra bibliográfica

que trata o tema em específico foi citada; e, assim, as respostas: “além dos livros

didáticos, recorremos a revistas, à internet e a vídeos”.

A professora “B”, argumenta7: “Eu pesquiso na internet; vai pra escola revistas, têm os

livros [didáticos], na secretaria tem a sala pedagógica que eu posso pesquisar também

em vários livros”.

Já a professora “C”8 diz: “Além dos materiais da Escola Ativa, [os livros didáticos] nós

também temos os extras-curriculares que a gente pode tá utilizando que é pesquisa em

outros materiais; pesquisa em internet, que sempre quando há, há uma questão de algum

conteúdo que a gente vê que não tá sendo bem assimilado, a gente vai em busca de

outros recursos, né?!? Temos também os... as aulas de vídeos da... do meio ambiente,

não é só os livros em si que a gente tem em manual, a gente tem várias fontes que pode

ser trabalhada.”

Com base nas respostas apresentadas, podemos compreender a ideia, ainda reducionista,

dada pelos alunos, quando buscamos saber o que consideram fazer parte do Meio

Ambiente e o que é Meio Ambiente para eles.

Não devemos desconsiderar as fontes supracitadas, contudo acreditamos que outras

fontes possam ser utilizadas, a fim de complementá-las. Além das fontes informacionais

colocadas pelas educadoras não serem suficientes para o trabalho com o tema abordado,

soma-se a isso a seleção dos conteúdos que, a nosso ver, é de extrema relevância para

que o educando possa apreender sua realidade.

Segundo propostas do MEC, de acordo com o PCN de Geografia, a seleção dos

conteúdos “[...] devem permitir o pleno desenvolvimento do papel de cada um na

construção de uma identidade com o lugar onde vive [...] valorizando os aspectos

socioambientais que caracterizam seu patrimônio cultural e ambiental” (BRASIL, 2001,

p.123)

No entanto, não é essa a realidade das escolas do campo, no município de Iporá; não se

considera a realidade do educando a partir do momento em que o livro didático tem que

ser seguido, à risca, até esgotar o conteúdo. Segundo a professora “A”, elas podem usar

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guias extras para complementar o conteúdo, porém jamais deixar de aplicar um

conteúdo, que porventura a educadora considere desnecessário.

Quando questionamos a Professora “B” sobre esta proposta, ela responde: “O MEC

coloca que se o aluno não concluir o livro nós não podemos passar o aluno, ele tem que

ver todo o conteúdo. Enquanto ele não ver todo o conteúdo, ele não passa pra outra

série”.

Portanto, Passini (2007, p. 38), afirma que “A escolha do conteúdo para ensinar

geografia deve ser feita pensando na responsabilidade de formação do cidadão que

precisa entender o mundo”.

No caso destas escolas, o livro é trabalhado por módulo, portanto se não termina o

módulo, o educando fica retido até terminá-lo; e, no ano seguinte, deve continuar o que

não conseguiu. Assim, o professor precisa acelerar o conteúdo para que o aluno consiga

concluir o ano.

“Olha esse livro didático é o seguinte: que ele é por módulos. A gente tem que terminar

o módulo, porque se o aluno não terminar o livro didático ele fica deveno, por exemplo:

se tem oito módulos o livro e o...ele estudou só seis módulos, ano que vem, esse aluno

que não deu conta, que ele ficou meio atrasado, ele tem que fazê os dois módulos,

entendeu? Então a gente tem que cumpri todo o livro, tem que dá todo o conteúdo”

O MEC ainda orienta que estas escolas devem acrescentar mais informações às contidas

nos livros didáticos, portanto existem situações em que os educadores devem acelerar os

conteúdos para esgotá-lo ao final do ano letivo. No entanto, se o conteúdo é muito,

como argumenta a educadora “B”, e o tempo é pouco para ministrar todo o conteúdo, e

o professor necessita acelerar para esgotá-lo ao final do ano letivo, subentendemos que

isso acaba sendo um limitante para que o professor acrescente mais informações às dos

livros didáticos como sugere o MEC.

Nesse sentido o educador passa a se apoiar apenas no livro didático, e por mais que se

busque outras fontes informacionais, como as professoras afirmaram fazer, não se

efetiva a proposta da construção de conceitos.

Para Sato (2002), nos países em desenvolvimento, como o Brasil, a presença do livro

didático é constante nas atividades pedagógicas. Assim:“[...] Os professores diante das

péssimas condições de trabalho, baixos salários e falta de recursos pedagógicos são

obrigados a ministrarem muitas aulas, adotando os livros didáticos como suporte básico

nas atividades educacionais”.

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Sendo o livro didático o recurso mais utilizado pelas educadoras entrevistadas nas

escolas do campo em Iporá/GO, inferimos que no caso dos livros didáticos do 2º ao 5º

ano, utilizado pelo Programa Escola Ativa, são livros de Estudos sociais, com edição

datada da criação do Programa no ano de 1996.

Considerando que cabe à geografia compreender as transformações que ocorrem no

espaço geográfico, e que este espaço é dinâmico, não sendo mais o mesmo de há dez

anos, e que a disciplina de estudos sociais – componente curricular instituído no período

da ditadura militar com a finalidade de eliminar do currículo, os componentes de

história e geografia – também já não faz mais parte das disciplinas que compõem o

currículo escolar; questionamos, mas não obtivemos resposta sobre o porquê de este

material estar em uso a mais de dez anos.

Com base no exposto, verificamos o fosso que existe entre o que se propõe e o que se

pratica. Pensando nestas práticas, e contextualizando a pesquisa, fica fácil entender por

que os alunos têm tanta dificuldade na definição de conceitos, bem como entendê-los

como parte de seu cotidiano.

A percepção das educadoras em relação aos conceitos de Meio Ambiente

Penteado (2001, p. 52), ao tecer considerações metodológicas para o trabalho com o

meio ambiente, argumenta que: “Compreender as questões ambientais para além de suas

dimensões biológicas, químicas e físicas, enquanto questões sócio-políticas, exige a

formação de uma “consciência ambiental” e a preparação para o “pleno exercício da

cidadania”, fundamentadas no conhecimento das ciências humanas.

Através das entrevistas realizadas com as professoras, constatamos que não existe para

elas esta clareza. A professora “A” ao ser questionada sobre o que entende por meio

ambiente, responde: “ah... eu acho assim, que meio ambiente é... tudo que nos rodeia faz

parte do meio ambiente, por exemplo: os animais, as plantas, as pessoas, eu acho que

tudo que nos rodeia”.

Já as professoras “B” e “C” argumentam respectivamente: “meio ambiente, pra mim, é

tudo que está a nossa volta”; “Meio ambiente é o local onde a gente vive; é a natureza

todo o ambiente natural, né... o habitat natural”.

Para Penteado (2001), para trabalhar com o tema, não basta ler o meio ambiente, é

necessário entrar em contato direto com os vários grupos sociais que o compõe,

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observar a exploração a partir das relações sociais; e, além disso, conhecer os teóricos

que fundamentam o tema, os quais estão relacionados às ciências humanas.

Questionadas sobre a importância em trabalhar e compreender o conceito de Meio

Ambiente no espaço rural, obtivemos as seguintes respostas: a professora “A” acredita

que estudar o ambiente rural é mais importante que o urbano pelo fato de os estudantes

estarem em contato direto com o “meio ambiente”, conforme a sua fala transcrita:

Nossa! Como né! Muito importante mesmo porque, principalmente os alunos aqui do

campo ele tá mais em contato direto com o meio ambiente, né? Então pra eles, ter esse

conceito de como preservar, né, é muito importante e eles já tem uma consciência disso,

de que não pode destruir e que envês de destruir tem que plantar, tirá o lixo, intão é pra

eles principalmente que tá em contato direto, né .

A Professora “B” ao falar sobre a importância de trabalhar este conceito, nas escolas do

campo, considera que não só é relevante trabalhar no campo, mas no espaço urbano,

porém acredita que no meio rural é mais importante para que os alunos valorizem mais

o ambiente em que vivem.

Na fala da professora “C”9 percebemos os mesmos equívocos, “Esse é um assunto que

da zona urbana, como diz da zona urbana já é bem retratado, agora imagina os alunos

que estão lá e... e tá em contato com a natureza, eu acho que é mais ainda, né, porque

aqui, a gente na cidade... a gente já tem aquela prática, todo local já tem que ter

incimentado, há todo local, tipo assim, pa sê mais fácil vamo cimentá que fica mais

prático, mais isso aí já é uma preparação distruindo um pouco da natureza. Então na

zona rural eles veem a importância de deixar tudo fluir naturalmente, né. Eu tenho,

como diz, eu tenho que ajudar, eu tenho que preservar pra que ali dê frutos.[...]”

Quando argumentam que é mais importante o trabalho destes conceitos no campo,

notamos nestas e noutras falas que preservar o espaço natural significa para elas cuidar

do meio ambiente natural, ou seja, a forma como o conceito é tratado pelas educadoras

reflete um nível de conhecimento ancorado apenas no livro didático.

Como educadores, devemos entender que muitos dos problemas ambientais existentes

(pode excluir) decorrem da forma desordenada com que a sociedade vai apropriando

dos recursos naturais disponíveis, à guisa de atender seus interesses.

A exploração predatória do meio ambiente não pode ser impedida com a simples

imposição da ideia de intocabilidade, contenção ou retração do uso do ambiente; exige

isto sim, a inclusão social e econômica de forma a buscar o bem estar social para todos.

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Meio ambiente e sociedade encontram-se intimamente associados; por isso, é necessário

compreender a problemática ambiental na sua complexidade. (SAITO, 2002, p.51)

Ao perguntarmos para as professoras se elas se acham pessoas que degradam o meio

ambiente, elas disseram que não. A professora “C”10 diz: “por mais que a gente se vigia,

se policia né.. mas é... eu eu tenho assim em mente que tudo que a gente tem é graças

ao meio ambiente, né? Então nós temos que preservar, e eu nesse ponto de preservação,

é de não jogar lixo no solo né, eu, eu graças a Deus eu tenho um pouquim que eu sou

consciente disso”.

Já a professora “B", argumenta o seguinte: “Eu acredito que não, por várias posturas

que eu tenho de não prejudicar o meio ambiente eu acredito que eu tento cuidar”.

Então perguntamos como você cuida do meio ambiente, já que não degrada. Ela

responde: “Por que eu sou preocupada com minhas ações em não prejudicar e não

degradar o meio ambiente, algumas coisas simples como jogar um lixo, é... uma

sacolinha, preocupar em colocar o lixo em sacolinhas plásticas, é... aproveitar, muitas

vezes, eu sei o tanto que esse ato é errado e que na zona urbana, o tanto que nós

fazemos então eu preocupo em diminuir, é... acredito que usando sacolas de papel vai

melhorar, né? Em pouco tempo vai se decompor, então várias atitudes eu tenho

melhorado”.

A professora “A” quando questionada se é uma pessoa que degrada responde: “Não, eu

acho que não, eu acho assim o que eu posso fazer para evitar essa degradação eu faço e

também passo pros meus alunos essa conscientização, conscientizo eles sempre, meus

filhos, meus alunos, pra que dê, valor, valorize e assim, num destrua esse meio

ambiente, não; que é a nossa casa, né?”

Entendemos que são atitudes que fazem diferença, porém, não suficiente para a solução

dos problemas ambientais. Devemos compreender os processos dinâmicos de

dominação, que ao longo do tempo se estabeleceram nas sociedades e nas suas relações

com a natureza. E a partir dessa compreensão, introduzir no componente curricular de

Geografia uma educação crítica, para lidar com os problemas ambientais a partir do

entendimento dessa intervenção social.

Análise do Programa Escola Ativa, do Projeto Base e do Caderno de Orientações pedagógicas para a formação de educadores e educadoras

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Ao resgatar a dimensão sócio-política da Educação do Campo, exige-se dos sujeitos

educativos, distintas formas de organização do trabalho pedagógico e do trato com o

conhecimento, apontando tanto para a busca de processos participativos de ensino e

aprendizagem, quanto de ação social para a transformação. Dessa maneira, a Educação

do Campo evidenciará o respeito à diversidade cultural e às realidades que fazem parte

das comunidades. (BRASIL, 2010, p. 17)

No entanto, a partir do diagnóstico de campo, nos surpreendemos, quando nos

deparamos com o Programa Escola Ativa, que tem um material pedagógico-didático

voltado para a realidade campesina e portanto favorável ao trabalho da construção do

conceito de Meio Ambiente.

O ensino de Geografia e a percepção dos alunos sobre meio ambiente

Com a intenção de perceber como a geografia tem contribuído para a construção dos

conceitos de Meio Ambiente, realizamos também entrevistas com nove educandos do 2º

ano, cinco do 3º, um do 4º e nove do 5º, sendo um total de 24 alunos participantes.

A todos os educandos, pedimos que através de desenhos representassem o seu

entendimento sobre o Meio Ambiente, objetivando compreender as concepções destes

alunos das por meio das representações de imagens e de escrita, observando que se

equiparam. Percebemos, pelas imagens e pela escrita, uma percepção do Meio

Ambiente, muito aproximado do meio natural, embora em alguns desenhos o ser

humano apareça, ele não é tido, nem nos desenhos e nem nas respostas escritas, como

responsável em relação aos problemas ambientais existentes; sendo assim mero

expectador/apreciador destes ambientes.

Nestas figuras, temos as representações da concepção de Meio Ambiente dos alunos das

escolas investigadas.

Figura1: Alguns dos desenhos confeccionados pelos alunos das escolas do campo do município de Iporá

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Analisando as respostas dos alunos do 2º e 3º ano, sobre o que é meio ambiente, todos

entendem que seja o lugar onde vivem homens, animais e plantas.

Para os alunos do 4º e 5º anos, quando questionados sobre o que entendem por Meio

Ambiente, em apenas dois questionários encontramos respostas mais elaboradas, nas

quais o ser humano também aparece como elemento do meio. Para ilustrar,

transcrevemos as duas respostas: “eu entendo que meio ambiente é onde mora os

animais e nós humanos é todas as coisas que fazem parte da natureza;” já o outro aluno

diz que: “ as árvores, os animais, as frutas, as florestas, as cidades, as pessoas, tudo que

existe no mundo.”

Nos demais questionários11 as respostas se aproximam de um meio ambiente enquanto

“a natureza, os rios, os peixes, os animais”; “aquilo que faz parte dos animais das

plantas, e as árvores, e ajuda nós”; “[...] árvores, as pedras, os rios”; “ é tudo que faz

parte ou está na natureza” ; “é um lugar que os bichos vivem, que tem árvores, plantas,

rios e o meio ambiente é tudo que pertence a natureza”. Quando observamos que a idéia

de lugar está posta, entendemos que há para o aluno uma separação seu meio e o meio

ambiente.

Buscando compreender se os alunos12 percebem o ambiente modificado (casas, ruas,

praças e outros) como sendo meio ambiente e se percebem o ser humano como

transformador do mesmo, eles respondem basicamente com as mesmas palavras “o

homem, os animais, as plantas, os rios, o que tem na natureza.”, “os rios, os animais as

pessoas e a natureza”, “as pedras, as matas, os animais, os bois, e as vacas, os pássaros,

os homens”, “árvores, mares, rios, animais, pessoas, cidades, florestas, enfim, tudo que

existe faz parte do mundo”, “os animais, as plantas, árvores, as frutas, flores, a gente

também faz parte da natureza.”

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O meio ambiente é formado pelos elementos pertencentes ao reino mineral, vegetal,

animal que compõem um determinado espaço;

[...] Estes elementos são todos inter-relacionados; destes elementos destaca-se o homem (pertencente ao reino animal) pela capacidade que tem de interferir em todos estes elementos, alterando-os, consciente e/ou inconscientemente através das dimensões econômicas e políticas, das organizações sociais que constroem (PENTEADO, 2001, p. 73).

Questionando-os se são capazes de resolver problemas ambientais, lembrando que os

problemas mencionados por eles nos questionários limitam-se ao lixo, às queimadas,

poluição ambiental a partir do lançamento de fumaça e matança de animais, eles não se

consideram como parte interveniente, neste processo.

Considerações finais

Ao concluirmos a pesquisa, observamos quão grande é o grau de dificuldade dos

educandos em compreender conceitos que fazem parte de seu dia-a-dia. As escolas do

campo do município de Iporá possui um projeto relevante, que se bem trabalhado pela

Secretaria Municipal de Educação e pelas educadoras poderia ser muito produtivo. Ao

mesmo tempo em que enxergamos essa necessidade, observamos também que se não

houver mudanças na forma de trabalhar o componente curricular – Geografia – a médio

e longo prazo, estas mudanças não serão possíveis, pois atitudes para transformação

dependem de pessoas críticas, que sejam capazes de reivindicar direitos, pessoas cientes

de seus direitos e deveres e também comprometidas com a sociedade.

Diagnosticamos que a Geografia escolar pouco tem contribuído para a construção destes

conceitos nas escolas do campo no município de Iporá/GO. Pensamos que o

conhecimento referente aos conceitos de Meio Ambiente não pode ser construído a partir

de noções em nível de senso comum, e/ou a partir de bases científicas deficientes como

o que vimos durante o estudo.

Entre os educandos pesquisados, não encontramos os que possuem conhecimento

razoavelmente elaborado sobre o tema tratado. No entanto, percebemos que se o ensino

de Geografia fosse elaborado e abordado de modo mais criterioso por todos os

componentes do sistema educacional, poderíamos solucionar alguns problemas a curto,

a médio e a longo prazo; e, assim, termos de fato cidadãos comprometidos com as

questões socioambientais.

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Notas

1 Participaram da investigação alunos regulares do 2o ao 5o ano da séries iniciais (ensino fundamental) 2 Essa é uma concepção contida em teorias de aprendizagem que enfatizam a necessidade de considerar os conhecimentos prévios do aluno e o meio geográfico no qual ele está inserido. (BRASIL, 2008, p.44) 3 Informação a partir de conversa informal com uma educadora e de uma ex-merendeira, moradora da comunidade Cruzeirinho 4A nova geração está sendo deseducada para viver no campo, perdendo sua identidade de raiz e seu projeto de futuro. Crianças e jovens tem direito de aprender da sabedoria de seus antepassados e de 5 Escola do campo fechada no final do ano letivo de 2009. 6Escola do campo fechada no final do ano letivo de 2010, em razão de atender apenas 4 alunos. 7 Informação verbal. 8 Entrevista gravada com a professora “C” 9 Trecho de entrevista formal com a professora “C” 10Entrevista formal, gravada com a professora “C”. 11Transcritas a partir dos questionários aplicados 12 Falas transcritas a partir dos questionários aplicados

Referências

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