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 · ANA MARIA ALVES BENETTI O DIREITO A EDUCAÇÃO EM FACE DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Dissertação apresentada B BANCA EXAMINADORA do UNIFIEO - …

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    " PR"'

  • ANA MARIA ALVES BENETTI

    0 DIREITO A EDUCAÇÁO EM FACE DO

    PRINCIPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA

    PESSOA HUMANA

    MESTRADO EM DIREITO

    UNIFIEO - Centro Universitário FIE0 OSASCO / 2004

  • ANA MARIA ALVES BENETTI

    O DIREITO A EDUCAÇÃO EM FACE DO

    PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE

    DA PESSOA HUMANA

    Dissertação apresentada B BANCA EXAMINADORA do

    UNIFIEO - Centro universitário FIEO -, como

    exigência final para obtenção do titulo de Mestre em

    Direito, tendo como área de concentração "Positivação e

    Concretização Jurídica dos Direitos Humanos", dentro

    do projeto - "A Tutela da Dignidade da Pessoa Humana

    Perante a Ordem Política, Social e Econômica", inserido

    na linha de pesquisa - "Direitos Fundamentais em sua

    Dimensão Material", sob a orientação da Professora

    Doutora Margareth Anne Leister.

    UNIFIEO - Centro Universitário FIEO

    OSASCO / 2004

  • BANCA EXAMINADORA

  • Ao Criador do Universo, pela grandiosidade

    da Sua criação, pela minha vida.

    A minha família, pelo amor, compreensão e

    apoio.

    Aos meus amigos, pela parceria e incentivo.

  • AGRADECIMENTOS

    Aos brilhantes professores do Curso de

    Mestrado em Direito do Centro Universitário

    FIEO, pelos conhecimentos desenvolvidos, pela

    convivência humana edificante.

    A amiga e estimada ProP DP Anna Cândida da

    Cunha Ferraz, Coordenadora do Curso de

    Mestrado em Direito, pela determinação e

    sabedoria na condução de todo o processo.

    A mestra orientadora ProP Dia Margareth Anne

    Leister pela dedicação, apoio e inteligência que

    direcionaram o aprendizado durante o curso e a

    elaboração deste trabalho, meu respeito e

    admiração.

  • RESUMO

    O presente trabalho pretende abordar a expressa inclusão do princlpio

    constitucional da dignidade da pessoa humana, como fundamento da

    República Federativa do Brasil e do Estado Democrático de Direito em que

    ela se constitui, bem como as conseqüências jurídicas produzidas por essa

    inovação na Carta Magna.

    A relevância normativa do princípio constitucional da dignidade da

    pessoa humana, é analisada no pensamento ocidental, culminando com a

    análise constitucional.

    Por outro lado, a dignidade da pessoa humana, enquanto 'valor fonte '

    do sistema constitucional, apresenta-se como cláusula aberta e sustentadora de

    novos direitos presentes no rol dentre os quais os direitos

    sociais. Destaca-se, especialmente o direito à educação, que tem no Estado e

    na família os entes responsáveis pela sua realização.

    Numa relação mutuamente responsável entre o princlpio

    constitucional da dignidade da pessoa humana e o direito a educação, a

    todos assegurado indistintamente, as noções de Educação e de cidadania e

  • democracia, modificadas através dos tempos e nos contextos onde se

    desenvolveram, são abordadas, uma vez que a Carta Constitucional

    expressamente prevê a todos os cidadãos brasileiros tratamento digno, sendo

    cada um deles destinatário do respeito e da proteção do Estado.

    Através da Educação, busca-se garantir na sociedade em constante

    transformação, o acesso a condições existenciais mínimas. Assim, cada

    pessoa, cada família, cada instituição escolar é chamada a ser responsável não

    somente por seu próprio destino, mas também pelo das demais pessoas, numa

    convivência participativa e solidária, encontrando no direito publico subjetivo

    da educação, espaço propício para o estabelecimento de relações sociais e de

    respeito a dignidade humana.

  • SOMMARIO

    I1 presente lavoro pretende abbordare l'inclusione de1 'principio

    costituzionale della persona umana" come fondamento della Repubblica

    Federativa de1 Brasile e de110 Stato Democratico di Dintto su cui esso si basa, ben

    come la consequenza giuridiche prodotte da tale innovazione della "Carta

    Magna".

    Perché si potesse arrivare al rilievo normativo de1 principio costituzionale

    della dignita della persona umana, é stato necessario analizzare tale nozione nel

    pensiero occidentale.

    Si e dirnostrato inoltre che ]a dignitá della persona umana, inquanto

    "valore fonte" de1 sistema costituzionale, si presenta con clausola aperta e

    fondamentale dei nuovi diritti preçenti nel mo10 costituzionale, fra i quali i diritti

    sociali. Ln modo speciale i1 ''diritto all'educazione", qui tiene nel Stato i nella

    Famiglia i responsabili per Ia realizazionv.

    Nella relazione mutuamente responsabile mentre i1 principio

    costituzionalle de110 dignita della personna umana i e1 diritto all'educazione, a

    tutti assicurata indistintaqmente, le nozioni di Educazione, de citatanza e di

  • democracia, modificate traverso le anni i in i contexti svilupati, sano abordati una

    volta qui la Carta Costituzionale prevede i assicura a tutti i cittadini brasiliani

    trattarnento degno, essendo ognuno di loro destinatari de1 rispetto e della

    protezione dello Stato, garantendo gli tramite I'Educazione i1 diritto di accesso a

    condizioni esistenziali minirne.

    Pertanto, ogni persona e chiarnata a essere responsabile non soltanto de1

    suo proprio destino, ma anche delle altre persone, in una convivenza participativa

    i solidaria, encontrando nel diritto publico subjectivo della educazione, i1 spasso

    ideale per i1 stablimento de relazioni socialli i di rispetto alla dignita urnana.

  • RESUMO ............................................................................................................................ VI

    SOMMARIO .................................................................................................................... VI11

    INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 1

    I . PRINC~PIO ................................................................................................................. 6

    1 . 1 Noção de principio ............................................................................................ 6

    1.2 Princípios gerais de direito ................................................................................ 9

    1.2.1 Origem e fundamentos dos princípios gerais de direito .................... 17

    ..................................................................... 1.3 A normatividade dos princípios 23

    1.4 Princípios e regras ........................................................................................... 31

    ........................................... 1.4.1 O Direito na concepção de Herbert Hart 32

    1.4.2 O Direito na concepção de Ronald Dworkin ..................................... 35

    1.4.2.1 0 s princípios e as regras ............................................... 39

    1.4.3 Resposta de Hart criticas de Dworkin .......................................... 40

    1.4.4 Os princípios enquanto mandados de otimização de Robert Alexy .. 44

    1 4 . 5 Quanto ao conteúdo ........................................................................... 48

    1.4.6 Quanto ao grau de abçtração .............................................................. 49

    1.4.7 Quanto a resoluçfio de conflitos ........................................................ 51

    1.5 Princípios constitucionais ................................................................................ 57

    2 ANTECEDENTES HIST~RICOS DA NOÇÃO DE DIGNIDADE DA PESSOA

    HUMANA .......................................................................................................................... 65

    2.1 Dignidade da Pessoa Humana no Pensamento Ocidental ............................... 65

    . 2.1 1 O Pensamento Grego ......................................................................... 68

    2.1.2 O pensamento Cristão ....................................................................... 71

  • 2.1.3 A contribuição de Immanuel Kant .................................................... 83

    2.1.4 O existencialismo de Jean Paul Sartre ............................................... 90

    2.1.5 A reflexão dialética de Hannah Arendt ............................................. 93 3 TRATAMENTO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA

    HUMANA ........................................................................................................................ 100

    3.1 A Constituição de 1988 e a dignidade da pessoa humana: fundamento da

    República e do Estado Democrático de Direito ................................................................. 105

    3.1.1 Antecedentes histórico-constitucionais do princípio da dignidade da

    pessoa hmana .................................................................................................................. 108

    3.2 Dignidade da pessoa humana: valor fonte do sistema constitucional .......... 120

    3.3 Dignidade da pessoa humana: unidade axiológica do sistema Constitucional 127

    3.4 Dignidade da pessoa humana: fundamento da República e do Estado

    De1nocrBtico de Direito .................................................................................................... 135

    4 . EDUCAÇÃO E PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA .................................... 143

    4.1 Exercício da cidadania ................................................................................... 150 4.2 Prepararido o exerclcio da cidadania através da educaçso ..........................a 153

    4.3 O direito à educação nos textos constitucionais brasileiros ............................ 160 ........... 4.3.1 Aspectos relevantes do direito à educaçgo no texto de 1988 169

    ... 4.3.2 Do texto constitucional ao Estatuto da Criança e do Adolescente 172

    5 . A RESPONSABILIDADE DA EDUCAÇÃO NA CONSTRUÇAO DA

    DIGNIDADE HUMANA ....................................................................................... 179

    5.1 Instrumentos viabilizadores do direito A educação ........................................ 184

    5.2 0 direito à educação na LDB ........................................................................ 190

    5.3 A organização da Educação escolar na CF e na LDB .................................... 194

    5.3.1 A educação especial ......................................................................... 202

  • ........... 6 . POL~TICAS PÚBLICAS E O PRINC~PIO DA DIGNIDADE HUMANA 208

    6.1 Educação e dignidade da pessoa humana - uma relação reciprocamente

    responsável ................................................................................................... 2 1 1

    CONCLUSÃO .................................................................................................................. 21 8

    .............................................................................. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 223

  • A importância dada pelo legislador constitucional a Dignidade Humana, a

    elevou a condição de um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, o

    que se comprova na leitura do inciso terceiro do artigo primeiro da Constituição

    Federal de 1988, sendo possível estabelecer sua relação com a Educação

    enquanto direito social a todos garantido, dever do Estado e da família, visando

    ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e

    sua qualificação para o trabalho.

    Para demonstrar tal importância, a noçiío de principio, sua normatividade,

    0s princípios gerais de direito, sao abordados, lembrando-se que as regras e

    princípios situam-se dentro do ordenamento do sistema jurídico. Para Herbert

    Hart, porém, os princípios são uma espécie de norma jurídica ao lado das regras,

    dai a pouca consideração à presença de principios como parte do sistema

    jurídico. No entanto, a teoria de Ronald Dworkin reconhece tal importância, o

    que é confirmado e demonstrado por Robert Alexy, que considera os princípios

    como mandados de otimização, ou seja, como preceitos que devem ser

    cumpridos da melhor maneira possível e cuja limitaçiio será dada pelas

    condições jurídicas e fáticas.

  • Após tais análises teóricas, passa-se a diferenciar as regras dos princípios

    em relação ao conteúdo, ao grau de abstração e a resolução de conflitos, que

    podem ocorrer quando houver choque entre as suas disposições, sendo que

    princípios colocados numa mesma hierarquia constitucional precisarão ser

    submetidos ao 'princípio da proporcionalidade' aplicado ao caso concreto, para

    busca de solução.

    Uma vez firmada a importância dos princípios no cenário jurídico, é

    demonstrada a evolução do conceito de 'pessoa humana' no pensamento

    ocidental e o reconhecimento de sua dignidade, desde a Grécia Antiga, passando

    pela patristica, pelo pensamento de Kant abordando algumas concepções de

    dignidade humana desenvolvidas por pensadores do mundo ocidental.

    Apresentada a evolução desses conceitos básicos, é na Constituição

    Federal do Brasil (e na de inúmeros países), que a dignidade humana é elevada

    ao mais alto patamar, não só pela sua afirmação, como também pelo

    reconhecimento de outros direitos, dos quais ela é o alicerce, como no caso dos

    direitos fundamentais.

    Em seguida, percorre-se a evolução histórica dos direitos humanos e a luta

    para a manutenção de valores ético-jurídicos que dêem sustentação para o

    convívio harmonioso de uma sociedade fraterna, pluralista, sem preconceitos,

  • fundada na harmonia social e comprometida com a ordem interna e

    internacional.

    Eis porque o fundamento constitucional da cidadania assume relevante

    papel no direito a educação e se reflete na prática da democracia, na formação

    consciente da pessoa cidadã e na luta pela dignidade humana, valor inerente a

    cada pessoa.

    O direito a educação presente nos textos constitucionais brasileiros,

    revela-nos um percurso lento e gradual na direção dos princípios auto-

    executórios da obrigatoriedade e da gratuidade, sendo que somente após a

    Constituição Federal de 1988, é que o dever do Estado para com a educação

    passou a ser acompanhado da garantia pelos poderes públicos, de dotação

    orçamentária correspondente.

    Decorrente da Constituição Federal, encontra-se na legislação

    infraconstitucional - com destaque ao Estatuto da Criança e do Adolescente e a

    Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional -, a regulamentação para que as

    garantias e direitos assegurados as pessoas sejam atingidos.

    No mundo de hoje, com as relações sociais e culturais em constante

    transformação, não é possível falar em dignidade da pessoa humana sem levar

  • em consideração o dever do Estado para com a educação no seu aspecto formal,

    ou seja, a garantia do ensino básico a crianças, adolescentes e a todos que a ele

    não puderam ter acesso na idade própria.

    Somente a efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana faz

    com que um Estado seja constitucional, uma vez que esse princípio, valor-fonte

    que acompanha todo ser humano, é base do arcabouço jurídico.

    Sendo um dever do Estado e da família, e direito de todos, com caráter

    inclusivo, sem preconceitos ou discriminação, a educação precisa ser garantida,

    e essa responsabilidade é distribuída pela União, Estados e Municípios, com

    variados campos de atuação, disciplinados pela legislação decorrente da Lei

    Maior.

    Com vistas a essa garantia de direitos e controle da prestação do dever de

    educar imputado ao Estado, existem instrumentos capazes de viabilizar a

    prestação do direito à educação, que poderão ser efetivados pelo Ministério

    Público e pelo Judiciário.

    A educação, entendida como processo contínuo, determinante na

    formação de pessoas mais preparadas para o exercício da cidadania e para a vida

    em sociedade, encontra no seu aspecto formal - o ensino - uma relação

  • reciprocamente responsável para essa construção: Educação e Dignidade

    Humana.

  • 1.1 Noqão de principio

    Para a fundamentação teórica do que virá a ser desenvolvido, é de

    suma importância que se possa compreender o significado do termo princípio,

    encontrado em determinadas normas que consagram direitos fundamentais. "Já

    se torna cada vez mais difundido entre nós esse avanço fùndamental da teoria do

    direito contemporânea, que, em uma fase 'pós-positivista' (GUERRA FILHO,

    1996; BONAVIDES, 1997, p. 247), com a superação dialética da antítese entre

    o positivismo e o jusnaturalismo, distingue normas jurídicas que são regras, em

    cuja estrutura lógico-deôntica há a descrição de uma hipótese fática e a previsão

    da conseqüência jurídica de sua ocorrência, daquelas que são princípios, por não

    trazerem semelhante descrição de situaçaes jurídicas, mas sim a prescrição de

    um valor, que assim adquire validade jurídica objetiva, ou seja, em uma palavra,

    positividade". '

    Com a mesma idéia de fundamento e alicerce, Miguel Reale define

    princípios como:

    I GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo Constitucionale Direitos Fundamentais. 2. ed Sào Paulo : IBDC, 2001.

  • "verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais

    admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas,

    mas também por motivos de ordem prática de caráter operacional,

    isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e

    da práxis ". *

    Entretanto, dentre as definições acerca do tema, a mais utilizada e

    adotada é a de Celso Antonio Bandeira de Mello, que entende principio como:

    '6 mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele,

    disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas

    compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata

    compreensão e inteligência, exatamente por defnir a lógica e a

    racionalidade do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e

    lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princbios que

    preside a intelecção das dferentes partes componentes do todo

    unitário, que há por nome de sistema jurídico positivo".

    Fica evidenciado em tais conceitos que o principio não é somente o

    começo, mas o alicerce, a estrutura, a viga mestra que nos permite entender todo

    REALE, Miguel. Liqõespreliminares de direito. Sào Paulo : Saraiva, 1993, p.305. MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. I I . ed. (rev., atual. e ampl.) Sào Paulo :

    Malheiros, 1999, p. 629-30.

  • um sistema particularmente e, em especial, o sistema jurídico, objeto de estudo

    neste trabalho.

    Justamente pela importância intrínseca a esse alicerce que,

    ocorrendo o desrespeito a um princípio orientador do sistema, no dizer do

    mesmo mestre, anteriormente mencionado,

    L' r e muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A

    desatenção ao princbio implica ofensa não apenas a um espec9co

    mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. E a

    mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade,

    conforme o escalão do princllpio atingido, porque representa

    insurgéncia contra todo o sistema, subversão de seus valores

    fundamentais, contumélia irremissivel a seu arcabouço lógico e

    corrosão de sua estrutura mestraWa4

    Conforme ensina Willis Santiago Guerra Filho, uma das principais

    características para se distinguir os princípios jurídicos das normas que são

    regras,

    '' MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direi10 adminisrrarivo. 11. ed. (rev., anial. e ampl.) Sào Paulo : Malheiros, 1999, p. 630.

  • I' I e a sua maior abstração, na medida em que não se reportam,

    ainda que hipoteticamente, a nenhuma espécie de situação fatica,

    que dê suporte à incidência de norma jurídica". c..) "O grau de

    abstração vai então crescendo até o ponto que não se tem mais

    regras e, sim, princlpios. A ambiéncia natural dos princlpios

    jurídicos, como é fácil deduzir, será o texto ~onstitucional".~

    1.2 Princípios gerais de direito

    Ao se abordar a Ciência do Direito, nota-se que a primeira

    apresentação dos princípios ocorre sob a forma de princlpios gerais de Direito,

    de tal modo que, em sendo o princípio um alicerce, tal base, tal fundamento - 0s

    princípios gerais de Direito -, constitui-se no próprio alicerce da Ciência do

    Direito em si.

    A impossibilidade do acobertamento integral de todas as relações

    jurídicas, foi percebida pelo legislador, o que explica as modificações e

    renovações legais surgidas, mas ainda assim, ocorre o inevitável surgimento de

    lacunas. Vale ressaltar que não existem lacunas na ciência do Direito, mas tão

    somente na lei, o que no dizer de Luís Roberto Barroso, significa que

    GUERRA FILHO, Wllis Santiago. Op Ci , p. 53-54.

  • "a omissão, lacuna ou silêncio da lei consiste na falta da regra

    jurídica positiva para regular determinado caso. A ordem jurídica,

    todavia, tem uma pretensão de completude, e não se concebe a

    existência de nenhuma situação juridicamente relevante que não

    encontre uma solução dentro do s i ~ t e m a " . ~

    Para se buscar resolver eventual ausência de regra jurídica, O

    recurso utilizado é a integração, ou a busca no sistema jurídico, pelo aplicador

    do direito, de uma norma capaz de solucionar a hipótese não prevista de maneira

    expressa pelo legislador.

    Na busca por essa permissão legal que possibilita ao aplicador do

    direito a utilização dos princípios gerais de direito, vai-se encontrar no art. 4" da

    Lei de Introdução ao Código Civil, a seguinte prescrição:

    6 '

    quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a

    analogia, os costumes e os princlpios gerais de direito".

    Sabe-se, no entanto, que um sistema composto exclusivamente por

    regras não pode conter a plenitude necessária para resolver as diversas questaes

    que vão se modificando com o tempo. É normal, portanto, que o legislador se

    " BARROSO. Luis Roberto. Inlerpre~ação e aplicação da consriluição. 4. ed. (rev. e atual.) Sào Paulo : Saraiva, 200 1, p. 140.

  • defronte com lacunas quando da adequação do fato concreto ao tipo legal

    previsto no ordenamento.

    As omissões, ou lacunas são, desse modo, na realidade, verdadeiros

    vazios legais, onde as relaçaes jurídicas que não foram previstas integralmente

    pelo ordenamento, dependem de uma solução legal. Ao magistrado, com vistas

    a resolver o caso concreto, diante de tais lacunas, incumbe utilizar-se de outros

    institutos tais como a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

    Alguns doutrinadores defendem a hipótese de que o aplicador do

    direito deve respeitar a ordem que foi expressamente prevista no ordenamento,

    para suprir as eventuais lacunas quando da resolução dos casos concretos, ou

    se.ia, deve se valer primeiramente da analogia, depois dos costumes e, s6 então,

    na ausência ou impossibilidade de aplicação de tais institutos, e que deve se

    utilizar dos princípios gerais de direito.

    Entretanto, no entendimento de Luiz Antonio Rizzatto Nunes

    "...se, uma vez buscada a saída para o problema concreto da

    lacuna nus normas do sistemu, ndo se u encontre, ainda que por

    analogia, ou reconhecimento do costume juridico (que é a normu

    jur idic~~ nZo escrita), entüo. uplicum-.se os princípios.

  • Não porque eles são os últimos, mas pura e tão somente porque são

    aquilo que resta quando não há norma alguma. Isso não implica

    que as normas jurídicas a serem aplicadas têm vida independente

    dos princrpios. Muito ao contrário. Elas estão totalmente ligadas a

    eles. Nascem atreladas e não têm como se l i ber t~r" .~

    Comenta Maria Helena Diniz, que o princípio geral de direito

    4 4 r r uma diretriz paro a interpretação das lacunas estabelecidas

    pelo prciprio legislador, mas é vago em sua expressão, reveste-se de

    caráter impreciso, uma vez que o elaborador da norma não diz o

    que se deve entender por principio ". 8

    Isto significa dizer que os princípios se apresentam de forma abstrata

    c. quando se toma uma decisão, privilegiando um principio em detrimento de

    outro, apenas se tem uma diminuição circunstancial de sua eficácia, não

    havendo perda de sua validade.

    Ensina Willis Santiago Guerra Filho que "para evitar o excesso de

    obediência a um principio que destrói o outro, e termina aniquilando os dois, há

    KIZZATTO NUNES, Luiz Antonio. O princ$io conslitucional da dignidade da pessoa humana. Doutrina e jirrisprudência. São Paulo : Editora Saraiva. 2002, p. 23.

    DINIZ. Maria Helena Compêndio de introdirção à ciência do direilo. 1 1 . ed. (atual.) São Paulo : Saraiva. 1999, p. 457.

  • de ser considerado o 'princípio dos princípios': o princípio da

    proporcionalidaded, e isto será possível após o emprego de uma metodologia

    especificamente desenvolvida, para se buscar a interpretação constitucional.

    O legislador apenas confirmou que é impossível ao ordenamento

    prescrever regras para a resolução de todo e qualquer conflito, entendendo que

    há dois princípios estruturantes do sistema jurídico brasileiro, condensados na

    fórmula política adotada na Constituição Federal: "Estado Democrático de

    Direito" - principio do Estado de Direito e o princípio democrático - que se

    implicam mutuamente.

    A dificil tarefa de interpretação norrnativa, foi deixada a cargo dos

    estudiosos do direito, que aos poucos discutem e revelam as condições para sua

    adequada aplicação; nesse sentido, os princípios seriam uma das formas, das

    ~ossibilidades, de se encontrar a solução para as mais diversas questões

    colocadas para a análise e utilização por parte do aplicador do direito.

    Fica evidenciado, entretanto, que a intenção do legislador não é

    localizar os princípios gerais de direito no mesmo patamar que estão os preceitos

    legais.

    GUERRA FILHO, Wllis Sanbago Op. Cit., p. 56.

  • Miguel Reale ensina que os princípios lógicos, gerais de direito

    "são enunciações normativas de valor genérico, que condicionam

    e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, quer para sua

    aplicação e integração, quer para a elaboração de novas

    normas " . 'O

    Porém, o Direito não pode ser reduzido a uma instrurnentalização

    normativa, sendo o resultado do fenômeno aprendido pelos operadores da

    norma, a luz de valores que, num determinado contexto, seriam os mais

    necessários, por estarem legalizados. O sentimento de Direito como Justiça,

    como valor, alvo a ser atingido, traz em si a idéia de obrigatoriedade, de

    comando. A norma representa para o jurista uma integraçiio de fatos segundo

    valores.

    No entanto, muitos desses princípios ainda permanecem sem a

    respectiva previsão legal, o que, de modo algum, retira-lhes a eficácia, até

    porque se mantêm como verdadeiras estruturas do ordenamento jurídico, mas na

    conipreensão de Limongi França, isso "constituiriu umu redlrnu'uncia

    incompatível com a moderna técnica de c o d i f c a ç ã ~ " . ~ ~

    I0 REAI !1. Miguel. 0p.cit.. p. 306. I' FRA',CA, R.Limongi. Princ$iosgerais de direito. Enciclopédia Saraiva de Direito. Sáo Paulo, 1977, V. 61, p.56.

  • O mestre português Jorge Miranda, explica que

    "a função ordenadora dos princbios revela-se particularmente

    nítida e forte em momentos revolucionários, quando é nos

    princlfpios - nos quais se traduz uma nova idéia de Direito - e não

    nos poucos e precários preceitos escritos, que assenta a vida

    jurídico-política do país"."

    Retomando o que ensinou, Limongi França conclui que o

    legislador

    I I adota inequivocamente a orientação racional de que, na verdade,

    o ordenumento nüo pode deixar de ter lacunas. A ultrupassada

    noção de plenitude das leis aí não encontra qualquer estribo, pois é

    ele prciprio quem reconhece que a lei pode ser omissa. Oru, é

    diante dessa omissão que cumpre recorrer às formas

    complementares de expressão do direito, especialmente ao costume

    e aos princlpios gerais de direito, uma vez que a analogia constitui

    simples método de aplicação da própria lei". l 3

    '' MIRANDA, Jorge. Munira1 de direito constitucional. Tomo 11,4. ed. (rev. e actual.) Lisboa : Coinibra Ed.. 2000, p. 199. " FRANÇA, RLimongi. Op. cit., p. 55.

  • Afirmando que o princípio de direito é mais do que um instituto que

    será usado apenas na ausência da regra jurídica, Roque Antonio Carrazza ensina

    que

    ' I I e um enunciado lógico, implícito ou explícito, que, por sua grande

    generalidade, ocupa posição de preeminência nos vastos

    quadrantes do Direito e, por isso mesmo, vincula, de modo

    inexorável, o entendimento e a aplicação das normas jurídicas que

    com ele se conectam ". I4

    E ainda, conforme Jorge Miranda,

    d ' a ação imediata dos princlpios consiste em primeiro lugar, em

    funcionar como critérios de interpretação e de integração, pois são

    eles que dão a coerência geral do s i ~ t e m a . ' ~

    Portanto, pode-se dizer que o sistema juridico é composto por

    normas jurídicas que se apresentam sob a forma de regras e princípios. E,

    justamente como parte desse sistema juridico, como seu alicerce e fundamento,

    e que os princípios são utilizados como solução aplicável ao caso concreto,

    quando as regras são insuficientes para a resolução de conflitos surgidos.

    I4 CARRAZZA. Roque Antonio. Curso de direito constitucional tributário. 12.ed. (rev. ampl. e atual.) São Paulo : Malhciros, 1999, p.31-32. I5 MIRANDA, Jorge. Op. cit., p. 199.

  • 1.2.1 Origem e fundamento dos princípios gerais de direito

    Miguel Reale em brilhante contribuição filosófica, revela

    existir na cultura grega, mesmo antes dos sofistas, uma clara distinção entre o

    justo por natureza e o justo por convenção ou por lei. Em Roma se repete a

    distinção já posta na Grécia entre o Direito Positivo e o Direito Natural, OU

    melhor, entre o justo por natureza e o justo por convenção ou lei.

    Com o advento do Cristianismo opera-se distinção entre

    Política e Religião, afetando também a Moral e o Direito, tornando-se o Direito

    Natural uma lei da consciência, uma lei interior, inscrita no coração do homem

    por Deus. Enquanto na Idade Média existia um sistema ético subordinado a uma

    ordem transcendente, o homem renascentista procura explicar o mundo humano

    segundo exigências humanas.

    Procurar os elementos formadores da Ciência, indagar da

    gênese dos fenômenos, de sua origem, é uma tendência constante entre os

    pensadores integrados na ampla visão desses novos tempo. É o homem

    colocando-se no centro do universo, passando a indagar a origem daquilo que o

    cerca. É assim que surge a Escola do Direito Natural ou Jusnaturalismo que,

    porém, se distingue da concepção clássica do Direito Natural aristotélico-

    tomista. Para Santo Tomás, primeiro se dá a 'lei' para depois se por o problema

  • do 'agir segundo a lei', enquanto que para o homem do Renascimento, primeiro

    está o 'indivíduo' com o seu poder de agir, para depois se por a 'lei'.

    É da 'auto-consciência do indivíduo que vai resultar a lei'. É

    por isso que surge a 'idéia de contrato', sendo o Contratualismo a alavanca do

    Direito na época moderna. A sociedade é um fato natural, mas o Direito é um

    fato contratual. É dessa explicação, com todas as nuances de novas concepções e

    idéias, que decorre a fundamentação teórica da ordem jurídica que se ~ ~ n h e c e

    hoje'('.

    Miguel Reale procura esclarecer a origem e o fundamento

    dos princípios gerais de Direito, a partir de três correntes principais: a do Direito

    Pátrio, a do Direito Comparado e a do Direito Natural.

    Para a corrente que defende a origem desses princípios no

    Direito Pátrio, o argumento é de que tais princípios encontrariam sua validade

    nas normas vigentes em cada país. Tal corrente acredita que cada país

    desenvolve seus próprios princípios que estão presentes na própria norma, ou

    podem ser deduzidos da análise de seus textos normativos.

    '" REAI,E, Miyel. f'ilosofirr do Direito. S h Paulo : Saraiva, 19%. p. 622-652.

  • Limongi França explicita que esta é a corrente dos

    positivistas em geral, que defendem

    "ser a lei a única espécie de regra coercitiva admitida para a

    solu~ão das controvérsias jurídica^".'^

    Ao criticar tal corrente, Miguel Reale comenta que num

    mundo globalizado não se pode esperar que exista urna muralha para fazer a

    separação de um ordenamento para com os demais. Além disso, pode-se

    considerar também que certos princípios são comuns a distintos ordenamentos,

    uma vez que são consagrados pela humanidade."

    Para os que defendem a segunda corrente, que encontra a

    origem dos princípios gerais de direito no Direito Comparado, só podem ser

    considerados princípios gerais de direito os preceitos confirmados através do

    estudo comparativo das leis de povos distintos.

    No que tange a esta corrente, Miguel Reale entende que deve

    se considerar as estruturas sociais e políticas de cada povo, para que a dimensão

    de um determinado preceito possa ser verificada, e não somente buscar extrair

    ~ o c á b u l o s semelhantes.

    16 " F K A N C A K I i i i l r > t i g i C > p L,: p 5 0 KI.AL2L. Miguel. Op. cii,. p. 308.

  • Já a terceira corrente, sustentada - segundo Miguel Reale -

    por Sócrates ao "passar pelo cadinho do pensamento plut6nico e adquirir

    plenitude sistemcitica no pensamento de Aristóteles", indica que a origem desses

    princípios, como "a expressão da natureza hurnunu" seria encontrada no Direito

    Natural, de tal modo que

    < c o Direito Natural e' igual paru todos o s homens. nüo sendo

    trm para os civilizados ntenienscs e outros para OS

    búrbaro.~".'~ Também é nesta corrente que se apóiam os

    jil6sofos estdicos, a ponto de "na0 fazerem qualquer

    distinqão entre a lei natural e a lei racional".20

    A existência precedente e a efichcia independente desta lei

    natural, não precisam ser positivadas para que revelem sua força.

    Na obra Antígona - de Sófocles (494-406 a.C) - pode-se

    notar a força do Direito Natural, ao ser relatada a vida de uma das filhas de

    Édipo e Jocasta. O irmão de Antigona, Polinice, havia morrido, mas o rei

    Creonte determinara que ele n8o fosse sepultado. Antigona pretendia dar ao

    irmão uma cova e, contrariando as ordens do rei, lhe diz

    "' REALE, Miguel. Op. Cit., p. 3 13. '" Idem mesma página.

  • "... tuas ordens não valem mais do que as leis não escritas e

    imutáveis dos deuses, que não são de hoje e nem de ontem e

    ninguém sabe de onde nasceram".2'

    Por essa desobediência, a pena de Antígona é ser sepultada

    viva numa parede rochosa. É nesse trecho da tragédia grega de Sófocles, que se

    tem por evidenciada a crença na superioridade do Direito Natural em relação ao

    Direito Positivo.

    Para o estudioso mestre, em face dessa terceira corrente, não

    há como entender que os princípios gerais de direito sejam sinônimos dos

    princípios do Direito Natural. De maneira objetiva esclarece que

    "a experiência histórica demonstra que há determinados

    valores que, uma vez trazidos à consciéncia histórica, se

    revelam ser constantes éticas inamovíveis que, embora ainda

    não percebidas pelo intelecto, já condicionavam e davam

    sentido à práris humana': 22

    E prossegue dizendo:

    21

    7 , S~FOCLES. Antigona. 3. ed. Lisboa : Inquento, 1988, p. 35-36.

    " REALE, Miguel. Op. cif., p. 315.

  • "são essas constantes ou invariantes que formam o cerne do

    Direito Natural, delas se originando os principios gerais de

    direito, comuns a todos ordenamentos jurídicos".23

    Também Limongi França entende que os princípios gerais de

    direito não devem ser confundidos com os principios de Direito Natural,

    esclarecendo sua definição como

    "não apenas aqueles que decorrem das regras particulares

    pelo ordenamento adotadas, senão também aqueles que,

    embora não consagrados pelo direito positivo, são deduzidos

    pela ciência jurídica. Por outro lado entre estes últimos,

    estão c..) os princípios de doutrina e da legislação comparada, como ainda as regras de direito cujo valor é

    intrínseco, por se tratar de princípios do direito natural "."

    1.3 A normatividade dos princípios

    Um aspecto que merece discussão é o que se refere a força

    normativa dos princípios, entendidos como espécie norrnativa, ao lado das

    regras.

    " REALE, Miguel. Op. cit., p. 3 16. I'' FRANÇA R. Limongi. Op. cit., p. 74.

  • Segundo Norberto Bobbio,

    "as normas jurídicas nunca existem isoladamente, mas sempre em

    um contexto de normas com relações particulares entre si. Este

    9 9, 25 contexto de normas costuma ser chamado 'ordenamento ,

    quando os princípios são utilizados para manter o espírito da norma,

    exalamente para que este sistema chamado ordenamento mantenha a coerência.

    Pode-se entender a noção de sistema, como aponta Walter Brugger:

    C..) é a multiplicidade de conhecimentos articulados segundo uma

    idéia de totalidade. Nem um conhecimento isolado, nem muitos

    conhecimentos desconexos constituem um sistema. Este só nasce

    por conexão e ordenação segundo um comum princ@io ordenador,

    por meio do qual se atribui a cada parte, no todo, seu lugar e

    função impermutáveis. c..) o sistema é uma exigência da razão que em toda multiplicidade busca unidade e ordem c..). (Brugguer, Dicionário de filosofia, 1969, p. 382/3).

    De maneira mais cotidiana, a definição para o termo 'sistema' é

  • "o conjunto de regras e princípios sobre uma matéria, tendo

    relações entre si, formando um corpo de doutrinas e contribuindo

    para a realização de um Jim c..). Assim, todo conjunto de regras que se deve aplicar na ordenação de certos fatos, integrantes de

    certa matéria, constitui um sistema".26

    No que diz respeito ao universo jurídico, temos que o sistema

    jurídico

    ' 6 . e o conjunto de regras e princ@iosjuridicos que se insfifuem e se

    adoram para regular todo corpo de leis de um país. Dentro dele

    estabelecem-se os vúrios regimes jurídicos e se fundum as várias

    instituições legais, sejam de ordem interna, sejam de ordem

    externa". 27

    Paulo de Barros Carvalho explica que neste sistema jurídico as

    normas são dispostas numa "estrufura hierarquizadu", onde cada norma se

    ?' BOBBIO.Norberto. Teorin do ordenamenfojurídico. 7. ed. Brasília : Universidade de Brasilia, 1996, p. 19. "' PLACIDO e SILVA, De. Cócabulário jurídico. p. 761. " PLACIDO e SILVA, De. Iócabirlário jurídico. p. 762.

  • fundamenta em normas superiores, '* o que, no dizer de Hans Kelsen, significa que

    "todas as normas cuja validade pode ser reconduzida a uma e

    mesma norma fundamental) formam um sistema de normas, uma

    ordem normativa. A norma fundamental é a fonte comum de

    validade de todas as normas pertencentes a uma e mesma ordem

    normativa, o seu fundamento de validade comum c..). É a norma fundamental que constitui a unidade de uma pluralidade de

    normas, enquanto representa o fundamento de validade de todas as

    normas pertencentes a essa ordem n o r m ~ t i v a " . ~ ~

    A partir das definições de sistema e de ordenamento jurídico, fica

    evidenciado que o gênero - normas que compõem esse sistema - é formado por

    regras e princípios; daí, conforme Norberto Bobbio,

    "não há dúvida: os princbios gerais são normas como todas as

    outras

    E continua, confirmando essa verificação, valendo-se da citação de

    Crisafulli,

    CAIIVALHO, Paulo de B m s . Curso de direito tribirtário. 6 . ed. São Paulo : Saraiva, 1993, p. 98. '' KII .SLN, Hans.Teoriapcra do direito. São Paulo : Martins Fontes, 1998, p. 2 17. "' BORBIO, Norberto. Op. cif. p. 158.

  • "para sustentar que os princípios gerais são normas, os

    argumentos são dois e, ambos, válidos: antes de mais nada se são

    normas aquelas das quais os princkios gerais são extraídos,

    através de um procedimento de generalização sucessiva, não se vê

    por que não devam ser normas tambkm eles: se abstraio da espécie

    animal, obtenho sempre animais e não jlores ou estrelas. Em

    segundo lugar: a função para a qual são extraídos e empregados é

    a mesntu cumpridu por todas us normas, isto k, uJunqüo de regirlur

    um caso ". 3 1

    Norberto Bobbio empresta importante contribuição para a

    atribuição da força normativa do princípio geral de Direito, chegando a entender

    - tratando do ordenamento italiano - que, ao se utilizar dos princípios gerais,

    devido à existência de uma lacuna, não se trataria, na verdade, de uma lacuna,

    32 uma vez que o intérprete recorreu a uma norma como as demais.

    Conforme explica Jorge Miranda,

    "Os princbios não se colocam pois, além ou acima do Direito;

    também eles - numa visão ampla, superadora de concepções

    31 BOBBIO. Norberto. Op. cit., p. 158-9. '' Idem, p. 160

  • positivistas, literalistas e absolutizantes das fontes legais -fazem

    parte do complexo ordenamental".

    Para o mestre português, os princípios não se contrapõem as normas

    e sim as regras, as quais ele chama de "preceitos". Além do que, afirma:

    "as normas jurídicas é que se dividem em normas-disposições e

    normas-princípios ". ''

    Foi preciso haver toda uma evolução do pensamento jurídico para

    se chegar a conclusão de que os princípios gerais de Direito possuem força

    normativa; no entanto, não significa que tal discussão já esteja plenamente

    superada.

    Em sua obra Curso de Direito Constitucional, Paulo Bonavides

    incluiu no Capítulo 8" o título "Dos Princípios Gerais de Direito aos Principias

    C~nstitucionais",~' apresentando uma discussão sobre a evolução da

    importância e normatividade dos princípios, começando por apresentar a

    evolução dessa normatividade, a partir de três diferentes fases: a jusnaturalista, a

    positivista e a pós-positivista.

    33 MIRANDA. Jorge. Op. cit., p. 198. 34 BONAVIDES, Paulo. Curso de direito con

  • A fase jusnaturalista '' - primeira e mais antiga fase - vigorou de uma forma mais ostensiva entre os Séculos XVI e XIX. Fundamentada no

    Direito Natural, essa corrente filosófica reconhece que na sociedade existe uma

    série de valores e as aspirações humanas independem do direito posto. Iniciada

    na Antiguidade Clássica, seu desenvolvimento adquiriu melhor elaboração na

    Idade Média.

    Resposta aos tempos de poderio absoluto dos reis e marca da

    ascensão da burguesia, o jusnaturalismo - dentro do período de revolução

    intelectual denominado iluminismo -, entende que o Estado deve respeitar a

    liberdade individual, pelo fato do homem possuir certos direitos natos.

    Nesta fase, os princípios são entendidos como institutos abstratos,

    que serviriam para inspirar os ''postulados de justiça", ainda que não

    precisassem da força normativa.

    A próxima fase foi dominada pela corrente filosófica do

    positivi~mo,~~ com seu início no Século XIX até a primeira metade do Século

    XX, compreendendo a ciência jurídica com características semelhantes as das

    ciências exatas e naturais. O Direito era entendido como norma emanada pelo

    Estado, "com carater imperativo e força coativa". O doutrinador mais

    35 BARROSO, Luís Roberio. Funhmentos teóricos ejilosójicos do novo direito consrirttcional brasileiro. p. 13- 16. 3f3 Idem, p. 16-18.

  • expressivo desta corrente foi Hans Kelsen, que levou ao extremo a idéia do

    Direito como norma e "completude do ordenamento jurídico", onde não há

    quaisquer lacunas.

    Uma vez que toda a confiança centralizava-se nas leis, nesta fase a

    questão principiológica tornou-se uma questão de Direito Positivo. Deste modo,

    0s princípios gerais de direito passam a equivaler aos princípios positivados,

    codificados e previstos pelo ordenamento como uma fonte subsidiária para a

    solução de conflitos, o que, segundo Gordillo Caiias, funcionaria como

    "~álvulas de segurança".37

    A principal discussão entre as correntes jusnaturalista e positivista,

    é que a primeira entendia que o ordenamento não pode prever todos OS

    princípios que deverão ser usados para solução de conflitos, enquanto que a

    segunda corrente acreditava ser possível ao ordenamento a previsão dos

    princípios essenciais, e no surgimento de uma situaçilo nova, bastaria a

    utilização da analogia.

    Na corrente pós-positivista38 - com vigência a partir da segunda

    metade do Século XX - que corresponde aos grandes movimentos constituintes,

    37 BONAVIDES, Paulo. Op. cir., p. 235. 3 1 BARROSO. Luís Roberto. Op. cit., p. 19-20.

  • retoma-se aos valores que se materializam em princípios ao serem

    compartilhados por uma determinada comunidade, de tal modo que

    "as novas Constituições promulgadas acentuam a hegemonia

    axiológica dos princlpios, convertidos em pedestal normativo

    sobre o qual se assenta todo o edifcio jurídico dos novos sistemas

    ~onsti tucionais".~~

    A novidade desta corrente é o reconhecimento da força normativa

    inerente a estes princípios e não o reconhecimento da existência de princípios.

    Neste momento é superada a discussão entre o jusnaturalismo e o

    positivismo, diferenciando-se

    "normas jurídicas que são regras, em cuja estrutura lógico-

    deôntica há a descrição de uma hipótese fatica e a previsão da

    conseqüência jurídica de sua ocorrência, daquelas que são

    princlpios, por não trazerem semelhante descrição de situações

    jurídicas, mas sim a prescrição de um valor, que assim adquire a

    validade jurídica objetiva, ou seja, em uma palavra,

    positividade ". ' O

    "' BONAVIDES, Paulo. Op. cit., p. 237. 40 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Processo constirircional e direitosfùndamentais. p. 53.

  • 1.4 Princípios e regras

    Para se chegar ao entendimento do Direito como um sistema de

    princípios e regras, é necessário levar em conta o pensamento de Herbert Hart,

    que, ao desenvolver sua teoria jurídica no âmbito do 'common law ', abordava O

    Direito como uma união de regras primárias e secundárias.

    A partir dessa idéia inicial analisa-se a teoria de Ronald Dworkin,

    sucessor de Herbert Hart na Universidade de Oxford e, por fim, aborda-se O

    trabalho de Robert Alexy.

    1.4.1 O Direito na concepção de Herbert Hart

    Em sua obra "O conceito de direito", o autor afirma quanto

    ao Direito: "sua existência signijica que certas espécies de conduta humana já

    não são facultativas, mas obrigatórias "," localizando, de maneira precisa, a

    41 HART, Herbert. Oconceiro de direito. 2 . ed. Lisboa : Calouste Gulbekian, 1994. p. 11.

  • definição de Direito como pertencente a 'yamilia geral de regras de

    comportamento "."

    Tal idéia fez com que se desenvolvesse uma teoria segundo a

    qual o Direito deve ser compreendido como a união de regras primiirias e

    secundárias,') de sorte que a estrutura que combina tal união de regras, pode ser

    vista como "o coração de um sistema jurídico ".'I

    As regras primárias são aquelas que exigem dos seres

    humanos fazer ou deixar de fazer certas ações. Já as regras secundárias são as

    que

    "asseguram que os seres humanos possam criar - ao fazer

    ou dizer certas coisas -, novas regras do tipo primário,

    extinguir ou mod$car as regras antigas, ou determinar de

    diferentes modos a sua incidência ou jscalizar a sua

    aplicação ". "

    Idem, p. 19-20. '" Idem, p. 91. 44 Idem, p. 107. 4q Idem. p. 91.

  • Pode-se sintetizar, que as regras primárias seriam

    responsáveis por impor deveres, enquanto as regras secundárias serviriam para

    a criação, alteração e controle das primárias.

    Assim, as regras secundárias serviriam para solucionar

    possíveis "defeitos" das regras primárias, tais como o caráter estático, a

    incerteza, e a inefi~ácia.'~ para chegar a essa solução, as regras secundárias se

    apresentariam sob a forma de regras de reconhecimento, de alteração e de

    julgamento.

    Para Hart, as regras de reconhecimento são

    "afirmações de facto internas de direito expressando o ponto

    de vista daqueles que aceitam a regra de reconhecimento do

    ~istema",~'

    e servem para validar as regras primárias, ou seja, definir

    quais regras fazem parte do sistema jurídico, conferindo certeza a estas regras.

    Além disso, uma vez que a regra de reconhecimento é o elemento definidor do

    sistema jurídico, de sua presença dependem as demais, de tal modo que não se

    46

    47 HART, Herbert. Oconceito de direito. 2. ed. Lisboa : Calouste Gulbekian, 1994, p. 102-3. Idem, p. 119.

  • pode questionar a validade a respeito dela mesma, uma vez que ela é

    'Simplesmente aceita como apropriada para tal utilização".

    As regras de alteracão são aquelas que servem para completar

    o caráter estático das regras primárias, possibilitando não somente a

    incorporação de novas regras, bem como a eliminação das antigas.

    Já as regras de julgamento servem para substituir a possível

    ineficácia das regras primhrias, de tal modo que outorga a alguns indivíduos o

    poder

    "para proferir determinações dotadas de autoridade

    respeitantes à questão se, numa ocasião concreta, foi violada

    uma regra prin~ária".'~

    Outra idéia que merece ser destacada na teoria de Hart, diz

    respeito ti existência de uma obrigaçilo juridica onde se pressupóe a existência

    de regra j~r idica .~ ' Quando certas situaçaes não se enquadram perfeitamente As

    regras previstas, o juiz deve se valer de seu discernimento pessoal para

    Jn iIAKT. Herbert. Oconcei~o de direito. 2. ed. Lisboa : Calouste Gulbekian, 1994,. p. 120. 4'1

    5 0 Idem. p. 104-7. Idcm. p. 94.

  • "escolher entre as alternativas", que se apresentam nesta "penumbra de

    incerteza ". 5'

    1.4.2 O Direito na concepção de Ronald Dworkin

    O autor foi quem primeiro observou que existem

    determinadas situações onde os profissionais do Direito discutem acerca de

    direitos e obrigações, que se resolvem com princípios e não com regras.

    Em sua obra "Levando os direitos a sério", Ronald Dworkin

    critica a teoria do positivismo jurídico de H.L.A.H~~~.''

    Dworkin resume o positivismo nos seguintes "preceitos-

    a) o direito de uma comunidade é um conjunto de regras que

    são submetidas a "testes de pedigree" com o objetivo de

    determinar quais comportamentos serão punidos ou

    coagidos pelo poder público;

    HART, Herbert. Oconceitode direito. 2. ed. Lisboa : Calouste Gulbekian, 1994,. p. 17. 5' Ressalte-se que na 2" ediçáo & tradução portuguesa da obra de Hart consta um pós-escrito, onde ele responde Bs criticas de Dworkin. chegando a reconsiderar alguns pontos de sua teoria, o que será descrito apbs a apresentação & teoria de Dworkin. " DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Sào Paulo : Martins Fontes, 2002, p. 28.

  • b)como o direito é constituído por essas regras válidas,

    quando um caso concreto não se enquadra nessas regras,

    significa que ele será decidido por um juiz no exercício do

    seu "discernimento pessoa?';

    c) dizer que alguém tem uma "obrigação jurídica" significa

    afirmar a existência de uma regra jurídica válida; caso

    contrário, não existirá a mencionada "obrigação jurídica".

    Para Dworkin, em sua visão Hart diferencia as regras

    primárias das secundárias, entendendo as primárias como sendo

    "aquelas que concedem direitos ou impõem obrigações aos

    membros da comunidade", enquanto que as secundárias

    "são aquelas que estipulam como e por quem tais regras

    podem ser estabelecidas, declaradas legais, modijicadas ou

    aboli da^".^"

    Entre estas regras secundárias, existe a "regra de

    reconhecimento", que seria uma "regra secundária fundamental", pela qual se

    54 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a serio. São Paulo : Martins Fontes, 2002. p. 31.

  • estabelece uma cadeia de validade para as regras jurídicas. Nesta regra de

    reconhecimento a obrigatoriedade dependerá da aceitação pela comunidade."

    O maior problema desta teoria consiste no fato de considerar

    as regras jurídicas com uma estrutura aberta, possibilitando aos juízes exercitar

    "seu poder discricionário para decidir esses casos por meio de nova

    legislação ". A crítica de Dworkin reside nesse poder discricionário apresentado

    pelos positivistas.

    Ele entende que em casos mais difíceis, os juristas deveriam

    se valer de padrões que funcionem como principias, políticas e não como

    regras. Dworkin define política como sendo

    "aquele tipo de padrão que estabelece um objetivo a ser

    alcançado, em geral para a melhoria em algum aspecto

    econômico, político ou social da comunidade"; por outro

    lado, princkio signijca "um padrão que deve ser observado,

    não porque vá promover ou assegurar uma situação

    económica, política ou social considerado desejável, mas

    porque é uma exigência de justiça ou equidade ou alguma

    dimensão da m ~ r a l i d a d e " . ~ ~

    '' DWORKiN, Ronald. Levando os direitos a skrio. Sào Paulo : Martins Fontes, 2002, p. 34. '" Idem, p. 36.

  • Embora o juiz possa se valer tanto dos principios como das

    políticas, Dworkin defende que as decisões devem ser geradas por princípios e

    não por Isto porque os principios encontram menos objeções em

    relação a correspondência do interesse coletivo. Fundamentando em princípios

    sua decisão, o juiz não está criando nova lei, mas sim valendo-se da justiça ou

    equidade para sustentar sua decisão.

    1.4.2.1 Os principios e as regras

    Para Dworkin, há uma diferença lógica entre os

    princípios e as regras jurídicas.

    Enquanto as regras são aplicáveis na presença dos

    fatos por elas estipulados, sob pena de serem consideradas inválidass8 - tanto é

    que, diante de um conflito de regras, a solução é encontrada verificando-se qual

    delas é válida e, por conseqüência, qual delas é inválida -, os princípios não

    apresentam conseqüências jurídicas que se aplicam diretamente diante de certas

    condições.

    57 DWORKIN, Ronald. Levundo os direi~os a sério. Sào Paulo : Martins Fontes, 2002, p. 132. '' Idem, p. 39.

  • Eles possuem uma dimensão ou importância que,

    para aplica-los, é preciso considerar o peso relativo de cada princípio59. Não se

    pretende determinar qual dos princípios é válido e qual é inválido.

    Quando ocorre uma colisão de princípios, o juiz deve

    avaliar os princípios conflitantes que incidem sobre o caso concreto, decidindo

    qual deles deve prevalecer. Os princípios que não vierem a ser aplicados nesta

    situa~ão não deixarão de ser validos, nem perderão o seu peso relativo. 60

    Para Willis Santiago Guerra Filho, existem questões

    que (conforme ensina Dworkin), podem ser chamadas de 'hard cases ', as quais

    "são as questões mais tormentosas, aquelas que

    terminam sendo examinadas no exercício da

    jurisdição constitucional, as quais não se resolve

    satisfatoriamente com o emprego apenas de regras

    jurídicas, mas demandam o recurso aos princlpios,

    para que sejam solucionadas em sinfonia com o

    fundamento constitucional da ordem j~rídica".~'

    5'1 DWORKIN, Ronald. Levando os direitos asério . SBo Paulo : Martins Fontes, 2002. p. 42. "" Idem, p. 114. h l GUERRA FILl10, Willis Santiago. Processo Consrirircional e Direitos F11ndamenrais. 2. ed. (rev. e ampl.) São Paulo : Celso Bastos, 2001, p. 53.

  • 1.4.3 Resposta de Hart hs críticas de ~ w o r k i n ~ ~

    Após o falecimento de Hart em 1994, foi incluído para

    publicação em sua obra "O conceito de Direito", um pós-escrito, no qual ele

    responde a alguns dos argumentos de Dworkin, rebatendo-os, ou, simplesmente,

    reconhecendo seus erros e melhorando sua teoria.

    Procura esclarecer que o objetivo da obra foi o de 'tfornecer

    uma teoria sobre o que é o direito", com uma "vertente regida por regrasW,6' O

    que não a torna uma "teoria meramente factual do positivismo ", como dissera

    Dworkin, uma vez que admite outros critérios, como os valores, por exemplo.

    Por essa razão, Hart manifestava preferência pela designação de sua teoria como

    ')ositivismo moderado".64

    Quando Dworkin o critica, alegando que sua teoria aponta

    que a finalidade do direito é justificar a coerção, Hart responde esclarecendo que

    este nunca foi o seu ponto de vista, ou seja,

    "a unica referência que faço a coerção na minha discussão

    das regras secundárias, surge a propósito da ineficiência,

    "' I al msposta encoiilni-se iw P)s escrito da i" cdi(;5 du obra "O cotlcerto de drrrtto ", de 1994, npch o liileciiiicnto dc I liul. "' I 1AR'I'. Herbert. Op cii.. p. 300-301.

  • causadora do desperdício de tempo, de deixar a execução

    das regras a pressão difusa, em vez de deixar as sanções

    organizadoras aplicadas pelos tribunais". E continua,

    alegando que isto é "simplesmente um remédio para a

    inejciência e não uma justijicação ". 65

    Quanto aos casos mais dificeis ou ainda, controvertidos, nos

    Vais 0s "juristas razoáveis e inteligentes" discordam acerca da resposta

    entendida como juridicamente correta, deve-se compreender que o direito é

    "no fundamental, incompleto", não fornecendo qualquer

    resposta para as questões que "não estão juridicamente

    reguladas e, para se obter uma decisão, nesses casos, os

    tribunais devem exercer a função restrita de criação de

    direito", ao qtre Hart designa como "poder

    discricionário". 66

    Esclarece que tal poder não é ilimitado, ao contrário, é

    limitado por "muitos constrangimentos que estreitam sua escolha", e, mesmo

    em situações em que o direito não aponta qualquer resposta como correta, a

    decisão do juiz não será arbitrária, de tal modo que

    "' HART. Herbert. Op. cir., p. 3 1 1. (6 Idem, p. 314.

  • "ele deve sempre ter certas razões gerais para justificar a

    sua decisão e deve agir como um legislador consciente

    agiria, decidindo de acordo com as próprias crenças e

    valores J ' .67

    No que diz respeito aos princípios, Hart reconhece seu erro

    em não inclui-los como parte do sistema jurídico,6* mas esclarece a Dworkin que

    não poderia incluir em sua teoria do direito os princípios jurídicos como parte do

    sistema jurídico, a não ser que renunciasse a idéia da regra de reconhecimento,

    sob pena de sua teoria perder a coerência.

    Quando admite a inclusão dos princípios como parte do

    sistema jurídico, Hart não vê como incoerência o reconhecimento da

    importância desses princípios. Ao contrário, mantém a idéia da regra de

    reconhecimento, uma vez que para serem aplicados, haverá a necessidade de se

    verificar se pertencem ou não ao sistema jurídico, o que irá requerer a aplicação

    dos critérios já definidos e trazidos pela regra de reconhecimento."

    Para Hart, os princípios diferem das regras a partir de uma

    questão de grau, uma vez que são mais gerais do que as regras. Além disso, a

    h7 HART. Herbert. Op. cir.. p. 326. "' Idem p. 32 1-322. " Idem, p. 328.

  • finalidade dos princípios é a de ser "objectos de adesão", contribuindo para a

    justificação das regras.

    Porém, além dessas duas diferenças, Hart indica uma terceira,

    distinta de Dworkin, segundo a qual, tanto os princípios como as regras,

    possuem uma dimensão de Deso, o que poderá ser considerado no conflito entre

    regras, quando também observar-se-á qual delas é a mais importante para

    resolver a questão.70

    1.4.4 Os princípios enquanto mandados de otimizaçfio de

    Robert Alexy

    Para a diferenciação entre princípios e regras, Robert Alexy

    apresenta seu modelo teórico, a partir da idéia central de que os princípios são

    mandados de otimizacão.

    Entende ele ser imprescindível para a teoria dos direitos

    fundamentais, a distinção entre princípios e regras, de tal modo que não

    diferenciá-los significaria a não-existência de uma teoria satisfatória sobre o

    papel e a colisão dos direitos fundamentais. No entender do autor, tal distinção

    '" HART, Herbert. Op. cir., p. 322-323.

  • constitui o marco de uma teoria material normativa dos direitos fundamentais,

    além de representar um de seus pilares.71

    Reconhece ainda, não ser o primeiro a discutir o assunto, mas

    afirma que a doutrina persiste na diferenciação entre norma e princípio, como se

    fossem diferentes institutos. Exatamente por isso, antes mesmo de começar a

    distinguir regras e princípios, esclarece que os dois são normas, uma vez que

    ambos são juizos do dever-ser.

    Alexy aponta o grau de generalidade como o fator mais

    utilizado dentre os critérios existentes para diferenciá-los, de tal modo que os

    princípios seriam normas com um grau de generalidade maior que o das regras.

    Observa Alexy que a distinção não ocorre em relação a quantificação gradual,

    mas sim, em relação à qualificação.72

    É com base nessa diferenciação qualitativa que Alexy define

    OS princípios como "mandados de otimização", ou seja, normas que ordenam

    algo que deva ser realizado na maior medida possível, dentro das possibilidades

    " ALEXY, Roixrt. Teoria de 10s derechosJúndame~uies. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997. p. 81. '' Idem. p. 86.

  • jurídicas e fáticas existentes, as quais são determinadas pelos princípios e regras

    opostos.73

    Já as regras, ao contrário, são normas que podem ou não ser

    cumpridas; assim, se a regra é válida, deve-se respeitar exatamente o que ela

    determina. As regras, portanto, contêm determinações para o que é fática e

    juridicamente

    Tal distinção demonstra-se na solução para as colisões de

    princípios e conflitos de regras.

    Na ocorrência de um conflito de regras, este só poderá ser

    solucionado com a introdução em uma das regras, de uma cláusula de exceção,

    ou, ainda, declarando-se inválida uma delas. Se não for possível a cláusula de

    exceção, então a resolução do conflito será buscada no âmbito da validade da

    regra.75

    No que tange a colisão entre princípios, a solução será obtida

    de forma totalmente distinta, de tal modo que, se dois princípios entram em

    colisão, um deverá ceder em face do outro, o que não significa dizer que um

    " ALEXY, Robert. Teoria de 10s derechosfirndamenlales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 86. 74 Ideni. p. 87. 7s Idem, p. 88.

  • princípio é inválido por ter sido desprezado, mas que, sob certas circunstâncias,

    um dos princípios precede ao outro.16

    Isso ocorre porque os princípios possuem pesos diferentes,

    daí levar-se em consideração a dimensão de peso para a tomada de decisão.

    Alexy explica que entre os princípios se estabelece urna

    ''relução de precedência condicionada", onde se leva em consideração as

    condições do caso concreto, nas quais um dos principios precede ao outro. Isto

    significa dizer que, num determinado caso concreto, e sob aquelas condições,

    um determinado princípio teria um peso maior do que um princípio oposto.77

    Outra distinção entre princípios e regras, que precisa ser

    considerada, diz respeito ao âmbito das razões. Enquanto os princípios são

    razões primeiras, as regras são razões definitivas, a não ser que se tenha

    estabelecido uma exceção. Quando os fatos previstos pelas regras estiverem

    presentes, elas deverão ser cumpridas o que não ocorre com os princípios que,

    para serem aplicados, submeter-se-ão a uma "relação de preferência

    condicionada", para qiie se defina qual princípio será aplicado no caso

    con~reto. '~

    7(' ALEXY, Robert. Teoria de 10s derechosJwldamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997, p. 89. 7 7 Idem. p. 92-93. 78 Idem. p. 102-103.

  • Para Alexy, não existem princípios absolutos, uma vez que,

    se isto ocorresse, o próprio conceito de princípio deveria ser mudado.79 Assim

    demonstra que, se os direitos coletivos fossem considerados princípios

    absolutos, então os direitos fundamentais nunca seriam considerados um limite

    para tais direitos coletivos.

    Ao desenvolver este raciocínio, também pondera que, se os

    direitos fundamentais fossem considerados absolutos, como seria possível

    resolver a colisão entre direitos fundamentais que se contrapõem num

    determinado caso concreto?

    Apesar de Alexy reconhecer que não é possível a existência

    de princípios absolutos, verifica que a dignidade humana traz em si a impressão

    de ser absoluta, por ser tratada, algumas vezes, como regra, o que significa que

    enquanto regra é absoluta, enquanto princípio não. Por outro lado, ainda que se

    considere a dignidade humana como princípio não absoluto, ela traz em si um

    alto grau de segurança em relação a outros princípios, o que equivale dizer que

    nas relações de precedência, normalmente antecede a outros princípios

    opostos. 80

    7'1 Al.I

  • Para que se diferencie as regras e princípios, com base nas

    teorias apresentadas, há que se considerar tal distinção sob três enfoques: quanto

    ao conteúdo, ao grau de abstração e a resolução de conflitos entre eles.

    1.4.5 Quanto ao conteudo

    O conteúdo de informações apresentadas pelos princípios,

    requer sempre uma interpretação extensiva, ou um "mandado de otimização" -

    como diz Robert Alexy -; ou seja, deve ser aplicado da melhor forma possível,

    de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas, para que a limitação de sua

    abrangência seja determinada pelas características e pelos princípios opostos no

    caso concreto.

    As regras, por seu lado, possuem um conteudo de informação

    menor, de tal modo que elas serão tanto melhores se tipificarem adequadamente

    a situação que pretendem regulamentar, ou, no dizer de J.J.Gomes Canotilho:

    "as regras c..) são normas que, verificados determinados pressupostos, exigem, proíbem ou permitem algo em termos

    defnitivos, sem qualquer e~cepção".~'

    X I CANOTILHO. J.J. Gomes. Direito constitucional e teoria da consr~tu~ção. 3. ed. Coimbra : Almedina, 1999. p. 1.177.

  • Justamente por essa diferença é que os princípios não

    detalham as condições necessárias para sua aplicação, indicando apenas uma

    direção e não especificando as situações que só poderão ser resolvidas com a

    utilização daquele princípio. Nesse sentido, é preciso ocorrer a intermediação de

    outros principios ou regras para a adequada aplicação dos

    1.4.6 Quanto ao grau de abstraçao

    Os princípios possuem um maior grau de abstração em

    relação as regras, eis que eles não trazem nenhuma situação fática em seu

    conteúdo -, como acontece com as regras que tendem a tipificar exatamente a

    situação fática a qual ela deverá ser aplicada.

    Os princípios são plenamente eficazes com seu conteúdo

    vago e abstrato. No entanto, as regras precisam se afastar ao máximo da

    abstração e do conteúdo vago para que possam produzir seus efeitos.

    No dizer de Willis Santiago Guerra Filho,

    " A esta idtia Hart deu o nome de conteúdo não-conclusivo dos princípios em seu pós-escrito, da obra "O Conceito de Direito ".

  • "as regras trazem a descrição de estados-de-coisas formados

    por um fato ou um certo número deles, enquanto nos

    princl;tiios, há uma referência direta a valores. Daí se dizer

    que as regras se fundamentam nos princrpios, os quais não

    fundamentariam diretamente nenhuma ação, dependendo

    para isso da intermediação de uma regra concretizadora"."

    Deve-se ressaltar que, para Alexy, a diferença não é

    quantitativa, mas qualitativa, a medida que seu conteúdo de mandado de

    otimização é que realmente diferencia os princípios das regras, e não o grau de

    a b ~ t r a ~ ã o . ~ ~

    1.4.7 Quanto i resolução de conflitos

    Entende Dworkin que as regras são aplicadas na forma do

    "tudo ou nada", de tal modo que se a situação prevista por elas, ocorrer, somente

    aquela regra poderá ser utilizada; entretanto, se houver uma segunda regra,

    também adequada, cabível na mesma situação, uma delas seria válida e a outra,

    inválida.

    83 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Op. cit., p. 45. 84 ALEXY, Robert. Derecho y rmon practica. p. 1 1 e 14.

  • O conflito das regras é chamado de antinomia, pela doutrina,

    e se apresenta como

    "um defeito que o intérprete tenta eliminar", diz Norberto

    ~obbio . '~ Cabe ao intérprete verijcar qual delas é a regra

    válida e qual será considerada inválida. Esclarece ainda,

    Norberto Bobbio que "a eliminação do inconveniente não

    poderá consistir em outra coisa senão na eliminação de uma

    das duas normas".86

    A resoluçiio dessa antinomia jurídica surgida pelo conflito de

    regras, segundo Bobbio, levara em conta critérios cronológicos, hierárquicos e

    de especialidade. É evidente que o ideal seria que num ordenamento não

    ocorressem tais antinomias, para que fosse mantida a coerência do ordenamento.

    NO entanto, diante dessa possibilidade, é necessário o estabelecimento de

    critérios para a resolução desses conflitos.

    Pelo critério cronológico, - entende-se que se duas regras são

    incompatíveis, a prevalência é da posterior em relação a anterior. Pelo critério

    hierárauico, em sendo duas regras incompatíveis, a regra hierarquicamente

    superior prevalece em relação a inferior. E, pelo critério da especialidade, se

    8 5 ROBBIO, Norberto. Op. cil., p. 91. Kli Idem. mesma página

  • duas regras forem incompatíveis, a mais específica prevalece em relação a mais

    genérica.87

    Para Robert Alexy, enquanto os conflitos de regras se

    resolvem no campo da validade, os conflitos existentes entre princípios se

    resolvem na dimensão do peso, uma vez que princípios em conflito são

    igualmente válidos, ainda que venham a ser afastados na aplicação do caso

    concreto.

    Quanto a tensão entre princípios, esta não deve ser

    considerada uma antinomia jurídica, uma vez que o ordenamento pode gerar

    princípios com valores aparentemente em contraposição, para a aplicação no

    caso concreto, sem que com isso se fira a coesão e a harmonia do ordenamento.

    São tais principios opostos que limitam a aplicação dos princípios enquanto

    mandados de otimização.

    No entender de Eros Roberto Grau, o conflito entre princípios

    permite ao aplicador ou intérprete do direito, fazer a opção pela utilização de um

    determinado princípio em detrimento do outro, sem que isso represente uma

    desobediência ao princípio n8o u t i~ i zado .~~

    87 BOBBIO. Norberto. Op. cit.. p. 92-%. " GRAIJ. Eros Roberto. A ordem econômica nu Comriri

  • O problema da tensão dos princípios não pode ser resolvido

    no âmbito da validade, mas a partir de uma relação de precedência, onde as

    condições apresentadas no caso concreto e a dimensão dos princípios opostos,

    trarão a melhor resposta ao aplicador do direito.

    Para a solução de conflitos, o núcleo essencial dos princípios

    afastados, deve ser sempre resguardado, levando-se em conta o que J.J.Gomes

    Canotilho chama de yrincipio da salvaguarda do núcleo

    Enquanto o conflito de regras se resolve no campo da

    antinomia, ocasião em que será questionada a validade das regras em colisão,

    entre os princípios haverá ponderação, pelo julgador, acerca do uso adequado

    de um determinado princípio em detrimento de outro, em determinada situação.

    Essa "ponderação de valores ou de interesses" é a técnica

    que busca estabelecer o peso relativo de cada principio, não podendo resultar

    numa escolha arbitrária, "sob pena de violar o texto constitucionar'.

    É fácil verificar que, em ocorrendo uma hierarquia entre os

    princípios, um determinado princípio tem prevalência sobre outro; no entanto,

    em se tratando de princípios constitucionais que ocupam uma mesma hierarquia

    ") CANOTILHO, J.J.Gomes Op. cit., p. 1.108.

  • normativaw, faz-se necessário o uso do principio da ~roporcionalidade que, para

    Willis Santiago Guerra Filho, diz respeito a

    " busca de uma "solução de compromisso", na qual se

    respeita mais, em determinada situação, um dos princkios

    em conflito, procurando desrespeitar o mínimo ao($

    outro(s), e jamais lhe($ faltando minimamente com o

    respeito, isto é, jèrindo-lhe($ o seu "núcleo essen~ial':~'

    A proteção desse "núcleo essencial" de um direito

    fundamental, pretende "evitar o esvaziamento do direito fundamental mediante

    o estabelecimento de restrições descabidas, desmesuradas ou

    desproporcionais", segundo Gilmar Ferreira ~ e n d e s . ~ *

    Ainda que o princípio da proporcionalidade nao se encontre

    explicitado na Constituição Federal do Brasil, vale lembrar que ele é uma

    " exigência inafastável da própria fórmula politica adotada

    por nosso constituinte - a do 'Estado Democrático de

    Direito' -, pois sem a sua utilização não se concebe como

    bem realizar o mandamento básico dessa fórmula, de

    Ou no dizer de CANOTILHO. J.J. Gomes. : "possuem igual dignidade", in op. cit., p. 1.109. '1 I GUERRA FILHO. Willis Santiago. Op. cit., p. 61. "' MENDES, Gilmar Femira. Direitos funcimenlais e controle de constitircionalidade: esrzdos de direito cr)nstitircional. p. 39.

  • respeito simultâneo de interesses individuais, coletivos e

    públicos". 93

    Ou ainda, como nos ensina Luiz Antonio Rizzatto Nunes,

    esse principio da proporcionalidade "é uma imposição natural de qualquer

    sistema constitucional de garantias f~ndamentais".~'

    Encontra-se no parágrafo 2", do art. 5 O , da Constituição

    Federal, a prescrição acerca dessa possibilidade legal de utilização do principio

    da proporcionalidade, a saber:

    "Os direitos e garantias expressos nessa Constituição não

    excluem outros decorrentes do regime e dos princbios por

    ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a

    República Federativa do Brasil seja parte".

    Estando intimamente ligado ao princípio da igualdade, o

    princípio da proporcionalidade permite o exame atento do peso dos princípios

    colidentes. Willis Santiago Guerra Filho afirma que tal princípio ocupa o posto

    mais elevado na escala principiológica, por se apresentar como o mais abstrato

    93 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Op. cit., p. 61. E no mesmo sentido, BERGMANN, Hurnberto. A distinção entre princbios e regras e a redejnição do dever ab proporcionalidade. p. 152. ')-I NUNES, Luiz Antonio Riuato. O principio constitlrcional ab dignidade da pessoa humana: doutrina e jirrisprirdência. Sào Paulo : Editora Saraiva, 2002. p. 41.

  • dos princípios. Tal abstração permitirá que este princípio venha a ser utilizado

    nos conflitos entre princípios constitucionais, bem como nos conflitos entre

    normas pertencentes ao ordenamento infraconstitucional.

    No entendimento de Rizzatto Nunes, o princípio da

    proporcionalidade deriva do princípio da dignidade humana, uma vez que, sendo

    a dignidade da pessoa humana

    "o valor supremo a ser respeitado, é a ela que a

    proporcionalidade deve estar conectada. É nela que a

    proporcionalidade nasce ". 95

    Desse modo, a dignidade humana dará a diretriz para a

    aplicação do princípio da proporcionalidade, que se apresentará como

    instrumental para a busca da solução.

    1.5 Princípios constitucionais

    A Constituição Federal é a "norma fundamental" do ordenamento,

    mantendo a integração de todo sistema normativo e indicando o caminho

    " NUNES. Luiz Antonio Rizzato. O princípio constitucional da dignidade da pessoa humana: doutrina e juri.sprudéncia. Sào Paulo : Editora Saraiva, 2002. p. 42 e 55.

  • escolhido pelo legislador constituinte para esclarecer qual é o espírito norteador

    da norma fundamental.

    Assim ensina Norberto Bobbio:

    "é a norma fundamental que dá unidade a todas as outras normas,

    isto é, faz das normas espalhadas e de várias proveniências um

    conjunto unitário que pode ser chamado de ordenamento "."

    E ainda prossegue afirmando que

    "a norma fundamental é o critério supremo que permite

    estabelecer se uma norma pertence ou não ao ordenamento; em

    outras palavras, é o fundamento de validade de todas as normas do

    sistema". 97

    Na condição de 'norma fundamental', nossa Constituição traz em

    seu conteúdo, regras e princípios que se relacionam entre si e, segundo Geraldo

    Ataliba,

    'V" ROHBIO. Norberto. Op. ccit., p. 49. '>7 Idem, p. 62.

  • "mesmo no nível constitucional há uma ordem que faz com que as

    regras tenham sua interpretação e eficácia condicionada pelos

    princbios. Estes se harmonizam em função da hierarquia entre eles

    estabelecida, de modo a assegurar plena coerência interna ao

    sistema".98

    O funcionamento desse sistema constitucional garante que certos

    princípios sirvam como ligações, o que faz com que as regras constitucionais e

    infraconstitucionais sejam mantidas num bloco sistemático.

    Estes princípios constitucionais, no dizer de Celso Ribeiro Bastos

    possuem dupla função.

    A primeira delas é a de conceder unidade ao sistema constitucional,

    de modo que, se não fossem os princípios constitucionais,

    "a Constituição se pareceria mais com um aglomerado de normas

    que só teriam em comum o fato de estarem juntas no mesmo

    diploma jurídico, do que com um todo sistemático e congruente.

    Desta forma, por mais que certas normas constitucionais

    ,JX ATALIBA, Geraldo. Repiblica e consliluição. Sào Paulo : Revista dos Tribunais, 1985, p. 6.

  • demonstrem estar em contradição, esta aparente contradição deve

    ser minimizada pela força catalisadora dos princípios". 99

    Ainda, no dizer do mesmo mestre, a segunda função é a de

    "servir como critério de interpretação das normas constitucionais,

    seja ao legislador ordinário, no momento de criação de normas

    infraconstitucionais, seja aos juizes, no momento de aplicação do

    direito, seja aos próprios cidadãos, no momento da realização de

    9 9 100 seus direitos .

    No entender de José Afonso da Silva, os princípios constitucionais

    apresentam-se sob a forma de duas categorias distintas: os ''princkios politico-

    constitucionais" e os '3rincljpios jurídico-constitucionais".

    Os princípios político-constitucionais são as decisões políticas

    fundamentais que trazem a expressão das escolhas políticas de uma determinada

    Constituição; são os '>princípios constitucionais fundamentais", segundo o

    citado autor. Desse modo, os artigos 1" ao 4" da Constituição Federal explicitam

    esse sentido.

    99 BASTOS. Celso Ribeiro. Cirrso de direitoconstiticcional. 14. ed. Sào Paulo : Saraiva 1992, p. 154. I I X I Idem. mesma pagina.

  • Por outro lado, os princípios jurídico-constitucionais são os

    princípios informadores do ordenamento, que se desdobram em outras normas,

    como se pode constatar no caso "do princrjpio da supremacia constitucional, da

    9 , 101 isonomia, da autonomia individual, entre outros .

    Segundo Jorge Miranda, classificam-se os princípios

    constitucionais em b>rincrjpios constitucionais substantivos" e "princrIpios

    9 , 102 constitucionais adjetivos .

    Enquanto os princípios constitucionais substantivos são válidos em

    si mesmos, refletindo os valores básicos da Constituição, os princípios

    constitucionais adjetivos ou instrumentais são aqueles de "alcance técnico",

    garantindo a "racionalidude e a operacionalidade do sistema".

    O interesse maior repousará sobre os princípios político-

    constitucionais, considerados "normas/princrjpios ') ou princípios fundamentais,

    de José Afonso da Silva, ou ainda, já com outra denominação, sobre os

    princípios constitucionais substantivos, de Jorge Miranda.

    No entanto, a proposta de Canotilho apresenta o conteúdo da Carta

    Constitucional dividido do seguinte modo:

    I"' SILVA. Jod Afonso da Cirrso de direito cons~i~ucionalposi~ivo. 18 ed. SBo Paulo : Malheiros, 2000, p. 85-86. I"' MIRANDA, Jorge. Op. cif., p. 202.

  • A. principios fkdamentais estruturantes: são aqueles que

    alcançariam o maior grau de abstração, como o caso do

    "princ@io do estado de direito" e "princ@io democrático". A

    estes, Canotilho acrescenta o "princlpio republicano";

    B. princípios fundamentais gerais, com um grau de abstração

    menor que os anteriores: trata-se aqui, do art. 1' da Constituição

    Federal de 1988, merecendo destaque o respeito a dignidade da

    pessoa humana;

    C. princípios constitucionais especiais: aqueles de menor grau de

    abstração, servindo para a concretização dos principios

    fundamentais gerais; no caso, os direitos humanos fundamentais

    e o princípio da proporcionalidade;

    D. regras: que não são principios, apenas regras con~titucionais.'~~

    Na reedição do curso sobre as Constituiç6es Brasileiras, feita pelo

    Centro de Estudos EstratégicosMCT, pelo Senado Federal e pela Escola de

    Administração FazendáriaIMF, encontram-se comentários acerca do processo de

    "" CANOTILHO. J.J.Gomes. Op. cit.. p. 1.157- 1.159. Esta classificaçào também C reiterada por GUERRA FILHO, Willis Santiago. in op. c i~ . , p. 48-49.

  • elaboração da Constituição Federal de 1988 e a relevância que foi dada aos

    direitos sociais, e assim diz um dos comentaristas da obra, Caio Tácito:

    "Os direitos sociais do homem não se opõem, antes, completam as

    liberdades tradicionais. Os direitos econômicos e sociais são um prolongamento

    dos direitos e garantias individuais, contemplando a pessoa, além de sua

    qualidade singular, para garantir seus direitos de participação na sociedade, a

    substituição de um conceito de justiça distributiva pela de justiça comutativa,

    que deve levar em conta as desigualdades individuais.

    Assim, dentre os direitos sociais, o direito à Educação está previsto

    nu atual Constituição, que eleva a hierarquia constitucional princlpios e

    normas até então contidas na legislação básica de diretrizes da Educação

    Nacional.

    Em atendimento a tais direitos sociais, a Constituição, mais

    adiante, discrimina o título relativo à Ordem Social, os mecanismos e os meios

    de ação que o Estado tem o dever de oferecer ao indivíduo, à família, ou à

    comunidade, titulares de direitos públicos subjetivos ou de interesses

    legítimos. 9 , 1 0 4

    'O4 COLEÇÃO C