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  • ANA BEATRIZ DOS SANTOS CARVALHO

    LEITURAS E USOS DO LIVRO DIDTICO DE HISTRIA:

    RELAES PROFESSOR-LIVRO DIDTICO NOS ANOS FINAIS DO

    ENSINO FUNDAMENTAL

    UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLNDIA

    FACULDADE DE EDUCAO

    2009

  • ANA BEATRIZ DOS SANTOS CARVALHO

    LEITURAS E USOS DO LIVRO DIDTICO DE HISTRIA:

    RELAES PROFESSOR-LIVRO DIDTICO NOS ANOS FINAIS DO

    ENSINO FUNDAMENTAL

    Dissertao apresentada ao Programa de Mestrado

    em Educao da Universidade Federal de

    Uberlndia, como requisito parcial para a obteno

    do ttulo de Mestre em Educao.

    rea de Concentrao: Saberes e Prticas

    Educativas

    Orientao: Profa. Dra. Selva Guimares Fonseca

    UBERLNDIA

    2009

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    C331L

    Carvalho, Ana Beatriz dos Santos, 1977-

    Leituras e SOS do livro didtico de Histria : relaes professor-livro

    didtico nos anos finais do ensino fundamental / Ana Beatriz dos Santos

    Carvalho. - 2009.

    116 f. : il.

    Orientadora: Selva Guimares Fonseca.

    Dissertao (mestrado) Universidade Federal de Uberlndia, Progra- ma de Ps-Graduao em Educao.

    Inclui bibliografia.

    1. Livros didticos - Histria - Teses. 2. Histria - Estudo e ensino -

    Teses. I. Fonseca, Selva Guimares. II. Universidade Federal de Uberln-

    dia. Programa de Ps-Graduao em Educao. III. Ttulo.

    CDU: 371.671.1

    Elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UFU / Setor de Catalogao e Classificao

  • __________________________________________

    Prof Dr Selva Guimares Fonseca

    Orientadora

    ___________________________________________

    Prof Dr Silma do Carmo Nunes

    ___________________________________________

    Prof Dr Iara Vieira Guimares

  • Agradecimentos

    Aos meus pais Geraldo e Bia, pelo exemplo de luta e dedicao, exercitando um amor incondicional

    todos os dias, independente de qualquer adversidade;

    Ao William, pelo carinho, pacincia e incentivo, sem medidas, para a realizao do que parecia um

    sonho;

    Ao Joo Pedro, que foi gerado durante esta jornada, e mesmo sem compreender, participou ativamente

    desde momento especial.

    Aos amigos e parentes que algumas vezes foram colocados em segundo plano, durante os momentos

    mais conturbados, mas tiveram compreenso e carinho para comigo.

    Amo todos vocs!

  • SUMRIO

    LISTA DE SIGLAS ............................................................................................................................................... 7

    LISTA DE FIGURAS ........................................................................................................................................... 8

    LISTA DE TABELAS ........................................................................................................................................... 9

    RESUMO ............................................................................................................................................................. 10

    ABSTRACT ......................................................................................................................................................... 11

    INTRODUO ................................................................................................................................................... 12

    1. TEMA E PROBLEMAS ................................................................................................................................ 14

    2. JUSTIFICATIVAS ....................................................................................................................................... 16

    3. OBJETIVOS ............................................................................................................................................... 18

    4. METODOLOGIA ........................................................................................................................................ 19

    5. ESTRUTURA DA DISSERTAO ................................................................................................................. 22

    CAPTULO I: HISTRIAS DO LIVRO DIDTICO NO BRASIL .............................................................. 25

    1. BREVE HISTRICO DO LIVRO DIDTICO .................................................................................................... 27

    2. OS LIVROS DIDTICOS DE HISTRIA NAS POLTICAS PBLICAS DO MINISTRIO DA EDUCAO ................ 39

    CAPTULO II DAS CAVERNAS AO TERCEIRO MILNIO: LEITURAS E RELEITURAS .......... 49

    1. PRESSUPOSTOS TERICO-METODOLGICOS ............................................................................................. 51

    2. A ESTRUTURA DA COLEO .................................................................................................................... 58

    3. CRITRIOS DE AVALIAO DO USO DA COLEO ..................................................................................... 62

    CAPTULO III A COLEO NA SALA DE AULA: DIZERES SOBRE OS FAZERES ....................... 76

    1. NARRATIVAS E REFLEXES ...................................................................................................................... 76

    2. FATORES FAVORVEIS UTILIZAO DO LIVRO DIDTICO ...................................................................... 92

    3. PROBLEMAS ENCONTRADOS NA UTILIZAO DO LIVRO DIDTICO ........................................................... 95

    CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................................................ 100

    1. PRXIMOS PASSOS ................................................................................................................................. 105

    BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................................................... 106

    ANEXOS ............................................................................................................................................................ 113

    1. ESTRUTURA CURRICULAR DOS LIVROS DA COLEO ............................................................................ 113

    2. CPIA DA AVALIAO DA COLEO NO GUIA DO PNLD 2008 ............................................................. 115

    3. MODELO DE QUESTIONRIO .................................................................................................................. 118

    4. ROTEIRO DE ENTREVISTAS..................................................................................................................... 120

  • LISTA DE SIGLAS

    ABRELIVROS Associao Brasileira de Editores de Livros

    BOC Bloco Operrio e Campons

    CBC Contedo Bsico Curricular

    CNLD Comisso Nacional do Livro Didtico

    COLTED Comisso Nacional do Livro Tcnico e Didtico

    EJA Educao de Jovens e Adultos

    ENEM Exame Nacional do Ensino Mdio

    EUA Estados Unidos da Amrica

    FNDE Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao

    IDH ndice de Desenvolvimento Humano

    IHGB Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro

    INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio Teixeira

    INL Instituto Nacional do Livro

    MEC Ministrio da Educao

    ONU Organizao das Naes Unidas

    PA Programa de Aprofundamento

    PAIES Programa Alternativo de Ingresso ao Ensino Superior

    PCN Parmetros Curriculares Nacionais

    PEAS Programa de Educao Afetiva Sexual

    PLIDEF Programa do Livro Didtico para o Ensino Fundamental

    PNLD Programa Nacional de Livro Didtico

    PNLEM Programa Nacional do Livro de Ensino Mdio

    PNUD Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento

    SEF Secretaria de Educao Fundamental

    UNESCO United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization

    UNICEF United Nations Children's Fund

    USAID United States Agency for International Development

  • LISTA DE FIGURAS

    FIGURA 1 - ETAPAS DO PROCESSO DE ELABORAO E CONDUO DA PESQUISA .................................................... 22

    FIGURA 2 CAPA DA CARTILHA NOVA ESCOLA PARA APRENDER A LER, ESCREVER E CONTAR DE 1722 .............. 25

    FIGURA 3 NMERO DE COLEES POR BLOCO DE ORGANIZAO DE CONTEDOS: GUIA DO PNLD 2008 ........... 45

    FIGURA 4 - RECORTE SOBRE MODERNIDADES DO BRASIL .................................................................................. 50

    FIGURA 5 TERRA BRASILIS MAPA DO ATLAS MILLER (1511-1519) ................................................................. 61

    FIGURA 6 CATEGORIAS ICONOGRFICAS POR LIVRO ........................................................................................... 65

    FIGURA 7 DENSIDADE IMAGTICA DOS LIVROS E DA COLEO............................................................................ 66

    FIGURA 8 - GNERO DOS PROFESSORES ................................................................................................................. 77

    FIGURA 9 TIPO DA INSTITUIO DE GRADUAO ............................................................................................... 77

    FIGURA 10 - TEMPO DE FORMATURA E EXPERINCIA DE MAGISTRIO .................................................................. 77

    FIGURA 11 QUANTIDADE DE RECURSOS ADICIONAIS UTILIZADOS EM SALA DE AULA .......................................... 80

    FIGURA 12 PS-GRADUAO .............................................................................................................................. 81

    FIGURA 13 AVALIAO DO MANUAL DO PROFESSOR ......................................................................................... 84

    FIGURA 14 CARACTERSTICAS QUE MOTIVAM O USO DO LIVRO EM SALA ............................................................ 85

    FIGURA 15 FUNES DAS IMAGENS NO LIVRO DIDTICO ..................................................................................... 85

    FIGURA 16 ADEQUAO DA LINGUAGEM UTILIZADA NOS LIVROS ....................................................................... 90

    FIGURA 17 ATUALIZAO CONCEITUAL DO CONTEDO DOS LIVROS ................................................................... 91

    FIGURA 18 AVALIAO DAS ATIVIDADES DOS LIVROS ........................................................................................ 92

    FIGURA 19 AVALIAO DA COLEO NO GUIA DO PNLD 2008 - PARTE I ........................................................ 115

    FIGURA 20 AVALIAO DA COLEO NO GUIA DO PNLD 2008 - PARTE II ...................................................... 116

    FIGURA 21 AVALIAO DA COLEO NO GUIA DO PNLD 2008 - PARTE III ..................................................... 117

    FIGURA 22 QUESTIONRIO DE PESQUISA - PARTES I E II ................................................................................... 118

    FIGURA 23 - QUESTIONRIO DE PESQUISA PARTE III ........................................................................................ 119

    FIGURA 24 - ROTEIRO DAS ENTREVISTAS COM OS PROFESSORES .......................................................................... 120

  • LISTA DE TABELAS

    TABELA 1 QUANTIDADE DE IMAGENS POR CATEGORIA ICONOGRFICA NOS LIVROS DA COLEO ...................... 65

    TABELA 2 - DENSIDADE IMAGTICA DA COLEO .................................................................................................. 66

    TABELA 3 - RECURSOS DIDTICOS ADICIONAIS AO LIVRO DIDTICO UTILIZADOS POR CADA PROFESSOR ............... 80

    TABELA 4 GRADE CURRICULAR DOS LIVROS DE 5A E 6A SRIES .......................................................................... 113

    TABELA 5 GRADE CURRICULAR DOS LIVROS DE 7A E 8A SRIES .......................................................................... 114

  • RESUMO

    Trata-se de uma investigao que tem como objeto de estudo as relaes entre livro didtico e

    professores de Histria. A coleo selecionada como foco da pesquisa foi: Histria: das

    Cavernas ao Terceiro Milnio, editado pela Editora Moderna, destinada aos ltimos anos do

    Ensino Fundamental. O objetivo geral foi analisar as relaes entre os professores e os livros

    didticos de Histria nos anos finais (6o

    ao 9o

    anos) do Ensino Fundamental, evidenciando

    leituras e usos que so feitos da referida coleo didtica pelos professores. Os objetivos

    especficos foram assim delimitados: revisar a histria do livro didtico, no Brasil, em

    particular, do livro didtico de Histria; analisar a coleo Histria: Das Cavernas ao

    Terceiro Milnio, aprovada pelo MEC pelo PNLD de 2008, focalizando os pressupostos

    terico-metodolgicos, a estrutura da coleo, a iconografia e os critrios de usabilidade;

    refletir sobre o modo como os professores leem, percebem e utilizam o livro didtico no

    processo de ensino e aprendizagem desenvolvido no cotidiano escolar; e colaborar para a

    produo de um diagnstico crtico sobre os saberes histricos veiculados pelos livros

    didticos de Histria e os modos de sua utilizao na realidade educacional na sociedade

    brasileira contempornea. A metodologia combinou anlise de documentos escritos e

    iconogrficos, questionrios e entrevistas orais com sete professores de Histria, usurios dos

    livros nos anos 2008 e 2009, no contexto da Escola Estadual Segismundo Pereira, na cidade

    de Uberlndia, Minas Gerais, Brasil. A investigao possibilitou-nos evidenciar as vises que

    professores investigados tm desses livros, identificar aspectos positivos e negativos e

    explicitar significados que emergem dessas concepes. Conclumos que um maior

    conhecimento acerca das concepes dos usurios, neste caso, professores de Histria, a

    respeito do livro didtico pode propiciar melhorias desse importante recurso de ensino.

    Possibilitou-nos a identificarmos indicadores que evidenciam diversos modos de ler e usar os

    livros em sala de aula; bem como a necessidade de mudanas que podero ser incorporadas

    nas prticas de ensino de Histria.

  • ABSTRACT

    This study is a research that has as object the relations beetwen textbooks and History

    teachers. The researched selected collection was: Histria: das Cavernas ao Terceiro Milnio,

    published by Editora Moderna, destined to the forthy last year of elementaty school. The

    general objective oh that research was to analyze the relationships between teachers and

    history textbooks in the final years (6th

    to 9th

    years) of elementary school, showing the ways

    and uses that are made of the textbooks by investigated teachers when teaching. The specific

    objectives were well defined: reviewing of the Brazilian history textbook, examining the

    history collection: Histria: das Cavernas ao Terceiro Milnio, adopted by MEC PNLD

    2008, toward the final years of elementary school, focusing on the theoretical and

    methodological assumptions, the structure of the collection, the iconography and criteria

    usability, thinking about how teachers read, understand and use the textbook in the teaching

    and learning developed in the daily school and work for the production of a critical diagnosis

    of the historical knowledge conveyed by textbooks for history and methods of their use in the

    educational reality of the contemporary Brazilian society. The methodology combined

    document analysis, questionnaires and oral interviews with seven history teachers that uses

    the collectoin books in the years 2008 and 2009. The research enabled us to record and

    understand the view that teachers have these books, identifying strengths and weaknesses and

    explaining the meanings of these concepts that emerge. We conclude that greater knowledge

    about the concepts of users, in this case teachers, about the textbook that allows us to progress

    improvements that can provide important resource for education, allows us to identify

    indicators that demonstrate ways to read and use the books in the classroom, and highlights

    the need for changes that may be incorporated into the practice of teaching history.

  • 12

    INTRODUO

    O livro didtico, no Brasil tem, historicamente, assumido diversos significados nas

    vrias realidades escolares. Ele pode ser encarado apenas como manual escolar, manual de

    texto1, como um importante material didtico ou, simplesmente, um livro escolar. Trata-se

    de uma materialidade textual que se caracteriza como um instrumento de uso educacional,

    com objetivos didticos. Consideramos interessante estabelecer essas diferentes

    denominaes, uma vez que, no curso da investigao, evidenciamos diferentes configuraes

    em termos de concepo, recepo e uso do livro didtico.

    A primeira caracterstica do livro didtico, segundo Batista (1999, p. 542), a ser

    destacada a provisoriedade, visto que o livro didtico se desatualiza rapidamente. Sua

    objetividade tamanha que, raramente, revisto ou retomado. Traz ao aluno e ao professor

    dados, informaes e saberes e por este motivo, muitas vezes, no preservado em bibliotecas

    pessoais ou institucionais. Conforme esse autor, o livro didtico tem pouca autonomia em

    relao ao contexto da sala de aula e sucesso de graus, ciclos, bimestres, semestres,

    captulos e unidades. Sendo assim, sua utilizao est intimamente ligada organizao do

    tempo escolar e aos papis desenvolvidos pelo professor e pelo aluno.

    O livro didtico , tambm, um produto desenvolvido para um mercado especfico: o

    escolar. Quem mais vende livro no Brasil so as Editoras de livros didticos. Essa a fatia

    mais significativa do mercado editorial brasileiro. A importncia desse segmento se explica,

    em parte, por causa dos programas do governo federal, que compram e distribuem,

    gratuitamente, livros para alunos de escolas da rede pblica. Vender para esses programas

    um grande negcio para as editoras. Consoante com Joo Arinos, presidente da Abrelivros2

    A margem percentual de lucro obtida com os livros vendidos para o governo bem

    menor do que a do mercado privado. Mas compensa porque a escala maior.

    (ARINOS, 2007, p. 47).

    As tenses procedentes da comercializao do livro didtico, como produto, uma

    mercadoria produzida e comercializada em situao especfica, so decorrentes da funo que

    possui dentro do contexto escolar. De acordo com Michael Apple

    1 BATISTA, Antnio Augusto Gomes. Um objeto varivel e instvel: textos, impressos e livros didticos. In:

    ABREU, Mrcia. Leitura, histria e histria da leitura. So Paulo: Mercado de Letras, 1999. 2 Associao Brasileira de Editores de Livros.

  • 13

    so os livros didticos que estabelecem grande parte das condies materiais para o

    ensino e a aprendizagem nas salas de aula de muitos pases do mundo (APPLE,

    1995, p. 81).

    Nesse sentido, Rosa Corra nos chama a ateno para o fato de

    que, provavelmente, nenhum material escolar sofreu tanto as influncias das leis de

    mercado quando esse, fundamentalmente porque as polticas do livro escolar

    mantiveram conectados interesses estatais e privados (CORRA, 2000, p. 22).

    Ainda nessa direo, Regina Zilberman afirma:

    se todas as caractersticas do livro didtico fazem-no o primo-pobre da famlia dos

    livros, ele o primo-rico no ramo das editoras, pois assegura uma rentabilidade

    segura, no s por contar com o apoio do sistema de ensino, como tambm ter o

    abrigo do Estado, devido s polticas pblicas que garantem sua compra

    (ZILBERMAN, 1998, p. 58).

    Dessa forma, no mercado do livro didtico do Brasil, a escola vista pelas grandes

    editoras como mercado-alvo, ao mesmo tempo em que impe s empresas e aos autores

    especificidades para a produo e circulao do produto. Segundo pesquisas recentes, o livro

    didtico considerado a principal fonte de saberes impressa utilizada por grande parte dos

    professores e alunos. Partindo dessa premissa, Batista assegura que

    o livro didtico desenvolve importante papel no quadro mais amplo da cultura

    brasileira, das prticas de letramento e do campo da produo editorial e

    compreende, consequentemente, diferentes dimenses de nossa cultura (BATISTA,

    1999, p. 534).

    Ressaltando a sua efemeridade, as autoras Bufrem, Schmidt e Garcia destacam que,

    embora sejam considerados como obras de referncia, os livros trazem consigo a condio de

    se desatualizarem rapidamente. Isso transforma o livro didtico em

    um material, ao mesmo tempo, intenso, por sua aplicao em sala de aula, e frgil,

    pois exige uma renovao constante (BUFREM; SCHMIDT; GARCIA, 2006, p.

    124).

    Os livros didticos permanecem no mercado por cerca de quatro a cinco anos por

    edio. Contudo so um instrumento extremamente valorizado como elemento mediador do

    processo de ensino e aprendizagem, pois apresentam um vasto repertrio de contedos,

    conhecimentos escolares, mtodos e atividades de ensino nas disciplinas especficas.

    Dada sua importncia nesse processo, consideramos pertinente voltarmos os holofotes

    para a relao entre o livro didtico e o docente que o utiliza, relao esta que se estabelece

    dentro de um contexto institucional, social, poltico, econmico e cultural.

    Concebemos os livros didticos como importantes referenciais para o trabalho em sala

    de aula, os quais se encontram disposio para a escolha do professor, trazendo-lhes

  • 14

    propostas variadas. Alguns livros apresentam tendncias consideradas tradicionais e outras

    julgadas como mais renovadoras em termos pedaggicos, tericos e polticos. Esse tipo de

    avaliao questionado, porquanto muitos fatores devem ser levados em conta.

    Consideramos que o livro didtico, independente de sua proposta pedaggica,

    dificilmente, ultrapassa as barreiras e o engessamento dos padres aos quais se adaptam

    para chegar ao mercado. Em outras palavras, como qualquer produto cultural destinado ao

    mercado consumidor, atende a determinados padres e exigncias do mercado. Assim, o livro

    didtico atende a um nmero preestabelecido de pginas, a um recorte e uma seleo de

    contedos, a uma determinada quantidade de textos e de atividades propostas, dentre outros

    itens que so includos nas solicitaes e orientaes das editoras aos autores.

    Alm disso, necessrio registrar as Diretrizes e Parmetros Curriculares do

    Ministrio da Educao, que, como referncia, tornam-se praticamente exigncias, uma vez

    que constituem critrios, pr-requisitos para a avaliao e aprovao dos livros pelo PNLD

    (Programa Nacional do Livro Didtico)3. Esse conjunto de critrios de produo e avaliao,

    por sua vez, so alvo de intensas discusses, na medida em que podem ser vistos como

    limites para o trabalho do professor em sala de aula e influenciam as relaes entre o

    contedo e a metodologia apresentada pelos autores e professores. Tambm so

    compreendidos, por muitos, como regras, normas de controle da qualidade estabelecidas pelo

    Estado.

    1. Tema e Problemas

    O objeto desta pesquisa o modo como os livros didticos de Histria adotados nos

    anos finais do Ensino Fundamental, so lidos e utilizados pelo professores de Histria.

    Focalizaremos, um caso especfico, para que possamos nos aproximar e compreender as

    relaes entre os livros didticos e os professores que os utilizam em sala de aula.

    Buscaremos investigar as leituras, as vozes e as experincias dos professores de Histria que

    utilizam a coleo aprovada pelo PNLD 2008 para os quatro ltimos anos do Ensino

    Fundamental (5a a 8

    a sries-cuja nova nomenclatura passou a ser 6

    o ao 9

    o anos), Histria: Das

    Cavernas ao Terceiro Milnio, das autoras Patrcia Ramos Braick e Myriam Becho Mota, na

    Escola Estadual Segismundo Pereira, localizada na cidade de Uberlndia, Minas Gerais,

    Brasil.

    3 Estas Diretrizes so encontradas nos Editais do PNLD de 2008 (BRASIL, MEC, 2007).

  • 15

    Este estudo situa-se no campo de ampliao das pesquisas em ensino de Histria.

    Segundo Fonseca, a partir dos anos 1980, o ensino de Histria passou por um amplo

    movimento curricular, em que a perspectiva multicultural foi destacada sem, contudo, fazer

    apologia ao relativismo absoluto. Em vrios pases, ocorreram movimentos semelhantes, nos

    quais o ensino de Histria foi inserido numa atmosfera permeada de mltiplas possibilidades

    e caminhos, visando ampliao da educao escolar. Em outras palavras, existem, no atual

    contexto educacional brasileiro, diversas propostas de ensino de Histria, porm com um

    ponto comum: o respeito s diferenas, diversidade, tolerncia, e a solidariedade.

    Como fruto das polticas pblicas que emergiram das reformas dos anos 1990, o texto

    dos PCN (Parmetros Curriculares Nacionais) de Histria, elaborado pelo Ministrio da

    Educao, em 1998, orienta os currculos de Histria a construr uma nova concepo de

    cidadania, mediante crticas ao ensino de Histria centrado na representao de nacionalidade

    em que os valores e a cultura branca europeia so predominantes.

    A preocupao com a reviso do ensino de Histria passa a ser recorrente e

    evidenciada nos projetos e programas das redes de ensino pblicas e privada. A poltica de

    produo e distribuio de materiais didticos, sobretudo, livros didticos, historicamente, um

    dos meios utilizados pelo Estado para efetivar polticas pblicas para a educao bsica,

    passou a ser revista e aperfeioada.

    Desde 1929, o governo federal do Brasil investe em programas voltados distribuio

    de materiais didticos aos estudantes da rede pblica de ensino brasileiro. Ao longo de quase

    70 anos, o programa foi se aprimorando, agregou diferentes concepes, nomenclaturas e

    formas de execuo. O PNLD a forma atual do Programa de avaliao e distribuio

    gratuita de livros didticos aos alunos do Ensino Fundamental da rede pblica de ensino,

    incluindo as classes de alfabetizao infantil. O ensino mdio contemplado com o PNLEM

    (Programa Nacional do Livro Didtico para o Ensino Mdio), implantado em 2004, e que

    prev a avaliao e distribuio de livros didticos para os alunos do ensino mdio da rede

    pblica de todo o pas.

    No programa de distribuio gratuita de livros didticos para todos os alunos do

    Ensino Fundamental e para o Ensino Mdio da rede pblica de ensino, destaca-se o padro de

    qualidade do material que chega ao aluno.

    Alguns questionamentos so recorrentes entre os profissionais de ensino de Histria e

    nos parecem pertinentes nesta investigao: at que ponto h compromisso, por parte da

    indstria editorial com a qualidade terica do material que oferecido s escolas? Como se d

  • 16

    a participao do professor nas escolhas destes livros? Por fim, a principal pergunta que

    levantamos neste trabalho: como o professor de Histria se relaciona com o livro didtico nas

    salas de aula do Ensino Fundamental? Quais so as leituras e usos que professores de Histria

    fazem dos livros didticos?

    As diretrizes e os textos curriculares, assim como os livros didticos, veiculam, de

    forma ora incisiva, ora sutil ideologias, propostas culturais e pedaggicas na realidade escolar.

    Em decorrncia das opes polticas feitas pelos especialistas educacionais, contratados como

    avaliadores pelo Estado, os livros didticos so pr-selecionados e indicados aos professores

    para a escolha e uso.

    Diante disso, acreditamos ser necessrio estar atentos ao formato e ao contedo dos

    livros que chegam s escolas. Que conhecimentos histricos escolares esto sendo, ou podem

    ser, construdos a partir desse material? Como um grupo de professores do Ensino

    Fundamental pensa, problematiza o uso do livro de didtico de Histria? Que possibilidades

    de reflexo pedaggica as leituras e usos do livro proporcionam aos professores? Essas e

    outras perguntas fazem parte de uma histria. Nessa perspectiva, alguns aspectos dessa

    histria sero registrados na pesquisa. Como o professor l, interpreta, apropria-se e se re-

    apropria de textos e imagens no universo de sala de aula? Como o professor de Histria utiliza

    os livros didticos? Suas vozes sero registradas e interpretadas nesta dissertao. Esta a

    nossa meta.

    2. Justificativas

    Responder a essas perguntas importante porque, muitas vezes, os professores, no

    cotidiano escolar, no explicitam o papel que o livro didtico assume dentro do processo de

    ensino e aprendizagem. Os impactos so diversos. H descompassos, ou seja, o livro didtico

    valorizado por alguns; desperdiado e desvalorizado por outros. Lembramos Circe

    Bittencourt ao afirmar que o livro didtico o material de apoio bsico a professores, pais e

    estudantes4. Ainda a esse respeito, concordamos com Dcio Gatti, ao afirmar que:

    [...] os livros didticos so, incontestavelmente, instrumentos privilegiados no

    cenrio educacional brasileiro e internacional, pois so eles que, verdadeiramente,

    estabelecem grande parte das condies materiais para o ensino e aprendizagem nas

    salas de aula de muitos pases atravs do mundo (GATTI, 2004, p. 27).

    4 BITTENCOURT, Circe M. Livros didticos entre textos e imagens. In: O saber histrico na sala de aula. So

    Paulo: Contexto, 1998, p.19.

  • 17

    Concordando com os autores, partimos do pressuposto de que o livro didtico constitui

    um relevante instrumento, suporte, fonte de saberes no cotidiano escolar, pois veicula

    contedos, tcnicas, metodologias, exerccios, questionrios, sugestes de trabalhos, enfim,

    dezenas de elementos que so mobilizados com o objetivo de que o aluno consiga apreender

    ou at mesmo fixar os contedos escolares. Ampliando o papel do livro, percebemos que

    mais do que um simples transmissor de contedos e metodologias, e, sim, um veculo que

    porta em si todo um sistema de valores, ideias, saberes. Logo, construtor de imagens e

    interpretaes sobre o mundo.

    Entendemos os processos de leitura, interpretao, apropriao e re-apropriao no

    universo de sala de aula como uns dentre outros possveis. Nosso referencial terico leva-nos

    a buscar compreender a historicidade do livro didtico. Como toda fonte, documento e

    materialidade possuem uma histria, portanto o livro didtico deve ser sempre situado e

    problematizado no contexto social em que foi produzido e tambm no contexto em que lido

    e re-apropriado.

    Para compreender o nosso objeto de trabalho5 e estudo, preciso que nossas bases

    tericas e nossos objetivos estejam claros. Caso contrrio, podemos nos deparar com uma

    situao de aprisionamento, em que pesquisador e professor se veem completamente presos

    ao que o livro veicula, sem que sejam feitos os exerccios do questionamento e reflexo que o

    objeto exige.

    lugar comum entre os historiadores a necessidade de olhar criticamente as fontes

    utilizadas. No entanto, quando a fonte se trata do livro didtico, esse olhar deve ser ainda

    mais aguado. Devemos tomar muitos cuidados, pois essa fonte grande aliada do professor e

    do pesquisador e pode contribuir para uma renovao metodolgica, necessria para as

    pesquisas em Cincias Humanas e, mais especificamente, no ensino de Histria.

    Os livros didticos vm percorrendo longa trajetria na histria da educao brasileira,

    confundindo-se com ela prpria. Tm sido fonte de investimento e preocupao dos

    formuladores e gestores das polticas pblicas, alm de suscitar debates dentro e fora das

    instituies educacionais sobre o seu papel na constituio e na construo de identidades, na

    difuso e no acesso aos saberes escolares bsicos da educao.

    5 O nosso objeto de estudo tambm objeto de trabalho, pois atuo como docente de Histria, nas sries finais do

    Ensino Fundamental e no Ensino Mdio na rede pblica estadual e tambm na rede particular, da cidade de

    Uberlndia MG, desde 2006. Fao uso da coleo Histria: Das Cavernas ao Terceiro Milnio, objeto de investigao deste trabalho. Sendo assim, compartilho de algumas dvidas e inquietaes com meus colegas

    professores que trabalham na escola investigada, na qual tambm atuo.

  • 18

    Os contedos dos livros didticos de Histria tm sido objeto de anlise e

    reivindicaes de vrios grupos que se sentem incomodados ou mesmo no representados, o

    que refora a tese de preconceitos, esteretipos e discriminao no processo de produo e

    usos do livro didtico. A partir dos anos 1980, essa agenda de reivindicaes tem sido cada

    vez mais presente e objeto de demandas e disputas do mercado editorial e especialistas.

    Na nossa pesquisa, optamos por focalizar as percepes dos professores em relao ao

    livro didtico; e capturar os saberes, os modos de leituras e utilizao no cotidiano da sala de

    aula. Pretendemos compreender como o texto da coleo didtica Histria: das cavernas ao

    terceiro milnio est sendo lido e utilizado pelos profissionais de ensino de Histria, a

    recepo dos docentes em relao aos contedos e fontes oferecidos pela coleo investigada.

    Com base nos questionamentos levantados at ento, tencionamos traar, nesta

    pesquisa, um possvel caminho para a elucidao de algumas questes que nos surgem

    quando lemos, utilizamos e pensamos sobre os usos do livro didtico de Histria.

    3. Objetivos

    Esta pesquisa tem como objetivo geral analisar as relaes entre os professores e os

    livros didticos de Histria nos anos finais (6o

    ao 9o

    anos) do Ensino Fundamental,

    evidenciando leituras e usos que so feitos de uma coleo didtica pelos professores

    investigados. Como objetivos especficos, delimitamos:

    1. Revisar a histria do livro didtico, no Brasil, em particular, do livro didtico de

    Histria.

    2. Analisar a coleo Histria: Das Cavernas ao Terceiro Milnio, aprovada pelo

    MEC (Ministrio da Educao) no PNLD de 2008, voltada para os anos finais do

    Ensino Fundamental, ou seja, 6o ao 9

    o anos, focalizando os pressupostos terico-

    metodolgicos, a estrutura da coleo, a iconografia e os critrios de usabilidade.

    3. Refletir sobre o modo como os professores leem, percebem e utilizam o livro

    didtico no processo de ensino e aprendizagem desenvolvido no cotidiano escolar.

    4. Colaborar para a produo de um diagnstico crtico sobre os saberes histricos

    veiculados pelos livros didticos de Histria e os modos de sua utilizao na

    realidade educacional da sociedade brasileira contempornea.

  • 19

    4. Metodologia

    Neste trabalho, inspiramos-nos na abordagem qualitativa de pesquisa educacional.

    Aplicamos questionrios e realizamos entrevistas orais com professores, complementadas por

    anlise de documentos, tais como: Diretrizes Curriculares Nacionais para Educao Bsica6,

    Documentos do PNLD7, Parmetros Curriculares Nacionais de Histria

    8 e os livros didticos

    de Histria da Coleo Histria: Das Cavernas ao Terceiro Milnio9. (MOTA e BRAICK,

    2008)

    O questionrio foi composto por trs partes:

    Parte I Dados Scio-Biogrficos e Formao Profissional: delineia o perfil

    profissional do professor em termos de formao acadmica (inicial e continuada),

    dados da escola onde trabalha e a relao do professor com o mercado de trabalho.

    Parte II Critrios de seleo do livro didtico: levanta perguntas sobre os

    critrios que o professor utiliza ao escolher o livro didtico de Histria.

    Parte III Uso e metodologias: busca questes que avaliem critrios tais como:

    ilustraes, adequao da linguagem, atualizao conceitual, organizao e

    coerncia dos contedos, abordagem temtica etc.

    As entrevistas orais so importantes nesta pesquisa porque, com base nelas, buscamos

    compreender a repercusso, em sala de aula, dos livros didticos e todo o contedo veiculado

    por ele. A realizao das entrevistas se deu de acordo com os princpios da histria oral

    temtica.

    As entrevistas foram conduzidas informalmente, porm, guiadas por um roteiro que

    estabelece questes exploratrias e motivacionais com a finalidade de extrair do professor

    informaes relevantes para as anlises. As transcries das entrevistas foram submetidas a

    um processo de anlise textual, estabelecendo-se as seguintes categorias:

    critrios de seleo e usos do livro didtico;

    fatores favorveis utilizao do livro didtico; e

    6 BRASIL, MEC/CNE. Diretrizes Curriculares Nacionais para Educao Bsica. Braslia: MEC, 2001.

    7 BRASIL, MEC. Guia de livros didticos PNLD 2008: Histria. Secretaria de Educao Bsica. Braslia:

    Estao Grfica, 2007. Disponvel em 2007. http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/2008/pnld08_historia.pdf

    (acesso em 03 de Julho de 2009). 8 _____. Parmetros Curriculares Nacionais. Braslia: MEC, 1999.

    9 MOTA, Myriam Becho; Patrcia Ramos BRAICK. Histria: das Cavernas ao Terceiro Milnio. 2

    a Ed. 4 vols.

    So Paulo: Moderna, 1999.

  • 20

    problemas encontrados na utilizao do livro didtico.

    Todos os dados foram tabulados para anlise, e, na busca de identificao das

    concepes, foram consideradas as informaes registradas e dados os scio-biogrficos dos

    professores.

    A escola investigada a Escola Estadual Segismundo Pereira, situada Avenida

    Ortzio Borges, no 1284, Bairro Santa Mnica, Uberlndia, Minas Gerais, Brasil. Esta escola

    foi escolhida por possuir contingente significativo de alunos e turmas. No ano de 2009, foram

    matriculados, aproxidamente, 1723 alunos10

    , sendo:

    747 no turno da manh, cursando o Ensino Mdio;

    623 no turno da tarde, cursando os anos finais do Ensino Fundamental;

    353 no turno da noite, cursando Ensino Mdio e EJA (Educao de Jovens e

    Adultos).

    O turno investigado foi o vespertino, no qual os 623 alunos se dividem em quatro

    turmas de 6o

    e 7o anos e cinco turmas de 8

    o e 9

    o anos dos anos finais do Ensino Fundamental,

    cada turma com uma mdia de 30 alunos11

    .

    Outro critrio de escolha foi o papel de destaque entre as escolas estaduais da cidade

    de Uberlndia, pois oferece oficinas, cursos e capacitaes comunidade discente. Entres

    estes programas, destacamos os seguintes:

    1. PA (Programa de Aprofundamento), que consiste em aulas complementares, extra-

    turno, para os alunos de Ensino Mdio, cujo objetivo reforar o contedo

    cobrado no vestibular e no PAIES12

    ;

    2. PEAS (Programa de Educao Afetiva Sexual), que realiza oficinas com grupos de

    alunos dos anos finais do Ensino Fundamental, nas quais so discutidas questes

    sobre comportamento, amizade e sexualidade;

    3. Cursos de capacitao tcnica em informtica, cuja proposta preparar o pblico

    jovem para o mercado de trabalho, na rea de manuteno de computadores.

    10 Este nmero se refere ao nmero de alunos matriculados at fevereiro de 2009. Como matriculados,

    consideram-se os alunos veteranos, ingressantes no incio do ano e transferncias ao longo do ano. 11

    Estes dados foram fornecidos pela direo e na secretaria da Escola Estadual Segismundo Pereira, de acordo

    com o Censo Escolar 2009.

    12 O PAIES (Programa Alternativo de Ingresso ao Ensino Superior) um processo seletivo de ingresso na UFU,

    realizado em trs etapas, ao final de cada ano letivo do Ensino Mdio. Em cada etapa, so avaliados os

    aprendizados dos contedos programticos da 1a, 2

    a e 3

    a sries do Ensino Mdio pblico, respectivamente. Este

    programa foi suspenso a partir do ano letivo de 2007, sendo o ltimo Subprograma 2007/2010 referente aos anos

    letivos de 2007 (1o ano), 2008 (2

    o ano) e 2009 (3

    o ano).

  • 21

    Os resultados do ENEM (Exame Nacional do Ensino Mdio) e dos ltimos

    vestibulares tm sido satisfatrios, pois, segundo a diretora Nilva Lamounier, 47 alunos do

    Ensino Mdio ingressaram no Ensino Superior no ano de 2009, o que considera um bom

    resultado.

    A escola conta com um quadro diversificado de professores de Histria, tanto em

    termos de gnero, idade quanto em tempo de atuao em sala de aula. Nos anos finais do

    Ensino Fundamental, lecionam quatro professores efetivos de Histria. Porm, no perodo de

    investigao, trs professores foram contratados, temporariamente, como substitutos,

    somando sete professores entrevistados13

    .

    A coleo de Histria escolhida pelos professores e em uso na escola, a partir de 2008,

    Histria: Das cavernas ao terceiro milnio, das autoras Myrian Mota e Patrcia Braick. Esta

    coleo foi escolhida para anlise neste trabalho. Apresenta uma proposta integrada de

    contedos de Histria Geral, Amrica e do Brasil. Segundo a avaliao do PNLD/ 2008, a

    obra proporciona a

    leitura de textos escritos em diferentes linguagens (filmes, fotografias de pinturas,

    mapas, objetos arquitetnicos, etc.) [...] e devido a isso, percebe-se, na obra, a

    inteno de trabalhar o conhecimento histrico a partir de fontes variadas. (BRASIL,

    MEC, 2007, 63)

    Nossa escolha por essa coleo diante da diversidade de opes presentes nas

    escolas de Uberlndia se deu em funo da representatividade e o espao que ela ocupa no

    contexto do ensino de Histria nas escolas pblicas e privadas da cidade com as quais

    mantenho contato. Trs das quatro escolas em que lecionei, adotam-na, o que chamou

    ateno para o quanto tem sido utilizada. Alm disso, investigar essa escola, na qual atuava

    em 2008, constitua uma oportunidade de produzir uma reflexo sobre a minha prpria prtica

    pedaggica.

    A opo por registrar as vozes, tendo como referncia os aportes da histria oral,

    justifica-se por algumas razes. De acordo com Jos Carlos Meihy, a Histria oral exige

    flexibilidade por parte do pesquisador (MEIHY, 2002, p. 132). O carter dialgico da Histria

    oral demanda do pesquisador disponibilidade para lidar com a diversidade. Nesse sentido,

    imprescindvel disposio para ouvir, interesse e respeito pelos pontos de vista daqueles que

    se propem a partilhar suas experincias com o outro. As etapas do processo de elaborao da

    13 Para preservar a identidade dos colaboradores, utilizamos pseudnimos para a identificao dos professores e

    professoras que foram entrevistados durante a realizao da pesquisa. So colaboradores da investigao.

  • 22

    presente pesquisa podem ser ilustradas pela figura a seguir:

    1. Pesquisa bibliogrfica

    3. Histrico do Livro Didtico de Histria

    2. Parmetros da Pesquisa

    4. Anlise da ColeoDas Cavernas ao...

    IconografiaPressupostos Usabilidade Estrutura

    5. Aplicao de Questionrios

    6. Realizao de Entrevistas

    Professores de Histria de 6o ao 9o ano da E. E. Segismundo Pereira

    7. Consolidao de Resultados

    Figura 1 - Etapas do processo de elaborao e conduo da pesquisa

    Pretendemos navegar por caminhos que permeiam os currculos prescritos via livros

    didticos, e as relaes com a prtica pedaggica componentes da cultura escolar brasileira.

    Focamos nossos olhares para o principal recurso ora disponvel na realidade escolar - o livro

    didtico e os sujeitos leitores-professores de Histria.

    5. Estrutura da Dissertao

    No primeiro captulo, buscamos fazer um registro da histria do livro didtico e, mais

    especificamente, do livro didtico de Histria. Nesse momento, a nossa inteno foi

    compreender os caminhos percorridos pelo livro didtico no Brasil; as diretrizes

    governamentais; a indstria editorial, demonstrando como este material se transformou, cada

    vez mais, em um produto construdo por vrias mos, por meio de critrios que no so

    apenas dos autores. O livro didtico, ento, tornou-se elemento chave da poltica educacional

    brasileira, considerado, pelo Estado, como um material pedaggico essencial para a educao

    escolar. Assim, Ministrios, Secretarias, Comisses e a indstria editorial, tm se tornado,

    gradativamente, personagens principais na definio de padres e modelos para a construo

    de textos e imagens carregadas de mensagens que chegam aos alunos da educao bsica.

    No segundo captulo, apresentado o livro objeto da relao pedggica. Analisamos

    a coleo Histria: das Cavernas ao Terceiro Milnio. Com base nos questionrios e

    entrevistas realizadas com os professores de Histria de 6o ao 9

    o anos do Ensino Fundamental,

    da Escola Estadual Segismundo Pereira em Uberlndia, Minas Gerais, identificamos o grupo

    de profissionais e que utilizam a coleo em questo.

    Esse captulo no tem como objetivo fazer uma mera avaliao da coleo e sim, uma

    leitura do contedo apresentado s sries finais do Ensino Fundamental de acordo com os

  • 23

    pressupostos terico-metodolgicos, a estrutura da coleo e os critrios de usabilidade.

    A anlise foi realizada visando compreender as escolhas e usos feitos pelos

    professores, levando em considerao o mundo social da escola, suas caractersticas e ritmos.

    Jean-Claude Forquin alerta-nos que, ao se buscar compreender a cultura de uma escola, por

    meio das escolhas feitas pelos professores,

    procura-se identificar os saberes, os pressupostos, os referenciais, os valores de suas

    identidades social e profissional que, muitas vezes, podem ser apresentados de

    forma contraditria. (FORQUIN, 1993, p. 158)

    A escola no um local apenas de aprendizagem de saberes cognitivos, mas de

    incorporao de comportamentos e hbitos exigidos socialmente que fazem parte da cultura.

    Ainda segundo Forquin

    a escola tambm mundo social, que tem suas caractersticas de vida prprias, seus

    ritmos e seus ritos, seu imaginrio, seus modos prprios de regulao e de

    transgresso, seu regime prprio de produo e de gesto de smbolos. (FORQUIN,

    1993, p. 167)

    Essa cultura da escola no deve ser confundida com o que se entende por cultura

    escolar, que exibe elementos produzidos e direcionados para a escola, como o livro didtico,

    por exemplo.

    No terceiro captulo, sero expostas as vozes dos professores. Como os professores de

    Histria, do Ensino Fundamental, da E. E. Segismundo Pereira, utilizam a coleo Histria:

    das Cavernas ao Terceiro Milnio, imersos num espao social repleto de desigualdades?

    Como lidam com um espao to diferente do sistema escolar democrtico descrito nos textos

    oficiais do MEC? Apresentaremos as vozes explicitas nas respostas dos questionrios e nas

    entrevistas orais. O objetivo dessa etapa analisar as percepes e os usos do material em sala

    de aula, a partir das reflexes e relatos dos professores.

    Sem perder o foco, ressaltamos a perspectiva crtica desta pesquisa, no que diz

    respeito s relaes entre professores e o livro didtico. Partimos da ideia de que o livro

    precisa ser analisado no apenas como uma mercadoria, mas tambm como produto cultural,

    pois o livro didtico vem sendo orientado por sistemas, que obedecem s presses

    econmicas, culturais e ideolgicas que agem sobre os textos e so bem significativas nos

    resultados finais.

    Assim, ao analisar o livro didtico como uma mercadoria cultural, um material que

    produzido, vendido e consumido, tambm se pretende desvelar as relaes construdas com o

    livro em sala de aula, pelos professores, tendo em vista que esses sujeitos esto atuando em

  • 24

    um grupo, com objetivos e perspectivas especficas.

    Dessa forma, ao pesquisar sobre os usos dos professores em relao ao livro didtico,

    necessrio refletir sobre as polticas governamentais e seus impactos na escola. Buscaremos,

    ainda, entender os sentidos atribudos a tais processos efetivados em sala de aula pelos

    professores, sujeitos diretamente envolvidos, desde a definio de critrios de escolha dos

    livros no espao da escola at a forma como o contedo, trazido por esse livro, so

    ministrados ao aluno.

    Algumas consideraes sobre a importncia do papel do professor sero feitas ao

    longo deste trabalho, compartilhando a afirmativa de Garcia e Schmidt de que preciso

    reconhecer que os professores, sujeitos que ensinam, estabelecem relaes com os saberes a

    serem ensinados e, dessa forma, considerar

    o papel importantssimo de mediador que o professor exerce entre essas duas

    instncias da transposio didtica. (BUFREM; SCHMIDT; GARCIA, 2006, p. 87)

    Assim, valorizamos a natureza dessa atividade de mediao. Reconheceremos que o

    professor, ao optar por um determinado livro didtico, exerce importante papel, pois a que se

    inicia a execuo das polticas pblicas do livro, nas complexas atividades educativas em sala

    de aula, nas relaes entre os sujeitos, os saberes aprendidos pelos alunos, os saberes

    ensinados e as prticas: o livro didtico materializa e media essas relaes.

    Defendemos que as relaes entre professor e livro didtico devam ser compreendidas

    a partir da ideia de que as leituras e usos feitos pelo professor revelem e expressem formas de

    se apropriar dos saberes trazidos pelo livro, articulando-os e atribuindo-lhes outros

    significados, num processo complexo de transformao e reconstruo dos saberes e prticas.

  • 25

    CAPTULO I: HISTRIAS DO LIVRO DIDTICO NO BRASIL

    O uso do livro didtico como fonte e recurso de ensino e aprendizagem no uma

    prtica nova. Mesmo diante de novas tecnologias miditicas, no Brasil, o livro didtico

    mantm sua posio preponderante no processo educativo escolar. Um dos mais antigos livros

    didticos escritos em portugus e, provavelmente, utilizado no Brasil foi a cartilha Nova

    Escola para Aprender a Ler, Escrever e Contar, de Manoel de Andrade de Figueiredo,

    impressa no ano de 1722 em Lisboa14

    , e cuja capa est representada na figura a seguir:

    Figura 2 Capa da cartilha Nova Escola para Aprender a Ler, Escrever e Contar de 1722

    Alm das primeiras letras, continha os preceitos e mandamentos da Igreja Catlica,

    uma vez que o ensino secular e o religioso eram inseparveis.

    Com o advento da Revoluo Industrial, ocorrido no sculo XVIII, houve a

    necessidade de efetivar mudanas nos requisitos educacionais e no processo de capacitao

    dos funcionrios das fbricas, para atender s necessidades da nova dinmica produtiva.

    nesse perodo que os trabalhadores comeam a perceber que esto perdendo

    espao para as mquinas modernas. A escola, ento, para atender nova realidade

    econmica, passa a organizar os saberes escolares em currculos mnimos. A partir

    da, os livros com fins exclusivamente didticos passam a fazer parte do dia-a-dia

    dos estudantes (E. MARTINS, 2006, p. 33).

    14 MARTINS, Elson. Livro didtico: discurso cientfico ou religioso? Dissertao de Mestrado. Palhoa:

    UNISUL, 2006.

  • 26

    Entendemos que o livro didtico no pode ser compreendido isoladamente, fora do

    contexto histrico-cultural, escolar e social. um produto sciocultural, um artefato, e,

    portanto, conformado, segundo a lgica da sociedade e da escola em que esto inseridos. O

    livro didtico tem, assim, tanto uma dimenso econmica, social e cultural quanto poltico-

    ideolgica. A sua dimenso econmica pode ser definida hoje, por exemplo, pelo fato de

    responder por cerca da metade do mercado editorial brasileiro.

    O aspecto poltico-ideolgico do livro didtico define-se por contedos que, em vrias

    disciplinas, veiculam uma viso de mundo, como mostrou Nadai (1988, p. 13). A autora

    salientou como os livros didticos de Histria, nos anos 1970 e 1980, procuraram construir

    uma memria oficial, em que tm vez os grandes homens, o nacionalismo, e os conflitos

    sociais so omitidos ou atenuados. Ainda, segundo a autora,

    porm, um exame, ainda que superficial, dos livros didticos de Histria revela que

    eles contm, no apenas as vises das classes dominantes, mas tambm elementos

    de negao destas vises (NADAI, 1988, p. 14).

    Tambm h conceitos que, simplesmente, no devem ser aplicados com o mesmo

    sentido nas diferentes pocas histricas em que esto inseridos. O conceito de burguesia, por

    exemplo, que no se aplica, nem tem a mesma extenso ou a mesma compreenso, se inserido

    no contexto do sculo XIV ou sculo XV, ou no final do tempo medieval, e quando visto no

    processo histrico do sculo XIX. Esta transformao do conceito praticamente no

    trabalhada no livro didtico segundo BALDISSERA (1994, p. 33).

    O livro didtico, qualquer que seja a viso de mundo, da cincia que difunde, de

    corrente positivista, materialista histrica, ecltica (como frequente), poder ser um apoio ou

    obstculo ao ensino de Histria em funo15

    , no apenas pelo contedo em si, mas dos modos

    de trabalhar esse contedo. Conforme nos ensina Tomaz Tadeu da Silva,

    Quando se pensa em currculo, no se podem separar forma e contedo. O contedo

    est sempre envolvido numa certa forma, e os efeitos desta podem ser to

    importantes quanto os comumente destacados efeitos do contedo.. A forma em que

    vem embalado um determinado contedo estrutura o pensamento e a conscincia

    numa determinada direo, independentemente do contedo que ela transmite (T. T.

    SILVA 1990, p. 64).

    A importncia e a centralidade do uso do livro didtico no Brasil no se restringem aos

    aspectos pedaggicos e s possveis influncias na aprendizagem e no desempenho dos

    alunos. O mercado, a rede de produo e circulao criados em torno do livro didtico fazem

    15 O livro didtico no pode ser considerado nem bode expiatrio culpado pelos problemas de ensino, nem

    panacias recheadas de mitos que rejam o quotidiano da populao escolar.

  • 27

    dele uma importante mercadoria, de alto valor econmico, cujos custos e lucros interferem

    nas possibilidades de acesso ao produto. Assim, o livro didtico no Brasil possui aspectos

    polticos, econmicos e culturais, na medida em que reproduz valores da sociedade, uma

    viso da cincia, da interpretao dos fatos e do prprio processo de transmisso cultural de

    conhecimentos, historicamente, produzidos e acumulados pela sociedade.

    1. Breve histrico do livro didtico

    O sistema educacional e a produo cultural, no Brasil, so, historicamente, marcados

    por decretos, leis, frutos de polticas que produziram muitas mudanas, permanncias e

    descontinuidades, ao longo de toda a histria da Repblica. De acordo com Brbara Freitag, a

    histria do livro didtico

    no passa de uma sequncia de decretos, leis e medidas governamentais que se

    sucedem, a partir de 1930, de forma aparentemente desordenada, e sem a correo

    ou a crtica de outros setores da sociedade (FREITAG, 1993, p. 11).

    As histrias da seriao de leis e decretos somente tm sentido se interpretadas luz

    das mudanas estruturais ocorridas ao longo do sculo XX.

    Somadas as discusses ligadas temtica da educao, consideradas importantes, o

    livro didtico recebeu um grande destaque nas ltimas dcadas, ao se tornar objeto de diversas

    aes polticas e governamentais. O PNLD fruto de uma das mais importantes aes de

    implementao das polticas pblicas do Estado Brasileiro. Esse programa gerou uma srie de

    indagaes para os pesquisadores, autores e para os profissionais que utilizam esse material

    em sala de aula, ou seja, os professores.

    O PNLD o mais antigo dos programas direcionados distribuio de obras didticas

    aos estudantes da rede pblica de ensino brasileira e iniciou-se, com outra denominao, em

    1929. Ao longo de quase 70 anos, o programa se aperfeioou e teve diferentes nomes e

    formas de execuo. O PNLD voltado para o ensino fundamental pblico, incluindo classes

    de alfabetizao infantil. Todos os estados so atendidos, com exceo de So Paulo, que

    executa seu programa de forma descentralizada.

    A partir de 2001, o PNLD ampliou sua rea de atuao e comeou a atender, de forma

    gradativa, os alunos portadores de deficincia visual que esto nas salas de aula do ensino

    regular das escolas pblicas com livros didticos em Braille. Em 2004, a Resoluo no 40 do

    Conselho Deliberativo do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao),

    instituiu, tambm, o atendimento aos estudantes portadores de necessidades especiais

  • 28

    das escolas de educao especial pblicas, comunitrias e filantrpicas, definidas no

    censo escolar, com livros didticos de lngua portuguesa, matemtica, cincias,

    histria, geografia e dicionrios (FNDE, 2004).

    Em 2006, o investimento do PNLD foi de R$ 563,7 milhes. Em 2007, foram gastos

    R$ 661 milhes16

    .

    O PNLEM foi implantado em 2004, pela Resoluo no 38 do FNDE, o programa prev

    a universalizao de livros didticos para os alunos do ensino mdio pblico de todo o pas.

    Inicialmente, atendeu 1,3 milhes de alunos da 1a srie do ensino mdio de 5.392 escolas das

    regies Norte e Nordeste, que receberam, at o incio de 2005, 2,7 milhes de livros das

    disciplinas de Portugus e de Matemtica.

    Em 2005, as demais sries e regies brasileiras tambm foram atendidas com livros de

    Portugus e Matemtica. As escolas beneficiadas esto cadastradas no censo escolar realizado

    anualmente pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Ansio

    Teixeira).

    Em 2006, foram adquiridos 7,2 milhes de volumes, para serem utilizados em 2007,

    por 6,9 milhes de alunos, ficando 300 mil exemplares para compor a reserva tcnica. Foi

    adquirido, ainda, 1,9 milho de livros de Portugus e Matemtica para reposio dos que

    foram distribudos no ano anterior.

    Em 2007, foi feita a escolha dos livros didticos de Histria e de Qumica, que seriam

    usados em 2008. Em 2008, seriam includas as disciplinas de Geografia e Fsica para serem

    utilizadas em 2009, completando, assim, a universalizao do atendimento do ensino mdio.

    Foram investidos R$ 221 milhes17

    .

    O livro didtico tornou-se, de acordo com algumas pesquisas, um dos instrumentos

    mais valorizados na prtica pedaggica no sistema educacional pblico. Neste sentido,

    consideramos conveniente, situar e recuperar dimenses da historicidade do livro didtico,

    nosso objeto de estudo nesta pesquisa.

    Durante a reforma protestante, o mundo ocidental viveu a criao das escolas pblicas;

    que, no sculo XIX, receberam o incremento no seu papel civilizador, por fora das

    influncias da economia poltica, do enciclopedismo e da Revoluo Francesa. No vamos

    16 Os nmeros referentes aos gastos e quantidade de livros distribudos pelo PNLD podem ser encontrados no

    site do FNDE, em http://www.fnde.gov.br/home/index.jsp?arquivo=livro_didatico.html#pnld. Acesso em 23 de

    Julho de 2009. 17

    Os nmeros referentes aos gastos e quantidade de livros distribudos pelo PNLEM podem ser encontrados no

    site do FNDE, em http://www.fnde.gov.br/home/index.jsp?arquivo=livro_didatico.html#pnlem. Acesso em 23

    de Julho de 2009.

  • 29

    nos ater trajetria de desenvolvimento dessa instituio social na Alemanha, na Inglaterra,

    na Frana e nos Estados Unidos da Amrica, pois, no contexto desta pesquisa, pertinente

    detectar seu movimento no interior da sociedade capitalista, em nosso tempo, destacando as

    funes que vm sendo incorporadas ao seu dia-a-dia (ALVES, 2006, p. 23). A crena no

    papel civilizador da escola pblica primria colaborou com a formao e o fortalecimento dos

    Estados Nacionais recm-nascidos no sculo XIX ou j estabelecidos.

    Para FREIRE et al (2004, p. 21), a funo da escola pblica no era somente iniciar no

    letramento, mas ir alm: construir valores morais e costumes e formar o cidado com direitos

    e deveres conscientemente assimilados.

    Nesse sentido, houve um grande impulso no processo de universalizao da educao

    escolar; pases como Alemanha, Inglaterra e Frana tiveram, em 1890, entre 80 e 90% das

    crianas em idade escolar matriculadas em escolas pblicas. Nos anos seguintes, os esforos

    dos Estados, para que esse percentual fosse ampliado, foram cada vez mais acentuados. Desta

    forma, houve um avano significativo na escolarizao da populao dos pases do Norte.

    Nesse perodo, sculo XIX, a economia do Brasil era voltada para a produo do caf.

    O coronelismo se fortaleceu com a descentralizao do poder, caracterstica da Repblica

    Velha. No final dos anos de 1920, porm, uma crise abalou a economia e a poltica mundial.

    A crise de 1929 teve impactos na correlao de foras polticas que sustentavam o governo,

    que precisou valer-se de inmeras estratgias para evitar uma crise ainda maior, devido

    superproduo e ausncia de compradores para o caf brasileiro.

    O ano 1930 foi assinalado por um movimento poltico conhecido, na historiografia

    tradicional, como Revoluo de 30, entendido, por alguns autores, como um golpe de

    Estado18

    . Marcou o fim da repblica do caf com leite e, assim, houve a ampliao dos

    personagens envolvidos no cenrio poltico nacional. Algumas mudanas marcaram o cenrio

    poltico brasileiro.

    Segundo FREIRE et al, em sua Histria em Curso: o Brasil e suas relaes com o

    mundo ocidental (2004, p. 24), nesse mesmo perodo a rea de educao passou por um

    processo que envolveu vrias aes, buscando atentar para os interesses polticos, sem que

    18 Para Edgard de Decca e Carlos A. Vesentini, a Revoluo de 1930 foi, na verdade, uma contrarrevoluo ao

    processo revolucionrio iniciado de 1928, quando se explicitou, institucionalmente, a luta de classes com a

    criao do Bloco Operrio e Campons BOC , organizado pelo Partido Comunista. No mesmo ano, foi criado o Centro das Indstrias do Estado de So Paulo, enrijecendo sua postura repressiva com relao ao operariado. A

    consagrao do golpe de 1930 seria o resultado da produo do discurso vitorioso, tentando apagar a memria da

    verdadeira luta de classes (DECCA, 2004, p. 48).

  • 30

    tivessem como objetivo o atendimento das necessidades urgentes que surgiam nas chamadas

    escolas populares. Como fruto da poltica de aproximao com os EUA, ainda no ano de

    1930, passava a ser produzido, no Brasil, o compndio nacional (Livro Didtico), deciso

    tomada devido ao alto valor gasto com livros importados.

    De uma forma geral, comum encontrarmos referncias Revoluo de 1930 como o

    episdio que d incio s grandes mudanas polticas, econmicas e, consequentemente,

    culturais, marcando uma fase de transio do Brasil arcaico para o Brasil moderno. O

    Estado tornava-se centralizado e intervencionista, alterando as relaes entre as classes sociais

    e o poder estatal. Em 1938, no perodo de vigncia do Estado Novo, da Era Vargas, houve a

    criao da CNLD (Comisso Nacional do Livro Didtico), que, sob a direo do Instituto

    Nacional do Livro, controlaria a disposio, tanto ideolgica, quanto metodolgica, do que

    era veiculado nesse material.

    Segundo FERREIRA (2006), essa comisso tinha como funo definir como deveria

    ser o livro didtico, no Brasil:

    O decreto-lei 1.006 de 30 de dezembro de 1938, que criou esta ltima comisso

    definiu, pela primeira vez, o que deveria ser entendido como livro didtico: livros

    que exponham total ou parcialmente a matria das disciplinas constantes dos

    programas escolas; livros usados para leitura dos alunos em sala de aula. Na

    comisso, constituda por 17 membros, escolhidos diretamente pelo presidente da

    Repblica e pelo ministro Gustavo Capanema, [...] integrava representantes da

    Escola Nova, catlicos e militares com a funo de examinar e julgar livros [...].

    (FERREIRA, 2006, p. 03)

    O desenvolvimento do ensino no Brasil, desde o sculo XIX, tem trazido a marca das

    desigualdades sociais, da excluso social, ao longo de todo Imprio e tambm durante a

    Repblica. Estas caractersticas, no entanto, no impediram a confirmao do processo de

    ampliao gradativa da oferta de escolarizao, como argumenta ngela Gomes:

    Estudos atuais de Histria da educao indicam que a descentralizao poltico-

    administrativa (existente at hoje) no impediu o desenvolvimento de nosso

    processo de escolarizao, isto , a formao de uma rede de instituies

    responsvel pela educao que teve a escola como seu ncleo. claro que esse

    processo permaneceu e ainda permanece longe de nveis exemplares, sendo nossa

    cidadania educacional uma conquista a ser realizada. Polticos e intelectuais

    interessados em educao enfrentaram, desde o sculo XIX, a descontinuidade das

    iniciativas e a falta de recursos compatveis com a imensido da tarefa. (GOMES,

    2004, p. 67)

    Ainda no sculo XIX, Baptiste Garnier se tornou o primeiro editor a se esforar para

    atender s necessidades de livros escolares, assumindo o risco comercial. Mas foi nos anos de

    1930 que a produo brasileira de livros didticos sofreu uma grande ampliao, com a

    Reforma Capanema (HALLEWELL, 1985, p. 145). Trata-se de livros produzidos no Brasil,

  • 31

    pois os primeiros livros didticos para as escolas brasileiras foram traduzidos, j que algumas

    escolas pblicas e privadas utilizavam materiais importados e de alto custo. O uso de livros

    traduzidos era totalmente autorizado pelo governo. Essa caracterstica marcante e crescente da

    interveno do Estado destacada ainda por alguns autores:

    O perodo que vai de 1930 a 1954 conhecido como Era Vargas. Poucos perodos

    da Histria do Brasil deixaram uma herana to extensa e duradoura. A poltica

    econmica baseada na interveno estatal, bem como as instituies criadas para

    execut-la tiveram prosseguimento no fim da dcada de 1950 e incio da de 1960

    [...]. (FREIRE, MOTTA e ROCHA, 2004, p. 284)

    O livro didtico nacional firmou-se a partir de 1930. A crise econmica mundial e a

    desvalorizao da moeda brasileira permitiram a competio comercial com o livro importado

    (FREITAG, 1993, p. 55). Nesse perodo conturbado, foi criado, em novembro de 1930, o

    Ministrio da Educao e da Sade. A Igreja Catlica, que possua uma rede ampla de escolas

    em todo o pas, influenciava decises do Estado e provocava reaes no campo educacional,

    como os debates e s propostas de um grupo de educadores, entre os quais, Ansio Teixeira e

    Fernando de Azevedo, que lanaram o movimento da Escola Nova19

    , em oposio aos

    catlicos.

    Durante o Estado Novo, a instituio do currculo nico e do livro nico viria

    atender ao novo projeto de Estado, de uniformizao da nao e da educao. Dessa forma,

    estabeleceu-se o Estado corporativo e mediante a prtica de uma organizao social com base

    em entidades representativas dos interesses de categorias de profissionais ligados educao.

    O Estado Novo foi inspirado na defesa de interesses desse setor organizado da sociedade,

    muitas vezes, em detrimento do interesse pblico. Como consequncia, o currculo e o livro

    nico foram formas encontradas pelo Estado para controlar a cultura em geral e, tambm,

    controlar um dos principais elementos da cultura escolar, que o livro utilizado nas escolas

    pblicas.

    Em 1934, Gustavo Capanema assumiu o Ministrio da Educao e, durante onze anos,

    definiu as orientaes e diretrizes que regeram o sistema educacional brasileiro at o incio

    dos anos sessenta. Ainda de acordo com FREIRE et al,

    19 O movimento chamado Escola Nova esboou-se, na dcada de 1920, no Brasil. O mundo vivia, poca, um

    momento de crescimento industrial e de expanso urbana e, nesse contexto, um grupo de intelectuais brasileiros,

    capitaneados por Ansio Teixeira, Fernando de Azevedo e Manuel Loureno Filho, sentiu necessidade de

    preparar o pas para acompanhar esse desenvolvimento. Inspirados nas ideias poltico-filosficas de igualdade

    entre os homens e do direito de todos educao, esses intelectuais viam num sistema estatal de ensino pblico,

    livre e aberto, o nico meio efetivo de combate s desigualdades sociais da nao. Este movimento ganhou

    impulso na dcada de 1930, aps a divulgao do Manifesto da Escola Nova (1932). Nesse documento,

    defendia-se a universalizao da escola pblica, laica e gratuita (FILHO, 2002, p. 112).

  • 32

    em termos gerais, nesse perodo, investiu-se na formao de uma elite capaz de

    comandar a nao, em detrimento de uma educao mais democratizada, voltada

    para o ensino bsico. (FREIRE, MOTTA e ROCHA, 2004, p. 287).

    O perodo aps a Segunda Guerra Mundial foi marcado por intensos debates polticos

    e ideolgicos, cuja finalidade era acelerar o processo de desenvolvimento tecnolgico

    brasileiro. O ideal de desenvolver o pas envolvia aes governamentais relativas educao.

    Nessa perspectiva, na dcada de 1960, ps Golpe Militar, consolidaram-se os acordos MEC-

    USAID, que resultaram em aes como a distribuio gratuita de milhes de livros didticos.

    Alm disso, segundo Fonseca, vrios livros eram traduzidos para o portugus, e os que aqui

    eram produzidos passavam por um crivo de contedo (FONSECA, 1995, p. 49).

    Segundo a autora, no incio dos de 1960, o Brasil passou por um perodo conturbado

    no cenrio poltico. Com a eleio de Jnio Quadros e Joo Goulart, objetivava-se concentrar,

    no Ministrio da Educao, a padronizao, produo e distribuio do livro didtico. O

    Golpe Militar de 1964 interrompeu este projeto. O Estado passou a incentivar a indstria

    editorial brasileira e estabeleceu, ento, a iseno de impostos em todas as fases de produo e

    comercializao de livros, jornais e peridicos, garantidos pela Constituio Federal de 1967.

    O Brasil passou, ento, a ser exportador ao invs de importador, de papel e celulose, graas ao

    incentivo indstria editorial. (FONSECA, 2003, p. 50),

    O perodo de Ditadura militar, instalado a partir dos anos 1960, imps mecanismos de

    controle e preservao da ordem social. Do ponto de vista educacional e, particularmente, da

    produo de livros escolares, a dcada de 1970 trouxe vrios projetos nacionais inovadores,

    mas com resultados que ainda hoje so objeto de pesquisas para avaliar os impactos sobre a

    educao brasileira naquele perodo20

    .

    Se, por um lado, o perodo foi marcado por uma perspectiva que muitos denominam

    como tecnicista, cujas caractersticas definem o livro didtico como uma tecnologia

    educacional, por outro lado, houve o fortalecimento das produes nacionais. Nesta

    perspectiva, milhares de livros escolares de estudo dirigido foram produzidos para

    20 A partir da concepo de que as capacitaes so um servio essencial, o professor Jos Fusari analisa como a

    Pedagogia Tecnicista - que vigorou durante os anos 70, influiu nos treinamentos de educadores. Segundo ele, a escola deveria ser produtiva, racional e organizada e formar indivduos capazes de se engajar rpida e

    eficientemente no mercado de trabalho. [...] Para tanto, imagem da empresa, a escola deveria apresentar uma

    produtividade eficiente e eficaz. (FUSARI, 1988, p. 33) Ainda segundo o professor Fusari, claro que os treinamentos de educadores nos anos 70 refletiram, e muito, esta tendncia que valorizava fundamentalmente os

    meios, as tecnologias e os procedimentos de ensino - apresentados sempre como neutros, eficientes e eficazes. E isto teve consequncias negativas na educao escolar brasileira que perduram at o presente momento (FUSARI, 1988, p. 35).

  • 33

    transmitir uma variedade de contedos: Lngua Portuguesa, Matemtica, Estudos Sociais e

    Cincias. Paralelamente, na dcada de 1970, estudos apontam inmeros problemas como

    ideologia, preconceitos e discriminao nos materiais didticos produzidos para a escola.

    Em 1966, foi assinado o acordo entre o MEC e a USAID (Agncia Norte-Americana

    para o Desenvolvimento Internacional), que assegurou ao governo recursos suficientes para a

    distribuio gratuita de 51 milhes de livros no perodo de trs anos. Podemos assegurar que

    esse seria o embrio do PNLD, que teria um formato parecido com o que conhecemos a partir

    de 1985, com a edio do Decreto n 91.542, de 19/8/85, desde ento, os professores puderam

    participar da escolha dos livros21

    (MEC, FNDE 2009).

    Ao garantir o financiamento do governo por meio de verbas pblicas, o programa

    revestiu-se do carter de continuidade. Em 1971, o INL (Instituto Nacional do Livro) passou a

    desenvolver o PLIDEF (Programa do Livro Didtico para o Ensino Fundamental), assumindo

    as atribuies administrativas e de gerenciamento dos recursos financeiros, at ento, a cargo

    da COLTED (Comisso do Livro Tcnico e Livro Didtico).

    Esses eventos seriam produzidos pelo MEC e pela USAID, que teve forte participao

    na poltica educacional brasileira nesse perodo. Este programa fazia parte do projeto

    educacional do governo e trouxe inmeros benefcios ao setor industrial e confluiu,

    naturalmente, com o projeto ideolgico e de segurana nacional.

    Em 1971, algumas mudanas ocorreram aps a aquisio de grandes quantidades de

    livros didticos e uma consequente ampliao do setor, o Brasil sediou a I Bienal

    Internacional do Livro. Nesse mesmo ano, o programa de distribuio gratuita do livro foi

    extinto. A COLTED foi absorvida pelo INL, no entanto continuaram sendo apoiados vrios

    subsdios aos livros tcnicos e didticos.

    A indstria cultural e a educao brasileira estiveram, intimamente, ligadas a partir das

    reformas educacionais ocorridas ao longo dos anos 1970. E vale lembrar que esse projeto

    fazia parte do modelo poltico de desenvolvimento que, ao mesmo tempo, favorece o projeto

    de manuteno da ordem e dos ideais de segurana nacional e o fortalecimento das indstrias

    editoriais nacionais.

    No incio dos anos 1980, distinguidos pela forte centralizao das medidas relativas ao

    ensino, a produo e a circulao dos livros didticos foram marcadas por vrios problemas,

    21 MEC, FNDE. FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao. 07 de Abril de 2009.

    http://www.fnde.gov.br/home/index.jsp?arquivo=livro_didatico.html#pnld (acesso em 04 de Julho de 2009).

  • 34

    como a distribuio inadequada de livros, o no cumprimento dos prazos, a diferena entre a

    quantidade de livros pedidos e recebidos pelas escolas, entre outros. Tambm so apontadas

    as dificuldades decorrentes das decises das Secretarias Estaduais e Municipais, de

    Delegacias Regionais que faziam a escolha pelos professores, provocando reaes das escolas

    com relao ao uso dos livros que no eram selecionados por elas. Sem contar as denncias de

    suspeitas de lobbies22

    , feitos pelas editoras junto aos rgos do governo responsveis pela

    seleo dos livros didticos.

    O perodo dos anos 1990 foi assinalado pela efetivao da poltica dos livros didticos

    no Brasil. Em 1993, o Ministrio da Educao liderou a elaborao do Plano Decenal de

    Educao para Todos, deciso que ocorreu na Conferncia Mundial de Educao promovida

    pela UNESCO23

    , com co-patrocnios do PNUD24

    , UNICEF25

    e Banco Mundial, envolvendo

    todos os pases com alto ndice de analfabetismo e baixa escolaridade. Nesse momento, um

    tema muito discutido foi a necessidade de melhoria da qualidade dos livros didticos e das

    polticas para a capacitao dos professores.

    Em 1993, o MEC instituiu uma Comisso de Avaliao formada por especialistas,

    encarregada de avaliar a qualidade dos livros mais solicitados pelos professores e de

    estabelecer critrios gerais de avaliao26

    aos quais todos os livros deveriam se submeter.

    Essa comisso analisou, em 1994, os dez livros mais solicitados pelos professores da

    rede pblica, em cada disciplina, e constatou que o MEC vinha comprando e distribuindo

    livros preconceituosos, desatualizados e com erros programticos e conceituais. Aps essa

    pesquisa, o MEC passou a submeter os livros didticos a uma avaliao peridica, cujo

    22 Lobby a atividade de presso exercida por grupo organizado (de interesse, de propaganda etc.) sobre

    polticos e poderes pblicos, que visa exercer sobre estes qualquer influncia ao seu alcance. 23

    A UNESCO (em ingls United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization) um organismo

    especializado do sistema das Naes Unidas. A UNESCO (Organizao das Naes Unidas para a Educao, a

    Cincia e a Cultura) foi fundada em 16 de Novembro de 1945, com o objetivo de contribuir para a paz e

    segurana no mundo mediante a educao, a cincia, a cultura e as comunicaes. 24

    O PNUD (Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento) o rgo da ONU (Organizao das Naes

    Unidas) que tem por mandato promover o desenvolvimento e eliminar a pobreza no mundo. Entre outras

    atividades, o PNUD produz relatrios e estudos sobre o desenvolvimento humano sustentvel e as condies de

    vida das populaes, bem como executa projetos que contribuam para melhorar essas condies de vida, nos 166

    pases onde possui representao. conhecido por elaborar o IDH (ndice de Desenvolvimento Humano), bem

    como por ser o organismo internacional que coordena o trabalho das demais agncias, fundos e programas das

    Naes Unidas nos pases onde est presente. 25

    O Fundo das Naes Unidas, para a Infncia (em ingls United Nations Children's Fund) uma agncia das

    Naes Unidas que tem como objectivo promover a defesa dos direitos das crianas, ajudar a dar resposta s suas

    necessidades bsicas e contribuir para o seu pleno desenvolvimento. 26

    Este trabalho foi realizado em 1994 e produziu um relatrio que expressava o baixo ndice de qualidade do

    livro didtico (BRASIL, MEC, FAE 1994).

  • 35

    resultado tem sido divulgado no Guia de Livros Didticos. A avaliao previa inclusive a

    excluso de livros antes da escolha dos professores. As excluses justificadas pelos erros27

    tiveram forte repercusso na mdia e reao por parte de autores e importantes editoras. O

    grande desconforto se deveu ao enorme nmero de livros inscritos e excludos,

    principalmente, por erros conceituais, nos anos de 1990.

    Voltando ao PNLD, que instituiu o processo sistemtico de avaliao, a partir de 1996,

    Munakata descreve:

    A partir de 1996, o governo federal, por intermdio de uma equipe formada pelo

    Ministrio da Educao, passou a avaliar os livros didticos, ao menos aqueles

    encaminhados pelas editoras. Isso acabaria por constituir um novo grupo de leitores

    o dos avaliadores -, reduzidssimo em nmero, mas altamente poderoso, na medida

    em que capaz de influir sobre a aquisio, pelo governo, de livros didticos, numa

    operao comercial que envolve dezenas de milhes de exemplares. Como esse

    seleto grupo l o livro didtico? Cabe tambm indagar se as editoras redefiniram e

    como as estratgias para tentar assegurar que seus produtos sejam aprovados por

    esses leitores (MUNAKATA, Histria do livro didtico, 2005, p, 25).

    Em 1996, o PNLD teve as suas caractersticas modificadas, passando a ter como

    principais objetivos avaliar, adquirir e distribuir de forma universal e gratuita os livros

    didticos para todo o Ensino Fundamental pblico. Desenvolvido pelo FNDE e pela SEF,

    rgos ligados ao MEC, realizam a aquisio e distribuio de livros de Alfabetizao, Lngua

    Portuguesa, Matemtica e da disciplina at ento conhecida como Estudos Sociais e Cincias,

    que inclua Histria, Geografia e Moral e Cvica.

    Muitas das diretrizes estabelecidas no PNLD de 1995 se mantiveram no PNLD de

    1996, mas algumas mudanas muito importantes foram efetuadas. O governo que, at ento,

    se tinha restringido ao papel de comprador e distribuidor dos livros didticos, formou uma

    comisso para analisar a qualidade dos contedos programticos e dos aspectos pedaggicos e

    metodolgicos dos livros comprados pelo MEC para as sries iniciais do Ensino

    Fundamental.

    Ainda em 1996, novas alteraes: o PNLD passou a ser administrado pelo FNDE, uma

    autarquia federal ligada ao MEC e responsvel pela captao de recursos destinados aos

    programas voltados para o Ensino Fundamental. Nesse mesmo ano, os alunos de 6o ao 9

    o

    anos28

    , comearam a receber livros didticos regularmente.

    27 Os tipos de erros que levaram excluso das colees incluem: erros programticos, metodolgicos e

    conceituais. 28

    Apesar do PNLD de 1985 estabelecer que todos os alunos do Ensino Fundamental deveriam ser atendidos, at

    1995, apenas os alunos de 1a a 4

    a sries eram regularmente atendidos pelo programa.

  • 36

    Segundo dados do MEC, os nmeros evidenciam o empenho do Estado em investir,

    gradativamente, cada vez mais no programa de avaliao, aquisio e distribuio de livros.

    Ainda no ano de 1995, o Governo Federal comprou mais de 80 milhes de livros didticos

    para serem distribudos nas escolas pblicas de Ensino Fundamental do pas, somando cerca

    de 196 milhes de reais. (BRASIL, MEC 2008),

    Em 1996, a cifra foi alm dos 226 milhes. Em 1998, a compra ultrapassou a casa dos

    100 milhes de livros e chegou a cerca de 373 milhes; no ano seguinte, as compras para o

    ano letivo de 2000 caram para 72 milhes livros e 273 milhes. Mas, a partir do ano 2001,

    foram investidos mais de 500 milhes de reais em livros didticos, esse valor ficou na casa

    dos 270 milhes e voltou a subir no ano de 2003, quando os nmeros chegaram a 116 milhes

    de livros didticos e mais de 600 milhes. O MEC adquiriu 44 milhes de livros em 2005; o

    FNDE, em 2006, comprou 102 milhes de livros e, no ltimo programa PNLD 2007, o

    governo adquiriu cerca de 110 milhes de livros didticos. (BRASIL, MEC 2008)

    Em 2004, o PNLD deixou de comprar livros de Estudos Sociais para os anos iniciais

    do Ensino Fundamental, buscando se adequar aos PCNs e a comprar livros de Histria e

    Geografia. Ocorreu, tambm, a aquisio de livros regionais de Histria e de Geografia,

    destinados a 3a e 4

    a sries do Ensino Fundamental, com o objetivo de fornecer obras que

    atendessem aos currculos dessas disciplinas (estudo do Municpio e do Estado).

    Ao longo do perodo dos anos de 1990 e 2000, vrias crticas foram feitas ao processo

    de avaliao realizado pelo MEC, pelas editoras e professores. As editoras sentem-se

    prejudicadas por terem obras de alta vendagem excludas, e os professores sentem-se

    privados da escolha de obras consideradas importantes para a sua prtica pedaggica, que, no

    entanto, no podem ser adotadas, pois no constam no Guia do MEC. Um exemplo dessa

    insatisfao pode ser encontrado na voz da professora de Pedagogia da UFPR, Elisa Dalla

    Bona, que critica a imposio da escolha do livro didtico:

    voc escolhe o que lhe ofertado, dentro de uma lista. Estamos lutando para que o

    professor possa escolher o livro que deseja trabalhar, junto com a equipe de sua

    escola. Uma vez selecionado, apenas mais um recurso. O professor no pode ficar

    agarrado ao livro: deve segui-lo apenas como um roteiro, um apoio. [..] O professor

    qualificado possui apenas mais de um material. Eu desconheo algum livro didtico

    que seja merecedor de ser seguido risca. O bom professor pode, inclusive, critic-

    lo (CRUZ, 2007, p. 03).

    Nessa mesma linha, Klein tambm apoia a figura do professor independente, ao

    afirmar que

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    no importa a ideologia apresentada, o professor quem detm o conhecimento, e a

    figura dentro de sala que representa isso. Dependendo da maneira que ele atua, pode

    induzir o aluno. Apud (CRUZ, 2007, p. 04).

    Destacamos que as ltimas dcadas tm sido marcadas por mudanas e transformaes

    na educao brasileira: reformas curriculares, metodolgicas, currculos, avaliaes nacionais,

    livros didticos com metodologia e propostas diversas, inovaes nos cursos de formao de

    professores, implantao de novas modalidades de formao docente, polticas de merenda

    escolar (segurana alimentar), transporte escolar e outros. A poltica dos livros didticos faz

    parte do conjunto de aes governamentais para a educao bsica que tm sofrido

    reformulaes nas ltimas dcadas.

    Os elementos aqui expostos, com a inteno de destacar alguns pontos especficos da

    Histria do livro didtico e sua presena no sistema escolar brasileiro, visam a um

    aprofundamento sobre as formas pelas quais as polticas pblicas do livro se articulam e se

    manifestam na cultura da escola. Para concluir esse esboo histrico, apresentamos alguns

    dados que resumem a Histria recente do livro didtico na poltica pblica brasileira,

    fornecidos pelo Ministrio da Educao.

    Em 2004, o MEC instituiu o PNLEM, realizando um projeto piloto, que adquiriu 1,3

    milhes de livros de Matemtica e Lngua Portuguesa para as regies Norte e Nordeste. O

    PNLEM seguiu os moldes de avaliao, aquisio e distribuio do PNLD.

    Em 2005, o FNDE/MEC fez um convnio com a Fundao Dorina Nowill para

    Cegos29

    e adquiriu 40 mil livros em Braille, sendo 128 ttulos das cinco disciplinas, entregues

    no ano letivo de 2006 (BRASIL, MEC 2008).

    Ainda em 2006, o programa universalizou a disponibilizao de livros didticos de

    Portugus e Matemtica para o ensino mdio. Assim, 7,01 milhes de alunos das trs sries

    do ensino mdio de 13,2 mil escolas do pas foram beneficiados no incio de 2006, exceto as

    escolas dos estados de Minas Gerais e do Paran, que desenvolvem programas prprios.

    Em 2007, pela primeira vez, foram cedidos os livros de Biologia a todos os alunos e

    professores do Ensino Mdio das escolas pblicas de todo o Brasil, exceto as escolas

    29 A Fundao Dorina Nowill Para Cegos, antiga Fundao Para o Livro do Cego no Brasil, foi instituda em 11

    de maro de 1946 pela professora Dorina de Gouva Nowill. A necessidade de criar a fundao surgiu aps a

    dificuldade enfrentada pela professora, cega desde os 17 anos, em encontrar livros em Braille. Inicialmente, a

    Fundao dedicou suas atividades produo manual de livros em Braille, realizada por um Grupo de

    Voluntrios. Com o sucesso das atividades, possibilitadas por doaes de equipamentos, apoio de voluntrios e

    dos Governos Municipal e Estadual, foi possvel instalar a Imprensa Braille para a produo industrializada de

    livros em Braille (FUNDAO DORINA NOWILL, 2009).

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    estaduais de Minas Gerais. Tambm foram repostos os livros de Portugus e Matemtica. O

    PNLEM/2007 introduziu 9,1 milhes de exemplares, beneficiand