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SENADO IMPERAL ANNO DE 18 54 LIVRO 4 ANAIS DO SENADO Secretaria Especial de Editoração e Publicações - Subsecretaria de Anais do Senado Federal TRANSCRIÇÃO

ANAIS - 1854 - LIVRO 4 - Transcrição · livro 4 anais do senado ... transcriÇÃo \r annaes do senado do imperio do brazil\r \r . sessÃo em 1º de agosto de ... eu o digo em resumo,

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  • SENADO IMPERAL

    ANNO DE 1854LIVRO 4

    ANAIS DO SENADO

    Secretaria Especial de Editorao e Publicaes - Subsecretaria de Anais do Senado Federal

    TRANSCRIO

    yuribeloCaixa de texto ANNAES DO SENADO DO IMPERIO DO BRAZIL

  • SESSO EM 1 DE AGOSTO DE 1854.

    PRESIDNCIA DO SR. CAVALCANTI DE LACERDA. Sumrio Criao da freguesia de Santo Antonio dos Pobres. Discursos dos Srs. Montezuma e

    Jobim. Oramento do imprio. Discursos dos Srs. Pedreira e D. Manoel. Votao. s 10 horas e meia da manh reunido nmero suficiente de Srs. senadores, abre-se a sesso e

    aprova-se a ata da anterior.

    EXPEDIENTE So eleitos por sorte para a deputao que tem de receber o Sr. ministro do imprio os Srs. marqus

    de ltanham, Paula Pessoa, e Visconde de Olinda.

    ORDEM DO DIA Continua a 2 discusso, adiada na sesso antecedente, do art. 2 das emendas substitutivas das

    comisses de negcios eclesisticos e de constituio da proposio da Cmara dos Deputados erigindo em matriz a capela de Santo Antonio dos Pobres desta corte.

    O SR. MONTEZUMA: Sr. presidente, peo perdo ao Senado por ter pedido a palavra ontem e assim obstar a que ele votasse art. 2 do projeto que se discute. Obrei por este modo para ter ocasio de despertar a ateno do Senado relativamente a um objeto que julgo conexo e muito conexo com a questo da diviso das freguesias de S. Jos, Santana e Sacramento.

    No meu conceito, Sr. presidente, o projeto no est completo. Eu disse em outra ocasio que me parecia mais conveniente que o

  • projeto contivesse logo a consignao necessria para a edificao da Igreja matriz na nova freguesia, disse-o fundado nos prprios motivos dados pelas ilustres comisses reunidas. Elas no deixaram de reconhecer que no havia razo alguma para se tirar irmandade de Santo Antonio dos Pobres o uso completo da sua igreja, por isso que disseram as ilustres comisses: provisoriamente seja ali estabelecida freguesia at que se edifique a igreja prpria para a matriz.

    O SR. COSTA FERREIRA: Para a ressurreio dos capuchos. O SR. MONTEZUMA: Esta ocupao provisria, disse eu, demonstra at certo ponto o direito que

    as ilustres comisses reconhecem naquela irmandade. Se esse direito no verdadeiramente de propriedade tal qual como se entende que tm todos os cidados relativamente a seus bens, todavia um direito que as prprias ilustres comisso reconhecem, seja ele de propriedade ou de domnio, ou seja de mera administrao. Para o caso de que se trata suficiente que as ilustres comisses reconheam na irmandade de Santo Antonio dos Pobres o direito de administrar aquela igreja, quando no queiram reconhecer o direito pleno de propriedade para que se consignasse no projeto os fundos precisos para a construo da igreja. Estas razes dadas por mim, e creio que sustentadas pelo nobre senador da provncia do Maranho, mais ou menos extensamente, mais ou menos de acordo com aquilo que eu disse, no foram aceitas pelas ilustres comisses, e ontem o honrado membro que falou sobre o objeto declarou que conquanto ele desejasse ver consignada uma quantia para a edificao da igreja desde j, todavia nem mandaria a emenda, nem julgava que era o objeto to importante que merecesse ser colocado na lei do oramento deste ano.

    O SR. PAULINO: Eu disse que se passassem outras emendas na lei do oramento, no duvidava que tambm se apresentasse esta, mas que entendia que no devia voltar o oramento outra cmara s por causa desta emenda.

    O SR. MONTEZUMA: Bem, disse que no mandava emenda, e tambm que a no passarem outras emendas na lei do oramento, esta s no devia obrigar ao Senado a enviar Cmara dos Srs. Deputados o oramento. Sr. Presidente, eu no questiono sobre isto; esta 2 parte da proposio do honrado membro muito judiciosa para que eu me oponha a ela; enquanto 1 parte, eu desejaria que o Senado fizesse alguma coisa a este respeito. Se o Senado entende que ao Estado no incumbe a edificao das igrejas, declare-o,

  • mas declare-o expressamente; se o Senado entende que ao Estado incumbe em parte a edificao das igrejas como preceitua a lei de 10 de abril de 1566, declare-o para que os que no sabem se o Estado somente faz a capela mor, e que o corpo da igreja pertence aos cidados faz-lo, conheam que ainda est em vigor a lei que acabei de citar. esta a declarao formal e plena que eu desejo, porque com ela h de vir tambm outra indispensvel: 1, quem so os cidados que tm de concorrer para a edificao do corpo da igreja; 2, como que estes fundos ho de ser determinados e recebidos, que questo absolutamente ligada com aquela que acabei de exprimir (apoiados), tanto mais quanto o honrado membro a quem tenho a honra de referir-me disse que nas atuais circunstncias, segundo a nossa forma constitucional representativa; no era mais lcito que uma autoridade qualquer fosse estabelecer uma finta, uma derrama, em uma palavra, levantar um capital para esse fim. Bem, concordo nisto enquanto a lei no o determinar; o que pois preciso? Que a lei o determine; havemos de deixar ainda o pas no estado anmalo em que se acha a este respeito, dependendo o culto absolutamente dos desejos, das boas graas e da benevolncia deste ou daquele fiel mais ou menos devotado, mais ou menos devoto para dar os seus fundos, para fazer doaes, para edificar igrejas? Certamente que no, porque o culto padece, e com ele padece a religio. esta questo, Sr. Presidente, que eu julgo importante trazer ao conhecimento do Senado; foi esta uma das questes que deram lugar a que eu tomasse a liberdade, a que eu tivesse a ousadia de embaraar a votao do Senado ontem a respeito deste projeto. Se eu no estivesse convencido da importncia desta questo, no seria o amor prprio, no podia ser uma presumida suposio de que minhas palavras viessem ainda esclarecer uma matria to elucidada pelos nobres senadores que tomaram parte nela, que me fizesse reter a votao do Senado; mas esta questo me parece transcendente.

    Alm desta, Sr. Presidente, h outra que tambm me parece que no foi aventada na casa, e que julgo de importncia, vem a ser a questo da administrao da fbrica daquela igreja. O que fbrica? Como se administraram as fbricas nos tempos primitivos da igreja? Como se administram hoje nos pases cultos da Europa? Como se administram hoje entre ns? Todas estas questes, senhores, sero indiferentes ao Senado brasileiro quando se trata de edificar uma freguesia, e uma freguesia em casa alheia? Isto tudo importante.

  • No trarei ao Senado a histria das fbricas porque melhor do que eu ele a conhece; mas somente para me socorrer a alguns dos fatos dessa poca eu a declararei. O Senado sabe perfeitamente que os bens pertencentes s fbricas so bens eclesisticos e que estes estiveram at o sculo XIV absolutamente administrados pelos clrigos, e no pelos leigos. Depois no sculo XV, os conselhos dessa poca permitiram que esses bens fossem administrados pelos leigos. Desde o sculo V que as fbricas foram estabelecidas porque havia necessidade absoluta de as estabelecer, desde que se dividiram os bens eclesisticos e que teve lugar essa clebre quatripartita disposio, sendo uma parte para os bispos, outra para os clrigos, outra para os pobres, e outra para as fbricas. Isto durou at o sculo IX, criando-se os benefcios eclesisticos e retirando assim os clrigos parte que lhes pertencia. Sempre se reconheceram os bens das igrejas como bens de rfos no emancipados, e por isso debaixo da tutela administrativa. Como exerce o pas, como exerce o governo, permita-me que eu faa esta pergunta, esta tutela administrativa entre ns? Como que as fbricas so veladas, zeladas, administradas no nosso pas!

    O SR. PAULINO: Tudo isto est num caos perfeito. O SR. MONTEZUMA: Exatamente. Senhores, ser novo ao Senado a legislao que hoje existe na Frana, que de todas a que me

    parece mais audaciosa? Desde o decreto de 30 de dezembro de 1809 que a estabeleceu formalmente, e do decreto de 12 de janeiro de 1825 que reformou aquela legislao e a estatuiu em bases slidas, as fbricas na Frana tm uma administrao regular, sabe-se o que so as fbricas, quem as administra, e como so elas administradas; nem se tiraram os direitos s autoridades eclesisticas; nem tambm se despiu a autoridade administrativa dos direitos que lhe pertencem: unidos, casados, permita-se expresso, estes dois princpios, a legislao francesa parece que digna de imitar-se.

    Eu, Sr. presidente, no cansarei ao senado com a exposio minuciosa de tudo quanto ali se faz, porque no me proponho a fazer uma preleo do direito eclesistico e administrativo a este respeito; a est a obra de Foucart e Degerando, a est o dicionrio do direito administrativo de Magnitot, e todos os outros autores que tratam desta matria, para tirarem dvidas a quem ainda as tiver, ou para quem se quiser inteirar do que se passa naquele pas relativamente s fbricas.

  • O senado sabe que Portugal hoje tem dois cdigos administrativos excelentes, o que foi promulgado em 1836, e depois o outro que foi promulgado em1842 reformando, revendo, aperfeioando as disposies do primeiro. Nestes dois cdigos, senhores, expressamente se determina o modo por que as fbricas ho de ser administradas, que ingerncia tem o cidado paroquiano nos bens das fbricas das igrejas a maneira por que as igrejas ho de ser reparadas, a quem pertence as grandes obras, e a quem pertence as pequenas construes. Confessarei que na legislao portuguesa no foram to atendidas, como me parece que deveriam ser, os direitos das autoridades eclesisticas: deu-se tudo ou quase tudo s autoridades civis; sendo elas as que nomeiam a junta paroquial, a junta paroquial toma conta dos bens das fbricas, administra-os, nomeiam dentre si uma espcie de poder executivo, este poder executivo faz a gesto dos bens, e assim se desenvolve o princpio administrativo daquele pas; mas reconhece-se a necessidade de se imporem fintas, de se lanarem derramas sobre os cidados paroquianos para a construo das igrejas, e para os seus reparos, e quando estes dinheiros no chegam recorre-se ento indispensavelmente autoridade civil. Ali portanto, Sr. presidente, j h uma ordem, j h um meio de administrao; entre ns nada h,de nada se tem curado, permita-me que eu o diga.

    O SR. COSTA FERREIRA: Apoiado. O SR. MONTEZUMA: Os interesses espirituais dos cidados brasileiros esto absolutamente

    abandonados. O SR. COSTA FERREIRA: Apoiado. O SR. MONTEZUMA: Os interesses materiais esto velados tanto quanto a autoridade pblica o

    tem podido fazer, por que razo, Sr. presidente, h esta diferena? Sabe V. Ex. como se faz a administrao das fbricas no nosso pas? Eu o digo em resumo, porque fui estudar. Digo mal, fui instruir-me, porque de escrito nada h no temos legislao alguma a este respeito; fui perguntar a quem sabe tiveram a bondade de instruir-me, e eu vou dizer ao senado o que aprendi. Senhores, entre ns tudo uso, no h lei; s vezes o diocesano nomeia, o fabriqueiro ou o fabricano; outras vezes o magistrado civil o nomeia: para a roa ou para o interior do pas no h nomeaes, a o proco que o fabricano.

    Note-se todavia que h um aviso de 31 de agosto de 1784 que expressamente declara impeditivo o cargo de fabricano ao ofcio

  • paroquial; contra este aviso, contra aquilo que a norma dita, a por fora o proco que fabricano. Ora, eu confessarei, Sr. presidente, que quando o proco no tem ingerncia na administrao da

    fbrica, graves inconvenientes acontecem, porque o fabricano obra s e muitas vezes no quer anuir a nada daquilo que ao proco parece indispensvel ao culto da igreja. Se o proco, por exemplo, pede o reparo do seu passal, do seu presbitrio, o fabricano diz no, e o presbitrio ou o passal acaba-se, perece, destri-se, ou fica em estado de se no poder gozar dele. Se o proco exige certos fundos para se pr a igreja em estado de poder fazer com decoro e decncia o servio do culto, diz o fabricano que no, pois os fundos, existem no cofre para fazer pomposas festas, atacar estrondosos fogos de artifcio, e outras despesas que ns presenciamos. H entre ns uma freguesia, Sr. presidente, que eu no direi qual , aonde as festas so as mais pomposas que possvel; mas tudo o quanto ornato ou preparos para a missa, como toalhas, alvas, paramentos, vinho, hstias, etc., est na maior misria que se pode considerar. Por isso disse eu e creio que disse bem, que indispensvel que os procos tenham ingerncia na administrao das fbricas. Esta a razo por que na Frana o cura membro nato da junta ou comisso das fbricas. por isso que em Portugal adotou-se o mesmo princpio, e por isso que eu creio que entre ns, quando o corpo legislativo entender que deve tambm cuidar deste objeto, h de adotar a mesma mxima: o cura deve ter sem dvida alguma ingerncia na administrao da fbrica, mas no deve ser ele o nico; a doutrina do artigo judiciosa: por ser talvez o cura o nico que as igrejas esto sem reparo algum, entretanto que os cemitrios so extensos. Nas catedrais h melhor ordem e regularidade. confiada a um cnego, nomeado pelo cabido, da mesma forma e na mesma ocasio em que ele elege os seus oficiais.

    Continuando a expor a maneira por que entre ns se procede, j disse que a nomeao dos fabriqueiros ora feita pelos diocesanos, ora feita pelos magistrados civis; mas a quem do elas conta? O Conclio Tridentino, sess, 22 de Reformat., cap. 8, expressamente determina que os fabricanos dem contas aos diocesanos, e do eles estas contas? Esto elas tomadas? No; e por qu? Porque no h legislao a este respeito. Relativamente s parquias, em que abandono no est isto? No h, senhores, o menor interesse, as administraes das igrejas constantemente se querem distinguir pela pompa

  • das festas e nada mais. O Estado no deve intervir nisto? Pois os bens das igrejas so como os bens dos rfos que esto debaixo da tutela administrativa, e no h de haver uma lei que estabelea o modo por que se deve exercer esta tutela para salvar das runas esses bens, e ao mesmo tempo dar ao culto a pompa, o decoro que indispensvel segundo os preceitos da religio? No chamarei eu a isto um desleixo? No me ser lcito despertar a ateno do corpo legislativo para este objeto, que me parece importantssimo, e em que ocasio? Na ocasio em que se vai estabelecer uma nova freguesia, h de ficar esta matria absolutamente entregue ao acaso ao desleixo?

    Depois destas reflexes, Sr. presidente, permita-me V. Ex. que eu faa pergunta s honradas comisses, e com as quais eu mostre a razo por que disse que o projeto no me parecia completo.

    A igreja Santo Antonio dos Pobres tem uma fbrica, esta fbrica deve ser administrada por algum; composta de tais e tais rendimentos provenientes de tais ou tais origens, o destino destes rendimentos o culto existente atualmente naquela igreja; pergunto eu, quem que h de fazer os gastos da nova freguesia? O Estado, V. Ex., sabe perfeitamente que apenas d uma pequena quantia chamada para guisamento; esta quantia e to limitada, to pequena, que no vale a pena mesmo mencionar-se, igual quela que devem pagar os oratrios e mais as capelas particulares quando os indultados querem gozar desta graa nos dias ou festas excetuadas, que 640 rs. por ano, em favor das fbricas das matrizes respectivas. Isto mostra, quanto importa estabelecer legislao a este respeito, porque se 640 rs. era uma quantia suficiente para o XV sculo, ou os sculos atrasados, hoje, a falar a verdade, no pode ser suficientes ou eqitativas, por isso indispensvel que sobre este objeto se faa alguma coisa. Mas, prosseguindo eu na minha pergunta, qual h de ser o rendimento desta freguesia?J sei que a resposta que as honradas comisses me daro : h de se criar uma irmandade do SS. Sacramento, os irmos dessa irmandade ho de dar jias pela sua entrada, ho de pagar uma anualidade e ho de pedir esmolas pelas ruas: porm observarei que isto mesmo no est no projeto, porque me parece que o projeto no teve em vista a criao de outra irmandade naquela igreja; ento quem h de fazer a despesa do culto divino pelo que diz respeito matriz? A quantia que se d para guisamentos impossvel que chegue. Se a atual

    irmandade no pode fazer os seus gastos seno lanando uma espcie de derrama,

  • toda ela voluntria, entre os cidados moradores daqueles lugares prximos ou contguos, o que pblico e notrio,como possvel que ela possa fazer as despesas da administrao da igreja quando freguesia; sem alguma outra renda, sem o auxilio do governo? E o honrado membro que tomou ontem a palavra, teve a bondade de dizer-nos que no havia direito para impor sobre algum, e teve toda a razo, porque no h autorizao em lei. Desejava pois que se me dissesse como que essa fbrica se h de estabelecer? De que bens constar? Quem nomear o fabricano? E ser um s? No haver corpo deliberante como a razo tem hoje demonstrado que conveniente em todas as naes cultas que tratam deste objeto seriamente? No haver, por assim dizer junta paroquial? No haver conselho, ou o que quer que seja? Quem sero os eleitores? Quem os nomear? O bispo conjuntamente com a autoridade civil, como acontece na Frana, aonde o bispo tem sempre a nomeao da maior parte dos membros, e a autoridade civil a nomeao do menor nmero, considerando-se sempre como membro nato da junta o cura ou proco? Seguir-se- o sistema adotado nos cdigos administrativos portugueses? possvel, Sr. presidente, que ainda no ano de 1854 saia do corpo legislativo um projeto incompleto por esta forma? No se aproveitar a ocasio para se fazer sobre esta matria uma legislao apropriada, conforme com os princpios do direito administrativo? So estas, Sr. presidente, as observaes que eu tinha a fazer; perdoe-me as ilustradas comisses a ousadia que tomei em expor ao Senado estas observaes; se elas parecerem justas, as honradas comisses podem na 3 discusso formula-Ias em uma emenda.

    O SR. VISCONDE DE OLINDA: Apresente o nobre senador agora a sua emenda. O SR. MONTEZUMA: Peo licena ao nobre senador para declarar que eu no vim prevenido para

    fazer a emenda; tal o respeito que tenho aos ilustres membros das duas comisses, que no tive por fim seno despertar a sua ilustrada ateno. No me atrevo a apresentar emenda, hei de votar, Sr. presidente, pelo projeto, como declarei ao princpio, mas com o intuito de servir ele de pretexto e de base para alguma coisa se determinar a este respeito, para o que pedirei ao Senado que depois de votado em 2 discusso, volte outra vez s ilustradas comisses para o rever e fazer algumas adies de conformidade com as necessidades pblicas e religiosas.

    Nem isto, Sr. presidente, objeto que se faa por meio de uma

  • emenda, preciso ser muito bem discutido, e discutido no remanso do gabinete; h questes, e questes muito importantes que devem ser resolvidas nessa ocasio... No sei se agradou o termo solvidas; quando falo no escolho termos... Se as ilustres comisses concordarem neste meu requerimento, tambm o projeto no perder nada. Ns, senhores, no temos talvez tempo para fazer um cdigo administrativo; j o Senado tm ouvido discursos relativamente ao direito de delegar, tem-se oposto fortemente nesta casa contra esta inovao, contra esta violao do nosso pacto social, rindo-se, e por isso no tenho esperana de termos cdigo administrativo. Os portugueses vo seguindo outra regra, o cdigo administrativo de 1836 que acabei de citar ao Senado foi feito pelo poder executivo com autorizao amplssima para o fazer; foi em virtude desta autorizao que o poder executivo organizou, depois naturalmente de bem aconselhado, e decretou o cdigo administrativo de 1836.

    O SR. DANTAS: O nosso cdigo do processo, tambm foi apresentado por um homem. O SR. MONTEZUMA: verdade, mas perdoe V. Ex., isso foi em outro tempo (rindo-se), em tempo

    em que no se considerou este procedimento uma violao expressa do pacto social, da nossa lei fundamental; hoje no, hoje os princpios esto mais alambicados e por isso creio que no teremos cdigo administrativo em toda a nossa vida. Se acaso o governo, ou o corpo legislativo estivesse disposto a dar um cdigo administrativo no qual estas questes por fora deviam entrar, havia de se comear por se estabelecer s administraes paroquiais, para depois se acabar nas altas administraes.

    O SR. DANTAS: Difficilem rem postulasti. O SR. MONTEZUMA: uma verdade Difficilem rem postulasti. Sou da opinio do honrado

    membro, e por isso que desejo que o projeto depois de votado em 2 discusso v outra vez s honradas comisses para elas oferecerem as emendas precisas, porque o projeto em minha conscincia no est completo.

    O SR. JOBIM: Tambm subscrevi a este projeto; mas unicamente com a inteno de no opor o menor embarao ao seu fim principal, quero dizer, criao da nova freguesia de que se trata, e da qual serei tambm fregus, visto que moro no lugar onde se pretende cria-Ia; apesar pois de ter subscrito ao projeto em discusso com este intento creio que no estou inibido de emitir francamente a minha opinio sobre ele no Senado, mormente quando aparece

  • agora de novo a idia de ser remetido outra vez s comisses para reconsider-lo. Sr. presidente, quanto mais penso sobre esta matria, mais me conveno de que o melhor que

    tnhamos a fazer era adotar a resoluo da Cmara dos Srs. Deputados tal qual de l nos veio, e deixarmo-nos de todas estas condescendncias que temos tido enviando e tornando a enviar o projeto s duas comisses reunidas. Darei a razo em que me fundo para acreditar que o projeto tal qual veio da outra cmara o melhor e o que devia passar nesta casa.

    Sr. presidente, temos seguido no Senado um costume que no me parece bom, porque pe as suas comisses em grandes embaraos; aparece aqui um projeto, sobretudo no caso deste, que j foi muito considerado na Cmara dos Srs. Deputados, e apenas se levanta algum membro para pedir que seja remetido a alguma comisso, o Senado sem mais discusses e por pequenas consideraes atende logo a este pedido, e a comisso a quem foi ele remetido deve achar-se necessariamente em graves embaraos, quando o sistema contrrio seria muito mais proveitoso, porque entrando o Senado primeiramente em uma discusso larga sobre a matria, e remetendo depois os projetos s comisses, elas neste caso se achariam mais orientadas para emitir um parecer que mais se aproximasse do bem e da vontade geral. este o sistema ordinariamente seguido em outros corpos deliberantes, nas associaes cientficas, por exemplo, aonde primeiramente se discutem certos objetos j bem considerados e s depois desta discusso que so enviados s comisses, se necessrio envi-los. No caso presente nada disto se deu: apenas apareceu o projeto em discusso, levantou-se um membro, afirmou somente que nela se atacava o direito de propriedade, e sem mais considerao foi remetido s duas comisses de constituio e negcios eclesisticos. Fazendo eu parte de uma destas comisses, cheio de escrpulos, e pensando que talvez o Senado estivesse persuadido de que tal ataque ao direito da propriedade tivesse havido, reconheci, e reconheceram todos de novo que tal ataque no tinha havido, como creio que todos hoje o reconhecem, no projeto que veio da Cmara dos Srs. Deputados. Mas, pela minha parte, desejoso de que a matria passasse, procuro destruir todas as dificuldades que se pudessem objetar, e uma entre elas sempre figuravam certos direitos, no de propriedade, mas de posse, que a Irmandade de Santo Antnio tinha incontestavelmente no todo daquele edifcio; julguei justo atender a eles, como atendi no primeiro

  • projeto das comisses de que fui relator. Ningum ignora que aquela irmandade est de posse de uma parte anexa igreja, da qual tira um interesse que consiste no aluguel que ela percebe da sociedade Auxiliadora das Artes, que ali celebra suas sesses, e de uma famlia que mora nas lojas dessa parte do edifcio, interesse este que talvez monte a 30% ou 40% mensais.

    Ora, estabelecida ali a freguesia, indispensvel para ela esta parte do edifcio hoje alugada; a igreja no tem outras acomodaes seno essas, nem se ho de fazer novas, quando essas podem servir. Ento entendi, e entenderam tambm as comisses, que apoderando-se o Estado destas acomodaes para a freguesia era justo que se desse irmandade uma indenidade anual proporcionada aos cmodos tomados e aos aluguis que a mesma irmandade atualmente percebe. Conseguintemente no primeiro projeto das comisses veio esta clusula, e ao mesmo tempo lembramo-nos de outra considerao, e que visto que no compromisso da irmandade de Santo Antnio dos Pobres se achava estabelecido que no haveria ali outra irmandade, justo era que se estipulasse na lei que ento a existente se encarregasse do servio do Sacramento, porque quem seria que o pudesse fazer? Seria o vigrio somente? Os vigrios no possvel que se possam prestar todo o servio necessrio para o culto do Sacramento, era preciso que algum mais se encarregasse deste servio, e uma vez, como disse, que a atual irmandade no queria nenhuma outra no seio daquela igreja, ento fosse ela a encarregada deste mesmo servio, como aconteceu em muitas outras igrejas; era, tambm em recompensa deste nus que se lhe dava aquela indenidade Entretanto esse primeiro projeto tendo sido reenviado s mesmas comisses sem motivo aprecivel, e estas comisses reunidas no tomando em considerao o que a primeira tinha proposto, nova relao se fez, estabelecendo-se unicamente que no haveria outra irmandade naquela igreja seno a atual, no se determinando quem ficar encarregado do servio do Sacramento, e ao mesmo tempo no se falando mais na indenidade. Remeteu-se tudo para o governo, como se ele pudesse por si s dar a indenidade que julguei de toda a justia dar-se.

    Portanto Sr. presidente, o embarao me parece ter ainda crescido com o novo projeto, as dificuldades so ainda maiores, porque a nova freguesia certamente no ter quem sirva o Sacramento, ou o seu servio se far mal.

    Agora, Sr. presidente, a respeito da grande questo de direito

  • de propriedade da igreja de Santo Antnio, eu que nestas matrias no costume dirigir-me por mim somente, procurei informaes de dois respeitveis prelados nossos. Aqui tenho presente uma carta do virtuoso e respeitabilssimo prelado de S. Paulo, que se exprime a este respeito por estas palavras: No h igreja alguma dedicada a santo diretamente, dedicam-se a Deus pelo santo a quem ela glorificou, como o sol da luz lua; assim nunca h coliso; e se pensa o contrrio, por ignorncia do catecismo...

    Ora, se as igrejas so todas dedicadas ao servio de Deus, segue-se que todas as vezes que o grande padroado julgar conveniente erigir qualquer delas em freguesia, no pode nem deve haver o menor obstculo da parte das irmandades, e este o princpio que tem sido seguido em todos os tempos no nosso pas. Se examinarmos o que se tem passado com todas as freguesias desta provncia e desta capital, reconheceremos a verdade desta minha insero. Assim, a igreja da freguesia das Cebolas, que me consta at que foi levantada com peclio particular, quando o Estado entendeu que a devia elevar categoria de freguesia, o seu proprietrio nenhum obstculo ops, nem se lhe deu indenidade alguma.

    O mesmo aconteceu com a igreja da freguesia de Santa Rita desta corte, que foi edificada por um membro da famlia do conselheiro Paulo Fernandes Vianna, creio que um tio dele, que tambm nenhuma objeo apresentou quando o Estado a elevou categoria de parquia. O mesmo aconteceu com a igreja de Santa Ana desta corte, que foi construda custa da irmandade dos militares de cavalaria. O mesmo ainda aconteceu com a igreja de S. Jos, que foi construda pelos primeiros pedreiros e carpinteiros que vieram de Portugal para o Rio de Janeiro h mais de 200 anos; e nenhuma indenidade se tem dado a estes particulares, e muito menos as irmandades, que as edificaram com esmolas.

    Portanto, senhores, me parece que ao padroado nenhuma objeo se pode fazer quando trate, se o julga conveniente, e s ele o pode julgar, de elevar qualquer igreja categoria de freguesia, de dar-lhe enfim um destino ainda mais elevado do que aquele para que ela foi construda.

    O SR. MONTEZUMA: Quanto igreja de S. Jos V. Ex. deve ler as cartas rgias que criaram a freguesia ali.

    O SR. JOBIM: Essas cartas rgias apenas conservavam a irmandade de S. Jos no seio da igreja.

  • O SR. MONTEZUMA: V. Ex. os deve ler para ver como que a autoridade competente reconheceu o direito de propriedade.

    O SR. JOBIM: Tanto no reconheo esse direito na espcie de que fala o nobre senador, que depois de uma grande demanda o conselho ultramarino de Portugal mandou um aviso para que a irmandade de Sacramento fosse considerada como tendo todo o direito na igreja para tudo aquilo que fosse necessrio para o servio da parquia.

    O SR. MONTEZUMA: V. Ex. est enganado. O SR. JOBIM: Perdoe-me, no estou; eu li todos esses papis. O SR. MONTEZUMA: Eu tambm os li; O SR. JOBIM: A irmandade de S. Jos venceu na relao do Rio de Janeiro a renhida demanda

    que teve por muito tempo com a irmandade do Sacramento, h cento e tantos anos; essa vitria foi celebrada com grandes festas foguetes, etc, pelos irmos de S. Jos; veio depois um aviso de Portugal mandando, apesar da vitria, que no ficasse dependente da irmandade de S. Jos o servio da irmandade do Sacramento em tudo o que fosse relativo parquia.

    O SR. MONTEZUMA: Est enganado. O SR. JOBIM: O litgio que agora reaparece funda-se em um engano de palavras. Aquela igreja foi

    construda principalmente custa de loterias, mas como se dizia que eram destinadas para a freguesia de S. Jos entendeu esta irmandade que senhora absoluta daquela igreja, e que a do Sacramento lhe deve ser em tudo subordinada; a demanda assim a mais injusta possvel da parte da irmandade de S. Jos...

    O SR. MONTEZUMA: Tambm est enganado nisso. O SR. JOBIM: Bem; no quero agora entrar mais nessa questo, mas no estou enganado,

    deixemos isso. O SR. MONTEZUMA: o melhor. O SR. JOBIM: Mas repito que a regra estabelecida que a respeito de qualquer igreja dedicada a

    algum santo sempre que o padroado tem entendido que a deve elevar categoria de freguesia no tem dado indenidade a ningum. O que se deve regular o servio do Sacramento, e isto o que me parece que no foi previsto no presente projeto. Por isso entendo que o melhor era entregarmo-nos inteiramente, ao uso e regra estabelecida at aqui, que o que faz o projeto da Cmara dos Srs. Deputados, e daqui por diante regularmos a matria em leis positivas que revoguem as que se acham estabelecidas ou a prtica seguida. Creio que ningum me

  • provar que pelas igrejas pblicas, dedicadas a santos, que tm sido elevadas a freguesia se desse a menor indenidade; ningum me mostrar que se pusesse a essa elevao qualquer obstculo com a alegao do direito de propriedade a tais igrejas da parte das irmandades.

    Portanto, Sr. presidente, parece-me que o mais que se podia fazer era conceder essa indenidade que o primeiro projeto das comisses concedia irmandade de Santo Antonio. Porm no insistirei muito sobre isto, porque o princpio que me parece atualmente o melhor a seguir-se o que se tem seguido a respeito de todas as igrejas que tm sido elevadas a matrizes no nosso pas.

    Quanto emenda de que o nobre senador pela Bahia falou, e creio que tambm o nobre senador pelo Rio de Janeiro, que tinha por fim marcar-se desde j uma consignao na presente lei para a construo de uma igreja para a nova parquia de que se trata, direi desde j que me parece que essa medida no pode deixar de ser considerada como parcial a favor desta freguesia, e portanto injusta, quando a necessidade de todas as outras igualmente flagrante. Seria certamente injusto consignar-se nesta lei desde j uma soma para igreja na freguesia de que se trata, quando todas as outras freguesias tm talvez uma necessidade mais urgente porque tm muito maior populao, como Santa Ana, Engenho Velho e outras que no tm igreja, ou que a tm muito mesquinhas e arruinadas.

    Portanto me parece que a emenda no tem cabimento na lei de que se trata, e foi principalmente por este motivo que pedi a palavra quando o nobre senador pela Bahia falava. Parece-me que com efeito de toda a justia que se d uma consignao para a construo de matrizes no municpio do Rio de Janeiro; mas no este o lugar prprio para isso, seria na lei do oramento ou em uma lei especial. Concluo dizendo que o melhor talvez abandonarmos todos os projetos das comisses reunidas, e seguirmos a regra estabelecida at aqui, com a qual est inteiramente de acordo o projeto que veio da Cmara dos Srs. Deputados.

    Achando-se na antecmara o Sr. ministro do imprio fica adiada a discusso, e sendo introduzido com as formalidades do estilo, toma assento mesa.

    Prossegue a 1 discusso, adiada pela hora na ltima, sesso; da proposta do poder executivo, e emendas da Cmara dos Srs. Deputados fixando a despesa e orando a receita geral do imprio para o exerccio de 1855 1856.

  • O Sr. Presidente convida ao Sr. vice-presidente a ocupar a cadeira, visto achar-se incomodado. Os Srs. Hollanda Cavalcanti e Visconde de Olinda cedem a palavra. No havendo mais quem a pea, encerra-se a 1, discusso. Retira-se o Sr. ministro para se votar, e aprovada proposta, com as emendas da Cmara dos

    Deputados, para passar 2 discusso. Tendo ingresso o Sr. ministro, entram em 2 discusso os pargrafos do art. 2 da proposta, com as

    respectivas emendas da Cmara dos Deputados, acerca do ministrio do imprio. O SR. PEDREIRA (Ministro do Imprio): Cumpre-me, Sr. presidente tomar em considerao

    diversas proposies que foram enunciadas nesta casa pelo ilustre senador pela provncia do Rio Grande do Norte, que encetou a discusso para a qual o Senado fez-me a honra de convidar. S a fora da necessidade de preencher dever to imperioso a isto me levaria, porque o acanhamento natural que sinto sempre que ocupo a tribuna hoje agravado pela idia de ter de falar perante uma corporao to respeitvel pelas luzes e posio de seus membros.

    O ilustre senador comeou seu discurso perguntando ao governo o que tem feito relativamente estada na Europa de S. A. Imperial a Sra. condessa dAquila, o declarou que fazia esta pergunta no porque estivesse convencido que o governo tinha direito de intervir em tal objeto, mas sim porque o atual Sr. presidente do conselho, discutindo-se o oramento do imprio em dias de agosto do ano passado, interpelara o meu antecessor a este respeito, e como que indicara que se devia converter a dotao anual de S. A. no dote por uma s vez.

    Respondendo ao nobre senador, devo informar-lhe que nenhuma medida tem sido iniciada neste sentido. S. A. Imperial acha-se na Europa com seu augusto esposo e os serenssimos prncipes seus filhos no gozo da licena que lhe foi prorrogada por S. M. o Imperador, licena cujo termo ainda no chegou. Achando-se SS. AA. Imperiais fora do Brasil, porm com licena, no se d o caso do art. 11 da lei de 29 de setembro de 1840 e de igual artigo do contrato dotal de janeiro de 1844. Se a S. A. I. aprouver tornar efetiva na Europa a sua residncia, neste caso tanto a citada lei como o respectivo contrato oferecem o meio de resolver-se este ponto sem ser preciso solicitar-se medida alguma do corpo legislativo.

  • Sendo assim, Sr. presidente, parece-me que inoportuna qualquer discusso neste terreno, e por isso o ilustre senador me permitir que me limite a estas palavras.

    Pelo mesmo motivo permitir tambm que no entre na questo constitucional que S. Ex. chegou a aventar o que reduz-se a saber se o imperador neste objeto procede em sua alta qualidade de chefe do poder executivo, ou se na qualidade no menos elevada de chefe da augusta famlia imperial. O que posso asseverar ao ilustre senador, e simplesmente como um fato, que as licenas concedidas a SS. AA. II. quer no ministrio do Sr. visconde de Maca em 1844, quer no do Sr. visconde de Monte Alegre em 1852, o foram por cartas imperiais referendadas pelo ministro do imprio.

    Limitando-me a estas palavras acrescentarei todavia que lendo os discursos do Sr. presidente do conselho no pude descobrir neles o alcance que o ilustre senador pretendeu enxergar. O nobre presidente do conselho no fez nessa ocasio mais do que chamar a ateno do governo para esse objeto, e no teve por fim provocar deciso alguma definitiva sobre ele, como francamente declarou no seu segundo discurso, e como foi entendido pelo ilustre senador por Pernambuco quando tambm falou sobre o objeto.

    Passou depois o nobre senador a analisar o tpico de oramento relativo, aos presidentes das provncias, e depois de ter feito consideraes alis muito acertadas acerca da circunspeco e critrio com que deve proceder sempre o governo na nomeao destes altos funcionrios pblicos, censurou o ministrio pela nomeao de juzes de direito para estes cargos; e disse que alm do mal que vinha s comarcas de serem privadas de seus juzes permanentes para serem dirigidas por outros que considerava provisrios, havia neste procedimento do governo incoerncia depois da promulgao da lei de 1850 que tinha estabelecido incompatibilidades indiretas.

    Quando, Sr. presidente, pudesse ser isto objeto de uma censura ao governo, no podia ela por certo ser bem cabida ao ministrio atual, que h sido muito parco na nomeao de juzes de direito para presidentes de provncia, e tanto que tendo de fazer onze de tais nomeaes, apenas nomeou um juiz de direito que o atual Sr. presidente da provncia do Rio de Janeiro, e este mesmo estava avulso, no tinha comarca designada. O Senado sabe que esse ilustre funcionrio era chefe de polcia da provncia de Minas quando foi nomeado presidente daquela provncia, que da passou a ocupar o cargo de ministro da justia, e que quando deixou o ministrio foi

  • ento nomeado presidente da provncia do Rio de Janeiro, e o governo preencheu logo depois o lugar de chefe de polcia de Minas com outro magistrado. H em verdade, alm, desses trs presidentes que so juzes de direito, e que tm sido conservados pelo ministrio atual, mas desses mesmos um no tem comarca, o Sr. presidente de Minas Gerais; restam portanto apenas dois, cujas comarcas esto ocupadas pelos respectivos substitutos. Assim, quando fosse bem cabida a censura, parece que o ilustre senador no a devia fazer ao ministrio atual, que tem sido, como acabei de mostrar, o mais limitado possvel na nomeao de magistrados para presidentes de provncia. Devo porm dizer ao nobre senador que no julgo fundada qualquer censura aos ministros que me precederam e que nomearam aqueles dois juzes de direito, e que o ministrio atual se considera inibido de fazer semelhantes nomeaes, no como regra que adote, mas em um ou outro caso, isto , sempre que julgue conveniente aos interesses de uma ou outra provncia que seja administrada por qualquer magistrado. Entendo que a lei de 1850 no teve por fim restringir o crculo dentro do qual tem o governo direito de escolher os presidentes, mas sim criar incentivos para que os juzes de direito preferissem conservar-se nas suas comarcas a aceitarem outras comisses, e por isso no lhes conta o tempo de servio fora da magistratura. O que da se segue que hoje os juzes de direito que o governo empregar como presidentes de provncias por julgar mais convenientes seus servios testa de uma provncia do que nas respectivas comarcas, prestam duplicado servio aceitando tais cargos, porque fazem hoje mais sacrifcios do que faziam antes, visto perderem pelo fato da aceitao e exerccio de uma comisso destas, tempo que lhes no levado em linha de conta para a sua antigidade.

    Nesse mesmo tpico do seu discurso o nobre senador censurou o ministrio pela nomeao que fez do Sr. Cruz Machado para presidente da provncia de Gois. A este respeito peo licena ao nobre senador para dizer-lhe que divirjo inteiramente do seu modo de pensar quanto ao conceito que forma desse senhor. Pelo lado da inteligncia ouvi sempre a muitos dos Srs. deputados de Minas Gerais que o conhecem de perto fazerem-lhe elogios; tive eu mesmo ocasio de apreciar na cmara o seu talento, que alis pode ser aquilatado por seus discursos que correm impressos. Quanto sua moralidade, creio que o nobre senador no poder apresentar um s fato contra ela.

  • Formo tambm bom conceito do juiz de direito a que o nobre senador se referiu, e que foi nomeado 1 vice-presidente daquela provncia. Responderei agora a outra parte do discurso do ilustre senador em que notou a facilidade com que o governo no s acedeu demisso pedida pelo Sr. ex-presidente de Gois, como fez a remoo do 1 vice-presidente para 3, atribuindo tudo isso a manejo eleitoral. Senhores, a remoo do 1 vice-presidente pareceu ao governo, necessria, e o ilustre senador mesmo deu a razo quando no correr do seu discurso disse que esse vice-presidente era candidato. Sendo assim, se o governo o conservasse na administrao da provncia como 1 vice-presidente, tendo ele de entrar logo em exerccio, havia de ser acoimado de t-lo feito de propsito, e com o nimo deliberado de proteger a sua candidatura diretamente, e quaisquer atos que fosse praticados por esse vice-presidente em tal ocasio seriam para logo taxados de parciais. H ainda outra considerao.

    Quando mesmo o Sr. Pdua Fleury devesse continuar na vice-presidncia sem aquele inconveniente, presumindo-se que tinha de partir para a corte, a fim de tomar assento no corpo legislativo, o que portanto no estaria l na poca da eleio, no convinha por isso mesmo a sua conservao, porque o governo no tinha nem a certeza de que o Sr. Cruz Machado aceitaria a comisso para que foi nomeado, nem da sua imediata partida para a provncia de Gois, e sendo um lugar to distante era mister que providenciasse ao mesmo tempo acerca do vice-presidente em que tinha de ficar em exerccio at chegada do novo presidente. Quanto a dizer o nobre senador que os presidentes hoje no so mais que meros agentes eleitorais, no sei a que fatos se referem o nobre senador, e pois no entrarei nesta questo, at porque ela j tem sido muito debatida nesta casa, quer em relao s eleies de Gois, quer s de S. Paulo, que j foram aprovadas, no tendo as do Rio de Janeiro sido nem ao menos objeto de contestao. Pelo que toca eleio de S. Paulo direi unicamente que o fato mesmo de haver entrado na lista trplice um candidato que se dizia que no tinha as simpatias nem o apoio do presidente da provncia, mostra bem claramente que nem violncias nem arbitrariedades houve ali por parte da autoridade, nem mesmo a ndole e o carter do ento presidente de S. Paulo se prestariam a suspeita de que ele fosse capaz de concorrer por qualquer forma para excessos ou violncias deste gnero. (Apoiados)

    Disse nessa ocasio o ilustre senador que o juiz de direito de

  • Santa Cruz em Gois havia sido removido sem o ter pedido. Procurei examinar este fato, e o meu colega o Sr. ministro da justia informou-me que pessoa autorizada por esse magistrado lhe tinha falado e pedido em seu nome tal remoo, o que lhe pareceu natural, mas que apenas soube que o juiz de direito assim removido para a capital desejava antes a comarca de Santa Cruz e que queria voltar para o seu lugar desfez-se o auto, que no tinha sido filho da necessidade de remover o mesmo juiz por amor daquela localidade, e ele voltou para a sua antiga comarca.

    Passou depois o ilustre senador a outro tpico do oramento do ministrio do imprio, concernente ao conselho de estado, e tendo rendido a homenagem devida aos conspcuos membros desta corporao, homenagem que por dever de verdade at de gratido eu fui o primeiro a prestar quando falei na Cmara dos Srs. Deputados em resposta a um nobre deputado pela provncia das Alagoas, declarou que o governo no dava a esta instituio a verdadeira importncia, e que o conselho de estado se achava reduzido hoje a fazer regulamentos quando o governo no os queria formular.

    Em primeiro lugar direi ao nobre senador que me parece injusta esta acusao. No me lembro de nenhum negcio muito importante e grave que tenha sido resolvido pelo ministrio, sem que o conselho de estado fosse ouvido sempre que o governo o tem julgado necessrio. Em segundo, lugar, direi que pelo que respeita seo dos negcios do imprio os distintos membros que a compem, e que se acham presentes, no esto reduzidos a fazer regulamentos; tm trabalhado e trabalhado muito, e ho sido constantemente um auxiliar poderosssimo do meu ministrio em muitos negcios importantes, sobre os quais os tenho consultado no s por escrito, como tambm em conferncias verbais.

    Ocupou-se em seguida o ilustre senador com a verba relativa instruo pblica, e tendo tido a bondade de declarar que reconhecia vantagens na reforma que pelo ministrio a meu cargo se havia feito na instruo primria e secundria da corte, passou a tratar das escolas de medicina, e por esta ocasio censurou-me por ter marcado ao diretor, tanto dessas escolas como dos cursos jurdicos, o ordenado de 4:000$ em lugar de 400$ que tinham.

    Cumpre-me Sr. presidente, retificar primeiro que tudo um engano em que se acha o ilustre senador. O diretor dos cursos jurdicos e das escolas de medicina no tinha unicamente o vencimento de 400$, mas sim o de 2:400$, assim o declarou a lei de 27 de junho

  • de 1838, quando elevando os vencimentos dos lentes dos cursos jurdicos e das escolas de medicina elevou tambm os do diretor. Tendo eu julgado conveniente, quando fiz os estatutos das escolas de medicina e de direito, que aumentassem os vencimentos dos professores, porque vi que eram mal pagos, e que ao passo que se lhes impunham novos deveres, que se lhes aumentavam sacrifcios, que se deixava de se lhes contar o tempo de servio em outras comisses, parecia de justia que ao mesmo tempo fosse melhorada a sua sorte, no era possvel que eu deixasse de elevar tambm os vencimentos dos diretores que no so correspondentes ao servio que prestam como chefes das faculdades de direito e de medicina. No meu relatrio eu tive ocasio de justificar esta medida, a eu disse que por mais bem pensada e por melhor elaborada que seja uma reforma, por mais cuidado que haja da parte do governo, no produzir vantagens reais na prtica se no for muito habilitado o pessoal que a tm de executar, e que o governo no poderia escolher bem esse pessoal se no oferecesse os vencimentos e vantagens correspondentes. De feito, senhores, nenhum homem de habilidade que pode descortinar diante de si uma carreira muito mais brilhante, se resignaria vida do magistrio com os vencimentos atuais, seno, ou como um lugar de espera at achar outro melhor, ou com a mira em acumular depois ao professorado outros meios de vida que lhe melhorem a existncia; disse eu tambm que o lente de medicina que fosse obrigado pela necessidade a manter, uma clnica regular para poder subsistir, que o lente de direito que fosse obrigado a advogar para viver, nunca poderiam ser perfeitos lentes, nem portanto prestar servios reais no magistrio. Alm destas razes, atendi igualmente, Sr. presidente, a que quando se criaram as academias de direito declarou-se que os lentes teriam o mesmo ordenado dos desembargadores. Mas o ilustre senador disse que este argumento de paralogismo no tem fundamento, porque os estatutos referiam-se somente aos ordenados que tinham ento os desembargadores e que eram 1:200$. Nesta parte permitir o nobre senador que lhe diga que me parece haver engano seu. No s a lei de 11 de agosto de 1837 que fundou as academias, como a de 7 de novembro de 1831 que lhes deu estatutos definitivos, sempre se referiram no somente aos ordenados que tinham os desembargadores naquele tempo, mas aos que de futuro tivessem. Assim o diz o art. 3 da lei de 11 de agosto nas seguintes palavras: "Os lentes proprietrios vencero os ordenados que tiverem os desembargadores das relaes e gozaro das

  • mesmas honras. Podero jubilar-se com o ordenado por inteiro, findos 30 anos de servio. A disposio desse artigo passou para a lei de 7 de novembro de 1831 na qual se encontra no art. 1

    do cap. 19 transcrita pelas mesmas palavras. Portanto, parece-me claro que no foi da mente do legislador nessa ocasio referir-se ao ordenado que ento tinham os desembargadores, mas como disse, ao que de futuro tivessem, foi uma verdadeira promessa que se fez; e tanto que quando depois se tratou de aumentar os vencimentos dos desembargadores, elevando-os 2:800$, e ocorrendo a observao da necessidade de se elevarem tambm os vencimentos dos lentes, disse-se que no cabia nessa hiptese a promessa alegada e feita pelas leis que citei, porquanto no se tinham aumentado os ordenados dos desembargadores, e somente se lhes havia concedido um maior vencimento a ttulo de gratificao. Esta razo porm, cessou desde que por uma lei, creio que do ano passado, o ordenado dos desembargadores foi elevado a 3:000$ alm de mais 1:000$ de gratificao.

    Mas ao passo, Sr. presidente, que eu entendia que era de justia aumentar os vencimentos dos lentes, eu no deixei de atender at certo ponto s circunstncias do pas, e por isso no procurei ainda assim desempenhar toda promessa da lei, porque no lhes dei um ordenado igual quele dos desembargadores, no aumentei mesmo o ordenado dos lentes. Digo que no aumentei, ou antes no propus aumento desse ordenado, porque 2:000$ j so na atualidade o ordenado dos lentes proprietrios que completam 25 anos de servio em virtude do disposto na lei do oramento de 1851, e pelos novos estatutos a jubilao que era de 20 passou a ser de 25 anos.

    O que fiz pois, foi somente indicar uma gratificao de 1:200$ por ano, concedida unicamente pro labore, e que portanto no lhes aproveita nem para as licenas, nem para a jubilao. Aumentando porm os vencimentos dos lentes com essa gratificao, eu no podia deixar de elevar tambm, como j tive a honra de dizer, os do diretor, tanto por ser o chefe do estabelecimento, como por pesar sobre ele maior trabalho, tendo a obrigao diria de comparecer no estabelecimento e de conservar-se nele muitas horas, tendo maior responsabilidade, dirigindo a faculdade, mantendo o seu regime, etc. Se o contrrio praticasse eu cometeria uma injustia que no fizeram nem as leis anteriores que citei, as quais deram sempre aos diretores maiores vencimentos do que aos lentes, nem a lei de 27 de junho de 1838, que concedendo aos lentes proprietrios a gratificao

  • de 800$, elevou a dos diretores, que era de 400$ a 1:200$, e assim no se procederia se no se reconhecesse que sobre os diretores pesava muito mais trabalho, muito mais responsabilidade do que sobre os lentes.

    Porm, senhores, preciso observar ao Senado que eu no aumentei esses vencimentos definitivamente; apenas formulei e apresentei ao corpo legislativo uma tabela propondo a elevao dos vencimentos atuais. Ao corpo legislativo pois compete apreciar em sua sabedoria se esse aumento, que nem uma exceo tem tido at o presente, justo; e pode aprov-lo, modific-lo ou rejeit-lo, se julgar conveniente, sem que disso resulte pesar algum ao ministro, que no fez mais do que propor o que lhe pareceu razovel em objeto puramente administrativo, e que portanto nenhum alcance poltico tem para o governo.

    Depois destes pontos a que tenho tido a honra de responder, fez objeto principal do discurso do nobre senador colonizao e a lei das terras. Disse o nobre senador que entendia que o governo havia perdido seu tempo e seu trabalho nesses regulamentos que promulgou, e que ho de ser votadas pelo Senado em pura perda as quantias solicitadas do corpo legislativo para este fim, porque os braos livres no podem vir para o Brasil.

    Concordo, Sr. presidente, at certo ponto que o sistema da venda das terras medidas e demarcadas em pequenos lotes um meio por si s muito lento que h de ser algum tanto demorado para a colonizao, a qual h de encontrar entre ns as mesmas, seno maiores dificuldades com que teve de lutar em muitas outras partes do mundo, que encontrou at nos Estados Unidos da Amrica em princpio, e que tm encontrado na Inglaterra. Mas no posso convir de forma alguma com o nobre senador quando diz desde j que sero perdidos todos os sacrifcios, todas as despesas que o Estado fizer com a medio e venda das terras devolutas.

    Em primeiro lugar, Sr. presidente, o nobre senador encarou a questo exclusivamente pelo lado da colonizao. Sem que eu esteja mesmo nesta parte de inteiro acordo com a opinio de S. Ex., como adiante mostrarei, lembrarei ao nobre senador que, uma vez que se faam as medies, que se dividam e demarquem os lotes, j no ser pequeno o benefcio que conseguiremos de extremar o domnio pblico do particular, de impedir as posses e usurpao dos terrenos nacionais, e de preparar o futuro do pas, deixando a nossos sucessores j disposta a principal e mais segura base, para o desenvolvimento

  • da colonizao espontnea e regular, para a realizao enfim de um sistema mais slido. Valeria mesmo a pena, Sr. Presidente, despender o Estado todos os anos 600 ou 1.000 contos de ris s para obter to importante resultado, embora a medio e a venda das terras no produzisse desde j e ao mesmo tempo o desenvolvimento da emigrao espontnea.

    Em relao porm mesmo colonizao, no nutro as apreenses do nobre senador, antes tenho esperanas e razes plausveis para crer que, desde que o governo tiver lotes de terras medidas e demarcadas em lugares convenientemente escolhidos, e recomendveis por sua salubridade e fertilidade, e pela facilidade dos meios de transportes, e os mandar anunciar, se o governo no lanar mo deste meio exclusivamente, se o acompanhar de outros estmulos, como tem feito a Inglaterra, nossas terras ho de ser procuradas pelos colonos e a emigrao h de dirigir-se para o Brasil, no em uma escala to larga como para os Estados Unidos, pois hoje a emigrao que para ali corre se calcula de 400 a 500.000 indivduos anualmente, no mesmo na em que vai para a Austrlia e outros pontos do globo, mas de uma maneira correspondente aos sacrifcios que o governo tiver feito, e que vista disto jamais se podero considerar perdidos.

    No creio mesmo, Sr. Presidente, que sejamos to infelizes que um sistema que tem por si a experincia esclarecida de quase 60 anos de um pas como os Estados Unidos; que um sistema que foi adotado por um governo ilustrado e refletido como o governo ingls, que o aplicou com algumas modificaes s suas colnias da Austrlia e de Nova Zelndia, de Van Diemen, etc., e tal qual no Canad, que esse sistema, digo, que tem por si o apoio de escritores distintos, e dos homens que mais ho estudado a matria; que um sistema que foi entre ns adotado depois de uma discusso importante e muito pensada, quer nesta, quer na outra casa; que esse sistema, digo, seja em sua aplicao no Brasil uma pura utopia, e que no sirva seno de pretexto vivo contra a experincia daqueles pases e contra as opinies de tantos homens prticos.

    Entendo sim que a sua realizao ser morosa; causas naturais, causas acidentais podem e devem retardar o seu desenvolvimento entre ns; so essas causas que o governo tem estudado e trata de estudar para aplicar-lhes os meios mais acertados sua remoo.

    Alguns desses meios j tm sido empregados pelo governo; outros esto sendo examinados pela repartio geral das terras pblicas,

  • que tm por um de seus principais objetos a colonizao. O governo est disposto, como eu j disse, parte em meu relatrio, parte na outra cmara, a empregar todos os meios indiretos, todos os meios auxiliares que dependerem dele para desenvolver a emigrao, sem perder contudo de vista o sistema da lei. No pretende, s porque h uma lei de terras, s porque h um regulamento que estabelece os meios prprios para fazer a venda dessas terras, e s porque promova e consiga sua medio, cruzar os braos e esperar que o desenvolvimento da colonizao venha unicamente da ao do tempo, e da emigrao espontnea propriamente dita!

    Assim, no est fora j de conceder prmios aos importadores de colonos, uma vez que provem que esses colonos, so moralizados e afeitos ao trabalho agrcola, j de promover e auxiliar convenientemente a criao de sociedades e companhias que mandem buscar colonos por sua conta e lhes dem pronto destino, ou os distribua pelos fazendeiros que contratarem os servios dos mesmos colonos.

    O que o governo, porm no julga prudente adotar nenhum desses meios indiretos exclusivamente; nem empreg-los sem a devida cautela, para evitar que especuladores se aproveitem dos auxlios que lhes forem prestados, em desvantagem real da colonizao e do seu crdito, e em detrimento dos cofres pblicos. O governo, por exemplo, no aprova nem condena priori o sistema de parceria, posto que no se considere um sistema de colonizao propriamente dito, mas sim como um meio de transio que pode ser til, uma vez que se tomem certas medidas e cautelas necessrias que no tm presidido celebrao de alguns contratos, e de cuja falta tem em regra provindo o mau sucesso de certos estabelecimentos fundados por este sistema.

    O que o governo no julga por ora prudente mandar vir diretamente os colonos custa do tesouro para distribu-los pelos fazendeiros. Deste objeto me ocupei no relatrio, e estou nestas idias de inteiro acordo com a ilustrada comisso que props o ltimo projeto do regulamento das terras; porque, senhores, se o governo tomar a si este objeto diretamente, para suprir a lavoura atual de braos, ver-se- em luta com tantas e to repetidas demandas, que chegaro a um ponto to exagerado que todos os recursos do tesouro seriam insuficientes para que sejam atendidas, pelo desejo alis muito natural que os fazendeiros tero de ver povoados seus estabelecimentos de braos teis, cuja aquisio nenhum trabalho lhes

  • custar, e se tiver de reduzir os pedidos, contemplando pequeno nmero de lavradores e dando preferncia aos que parecerem mais necessitados, ou mais no caso de aproveitarem os servios dos colonos, ter de lutar com muitas dificuldades para avaliar sempre com justia essas necessidades, e supondo-se mesmo que chegue a apreci-las devidamente, dar isto sempre lugar a muitos clamores, a muitas reclamaes e queixas daqueles indivduos que se julgarem preteridos. Demais, como mui bem ponderou a ultima comisso a que j me referi, os colonos que viessem por esse meio, ainda depois de entregues aos particulares julgar-se-iam sempre debaixo da tutela imediata do governo, que constantemente ver-se-ia forado a ouvir queixas contra os proprietrios rurais, cujo procedimento alis no convinha que deixasse de fiscalizar para manter o crdito da emigrao por este sistema; o que tudo roubaria muito tempo administrao e muitas vezes infrutferamente.

    Alm dos apontados, outros inconvenientes ocorrem contra esta importao direta por parte do governo que seria longo enumerar.

    Todavia entendo que no se deve estabelecer como regra a condensao absoluta deste meio; casos se podem dar em que ele aproveite, e no meu relatrio enumero os dois principais. Prefere porm o governo deixar ao interesse particular as condies com que os fazendeiros tenham de ajustar os colonos, ou com os importadores ou com os prprios emigrados quando os mandarem vir diretamente da Europa. Pensa o governo nos meios de obviar alguns inconvenientes a que o sistema de parceria entregue a si s pode dar lugar, e deseja estabelecer at onde for possvel certas cautelas para evitar que contratos celebrados irrefletidamente tragam consigo a runa dos proprietrios ou a infelicidade dos colonos, o que concorrer para aumentar o descrdito da emigrao, e para embaraar quanto for possvel a introduo de colonos desmoralizados e vagabundos, que em lugar de teis ao pas venham ser um verdadeiro flagelo dos fazendeiros que os contrataram, e que depois sirvam ainda em cima de fazer lanar sobre o Brasil e sobre os proprietrios a culpa do mau sucesso dos estabelecimentos. Do que tenho dito v o honrado membro que em substncia estamos de acordo. O governo no descansa unicamente na venda das terras, e pretende lanar mo de outros meios para favorecer a emigrao; mas entende que, quaisquer que sejam os meios adotados dentre aqueles a que, o nobre senador pareceu referir-se, tais meios sero sempre paliativos, e no daro um resultado slido e duradouro enquanto no houver como

  • base medio e venda das terras, enquanto no houver uma poro de lotes medidos e demarcados que se possam expor venda aos colonos que chegarem, e assim em vez de condenar o regulamento das terras o nobre senador devia dar-lhe o seu voto, porque tende a estabelecer o complemento de qualquer sistema que porventura se queira seguir, porque a base principal de que deve provir o desenvolvimento da emigrao espontnea. Alm do exposto, consta do meu relatrio que o governo se tem servido de diversos elementos, todos tendentes a promover a colonizao. Um desses elementos por sem dvida a criao de ncleos coloniais, isto , a fundao de colnias em terras frteis que estejam ao alcance de fcil meio de transportes. Se bem que esses ensaios no tenham sido todos felizes no pas, todavia o governo no desanima de conseguir que, mediante certas providncias e regras, cheguem os que formarem a estado de prosperidade; e desde que o governo puder alcanar este resultado, de esperar que as notcias que chegarem a Europa desse estado, e desde que ali constar que em sua proximidade h terras frteis junto ou perto de rios navegveis, ou contendo outros meios de fcil transporte, se desenvolva para esses pontos a corrente de emigrao, logo que os colonos souberem que encontraro essas terras j medidas e demarcadas.

    Pelo menos viro facilmente os parentes e amigos, e em geral os compatriotas dos primeiros colonos, porque a outras vantagens acrescer a de encontrarem nas vizinhanas dessas terras, pelo menos pessoas que falem a mesma lngua, que os podero hospedar e encaminhar convenientemente em seus primeiros trabalhos. nesta inteno que o governo mandou fundar ultimamente uma colnia na vila de Obidos, no Par, colnia que, alm de sua importncia poltica que o nobre senador no pode desconhecer, torna-se recomendvel no tocante agricultura; porque o governo est informado de que as terras ali so mui frteis, sabe que os meios de transporte so faclimos, e que as medies para a venda dos lotes poder-se-o fazer sem grande demora e sem dificuldade da parte de proprietrios de terrenos. Foi ainda nestas intenes que o governo mandou dispor os primeiros elementos para a fundao de duas colnias nos dois pontos extremos do Varadouro que se est fazendo nos rios Anhuac e Brilhante, com o fim de proteger a navegao entre as provncias do Paran e Mato Grosso, tendo tido primeiramente informaes minuciosas sobre a fertilidade dessas terras, e sobre sua salubridade e facilidade de meios de transporte. finalmente com o

  • mesmo intento que o governo tem tratado de dar impulso s colnias militares; e agora ocasio de eu responder a outro tpico do discurso do nobre senador a esse respeito.

    Disse o nobre senador que no sabe que colnias militares so essas, e que no se casam bem a organizao e servio militar com os trabalhos agrcolas. Responderei ao nobre senador que as nossas colnias militares no so por certo da mesma natureza e ndole das colnias militares que os romanos fundaram na Illyria e na Panonia, no so tambm da natureza das que depois mandaram estabelecer os reis da Hungria e os arquiduques dustria, com o fim de organizar uma fronteira militar e um cordo sanitrio, a fim de se defenderem contra as invases dos turcos, e preservarem-se da peste do Oriente; no so igualmente da natureza das colnias militares que na Rssia se fundaram de 1818 em diante no intuito de manter o exrcito num p mais considervel sem distrair braos da agricultura, sistema que custou rios de dinheiro, para chegar a elevar em 10 anos a 60.000 o nmero de colonos e a 400.000 o dos paisanos que eram considerados servos das coroas, e a quem se concederam terras com obrigao de sustentar os soldados enviados para essas colnias, os quais eram obrigados a retribuir-lhes com o seu trabalho. Tais colnias so condenadas por diversos escritores que tm tratado da matria, e na Rssia mesmo, segundo diz o Sr. Molinari, foi mister desarmar grande nmero desses colonos, no tendo a instituio correspondido s esperanas que de princpio havia despertado.

    a essas colnias militares que referiu-se o escritor a cujas palavras o nobre senador aludiu quando disse que no sabia como casar o trabalho militar com os servios agrcolas. As nossas colnias militares porm, como j disse, no so dessa natureza, nem tm semelhante fim, so colnias a que chamarei sui generis.

    Certos lugares do nosso pas no podiam ser povoados por muitos anos, se o governo no tomasse a deliberao de faz-los policiar, a fim de manter a segurana das pessoas que os quisessem habitar; e o meio que melhor pareceu ao governo para conseguir tal resultado foi o estabelecimento de colnias compostas de soldados ou de indivduos sujeitos a certo regime militar, para que pudesse haver a subordinao e disciplina indispensveis realizao daquele fim, e por isso deu-lhes a denominao de colnias militares. E porque os colonos prestam certos servios de polcia e segurana local, vencem uma etapa e um soldo durante o seu engajamento e pouco tempo depois.

  • Querendo-se porm que eles se apliquem agricultura, tambm concedem-lhes terras que cultivam em dias designados. No so pois tais colnias puramente militares, so tambm agrcolas; e como servem de ncleo de populao so verdadeiramente um meio de transio para colnias agrcolas, em que por fim se devem converter, logo que cesse a necessidade do seu regime militar. assim que eu as encaro, e neste intento que as tenho procurado desenvolver.

    Foi com semelhante inteno que se fundaram duas colnias militares nas matas do Jacuipe. com o mesmo fim que o governo mandou realizar ultimamente a criao de outra nas margens do Gurupi, na provncia do Maranho, a qual tem de estender a sua polcia at s margens do Turiassu, que eram, como todos sabem, um receptculo de escravos fugidos e de criminosos, o que era por certo bastante para que ningum fosse habit-las, apesar da fertilidade das terras, e das vantagens que podiam oferecer.

    Logo que o primeiro ncleo desses colonos esteja bem firmado o estabelecimento ser engrossado por colonos estrangeiros que o governo para ali enviar, e de futuro tornar-se- uma colnia puramente agrcola.

    No mesmo caso est a colnia que j em meu tempo o governo mandou fundar com duas filiais na estrada de Lajes em Santa Catarina com o fim de proteger moradores e viandantes das incurses de ndios bravios que por vezes tm ali praticado atos de barbaridade. No mesmo caso est ainda a colnia militar que tambm ultimamente se mandou criar nas margens do ribeiro do Urucu, confluente do rio Mucuri.

    Outro meio tambm tem o governo empregado para o desenvolvimento da colonizao. Consiste na concesso de terras que o governo fez companhia do comrcio e navegao do Amazonas, com obrigao de fundar diversas colnias; concesso esta que tem de ser melhor regulada no novo contrato que depende de definitiva deciso sobre algumas condies, e pelo qual a companhia ser obrigada a fundar dentro do prazo de 10 anos 12 colnias nos lugares que forem designados pelo governo e com indivduos das nacionalidades que ele julgar conveniente.

    O nobre senador sabe que a Frana se tem servido deste meio, e que ainda em abril de 1853 o governo francs concedeu 20.000 hectares de terras nas vizinhanas do Sethif na provncia Constantina, a uma companhia de Genoveses, com a obrigao de povoar

  • certo nmero de aldeias com famlias oriundas da Sua. de esperar que o emprego de todos esses meios de que o governo tem lanado mo, e nos quais prosseguir prudentemente, mas com perseverana, concorra para que a emigrao venha para o Brasil, dependendo porm tudo isto sempre da base essencial, que no meu entender a venda de terras, medidas e demarcadas em pequenos lotes, e a baixo preo, porm com um mnimo taxado.

    Mas disse ainda o nobre senador: "A emigrao no poder vir para o Brasil, porque receia da falta de segurana individual que h entre ns, visto que at o Sr. ministro da justia pintou o pas no seu relatrio em um estado desgraadssimo a esse respeito."

    Primeiramente direi que me parece ter havido alguma exagerao na maneira por que o nobre senador encarou essa parte do relatrio do Sr. ministro da justia; porm, seja como for, o que para mim lquido que o Sr. ministro da justia devia falar ao corpo legislativo com toda a franqueza e lealdade, muito mais quando ele tinha de propor e solicitar medidas tendentes a melhorar o nosso estado de segurana, e permita o nobre senador que lhe diga que eu no receio que esta franqueza traga o resultado que o nobre senador presume.

    Primeiramente, no consta do relatrio do Sr. ministro da justia que os crimes contra a segurana individual fossem praticados contra estrangeiros; so de ordinrio, como todos sabem, provenientes de rixas entre os nacionais, e isso de ordinrio nos sertes e nos lugares mais longnquos, onde a ao da polcia no est ainda bem desenvolvida. Talvez sejam na proporo de 1 para 100 (no tive tempo de averiguar o clculo) os crimes praticados contra estrangeiros; se, portanto, a notcia dada no relatrio a que aludi chegar Europa, tambm chegar com ela o relatrio do Sr. ministro da justia, e por ele se ver que o governo cuida em remover as causas principais desses crimes, e tanto que pelo ministrio da justia foi apresentado no corpo legislativo um projeto com este fim.

    Alm disso o nobre senador sabe que nem em todos os lugares do globo para onde costuma dirigir-se a emigrao h mais segurana individual do que no Brasil, entrando neste nmero alguns Estados da Unio Americana, onde no h por certo mais segurana individual e de propriedade do que h no imprio. (Apoiados.)

    Disse porm o nobre senador: "Criou-se uma repartio como a dos Estados Unidos, com um pessoal muito grande e inteiramente intil para um primeiro ensaio. O nobre senador, j havia dito no seu

  • primeiro discurso que o governo havia-se dirigido nessa criao pelo patronato. Sr. presidente, o governo quando teve de formular o regulamento de janeiro deste ano pensou muito

    a respeito da organizao da repartio que tinha de criar em virtude da lei de 18 de setembro de 1850, e entendeu que em vez de um conselho ou junta geral encarregada das terras pblicas, como estava proposto em diversos projetos oferecidos sua considerao, era mais conveniente seguir o exemplo dos Estados Unidos da Amrica, e organizar uma repartio com um chefe e empregados necessrios; at porque lhe pareceu que essa era a mente da lei.

    Mas, segundo o exemplo dos Estados Unidos, o governo porventura criou uma repartio com um pessoal ao menos aproximado em nmero ao da repartio daquele pas? O nobre senador, que tem bastante leitura nesta matria, h de saber que nos Estados Unidos a repartio geral das terras pblicas, alm de um comissrio geral, um oficial-maior, e dois chefes de sees, sendo um das reclamaes particulares sobre terras, e outro das medies, tm um solicitador, um chanceler ou registrador, um secretrio do presidente para a assinatura de patentes, mais de oitenta oficiais, e alm de litgrafos e estampadores, grande nmero de escreventes ou amanuenses.

    O SR. VISCONDE DE ABRANTES: E os gabinetes topogrficos, etc. O SR. MINISTRO DO IMPRIO: Possui reparties subordinadas nos 68 distritos em que esto

    divididos os Estados em que h terras pblicas. Cada uma dessas reparties tem um registrador e um solicitador e diversos empregados. H alm disso inspetores gerais nos distritos de medies com grandes vencimentos, aos quais at se d uma quota para aluguel de casas, salrio de criados, etc., alm de escriturrios, cujo nmero varivel. Ora, vista de todo esse pessoal, ningum dir que o governo, criando a repartio das terras da maneira por que a organizou, deu-lhe um pessoal aproximado ao dos Estados Unidos. Ao contrrio, no s esse pessoal no admite comparao, mas at ainda menor que aquele que se achava proposto no projeto primitivo oferecido sua considerao.

    O projeto primitivo, acerca do qual sabe o Senado que foram consultados muitos nobres senadores e deputados, alm de outras pessoas notveis, indicava a seguinte organizao. A repartio geral devia ser composta de uma junta, que alm de um presidente devia ter quatro vagas, sendo dois oficiais superiores do corpo de

  • engenheiros, um bacharel formado e um cidado sem dependncia de classe; devia ter uma secretaria composta de secretrio, trs oficiais, trs amanuenses, um porteiro e um contnuo; e alm disso devia haver em cada provncia do imprio uma junta com um presidente, dois vogais, etc.

    Entretanto, as pessoas que examinaram esse projeto no se opuseram a ela, execuo de dois nobres senadores pela provncia de Pernambuco que fizeram reflexes sobre esse pessoal. Ora, sendo este pessoal maior do que aquele que o governo estabeleceu, pensei que sobre esse ponto no aparecesse por isso acusao contra e o ministrio, e menos ainda, perdoe-me o nobre senador, que ela partisse de S. Ex., porque tendo sido uma das pessoas encarregadas de examinar o projeto primitivo, h de estar lembrado que deu um parecer declarando que nenhuma alterao tinha a propor-lhe, concordando em seu ofcio, creio que de novembro de 1850, com todas as disposies do dito projeto, e portanto com o pessoal indicado, que era mais numeroso.

    Perguntou o nobre senador o que se tem feito depois da publicao do regulamento, por onde principiou a medio e demarcao das terras, e se era verdade que ia principiar pela provncia do Rio de Janeiro. Perguntou tambm se o governo tem encontrado alguma oposio da parte dos proprietrios.

    Devo dizer ao nobre senador, em primeiro lugar, que sendo o regulamento para a execuo da lei das terras datado de janeiro deste ano, e sendo de maio o das medies, no era possvel que estas tivessem j principiado. Era preciso primeiramente montar as reparties filiais nas provncias, onde por haver terras devolutas em mais abundncias, e por outras circunstncias, cumpre que comece a medio.

    Informarei tambm ao nobre senador que o governo, em vez da inteno que constou ao nobre senador de principiar pelo Rio de Janeiro as medies, pretende mand-las comear pelas provncias fronteiras do imprio, nas quais h mais urgncia, por motivos que so bvios, de se demarcarem as terras para promover-se para ali a emigrao.

    Informarei tambm que o governo no espera encontrar grande oposio da parte dos proprietrios de terras, nem dificuldades que no possam ser removidas, porque est firme no propsito de marchar neste objeto com a devida prudncia.

    Falou o nobre senador em seu 2 discurso sobre a mortalidade

  • dos expostos que tm lugar na Santa Casa de Misericrdia, e perguntou a que causas o governo atribua essa mortandade, visto como as no referi em meu relatrio.

    Direi ao nobre senador que no enumerei as causas especiais de tal mortandade no meu relatrio porque elas no me pareciam ainda bem conhecidas pelos homens da cincia. Diversos mdicos tm sido encarregados de estud-las, e propor os remdios convenientes para remov-las mas esses remdios e as medidas que tm tomado a administrao da santa casa pouco tem aproveitado porque, o que prova que as causas ainda no foram completamente reconhecidas. Atribua-se como uma das causas a casa em que estavam os expostos, pelo que tratou-se de mud-los; mas dentro de poucos dias reconheceu-se que continuava o mal de que mais geralmente so vtimas as crianas.

    A questo por ora pertence ao domnio da cincia, e no serei eu por certo o mais habilitado para vir aqui manifestar a este respeito uma opinio com segurana.

    Entretanto direi que em geral o mal parece proveniente principalmente do estado em que essas crianas chegam de ordinrio ao estabelecimento, e parece mesmo inerente instituio, se bem que eu julgue ainda que poder ser atenuado por medidas que esto sendo estudadas.

    Este objeto j tem sido discutido nesta e na outra casa; sei que a administrao provisria da Santa Casa de Misericrdia, assim, como o falecido Sr. conselheiro Jos Clemente Pereira, empregava toda a ateno na maneira porque so tratados os expostos; e a atual administrao certamente h de prestar a to importante objeto cuidado muito particular; ela sem dvida far continuar os estudos que se tm feito e procurar conhecer exatamente as causas do mal e os meios de remedi-lo.

    A grande mortalidade dos expostos no se nota somente no nosso pas; d-se em larga escala ainda nos mais adiantados, como o nobre senador sabe, e como se v das respectivas estatsticas morturias.

    Falando dos vapores da companhia brasileira lamentou o nobre senador que o governo somente cuidasse de tomar medidas para evitar os abusos e incmodos que a bordo deles sofriam os recrutas depois de advertido por algumas vezes no corpo legislativo. Informarei ao nobre senador que antes da atual sesso do corpo legislativo j o governo tratava de dar providncias para que os recrutas

  • e soldados pudessem ser melhor acomodados a bordo dos nossos vapores, e se evitassem quaisquer abusos em seu transporte, e tanto que j se havia entendido com a diretoria da companhia para inovar o respectivo contrato, e regular este e outros objetos no intuito de melhorar esse navegao, como fiz ver mais desenvolvidamente na Cmara dos Srs. Deputados. Tratou o nobre senador tambm da catequese, e disse que se admirava de que ainda estivesse em vigor o regulamento de 24 de julho de 1845.

    Quanto ao juzo que o nobre senador firma desse regulamento, h de ver pelo meu relatrio que estamos de inteiro acordo. No tpico respectivo do mesmo relatrio ver o nobre senador que eu francamente declaro que as disposies de tal regulamento no tm na prtica correspondido as esperanas que fez nascer sua publicao.

    O SR. HOLLANDA CAVALCANTI: Eu nunca a tive. O SR. MINISTRO DO IMPRIO: Mas muita gente as teve. Tanto eu julgo necessria a reforma do

    regulamento de 24 de julho, que tendo mandado reunir os papis que havia na secretaria sobre este objeto, os enviei seo do conselho do Estado para indicar as alteraes que se devem fazer no dito regulamento. Ontem fui informado que o parecer brevemente ser apresentado ao governo. Mas disse o nobre senador: "Porque o governo no o revogou logo? E eu responderei: porque era necessrio haver outro que o substitusse, pois no devia ficar este servio inteiramente abandonado e sem regras que o dirigissem. necessrio, disse o ilustre senador, que o governo se convena de que o elemento religioso o essencial para a catequese. Concordo tambm neste ponto, e tambm no meu relatrio ver o nobre senador enunciada a minha opinio sobre a necessidade de vinda de missionrios para promoverem a catequese.

    Reconhecendo o governo que havia algumas dificuldades na corte de Roma que embaraavam a vinda destes missionrios, entrou em negociaes com a mesma corte para que se removessem tais dificuldades. Disse mais no meu relatrio que tanto o governo reconheceu a necessidade deles que tinha mandado buscar 30 para satisfazer as requisies dos diversos presidentes. Parece-me pois que por este lado do servio pblico o governo tem feito tudo quanto era possvel, tudo quanto estava ao seu alcance.

    Ocupou-se tambm o nobre senador com o arquivo pblico, e perguntou se o ministrio atual dava a esse estabelecimento a mesma

  • importncia que certos ministrios lhe tinham dado, ou se tinha inteno de extingui-lo; perguntou mais se na reforma da secretaria o governo tencionava acabar com aquela repartio, unindo-a secretaria do imprio.

    Se fosse preciso alguma prova de que o governo no tem a inteno de extinguir o arquivo pblico, o ilustre senador a acharia no meu relatrio, porque a declaro que o governo tendo reconhecido a necessidade de dar casa mais espaosa ao arquivo pblico, a fim de que melhor pudesse desempenhar os fins de sua criao; e que tendo encontrado como encontrou a maior facilidade e os melhores desejos da parte dos religiosos de Santo Antnio, tinha mandado proceder s obras, necessrias numa parte do seu convento para nela estabelecer essa repartio.

    Quando se procede assim com uma instituio fica fora de dvida que no se tem em fito extingui-la. Declarei tambm no meu relatrio que o regulamento porque se rege o arquivo pblico no pode hoje corresponder ao seu destino, e que por isso o governo julgava conveniente retoc-lo. Quanto a reunir o arquivo secretaria do imprio, posto que eu j tenha mais ou menos opinio formada a este respeito, pedirei licena para no dizer desde j qual ela seja, porque podem at o momento da reforma haver circunstncias que a faam modificar.

    Falou depois o nobre senador sobre a biblioteca pblica, e censurou o governo por ter comprado a livraria do Dr. Pedro de Angelis; disse que no sabe que valor possam ter esses livros, que supe ser nenhum em relao ao preo que custaram, nem que obras sero essas que no haja na biblioteca pblica. Devo informar que quando entrei para o ministrio j essa livraria estava ajustada: o nosso ministro em Montevidu tinha tido autorizao para o ajuste, e em conseqncia dele foi a livraria remetida para o Rio de Janeiro, e o Dr. Angelis apresentou-se para receber o seu valor; o governo no podia deixar de pag-lo, porque era um ajuste feito pode-se dizer que solenemente. No se pense porm que o ministro que nos precedeu procedesse mal mandando fazer essa compra, pois ao contrrio entendo que fez uma aquisio importantssima para a nossa biblioteca pblica.

    Esta livraria em vez de ser composta, como o ilustre senador sups ou como o informaram, de obras inteis, de folhetos sem valor e sem significao, contm obras importantssimas sobre a histria da Amrica, sobre viagens interessantes, notcias importantes

  • sobre limites, muitos mapas, etc. Se o nobre senador quiser convencer-se disto, eu posso oferecer sua considerao o catlogo dessas obras, que corre impresso, e que trago comigo. Saiba alm disto o nobre senador que quando j estava feito o ajuste, o Dr. Angelis recebeu de um livreiro da Inglaterra uma carta com um oferecimento do preo mais avultado do que aquele por que o Brasil tinha ajustado a sua livraria. Eu no tive ocasio de ver esta carta, mas um ilustre senador, que conselheiro de estado, que me merece, como a todos que o conhecem, particular considerao, viu-a, e est perfeitamente informado disto.

    O SR. VISCONDE DE ABRANTES: Apoiado. O SR. MINISTRO DO IMPRIO: Direi mais ao nobre senador que esta biblioteca compe-se de

    2.785 volumes impressos, alm de 1.291 documentos, mapas e manuscritos importantes. Devo mais informar ao nobre senador que muito insignificante a poro de livros dessa livraria que j existissem na nossa biblioteca; muito mais de trs partes de toda a poro adquirida no havia na biblioteca pblica. Algumas das obras so rarssimas, e s se poderiam obter com muita dificuldade. Ainda hoje verifiquei novamente tudo isto, mandando chamar o empregado que faz as vezes do bibliotecrio, o qual me informou miudamente a este respeito. Se o nobre senador, repito, quiser conhecer a importncia destas obras, posso oferecer sua considerao o respectivo catlogo, e se quiser verificar a existncia dessas obras, fcil faz-lo na biblioteca pblica.

    Passando ao tpico de obras pblicas, perguntou o nobre senador se acaso no seria melhor, em vez de votarem-se todos os anos 510 contos para obras gerais e auxlio das provncias, abrir-se um crdito para se contrair um emprstimo com o fim de acudir-se s obras mais urgentes das provncias, e ir empregando a consignao anual dos 600 e tantos contos no pagamento dos juros e na amortizao desse emprstimo. Parece-me que o ilustre senador no quis enunciar a este respeito uma opinio j formada, e apenas apresentar a idia considerao do Senado. Mas como pediu a minha opinio, direi, sem entrar em maior desenvolvimento que semelhante operao por ora ao menos no me parece prudente, alm de que no produziria resultado satisfatrio.

    Primeiramente um emprstimo nas atuais circunstncias para ocorrer s necessidades mais urgentes das provncias seria um

  • mal para o tesouro, por no estarem ainda bem conhecidas as obras mais necessrias. Na atualidade este emprstimo ou teria de ser muito exagerado para que se atendesse maior parte

    das provncias e fosse eficaz, ou teria de ser aplicado s obras principais de algumas somente, e isto daria lugar a cimes das que no fossem contempladas, cimes que no convm alimentar.

    Demais, o emprstimo no dispensaria o corpo legislativo de votar todos os anos uma quota para outras obras urgentes, gerais ou provinciais que fossem aparecendo, e que no pudessem deixar de ser prontamente atendidas.

    Parece-me pois, sem por ora, como disse, entrar em mais longo desenvolvimento, que esse meio no convm ser adotado.

    Sr. presidente, devo concluir, porque assaz me tenho j alongado; mas no o posso fazer sem tomar em considerao uma proposio do nobre senador enunciada no princpio do seu primeiro discurso. Nessa ocasio o ilustre senador, fazendo-me alguns elogios que no mereo, mas que assaz lhe agradeo, disse que lamentava a minha posio por fazer parte de um ministrio que tinha por presidente do conselho o Sr. visconde de Paran, o qual entendia que como tal devia impor sua vontade a todos seus colegas, e que devia exigir deles que subscrevessem a todos os atos de sua vontade sem a menor reflexo; que enfim os queria fiscalizar julgando-se superior a todos os ministros.

    Qual seja, senhores, a posio do Sr. presidente do conselho em relao aos outros ministros, e qual a destes em relao a seu chefe, j foi explicado nesta casa tanto pelo Sr. presidente do conselho, como pelos Srs. ministros da guerra e de estrangeiros, e na outra pelo Sr. ministro da justia; todos protestaram contra semelhante proposio. Hoje chegou a minha vez de tambm fazer o meu protesto.

    Eu pensei, Sr. presidente, que semelhantes insinuaes, que s poderiam ter algum merecimento, sendo inexatas, quando lanadas no pblico como um recurso da oposio para ver se assim conseguia plantar a desconfiana e a desarmonia entre ministros, despertando por esta forma o seu amor prprio, teriam cessado depois das declaraes dos ministros a quem me referi.

    O SR. D. MANOEL: Peo a palavra.

  • O SR. MINISTRO DO IMPRIO: Porque se algum de boa f pudesse pensar que na realidade o Sr. presidente do conselho erigia-se juiz dos atos dos seus colegas, e seu superior, impondo-lhes a sua vontade, e ao mesmo tempo pensava que os ministros atuais eram to inbeis ou to fracos que se humilhassem ao ponto de serem menos instrumentos da vontade alheia, ou to pouco dignos que praticassem atos contrrios sua conscincia, teria decerto j mudado de opinio vista das explicaes a que aludi; e aqueles,mesmos que empregassem tais proposies como recurso de oposio (declaro que no fao aluso ao nobre senador), deviam t-lo j abandonado por convencidos de sua ineficcia. As palavras porm do honrado senador provando que S. Ex. ao menos ainda nutre as mesmas idias a este respeito, sendo proferidas na minha presena obrigam-me a tambm declarar; pela primeira, mas ltima vez, que desde que tenho a honra de sentar-me nos conselhos da coroa no tenho encontrado da parte do Sr. presidente do conselho seno muita estima e muita considerao, muita lealdade e dedicao, qualidades estas a que procuro retribuir por maneira correspondente!

    Os ministros, Sr. presidente, decidem hoje os negcios como sempre foram decididos. Amigos uns dos outros, respeitando-se mutuamente, no tendo felizmente aparecido entre eles o menor grmen de rivalidade, expem todos nas conferncias suas opinies com a maior franqueza e liberdade. Animados todos por motivos nobres e tendendo ao mesmo fim, chegam de ordinrio a um acordo depois de discutirem sobre a soluo das questes mais importantes que correm pelos respectivos ministrios. Amigo da discusso e at da contrariedade, como bem disse na Cmara dos Srs. Deputados o Sr. ministro da justia, o Sr. visconde de Paran ligado a todos ns por laos anteriores e firmes de muita estima e de muito respeito, no tem no gabinete seno aquela influncia moral e legtima a que lhe do direito a sua ilustrao e a longa prtica dos negcios pblicos. Como presidente do conselho exerce apenas a ao benfica que indispensvel para que haja sempre nos atos do ministrio unidade de pensamento, e se mantenha a solidariedade que essencial na soluo das questes polticas e nas mais importantes da administrao. Desde que entrei para o ministrio. Sr. presidente, ainda uma s vez no me achei colocado na posio de subscrever a um ato qualquer contra a minha vontade. Tomo conscienciosamente a responsabilidade de todos os meus atos, quaisquer que eles tenham

  • sido, tomo-a pelos dos meus colegas, e isto que digo de mim digo de todos eles. Pedirei pois licena ao nobre senador para rogar-lhe que em vez de lamentar a minha posio

    acredite na verdade das minhas palavras, e na sinceridade dos meus sentimentos, porque se convencer ento que eu no tenho seno motivos para cada vez mais apreciar a sbita honra de haver entrado para o ministrio, tendo por colega e por presidente do conselho um estadista to distinto quanto ilustrado, e to perfeito cavalheiro como o Sr. visconde de Paran.

    Peo desculpa ao Senado por ter tomado o seu precioso tempo com estas consideraes. Fi-las por entender que