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515 IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA Análise de risco de estabilidade do talude jusante de uma barragem em regime de operação Cavalcante, S.P.P.C. Universidade Federal do Ceará / Pernambuco, Brasil, [email protected] Vieira, V.P.P.B. Universidade Federal do Ceará, Brasil, [email protected] Coutinho, R.Q. Universidade Federal de Pernambuco, Brasil, [email protected] Resumo: O presente trabalho trata da análise de risco associada à estabilidade do talude de jusante, no regime de operação com reservatório cheio, da barragem de Angicos situada no município de Coreaú – CE. Foram utilizados os métodos probabilísticos (Simulação Monte Carlo e método PEM (Point Estimate Method)) e da teoria dos conjuntos difusos. A análise de risco através da utilização destes métodos considerou a variabilidade de 3 (três) parâmetros geotécnicos, de resistência (c - coesão e φ – ângulo de atrito) e de peso específico aparente (γ), do aterro compactado da barragem. Os resultados obtidos apresentaram valores de risco de deslizamento (FS<1) nulos (simulação Monte Carlo – distribuição normal e triangular), de 0,37% (PEM – distribuição normal), de 0% (números difusos triangulares = µ±σd), e 0,36% (números difusos triangulares = µ±2.σd). Os resultados referentes ao risco do fator de segurança apresentar-se abaixo do valor recomendado em projetos (FS<1,5) apresentaram valores de 7% (simulação Monte Carlo – distribuição normal), de 0% (simulação Monte Carlo – distribuição triangular), de 4,37% (PEM – distribuição normal), de 0% (números difusos triangulares = µ±σd), e 6,89% (números difusos triangulares = µ±2.σd). Em análise complementar (números difusos triangulares = µ±2.σd) pôde-se observar o risco de deslizamento do talude de jusante (FS<1) em função do ângulo de inclinação do talude de jusante. Como conclusões observou-se que para a geometria do talude de jusante executado (com fator de segurança de 2,4 (parâmetros geotécnicos médios CL e SM - presente análise) e de 2,3 (parâmetros e análise de projeto)), o risco de deslizamento em função da variabilidade dos parâmetros γ, c e φ apresentou um valor máximo de 0,37%, e que para os materiais analisados o risco só apresentaria valores maiores que zero para inclinações superiores a 21,78º (sendo a inclinação do talude de jusante executado igual a 21,8º) e fator de segurança inferiores a 2,475 (sendo para o talude executado FS=2,4). Abstract: The present work presents the risk analysis associated to the stability of the downstream slope, in the operation regime with full reservoir, of the Angicos dam located in the municipal district of Coreaú - CE. They were used the probabilistic methods (Monte Carlo simulation and

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515IV COBRAE - Conferência Brasileira sobre Estabilidade de Encostas - Salvador-BA

Análise de risco de estabilidade do talude jusante deuma barragem em regime de operação

Cavalcante, S.P.P.C.Universidade Federal do Ceará / Pernambuco, Brasil, [email protected]

Vieira, V.P.P.B.Universidade Federal do Ceará, Brasil, [email protected]

Coutinho, R.Q.Universidade Federal de Pernambuco, Brasil, [email protected]

Resumo: O presente trabalho trata da análise de risco associada à estabilidade do talude dejusante, no regime de operação com reservatório cheio, da barragem de Angicos situada no municípiode Coreaú – CE. Foram utilizados os métodos probabilísticos (Simulação Monte Carlo e métodoPEM (Point Estimate Method)) e da teoria dos conjuntos difusos. A análise de risco através dautilização destes métodos considerou a variabilidade de 3 (três) parâmetros geotécnicos, deresistência (c - coesão e φ – ângulo de atrito) e de peso específico aparente (γ), do aterro compactadoda barragem. Os resultados obtidos apresentaram valores de risco de deslizamento (FS<1) nulos(simulação Monte Carlo – distribuição normal e triangular), de 0,37% (PEM – distribuição normal),de 0% (números difusos triangulares = µ±σd), e 0,36% (números difusos triangulares = µ±2.σd). Osresultados referentes ao risco do fator de segurança apresentar-se abaixo do valor recomendadoem projetos (FS<1,5) apresentaram valores de 7% (simulação Monte Carlo – distribuição normal),de 0% (simulação Monte Carlo – distribuição triangular), de 4,37% (PEM – distribuição normal), de0% (números difusos triangulares = µ±σd), e 6,89% (números difusos triangulares = µ±2.σd). Emanálise complementar (números difusos triangulares = µ±2.σd) pôde-se observar o risco dedeslizamento do talude de jusante (FS<1) em função do ângulo de inclinação do talude de jusante.Como conclusões observou-se que para a geometria do talude de jusante executado (com fator desegurança de 2,4 (parâmetros geotécnicos médios CL e SM - presente análise) e de 2,3 (parâmetrose análise de projeto)), o risco de deslizamento em função da variabilidade dos parâmetros γ, c e φapresentou um valor máximo de 0,37%, e que para os materiais analisados o risco só apresentariavalores maiores que zero para inclinações superiores a 21,78º (sendo a inclinação do talude dejusante executado igual a 21,8º) e fator de segurança inferiores a 2,475 (sendo para o taludeexecutado FS=2,4).

Abstract: The present work presents the risk analysis associated to the stability of the downstreamslope, in the operation regime with full reservoir, of the Angicos dam located in the municipaldistrict of Coreaú - CE. They were used the probabilistic methods (Monte Carlo simulation and

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INTRODUÇÃO

Em geral, na analise de estabilidade de taludes,os métodos de cálculo para obtenção do fator desegurança baseia-se em parâmetros geotécnicosmédios dos solos de fundação e do maciço dabarragem. A variabilidade destes parâmetros emgeral é desconsiderada, e os parâmetrosadotados no projeto dependem do projetista eproduzem um resultado determinístico.

Atualmente tem sido introduzida na análisede estabilidade de taludes além da análisedeterminística, a análise probabilística queenvolve a análise do risco de estabilidadeconsiderando a variabilidade dos parâmetrosgeotécnicos. Diversos autores nacionais einternacionais têm abordado o assunto:ALONSO, E. E. (1976); VANMARCKE (1977);TANG (1984); WHITMAN (1984); BEGARDO &ANDERSON (1985); LI & LUMB (1987); HARR(1987); RÉTHÁTI, L. (1988); CHRISTIAN ET AL.(1992); PACHECO (1990); OKA & WU (1990);

VIEIRA & MIRANDA (1990); LIMA (1991);SANDRONI & SAYÃO (1992); MOSTYN & LI(1993); YANG ET AL. (1993); CHRISTIAN ETAL. (1994); DELL’AVANZI (1995); GUEDES(1997); FONTENELE & VIEIRA (2001).

A análise de estabilidade baseada na teoriado equilíbrio limite determina o fator de segurançapela seguinte expressão:

Onde:MR: momento resistente ao deslizamentoMS: momento solicitante favorável aodeslizamento.

O valor de MR é função dos parâmetrosgeotécnicos de resistência (c - coesão e φ -ângulo de atrito) e da tensão normal efetivaatuante (σ = γ.z – u ; sendo γ o peso específicodo material e u a poro-pressão da água). E o valor

PEM (Point Estimate Method)) and of the theory of the fuzzy groups. The risk analysis through theuse of these methods considered the variability of 3 (three) geotechnical parameters, of resistance(c - cohesion and φ - friction angle) and unite weight (γ), of the compacted embankment of the dam.The obtained results presented values of landslide risk (FS <1) null (simulation Monte Carlo -normal and triangular distribution), 0,37% (PEM - normal distribution), 0% (triangular fuzzy numbers= µ±σd), and 0,36% (triangular fuzzy numbers = µ±2.σd). The referring results to the risk of safety’sfactor to come below the value recommended in projects (FS <1,5) they presented values of 7%(simulation Monte Carlo - normal distribution), 0% (simulation Monte Carlo - triangular distribution),4,37% (PEM - normal distribution), 0% (triangular fuzzy numbers = µ±σd), and 6,89% (triangularfuzzy numbers = µ±2.σd). In complement analysis (triangular fuzzy numbers = µ±2.σd) the risk oflandslide (FS <1) of the downstream slope could be observed in function of the angle of inclinationof the downstream slope. As conclusions were observed that for the geometry of the slope executed(factor of safety of 2,4 (medium geotechnical parameters CL and SM - present analysis) and of 2,3(parameters and analysis of project)), the landslide risk in function of the variability of the parametersγ, c and φ presented a maximum value of 0,37%, and only present larger values than zero forinclinations above 21,78º (being the inclination of the downstream slope equal to 21,8º) and factorof safety under 2,475 (being for the executed slope FS=2,4).

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de MS é função da geometria do talude, do pesoespecífico do material γ e das condições de fluxode água e poro-pressão, de cargas externas esismos.

A abordagem determinística tradicional temsido a de se considerar nos projetos um FS tantomaior quanto maiores forem as incertezas. ATabela 1. apresenta os fatores de segurançamínimos recomendados na análise deestabilidade de taludes em função dos custos econseqüências dos deslizamentos e dasincertezas nos parâmetros de resistência(COUTINHO, 1997).

Tabela 1. – Fatores de segurança mínimosrecomendados na análise de estabilidade detaludes (COUTINHO, 1997)

CRUZ (1973) transcreve opiniões deCASAGRANDE (1965) sobre análiseprobabilística e risco calculado, como sendo: “Ouso do conhecimento imperfeito, orientado pelojulgamento e experiência, para estimar a amplitudeprovável de todas as quantidades pertinentes eque entram na solução de um problema”. “Adecisão de uma possível margem de segurança,ou de risco, tendo em conta fatores econômicose as grandezas das perdas que resultariam seuma ruptura ocorresse”. GUIDICINI & NIEBLE(1985) e CRUZ (1973) apresentam uma correlação

interessante proposta por SHERMAN entre oFS e a probabilidade de ruptura (Figura 1).

Figura 1. – Correlação entre o Fator de Segurança FS ea probabilidade de risco (SHERMAN a partir de CRUZ,

1973).

Segundo MELLO ET AL. (2002) “é inegávele frustrante a demonstrada insuficiência dosmodelos determinísticos em uso ultrapassado,somado a erros humanos, como dominantes naincapacidade de aprimorar as previsões decomportamentos tanto seguros sem exageros,quanto econômicos sem risco”. Recentementeno 12th Panamerican Conference on SoilMechanics and Geotechnical Engineering –2003 esse assunto mereceu destaque numasessão única sobre “Risk and Reliability”.

2. CASO EM ESTUDO

A barragem de Angicos (Figura 2.) estálocalizada na Região Noroeste do Estado do

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Ceará, entre os municípios de Coreaú eFrecheirinha, ficando o eixo barrável numalocalidade chamada Angicos, próximo aAraquém (distrito de Coreaú) (Figura 3.). AFigura 4 apresenta a seção transversal deprojeto da Barragem adotada nas análises deestabilidade. A barragem de seção do tipohomogênea com filtro vertical tipo chaminé,foi construída sobre uma área de origemsedimentar (rocha arenito), conferindo-lheuma particularidade única dentre as demaisexecutadas no Estado, que foram construídassobre formação geológica cristalina. Suaconstrução foi concluída em 1998, com custoestimado de R$2.713.209,36 em março de 1996,apresentando capacidade de 56,1 milhões dem3 , área da bacia hidrográfica 282,8 Km2,extensão de 1367 m e altura máxima de 18,9 m.

Segundo as investigações geotécnicas decaracterização realizadas, o solo do maciçoda barragem foi classificado como CL (argilade baixa plasticidade) e SM (areia siltosa), eos parâmetros de resistência coesão (c = 45,8kPa), ângulo de atrito (φ = 28,3º) e pesoespecífico aparente (γ = 20,7 kN/m3) foramobtidos através de um único ensaio decisalhamento direto.

Figura 2. – Vista da barragem de Angicos – Coreaú - CE

3. MÉTODOS UTILIZADOS E ANÁLISESREALIZADAS

No presente trabalho foram realizadas análisesde estabilidade pelo método modificado deBISHOP (1955) através do programa SLOPE/WStudent Edition – GEO SLOPE (1999). Tendoem vista a escassez de dados dos parâmetrosgeotécnicos de resistência obtidos através deensaios de laboratório, com base nacaracterização e classificação geotécnica foramestimados os valores de c, φ, e γ segundo tabelaapresentada por CARVALHO (1983) do U. S.Bureau of Reclamation baseada em resultadosde 1500 ensaios de solos. A Tabela 2 apresentaos parâmetros geotécnicos referentes ao maciçoda barragem, onde, para as análisesprobabilísticas do presente trabalho, foiconsiderada a variabilidade dos parâmetrosgeotécnicos em função da distribuição normale da arbitragem dos valores limites (=µ ± σd) e(=µ ± 2.σd) para distribuição triangular enúmeros difusos triangulares. Nas análisesprobabilísticas foram utilizados os métodos deSimulação Monte Carlo (para distribuiçãonormal e triangular (µ ± σd)), PEM - PointEstimate Method (distribuição normal) e daTeoria dos Conjuntos Difusos (números difusostriangulares (=µ ± σd) e números difusostriangulares (=µ ± 2.σd)), a Tabela 3 apresentaos métodos probabilísticos e distribuiçõesutilizadas.

Figura 3. - Localização da Barragem de Angicos –Municípios de Coreaú e Frecheirinha

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Tabela 3 – Métodos probabilísticos e distribuições utilizadas

Figura 4 – Seção transversal de projeto da barragem de Angicos adotada nas análises de estabilidade.

Tabela 2 – Parâmetros geotécnicos referentes ao maciço da barragem

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Figura 5 – Análise de estabilidade realizada através do programa da GEO-SLOPE (1999) para os parâmetrosadotados em projeto (a) e para os parâmetros médios adotados no presente trabalho (b).

4. MÉTODO DA SIMULAÇÃO MONTECARLO

A simulação Monte Carlo, realizada segundometodologia apresentada por VIEIRA (2003), foiefetuada gerando-se números aleatórios entre0 e 1 (através de planilha eletrônica) econhecidas as distribuições dos parâmetros γ,c e φ (distribuições normal e triangular), foramgerados os trios aleatórios de γ, c e φ (100 triospara cada distribuição) para o aterro compactadoda barragem. Para cada trio de parâmetros obtido( γ, c e φ ) obteve-se o fator de segurança (FS)correspondente através do programa da GEO-SLOPE (1999) , registrando-se os valores de FS

obtidos na planilha eletrônica para o cálculo dorisco.

Uma análise complementar foi realizadaautomaticamente através do Programa GEO-SLOPE (2002), opção do método probabilísticode Monte Carlo, considerando para cadaparâmetro geotécnico a média e o desvio padrão,no qual foram realizadas 1000 análises paracombinações aleatórias dos parâmetrosgeotécnicos.

4.2. DISTRIBUIÇÃO NORMAL

As distribuições normais dos parâmetros γ, c eφ foram obtidas através dos valores da média e

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desvio padrão apresentados na Tabela2.Figuras 6 (a), (b) e (c) apresenta asdistribuições normais adotadas.

As Foram obtidos valores aleatóriosindependentes de γ, c e φ segundo umadistribuição normal através da planilha eletrônica.A partir dos valores obtidos de γ, c e φ foramobtidos os valores do fator de segurança (FS)(um total de 100 valores), através do programade estabilidade de taludes da GEO-SLOPE (2002),e registrados na planilha eletrônica para o cálculodo risco. A Figura 6 (d) apresenta a curva de

freqüência acumulada do FS obtida, através daqual pôde-se obter um risco calculado de FS<1igual a 0% e de FS<1,5 igual a 7%.

Na análise automática realizada através doprograma GEO-SLOPE (2002), foi realizada comum universo de 100 e 1000 valores de FS,obtendo-se uma probabilidade de FS<1 de0,02% e 0,04% respetivamente e de FS<1,5 de1,06 e 1,29% respectivamente. A Figura 7 (a) e(b) apresenta a distribuição normal e acumuladados valores obtidos considerando 1000combinações.

Figura 6 – Distribuições normais dos parâmetros γ, c e φ e normal acumulada do FS.

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4.2. DISTRIBUIÇÃO TRIANGULAR

As distribuições triangulares dos parâmetrosγ, c e φ foram obtidas através da arbitragemdos valores mínimo, médio e máximoapresentados na Tabela 2. A Figura 8 (a), (b) e(c) apresenta as distribuições triangularesadotadas.

Foram obtidos valores aleatóriosindependentes de γ, c e φ segundo umadistribuição triangular a partir das expressõesabaixo:

Para:

A partir dos valores obtidos de γ, c e φ foramobtidos os valores do fator de segurança (FS)(um total de 100 valores), através do programade estabilidade de taludes da GEO-SLOPE

(2002), e registrados na planilha eletrônica parao cálculo do risco. A Figura 8 (d) apresenta acurva de freqüência acumulada do FS obtida,através da qual pôde-se obter um riscocalculado de FS<1 igual a 0% e de FS<1,5 iguala 0%.

5. MÉTODO PEM (POINT ESTIMATEMETHOD)

O método PEM, proposto por ROSEMBLUETH(1975) e exposto por HARR (1987), foi utilizadono presente trabalho considerando avariabilidade dos parâmetros γ, c e φ em funçãoda média e do desvio padrão apresentado naTabela 2 para distribuição normal adotando aseguinte formulação:

Número de termos envolvidos no cálculo

±=kji ,,

Figura 7 - Distribuição normal (a) e acumulada (b) dos valores de Fator de Segurança (FS) obtidos pela simulaçãoMonte Carlo automática (1000 combinações) através do programa GEO-SLOPE (2002)

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A partir dos valores de fator de segurançaobtidos através dos 8 termos (combinações)estabelecidos no método PEM, o risco foi entãocalculado. A Tabela 3 apresenta a planilha decálculo do risco pelo método PEM.

6. MÉTODO DIFUSO

O método difuso (ZADEH, 1965; FAUFMANNE GUPTA, 1985) é definido como umageneralização da teoria clássica dos conjuntos.Na abordagem clássica (probabilística) cadaelemento tem pertinência que vale 1 ou 0,indicando pertinência ou não pertinênciarespectivamente. No caso do conjunto difusovários são os graus de pertinência para oselementos definidos no intervalo [0,1].

Figura 8 – Distribuições triangulares dos parâmetros γ, c e φ e acumulada do FS.

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6.1. NÚMEROS DIFUSOS TRIANGULARES

A Figura 9 (a), (b) e (c) apresenta os númerosdifusos triangulares (= média ± desvio padrão)adotados na análise considerando os extremosdos níveis de pertinência 0 - 0,25 – 0,5 – 0,75 - 1,totalizando 9 análises de estabilidade. A Tabela4 apresenta a planilha de cálculo do risco e aFigura 8 (d) apresenta os números difusosobtidos para FS.

6.2. NÚMEROS DIFUSOS TRIANGULARES(= média ± 2. desvio padrão)

A Figura 10 (a), (b) e (c) apresenta as os númerosdifusos triangulares (= média ± 2. desviopadrão) adotados na análise considerando osextremos dos níveis de pertinência 0 - 0,25 – 0,5– 0,75 - 1, totalizando 9 análises de estabilidade.A Tabela 5 apresenta a planilha de cálculo dorisco, e a Figura 9 (d) apresenta os númerosdifusos obtidos para FS.

O conjunto difuso é definido por:.

Onde Z é o universo onde os elementos de zestão definidos e é a função de perti-nência de z em .

O risco difuso K de deslizamento do taludepode ser definido, na lógica difusa, através daexpressão:

onde Z=FS

No presente trabalho o risco difuso foicalculado, através da arbitragem dos valoresmínimo, médio e máximo dos parâmetros γ, c eφ apresentados na Tabela 2, considerandonúmeros difusos triangulares (= µ ± σd) enúmeros difusos triangulares (= µ ± 2.σd) , paraos níveis de pertinência iguais a 0 - 0,25 – 0,5 –0,75 - 1, totalizando um total de 9 análises deestabilidade para cada tipo de distribuição(totalizando 18).

Tabela 3 – Risco Calculado pelo método PEM

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Figura 9 – Números difusos triangulares em função do nível de pertinência dos parâmetros γ, c e φ adotados e dosvalores de FS.obtidos na análise de estabilidade.

Tabela 4 - Risco difuso calculado pelo método dos números difusos triangulares (= média ± desviopadrão) dos parâmetros γ, c e φ .

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Figura 10 – Números difusos triangulares (= média ± 2. desvio padrão) em função do nível de pertinência dosparâmetros γ, c e φ adotados e dos valores de FS obtidos na análise de estabilidade.

Tabela 5 - Risco difuso calculado pelo método dos números difusos triangulares (= média ± 2.desvio padrão) dos parâmetros γ, c e φ

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6.3. ANÁLISE COMPLEMENTAR –INCLINAÇÃO DO TALUDE VERSUS RISCODIFUSO

Na aplicação do método da teoria dosconjuntos difusos foi realizada uma análisecomplementar visando verificar a influência dainclinação do talude de jusante no valor do riscodifuso calculado considerando os númerosdifusos triangulares (= média ± 2. desviopadrão) dos parâmetros γ, c e φ (ver Tabela 5 eFigura 9) . A Tabela 6 apresenta os fatores desegurança obtidos para cada inclinação dotalude, e a Figura 11 apresenta o conjunto dosnúmeros difusos dos respectivos fatores desegurança.

As Figuras 12 (a) e (b) apresentam gráficosrelacionando o risco de deslizamento em funçãoda inclinação do talude em graus e o risco de

deslizamento em função do fator de segurança,respectivamente. Pôde-se observar umcomportamento crescente do risco com oaumento da inclinação do talude e decrescentecom o aumento do fator de segurança,semelhante ao observado por SHERMAN (apartir de CRUZ, 1973),e em concordância comum comportamento esperado.

Figura 11 – Conjunto dos números difusos dos valoresde FS obtidos nas análises de estabilidade para diferentesinclinações do talude de jusante.

Figura 12 – (a) relação entre a inclinação do talude de jusante e o risco difuso de deslizamento; (b) relação entreo FS

médio e o risco difuso de deslizamento.

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7. ANÁLISE DOS RESULTADOS

A Tabela 7. apresenta um resumo dos resultadosobtidos através dos diferentes métodosprobabilísticos (Monte Carlo e PEM - PointEstimate Method) e da teoria dos conjuntosdifusos considerando a variabilidade dosparâmetros geotécnicos γ, c e φ do aterro dabarragem homogênea de Angicos. Pôde-seobservar que o valor do risco calculado dedeslizamento (FS<1) apresentou-se entre 0 e0,37 %, apresentando o valor máximo do riscocalculado pelos métodos PEM e dos númerosdifusos triangulares (= média ± 2. desviopadrão). Com relação ao risco do fator desegurança apresentar-se inferior ao valor

mínimo recomendado em projeto para taludesde jusante em regime de operação (FS<1,5) orisco calculado apresentou-se entre 0 e 7%,apresentando o valor máximo do risco calculadopelo método de Monte Carlo distribuição normal(7%) e da teoria dos números difusostriangulares (= média ± 2. desvio padrão)(6,89%) seguidos do método PEM (4,37%).

8. CONCLUSÕES

Através das análises de risco associadas àestabilidade do talude de jusante em regime deoperação da barragem de Angicos – Cearárealizadas no presente trabalho,considerandoa variabilidade dos parâmetros geotécnicos γ,

Tabela 7. – Resumo dos resultados obtidos da análise de risco.

Tabela 6 - Fatores de segurança obtidos para cada inclinação do talude – método dos númerosdifusos triangulares (= média ± 2. desvio padrão)

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c e φ do aterro da barragem em função daclassificação do solos do maciço da barragem(SM – Areia Siltosa; e CL – Argila de BaixaPlasticidade) e dos parâmetros de resistênciapropostos U. S. Bureau of Reclamation(CARVALHO, 1983) baseada em resultados de1500 ensaios de solos, tem-se como conclusões:

• Apesar da variabilidade dos parâmetrosconsiderados o risco de deslizamento(FS<1) apresentou um valor máximo de0,37% (PEM e números difusostriangulares (=µ ± 2.σd)), enquanto que orisco do fator de segurança apresentar-seinferior ao valor recomendado em projeto(FS<1,5) apresentou um valor máximo de7% (Monte Carlo e números difusostriangulares (=µ ± 2.σd)).

• No método de Monte Carlo automático doGEOSLOPE, distribuição normal,observou-se que para um maior númerode combinações obteve-se um maior valordo risco.

• Os resultados obtidos indicam que o riscoapresentou valores mínimos e dentro deuma margem considerada aceitável naopinião dos autores.

• Os baixos valores do risco de deslizamentoobtidos, muito provavelmente, se devemao fator de segurança correspondente aotalude de jusante executado (FS=2,3 comparâmetros de projeto e FS=2,4 comparâmetros médios considerados nopresente trabalho).

• Na análise complementar da relação entreo risco difuso de deslizamento e ainclinação do talude, observou-se que parainclinações α inferiores a 21,78º (talude de1: 2,45) o risco apresenta-se nulo, e a partirdaí apresenta comportamento crescentecom o aumento da inclinação segundo aexpressão .

• Na análise complementar relacionando orisco difuso de deslizamento ao fator desegurança médio, observou-se umcomportamento crescente com a

diminuição de FSmédio

, segundo aexpressão , semelhante ao observado porSHERMAN (a partir de CRUZ, 1973) , eque o risco difuso apresenta valores nulospara fatores de segurança superiores a2,475.

• Uma análise mais completa baseada navariabilidade de parâmetros geotécnicosobtidos através de vários ensaios decisalhamento direto (c e φ )e decompactação ( γ ) do material do maciçoda barragem, indicaria valores maispróximos da realidade dos locais dasjazidas da barragem.

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