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18 Morphometric analysis of tissue response to medullary mixed bovine bone implanted in cranial bone defect of rats Rodrigo Cardoso de OLIVEIRA 1 , Flávia Godoy IANO 2 , Danilo Donizetti Januário JANUNE 3 , Tânia Mary CESTARI 4 , Rumio TAGA 5 , Eulázio Mikio TAGA 6 , José Mauro GRANJEIRO 7 Análise morfométrica da resposta tecidual ao osso bovino misto medular implantado em defeito ósseo na calvária de rato 1. Professor Associado do Departamento de Ciências Biológicas, Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, SP, Brasil. 2. Doutoranda do Curso de Ciências Odontológicas Aplicadas, área Estomatologia e Biologia Oral, Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, SP, Brasil. 3. Doutorando do Programa de Medicina, Odontologia e Ciências Farmacêuticas do Primeiro Departamento de Cirurgia Reconstrutiva Oral e Maxilofacial Universidade de Okayama, Japão. 4. Doutora em Odontologia, área Estomatologia e Biologia Oral, Departamento de Ciências Biológicas, Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, SP, Brasil 5. Professor Titular do Departamento de Ciências Biológicas, Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo, Bauru, SP, Brasil. 6. Pesquisador Sênior, Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, Duque de Caxias, RJ, Brasil. Professor Adjunto do Núcleo de Terapia Celular, Hospital Universitário Antônio Pedro, Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, Brasil. Endereço para correspondência: Rodrigo Cardoso de Oliveira Departamento de Ciências Biológicas – Facul- dade de Odontologia de Bauru – Universidade de São Paulo Al. Octávio Pinheiro Brisolla, 9-75 17012-101 – Bauru – São Paulo – Brasil E-mail: [email protected] Recebido: 01/06/2011 Aceito: 31/08/2011 ABSTRACT The purpose of this study was to evaluate bone repair of critical size defects in the calvarias of rats treated with bovine bone mixed disk (OBM) porous medullary. We used 30 adult male Wistar rats that underwent surgery to confection a bone defect of 8 mm diameter circular removing diploe calvaria completely. The defects were filled with a disc of OBM 8 mm diameter and 3 mm thick, while the control group the bone defect was filled with blood clot. The animals were killed after 30, 60 and 120 days. The pieces were removed, fixed in 10% buffered formalin, demineralized and processed by standard technique to staining with hematoxylin and eosin. The sections were submitted to descriptive histology and morphometry (volume density). The results showed a small decrease of the implanted material in the course of the experimental periods, suggesting a slow and gradual resorption of the OBM. On the other hand, there was a small new bone formation observed in both groups (test and control) and formation of dense connective tissue areas of the bone defect at 120 days also in the two groups. The connective tissue in the test group was able to penetrate the pores of the material and occupy these spaces over the periods. Within the limits of this study, it can be said that the OBM is biocompatible, however, does not have osteoinductive or osteoconductive capacity in critical defects in the calvaria of rats. KEY WORDS: Bone regeneration. Materials testing. Bone resorption. RESUMO O propósito deste trabalho foi avaliar o reparo ósseo de defeito de tamanho crítico em crânio de ratos tratados com disco de osso bovino misto (OBM) medular poroso. Foram utilizados 30 ratos Wistar machos adultos submetidos à cirurgia para confecção de um defeito circular de 8 mm de diâmetro removendo toda a díploe da calvaria. Os defeitos foram preenchidos com um disco de OBM de 8 mm de diâmetro por 3 mm de espessura, enquanto no grupo controle o defeito ósseo foi preenchido com coágulo sanguíneo do próprio animal. Os animais foram mortos após 30, 60 e 120 dias. As peças foram removidas, fixadas em formol 10% tamponado, desmineralizadas e processadas pela técnica histotécnica padrão para coloração em hematoxilina e eosina. Os cortes foram submetidos à análise histológica descritiva e morfometria (densidade de volume). Os resultados demonstraram uma pequena diminuição do material implantado com o decorrer dos períodos experimentais, sugerindo uma reabsorção lenta e gradual do OBM. Em contrapartida foi observado uma pequena neoformação óssea nos dois grupos (teste e controle) e formação de tecido conjuntivo denso nas áreas do defeito ósseo aos 120 dias também nos dois grupos. O tecido conjuntivo, no grupo teste, foi capaz de penetrar nos poros do material e ocupar esses espaços com o passar dos períodos. Dentro dos limites desse estudo, pode-se afirmar que o OBM é biocompativel, no entanto, não apresenta capacidade osteocondutora ou osteoindutora em defeitos críticos na calvária de ratos Wistar. PALAVRAS-CHAVE: Regeneração óssea. Teste de materiais. Reabsorção óssea. Innov Implant J, Biomater Esthet, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 18-23, maio/ago. 2011

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Morphometric analysis of tissue response to medullary mixed bovine bone implanted in cranial bone defect of rats

Rodrigo Cardoso de OLIVEIRA1, Flávia Godoy IANO2, Danilo Donizetti Januário JANuNE3, Tânia Mary CESTARI4, Rumio TAGA5, Eulázio Mikio TAGA6, José Mauro GRANJEIRO7

Análise morfométrica da resposta tecidual ao osso bovino misto medular implantado em defeito ósseo na calvária de rato

1. Professor Associado do Departamento de Ciências Biológicas, Faculdade de Odontologia de Bauru, universidade de São Paulo, Bauru, SP, Brasil.2. Doutoranda do Curso de Ciências Odontológicas Aplicadas, área Estomatologia e Biologia Oral, Faculdade de Odontologia de Bauru, universidade de São Paulo, Bauru, SP, Brasil.3. Doutorando do Programa de Medicina, Odontologia e Ciências Farmacêuticas do Primeiro Departamento de Cirurgia Reconstrutiva Oral e Maxilofacial universidade de Okayama, Japão.4. Doutora em Odontologia, área Estomatologia e Biologia Oral, Departamento de Ciências Biológicas, Faculdade de Odontologia de Bauru, universidade de São Paulo, Bauru, SP, Brasil5. Professor Titular do Departamento de Ciências Biológicas, Faculdade de Odontologia de Bauru, universidade de São Paulo, Bauru, SP, Brasil.6. Pesquisador Sênior, Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, Duque de Caxias, RJ, Brasil. Professor Adjunto do Núcleo de Terapia Celular, Hospital universitário Antônio Pedro, universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, Brasil.

Endereço para correspondência:Rodrigo Cardoso de OliveiraDepartamento de Ciências Biológicas – Facul-dade de Odontologia de Bauru – universidade de São PauloAl. Octávio Pinheiro Brisolla, 9-7517012-101 – Bauru – São Paulo – BrasilE-mail: [email protected]

Recebido: 01/06/2011Aceito: 31/08/2011

AbstrActThe purpose of this study was to evaluate bone repair of critical size defects in the calvarias of rats treated with bovine bone mixed disk (OBM) porous medullary. We used 30 adult male Wistar rats that underwent surgery to confection a bone defect of 8 mm diameter circular removing diploe calvaria completely. The defects were filled with a disc of OBM 8 mm diameter and 3 mm thick, while the control group the bone defect was filled with blood clot. The animals were killed after 30, 60 and 120 days. The pieces were removed, fixed in 10% buffered formalin, demineralized and processed by standard technique to staining with hematoxylin and eosin. The sections were submitted to descriptive histology and morphometry (volume density). The results showed a small decrease of the implanted material in the course of the experimental periods, suggesting a slow and gradual resorption of the OBM. On the other hand, there was a small new bone formation observed in both groups (test and control) and formation of dense connective tissue areas of the bone defect at 120 days also in the two groups. The connective tissue in the test group was able to penetrate the pores of the material and occupy these spaces over the periods. Within the limits of this study, it can be said that the OBM is biocompatible, however, does not have osteoinductive or osteoconductive capacity in critical defects in the calvaria of rats.

Key words: Bone regeneration. Materials testing. Bone resorption.

RESUMOO propósito deste trabalho foi avaliar o reparo ósseo de defeito de tamanho crítico em crânio de ratos tratados com disco de osso bovino misto (OBM) medular poroso. Foram utilizados 30 ratos Wistar machos adultos submetidos à cirurgia para confecção de um defeito circular de 8 mm de diâmetro removendo toda a díploe da calvaria. Os defeitos foram preenchidos com um disco de OBM de 8 mm de diâmetro por 3 mm de espessura, enquanto no grupo controle o defeito ósseo foi preenchido com coágulo sanguíneo do próprio animal. Os animais foram mortos após 30, 60 e 120 dias. As peças foram removidas, fixadas em formol 10% tamponado, desmineralizadas e processadas pela técnica histotécnica padrão para coloração em hematoxilina e eosina. Os cortes foram submetidos à análise histológica descritiva e morfometria (densidade de volume). Os resultados demonstraram uma pequena diminuição do material implantado com o decorrer dos períodos experimentais, sugerindo uma reabsorção lenta e gradual do OBM. Em contrapartida foi observado uma pequena neoformação óssea nos dois grupos (teste e controle) e formação de tecido conjuntivo denso nas áreas do defeito ósseo aos 120 dias também nos dois grupos. O tecido conjuntivo, no grupo teste, foi capaz de penetrar nos poros do material e ocupar esses espaços com o passar dos períodos. Dentro dos limites desse estudo, pode-se afirmar que o OBM é biocompativel, no entanto, não apresenta capacidade osteocondutora ou osteoindutora em defeitos críticos na calvária de ratos Wistar.

PALAVRAS-ChAVE: Regeneração óssea. Teste de materiais. Reabsorção óssea.

Innov Implant J, Biomater Esthet, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 18-23, maio/ago. 2011

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ARTIgOS CIENTíFICOS

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INTRODUÇÃO

O avanço da medicina regenerativa e a engenharia de tecidos trouxe enormes possiblidades e expectativas na área da saúde. O crescimento dessas áreas aconteceu concomitantemente com o avanço científico das últimas décadas e o desenvolvimento de ferramentas capazes de avaliar processos teciduais/moleculares de forma mais apurada11.

Especificamente a regeneração do tecido ósseo tem sido pesquisada objetivando alcançar materiais que apresentem, entre outras características, biocompatibilidade, previsibilidade, fácil manuseio, segurança e preço acessível8,12,19, capaz, ainda, de funcionar como um material carreador para a engenharia de tecidos8,17. Diversos candidatos ao posto de material carreador vem sendo desenvolvido e pode-se fazer um divisão simples segundo a origem desses materiais: oriundos de outros tecidos animais/vegetais (como é o caso da hidroxiapatita natural, colágeno tipo I, colágeno tipo IV, polímero de mamona etc.)5,17 e polímeros (ácido poliglicólico, ácido polilático, ácido poliéster etc.)5 e cerâmicas sintéticas (hidoxiapatita sintética, cerâmica bioativa, biovidro, zircônia etc.)3,5,9. No entanto, nenhum desses materiais foi capaz de atender todas as necessidades exigidas17. Um dos desafios é encontrar um material que se aproxime da estrutura encontrada no tecido hospedeiro16. No caso do osso, um material que tenha uma semelhança biológica e apresente resistência mecânica para ser usado em algumas regiões.

O osso bovino processado vem sendo estudado e usado, uma vez que o mesmo apresenta sua estrutura “desenhada” biologicamente, além de possuir os componentes similares aos do tecido ósseo humano4,6,27. Alguns trabalhos do nosso grupo tanto com o osso bovino desproteinizado ou desmineralizado mostraram que ambos apresentam biocompatibilidade in vitro24, in vivo e capacidade osteocondutora1,20-23,26-27,29. Uma rota de processamento possível do osso bovino preserva a porção inorgânica de hidroxiapatita e a porção orgânica de colágeno, sendo chamado de osso bovino misto (OBM). Assim esse novo biomaterial poderia se aproximar mais da composição do osso natural. Trabalhos anteriores mostraram que esse material em sítios subcutâneos7,14 e intraósseos28, foi biocompatível, demonstrou capacidade osteocondutora e bioabsorção28. Entretanto, até o momento, não foi determinada a sua eficiência em promover o reparo ósseo em condições limites, como é o caso de defeitos ósseos críticos, os quais não se reparam naturalmente.

Nesse sentido o objetivo deste estudo foi avaliar, além da bicompatibilidade, a capacidade osteocondutora/osteoindutora do osso bovino misto (OBM) medular implantado em defeito de tamanho crítico na calvária de rato.

MATERIAL E MÉTODOS

MATERIALOssos bovinos foram obtidos de um frigorífico, em seguida esses foram

submetidos à limpeza mecânica e tratamento químico com peróxidos e agentes caotrópicos, neutralizado em tampão fosfato e liofilizado24. Utilizou-se o osso bovino misto (OBM) medular em discos com 8 mm de diâmetro e 3 mm de espessura esterilizado previamente por radiação gama (25 KGy).

ANIMAISForam utilizados 30 ratos Wistar (Rattus norvergicus) machos, com

aproximadamente 300g cada dividos aleatoriamente em 4 grupos experimentais, de acordo com os períodos de 30, 60 e 120 dias após a cirurgia (5 animais/período).

A pesquisa foi realizada segundo as normas recomendadas pelo Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA), sendo que o trabalho foi aprovado pelo Conselho Comitê de Ética em pesquisa animal da Faculdade de Odontologia de Bauru – Universidade de São Paulo.

PROCEDIMENTOS CIRÚRgICOSOs animais foram anestesiados, via intramuscular, com uma solução

de cloridrato de ketamina (Dopalen) e cloridrato de xilazina (Rompum) ambos produzidos pela Agribrands do Brasil Ltda., Paulínia – SP, na proporção de 1:1 (v/v), numa dose de 0,14 mL/100g de peso do animal18. Foi realizada a tricotomia na região frontoparietal e a anti-sepsia da calvária. Em seguida, foi feita uma incisão, com bisturi de lâmina nº 15, descolamento do periósteo e confecção do defeito utilizando uma trefina cirúrgica com 8 mm de diâmetro em baixa rotação, sob irrigação constante de soro fisiológico. Nos grupos experimentais o defeito ósseo foi preenchido com um disco de OBM de 8 mm de diâmetro e 3 mm de espessura, exceto nos animais do grupo controle, que tiveram o defeito preenchido só por coágulo. O retalho total foi reposicionado e suturado com fio de seda nº4 (EthiconTM, Johnson & Johnson, São José dos Campos, Brasil).

COLETA DAS PEÇASDecorrido os períodos experimentais os animais foram mortos de acordo

com as normas do Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA). As calotas foram removidas e fixadas, por uma semana, em formol 10% tamponado.

ANÁLISE hISTOLÓgICAAs peças foram imersas em solução de EDTA (0,5 M em pH 7,4),

que foi renovada semanalmente, para a desmineralização. Após a desmineralização, as peças foram lavadas em água destilada por 24 horas e receberam processamento histotécnico padrão para cortes semi-seriados no sentido látero-lateral de 5 µm de espessura e foram coradas com hematoxilina e eosina padrão18.

Em seguida, os cortes histológicos foram analisados morfometricamente ao microscópio para determinação da densidade de volume por pontos (%) do remanescente de material implantado, tecido ósseo neoformado, tecido de granulação e tecido fibrótico. A densidade de volume por unidade de área ocupada pelas estruturas citadas foram determinada usando uma objetiva de 10x e um gratículo de integração II Zeiss, composto de 10 linhas paralelas e 100 pontos numa área quadrangular, colocado em uma ocular Kpl 8X. Foi utilizada a objetiva de 10x, ao invés da objetiva de 40x proposta no projeto, porque não houve variação dos tipos de estruturas encontradas nas lâminas histológicas que justificasse a análise numa objetiva de 40x. A imagem do gratículo foi superposta sucessivamente a cinco cortes histológicos de cada animal do experimento. Foram anotados os números de pontos (Pi) que caíram sobre cada estrutura em particular (i). Tendo esses dados e conhecendo-se previamente a quantidade total de pontos (P) da área examinada (A), foi calculada a densidade de volume

Oliveira RC de, Iano FG, Janune DDJ, Cestari TM, Taga R, Taga EM, Granjeiro JM

Innov Implant J, Biomater Esthet, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 18-23, maio/ago 2011

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(Vvi) pela relação Vvi = Pi/P, que está expressa em porcentagem. Os valores obtidos para osteogênese foram transformados em LOG10 para que se obtivesse uma Curva de Distribuição Gaussiana e pudesse ser realizado o teste paramétrico. A análise estatística foi realizada, como a análise radiográfica, pelo programa SigmaStat® for Windows® utilizando análise de variância (ANOVA) e teste paramétrico de Bonferroni, onde os dados foram confrontados entre si. Para se estabelecer o grau de absorção do material foi feito o teste regressão linear do programa SigmaStat® for Windows®.

RESULTADOS

ANÁLISE hISTOLÓgICA DESCRITIVAPeríodo de 30 dias: De modo geral não foram encontradas células do

tipo neutrófilos, linfócitos ou plasmócitos nos grupos controle e OBM. Pequenas áreas semelhante à coágulo sanguíneo, localizadas dentro dos poros do material implantado, foram observadas no grupo OBM, não sendo encontrada correspondente no controle. Pequenas áreas de osso neoformado, localizado próximo as bordas do defeito, foram observadas em ambos os grupos. O tecido conjuntivo ocupava a maior parte do defeito ósseo nos dois grupos (Figuras 1A e 1B). Especificamente em relação ao grupo OBM, o material implantado estava presente com formação de tecido conjuntivo, composto por vasos e fibras, dentro de seus poros (Figura 1B).

.

Figura 1A - Grupo controle: notamos o preenchimento da região do defeito ósseo com tecido conjuntivo.

Figura 1B - Grupo OBM: presença de tecido conjuntivo nos poros do material implantado.

Período de 60 dias: Houve manutenção da quantidade de tecido ósseo neoformado e também de tecido conjuntivo presente nos dois grupos, quando comparados com o período de 30 dias. No entanto, notou-se que o tecido conjutivo presente aos 60 dias nos dois grupos era composto, aparententemente, por uma menor quantidade de células (semelhantes à fibroblastos) e maior quantidade de fibras. Sugerindo um tecido conjuntivo mais maduro (Figura 1C). Notou-se também a presença de células gigantes multinucleadas em contato com o OBM implantado.

.

Figura 1C - Grupo OBM: presença de tecido conjuntivo mais maduro nos poros do material implantado.

Período de 120 dias: No grupo controle foi observado que não houve fechamento completo da lesão por tecido ósseo, a despeito da neoformação óssea existente (Figura 1d). A exemplo dos períodos anteriores, houve formação óssea nas bordas do defeito em ambos os grupos. O tecido conjuntivo torna-se mais denso e maduro em praticamente todas as áreas analisadas. No grupo OBM, em alguns animais, observou-se tecido adiposo no interior dos poros do material, sugerindo que a hipoderme ocupou a região mais exocraniana do defeito. Também foi encontrado, neste grupo, ossificação no interior do no material. O material apresenta-se visualmente alterado e seu volume também é o menor de todos os períodos, sugerindo assim um processo de reabsorção lento do material (Figura 1E).

Análise morfométrica da resposta tecidual ao osso bovino misto medular implantado em defeito ósseo na calvária de rato

Innov Implant J, Biomater Esthet, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 18-23, maio/ago. 2011

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Figura 1D - Grupo controle: neoformação de osso na região do defeito sem, no entanto, o fechamento completo.

Figura 1E - Grupo OBM: material implantado envolto por tecido con-juntivo. Coloração H&E. Magnificação de 4x. Siglas: OBM-osso bovino misto; ON-osso neoformado; OS-osso; TC-tecido conjuntivo.

ANÁLISE hISTOMORFOMÉTRICAA morfometria dos tecidos permitiu registrar um aumento na neofor-

mação do tecido ósseo com o passar do tempo no grupo controle (9,1 ± 5,1% - 26,4 ± 25,5%), enquanto no grupo OBM houve apenas uma oscilação com o decorrer dos períodos (4,0 ± 3,1% - 5,4 ± 2,4%), havendo diferença significativa entre os dois grupos (p < 0,05) (Tabela 1). O tecido conjuntivo apresentou uma dinâmica diferente nos dois grupos, enquanto houve uma diminuição no grupo controle (90,9 ± 5,1% - 73,6 ± 25,5%) e aumento no grupo OBM (63,0 ± 7,4% - 78,0 ± 2,9%) (Tabela 1). No entanto, não houve diferença entre os grupos em relação ao tecido conjuntivo. Quanto à den-sidade de volume do material implantado, apesar da diminuição não foi observado diferença significante entre os períodos experimentais (24,1 ± 5,1% - 16,6 ± 4,0%) (Tabela 1).

Tabela 1 - Valores médios (± sd) referentes à análise de densidade de volume para coágulo, material residual, osso neoformado e tecido conjuntivo.

Densidade de Volume (%)

Períodos Experimentais

30 dias 60 dias 120 dias

Controle OBM Controle OBM Controle OBM

Coágulo Sanguíneo 0 8,9

(±0,1) 0 0 0 0

Material Residual 0 24,1

(±5,1) 0 21,1(±3,9) 0 16,6

(±4,0)

OssoNeoformado

9,1(±5,1)

4,0(±3,1)

19,8(±3,3)

6,9(±1,3)

26,4(±25,5)

5,4(±2,3)

Tecidoconjuntivo

90,9(±5,1)

63,0(±7,4)

80,2(±3,3)

72,0(±8,0)

73,6(±25,5)

78,0(±2,9)

DISCUSSÃO

Nos últimos anos presenciamos um grande avanço no campo da medicina regenerativa e a engenharia de tecidos11. Concomitantemente houve o surgimento de novos biomateriais e o conceito de mimetização do tecido hospedeiro, ou seja, biomateriais que apresentassem caracteristicas semelhantes ao do tecido receptor16. Assim diversos biomateriais têm sido estudados para aplicação na área médico-odontológica. Em especial nosso grupo tem feito um esforço no desenvolvimento de materias de origem bovina como uma opção aos materiais internacionais de origem bovina ou não.

Alguns materiais de origem bovina, similares ao OBM, têm sido testados por outros pesquisadores, como no trabalho de Hartl e colaboradores, onde esses autores compararam o Lubboc, um osso bovino com processamento similar ao OBM, com osso alógeno, ambos implantados em humanos13. Os autores observaram que o osso alógeno apresentou integração mais rápida ao leito receptor, quando comparado ao Lubboc. Os autores especularam que os resultados obtidos pelo Lubboc seja decorrente do modo como este é processado, ou seja, utilizando 8M de uréia para extrair proteínas. Esse processamento com uréia, segundo Urist e colaboradores, remove as BMP’s (proteínas morfogenéticas ósseas) do osso, o que pode diminuir o tempo de resposta devido à falta de osteoindução25. Como foi observado na análise histológica, o OBM não apresentou efeito osteoindutor. Pode-se sugerir que o processamento do OBM, que também é tratado com uréia, possa ser um dos fatores que promoveram a inibição da capacidade osteoindutora13. Ainda denotando a importância da presença de osseoindutores como determinantes do sucesso na regeneração óssea, o trabalho de Ahn e colaboradores avaliaram o comportamento de esponja absorvível de colágeno (ACS) e fosfato tricálcico (TCP), com ou sem BMP, em defeito de tamanho crítico em calvária de ratos2. Quando carregados com BMP, os materiais apresentaram ossificação. Quando implantados sem BMP, apresentaram a formação de tecido conjuntivo ao redor do material, a exemplo do OBM.

Outro trabalho com osso similar ao OBM foi realizado e os autores usaram osso bovino denominado de Kiehl em calvária de coelhos15. Os resultados desse trabalho foram divergentes dos resultados do nosso trabalho, pois os autores descreveram uma ossificação em contato com o material implantado.

Oliveira RC de, Iano FG, Janune DDJ, Cestari TM, Taga R, Taga EM, Granjeiro JM

Innov Implant J, Biomater Esthet, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 18-23, maio/ago 2011

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O processamento do osso bovino empregado no presente estudo foi utilizado anteriormente para a obtenção de OBM da cortical óssea no formato de pino implantado em subcutâneo de ratos7 e em fêmur de ratos28. O OBM de origem medular no formato de bloco (10x10x5 mm) foi testado em 2006 por Janune e colaboradores, mostrando biocompatibilidade tecidual em subcutâneo de ratos14. O trabalho de Zambuzzi e colaboradores ainda demonstrou a propriedade do material de ser bioabsorvido28. Este resultado descrito por Zambuzzi e colaboradores pode ser ralcionado ao do presente estudo uma vez que foi obsevado micoscopicamente uma diminuição do volume do material implantado e também uma sugestiva mudança na arquitetura do material28. Os resultados obtidos também são similares aos nossos uma vez que houve migração/proliferação de células e vasos no interior dos poros do OBM14.

Uma das hipóteses levantadas na literatura para a falha na capacidade osteocondutora de um biomaterial, e mesmo na regeneração de fraturas ósseas, é a movimentação ou mobilidade do material10. Sabemos que esse mecanismo leva ao prejuizo da regeneração do tecido ósseo e formação de um tecido conjuntivo fibroso10. Como o OBM utilizado no presente estudo era produzido na forma de disco, esse disco poderia apresentar um pequeno grau de mobilidade uma vez que não se utilizou dispositivos para a estabilização do mesmo. Destarte, permaneceu o defeito circundado por osso nas laterais e pela dura-mater e periosteo+tegumento nas regiões inferior e superior respectivamente.

CONCLUSÃO

Dentro dos limites desse estudo, pode-se afirmar que o OBM é biocompativel, no entanto, não apresenta capacidade osteocondutora ou osteoindutora em defeitos críticos na calvária de ratos Wistar.

AgRADECIMENTOS

Os autores agradecem os servidores da FOB-USP, Thelma L. Silva, Luiz C. da Silva, Erasmo G. da Silva e Danielle S. Ceolin, pelo auxílio técnico prestado. Este trabalho foi financiado pela FAPESP Proc. 04/00043-2.

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Innov Implant J, Biomater Esthet, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 18-23, maio/ago. 2011

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Oliveira RC de, Iano FG, Janune DDJ, Cestari TM, Taga R, Taga EM, Granjeiro JM

Innov Implant J, Biomater Esthet, São Paulo, v. 6, n. 2, p. 18-23, maio/ago 2011