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ANÁLISE PRELIMINAR DOS IMPACTOS DO RODOANEL NA REPRESA BILLINGS: ESTUDO DO CASO DO BAIRRO PARQUE MIAMI E JARDIM RIVIERA, NO MUNICÍPIO DE SANTO ANDRÉ, SP Thaís Marina Castelhano Ralla, Mestranda do Departamento de Geografia Física da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. [email protected] RESUMO Devido à concentração populacional e a generalização de transporte individual do Município de São Paulo a partir dos anos de 1940, o trânsito vem se tornando cada vez pior. Assim, a gestão pública foi obrigada a encontrar novas possibilidades. Uma delas foi o Rodoanel, que consiste em um anel viário que permite a passagem de veículos por São Paulo sem passar pelas suas concentrações urbanas. Porém, o eixo sul do Rodoanel será construído sob os principais mananciais que abastecem o Município de São Paulo, um deles seria a Represa Billings. Neste contexto, o objetivo deste trabalho é prognosticar os possíveis impactos que o Rodoanel irá causar a Represa Billigs, especificamente a região do Parque Miami e Jardim Riviera, que tem sido até agora uma das áreas mais afetadas pelas obras do Rodoanel. O método utilizado neste trabalho será uma análise integrada evolutiva, inicialmente demonstrando a evolução urbana através de mapeamentos na área, antes do início das obras do Rodoanel, utilizando fotografias aéreas dos anos de 1972 e 2001. A indução e a analogia também orientarão o prognóstico, pois a previsão de impactos será pautada na análise de outras áreas que foram abrangidas pelo Rodoanel, para então projetar um quadro futuro. Tecnicamente a pesquisa será apoiada por trabalhos de campo, que viabilizarão a observação e registros fotográficos da área, além da aplicação de questionários aos moradores e de entrevistas com engenheiros das obras do Rodoanel. Esta região foi escolhida, pois apesar da grande concentração populacional da área, já se começou a perceber mudanças significativas. Este trabalho torna-se importante dentro da ciência geográfica, pois a previsão de impactos exige articulação da dimensão social e natural, identificando os principais danos que o homem pode causar a natureza, de modo a orientar a mitigação. Justifica-se também, pois a Geografia da USP em convênio com a Dersa está encarregada da recuperação dessas áreas. Palavras-chave: Rodoanel, Impactos Ambientais, Represa Billings. ABSTRACT Due to population concentration and spread of individual transport in São Paulo from the year 1940, traffic has become increasingly worse. Thus, public management was forced to find new possibilities. One was the Rodoanel, which consists of a ring road that allows the passage of vehicles in São Paulo without passing their conurbations. However, the shaft will be constructed south of Rodoanel under the main springs which supply the city of São Paulo, one of them would be to Billings. In this context, the objective of this work is to predict the possible impacts that will cause the Rodoanel dam Billigs, specifically the region of the Jardim Riviera and Parque Miami, which has so far been one of the areas most affected by the works of Rodoanel. The method used in this work is an integrated evolutionary analysis, initially by showing the evolution of urban mapping in the area, before the works of Rodoanel, using aerial photographs of the years 1972 and 2001. Induction and analogy also guide the prognosis, because the prediction of impacts is based on analysis of other areas that were covered by Rodoanel and then design a future. Technically the research will be supported by field work, which enable the observation and photographic records of the area, besides the application of questionnaires to residents and interviews with engineers of the works of Rodoanel. This region was chosen because despite the large concentration of population in the area, now started to see significant changes. This work becomes important in geographical science, as the prediction of impacts requires articulation of social and natural, identifying the main damage that may cause the man to nature, to guide the mitigation. It is also because the geography of USP ders in agreement with the task of rehabilitation of this areas. Keywords: Rodoanel, Environmental Impacts, Billings.

ANÁLISE PRELIMINAR DOS IMPACTOS DO RODOANEL NA … · Rodoanel, que consiste em um anel viário que passaria fora da cidade de São Paulo para dessobrecarregar o trânsito da cidade,

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ANÁLISE PRELIMINAR DOS IMPACTOS DO RODOANEL NA REPRESA BILLINGS: ESTUDO DO CASO DO BAIRRO PARQUE MIAMI E JARDIM RIVIERA, NO MUNICÍPIO

DE SANTO ANDRÉ, SP

Thaís Marina Castelhano Ralla, Mestranda do Departamento de Geografia Física da Faculdade de Filosofia,

Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. [email protected]

RESUMO Devido à concentração populacional e a generalização de transporte individual do Município de São Paulo a partir dos anos de 1940, o trânsito vem se tornando cada vez pior. Assim, a gestão pública foi obrigada a encontrar novas possibilidades. Uma delas foi o Rodoanel, que consiste em um anel viário que permite a passagem de veículos por São Paulo sem passar pelas suas concentrações urbanas. Porém, o eixo sul do Rodoanel será construído sob os principais mananciais que abastecem o Município de São Paulo, um deles seria a Represa Billings. Neste contexto, o objetivo deste trabalho é prognosticar os possíveis impactos que o Rodoanel irá causar a Represa Billigs, especificamente a região do Parque Miami e Jardim Riviera, que tem sido até agora uma das áreas mais afetadas pelas obras do Rodoanel. O método utilizado neste trabalho será uma análise integrada evolutiva, inicialmente demonstrando a evolução urbana através de mapeamentos na área, antes do início das obras do Rodoanel, utilizando fotografias aéreas dos anos de 1972 e 2001. A indução e a analogia também orientarão o prognóstico, pois a previsão de impactos será pautada na análise de outras áreas que foram abrangidas pelo Rodoanel, para então projetar um quadro futuro. Tecnicamente a pesquisa será apoiada por trabalhos de campo, que viabilizarão a observação e registros fotográficos da área, além da aplicação de questionários aos moradores e de entrevistas com engenheiros das obras do Rodoanel. Esta região foi escolhida, pois apesar da grande concentração populacional da área, já se começou a perceber mudanças significativas. Este trabalho torna-se importante dentro da ciência geográfica, pois a previsão de impactos exige articulação da dimensão social e natural, identificando os principais danos que o homem pode causar a natureza, de modo a orientar a mitigação. Justifica-se também, pois a Geografia da USP em convênio com a Dersa está encarregada da recuperação dessas áreas. Palavras-chave: Rodoanel, Impactos Ambientais, Represa Billings. ABSTRACT Due to population concentration and spread of individual transport in São Paulo from the year 1940, traffic has become increasingly worse. Thus, public management was forced to find new possibilities. One was the Rodoanel, which consists of a ring road that allows the passage of vehicles in São Paulo without passing their conurbations. However, the shaft will be constructed south of Rodoanel under the main springs which supply the city of São Paulo, one of them would be to Billings. In this context, the objective of this work is to predict the possible impacts that will cause the Rodoanel dam Billigs, specifically the region of the Jardim Riviera and Parque Miami, which has so far been one of the areas most affected by the works of Rodoanel. The method used in this work is an integrated evolutionary analysis, initially by showing the evolution of urban mapping in the area, before the works of Rodoanel, using aerial photographs of the years 1972 and 2001. Induction and analogy also guide the prognosis, because the prediction of impacts is based on analysis of other areas that were covered by Rodoanel and then design a future. Technically the research will be supported by field work, which enable the observation and photographic records of the area, besides the application of questionnaires to residents and interviews with engineers of the works of Rodoanel. This region was chosen because despite the large concentration of population in the area, now started to see significant changes. This work becomes important in geographical science, as the prediction of impacts requires articulation of social and natural, identifying the main damage that may cause the man to nature, to guide the mitigation. It is also because the geography of USP ders in agreement with the task of rehabilitation of this areas. Keywords: Rodoanel, Environmental Impacts, Billings.

1. INTRODUÇÃO

Segundo a PRODAM e o DPH (Empresa de Tecnologia da Informação e Comunicação do Município de

São Paulo e Departamento do Patrimônio Cultural, 1999), nos anos de 1950, o Município de São Paulo passa

por um fenômeno de “desconcentração” industrial. As indústrias passaram a se transferir para outros municípios

da Região Metropolitana como o grande ABC, Osasco, Guarulhos, Santo Amaro, Campinas, São José dos

Campos, Sorocaba, devido a incentivos fiscais e outros tipos de incentivos, o que fez com que essas áreas se

desenvolvessem também.

Nas décadas de 1950 e 1960, a Via Anchieta tornou-se um dos principais eixos econômicos do país. A

indústria automobilística instalou-se próxima à região de mananciais, que na época vivia seu momento de maior

glória. Assim, a instalação das indústrias automobilísticas na região, levou à ocupação por uma população de

alto poder aquisitivo que mudou por completo os hábitos do local. Inúmeros barcos de lazer de alto padrão

invadiram a Represa Billings, onde não se viam mais embarcações simples. Devido à reversão do Rio Pinheiros

para a Represa ela foi ficando cada vez mais poluída, o que afastou a população de alto poder aquisitivo da área.

Também devido à promulgação da Lei Proteção dos Mananciais, que tornaria a permanência daquela população

na área ilegal.

A cidade de São Paulo cresceu muito rapidamente, fazendo com que as classes mais carentes se

direcionassem para a periferia, já que as áreas centrais se valorizaram, causando especulação imobiliária.

Com a expulsão das classes baixas para a periferia, iniciou-se a degradação ambiental, causada pela

grande expansão e pela falta de infra-estrutura urbana adequada, gerando os problemas da ocupação das áreas de

proteção de mananciais e das várzeas e, também, dos sistemas de abastecimento de água, coleta de esgotos

sanitários e lixo. Em outras palavras, com a valorização das zonas centrais, o centro é ocupado por uma classe

alta, onde a infra-estrutura já está consolidada, ocorrendo o inchaço das regiões periféricas, que não possuem

infra-estrutura e esperam para obtê-la.

A instalação das montadoras no Brasil expressou a opção feita pelo transporte individual rodoviário.

Assim com o rápido desenvolvimento da cidade de São Paulo por volta dos anos 1940, e mais ainda nos 1950 e

com o desenvolvimento da indústria automobilística no país, o trânsito se tornou cada vez mais sobrecarregado,

principalmente com os atuais incentivos para se obter um carro.

Assim, os governantes foram obrigados a tentar encontrar novas possibilidades. Uma delas foi o

Rodoanel, que consiste em um anel viário que passaria fora da cidade de São Paulo para dessobrecarregar o

trânsito da cidade, principalmente os caminhões que entram na cidade para ir ou voltar do porto de Santos.

Neste quadro, o eixo sul do Rodoanel que servirá de acesso ao porto de Santos sem passar dentro da cidade de

São Paulo está sendo construído. O problema é que passará pelos principais mananciais de água doce que

abastecem a cidade de São Paulo.

No relatório de impactos ambientais da PROTAN (empresa que está realizando as obras do Rodoanel,

2006) há uma breve explicação do que seria o Rodoanel Sul: “O principal impacto do Rodoanel refere-se às

alterações que ocorrerão no desempenho do sistema viário metropolitano, a partir da entrada em operação de

cada trecho. Essa melhoria do desempenho do sistema, de forma agregada, se concretizará mediante a sensível

redução do tráfego de passagem em algumas artérias estruturais, como: as marginais e o Minianel Viário; os

trechos de todas as rodovias entre a sua intersecção com o Rodoanel e o centro metropolitano; os trechos de

estradas e vias concorrentes com o Rodoanel, como a SP-23, a SP-31, a estrada do Montanhão e a Galvão

Bueno, dentre outras. Implicará, contudo, o incremento do tráfego em vias urbanas que catalisarão as viagens

com origem e destino associados às interseções com o Rodoanel, como é o caso, hoje, com a abertura do trecho

Oeste, da Avenida Raimundo Pereira de Magalhães e das vias urbanas que articulam as estradas do M’Boi

Mirim e de Itapecerica da Serra à intersecção do Rodoanel com a Regis Bittencourt, e o caso, futuramente, da

avenida Papa João XXIII, da SP-66, da estrada de Bonsucesso, dentre outras”.

Neste contexto, o objetivo deste trabalho é prognosticar os possíveis impactos que o Rodoanel irá causar

a Represa Billigs, mais especificamente a região do Parque Miami e Jardim Riviera, que foram até agora uma

das áreas que mais tiveram a cobertura vegetal retirada, e tiveram uma boa parte das populações de baixa renda

deslocada.

Para AB’SABER (1998), prever impactos é um ato de tomada de precauções para garantir a harmonia e

compatibilizar funções no interior do espaço total no futuro. É também, por extensão, um ato de bom senso em

que se procura harmonizar o desenvolvimento com uma correta postura de proteção ambiental e ecológica.

Levando em consideração CHRISTOFOLETTI (1979), o espaço total pode ser considerado como o sistema

inteiro (a Billings e seu entorno), e a área de estudo como um subsistema (Parque Miami e Jardim Riviera),

utilizando a abordagem sistêmica, na qual um subsistema influencia o outro e vice-versa, gerando uma rede em

que se houver a entrada de algum componente a entropia aumenta, fazendo com que o sistema não fique em

equilíbrio, já que há muita sobra de energia no mesmo.

Esta área foi escolhida porque além de ser a segunda região com maior densidade populacional do

entorno da Represa Billings, perdendo apenas para a vertente do lado da Represa Guarapiranga, possui uma

grande concentração de áreas verdes que por lei estão protegidas, Além disso, o tema dentro da ciência

geográfica torna-se importante, pois a previsão de impactos exige articulação da dimensão social e natural,

identificando os principais danos que o homem pode causar a natureza, de modo a orientar a mitigação.

Justifica-se também, pois a Geografia da Universidade de São Paulo (USP) em convênio com o

Desenvolvimento Rodoviário S.A. (Dersa) que está encarregada da recuperação de áreas.

As áreas selecionadas para a pesquisa situam-se as margens da Represa Billings; localizam-se no

Município de Santo André, SP, quase na divisa com o município de São Bernardo do Campo. A área escolhida

compreende o bairro Parque Miami, Jardim Riviera e a favela Pintassilgo que teve início como uma expansão

não planejada da subdivisão legal do bairro Parque Miami, e assim pode ser considerada parte do bairro.

O acesso à área se dá em Santo André pela Estrada do Pedroso e pela Estrada do Montanhão por São

Bernardo, que é acessada pela Rodovia Anchieta (SP – 150).

A figura 1 mostra a localização do Município de Santo André dentro da Região Metropolitana de São

Paulo e a figura 2 mostra o Parque Miami e o Jardim Riviera dentro do Município de Santo André.

Figura 1: Localização do Município de Santo André dentro da Região Metropolitana de São Paulo

Fonte: SEADE (2007) – Organizado por RALLA, T, M, C.(2009)

Figura 2: Os bairros Parque Miami e Jardim Riviera localizados dentro do Município de Santo André

Fonte: SEADE (2007) – Organizado por RALLA, T, M, C.(2009)

A figura 3 mostra a localização do Parque Miami e Jardim Riviera de uma forma mais

detalhada

Figura 3: Localização Parque Miami e Jardim Riviera no Município de Santo André de uma forma mais detalhada

Fonte: SEADE (2007) – Organizado por RALLA, T, M, C.(2009)

O traçado do Rodoanel Sul passa dentro da área de estudo, como mostra a figura 4.

Figura 4: Traçado do Rodoanel dentro da área de estudo

Fonte: SEADE (2007) – Organizado por RALLA, T, M, C.(2009)

2. MATERIAIS E MÉTODOS

O método utilizado neste trabalho afim de se chegar ao objetivo proposto, será uma

análise integrada evolutiva. A indução e a analogia também orientarão o prognóstico, pois a

previsão de impactos será pautada na análise de outras áreas que foram abrangidas pelo

Rodoanel, para então projetar um quadro futuro.

Tecnicamente, serão feitos alguns mapeamentos na área para demonstrar a evolução

urbana de recorte temporais anteriores, utilizando fotografias aéreas na escala de 1:25.000 e de

1:15.000, respectivamente dos anos de 1972 e 2001, fornecidas pelo Instituto de Pesquisas

Tecnológicas (IPT), fazendo a sobreposição de dados no Software MapInfo 8.5. Após, a

pesquisa será apoiada em trabalhos de campo, que viabilizarão a observação e registros

fotográficos da área, além da aplicação de questionários aos moradores para identificar as

mudanças que ocorreram na área desde o início das obras do Rodoanel, e também de entrevistas

com engenheiros das obras.

3. RESULTADOS E DISCUSSÕES

3.1 Caracterização preliminar da área de estudo

A área estudada está situada no Planalto Atlântico, caracterizada como “região de terras

altas constituída predominantemente por rochas cristalinas pré-cambrianas e cambro-

ordovicianas, cortadas por intrusivas básicas e alcalinas mesozóico-terciárias, e pelas coberturas

das bacias sedimentares de São Paulo e Taubaté” (IPT, 1981, apud COPIANO, 2002).

Esse planalto foi dividido em zonas, sendo que a área de estudo inclui-se na zona do

Planalto Paulistano, que corresponde a uma área de relevo suavizado, desfeito em morros e

espigões divisores de alturas modestas, com altitudes geralmente entre 751 e 900 metros,

decrescendo de sudeste a noroeste. “Esse planalto limita-se a sul de modo brusco nas cumiadas

das escarpas da Serra do Mar e Paranapiacaba...” (ALMEIDA,1964 apud COPIANO, 2002) e

divide-se em duas subzonas. Denominam-se Morraria do Embu e Colinas de São Paulo.

Portanto, pode-se descrever a geomorfologia dos núcleos estudados com sendo uma

região com domínio dos mares de morros e com vales que possuem predominantemente

vertentes convexas. Conseqüentemente trata-se de uma região de planalto há cerca de 25 km da

linha de crista da Serra do Mar, muito afetada pela influência oceânica.

Segundo COPIANO (2002), o clima é o tropical de altitude, com temperaturas médias

de 20,6 oC e pluviosidade entre 1400 e 1500 mm anuais. Situa-se na área de influência das

massas tropicais atlânticas e tropical continental, além da polar atlântica, mais freqüente de

maio a setembro, e responsável pela maior parte das chuvas nesse período. A proximidade da

área serrana favorece para que a umidade relativa do ar seja elevada, com freqüentes episódios

de nevoeiros.

Dessa forma, os bairros estão inseridos no Domínio da Mata Atlântica, e a totalidade de

sua área era, originalmente, recoberta por floresta ombrófila densa. Inicialmente a floresta foi

removida devido ao extrativismo vegetal, pois além da coleta do palmito, usavam outras árvores

para a construção de embarcações, residências e também para a fabricação de móveis, de lenha

e carvão. Muitas culturas foram introduzidas por famílias de chacareiros como o cultivo de

verduras destinadas ao abastecimento local. Mais recentemente, foi feito o reflorestamento com

espécies arbóreas, principalmente pinus e eucalipto, conhecidas por impedir o crescimento de

outras espécies e comprometer a biodiversidade de onde são plantadas.

Desde então, a expansão urbana tem alcançado as últimas áreas que possuem

remanescentes de florestas, como o núcleo populacional estudado. Atualmente, a vegetação do

Município é composta por matas secundárias, do tipo de florestas tropicais úmidas de altitude

ou de florestas tropicais úmidas de encosta. No Parque Miami e Jardim Riviera, apesar da

conservação, a cobertura vegetal mostra-se bastante alterada, devido à ocupação humana.

Segundo COPIANO (2002), a área é situada dentro da bacia hidrográfica da represa

Billings e constitui-se numa das áreas de expansão da mancha urbana, apresentando atrativos

para a ocupação, tais como a proximidade com indústrias e áreas comerciais e de serviços, infra-

estrutura urbana já parcialmente implantada e que apesar de precária favorece o acesso público.

Além disso, é próximo da área mais urbanizada do município de Santo André, e o baixo

custo do solo urbano, quando comparado às áreas sem condicionantes restritivos legais e com

melhor infra-estrutura, apresenta-se como fator de intensificação da apropriação dessa área pela

classe trabalhadora, cujo acesso à moradia é dificultado pelo baixo rendimento e insuficiência

das políticas públicas de habitação.

Conforme dados obtidos nas pesquisas de campo, a região estudada é urbanizada, pois

possui rede de saneamento básico e água, mas ainda parte do esgoto é jogado no Córrego

Guarará (afluente do rio Tamanduateí) sem tratamento, pois a rede não alcança a ETE (Estação

de Tratamento de Esgoto) São Caetano; há coleta de lixo três vezes por semana.

Não possui altos índices de violência e conta com áreas de lazer na proximidade (Parque

do Pedroso). A comunidade conta com uma escola da Prefeitura, com um posto de saúde, com a

creche Monteiro Lobato e com uma escola do Estado.

Apesar de tudo ainda, é uma área considerada de baixa renda e possui a favela

Pintassilgo que modifica um pouco a situação em relação à questão da urbanização já que a

mesma não possui nenhum tipo de infra-estrutura.

A favela encontra-se em uma área com declive acentuado e também parcialmente dentro

de um parque destinado à conservação natural. Ela é adjacente ao bairro Parque Miami e

densamente ocupada por edificações ao longo da encosta de um morro voltado para o sul, com

grande declive descendo até um dos braços do Reservatório Billings.

Serviços como comércio, saúde e educação não existem na Pintassilgo, apenas existe

um campo de futebol, o qual, juntamente com algumas pequenas igrejas, constituem as únicas

áreas comunitárias do local, outros serviços são acessíveis em algumas vizinhanças próximas. A

favela é relativamente acessível à parte urbanizada de Santo André. A sudoeste da favela

existem comércios e instalações de serviço local (incluindo um posto de saúde) do Parque

Miami. Essa região possui uma escola de ensino primário, que é freqüentada pela maioria das

crianças residentes na Pintassilgo. Existe ainda outra escola primária localizada a nordeste da

favela, mas seu acesso se dá por meio de uma faixa de terra pantanosa e florestada.

Muitas moradias foram construídas em alvenaria, no sistema de autoconstrução, por

meio da cooperação da família e de amigos, sendo que em alguns terrenos a área total foi

edificada, muitas vezes sendo construídos mais de um pavimento (sobrados), sem o prévio

estudo do terreno.

Atualmente, a favela conta com sistema de telefonia; as casas são abastecidas de água

potável pela rede pública, porém não possuem acesso a rede de esgoto sanitário e, por não ser

uma área urbanizada, não há controle sobre a utilização de fossa séptica. O lixo é coletado por

meio de caçambas e retirado pela prefeitura semanalmente.

Na região, ocorrem diversos problemas ambientais, resultantes do arruamento

inadequado, da suavização do relevo por meio de terraplanagem e remoção de cobertura

vegetal. Em certos locais, a ocupação sem infra-estrutura causou a erosão do solo, expondo-o ao

impacto pluvial e a camada alterada do substrato rochoso tornou-se excessivamente suscetível

aos mecanismos de remoção e transporte de massa pelo escoamento superficial.

O deslizamento de terras, com a conseqüente destruição de moradias e ameaças à vida

humana, o assoreamento dos rios, a perda de capacidade de armazenamento de água nos

reservatórios e a ocorrência de enchentes são também conseqüências da ocupação e uso do solo

de formas inadequadas e irregulares.

As exigências legais que impõem controles sobre a densidade demográfica e o

parcelamento do solo, exigindo nos lotes poucas pessoas por unidade de área, restringiram as

possibilidades de utilização dessas áreas, causando a pré-desvalorização e tornando-as atrativas

para venda à população de baixa renda, sob a forma de lotes clandestinos e/ou terrenos com

construções irregulares, cuja área construída está em desacordo com a legislação.

Os moradores comentam que mesmo se localizando em Área de Proteção de

Mananciais, possuem a posse da terra, mas hoje em dia é proibido desmatar mais, e comentam

que há fiscalização rigorosa.

3.2 Evolução da Ocupação

Foram elaborados inicialmente dois mapas de uso e ocupação do solo, que podem

demonstrar esse forte adensamento populacional, tendo como base fotos aéreas, de 1972,

quando o loteamento estava começando a ser ocupado, e de 2001 quando a ocupação estava

consolidada.

A figura 5 mostra o mapa de uso e ocupação do solo na região do Parque Miami e

Jardim Riviera no ano de 1972.

Figura 5: Mapa de uso e ocupação do solo do Parque Miami e Jardim Riviera, no ano de 1972

Fonte: SEADE (2007) – Organizado por RALLA, T, M, C.(2009)

Em relação à ocupação, no ano de 1972, apenas ocorriam áreas extensas com

loteamentos desocupados; era o início da ocupação da região. Havia apenas uma chácara que

desmatou uma parte da área. Fora isso, só havia mata ainda conservada.

A figura 6 mostra o mapa de uso e ocupação do solo do Parque Miami e Jardim Riviera

no ano de 2001.

Figura 6: Mapa de uso e ocupação do solo do Parque Miami e Jardim Riviera, no ano de 2001

Fonte: SEADE (2007) – Organizado por RALLA, T, M, C.(2009)

No ano de 2001, a região encontrava-se com um grande adensamento populacional de

baixa renda. Ocorreu um forte desmatamento na área trazendo a possibilidade de

escorregamentos e também o assoreamento da Represa, além da possibilidade de acúmulo de

lixo e resíduos, já que a favela Pintassilgo não possui rede de saneamento básico, nem coleta de

lixo efetiva. Um aspecto interessante é que, a área ocupada pela chácara parece ter sofrido

impacto positivo, pelo fato de a foto aérea de 1972 mostrar que a região estava muito mais

desmatada do que na foto de 2001.

Ocorreram nestes anos, muitas mudanças na região que podem influenciar para sua

contínua degradação.

A maior mudança refere-se às obras do Rodoanel, cuja construção é empreendida pelo

Governo Estadual, e estimulada pelo Programa de Aceleração do Crescimento do Governo

Federal.

A partir da análise dos dois mapas e de trabalhos de campo, considerando a situação

atual da área do ano de 2009, pode-se perceber que grande parte da cobertura vegetal foi

retirada para a construção do Rodoanel.

O Rodoanel consiste em um anel viário que servirá para ir ao porto de Santos sem

passar na cidade de São Paulo. Com 61,4 quilômetros Trecho Sul tem início no trevo da

Rodovia Régis Bittencourt, passando pelas Rodovias Anchieta e Imigrantes, chegando até o

prolongamento da Avenida Papa João XXIII, em Mauá.

3.3 Situação Atual

Segundo o jornal “O Estado de São Paulo” do dia 12 de Março de 2007, a Prefeitura e a

empresa Desenvolvimento Rodoviário S.A. (Dersa) firmaram acordo para garantir a

compensação ambiental pela retirada de 212 hectares de mata no entorno da Represa Billings,

necessária para esta obra. Está prevista a criação de quatro unidades de preservação, além de um

parque-estrada ao longo da pista do anel viário na área do entorno que será desmatada. Com

isso, a expectativa é proteger 15 milhões de metros quadrados de área verde. Serão destinados

cerca de R$ 600 milhões para o Trecho Sul, 3 milhões no Parque do Pedroso, em Santo André,

que compreende a área do Parque Miami e Riviera. Quem está encarregado de planejar o uso

dessas áreas é o Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP), sob a

coordenação da Professora Sueli Ângelo Furlan.

Foram retiradas famílias que moravam no local onde as obras estão sendo construídas.

Nos questionários aplicados aos moradores locais, pode-se perceber que todos os entrevistados

confirmaram que as indenizações foram pagas, mas no projeto inicial a intenção seria remanejar

as pessoas para outras áreas, e não apenas pagar indenizações. Foi comentado também pelos

moradores que nas reuniões antes do início da construção do Rodoanel na área, foi dito que

haveria aberturas para os moradores terem acesso ao Anel Viário. Mas segundo a Secretaria dos

Transportes do Estado de São Paulo (2009), para não induzir a ocupação nas zonas de

mananciais, o trecho sul estende-se por 38 quilômetros sem nenhum acesso às avenidas da

região. Na área após o cruzamento com a Via Anchieta, prossegue em direção a Mauá,

margeando o braço do Rio Grande, funcionando como barreira à ocupação da área.

Ao tentar conversar com algum responsável pelas obras do Rodoanel só conseguiu-se

entrevistar um engenheiro, que comentou que aquela região após a construção do Rodoanel será

totalmente desalojada, e será construído lá um Parque Estadual. Ele não soube delimitar

exatamente qual o núcleo populacional que seria desalojado.

Na figura 6 e 7 mostra-se que a devastação inicial já é significante. No ano de 2007 a

cobertura vegetal se encontrava muito mais densa. Agora em 2009, grande parte da cobertura

vegetal foi retirada para a construção do Anel Viário.

A figura 7 mostra a região do Parque Miami, onde a vegetação está relativamente

conservada. Nota-se que a direita ainda permanece uma ocupação de baixa renda.

Figura 7: Região Parque Miami onde a vegetação está relativamente conservada, com ocupação de baixa renda à direita

Fonte: RALLA, T, M, C.(2007)

A figura 8 mostra a região do Parque Miami, com as obras do Rodoanel Trecho Sul,

com grande parte das ocupações de baixa renda retiradas a direta.

Foto 8: Região do Parque Miami, com as obras do Rodoanel Trecho Sul, com grande parte das ocupações de baixa

renda retiradas à direta

Fonte: RALLA, T, M, C.(2009)

Já a figura 9 mostra a grande retirada de cobertura vegetal da parte um pouco mais

distante da margem da Represa onde o Rodoanel passará, para fazer ligação com a Rodovia

Anchieta.

Figura 9: região desmatada de onde está sendo construída a ligação do Rodoanel Sul com a Via Anchieta

Fonte: RALLA, T, M, C.(2009)

Uma comparação a ser feita seria do Rodoanel Trecho Sul que está sendo construído

nos mananciais, que tem o comprometimento do reflorestamento dos trechos desmatados, com o

Rodoanel Trecho Oeste, lá houve este mesmo compromisso por parte dos governantes, porém,

segundo WHATELY (2005), não ocorreu o reflorestamento. As áreas foram mais ocupadas,

devido ao beneficiamento de vias de ligação com locais mais centrais, assim diversas áreas

foram terraplanadas para serem utilizadas na construção de grandes empreendimentos. A

justificativa para o não realizamento das obras de reflorestamento está na falta de verbas.

A figura 10, 11e 12 mostra algumas partes do Rodoanel Oeste que ainda não foram

reflorestadas, e que foram e podem ser usadas para grandes empreendimentos, além de outras

áreas que se encontram erodidas.

Figura 10: mostra área desflorestada, que pode ser usada para grandes empreendimentos

Fonte: VIEIRA, R. (2007)

Figura 11: mostra grande área terraplanada, e algumas áreas desflorestadas

Fonte: Secretaria dos Transportes do Estado de São Paulo (2009)

Figura 12: mostra extensa área com grandes empreendimentos

Fonte: Secretaria dos Transportes do Estado de São Paulo (2009)

4. CONCLUSÕES PARCIAIS

Preliminarmente chega-se a conclusão que a finalização da obra do Rodoanel Trecho

Sul, pode causar muitos impactos, pois se não houver realmente a tentativa de reflorestamento

na área, o que era até pouco tempo relativamente conservado, se torna totalmente destruído, o

que pode impulsionar um maior crescimento populacional na área.

Pode-se perceber que não há interesse de mostrar a verdade aos moradores, já que

inicialmente para eles a obra teria abertura para a área e apenas algumas moradias seriam

desalojadas. Mas não é o que parece que vai acontecer, a obra não tem abertura para esta região

segundo o que afirma a Secretaria de Transportes do Estado de São Paulo, e ainda há o projeto

de desalojar toda a região para a construção de um Parque.

Nota-se que para o governo, Estadual e Federal, é interessante apenas divulgar que as

obras logo serão concluídas, mas não se sabe como as populações das áreas se encontram, ou

mesmo como está a parte física da área, já que com trabalhos de campo pode-se perceber que a

área do Parque Miami e Jardim Riviera foi bem devastada. Assim, o único meio de observar as

obras de forma efetiva é a realização de trabalhos de campo nas áreas, já que as notícias

divulgadas pela imprensa se encontram de forma nebulosa nestes assuntos.

Também ainda encontra-se outro problema, já que no Programa de Aceleração do

Crescimento do Governo Federal há o projeto de urbanização da Favela Pintassilgo, imagina-se

que se acontecer poderá incentivar uma maior demanda populacional para área, já que áreas que

antes não eram regularizadas agora poderão ser, e ainda receber infra-estrutura. Claro que é um

ponto importante, mas se não houver o reflorestamento, como por indução, projeta-se que não

irá acontecer, incentivará a vinda de outras famílias para a área, pois ficarão muitas áreas

desmatadas, prontas para serem ocupadas.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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impacto ambiental no leste, oeste e sul. Experiências no Brasil, na Rússia e na Alemanha. 2ª edição. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1998.

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