ANDRADE, Oswald - O Perfeito Cozinheiro Das Almas Deste Mundo

Embed Size (px)

Citation preview

  • OBRAS COMPLETAS DE OSWALD DE ANDRADE

    O PERFEITO COZINHEIRO DAS ALMAS DESTE MUNDO

    ' 'O perfeito cozinheiro das almas deste mundo'' Por Mrio da Silva Brito

    Rquiem para Miss Ciclone, musa dialgica da pr-histria textual oswaldiana

    Por Haroldo de Campos

    Transcrio tipogrfica de Jorge Schwartz

    ) G0BO

  • CIP-Brasil. Catalogao-na-fonte Cmara Brasileira do Livro, SP

    Andrade, Oswald dc, 1890-1954. O perfeito cozinheiro da almas deste mundo / Oswald de Andra-

    de. Sio Paulo : Globo. 1992. (Obras completas dc Oswald dc Andrade)

    Apndice: "O perfeito cozinheiro das almas deste mundo" / por Mrio da Silva Brito Rcquicm para Miss Ciclone, musa dialgica da pr-histria textual oswaldiana I por Hiroldo de Campos Transcri-o tipogrfica / de Jorge Schwanz.

    ISBN 85-250-1088-X

    1. Andrade, Oswald de, 1890-1954. O perfeito cozinheiro das al-mas deste mundo - Crtica c interpretado 2. Biografias - Sculo 20 3-Dirios brasileiros (Literatura) I. Brito, Mrio da Silva, 1916. II. Cam-pos, Haroldo de, 1929- III. Schwanz, Jorge, 1944. IV. Ttulo. V. Srie.

    92-0014 CDD-869.9803

    ndices para catlogo sistemtico: 1. Dirios : Literatura brasileira 869-9803 2. Reminiscncias : Escritores : Literatura brasileira 869-9803

  • OBRAS COMPLETAS DE OSWALD DE ANDRADE

    O PERFEITO COZINHEIRO DAS ALMAS DESTE MUNDO

  • SUMRIO

    "O Perfeito Cozinheiro das Almas deste Mundo" Mrio da SUva Brito, VII

    Rquiem para Miss Ciclone, Musa Dialgica da Pr-Histria Textual Oswaldiana

    Haroldo de Campos, XIII O Perfeito Cozinheiro das Almas deste Mundo, 1

  • "O PERFEITO COZINHEIRO DAS ALMAS DESTE MUNDO"*

    MRIO DA SILVA BRITO

    De 30 de maio a 12 de setembro de 1918, Oswald de An-drade compe, com amigos, O Perfeito Cozinheiro das Almas deste Mundo. Trata-se de um grande caderno de duzentas pginas, me-dindo trinta e trs centmetros de altura por vinte e quatro de largura, que se transforma num dirio dos freqentadores da gar onnire, provida de fonola e alguns discos, que Oswald man-tm Rua Libero Badar, 67, 3? andar, sala 2.1

    No enorme caderno, escrito a tinta roxa, verde e vermelha, ou a lpis s vezes, h de tudo: pensamentos, trocadilhos (in-meros), reflexes, paradoxos, pilhrias com os habitues do reti-ro, aluses marcha da guerra, a fatos recentes da cidade, a autores, livros e leituras, s msicas ouvidas (das eruditas s com-posies populares americanas), a peas em representao nos palcos de So Paulo, s companhias francesas em tourne pelo Brasil. H mais porm: h colagens, grampinhos de cabelo, pen-tes, manchas de batom, um poema pr-concreto de Oswald, feito com tipos de carimbo,2 cartas de amigos grudadas em suas pginas, afora charges da imprensa com legendas adapta-das para zombarias com os integrantes do grupo, enigmas pito-rescos, recortes de jornais e, inclusive, o carto de um usurio em que se l: "de la part de Dcio de Paula Machado".3 Sol-tas entre as pginas do caderno, flores murchas e uma pequena bandeira norte-americana de seda.

    * Este texto, aqui revisto pelo autor em 1987, foi publicado originalmente no Suplemen-to Literrio de O Estado de S. Paulo, de 16 de maro de 1968.

  • A idia do lbum partiu de Pedro Rodrigues de Almeida,4 literato rat que acabou delegado de carreira, esprito perfeito de acadmicien escrevendo o mdio do bom gosto. Sob o pseudni-mo de Joo de Barros, ele quem abre o caderno, onde diz: "Mui-to de arte entrar nestes temperos, arte e paradoxo que fraternal-mente se misturaro para formar, no ambiente colorido e musi-cal deste retiro, o cardpio perfeito para o banquete da vida".5

    Os colaboradores no se utilizam de seus nomes. Valem-se de pseudnimos ou apelidos. Sabe-se que freqentaram a gar-onnire, entre outros, Monteiro Lobato (que l, um dia, esque-ceu as provas de Urups), Menotti dei Picchia, Lo Vaz, Guilher-me de Almeida, Igncio da Costa Ferreira, Edmundo Amaral, Sarti Prado e Vicente Rao. Nas suas Memrias e Confisses, Oswald revela alguns dos pseudnimos: Joo de Barros Pedro Rodrigues de Almeida;6 Miramar e Garoa, Oswald de Andrade;7 Viviano, Edmundo Amaral;8 Ferrignac e Ventania, Igncio da Costa Fer-reira;9 e Bengala, Lo Vaz;10 Guy todos os paulistas o sabem foi sempre pseudnimo de Guilherme de Almeida. Sarti Pra-do pode ser identificado pelo seu latinrio ou por sua "literatu-ra bestssima" como diz Oswald,11 literatura onde fala em "a Alameda do Sonho", "o halo do passado". Em algumas pginas do dirio, Ferrignac deixou caricaturas de Oswald, de Deisi, de Jeroly, de Viviano, de Guilherme de Almeida, de Vicente Rao e de Lo Vaz.12

    A figura dominante de O Perfeito Cozinheiro Deisi novo amor de Oswald, misteriosa mulher com que depara ao sair de momentos sentimentais turbulentos, mulher que exerce grande fascnio no s sobre o jovem jornalista mas tambm sobre todos os que o rodeiam e fazem ponto na sua garonnire. H uma es-pcie de secreta paixo coletiva por Deisi, que amante de Os-wald. "Todos declaram que amavam a Ciclone", escreve ele.13

    Deisi surge na vida de Oswald aps seu rompimento com Kami ex-rainha dos estudantes de Montparnasse, que trouxe de Paris e superada a crise amorosa que teve por centro a bai-larina Landa Kosbach, por ele batizada no Duomo de Milo. O encontro dos dois assim relatado por Oswald: "Em minha casa calma da Rua Augusta, a professora de piano de Kami, uma moa chamada Antonieta que mora ao lado, na Rua Olinda, traz para o almoo uma prima esqueltica e dramtica, com uma mecha

  • de cabelos na testa. Chamavam-na Deisi. Padece inteligente. Con-vido-a cinicamente a amar-me. Ela responde: Sim, mas sem premeditao. Quando nos encontrarmos um dia. Pergunto-lhe que opinio tem dos homens. Uns canalhas! E as mu-lheres? Tambm!"14 Pormenor a registrar: este dilogo abre o romance A Estrela de Absinto, de Oswald, escrito de 1917 a 1921, refundido vrias vezes, mas publicado em 1927 na sua for-ma primitiva. Aps esse primeiro contato, logo se estreitam as relaes com Deisi, a quem chamam de Miss Ciclone, "acentuando na primeira slaba".15

    Figura estranha e fugidia, normalista e poitrinaire, 16 Deisi, cortejada e festejada pelo grupo, aparece e desaparece da garon-nire. Inquieta e fantasiosa, tem problemas com a famlia, que lhe vigia os estudos, mas, ao mesmo tempo, mantm esquisitas relaes. Oswald refere-se a seus passos escusos: "Os amores de Ciclone infelizmente no tm somente sergents de ville, tm tam-bm cambrioleurs. E que h qualquer mistrio que minha amante vagamente refere. Um sujeito esquisito do Brs".17 Outro depoi-mento: "Chego ainda a tempo de v-la galgar ligeira o estribo poeirento de um bonde e mergulhar, com a lentido do monstro" deferro, nesse abismo bumoso da vrzea que faz supor, paia l do bstI3of~cle crimes das vielas, a bastencja.de rnmanr* em qiip ela se obstina. Com uma timidez de potache, murmurei-lhe, en-trc dentes, um bom-dia idiota. Ela nem sorriu nem olhou. Par-tiu. Pela primeira vez, percebi uma coisa sria que ela me faz falta. Assino: Mirabismo".18 Doutra feita, Oswald surpreende-a entrando numa "penso de rapazes" na Rua Anhangaba.19

    Desentendimentos com a tia, que a expulsa de casa, obrigam-na a partir para Cravinhos, onde, por exigncia da parente, deve-r obter licena da me para ser independente.20 Nessa cidade do interior adoece, e de l manda cartas. Numa delas, sem data, escrita em tinta roxa, dirigida a Oswald ("Meu Miramar") e assi-nada Gracia Lohe, conta que vai indo bem mal de sade. Indaga do amor de ambos e recomenda: " preciso velar por ele, muito, muito!" Mais adiante, pungentemente discreta, revela: "como me sinto morrer! E isto sem gesto teatral, e olhos em alvo... sabes como sou simplria a esse respeito'Pede-lhe que a visite, tele-fone ou escreva. Suplica s tantas: "consola a tua pobre amigui-nha" e afirma: "sou to s e to triste sem ti". Sugere-lhe que desfaa a garonnire e solicita, ento, coisas, objetos que l se

  • encontram. "Nessa carta roxa, ela exige tudo a almofada ver-de, a peluda, a pele de tamandu que estava na parede sob um florete, o meu retrato, o reposteiro claro, os tapetes macios e os Di e Malfatti que possuo", escreve Oswald.21 Deisi termina a car-ta dizendo: "beijo-te o olhar verde".22

    A ausncia de Miss Ciclone, sempre lamentada, esvazia o re-tiro de Oswald e amigos. "O covil da Rua Libero agoniza."23 Ao seu retorno de Cravinhos, a garonnire fechada e chega ao fim O Perfeito Cozinheiro das Almas deste Mundo. 24 Encerra-se o dirio com a sentena Acta est fabulal Abaixo dela, registra-se: "...e o livro se fecha silenciosamente, com a prestigiosa atrao das coisas silenciosas: mon silence est ma force...*' Como ltima contribuio, em nome da Ciclone, a frase: "E tanta vida, bem vivida, se acabou". Era o seu epitfo.

    Aps narrar que seguiu a Ciclone at uma penso de rapa-zes, Oswald anota em suas memrias: ' 'Deisi visgo puro. No tenho a coragem de romper. Ela tambm no explica nada, no conta, no se defende. Em Junho, ela me diz que est grvida. De quem? No pergunto. Ela no fala. Concordamos no abor-to".25 O aborto praticado, sobrevm violenta hemorragia, torna-se necessria a extirpao do tero, o mal atinge os pul-mes.26 Agrava-se o estado da doente e Oswald casa-se com ela in extremis a 11 de agosto, presentes Guilherme de Almeida, Fer-rignac e Monteiro Lobato. A 24, Deisi agoniza e morre. "Esfacela-se meu sonho'', lamenta Oswald, que dir tambm: ' 'A que en-contrei enfim, para ser toda minha, meu cime matou".27

    Recorte de jornal colado ao fim de O Perfeito Cozinheiro das Almas deste Mundo noticia que Deisi (D. Maria de Lourdes Castro de Andrade) esteve casada uma semana e que tinha 19 anos ao falecer. Vo a seu sepultamento, entre outros, Ferrignac, Edmundo Amaral, Lobato e Vicente Rao. Miramar manda uma coroa com a inscrio: "A Deisi, o teu pobre Oswald". Vestida de branco, est enterrada no jazigo da famlia do marido, na Rua 17, n? 17, do Cemitrio da Consolao. Estava encerrada uma eta-pa da vida de Oswald, que em breve instala outra garonnire, agora na Praa da Repblica, esquina da Rua Pedro Amrico.28 Nela entraria em fermentao o Modernismo.

    O Perfeito Cozinheiro das Almas deste Mundo, dirio a um tempo pessoal e coletivo, alm de testemunho de um tempo, da belle poque paulistana, da atmosfera e esprito em que se for-

  • mava uma gerao, , no tocante a Oswald, documento existen-cial que reflete os seus anos de aprendizagem, no s literria e artstica, mas de vida ela mesma, com seus jbilos, dramas, con-flitos e sofrimentos: inicia-se sob o signo do riso e do otimismo, jocoso e pilhrico no comeo; vai, a pouco e pouco, crescendo em termos de inquietao, melancolia, angstia, dvidas e sus-peitas, para atingir, ao final, o plano de lgrima e do trgico com a morte da bela Miss Ciclone, figura smbolo para o grupo de uma outra mulher que ento se forjava a mulher moderna, em busca de liberdade, de afirmao, de independncia. Veja-se o depoimento de Pedro Rodrigues de Almeida:' 'Ela sozinha basta para encher um ambiente intelectual de homens de quanto ele precisa de feminino para sua alegria e para seu encanto. Ela mul-tiforme e varivel na sua interessante unidade de mulher moder-na".29 Para Ferrignac, Deisi "cheia de graa, amorvel e ben-dita entre as mulheres".30

    Mais do que um dirio, O Perfeito Cozinheiro um catico e desencontrado ou desordenado romance, por onde flui uma his-tria de amor, com seu pathos e sofrimento desentranhados da prpria vida a histria de amor de Oswald e Deisi, das surti-das sentimentais e misteriosas da freqentadora do Brs pen-so de rapazes do Anhangaba, e, ainda, a histria do recndito, secreto amor de todos os que transitam pela garonnire seduzi-dos pela jovem normalista marcada como observa Oswald por "um sentimento iniludvel de doena, de morte e de frus-trao".31 Um romance de nova estrutura, de tcnica inusitada, de um surrealismo natural e espontneo, em que esto o clima e as personagens que vo gerar e povoar Os Condenados, Mem-rias Sentimentais de Joo Miramar e Serafim Ponte Grande. Do ngulo da estrutura, do caricato das personagens, estes dois lti-mos livros derivam do dirio, nele se enrazam, ali comeam in-conscientemente. Todo o processo fragmentrio de Oswald nasce dessa experincia pessoal de diarista e um pouco tambm das suas leituras do Journal, dos irmos Goncourt, cuja criture artistique buscou assimilar, notadamente cm Os Condenados. Machado Pe-numbra, de Joo Miramar, certamente um dos freqentadores da garonnire. A viso de crimes e traies, de bas fond e desa-gregao de Os Condenados decorre dos mistrios que cercavam Miss Ciclone. Os nomes grotescos ou humorsticos e por isso mesmo crticos de Miramar e Serafim em nada diferem, como

  • esprito ou essncia, dos pseudnimos e apelidos usados em 0 Perfeito Cozinheiro. O gosto pelo trocadilho, cultivado abusiva-mente no dirio e provindo de Emlio de Menezes, o amor pelas situaes inslitas e imprevistas com tons de stira e humor tm a mesma fonte.

    O dirio, por outro lado, tem ainda especfico valor , em si mesmo, com suas tintas de diversas cores, suas colagens, trechos a carimbo, caricaturas, charges e caligrafias, um objeto criativo, uma inveno como livro, pea rara em sua aparncia e organizao. E precursor de vrias obras que, grafcamente, tentam inovar as formas de comunicao. Texto e contexto, as-pecto interno e externo, contedo, forma e fundo esto indisso-luvelmente ligados nessa rara pea que documenta uma poca e uma cultura.

    NOTAS Indicam-se a seguir as pginas de Um Homem sem Profisso (So Paulo, Editora

    Globo, 1990), primeiro volume das Memrias e Confisses de Oswald de Andrade, de onde foram retiradas as citaes deste artigo: 1) Pg. 109; 2) Reproduzido em Inveno, n? 5, dezembro 1966; 3) Pg. 118; 4) Pg. 109; 5) Pgs. 110-111. Nas Memrias e Confis-ses, das pgs. 109 a 128, Oswald reproduz diversos trechos do dirio da garonnire; 6) Pg. 111; 7) Pgs. 112 e 116. Oswald tambm usa o pseudnimo de Irmo Garoa e inmeras variaes dc Miramar; 8) Pg. 113; 9) Pgs. 110 e 115; 10) Pg. 117; 11) Pgs. 121-122; 12) Pgs. 113 e 117; 13) Pg. 120; 14) Pg. 108; 15) Pg, 109; 16) Pg. 117; 17) Pg. 113; 18) Pg. 116; 19) Pg. 131; 20) Pg. 120; 21) Pg. 127; 22) Oswald reproduz diversos trechos da cana, omitindo outros porm; 23) Pg. 122; 24) Pg. 127; 25) Pg. 132; 26) Pg. 132; 27) Pg. 133; 28) Pg. 133; 29) Pg. 112; 30) Pg. 119; 31) Pg. 127.

    As referncias a certas peculiaridades da obra, que se encontram nos prefcios dc Mrio da Silva Brito e de Haroldo dc Campos, so pertinentes ao original. Estes pref-cios, bem como a transcrio de Jorge Schwartz, aqui reproduzidos, constam da edio fc-similar, projeto c produo de Frederico Jayme Nasser, para a Editora Ex Libris Lrda., 1987. (Maria Augusta Fonseca)

  • REQUIEM PARA MISS CICLONE, MUSA DIALGICA

    DA PR-HISTRIA TEXTUAL OSWALDIANA

    HAROLDO DE CAMPOS

    A folheatura deste livro-lbum, peas de um mosaico disper-sivo, livro-caixa-de-surpresas numerado derrisoriamente como um livro-razo (e que se vai compondo por frases fragmentrias, ano-taes, rplicas e trplicas, intervenes ready-made, exerccios "be-letrsticos" de circunstncia, caricaturas, cartoons, cartas, ao rit-mo bomio dos mores e humores dos habitues do ' 'covil do Mira-mar" a garonnire oswaldiana dos anos 17/18), projeta uma estranha luz, uma luz memorial, de pantalha art nouveau.1

    No sei se pela influncia subliminar da tinta violeta da manuscritura de sua primeira centena de pginas (uma dominante grafocromtica depois substituda pelo verde, encre verte, a par-tir da pgina 112, e, sucessivamente, pelo vermelho, "tinta en-carnada' ', rubricas rubras, desde a pgina 149). No sei. Mas, medida que essa luz de vitral coa sobre um passado hoje mais do que sexagenrio e o nimba de uma aura deliqescente e fan-tasmtica, produz-se um efeito ptico-mnemnico que faz com que esse pretrito relativamente recente nos parea mais distante do que o passado remoto, arcaico. Como parece estar longe no tempo essa garonnire oswaldiana da Rua Libero Badar, fre-qentada por rapazes de palheta e gravata os ' 'gravatas'' (pg. 94) que trocavam irreverncias amigveis em francs nem sem-pre correto (mas constantemente ferino) e acompanhavam com distncia nonchalante os sucessos do ano final da Primeira Gran-de Guerra. Como tem um ar fanado essa escritura lils do ano

  • dcimo oitavo deste sculo, mais morta e cedia para o nosso cri-ticismo desromantizado de homens ps-modernos da dcada de 80 do que as incises parietais, cursivamente picassianas,4de um desenho rupestre.

    Ao mesmo tempo, h alguma coisa de persistentemente no-vo, instigante, vivo, por trs desses caracteres coloridos (s vezes disciplinados em caligrafia elegante, outras garatujados em rabiscos, ao sabor grafolgico de cada temperamento), que configuram uma espcie de simpsio risonho: O Perfeito Cozinheiro das Almas deste Mundo... Ei-lo, nossa vista, nesta cuidada reproduo fac-similar, apresentado na letra roxa do //^r^ar-delegado-de-polcia Joo de Barros (Pedro Rodrigues de Almeida), com um prefcio no es-tilo retrico-ornamental do futuro Machado Penumbra das Me-mrias Sentimentais de Joo Miramar: "Para os que vm do so-nho e do impalpvel, acreditando na bondade nativa da mulher e na felicidade poetizada do amor, alinhar-se-o como lanceiros espirituais, agressivas e speras, as receitas apimentadas com a ver-dade picante dos desenganos reais..." (...) "Muito de arte entrar nestes temperos, arte e paradoxo, que, fraternalmente, se mistu-raro para formar, no ambiente colorido e musical deste retiro, o cardpio perfeito para o banquete da vida"; ''...o triunfo mais completo da culinria espiritual e o penhor certo da fora psqui-ca das geraes vindouras''. A verve parnaso-acadmica diz de uma poca nossa leviana e retardada belle poque cm que a li-terarua pretendia ser o 1 'sorriso da sociedade'', afraniopeixotes-camente. Desmitificada, minada nos resqucios prestigiosos de so-lenidade que lhe sobravam da ' 'escrita artista'', transposta para um novo contexto, assumida ao revs enquanto possibilidade de pardia (e de autopardia), essa mesma verve dar nutrimento stira mordentemente demolidora dos romances-invenes os-waldianos. Mas o trao vital que procuro surpreender e definir agora no exatamente este, do qual j me ocupei em outras opor-tunidades. Aqui me interessa sentir uma presena. Uma presen-a que se impe disseminao, ao desconcerto estilhaado desse dirio coletivo e alegremente proliferante, com a fora coesiva dc um magneto. uma imagem de mulher: perfil de garonne, me-cha ruiva agressiva, feies petulantes, um trao azul marcando a olheira funda, desenhada por Jeroly-Ferrignac (alis, Igncio da Costa Ferreira): Deise (Daisy), Dasinha, Miss Ciclone, a musa art nouveau da garonnire miramarina...

  • No preciso muito esforo para dar-se conta de que nesse jornal caleidoscpico, movido a alfinetadas de humor e a passes de trocadilhos mais e menos felizes, o trao de unio que sutura os momentos dispersos do mosaico, e lhes d conexo e sentido, a presena/ausncia ciclnica (e cclica) da Miss. Musa polifni-ca, ela quem aparecendo e desaparecendo tece e retece a trama do "Dirio", deflagrando as interrogaes, os coment-rios, as glosas, as pulses lrico-epigramticas e os arroubos pas-sionais do grupo disponvel de ' 'estetas'', freqentadores do ' 'co-vil" do miramante (e mais de uma vez mirabismado e miramar-gurado) Miramar: todos sob a regncia de sua "batuta invisvel''... Musa palimpsstica, boa parte dos grafemas que constelam o texto como que a reinscrevem implicitamente, em linha d'gua, figu-ra latente e latejante de um desejo ubiquamente plural.

    Deise, Miss Ciclone, Miss Tufo, Tufozinho a pr-Pagu da Idade Bomia de Oswald de Andrade, da era em que o autor das Memrias Sentimentais de Joo Miramar o Mramar/Ga-roa do Cozinheiro acreditava que o contrrio do burgus seria o bomio, no o proletrio. Pagu, a Musa Antropfaga da Revis-ta de Antropofagia (2 * Dentio), a Musa Proletria da fase do Homem (e da Mulher) do Povo e do Parque Industrial, to bem retratada por Augusto de Campos em Pagu-Vida-Ohra, est pa-ra Oswald de Andrade como Asja-Lacis para Walter Benjamim a musa militante da virada ideolgica. Como refere Mrio da Silva Brito, com certeiro poder de observao (As Metamorfoses de Oswald de Andrade), se Pagu, ' 'a Passionria Nacional dos momentos primeiros e hericos da luta ideolgica no Brasil", es-t caracterizada na revolucionria Mongol, personagem de A Es-cada Vermelha (da Trilogia Os Condenados), Deisi um compo-nente essencial do retrato de Alma: essa Lucola tardo-romntica e evanescente, protagonista dos primeiros dois livros da Trilogia, escritos basicamente entre 1917-1921. Musa crepuscular e agni-ca, sua morte prematura, dolorosa, joga o irresponsvel e destro-ado Miramar num outro tempo de sua carreira de escritor e de homem: ele comea a experimentar foras e amadurec-las para as escaramuas do Modernismo, a afiar sua navalha crtica para os anos polmicos dos romances-invenes da dcada de 20 que se anuncia. S depois, ao cabo dessa nova etapa (que se ir de-senrolar ao longo dos anos da vida em comum com a pintora Tarsila o fulgurante perodo "Tarsiwald" biografado por Aracy Ama-

  • ral), emergir o Oswald dos anos 30, ' 'casaca-de-ferro na revolu-o proletria", pedindo contas a seus avatares provisoriamente conjurados: tanto ao Miramar docemente alienado dos discursos cvicos de Tijucpolis (Aradpolis), como a seu desabusado su-cessor, o carnavalesco homo seraphinicus: "Necrolgio da bur-guesia. Epitfio do que fui".

    Um outro necrolgico encerra este lbum-vida que O Per-feito Cozinheiro: um recorte amarelecido de jornal (sobrescrito por uma data a mo: "Agosto 25-8-1919"), registrando o faleci-mento da normalista Deise e o seu casamento in extremis com o jovem Oswald, bacharelando em Direito. (Pagu, poca, tinha apenas 9 anos e freqentava o Grupo Escolar da Liberdade.) l-bum-vida: a vida, aqui, imita a arte, estiliza-se como arte, na forma do paradoxo wildeano. Deise, a normalista de Cravinhos, a "es-finge do deserto do Brs"2 (o Brs da "divina encrenca e do mis-trio", o "delicioso bairro d'apaches", como ela o definia ideali-zadamente, velando assim o seu ' 'mundo de caixeiros'' e a cena proletria do futuro romance de Pagu), assume, vivncia exaspe-radamente e satura um paradigma literrio: o modelo romanes-co das ' 'almas de fico'', cujos sofrimentos ela afirma reviver nos "momentos de veemncia crtica", confessando-se "deformada sentimentalmente pelos livros". Como as heronas dos "roman-ces de paixo'', de Manon Lescaut Dama das Camlias (sem es-quecer a variante virginal de Virginie e Atala), a Miss ora' 'musa gavroche do vcio ligeiro'', ora ' 'silhueta de mistrio'', 4 'estranha criana" morre por amor. Mrio da Silva Brito resume, em seu comovente estudo sobre O Perfeito Cozinheiro, o entrecho dessa pera de Puccini que a vida real orquestrou. A morte da normalista poitrinaire sobrevm, como um desenlace infeliz, a um aborto, forado pelos cimes apaixonados de Oswald, que, liqidada a garonnire, contava casar-se com a enigmtica Dei-se (essa resoluo rastrevel j antes, nos crescentes protestos amorosos lanados nas pginas do "Dirio" pelo cada vez mais enamorado e possessivo Miramar, a quem os amigos, solidrios no amor e na dor como no humor , comeavam a alcunhar de "Miramr...tir" e "Miramar...ido"). A nota de tragdia, no irreparvel da notcia fnebre, recortada do jornal e colada ao l-bum bomio como um clofon pstumo redigido pela vida real, sobreleva o trao constante de mordacidade e ironia que tempe-ra mesmo os momentos de angstia e sofrimento registrados no

  • Cozinheiro. Nas suas' 'Memrias e Confisses'' publicadas em 1954 {Um Homem sem Profisso), o velho Oswald revive e epitomiza os sentimentos dilacerados do jovem Miramar, na passagem dos anos 10:' 'A que encontrei enfim, para ser toda minha, meu cime matou... Estou s e a vida vai custar a reflorir. Estou s".

    Conhecemos, de longa data, a aclimatao literria desse pa-radigma entre ns, desde o Romantismo alencariano. Com Lu-cola \1862) e Iracema (1865), o romancista cearense conseguiu desvencilhar-se, at onde lhe era possvel dentro dos preconcei-tos puritanos da sociedade do seu tempo e de suas prprias con-tradies, da visualizao tradicional da mulher intangivelmente casta e sublimadamente distante a donzela das convenes do amor-corts luso-europeu, que ainda persiste na Ceei do Guara-ni , para criar os seus mais livres tipos femininos: a indgena em estado de natureza e a desinibida mundana de salo, ambas a priori ou por definio resgatadas do cdigo de tica dominan-te, de imposio patriarcal, pela exceo ou pelo excesso. Irace-ma, a virgem dos lbios de mel, na verdade uma tigresa na obsti-nao de suas opes ("a virgem morena dos ardentes amores"), decidida, no ntimo, a deixar-se possuir pelo guerreiro branco, Martim, apesar dos escrpulos e relutncias deste, acaba, de cer-to modo, por' 'possu-lo'', seduzindo-o no sono-sonho, aninhando-se em seus braos depois de ter consentido em faz-lo provar o embriagante licor da jurema, do qual ela mesma era a guardi e a vestal. Lcia Lucola, "o lampiro noturno que brilha de uma luz to viva no seio da treva" , orgiasticamente disposta a submeter os homens que a infelicitavam ao prestgio ertico do seu desenfreio carnal; a autopunir-se, flagelando-os tambm, num impulso ambguo de gozo e dio ("Em lugar de Lcia diga-se Lcifer" l-se numa passagem do romance). Ambas, es-tando margem por fora de sua condio ou "selvagem", ou "luciferina", podem fazer amor e dispor erogenamente do pr-prio corpo fora das normas masculinas que prescrevem, para a mulher, o recato virginal e a abulia encorrinada do decoro espon-salcio, na sociedade brasileira do Segundo Imprio. (Lembrar que Franklin lavora, o regionalista estreito, que seria dado como pre-cursor do naturalismo brasileiro por seus pruridos de localismo documental, insurgiu-se com indignao moralista contra Irace-ma; nas Cartas a Cincinato, de 1870, a pretexto de criticar o ' 'es-banjamento de imaginao'' que afastaria o autor da ' 'verdade'',

  • denuncia, na cena da "posse" do Captulo XV, em particular, 1 'a mais deslavada materialidade'', a "baixeza'' que supunha assim

    desmascarar sob o disfarce de um estilo ' 'alambicado'', sob o ' 'ar-tefato de roupagens suprfluas". Recordar ainda, luz dos da-dos recolhidos por Raimundo de Menezes, que D. Pedro II estra-nhara como um homem do estofo moral do Conselheiro Alencar tivesse sido capaz de escrever um livro "to licenciosamente rea-lista" como Lucola...) Iracema e Lucola, ambas essas figuras de nossa galeria feminina de fico, excepcionais e excessivas para os moldes da poca, tm de pagar com a morte o tributo pela in-fringncia da norma. E a maneira de Alencar fazer as pazes com a conveno e com seus prprios prejuzos conselheirais, exem-plando as suas insubmissas heronas (para isto, semiologicamen-te falando, tinha sua disposio a alternativa do ' 'desenlace in-fortunado'', contida no esquema romanesco que lhe serve de pa-dro). Iracema expira, depois de dar luz Moacir, ' 'o filho da dor'', sentindo-se abandonada por Martim; Lucola, condenada ciso corpo/alma (ver, nesse sentido, o penetrante estudo de Dan-te Moreira Leite sobre a "teoria romntica do amor''), redime-se de sua condio luciferina: morre de um aborto, resultado de um violento choque emocional ainda uma vez autopunitivo, sabendo-se grvida de seu devotado Paulo e sentindo-se indigna de um amor puro ("Fui tua esposa no cu!"). Poderia parecer-nos que essa idealizao romntica do ' 'eros'' na mulher, maniqueista-mente livre em suas exteriorizaes s quando destinado a ter um "final infeliz", teria sido, de uma vez por todas, relativizada e ambigizada pelos olhos ciganos da Capitu machadiana (na car-ta roxa, do final deste "Dirio", Miss Ciclone diz estar relendo Dom Casmurro...). A vida mostrou que o modelo supostamente de fico subsistia, apesar de tudo, em outros termos e cercado de novas tenses, mas igualmente dotado de fora coercitiva e re-pressora, na Paulicia no to desvairada dos anos 17 a 19 de nos-so calendrio provinciano, ainda pr-futurista...

    Deise, Miss Ciclone, Miss Terremoto, a Tufozinho da gar-onnire que era Zfiro no Brs-Montmartre dos devaneios afran-cesados dos redatores do Cozinheiro, viveu com tenacidade e vee-mncia o seu paradigma literrio. O que significava, antes de mais nada, para ela, uma opo literria, decididamente igualitria, no confronto com o universo masculino. Uma opo interioriza-da e determinada at a fatalizao, como o provam, aqui e ali,

  • no "Dirio", frases e cartas suas. Como o prova a sua resistncia s presses moralizantes e censreas da famlia e do acanhado meio burgus, os estratagemas desenvoltos de que lanava mo para ver-se livre dessas peias. Como o demonstra, por outro lado, a independncia altiva que marca o seu relacionamento com o grupo bomio dos freqentadores da garonnire; seu ritmo de andori-nha; suas presenas e suas ausncias misteriosas; sua terna doa-o de amante ("Por ti, Joo Miramar, a Miss tem mais profun-dos os olhos e a cabea bizarra mais revolta"), e suas fugas sobe-ranas e inexplicveis, que assustam Miramar e comovem seus com-panheiros ("Flores para a Ciclone! Ressurreio provisria para outra provisria agonia... E de novo h de ressurgir de grandes olhos sob a boina ligeira de estudante a nossa Ciclone, a nossa mocidade, o nosso smbolo esguio"). O "Dirio" um grfico dessas atitudes, contraditrias s na aparncia, da ' 'singular doida-lcida, Miss Ciclone de olhos tristes..." A irreverncia galantea-dora e cobiosa dos ' 'seus rapazes'', ela responde com ceticismo melodramtico, quando no a paga tambm na mesma moeda brincalhona de irreverncia. Num trecho em que Joo de Barros literateja loas em louvor da Miss ("A Ciclone um desenho mo-derno do Sexo, feito nervosamente e a carvo, de um interesse empolgante, capaz de satisfazer a todos os espritos de homem, os mais diversos e exigentes...") e onde Miramar, trocadilhesco, entoa: "E o pecado imortal!" Deise entra no jogo e ironiza, no mesmo tom de clich grandiloqente: ' 'A Ciclone o grande v-cio desta vida...", para afirmar em seguida, num mood afetado, dramtico: ' 'Oh! o passado ser-me- sempre a grande chaga que sangra e cheira mal..." Em outro momento, escreve: "Mas a arte to longa... e a vida to curta", e o velho paradoxo latino, de dicionrio de citaes, ganha repentinamente um sentido do-cumental de instantneo. Pginas adiante, compara "Le Cygne", que "morre lentamente" na fonola, com um "vampiro de san-gue" que lhe suga os sonhos... Tiradas literrias e vida crua se interpenetram: "O dia a falecer no hospital de sangue do poen-te"... Ou: "Vou ao mdico fazer uma puno. Ciclone". Oswald-Miramar caoa das "literatices" da amiga (embora ele mesmo, de quando em quando, no deixa de perpetrar "tiradas" do g-nero nas pginas do "Dirio"). A certa altura, j quase no final do Cozinheiro, anota: "Daisy continua a fazer literatura cravi-nhense". Antes fora o Ventania (o caricaturista Ferrignac) quem

  • glosara, mordaz, um trecho idlico-paisagstico, caprichadamen-te composto na letra caligrfca da Ciclone: "Viva a basbleuzi-nha do Brs!" A Miss no perde o prumo: assina uma de suas cartas "Missa Literria''... Diverte-se com as complicaes doms-ticas do Miramar (que se estava separando de uma antiga liga-o, a francesa Kami): "Kami!" registra em letras garrafais

    1 'Oswald entrou c miando, pelo chapu. Ciclone''. E no deixa

    de anotar, fazendo troa com a ambigidade de sua situao no meio dos "gravatas": "Eu sou como a cobra cascavel! Sou trata-da a ponta-pel!" Provocante e reticente, joga um jogo de esqui-vanas com os seus mal-dissimulados pretendentes e com o pr-prio Miramante, que, saudoso da sua presena, prorrompe, mais de uma vez, em efuses ditirmbicas: "Ciclone, pinga da minha taverna sentimental! (...) Volta! Volta!" Ou ainda: "Amo-te. Sou teu escravo! Abaixo o 13 de maio... Miramorto". Quando um dos litterteurs condimenta uma receita galante de amor e mulher, pg. 104 do Cozinheiro, deixa escrito: "...e como ella se nos escapam sempre com um lindo riso por entre malhas inhabeis do sentimentalismo macho''. Denuncia-se nessa passagem invo-luntariamente o "machismo" mal-contido, "poetizvel", mas no fundo cioso de domnio, dos bomios do "covil" miramarino, os "neoromnticos de 1918"... Talvez por isso Ciclone zombe dos cimes do Miramar. Conta-lhe dos seus misteriosos namoros do Brs. Do seu Harrusam, amarelo amor japons, cujo nome ' 'd idia de uma pastilha de chocolate ou mel rosado''. a "Cclow-ne" do "circlone"... Coqueteia com os "seus rapazes", flerta com eles todos, cobrando-lhes tributo de afeto ("Ferrignac que no se esquea muito de mim e Viruta e Leo e Sarti, o meigo poeta, enfim todos os pequeninos deuses do meu paraso perdido"). Manda-lhes bilhetinhos, mimando-os com apelidos ("O bilhete chamava o Leo sabem de qu? 'Meu doce de abbora sentimen-tal!', e dizia tambm isto: 'Mas tira esse bigode esquisito, esse indcio piloso e frgil da raa nobre!', e assina 'Tua sereia'. Leo desfez a tromba, gozou, depois murmurou: No, os bigodes no, ainda no esqueci a histria do Sanso"). Se lhe celebram parnasianamente as "mos reais d'unhas perfeitas", replica, p-ginas (e vida) adiante, j do seu exlio de convalescente em Cra-vinhos: ' 'A terra de escarlata mas no h mos reais de unhas perfeitas: quando muito umas mozinhas avermelhadas com mon-tanhas de calos, unhas torturadas, comidas de um lado". Se o

  • Miramar-Garoa, hamletiano, faz "blague": "Ciclone, que mais esperas? Vai para um convento, philia!", ela retoma a "deixa" e atia: ' 'Receitas conventuais: Quiseras estar no convento? Nu com vento? ...!!! / Preferiria estar nua com garoa..." (O Miramar-Garoa e o Ferrignac-Ventania entram na dana, e a Miss, maliciosamente, replica ' 'Primeira receita'' escrita em 30 de maio de 1918 pela mo do Miramar, logo pg. 2 do Cozinheiro: "Nos casos de amor, Dulcinia prefira-se a Dulce nua"). Mas a ob-sesso do infortnio, do "final feliz", persiste, atravessa o texto, resiste, convincente, ao prprio tora pattico, empostado, de con-fisso "literatizada": "Que ser que eu tenho em mim? Uma ansiedade m que me tortura um pouco... Sinto a premeditao que a alma tem para a desgraa! Que ser que eu tenho em mim?... A medalha mostrou-me o reverso''. Na carta final, na ' 'carta ro-xa", naquela em que Deise, segundo o relato confessional do l-timo Oswald (Um Homem sem Profisso), "exige tudo" da almofada verde aos tapetes e quadros que guarneciam a garon-nire em dissoluo ela junta as duas pontas da dor e do hu-mor: "Lego-te o bidet, mas manda-me o espelho". Lia baudelai-reanamente as Flores do Mal, e como que adivinhava a proximi-dade da morte (que aguardava "sem gesto teatral e olhos em al-vo"). "Beijo-te o olhar verde" sua frase de despedida. Poema de um s verso. Sinttico. Beijo metonmico, atirado no impromp-tu de uma frase-em-liberdade.

    Da Miss de quimono lils e mecha interrogante no restou obra, restou vida. Breve, intensa, fragmentria, epifanicamente reconhecvel nos instantneos dispersos deste "Dirio". Escreve ainda o Oswald reflexivo das Memrias e Confisses de 54: "De Deise, que tambm usara o pseudnimo de Gracia Lohe, resta bem pouco, apesar de ter deixado uma difusa e numerosa litera-tura. Se, nas minhas peregrinaes, eu no tivesse perdido as suas memrias inteiramente fantsticas, ela talvez tivesse sido a pre-cursora do conto policial que hoje to bem cultiva meu amigo Luiz Coelho''. Da fbula vivida Acta est fabulal, l-se em la-tim de bacharel na ltima pgina do Cozinheiro , ela foi, no entanto, actante e atriz agente e reagente (no sentido qumi-co ou alqumico) da "funo fabuladora". "E voc no conhece a Cyclone?!..." (pg. 68). "Todos ns, defacto, ammos a Cyclo-ne..." (pg. 156). Plurabela e analvica presena, amante-e-me como o "Eterno Feminino" em Joyce ("Well, you know Anna

  • Lvia? Ycs, of course, we ali know Anna Livia"). Mrio da Silva Brito apontou com razo a fuso dessa dupla imagem, desse du-plo papel da mulher em Alma, de Os Condenados. Assim, Daisy (Deisi), Miss Tufo, a ciclnica Tufozinho, acaba sendo, por os-mose e catalisao, a autora-regente de 0 Perfeito Cozinheiro. E como este, ainda na certeira apreciao de Mrio, visivelmente o embrio ' 'catico'',' 'de um surrealismo natural e espontneo' da Trilogia; como tambm , na novidade da estrutura aleatria e da forma ready-made, de livro-objeto, o nascedouro do par Mi-ramar/Serafim, os romances-invenes da radicalizao modernista Miss Ciclone fica sendo uma espcie de "ghost writer" desse agendrio coletivo, dessa escritura originariamente plural, que flui por revezamento e contraste, por idlio e trocadilho, ponteio e contraponto, exerccio estilizante e mordacidade pardica. No fazer das contas, Miss Ciclone, a "basbleuzinha do Brs", emerge pa-ra ns, do seu nostlgico ' 'auto-epitfo'' no lbum miramarino ("E tanta vida, bem vivida, se acabou"), como a musa dialgica da pr-histria textual oswaldiana.3

    E aqui que alcano entender melhor o que persiste de ins-tigante e vivo para alm da escritura fanada deste lbum repus-cular, quase monumento fnebre, decorado com marcas de flo-res murchas, retalhos de cartas, grampos enferrujados, peas vo-tivas de um bric--brac memorial. Penso dissipar-lhe a distncia ' 'aurtica' ', penetrar o rayon violet que se projeta de suas pgi-nas como um revrbero de mirada art nouveau, surpreender-lhe o sentido prospectivo, j agora apostilado histria ( Histria do Modernismo Brasileiro, de que Oswald de Andrade seria a per-sonagem "mais caracterstica e dinmica", no testemunho auto-rizado do outro Andrade, Mrio). Peter Szondi, numa compara-o iluminadora entre o ' 'tempo perdido'' proustiano e o dc Wal-ter Benjamin (da "infncia berlinense" revisitada), esclarece: "O tempo perdido de Benjamin no o passado, mas o futuro". E apoia essa observao num aforismo de Einbahnstrasse: "Como a luz ultravioleta, a recordao manifesta, a cada um, a glosa se-creta que acompanhava, como uma profecia, o livro de sua vi-da". O que nos interessa (e fascina) nesse livro passado recap-turar nele a figurao do futuro.

    So Paulo, julho de 1982.

  • NOTAS 1 Em Um Homem sem Profisso (Memrias c Confisses), voi. I, 1890-1919 (Sob as ordens de mame), Rio de Janeiro, Jos Olympio, 1954, Oswald escreve (pg. 109) "Alugo uma garonnire, Rua Libero Badar, nos fundos de um terceiro andar. Estamos no ano de 17. Dessa poca, do ano de 18 e at 19, componho com os freqentadores da garonnire e com Deisi, que se tornou minha amante, um caderno enorme que Non conserva'M-rio da Silva Brito refere como datas de elaborao do dirio: "30 de maio de 1918 a 12 dc setembro de 1919" ("O perfeito cozinheiro das almas deste mundo'Suplemento liter-rio de O Estado de S. Paulo, 16.3.1968). Ao republicar esse estudo pioneiro (ngulo e Hori-zonte, So Paulo, Martins, 1969; As Metamorfoses de Oswald de Andrade, So Paulo, Con-selho Estadual de Cultura, Comisso dc Literatura, 1972), Mrio indica "30 de maio dc 1918a 12 de outubro de 1919". Frederico Nasser e eu, depois dc cuidadosa verificao do original e sua confrontao com os trechos correspondentes de Um Homem sem Profisso (UHSP), chegamos s seguintes concluses: A garonnire poder ter sido alugada por Os-wald no ano de 1917, ano em que se estreitaram suas relaes com Deisi (UHSP, pgs. 175 a 177). O dirio, todavia, apesar de trazer na frente da segunda guarda, a lpis, as datas 1918-1919. parece ter sido escrito ao longo exclusivamente do ano de 1918. A pg. 1, a data expressa de seu incio c 30 dc maio dc 1918. O encerramento sc d cm 12 dc setembro do mesmo ano de 18. O ms e o dia esto expressos ltima pgina do caderno; o ano resulta das informaes contidas em UHSP, pgs. 209-211. No dirio, na frente da penltima guar-da, encimando a carta final de Deisi, escrita cm roxo, h um carto-postal, colado, com a data completa: 12.9-18. Desfeita a garonnire, Oswald instala Deisi "numa casa da Rua Santa Madalena, no Paraso" (UHSP, pg. 214). As referncias Ciclone, que seguem em UHSP, no mais esto registradas no dirio, j concludo. Neste, como acrscimos posterio-res a 1918, podemos encontrar apenas: a) o recorte de jornal, noticiando o falecimento de Deisi, colado na ltima guarda, com a data, a mo: 25.8.1919); b) a inscrio no verso da penltima guarda, comentada na nota 3, abaixo (atribuio conjectural).

    2 Lily Litvak, Erotismo Fin de Siglo, Barcelona, Antoni Bosch Editor, 1979, mostra como a simbolizao da mulher sedutora numa esfinge foi uma constante no erotismo europeu finissecular: "Assim presidiu a uma revista criada na Holanda e a outra na Alemanha; as-sim a pintaram Khnopff, na Blgica, e Toorop, na Holanda; e assim escreveram a respeito dela D Annunzio, na Itlia, Wilde, na Inglaterra, Eugnio D'Ors, na Espanha. Nesse sen-tido representa o enigma da vida e o mistrio do destino humano".

    3 O anncio "No Ibrno / Brevemente 21 rao", completado por um lema recursivo, em italiano "de orelhada'DA CAPO AL (sic) FINE, parece-me um Post Scriptum algo tardio, acrescentado ao lbum na fase da segunda garonnire de Oswald, onde a "Semana de Arte Moderna" germinaria em "discusses entusiasmadas sobre pintura, escultura, msica, poe-sia, prosa, romance, tudo, enfim, num ambiente heterogneo e confuso..." (Conferir Mrio da Silva Brito, ' 'O Arauto da Semana de Arte Moderna", cm As Metamorfoses de Oswald de Andrade.) Oswald provavelmente pretendeu, em certo momento, manter um novo "Di-rio" desses anos modernistas. Do perodo de 1929-31 "O Romance da poca Anarquista ou Livro das Horas de Pagu que So Minhas'\ publicado parcialmente por Augusto de Cam-pos {Pagu Vida-Obra, So Paulo, Brasiliense, 1982) com o pertinente comentrio: "...est pa-ra o Perfeito Cozinheiro (...) como um concerto de cmara a duas vozes para uma sinfonia''.

  • NOTA DO EDITOR

    Na transcrio do manuscrito, optamos por manter a gra-fia original e algumas outras de suas caractersticas tais como: disposio do texto na pgina, sinais grficos, alteraes e cor-rees. Conservamos tambm a numerao das pginas e repro-duzimos nas de nmero 28, 29, 30, 31, 32 e 33 os desenhos assinados por Jeroly.

    A ttulo de ilustrao, reproduzimos e encartamos algu-mas pginas do dirio, de forma a proporcionar ao leitor uma idia mais aproximada da riqueza da obra.

  • 1918 1919

  • 1918

    Maio 30

    Perfeito cosinheiro das almas., deste mundo: na formula breve e extica d'este titulo est a promessa, que, praza a Deus no seja mentirosa, do livro mais util, mais pratico e mais moderno deste sculo de grandes torturados. Si o nosso pobre corpo, depaupe-rado a toxicos e reduzido s propores de carcassa degene-rada, precisa dos condimentos que rehabilitam, no me negar a posteridade deliquescente, que se annuncia, serem almas hu manas as coisas mais esfomeadas e debeis, que se agitam neste conflagrado planeta dos absurdos e das inverosimilhan as. Aqui, e no foi outro o intuito humanitario dos abnegados autores, encontrarfho as irriquitas e contradicto-rias almas deste mundo com que matar a sua fmg je o^^^m^Lai^fomedolluso. Para os que vem

    na bondade nativa da mulher e na feli cidade poetisada do amor, alinhar-se-o como lanceiros espirituaes, aggressivas e asperas, as receitas api-mentadas com a verdade picante dos desenganos reaes, que fer-vem em volta de tudo, para nosso assombro e desolao^ Para os que precisam mitigar o grande mal de ter vivido muito, para os que sentem, na ruina dos sentimentos monos, o desen-cantamento doentiio das coisas e dos homens, os pratos com muito saL os anti-pastos fones, as salitradas fatias de bom-humor, que do sede para beber, num clice de ouro improvisado e com relevos de sonho, a ambrosia embriagante das horas despreoc cupadas, que produz as ressurreies do bem cubiado e perdido e acorda, na bruma parda da viso pessimista, os vagos contor nos da chimra, que consola e quasi cura. Muito de ane entrar nestes temperos, arte e paradoxo, que, fraternalmente se misturaro para formar, no ambiente colo rido e musical deste retiro, o cardapio perfeito para o banquete

  • da vida. Comendo assim, as almas sans se faro robustas e as doen-tes sustero, com grande encanto e surpreza, a marcha dos seus males. Ser o regimen idal e hygienico, nada de excessos, nada de indigestes. Almas equilibradas e sanguineas: o triumpho mais complto da culinaria espiritual e o penhor certo da fora psychica das geraes vindouras. Que o livro produza o bem que ha de encerrar.

    Joo de Barros

    Primeira receita: XMpM/Affott

    Piii Nos casos de amor, Dulcina prefira-se a Dulce nua. Dr. xxxx

    Maio 31

    A Cyclone bateu a borracha. Miramar

    Ri devagar

    Cyclone

  • Eu tinha trez amigas

    A primeira partiu A segunda

    A terceira, f^! V

    Quem o sabe?

    Cyclone.

    A segunda? Repartiu. Miramar

    E o amigo? ^ 2 tentou rehavel-a... .negando-lhe beijos inda

    que falsos. Cyclone.

    h Tarirari taranta n tan! fari fan fan! C a t m caT\

    Phonola Estou desesperado, morro enforcado, Cyclone

    muito m. Nh, nh, nh... Therezo.

    Em torno da mulher, os homens formam duas corren-tes, completamente diversas e oppostas: uns procuram materializal-a, cultivando-lhe a carne e abafando-lhe a alma; os outros anceiam por espiritualizal-a demais, eri-ando-a de complicaes psychicas. Como so raros os

  • transfugas d'essa generalidade bi-partida itofriti i que comprehendem que ella, a futil e gloriosa herdei-ra de Eva, composta de corpo e alma. S esses so ca-pazes de plasmal-a completamente, no grande sentido, ii\ fa-zendo-ai integraM, fortei e tranquilla .^ Honra a elles!

    Joo de Barros.

    Paradoxo para uso interno: A mulher a costella de Ado,

    o sopro de Deus e a saudade da Serpente. Joo de Barros.

    .. ou a saudade de Deus, o sopro de Ado e a costella da serpente.

    Miramar

    O perigo do engasgo de Ado no foi ter sido com a ma e sim com a prpria costella

    M.

    S ha um mommento interessante no dia, o do cre-musculo, s existe uma edade interessante nas mulheres a dos trinta annos. Uma mulher de 18 annos to massan-te como um morma#o.

    Viviano

    Junho 1

    Manh s, manh triste. O Sr. de Kubelick, pallido e cabelludo, tropeando no tapete chega e toca Rubinstein para eu ouvir.

  • L fora briga-se por causa do Valois. Hontem entrevistei a Pavlowa. Ella tem marido, cachorro, frio e boceja como qualquer de ns.

    Miramar

    Ferrignac chegou, ja era tempo! Com elle, um minue-to de Beethoven e o "Momento Musical" de Schubert. Significativo para 4a ihii phase de verve morta.

    Miss Cyclone c'est la fatalit!

    Mich... let.

    Apague a luz!... Chico Ventania

    Sur la Cyclone on pourra dire tout ce qu'on voudra: tout sera galement vrai... Parce qu'elle est le ihMensonge... Ou la Verit! Ferrignac

    s de vidrio la Pina! Lucena

    Oswald. Burrinha! Burrinha! Cyclone. Ai, Juo! Ai, Juo!...

    Burrinho voc, seu Ferrignac Miracydone

  • Sobre a graphonola: Uma mulher feia como o 'Chui-Chui" de Caryl

    um disco desafinado. Uma mulher bonita como "Le Cygne" de Maud Power um disco afinado.

    Viviano..

    Noite. Silencio. O retiro deserto... Sobre a mesa os destro-os tristes de uma refeio: "andaram barbaras por aqui". Abro o nosso registro: "Oh! lindo, lindo, Ferrignac chegou". Leio as paginas de hoje: "Os barbaras so sentimentaes e sonham; que delicias {arharos!" Fao musica em honra delles: "Viva a phonola"..

    Joo de Barras.

    44A ultima rosa do vero."... Vem perto o outomno para todos ns; maturidade gloriosa dos fructos cidos da mocidade! Outomno que nos chegas, evocado pela musica, que se desmancha numa graciosa agonia de flres, chega-nos com sombra amena e doura nos pomos; no nos seja preciso temperar o que a vida nos devra ter Afeito bom e assucarado; Outomno, s benigno e transforma os azedumes da illuso na essencia dce de uma experiencia vencedora! Soa Phonola! Faz-nos pensar na ultima rosa que se desfolha no escaldante vero da existencial. Quando ser? Quan-do ser isso? logo, decerto, e deve ser encantador ver, sob um cu que se faz diverso, no desmaio chlorotico da cor, uma ptala, outra depois, depois mais outra.. irem todas, lentamen-te, cahindo, cahindo...

    Joo de Barros.

    Lendo, na Gazeta de hoje, a entrevista de Miramar com a friorenta Pavlowa, convenci-me, mais ainda, de que somos mesmo um povo fundamentalment e elegante, elegante no conjuncto, nos

  • capiteis, na cupola e nas bases: temos entre ns o primeiro sapateiro do mundo. Irra! j a gloria!..

    Joo de Barros.

    junho 2

    Some sunday morning"

    Pedro ri litteratura. Estivemos na missa em So Bento e, vista dos ltimos telegrammas, quizemos saber do Cyro qual era a candidatura derrotista. Os al-lemes bombardeiam Paris. Ferrignac comprou um papa-capim. Nadje, que tem cabellos de bronze , um cunhado de ferro e uma frgil alma de crystal, man-dou-me um carto com isto lithographado sobre uma paysagem de folhinha: "A* tua ingratido me mata".

    M.

    Amanheci amarfanhado e molie; a noite correu-me tumultuosa de sonhos e escassa de repouso; sahi indeciso, amado e bambo de alma e de corpo. Apezar de todas interes-santes noticias da campanha em que se mediram o Abrao Cri-minoso do Valois e o Cavalleiro Andante da Peuana, no tinha vontade, nenhuma vontade de rir. Mas, depois da missa, aqui, as piadas sobre a offensiva, a phonola, o Mira-mar a fazer arrumaes divertem-me, alegram-me e, por fim (Oh! Prodgio!) o sr. Ren Zapata Quesada arran-ca-me gargalhadas immensas, gargalhadas feitas na barri-ga, faz-me chorar de rir. A carta que elle escreveu ao nosso amado Guy, que coisa, que monumento, que preciosida-de! Tristes, doentes do fgado ide a essa fonte beber alegria! Que carta! Ainda haver mo-humor depois de se ler a prosa

  • do grande homem? Leiam, leiam todos os que soffrem e respondam. Zapata, eu te admiro, e te agradeo commo-vido; s um benemerito, Zapata, quero-te aqui, quero dar-te pinga com limo e piadas do Ferrignac, quero ofiertar-te um Therezo, quro beijar-te, Zapata! Eu te amo de longe, vem para ns, vem alegrar-nos; no sejas mo!..

    Joo de Barros.

    Homem no Municipal Rofthkoff, blagueur do sculo 21, diz-me da pederastia de Nijinski e do seu casamento por 200 pesos com "alfombra", levando o cura em con-siderao, a reclame para sua#greja. Roskoff o south american modem boy filho de russos.

    M.

    Apezar de ser, como ficou consignado, to desopilante o sr. Quesada, a quem no tenho o direito de negar talento (e deve tel-o de facto) fiquei encantado, intima e sinceramente satisfeito com esse documento mais, que elle, expontanea e calorosamente, veio juntar aos muitos, aos valiosos, aos indiscutveis titulos, que fazem, neste momento, a consagrao justa e, para mim, desvanecedora, do grande pota, do realmente e totalmente pota Gy, meu amigo, meu bom, meu velho, meu carinhosissimo amigo.

    J. Barros.

    Tarde azul. Almoo com Pedro. Palestra com Rothkoff no quarto, na Rotisserie. Buenos-Ayres, S. Paulo, a Europa.

    M.

  • Junho, 3.

    No pude vir, honrem, noite, hora combinada. Quando cheguei, encontrei a porta fechada. Lamentei, lamento.

    J.B.

    A Cyclone, ella sosinha, basta para encher um ambiente intellectual de homens do quanto elle precisa de feminino, para sua alegria e para seu encanto. Ella multiforme e variavel, na sua interessante unidade de mulher moderna.

    Joo de Barros.

    A Cyclone um desenho moderno do Sexo, feito nervosa-mente e a carvo, de um intersse empolgante, capaz de satisfazer a todos os espiritos de homem, os mais diversos e exigentes.

    Joo de Barros.

    Ainda no vi Ferrignac, depois que chegou de sua viagem. Estou com saudade d'elle. Como eu gosto desse typo! Que bizarro bla-gueur!

    Joo de Barros.

    A vida um bem, mesmo para o pessimista, porque este poder e deve definida assim: " o bem de esperar a morte". Ou isso, ou a esperana um mal.

    Joo de Barros..

    Tens a alma opilada? O triatoma cupidineo infeccio-nou-te o corao? O hematozoario de Laveran te anemia a inventiva?

    Cyclomol, q.s. X

  • Difinio graphica da vida:"...?..." Viviano Pacchcco

    Nous dcvons acccptcr lc vent comme il souf-flc, lc temps comme il vient la "Cyclone" com-me elle est...

    Chico Ventania

    Cumulo de pacincia:

    Catar carrapatos com luvas de box...

    Viruta

    da impacincia: Jogar box com luvas de pellica.

    M.

    Reflexes sobre a Cyclone:

    Cyclone uma espiral de fumo de perfumador espiritualisada em rithmos de musica slava.

    Viviano. (com vistas ao Dr. Franco da Rocha)

    Cyclone... (Honny soit qui mal y pense...) Chico Ventania

    Se a Cyclone estivesse entre os ventos da tempestade classica de Virglio, Enas no escapava.

    M. A Cyclone a desolao do Amadeu Amaral

    C.V.

  • A "Cyclone" uma brisa que annuncia o btMlh simum.

    V.v. A Cyclone a quarta virtude theologal.

    C.V. E o pecado immonal!

    Miramar.

    O que consegue a Cyclone socialmente? Na-da. O que consegue a Cyclone na solido? Tudo

    CV.

    A Cyclone a hyperbole do complicado e a quintessncia do simples.

    Joo de Barros.

    A Cyclone um comprimido de pyramidan para certas migraines sentimentaes...

    C.V.

    A Cyclone o bem, porque mulher; a Cyclone o mal, porque mulher; a Cyclone o bem c o mal, que Eva trouxe da Arvore da dupla sciencia e transmittiu mulher.

    Joo de Barros.

    Trocadilho paradisaco de Ado (o primeiro da Terra) E prefervel ser pente a ser mulher!

    M.

    A Cyclone o grande vicio desta vida. Cyclone

  • Oh! o passado scr-mc-ha sempre a grande chaga que sangra e cheira mal...

    Cyclone.

    Um grande motivo de melancolia: "Porque o cigarro apaga" Cyclo

    J ter talento e ser mulher! M.

    Que pessimismo, Cyclone! Todas as chagas se cu-ram.

    Joo de Barros.

    O Ferrignac deante da Cyclone a philarmonica de Rio Claro, em dia de festa.

    M. O Ferrignac quando v a Cyclone

    fica sentimental e maroto. J-

    B'

    No se encoste em mim, sino sahe cinza. Cigarro Accezo

    O Pedro deante da Cyclone o directorio politico de Itaporanga em dia rfde eleio agita-se.

    M. Viva a Bacchanal de Glazunow!

    M. O cysne deslisa agonisante na phonola, est tudo azul, o ceu, a vida, a tinta. At logo, vou ver se os allemes tomaram Paris.

    M. Ainda no. 8h.xx. J.B.

  • Ha fraquezas que fortalecem. M.

    O Pedro positivamente deixou de ser o Dr. Sorrizo de Itaporanga para ficar, um instante, esta noite pelo menos, o Dr. Tristeza de So Paulo.

    "Xarope de dynamite" o nome da valsa que a nossa orchestra de cegos toca dias e dias, sob o balco hypothetico de D. Felicidade.

    M.

    Quando que a gente poder fazer a arte? M.

    Depois que fizer a vida. J-B.

    Joo de Barros, com um pictoresco real que me da illuso de leitura, i iiAi illustra a vida desse "hinterland" da maleita e do sen-timento que d expresso territorial pelo me-nos bandeira verde e amarella dos batalhes de meninos nacionalistas. O preto Sebastio, morto em cima do cavallo, i que pacientemente o conduz assim at a casa; a tragdia do Isaias cuja familia acaba antes do seu corpo podre ser pescado numa volta do Rio Verde; o sol-dado Clodomiro que amava a Tica e ratou em syncope, no matto, o suicidio sensacional tudo isso me pe ante os olhos, a poderosa ma-gia d'expresso que possue o nosso trefego e mascarado companheiro de rota. A elle a home-nagem sincera do meu enthusiasmo!

    M.

  • Ri devagar(?)

    Muito obrigado Miramar, tni a tua generosidade foi sempre o microscopio que me centuplica. No me zan-go com isso, porque: Ora cebo, ou a gente amigo ou no ! Com tudo isso, porm, que voc enxerga em mim, eu no passo do desterrado delegado de Itaporan-ga, cuja mais nobre funco caar homens. Coisas da vida e no me queixo. O que voc chama poderosa magia de expresso no mais do que o meu pobre dom de ver bem. E, com isso, meu velho, sem outros elementos, no se faz arte. Pbr tal motivo, sou da policia e no das letras. A homenagem, que sincra, guardo-a no corao e levo-a commigo para esse scenario verde e vivo, onde se desenrolaram as coisas que o impressionaram e repartil-a-ei com a vida de l, que foi o seu prestigio, e no o meu, que o empolglhou e seduzio. Mais uma vez, muito obrigado.

    Joo de Barros.

    Junho 4

    Trag rapadura de cidra e uma alma pre-homerica, cheia de pinga com limo Positivamente amanhece na Vida.

    M.

    Acabo de ouvir paradoxos, bebo madeira e penetro neste asylo de msicos cgos, onde vejo que Miramar, illudido pelas virtudes do limo ou da pinga, sob a canicula da sua vida intensa de sempre e, sobretudo, do momento, divi-sa, optimistamente, frescas madrugadas azues. assim, meu filho, que se vive: faz-se mistr que no nos queime o sol e no nos assuste a noite. Temperemos os fogos do dia e atiremos punhados de luz na treva. Que os elementos heterogeneos do nosso existir de bruscas transies se mis-

  • turem, na retorta da nossa experiencia, para formar a suavidade, harmoniosa vista e grata ao corao, das meias tintas, das meias luzes, das emoes em surdina e dos risos devagar. Que amanhea sempre, para sempre pardejar e que ns ii faiih do alvorecer alegre de um cyelo de espe-ranas boas saibamos e possamos repousar, passado o dia intenso e inconseqente, no crepusculo de uma saudade resignada e quasi feliz. E que a vida sino uma succes-so de madrugadas? Ha dias que amanhecem calmos, correm serenos e entardecem poticos; outros correm turvos e se fcham em tormenta. Que amanhea.

    J. de Barros.

    Pensamento inconfessvel da Cyclone: "s meias luzes eu prefiro as meias de seda.

    M.

    Collaborao da Cyclone

    O Sarti deante da Cyclone illustra o primeiro encontro AiiihTtM que Ado teve com Eva, depois da queda Effi toma um ar desconfiado e malandro.

    Madrigal itaporanguense: "O fogo da mulher amada no queima, illumina"

    Benedicto XV desculpe M.

    A Cyclone a celebre prophecia a Balthazar: Manes, thecel, phars! ( da Cyclone)

    pesada, contada e dividida. J. de Barros. O peor que: "Dans cette fosse aux "lions", il n'y a pas de Daniel"

    M. Victorhuguinho.

  • Je porte tous Alies biens avec moi!... (Isto da Cyclone) Viviano.

    Casa a arte com tua vida e talves sejas feliz!... Mas a arte to longa... e a vida to curta....

    (Isso insinuao de casamento com o Pedrinho) Cyclone. M.

    A Cyclone acaba de definir o Pedro: ' 'O theatro ly-rico de Itaporanga" e eu accrescentei: "Em dia de beneficio". M.

    Reflexes culinaras Ferrignac Foie-gras "Pimpona". Miramar beef la mode do sentimentalismo

    Joo de Barros picadinho do "donjuanismo" itaporanguense Cyclone Mayon&aise da nevrose.

    Vivianocook

    Mh Prato do dia: Feijoada de Cyclones. M.

    O Viviano mordeu o dedo da Cfyclone. E a mania de chuchar. M.

    A Cyclone vem me confessar que ama... (o Pedro). De facto, ella est com o corao ferido epidermicamente.

    M. O estylo o homem, a mulher o estalo.

    M. Lobato esteve aqui e esqueceu as provas dos seus "Urups" sobre o sofa. A Cyclone, muito pimpona, attribuiu sua in-fluencia desnorteadora esse gesto do nosso homem do dia.

  • Lobato, defenda-se ou confesse que tomou Cyclomol.

    Ferrignac no chegou, que coisa pau!

    Anoitece (na Wida no,) l fora. A phonola canou de tocar tangos. Eu penso no Edmundo, nos alliados que o Fiore acha que "s uns burro", no Braz, e idh 1\i descubro enfim que a cr do sculo

    "A Zul Mira Mar"

    Viva a Mimi Pinson de Chicago!

    Vou me embora.. No vou.

    loca Kubelick! Toca, meu ceguinho!

    Vou.

    Fui. A phonola arrasta o mommento musical de Schubert

    em largas arcadas de violino. Faz-me por isso reflexionar sobre este instrumento

    Reflexes sobre o violino

    O homem o arco; a mulher o "stradivarius"; o arco passa/ e o Stradivarius fica vibrando...

    Vivioline Sejamos os virtuoses d'esses stradivarius.

    Viviolinine Uma mulher meiga um violino tocado em

    surdina. Isso eu j li V.V. nos pensamentos dos

    Cigarros Castelles Ventania.

  • D. Juan Tcnorio y Salazar foi o Paganini dos coraes femeninos.

    Vivioline.

    "Chego: tudo deserto: a vida em tomo to deserta... que vontade me vem de chorar mais...!

    Cyclone. A Cyclone diz que isto est sem rythmo. Juro que mentira, oh entertela da minha vida!

    Miramar. iii iiii i

    "Comeo a prever que tambm ja tenho meu corao de moa e de menina, estrangulado por um sentir devotado e maligno, mordido pela volpia da vida incgnita que me oferecem: "Le cygne" morre lentamente... e com elle se desdobra de manso uma immensa tristeza que como um vampiro de sangue suga os meus sonhos, matando o meu ardor!

    Cyclone.

    E o Pedro que no vem! Que corao de pedra! Cyclone.

    Benedicto XV desculpe-nos J de Barros.

    A Cyclone mysteriosamente leal. J. de Barros.

    . . .eo Pedro grosseiramente leal! Cyclone.

    E ambos so desleaes. M.

  • Meus amigos, at a volta. A vida boa. Viva a saudade!

    J. Barros.

    Amanh, eu volto. J.B.

    No chorem. J-B.

    Ultimo pensamento:

    A vida como o disco comprado pelo Pedro: bem intencionada e mal comprehendida.

    Joo de Barros.

    . . . mal tocada, quer voc dizer. M.

    No entanto, outra coisa era a vida, ha pouco, para o Pedro a gondola de vime, sem en-costo. Ao que a Cyclone observou que o Lobato no besta senta de atravessado na vida.

    ^Prolongando um trocadilho: Corao de Pedro, corao de pedra, corao de padre.

    M. Bis-Ultimo pensamento: O meu disco uma pssima musica tocada por um grande artista;

    o amor , a maior parte das vezes, uma grande msi-ca, tocada por um pssimo artista. No lhe sabe este dar expresso e relevo, ih apezar da sua immensa belleza, como no consegue o outro corrigir os defeitos

  • da composio falsa e apagada.

    Joo dc Barros

    Se isso e piada commigo, fique sabendo que j toquei a Pathetica de Beethoven numa sanfona.

    M. E eu j executei Wagner no pente.

    De quem? (M.) J.B.

    E o que vale ser cgo de orchestra. M.

    PS. dos ltimos pensamentos: No faamos piada, eu pano para

    Itaporanga: fique o meu disco de violoncello sendo a nica voz humana deste recinto. Adeus. E com pezar que os deixo, mas o dever me priva de os ver por mais tem-po (sem trocadilho). Adeus e muita saudade, acreditem.

    Joo de Barros.

    Se verdade que violoncello tem voz de gente, o iit AUi violoncello 6h fim iiih ii M Tiii Ai UiT

  • Daisy desfallece cm crise dc sentimento. Esqueceu-sc de rir devagar. O Pedro, esse esqueceu-se de que poli-

    la-me olhos de assassino. Positivamente o disco que elle adquiriu desta vez em So Paulo a:

    "Ave Maria! M Uttt Tit" do Othello. M.

    Na orchestra de cegos, eu sou o violoncello: falo como gente.

    J. Barros.

    A Daisy a batuta invisvel M,

    Para uma orchestra de cgos, s uma batuta invisvel; si desafinarmos, a culpa delia.

    Joo de Barros.

    iiiiiiiiiiiiiUii

    J. dc Barros? Daisy? Miramar?.... No grande scenario de um dia depois do outro ho de resolver juntos o cora-co e a cabea. Que grande alma, o Miramar! Que encanto, a Daisy! Que paradoxo, o Joo de Barros!

    Como os tres so bons! Como os tres se querem! Acima de tudo, sejamos leaes, prudentes e sensveis.

    J. de Barros.

    Daisy, voc fica insensvel deante d'isso? M.

    Fico imprudente e desleal Cyclone

    Que prudente lealdade! M.

  • Pedro parte. A esta hora apita o trem que o vae mer-gulhar em Ituparipiranga ou coisa equidistante. No vou ao botafra para documentar-lhe minha amizade. No boto fora amigos. Ventos galemos o levem, mas fiquem os... cyclonicos.

    Frei Lupus Dona Urraca Briolanja de Vermuiz Tructezinda, a castell "com canteiros de violeta em torno dos olhos" que pe em cheque o Dicto XV desta rabelaisiana manso quem... (caroo) quem... (caroo). Socorro! Socorro! Sinto o On... na cabea! Audam!

    Frei Lupus

    Do Lobato os torcedores da guerra E sahimos, to-mando no cabide o chapo, o guarda-chuva e as ideas l de fra.

    Junho 6

    E i iiiiiiii O Miramar "le poids lourd" do romanticismo. MfCyclone

    A Cyclone o "poids leger". M.

    O Viviano, illustrando a sua opinio a meu respeito me (adivinhe se for capaz.) nueto?

    Cyclone.

    A C^yclone a sphinge do deserto do Braz

    Viviano.

    O Viviano d vida um sabor d"exquise" de scenas azues... de ternas crianadas...

    Cyclone.

  • O Viviano disse que sente dentro d'alma um lindo arfar de andorinhas azues.

    (confere Viviano) Cyclone

    Dessa lucta grega entre o "poids leger" e o "poids lourd" restar pelo menos a saudade das attitudes.

    M. Daisy o petit-pois do amor, a ervilha da indif-ferena, o feijo mulatinho da blague.

    Joo Gourmet.

    Dasy andorinha de dois veres inquieta edificadora de ninhos flor saudade busca-p!

    Junho 7. 3 h. da tarde.

    O Miramar dorme o somno da innocencia Cyclone

    E sonha comtigo. Miramar (s 3 e 2 segundos)

    Emilio morreu hontem. Uma epocha morreu com elle. M.

    Ferrignac em Rio Claro, Pedro em Itaporanga, Rao em Ta-quaritinga, s eu e Dasy enchemos de sombra o claro retiro.

    D-me agua do Taboo, oh samaritana da minha JxAii peregrinao sentimental!

    Dasy sahiu dizendo-me que no era d nada d'isso, apenas a "cegonha do meu lago escocez".

    M.

  • Ao Miramar. Como bom querer bem... ser uma cabea loira ou

    no, uma face de mrmore ou rubra em rosas, uns lbios e uma alma irm a quem se diga soffro parece-nos que os espinhos menos se aguam e a flor mais se perfuma!

    Cyclone (isto do Viviano)

    L UHi ilii U biMiii M Uiii vmu

    La beaut cest une premesse de bont (E de voc?) Viviano

    Amo as mulheres quando ellas se parecem com as rosas; amo as rosas quando ellas se parecem com as mulheres; amo ambas quan-do ellas se parecem com o meu sonho...

    Viviano A vida toda pregada de alfinetes... cheia de "plisses" de franzidos e ns somos os grandes costureiros da Rua da Amargura, sempre numero impar...

    Cyclone.

    Junho 8

    Et vous contemplerez

    Don Quichotte qui

    charge!

  • Junho 10

    E a vida prossegue. M.

    V se reanimas o teu pobre corao. Cyclone

    Minha creana Dei-te a chave de uma gaveta muito mais preciosa do

    que essa, a de tudo o que soffro e que quero. E outras mem-rias mais caras, as que vou compondo com lagrimas baques e sorrisos de victoria ou de dor, tu as conheces, as que vou compondo hoje, amanh...

    Miramar.

    Pedro, poceiro, encontraste afinal o poo de Rocinha?

    Jeroly

    Os beijos da Cyclone descendem em linha recta e sempre varonil dos beijos de Lucrecia...

    Jeroly

    Os abraos, dos abraos do tamandu da parede. M.

    Miss Cyclone embellie la vie... Jeroly

    elle fait la vie! et la mort!

    M.

  • Miss Cyclone, meu "Vermouth Cinzano" dos agapes "pinianos"...

    Jeroly Lagarta rosada do meu algodoeiro!

    M.

    Monteiro Lobato dos opilados! Jeroly

    O violino o instrumento do sentimento assim como a mu lher o sentimento do instrumento

    Viviano. (Caliniano de Salazar)

    Dasy o piro deste menu. M.

    Ferrignac chegou com maneiras de gentilhomme campagnard. Trouxe bom humor e bom tabaco. Dasy vae para Itaporanga.

    Paulino Piza, "sergent de ville" dos amores da Cyclone.

    Chico Ventania Os amores da Cyclone nfelismente no tm somente "sergents de ville" tm tambm "cambrioleurs".

    M. Mas para isso, aqui esta a policia scientifica. Cuidado!

    Miramar Cyclone

    Veremos quem dir, por ultimo:

    Tas gagn la partie! Miramar

  • Cyclone:

    "Calypso ne pouvat pas se consoler iii les dpart d'Ulysses..."

    Ferrignac

    Fan-faririn -fan-fararin-fan-fa fan fan fan! Phonola

    Junho 11 (Bat. de Riachuelo)

    Fi! fifi! trrrri.. .f! Viu! Viiii! trrrr.. .fi!

    (Patativa do 1? andar)

    Vidari e Carvalho de Mendona sustentam que a lei de 1902 no seu artigo 49, dos contractos unilateraes, no produziro effeto erga omnes, de-vendo, portanto, como diz Brustlein, declarar os motivos juridicos que podem auctorisar a resci-so da concordata.

    Dr. Vicente Rao

    Justinianus definio: "Jris vinculum et cyclopi-cum necessitat obligatium ut nobis alicujus et solvendae rex". Ora, o contracto aleatorio, por con-seguinte... Irra! a hespanhola de Ribeiro no me sae da cabea!...

    Dr. Vicente Ro

    Volinine! Que monada de muchacho! Que pier-nas, Dios! Bemdicta sea la madre... que ha hecho usted!...

    Don Garcia de Faria, servidor de ustedes...

  • 5 horas da tarde Passou por ahi a procissosinha do Lessa, do Stcidcl

    e da Sociedade Hippica. Enfermeiras fazendo beicinho para chorar aos estalos minados das palmas, escoteiros de anno e meio grudados no leno clssico de procisso, o Paulino Piza, a gloria das bandeiras e o Plinio Barre-to. O Lobato diria que isso que guerra, o mais his-toria. Assisti ao desfile com Non e Kamia. Os jornaes amanh vo ii affirmar que havia 20.000 pessoas. E mentira.

    A phonola convida Dansa pela magia persuasiva de Carl Maria Weber. Depois Iseult que entrega a alma ao Creador numa arcada de violino. Depois o capricho poderoso de Rubinstein que agita um teclado onde segue a melancolia patritica de Chopin. Sem iHi isso tambm, que seria a vida?

    Nesta morte de Isolda, a gente sente ella penetrar no Paraizo.

    A Cyclone Wagner alegre. Miramar.

    Junho 12

    Regresso da missa do Emiiio. Na nave deserta, onde um orgo resa, a mais disparatada meia dzia de pessoas papae, Santos Silva, Jlio Cezar, Chichorro, Nita, Armando Prado, Leoncio Corra e Sucupira! Volto, pela clara manh com Jairo e Amadeu. Caf.

    Saio. Volto. Saio. De novo aqui, ouo Rubinstein, Weber... O Fiore tem uma criada nova e est de enxaqueca. Vou comprar um franga

    Viva Rubinstein! Miramar.

  • Cebo, que defluxo! Ha uma semana que estou endefluxado como um beduino ou como Fradique...

    Sinto uma neva intellectual s comparavel i a do Thomaz Lessa Um defluxo abominavel como um discurso de Senado; um espirro to estpido como uma piada do Malho. Ferrignac chegou! bravo! No sinto nem coragem para tocar outro disco; aftcho a phono-la rouca; sera tambm algum resfriamento?

    Viviano

    Viva o "Frango"! M.

    Junho 13

    O cysne redivivo entenda-se.

    Sim, imagine-se um "menu" de cysne.

    Fui missa e de l almoar com Kamia no restauran-te do Ignacio "o dottore non vinho" disse-nos o homem do guardanapo. Dahi, Academia, louvao, coisas, o mi-nuetto celebre de Boccherini. E hontem? Assisti ao casamento do Dudu com a Dod na policia. Que "courtelinade"!

    Ser negocio importal-o directamente? E se a paz vem, e o stock fica desvalorisado? That is the question.

    Ancylostomo 14 de Junho

    Cyclone, frisson nouveau! Ferrignac

  • 2 e meia

    Minuette de Boccherini... Como rola triste a vida no covil de Miramar! Encontrei discos novos: in-dcios mui vivos de grossas transaes de terras. Cerqueira Cezar, a Sion, a Meka, as terras figuei-ras de Chanaan de todos ns!... O mandarim K-Yama declama, todavia, coisas confusas de Confucio sobre a fuga ligeira das horas. E Carmen, a feiticeira, debruada no caixilho negro, de cabelleira ruiva revolta pelos vendavaes das paixes, pergunta-me docemente:

    At quando, Jeroly! hei de esperar pelo meu D. Sebastio?

    Ferrignac

    "Momento musical" de Schubert... Volto do guarda comida. Que misria! Na vastido da segunda prate-leira uma bojuda lata de manteiga dorme o seu somno de cebo; ao lado, uma altiva garrafa de mel assuca-rado chora saudades do tempo em que foi liquida. Indicios mui vivos de magras transaes de terras!...

    Ferrignac

    Fox-trot... E Viruta? Em Santos? Na casa do Zoz? Nos braos da viuva vulcanica? Entre as saias d'aquella senhora gorda e loira?

    Ferrignac

  • Llama a un automovil! Chicharrn.

    O Fiore tem uma mucama nova! 0 velho Pan no morreu!

    Pansinho

    Ao Miramar: ... no restauram do Ignacio? V elle!

    Ferrignac

    Miramar quer se casar com Miss & Terremoto! E vocs, homens da "Eugenia", o que dizem?

    Ferrignac Para ficar redusido a escombros! V elle! V elle!

    Miramar Llama a un automovil!!

    M. Ferrignac acha Debussy "um caso interessante de mediocridade". Falamos Frana, America, offensiva e ouvimos com assombro a trompa prophetica de Lohengrin na phonola.

    M. Cyclone, vieux frisson!

    Miramar. Mais pinga com limo!

    M.

  • Mexe, bem!... Chicharrn

    Est um dia de Gnova, diz Ferrignac. Um dia de Londres, digo eu. Um dia pardo, um dia nocturno.

    Miramar

    Um dia de pole, um dia de canap... Ai, as delicias dos sales feltrados! Ai, as angustias dos cli-mas lattitudinaes!

    Ventania

    Um dia para amarrotar a Dulce sobre esses cretones...

    Ferrignac

    Doutrina de Monre: A Dulce para os rio-clarenses!

    Ferrignac Eu podia oppor outra theoria americana, offerecida pelo proprio Ferrignac a de Sans Pefia (a Dulce para a huma nidade). Acho porm uma deshumanidade, uma pena (sem ser a do cysne de Saint-Sans) estragar assim a Diva de Rio Claro. prefervel adoar a vida com a Dulce, j que o assucar est to caro.

    Pensamento rio-clarense: "A vida sem a Dulce caf sem assucar".

  • Junho 15

    Manh Boccherini Boccherini Boccherini

    Mais Boccherini M.

    E Ferrignac, Miramar, Cyclone? Realidades ou sonhos, matrias ou essencias, permanen-

    tes ou transitivas? Onde esto "No esto aqui nem esto ali, esto no turbilho da

    vida"... (hino de Job) Viviano

    Junho 17

    Para o Viviano: "Fradique o Conselheiro Accacio tomado a serio"

    Fialho

    Reflexes sobre o Viviano:

    Viviano o Fradique no tomado a serio.

    Ventania Viviano? Boccados ardentes d'Ea, diludos em agua de Sabin.

    V. Isso em francez era melhor: "Des bouches ardentes...." que horror!

    Garoa.

  • Viviano, rat d'hotel dos menages...

    Ventania

    10 e meia da noite Fui redaco do "Jornal" Encontrei l um retra-

    to para mim. Era de Anna Pavlowa. Trouxe-o para c. Na primeira parede, entrada da 'garoniere', a dansarina ergue-se ligeira, ibiii num fundo negro, entre reprodues celebres e loucuras do Di. S bemvinda Pavlowa, no retiro musical, onde no desconforto das noites longas, fazem ronda o pal-lido Kubelik, Beethoven e Rubinstein, e resa em timida surdina para que o Veiga no accorde, a trompa prophetica de Lohengrin! S bemvinda!

    Janjo Garoa Junho 18

    Dia molhado. Ferrignac mais uma vez desertou. Viruta deve andar desapparecido sob alguma pyramide domes-tica de chles-mantas. Cyclone, conforme me confessou ou-tro dia, passa manhs assim frias, no calor desconfortante do seu George Walsh de terceira classe, o terribil Azevedo que d punhaladas no escuro dos jardins. Eu, eu.... sei l!

    Ah! Ja sei! Eu... toco a phonola.

    t Garoa

    A vergonha italiana findou no Caporeto!

    V.

  • 18 graus acima de zero. Dia arripiadinho! Triste e comprido como a rabona do Marra!

    V. chove Um dia de chuva e lama como um pranto escorrendo por

    uma face velha. Vivi

    P. Qual a differena entre o Marra e um verme? R. Nenhuma os dois fossam nos cadaveres...

    V.

    7h.l0.

    Viviano, cavalheiro de Fnblas.

    Viviano, primo Bazilio.

    Viviano, inexperiente Dante de uma Beatriz ligeira...

    Viviano, pallido Gonzaga de uma Marilia de segunda mo!

    Ventania

    O Romeu, quem ser essa Julieta suburbana que a verve elu-cidativa de Irmo Ventania me descreve de sexo pelludo e robusto? Cuidado Irmo fFoguinho. Reza uma chronica de sculo ifafah antigo que cabellos assim so barbas pican-tes do demonio!

    Irmo Garoa

  • Mais uma vez, Jos, adolescente, na arapuca de . Madame Putiphar!

    Irmo Ventania Jos, segundo a Biblia, tinha 24 annos. Mme Putiphar, 30. O Da-maso tinha 24, Calino ficou nos 24. Oh! irmo fFoguinho, envelhece

    Frater Garoa

    Accacio comeou a ser accaciano aos 24...

    Gouvarinho, aos 24 j era par do reino!

    Monsieur de la Paiisse (que Deus guarde!) foi eleito senador do Imprio e cavalheiro do Me rito Agrcola aos 24...

    Irmo Ventania

    Uma reminiscencia de delegacia: Authoridade Quantos annos tem? Dud 24... Authoridade Ento case!

    Frei Garoa

    Os versos celebres de Jacques d'Avray foram publicados aos 24!

    Ventania

    Reprter: De quando datam as suas inclinaes hierophanticas?

    Baro Mucio: Dos 24... V.

  • Sccnas de alcova: (A' Modelo I (A' luz que um abat-jour de rendinhas apenas incom-moda, elle se ageita mais e mais nas saias grossas d'Ella) Jure-me que ser s minha, que foi s minha, que s deste seu garoto Que edade voc tem, meu bensinho - 2 4 . . .

    Modelo II (A luz velada, M uma garonire americana. No confuso clara Ait cretones e di "dessous", elle tem a mo perdida, e parada entre pernas para o ar. Ella descerra os lbios.) O teu sexo todo.,. E teu... Que edade tens? Nunca tive 24.

    F.G.

    No jury. O advogado do ru, gordo, t i t t negras suissas de conselheiro do Imprio, pede afflictivamente aos jurados a absolvio do ru: ... e depois lembrem-se os srs. jurados que o

    meu constituinte s tem 24 annos!... Ventania

    Campos Elyseos. Noite velha. Luar de legenda. Na janella baixa, um idyllio. Elle. Sim, amanh o meu anniversario. O pap vae

    me dar um relogio... A titi pretende convidar todos os meninos do bairro para o jantar...

    Ella. Que idade completas? Elle. - Os 24...

    Ventania

  • Junho 19

    Sol, emfim! Cu de faiana hispano-arabe... "Momen-to musical" de Schubert que a minha morphina. Depois, canninha com limo! Mais canninha com limo! A mucama do Guy, alegre como um canario, desafoga a almasinha das coisas sem nome que n'ella tumultuam... Nada de Viruta. Fadigas amollecidas das rapaziadas d'hontem. Sol, emfm! Cu de faiana hispano-arabe...

    Ventania

    Decididamente, este covil sem a Cyclone intil como um gramophone sem discos, (bi p'&Ai\)

    Ventania

    Viruta, a estas horas, repousa, contente, a carnesinha satisfeita... (iMAiM6Widlmiimi{iM1)

    V.

    Que tal o gado no momento supremo, Viruta? {muimittyiiimimimwm)

    v. fogosa? Diz cochonneries entre os dentes?

    (miitfii) V.

    A famlia a pedra angular da sociedade.

    Conselheiro Accacio (angular no digo-mas' 'triangular'' sim-a famlia moderna um tringulo: cujos ngulos so: -elle, cila e c "outro"-) Vivi

  • "Sans-rfSouci"... Nem Miramar, nem Viruta, nem Cyclone... Que abundancia de discos e que mi-sria no guarda-comida!

    "La cigale ayant chant Tout l't,

    Se trouva fort deporvue"... V.

    Palestra d'esquina: Sabes, casou na policia... Quem, o Dudu? No, o Viruta..

    Conseqncias dos 24 annos... Garoa.

    O Covil sem a Cyclone... eu preferia, no emtanto, a Cyclone sem o covil.

    Miramar

    Irmo Ventania pra, luz clara da janella, num movi-mento de surpreza triste... O primeiro disco quebrado... E mostra-me a rodella negra onde um accordeon ame-ricano acabara de repetir o seu motivo nostlgico O primeiro... E a "garonire" que vive... que v vivendo mas no chegue nunca nos 24.

    Garoa

    A "mo real d'unhas perfeitas" da Cyclone o resultado de cinco sculos de ociosidade. (Isto ja disse

    o Balzac) V.

  • 24 lindo, encantador numero que encerras o mysterio, a belleza a mocidade no conjuncto das tuas unidades!

    Assim o dia, glorioso espasmo de luz, tem 24 horas; 12 sao os mezes, isto metade de 24; 24 foram os ltimos sobreviventes da gloriosa passagem das Thermopylas; 24 eram os raios do calcanhar de Jpiter; Helena, loira e branca, quando iif fazia estremecer as brancuras dos Mrmores de Tria com a irradiao de sua bellesa, que era a condensao de toda a harmonia da Hellade, i quando iiti ti a sua graa perfeita fez atrair as hostes de Menelau contra os escudos luminosos dos homens de Paris,tinha(e isso com-provado por Homero, Aristophanes e Luciano de Samosata) tinha so-mente M fceis e seremnos 24 annos... Os antigos deuses juvenis do culto helienico tinham eternamente 24 annos... lambem N no rastro luminoso da vida humana 24 representa toda a mocidade, a fora entremeada razo; aos 24 anos sente-se como um moo e pensa-se como um homem. Nos feitos humanos essa edade tem sido sempre o meio-dia das energias

    Assim Newton quando espantou o Sbio do Instituto com a sua celebre lei das attraes tinha apenas 24 descanados annos sob a dou-ras das macieiras dos condados do Sul da Inglaterra. Gama (Vasco) quando sonhava com a sua epopea martima

    tinha 24 annos. Napoleo quando venceu a batalha de Paysand itit tinha apenas

    24 annos cheios de sonho.

    S. Pedro Que fizeste pelo mundo? o espirito

    S. Pedro No podes entrar. (Depois de uma pausa) Que edade tens?

    o espirito 24 annos... S. Pedro(sorridente) entra filho... essa edade perigosa l em baixo.

    Viviano.

  • "12 so os mezes, isto , metade de 24..." Ora bolas, seu Viruta

    V. Argumentos arithmeticos do Viruta: Titi 3 so as virtudes theologaes x 8 = 24

    7 so os peccados mortaes x 3 = 21 + 3 = 24 Gara

    "Lyrismo ingnuo de potaches'' 24 letras 1.2-3-4-5-6-7-8-9-10-11-12-13-14-15-16-17-18-19-20-21-22-23-24

    O alfabeto esta maravilha humana tambm tem 24 letras. Ventania

    Vivi.

    25, homem! Irra tem 26! Vivi Ventania

    Sim 24 + 1 G. A gaita fona o lohengrin... Vimos da Annette

    Kellerman, um peixo australiano que nada como o Marra berra... Um frio de 70 gros abaixo de zero na rua { sombra)... O resto do aniz pYo papo... Essa coisa bonita do minueto de Boccherini...

    A vida boa, ora se! A vida tem 24 annos, no resta duvida

    Irmo Ancylostomo Junho 20

    Manh gelada. Ningum, Um pouco da "Morgada". Valse caprice Irmo Gara

  • 48 + 2 = 24

    A "Morgada" aquece o corpo e contenta a alma! Parece sol liquido! Esse Miramar descobre cada coisa...

    Ventania

    O "24" no appareceu. Miramar, longe. De Cyclone ningum sabe noticias. S eu e a gaita... Ha, tambm, a "Morgada", filhos! Que bella sociedade!

    V.

    A graphonola deu uns estlos mysteriosos!... Estou com medo! Ser a alma do Emlio?!...

    Outra vez! Outro estalo! Que coisa esquisita! Vou chamar o Fiore!

    V.

    Agora o relogio que despertou! Trrinim!... Que susto, Jesus! Estou gelado que nem uma ran!...

    V.

    O Fiore fa disse que foi n'esta sala (ai, Jesus!) que se matou o cnsul da Argentina! Que horror, "minha Nossa Senhora"!

    V.

    O "24", longe. O Miramar, longe. De Cyclone, nenhuma noticia. S eu e... os estlos! "Marvdos"!

    V.

  • sola beatitudo, beata solitudo S. Bernardo

    Vivi

    Junho 21 Cyclone, "morgada" do meu inverno! Cyclone, "morro com cambucy"! Cyclone, pinga da minha taverna sentimental! Ja l vae um longo mez que no pes no retiro musical a tua feminilidade exquisita! Volta! Volta!

    Irmo Gara Ferrignac

    Traga a loira. Gara.

    Sim, trago a loira e... muchas cosas ms! Ferrignac

    ' 'Toda la vida'.. A immensa tristeza dos pampas. A alma dolorida do hispano-guarany... Copinhos de "Morgada"... Mais copinhos de "Morgada"... E Mira-mar? E Viruta? E a feiticeira das olheiras outo-naes? Ningum, meu Deus! S eu e a grapho-nola asthmatica.

    Ferrignac

    Oswald: Vou ao Jumenta (Pelagio). Volto j.

    Ventania

    Voltei: O Pelagio um caloteiro! V.

  • Dia intil; horas escoadas inutilmente: volta ao tringulo, emoo vaga por uma perna que se ihihi some entre um rufflo de sedas; ch raelancholico no Mappin, entre uma Ingleza elastica e um funcionrio amador de torradas; depois Jairo, depois Jarraux, de pois copinhos de pinga com limo (shoking!) depois um emmenso aba-timento pelos homens e pelas cousas...

    Sebo! s 4i vale ser um santo ou um gnio na vida ou... escorregar com monotonia entre sebes di sonhadoras de seios de pedregulhos speros das desi-sulluses.

    Quero uma mulher branca, de pendentifs de platina, de vestido de seda preta que cheira dMfc delicio-samente a White-Rose, viuva e tem 30 annos!

    Porque no obtel-a? Estou com uma gana de ver o Ferrignac o Miramar

    sentir a sua mocidade! S estes me comprehendem... Viviano

    Enivrez-vous soif d'lcool, soif d'amour, soif d'ether mais enivrez-vous

    Vivi Baudelaire Eu duvido que Baudelaire dissesse isso (G.)

    Estou positivamente em estado de me embebedar ou com uma esguia taa de champagne, ou com o fKiii "white-rose" de um seio.

    Vivi

    Junho 22 O menino do elevador da-me um recado desaforado de Ir-mo Ventania. Pucho-lhe as orelhas. Ventania, o independen-te rebento dos Ferreira jz, como hontem o dia inteiro, no fundo do poo onde o guarda o despeito italiano da Salom da R. Jos Bonifcio Seria melhor assignar logo Iokanan da Costa Ferreira.

    Garoa.

  • 24 Junho.

    Sinto hoje ifcft a famosa "nvoa cerebral" do amigo Lessa. Positivamente so ainda vestgios do almoo de sabbado. o diabo! O Miramar, tambm, mette a gente em cada uma!... P'r'os cachorros!

    V.

    Estou com saudades do Irmo Viruta, por ternura "Fguinho". Que prola de rapaz! uma flr! "Uma moa"! como diz o meu amigo Pimenta. Com este frio, o auctor do "Elogio da Cor" deve estar sepultado sob a pyramide domestica dos chales-ma-tas...

    V.

    O Miramar vive da volpia nervosa de retar-dar o seu 13 de Maio... Eu, o "Mira" e o Guy pre-cisamos nos "quilombar" numa nova Palmares... E d'ur gencia! Chega de captiveiro! V.

    Quando chegar a Bem Amada, faze com que ella mesma, pouco a pouco, te convena,

    pelo olhar, pelo gesto, pela phrase, de que uma outra mulher que te procura! Pensa

    que uma tua inimiga que te ameaa, que te traz um prazer e um arrependimento:

    gozo doido e fugaz que uma fumaa, remorso, que um carvo apagado e cinzento...

    etc... Gy

  • Bellos versos do Guy! So da sua ' 'Arte de amar" imitao de Ovidio. Miramar, maldoso, quer, agora, uma "Arte de funar" imitao de Vieira...

    V. Irmo Ventania, tu se fizesses versos, comporias, sem

    esforo "A arte de furtar amor". Garoa

    Viva o Quilombo! G.

    Cyclone, esphynge do deserto do Braz! Viruta, phara embalsamado pelas titis, sob a pyramide de Cheops. dos chals mantas domsticos! Jeroly, nilo fertilisa-dor dos areaes da nossa vida de negros fugidos! Que Egypto evocativo, Santo Deus!

    G.

    Junho 23

    3 gros abaixo de zero! Encontrei a Morgada transformada em gela.

    Gara

    Os tocadores de sanfona, empurrados pelos inglezes, conseguiram dizem as gazetas alguns successos... J tempo! E necessrio rehabilitar a vergonha militar italiana coisa, alis, que duvido ^ exis-tir. .. V. Irmo Foguinho no veiu hontem, dia de So Joo. Precavido como , teve medo de ser soltado.

    G.

  • Viruta, traque de velha! G.

    Aphtas, Viruta? Aquellas pontadasinhas mysteriosas? Pelos morenos joelhos das Graas, Viruta magnfico! vem! Vem virutar, Boguinho! Vem vivianar, Salazar!

    V. Vem tocar, oh "virutola" a prestaes

    G.

    Daisy reappareceu, numa nuvem de agazalhos, de luvas e beret, illustrao fugidia deste inverno de tres graus! E como veiu, partiu, (sonho fugaz), alma trotinante da rua, litteratura, busca-p do meu So Joo sentimental!

    G. Iunho-26

    Hontem, noitada em casa de Viruta. Morgada, titi de tradio, biscoitinhos de Santos, virutola- bficfycleta, em-fim 16A6 o manso conforto dos velhos lares em que todos ns nos educmos. Bravos, Viruta!

    Hoje, trouxe pelas orelhas o loiro e frgil sr. De Veczei pa-ra vir sonhar Schumann no violino e rezar, nas horas de recordao, a Ave Maria de Schubert. Jeroly deve estar com medico cabeceira entrou hontem s onze horas.

    Gara.

    AMARAL & Comp S. Paulo