AndréGomes31318

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Recenso crtica sobre a recepo do Jazz na Terceira anos 20/30Moreira dos Santos, Joo; Rubio, Antnio (2008), Jazz na Terceira: 80 anos de Histria, Praia da Vitria: Blue EdiesA documentao levantada por Joo Moreiras dos Santos e Antnio Rubio (2008) e apresentada em Jazz na Terceira: 80 Anos de Histria, pertencente ao perodo dos anos 20 e 30, pertinente para compreender alguns dos processos iniciais envolventes que permitiram a recepo do Jazz na Ilha Terceira e como o impacto deste novo estilo musical causou crticas, quer de teor pejorativo, exemplificado na crnica de Luiz Ribeiro (p. 12, 13), ou apreciativo, sendo utilizado para fins polticos (artigo da pg. 23, publicado no jornal Vanguarda em que demonstra o uso do Jazz como instrumento de ataque Igreja). O exemplo extrado para anlise exactamente o primeiro, no qual revela a reaco de Luiz Ribeiro despontada pela nova sonoridade que comeava a permear o espao pblico na cidade de Angra do Herosmo:H mais de 50 anos, apareceu na cidade uma mquina esquisita, antepassado da vitrola actual. Estava na Praa Velha numa loja do hotel que ento era de Mateus. roda de uma mesa onde havia uma caixinha, sentava-se meia dzia de pessoas, cada uma das quais metia nos ouvidos um auscultador, ligado por um tubo, de borracha ao aparelho, e ouvia uma mulher a cantar e mais duas ou trs peas de msicas, gravadas em cilindros que o operador metia e tirava da mquina () Correu o tempo e veio a vitrola americana com msica gravada em discos. Foi um deslumbramento. Que maravilha e que felicidade poder ouvir aqui as melhores orquestras e os maiores artistas! necessrio referir primeiramente como a difuso do Jazz era possibilitada pela rdio que, segundo os autores, seria o grande meio de comunicao de massas do incio do sc. XX (p. 10). A expanso e desenvolvimento da radiodifuso intersecta com o declnio do mercado fonogrfico no primeiro quartel dos anos 20, que at ento via com pouca preocupao a competio que surgia pela emergncia do novo formato tecnolgico de disseminao (Tschmuck 2012: 53 [2006]). No entanto, o facto de em Portugal continental a Columbia Records adotar a estratgia de apelar ao consumo privado de msica articulando a comercializao de fonogramas e de tecnologias de reproduo mecnica (Roxo 2009), s nos anos 30 assinala-se a venda de discos e gramofones na Ilha Terceira, particularmente na Loja do Adriano (p. 14). Por outro lado, os autores mencionam que o mercado discogrfico encontrava-se ainda em estado rudimentar devido a factores econmicos, demogrficos e geogrficos, respectivamente o reduzido poder de compra, o baixo nmero de populao na ilha e a distncia dos grandes centros urbanos (p. 15). Ao que parece a presena da T. S. F. (estao de rdio portuguesa com transmisso em Lisboa) na Ilha Terceira encontrava-se, de alguma forma, associada em termos comerciais com a venda de aparelhos radiofnicos fabricados pela Philco em 1926 Ver pg. 11 Cartaz publicitrio In A Unio (Sethi 2013:159). passvel de inquerir sobre outros aspectos no modo que as relaes das indstrias refiro-me difuso da rdio e cinema e venda de discos - advindas dos Estados Unidos e Portugal continental funcionavam e contribuam mutuamente para a imerso da modernidade e eventualmente do Jazz na sociedade terceirense. A proximidade com os americanos no plano poltico e as mudanas que trouxe ao nvel de padres de produo, distribuio e consumo na ilha so questes pertinentes a abordar fora deste trabalho.Ainda na crnica de Luiz Ribeiro fornecida uma noo dos diferentes estilos de Jazz que circundavam na Terceira apesar da recepo idiossincrtica e o julgamento valorativo do autor: Afinal, nesse benigno processo estava latente um terrvel instrumento de tortura. Por toda a parte a infernal zaragata dos aparelhos ultra-potentes a debitarem insuportvel fadaria, sermes laicos compridos como a lgua da Pvoa, inspidos como dieta de formigueiro, relatos de futebol; a vazarem jorros de ritmos percucientes, obsidiantes de foxtrot, charleston, rumba, traumatizantes pela montona insistncia, arrepiantes pelos guinchos siamescos de cornetins com surdina, gaitinhas e lminas, duras como certa iguaria dura, pelo ruido musical de banjos, marimbas, xilofones e matracas; o arraste de gramofones ligados a alto-falantes, associando os dois numa simbiose diablica, expiatria, perturbadora do repouso, num inferno frio, mas sonoro, com os reclamos de loja de modas e alfaiataria, vendedores ambulantes de ervas e ps de perlimpimpim, fenmenos raros e preciosos, entreamados de canes cantadas por etlicas vozes, mais venenosas que a recente gasolina estilizada.Como se pode verificar o foxtrot, o Charleston e o rumba para Luiz Ribeiro aglomeravam-se como um conjunto de estilos diferenciados daqueles que eram usuais ou pelo menos considerados como boa msica viva, frase complementada que ele refere posteriormente na mesma crnica das admirveis execues de obras de Debussy. Os ritmos percucientes e a montona insistncia ou os efeitos percutidos e repetitivos constam caracterizar o foxtrot, o charleston e a rumba categorizando-os sob um princpio danante. No discurso apresentado o conceito Jazz nunca empregado, nem se presenceia uma perspectiva de alteridade racial pelo autor contudo, dimenses da modernidade expandiam-se at cidade de Angra atravs destes tipos de msicas transmitidas por via rdio evidenciando o uso da bateria visto que os elementos de percusso so bastante sublinhados por Luiz Ribeiro - como smbolo dessa mesma modernidade (Roxo 2009). Tambm indica o sentido pouco restrito dos estilos que se integravam no domnio do Jazz, tendo aqui, apesar de implicitamente, a associao do Jazz com estilos musicais para danar. referenciado desde instrumentos de sopro incluindo os cornetins com surdina e gaitinhas; cordofones, como os banjos; idiofones, entre marimbas, xilofones e matracas. A aluso a este instrumentrio especfico intersecta com aquele presente em agrupamentos de Jazz-Band que a partir dos anos 20 encontrava-se em crescimento. Em paralelo, adjectivos como simbiose diablica e expiatria podem remeter para o texto de Antnio Ferro no qual declara que o Jazz-Band, frentico, diablico, destrambelhado e ardente, a grande fornalha da nova humanidade (1924:54). Ainda que se considere dois sentidos divergentes atribudos por cada um dos autores, ao passo que Luiz Ribeiro julga a msica negativamente e Antnio Ferro a enaltece, os discursos conjugados resultam numa percepo de um ambiente de desvaire. Por outras palavras, O Jazz-Band o triunfo da dissonncia, a loucura instituda em juzo universal, essa caluniada loucura que a nica renovao possvel do velho mundo (ibid). A meu ver, a frase ilustra tanto o frenesim causado para Luiz Ribeiro, como explica o seu discurso legitimador de prticas culturais (porque no s referente musica que a crtica se constri) das quais o autor valoriza umas, que vo de acordo com a sua tradio musical e valores (o recital de piano de obras de Debussy) em detrimento de outras que ameaam o status quo (foxtrot, charleston e a rumba). A atitude do autor perante o Jazz no deve ser generalizada para toda a populao da ilha, no entanto indica dados pertinentes para pensar o possvel impacto da msica em alguns intelectuais ou indivduos pertencentes a uma determinada classe social.

Referncias Bibliogrficas:Ferro, Antnio (1924), A idade do Jazz-Band, 2 ed., Lisboa: Portugalia Editora (1 ed.: 1923) A Idade do Jazz Band, Rio de Janeiro: H. Antunes & C Editores)Roxo, Pedro (2009) Modernidade, Transgresso Sexual e Percepes da Alteridade Racial Negra na Recepo do Jazz em Portugal nas Dcadas de1920 e 1930 in Arte e Eros. Lisboa: FBAL / Instituto Francisco deHolandaSethi, Anand Kumar (2013), The Business of Electronics: A Concise History, Basingstoke: Palgrave MacmillanTschmuck, Peter (2012), Creativity and Innovation in the Music Industry, 2 ed., New York: Springer Publishing (1 ed.:2006)