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Análise Dinâmica do Arco em Alvenaria
O efeito do Enchimento do Extradorso
Rosa Guimarães Atalaia Canhão
Dissertação para a obtenção do Grau de Mestre em
Engenharia Civil
Júri
Presidente: José Manuel Matos Noronha da Câmara, Departamento de
Engenharia Civil e Arquitectura (DECivil)
Orientação: António Manuel Candeias de Sousa Gago, Departamento de
Engenharia Civil e Arquitectura (DECivil)
Vogal: Luís Manuel Coelho Guerreiro, Departamento de Engenharia
Civil e Arquitectura (DECivil)
Outubro de 2010
À minha mãe, por fazer de mim a pessoa que sou, sem a qual nada disto seria
possível
Agradecimentos
Neste espaço quero deixar expressa a minha gratidão a todos os que directa ou indirectamente
tornaram possível a realização deste trabalho, com um especial reconhecimento:
Ao meu Professor e Orientador António Gago pela sua compreensão, ajuda, incentivo, apoio e
disponibilidade desde a primeira hora na escolha do tema, e em todas as fases do meu
trabalho.
Ao Professor Lemos, pela luz que me trouxe ao mundo complexo do UDEC e ao Professor Rui
Agostinho pelas suas dicas pertinentes no Mathematica.
Aos Professores Heleno Cardoso, Joaquim Paulino Pereira, Luís Castro e Pedro Borges Dinis
que, ao longo destes anos, provaram que o ensino não acaba na sala de aula, e ainda, pelo
interesse, apoio e palavras de motivação que sempre me dirigiram.
À Professora Helena Rua, sempre pronta para ouvir os meus desabafos e encontrar soluções
para os meus problemas, pelo papel insubstituível de mentora ―oficiosa‖.
Aos meus amigos, especialmente ao Pedro e Margarida Simão por estarem sempre lá, à
Rossana Amador pelas suas palavras prontas de motivação, ao Pedro Pereira por descobrir
sempre tesouros que afogam qualquer drama, ao Pedro Sousa por não desistir nunca de me
tornar mais pessoa e ao João Marques por saber, melhor que eu, quem eu sou.
Ao João Martins pela sua capacidade em me apontar sempre a direcção justa.
Ao Rui Barreiros por sermos tudo o que somos, juntos ou separados.
Aos meus pais por estarem sempre lá, mesmo quando não estão.
E ao João, por tudo.
Resumo
É objecto deste estudo, o comportamento do arco em alvenaria quando sujeito à acção
sísmica. Tendo como propósito principal a reabilitação de estruturas em alvenaria,
particularmente os arcos, em construções antigas, pretende-se compreender a influência do
enchimento do extradorso no comportamento estrutural global do arco em alvenaria, em estado
dinâmico, nomeadamente na sua estabilidade.
Neste estudo, revisitam-se diversas alternativas de conceber o arco, ao longo do tempo, e as
teorias e metodologias que suportaram e suportam hodiernamente o estudo do seu
comportamento estrutural. Incidindo de forma particular, sobre alguns métodos de
dimensionamento, dos quais se destaca a linha de pressões, e sobre os fundamentos teóricos
relativamente à análise dinâmica quando aplicada ao arco em alvenaria, elabora-se sobre os
efeitos de alguns aspectos da sua geometria na sua estabilidade do arco através da obtenção
a aceleração mínima necessária a cada tipo de arco para a formação do mecanismo de
colapso. Tendo em vista a modelação do enchimento do extradorso de um arco em alvenaria,
quando sujeito a acção sísmica, aborda-se o método dos elementos discretos (DEM),
especialmente indicado para capturar a natureza descontínua da alvenaria.
O estudo das consequências do enchimento do extradorso do arco, estado dinâmico, na
estabilidade do arco, realiza-se a partir de três casos, em cujos testes foi utilizado o algoritmo
UDEC. Procedeu-se à comparação entre a modelação do enchimento através do seu
carregamento e a representação deste como elementos discretos. Confirmam-se os resultados
de Oppenheim relativos ao comportamento do arco e concluiu-se que, em estado dinâmico, o
enchimento do extradorso nem sempre confere, uma maior estabilidade ao arco, dependendo
da sua estabilidade de origem.
Palavras-chave
Arco
Alvenaria
Linha de pressões
Método dos Elementos Discretos
Enchimento do Extradorso
Análise Dinâmica
Abstract
The object of this study is the behavior of masonry arches subject to seismic action. Being the
rehabilitation of masonry structures, namely arches in old constructions, the main purpose of
this work, the goal is to understand the influence that filling the ―extrados has on the global
dynamic structural behavior of the masonry arch, namely its stability.
In this study, the different ways that over the time have been used to conceive the arch are
revisited, as well as the theories and methodologies that supported and still support the study of
its structural behavior. With a particular focus on design methods, such as the pressure line
method, and the theoretical background of dynamic analysis applied to these types of
structures, the effects that some of the aspects of the geometry of arches have on their stability
are thoroughly analysed by calculating the minimum acceleration required to reach the collapse
mechanism of each type of arch. Regarding the modeling of the filling of the extrados of a
masonry arch when subject to seismic action, the discrete element method (DEM) is used, since
it’s the most appropriate method to capture the discontinuous nature of masonry.
The dynamic study of the consequences on the stability of the arch due to the filling of its
extrados is carried out on three cases, in which the UDEC algorithm was used. A comparison
between modeling the filling as a load and as a discrete element was made. Oppenheim’s
conclusions on the behavior of the arch are confirmed and, furthermore, evidence shows that, in
a dynamic state, filling the extrados of the arch does not always improve its stability, depending
on its original stability.
Key words
Arch
Masonry
Thrust line
Discrete Element Method
Filling of the Extrados
Dynamic Analysis
Conteúdo
Agradecimentos............................................................................................................................. 5
Resumo ......................................................................................................................................... 7
Abstract ......................................................................................................................................... 9
Índice de figuras .......................................................................................................................... 13
Parte I - Introdução ........................................................................................................................ 1
1. Introdução .............................................................................................................................. 1
1.1 Motivação do estudo ....................................................................................................... 3
1.2 Problema ......................................................................................................................... 4
1.3 Estrutura .......................................................................................................................... 4
Parte II - O Arco em Alvenaria: Análise Estática ........................................................................... 7
1. Introdução .............................................................................................................................. 7
2. Enquadramento do estudo: Perspectiva Histórica ................................................................ 7
2.1 Evolução da análise estrutural do arco ......................................................................... 11
2.1.1 O Início ....................................................................................................................... 12
2.1.2 Da Antiguidade à Idade Média ................................................................................... 13
2.1.3 Do Renascimento ao séc. XIX: As Teorias Científicas .............................................. 15
2.1.4 Do século XX até à actualidade ................................................................................. 22
3. Metodologias gráficas, analíticas e computacionais para o estudo estrutural dos arcos ... 25
3.1 Metodologias Gráficas ................................................................................................... 26
3.1.1 Linha de pressões. Regra do ―terço central‖ .............................................................. 26
3.1.2 Linhas de Pressões. Analogia com Cabos Suspensos ............................................. 29
3.1.3 Polígono Funicular ..................................................................................................... 31
3.1.4 Método de Fuller ........................................................................................................ 33
3.1.5 Método Elástico de Pippard ....................................................................................... 33
3.1.6 Teoria da Análise Limite aplicada a Estruturas em Alvenaria .................................... 34
3.2 Metodologias Analíticas ................................................................................................ 38
3.3 Metodologias Computacionais ...................................................................................... 42
3.4 Síntese .......................................................................................................................... 44
Parte III O Arco em Alvenaria: Análise Dinâmica ........................................................................ 47
4. Análise Quase-estática vs Análise Dinâmica ...................................................................... 47
4.1 Uma Aproximação ao Estado Estático .......................................................................... 48
4.1.1 Análise da Linha de Pressões .................................................................................... 49
4.2 Análise dinâmica pelas equações de movimento ......................................................... 54
4.2.1 O Bloco (Housner) ...................................................................................................... 54
4.2.2 Arco de Oppenheim ................................................................................................... 56
4.3 Síntese .......................................................................................................................... 64
5. Método dos Elementos Discretos ........................................................................................ 65
5.1 Aspectos gerais do UDEC ............................................................................................. 66
5.2 Comportamento Mecânico dos Blocos ......................................................................... 68
5.3 Comportamento Mecânico dos Contactos .................................................................... 69
5.4 Detecção e Actualização dos Contactos ....................................................................... 71
5.4.1 Contacto Vértice-Aresta ............................................................................................. 72
5.4.2 Contacto vértice-vértice .............................................................................................. 73
5.5 Cálculo Estrutural .......................................................................................................... 74
5.5.1 Algoritmo de Cálculo .................................................................................................. 74
5.5.2 Ciclo de Cálculo ......................................................................................................... 74
5.5.3 Equações de Movimento ............................................................................................ 75
5.5.4 Amortecimento ........................................................................................................... 76
5.5.5 Estabilidade Numérica ............................................................................................... 77
5.6 Síntese .......................................................................................................................... 77
6. Estudos Numéricos ............................................................................................................. 78
6.1 O arco de Oppenheim ................................................................................................... 79
6.2 Considerações Iniciais da formulação do problema ..................................................... 81
6.3 Caso 1 – Estudo de Arcos Simples sem Enchimento ................................................... 82
Modelação ........................................................................................................................... 82
Discussão dos resultados obtidos ....................................................................................... 83
6.4 Caso 2 – Estudo de Arcos com Enchimento do Extradorso considerando apenas o seu peso ..................................................................................................................................... 86
Modelação ........................................................................................................................... 86
Discussão dos resultados obtidos ....................................................................................... 87
6.5 Caso 3 – Estudo do Arco Semi-Circular com Enchimento do Extradorso modelado com elementos discretos............................................................................................................. 88
Modelação ........................................................................................................................... 88
Discussão dos resultados ................................................................................................... 93
6.6 Síntese .......................................................................................................................... 95
Parte IV – Conclusões Finais ...................................................................................................... 99
7. Conclusões .......................................................................................................................... 99
7.1 Conclusões Gerais ........................................................................................................ 99
7.2 Alguns Contributos da Investigação ............................................................................ 102
7.3 Desenvolvimentos Futuros .......................................................................................... 103
Referências .................................................................................................................................... I
Índice de figuras
Figura 1 – Terminologia do arco em alvenaria. Fonte: desenho esquemático sobre detalhe de perspectiva interna da Basílica de Vézelay, França, 1150. (Nunes, 2010) .................................. 8
Figura 2 - Arco pertencente à civilização etrusca. (Huerta, 2001) ................................................ 9
Figura 3 – Diagrama qualitativo das tensões de tracção e compressão uniaxial. (Ricamato, 2007) ........................................................................................................................................... 10
Figura 4 – Fenómenos de erosão de um arco natural de pedra em Devil’s Garden, Utah, US. (Block, 2005) ............................................................................................................................... 12
Figura 5 - Civilização nómada, Somália. (Auroville, s.d.) ........................................................... 12
Figura 6 - A forma da catenária. (Kurrer, 2008) .......................................................................... 16
Figura 7 - Mecanismo de colapso de La Hire e Belidor. (Kurrer, 2008)......... Erro! Marcador não definido.
Figura 8 - Diagrama de análise estrutural do desvio da carga. (Lourenço, 2001) ...................... 21
Figura 9 – Cedência de um arco semi-circular sujeito a concentração das cargas. (Kurrer, 2008) ..................................................................................................................................................... 23
Figura 10 - Distribuição das tensões internas em função da posição da sua resultante. (Gago, 2004) .............................................................................................. Erro! Marcador não definido.
Figura 11 - Diagrama de interacção M-N (secção rectangular não resistente à tracção). (Gago, 2004) ........................................................................................................................................... 28
Figura 12 - Linhas de pressões e de resistência num arco, de acordo com as definições de Timoshenko. (Gago, 2004) ............................................................. Erro! Marcador não definido.
Figura 13 - Diagrama de Corpo livre de um troço de um arco. (Gago, 2004) ............................ 29
Figura 14 - Traçado de um polígono funicular. (Gago, 2004) ..................................................... 32
Figura 15 - Geometria dos polígonos funiculares em função da localização da resultante das cargas. (Gago, 2004) .................................................................................................................. 32
Figura 16 - Reprodução da maqueta de estudo da igreja da Sagrada Família, utilizando pequenas esferas a simular o carregamento. (Nunes, 2010) ..................................................... 30
Figura 17 - Movimento relativo numa junta entre elementos. (Gago, 2004) .............................. 35
Figura 18 - Região admissível no espaço das tensões. (Heyman, 1966) .................................. 35
Figura 19 – Regiões admissíveis. (Heyman, 1966) .................................................................... 36
Figura 20 - Análise limite de um arco de perfil parabólico. (Gago, 2004) ................................... 37
Figura 21 - Momento de "plastificação" em função da localização da carga concentrada. (Heyman, 1969) ........................................................................................................................... 38
Figura 22 - Coeficiente de segurança geométrico. (Gago, 2004) ............................................... 38
Figura 23 - Possível mecanismo de escorregamento (de La Hire). (Kurrer, 2008) .................... 39
Figura 24 - Mecanismo rotacional de Coulomb-Mascheroni. (Nunes, 2010) ............................. 40
Figura 25 - Análise da inclinação das linhas de pressões de um arco em alvenaria: (a) configuração inicial; (b) com inclinação mas estável; (c) Inclinação limite para o colapso; (d) mecanismo de colapso. (DeJong, 2009) ..................................................................................... 51
Figura 26 – análise através da linha de pressões da Basílica de Sta Maria Madalena, Vaseley.
(DeJong, 2009) ............................................................................................................................ 53
Figura 27 – Aceleração mínima para o despoletar do mecanismo do bloco. (DeJong, 2009) ... 55
Figura 28 - Modelo analítico da previsão de possíveis respostas, do arco em alvenaria, a impulsos de duração tp e magnitude ap. (Dejong, 2009) ........................................................... 59
Figura 29 – Comparação entre os resultados obtidos na aplicação dos sismos e o modelo analítico (DeJong, 2009) ............................................................................................................. 61
Figura 30 – Modelo analítico e caminhos de forças. (DeJong, 2009)......................................... 62
Figura 31 - Forças entre elementos. (Sincraian, 2001) .............................................................. 69
Figura 32 - Tipo de contacto-vértice aresta. (Sincraian, 2001) ................................................... 73
Figura 33 - Tipo de contacto vértice-vértice. (Sincraian, 2001) .................................................. 73
Figura 34 - Ciclo de cálculo para elementos discretos. (Itasca, 2004) ....................................... 74
Figura 35 - Natureza iterativa inerente ao DEM. (Itasca, 2004) ................................................. 75
Figura 36 Mecanismo de colapso do arco de Oppenheim quando sujeito a um movimento de base horizontal (Oppenheim, 1992) ............................................................................................ 79
Figura 37Valores de aceleração máxima (sem ocorrer colapso) para diferentes t/a (Oppenheim, 1992 ............................................................................................................................................. 81
Figura 38 - Arco padrão de Oppenheim (157,5˚) – arco 1 .......................................................... 82
Figura 39 - Arco semi-circular – arco 2 ....................................................................................... 82
Figura 40 – Representação das acções a que o arco 1 (e 2) estão sujeitos .............................. 83
Figura 41 Oscilador linear com 1 grau de liberdade (Correia, 2007) .......................................... 84
Figura 42 Coeficiente de amplificação dinâmica do deslocamento (Correia, 2007) ................... 85
Figura 43 Espessura mínima admissível em função do ângulo de abertura do arco (Gago, 2004) ........................................................................................................................................... 85
Figura 44 Mecanismo de Colapso do arco de Oppenheim ......................................................... 86
Figura 45 Representação do Enchimento do Extradorso ........................................................... 87
Figura 46 - Arco simples semi-circular sem considerar o enchimento do extradorso ................ 90
Figura 47 - Arco semi-circular considerando o peso do enchimento do extradorso ................... 90
Figura 48 – Arco semi-circular considerando o peso do enchimento do extradorso através de elementos discretos .................................................................................................................... 91
Figura 49 Representação da área de enchimento de cada aduela ............................................ 91
Figura 50 Pormenor do Enchimento do Arco .............................................................................. 91
Figura 51 - Colapso do arco semi-circular considerando o peso do extradorso ........................ 92
Figura 52 Colapso do arco semi-circular com a modelação do enchimento .............................. 93
Figura 53 Imagens do momento do colapso parcial da Basílica de S. Francisco de Assis (National Geographic) ................................................................................................................. 94
Figura 54 Colapso da abóbada da Basílica de S. Francisco de Assis (Itália) depois do sismo de 1997 (http://www.ansa.it/) ............................................................................................................ 95
1
Parte I - Introdução
1. Introdução
A alvenaria tem sido, ao longo dos tempos, amplamente utilizada em todo o mundo, na
construção de todo o género de edificações. Grande parte dos monumentos históricos, nos
mais variados países, e dos núcleos urbanos antigos, especialmente na Europa, são em
alvenaria e constituem um testemunho vivo da história recente da civilização, uma herança
cultural de preservação obrigatória, a memória identitária das gerações vindouras.
O arco em alvenaria, sob ponto de vista arquitectónico e estrutural, (juntamente com a cúpula e
a abóbada que o prolongam no espaço) é um elemento fundamental na arquitectura ocidental e
de valor incontornável no património histórico legado à contemporaneidade.
Constituindo a base de inúmeras e desafiadoras soluções estruturais, durante vários séculos, o
arco em alvenaria foi construído com utilização de regras estruturais, sustentadas pela tradição
e saber empírico. Com o desenvolvimento da ciência, surgiram ferramentas analíticas que
trouxeram luz e ao estudo do seu comportamento estrutural e, consequentemente, às regras e
procedimentos para o seu cálculo. Na verdade, sustentadas fundamentalmente na Mecânica e
na Matemática, emergem teorizações do arco em alvenaria, denotando mudanças de
paradigma, que procuram explicar o comportamento do arco e encontrar os métodos mais
adequados para o seu dimensionamento.
Às teorias científicas, a partir do século XVII, colocavam-se inúmeros desafios, entre eles,
compreender de que forma na alvenaria de pedra, material assumido como ―rígido‖, as
deformações eram possíveis e conhecer o seu comportamento tendo em vista garantir a
segurança das estruturas existentes e orientar a construção de novas construções.
Decorrente das grandes linhas teóricas que alimentam, ainda hoje, o debate actual entre a
teoria elástica e a plástica, surgem os métodos gráficos que, conjuntamente com os processos
analíticos constituíram, durante muito tempo, e até início da modelação computacional, as
ferramentas disponíveis para o dimensionamento e verificação da segurança de estruturas em
alvenaria.
Os conceitos da teoria da plasticidade, mais recentes, são repescados e aplicados para
legitimar algumas metodologias analíticas e gráficas, anteriormente utilizadas sem fundamento
teórico. As teorias e métodos mais influentes (por exemplo, a linha de pressões e sua análise
pelo terço central, o polígono funicular, o método de Fuller, o método de Pippard, analogia com
cabos suspensos de Hooke, análise limite de Heyman, e, no caso das analíticas os
mecanismos de colapso) são revisitadas, demonstrando ou corrigindo os seus conceitos
básicos e desenvolvendo essas metodologias com base nos conhecimentos teóricos actuais e
com o auxílio das novas potencialidades computacionais. São também apresentadas algumas
inovações aos métodos analíticos tradicionais, visando o dimensionamento e verificação da
2
segurança das estruturas e possibilitando até a identificação de características fundamentais
do comportamento das estruturas arqueadas.
Embora as soluções analíticas tenham trazido alguma luz sobre a natureza da dinâmica das
estruturas em alvenaria, a sua complexidade inerente conduziu à necessidade de procurar
ferramentas computacionais que, abordassem correctamente, a problemática da rigidez da
estrutura. É, pois, com o desenvolvimento das novas tecnologias que vão surgir instrumentos
numéricos que passam a permitir uma modelação do comportamento estrutural do arco em
alvenaria, antes impossível de obter. Estas novas prometedoras possibilidades, que se abriram
à continuação da pesquisa sobre o tema do estudo, conduziram ao aprofundamento do seu
conhecimento. Na verdade, os métodos e instrumentos até então desenvolvidos, bem como as
recentes ferramentas computacionais utilizadas no método dos elementos finitos, usados
amplamente na engenharia, na Modelação Numérica de Estruturas em Alvenaria, revelaram-se
claramente adequados para tratar de problemas de elasticidade e plasticidade. Porém, o
mesmo não acontece no que diz respeito aos problemas de estabilidade das estruturas.
O método dos elementos discretos (DEM), utilizado em diversos campos de estudo e mais
amplamente utilizado na análise das estruturas em alvenaria de edifícios e pontes históricas,
depressa se evidenciou capturar satisfatoriamente a natureza descontínua da alvenaria.
É precisamente o método de elementos discretos que é utilizado neste trabalho para modelar o
comportamento do arco em alvenaria, com enchimento do extradorso, pretendendo
compreender a sua influência no comportamento global do arco quando sujeito a uma acção
sísmica.
Na verdade, os sismos são a principal causa da destruição e colapso dos edifícios,
particularmente os que possuem estruturas em alvenaria. A grande maioria dos edifícios
monumentais em alvenaria localiza-se em zonas especialmente susceptíveis à acção sísmica,
nomeadamente no sul da Europa e Ásia ou América Latina (Sincraian, 2001).
Uma área considerável de Portugal (nomeadamente a metade sul) possui acentuado risco
sísmico, tendo sido, nos séculos XIV, XVI e XVII, palco grandes sismos destrutivos. Ora, no
nosso país, cerca de 20% do total de edifícios são, sobretudo, construídos em alvenaria e
madeira (anteriormente a 1945) e, na sua maioria apresenta insuficiências estruturais, segundo
os critérios actuais para a verificação de segurança (censos de 2001). Muitos desses edifícios
e monumentos podem mesmo ser considerados perigosos à luz dos conhecimentos actuais de
sismologia e do comportamento das construções pois apresentam risco sério de colapso total
ou parcial, na eventualidade de um choque sísmico intenso (Cóias, 2007).
Constata-se, porém, que, apesar dos enormes avanços no domínio deste campo de estudos,
permanecem, ainda, áreas não totalmente compreendidas, nomeadamente as relacionadas
com o comportamento estrutural do arco em alvenaria face a um carregamento sísmico.
Algumas delas prendem-se com aspectos da geometria do arco em alvenaria, quando sujeita a
determinado carregamento, que podem influenciar o seu comportamento. De entre estes
3
aspectos, destaca-se o efeito do enchimento do extradorso do arco que tem sido objecto de
pesquisa num estado estático, mas não em estado dinâmico. Está-se, pois, perante um
problema investigativo desafiador e de essencial abordagem.
1.1 Motivação do estudo
A consciencialização do valor patrimonial, cultural e arquitectónico dos edifícios antigos e do
imperativo moral e de responsabilidade da sua conservação para gerações seguintes, nas
últimas décadas, traduziu-se num investimento com a sua reabilitação geral e numa
preocupação crescente com a sua protecção, trazendo para primeiro plano a necessidade de
actualização e de aprofundamento do conhecimento dos materiais, das respectivas técnicas de
construção, bem como do seu comportamento e dimensionamento estrutural.
Particularmente no sul da Europa, e concretamente em Portugal, as edificações em alvenaria
são, com frequência, localizadas em zonas sísmicas. Ora, quando sujeitos a sismos
importantes, os monumentos históricos mesmo que não colapsem, sofrem danos e alterações
no comportamento mecânico do material, nomeadamente de redução da sua rigidez e
enfraquecimento estrutural. Assim, os estudos que visem a compreensão do comportamento
estrutural das edificações, construídas neste material e o entendimento do seu mecanismo de
colapso, permitindo determinar a melhor forma de intervenção e a redução da sua
vulnerabilidade sísmica, são particularmente relevantes e pertinentes.
Recentemente, com o aparecimento de programas de modelação capazes de representar a
natureza descontínua da alvenaria, deram-se passos significativos na previsão, complexa
devido à natureza aleatória da acção sísmica, do comportamento do arco sob efeito sísmico. É,
pois, agora possível prever, com mais rigor e precisão, os efeitos de diversos tipos de
carregamento no arco, bem como as alterações que, num estado estático, sofre na sua
geometria, e consequentemente, o efeito do enchimento do extradorso (Block, 2005).
Daqui decorre a relevância do estudo da estabilidade do arco, para a identificação situações de
risco e para a sua correcta reabilitação. Na verdade, nos últimos anos, as investigações
realizadas nesta área integraram a análise dinâmica das construções, visando reduzir os danos
provocados pelo fenómeno sísmico. Consequentemente, teorizou-se sobre o arco e o seu
comportamento, quando sujeito a este tipo de acção e aperfeiçoou-se a sua modelação através
de métodos como o MEF (elementos finitos) e o DEM (elementos discretos) que, tal como na
análise estática, contempla a diversidade do carregamento e das propriedades do arco.
Continua, contudo, a ser consensual entre os investigadores a necessidade de maior
compreensão do comportamento das estruturas em alvenaria que possibilite um domínio maior
dos métodos de avaliação, bem como das ferramentas numéricas de previsão das suas
respostas, em estado estático ou dinâmico.
Relativamente a estas últimas, pouca atenção tem sido dada à influência do enchimento do
extradorso. Na verdade, se o seu efeito na estabilidade do arco em alvenaria é considerado,
antes do século XIX de forma empírica, é unicamente a partir do século XX que Rankine,
4
Pippard e Chettoe e Henderson, entre outros investigadores, ponderam este efeito nas suas
abordagens, conduzindo, consequentemente, a um incremento de compreensão relativamente
à sua influência numa análise estática, mas não no que diz respeito ao comportamento do arco
em alvenaria quando sujeito à acção sísmica.
Ora, este estudo, centrando-se precisamente no efeito do enchimento do extradorso do arco
em alvenaria quando é sujeito a acções sísmicas, pode constituir um contributo a uma
compreensão do comportamento estrutural do arco em alvenaria, ajudando a perceber como
este reage quando sujeito a carregamento.
Muitos métodos têm existido para a modelação do comportamento da estrutura do arco em
alvenaria. Apesar do método dos elementos finitos ser o mais comum na análise dessas
estruturas, a opção recaiu, neste trabalho, na utilização do método dos elementos discretos
(DEM), particularmente relevante, dada a sua exclusiva capacidade de representar a não
linearidade do material em causa.
1.2 Problema
É objecto deste estudo o comportamento do arco em alvenaria quando sujeito à acção sísmica.
Tendo como propósito principal a reabilitação de estruturas em alvenaria, nomeadamente os
arcos, em construções antigas, pretende-se compreender a influência do enchimento do
extradorso no comportamento estrutural global do arco em alvenaria, nomeadamente para a
sua estabilidade, procurando analisar as suas vantagens quando o arco é sujeito a uma acção
dinâmica.
De forma a alcançar os objectivos propostos foi necessário:
Estudar a evolução do conhecimento do comportamento do arco para seu
dimensionamento e reabilitação;
Estudar as metodologias tradicionais de dimensionamento de do arco em alvenaria e perspectivá-las integrando os conceitos actuais da mecânica estrutural;
Estudar os fundamentos teóricos relativamente à análise dinâmica quando aplicada ao
arco e ao bloco;
Analisar e descrever as metodologias de modelação numérica não linear (DEM),
particularmente o algoritmo UDEC, e sua utilização na modelação do enchimento do
extradorso de um arco em alvenaria, quando sujeito a acção sísmica;
sendo que esses estudos ficaram registados neste documento.
1.3 Estrutura
Neste trabalho, centrado no efeito do enchimento do extradorso de um arco em alvenaria
quando sujeito a acção sísmica, há três vertentes a que se dá particular atenção e que
envolvem uma análise dicotómica: o tipo de colapso (estabilidade vs resistência); o tipo de
5
acção (estática vs dinâmica); e o tipo de estrutura (arco com enchimento do extradorso vs arco
sem enchimento do extradorso).
No presente estudo, analisa-se estruturalmente o arco em alvenaria, e nele o efeito do
extradorso, perspectivando-o, numa primeira parte, no seu estado estático e, numa segunda
parte, no seu estado dinâmico e propondo-se uma organização em sete capítulos: um capítulo
introdutório, outro conclusório e os cinco restantes distribuídos pelas duas partes referidas.
Assim, a primeira parte do trabalho, da qual fazem parte dois capítulos — respectivamente
capítulo 2 e 3 — é antecedida por um capítulo de enquadramento do tema em foco, da
clarificação da motivação, apresentação do problema e objectivos do presente estudo e da sua
estrutura. No capítulo 2, realiza-se uma breve análise diacrónica sobre o conhecimento do arco
e principais teorias que o fundamentam e sobre os efeitos do enchimento do extradorso. O
capítulo 3 incide nas principais metodologias – gráficas, analíticas e computacionais –
consideradas de relevância para o dimensionamento e verificação da segurança do arco sujeito
a acções estáticas, salientando, sempre que considerado, o efeito do enchimento do
extradorso. Nos métodos gráficos, destacam-se a Linha de Pressões, o Polígono Funicular, o
Método de Fuller, o Método Elástico de Pippard, a Análise Limite aplicada a estruturas em
Alvenaria e a Analogia entre Linhas de Pressões e Cabos Suspensos. Relativamente aos
Métodos Analíticos, realiza-se a análise dos mecanismos resultantes de determinado
carregamento — utilizando-se os Teoremas Estático e Cinemático — e aplicam-se ao
dimensionamento, quanto ao pé direito e espessura das colunas que sustentam o arco, e à
carga de colapso que o arco em alvenaria suporta.
A segunda parte, centrada numa abordagem do estudo do arco quando sujeito a acção
dinâmica, é composta por três capítulos, respectivamente quarto, quinto e sexto capítulos.
No capítulo 4, apresenta-se a fundamentação teórica que suporta o estudo prático realizado,
em duas secções. Em primeiro lugar, elabora-se, recorrendo ao conceito de linha de pressões,
sobre o comportamento do arco em alvenaria num estado quase-estático e compara-se este
com o de uma estrutura elementar, o bloco, que, sendo estrutura mais simples, pode iluminar o
que ocorre numa estrutura mais complexa, o arco em alvenaria. Seguidamente, propõe-se uma
análise dinâmica do comportamento do arco e, retoma-se o paralelo entre o comportamento do
arco com do bloco, recorrendo aos estudos de DeJong (2009), de Housner (1941) e
Oppenheim (1992). O quinto capítulo incide no programa utilizado para realizar o estudo do
comportamento do arco, o método computacional DEM, Método dos Elementos Discretos, o
qual, para a simulação do arco em alvenaria, se reconhece possuir vantagens relativamente a
outros métodos computacionais. Assim, depois de apresentada a metodologia utilizada nesta
modelação, particularmente do seu algoritmo UDEC, referem-se as suas vantagens e
apresenta-se, também, o cálculo estrutural realizado neste estudo. O sexto capítulo encerra a
segunda parte e, nele, são apresentados e discutidos os resultados numéricos, através do
método UDEC, obtidos no estudo do comportamento do arco sujeito a uma acção sísmica,
contemplando o efeito do extradorso comparando-os com os previstos numa situação de
6
análise estática do arco.
No sétimo e último capítulo, são explicitadas as conclusões obtidas, confrontando-as com
algumas investigações nacionais e internacionais, sendo ainda apresentadas algumas
sugestões de aspectos relevantes para desenvolvimento de futuros estudos nesta temática.
7
Parte II - O Arco em Alvenaria: Análise Estática
1. Introdução
Compreender o comportamento estrutural do arco em alvenaria passa por entender as diversas
alternativas de o conceber e, consequentemente, por precisar as teorias que suportaram e
suportam o seu estudo. Partindo deste pressuposto, o capítulo 2, que a seguir se apresenta,
inicia-se com uma breve perspectiva histórica relacionada com o tema em estudo, referindo os
momentos de evolução do arco e do material que o constitui – a alvenaria. São salientadas
algumas das ideias consideradas mais relevantes e que mais contribuíram para o estado de
arte actual, no que se refere ao arco, nomeadamente, os estudos da linha de pressões (Hooke,
Méry, Moseley e Navier), do mecanismo de colapso (La Hire, Belidor, Couplet e Coulomb) e da
Teoria da Análise Limite (Heyman, 1966).
Seguidamente, desenvolvem-se algumas das metodologias referidas na contextualização
histórica, tais como: a regra do terço central e linha de pressões; o polígono funicular; o método
de Fuller; o método elástico de Pippard; a análise limite aplicada a estruturas em alvenaria;
analogia das linhas de pressões com cabos suspensos; e, finalmente, a metodologia analítica
que se baseia na interpretação dos mecanismos de colapso.
2. Enquadramento do estudo: Perspectiva Histórica
Ao longo dos tempos, foram construídos monumentos grandiosos, exemplares quer pela sua
imponência estética, quer pela sua complexidade estrutural. Em muitas dessas construções,
particularmente nas de cariz religioso, podem observar-se arcos em alvenaria, denotando
constituírem já um recurso técnico muito recorrente, embora não fosse ainda dominado o seu
dimensionamento que, à época, se limitava ao estabelecimento de proporções geométricas
entre os distintos elementos estruturais.
Este saber sobre o dimensionamento dos arcos era transmitido pelo testemunho do mestre aos
novos artesãos. Porém, a capacidade dos construtores de então realizarem uma análise
estrutural é questionável, até porque um dos conceitos essenciais para serem possíveis os
cálculos de dimensionamento é o paralelo de forças que só surge no final do século XVI, com
Leonardo Da Vinci (1452-1519). Todavia, com ou sem cálculos, através de uma estratégia de
tentativa-erro, por via da experimentação em modelos ou mesmo na própria estrutura, foram
realizadas construções de monumentos que resistiram ao passar dos anos e permaneceram
até aos dias de hoje (Lança, 2006; Nunes, 2009).
8
Desde a sua criação, há mais de seis mil anos, o arco em alvenaria foi uma solução estrutural
e arquitectónica amplamente utilizada por inúmeras culturas e civilizações para construções
com dimensões, funções, e usos de enorme diversidade (Nunes, 2009). O arco em alvenaria,
um dos grandes testemunhos da evolução da ciência estrutural, é o perfeito exemplo de forma
que deriva da função e, nas palavras de Kurrer (2008), ―é, tal como a roda, impossível de datar‖
(p. 188). Trata-se de um elemento estrutural curvo, frequentemente definido como uma
estrutura hiperstática cuja principal vantagem resulta de, sob um carregamento uniforme, as
tensões instaladas no arco serem principalmente de compressão, mas de colapso possível por
redistribuições plásticas, provocadas pela plastificação de um número de secções igual ao grau
de hiperstaticidade mais um (Grandjean, 2010). Esta hiperstaticidade é, contudo, contestada
por Heyman (1966) que admite o arco como uma estrutura susceptível de iniciar o seu
mecanismo, constituído por três rótulas e, como tal, isostático.
Dada a resistência elevada da alvenaria à compressão, o arco em alvenaria torna-se uma das
escolhas mais eficientes para vencer vãos.
Os principais elementos constituintes do arco em alvenaria são, uma chave (bloco superior ou
aduela de fecho), ou duas no caso dos arcos descontínuos, aduelas (blocos que compõe a
zona curva do arco), um extradorso (face exterior e convexa do arco), um intradorso (face
interior e concava), uma flecha (distância entre a linha de arranque e face inferior da chave),
uma luz ou vão do arco (largura do arco) e, por vezes ainda, contrafortes (parede construída
sobre o extradorso do arco que suporta os impulsos resultantes do arco) (fig. 1).
Figura 1 – Terminologia do arco em alvenaria. (www.imhotep-studio.blogspot.com)
Contudo, o arco pode ter funções e formas muito diversas (Nunes, 2009) e, portanto, na
geometria do arco, pode evidentemente haver variações relativas aos elementos constituintes,
nomeadamente, ao número de aduelas (normalmente ímpar por uma questão estética), à
espessura do arco (cuja redução excessiva pode condicionar a estabilidade do arco), à sua
abertura, à existência, ou não, de colunas com pé direito e de enchimento do seu extradorso
(cujas consequências se pretendem analisar neste trabalho) (Grandjean, 2010).
9
Podendo o arco variar a sua geometria, são diversos os factores que podem influenciar o
comportamento da estrutura quando sujeita a determinado carregamento. Oppenheim (1992),
na sua análise do arco em alvenaria, apresenta alguns tais como o número de aduelas, o rácio
espessura/raio do arco, bem como o seu ângulo de abertura. O efeito do enchimento do
extradorso do arco foi outro factor considerado por vários autores, tais como Méry, Pippard e
Rankine, entre outros. Gago (2004) estuda também o feito do extradorso incluindo-o nas suas
hipóteses de carregamento.
Relativamente ao seu funcionamento estrutural, o arco transfere o carregamento vertical que
suporta lateralmente, ao longo das suas aduelas até aos suportes, sob a forma de reacções
verticais e horizontais. Assim, jogar com a geometria do arco é jogar com esses impulsos
resultantes.
Figura 2 - Arco pertencente à civilização etrusca. (Huerta, 2001)
Aliada à simplicidade da sua execução, principalmente no caso da alvenaria, a resistência do
arco construído neste material torna-o o elemento estrutural de eleição na concepção do novo
conceito de cidade criado em Auroville, uma cidade universal com uma vida sustentável de
exploração dos seus próprios recursos, procurando simultaneamente uma harmoniosa inserção
com o ambiente, o desenvolvimento da cultura e o acautelamento das necessidades não só
sociais como espirituais (Auroville, s.d.).
O comportamento mecânico do arco vai, evidentemente, depender do material utilizado na sua
construção que, na grande maioria das edificações antigas, é, como se disse, a alvenaria, pelo
que, neste estudo, interessa referir alguns aspectos relativos à especificidade deste material
que auxiliem na compreensão da sua influência no comportamento das estruturas.
A ―alvenaria‖ é muitas vezes associada a uma técnica. Nunes (2009), citando Harris (1975),
refere-a como a arte de dar forma, dispor e unir pedras, tijolos, blocos de construção, entre
outros, para formar paredes e outras partes de edifícios. Outras vezes, é claramente
perspectivada como material (Grandjean, 2010; Rouxinol, 2007): “A alvenaria é um complexo
material compósito constituído por blocos (units) e argamassa (mortar) (Sincraian, 2001).
Qualquer que seja o sentido que se lhe atribua, os documentos mostram que o material das
construções dos edifícios, pontes etc., nos vários períodos da história, era composto por blocos
de pedra ou tijolos, ligados com argamassa ou com juntas secas (Frunzio et al., 2001).
10
Devido à sua elevada rigidez, comparativamente à da argamassa, os blocos assumem a
função de elementos resistentes, absorvendo a maioria dos esforços. Considerados elementos
inertes, a sua interacção física e química com a argamassa influencia a durabilidade, bem
como o comportamento mecânico da alvenaria. A função teórica da argamassa é do
estabelecimento de ligação entre unidades, evitando concentrações de tensões que podem
provocar efeitos nefastos nos pontos de contacto directo entre blocos. Apesar de não assumir
funções portantes, quando executada de forma adequada, a argamassa, com menor rigidez
que os elementos, é capaz de absorver parte das deformações impostas. Além disso, a sua
permeabilidade, quando ajustada, permite a evacuação de humidade que, de outra forma, é
origem de danos na estrutura (Grandjean, 2010).
Desde há muito que é consensual a ideia que a resistência das estruturas é influenciada
enormemente pela história da construção (dimensionamento, técnicas e materiais). Atribuem-
se a Perronet e Souflot, no século XVIII, os primeiros ensaios sistemáticos sobre as
propriedades mecânicas das pedras (Nunes, 2009). Relativamente à alvenaria, já no século
XIX, se evidenciava a relação entre a qualidade da argamassa e o desenvolvimento de
esforços de tracção superiores a certo limite, impeditivos do deslocamento, bem como a
importância da natureza das pedras e do modo como a argamassa era aplicada.
Nunes (2009), citando Huerta (2004), refere que, em todos os estudos que analisou, a
resistência da alvenaria está associada ao tipo de pedra ou do tijolo usado, à espessura das
juntas e ao tipo de argamassa no caso de esta ter sido utilizada. Esta assemblagem possui um
comportamento mecânico estrutural complexo, localizado entre os comportamentos dos tijolos
e da argamassa quando considerados isoladamente, como é visível no gráfico representado na
fig. 3.
Figura 3 – Diagrama qualitativo das tensões de tracção e compressão uniaxial. (Ricamato, 2007)
Este gráfico identifica a elevada resistência à compressão suportada pela alvenaria e a sua
reduzida resistência à tracção. Uma outra característica comum a todos os materiais originados
por coesão é o relaxamento ou a redução progressiva de resistência sob um deslocamento
11
contínuo (Ricamato, 2007; Nunes, 2009).
O tipo de assemblagem utilizada na alvenaria – relacionada com a dimensão dos blocos, o
espaçamento das juntas e a geometria – influencia também fortemente as características
mecânicas da alvenaria e a sua consideração na modelação deve ser cuidadosamente
efectuada. Uma alvenaria constituída por blocos cortados/executados de forma igualitária, com
juntas de reduzida espessura, apresenta melhores características mecânicas do que o mesmo
material sem estas características.
Grandjean (2010) considera essencial o estabelecimento de critérios precisos para a definição
da assemblagem e que a correlacionam com as propriedades mecânicas. Apresenta, assim, a
sugestão de quantificar a percentagem relativa da superfície aparente dos materiais
constituintes.
Com a evolução artística que naturalmente foi acontecendo ao longo dos séculos,
particularmente no campo da arquitectura, a utilização e o domínio do arco em alvenaria
aumentou. O seu conhecimento estrutural conduziu a alterações geométricas visando reduzir
impulsos horizontais, estabeleceu-se um paralelo entre o arco e a catenária invertida (que
permitiu compreender o comportamento mecânico do arco) e foram estimados os primeiros
mecanismos de colapso do arco (Huerta, 2001).
Com a revolução industrial nos séculos XVIII e XIX, o uso do metal nas construções destrona o
papel da alvenaria nas construções. Mais tarde, com o surgir do betão, este torna-se o material
por excelência na construção de edifícios. Nos dias de hoje, constata-se um interesse pela
recuperação e reabilitação das construções existentes (Lipovetsky e Serroy, 2010) e com a
utilização da alvenaria como material de construção sustentável, verificando-se, por isso, uma
revalorização da investigação sobre o dimensionamento dos arcos e do seu comportamento
estrutural (Gago, 2004).
É durante o século XX que o domínio estrutural do arco vai sendo conseguido. Na verdade, se
bem que as linhas de pressões, polígonos funiculares e regra do terço central fossem conceitos
dominados e integrados, o pré-dimensionamento da geometria e espessuras era ainda
sustentado em regras empíricas, o que implicava posterior verificação de estabilidade através
de métodos gráficos.
2.1 Evolução da análise estrutural do arco
Não existindo habitualmente na natureza excepto quando consequência de erosão (fig. 4)
como no caso do Landscape Arch nos Estados Unidos, ou ainda o ―Aloba‖, no nordeste do
Chade e a ―Ponte em Arco‖ (Pont d´Arc), no sudeste francês, o arco é uma criação do Homem,
com mais de 6.000 anos, que se atribui aos babilónios ou aos egípcios (Lança, 2006; Nunes,
2009). Na verdade, juntamente com as abóbadas e cúpulas, o arco é, e foi sempre, um
elemento estrutural de grande interesse e valor arquitectónico que, embora podendo executar-
se de forma empírica, foi sempre considerado de comportamento estrutural complexo.
12
Figura 4 – Fenómenos de erosão de um arco natural de pedra em Devil’s Garden, Utah, US. (Block, 2005)
2.1.1 O Início
Apesar de a concepção do arco estar, no presente trabalho, relacionada com alvenaria, é
importante salientar que o arco já existia sob formas rudimentares muito antes da sua
construção em alvenaria, remontando ao início da nossa civilização, nomeadamente aos
tempos do nomadismo. Nos povos nómadas, cuja relação com o cosmos, através do céu, era
essencial, as suas habitações possuíam a forma circular e cobertura cónica ou esférica feita
com ramos, resultando em cúpulas primitivas. Esta geometria, ainda existente em culturas
nómadas de hoje, por exemplo na Somália (fig. 5), usa como modelo a cúpula do céu, a
polaridade do círculo, idealizando através deste a dinâmica e limitação da natureza, por
oposição ao quadrado típico de uma sociedade sedentária (Burckhardt, 2009).
Figura 5 - Civilização nómada, Somália. (Auroville, s.d.)
A composição da alvenaria sofreu poucas alterações ao longo da história (Lança, 2006).
Na construção dos grandiosos e imponentes edifícios, como por exemplo nas pirâmides e
templos faraónicos egípcios, a pedra foi, dados os meios e exigências, o material de eleição
para a construção dos arcos (Sincraian, 2001).
Com o tempo, a madeira cedeu lugar à alvenaria, sendo os primeiros exemplos de arcos
construídos neste material encontrados em escavações arqueológicas em Israel datadas de
13
9000 e 8000 anos antes de Cristo, pertencentes à civilização etrusca (Huerta, 2001; Nunes,
2009).
Contudo, a escassez de pedra levou à necessidade de procurar alternativas tais como a
secagem de terra, de utilização vantajosa na construção dos arcos mesmo nos dias de hoje,
porque económica e de simples execução, sendo um exemplo disso a cidade de Auroville
(s.d.). Nos arcos são utilizados tijolos de argila (por exemplo em Kafhaje, Iraque, datados de
3000 A.C.) que foram melhorados qualitativamente, no que se refere à sua resistência e à
durabilidade da cerâmica, com a sua cozedura (Sincraian, 2001).
As linhas rectas da Grécia Clássica converteram-se em estruturas curvas que, estruturalmente,
permitiram maiores vãos realizados com material mais durável. Suportado no legado do saber
e cultura do antigo Egipto e Grécia clássica, é no Império Romano que se dá o salto estrutural,
no que se refere ao arco. Herdando da civilização etrusca o domínio do seu conhecimento
estrutural, a civilização romana aperfeiçoa o dimensionamento aplicando regras de proporção
geométrica que garantiram a estabilidade da construção (Huerta, 2001; Nunes, 2009).
No que diz respeito à técnica construtiva do arco, os romanos começaram a recorrer a
estruturas em madeira como suporte auxiliar da construção, com o objectivo de assegurar o
funcionamento à compressão do arco (Nunes, 2009). Desenvolveram igualmente a técnica da
produção de tijolos que passaram a ter dimensões normalizadas, e surgiram novas e melhores
argamassas, inclusive o betão, embora, evidentemente, sem as características daquele que
existe nos dias de hoje (Lança, 2006).
Estes enormes avanços deveram-se à estabilidade e organização do Império Romano que
possibilitaram a execução de estradas, aquedutos, pontes e templos (Gago, 2004; Sincraian,
2001) e, consequentemente, a utilização de novas técnicas, emprego de novos materiais e até
criação de vocabulário específico para todas as estruturas duráveis de grandes vãos (Nunes,
2009).
2.1.2 Da Antiguidade à Idade Média
Extinto o Império Romano, só as ordens religiosas reuniam o poder e meios para continuar a
edificação de estruturas mais complexas (Gago, 2004). Foram fundados mosteiros e escolas
de artesãos, sendo privilegiada a tradição na técnica de execução. A metodologia de
dimensionamento do arco era ainda baseada em relações entre as principais dimensões,
sendo as interiores definidas através de um sistema geométrico de linhas e círculos e os
elementos exteriores dimensionados de forma empírica (Lança, 2006). A escassez de
recursos, comparativamente com os utilizados nas construções romanas, conduziu à
necessidade de compreender o comportamento estrutural do arco, de forma a reduzir a
matéria-prima e a mão-de-obra, surgindo, desse condicionamento, o estilo romântico (XI a XII),
onde os arcos conferiam aos templos uma maior relevância simbólica, permitiam uma maior
altura e luminosidade e evitavam também a comum ocorrência de incêndios nos tectos de
madeira. Esta relevância traduz-se, por exemplo, no caso do arco ogival pelo conceito vesica
14
piscis (ou ichtus) que consiste na figura geométrica que resulta da intersecção de dois círculos
idênticos, em que o centro de um se encontra na circunferência do outro, simbolizando a
relação de opostos, reconciliação entre homem e Deus por intermédio de Cristo, associada à
Santíssima Trindade (Nunes, 2009).
A construção das catedrais românticas teve início no século XI, perdurando e intensificando-se
nos séculos XII e XIII. Na Idade Média desenvolveu-se, para além do estilo romântico, o estilo
gótico, de importância decisiva na história dos sistemas construtivos e dos elementos
estruturais da arquitectura religiosa (Nunes, 2009).
Esta nova corrente artística, que se inicia aproximadamente no século XII, com semelhanças
significativas relativamente ao romantismo mas explorando de outra forma as possibilidades de
alteração do fluxo de cargas, é considerada como um desdobramento das transformações do
romântico, também na arquitectura do arco (Nunes, 2009). A arquitectura gótica é
caracterizada por um complexo esqueleto de colunas, arcos, nervuras, entre outros elementos.
Esta especificidade surge da tentativa de reduzir espessuras dos elementos que suportam os
arcos. Esta diminuição implicou, no entanto, um controlo dos impulsos horizontais,
convertendo-os em arcos ogivais que, para um mesmo vão, produzem menores esforços
horizontais (Sincraian, 2001).
Para equilibrar as paredes, (que perderam a função estrutural permitindo aberturas que se
converteram em vitrais e pilares, agora mais esbeltos) são executados os arcos botantes
(elementos estruturais característicos desse período cuja geometria é dependente do seu
carregamento) (Nunes, 2009) e os contrafortes (Gago, 2004). É o período áureo da construção
de catedrais de altura e vãos com medidas nunca ousadas e que só o desenvolvimento de
novas técnicas e a acumulação de saber prático tornaram possíveisl.
No Renascimento (séculos XV e XVI), caracterizado pelo progresso pela evolução e salto
científico e cultural, surgem as teorias científicas que o advento da imprensa permitiu divulgar,
conhecendo-se, hoje traduções diversas dos estudos científicos entre os quais os textos de
Vitrúvio, Euclides, Arquimedes e outros Tratados sobre técnicas construtivas e proporções
geométricas dos arcos (Gago, 2004).
Em pleno Renascimento, no final do século XV, Leonardo Da Vinci, pioneiro na resistência de
materiais, define pela primeira vez o conceito de vector e suas características e realiza os
primeiros estudos que abordam o comportamento mecânico dos arcos, propondo uma regra
para verificar a estabilidade que mais tarde é recuperada por Couplet (? - 1743): ‖um arco não
cai se a corda exterior não tocar o intradorso do arco‖ (na fig. 6 é visível a corda desenhada na
espessura do arco).
Galileo Galilei, em 1643, enunciou as bases da mecânica estrutural (Kurrer, 2008), e Robert
Hooke (1635-1703) apresenta, anos mais tarde, em 1675, a analogia arco-catenária em que
uma corrente metálica suspensa se equipara à geometria invertida de um arco equilibrado.
Huerta (2001) e Nunes (2009) referem a ideia de Hooke que ao tentar resolver o problema do
15
traçado do arco e das pressões conclui que Ut pendet continuum flexile, sic stabit contiguum
rigidum invertsum, ―tal como pende a linha flexível, igualmente mas de forma inversa se
suporta o arco.‖
Figura 6 – Regra para a verificação da estabilidade dos arcos por Leonardo Da Vinci (Gago, 2004)
2.1.3 Do Renascimento ao séc. XIX: As Teorias Científicas
Ao longo dos tempos, a construção do arco em alvenaria foi sempre sustentada por regras
estruturais que eram utilizadas para encontrar a forma e dimensão do arco e a espessura dos
apoios e contrafortes (Nunes, 2009). Se, de início, essas regras eram ditadas pelo
conhecimento prático e experiência, transmitidos e renovados de geração em geração, o
desenvolvimento da ciência moderna, fruto de um processo de mudança das mentalidades que
se viveu no renascimento cultural e económico da Europa, deu origem a um novo paradigma
em que se perspectivava o mundo, os fenómenos físicos, e, consequentemente, o
comportamento das estruturas de forma radicalmente distinta. Com a racionalidade científica, a
partir do século XVII, a necessidade de uma justificação científica dos fenómenos físicos e
processos técnicos originou uma nova atitude frente ao projecto estrutural, pelo que as regras
sustentadas no conhecimento empírico se tornaram insuficientes para determinar a geometria
das estruturas (Nunes, 2009).
Apesar das contribuições de Leonardo da Vinci, embora tenha existido uma evolução
significativa no conhecimento do arco, os estudos elaborados sobre o arco como estrutura
(com excepção do trabalho de Honoré Fabri) baseavam-se em interpretações de carácter
intuitivo das observações experimentais. A partir do século XVII, assiste-se ao desenvolvimento
de modelos teóricos científicos, baseados nas leis da mecânica, para explicar o
comportamento das estruturas, que originaram as novas regras para o projecto estrutural de
construções em alvenaria (Nunes, 2009).
É com este enquadramento que o arquitecto Hooke descobriu (trabalhando num problema
colocado à Royal Society, em 1670) que estática do arco em compressão é idêntica à do cabo
flexível em tracção, uma das ideias mais fecundas da história da teoria das estruturas (Nunes,
2009).
16
Cerca de duas décadas depois, é com David Gregory que surge a forma do cabo suspenso,
bem como a expressão matemática da catenária (fig. 6), apesar de se verificarem imprecisões
na primeira (Gago, 2004). Gregory considera a catenária a única verdadeira, ou legítima,
representante do arco e, se este se sustenta, então é porque a sua espessura contém uma
catenária (Huerta, 2001). No final do século XVII e início do século seguinte, é La Hire,
considerado precursor da abordagem científica do arco, que utiliza a mecânica estrutural na
análise de arcos e abóbadas (Kurrer, 2008).
Figura 7 - A forma da catenária. (Kurrer, 2008)
As contribuições de La Hire e Belidor
Na segunda metade do século XVII, Philippe de La Hire (1640-1718) aplica os conceitos da
estática ao estudo do comportamento mecânico de arcos e abóbadas. Os estudos de La Hire
(juntamente com os de Belidor) foram pioneiros na arbitragem do mecanismo de colapso do
arco real, considerando que ruía através de um mecanismo do tipo cunha deslizante. Na
verdade, a parte superior cai devido ao seu peso próprio, deslizando sobre juntas fracturadas e
empurrando os encontros para o exterior.
A teoria de La Hire (fig. 8) pressupõe a inexistência de atrito entre as aduelas do arco (é
unicamente em 1773 que Coulomb vai considerar a problemática do atrito no estudo do
comportamento do arco) (Kurrer, 2008). Assumindo que as juntas do arco são perfeitamente
polidas, para determinar o peso que cada aduela deve ter para garantir a estabilidade da
estrutura, La Hire apresenta uma solução geométrica.
No mecanismo de colapso admitido por La Hire, verifica-se que as juntas de escorregamento
ocorrem aproximadamente a meia distância entre os encontros e o fecho do arco e as três
zonas entre as descontinuidades permanecem coesas formando corpos rígidos (Kurrer, 2008).
Todavia, os estudos experimentais de mecanismos de colapso, entre eles, os de Augustin
Danyzy, mostravam resultados diferentes. O mecanismo de colapso resultante consistia na
formação de charneiras de rotação nas juntas entre aduelas, apesar de na hipótese admitida
por La Hire existir um, possível mas não o mais provável, mecanismo de colapso, como adiante
vai ser aprofundado (Kurrer, 2008; Nunes, 2009).
17
Figura 8 - Mecanismo de colapso de La Hire e Belidor. (Kurrer, 2008)
A primeira aplicação prática da teoria de La Hire é atribuída a Bernard Forest de Belidor que
introduz alterações ao modelo de funcionamento do arco como sistema de cunhas: estabelece
como regra a posição da junta de ruptura a 45º, a meia distância entre a chave e a imposta;
localiza o ponto de aplicação L do impulso, no eixo do arco e não no intradorso; considera os
momentos a partir da face externa do contraforte.
As propostas de Belidor são entendidas por alguns autores como um retrocesso em relação às
de La Hire, uma vez que o estabelecimento da posição da junta de ruptura a 45º, para todos os
arcos, não corresponde ao que se observa na realidade e a mudança de localização do ponto
de aplicação do impulso faz perder a noção da formação de articulações (Heyman, 1969).
Apesar de os estudos de La Hire e de Belidor (1698-1761) substituírem regras empíricas por
regras racionais, a sua aplicação era tão complexa que teve difícil aceitação e, assim,
continuaram os esforços de aperfeiçoamento do modelo do arco como um mecanismo de
cunhas para que melhor se traduzisse a realidade física. Couplet surge umas décadas depois
e, com ele, um significativo avanço na teoria da mecânica de arcos (Gago, 2004).
As contribuições de Couplet
É entre 1729 e 1730, e depois de num registo primeiro repetir as ideias de La Hire, que Pierre
Couplet veio estabelecer um critério para verificar a segurança de um arco, completando a
ideia de Da Vinci, atrás apresentada. Dizia ele: ―admitindo que as aduelas do arco não podem
ter deslizamentos relativos entre si, o arco não colapsa se a corda da metade do extradorso
não cortar o intradorso e permanecer dentro da espessura do arco.‖ O conceito da linha de
pressões que vai justificar esta afirmação só mais tarde foi enunciado, inspirando-se Couplet,
certamente, no arco sujeito à acção de uma carga concentrada no fecho, de intensidade muito
superior ao peso total do arco (Gago, 2004).
Couplet apresenta três hipóteses que definem o comportamento da alvenaria quanto à sua
resistência à tracção e compressão e ao deslizamento entre aduelas (Kurrer, 2008). Estas
premissas foram, mais tarde, relembradas por Heyman (1966). Segundo ele, o atrito entre
aduelas adjacentes era suficiente para impedir deslizamentos relativos destas e as juntas não
impediam a sua separação, sendo assim portanto possível a sua rotação.
Contrariamente a La Hire, Couplet considerou a formação de 4 corpos rígidos distintos ligados
18
entre si através de rótulas. Resolvendo as equações de equilíbrio, obtém a relação entre a
espessura mínima admissível e o raio do arco circular, cujo valor se afasta muito pouco do
correcto, obtido mais tarde. Couplet considerava que se formavam juntas críticas a meia
distância entre os apoios e o fecho. Embora a localização que indicou não esteja correcta, tal
não implicou erros significativos, pois o cálculo não é muito sensível à localização das rótulas,
como considerava Coulomb. Quanto à resistência do material, Couplet partiu da hipótese de
que, para as tensões instaladas, aquela era suficiente para não ser condicionante. Desta vez,
os resultados experimentais de Augustin Danyzy, publicados em 1778, estão concordantes
com a hipótese apresentada de mecanismo de colapso (Kurrer, 2008; Nunes, 2009).
No entanto, o evidente progresso de Couplet é ignorado, não lhe sendo feita qualquer
referência quando, em 1773, Coulomb apresenta o seu ensaio (Gago, 2004).
As contribuições de Coulomb
Charles Augustin Coulomb (1736-1806) retomou o estudo do arco, em 1773, numa publicação
(considerado o lançamento das bases da mecânica dos solos moderna) em que analisa a
influência do atrito e da coesão em alguns problemas importantes, que envolviam o impulso do
solo, a resistência das vigas à flexão, a resistência de pilares em alvenaria em
compressividade e o equilíbrio de arcos e abóbadas (Heyman, 1969).
A análise do equilíbrio do arco em alvenaria, efectuada por Coulomb, por alguns autores
considerada a primeira tentativa de formulação geral do colapso de arcos simétricos (Nunes,
2009), sustenta-se na análie dos impulsos máximos e mínimos. Coulomb, centrando-se no
comportamento dos materiais e combina-o com o mecanismo de colapso identificando o que é
mais provável e quais os correspondentes valores limite dos impulsos.
Inicialmente desprezando o atrito, admite, depois, que o seu valor nas juntas entre os
elementos é suficiente para evitar deslizamentos relativos. Assim, segundo Coulomb, o único
mecanismo de colapso é o que implica a formação de charneiras de rotação e, para esse
mecanismo, se o impulso horizontal for reduzido, o corpo rígido do arco acima da junta crítica
cai por rotação em torno de um ponto localizado no intradorso do arco. Se o impulso for
elevado, o corpo rígido elevar-se-á, por rotação em torno de do mesmo ponto, agora no
extradorso do arco.
Tal como Couplet, também Coulomb não apontou com exactidão a localização das rótulas do
mecanismo de colapso, identificando, por tentativa e erro, a posição mais desfavorável das
juntas críticas e concluindo que, tanto a espessura do arco, como o impulso correspondente
são insensíveis a essa localização (Kurrer, 2008; Nunes, 2009).
O arco perde, no século XIX, a relevância e o papel de destaque na investigação científica,
passando a ser considerado um caso particular das estruturas planas de comportamento linear.
É necessário salientar que, apesar de todo o progresso no estudo do comportamento estrutural
deste elemento, o arco equilibrado, longe da rotura, ainda era, nesta época, um problema
indeterminado dada a sua hiperstatia. Além disso, as regras e métodos existentes não
19
consideravam a distribuição de tensões nas secções transversais, sendo este factor finalmente
teorizado, em 1823, por Claude Navier (1785-1830) (Gago, 2004).
Teoria da Linha de Pressões
Em 1823, Navier definiu o conceito de núcleo central do arco respondendo ao problema da
distribuição de tensões nas secções de peças lineares, permitindo, poucos anos mais tarde,
em 1830, a formulação de dois novos conceitos por Méry que adopta as teorias de Moseley:
linha de pressões e linha de resistência (Gago, 2004) e (Nunes, 2009).
No século XVII, a descoberta de que a estática do arco rígido é a mesma do cabo suspenso, o
primeiro à compressão e o segundo à tracção (Hooke, La Hire e Gregory) fez surgir a ideia de
linha de pressões incluída na espessura de um arco. Decorrem algumas décadas até que
fossem clarificados, simultaneamente na França (Méry, 1830), Alemanha (Gerstner, 1831) e
Inglaterra (Moseley, 1833), a sua definição e papel na estabilidade do arco, relacionada com a
rotação e deslizamento de aduelas (Nunes, 2009).
A linha de pressões é, segundo Timoshenko, o lugar geométrico das consecutivas intersecções
entre as direcções das pressões actuantes nas juntas e a linha de resistência é o polígono que
une os centros de pressões de cada junta (Kurrer, 2008). Estes dois conceitos foram
essenciais no desenvolvimento do conhecimento do arco, que se seguiu, sendo Franz Gerstner
(1756-1832) o primeiro a estudar as linhas de pressões. Huerta (2001), no seu estudo, coloca a
questão do que é a verdadeira linha de pressões. O autor refere que Moseley foi o primeiro a
procurar uma resposta tentando determinar a sua localização. Como o arco é uma estrutura
hiperstatica, a formulação das equações de equilíbrio não é suficiente para obter um resultado,
enunciando para tal um novo teorema na Estática que pretendia obter as reacções de
estruturas hiperstaticas rígidas – o princípio da pressão final. Aplicando este princípio ao arco,
Moseley conclui que a linha verdadeira corresponderá ao estado de pressão mínimo.
Na verdade, depois de Gerstner considerar que a linha de pressões corresponde a um arco
totalmente comprimido de forma invertida, Henry Moseley (1801-1872) prova que as duas
linhas correspondiam a lugares geométricos distintos. Gerstner tinha afirmado que, para o
problema da indeterminação inerente ao arco, havia um número infinito de linhas de pressões
dentro deste que satisfaziam as condições de equilíbrio. Moseley aprofunda essa ideia,
considerando que, para que o equilíbrio se comprovasse, a linha de resistência deve estar
incluída no interior do arco e que, no caso de cruzar o extradorso ou intradorso, é aí o ponto de
rotura do arco. Moseley apresenta ainda uma das situações limite admitindo, embora
erradamente, que esta era a ―verdadeira‖ linha de resistências, face às infinitas restantes, que
correspondia ao impulso horizontal mínimo no fecho do arco e que, graficamente, era
representada por uma linha que passa pelo extradorso no fecho do arco e no intradorso dos
rins. Esta não é, como se verifica, a linha de pressões ―real‖ mas uma das suas situações limite
(Kurrer, 2008; Nunes, 2009).
Baseado no conceito de núcleo central definido por Navier e no mecanismo considerado por
20
Moseley, Méry introduz, em 1840, dois pontos de passagem da linha de pressões, tornando o
problema do arco estaticamente determinável. Para Méry, o arco é dimensionado em
compressão total, sendo para tal necessário que a linha de pressões se encontrasse dentro do
terço central da secção do arco. O mecanismo de colapso forma-se quando a curva passa pelo
ponto superior do terço central na zona do fecho e no ponto inferior do terço central na junta
nos rins. Apesar da sua popular aplicação, este método restringia-se a pontes simétricas com
carregamentos simétricos e com limitações de vãos e abatimentos (Kurrer, 2008).
Com as investigações de Moseley, foram introduzidos em Inglaterra os métodos utilizados pela
engenharia francesa (Navier, Dupin, Poncelet...) que, tendo tido grande eco
internacionalmente, divulgaram, significativamente, a literatura de engenharia na língua inglesa
(Timoshenko, 1953). No que diz respeito à teoria do arco, foram fortes os seus contributos para
a compreensão da estática do arco em alvenaria (no que os estudos de Scheffler foram
relevantes) e para o desenvolvimento das teorias da linha de pressões (Kurrer, 2008).
A Teoria da Elasticidade
O problema da indeterminação estática do arco arrasta-se até ao século XIX, questionando-se,
os estudiosos, sobre a lei física a utilizar para levantar essa indeterminação. Nas hipóteses que
então se colocavam, o problema era simplificado não sendo o comportamento do material
tomado em consideração, pelo que foram abandonadas, começando então a ponderar-se a
hipótese de se considerar a alvenaria um material elástico. Apesar de se comprovar a
ocorrência de fendilhação, e de o material ser irregular, anisotrópico e descontínuo, esta teoria
elástica continuava a ser considerada a melhor abordagem (Huerta, 2001).
É só final do século XIX que os estudos sobre o arco em alvenaria (e sobre a determinação da
linhas de pressões) são realizados à luz da teoria da elasticidade. De acordo com Huerta
(2004), a partir de então, a teoria elástica foi definitivamente considerada a mais adequada
para o cálculo de arcos em alvenaria e contribuições teóricas que iam surgindo foram no
sentido de simplificar os métodos de cálculo elástico. Até então, a teoria elástica é utilizada nos
estudos do arco metálico e de madeira, sendo o de em alvenaria objecto de investigação
teórica própria (Kurrer, 2008).
A problemática dos materiais, e da sua resistência, não esteve ausente das reflexões dos
teóricos do arco em alvenaria, como é o caso de Coulomb que, na altura, salientou a
necessidade de os pontos de aplicação do impulso horizontal, na chave, e da resultante, sobre
a junta de ruptura, se manterem afastados das extremidades das juntas, ou seja, da superfície
do extradorso e do intradorso, de forma a que as tensões fossem distribuídas e fosse evitado o
rompimento das aduelas (Heyman, 1969; Timoshenko, 1953). É Navier (1826) que, a partir da
teoria de Coulomb, distribui linearmente as tensões ao longo das juntas do arco e propõe a
medida de um terço da espessura do arco para identificar o ponto de aplicação das resultantes
(Timoshenko, 1953).
Winkler e Perrodil, entre outros, executaram ensaios no arco que comprovaram que a teoria da
21
elasticidade poderia ser aplicada e, em 1879, a indeterminação estática encontrava-se
resolvida sendo possível a aplicação destas noções à construção do arco (Nunes, 2009). A
teoria de Winkler estabelece condições ideais, denominadas de ―estado normal‖ do arco: cura
perfeita da argamassa e a inexistência de movimentos ou fissuras na alvenaria. Quando não se
verificavam estas condições, o arco está sujeito a ―perturbações‖ (Störungen) que incluem
fenómenos de cura incompleta da argamassa, mudanças de temperatura, rebaixamento do
cimbre durante a construção e recalque dos apoios após o decimbramento (Nunes, 2009;
Kurrer, 2008). Consequentemente, Winkler, para um arco em estado normal, admite que a
teoria elástica permite encontrar a verdadeira linha de pressões.
Segundo Lourenço (2001), a análise elástica linear assume que o material obedece à lei de
Hooke, o que não acontece com a alvenaria à tracção em que para níveis de carregamento
reduzidos surgem as primeiras fissuras. Assim, o autor considera que a análise não linear
deverá ser privilegiada.
No caso de uma análise linear, Lourenço (2001) recomenda certos cuidados tais como a
consideração de uma fissuração gradual e, no estado limite último, deverão ser reforçadas as
zonas onde surgem tracções (fig. 9).
Figura 9 - Diagrama de análise estrutural do desvio da carga. (Lourenço, 2001)
Apesar da enorme evolução do conhecimento estrutural do arco, Gago (2004) e Nunes (2009)
fazem notar que os antigos métodos geométricos e as analogias com a catenária foram ainda
utilizados na construção dos arcos com resultados eficazes, como é o caso da Igreja da
Sagrada Família em Barcelona executada pelo arquitecto Antonio Gaudí (1852-1926).
É só no século XIX que se destaca o conhecimento das vantagens do enchimento do
extradorso do arco, considerando Rankine (1898) que o vão efectivo devia ser reduzido para
considerar o efeito favorável do enchimento. Segundo Gago (2004), outros autores como Howe
(1897) e Thompson (1900) também consideram o enchimento nos seus estudos, não sendo até
então este um objecto de estudo na análise do arco.
22
A metodologia utilizada, no século XX, apesar de toda a evolução do conhecimento do arco,
continua a ser baseada no pré-dimensionamento da geometria e da espessura do arco,
recorrendo a regras empíricas, e na posterior verificação da sua estabilidade, utilizando
métodos racionais desenvolvidos. Estes são maioritariamente métodos gráficos que controlam
a posição da linha de pressões apresentada anteriormente (Nunes, 2009). Com a revalorização
do arco, no século XX, é recuperado o desenvolvimento destes métodos, tornando-os mais
simples e mais eficientes para o seu estudo (Sincraian, 2001; Lança, 2006).
2.1.4 Do século XX até à actualidade
O betão que, como mencionado, já existia, denominado de pozzolana na época romana, sofreu
grande evolução no século XIX tornando-se o material de construção por excelência no século
XX e, por consequência, também na construção dos arcos. Igualmente, o uso do metal faz com
que a construção metálica desviasse as atenções da alvenaria, levando a um esquecimento e
desinteresse pelas técnicas construtivas e evolução deste elemento estrutural concebido para
esse material (Lança, 2006).
Na segunda metade do século XX, todavia, com a valorização e interesse crescente na
preservação dos espaços e templos antigos, que constituem as bases do nosso tempo, o olhar
e acção são dirigidos para a recuperação de antigas estruturas (Lipovetsky e Serroy, 2010).
Assumindo a necessidade de melhorar e simplificar as técnicas de dimensionamento, nos anos
sessenta do século passado, a instituição inglesa Military Engineering Experimental
Establishment cria um primeiro método para avaliar a capacidade de resistência de pontes em
arco (Gago, 2004). Este método, denominado MEXE/MOT, é um método empírico
desenvolvido no Reino Unido que se baseia nas equações de Pippard que modelam o arco
como um elemento elástico linear, de perfil parabólico, secção transversal linear e submetido a
uma carga pontual na sua chave. Num ábaco, serão relacionadas as cargas admissíveis com
as dimensões da ponte em arco, tais como o vão, a profundidade e as aduelas na chave do
arco. Para um arco de dimensões conhecidas, obtém-se, então, uma carga axial provisória que
vai ser afectada de vários coeficientes de ponderação dependentes de vários factores, tais
como as relações geométricas das dimensões do arco, a estimativa da qualidade do material, o
estado do cimento entre as juntas e, ainda, o estado geral da ponte. Estes coeficientes,
excessivamente subjectivos, resultam em resultados muito conservativos (Tirado, s.d.)
Heyman e a Teoria da Análise Limite
Na mesma altura, Jaques Heyman (1966) apresenta a aplicação do método de análise limite
aos arcos em alvenaria, considerando Huerta (2001) que esta era a melhor ferramenta para
compreender e analisar edifícios em alvenaria. Assim, Heyman (1966) surge com dois
teoremas limite: o Teorema Limite Mínimo, também conhecido por Teorema Estático, e o
Teorema Limite Máximo, que corresponde ao Teorema Cinemático. Heyman (1966) aplica o
método de análise limite às estruturas em alvenaria, considerando o arco dividido em blocos
rígidos, indeformáveis e, sendo assim, a obtenção da solução elástica para o seu
23
comportamento não é possível. Admite que se pode encontrar uma única solução, que
corresponde à solução elástica, mas que esta será muito sensível a pequenas variações das
condições de fronteira e das características mecânicas dos materiais. Por oposição, aqueles
que se suportavam na teoria plástica assumem existir não uma exclusiva, mas infinitas linhas
de pressões verdadeiras. Considerando que os apoios não eram totalmente rígidos, seriam
prováveis pequenas deformações que levariam o arco ao colapso ou, em alternativa, este
acomodaria internamente estes deslocamentos, provocando um ligeiro aumento do vão. Sendo
o arco constituído por blocos rígidos, este aumento só poderia ocorrer através da fissuração.
No Teorema Estático, são avaliados os estados de equilíbrio de um arco e considera-se que,
sendo possível encontrar um estado de tensão em equilíbrio com as solicitações exteriores
verificando em simultâneo o critério de resistência em todas as secções, então a estrutura não
colapsa sob essas condições de solicitação. Ou seja, se, para determinado carregamento, for
possível identificar um estado de esforços internos em equilíbrio – correspondente à linha de
pressões incluída na espessura no caso dos arcos – que verifique o critério de resistência do
material, esse carregamento é inferior à carga de colapso e garante a segurança da estrutura.
No Teorema Cinemático, ou de limite máximo, onde os modos de colapso de uma estrutura
são investigados, estabelece que, para um determinado mecanismo arbitrariamente
seleccionado, a carga de colapso é superior (ou igual, se o mecanismo corresponder ao real) à
carga de colapso real. No entanto, há que ter em atenção que a segurança do arco não está
verificada se, para determinada distribuição de rótulas, não ocorrer colapso do arco (Lança,
2006).
A vantagem da utilização destes teoremas é permitir analisar a segurança do arco sem que a
verdadeira linha de pressões seja conhecida. Apesar de Heyman (1966) ter adiado o problema,
apresenta hipóteses para os valores que a limitam. Assim, expõe as linhas a que corresponde
o limite máximo e mínimo do impulso horizontal nos arranques (Huerta, 2001).
Figura 10 – Cedência de um arco semi-circular sujeito a concentração das cargas. (Kurrer, 2008)
Heyman (1966) desenvolve, ainda, uma teoria de verificação de segurança nos arcos para os
24
teoremas de limite, recorrendo a um coeficiente de segurança geométrico. Este coeficiente é o
resultado da comparação da geometria do arco verdadeiro com aquela de um arco de
espessura mínima necessária para suportar o carregamento a que está sujeito. A segurança do
arco de espessura mínima é garantida, pois existe uma linha de pressões que se insere dentro
da espessura deste (fig. 10). Esta linha, no entanto, toca as paredes do arco formando rótulas
nesses pontos e tornando o arco muito instável: um acréscimo de carregamento pode levar ao
colapso da estrutura. Ao comparar as espessuras, se o arco real tiver o dobro da espessura do
arco em quase colapso, então o factor de segurança é de 2. Deve-se, todavia, ter em atenção
que este coeficiente de segurança geométrico pouco tem a ver com os coeficientes
habitualmente utilizados, devendo a sua utilização ser revestida de cuidados (Huerta, 2001).
Teoria da Plasticidade
Para a teoria plástica, o arco em alvenaria, tratando-se de uma estrutura rígida, em condições
normais de utilização está sujeito a fenómenos como uma abertura da base, cura heterogénea
da argamassa, ou recalques dos apoios, que provocam fissuras funcionando como
articulações, acomodando a estrutura às condições do ambiente.
A forma e a posição da linha de pressões são significativamente condicionadas por estes
efeitos acomodativos, muitas vezes frequentes, pelo que a determinação da linha de pressões,
embora possível, não é prática. Com base na teoria plástica, é possível determinar as
condições de estabilidade e de segurança da estrutura, desde que se admitam (o que surge
razoável dadas as condições reais de utilização) para a alvenaria, os pressupostos de Heyman
(1966): resistência infinita à compreensão; resistência nula à tracção; não existência de
deslizamento de aduelas.
A foto-elasticidade e a era computacional
Robert Mark, em 1982, recorreu à foto-elasticidade para analisar o comportamento de
estruturas góticas. Com este método, apesar de o material apresentar resistência à tracção, é
possível uma aproximação do campo de tensões instalado devido à acção do carregamento.
Esta técnica experimental para análise de tensões e/ou deformações é muito útil para
estruturas de geometria complicada ou distribuição complexa de cargas, em que a aplicação
dos métodos analíticos é inviável. Estes métodos experimentais consistiam em confeccionar
um modelo com material foto-elástico e sujeitá-lo à luz polarizada. Esta, ao passar através do
modelo sob tensão, vai gerar franjas luminosas escuras ou coloridas e formar desenhos que,
depois de analisados, dão indicações sobre as deformações e as tensões do material. Torna-
se, desta forma, possível realizar uma análise qualitativa e quantitativa, através da imagem
geral da distribuição de tensões que se obtém com este método, em vez de informações muito
localizadas (Shimano, 2006).
Com a rápida evolução tecnológica, alguns métodos computorizados tornaram-se muito
acessíveis e comuns. É o caso do método dos elementos finitos. Este método, apesar de
pensado para uso em estruturas metálicas ou em betão armado, foi também aproveitado para
25
estruturas em alvenaria. No entanto, o método prevê um comportamento estrutural que é
modelado como linear e contínuo o que acarreta alguns problemas quando aplicado ao arco
em alvenaria. Das características da alvenaria, destaca-se o seu comportamento mecânico não
linear sendo um material de fraca resistência à tracção e com descontinuidades entre
elementos representadas pelas juntas. Assim, os modelos tradicionais de elementos finitos não
traduzem de forma realística o comportamento das estruturas em alvenaria. O MEF (método
dos elementos finitos) sofreu, contudo, uma evolução e já é possível a representação do
comportamento não linear do material bem como as suas descontinuidades, possibilitando
assim a simulação da fendilhação (Lança, 2006; Kingsley e Seible, 1991).
A evolução do modelo fez aumentar a complexidade que se traduziu em modelos muito
pesados e de difícil modelação, principalmente quando se trata de estruturas de dimensões
elevadas e sujeitas a acções de modelação mais exigente tais como a acções dinâmicas.
Inicialmente desenvolvido para o estudo da mecânica das rochas, surge um novo método de
modelação. Este, referido como o método dos elementos discretos, que sendo semelhante ao
método dos elementos finitos, admite a ocorrência de grandes deslocamentos e rotações e
difere de modelações não lineares por actualizar ao longo da análise o posicionamento dos
diferentes elementos entre si. Torna-se assim, um modelo de aplicação vantajosa na alvenaria.
Um dos programas de cálculo de algoritmo mais divulgado pertencente a esta modelação é o
programa UDEC que é apresentado mais adiante (Sincraian, 2001; Rouxinol, 2007; Gago,
2004; Itasca, 2004). Este, além de possibilitar uma modelação adequada do comportamento da
alvenaria, possui a vantagem adicional de traduzir eficazmente a acção dinâmica
(nomeadamente os sismos) sob estruturas neste material (Drei e Oliveira, 2001; Calvetti e
Roberti, 1998).
O capítulo que se segue debruça-se sobre os métodos gráficos, analíticos e computacionais de
análise estrutural do arco em alvenaria e são apresentados cronologicamente, suportando,
assim, as teorias anteriormente referidas. Aborda-se, em algumas das análises, a influência do
extradorso permitindo a enumeração das suas vantagens na estabilidade do arco em alvenaria.
3. Metodologias gráficas, analíticas e computacionais para o estudo estrutural dos arcos
Após o breve resumo, inevitável dado os condicionalismos do presente trabalho, da evolução
do estudo do arco e da análise do seu comportamento estrutural, esta secção incide sobre os
diversos métodos de análise do comportamento do arco em alvenaria, em que será explicitada
a distinção entre métodos gráficos e analíticos, cuja principal vantagem é permitir uma análise
preliminar. Apresentam-se também sinteticamente as análises computacionais, completando-
se a apresentação do método DEM no capítulo 5.
Estas análises visam a verificação do equilíbrio da estrutura em causa e, como se procura
26
salientar, a base dos vários métodos é a linha de pressões, já várias vezes referida. Assim, a
avaliação da estabilidade passa pelo posicionamento da linha de pressões relativamente à
espessura do arco. Numa análise mais conservativa, ou seja em que a estrutura fique
totalmente comprimida, a linha de pressões tem de se localizar dentro do terço central das
várias secções transversais.
Gago (2004) alerta para o facto de que, apesar de ser simples a verificação da estabilidade
através da análise da localização da linha de pressões, a obtenção da expressão que a
identifica (relativamente ao carregamento a que a estrutura está sujeita) torna-se uma tarefa
complexa. A indeterminação estática do arco revela serem insuficientes as equações estáticas,
sendo necessárias equações que considerem a deformabilidade da estrutura. Para facilitar a
resolução do problema de estabilidade, são aplicadas hipóteses simplificativas, recorrendo-se à
análise limite, em particular ao teorema estático. Além da dificuldade inerente à problemática
da estática do arco, também a utilização da alvenaria traz consigo uma complexidade
acrescida, pelo que a abordagem ao problema deixa de poder ser feita à luz da teoria elástica,
apesar de o método MEXE considerar possível, passando a ser suportada pela teoria plástica.
Apesar de todos os obstáculos mencionados, é, no entanto, praticável determinar famílias de
geometrias de linhas de pressões que correspondem a vários carregamentos possíveis. Estas
famílias permitem analisar os efeitos consequentes do enchimento do extradorso, apresentar
espessuras mínimas admissíveis que definem coeficientes de segurança, bem como identificar
as localizações mais desfavoráveis para a aplicação de cargas concentradas recorrendo a
análises de mecanismos cineticamente admissíveis (Gago, 2004).
3.1 Metodologias Gráficas
3.1.1 Linha de pressões. Regra do “terço central”
Na alvenaria, a resistência à tracção é, na maioria dos casos, tão reduzida que é possível ser
desprezada, mantendo a garantia da estabilidade dos elementos, recorrendo somente a
tensões de compressão. Para tal, é necessário analisar o elemento estrutural e determinar as
tensões nele instaladas, controlando assim a inexistência de tracção (Lourenço, 2001; Gago,
2004). Assim, as tensões normais equilibradas com os esforços actuantes na secção
transversal da peça, partindo da hipótese de Bernoulli, traduzem-se na expressão:
(3.1)
Dado que A representa a área da secção transversal, e admitindo que esta é rectangular, a
expressão passa a ter a seguinte forma:
(3.2)
É, segundo Gago (2004), então possível identificar a expressão da tensão mínima na estrutura.
Para garantir que a secção está totalmente comprimida, a tensão mínima deve ser de
27
compressão, ou positiva, verificando-se que:
com
(3.3)
Como a relação e=M/N representa a excentricidade da resultante das tensões normais
instaladas, é possível identificar uma zona da secção em que se verifica o requisito da tensão
mínima de compressão. Se a resultante das tensões normais estiver aplicada nessa zona, que
corresponde ao núcleo central da secção transversal, então esta secção de geometria
rectangular estará totalmente comprimida. Ao aumentar a excentricidade, a resultante desloca-
se do núcleo e surgem tracções numa das extremidades da secção que, como são suportadas
pela estrutura, levam à sua fendilhação nessa zona e, na extremidade oposta, a tensão de
compressão aumenta o seu valor. Aumentando a excentricidade, o valor da compressão
poderá, eventualmente, provocar o esmagamento do vértice e, caso a resultante se localizar
exteriormente aos limites da secção, o equilíbrio deixa de ser possível para tensões normais de
compressão (fig. 11).
Figura 11 – Distribuição das tensões em função da posição da sua resultante (Gago, 2004)
Define-se, através da relação entre os esforços actuantes M e N, a tensão normal máxima,
recorrendo à expressão (3.4). Como a resistência à compressão da secção, apesar de elevada,
não é infinita, a tensão máxima deve ser limitada a uma tensão admissível. Desta forma,
determina-se o momento máximo possível de mobilizar na secção, bem como o valor de
esforço normal:
(3.4)
(3.5)
28
Podem, então, a partir dos limites de variação do esforço normal actuante na secção, elaborar-
se gráficos de interacção que relacionam o esforço normal actuante com o momento máximo
suportado por esta e com a excentricidade máxima que o esforço axial suporta.
Figura 12 - Diagrama de interacção M-N (secção rectangular não resistente à tracção). (Gago, 2004)
Estes gráficos (fig. 12) revelam que, apesar de a peça não ser resistente à tracção, podem
suportar momentos flectores, cujo valor máximo admissível aumenta com a resistência da
secção à compressão (Gago, 2004).
Definindo como linha de pressões o lugar geométrico dos pontos de aplicação das resultantes
das tensões normais actuantes nas diferentes secções transversais de um arco, o
posicionalmento dessa linha no interior da espessura do arco (e do núcleo central das suas
secções transversais) é condição necessária para garantir o equilíbrio do arco (ou que todas as
secções estão comprimidas).
A relação entre o núcleo central apresentado no início e as linhas de pressões, estabelece-se
quando se consideram, novamente, as características da alvenaria: elevada resistência à
compressão, reduzida resistência à tracção e inexistência de deslizamento relativo nas juntas
entre aduelas. Devido a estas duas últimas características, o comportamento das juntas, no
caso da alvenaria, pode ser alargado a toda a secção. Desta forma, as expressões
anteriormente referidas, (3.4) e (3.5), passam a ser verdadeiras para toda a secção e não só
para a sua junta. Igualmente, para um número suficientemente elevado de secções
transversais, as linhas de pressões e resistência convergem para uma única curva contínua,
lugar geométrico das linhas de acção, resultantes das tensões actuantes nas várias secções
(Gago, 2004; Nunes, 2009).
O equilíbrio de uma estrutura arqueada sujeita a determinado carregamento está garantido, se
a linha de pressões resultante estiver inserida no interior da sua espessura (Gago, 2004).
Regressando ao conceito do núcleo central, conclui-se que, se a linha se situar dentro deste, a
secção está totalmente comprimida. Esta regra de dimensionamento utilizada até metade do
século XX é, hoje em dia, excessivamente conservativa, sendo admissível a fendilhação do
29
arco, desde que controlada e, desde que o equilíbrio daquele, quando sujeito a um dado
carregamento, seja garantido.
Figura 13 - Diagrama de Corpo livre de um troço de um arco. (Gago, 2004)
Conhecida a definição da linha de pressões e as suas vantagens para o dimensionamento de
uma estrutura arqueada, importa calcular a sua posição. Esta pode ser obtida de forma
analítica através do equilíbrio das forças actuantes na estrutura (Gago, 2004).
Gago (2004) considera um arco sujeito a um carregamento vertical em que se forma uma linha
de pressões que está afastada do intradorso do arco a uma distância vertical de ε (como visível
na fig. 13). Para este autor, o seu cálculo está, no entanto, dependente de três valores: H, V e
Δ, que traduzem a indeterminação estática do problema. Estas três incógnitas não são
impeditivas da resolução do problema caso sejam conhecidos três valores que as anulem.
Torna-se, pois, necessário encontrar três pontos da linha de pressões de coordenadas
conhecidas. Sabendo que as rótulas se formarão com dois pontos a tocar o intradorso e um
ponto no extradorso, através do prévio conhecimento do mecanismo de colapso da estrutura,
podem assumir-se diferentes valores para as coordenadas e traçar-se respectiva linha de
pressões. Se esta não representar um estado de equilíbrio da estrutura arqueada, então,
iterativamente, repete-se a escolha de outros valores para as coordenadas até a linha ficar
inserida na espessura do arco.
3.1.2 Linhas de Pressões. Analogia com Cabos Suspensos
O conceito da catenária é um dos primeiros conceitos a surgir na análise da estrutura do arco,
identificado por Robert Hooke em 1675. O método da aplicação da catenária, continuou a ser
aplicado, utilizando-o Antonio Gaudí na construção da Igreja da Sagrada Família em Barcelona
em 1883 (Nunes, 2009).
No pressuposto de que os arcos não suportam esforços de tracções e de que não há atrito nas
juntas entre aduelas (pelo teorema estático, se o arco for estável sem se considerar o atrito,
também o é em condições reais), segundo Gago (2004), é possível encontrar um paralelo entre
30
esse elemento estrutural e os cabos suspensos. Apesar de terem comportamentos inversos -
no caso dos cabos a tracção é possível não o sendo, no entanto, a compressão - as
considerações relativas ao equilíbrio das linhas de pressões deverão conduzir a resultados
análogos.
Figura 14 - Reprodução da maqueta de estudo da igreja da Sagrada Família, utilizando pequenas esferas a simular o carregamento. (Nunes, 2010)
Para um arco sujeito apenas ao seu peso próprio, as condições de equilíbrio da linha de
pressões, são traduzidas por:
(3.11)
(3.12)
Se for calculada e resolvida a equação diferencial resultante, obtém-se a expressão da
catenária:
(3.13)
em que c é uma constante de integração provocada pela indeterminação estática do problema.
A expressão traduz a analogia, mencionada, entre a expressão da linha de pressões
correspondente à acção do peso próprio do arco e a da geometria do cabo suspenso, sujeito
também ao seu peso próprio. Submetendo, de seguida, o arco a uma carga concentrada q
distribuída pela largura do seu vão, a expressão obtida das condições de equilíbrio é a de uma
parábola:
(3.14)
Gago (2004) refere que Yvon Villarceau propõe uma técnica de dimensionamento do arco que
consiste em adaptar a geometria deste às linhas de pressões, calculando-se a geometria do
arco para que o seu eixo coincida com uma possível linha de pressões. Nesse caso, conclui-se
que o perfil ideal para um arco não resistente à tracção e sem atrito nas juntas é o da catenária
ou da parábola, como demonstram as expressões encontradas. Menciona ainda que, quando
considerado o enchimento do extradorso do arco, se obtém uma expressão que permite
simplificar a definição da sua geometria. Basta especificar o vão do arco L, bem como a altura
total do enchimento a e a flecha h, para que se encontre a expressão da geometria do arco em
questão.
31
(3.15)
Perante uma análise da linha de pressões, equiparando a sua geometria à de cabos
suspensos, Gago (2004) defende que é pertinente compreender a diferença entre as linhas de
pressões parabólicas e as circulares. A intensidade dos carregamentos correspondentes
destas linhas aumenta do meio vão para os apoios. No entanto, se for considerado um arco de
volta inteira, essa intensidade cresce para o infinito nos apoios, provando ser impossível, nesse
tipo de arco, a existência de linhas de pressões circulares.
(3.16)
(3.17)
A mesma conclusão é, segundo Gago (2004), retirada quando é considerado o carregamento
do extradorso do arco, ao admitir a acção do seu peso próprio. Constata-se que, com a
variação da espessura do arco também, neste caso, uma linha de pressões circular é
impossível. Igualmente, no caso do arco circular, se verifica o efeito estabilizador do
enchimento do extradorso, aproximando a linha de pressões ao perfil circular. O peso próprio
do enchimento, ao aumentar a intensidade de distribuição nos rins do arco, tem o efeito
estabilizador já verificado na metodologia do polígono funicular.
3.1.3 Polígono Funicular
O método do polígono funicular é um método gráfico que permite calcular a linha de pressões
correspondente a um determinado carregamento. O polígono funicular é construído através de
um polígono formado por um eixo que nos seus extremos fixa um cordão traccionado pelas
forças actuantes. O método mais comum para determinar uma aproximação das linhas de
pressões de um arco bidimensional consiste na técnica gráfica do polígono funicular, na qual
se analisa o equilíbrio das forças que actuam na estrutura, sendo o arco representado por um
cabo suspenso invertido sujeito a cargas concentradas que simulam o peso de cada aduela.
Como o polígono funicular representa o equilíbrio estático das forças que actuam na estrutura e
como, já referido, o arco é uma estrutura triplamente hiperstatica, não é possível determinar a
expressão da linha de pressões recorrendo somente a esta técnica. Assim, é necessário
considerar a deformabilidade da estrutura, de modo a tornar o problema resolúvel (Gago, 2004;
Nunes, 2009; Rouxinol, 1999).
Pela teoria da análise limite de Heyman (1966), se for encontrada pelo menos uma linha de
pressões que satisfaça o equilíbrio da estrutura, garante-se que a estrutura está em equilíbrio.
Desta forma, basta pois encontrar uma aproximação da linha de pressões para analisar a
estabilidade da estrutura (fig. 15).
Embora podendo obter-se a aproximação através de tentativa erro, é preferível considerar as
situações limite da linha, uma vez que são já conhecidas. Estes dois limites correspondem,
respectivamente, à linha de pressões que provoca o impulso horizontal máximo e mínimo,
32
quando esta é tangente ao intradorso e extradorso do arco em três pontos (Gago, 2004;
Nunes, 2009).
Figura 15 - Traçado de um polígono funicular. (Gago, 2004)
O método do polígono funicular tem a enorme vantagem de permitir a análise da estabilidade
do arco, bem como de possibilitar a identificação dos valores máximos e mínimos dos impulsos
horizontais. Todavia, deve ser tido em conta que mesmo que não se encontre uma
aproximação da linha de pressões tal não implica que esta não exista, não sendo, nesse caso,
possível quantificar margens de segurança.
Através do método do polígono funicular, apresentam-se algumas das vantagens do efeito do
enchimento do extradorso. Quando traçado, é possível estabelecer que, estando o arco sujeito
a um carregamento simétrico, quanto maior o declive do troço final, menor o impulso horizontal
nos apoios e quanto mais próxima estiver a resultante das cargas da imposta, mais acentuado
é o ângulo do troço final (fig. 16). Assim, com o aumento do carregamento dos rins do arco, ao
reduzir o braço da resultante das cargas, reduzir-se-á a intensidade do impulso horizontal.
Além da acção estabilizadora dos pés direitos, com o enchimento do extradorso, ao seu peso
adiciona-se o peso do próprio arco, o que provoca a deslocação da linha de pressões para o
seu interior. Se a união enchimento/arco apresentar uma resistência ao corte suficiente, então
a linha de pressões pode, inclusivamente, sair da espessura que a limita e percorrer o
enchimento sem afectar a estabilidade (Gago, 2004; Rouxinol, 1999).
Figura 16 - Geometria dos polígonos funiculares em função da localização da resultante das cargas. (Gago, 2004)
33
3.1.4 Método de Fuller
Introduzido no final do século XIX, com este método é possível verificar se um arco é estável
para determinado carregamento, assim como determinar a espessura mínima admissível do
mesmo arco. É um método baseado em transformações do polígono funicular, não sendo,
contudo, alteradas a distância vertical entre o eixo do arco e a linha de pressões. Mantendo-se
a distância que causa o momento consequente do binário de forças — e que define a
excentricidade da resultante das tensões normais na secção — a posição da resultante
permanece a mesma relativamente aos limites da secção (Gago, 2004).
Assim, no caso de um arco sujeito a um carregamento, e arbitrando a posição do pólo do
polígono, desenham-se então o polígono de forças e, de seguida, o arco e o polígono
respectivo, numa escala horizontal distorcida, de modo a que o polígono corresponda a dois
segmentos de recta de localização arbitrária. Esta transformação do polígono em dois
segmentos é a base do Método de Fuller.
Gago (2004) refere que, considerando as propriedades dos polígonos de forças e funiculares, o
polígono é constituído por dois segmentos de recta e qualquer translação do pólo do polígono
resulta num outro polígono de forças igualmente bi-linear. Desta forma, este autor conclui que
qualquer outro polígono funicular que se encontre em equilíbrio com as cargas aplicadas e que
corresponda a uma outra posição do pólo do polígono de forças é representado por dois
segmentos de recta, no arco distorcido. Sendo possível desenhar um e só um polígono de
foças bi-linear dentro da espessura do arco distorcido, então a espessura do arco corresponde
à espessura mínima. Este método prova o efeito estável do enchimento do extradorso, pois
pode desenhar-se um polígono de forças bi-linear na sua espessura.
Ao comparar os resultados obtidos para o arco submetido ao seu peso próprio com aquele
sujeito ao peso do seu material de enchimento, Gago (2004) conclui que, no segundo caso, a
espessura mínima admissível é inferior à do primeiro, como se previa.
3.1.5 Método Elástico de Pippard
O método MEXE, anteriormente descrito, foi desenvolvido pelo exército britânico para
classificar as pontes em alvenaria, e, nele, as bases utilizadas são originárias da análise de
Pippard.
Pippard observou que, apesar do arco se tratar de uma estrutura hiperstatica de terceiro grau,
devido ao ajuste da geometria à geometria dos apoios e à ocorrência de pequenos movimentos
nos apoios, se formam articulações e fendilhações localizadas que o tornam uma estrutura
estaticamente determinada. As deduções de Pippard, seguidamente apresentadas, ignoram,
todavia, a formação de uma terceira rótula, admitindo o arco uma estrutura bi-articulada
contínua (Gago, 2004; Rouxinol, 1999).
Pippard admite a existência de limites para o estudo do arco, não ao nível da espessura deste,
mas das tensões que nele se instalam (Gago, 2004). Para o cálculo da força horizontal,
Pippard começa por considerar a energia de deformação, fazendo coincidir o arco com o seu
34
eixo. A expressão da energia de deformação pode ser simplificada, admitindo uma diminuição
da secção do arco do apoio para a aduela de fecho ficando a inércia traduzida pela expressão:
(3.6)
A metodologia de Pippard aborda igualmente a problemática do efeito do enchimento do
extradorso. Quando o arco tem forma parabólica e está sujeito ao seu peso próprio, ao peso do
enchimento do extradorso e a uma acção concentrada P, Pippard minimiza a energia de
deformação, obtendo o valor da componente horizontal da reacção nos apoios:
(3.7)
(3.8)
(3.9)
A posição mais desfavorável para uma carga concentrada aplicada ao arco é
aproximadamente localizada a um terço ou a um quarto do vão e não a meio, como
considerado anteriormente por La Hire e outros. Se a dispersão da carga, provocada pelo
enchimento do extradorso, for tida em consideração, verifica-se, todavia, que essa posição da
carga provoca uma maior mobilização da largura do arco, actuando de forma favorável (Gago,
2004).
Seguidamente Pippard procura a definição de expressões para os valores limites das tensões
existentes do arco que se baseiam na regra da metade central, bem como em expressões da
tensão de compressão máxima em regime elástico. Admitindo a limitação na tensão de
compressão P2, Pippard verifica que é possível obter uma margem de segurança na relação
entre o valor real e valor limite. Assim, os valores das cargas de colapso obtidas serão 3 a 4
vezes as cargas de colapso, se no cálculo da carga admissível se considerar uma tensão de
compressão limite de 1.39 MPa. Assim, considerando esta tensão limite e os arcos como
estruturas parabólicas com relação vão/flecha de 4, Pippard elabora tabelas que permitem
determinar cargas admissíveis para múltiplos vãos e alturas de enchimento sobre o fecho
(Gago, 2004).
(3.10)
3.1.6 Teoria da Análise Limite aplicada a Estruturas em Alvenaria
O comportamento da alvenaria foi alvo de estudos que seguiram abordagens diversas, tais
como o comportamento elástico, comportamento plástico e comportamento não linear, sendo
este último o método mais eficiente, traçando a resposta do seu comportamento elástico,
passando pela fissuração até ao colapso.
A análise limite é uma técnica antiga que identifica as forças que provocam o colapso da
estrutura, sendo que o rácio entre estas forças e as que actuam na realidade permite obter um
35
coeficiente de segurança da estrutura (Sincraian, 2001).
Retomando os estudos de Heyman (1966), este sintetizou o comportamento da alvenaria em
três características fundamentais relacionadas com a sua resistência (nula à tracção, ilimitada
à compressão) e inexistência de deslizamento entre aduelas (Rouxinol, 2007; Nunes, 2009).
Figura 17 - Movimento relativo numa junta entre elementos. (Gago, 2004)
Partindo destas constatações, Gago (2004) refere que o único movimento relativo possível
entre aduelas separadas por uma junta é a rotação em torno das suas arestas comuns (fig. 17).
Esta rotação, admitindo uma secção rectangular, uma velocidade v de abertura da junta no seu
ponto médio e uma velocidade da rotação ω, é definida por:
(3.18)
Como a tracção na secção não é admissível, a excentricidade do esforço normal está limitada
a metade da altura da secção. Quando ocorre o movimento de rotação relativa, a força de
compressão N é transmitida através da aresta onde se localiza o eixo de rotação, ocorrendo
um momento, dada a existência da excentricidade. O vector de esforços, definido por M e N, e
pelo vector velocidade de deformação, de intensidade desconhecida, é constituído pelas
componentes v e ω. Tratando-se, portanto, de um elemento estrutural plástico perfeitamente
tradicional, é possível a aplicação dos teoremas fundamentais da análise limite: o Teorema
Estático e o Cinemático. A utilização destes teoremas, como foi referido na síntese da evolução
do arco ao longo do tempo, permite ao projectista encontrar uma só linha de pressões para que
o equilíbrio fique satisfeito (Lança, 2006).
Segundo Heyman (1966), quando a resistência da alvenaria está sujeita a tensões de
compressão, é possível elaborar uma superfície limite de resistência. Assumindo inicialmente
que essa resistência é infinita, obtém-se um resultado do tipo:
Figura 18 - Região admissível no espaço das tensões. (Heyman, 1966)
36
Apesar de não ser ilimitada, essa resistência está, como foi referido, muito acima das tensões a
que a estrutura está sujeita. Todavia, considerando uma tensão limite de compressão, a
superfície de resistência deixa de acompanhar as rectas visíveis na fig. 18 e forma dois arcos
parabólicos. Esses arcos são tanto mais próximos das rectas, quanto mais baixo for o nível de
tensões de compressão (fig. 19).
Figura 19 – Regiões admissíveis. (Heyman, 1966)
Relativamente à vantagem de utilizar a análise limite no estudo do comportamento dos arcos
em alvenaria, segundo Heyman (1966), esta prende-se com o facto de possibilitar o cálculo da
espessura mínima do arco para diferentes localizações de uma carga concentrada aplicada ao
arco. Esta espessura pode ser analisada através do valor do momento de ―plastificação‖
dependente da aplicação da carga concentrada.
Heyman (1966) considerou um arco parabólico sujeito a um carregamento uniforme e a uma
carga concentrada, sendo a intensidade desta muito inferior à da carga uniforme e
desprezando o peso próprio do arco. Para este autor, a consequente linha de pressões das
cargas aplicadas, que estabelece o equilíbrio do arco, tem forma parabólica coincidente com o
seu eixo, o que equivale a desprezar os efeitos da carga concentrada e do peso próprio do
arco na geometria da linha de pressões (fig. 20).
Gago (2004) entende que, todas as secções do arco têm igual momento que é provocado pela
formação de uma articulação. Esta assunção é somente válida para análises preliminares pois,
o esforço normal real varia ao longo do arco, o mesmo acontecendo com o valor do momento.
Como resultado, obtém-se um mecanismo de colapso do arco que corresponde a duas
articulações nos apoios: uma localizada sobre a carga concentrada e outra afastada yl do
centro do arco (fig. 20).
Recorrendo à teoria dos cabos, Gago (2004) calcula o valor da reacção horizontal e,
introduzindo uma pequena rotação em torno do centro de rotação I, se o balanço energético
entre o trabalho das cargas aplicadas e o das forças internas for efectuado, obtém uma
expressão para o momento de ―plastificação‖:
(3.19)
Para Gago (2004), podem estabelecer-se duas condicionantes. A primeira relaciona-se com a
independência da expressão relativamente ao valor da carga uniforme: Admitindo-se a linha de
37
pressões provocada por este carregamento coincidente com o eixo do arco, então, pela
aplicação do princípio dos trabalhos virtuais, o trabalho realizado por estas forças é nulo para
qualquer deformação da linha de pressões. A segunda prende-se com a determinação da
posição mais gravosa da articulação desconhecida e que se encontra dependente de y: Se
esta for calculada em função da maximização do valor do momento de plastificação, então tem-
se:
(3.20)
Figura 20 - Análise limite de um arco de perfil parabólico. (Gago, 2004)
Substituindo o valor obtido na expressão do momento, resulta:
(3.21)
Como o momento se admitiu ser constante, então é possível determinar a espessura mínima
em função da carga P. Resta mencionar que, se for definido um coeficiente de segurança,
então, logicamente, o andamento dos gráficos representativos desse coeficiente é oposto ao
andamento do momento de plastificação (Gago, 2004), como se pode observar nas seguintes
figuras (fig. 21 e 22).
38
Figura 21 - Momento de "plastificação" em função da localização da carga concentrada. (Heyman, 1969)
Figura 22 - Coeficiente de segurança geométrico. (Gago, 2004)
3.2 Metodologias Analíticas
Nunes (2009) destaca três possíveis origens para a formação de um mecanismo de colapso de
um arco em alvenaria: rotação de uma das suas arestas (intradorso ou extradorso);
deslizamento de aduelas sobre outras; e após deformação que precede o esmagamento do
material. Assim, para evitar o colapso, serão igualmente três as condições a satisfazer para
garantir a estabilidade: evitar a rotação de aduelas impondo a linha de pressões no interior da
espessura do arco; evitar deslizamentos impondo a resultante das forças na junta com um
ângulo inferior ao de atrito; e evitar o esmagamento sendo a resistência da secção superior às
cargas actuantes.
Admitindo os Teoremas Estático e Cinemático da análise limite, já explicitados anteriormente,
Gago (2004) examina o arco em alvenaria, incidindo no dimensionamento das espessuras dos
pés direito e do próprio arco, através do estudo dos mecanismos de colapso da estrutura.
Como foi referido por este autor, da análise de mecanismos de colapso obtém-se um majorante
da carga de colapso que corresponde à carga de colapso, no caso de o mecanismo ser o real.
É este o foco da secção seguinte.
3.2.1 Dimensionamento da espessura dos pés direitos do arco: dois mecanismos (La Hire e Coulomb)
Num arco, seja qual for a sua geometria e suportado por duas paredes ou colunas, há dois
possíveis tipos de mecanismos: um deles, segundo La Hire e Belidor, é um mecanismo de
escorregamento, do tipo cunha deslizante, o outro é o mecanismo rotacional, estabelecido por
Coulomb e Couplet (Kurrer, 2008; Nunes, 2009).
39
La Hire descreve o escorregamento da parte superior do arco sobre duas juntas fracturadas
que se localizam aproximadamente a meio dos rins (fig. 23). Admitindo que as zonas entre as
juntas são estáveis, é possível a formação de corpos rígidos. Com o deslocamento
descendente do troço superior são provocados impulsos nas juntas que por sua vez provocam
rotação do corpo rígido em torno das bases das colunas ou paredes (Gago, 2004; Nunes,
2009).
Figura 23 - Possível mecanismo de escorregamento (de La Hire). (Kurrer, 2008)
Para os autores acima referidos, La Hire apresenta três argumentos para suportar a sua teoria.
O primeiro prende-se com a localização das juntas e La Hire assume que estas se encontram
nas secções intermédias entre a imposta e o fecho ou a 45º para o caso do arco circular. No
segundo, defende que a direcção do impulso nas juntas é perpendicular à direcção destas, o
que está correcto se o atrito não for considerado. Todavia, a partir de determinado ângulo o
escorregamento o atrito deve ser tido em conta. Quando o atrito é considerado, o ângulo entre
o impulso e a direcção da junta deixa de ser recto para passar a ser o ângulo de atrito admitido.
Finalmente, num terceiro, La Hire admite que o ponto de aplicação do impulso na junta se
localiza na extremidade inferior. Com este mecanismo, e assumindo estes três pressupostos,
analisando a equação de momentos, obtém-se uma expressão que determina a espessura
mínima admissível do pé direito em função da sua altura total, da espessura do arco e do raio
deste.
Segundo Gago (2004) e Nunes (2009), Belidor não concordou com esta localização da junta,
entendendo que o ponto de aplicação do impulso é a meio da junta, e propõe uma expressão
que é ligeiramente mais desfavorável que a obtida por La Hire obtendo para os mesmos
valores de ângulo, valores superiores da espessura mínima admissível. Esta expressão indica
que, para uma altura de pé direito superior ou para uma espessura superior do arco, os valores
das espessuras mínimas dos pés direitos são crescentes.
Referem os autores acima citados que Coulomb apresentou um mecanismo alternativo, mais
tarde retomado por Mascheroni. Trata-se de um mecanismo rotacional em que ocorre rotação
do corpo rígido de partes do arco que estão delimitadas pelas zonas fracturadas em torno das
arestas (Kurrer, 2008).
40
Figura 24 - Mecanismo rotacional de Coulomb-Mascheroni. (Nunes, 2010)
A análise deste mecanismo, representado na figura anterior (fig. 24), termina com uma
expressão idêntica à desenvolvida por La Hire sendo contudo diferente o ângulo a utilizar. A
expressão que relaciona a espessura mínima do pé direito com a altura e com a espessura do
arco permanece a mesma mas com tan ϕ’ no lugar de tan ϕ.
Quando são comparados os dois tipos de mecanismo, verifica-se que, se o atrito for
considerado (ϕ >20), os resultados da espessura mínima admissível serão mais gravosos no
mecanismo rotacional do que no deslizante de La Hire e Belidor, tornando-o condicionante para
o dimensionamento da espessura dos pés direitos do arco (Kurrer, 2008).
3.2.2 Definição de Coeficientes de Segurança Geométricos através da Análise das Espessuras Mínimas (Heyman)
A avaliação da capacidade de resistência de uma estrutura arqueada sujeita a dado
carregamento consiste em determinar a espessura mínima do arco que verifique as condições
de equilíbrio, quando este está sujeito ao carregamento referido, e comparar com a sua
espessura real (Rouxinol; Nunes, 2009). Como foi mencionado atrás, para Heyman (1966),
quando esta razão é 2, o coeficiente de segurança é suficiente.
Gago (2004) realiza as avaliações de diferentes geometrias sujeitas a diferentes
carregamentos tais como o peso próprio, este combinado com uma carga uniforme, entre
outras combinações. O primeiro caso a ser considerado é o mais simples: um arco circular
sujeito apenas ao seu peso próprio. Nesta situação, a linha de pressões correspondente é a
catenária invertida, como já foi verificado anteriormente, e a espessura mínima admissível do
arco ocorre quando esta linha está tangente ao extradorso do arco no fecho e impostas e ao
intradorso em pontos médios nos rins. Esta é a única linha possível de incluir na espessura do
arco e corresponde simultaneamente aos impulsos máximo e mínimo. O mecanismo de
colapso, devido ao atrito nas juntas ser suficiente para impedir o escorregamento dos
elementos do arco, consiste somente na geração de articulações nas secções entre elementos
e, como estes são suficientemente estáveis, os corpos rígidos movem-se como corpos
articulados. A expressão resultante desta análise, referente ao impulso horizontal, indica que
este impulso vai apenas depender da posição da articulação nos rins do arco e da carga a que
está sujeita essa zona. O ângulo da localização da junta fracturada obtido tem o valor
41
β=58.82º, conduzindo à espessura mínima admissível para o caso do arco circular sujeito
apenas ao seu peso próprio de valor (t/R)min = 0.106. No caso particular do arco circular abatido
(com um ângulo de abertura 2α <180º), a expressão altera-se e verifica-se que a espessura
mínima cresce com o valor do ângulo α, o que significa que a espessura mínima corresponde
ao mecanismo de articulações junto das impostas e não aquele definido por La Hire,
constituído por duas articulações nas zonas intermédias dos rins. Então, constata-se que, se
não ocorrer escorregamento, um arco abatido é mais resistente que um arco de maior altura.
Esta afirmação deriva do facto da catenária se aproximar tanto mais do perfil circular quanto
menor for a sua flecha. Todavia, a hipótese de ausência de escorregamento deixa de ser real
para arcos muito abatidos.
No segundo caso mencionado por Gago (2004), o arco circular está sujeito a uma carga
uniformemente distribuída ao longo do seu vão. Aqui, uma vez que a linha de pressões
mantém a sua geometria parabólica, o mecanismo é equivalente ao anterior com as mesmas
equações de equilíbrio. Neste caso, porém, o ângulo aumenta para β=60º com um rácio
espessura mínima/raio de 0.133. Desta forma, verifica-se que a acção uniforme é ligeiramente
mais desfavorável do que a acção do peso próprio, já que a geometria da catenária está mais
próxima do perfil circular do que a geometria parabólica. No caso particular do arco abatido, os
resultados mantêm-se os mesmos que no exemplo anterior.
No terceiro caso analisado por Gago (2004), o peso próprio do arco é acrescido de uma carga
uniforme. Esta carga tem sempre um efeito desvantajoso na segurança do arco, já que a
espessura mínima cresce com a intensidade da carga. Ao analisar o coeficiente de segurança
geométrico, verificou o seguinte:
Este decresce com o aumento da carga uniforme, excepto quando a espessura real do
arco for tal que t/R > 0.133. Nestas condições, o coeficiente, apesar de sofrer um
decréscimo, é sempre positivo, qualquer que seja a intensidade da carga, e nunca é
atingido o colapso.
Se a espessura estiver incluída no intervalo 0.106 < t/R < 0.133, é possível a ocorrência
de valores negativos do coeficiente de segurança.
Se a relação espessura/raio estiver abaixo de 1.06, a intensidade da carga não tem
influência, já que é impossível o equilíbrio.
No quarto caso, referido por Gago (2004), em que se considera o peso próprio do material de
enchimento do extradorso, a geometria da linha de pressões é diferente, atingindo um
andamento quase horizontal junto ao fecho do arco, dada a reduzida intensidade das cargas
nessa zona. O mecanismo sofre também alterações, como seria de prever, e o novo ângulo
localiza a articulação junto da imposta (α=75 º) com uma espessura mínima de 0.073 m. Esta
situação não se altera quando considerado um arco abatido.
No quinto caso explicitado por Gago (2004), o arco está sujeito ao seu peso próprio e ao peso
do enchimento do extradorso. O mecanismo que se despoleta mantém-se idêntico ao do caso
42
anterior, se o efeito do enchimento for significativo, quando comparado com o do peso próprio.
Se tal não acontecer, o mecanismo é o mesmo que o do primeiro caso, isto é, em que o arco
esta exclusivamente sujeito ao seu próprio peso. Contudo, este autor considera importante
referir que a espessura mínima admissível decresce à medida que o valor do peso próprio do
enchimento aumenta, evidenciando que o efeito das acções verticais associadas a esse peso é
favorável para a estabilidade do arco.
Finalmente, Gago (2004) apresenta o caso de um arco com uma geometria genérica que se
encontra sujeito a um qualquer carregamento, elaborando sobre a consequência do efeito da
limitação da tensão de compressão no arco. Neste caso, a posição da linha de pressões é
indeterminada devido à indeterminação estática do problema. No entanto, segundo Gago, é
possível a identificação de várias linhas, nomeadamente daquelas correspondentes aos
valores máximo e mínimo do impulso horizontal. Estas linhas limite definem uma região onde
as linhas de pressões podem estar localizadas, sendo a amplitude do arco admitida como
coeficiente de segurança do arco. Se a espessura for progressivamente reduzida, verifica-se
que o valor do impulso máximo diminui, contrariamente ao do impulso mínimo que aumenta.
Assim, existe uma espessura em que esses dois valores se encontram e, simultaneamente, se
formam articulações que correspondem aos impulsos máximo e mínimo, não sendo possível o
equilíbrio. Esta espessura corresponde à espessura mínima admissível. No que se refere ao
efeito de limitação da tensão de compressão, Gago (2004) entende que este é contemplado no
problema reduzindo a dimensão da espessura t e garantindo que a linha de pressões está
afastada dos limites dos limites da secção.
3.2.3 Arcos sujeitos a Cargas Concentradas. Cargas de colapso
Abordando o arco pela análise limite, desprezando a deformabilidade e admitindo que a
deformação da estrutura ocorre localizadamente através da abertura de juntas entre
elementos, Gago (2004) salienta que as estruturas exibem um comportamento rígido/plástico.
O cálculo das cargas de colapso pode assim ser realizado admitindo um carregamento em que
pela análise limite se determina o coeficiente majorante da solicitação que conduz ao colapso.
Se considerado o teorema cinemático, em que o mecanismo de colapso corresponde,
simplificadamente, àquele que sofre o colapso quando sujeito à menor carga, e o teorema
estático, em que dos vários carregamentos aquele que equivale ao colapso é o que equivale a
maior carga, então pode ser enunciado um terceiro teorema. Este, o teorema da unicidade,
preconiza que, para um dado parâmetro de carga, e no caso de ser possível definir uma
distribuição de esforços estaticamente admissível, à distribuição de deformações
cinematicamente admissíveis corresponde uma carga de colapso.
3.3 Metodologias Computacionais
Actualmente, são vários os métodos que ainda encaram a alvenaria como um material elástico
linear, considerando como hipóteses simplificativas as relacionadas com as suas
43
características. No entanto, a consideração dessa linearidade já se sabe ser válida até
determinado limite, a partir do qual o material se comporta como não-elástico. Segundo, Ayala
e Roeder-Carbo (2001), uma correcta selecção do método que mais adequadamente estuda a
estabilidade do arco em alvenaria depende do carregamento e condições de fronteira. No caso
do arco em alvenaria sujeito a um carregamento vertical, esta pode ser modelada como linear,
mas para carregamentos ou geometrias mais complexos pode ser difícil identificar que partes
da estrutura exibem um comportamento não-elástico, sendo, nestes casos, essencial uma
modelação mais refinada. Quando aplicado o Método dos Elementos Finitos a um material de
natureza descontínua, Ayala e Roeder-Carbo (2001) admitem existir uma elevada sensibilidade
da resposta do sistema à configuração da malha e ao tamanho dos elementos característicos
utilizados na discretização. Esta sensibilidade resulta em dificuldades de convergência da
resposta. Como solução, estes autores sugerem a definição de funções matemáticas que
representem a evolução dos esforços e tensões no domínio não-elástico, representando a
evolução do dano quando o limite do comportamento elástico é ultrapassado. Estas funções
baseiam-se em simplificações teóricas dos processos irreversíveis termodinâmicos. Ayala e
Roeder-Carbo (2001) apresentam três métodos para o cálculo das equações constitutivas do
material que permitem descrever a sua não elasticidade: modelos matemáticos baseados na
teoria da plasticidade; modelos matemáticos baseados em conceitos de propagação de falhas;
e modelos matemáticos de dano contínuo. Assim, são utilizados modelos mais refinados para
considerar os efeitos não lineares provocados por aberturas e dano do material.
Para considerar o enchimento do extradorso, Gibert (2007), Lemos (2007) e Rouxinol (2007)
sugerem a sua modelação de várias formas possíveis. Para Gilbert (2007), a resistência
passiva que o enchimento induz (o enchimento impede a oscilação do arco) tem sido
representada através de paredes verticais. Outra hipótese utilizada passa por considerar um
coeficiente de pressão do enchimento, correspondente a 1/3 daquele aplicado aos solos. Este
autor contrapõe, no entanto, que estas assunções não se encontram teoricamente
fundamentadas e sugere, em alternativa, modelar o enchimento através de pressões aplicadas
ao arco, ou através de elementos definindo apenas a sua coesão e ângulo de atrito. Rouxinol
(2007) entende que a rigidez normal e a tangencial das juntas estão dependentes das
dimensões dos elementos em alvenaria e do material de enchimento do extradorso. Sugere,
assim, a simulação do material do enchimento através do DEM, recorrendo a elementos
esféricos, tal como Lemos (2007) e considera-o constituído por uma mistura de brita, areia e
argila com massa volúmica ρf de valor 1890 kg/m3 e módulo de deformação Ef = 40 MPa.
Rouxinol (2007) considera também que o material de enchimento tem resistência à tracção
nula.
Nos seus modelos de carga /estrutura, Rouxinol (2007) apresenta as diferenças de
comportamento do arco para vários tipos de carregamento fornecendo assim uma comparação
experimental com as hipóteses teóricas colocadas na metodologia analítica baseada em
mecanismos. O autor simula o enchimento do arco através de cargas verticais correspondentes
ao seu peso próprio e através de 1957 elementos circulares. Quando não se considera o
44
enchimento a carga de colapso apresenta um valor reduzido confirmando-se a necessidade de
incluir o enchimento do extradorso na modelação. Os resultados obtidos quando o enchimento
é simulado por um carregamento, e não por elementos discretos, estão abaixo dos obtidos na
realidade, porém, essa modelação é simples e permite uma estimativa aproximada do valor da
carga de rotura.
Gago (2004), realizou a modelação da alvenaria e do material de enchimento através de blocos
deformáveis independentes de comportamento elástico e ligados entre si por contactos não
pontuais de comportamento não linear. Gago (2004), tal como Rouxinol (2007), considera o
material de enchimento com resistência à tracção nula e um ângulo de atrito reduzido de 10º
que simula a fractura por corte do enchimento.
3.4 Síntese
O enchimento do extradorso, numa análise estática do arco em alvenaria, recorrendo a
diversas metodologias, apresenta sempre um efeito estabilizador no comportamento estrutural
global do arco.
Segundo o Método de Fuller, se o enchimento for considerado e se se analisar o arco sujeito
ao seu peso próprio comparando-o ao mesmo arco sujeito, desta vez, ao seu próprio peso sem
o enchimento, então a espessura mínima admissível diminui, no primeiro caso. Assim, verifica-
se que, no caso do arco com enchimento do extradorso, é mais fácil traçar um polígono na sua
espessura. Além disso, este actua como um estabilizador dos pés direitos.
No estudo de Pippard, a componente horizontal da reacção nos apoios é obtida para um arco
sujeito ao peso próprio, ao peso do enchimento e a uma carga concentrada P. Ao definir a
posição da carga P mais desfavorável para o arco, conclui que o enchimento do extradorso
provoca uma dispersão da carga concentrada que, quando aplicada na localização mais
desfavorável (a um terço ou a um quarto do arco) mobiliza a maior largura do arco actuando
favoravelmente.
Ao considerar a metodologia que compara o arco com cabos suspensos, Gago (2004)
apresenta as consequências da assunção de linhas de pressões circulares em vez de
parabólicas. No caso do arco de volta inteira, conclui ser impossível a existência de linhas de
pressões circulares, mas, que ao se considerar o enchimento do extradorso, este aproxima a
linha de pressões ao perfil circular. Além dessa vantagem que se prende novamente com o
efeito estabilizador, o enchimento do extradorso permite, através da técnica sugerida por Yvon
Villarceau, simplificar a expressão da geometria do arco.
Gilbert (2007) apresenta, no seu modelo de elementos finitos, a simulação do enchimento do
extradorso como interacção arco — solo. Em vez de aplicar ao arco as pressões
correspondentes às que o solo exerce, considera elementos finitos modelando a sua coesão e
ângulo de atrito. Lemos (2007) e Rouxinol (2007) utilizam o modelo de elementos discretos e
consideram que, para uma representação fiel do enchimento, este deve ser modelado através
45
de elementos esféricos por oposição aos poligonais utilizados para a alvenaria. Também Gago
(2004) simula a alvenaria e o efeito do enchimento do extradorso através do método dos
elementos discretos, utilizando no entanto, elementos poligonais para ambos os materiais.
46
47
Parte III O Arco em Alvenaria: Análise Dinâmica
4. Análise Quase-estática vs Análise Dinâmica
Sabe-se que a actividade sísmica sempre intrigou o homem e, por isso, há milénios que se
procuram explicações para este fenómeno. Com a evolução do pensamento do homem e da
ciência em geral, os sismos que antigamente se julgava serem provocados por mares ou
ventos que habitavam o interior do nosso planeta, são agora fenómenos explicados. Mas, na
verdade, só no século XX, com a teoria da tectónica de placas, começou a ser desbravada a
acção sísmica e as suas origens. Embora não sendo ainda possível o seu controlo por parte do
Homem, pelo menos nos dias de hoje, é um objectivo actual da ciência conseguir prever os
sismos e reduzir os danos que estes provocam, evitando catástrofes que vitimam todos os
anos milhares de pessoas.
Comummente, ouve-se afirmar que os sismos, tal como outras catástrofes naturais que o
Homem não domina, são calamidades em relação às quais pouco ou nada se pode fazer.
Todavia, sendo demonstrações de força da natureza, é possível ao Homem encontrar
maneiras de limitar e minimizar os danos e as consequências da acção dos sismos. Quando
estes acontecem, a causa principal da maioria das vítimas e dos prejuízos económicos está
relacionada com a danificação e colapsos nas construções, redes de infra-estruturas e outros
equipamentos. A observação de vários sismos e o estudo das suas consequências, bem como
a pesquisa que foi sendo feita sobre o comportamento dos materiais no fenómeno, remete-nos,
no que diz respeito aos campos relacionados com o presente estudo, para, entre outros
aspectos, a problemática do planeamento urbanístico e da construção dos edifícios.
Quando na construção dos edifícios se utilizam estruturas em alvenaria os problemas que se
colocam quando se pensa a sua segurança, relativamente a este tipo de fenómenos, são
particularmente complexos, devido a vários factores. Um deles prende-se com o projecto de
base das estruturas, e com o facto destas, na sua grande maioria pouco elaboradas, não
beneficiarem de um projecto cuidadoso, sendo executadas partindo de conhecimentos
empíricos. Além disso, no caso de estruturas em alvenaria antigas, são vários os obstáculos
que se encontram quando se pretende realizar uma análise estrutural, como por exemplo a
inexistência de plantas dos edifícios, e degradação dos materiais, neste caso a alvenaria,
provocada pelo tempo e assentamentos. Outra dificuldade passa pela própria natureza do
material. Por se tratar de um material descontínuo, a modelação de estruturas em alvenaria é
complexa e apresenta dificuldades quando se usa o Método dos Elementos Finitos. Importa
também dizer que, na análise de estruturas a opção de analisar uma estrutura quanto à sua
estabilidade ou à sua resistência, é controversa, pois existem vários métodos para o fazer e
qualquer um que se utilize acarreta vantagens e desvantagens (Peña et al., 2006).
Este capítulo vai centrar-se no comportamento de um arco quando sujeito à acção sísmica,
estando dividido numa análise quase-estática e numa dinâmica, que por sua vez, separa os
48
métodos dinâmicos analíticos dos computacionais. Ao longo da análise, para ambos os tipos
de carregamento, são confrontados os estudos do bloco de Housner (1941) com o do arco de
Oppenheim (1992). A análise quase-estática recorre à linha de pressões para interpretação dos
resultados da aplicação de uma inclinação. Na análise dinâmica, os métodos analíticos
recorrem à derivação das equações analíticas de movimento. Os métodos computacionais
focam-se especialmente na modelação em elementos discretos (DEM), recorrendo ao código
UDEC para uma modelação fiel das descontinuidades da alvenaria.
4.1 Uma Aproximação ao Estado Estático
Para compreender os resultados de uma estrutura sujeita à acção sísmica, é necessária uma
compreensão prévia de como esta se comporta em estado quase-estático, antes de a
submeter à acção dinâmica. Os métodos de análise quase-estática foram, segundo DeJong
(2009), os primeiros a ser utilizados no estudo do comportamento de um arco quando sujeito à
acção sísmica. Neles, são ignorados os efeitos dinâmicos, assumindo-se um estado quase-
estático, tal como o nome indica. Esta assunção possui a grande vantagem de possibilitar a
análise computacional simplificada, estabelecendo-se condições que permitem uma
abordagem de primeira ordem dos efeitos sísmicos — análise linear estática e elástica em que
são determinadas forças de dimensionamento e momentos resultantes das cargas aplicadas.
Numa análise de segunda ordem, que não está prevista na aproximação quase-estática,
consideram-se efeitos adicionais aos previstos na análise dos efeitos de 1ª ordem (resultantes
das acções e das imperfeições geométricas da estrutura), nomeadamente os resultantes das
deformações da estrutura.
A aproximação a uma análise quase-estática pode ser, segundo DeJong (2009), feita de duas
formas: ou privilegiando a estabilidade da estrutura, ou a resistência da mesma. No primeiro
caso, aplica-se uma aceleração horizontal à estrutura, o que equivale a aplicar um movimento
constante na sua base. Apesar de, nesta abordagem, se ignorar que a aceleração é de curta
duração (como é uma hipótese conservativa, isto não apresenta problemas), ou pelo menos,
de duração limitada, ignora também, mas desta vez com efeitos negativos, qualquer efeito de
amplificação de ressonância. Assim, este método é de preferir quando a estabilidade é
condicionante e quando a ressonância elástica não o é.
No segundo caso, aplicam-se forças horizontais ao longo da altura da estrutura, cujas
amplitudes distribuídas pretendem representar o efeito do sismo e consideram a amplificação
causada pela ressonância dinâmica. Ao contrário do primeiro método, neste, a resistência da
estrutura é condicionante, tal como os efeitos de ressonância.
Nos métodos de análise quase-estática, privilegia-se, como atrás foi referido, o equilíbrio ou a
resistência da estrutura. No método de análise em que rege a resistência do material, as
hipóteses que caracterizam a alvenaria deixam de ser suficientes e é necessário incluir a
própria resistência desta na análise. DeJong (2009) refere que esta consideração adicional é
essencial, por exemplo, no caso de estruturas confinadas em que há necessidade de impedir a
49
instabilidade da estrutura e evitar deslizamento ou esmagamento. Estes métodos, que podem
ser do tipo macro escala (modelos que pretendem descrever a relação força-deformação de
uma estrutura em alvenaria, recorrendo a fórmulas simplificadas de oscilação, corte e
deslizamento), micro escala (modelos muito pormenorizados recorrendo comummente a
elementos finitos para a sua representação) ou as duas vertentes combinadas (considerando
quais as zonas condicionantes de falha e aplicando-se unicamente aí a pormenorização), têm a
especial vantagem de serem capazes de prever o dano da estrutura, não sendo, todavia,
garantida a previsão do colapso (DeJong, 2009).
Como já foi referido, no início do século XVIII, Couplet apresentou três características relativas
ao comportamento da alvenaria com seguintes implicações referidas por Sincraian (2001):
Sendo a análise estática da alvenaria um problema de estabilidade baseado na
geometria, então os seus resultados são independentes da escala. Um modelo vai,
desta forma, ter um igual comportamento ao da estrutura real que este representa.
Apesar de, entre aduelas, não ocorrer esmagamento ou deslizamento, aquelas podem
separar-se provocando a formação de rótulas. A ocorrência de rótulas, já mencionada
por Heyman (1966), implica que a linha de pressões já não se encontra contida da
espessura da estrutura e o mecanismo de colapso iniciou a sua formação.
Se não ocorrerem deslizamentos depreende-se que as tensões que os provocariam têm
valores desprezáveis face à resistência da estrutura. Assim, é possível obter uma
aceleração constante horizontal ―abanando‖ a base em que a estrutura repousa,
método este que foi utilizado por vários investigadores incluindo DeJong (2009).
Seguidamente, é apresentada, de forma breve, uma análise da estabilidade (equilíbrio)
baseada na análise da linha de pressões, não se abordando, neste trabalho, uma análise linear
sequencial, exemplo do método de resistência.
4.1.1 Análise da Linha de Pressões
O arco em alvenaria tem sido, ao longo deste estudo, compreendido recorrendo ao conceito
das linhas de pressões, que também é utilizado na análise seguinte num estado quase-estático
desta estrutura. Neste estado, os métodos de equilíbrio são uma escolha eficiente para o
estudo do comportamento da estrutura. Foi atrás referido que a linha de pressões permite
visualizar as forças existentes na estrutura, pois, quando a estrutura em alvenaria não contém
a linha na sua espessura, não suporta o carregamento aplicado e, consequentemente, não se
equilibra sem formar rótulas. Essas rótulas não conduzem necessariamente ao colapso da
estrutura, ocorrendo este apenas com a formação de 4 rótulas.
Na análise que realizou do comportamento de estruturas para um estado quase-estático,
DeJong (2009) simula a acção horizontal a que a estrutura está sujeita através de um ângulo
de inclinação na base desta, considerando, primeiramente a acção sobre um bloco de estrutura
simples e, depois, considerando um arco e as variantes geométricas deste. Os resultados a
que DeJong (2009) chegou com estas modelações foram alcançados recorrendo a um método
50
apresentado por Block e Ochsendorf (2007) que consistia em analisar a geometria do arco para
compreender a estabilidade da estrutura em alvenaria. Como neste método se recorre a um
programa gráfico paramétrico, é possível um ajuste da geometria em tempo real. Trata-se de
uma via vantajosa, pois possibilita a avaliação rápida de alterações de geometria no
comportamento da estrutura, bem como a obtenção de resultados qualitativos e visuais e a
identificação clara do mecanismo de colapso. Apesar de estes procedimentos não serem
suficiente para um estudo dinâmico rigoroso da estrutura, através deles é possível identificar
instabilidades na estrutura e, desta forma, avaliar a sua segurança.
DeJong (2009) debruça-se sobre a estabilidade de uma estrutura sujeita a uma aceleração que
representa a acção dinâmica aproximada ao estado estático começando com o paralelo
bloco/arco — que, como se verifica mais à frente, é um paralelo Housner (1941) /Oppenheim
(1992) — seguindo-se o arco com pé direito e finalmente o arco com pé direito e suporte
lateral. Nas análises de DeJong (2009), é utilizado o software Cabri Geometry II Plus.
O bloco de Housner
Na análise de estabilidade que DeJong (2009) realizou, a simulação do sismo é realizada
através da aplicação de uma força horizontal, fracção do peso da estrutura em magnitude
(equivalente a aplicar uma aceleração constante que é uma fracção da aceleração da
gravidade). Apesar deste carregamento ―equivalente‖ não traduzir na íntegra o processo
dinâmico, ele permite uma leitura do comportamento da estrutura e da sua capacidade de
resistência antes do colapso. Assim, uma simulação possível é conseguida com a inclinação da
base onde a estrutura assenta até que a linha de pressões toque a superfície exterior em 4
posições, formando o mecanismo e colapsando. Esta inclinação não equivale, exactamente, à
aplicação de apenas uma força horizontal, uma vez que existe uma parcela de força vertical.
Porém, como se considerou não haver esmagamento de elementos, as tensões são ignoradas
e a parcela vertical não se torna condicionante.
Housner (1941) considerou a estrutura bloco como ponto de partida para o estudo de
estruturas mais complexas, quer por entendê-la como uma estrutura simples, quer por
considerar que, através dela, é possível identificar, com alguma facilidade, o efeito da
inclinação na base que o sustenta, nas linhas de pressões. Constatou que, se existe
estabilidade sem qualquer acção aplicada, o bloco está somente sujeito à aceleração da
gravidade e, por isso, as linhas de pressões são verticais e têm a sua origem no centro de
massa e um sentido descendente. Procedeu, então, à inclinação do bloco, até se atingir o
ângulo de inclinação crítico αcr, e verificou que a linha de pressões, até este valor de ângulo,
vai permanecer no interior do bloco. Como consequência, há estabilidade até ser atingido o
valor de inclinação crítico, altura em que a linha de pressões sai do bloco através do vértice
que toca ainda a superfície. Esse ponto, localizado no vértice inferior direito do bloco,
corresponde à formação de uma rótula em torno da qual o bloco roda, resultando no seu
derrubamento. Nesse ponto, é possível relacionar o ângulo de inclinação com a aceleração
horizontal constante üg que provoca o colapso a uma estrutura não sujeita a inclinação.
51
O Arco de Oppenheim
Devido à simplicidade do bloco, como estrutura base, DeJong (2009) identifica facilmente a
linha de pressões e o seu comportamento, quando a estrutura é sujeita a inclinação. Todavia,
esta análise permite resultados mais interessantes quando aplicada ao estudo do arco, sendo
possível observar a dependência de comportamento entre os vários elementos geométricos da
estrutura. DeJong (2009), continuando os estudos de Oppenheim (1992) de um arco simples
sujeito a uma inclinação, compara os resultados destes com o arco com pé direito e com arcos
de suporte laterais
Considerando o arco padrão com sete aduelas, uma abertura de 157.5º, raio de 10 m e
espessura de 1.5 m, doravante designado por arco de Oppenheim, Oppenheim (1992) sujeita a
estrutura à inclinação, tal como Housner (1941) fez com o seu bloco. No estado de repouso da
estrutura, caso não exista qualquer inclinação, é possível encontrar, entre infinitas, uma linha
de pressões completamente integrada na espessura do arco em estudo, demonstrando que o
arco está estável. Quando o arco sofre uma primeira inclinação, altera-se o polígono funicular
e, consequentemente, a linha de pressões, que permanece no interior da estrutura, provando
que o arco continua estável. DeJong (2009) determina, através da análise do polígono, a
assimetria instalada provocada pela rotação das forças. Com o aumento do ângulo de
inclinação (até um máximo de 20.3º ou 0,37*g), o número de linhas de pressões vai sendo
cada vez menor, reduzindo-se a uma única onde é garantido o equilíbrio do arco (fig. 25). Esta
linha intersecta o exterior do arco em quatro pontos e, por isso, o colapso torna-se eminente,
formando o mecanismo já conhecido. O valor do ângulo de inclinação obtido é idêntico ao
calculado por Oppenheim (1992) (0,37*g é a aceleração horizontal mínima para estabelecer o
mecanismo).
Figura 25 - Análise da inclinação das linhas de pressões de um arco em alvenaria: (a) configuração inicial; (b) com inclinação mas estável; (c) Inclinação limite para o colapso; (d)
mecanismo de colapso. (DeJong, 2009)
Inclinação do Arco com Pé Direito
DeJong (2009) estuda as consequências da inclinação aplicada à estrutura como simulação de
uma aceleração horizontal considerando, desta vez, um arco com pé direito, ou seja, suportado
52
por paredes/colunas contínuas (a funcionar como um todo, pois interessa o comportamento do
arco e não o das colunas, que funcionam como suporte elevado).
Repetindo o processo mencionado anteriormente, DeJong (2009) procedeu à inclinação da
estrutura e, para compreender o efeito da altura e espessura das colunas no comportamento
do arco sujeito à inclinação, variou estes parâmetros. Partindo de uma geometria pré-definida,
comparou-a com a variação da espessura dos suportes para um pé direito fixo e vice-versa.
O mecanismo resultante é o típico constituído pelas quatro rótulas, já que a hiperstatia de
terceiro grau se mantém. A localização das rótulas não é, no entanto, a mesma: das quatro,
três rótulas formam-se no arco e a restante na base da coluna esquerda, e nelas o mecanismo
corresponde ao de uma linha de pressões mínima.
Para compreender a relação entre o comportamento do arco e a sua geometria, DeJong (2009)
fixa a altura do arco e varia a espessura das colunas, concluindo que o ângulo necessário para
formar o mecanismo de colapso decresce exponencialmente com o aumento do rácio pé
direito/espessura. Quanto mais fina for a coluna (altura/espessura < 1.5), mais fácil é ocorrer
inclinação e a amplitude do ângulo desta inclinação aproxima-se à do ângulo suportado pelo
arco simples.
Variando a altura do pé direito, verificou que a estabilidade aumenta com a diminuição da altura
da coluna, sendo que quanto menor a altura, mais a amplitude do ângulo se aproxima da do
arco simples.
Inclinação do Arco botante com apoio lateral
Apresenta-se de seguida a análise de DeJong (2009) sobre o arco com pé direito e suporte
lateral. Para tal, o autor baseia-se em duas estruturas que correspondem à geometria referida:
a da Basílica de Sta Maria Madalena, em Vezelay, França; e a da Igreja de S
to Patrocle em
Coulombier, França. A principal diferença da primeira relativamente à segunda prende-se com
o facto de os arcos laterais estarem abaixo do arco central sendo que, no caso da Igreja Sto
Patrocle, estes estão quase à mesma altura do arco central.
No estudo que realizou sobre a Basílica de Sta Maria Madalena (fig. 26), DeJong (2009)
sustenta que a aceleração horizontal resulta em três possíveis mecanismos. Um primeiro
corresponde ao caso em que os apoios laterais são muito esbeltos e nesse caso colapsam
sozinhos, com o arco a funcionar a um estado de pressão mínimo. Com o aumento da
espessura dos pés direitos, estes estabilizam o arco botante central e os colapsos do arco
lateral e central ocorrem simultaneamente. Finalmente, um terceiro mecanismo corresponde a
colunas de espessura elevada, mas com o arco de espessura fina nos apoios laterais. Neste
caso, o mecanismo dos arcos laterais corresponde a um estado limite máximo de tensão e o
arco central colapsa sob um estado de pressão mínimo. Nesta aproximação, este autor conclui
que os arcos laterais duplicam o valor do ângulo de inclinação suportado, mas, dada a reduzida
altura destes face ao arco central, são pouco eficazes a conferir estabilidade adicional à
estrutura original. Viollet-le-Duc (1860) propõe uma solução para aumentar a eficácia dos arcos
53
que é execução de um duplo arco nos arcos laterais.
Figura 26 – análise através da linha de pressões da Basílica de Sta
Maria Madalena, Vaseley. (DeJong, 2009)
Na Igreja de Sto Patrocle em Coulombier, onde os arcos laterais têm uma altura semelhante à
do arco central, resultam igualmente três mecanismos da aceleração que, contudo, diferem dos
do exemplo anterior. Quando as colunas dos arcos laterais são esbeltas, novamente ocorre o
colapso dos arcos. Aumentando a sua espessura, a resistência sofre, todavia, um aumento
significativo e o colapso ocorre para os três elementos com o arco lateral direito num estado
mínimo de tensão e os restantes em estados intermédios. Finalmente, para colunas dos arcos
laterais de elevada espessura, são os arcos novamente a causa do colapso, resultando,
igualmente, no colapso dos três arcos. O arco lateral esquerdo está em estado máximo de
tensão e o central e da direita em estado intermédio e mínimo de tensão, respectivamente.
Esta análise de estabilidade, apesar de apresentar o comportamento de estruturas quando
sujeitas a um estado quase-estático de forma simples, tem, no entanto, limitações, desde logo
porque está restrita a situações bi-dimensionais. Por outro lado, a aceleração horizontal
constante admitida é excessivamente conservativa, pois corresponde a uma duração muito
superior àquela manifestada pelos sismos. Além disso, a estrutura, quando sujeita a acções
finitas, pode conseguir recuperar a estabilidade devido à inércia, tornando a análise de DeJong
(2009) ainda mais conservativa. Uma outra limitação prende-se com uma das hipóteses
simplificativas considerada para esta análise. Na verdade, assume-se que não ocorre
esmagamento ou deslizamento de aduelas, o que, apesar de normalmente ser desfavorável
quando a estrutura está sujeita a um carregamento estático, não é válido, existindo estruturas
em que tal não se verifica devendo, nesses casos, ser valorizada a resistência da estrutura e
não a sua estabilidade.
54
4.2 Análise dinâmica pelas equações de movimento
Depois de uma análise do comportamento do bloco, e do caso mais complexo do arco numa
abordagem quase-estática, pretende-se agora compreender o comportamento destas
estruturas, num estado dinâmico. Nesta fase, DeJong (2009) sustenta-se primeiramente em
análises teóricas para, numa fase seguinte, as provar recorrendo a uma análise experimental.
Assim, DeJong (2009) compara os modelos analíticos das estruturas bloco versus arco, desta
vez sob o efeito de acções dinâmicas.
No estudo de Housner (1941), são inicialmente consideradas estruturas oscilantes, dando
particular atenção à mais simplificada: o bloco. No seguimento do estudo de Housner (1941),
Oppenheim (1992) incide no comportamento do arco, comparando as conclusões a que ambos
chegaram. DeJong (2009) partindo das investigações anteriores, desenvolve as suas teorias,
considerando o conhecimento da linha de pressões. É assim apresentado o estudo de Housner
(1941) debruçado no bloco para de seguida se abordar o estudo de Oppenheim (1992) sobre o
arco.
4.2.1 O Bloco (Housner)
O conhecimento dos efeitos da acção horizontal do arco provocada pelos sismos permanece
uma questão de elevada complexidade, quer pela dificuldade de previsão destes, quer pelo
facto das estruturas não apresentarem uma resposta idêntica, diferindo os monumentos, das
torres, das estátuas, das pontes e dos arcos abordados nesta dissertação. Considerando
Housner (1941), o impulso primário da acção sísmica como o predominante da acção, os seus
objectivos são, por um lado, avaliar a vulnerabilidade de estruturas oscilantes face a diferentes
perturbações/pulsações e, por outro, analisar a possibilidade de queda da estrutura devido à
existência de impulsos múltiplos mesmo que de amplitude menor que a necessária para
provocar o colapso. Housner (1941) defende verificar-se um aumento do período natural da
estrutura com a inclinação, ou seja, com o aumento do ângulo de oscilação exercido sobre a
estrutura.
Partindo do estudo de Housner (1941), DeJong (2009) dispõe-se a clarificar a diferença entre
uma estrutura oscilante e uma estrutura elástica, para assim responder à questão da
vulnerabilidade das estruturas. Para tal é necessário abordar o problema através da
quantificação da energia no sistema quando este é sujeito a uma aceleração ao nível do solo.
A análise da resposta do bloco, quando sujeito a uma energia maximizada, clarifica a diferença
entre estruturas oscilantes e as tipicamente elásticas. Às primeiras, por não terem uma
frequência natural fixa, não pode ser imposta a uma frequência única que resulte em
ressonância e resposta amplificada. Como é possível observar na fig. 27, a ressonância
provocada pela oscilação é descrita por uma acção sinusoidal de período crescente. Assim, as
estruturas oscilantes podem ser excluídas quando se pesquisam estruturas vulneráveis a
acções sísmicas.
55
Figura 27 – Aceleração mínima para o despoletar do mecanismo do bloco. (DeJong, 2009)
Partindo do pressuposto que o bloco não parte do repouso total, dado que na realidade nem a
geometria é perfeita, nem a base onde este assenta é totalmente rígida, quanto maior for a
energia inicial, maior vai ser a quantidade de energia a dissipar e menor o valor da aceleração
que provoca o colapso. Sem se admitirem estas condições extremas, para um bloco de
esbelteza e energia inicial reduzidas, a aceleração que provoca o colapso é de 0,5*g, ou seja,
uma aceleração com metade do valor típico admitido para o início da oscilação.
Relativamente ao problema dos impulsos sinusoidais múltiplos, o tipo de actuação destes na
resposta da estrutura, nomeadamente se aqueles têm uma participação favorável ou
desfavorável, depende da relação entre a duração desse impulso, o período natural da
estrutura e o momento em que o impulso é aplicado. Quando o período do impulso a aplicar
está muito abaixo do período natural Tn/4, existe uma probabilidade de 50% de esse impulso
adicionar, ou retirar, energia ao sistema e o momento em que este interfere com a oscilação do
mecanismo é um condicionante. Para períodos mais longos, estes impulsos passam a ter
maioritariamente uma participação desfavorável, adicionando energia ao sistema, qualquer que
seja o ponto de interferência do impulso com a oscilação do bloco. Quanto maior o período do
impulso, maior o incremento de energia. Se, por outro lado, o período da estrutura aumentar
relativamente ao do impulso, então este passa a reduzir a energia existente no sistema.
Conclui DeJong (2009) que a resposta das estruturas, nomeadamente no caso de existirem
múltiplos impulsos, depende muito do espaçamento e duração de cada impulso, tornando
muito difícil a previsão exacta do seu comportamento. Este autor sugere então uma abordagem
probabilística para definir uma expressão genérica de representação da acção sísmica quando
aplicada ao bloco e ao arco.
Para encontrar a expressão que traduzisse os efeitos da acção sísmica, Sokolov (2002) estuda
cerca de 1150 diferentes terramotos e define o espectro das frequências para cada intensidade
sísmica (MMI). Partindo desta investigação, e admitindo que ao aumentar a intensidade do
sismo a energia associada a baixas frequências se reduz, considera ser possível conhecer a
aceleração da acção sísmica a partir da intensidade do sismo, através de:
56
(4.1)
em que Δω é frequência do ciclo, A representa a amplitude do espectro, ω a frequência e φ o
ângulo de fase correspondente do sismo.
Resta referir que para a geração da acção sísmica se assumiu um ângulo de fase
uniformemente distribuída e uma duração específica do sismo td. A expressão determinada por
Sokolov (2002) não é a única forma de obter uma representação da acção sísmica,
destacando-se, entre outros, os métodos de Gasparini e Vanmarcke (1976) e Hou (1968).
Conclui-se assim que na análise de uma estrutura (bloco ou, como é visto mais à frente, arco)
não são relevantes os valores da frequência, contrariamente aos valores dos impulsos, sejam
eles únicos ou múltiplos. Também, para este tipo de estrutura (arco), se prova serem de pouca
importância os valores da frequência, contrariamente aos valores dos impulsos, sejam eles
únicos ou múltiplos.
4.2.2 Arco de Oppenheim
Embora muitos e extensos estudos tenham sido realizados em torno do comportamento do
arco e dos seus métodos de dimensionamento e análise de estabilidade, até ao final do século
XX era limitado o conhecimento da resposta deste a acções sísmicas e, consequentemente, o
domínio dos métodos para o seu dimensionamento e da sua estabilidade.
Apesar de ser frequente o colapso de estruturas provocadas pelos movimentos
desencadeados pelo sismo, em muitas tal não acontece. Em algumas destas, são visíveis
sinais do fenómeno sísmico, tais como deslocações na alvenaria e fendilhação. Em outras,
acontecem danos parciais, mas, mesmo assim, continuam de pé. Oppenheim (1992) apresenta
um método de estudo para um arco tipificado, baseado na dinâmica de um mecanismo rígido
prismático. A resposta cinemática deste mecanismo é obtida através da derivação não linear
da equação de movimento.
Figura 28 – Mecanismo de colapso do arco de Oppenheim (Oppenheim, 1992)
57
A força aplicada nos estudos de Oppenheim (1992) para simular a acção dinâmica consiste
numa aceleração horizontal ao nível do solo g. Quando sujeito a uma força, este arco vai
responder formando um mecanismo constituído pelas rótulas ABCD (fig. 28). Este existe
apenas numa direcção pois, se esta for invertida, a resposta é outro mecanismo cinemático.
Para o mecanismo de rótulas ABCD obtêm-se três rotações possíveis θab, θbc e θcd. Estas
três rotações existentes não são independentes, pois o mecanismo tem apenas um grau de
liberdade, θab, por defeito. Para encontrar a resposta cinemática, Oppenheim (1992) procede à
derivação da equação de movimento, utilizando o princípio de Hamilton e a equação de
Lagrange. No presente caso, em que o mecanismo em estudo ABCD é um sistema de um só
grau de liberdade, a equação obtém-se com:
(4.2)
(4.3)
sendo T a energia cinética do sistema, V a sua energia potencial e Q a função geral das forças
aplicadas.
A energia cinética do sistema depende, neste caso, somente das velocidade da rotação do
corpo rígido e a energia potencial está associada apenas à acção gravítica, Q está relacionado
com θ e exprime a variação de trabalhão não conservativo executado sob a variação de θ.
Determinada a expressão cinemática do mecanismo do arco de Oppenheim sujeito a uma
acção dinâmica, Oppenheim (1992) analisa o mecanismo de colapso. Interessa, no seu estudo,
considerar a aceleração horizontal mínima que o despoleta, sendo que, abaixo desse valor
mínimo, o arco comporta-se como um corpo rígido. É um valor que define o limite entre acções
desprezáveis e aquelas que podem provocar colapso. Além disso, admitindo a existência de
vários mecanismos possíveis, o ―verdadeiro‖ é aquele que resulta da mínima aceleração. Este
autor posiciona as rótulas, no seu arco tipo, em -7, -1, 3 e 7, obtendo o mecanismo ―real‖ para
uma força mínima de 0.370*g. Este será explorado com maior detalhe no capítulo 6.
Considerando este mecanismo, Oppenheim (1992) varia parâmetros geométricos do arco em
busca da relação entre estes e o mecanismo resultante do arco, quando sujeito a acção.
Assim, admitindo o rácio t/a para representar a variação da espessura do arco, Oppenheim
(1992) conclui que, com o aumento da espessura, também a aceleração mínima que inicia o
mecanismo de colapso cresce. Se se considerar o ângulo de abertura do arco, o aumento da
sua amplitude vai, por sua vez, reduzir a aceleração mínima que despoleta o mecanismo. Ao
comparar um arco de abertura típica (157.5º) com um arco semi-circular de 180º, Oppenheim
(1992) obtém para este último arco valores de acelerações que, apesar de também
aumentarem com a variação t/a, estão muito abaixo dos resultados obtidos para o arco de
abertura padrão. Como já tinha sido visível na análise dos mecanismos de colapso
apresentada no capítulo anterior, o arco semi-circular quando sujeito ao seu peso próprio torna-
se tão instável que, para determinada relação espessura/raio (t/a=0.106), a aceleração se
aproxima do zero, sendo quase desnecessária uma acção para destabilizar a estrutura.
58
O autor varia, de seguida, o número de aduelas, considerando no seu arco base 7 blocos
iguais que corresponde, cada um, a 22.5º do arco e verifica que, como seria previsível, o
número de aduelas vai determinar, inversamente, o valor mínimo da aceleração. Essa
alteração vai funcionar como uma melhor discretização — quanto mais fina a malha, mais se
aproxima a aceleração do seu valor real.
Oppenheim (1992) compara os resultados para o seu arco rígido com os obtidos com material
não totalmente rígido (poliestireno expandido), demonstrando que é possível uma modelação
rígida. No primeiro caso, as rótulas formam-se sempre ou no interior ou exterior da espessura
e, no segundo, passam a localizar-se no interior desta. Verifica-se que a espessura efectiva é
menor que a definida para arcos rígidos, resultando numa aceleração horizontal inferior. Assim,
deve realizar-se uma verificação adicional, caso se modele um arco rígido.
Na experimentação do modelo do arco, este é frequentemente forçado a colapsar num único
ciclo de resposta para evitar confusão ou incertezas quanto ao comportamento do arco a longo
prazo (pode pensar-se que não existirá colapso, por não se ter atingido o tempo necessário
para que este ocorra). Esta hipótese de colapso após um único ciclo é realista, pois, dada a
amplitude das forças do fenómeno sísmico, este poderia produzir uma resposta dominante de
um único ciclo.
Nos estudos do bloco de Housner (1941), anteriormente referidos, este encontra um efeito da
escala que também acontece no caso do arco. Com o aumento do raio a, a aceleração do solo
necessária ao colapso tem também de aumentar com a raiz quadrada do raio, e, por
consequência o arco maior é mais resistente a acelerações do solo.
Sujeitando o arco a diversos impulsos de igual magnitude mas duração distinta, DeJong (2009)
conclui que, para uma mesma amplitude de acções, aquelas de impulso com menor duração
que permitem à estrutura recuperar a sua estabilidade, apesar de para tal esta sofrer múltiplas
oscilações. Resta agora saber entre que valores é possível uma previsão do comportamento
do arco, quais os que garantidamente conduzem a estrutura ao colapso e quais os que, à
partida, permitem à estrutura recuperar o seu estado inicial. Para tal, DeJong (2009) analisa os
domínios de colapso, considerando quatro possíveis respostas ao impulso aplicado (fig. 29).
Quando o impulso tem longa duração e magnitude, o seu colapso acontece, como já se referiu,
na primeira metade do ciclo e esta região de colapso toma o nome ―Modo II de colapso‖. Para
impulsos menores, o arco falha na segunda metade do ciclo e essa região denomina-se ―Modo
I de colapso‖. Para impulsos ainda mais reduzidos, o arco oscila sem nunca colapsar até
restabelecer a sua posição original. A esta região dá-se o nome de ―Recuperação‖. Para
impulsos de magnitude menor que ϒ, o mecanismo não chega sequer a iniciar-se e a região
correspondente chama-se ―Não rotulada‖.
Estendendo esta análise para outros tipos de impulso tais como ciclos de aceleração
sinusoidal, DeJong (2009) conclui que, mesmo alterando o tipo de acção dinâmica, o Modo I
continua o condicionante.
59
Figura 29 - Modelo analítico da previsão de possíveis respostas, do arco em alvenaria, a impulsos de duração tp e magnitude ap. (Dejong, 2009)
Como o presente trabalho se centra na utilização da linha de pressões para compreender o
comportamento da estrutura (arco ou bloco neste caso), também para acções do tipo
dinâmicas, DeJong (2009) utiliza linhas de pressões apesar de diferentes daquelas definidas
em modo estático. Numa análise estática, é possível conhecer a posição da linha de pressões,
admitindo as reacções de suporte e as forças de compressão internas. Durante a acção
dinâmica, pode aplicar-se o conceito de linhas de pressões, considerando, a cada instante, as
forças de inércia e momentos a actuar nos troços individuais do arco, além do peso próprio. No
caso da linha de pressões dinâmica, esta deve ser calculada para a configuração deformada
do arco, dado as suas deslocações não serem desprezáveis. Com este novo conceito, existe a
vantagem de ser possível conhecer o estado instantâneo da estabilidade do arco. Pode
inclusivamente confirmar-se assim o posicionamento das rótulas assumido no modelo analítico.
Estas foram consideradas fixas durante o movimento, excepto quando ocorre o impacto e estas
mudam simetricamente a sua posição. Porém, é visível na análise de DeJong (2009) que a
linha de pressões sai da espessura do arco, provocando a formação de uma rótula, em
localizações que não tinham sido as admitidas anteriormente. Esta flexibilidade da localização
das rótulas já era previsível, dado que o arco não é, na realidade, igual ao previsto
teoricamente.
Este autor sujeita um arco padrão à acção harmónica e este começa por responder como um
corpo rígido, cuja base revela pouca vibração e sem formação de rótulas. Seguidamente, ao
aumentar a amplitude do sismo, o arco oscila para frente e para trás, formando-se rótulas, mas
não se completa o mecanismo que o leva ao colapso. Por fim, continuando a aumentar a
amplitude, verifica a formação de um mecanismo de quatro rótulas, como previsto no modelo
analítico, em que há uma reflexão aproximada das rótulas. Todavia, a simetria das rótulas não
é perfeita e a transição entre mecanismos não se dá com um único impacto. Assim, a reflexão
torna-se mais uma migração fluente das rótulas e não uma inversão das suas posições, como
tinha previsto teoricamente, mais uma vez demonstrando a flexibilidade do modelo real por
60
oposição à sua ―rigidez‖ teórica. Nesta simulação não foi observado deslizamento confirmando-
se a análise da linha dinâmica de pressões.
Ao comparar a modelação analítica com os resultados obtidos na análise experimental, existem
três condições na primeira análise que poderão ser limitadoras e que serão problematizadas na
análise experimental do comportamento do arco: A primeira prende-se com a localização fixa
da formação das rótulas; A segunda condição definida no modelo analítico relaciona-se com o
facto de os blocos constituintes do arco serem rígidos e, como tal, não permitirem deformação
elástica, ou seja, a ressonância não é possível na modelação. No modelo à escala reduzida,
esta simplificação é possível, pois não ocorrem deformações significativas do material e a
frequência de ressonância elástica encontra-se muito acima da frequência da acção do sismo.
Como, no entanto, existe dependência da escala, a estrutura de maior escala pode ser
conduzida ao colapso pelas acções que também são mais elevadas. A ressonância fica assim
reduzida e pode ser alcançada pela estrutura. Todavia, mesmo que esta situação ocorra, a
ressonância não amplifica a resposta da estrutura até ao colapso. O efeito da ressonância
traduz-se na formação de rótulas a uma aceleração menor que a mínima previsível e, ao
formar as rótulas iniciais, a estrutura altera a sua estatia e, consequentemente, a sua
frequência, deixando a ressonância de ter um papel condicionante na resposta da estrutura:
Finalmente, a terceira e última condição considera que os suportes perfeitamente rígidos do
arco não sofrem qualquer deformação que possa provocar a redução da estabilidade do arco.
Esta condição permanece ainda como hipótese.
Depois de verificar experimentalmente o mecanismo de quatro rótulas definido teoricamente,
DeJong (2009) sujeita dois arcos de geometria semelhante não a uma aceleração padrão, mas
a 5 diferentes espectros de sismos escolhidos pelas suas distintas frequências e amplitudes
máximas: o de Prakfield, em 1966; o de El Centro, em 1940; o de GoldenGate, em 1957; o de
Northridge, em 1994; e o de Helena, em 1935.
Os resultados previstos por Oppenheim (1992) foram confirmados nos modelos experimentais.
Formaram-se diversos mecanismos de quatro rótulas com localizações que se aproximavam do
previsto analiticamente, mas como atrás referenciado, a transição entre mecanismos não
ocorria de forma descontínua, mas fluentemente através de vários e não um só mecanismo.
Surgiram novas rótulas e mecanismos diferentes dos que teoricamente eram previsíveis,
principalmente para uma estrutura sujeita a impulsos adicionais desfasados do balanço da
estrutura. Ocorreu colapso provocado pelas rótulas e o balanço do mecanismo, mas o
deslizamento de blocos foi raro, surgindo ocasionalmente nos suportes dos arcos nos
momentos de impacto que podem implicar redução da estabilidade.
Quando os arcos foram sujeitos aos múltiplos sismos, o colapso revelou ser dependente da
amplitude e período do impulso primário e independente da ressonância elástica, uma vez que
a frequência natural do primeiro modo de ambos os arcos é superior a 300 Hz.
Nos vários sismos, os arcos comportaram-se da forma prevista ocorrendo no entanto, no caso
do terramoto de Parkfield, vários picos antes do impulso primário. Este revelou um balanço
61
caótico do arco antes do colapso, que ocorreu através de um mecanismo de quatro rótulas e
sem deslizamento. No modelo de Northridge, o sismo aplicado ao arco número 2 é o único não
controlado de forma conservativa. Uma das explicações avançadas passa pelo pico elevado
visível logo a seguir ao que corresponde ao impulso primário. Este segundo impulso, que
acontece no segundo meio ciclo de resposta ao impulso primário, amplifica a resposta e o
colapso ocorre com uma aceleração inferior que previsto (fig. 30).
Figura 30 – Comparação entre os resultados obtidos na aplicação dos sismos e o modelo analítico (DeJong, 2009)
Esse efeito de impulsos múltiplos, e a consequência destes na resposta da estrutura, foi
abordado na análise da estrutura quando sujeita a uma força harmónica.
A acção harmónica simulada surge mais associada à série de impulsos pouco espaçados e
menos ao carregamento contínuo harmónico. O período desses impulsos diminui com o
aumento da amplitude da aceleração, resultando num caminho de forças representado na fig.
31.
Analisando o gráfico, DeJong (2009) conclui que a resposta do arco está condicionada pela
frequência, da seguinte forma:
62
Para baixas frequências (aproximadamente 2 Hz), o modelo analítico aproxima-se do
modelo experimental, mas a existência dos múltiplos impulsos baixa a amplitude de
aceleração correspondente ao colapso do arco. Os resultados do arco quando sujeito a
estas baixas frequências localizam-se abaixo do mínimo valor para o qual ocorre o
colapso no modelo analítico, mas, se observadas as respostas a outros impulsos que
não o primário, então estes podem ultrapassar esse valor mínimo
No caso das frequências intermédias (6 Hz), o modelo analítico subestima a estabilidade
do arco considerando que o arco pode ser mais resistente a impulsos vários do que a
um único. O que acontece neste caso é semelhante ao relatado na análise sísmica de
Northridge em que um impulso secundário interrompe a formação do mecanismo
formando mais rótulas e outros mecanismos. Apesar de se imaginar esta resposta como
desfavorável, neste caso em que a frequência é elevada, os vários impulsos surgem
como estabilizadores. O que acontece é que quando a estrutura sofre um impulso há a
formação de rótulas e há separação de blocos, resultando num impacto imediato que
dissipa a energia. Estando os impactos pouco espaçados nesta análise, e como a sua
magnitude vai progressivamente aumentando, a inércia necessária para a formação de
um balançar que resulta no colapso só é gerada para maiores acelerações. Este
fenómeno é ignorado no modelo analítico que assume o arco como perfeitamente
intacto quando ocorre o impulso primário e a energia é somente dissipada quando no
impacto há a reflexão das rótulas.
Finalmente, a frequências altas (> 8 Hz), o colapso do arco não é provocado pelas
rótulas e pelo balançar da estrutura, mas devido a deslocamentos entre blocos
provocados por vibrações. Para estas frequências tão elevadas, não há impulso que
forme um mecanismo rotulado mas o arco sofre vibrações que o desmontam. Essa
ausência de colapso devido ao mecanismo foi abordada no modelo analítico.
Figura 31 – Modelo analítico e caminhos de forças. (DeJong, 2009)
DeJong (2009) defende ser possível uma calibração do modelo analítico, definindo uma
equação passível de aplicar a um caso geral que preveja o colapso sendo assim possível a
63
análise simples da estabilidade. Esta equação permite obter curvas de colapso variando os
parâmetros que se pretender. Estas foram desenvolvidas admitindo uma repetição de um
intervalo de acelerações e períodos de impulsos aplicados ao modelo analítico. De entre as
várias hipóteses de curvas, a que se verificou mais acertada corresponde à próxima da
aceleração mínima, medida experimentalmente, necessária para o colapso
Com o principal objectivo de permitir uma maior flexibilidade do modelo, dependente de t/R e β,
a curva foi reformulada para uma escala geral com Ra=1 m (aplicável facilmente qualquer outra
escala) com a forma:
(4.4)
Em que Ra é o raio do arco medido em metros, Tp em segundos e C1, C2 e Tmin os
coeficientes a definir, dependentes apenas da relação ta/Ra e βa.
A partir da expressão da curva de colapso, é possível verificar a estabilidade de um arco
parcialmente circular, através dos seguintes procedimentos: adapta-se a geometria do arco;
reduz-se a sua espessura para 80% para contemplar imperfeições geométricas (recomenda-se
uma redução superior para arcos muito deformados); definem-se os coeficientes através da
tabela 1 que adaptam o modelo à estrutura em estudo e aplica-se a expressão da curva de
colapso. Como se considerou como condicionante a acção do impulso primário, é este o valor
da acção a que a estrutura está sujeita, comparando-se o seu valor com aquele obtido pela
curva. O colapso ocorre quando o impulso primário se encontra acima desta.
Tabela 1 - Coeficientes C1, C2, Tmin e ϒ(DeJong, 2009)
Devem ser, todavia, consideradas algumas limitações na utilização desta curva. A aplicação
desta curva para a análise da estabilidade do arco é problemática devido à dificuldade de
previsão do efeito de escala relativamente às forças. Estas, majoradas devido ao efeito de
64
escala, podem provocar o colapso não previsto anteriormente.
A ocorrência de impactos perto do colapso, não considerados, pode resultar numa redução da
estabilidade do arco, devido a danos na sua estrutura, ou a um aumento daquela devido a
dissipação de mais energia. Também, o valor do impulso primário é mais adequado quando se
trata de um sismo de epicentro próximo, sendo, nesse caso, caracterizado pela sua aceleração
primária. Não é, todavia, garantido que o impulso primário seja o impulso condicionante em
todo o tipo de sismos, particularmente quando ocorrem vários impulsos próximos causando
uma possível amplificação da resposta, como observado no sismo de Northridge. Além disso,
nesta análise experimental, para frequências elevadas, o problema não reside no mecanismo e
no seu balançar, ocorrendo o colapso devido a vibrações da estrutura. Assim, para essa ordem
de frequências (~8 Hz), deve ser controlados os deslocamentos devidos à vibração.
Finalmente, a curva de colapso não inclui os suportes do arco na sua análise de estabilidade,
quando é claro que estes podem reduzir significativamente a estabilidade do arco quando
muito deformáveis.
4.3 Síntese
Nas relevantes pesquisas de Oppenheim (1992) sobre o comportamento do arco quando
sujeito a uma acção na sua base, sustentadas nos estudos de Housner (1941) que foram
determinantes para o conhecimento da resposta de um bloco a uma análise dinâmica, são
apresentados as equações ―governantes‖ de um bloco oscilante, as condições para o
despoletar da sua reacção, a existência de uma perda mínima de energia no impacto e um
efeito de escala. Outros autores abordaram a resposta de uma estrutura a uma acção sísmica
recorrendo a uma modelação cinemática de prismas rígidos. Os pórticos eram simulados como
um mecanismo de quatro rótulas e é nesta simulação que assenta o estudo do arco de
Oppenheim (1992).
Este autor, admitindo um arco padrão, considera a resposta de um arco quando submetido a
uma força na sua base como um mecanismo de quatro rótulas, possível de representar através
de rotações de cada uma delas, que são dependentes, uma vez que é assumido um
mecanismo de um só grau de liberdade. A resposta cinemática é determinada a partir da
derivação da equação de movimento do mecanismo, recorrendo ao princípio de Hamilton e
equação de Lagrange. A partir daí, o estudo do despoletar do mecanismo do arco e as suas
possíveis influências, bem como as condições de colapso são estudadas (Oppenheim, 1992).
Através de estudos sobre a estabilidade do arco, num estado quase-estático, para os arcos
com pé direito e arcos com pé direito e arcobotantes laterais verificou-se que a estabilidade do
arco é dependente da espessura do próprio arco, da espessura da coluna que o suporta e da
sua altura: quanto menor altura ou maior espessura da coluna, maior estabilidade o arco possui
e maior é o ângulo de oscilação que suporta (Oppenheim, 1992; DeJong, 2009).
No entanto, verifica-se que, a partir de determinados valores, o esmagamento, não
considerado no modelo analítico, pode ocorrer, sendo que os arcobotantes laterais têm um
65
efeito positivo na estabilidade, dependendo, no entanto, da sua altura face à do arco central
(DeJong, 2009).
Os estudos confirmam que parece haver vantagens em conhecer-se o nível mínimo de
aceleração que despoleta o mecanismo de colapso, podendo esta ser utilizada como margem
de segurança. Através da análise do ângulo de rotação (expresso em termos de energia
potencial) que leva o mecanismo ao ponto de não retorno em termos de equilíbrio, verifica-se
que apesar de o arco resistir ao despoletar do mecanismo no caso de uma aceleração
horizontal, o mesmo não se passa numa análise quase-estática, em que não é capaz de
absorver a energia que impõe o seu mecanismo (φ=0.07 rad ou θ=0.8272 rad) (Oppenheim,
1992).
Se tivermos em conta a curva limite que separa o colapso da restituição do equilíbrio elaborada
por Oppenheim (1992) e retomada e acrescentada por DeJong (2009), relativamente à
resposta do arco à aceleração, que depende da duração do impulso e da magnitude do sismo,
podem verificar-se as seguintes situações: 1) Para impulsos de longa duração e elevada
magnitude, a resposta do arco corresponde ao Modo II de colapso, curva já apresentada por
Oppenheim (1992) em que o colapso surge na primeira metade do ciclo; 2) No caso de
impulsos de menor duração, o colapso ocorre na segunda metade do ciclo associada a um
Modo I de colapso; 3) Quando a duração do impulso é reduzida de modo a que o colapso não
aconteça, existindo apenas a oscilação do arco, a resposta pertence à região denominada
Recuperação; 4) Finalmente, o quarto domínio corresponde a impulsos inferiores à aceleração
mínima que resultam na Ausência de Rótulas (DeJong, 2009).
5. Método dos Elementos Discretos
O modelo e o método são conceitos distintos. Rouxinol (2007) define modelo como o conjunto
de hipóteses necessárias para representar o sistema físico, tanto a nível global como particular.
O método é a via utilizada para analisar o modelo específico previamente definido para
determinada estrutura. Dos vários tipos de métodos, destacam-se os algébricos, para
problemas simples, gráficos, reproduções à escala em laboratório e métodos numéricos, de
que são exemplos as diferenças finitas, elementos finitos e elementos discretos.
Nos dias de hoje, entre os métodos numéricos para a análise de estruturas, o Discrete Element
Modeling (DEM) concorre com o Finite Element Modeling (FEM) que, sendo o mais utilizado na
área da modelação, é particularmente adequado para problemas de elasticidade e resistência,
mas não de estabilidade (Dejong, 2009). Por sua vez, o DEM, possuindo um enorme potencial
no estudo do colapso de estruturas em alvenaria associado à instabilidade (Dejong, 2009), é
especialmente apropriado para problemas que envolvam a existência de deformações de
estruturas de valor significativo provocadas pelo movimento relativo entre corpos distintos. No
66
presente caso, tratando-se de um material de características descontínuas, a alvenaria, os
resultados atingidos através do algoritmo DEM são claramente preferenciais aos obtidos pelo
método FEM cujo desenvolvimento lhe trouxe ganhos relativamente à simplicidade da sua
interface, à capacidade de interacção com outros programas de modelação e à facilidade de
simulação, que se tornou mais intuitiva.
No caso da modelação discreta, o DEM é de utilização preferencial, pois, possibilitando a
captação da natureza descontínua do material da estrutura, permite igualmente analisar os
deslocamentos finitos e rotações em cada corpo, bem como reconhecer a formação de novos
contactos e o desaparecimento de outros ao longo do processo analítico. Para tal, é necessário
definir as propriedades dos elementos e seus contactos, estando a qualidade da modelação
directamente dependente da correcta enunciação dessas propriedades.
Neste capítulo, apresenta-se o método numérico DEM que é o utilizado no presente estudo
para a realização de uma análise de três modelos do arco: o arco de Oppenheim (fazendo
variar o ângulo de abertura); o de um semelhante ao referido mas em que se considera a
massa e peso próprio do enchimento do extradorso nas suas aduelas; e, finalmente, um
terceiro modelo em que se representa o enchimento com elementos discretos. Assim, o
capítulo começa com uma apresentação breve do método DEM, focando o seu algoritmo
UDEC para, seguidamente, enunciar os parâmetros a ter em conta na calibração do modelo e
explicitar as implicações das opções relativas a cada um dos parâmetros na análise a realizar,
procurando, resumidamente, e, ao longo do texto, evidenciar as principais vantagens da
utilização desta aplicação do DEM.
5.1 Aspectos gerais do UDEC
Os arcos de pedra são constituídos por elementos — aduelas — distintos unidos por interfaces
preenchidas, ou não, por cimentos. São, por isso, estruturas descontínuas e é nas zonas de
descontinuidade, nas juntas, que se situa a maior fraqueza da estrutura uma vez que existe a
possibilidade de deslizamento de blocos adjacentes provocado por forças tangenciais ou a
abertura de juntas provocada pela fissuração.
É assim que surge, nas últimas décadas, o conceito de elementos discretos, definido como o
conjunto de modelos capazes de representar o comportamento mecânico de sistemas
constituídos por múltiplos elementos, sejam estes corpos, blocos ou partículas. A partir desta
conceptualização, verificou-se um avanço significativo no conhecimento do comportamento das
estruturas em geral e do arco em particular, assim como ganhos consideráveis em exactidão,
facilidade e rapidez na sua análise.
Citando Cundall et al. (1992), Rouxinol define o DEM como um método numérico através do
qual podem ser reproduzidos deslocamentos e rotações finitos dos elementos, incluindo a
separação total entre os elementos, assim como podem automaticamente ser reconhecidos
novos contactos ao longo do processo de cálculo.
Limitando as propriedades da alvenaria à sua descontinuidade, com o DEM é possível obter a
67
representação das características mecânicas da alvenaria, considerando-as em cada bloco
separadamente, bem como entre si, no seu conjunto. Para tal, o DEM assume as juntas entre
os elementos discretos como superfícies de contacto entre corpos distintos (Lemos, 2007).
O método DEM, inicialmente desenvolvido para a mecânica das rochas, estendeu a sua área
de utilização ao solo, alvenaria e betão, sendo hoje a sua aplicabilidade ainda mais ampla
devido existência de várias formulações e aplicações. Entre as suas várias utilizações,
destaca-se a análise do colapso estrutural em estudos de verificação de segurança, sendo hoje
possível modelar uma estrutura, tanto num estado estático como, em casos mais complexos,
em estado quase-estático e dinâmico (Lemos, 2007).
Depois de versões iniciais pouco elaboradas, nos anos sessenta, em que as rochas eram
caracterizadas como um conjunto de blocos rígidos, Cundall propõe a utilização do DEM na
sua modelação numérica.
Através desta abordagem, um material, ou sistema discreto, pode ser tratado como um
conjunto de elementos distintos individuais, nos quais se impõe um equilíbrio dinâmico entre a
gravidade e inércia e as forças de contacto que representam a interacção entre elementos.
Neste processo, recorre-se às equações de movimento dos elementos discretos, que são
integradas no tempo, considerando-se grandes deslocamentos através da actualização
sequencial da posição desses elementos, e discretizando-as para cada elemento. O
movimento é simulado, em dois momentos: o deslocamento de cada elemento, imposto através
da segunda lei de Newton; e a actualização das forças de contacto para esses deslocamentos
dos elementos vizinhos.
Os elementos discretos são simulados através de blocos rígidos que interagem entre si através
dos seus contactos, cujos parâmetros a definir são a rigidez e o atrito. As forças que surgem
nos pontos de contacto são calculadas de forma simplificada assumindo uma lei elástica linear
cujas forças tangenciais estão limitadas pela lei de atrito de Coulomb (Calvetti et Roberti,
1998).
Este método pode utilizar-se, tanto no caso de estados estáticos, como dinâmicos. Na verdade,
através do DEM, são possíveis análises estáticas recorrendo a um amortecimento viscoso
(Lemos, 2007), bem como alargar a utilização do método a campos da engenharia tais como os
modelos micro-mecânicos dos solos e outros meios granulares (Rouxinol, 2007).
Gago (2004) considera que no estudo do modelo se devem distinguir um meio descontínuo de
um contínuo, prevendo a existência de contactos e interfaces entre os corpos discretos que
constituem a estrutura.
Sincraian (2001) define, assim, que os aspectos prioritários para uma modelação estrutural de
um meio descontínuo são o comportamento mecânico das descontinuidades, o dos corpos
discretos e o esquema utilizado para detecção de contactos.
As vertentes essenciais para qualquer modelação usando o DEM prendem-se com aspectos
relacionados com o material sólido, associado ao comportamento mecânico dos corpos
68
discretos e das descontinuidades, com a interacção entre ambos, com o esquema usado para
detectar e actualizar o conjunto de contactos e com um algoritmo de cálculo eficiente (Gago,
2004; Sincraian, 2001).
5.2 Comportamento Mecânico dos Blocos
O UDEC (Universal Distinct Element Code) é uma aplicação capaz de modelar vários tipos de
sistemas de juntas, desde a assemblagem de blocos discretos até a um maciço constituído por
famílias de fracturas (Lemos, 2007).
Na simulação UDEC, os elementos discretos constituintes do modelo podem considerar-se
como elementos rígidos ou deformáveis. No primeiro caso, a geometria dos elementos é
inalterável. A opção de os modelar como rígidos é acertada, sempre que seja possível
desprezar a sua deformação relativamente à da interface, isto é, quando o material sólido do
elemento discreto possui elevada resistência e baixa deformabilidade comparativamente com o
material da junta e, ainda, quando a avaliação do nível das tensões nos blocos discretos não é
relevante. Neste caso, a grande parte da deformação do sistema é representada por
movimentos (abertura e fecho) das descontinuidades nas descontinuidades, ou seja, a
deformação é concentrada nas interfaces, consistindo em deslizamentos e rotações relativas
dos elementos (Rouxinol, 2007),
Embora a opção de tratar os elementos discretos como rígidos seja satisfatória e ainda,
frequente, nos dias de hoje, na simulação de estruturas de materiais menos resistentes e em
situações de elevada concentração de tensões, a deformabilidade é expressa através da
divisão do corpo em elementos internos, criando uma malha constituída por um número de
elementos finitos em cada bloco de deformação constante, Para esta subdivisão, o bloco
poligonal não é o elemento preferencial dada a sua incapacidade de simular a flexão, sendo
utilizados elementos mais simples como triângulos no caso bidimensional e tetraedros numa
análise em 3DEC (Lemos, 2007).
No programa UDEC, os blocos deformáveis foram desenvolvidos para representar a
deformação interna de cada bloco no modelo. Nesta aplicação, a complexidade da deformação
dos blocos bem como a exactidão da análise de esforços depende do número de elementos
em que os blocos estão divididos. No caso de modelos de geometria complicada, o número de
malhas necessárias aumenta e torna esta abordagem desvantajosa (Sincraian, 2001). Para
contornar esta dificuldade, Shi e Goodman (1988) propõe uma opção mais simples onde se
assume distribuição uniforme de tensões em cada bloco.
A assunção dos elementos como deformáveis não apresenta, num estado estático, dificuldades
computacionais acrescidas. Todavia, em estado dinâmico, especialmente quando se uma
realiza uma análise tridimensional, existe um claro aumento do tempo que o programa levará a
correr. Assim, em problemas de natureza sísmica, a utilização de elementos rígidos apresenta
vantagens a nível computacional (Lemos, 2007).
69
5.3 Comportamento Mecânico dos Contactos
Um meio descontínuo distingue-se de um que seja contínuo pela existência de contactos ou
interfaces entre os elementos discretos que constituem o sistema. Os métodos de elementos
descontínuos são categorizados pela sua representação dos contactos e pela forma como
representam os corpos discretos na formulação numérica (Itasca, 2000). Uma das
componentes mais importantes de qualquer método discreto é a formulação e representação
de contactos. Assim, no DEM, uma atenção especial é requerida para preceitos como a
hipótese de contacto pontual, a aproximação dos vértices por arcos circulares, a área de
influência do contacto, a análise dos contactos, designadamente, a sua caracterização
geométrica, os vários tipos de contacto e as tolerâncias de sobreposição (Rouxinol, 2007).
No algoritmo UDEC, os contactos são assumidos como tendo uma rigidez normal finita,
representativa daquela que existe na realidade entre contactos ou juntas. Esta representação
da interface baseia-se em conjuntos de contactos pontuais. Nesta abordagem, a força de
interacção entre contactos é função dos deslocamentos relativos entre blocos (Sincraian,
2001). Quando dois blocos entram em contacto, desenvolvem-se forças entre ambos que se
repartem nas componentes normal e de corte.
Figura 32 - Forças entre elementos. (Sincraian, 2001)
Assim, o modelo mais simples (fig. 32) é aquele que considera que os blocos se interligam
através de molas normais e de corte e que as forças de interacção são proporcionais ao
deslocamento relativo entre blocos (Sincraian, 2001). Para definir o comportamento mecânico
dos contactos é necessário atender aos seguintes parâmetros:
Rigidez normal (kn)
Rigidez de corte (ks)
Ângulo de atrito (ϕ)
Coesão (c)
Resistência à tracção (σt)
Relativamente à sua deformabilidade, Rouxinol (2007) entende poder considerar-se o contacto
como rígido ou deformável. No modelo de contacto rígido, não há sobreposição dos elementos
discretos, sendo a formulação relativamente complexa. Ao contrário do que se passa
70
comummente na análise de estruturas, a rigidez, no caso das juntas da alvenaria, não se reduz
apenas a um conceito físico, estando relacionada com a espessura do enchimento e das suas
propriedades. Desta forma, para juntas secas, a irregularidade das superfícies de contacto
induzem concentrações de tensões e deformações localizadas em torno da periferia do bloco,
podendo, assim, determinar-se os parâmetros da rigidez da junta em ensaios de laboratório.
Considerando a direcção de corte, verifica-se que o modelo de fricção de Coulomb é o mais
adequado, apesar de, nem sempre, ser possível utilizá-lo. Desta forma, em modelos de
contacto deformáveis, com comportamento elasto-plástico ao corte, a força de corte dada pela
rigidez de corte elástica é reduzida, se se violar o critério de fricção de Coulomb.
Quando se assume uma abordagem plástica, adopta-se um comportamento de dilatância que
Lemos (2007) considera excessivo numa análise de juntas de alvenaria. No modelo de
contacto deformável, utilizado na maioria das formulações do DEM, verifica-se a ocorrência de
uma sobreposição ligeira na presença de forças de compressão, correspondendo à
aproximação de junta de espessura nula. Essa sobreposição representa, de facto, uma
aproximação do comportamento real, pois, na realidade, verifica-se a existência de
deformações ao nível da junta (Rouxinol, 2007).
A consideração da hipótese de contacto pontual entre os elementos, para a zona de contacto,
adoptada na maioria das formulações, consiste na representação de uma superfície
concentrando as suas propriedades em pontos discretos de contacto. No caso da consideração
de elementos discretos poligonais indeformáveis, sempre que um vértice concorra com um
vértice ou um lado de outro elemento discreto poligonal, é criado um contacto. Na simulação de
elementos discretos poligonais deformáveis, divididos internamente por elementos finitos
triangulares, é criado um contacto em cada nó da malha pertencente a um lado em contacto.
Assim, neste último caso, o número de pontos de contacto aumenta com a discretização
(Gago, 2004; Rouxinol, 2007) sendo que esta vai permitir a facilidade de detecção e eliminação
de contacto e, assim, uma maior eficiência computacional.
Outro aspecto importante no DEM diz respeito à representação geométrica dos vértices. Uma
correcta definição dos contactos entre elementos obriga a que os parâmetros geométricos
sejam consistentes. Por exemplo, os vértices dos elementos discretos poligonais representam
uma dificuldade, particularmente quando se pretende definir a normal do contacto, essencial
para estabelecer as forças de contacto normais e tangenciais. Igualmente, o comportamento
mecânico da estrutura deve permitir a alteração de posição dos contactos e, no caso de ocorrer
uma mudança do tipo de contacto, a existência de vértices nos elementos discretos poligonais
impossibilita que a transição ocorra de forma suave. Por essa razão, considera-se um
arredondamento dos vértices dos blocos e dos pontos constituintes da malha. Esse
boleamento dos vértices tem somente implicações na detecção e definição dos contactos, uma
vez que a inércia, área, massa e outras características mecânicas são definições base na
geometria original dos blocos (Gago, 2004; Sincraian, 2001; Rouxinol, 2007).
Para o arredondamento dos vértices, recorre-se ao traçado de um segmento de arco tangente
71
às duas arestas que definem o vértice e é constante para todos os vértices, sendo o seu raio
de curvatura função do ângulo formado pelas arestas de cada vértice. Desta forma, elimina-se
o problema da ambiguidade da componente normal da força de contacto, a variação de
posição dos contactos passa a acontecer de forma progressiva e não brusca e elimina-se o
problema de bloqueamento de blocos (embricamento dos vértices) (Gago, 2004).
A variação das forças de interacção entre os elementos discretos, depende do deslocamento
relativo entre eles. Podem ser utilizados modelos constitutivos formulados em termos de
tensões ou de forças. A interacção dos elementos, no caso particular do UDEC – programa
bidimensional – é representada, por grupos de pontos de contacto, não se pretendendo obter
uma distribuição contínua de tensões ao longo da superfície de contacto. Quando se estuda o
problema a três dimensões existem várias possíveis combinações de interacção aumentando,
assim, a complexidade do problema, bem como da sua representação numérica. O programa
3DEC, variante tridimensional do UDEC, representa os contactos pontuais para dois casos
elementares: vértice-aresta e vértice-vértice. Estas hipóteses são suficientes para modelar
variadas interacções entre poliedros (Lemos, 2007). Para tal, é essencial compreender como
acontece a detecção de contactos e como facilitar o procedimento.
5.4 Detecção e Actualização dos Contactos
O processo de detecção de contactos é o principal factor de demora das simulações DEM que
depende, tanto do número de blocos a serem simulados, como da geometria de cada bloco.
Assim, as rotinas do programa UDEC devem permitir a identificação dos corpos em contacto,
bem como as alterações que sofrem ao longo do procedimento sem que seja necessária a
intervenção do utilizador.
Os corpos começam por estar em contacto numa geometria definida pelo utilizador que
representa a sua estrutura, precisando um bloco inicial a partir do qual traça a sua estrutura
cortando o bloco original. Ao longo da análise, com a deslocação dos blocos, alguns destes
contactos poderão desaparecer e outros podem surgir.
Na utilização do DEM, o processo de detecção de contactos passa pela realização de um teste
eliminatório dos blocos que não contactam, seguido de um outro que analisa os restantes
(Gago, 2004; Sincraian, 2001; e Rouxinol, 2007). Para evitar a necessidade do programa
controlar recorrentemente todos os pares de contactos, conduzindo a um procedimento pouco
eficiente com uma duração excessiva, define-se um parâmetro que representa o movimento do
bloco e permite que o processo de detecção só comece quando o bloco se desloca
determinada distância de referência (Lemos, 2007). Além disso, devem ser previstos
antecipadamente os contactos que se podem formar entre dois passos sucessivos,
introduzindo-se assim o conceito de contacto virtual.
Durante o processo de detecção, os contactos são criados sempre que esse parâmetro
(distância) é excedido. No caso dos contactos virtuais, as forças são nulas. Quando os blocos
se aproximam, o teste detecta um contacto físico e os contactos virtuais podem passar a reais.
72
Por outro lado, se há um afastamento, os contactos virtuais são eliminados, pois já não
ocorrerá contacto futuro.
Relativamente à organização do processo de detecção é possível a decomposição do domínio
numa malha regular de elementos (ou células). Nos métodos de detecção de contactos por
decomposição do domínio, os elementos discretos, de forma geométrica irregular ou regular e
com tamanho semelhante, são inicialmente inscritos numa envolvente de forma geométrica
circular, quadrada ou complexa. Este tipo de organização tem diversas hipóteses de métodos
de detecção, apresentando Rouxinol (2007) alguns, tais como o método de detecção através
de árvores binárias, de listas e de topologia local. Este último é também referido por Sincraian
(2001) e Gago (2004) e consiste na formação, para cada célula, de uma lista dos blocos cujas
envolventes rectangulares os contêm. Assim, é possível identificar em que célula cada bloco
deve ser incluído. Depois de listados os blocos dentro das células a que correspondem, a
determinação dos blocos que estão próximos de um dado bloco pode ser conseguida. Gago
(2004), Rouxinol (2007) e Sincraian (2001) salientam, no entanto, que neste método o tempo
de cálculo é dependente da dimensão e forma dos blocos, mas independente do seu número.
Quanto maior a dimensão da célula, menos detalhada é a malha e mais blocos podem existir
no seu interior.
Existem dois tipos de contacto definidos no UDEC: contacto do tipo vértice-vértice ou tipo
vértice-aresta (Gago, 2004; Itasca, 2000; Rouxinol, 2007; Sincraian, 2001). Estes são os únicos
tipos de contacto necessários pelo algoritmo para a representação de um sistema de blocos.
5.4.1 Contacto Vértice-Aresta
Como já foi referido, a formação de um contacto virtual acontece antes do impacto físico, sendo
definido quando a distância de formação do contacto é superior à distância un. Por seu lado, as
forças de contacto só deixarão ter valor nulo quando un for zero e no caso de a interpenetração
de blocos ser superior ao valor máximo admissível é necessário aumentar a rigidez normal.
Para distinguir um contacto do tipo vértice-aresta de um do tipo vértice-vértice as seguintes
condições deverão verificar-se:
(5.1)
(5.2)
Em que dr é a distância de arredondamento, z é o comprimento da aresta e td a distância da
extremidade da aresta ao vértice.
Satisfeitas essas condições é criado um contacto virtual vértice-aresta cujo ponto de contacto é
dado por:
e
(5.3)
73
Figura 33 - Tipo de contacto-vértice aresta. (Sincraian, 2001)
5.4.2 Contacto vértice-vértice
Tal como no caso anterior, também este tipo de contacto virtual será somente criado se un se
encontrar entre os limites definidos por dfc e smax (fig. 34):
Figura 34 - Tipo de contacto vértice-vértice. (Sincraian, 2001)
(5.4)
(5.5)
e
(5.6)
Além destas condições, para que o contacto seja deste tipo, é necessário que a linha que
define a normal intersecte ambos os arcos circulares ou seja, que não seja possível formar
contactos vértice-aresta entre cada vértice e as arestas adjacentes ao outro vértice. Assim, é
necessário verificar que as seguintes condições não são satisfeitas:
e
(5.7)
74
5.5 Cálculo Estrutural
5.5.1 Algoritmo de Cálculo
O algoritmo de cálculo a utilizar na análise deve considerar todas as características essenciais
do modelo: a geometria da estrutura; o número e tipo de contactos; e a sua variação ao longo
do processo (Gago, 2004; Sincraian, 2001). No DEM, o algoritmo de cálculo é baseado em
algoritmos explícitos de diferenças finitas, tanto para uma análise estática como dinâmica. O
intervalo de tempo do procedimento está limitado pelas garantias da estabilidade numérica do
método das diferenças centrais. Sincraian (2001) explica esta afirmação afirmando que a
duração do algoritmo deve ser reduzida o suficiente para que as perturbações do sistema não
se propaguem para além dos blocos vizinhos imediatos (Sincraian, 2001; Gago, 2004). A
desvantagem deste método prende-se com a estabilidade condicionada do sistema, sendo às
vezes necessário considerar intervalos de tempo muito pequenos, o que implica uma análise
computacional de elevada duração.
Admitindo as equações de movimento, é possível, com este algoritmo, resolver problemas
estáticos, considerando um amortecimento viscoso artificial alto que dissipa a energia cinética
e o sistema converge para o estado estático, e, para análises dinâmicas, recorre-se a técnicas
semelhantes baseadas no relaxamento (Gago, 2004; Sincraian, 2001; Rouxinol, 2007).
5.5.2 Ciclo de Cálculo
Os cálculos resultantes da aplicação do método dos elementos discretos baseiam-se na
alternância entre a aplicação, a todos os elementos, da segunda lei de Newton e a todos os
contactos da lei de tensão-deformação. A primeira avalia o movimento dos blocos resultado
das forças que lhes estão aplicadas através da segunda lei aplicada aos contactos. No caso
dos blocos serem deformáveis, o seu movimento é calculado relativamente à malha de
elementos triangulares de cada bloco. O ciclo de cálculo apresenta, assim, esta forma:
Figura 35 - Ciclo de cálculo para elementos discretos. (Itasca, 2004)
75
Segundo este esquema (fig. 35), o algoritmo é resumido a dois passos: em primeiro lugar,
conhecem-se as velocidades através das equações de movimento, em segundo lugar,
calculam-se os incrementos de deslocamentos, aplica-se as relações constitutivas que resulta
em novas tensões e forças nos contactos, estas, juntamente com o carregamento exterior, são
reunidas num novo vector de forças F para o próximo passo de cálculo.
5.5.3 Equações de Movimento
A equação de movimento de cada elemento individual determina-se a partir da magnitude e
direcção do momento de desequilíbrio resultante e das suas forças actuantes. Admitindo o
deslocamento de um único elemento sujeito a uma força F sem amortecimento, a segunda lei
de Newton tem a forma:
(5.8)
reescrevendo-se a equação em que se substitui a parcela da aceleração por:
(5.9)
Obtém-se
(5.10)
Como a força depende do deslocamento, o cálculo constitutivo é feito para um instante de
tempo. A ordem de cálculo é apresentada na fig. 36, com as setas a representar essa mesma
ordem.
Figura 36 - Natureza iterativa inerente ao DEM. (Itasca, 2004)
Quando o problema é bidimensional, são várias as forças que actuam nos blocos, bem como a
gravidade, resultando em equações de movimento com três graus de liberdade (dois
deslocamentos e uma rotação) com a forma:
(5.11)
(5.12)
76
Onde velocidade angular do bloco relativamente ao centroide,
momento polar de inércia do bloco,
componentes da velocidade do centroide do bloco ( =1,2),
componentes da aceleração gravitacional,
componentes da força resultante no centro de gravidade do bloco devido à acção
das cargas exteriores ( ) e das forças de contacto (
),
momento resultante no centro de gravidade do bloco devido à acção das cargas
exteriores.
Através destas equações será possível obter as novas localizações de cada bloco (Gago,
2004; Sincraian, 2001; Rouxinol, 2007).
5.5.4 Amortecimento
O amortecimento é, no UDEC, utilizado na resolução de problemas estáticos, mas também
dinâmicos, tomando para as equações de movimento de blocos bidimensionais as seguintes
expressões:
(5.13)
(5.14)
Em que c é a constante de amortecimento.
Utiliza-se, no caso da análise estática, um amortecimento do tipo viscoso, de valor
artificialmente alto, e com uma intensidade das forças de amortecimento proporcional à
velocidade dos blocos (Gago, 2004; Sincraian, 2001; Rouxinol, 2007).
Pretende-se a dissipação da energia cinética, tendo em vista uma situação de equilíbrio ou
mecanismo de colapso quase-estático do sistema. Há, no entanto, duas razões que acarretam
dificuldades à definição do parâmetro amortecimento: uma primeira tem a ver com a
dependência da constante de amortecimento óptima das frequências principais do sistema.
Estas são desconhecidas até ser elaborada uma análise modal da estrutura, o que nem
sempre é possível. Uma segunda razão prende-se com a descontinuidade da estrutura,
podendo uma parte dela estar em equilíbrio e a outra em colapso. É, então, essencial, não um
único valor constante para o amortecimento, mas diferentes valores apropriados a cada região.
Para a resolução desta problemática, recorre-se à utilização do método de amortecimento
automático, em que a constante de amortecimento viscoso é ajustada de modo a que a energia
que o sistema absorve seja proporcional à taxa de variação da energia cinética do sistema.
Este método apresenta, todavia, uma fraqueza: quando o sistema evolui para um equilíbrio
quase-estático a energia aproxima-se do zero e o mesmo acontecerá com o amortecimento.
Assim, surgiu o método de amortecimento local em que este é definido proporcionalmente às
77
intensidades das forças desequilibradas.
Para análises dinâmicas, recorre-se ao amortecimento de Rayleigh que obedece à expressão
C = αM+βK, proporcional à massa M e rigidez K da estrutura. O problema com este método de
amortecimento relaciona-se com a sua parcela proporcional à rigidez que implica intervalos de
tempo reduzidos para que a solução possa convergir e atingir a estabilidade (Gago, 2004).
Dejong (2009) esclarece que a parcela do amortecimento proporcional à rigidez tende a ser
ignorada, por prolongar a duração do tempo de execução do modelo, e a parcela relativa à
massa é substituída unicamente para que o sistema tenha amortecimento mínimo. É todavia
essencial uma clara compreensão do papel do amortecimento na resposta do sistema para que
este seja convenientemente simulado. DeJong (2009), no seu estudo da modelação do
comportamento dinâmico do arco, considera a sua estrutura inicialmente a amortecimento nulo
e aumenta depois esse valor por tentativa-erro. Conclui este autor que, para uma fase de
intensa vibração (shaking) o amortecimento nulo apresenta os melhores resultados, por
oposição à fase final do sismo em que se verifica que o sistema oscila até a amplitude se
reduzir a zero (underdamped, ζ < 1).
Apesar de ser uma abordagem típica na definição de parâmetros do DEM numa análise
dinâmica, a tentativa-erro não é a forma mais correcta de obter os parâmetros de
amortecimento, sendo necessária uma análise de sensibilidade dos resultados obtidos. O
amortecimento de altas frequências previne oscilação e vibrações, existindo um valor de
frequência a partir do qual o sistema é amortecido de forma crítica (sistema atinge o seu
equilíbrio sem chegar a oscilar) sendo possível obter o amortecimento relativo à rigidez.
5.5.5 Estabilidade Numérica
Para que a estabilidade seja garantida, é necessário verificar que os passos de integração Δt
sejam inferiores a determinado valor crítico. Num sistema elástico linear, esta verificação toma
a forma:
(5.15)
Em que ωmax representa a frequência própria de vibração mais elevada do sistema. Se o
sistema discreto altera de forma significativa a sua geometria durante o procedimento, o valor
desta frequência torna-se impossível de obter recorrendo-se a uma estimativa baseada num
sistema com um grau de liberdade
(5.16)
5.6 Síntese
O UDEC trata-se de um código do programa de Modelação de Elementos Discretos. É um
programa geral, de aplicação possível a outros tipos de estrutura, contudo Sincraian (2001) e
Lemos (2007) esclarecem as suas principais vantagens:
78
Permite optar entre blocos rígidos ou deformáveis;
Simula um colapso progressivo associado à propagação de fendas. Esta deve-se à
quebra de ligações já existentes entre blocos que se mantém intactos;
São vários os códigos deste programa que permitem uma solução explícita, tanto para
uma análise estática como para a dinâmica.
É possível uma simulação de reforço estrutural
Permite optar entre contactos pontuais ou deformáveis, sendo possível uma pequena
sobreposição de elementos à compressão
As suas vantagens face a outros programas de modelação de estruturas dependem contudo de
uma correcta calibração dos parâmetros do modelo. Assim, é essencial compreender os
principais parâmetros que constituem a formulação deste programa para que seja possível o
seu eficaz manuseamento. Neste capítulo apresentou-se, assim, uma breve explicação do
comportamento mecânico dos seus elementos e contactos, bem como do seu cálculo
estrutural.
6. Estudos Numéricos
Neste capítulo, apresenta-se o estudo empírico realizado que é baseado nas pesquisas de
Oppenheim (1992), — sobre a análise do arco em estado estático e dinâmico — e de DeJong
(2009), que veio comprovar e desenvolver a investigação de Oppenheim (1992).
Nele distinguem-se três partes essenciais, uma inicial, onde, após a contextualização do
problema em estudo, se explicita o primeiro caso de estudo, referente a dois arcos — o arco
padrão de Oppenheim (1992) (arco 1) e o arco semi-circular (arco 2) — numa abordagem
dinâmica, visando obter as acelerações mínimas que podem provocar o seu colapso. A
obtenção destes valores realiza-se em dois passos. Primeiramente, efectua-se uma análise
estática em que se sujeita cada um dos arcos a forças horizontais constantes (F=m*a) que
simula a aceleração. Em seguida, efectuam-se duas análises dinâmicas, aplicando a mesma
força horizontal variável no tempo em cada aduela e uma aceleração constante, desta vez na
base que suporta o arco. Os resultados são comparados entre si e confrontados com os de
Oppenheim (1992).
Na segunda parte deste capítulo, descreve-se o segundo caso de estudo, referindo os
resultados relativos à modelação do arco considerando o enchimento do extradorso. Procura-
se compreender se este é, tal como em estado estático, favorável à estabilidade do arco, desta
vez sujeito a uma acção dinâmica. Salienta-se que, nesta modelação do enchimento, se
considera apenas o carregamento do enchimento aplicado a cada aduela.
79
Finalmente, na última parte do capítulo apresenta-se o terceiro caso de estudo, em que o
enchimento do extradorso é modelado com elementos discretos, sendo observado o seu
comportamento quando sujeito a uma acção sísmica. Realiza-se ainda a comparação deste
com o caso anterior, visando conhecer a eficácia das duas modelações
O capítulo termina com uma síntese conclusória dos resultados observados.
6.1 O arco de Oppenheim
Apesar de, em repouso, se tratar de uma estrutura hiperstática, uma vez iniciado o mecanismo,
o arco representa-se por um sistema de um grau de liberdade que corresponde à rotação entre
o seu estado de repouso e a sua deformada. No capítulo 4, foi brevemente apresentado o
estudo do arco conduzido por Oppenheim (1992). Este estudo será retomado nesta introdução
onde se apresentam os resultados empíricos deste trabalho por forma a clarificar o
comportamento do arco como sistema sujeito a acções dinâmicas.
Oppenheim (1992) considera um arco simples com a geometria definida da seguinte forma:
ângulo de abertura 157,5◦ distribuído ao longo de 7 aduelas e rácio espessura/raio de 0,15,
com um raio médio de 10 m e sujeita-o a uma aceleração horizontal ao nível da base . O
mecanismo que se inicia tem apenas uma direcção, considerando que na direcção oposta o
mecanismo já não é o mesmo. Este autor define o grau de liberdade único, deste mecanismo
planar, como a rotação θAB (fig. 37) ou simplesmente θ e utiliza ainda outra representação – φ –
definindo-a como a rotação relativamente à posição original (θ0 – θ). Esta rotação relativa,
admitindo o mecanismo com o deslocamento representado na fig. 37, será positiva sempre que
este se formar.
Figura 37 - Mecanismo de colapso do arco de Oppenheim quando sujeito a um movimento de base horizontal (Oppenheim, 1992)
Para conhecer o comportamento do sistema, é necessário determinar a sua equação de
movimento que pode ser obtida por três métodos: o método directo, o princípio dos trabalhos
virtuais e o método energético, este último escolhido por Oppenheim (1992).
80
No segundo o método energético admite-se que a energia cinética (dependente das
velocidades rotacionais do sistema) é dada por
(6.1)
e a energia potencial (devida às forças gravitacionais) por:
(6.2)
A função de forças generalizadas Q, considerada como a quantidade que expressa a variação
de trabalho não conservativo, é representada por:
(6.2)
em que tem a forma
(6.3)
Oppenheim (1992), introduz as grandezas que definiu nas equações de Lagrange e obtém,
utilizando o Princípio de Hamilton, a equação de movimento:
(6.4)
em que m é a massa por unidade de comprimento, a o raio médio e M, L, F e P coeficientes
não lineares em θ.
Aplicando esta equação ao caso do arco de Oppenheim em estudo, com θ0 de valor 0,8972
rad, a expressão toma a forma:
(6.5)
Alternativamente, considera o parâmetro já definido φ e exprime F(θ) como uma expansão de
Taylor de θ0
(6.6)
Tendo Oppenheim (1992) definido φ como positivo para que o mecanismo em estudo ocorra,
então o termo
tem de ser positivo e, como tal, a aceleração g tem de ser
negativa e de valor superior a 0,37*g.
(6.7)
Assim, para que o mecanismo se inicie num arco com as características geométricas definidas
é necessária uma aceleração horizontal constante ao nível do solo superior a 0,37*g.
Esta constatação de Oppenheim (1992) vai ser verificada neste estudo, recorrendo ao
programa UDEC, tanto para o arco com a geometria definida por Oppenheim (1992) como para
o arco semi-circular (em que a aceleração toma o valor de cerca 0,15*g como visível na fig. 38).
81
Figura 38 - Valores de aceleração máxima (sem ocorrer colapso) para diferentes t/a (Oppenheim, 1992)
6.2 Considerações Iniciais da formulação do problema
Utilizando o Método do dos Elementos Discretos (DEM), nomeadamente o seu algoritmo
UDEC, realizou-se a modelação de arcos diversos, variando a geometria e as propriedades
dos seus materiais. Como já foi descrito no capítulo 5, uma correcta modelação utilizando o
algoritmo UDEC implica uma escolha cuidada de alguns parâmetros: propriedades mecânicas
dos elementos, propriedades mecânicas das juntas e o amortecimento do sistema:
1. Modelou-se o sistema considerando-o rígido de modo a possibilitar uma comparação dos
resultados com os obtidos por Oppenheim (1992). Uma vez que o programa UDEC assume,
por defeito, os elementos discretos como rígidos, não foi necessária qualquer alteração
relativamente a este aspecto.
2. A densidade adoptada para o material do arco, seguiu o valor definido por DeJong (2009),
ou seja, de 2000 kg/m3.
3. Uma vez que a rigidez dos contactos não vai ter qualquer correlação com o modelo analítico
estudado, foi-lhe atribuído um valor fictício muito elevado para minimizar a deformação das
juntas. Os valores definidos por DeJong (2009), e assumidos na modelação executada neste
trabalho, são de 1012
Pa/m, tanto para a rigidez normal do contacto, como para a rigidez de
corte deste.
4. O valor de amortecimento não deve ser assumido como sendo proporcional à massa do arco
pois é uma assunção irrealista no programa em DEM. Pode ser utilizado um amortecimento
proporcional à rigidez, apesar de não ser adequado, numa perspectiva da Física, no caso de
ser necessário amortecer frequências muito elevadas de vibrações que ocorrem durante o
processo de modelação. Considerou-se inicialmente o modelo de amortecimento de Rayleigh
com os coeficientes α e β respectivamente com os valores 6,28 *10-5
e 1,59 *10-4
, optando-se
finalmente por simplificar o modelo considerando-o nulo.
5. O arredondamento dos vértices foi definido como 0,05 m e a interpenetração entre blocos foi
limitada a 5*10-2
.
82
6.3 Caso 1 – Estudo de Arcos Simples sem Enchimento
Modelação
Consideraram-se, neste caso, dois arcos distintos: o arco padrão de Oppenheim (1992) – arco
1 (fig. 38) – com ângulo de abertura 157,5◦, um rácio t/a de 0,15 e 7 aduelas; e um arco semi-
circular (180◦) – arco 2 (fig. 39) – com os mesmos rácio espessura/raio e número de aduelas. A
partir do valor de 2000 kg/m3
, atribuído à densidade das aduelas, tanto para o arco 1, como
para o arco 2, foi possível saber a massa da aduela por metro de profundidade, multiplicando a
densidade pela área que se admitiu igual para todas as aduelas (sem o enchimento, incluído
apenas nos seguintes casos de estudo).
Numa primeira fase, efectuou-se o estudo do comportamento dos arcos em estado estático.
Aplicou-se a ambos forças horizontais constantes, ao nível dos centróides de cada uma das
suas aduelas, de valor
(6.8)
em que m é a massa da aduela e a é o valor da aceleração que se fez variar até ao colapso.
Numa segunda fase, realizou-se o estudo de ambos os arcos em estado dinâmico (fig. 41).
Figura 39 - Arco padrão de Oppenheim (157,5˚) – arco 1
Figura 40 - Arco semi-circular – arco 2
83
Neste estudo em primeiro lugar, aplicou-se uma força horizontal ao nível dos centros de massa
das aduelas do sistema, variável no tempo.
(6.9)
Seguidamente, aplicou-se uma aceleração constante (as) ao nível do centro de massa da base
que suporta cada um dos arcos.
Figura 41 – Representação das acções a que o arco 1 (e 2) estão sujeitos
Discussão dos resultados obtidos
Na tabela seguinte estão apresentados os resultados correspondentes aos valores máximos de
aceleração suportada por cada um dos arcos antes do colapso
Tabela 2 Acelerações máximas suportadas pela estrutura sem que o colapso aconteça
Análise
Estática Análise Dinâmica
Valores obtidos por
Oppenheim
Força horizontal
variável
Aceleração constante
na base
Arco 1 0,30*g 0,29*g 0,14*g 0,37*g
Arco 2 0,14*g 0,12*g 0,06*g 0,16*g
Se compararmos os resultados obtidos com os de Oppenheim, verifica-se que, na análise
estática, estes apresentam valores muito semelhantes (tab. 2). As diferenças podem dever-se
ao facto de o programa UDEC considerar efeitos geometricamente não lineares que
Oppenheim (1992) não teve em conta.
É de salientar, igualmente, que fazendo uma comparação entre os resultados obtidos para o
mesmo arco em estado estático e dinâmico, os valores das acelerações máximas são distintos.
Os arcos em estudo são sistemas de vários graus de liberdade, mas o seu comportamento
dinâmico pode ser estudado através de um modelo simplificado de um grau de liberdade. Para
um oscilador de 1 grau de liberdade sujeito a um movimento da base (fig. 42), as forças
84
exercidas sobre este são a força exercida pela mola (Fs), proporcional ao deslocamento relativo
u da massa M; a força exercida pelo amortecedor (Fd), proporcional à velocidade relativa da
massa M; e a força de inércia (Fi) exercida sobre M que corresponde ao produto desta pela
aceleração absoluta da massa (Correia, 2007).
Figura 42 - Oscilador linear com 1 grau de liberdade (Correia, 2007)
Sendo o deslocamento absoluto da massa M (x) a soma do deslocamento da base (y) com o
deslocamento relativo (u), é possível estabelecer a mesma relação para as acelerações
correspondentes (de base e relativa). Sendo a resultante de todas as forças aplicadas ao
oscilador nula, a equação de movimento com base no deslocamento relativo e no movimento
da base é:
(6.10)
Observa-se que, no caso do sistema ser solicitado por uma força exterior variável P(t), a
equação de movimento toma a forma:
(6.11)
pelo que, o movimento do oscilador solicitado por um movimento ao nível do seu apoio é
equivalente ao do efeito sobre o mesmo oscilador, de uma força variável P(t), correspondente
ao produto da massa pela aceleração do solo.
Quando o sistema é sujeito a uma força aplicada os efeitos dinâmicos são normalmente
superiores aos efeitos dessa força aplicada estaticamente, sendo a relação entre esses efeitos
definida pelo coeficiente β1, que é função de frequência do oscilador e da excitação (fig. 43) e
que relaciona a amplitude do deslocamento dinâmico e estático (Correia, 2007).
Os resultados das análises obtidas pelo UDEC apresentados na tabela 2 revelam a existência
de uma amplificação dinâmica pois, apesar de se tratar de um sistema modelado como um
conjunto de corpos rígidos, o arco não é um corpo rígido, existindo deformabilidade das juntas.
Observando os resultados obtidos para o arco 2, semi-circular e para o arco 1, padrão de
Oppenheim, constata-se que o arco 2 apresenta valores de aceleração máxima suportada
inferiores aos do arco 1 em todas as análises, revelando diferenças ao nível da estabilidade.
Esta diferença, do nível de estabilidade, já constatada por Gago (2004) para o estudo estático
do arco está representada na figura 44 sob a forma de espessura mínima admissível.
85
Figura 43 - Coeficiente de amplificação dinâmica do deslocamento (Correia, 2007)
Figura 44 - Espessura mínima admissível em função do ângulo de abertura do arco (Gago, 2004)
Finalmente, é importante referir que a geometria dos mecanismos de colapso obtidos através
do programa UDEC confirma os seguintes aspectos, já referidos por DeJong (2009):
1) Quando o arco é forçado a iniciar o seu mecanismo, este é idêntico ao considerado
analiticamente por Oppenheim (1992).
2) As rótulas não se situam exactamente na localização exactamente definida por Oppenheim
(1992), ocorrendo uma flutuação das suas posições, que variam desde as de formação do
mecanismo até às do seu colapso. Esta diferença na localização das rótulas relaciona-se,
como refere DeJong (2009), com o facto de que, na realidade, a transição entre mecanismos
não é descontínua (fig. 44).
86
Figura 45 Mecanismo de Colapso do arco de Oppenheim
6.4 Caso 2 – Estudo de Arcos com Enchimento do Extradorso considerando apenas o seu peso
Modelação
No caso de estudo 2, realizou-se a modelação dos mesmos arcos, considerando-se, em ambos
os casos, apenas o peso do enchimento. Para tal, procedeu-se ao cálculo da área de cada
aduela e da área de enchimento que estaria acima desta. Assumindo os valores de 21 e 22
kN/m3 para o peso das aduelas e do enchimento respectivamente, procedeu-se ao cálculo do
novo peso da seguinte forma:
(6.12)
Apresentam-se na tabela seguinte os pesos resultantes correspondentes a cada aduela:
Tabela 3 Pesos da aduela acrescidas do Enchimento do Extradorso
Aduela 1 Aduela 2 Aduela 3 Aduela 4
Arco 1 50,84 kN/m3 47,96 kN/m
3 31,19 kN/m
3 20 kN/m
3
Arco 2 45,64 kN/m3 55,97 kN/m
3 36,12 kN/m
3 20 kN/m
3
Como se pode observar na figura 46, onde se representa a numeração de aduelas, a aduela 4
não suporta enchimento no arco padrão de Oppenheim. O mesmo acontece no arco semi-
circular que segue a mesma numeração de aduelas.
87
Figura 46 - Representação do Enchimento do Extradorso
O cálculo do peso de cada aduela, quando acrescido do peso do enchimento que suporta,
permite estabelecer a massa de cada uma, obtida através da multiplicação densidade * área da
aduela. Este valor será considerado na modelação do arco, tanto ao nível da definição do
material, como no cálculo da força horizontal (F=m*a) aplicada em cada aduela (tab. 3).
Comparam-se os resultados, com os obtidos no caso 1 para ambos os arcos 1 e 2 em estado
dinâmico, com vista a fazer sobressair o efeito do enchimento no comportamento dinâmico dos
arcos.
Discussão dos resultados obtidos
Tabela 4 Acelerações máximas que a estrutura suporta sem que o colapso aconteça
Arco 1 (157,5º)
Força Horizontal Variável
Com enchimento 0,29*g
Sem enchimento 0,29*g
Aceleração Constante na
Base
Com enchimento 0,17*g
Sem enchimento 0,14*g
Arco 2 (180º)
Força Horizontal Variável
Com enchimento 0,17*g
Sem enchimento 0,12*g
Aceleração Constante na
Base
Com enchimento 0,12*g
Sem enchimento 0,06*g
88
Observando as tabelas anteriormente representadas, constata-se o seguinte:
1. A diferença entre os valores das acelerações máximas suportadas com e sem enchimento
do extradorso, no caso do arco 1, de abertura 157,5º, é mínima, o que revela a não influência
do enchimento no comportamento deste arco. O arco padrão de Oppenheim (1992) apresenta
uma estabilidade inerente à sua geometria, tanto por ter um rácio espessura/raio superior ao
mínimo para um ângulo de abertura previsto por Gago (2004) (1,5m > 0,8m), como por esse
mesmo ângulo de abertura facilitar a inclusão da linha de pressões, aproximando-se da forma
parabólica. Como tal, este arco será menos sensível à mudança de comportamento que o
enchimento provoca.
2. Observando os resultados relativos ao arco 2, constata-se que o enchimento do extradorso
influencia o comportamento do arco. Sendo o arco semi-circular de natureza instável, para uma
aceleração máxima muito inferior (0,06*g) àquela que o arco de 157,5º suporta, o efeito do
enchimento já se torna visível (aumentando para 0,12*g), aproximando a estabilidade deste
arco à estabilidade do arco padrão de Oppenheim sem enchimento.
3. Finalmente, analisando a diferença de resultados obtidos, em cada uma das duas análises
dinâmicas efectuadas, para arcos com enchimento, verifica-se que ela é concordante com os
resultados verificados no caso de estudo 1: os valores de aceleração máxima quando se
sujeitam as aduelas a uma força variável horizontal são superiores aos valores obtidos quando
o arco é submetido a uma aceleração constante na sua base.
Verifica-se, pois, que para arcos instáveis, a existência do enchimento afecta de forma positiva
a sua estabilidade.
6.5 Caso 3 – Estudo do Arco Semi-Circular com Enchimento do Extradorso modelado com elementos discretos
Modelação
Após ser analisado o efeito do enchimento do extradorso na estabilidade do arco admitindo
apenas o seu carregamento, para análises dinâmicas, pretendeu-se neste terceiro caso de
estudo, conhecer o efeito do enchimento do extradorso no comportamento do arco, modelado
explicitamente no modelo de elementos discretos.
Embora, o caso de estudo 2 estudasse os efeitos do enchimento do extradorso no
comportamento do arco em estado dinâmico, não se focou o estudo no efeito do enchimento
do extradorso, relativamente à sua modelação. Neste caso, tretende-se estudar a influência do
enchimento e do tipo de modelação do enchimento. São comparados os resultados de uma
modelação considerando apenas o peso do enchimento com os resultados obtidos para o
mesmo arco em que o enchimento foi modelado com elementos discretos.
O arco modelado, no caso 3, tem as propriedades dos materiais idênticas às do arco da ponte
de Bridgemill. Pretendeu-se, com o estudo de uma estrutura já considerada por outros
89
investigadores (Gago, 2004; Rouxinol, 2007), conhecer previamente os seus parâmetros
geométricos e mecânicos, facilitando a calibração do modelo. Foram, desta forma, assumidos
os valores para os pesos próprios da alvenaria e do enchimento de valores respectivamente de
21.0 kN/m3 e 22.0 kN/m
3, tal como nos estudos referidos. Na tabela seguinte, elaborada por
Gago (2004), apresentam-se os valores necessários para a sua caracterização geométrica e
propriedades dos materiais.
Tabela 5 - Propriedades dos elementos de diferenças finitas e dos contactos pontuais. (Gago, 2004)
Procedeu-se à modelação do arco considerando a sua geometria original uma adaptação da da
ponte de Bridgemill.
Quando se executou o modelo, constatou-se a necessidade de aumentar a espessura do arco
para que este suportasse o seu próprio peso. Assim, mantendo a altura de enchimento de
0,208 m, no coroamento do arco, e mantendo a razão para o comprimento de enchimento de 2r
(r é o raio do arco), modelou-se o arco semi circular com o raio médio de 10,75 m e espessura
1,5 m.
Assim, para melhor compreensão dos resultados, considerou-se, neste caso de estudo, três
situações de modelação:
A. modelação do arco simples (fig. 47), sem considerar o enchimento;
B. modelação do arco simples considerando o enchimento apenas pelo seu peso
(atribuíram-se a cada aduela o seu peso e o do enchimento que lhe é superior) (fig. 48).
Este foi calculado de modo análogo ao caso de estudo 2, a área existente acima de cada
90
aduela, obtendo-se assim a densidade do enchimento + aduela (admitindo os pesos da
alvenaria e do material de enchimento atrás referidos) (fig. 50);
C. Numa terceira situação modelou-se o enchimento através de elementos discretos,
considerando-se paredes tímpano para evitar o seu escorregamento lateral (fig. 49).
Considerou-se que todas aduelas possuíam igual densidade, de valor diferente do
material de enchimento que foi modelado com elementos independentes. As paredes de
tímpano, apenas consideradas nesta terceira modelação, são assumidas como sendo
rígidas e distantes do arco de 2r. Com esta distância de afastamento pretendeu-se
anular a influência resistente das paredes no comportamento do arco. Não tendo sido
considerados outros afastamentos, em trabalhos futuros será oportuno estudar a
distância das paredes de tímpano ao arco de forma a que os seus efeitos na estabilidade
do arco não se produzam.
Na modelação do enchimento, executou-se uma malha aleatória de elementos
poligonais de largura média de 1 m. Para tal, recorreu-se ao comando existente no
programa UDEC voronoi. Na realidade, a largura do enchimento é de dimensão mais
reduzida. Contudo, assumir um valor mais próximo do real conduziria a um tempo de
ciclo demasiado elevado, tornando-se o modelo muito pesado e de difícil execução (fig.
51).
Figura 47 - Arco simples semi-circular sem considerar o enchimento do extradorso
Figura 48 - Arco semi-circular considerando o peso do enchimento do extradorso
91
Figura 49 – Arco semi-circular considerando o peso do enchimento do extradorso através de elementos discretos
Figura 50 Representação da área de enchimento de cada aduela
Figura 51 Pormenor do Enchimento do Arco
Depois de realizadas as modelações A, B e C dos arcos em estudo, estes foram sujeitos a um
sismo de efeito semelhante ao de 1969, ocorrido em Portugal.
Para realizar a comparação entre as três modelações quanto à resistência ao sismo, majorou-
se a intensidade de aceleração do sismo com um escalar λ que permite apenas a sua variação.
Os três modelos de arco foram submetidos ao mesmo sismo com valores variados de λ até se
formar o mecanismo de colapso. (fig. 52 e fig. 53).
92
Figura 52 - Colapso do arco semi-circular considerando o peso do extradorso
93
Figura 53 Colapso do arco semi-circular com a modelação do enchimento
Discussão dos resultados
Os valores máximos de λ a partir dos quais ocorre o colapso dos três arcos estão indicados na
tabela 6.
Tabela 6 - Valores de colapso do arco sujeito ao sismo
Valores de máximos (λ) sem que ocorra o colapso do arco
Arco simples (A) 10,5
Arco com o peso do enchimento (B) 17,75
Arco com o enchimento modelado (C) 27,5
Com base nesses resultados são possíveis duas conclusões.
Verifica-se que, ao comparar a modelação em que se considera a resistência do enchimento
(C) com a do arco simples (A), o enchimento do extradorso, tal como observado no caso de
estudo 2, aumenta a estabilidade do arco semi-circular. Para um arco com a geometria referida
(semi-circular), o enchimento do extradorso traz vantagens para a estabilidade do arco.
Contudo, é de notar que o arco analisado neste terceiro caso de estudo se trata de um arco
semi-circular, com menor estabilidade, que a de arcos com menores ângulos de abertura.
Coloca-se a questão de saber se este efeito benéfico na estabilidade se estende a outro tipo de
arcos ou se, como no segundo caso de estudo, (arco de Oppenheim) não se verifica influência
relevante no seu comportamento, quando sujeito a uma análise dinâmica.
Verifica-se, também, que existe uma diferença entre os resultados das modelações B e C. Esta
distinção resulta de as duas modelações não serem idênticas, considerando a modelação B
apenas o peso e não a rigidez lateral do enchimento.
Contudo, Croci (2000 e 2001) identifica um efeito negativo do enchimento. Apesar das
94
vantagens do enchimento, quando numa análise estática, se observarem para qualquer
geometria de arco1, em análises dinâmicas, o enchimento tem como efeito benéfico, o aumento
da rigidez lateral e o efeito instabilizante que resulta do aumento da massa sobre o arco.
A própria acção dinâmica depende também da massa da estrutura e, como tal, o enchimento
que irá afectar o comportamento da estrutura positivamente pelo seu peso, irá exercer um
efeito desfavorável pelo incremento da massa e consequentemente pelo incremento da acção
sísmica (força de inércia), anulando o anterior e até provocando o colapso da estrutura. Esta
situação é apresentada por Giorgio Croci (Croci, 2000 e Croci, 2001) sobre as intervenções na
estrutura da Basílica de S. Francisco de Assis, em Itália, que, apesar de já ter estado exposta a
vários sismos desde a sua construção no século XIII, é em 26 de Setembro de 1997 que iria
colapsar parcialmente (fig. 54 e 55).
Figura 54 Imagens do momento do colapso da abóbada da Basílica de S. Francisco de Assis (National Geographic)
Os danos provocados consistiram na abertura de falhas, deformação permanente sobre as
abóbadas da basílica, bem como o colapso das abóbadas junto à fachada e junto do transepto
(onde se localizam as naves) o qual também parcialmente ficou destruído.
Croci (2000 e 2001) atribui também o efeito destruidor do sismo a factores que aumentaram a
vulnerabilidade do monumento: a deterioração da argamassa de união das pedras constituintes
da alvenaria, provocando a redução da coesão desta, e, consequentemente, permitindo o
deslizamento e queda das pedras; a existência de um enchimento desagregado nas abóbadas
constituído por um amontoado de telhas partidas e outros materiais não coesos acumulados ao
longo dos anos, que vai actuar numa única direcção durante um sismo não apresentando
assim uma resistência à resposta da abóbada, e, como tal, permitindo um aumento das
deformações permanentes desta.
Assim, segundo Croci, o enchimento por si só pode não constituir uma mais valia na resposta
de um arco (ou abóbada) a uma acção dinâmica, sendo que o seu efeito depende do material
como já referido, o aumento da resistência do arco aos impulsos laterais, e a possibilidade do enchimento permitir aumentar a área de passagem da linha neutra são algumas das vantagens deste a quando em estado estático
1
95
que o constitui e da sua coesão. Este efeito negativo da massa do enchimento foi absorvido
pelo efeito positivo não sendo, por isso, observado neste trabalho. Tanto para o arco de
Oppenheim, como para o arco semi-circular com as características definidas no segundo e
terceiro caso de estudo, o peso do enchimento não teve qualquer influência no primeiro, e
aumentou a capacidade resistente do segundo. Contudo, são necessários mais testes,
admitindo diferentes geometrias e modelações, para excluir a hipótese de que o peso do
enchimento do extradorso actua desvaforavelmente, aumentando a vulnerabilidade da
estrutura submetida a uma acção dinâmica.
Figura 55 Colapso da abóbada da Basílica de S. Francisco de Assis (Itália) depois do sismo de 1997 (http://www.ansa.it/)
A modelação adoptada neste terceiro caso de estudo surge no seguimento de outros estudos
sobre o efeito do enchimento do extradorso no comportamento do arco em estado estático já
objecto de estudo de diversos autores (Gago, 2004; Gilbert, 2007; Rouxinol, 2007). Rouxinol
(2007), na sua análise estática do arco, considera o enchimento recorrendo ao um modelo
diferente do utilizado neste trabalho. Esse modelo alternativo à modelação de elementos
através de blocos, cada vez mais utilizado, é aquele que recorre a partículas para essa
modelação. Nestes modelos, os elementos são representados numa assemblagem de círculos
ou esferas, originalmente sugeridos para a simulação de solos ou outros materiais do tipo
granular. Para a definição do contacto entre estes elementos existem variadas possíveis leis
constitutivas.
6.6 Síntese
Neste sexto capítulo apresentam-se três casos de estudo que, baseados na revisão teórica
anteriormente elaborada, pretendem: (1) a confirmação dos valores de Oppenheim (1992),
para a aceleração mínima, que provocam o colapso no seu arco padrão de abertura 157,5˚, e a
comparação destes com os das acelerações provocam o mecanismo para um arco semi-
96
circular; (2) o estudo dos efeitos do enchimento do extradorso no comportamento do arco, em
estado dinâmico, considerando apenas o seu peso; (3) o estudo dos efeitos no comportamento
do arco, do enchimento do extradorso, modelando-o com elementos discretos, quando sujeito a
acção sísmica.
Para os dois primeiros casos de estudo foram considerados os dois arcos com ângulos de
abertura de valores 157,5˚ e 180˚. O estudo de cada um dos arcos foi realizado considerando-
os inicialmente em estado estático, ou seja, quando sujeitos a uma força horizontal
considerando a sua massa multiplicada por uma aceleração constante, que se faz variar.
Depois, foram realizados dois estudos considerando estado dinâmico: num deles aplicou-se a
força horizontal anterior, desta vez variável, e no outro verificou-se o efeito em cada arco
quando sujeito a uma aceleração constante na base que o suporta.
Os valores obtidos, no estudo em estado estático, para as acelerações mínimas que provocam
o mecanismo, aproximam-se dos valores considerados por Oppenheim (1992), mas, no estudo
dinâmico, essa similaridade de valores surge só com os derivados da aplicação da força
variável horizontal. Quando os arcos são sujeitos a uma aceleração constante na sua base, os
valores já não apresentam a similitude. Essa diferença reside no facto de o sistema modelado
não ser perfeitamente rígido e, como tal, as análises dinâmicas não provocarem iguais
resultados, ocorrendo uma amplificação da resposta, além de Oppenheim (1992) não
considerar na sua análise efeitos geometricamente não lineares que o UDEC, por sua vez,
considera.
No segundo caso de estudo, o enchimento do extradorso apresenta-se vantajoso na
estabilidade do arco semi-circular, não se verificando, contudo, qualquer efeito deste no arco
de Oppenheim.
No terceiro caso de estudo, quando modelado o enchimento do extradorso, tratando-se
novamente de um arco semi-circular, a estabilidade do arco aumenta, concluindo-se que o
enchimento trará vantagens para a estabilidade do arco, quando este for originalmente instável.
Conclui-se que, para uma acção dinâmica, apesar de o enchimento implicar um acréscimo de
peso na estrutura e portanto um aumento da acção dinâmica proporcional à massa da
estrutura, este exerce um efeito vantajoso em estruturas instáveis como o arco semi-circular ou
não apresenta qualquer influência para o arco de Oppenheim, não se tratando nunca de um
condicionante negativo para a resistência da estrutura ou para a sua estabilidade.
A modelação do enchimento com elementos discretos obteve resultados diferentes daqueles
obtidos através de uma modelação considerando apenas o seu peso. Conclui-se, assim, que
ambas as modelações não são equivalentes, sendo necessário a execução do modelo mais
complexo de elementos discretos para considerar a influência do enchimento do extradorso na
rigidez da estrutura.
O segundo e o terceiro caso de estudo revelam não existir um efeito desfavorável do peso do
enchimento no comportamento do arco sujeito a uma acção dinâmica. É, todavia, necessário
97
um maior número de estudos, com uma maior diversidade de geometrias e propriedades do
arco para excluir a hipótese de o enchimento actuar desfavoravelmente.
98
99
Parte IV – Conclusões Finais
7. Conclusões
7.1 Conclusões Gerais
Com a valorização da reabilitação patrimonial dos edifícios antigos, da conservação e restauro
das construções, tem vindo a dar-se cada vez maior atenção à avaliação da segurança,
prevenção de danos e reforço estruturais, particularmente quando, como é bastante frequente,
se dá o caso se situarem em zonas de elevado risco sísmico.
Todos estes aspectos que envolvem compreensão do funcionamento das estruturas, hoje em
dia, não são alheios a uma modelação eficaz da estrutura. Depois da popularização da
utilização do betão armado, os antigos métodos de dimensionamento foram abandonados
resultando no seu esquecimento e necessidade de actualização. Por outro lado, as novas
tecnologias que permitem uma modelação computacional não prevêem, na sua maioria, o
comportamento descontínuo da alvenaria presente na grande maioria dos edifícios antigos.
O presente trabalho focou o comportamento estrutural do arco em alvenaria procurando
conhecer a resposta deste, tanto a acções estáticas como dinâmicas, procurando uma
verificação mais eficiente da segurança desta estrutura. Este estudo do comportamento do
arco, no que diz respeito às forças que lhe são aplicadas, à sua geometria e ao tipo de
verificação que se pretende – equilíbrio ou resistência –, tinha como particular objectivo
conhecer a influência do enchimento do extradorso no comportamento do arco sujeito a uma
acção dinâmica.
Para atingir o objectivo proposto nesta dissertação, dividida em duas partes essenciais —
estudo do comportamento do arco em estado estático e em estado dinâmico — foi inicialmente
estudado o comportamento estrutural do arco e o efeito neste do enchimento do extradorso em
estado estático. De seguida, estudou-se o comportamento do arco em alvenaria em estado
dinâmico, procurando-se compreender as dificuldades que surgem com esta análise e as
diferenças comparativamente a uma análise estática. Finalmente, foi aplicado o enchimento ao
arco tendo-se verificado que, também sob acções dinâmicas, este confere ao arco,
nomeadamente o semi-circular, uma maior estabilidade, e como tal é vantajosa a sua
consideração na modelação desta estrutura.
Um estudo adequado das estruturas em alvenaria, não sendo possível através dos métodos
convencionais dos dias de hoje, torna necessário conhecer as antigas metodologias que
permitiram a execução de arcos neste material. Assim, na primeira parte - estudo do
comportamento do arco em estado estático – elaborou-se uma revisão bibliográfica das
técnicas de dimensionamento e regras de análise para estruturas do tipo arco onde, estas
foram apresentadas e desenvolvidas à luz dos actuais conceitos da mecânica estrutural,
referidos nos trabalhos de Gago (2004), Kurrer (2008), Nunes (2010), Rouxinol (2007) e de
100
Block e Ochsendorf (2007) no que concerne ao método das linhas de pressões.
No que diz respeito, às metodologias estudadas salientou-se o conceito de linha de pressões
constante ao longo deste trabalho. Concluiu-se que, sempre que for possível a sua inclusão no
interior da espessura do arco, a estabilidade deste está garantida e a sua segurança verificada.
Trata-se, portanto, de uma metodologia vantajosa pela sua simplicidade e eficiência.
A segunda parte do estudo incidiu no comportamento do arco em alvenaria sujeito a uma
acção dinâmica, baseando-se este trabalho nos estudos de Housner (1941), Oppenheim
(1992), Sincraian (2001) e DeJong (2009). Pretendeu-se compreender os efeitos que a
variação da geometria do arco tem no seu comportamento sob os efeitos de uma acção
dinâmica. Assim, constatou-se que, através do conhecimento da aceleração mínima que
provoca o mecanismo, esta pode ser utilizada como valor limite entre a estabilidade e o
colapso, ou seja, como verificação de segurança.
Apresentadas as técnicas antigas seguindo a sua cronologia, esta dissertação explorou os
métodos computacionais, nomeadamente o método dos elementos discretos, utilizando para a
modelação da sua estrutura o programa UDEC. Este programa insere-se no método dos
elementos discretos que se apresenta como a mais eficiente e correcta opção para a
modelação do arco em alvenaria. A sua capacidade em permitir deslocamentos consideráveis
entre elementos, bem como a actualização destes ao longo do procedimento, possibilita a
representação do comportamento descontínuo da alvenaria, apresentando contudo
dificuldades. A representação dos materiais apresentou-se um desafio, bem como a decisão
dos valores de amortecimento para as análises estáticas e dinâmicas.
Procedeu-se, assim, à calibração do programa e, a partir, daí elaboraram-se três casos de
estudo. O primeiro abordou o arco de características geométricas definidas por Oppenheim
(1992) e comparou-o com o arco semi-circular, confirmando a maior estabilidade do primeiro
através da comparação das acelerações mínimas que despoletam o mecanismo de ambos.
O segundo caso estudou o enchimento do extradorso, representando-o através do seu
carregamento, e as suas influências no comportamento do arco sujeito a um estado dinâmico.
O terceiro apresentou a modelação do enchimento do extradorso através de elementos
discretos. Compararam os resultados obtidos com a modelação com o enchimento
representado pelo seu peso e com a modelação considerar o enchimento.
No que concerne ao primeiro caso de estudo, obteve-se a aceleração mínima que provoca o
despoletar do mecanismo, fazendo-se variar o seu ângulo de abertura. Pretendeu-se conhecer
a aceleração máxima a partir da qual se despoleta o mecanismo de colapso e compará-la com
o valor estipulado por Oppenheim (1992) (0,37*g para o arco de Oppenheim e 0,16*g para o
arco semi-circular). Assim, numa análise estática, aplicou-se, ao arco de Oppenheim e a um
arco de 180º de abertura, forças horizontais constantes de valor F=m*a, ao nível dos centróides
das aduelas. Na análise dinâmica, sujeitaram-se os arcos tanto a forças horizontais variáveis
no tempo aplicadas aos centróides das aduelas, como a valores de aceleração constantes
101
aplicados ao nível da base. Concluiu-se que o colapso acontece para acelerações inferiores
relativamente ao arco no estado quase-estático, dado existirem efeitos geométricos não
lineares e por não se tratar de um sistema perfeitamente rígido ocorrendo como tal
amplificação de esforços.
Ainda, relativamente ao primeiro caso concluiu-se que, para o arco de Oppenheim (157,5 º), o
valor obtido, 0,29*g, ficou próximo do valor por ele obtido (0,37*g). No caso do arco de 180º, o
valor de aceleração obtido neste estudo, 0,12*g, aproxima-se igualmente do valor teórico
(0,15*g). Os resultados obtidos para o arco semi-circular são inferiores aos do arco de
Oppenheim, pois o primeiro arco é mais instável devido à sua geometria.
No segundo caso de estudo, que visava analisar o efeito do enchimento do extradorso na
estabilidade do arco num estado dinâmico, representando-se o enchimento através do seu
carregamento, repetiu-se o procedimento realizado no primeiro caso de estudo para os
mesmos arcos, agora com o peso do enchimento aplicado à respectiva aduela e concluiram-se
os seguintes aspectos:
Constatou-se que o colapso, no arco de Oppenheim (157,5º) acontece, com ou sem
enchimento para a aceleração de 0,29*g. Assim, para este arco, conclui-se que parece não
existir vantagem no enchimento para a estabilidade do arco.
Para o arco de 180º, a aceleração mínima que despoleta o colapso foi, no caso de se
considerar o enchimento, o dobro da que provoca o colapso sem ele. Conclui-se pois que,
nesta situação, de grande instabilidade devido à geometria do arco, a existência de enchimento
influencia significativamente a sua estabilidade.
No terceiro, e último, caso de estudo, similar ao referido anterior, modelou-se agora o
enchimento através de elementos discretos e não de forma representativa pelo carregamento
que exerce. Consideraram-se três situações, todas elas sujeitas a um sismo de características
idênticas ao ocorrido em Portugal, em 1969, majorando-se a intensidade de aceleração do
sismo com um escalar (λ) que se fez variar até os arcos atingirem o colapso. Na primeira, a
modelação dizia respeito a um arco semelhante ao de Brigemill com algumas diferenças a nível
geométrico (raio médio 10 m e espessura de 1,5 m). Na segunda, o arco considerado possuía
as mesmas características mas foi sujeito ao peso do enchimento. Na última, idêntica à
anterior, o enchimento foi modelado com elementos independentes. Conclui-se que, como já
observado num estado estático, o enchimento confere ao arco uma estabilidade acrescida e,
como tal, a aceleração mínima necessária para provocar o colapso é superior àquela do arco
sem enchimento, particularmente no arco semi-circular. Os resultados entre o segundo e
terceiro caso de estudo (modelando o enchimento através do peso e através de elementos
discretos) verificaram-se afastados pelo que se conclui que para uma adequada consideração
da resistência exercida pelo enchimento do extradorso na resposta dinâmica do arco, é
necessária a modelação do enchimento através de elementos discretos. Observa-se não
existirem efeitos desfavoráveis na estabilidade do arco, quando apenas se considera o peso do
enchimento. Contudo esta hipótese poderá apenas ser excluída através de estudos futuros que
102
incluam um maior leque de geometrias de arco, incluindo arcos não circulares.
7.2 Alguns Contributos da Investigação
O arco é uma estrutura amplamente abordada, tanto a nível nacional como internacional.
Todavia, o foco dos estudos realizados sobre este tema, de uma perspectiva estática, tem
vindo a deslocar-se integrando mais recentemente o seu comportamento dinâmico.
Com o objectivo de compreender e dominar a análise do comportamento do arco em alvenaria,
impossível de analisar correctamente com as metodologias aplicáveis às estruturas actuais,
Gago (2004) e Rouxinol (2007) realizaram estudos, onde apresentam uma ampla revisão de
metodologias antigas, ainda hoje de possível utilização, e que servem de base às novas
metodologias computacionais. Além disso, estes autores abordam, na sua análise das
características e parâmetros condicionantes do comportamento do arco em alvenaria, o efeito
do enchimento do extradorso, embora considerando-o apenas em estado estático.
Se, pela sua complexidade, o arco é uma estrutura recorrentemente estudada, a alvenaria e a
sua natureza descontínua serve de tema a outras investigações. Lemos (2007) e Lourenço
(2001) são alguns dos autores que exploram as características deste material e que procuram
compreender qual a modelação que reproduz os resultados mais fidedignos.
Sincraian (2001) estuda, em Portugal, as estruturas em alvenaria — parede, pilar e arco —
agora em análise dinâmica e apresenta, as vantagens da utilização do método dos elementos
discretos.
Destacam-se, igualmente, alguns investigadores a nível internacional, cujos trabalhos serviram
de base a este estudo e acrescentam o conhecimento e compreensão a este campo de
pesquisa.
Entre eles, Block e Ochsendorf (2005 e 2007) cujos estudos visam ganhos em termos da
verificação de segurança do arco, nomeadamente através de acréscimo de rapidez e
generalização do procedimento, baseando-se principalmente no método gráfico interactivo das
linhas de pressões.
Kurrer (2008) propõe uma relevante e extensa revisão bibliográfica de todas as teorias de
estruturas, focando-se, entre outras, no arco e nos métodos que foram surgindo ao longo da
história para compreender o seu comportamento, procurando simultaneamente tornar claro o
fio condutor que esteve por detrás dessa evolução.
A investigação de Nunes (2010), centrada especificamente no arco, apresenta uma discussão
crítica analítica do desenvolvimento das teorias sobre o comportamento do arco e dos métodos
de base científica para o dimensionamento dessas estruturas. A sua análise percorre o período
histórico que se estende do século XV, com Leonardo da Vinci, até meados do século XX, às
vésperas do desenvolvimento dos metódos numéricos, salientando particularmente as
contribuições, entre outras, de La Hire e Coulomb e as Teorias Elástica e Plástica.
Grandjean (2010) estuda a alvenaria e a influência dos seus constituintes no seu
103
comportamento mecânico e, ainda, analisa diversos exemplos de pontes em alvenaria de
pedra.
Housner (1941), questiona o comportamento dinâmico do bloco obtendo a aceleração mínima
que despoleta o mecanismo de colapso e os factores que condicionam este mecanismo.
Oppenheim (1992) continua os estudos de Housner (1941), aplicando-os, desta vez, ao arco
em alvenaria. Define o mecanismo de colapso do arco, a aceleração mínima que o provoca e
como esta se relaciona com a geometria da estrutura. Conhecendo esse valor mínimo de
aceleração, utiliza-o como limite entre o equilíbrio e o colapso e elabora curvas de colapso.
Estuda ainda a influência da duração do impulso na resposta do arco em alvenaria.
Partindo dos resultados alcançados nas investigações de Oppenheim (1992), DeJong (1992)
faz incidir os seus estudos outros domínios de resposta para além do equilíbrio e colapso do
arco. Este investigador estabelece o paralelo bloco/arco baseando-se nos trabalhos de
Housner (1941) e Oppenheim (1992) e verifica as hipóteses destes autores recorrendo ao
método dos elementos discretos.
7.3 Desenvolvimentos Futuros
Apesar de serem conhecidas as metodologias que estiveram por detrás da construção de
edifícios históricos, não foi explicitada uma análise comparativa entre estes métodos, nem a
sua aplicação a casos hipotéticos ou reais, pelo que se julga constituírem aspectos
merecedores de atenção particular.
Na análise do arco com pé direito, apresentada neste trabalho de forma teórica, foi sempre
considerado o comportamento contínuo das colunas suportantes do arco. Sendo estas
igualmente executadas em alvenaria, essa continuidade não corresponde a uma hipótese real
e poderá condicionar a estabilidade do arco, sendo sugerida a sua modelação de forma
descontínua.
Apesar de apresentada uma análise da dinâmica do arco através do método das linhas de
pressões, a acção dinâmica foi representada através de uma inclinação da base. A
possibilidade da aplicabilidade das linhas de pressões na análise de uma estrutura sujeita a
uma acção horizontal, ainda por definir, é outra vertente aberta à investigação.
No que diz respeito ao programa UDEC, salienta-se a necessidade de estudos que visem a
melhoria da interface deste para tornar a sua modelação mais intuitiva e acessível a novos
utilizadores.
Relativamente aos modelos aqui apresentados, sugere-se a sua repetição, com particular
cuidado no que diz respeito à calibração do amortecimento que, neste trabalho, foi
simplificadamente assumido como nulo.
Relativamente à verificação dos efeitos do peso do enchimento do extradorso no
comportamento dinâmico do arco, sugerem-se futuras modelações com maior diversidade de
geometria e propriedades mecânicas de modo a excluir, com maior certeza, o efeito
104
desfavorável deste.
O terceiro modelo considera um afastamento das paredes de tímpano de valor duas vezes o
raio, sendo sugerido que se procure qual o valor mais adequado para evitar a influência destas
na estabilidade do arco.
I
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