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ANÁLISE NUMÉRICA DA INFLUÊNCIA DO AUMENTO DA CARGA POR EIXO NO COMPORTAMENTO MECÂNICO DE UM PAVIMENTO FERROVIÁRIO Lorena Silva Lopes Instituto Militar de Engenharia COPPE/UFRJ Antonio Calos Rodrigues Guimarães Instituto Militar de Engenharia Francisco Thiago Sacramento Aragão COPPE/UFRJ RESUMO Este estudo apresenta a avaliação da influência de diferentes níveis de carregamento sobre o comportamento tensão-deformação dos elementos da via permanente através dos conceitos da mecânica dos pavimentos. Para tal, elencou-se o SysTrain como ferramenta de análise numérica, este software calcula os deslocamentos, tensões e esforços no pavimento pelo método dos elementos finitos. Desta forma, utilizou-se como dados de entrada para as avaliações uma seção ferroviária heavy haul típica. Avaliou-se o impacto no comportamento estrutural de cada componente da via frente ao aumento da carga por eixo prevista para os próximos anos. À vista disso, o Systrain se mostrou eficiente para a realização das análises e evidenciou-se a necessidade de uma melhor definição dos critérios de projeto de via permanente. ABSTRACT This work presents the evaluation of the influence of different load increments on the stress-strain behavior of the track elements through the concepts of pavement mechanics. Systrain was chosen to develop a numerical analysis, this software calculates the displacements and stresses in the pavement by the finite element method. Therefore, a typical heavy haul rail section was used as input data for the evaluations. The impact on the structural behavior of each track component was evaluated against the increase in the axle load expected in the coming years. Consequently, Systrain proved to be efficient in carrying out the analyses and there was a need for a better definition of the permanent track design criteria 1 INTRODUÇÃO O sistema de transporte ferroviário é uma importante parte da infraestrutura de transporte de um país, pois desempenha um papel significativo na manutenção de uma economia saudável. De um modo geral, as ferrovias de carga pesada (heavy haul) tem como finalidade o transporte do maior volume de carga possível, com o menor tempo e com a garantia de segurança na operação dos trens. O Anuário CNT 2017 (Confederação Nacional de Transporte) mostra que em 2016 as ferrovias brasileiras foram responsáveis pelo volume transportado de 341,2 bilhões de TKU (Toneladas por Quilômetro Útil). O que representa um crescimento de 43,1% no total de TKU produzidas pelo transporte ferroviário nos últimos dez anos. Outra informação relevante sobre o assunto trata do Programa de Investimento em Logística (PIL) que prevê, já na sua segunda etapa, um investimento de 86,4 bilhões em infraestrutura ferroviária. Deste total, 16 bilhões destinam-se a novos investimentos em concessões existentes. Para suprir esta crescente demanda de transporte diferentes alternativas podem ser adotadas, entre elas pode-se destacar o aumento da carga por eixo. Quando trata-se de aumento de capacidade de carga, esta alternativa é de grande valia, visto os benefícios econômicos atingidos do ponto de vista operacional. Entretanto, o aumento demasiado da carga por eixo pode expor a via a uma condição de carregamento para a qual ela não foi projetada. Desta

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ANÁLISE NUMÉRICA DA INFLUÊNCIA DO AUMENTO DA CARGA POR EIXO NO COMPORTAMENTO MECÂNICO DE UM PAVIMENTO FERROVIÁRIO

Lorena Silva Lopes

Instituto Militar de Engenharia COPPE/UFRJ

Antonio Calos Rodrigues Guimarães

Instituto Militar de Engenharia

Francisco Thiago Sacramento Aragão COPPE/UFRJ

RESUMO Este estudo apresenta a avaliação da influência de diferentes níveis de carregamento sobre o comportamento tensão-deformação dos elementos da via permanente através dos conceitos da mecânica dos pavimentos. Para tal, elencou-se o SysTrain como ferramenta de análise numérica, este software calcula os deslocamentos, tensões e esforços no pavimento pelo método dos elementos finitos. Desta forma, utilizou-se como dados de entrada para as avaliações uma seção ferroviária heavy haul típica. Avaliou-se o impacto no comportamento estrutural de cada componente da via frente ao aumento da carga por eixo prevista para os próximos anos. À vista disso, o Systrain se mostrou eficiente para a realização das análises e evidenciou-se a necessidade de uma melhor definição dos critérios de projeto de via permanente. ABSTRACT This work presents the evaluation of the influence of different load increments on the stress-strain behavior of the track elements through the concepts of pavement mechanics. Systrain was chosen to develop a numerical analysis, this software calculates the displacements and stresses in the pavement by the finite element method. Therefore, a typical heavy haul rail section was used as input data for the evaluations. The impact on the structural behavior of each track component was evaluated against the increase in the axle load expected in the coming years. Consequently, Systrain proved to be efficient in carrying out the analyses and there was a need for a better definition of the permanent track design criteria

1 INTRODUÇÃO

O sistema de transporte ferroviário é uma importante parte da infraestrutura de transporte de um país, pois desempenha um papel significativo na manutenção de uma economia saudável. De um modo geral, as ferrovias de carga pesada (heavy haul) tem como finalidade o transporte do maior volume de carga possível, com o menor tempo e com a garantia de segurança na operação dos trens. O Anuário CNT 2017 (Confederação Nacional de Transporte) mostra que em 2016 as ferrovias brasileiras foram responsáveis pelo volume transportado de 341,2 bilhões de TKU (Toneladas por Quilômetro Útil). O que representa um crescimento de 43,1% no total de TKU produzidas pelo transporte ferroviário nos últimos dez anos. Outra informação relevante sobre o assunto trata do Programa de Investimento em Logística (PIL) que prevê, já na sua segunda etapa, um investimento de 86,4 bilhões em infraestrutura ferroviária. Deste total, 16 bilhões destinam-se a novos investimentos em concessões existentes. Para suprir esta crescente demanda de transporte diferentes alternativas podem ser adotadas, entre elas pode-se destacar o aumento da carga por eixo. Quando trata-se de aumento de capacidade de carga, esta alternativa é de grande valia, visto os benefícios econômicos atingidos do ponto de vista operacional. Entretanto, o aumento demasiado da carga por eixo pode expor a via a uma condição de carregamento para a qual ela não foi projetada. Desta

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forma, pode-se ocasionar uma aceleração na degradação do pavimento levando este a atingir o fim da sua vida útil antes do tempo previsto. Prática esta que pode levar a gastos onerosos devido a intervenções precoces e mais frequentes (ou mais robustas), além de acarretar problemas operacionais. Logo, exige uma análise cautelosa para ser implementada. Com o propósito de realizar um diagnóstico efetivo do comportamento dos elementos que compõe a via férrea, torna-se indispensável a utilização de ferramentas adequadas, para isto, a mecânica dos pavimentos aliada a utilização de softwares de análise numérica tornam-se peças chave na avaliação do impacto do aumento da carga por eixo nos componentes da via. Assim sendo, o presente trabalho propõe-se a avaliar os efeitos do aumento do volume transportado na propagação de tensões, esforços e deslocamentos de uma seção ferroviária de carga pesada. Para tal, elencou-se o SysTrain como ferramenta computacional, este software destina-se puramente ao estudo de pavimentos ferroviários pelo método dos elementos finitos. Desta forma, utiliza-se como dados de entrada para as avaliações uma seção ferroviária heavy haul típica, faz-se uma análise com dois níveis de carregamentos distintos e avalia-se o impacto no comportamento estrutural dos componentes da via.

2 VIA PERMANENTE FERROVIÁRIA

Trata-se por Via Permanente ou pavimento ferroviário a estrutura responsável por guiar de maneira eficiente, estável e segura as rodas dos veículos (motores e rebocados) sob diferentes condições ambientais e operacionais, tais como variações de temperatura, carregamento ou velocidade. Para tal, o conjunto de instalações que compõem a via deve manter cada um de seus componentes exercendo sua devida função de maneira satisfatória e, além disso, preservar o adequado alinhamento lateral e vertical da estrutura. (ABNT NBR 7641:1980; SELIG & WATERS, 1994; INDRARATNA, 2011; NABAIS, 2014 e MEDINA & MOTTA, 2015) Este sistema composto por múltiplas camadas, usualmente agrupadas em infra e superestrutura, possui como função primordial resistir e distribuir ao subleito os esforços verticais produzidos pelo tráfego e do clima. Existem divergências entre os autores quanto aos elementos que compõe as seções deste pavimento, principalmente no que tange a literatura estrangeira. No Brasil e para efeitos desta pesquisa, refere-se a estes componentes como (ABNT NBR 7641:1980; BRINA, 1983; NABAIS, 2014 e MEDINA & MOTTA, 2015): Superestrutura: Seção superior da Via Permanente que suporta diretamente os esforços oriundos da passagem dos veículos e os transmite à infraestrutura da via através da complexa interação entre seus componentes. Os principais elementos constituintes deste segmento são: (i) trilhos, (ii) fixações e acessórios, (iii) dormentes, (iv) lastro e, quando necessário, (v) sublastro e (vi) aparelhos de mudança de via. Infraestrutura: Conjunto de obras destinado a formar a plataforma da ferrovia e suportar a superestrutura. A infraestrutura é composta por todas as obras abaixo do greide de terraplenagem, incluindo: (i) subleito, (ii) terraplenagem (aterros e cortes), (iii) elementos de drenagem superficial e profunda, (iv) taludes de corte e aterro, (v) obras de arte correntes e especiais (pontilhões, pontes e viadutos) e (vi) túneis.

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3 MECÂNICA DO PAVIMENTO FERROVIÁRIO

A terminologia “pavimento ferroviário” proposta pelo prof. Jacques de Medina em 1988 expressa a semelhança do mesmo com os demais tipos de pavimento, assim sendo os conceitos instituídos pela mecânica dos pavimentos também são aplicáveis. A mecânica dos pavimentos é uma disciplina da engenharia civil que estuda o pavimento como sistemas em camadas que atuam de forma combinada com o objetivo de resistir aos esforços oriundos do tráfego dos veículos e do clima. Dimensionar esta estrutura requer a escolha de materiais e espessuras de acordo com as condições a que esta é exposta: (i) tráfego, (ii) clima, (iii) condições particulares, tais como, subleito, topografia, drenagem e técnicas construtivas; e (iv) critério de ruptura. (MOTTA, 2015) A utilização de um método mecanístico-empírico requer o cálculo de tensões e deformações (parcela mecanística), definição de critérios de desempenho (parcela empírica) e, além disso, é sempre um método de verificação, ou seja, “adotam-se espessuras para os materiais escolhidos e comparam-se as tensões e deformações calculadas com as admissíveis”. (MOTTA, 2015) Portanto, segundo MEDINA & MOTTA (2015), o roteiro de dimensionamento mecanístico segue os seguintes passos:

1. Definir o número N de projeto considerando as informações de tráfego. 2. Ensaiar os materiais disponíveis na região e no subleito para se obter seus parâmetros

de deformabilidade, considerando as variações de umidade que possam ocorrer. 3. Adotar espessuras iniciais. 4. Calcular o estado de tensão-deformação atuante na estrutura composta com cada

material (caso exista várias opções de material). Escolher o programa de cálculo de tensões a ser utilizado.

5. Comparar as tensões-deformações com critérios de ruptura estabelecidos. Definir o grau de confiabilidade.

6. Se as espessuras adotadas atendem os valores admissíveis o dimensionamento foi finalizado. Caso algum dos critérios não for atendido, alterar as espessuras e refazer os cálculos.

3.1 SysTrain

Esta ferramenta computacional foi desenvolvida para auxiliar na avaliação do comportamento estrutural do pavimento por meio do método dos elementos finitos. Como dados de entrada para manejo do software são necessárias informações referentes a geometria da via, aos materiais de seus componentes e ao carregamento.

4 METODOLOGIA DA PESQUISA

A metodologia adotada no presente trabalho corresponde a uma pesquisa experimental com o auxílio de um software de análise de tensões desenvolvido especialmente para a área ferroviária, o SysTrain. Para tal, dados do projeto executivo do trecho 30-31 da duplicação da Estrada de Ferro Carajás apresentado por SOUTO (2010) serão utilizados como dados de entrada do programa mencionado. Abaixo são apresentados os inputs utilizados nas simulações que se referem aos parâmetros pré-definidos no projeto.

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4.1 Dados de entrada

4.1.1 Geometria

A alimentação do software inicia-se na aba referente as características geométricas da via, esta divide-se nos seguintes itens: Trilhos:

Bitola: 1,6 m; Nome da seção: TR-68. Dados complementares estabelecidos pelo projeto: aço carbono, formado por barras longas (TLS), de 384,00m, correspondente a 16 barras de 24,00m soldadas em estaleiro, e para segmentos em curvas com teores relativamente altos de manganês e silício, laminados a quente e convenientemente resfriados após a laminação. Dormentes:

Dormentes monobloco de concreto protendido em seção trapezoidal com as seguintes dimensões: (i) espaçamento: 61 cm, (ii) comprimento: 2,8 m, (iii) altura: 22,5 cm, (iv) largura inferior: 30 cm e (v) largura superior: 26 cm. Lastro:

Rocha britada com altura de 30 cm sob o dormente no alinhamento do trilho interno. Outros dados: (i) ombreira: 40 cm, (ii) declividade do talude (H:V): 1, (iii) declividade do fundo: 3%, (iv) tipo de declividade do fundo: direita e (v) encobrimento do dormente: Sim Camadas:

Além destes elementos foram inseridos dados relacionados ao sublastro e ao subleito do pavimento. O sublastro apresenta 25 cm de altura, ombeira de 0,5 m, talude (H:V) de 1,2 e fundo de 1%. O subleito possui a seguinte geometria: altura de 200 cm, ombeira de 2m, talude (H:V) de 1,5 e fundo de 1%.

4.1.2 Materiais

Após a definição da geometria é necessário definir os tipos de materiais que serão utilizados para cada elemento, para isto são necessárias duas etapas. No primeiro momento é realizado o cadastro de todos os materiais a serem utilizados e, na sequência, atribui-se cada material ao seu respectivo componente. Neste item utilizou-se dados típicos sugeridos pelo software, exceto para o material de sublastro, nele os dados necessário estão relaciodaods ao modelo resiliente argiloso, portanto: (i) massa específica: 1730 kg/m3, (ii) coeficiente k1: 131.220.000 (coef. x 106), (iii) coeficiente k2: -0,232, (iv) Tensão desvio mínima: 1000 Pa, (v) módulo de elasticidade: 230000000 Pa.

Fig. 4.1. Seção transversal em aterro do pavimento ferroviário da duplicação da EFC no trecho 30-31. (SOUTO, 2010).

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As atribuições dos materiais são: (i) Trilho: Aço, (ii) Grampo: Grampo1, (iii) Dormente: Concreto, (iv) Lastro: Brita, (v) Sublastro: Solo1 e (vi) Subleito: Solo2.

4.1.3 Carregamento

As informações necessárias referentes ao carregamento abrangem dados dos vagões, da composição e do posicionamento do carregamento. A Fig. 4.2 ilustra o esquema de carregamento adotado para a análise 1, trata-se de uma composição de dois vagões GDT. Em função do aumento considerável da carga por eixo a análise 2 foi realizada com o vagão GDU. Os carregamentos verticais utilizados são: (i) Simulação 1: 32 t/eixo, carga atual praticada no Brasil e (ii) Simulação 2: 40 t/eixo, peso por eixo aplicado no estudo de SOUTO (2010) referente a duplicação da EFC e o carregamento utilizado na Austrália atualmente, o mais pesado do mundo.

Para o posicionamento das cargas aplicadas foram selecionados os truques entre vagões adjacentes e com a carga posicionada no centro do dormente. Este arranjo foi adotado por se tratar da condição mais severa imposta ao pavimento devido à proximidade dos dois truques. Os dados de entrada das seções de vagões, composição e posicionamento estão expostos a seguir: Simulação 1: Vagão do tipo GDT, dois truques e com as seguintes dimensões: (i) distância do engate ao eixos: 1,27 m, (ii) distância entre eixos: 1,8 m e (iii) distância entre truques: 5,4 m. Foi considerada uma composição de dois vagões com peso bruto de 128 t acrescido do fator dinâmico (1,4). Simulação 2: Vagão do tipo GDU, dois truques e com as seguintes dimensões: (i) distância do engate ao eixos: 1,17 m, (ii) distância entre eixos: 1,85 m e (iii) distância entre truques: 6,3 m. Foi considerada uma composição de dois vagões com peso bruto de 160 t acrescido do fator dinâmico (1,4). O coeficiente dinâmico foi determinado através das Eq. 3.1 e 3.2. A magnitude deste fator é afetada pelas seguintes variáveis: (i) velocidade da composição, (ii) carga estática da roda e diâmetro da roda, (ii) pacote de molas sólido e condição do veículo, (iii) condições da via (incluindo juntas, geometria da via e módulo de via) e (iv) aspectos construtivos da via e propriedades do lastro e sublastro. Equações utilizadas para a determinação do fator de

Fig. 4.2. Composição de dois vagões GDT (SOUTO, 2010).

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impacto por meio do método da Associação Americana de Engenharia Ferroviária, em inglês AREA (American Railway Engineering Association), (INDRARATNA, 2011):

Pd = φPs (3.1)

Onde, Pd é a carga de roda de projeto acrescida do efeito dinâmico, Ps é a carga estática de roda (kN) e φ é o fator de impacto (adimensional e maior que 1,0).

φ = 1 + 0,0052𝑉𝐷𝑤

(3.2) Onde, Dw é o diâmetro da roda (m) e V é a velocidade do trem (km/h). A velocidade diretriz de projeto foi aquela em que o coeficiente não ultrapassasse o valor de 1,4 para rodas com diâmetro de 965 mm (38”), portanto 80 km/h.

4.1.4 MEF

O último item trata da malha de elementos finitos, neste é feito a discretização da malha e as configurações do processamento, onde optou-se por utilizar o default do programa.

4.2 Critérios de verificação

4.2.1 Trilho

Na atual concepção de dimensionamento de via permanente a deflexão no trilho é o parâmetro que define a aceitação de uma seção de pavimento, pois fornece uma noção da elasticidade do conjunto. A recomendação do manual da AREA (1973) apud. SPADA (2002) recomenda uma deflexão vertical máxima permitida de 6,35mm. Outro parâmetro que pode ser verificado, segundo NABAIS (2014), refere-se a tensão de flexão máxima no trilho obtida através da equação:

𝜎 =𝑀𝑊

< 𝛾𝑎𝑑𝑚 Onde, M é o momento fletor máximo (kgf x cm), W é o módulo resistente do trilho (cm³) e 𝛾𝑎𝑑𝑚 é a tensão admissível de escoamento do aço. Para o autor, o valor de 𝛾𝑎𝑑𝑚 deve ser fixado entre 1.500 kg/cm2 (147 Mpa) e 1.750 kg/cm2 (172 Mpa). Por fim, pode-se verificar o trilho quanto ao seu momento máximo de acordo com o método de Zimmermann (NABAIS, 2014), está exposta a seguir:

𝑀𝑚á𝑥 =7 + 8𝛾

8(5 + 2𝛾).𝑃.𝐶𝑑.𝑎

𝛾 =6𝐸𝐽𝐷𝑎3

𝐷 = 0,9.𝐶𝑑. 𝑏. 𝑐

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Em que, E = módulo de elasticidade do trilho (kgf/cm2); J = momento de inércia do trilho (cm4); D = coeficiente de dormente; a = distância de eixo a eixo dos dormentes (cm); Cd = Coeficiente dinâmico; b = largura do dormente (cm); c = distância de apoio no sentido do comprimento do dormente (cm); P = carga de roda estática (kgf).

4.2.2 Dormente

As cargas verticais aplicadas pelo tráfego dos trens submetem o dormente a um momento de flexão, cuja a magnitude varia de acordo com a condição de lastro, de sua geometria, dimensões, peso e espaçamento. O manual da AREA apud. SPADA (2002) recomenda que os dormentes monobloco de concreto sejam produzidos com capacidade de suportar um momento fletor de 300.000lb.in (34,56 kN.m) sob o trilho e 200.000lb.in (23,04 kN.m) de momento negativo no centro.

4.2.3 Lastro

Uma das principais funções do lastro é resistir as tensões atuantes e transmitir as camadas adjacentes tensões compatíveis com a resistência dessas camadas. Para garantir que isso corra, o limite proposto pela AREMA apud. SPADA (2002) para este elemento, trata-se de uma tensão de contato admissível sobre o lastro de 0,4 MPa.

4.2.4 Sublastro e subleito

Para avaliação destas camadas, apesar de sua abordagem conservadora, é de uso comum na pavimentação a equação proposta por Heukelon e Klomp (1962):

𝜎𝑎𝑑𝑚 =0,006𝑀𝑅

1 + 0,7𝑙𝑜𝑔𝑁

Em que, MR é o módulo de resiliência (kgf/cm2) e N é o número de ciclos de aplicação de cargas. O número N foi definido pela utilização dos seguintes parâmetros: (i) número de trens/dia: 27 trens, (ii) dias de operação por ano: 365 dias, (iii) período de Projeto: 12 anos, (iv) fator considerando ida e volta dos trens nas duas linha: 4 e (v) fator considerando apenas a linha que está sendo dimensionada: 2. Logo:

N vagões = 27x365x12x330x4/2 = 7,81x107 N locomotivas = 27x365x12x6x4/2 = 1,42x106

N dim = 7,95x107

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Ao fim das interações numéricas no SysTrain, obteve-se dois cenários distintos os quais devem ser analisados adequadamente a fim de verificar se as tensões e deformações no pavimento são compatíveis com os critérios admissíveis de cada material empregado. Os resultados fornecidos pelo software são apresentados em formato 3D, gráficos XY e tabelas

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de valores máximos e mínimos. Alguns dos resultados obtidos serão mostrados nas próximas seções. A análise dos dormentes não foi realizada, pois de um modo geral os dormentes de concreto são verificados quanto a capacidade de suporte dos momentos fletores atuante. Entretanto, esta não é uma informação fornecida pelo software.

5.1 Simulação 01 - Carga estática por eixo: 32 toneladas

5.1.1 Trilho

A concepção de uma linha muito elástica pode vir a acarretar o problema conhecido como elevação da roda do topo do trilho (wheel lift) ou alívio de roda (roda passando no ar). Este é um dos mecanismos de descarrilamento e trata-se da inversão da força vertical, enquanto a força lateral permanece constante ou aumenta. Isto posto, ao verificar a deflexão no trilho quanto ao critério da AREMA, observa-se uma deflexão igual a 5,7 mm, que é inferior ao limite desejável. A Fig. 5.1 mostra uma seção no sentido longitudinal da via onde é possível ter uma noção da magnitude (escala de cores) e do posicionamento dos deslocamentos verticais no pavimento. Na Fig. 5.2 (a) é possível ver o aspecto da bacia de deflexões. A verificação da tensão à flexão e do momento fletor máximo foi realizada pela aplicação das Eq. 4.1 e 4.2. A tensão calculada é igual a 95 MPa e encontra-se abaixo da tensão admissível de escoamento do aço. O momento máximo simulado é da ordem de 37 kN.m, sendo este inferior ao momento admissível (68,61 kN.m). A Fig. 5.2 (b) apresenta o gráfico de momentos fletor ao longo da via.

18,217,015,814,613,412,211,09,88,67,46,25,0

0,0

-0,5

-1,0

-1,5

-2,0

-2,5

-3,0

-3,5

-4,0

-4,5

-5,0

-5,5

-6,0

-6,5

Posição ao longo da via (m)

mm

Fig. 5.2. (a) Deslocamento vertical. (b) Momento fletor. – Simulação 1.

Fig. 5.1. (a) Deslocamento vertical do pavimento (1x Auto) – Simulação 1.

17,515,012,510,07,55,0

40

30

20

10

0

-10

-20

-30

Posição ao longo da via(m)

kN.m

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5.1.2 Lastro

A tensão máxima de contato é da ordem de 0,2 Mpa e atende a recomendação da AREMA. As tensões na camada de lastro pode ser verificada na Fig. 5.4. Como esperado, os dormentes mais solicitados são os dormentes 8 e 12, posicionados próximos do engate. A distribuição de pressão de contato no lastro pode ser vista na Fig. 5.3.

5.1.3 Sublastro e subleito

A tensão admissível no topo das camadas de sublastro e subleito são determinadas pelo uso da Eq. 4.3. Tem-se que a tensão no topo do sublastro não deve ultrapassar o valor de 155 kPa e 72 kPa no subleito. Deste forma, o Solo 1 satisfaz o critério (147 kPa) e o Solo 2 não atende ao critério adotado (263 kPa). Apesar da atenção no dimensionamento estar voltada a deflexão no trilho os demais componentes podem não estar cumprindo sua função corretamente, o que acarretará

1,51,00,50,0-0,5-1,0-1,5

200

175

150

125

100

Posição transversal (m)

kPa

Borda ABorda B

Fig. 5.4. Distribuição das pressões no dormente 8 – Simulação 1.

Fig. 5.3. Tensão vertical total na camada de lastro. (1x Auto) – Simulação 1.

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diretamente em danos no pavimento. Neste caso, observa-se a deflexão máxima dentro do limite proposto pela AREMA, entretanto com o subleito sendo solicitado além da sua capacidade. Logo, poderão ocorrer afundamentos plásticos, ruptura por cisalhamento ou até mesmo expor os demais componentes a uma condição de rompimento por fadiga.

5.2 Simulação 02 - Carga estática por eixo: 40 toneladas

5.2.1 Trilho

Seguindo o procedimento de análise do item anterior, quanto ao critério da AREMA observa-se uma deflexão igual a 7,28 mm, por conseguinte superior ao limite admissível. A Fig. 5.5 fornece uma noção do deslocamento vertical do pavimento como um todo (seção no sentido longitudinal da via). Na referida imagem os resultados estão extrapolados para melhor visualização dos resultados. A bacia de deflexões está melhor apresentada no gráfico da Fig 5.6 (a).

Por meio da aplicação das Eq. 4.1 e 4.2, obtém-se o momento fletor máximo e a tensão a flexão atuante (85,75 kN.m). Ambas se encontram dentro do limite admissível. A tensão calculada é igual a 122 MPa e o momento máximo simulado é 47,5 kN.m.

Fig. 5.5. Deslocamento vertical do pavimento (1x Auto) – Simulação 2.

17,515,012,510,07,55,0

0

-1

-2

-3

-4

-5

-6

-7

-8

Posição ao longo da via (m)

mm

17,515,012,510,07,55,0

50

40

30

20

10

0

-10

-20

-30

Posição ao longo da via (m)

kN.m

Fig. 5.6. (a) Deslocamento vertical. (b) Momento fletor – Simulação 2.

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5.2.2 Lastro

A tensão máxima da camada é da ordem de 0,25 MPa, logo inferior ao limite proposto pela AREMA. Como esperado, os dormentes mais solicitados são os dormentes 8 e 12, posicionados próximos do engate. A distribuição de tensões na camada é similar a apresentada na Fig 5.4. Além disso, na Fig. 5.7 é possível visualizar as pressões de contato no lastro aplicadas no dormente 8.

5.2.3 Sublastro e subleito

As camadas de lastro e sublastro não atendem ao critério proposto por Heukelon e Klomp. As máximas tensões solicitada foram, respectivamente, 180 kPa e 278 kPa (compressão).

De maneira preliminar, foi possível verificar por meio da deflexão no trilho que as camadas granulares do pavimento apresentavam baixa rigidez. A questão chave a ser observada, diz respeito as propriedades da grade. Em ambos os casos o trilho, dormente e o lastro atendem as especificações, por consequência os componentes críticos nestes casos são os solos das camadas inferiores. O que demanda uma atenção especial para a seleção de materiais que irão compor as mesmas, visto que intervenções futuras serão dispensiosas.

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O método empírico de dimensionamento de pavimentos ferroviários é de uso corriqueiro no Brasil, uma abordagem simplista considerando os recursos disponíveis nos tempos atuais. Métodos mecânisticos baseiam-se nos parâmetros de deformabilidade de cada material para o cálculo das tensões e deformações no pavimento. O Systrain, software de análise de tensões e deformações atuantes no pavimento ferroviário, se mostrou eficiente para a realização das análises, além de apresentar uma interface com o usuário simples e autoexplicativa. Como mencionado anteriormente a deflexão é a principal restrição quando se trata de dimensionamento de via permanente. Isto porque, o deslocamento excessivo do trilho pode levar o a composição a tombar ou descarrilar. Além disso, esta deflexão é função não apenas

1,51,00,50,0-0,5-1,0-1,5

240

220

200

180

160

140

120

100

Posição transversal (m)

kPa

Borda ABorda B

Fig. 5.7. Distribuição das pressões no dormente 8 – Simulação 2.

Page 12: ANÁLISE NUMÉRICA DA INFLUÊNCIA DO AUMENTO DA ...transportes.ime.eb.br/etfc/monografias/MON114.pdfcompõe a via férrea, tornase indispensável a utilização de ferramentas adequadas,

das características do trilho, mas sim das propriedades elásticas de todas as camadas subsequentes. De fato, dada a tecnologia atual de trilhos e dormentes o aumento da carga por eixo e do espaçamento entre dormentes torna-se cada vez mais palpáveis. Entretanto, para que isto se torne possível faz-se necessário o uso de materiais devidamente selecionados para as camadas granulares do pavimento. Este fato é evidenciado pelas simulações apresentadas, já que 80% do deslocamento do trilho é oriundo das camadas de sublastro e subleito. Como esperado, a via passa a não atender todos os critérios quando a carga por eixo recebe um incremento. Visto que o problema estrutural encontra-se nas camadas granulares, vale ressaltar que estes elementos são de difícil acesso para manutenção, o que evidencia a necessidade de uma atenção diferenciada. Além disso, a concepção de um pavimento nestas condições acarretarão numa aceleração na degradação do pavimento. Portanto, a readequação dos critérios de dimensionamento devem ser entendidos como um modo de restringir os parâmetros de tal forma a reduzir os danos na via causados pela resposta do pavimento a passagem do tráfego e incorporar novos materiais para o uso em pavimentos, visto a possibilidade de uma análise mais acurada dos mesmos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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