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Ano VIII Nº 13 Semestral Janeiro de 2006 Salvador, BA · 4 ano viii † nº 13 † janeiro de 2006 † salvador, ba rde - revista de d esenvolvimento econÔmico sumÁrio 5 11 19

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Departamento de Ciências Sociais AplicadasPrograma de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Urbano

Ano VIII • Nº 13 • Semestral • Janeiro de 2006 • Salvador, BA

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2 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

INDEXAÇÃO:

A Revista de Desenvolvimento Econômico – RDE é indexada por:

– GeoDados: Indexador de Geografia e Ciências Sociais < http//www.geodados.uem.br >– Universidad Nacional Autónoma de México CLASE Citas Latinoamericanas en Ciencias Sociales y

Humanidades: < http://www.dgbiblio.unam.mx >

A RDE foi classificada pelo QUALIS da CAPES como Nacional A pelas áreas de Planejamento Urbano eRegional/Demografia (área do Programa responsável pela sua edição) e Arquitetura e Urbanismo.

Depósito legal junto à Biblioteca Nacional,conforme decreto nº 1.825, de 20 de dezembro de 1907.

Ficha Catalográfica – Sistema de Bibliotecas da Unifacs

RDE – Revista de Desenvolvimento Econômico. – Ano 1, n. 1, (nov. 1998).– Salvador: Departamento de Ciências Sociais Aplicadas 2 / Uni-versidade Salvador, 1998.

v.: 30 cm.SemestralISSN 1516-1684

Ano I, n. 1 (nov. 1998); Ano I, n. 2 (jun. 1999); Ano 2, n. 3 (jan. 2000);Ano 3 n. 4 (jul. 2001); Ano 3, n. 5 (dez. 2001); Ano 4, n. 6 (jul. 2002);Ano 4, n. 7 (dez. 2002); Ano 5, n. 8 (jul. 2003); Ano 6, n. 9 (jan. 2004);Ano 6, n. 10 (jul. 2004); Ano 7, n. 11 (jan. 2005); Ano 7, n. 12 (jul.2005); Ano 8, n. 13 (jan. 2006).

1. Economia – Periódicos. II. UNIFACS – Universidade Salvador.UNIFACS.

CDD 330

Pede-se permutaOn demande l´échangeWe ask for exchangePede-se canjeSi rischiede lo scamboMann bitted um austausch

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3Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BARDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA

EXPEDIENTE:Revista de Desenvolvimento Econômico

A Revista de Desenvolvimento Econômico é uma publicaçãosemestral do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimen-to Regional e Urbano da Universidade Salvador – UNIFACS.

UNIVERSIDADE SALVADOR – UNIFACS

REITOR:Prof. Manoel Joaquim F. de Barros Sobrinho

VICE-REITOR:Prof. Guilherme Marback Neto

PRÓ- REITOR DE GRADUAÇÃO:Profª Maria das Graças Fraga Maia

PRÓ- REITOR DE PÓS-GRADUAÇÃO:Prof. Luiz Magalhães Pontes

PRÓ-REITOR FINANCEIRO:Prof. Sérgio Augusto Gomes V. VianaPRÓ-REITOR ADMINISTRATIVO:

Profª Verônica de Menezes FahelDEP. DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS:

Prof. Manoel Joaquim F. de BarrosPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM

DESENVOLVIMENTO REGIONAL E URBANO–PPDRU:Prof. Alcides dos Santos Caldas

CONSELHO EDITORIALProf. Dr. Alcides Caldas

Profª Dra. Bárbara-Christine Nentwig SilvaProf. Dr. José Manoel G. GândaraProf. Dr. Luiz Gonzaga G. Trigo

Prof. Dr. Fernando C. PedrãoProf. Dr. Noelio D. SpinolaProf. Dr. Pedro Vasconcelos

Profª Dra. Regina Celeste de Almeida SouzaProfª Dra. Rosélia Piquet

Prof. Dr. Rossine CruzProf. Dr. Sylvio Bandeira de Mello e Silva

Profª Vera Lúcia Nascimento BritoProf. Victor Gradin

EDITORProf. Dr. Noelio D. Spinola

SECRETÁRIOProf. MSC José Gileá de Souza

CAPA E EDITORAÇÃO GRÁFICAJoseh Caldas

FOTOLITOS E IMPRESSÃOS VICTOR GRÁFICA LTDA

TIRAGEM: 1.000 exemplares

Os artigos assinados são de responsabilidade exclusiva dosautores. Os direitos, inclusive de tradução, são reservados. Épermitido citar parte dos artigos sem autorização prévia des-de que seja identificada a fonte. É vedada a reprodução inte-gral de artigos sem a formal autorização da redação.

ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA:Alameda das Espatódias, 915 - Caminho das Árvores,

Salvador, Bahia, CEP 41820-460 - Tel.: 71-3273-8557E-MAIL: [email protected][email protected]

EDITORIAL

Departamento de Ciências Sociais AplicadasPrograma de Pós-Graduação emDesenvolvimento Regional e Urbano – PPDRU Noelio Dantaslé Spinola

EDITOR

Agora, atualizado cronologicamente, lançamos o nº 13 da Revista de De-senvolvimento Econômico (RDE), editada pelo Programa de Pós-Graduaçãoem Desenvolvimento Regional e Urbano da Universidade Salvador.

Os 13 artigos que enriquecem a edição começam com o professor FernandoCardoso Pedrão que apresenta dois trabalhos. O primeiro, de sua autoria,intitulado Aníbal Pinto e a ruptura do círculo vicioso da pobreza e o segundo, umartigo inédito de Aníbal Pinto que durante muito tempo permaneceu no limbode um arquivo e também versa sobre El financiamiento del desarrollo y el círculovicioso de la pobreza. O artigo de Pedrão constitui uma aula de história econômi-ca contemporânea que se impõe à leitura de todos aqueles que trabalham coma temática do desenvolvimento. Em seguida o professor José Elí da Veiga, emseu artigo sobre as vicissitudes da governança cidadã, discute as dificuldadesda emergência de novas identidades regionais no extremo sul do Brasil. Já oquarto artigo, de autoria da professora Bárbara-Christine Nentwig Silva e dobacharelando Araori Silva Coelho, estuda a macrocefalia urbana em Boa Vista,Roraima, do ponto de vista urbano e funcional, este direcionado para a área desaúde. O Norte do país é também contemplado, mais uma vez, pela pesquisa-dora Marta de Azevedo Irving, que aborda a questão das áreas protegidas defronteira e o turismo sustentável na Amazônia brasileira, especificamente osparques nacionais das Montanhas de Tumucumaque e Cabo Orange que sesituam na fronteira com a Guiana francesa. A professora Irving além de contri-buir para a discussão da perspectiva do turismo sustentável conclui que oturismo regional só poderá ser competitivo, no plano internacional e, inclusivo, nocenário local, se estiver associado a um diferencial de qualidade social e ambiental, tendocomo marca a cooperação Brasil-França e toda a sua significação cultural e identitária nocontexto amazônico. Ainda tratando do turismo a professora Carolina de AndradeSpinola questiona se o ecoturismo, o desenvolvimento local e a conservação danatureza em espaços naturais protegidos são objetivos conflitantes? Nesteartigo ela toma como exemplo o Parque Nacional da Chapada Diamantina quefoi objeto de sua pesquisa, concluindo que não é possível perseguir os objetivos daconservação da natureza e do desenvolvimento local, especialmente nas unidades deconservação localizadas nos países em desenvolvimento, sem atentar para as necessida-des humanas de subsistência das populações que os habitam e, conseqüentemente, pro-ceder-se a uma nova discussão sobre os modelos de gestão adotados nesses espaços e a suacapacidade de equacionar todas as variáveis derivadas do uso turístico desses espaços.Continuando na mesma temática a professora Sieglinde Kindl Cunha e oprofessor João Carlos da Cunha apresentam uma proposta de modelo deanálise de clusters de turismo a partir de um enfoque multidisciplinar entre asáreas da sócio-economia, geografia-social e estudos de redes. Mudando deassunto os professores Augusto Monteiro e Carlos Palma de Mello apresentamas conclusões de um estudo de caso onde avaliaram a eficácia dos programasde qualidade em obras públicas do estado da Bahia. O nono artigo, do mestrandoCláudio Damasceno Pinto, na seara microeconômica, estuda a competitividadedo setor de supermercados na cidade do Salvador. No plano ambiental regis-tra-se o décimo artigo do professor Generoso de Angelis Neto e equipe, quediscutem alguns conceitos relacionados ao tema “resíduos sólidos” num con-texto voltado para a análise geográfica. Neste enfoque estuda-se o planeja-mento e a recuperação de áreas urbanas, principalmente as decorrentes dosimpactos ambientais derivados da gestão incorreta dos resíduos. Por seu tur-no, o professor Paulo Renato Soares Terra apresenta um ensaio onde revisa aliteratura teórica e empírica sobre a interdependência entre o crescimento eco-nômico e o setor financeiro. O penúltimo artigo, do professor Jefferson Stadutoe equipe, trata de uma experiência concreta dos arranjos produtivos relatandoo surgimento de um APL no Oeste do Paraná. Esta edição se encerra com o 13ºartigo, dos professores José Vergolino e Alexandre Jatobá que, numa análiseeconométrica, analisam os determinantes do crescimento da população e doemprego das microrregiões do Nordeste do Brasil no período de 1970/1996.

Até a próxima edição.

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4 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

SUMÁRIO

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ANÍBAL PINTO E A RUPTURA DO CÍRCULO DA POBREZA

FERNANDO PEDRÃO

EL FINANCIAMIENTO DEL DESARROLLO Y EL CÍRCULO VICIOSO DE LA POBREZA

ANÍBAL PINTO SANTA CRUZ

VICISSITUDES DA GOVERNANÇA CIDADÃ: OS CONSELHOS REGIONAIS GAÚCHOS (COREDE)JOSÉ ELI DA VEIGA

MACROCEFALIA URBANA EM RORAIMA E SUA REPERCUSSÃO NOS SERVIÇOS DE SAÚDE

BARBARA-CHRISTINE NENTWIG SILVA E ARAORI SILVA COELHO

ÁREAS PROTEGIDAS DE FRONTEIRA E TURISMO SUSTENTÁVEL NA AMAZÔNIA: ENTRE OSURREALISMO E A INVENÇÃO

MARTA DE AZEVEDO IRVING

O ECOTURISMO, O DESENVOLVIMENTO LOCAL E A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA EM ESPAÇOS

NATURAIS PROTEGIDOS: OBJETIVOS CONFLITANTES?CAROLINA DE ANDRADE SPINOLA

CLUSTERS DE TURISMO: ABORDAGEM TEÓRICA E AVALIAÇÃO

SIEGLINDE KINDL DA CUNHA E JOÃO CARLOS DA CUNHA

A EFICÁCIA DOS PROGRAMAS DE QUALIDADE NO SETOR PÚBLICO: O CASO DO QUALIOP

AUGUSTO DE OLIVEIRA MONTEIRO E CARLOS PALMA DE MELLO

ESTRUTURA DE MERCADO E PADRÕES DE CONCORRÊNCIA: BARREIRAS À ENTRADA NO SETOR DE

SUPERMERCADOS EM SALVADOR

CLÁUDIO DAMASCENO PINTO

ÁREAS URBANAS DEGRADADAS: RELAÇÕES COM A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS

GENEROSO DE ANGELIS NETO, BRUNO LUIZ DOMINGOS DE ANGELIS E PAULO FERNANDO SOARES

AN ESSAY ON THE INTERDEPENDENCE BETWEEN ECONOMIC GROWTH AND THE FINANCIAL

SECTOR

PAULO RENATO SOARES TERRA

ARRANJO PRODUTIVO LOCAL DE TERRA ROXA: A ANTI-VOCAÇÃO?JEFFERSON ANDRONIO RAMUNDO STADUTO, EDNILSE WILLERS E PAULO ROBERTO AZEVEDO

DETERMINANTES DO CRESCIMENTO DA POPULAÇÃO E DO EMPREGO DAS MICRORREGIÕES DO

NORDESTE DO BRASIL - 1970/1996: UMA ABORDAGEM ECONOMÉTRICA

JOSÉ RAIMUNDO VERGOLINO E ALEXANDRE DOMINGOS SÁVIO CALDAS JATOBÁ

6875

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93

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5Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BARDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ANÍBAL PINTO E A RUPTURADO CÍRCULO DA POBREZA

Fernando Pedrão1

ResumoA publicação tardia de um artigo

inédito de Aníbal Pinto Santa Cruzoferece a oportunidade de recons-truir algumas linhas básicas do de-bate que se travou em torno da supe-ração do circulo vicioso da pobreza,que foi uma tese aparentemente damecânica da economia, mas que es-tava carregada de ideologia.Palavras chave: Desenvolvimento,subdesenvolvimento, círculo da po-breza, poupança interna.

ResumenLa publicación tardía de un

ensayo inédito de Aníbal Pinto San-ta Cruz nos ofrece la oportunidad dereconstruir algunas líneas básicasde un debate que se trabó acerca dela superación del círculo vicioso dela pobreza, que fue una tesis apa-rentemente de la mecánica de laeconomía, pero que estaba cargadade ideología.

Palabras llave: Desarrollo, sub-desarrollo, círculo de la pobreza,ahorro interno.

A oportunidade de ter encontra-do um texto inédito de Aníbal Pintoentre papéis da época, além depublicá-lo, permite esboçar uma ho-menagem tardia ao intelectual enga-jado que ele foi.2 Isso significa publi-car o texto original e avaliar seusignificado na época em que foi pro-duzido. Discutir o financiamento dodesenvolvimento não era apenas vercomo conseguir dinheiro para finan-ciar o plano de desenvolvimento, se-não significava perscrutar como aesfera da circulação se integrava naesfera da produção nas condiçõesespeciais – induzidas ou conduzi-das – dos planos de desenvolvimen-to. Essa foi a linha de trabalho aber-ta por Carlos Oyarzún no ambiente

da CEPAL, com textos não publica-dos precursores da década de 50, naqual se integrou Aníbal Pinto e naqual participamos.

O ensaio de Aníbal Pinto queagora apresentamos tem um signifi-cado especial, por trazer uma pers-pectiva histórica à análise do finan-ciamento do desenvolvimento, comofundamento do debate acerca da de-sigualdade do desenvolvimento en-tre as nações e desmitificando asrazões do sucesso dos que se indus-trializaram. Surgem, pela mão dele,a complexidade do papel do colonia-lismo entre latinos e saxões, e o pesonegativo sobre os latinos da transfe-rência do centralismo político e desua sustentação feudal na formaçãoda grande propriedade rural nas re-giões latino-americanas. Conco-mitantemente, descobre-se o custosocial do crescimento da economiainglesa e o modo como esse custo foiarcado no exterior para beneficio daeconomia norte-americana. O círcu-lo vicioso da pobreza é a reprodu-

ção linear da dominação. A rupturado círculo vicioso da pobreza é omodo da emancipação econômica epolítica.

Aníbal Pinto foi um grande pole-mista e incentivador de outros, masdeixou uma obra própria assinadasurpreendentemente pequena. Gran-de parte do que fez ficou submersoem relatórios oficiais.3 Assim, o me-lhor modo de fazer um elogio a Aní-bal Pinto é situá-lo no debate de quefoi participante apaixonado. Essafigura de homem do mundo, entre-tanto tão profundamente nacional,de boêmio e incansável trabalhador,perspicaz e cuidadoso, que pareciasaído de um diálogo de Platão, teveum claro sentimento político da Eco-nomia. Sua participação no debateeconômico, sempre teve um sentidoafinado da realidade social da eco-nomia e da responsabilidade da te-oria do desenvolvimento. Foi umafigura representativa do período cri-ativo daquela instituição que teve umdesempenho surpreendente: a única

1 Professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e Urbano da Unifacs.2 O texto em causa é uma exposição crítica da teoria do círculo vicioso da pobreza, realizada num

tratamento de modelo de dois setores, numa linguagem teórica marxista. A tese central dessa críticaé que a continuidade do círculo da pobreza resulta do modo como o capital circula entre S1 e S2 -mediante os termos de troca entre esses dois setores – que, entretanto, é determinado pelo padrãogeral de acumulação. A noção de circulo vicioso da pobreza é contraditória com as alterações nacomposição do capital, mesmo em condições em que a operação de cada setor permita separarrecursos para investimento. A concepção de circulo vicioso da pobreza não se coaduna com o funci-onamento da produção capitalista, porque não considera as interdependências entre os usos demeios de produção nos dois setores. No essencial, a crítica de Aníbal Pinto ao circulo vicioso dapobreza difere da de Celso Furtado – que aparece em La formación de capital y el desarrollo econô-mico – em que esta última opõe a perspectiva keynesiana à perspectiva de Schumpeter, representa-da por Nurkse. Há um problema de alteração da composição na formação de capital, que é manejadode diferentes modos por Furtado e por Pinto, dado que na perspectiva keynesiana não há espaçoconceitual para trabalhar com as conseqüências das alterações na composição do capital. Maisainda, na perspectiva keynesiana essas alterações não são obrigatórias, pelo que a ruptura do cir-culo vicioso da pobreza se torna incidental. O questionamento de Aníbal Pinto sobre a mecânica daruptura do circulo vicioso da pobreza apóia-se numa abordagem que parte dos elementos da repro-dução simples do capital.

3 Há uma produção paralela de artigos de Aníbal Pinto que apareceu em diversas revistas com pseu-dônimos utilizados para proteção, devido a restrições impostas por sua condição de funcionáriointernacional. O pseudônimo de Spartaco serviu aos seus propósitos polêmicos politicamente maiscomprometidos.

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6 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

das comissões continentais das Na-ções Unidas que desenvolveu umpensamento teórico próprio e que pro-curou criar uma base empírica siste-mática para sustentar alternativas depolítica de desenvolvimento.

A CEPAL surpreendeu ao mun-do das Nações Unidas, porque ul-trapassou seu mandato. O que aCEPAL dos seus primeiros quinzeanos teve de original foi concentraro debate sobre as transformaçõessociais e econômicas definidas comodesenvolvimento econômico e sociale ter elevado esse debate a um planomundial, formulando idéias pró-prias e trazendo pensadores inde-pendentes de outras partes do mun-do. As contradições desencadeadaspela política mundial, que cercearama possibilidade de continuar essapolêmica, e que se estenderam des-de a pressão indireta da Aliança parao Progresso até o obstáculo direto dogolpe militar que derrubou SalvadorAllende, deixaram uma outra CE-PAL, convencional, que tem tanto emcomum com a anterior como o aldea-mento de Tróia VIII com a Tróia VIIde Homero.

O trabalho da CEPAL começouem 1948 e se cristalizou no EstudoEconômico da América Latina de1949 4, gerando a seguir um conjun-to de estudos país por país, com onome de Análises e Projeções doDesenvolvimento Econômico. Essesestudos, que foram realizados paradiversos países, criaram uma novainércia do conhecimento de hoje derealidades nacionais que surgiramdos tempos do sistema colonial. Des-de fins da década de 50 houve mo-dificações profundas no pensamen-to sobre as transformações da eco-nomia mundial, que podem ser atri-buídas em parte a certo amadureci-mento das teses formuladas dezanos antes e em parte ao reconheci-mento ou ao desenvolvimento deuma visão crítica do processo. Issoem parte apareceu como um contras-te entre a chamada teoria do cresci-mento econômico5 e a teoria do de-senvolvimento econômico, sobre aqual em todo caso pairavam dúvi-das ou conflitos, se se tratava de de-senvolvimento do sistema produti-vo capitalista – no sentido de Marx

e Schumpeter – ou se se tratava deuma teoria que explicasse como po-deriam os países subdesenvolvidosse desenvolver. Realisticamente, sereconhecia que não necessariamen-te todos os países se desenvolveriam,mas não se entrava realmente nomérito de que no mundo capitalistaas tendências da concentração decapital alargavam e aprofundavamas diferenças entre os países.

A visão crítica do desenvolvimen-to surge, ao mesmo tempo em que aprópria concepção de desenvolvi-mento nas nações periféricas ao mo-vimento internacional de acumula-ção de capital. Essa visão crítica éprópria da Economia Política Críti-ca, geneticamente incompatível coma abordagem mecanicista da análi-se neoclássica que se tornou alinguagem técnica padronizada daeconomia do grande capital. Há di-ferentes níveis e escalas dessa críti-ca: é uma crítica acadêmica formal,ou passa a incluir o reconhecimentodo mundo americano indígena, queé negado pelo projeto colonial, masque ressurge, repetidamente, defi-nindo-se como uma fonte insubsti-tuível de consciência social.

Tal sentido critico aparece juntocom a noção de processo de subde-senvolvimento apresentada por Cel-so Furtado6 – ainda em sua perspec-tiva keynesiana – assim como apareceatravés de uma crítica marxista dopensamento teórico, com que se iden-tificavam Pedro Vuskovic, Julio Mel-nick e Aníbal Pinto no âmbito daCEPAL. Há uma diferença sutil po-rém profunda, entre a conceituaçãode subdesenvolvimento manejadapor Prebisch e a que passou atravésdas vulgarizações que se reproduzi-

ram, tal como reimpressões em edi-ções de menor qualidade. Prebischabsorveu uma visão histórica – webe-riana – da economia, que distinguiuos trabalhos de seu colaborador maispróximo, o filósofo e sociólogo JoséMedina Echevarria. Tinha-se comoessencial que o desenvolvimento eco-nômico e social – crescimento doproduto, distribuição da renda e con-trole nacional do processo de trans-formação econômica – jamais foi ga-rantido para todas as nações e quehistoricamente a maioria fracassa natentativa de alcançar esses resulta-dos. Daí, a centralidade do planeja-mento como meio de superar essa ten-dência negativa.

Ficou faltando ligar a histori-cidade do comércio desfavorável àhistoricidade da formação de capi-tal. Essa lacuna que Celso Furtadotentaria suprir com seu trabalho de1969 – A economia latino-americanadesde a conquista ibérica até a Revolu-ção Cubana - mas que continuou emaberto, pela falta de uma análise his-tórica do capital na periferia. Essaseria uma lacuna que Samir Amintentaria fechar com seu Acumulaçãoà escala mundial (1967), mas que fi-cou em aberto no relativo à compre-ensão da reprodução ampliada docapital em sua etapa de concentra-ção. A teoria do desenvolvimentoeconômico não conseguiu criar umateoria do capital para a periferia daeconomia mundial.

Com essa visão histórica, na ori-gem não havia praticamente seme-lhança alguma entre aquela compre-ensão de que o subdesenvolvimentosignificava uma perda de capacida-de de exercer políticas econômicasindependentes e o entendimento

4 A primeira obra teórica de Raul Prebisch, em que foi apresentada por primeira vez a teoria da relaçãocentro-periferia.

5 Houve um estreitamento dos objetivos da teoria do crescimento, desde a versão inicial de Roy Harrod(1939) até a leitura tardia de John Hicks (1965), em que as implicações em termos de teoria do capitalforam retiradas. No entanto, a contribuição de Harrod à teoria monetária se faz à luz de uma visãoformada no contexto da teoria do capital. Não se pode esquecer que naquele mesmo momento JoanRobinson publicava o que pretendeu ser sua obra principal, a Acumulação de capital. – logicamentenuma perspectiva keynesiana.

6 Celso Furtado, Desenvolvimento e subdesenvolvimento, Rio de Janeiro, Cultura, 1959. A críticaharrodiana da teoria neoclássica – no sentido de Marshall – do crescimento pressupunha a neces-sidade de penetrar no conceito de taxa de salário, para examinar a relação entre os requisitos detrabalho – em cada composição do capital – e as condições do sistema socioprodutivo para proveresse trabalho qualificado. O tema de Harrod não é a taxa in abstracto senão as condições sociaispara que essa taxa se verifique e se mantenha. A questão da composição do capital reaparece emdiversos textos de Harrod, e, especificamente, numa conferência sobre Marx.

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vulgar de que o subdesenvolvimentoseria apenas uma mecânica do atra-so tecnológico e de multiplicador deemprego. O enriquecimento da con-ceituação de subdesenvolvimentosurgiu como de algo inerente à dinâ-mica da economia mundial – tal comoPrebisch já tinha indicado desde oEstudo de 49 – e não poderia ser defi-nido como um problema apenas in-terno, que se pudesse reduzir aos ar-gumentos conhecidos de falta depoupança, de falta no sistema educa-tivo, ou simplesmente de sociedadesinfensas ao progresso (material). 7 Noambiente da progressão da produçãocapitalista, o subdesenvolvimento se-ria o resultado negativo – perverso –da desigualdade conduzida.8 O me-canismo do comércio seria esse fiocondutor. Havia, portanto, latente, anecessidade de uma teoria da perife-ria, que teria que contemplar os as-pectos materiais e os ideológicos doprocesso e não poderia ser apenasuma teoria econômica. Esse foi umobjetivo que Prebisch entreviu, em suatentativa de fazer um grande traba-lho coletivo em 1970, mas que foi in-terrompida.

Desde então, a principal diferen-ça entre aquilo que defino como aanálise maior do desenvolvimento ea análise menor, estaria entre traba-lhar com o processo em sua totali-dade ou buscar aspectos ou setoresque se apontaria como responsáveisda perpetuação do subdesenvolvi-mento. Mais adiante, na década de1970, essa diferença também estariaentre uma visão a longo e médio pra-zo do planejamento e o aparecimen-to de um planejamento a curto pra-zo, que não era muito mais quedisciplina orçamentária. A propostade técnica de planejamento apoiou-se em um quadro sintético que erauma combinação do modelo deHarrod com a análise de relaçõesinter-industriais de Leontief. Masessa técnica estava sustentada numintenso trabalho de análise e pesqui-sa teórica, que veio a constituir umcorpo doutrinário bastante bem de-finido.

Um seminário realizado no LagoComo (Itália) em 1959 mostrava,além disso, a divisão maior entre asdoutrinas contestatórias integradas

na teoria do desenvolvimento e umaresposta ortodoxa, representada porW.W.Rostow e Roberto Campos.9

Outros autores neoclássicos que es-creviam sobre desenvolvimento, taiscomo Harvey Leibenstein, EveretHagen, Henry Bruton, formavam oneoconservadorismo de então, estru-turando um discurso que antecipa-va a chamada síntese neoclássicapost-keynesiana, identificada comPaul Samuelson e John Hicks e logoadiante com Robert Solow10. A maréanti-keynesiana apontava justamen-te para os keynesianos ou pós keyne-sianos mais à esquerda, especial-mente contra Roy Harrod, JoanRobinson, Nicholas Kaldor.11 Ossuecos, isto é, Gunnar Myrdal, ErikLindahl,12 que já representavam umacrítica mais progressista que Keynes,

ele próprio um conservador, passa-vam a constituir um referencialcolateral. Os pensadores oriundosdas nações classificadas como sub-desenvolvidas, tais como Raul Pre-bisch e os cepalinos do grupo origi-nal13, apareciam perante a academiaconservadora, majoritariamente nor-te-americana, como um incidenteacademicamente pouco consistente.O inverso seria ver a análise neoclás-sica como historicamente irrelevante.

Esse quadro de posições foi ulte-riormente confirmado com o lança-mento da Aliança para o Progresso– um projeto da administração Ken-nedy – que se tornaria a referênciapara uma visão tecnicista dessesprocessos, onde se excluía o compo-nente de conflito social. 14 Em vez depolíticas de transformação, ajuda a

7 A escassez de poupança na visão de Prebisch, é um saldo negativo de relações internacionais desfa-voráveis que atinge a formação de capital e não é a simples falta de capacidade de poupar dos paísesperiféricos. O Haiti e a Bolívia foram vitimas dessa expropriação da formação de capital em suas expor-tações, respectivamente, de café e de minerais, tanto como o Brasil, o Chile, a Argentina. A escassez depoupança é um resultado de relações coloniais, que se agrava quando uma maior proporção da for-mação de capital se passa a investimentos nos países mais ricos e que se aprofunda quando os novosinvestimentos são parte das cadeias integradas de capitais. É um tema em que se tem que voltar apensar, quando se confronta hoje com um neoneocolonialismo perpetrado por países europeus quevoltam a fazer grandes investimentos integrados em redes internacionais que extraem todo lucro dospaíses receptores de seus capitais. Os exemplos mais imediatos são Portugal, Espanha e França.

8 Desigualdade conduzida pelas forças que prevalecem na acumulação de capital. Interesses econômi-cos institucionalmente organizados, com capacidade efetiva de decidir sobre os usos de recursos.

9 As idéias de Roberto Campos já estavam bem definidas em artigo de 1960, Inflação e crescimentoequilibrado. Aparecem de modo pleno e sintético na introdução que escreveu ao livro de Lorenzo-Fernandez.

10 Em seus diversos matizes, o conservadorismo na análise do desenvolvimento caracterizou-se por pro-curar sempre um fator decisivo ao qual atribuir o desastre do atraso e a possibilidade do progresso. Foio contrário da visão de totalidade do processo, Diferentes autores focalizaram em educação, ou emtecnologia, ou em industrialização, sempre como objetivos que se deve buscar através da liberação dosmercados, que na prática significava abaixar barreiras à expansão dos capitais norte-americanos.Somente da década de 70 em diante a liberação de mercados passou a beneficiar capitais europeus,que, para surpresa de alguns, revelam-se mais colonialistas que os norte-americanos.

11 As idéias de Michal Kalecki tiveram certa ressonância a partir de sua divulgação por Joan Robinson,porém aparentemente jamais foram levadas em conta pelos norte-americanos, mesmo por aquelesmais progressistas. Kalecki foi ignorado pela CEPAL e na América Latina passou a ser lido seriamentepelos brasileiros. Dentre os cepalinos, apenas Carlos Oyarzun e Aníbal Pinto trabalharam com as idéiasde Kalecki, por isso tomando o financiamento do desenvolvimento como uma disciplina essencial noestudo do desenvolvimento econômico.

12 Tanto Myrdal quanto Lindahl se destacaram inicialmente com trabalhos de economia monetária, res-pectivamente, O equilíbrio monetário (1932) e Estudos sobre a teoria do dinheirol e da moeda (1947),mas se afirmaram como cientistas sociais, com um espectro muito mais amplo de interesses.

13 Refere-se a José Mendive, Jorge Ahumada, Jesus González, Carlos Oyarzún , Manuel Balboa, JulianCalvo, José Antonio Mayobre e vários outros.

14 Hoje é preciso reconhecer que a Aliança para o Progresso constituiu uma opção ideológica de políticade desenvolvimento, que carregou toda uma elite de pensadores liberais – no sentido norte-americanodessa expressão – que se afirmavam como o lado democrático da Guerra Fria, comparados com fenô-menos tais como o macartismo e a direita republicana norte-americana em geral. Observe-se que háuma linha de continuidade entre a luta contra o racismo nos EEUU e a perspectiva étnica nas políticasde desenvolvimento nos países latino-americanos. Na América Central e nos países andinos continua-va uma política escravista em relação com os indígenas. A Argentina continuava declarando-se comopaís mais europeu da América e o Chile continuava negando cidadania aos seus indígenas. O racismodas elites latino-americanas transformou-se em instrumento de apoio a essa linguagem modernizadada influência norte-americana.

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políticas setoriais e a gastos assis-tenciais. O papel desde então atri-buído às despesas assistenciais,rotuladas de setores sociais, que sig-nificava tratar educação como umabenesse do Estado aos mais pobres,constitui o cerne de uma abordagemda política de desenvolvimento, queficava reduzida a uma política pu-blica setorialmente delimitada. Omais importante é que o papel doEstado nacional ficava externamen-te determinado. Logicamente, essaabordagem de despesas compensa-tórias seria questionada no própriocampo neoclássico, pela subcorrenterepresentada por Milton Friedmanne Harberger, em que esse último pas-saria a assessorar a ditadura chile-na na década de 1970.

Assim, a chamada “teoria da de-pendência” – que, praticamente, foiuma visão sociológica e weberianado subdesenvolvimento – captavaum aspecto do problema maior dedesigualdades nas relações entre ri-cos e entre pobres, mas esquivava odebate sobre a acumulação de capi-tal. Por isso, em paralelo ao discursodemonstrativo da marginalidade – enem sempre da marginalização – fi-cava por explicar os mecanismos eco-nômicos que levavam a essa margi-nalização. A resposta que alguns denós encontrávamos era o debate so-bre a distribuição da renda15, que sus-citava resistências de todos queentendiam que a teoria do desenvol-vimento deveria ser uma teoria daprodução e o foco na distribuição se-ria um desvio ricardiano, a todas lu-zes, inoportuno. Prevalecia o pontode vista de que a análise da distribui-ção seria, inevitavelmente, estática, evoltaria as costas para a análise alongo prazo da relação entre o cresci-mento do produto e o do capital. En-tretanto, Aníbal Pinto entrou de ca-beça nessa outra linha, da relaçãoentre as alterações da distribuição eo desenvolvimento dos países, publi-cando um livro intitulado Distribui-ção de renda na América Latina e desen-volvimento (1967), em que trabalhavaa distribuição como a cara visível, ne-gativa, da concentração do capital.

À parte de expressões que se tor-naram emblemáticas, tais como mar-ginalidade e dependência, paten-

teou-se uma fragilização do discur-so teórico do desenvolvimento, quedeveria dar conta de um constanteacréscimo do conhecimento factualda realidade latino-americana e querefletia o esgotamento das análisesoriundas da macroeconomia keyne-siana, que ficava no registro de evi-dências, mas não se aventurava nascausas do atraso. Nesse contexto,destacou-se, positivamente, o traba-lho de Sunkel, Paz e Rodriguez16, queprocurou encontrar as especifi-cidades do subdesenvolvimento nes-ta parte do mundo. No entanto, ain-da padecia de um conhecimentohistórico estruturado suficiente paracompreender o problema do colonia-lismo. Dentre os cepalinos, somenteCelso Furtado empreenderia umatentativa de síntese dessa trajetória.17

Aníbal Pinto teve uma participaçãosignificativa nesse debate, mas infe-lizmente não deixou texto que refe-rende seus pontos de vista.

O contraste desses trabalhos comaqueles outros de desenho marxis-ta, tais como os de Gunder Frank,Ruy Marini e Theotonio dos Santosmostravam a impossibilidade dedefinir o enquadramento doutriná-rio dos trabalhos apenas pelo uso determos de aceitação geral, tais comosubdesenvolvimento, dependência,dominação etc. A visão marxistarompia com as barreiras entre asanálises macroeconômica e micro-econômica, assim como revelava acentralidade do movimento de acu-mulação de capital. O problema subs-tantivo de combinar a escolha de te-

mas com a abordagem de métodosignificava uma opção ideológicaque não era compatível com o proje-to de resolver os problemas da sus-tentação das classes médias noprocesso de desenvolvimento. O su-posto economicismo da época nãoera mais que uma estratégia evasivados conflitos de classe que, inevita-velmente, surgiam quando se busca-vam as fontes da reprodução da de-sigualdade e do atraso. Significavaque os economistas não se ocupa-vam dos conflitos sociais subjacen-tes à formação de capital, onde tudose resumia em desigualdade de ren-da. O estudo de Kuznets sobre as va-riações na relação capital/produtonos EEUU durante 80 anos, era ummodo de mostrar o capital formadoe de evitar o debate sobre a mecâni-ca da acumulação.18

15 Elaborei minha tese para concurso de docente livre sobre A distribuição da renda e o desenvolvimen-to econômico (1960) por instigação de Jorge Ahumada, assim como escrevi um artigo sobre Asdesigualdades regionais e o desenvolvimento econômico (1964) por instigação de Aníbal Pinto.

16 Oswaldo Sunkel, Pedro Paz e Octavio Rodriguez, El subdesarrollo latinoamericano y la teoria deldesarrollo, (1981). Esse livro foi o texto básico de vários cursos de desenvolvimento econômico con-duzidos por Sunkel na década de 60, quando funcionou como uma resposta econômica da teoriasociológica da dependência. Já havia uma tensão básica entre a fundamentação histórica dasteorizações sobre a América Latina e as tentativas de generalização.

17 Alusão a A economia latino-americana desde a Conquista até a Revolução Cubana (1969). Nessaobra Celso Furtado fez uma tentativa de explicar os processos latino-americanos em função dosdados iniciais da colonização, que hoje se vê como um modelo caótico, isto é, um modelo que nãoincorpora as alterações de tendências introduzidas durante o percurso considerado doprocesso.Concretamente, como se o fato da independência política não resultasse em alterações dascombinações de poder que pudessem alterar as tendências de cada nação em seu conjunto. Aprincipal fragilidade desse modelo – reconhecida pelo próprio Furtado em fala durante o seminárioem sua homenagem em 92 – consiste em excluir - tacitamente – o imperialismo.

18 Simon Kuznets, Long –term changes in the National Income of the United States of America since 1870,Income and Wealth, series II, Income & Wealth of the United States, trends and structure, Cambridge,Bowes & Bowes, 1952. Posteriormente, se reconheceu que a pesquisa de Kuznets na realidadesignificava uma prova das idéias de Marx sobre as alterações na composição orgânica do capital.

O problemasubstantivo de combinar aescolha de temas com aabordagem de métodosignificava uma opção

ideológica nãocompatível com o projetode resolver os problemas

da sustentação dasclasses médias...

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O desgaste da teoria da relaçãocentro-periferia – em sua versão ori-ginal – deu lugar a outras incursõesteóricas, sempre no marco de umabusca de soluções alternativas às daimposição da supremacia norte-americana. Nesse sentido, entendoque podem ser decodificadas as con-tribuições ao debate sobre a hetero-geneidade do capital, em que se des-taca um artigo de Aníbal Pinto19,inaugurando uma linha de debateque se aproximava mais de visão deMarx que do neo-ricardianismo dePiero Sraffa.20 A questão central deuma leitura séria de Marx pesou so-bre a teoria do desenvolvimento naAmérica Latina, onde poucos, comoMaria da Conceição Tavares e PedroVuskovic conheciam consistente-mente a obra de Marx. Reconhecia-se, portanto, que o problema centralde uma teoria econômica do capita-lismo – uma teoria do capital – fica-ra fora da teoria do desenvolvimen-to econômico. Esse, a meu ver, é ofundamento de uma crítica internada teoria do desenvolvimento, queperdeu de vista a questão essencialda Economia Política.

A noção de estilos de desenvolvi-mento foi introduzida no ambienteda CEPAL pelo físico argentino Os-car Varsawski, que veio municiaroutra subcorrente da análise do de-senvolvimento – uma corrente quan-titativista - que encantou figuras daesquerda e da direita, em busca deuma legitimação não ideológica.21 Anoção de estilos de desenvolvimen-to seria uma ferramenta para pene-trar na variedade de situações doperíodo colonial, bem como para re-gistrar a variedade de situações dasegunda revolução industrial. Maspadecia da falta de um fundamentoconsistente no campo social, porisso, terminando por protagonizarmais um engendro de linguagem daFísica no campo social. Parecia umasimplificação e um desvio de umaanálise genuinamente histórica, jáque não registrava o fundamentosocial da formação do capital e sedispunha a identificar o sistema his-tórico do colonialismo como umaforma colonial.

A seguir surgiu uma bifurcaçãono próprio campo da análise de es-

tilos de desenvolvimento, em que umgrupo tentava substituir a análiseeconômica por uma outra, de inspi-ração da engenharia; enquanto ou-tra acreditava encontrar uma análo-ga da categoria formação social.Aníbal Pinto, Oswaldo Sunkel, Nor-berto González e alguns outros cor-responderam a essa subcorrente, queprocurava restabelecer categoriasnacionais para o tratamento do mo-vimento internacional do capital. Foiuma tentativa que topou com con-tradições profundas, mas que deixoualguns resultados positivos, naindividualização dos problemasnacionais de desenvolvimento. Acontribuição de Aníbal Pinto nessaárea foi modesta, mas deixou marca,justamente por indicar as contradi-ções entre uma análise internacionaldo capital e uma análise nacional dasformações sociais. Tentativas de in-terpretação da economia chilena,empreendidas por Jorge Ahumada epelo próprio Aníbal Pinto, de dife-rentes modos, tinham mostrado aimpossibilidade de alcançar umaexplicação nacional satisfatória semintegrá-la internacionalmente. Afi-nal, o modelo primário exportadormineiro chileno decorria do modo deuso de minerais na segunda revolu-

ção industrial nos Estados Unidos.O envolvimento de Aníbal Pinto

com os problemas do desenvolvi-mento no Brasil data de sua presen-ça como chefe do Escritório daCEPAL no Brasil e correspondem àprimeira metade da década de 1960.Naquele período, em boa parte porsua atividade docente, entrou emcontato com grupos de diversas par-tes do país, vindo a ponderar que aanálise regional neste país teria umpeso e um significado diferentes deoutras partes do continente. A críti-ca histórica do círculo vicioso da po-breza teve um significado muito es-pecial, naquele momento em que foiformulada e hoje, quando parece re-mota, porque evoca a temática docontrole da formação de capital noesforço dos países para superaremsuas condições desfavoráveis. Porisso mesmo, contém os elementosbásicos de uma critica das políticaseconômicas que descuidem ou igno-ram o aspecto de vulnerabilidadedas economias nacionais aos movi-mentos de capitais especulativos.

Naquele período em que a análi-se econômica no Brasil estava domi-nada por uma quase exclusividadeda visão dos grandes centros do Su-deste, percebeu que havia algo de

19 Aníbal Pinto Santa Cruz, La heterogeneidad del capital, Trimestre Económico, abril, 1964. Como sesabe, o debate entre a visão de heterogeneidade do capital e a de capital como entidade financeira– Cambridge (UK) vs.Cambridge (Massachussets) aconteceu durante a década de 60 e foi registradapela coletânea de Harcourt & Laing , Capital and growth (1967). Entretanto é um pseudo debate, jáque evade a questão substancial da composição orgânica do capital. Observe-se que Joan Robinson(1973) – Economics versus Political Economy – que a composição do capital é um tema ambíguo emMarx, entretanto que se torna essencial para a teoria do capital, quando se enfrentam os problemasmais complexos de renovação tecnológica. Tal como se pode ver no referido livro de Harcourt & Laing,o debate cerca da heterogeneidade – de que é parte o artigo de Aníbal Pinto – é uma reação àautosuficiencia da visão do capital financeiro.

20 Referencia a Production of commodities by means of commodities, (1961). O livro de Sraffa foi feste-jado de modo quase universal, talvez em parte por sua parcimônia – levou 42 anos para produzir umlivro de 139 páginas – e talvez porque resolvesse um problema latente em todos economistas, dedesejar que houvesse uma saída pós marxista para a teoria de Ricardo. No entanto, esse livro trazuma formalização da análise da produção capitalista industrial, que não contempla as transforma-ções inerentes à superação da segunda revolução industrial. Os principais desdobramentos da aná-lise sraffiana – Pasinetti e Garegnani – continuam no mesmo rumo de tentar criar uma explicação pósricardiano não inglesa no coração da justificativa inglesa do controle da acumulação industrial. Indi-retamente, estão levando água ao pote, isto é, estão construindo uma mecânica da economia plena-mente industrial – mercadorias por meio de mercadorias – que não contempla quaisquer outrasdimensões da desigualdade que não sejam essas da própria mecânica interna do processo. Ainternacionalização do capital aparece apenas como um desdobramento ulterior e não como centrodo capital mundializado.

21 Não se pode esquecer que uma grande parte da presença das Nações Unidas no após guerra deveu-se ao esforço de difundir técnicas estatísticas e de análise macroeconômica em países cujas estatís-ticas eram precárias, para criar condições de comparabilidade na esfera internacional. O referidoquantitativismo seria uma atitude de tendente a pretender desenvolver e aplicar modelos econométricos,que geralmente estavam muito além da confiabilidade das estatísticas desses países. Houve umasubstituição da análise econômica possível pela tentativa de impor técnicas quantitativas sem disporde números confiáveis para esse uso.

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irredutível na presença do Nordes-te. Esse talvez tenha sido seu momen-to de maior intimidade com a com-plexidade deste país e o ensejo parauma visão não centralista dos pro-blemas do desenvolvimento.

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A. El círculo vicioso de la pobreza

La activación del desarrollo eco-nómico depende, como ya se sabe,de la capacidad de una poblaciónpara apartar del consumo una frac-ción adecuada de sus ingresos (orecursos) para destinarlos a la crea-ción de capital. En relación a esteproblema se ha popularizado la me-táfora del círculo vicioso de la po-breza. Ingreso bajo – ahorro bajo –productividad baja – ingreso bajoetc. En resumen, “son pobres porqueson pobres”.

En términos estrictamente finan-cieros, “el círculo vicioso” no existe.Los países podrían disponer de todoel ingreso monetario que desearansi las autoridades bancarias dieran“empleo pleno” a las máquinasimpresoras. Desde ese ángulo, lapobreza se apreciaría en función dela capacidad para crear y distribuirmedios de pago. Lo anterior, claroestá, no tiene otra significación queuna especie de “reducción al absur-do”. En verdad, cuándo hablamosde “ingresos” nos referimos tácita-mente a “ingresos reales” en un sen-tido muy claro: como una contra-partida financiera que es el reversode la corriente de bienes y servicios.Al hablar de ahorro y capacidad deahorro, no nos referimos solamenteal saldo monetario de ingresos quese sustraen del consumo, sino queimplicamos lo que va con él, como elcuerpo y la sombra – en este caso –que son los recursos humanos ymateriales que esas rentas represen-tan, o mejor dicho, sobre las que tienedominio.

En otras palabras, expresar queahorramos tal o cual proporción delingreso equivale a señalar que unamayor cuota de bienes queda dispo-

EL FINANCIAMIENTO DEL DESARROLLO Y ELCÍRCULO VICIOSO DE LA POBREZA1

Aníbal Pinto Santa Cruz2

nible para la inversión, y tal decisiónsólo tiene pleno sentido o importan-cia en esa acepción.

En su forma más simple, el pro-blema del “círculo vicioso” de lapobreza podria exponerse gráfica-mente así:

S 1 S 2100 10

El sector 1 es el productor debienes de consumo. El sector 2 es elproductor de bienes de capital. Enuna esfera están reunidos y combi-nados los factores productivos quesatisfacen las necesidades inmedia-tas de la población. En la otra, losrecursos que tienen por objeto mante-ner y expandir la capacidad produc-tiva.

En un país adolescente, de bajaproductividad relativa, el S1 absor-be el grueso de los factores de pro-ducción (el caso de una comunidadprimitiva). En términos de ingresosesto significa que el margen suscepti-ble de ser ahorrado es obligadamen-te muy pequeño. El s 2 por oposición,es muy reducido si se mide por laproporción de recursos que absorbey no sólo eso: crece lentamente yaque es muy limitado el flujo de re-cursos que puede transferir el s 1para su ampliación.

En una economía que se expan-de, tanto la magnitud como as pro-porciones de los sectores van modifi-cándose. Podríamos imaginarlas asídespués de un periodo de desenvol-vimiento activo:

S 1 S 2200 40

La comunidad ha sido capaz dedesplazar hacia el sector consumouna parte creciente de sus recursosy ese esfuerzo se ha traducido en unaampliación de ambos sectores, peroen mayor proporción de la esfera queproduce bienes de capital. Para teneruna idea concreta del desarrollo deese proceso pueden considerarse lassiguientes cifras respecto a la evolu-ción de la importancia relativa de lasindustrias de bienes de consumo ylas de bienes de capital en los Esta-dos Unidos

I II

1850 43% 18%1900 35 231927 32 39

Gracias a esa expansión acelera-da – con respecto al otro sector – lainversión por hombre ocupado en elpaís del norte ha sobrepasado losUS$7.000.

El problema tratado puede apre-ciarse desde otro ángulo, más preci-so, en las siguientes ecuacionesbasadas en aquel esquema de dossectores:

Y= ingresoO= productoS = ahorroC = consumo

Y los signos 1 e 2 para señalarlos componentes de ambos sectores.

1 Este material inédito é a segunda parte de um texto escrito por Aníbal Pinto para um conjunto de aulasque proferiu para a matéria Financiamento do Desenvolvimento, em curso realizado em Salvador em1963, em cooperação entre a SUDENE e a Universidade Federal da Bahia e coordenado pelos pro-fessores Edivaldo Boaventura e Fernando Pedrão.O artigo foi conservado em sua estrutura original,não atendendo a padronização editorial da RDE.

2 Economista. Pesquisador da Universidade do Chile. Ex-diretor da CEPAL.

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12 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

0 = 01 + 02 = Y = C + S

01 = C1 + S 102 = C2 + S 2

02 = S = S1 + S2,

luego, S1 = C2

Esto es, el consumo del sectorinversión debe ser igual al ahorro delsector consumo. A fin de que lapoblación activa en el sector inver-sión pueda dedicarse a la creaciónde bienes de capital, se requiere queaquella que labora en el sector 1produzca un excedente sobre su pro-pio consumo.

Para esclarecer más este proble-ma y con miras a anticipar otrascuestiones relacionadas que exami-naremos más adelante, conviene quenos detengamos más en las relacio-nes entre los sectores 1 y 2.

Supongamos que el excedente debienes de consumo que deja el S 1permite ampliar en el S 2 la produc-ción de acero. Logrado ese objetivo,se va a plantear en seguida el pro-blema del destino o uso que se va adar al incremento de esa disponibili-dad. Imaginemos algunas alternati-vas: (a) la mayor producción deacero se pone a disposición de lasindustrias del sector I a fin de queaumenten la oferta de bienes dura-bles, menaje etc.; (b) el incrementomarginal de la oferta de acero quedaintegramente en el sector II, paraampliar su capacidad productiva(descontando que ha habido provi-sión para las depreciaciones en am-bos sectores) ; y (c) una combinaciónde (a) e (b).

Evidentemente la alternativa másfavorable desde el punto de vista deldesenvolvimiento es la (b) , o en todocaso una (c) que inclinara la distri-bución del acero agregado a favor deS 2 . Esto podría exponerse así: nosólo importan los márgenes deahorro del S 1 , sino también es pri-mordial resolver acerca del destinode los frutos de ese ahorro. En otraspalabras, de que S 1 siga ahorrando,en el sentido de que renuncie al goceinmediato de los resultados delesfuerzo realizado.

En lo que respecta a esta cuestión,el profesor Kaldor llama la atención

respecto a la distinta “posición es-tratégica” de los dos sectores. El S2es dependiente de S1 porque su es-cala de operaciones está subordina-da al ahorro de este último, es deciral margen de bienes de consumo quedeja disponible al S1, o sea, a unadecisión de éste. Sin embargo, lasrelaciones de medios o términos deintercambio entre los dos sectores –la cantidad de bienes de capital quepuede trocarse por una unidad debienes de consumo – está determi-nada por el S2.

Supongamos que la produccióndel S2 consiste de acero. De lo dichopuede deducirse que la cantidadproducida va a depender del mar-gen de bienes de consumo liberados, no consumidos, por el S1. Sin em-bargo, la producción de acero que sepone a disposición del S1 estará de-terminada por las decisiones del S2.De qué manera? Elevando el preciode sus productos puede reducir larentabilidad de las inversiones en elS1 y acrecentar la que puede esperar-se en el propio.

Imaginemos que el S1 ahorra 100unidades de trigo, que permiten alS2 operar en una escala que setraduce en la producción de 100unidades de acero, fijará un precioal acero que lleve a intercambiar 70unidades por las 100 de trigo. Si elS1 redujera en 90 unidades de trigo,obligaría al S2 a disminuir su pro-ducción de acero también a 90 uni-dades, pero si el S2 quisiera conti-nuar usando las 30 unidades delejemplo anterior, podría hacerlo co-locando el precio necesario al aceroa fin de que 60 unidades se trocaranpor las 90 de trigo que ahorró el S1 .En otras palabras, habría empeora-do la relación de precios para elsector consumo.

Quizás la consecuencia más im-portante de lo expuesto es que lospaíses que desean activar su desar-rollo necesitan en alguna medidallevar a cabo el proceso de radicaren el S2 una buena o mayor parte dela capacidad acrecentada por el actode ahorro en el S1. Eso significa de-dicar a las industrias de bienes decapital (siderurgia y metalurgia,cemento, maquinarias, energía) unamayor proporción de su producción,

que le requeriría un crecimiento pa-ralelo o similar de los dos sectores.He aquí la razón básica del énfasiscolocado sobre el crecimiento acele-rado de las industrias pesadas enalgunos programas de desarrolloeconómico intensivo. Asimismosubraya la importancia del funcio-namiento y control de las industriasbásicas de capital, ya que ellaspueden ser la fuente de sus propiosrequerimientos de inversión. Uncaso ilustrativo en este asunto es lapolítica de tarifas o precios de lasindustrias de servicios públicos o delas industrias pesadas en general.Cómo dijimos antes, todo esto impli-ca que los frutos del ahorro sedistraen en alguna medida delsector de producción para el consu-mo y se concentran en la ampliaciónde la capacidad productiva. Ello,naturalmente, permitirá una expan-sión ulterior más acelerada de am-bos sectores.

Como una cotación al margen deesta cuestión y por su decisivaimportancia para el proceso deahorro – inversión y el del desarrolloen general, cabe subrayar que elsacrificio presente o directo del actode ahorrrar, de substraer ingresos yrecursos del consumo, no se alterapor el hecho de que una parte im-portante de los mismos se dedica ala expansión del S2 en vez dedirigirse a ampliar la capacidad oprovisión de recursos para el S1.

Volviendo al ejemplo de Kaldor,el S1 ahorró 100 unidades de trigo ylas puso a disposición de los inver-sores a fin de que éstos ocuparanfactores en la creación de medios decapital. Estos bienes de producción(otra vez dejando de lado el proble-ma de mantener la capacidad exis-tente) puede dirigirse o utilizarse enuno u otro sector. Supongamos quetoda la inversión neta es en el S2 . Eneste caso el sacrificio extra del sectorconsumo estribará en no aumentarsu capacidad de producción inme-diata o próxima, pero no implicaacrecentarlo en forma absoluta oactual, ya que está fijado por las 100unidades de trigo.

Desde ese ángulo podemos apre-ciar que una tasa o volumen deinversión producirá muy distintos

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efectos sobre el desarrollo según im-plique una mayor o menor preferen-cia por la expansión de S2, aunqueel sacrificio actual de ahorro sea elmismo en ambos casos.

Las relaciones que se establecendesde ese ángulo no deben confun-dirse con el problema de la producti-vidad de la inversión o del capital,que se expresa en la relación poduc-to/capital. Por ejemplo, una inver-sión en un cinema y otra en una obrade irrigación pueden tener la mismaproductividad si comparamos elvolumen de ingresos que generacada unidad de capital en esos usos,pero el efecto sobre la capacidadproductiva y el potencial de desar-rollo será muy distinto en amboscasos. Por otra parte, en el momentoen que apartaron recursos del con-sumo paraísos fines, el sacrificio delacto de ahorro fue idéntico , supuestoclaro está, que se requerian los mis-mos factores.

Retomando el hilo de la exposi-ción podrá sentarse el supuesto obviode que los países que tienen un sectorI relativamente reducido en compa-ración con sus habitantes, se encuen-tran en pié más difícil para ampliarel sector II, o, dicho en otros térmi-nos, como S1 (ahorro del sector I) espequeño, también lo es C 2 ( que re-presenta el margen de bienes de con-sumo que debe ponerse a disposi-ción de quienes laboran en el sectorde bienes de producción).

Este principio elemental tienealguna corroboración estadística,aunque veremos más adelante queestá expuesto a serias críticas.

Tasas de inversión en algunas áreas

Europa Occidental + de 20%Estados Unidos + de 15%América Latina + de 15%ExcepciónEuropa Oriental + de 25%

El truísmo de que a mayor volu-men de ingreso por persona hay unamayor reserva potencial para trans-ferir recursos hacia la inversión,tendría mayor significado si eldesenvolvimiento fuera un procesoespontáneo, persistente o necesario,que automáticamente se tradujera en

expansiones sucesivas de la capaci-dad de los sectores. Así nadie deberíapreocuparse mayormente de esasrelaciones y todo el problema estri-baría en que los caminantes seencuentran en un momento dado enpuntos más o menos avanzados dela carretera. Lo que ocurre, sin em-bargo, es que en gran parte del mun-do sub-desarrollado no hay o no hahabido durante largos períodos unaexpansión secular que derive enaquella desviación de recursos haciala inversión: en otros países la ca-dencia del crecimiento no ha basta-do para compensar el aumento de lapoblación; y en el resto, finalmente,la expansión ha sido demasiadomodesta, inestable o desequilibradapara satisfacer la comunidad.

En esta materia cabe referirse auna circunstancia marginal, a nues-tro tema específico, pero de enormesignificación para ubicar el proble-ma en un marco adecuado. Es elhecho de la tendencia indisputabledurante un largo período a la acen-tuación de las desigualdades en eldesarrollo económico internacional.(A) El caso de las naciones másrezagadas de Asia y Medio Oriente,que parecen encontrarse aún en tér-minos absolutos más pobres quehace un siglo, no sólo han quedadoal margen de la revolución indus-trial, el sistema capitalista, la irradia-ción del “libre comercio internacio-nal” etc., sino que puede suponerseque éstos y otros fenómenos contem-poráneos resultaron contraprodu-centes para ellos. (B) La experienciade otras economías adolescentes –entre las cuáles pueden encontrarseAmérica Latina – que han logradoalgún incremento en sus niveles deingreso, pero que se hallan, sin em-bargo, a una distancia mayor quehace un siglo de los niveles alcanza-dos por los países centrales.

B. La ruptura del círculo vicioso de la pobreza

El interés del examen históricodel problema de romper el círculovicioso de la pobreza reside en lacircunstancia meridiana de que nu-merosos países han logrado sobre-pasar los obstáculos que dificultanel camino y emprender el ascenso

desde niveles tanto o más bajos quelos que caracterizan a muchos paí-ses adolescentes en la actualidad. relas experiencias o modelos más re-presentativos que se mencionaron enesta materia vale la pena considerarlos de Inglaterra, Estados Unidos, laUnión Soviética y Japón.

Para Singer, el caso inglés se ca-racteriza por una combinación dedos elementos principales, que sonuna distribución desigual del ingre-so y una alta propensión a ahorrar,un espíritu puritano de la gente querecibía altas rentas. En otras pala-bras, aludiendo a menciones anteri-ores, a una compresión muy resueltay sostenida del sector de producciónpara el consumo – fundamentalmen-te el consumo de gran masa – y elaprovechamiento de los recursos asídisponibles para la formación delcapital.

Algunas condiciones muy suigeneris se requirieron para quetuviese lugar esa combinación.

En primer lugar cabria señalar lareforma agraria inglesa, que des-truyó la estructura feudal en el cam-po, caracterizada por la explotaciónsemi-comunal de pequeñas exten-siones fragmentadas y la sustituyópor una agricultura de extensionesmás amplias y dirigida a satisfacerla demanda por alimentos y mate-rias primas de las ciudades. Esa re-forma, como se sabe, no implicó unarevolución en el sistema de propie-dad sino que fundamentalmente uncambio en la organización y en elfuncionamiento del sistema agríco-la. Por otra parte, está el sistemasuplementario que anota Singer. Laalta propensión a ahorrar de quienesresultaron favorecidos por la situa-ción descrita. Para explicar esa incli-nación incluso se alude frecuente-mente a condiciones de tipo reli-gioso, como la influencia del movi-miento protestante y las proyeccio-nes económicas del mismo: unaestimación por los valores materia-les, sobriedad en los hábitos de vidaetc..

Desgraciadamente, para esas tesisgeneralmente aceptadas, la escasadocumentación empírica no ofrecemucho asidero. De acuerdo a SimonKuznets, por ejemplo, que se basa

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en varias investigaciones inglesas,el porcentaje de formación de capi-tal en el Reino Unido entre 1870 e1890 fue inferior al 10% sobre elproducto bruto y en el mismo perio-do en Estados Unidos fue más deldoble.

De manera, pues, que no habríasido la abstinencia de consumo porparte de los sectores no asalariados,que son la otra parte de esa ecuaciónsocio-económica del desarrollo in-glés. Pensamos, en cambio, y nadamás que a título de vaga hipótesis,que podrian haber tenido mayorgravitación elementos como lossiguientes:

a. Las innovaciones tecnológicasdel periodo, que elevaron sustan-cialmente la productividad delsistema.

b. El hecho de que una parte consi-derable de las inversiones debiódirigirse a las industrias básicasde capital, especialmente despuésde la expansión textil del primerperiodo, cuestión que parece muyprobable, al recordar la estructurade la economía inglesa del perio-do y el hecho de que la expansiónde las industrias de consumo parala masa estaba constreñida por elpatrón de la distribución de lasrentas.

c. Seguramente su condición deprincipal proveedor de bienes decapital permitió a Inglaterraestablecer una relación de preciosventajosa para su economía, a loque habría que agregar la existen-cia de condiciones políticas – v.g.su posición rectora del mundo -que favorecían al proceso. Sobreesa materia Meier & Baldwinseñalan que los historiadores eco-nómicos generalmente concuer-dan en que una parte substancialdel incremento en el ingreso realde Gran Bretaña puede atribuirsea un mejoramiento secular de sustérminos de intercambio.

d. Por último, aunque no menos im-portante, el desarrollo económicoinglés fue alimentado por unacaudalosa transferencia de ingre-sos de otros países, gracias al sis-tema colonial. Los antecedentesmuy minuciosos sobre la contri-

bución dela Índia, por ejemplo, nodejan dudas de que el crecimientodel ingreso, que a la postre llegótambién a alcanzar a los gruposque habían sufrido y pagado porla Revolución Industrial, se debióen buena proporción al factorseñalado. (Ver al respecto, Politi-cal Economy of Growth, por PaulBaran, University of Stanford, Es-tados Unidos).

Respecto a las características delproceso de financiamiento de lacreación de capital, es posible dis-tinguir algunas fases característicasen la evolución inglesa.3 Entre 1750e 1800 se ha percibido que la acumu-lación se debió a la “inflación de uti-lidades”, que fueron ahorros forzo-sos a través de un retraso de los sala-rios monetarios respecto de losprecios en alza, que facilitaron laacumulación de fondos para la in-versión en nuevas empresas y am-pliaron el margen de ganancias quepodrían reinvertirse en el sistemaindustrial.

Durante el siglo dieciocho y laprimera parte del diecinueve, elfinanciamiento interno antes que elexterno, basado en el sistema banca-rio y en las bolsas de valores, fue elprincipal medio de desenvolver lasempresas industriales. Hacia finesdel siglo dieciocho el sistema ban-cario comenzó a adquirir un granimpulso, pero de preferencia facilitóel capital de trabajo en tanto que losahorros individuales y las utilida-des no distribuidas proveyeron losrecursos para la formación de capi-tal, desarrollándose con el tiempo lasinstituciones conocidas del merca-do financiero. Es interesante señalarque en Inglaterra, a la inversa queen el continente, y sobre todo enAlemania, los bancos se mantuvie-ron ajenos al financiamiento, controly promoción de empresas, lo que seexplica porque hubo un flujo sufici-ente de ahorros desde las otrasfuentes ya mencionadas. En este úl-timo sentido, habría que mencionarla aparición en la constelaciónfinanciera de uno de los instrumen-tos más eficaces y que pasa a ser

dominante en la organización pri-vada: la sociedad por acciones oanónima.

En tiempos recientes, el procesode financiamiento en Gran Bretañaha experimentado cambios que soncomunes a prácticamente todos lospaíses europeos y que se podríanresumir en: (a) la pérdida de impor-tancia de la contribución de ahorrospersonales; y (b) la generación en elpropio mundo de las empresas delos recursos invertibles. Aún en lospaíses de filosofía tan liberal comoAlemania Occidental, el ahorro delgobierno ha representado alrededordel 40% del total en 1954. Sobre estepunto, véase conferencia del prof.Carlos Oyarzún.

En el extremo opuesto al modeloinglés puede situarse la Unión Sovi-ética, cuyo único punto de seme-janza con el primero puede estar enel hecho de que en ninguna de lasdos experiencias jugó un papel lainversión extranjera. En el ejemplosoviético, como es evidente, el desar-rollo económico tiene lugar en elmarco de una estructura social ypolítica por completo diferente, porno decir opuesta. Sin embargo, algu-nos rasgos económicos fundamenta-les se repiten. Por una parte está elfenómeno del crecimiento despro-porcionado de los sectores básicos,que se traduce en una expansiónacelerada de la esfera de la produc-ción de bienes de capital y en lacontención del crecimiento del sectorde producción para el consumo. Porotra parte, sobresale el hecho de latransformación agraria, que a la vezque liberó mano de obra para lasindustrias y las actividades tercia-rias – servicios de toda clase – proveeel excedente alimenticio y las mate-rias primas de origen agropecuario,que demanda la industrialización.

Respecto al primer aspecto, elagente social que tuvo a su cargo larecepción de los ingresos y su canali-zación hacia la formación de capi-tal fue el Estado y no la clase propie-taria, que en el proceso aseguró eldominio sobre los medios de produc-ción en Inglaterra. Mirado desde unángulo menos institucional, podría

3 Ver, para mayores detalles, G.Meier e R. Baldwin, Economic Development.

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decirse con Hans Singer que el gru-po o partido dirigente desempeñó elpapel respectivo. Hay pocas dudasque ese conglomerado humano con-siguió eludir gran parte de lossacrificios que resistió la masa, perono es menos efectivo que la prodiga-lidad, el consumo conspicuo y larelajación que traerían aparejadasno han figurado corrientemente en-tre los múltiples defectos que se hancriticado en esos agentes políticosdel proceso de acumulación. De allíque el mismo Singer se haya referi-do alguna vez al patrón victorianode la sociedad soviética dirigente.

Hay considerable discusión res-pecto al grado de sacrificios que im-plicó para a población rusa el desen-volvimiento económico. Que hahabido un sacrificio relativo no cabeduda y está registrado en la distintaintensidad del crecimiento de lossectores. Sin embargo, no está clarosi el proceso también implicó otro decarácter absoluto, es decir que elesfuerzo haya requerido en el perío-do o parte de él una disminución delingreso o mejor dicho del consumopor persona. A este respecto el eco-nomista inglés Maurice Dobb,4 sos-tiene que deben dejarse de lado lasinfluencias o causas extra econó-micas, como las que afligieron losprimeros diez años de la revolución.Descontados esos efectos y ese perio-do, Dobb sostiene que hubo peque-ños aumentos del consumo y no unareducción del mismo y que el granempeño de inversión se debió esen-cialmente a la acumulación de losaumentos del producto en el sectorde bienes de capital. De todos modos– y sin olvidarse la gravitación de lasexigencias militares y la destrucciónde la última guerra – parece cierto queel ciudadano tuvo que esperar hastaestos últimos años para disponer enalguna cantidad significativa demuchos bienes de consumo de em-pleo extendido en los países desar-rollados. Esta reflexión, empero, deberelacionarse con otra que habitual-mente se olvida: que el grueso de lapoblación inglesa debió aguardarcasi un siglo desde el inicio de larevolución industrial, que se fija apro-ximadamente em 1760, para que secompensaran sus ingentes sacrificios

en pro del desenvolvimiento de supaís. Y agregamos que la fase demejoramiento arribó principalmentecuando Inglaterra comenzó a cose-char el fruto de sus inversiones en laproducción agrícola del extranjero yel giro favorable de sus relaciones deprecio de intercambio.

Esta evaluación, sobra señalarlo,no toma en cuenta los aspectos polí-ticos del asunto – por ejemplo, si lapoblación ganó o perdió por eseconcepto al pasar del zarismo al sis-tema actual. Solamente quiero su-brayar que en términos estrictamenteeconómicos el enorme salto de laindustrialización soviética no impor-tó penurias que resulten desmedidasen su rigor o prolongación al compa-rarse con las que sufrió la nacióninglesa para romper su círculo de lapobreza.

La nota anterior es importanteporque quienquiera haya visitado –como el que escribe – los países deAsia, se habrá dado cuenta de que elimpacto de la experiencia rusa tienepoco que ver con la ideología o elsistema político y mucho, en cambio,con la reflexión de que es posible enun plazo no excesivamente largo ysin reducción absoluta de los nive-les de vida, imprimir un impulso vi-goroso al desenvolvimiento econó-mico aún desde niveles muy bajosde productividad e ingresos. Quizásen esta apreciación exista un gradode ilusión, porque no puede olvidar-se que muchos de los países de esaregión, por ejemplo India, no cuen-tan con los ricos recursos naturalesde que dispone la U.R.S.S., pelo ellono despoja de significación aleccio-nador a la experiencia.

Como es natural, el mecanismode financiamiento de la creación decapital en el sistema soviético difiereradicalmente del empleado en lospaíses de empresa privada. El Esta-do, por medio del presupuesto fis-cal, es el principal recolectador e in-versor de los ahorros colectivos. Porotro lado, las empresas estatales ylas granjas colectivas también dispo-nen de una parte menor de los re-cursos para la capitalización, ya queestán autorizados para retener un

margen de las utilidades de susoperaciones productivas.

El medio que emplea el gobiernopara reunir los ahorros es el común,de un superávit en cuenta corriente,esto es, un excedente de las entradasrespecto a los gastos que no involu-cran aumento del capital nacional.Ese superávit, unido a los recursospropios citados arriba, constituye elvolumen del ahorro que pasa adisposición de las unidades produc-tivas, de acuerdo a las decisionesgenerales y particulares del plan.

Un aspecto interesante y discuti-do del sistema soviético es la estruc-tura tributaria que le permite acumu-lar los recursos para sus gastoscorrientes y de capital. Como se sabe,la fuente primordial de ingreso estárepresentada por los impuestos indi-rectos sobre las mercaderías produ-cidas. En esta clasificación tambiénse incluyen los tributos sobre las uti-lidades de las empresas estatales ylas deducciones o imposiciones deseguridad social sobre los salarios,ya que representan cargas sobre losprecios.

Parece indudable que el efecto deeste régimen tributario es de carácterregresivo, esto es, significa unacontribución mayor sobre el ingresopara las personas de menores rentas,efecto que se atenúa en alguna me-dida por cierta discriminación quefavorece a los bienes más esenciales.

A juicio de algunos investigado-res (ver F.D. Holzman, FinancingSoviet Development, trabajo del libroCapital Formation and EconomicDevelopment, Universidad de Prin-ceton) esta preferencia del régimenfiscal soviético obedece a tres razones:

a. que los efectos psicológicos dela tributación son menores queen el caso de la imposicióndirecta y personal a los ingre-sos;

b. que los impuestos indirectosson de administración mássimples;

c. que el impuesto al valor de lasproducciones facilita la plani-ficación de la economía. Comoexiste un mercado relativamen-te libre de productos de consu-

4 Simon Kuznets, Soviet economic development since 1917.

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mo, por medio de la tributaciónpueden equilibrarse oferta ydemanda elevando o bajandolos precios de los artículos.

A lo anterior habría que agregarque la teoría y práctica soviéticas sehan mostrado muy indiferentes alos problemas de la distribución delingreso, salvo en lo que respecta a lanecesidad de establecerse incentivosapropiados para los elementos califi-cados de la mano de obra. Parecehaberse partido de la base de queproviniendo todas las rentas del tra-bajo y Estado supeditados a unaponderación de la utilidad social delservicio prestado, no hay lugar paralas preocupaciones que interesan enotros tipos de sociedades. En resu-men, el sistema soviético se basa enun mecanismo de ahorro a través delsistema de precios y que se traduceen el control y dirección del volumende consumo de la población.

El modelo de crecimiento de Esta-dos Unidos – que tiene algún paren-tesco con el de Canadá, Australia yNueva Zelandia ) es el que más seasemeja en el terreno económico al yafamoso “parto sin dolor” de la medi-cina actual. Evidentemente, no fueuna situación idílica la que afronta-ron los esforzados pioneros de lacolonización norteamericana, comotampoco pueden olvidarse las dificul-tades y penurias que encaró el prole-tariado industrial en los períodosformativos de la industrialización. Ladocumentación económica y la lite-ratura social nos ofrecen abundantetestimonio al respecto y vale la penarecordar que el día que considerancomo su principal festividad lostrabajadores de la mayoría de los pa-íses, recuerda precisamente el dramaobrero de un 1er de mayo en Chica-go. Sin embargo, en términos relati-vos, que son los que importan paraestos exámenes, difícilmente puedeponerse en duda que el formidableprogreso del país del norte requirióuna suma mínima de sacrificios encomparación a otros países y a lagenerosidad de la cosecha de bienes-tar material conseguida.

Esta experiencia afortunada sedebe a una conjunción de factoresde diverso orden. En primer lugar,habría que referirse a la combinación

excepcional, de recursos humanos ynaturales, tan ricos unos como otros.Respecto al primer factor, bien sesabe que las corrientes de inmigra-ción trajeron a Estados Unidos a unaparte de los elementos más empren-dedores y capacitados que existíanen Europa, gente que poseía el bagajetécnico de la época y que se encon-traba poseído de un espíritu indo-mable y resuelto a superar toda clasede obstáculos. Por otra parte, esaenergía se volcó sobre un mediomaterial de gran riqueza potencial:tierras vírgenes y abundantes, aptaspara todas las explotaciones en suinmensa área, ricas en variadas re-servas minerales.

De esa feliz combinación de re-cursos, unida a una mentalidad re-almente identificada con el progresoy con la necesidad de la acumula-ción, surgieron caudalosos los exce-dentes destinados a elevar la produc-tividad agraria y a desarrollar losotros sectores económicos. Es útilindicar que las propias unidadesagrícolas y el comercio y pequeñasmanufacturas fueron la cuna de losindustrialistas que habían de trans-formar la economía.5 El proceso deformación de capital se alivió tam-bién porque, como anota Hans Sin-ger, “los fondos que fueron necesariospara el crecimiento del país y que Ingla-terra y la U.R.S.S. generaron con enor-mes sacrificios fueron obtenidos por Es-tados Unidos en la forma del dinerogastado por los países fuentes de lamigración en el aprovisionamiento,preparación y equipo de los que partie-ron a Estados Unidos”.

Junto a los elementos anterioresconviene subrayar la importanciadecisiva del dinamismo y de la flexi-bilidad inherentes a una sociedadabierta, esto es, libre de las rigidecesinstitucionales y del peso de tradi-ciones desventajosas para un pro-ceso de cambios persistentes en laestructura social y económica. Laausencia de una organización feu-dalista en la agricultura, con el con-siguiente monopolio o control de losrecursos y el poder por minorías sinintereses en la mutación del cuadroexistente, puede apreciarse en toda

su trascendencia al cotejar la evolu-ción dispar que tiene lugar en el Sur,donde existían esas trabas, y en otrasáreas del territorio.

Un aspecto interesante en eldesarrollo de Estados Unidos es elreferente al aporte extranjero a laformación de capital por la vía deinversiones o transferencias deingresos. Aunque parezca extraño ala luz de las oportunidades queofreció ese pujante mercado, lasinversiones a largo plazo en el paísdel norte no parecen haber sidosustanciales ni en relación a lainversión con recursos internos nicomparados con las contribucionesa otras áreas. Respecto al primerpunto, los datos recopilados porKuznets6 indican que el aporte exte-rior representó entre 1870 y 1890aproximadamente el 7% de la crea-ción de capital interna, que desapa-rece posteriormente, cuando EstadosUnidos se transforma en país acree-dor. Asimismo, en la distribución deinversiones a largo plazo de losprincipales países exportadores decapital, que exceptuando EstadosUnidos llegaban a unos 40.000 millo-nes de dólares en 1913-14, la econo-mía norteamericana sólo recibió6.800 millones, cifra inferior a la deAmérica Latina – 8.500 millones – ya la de Europa – 12.000 millones –comparable solamente con la deAsia, 6.000 millones. Esta evoluciónsubraya la observación de algunosautores de que, contrariamente a lassuposiciones abstractas, desde anti-guo los movimientos de capital su-frieron una gran influencia de lasconsideraciones políticas. A este res-pecto se destaca que buena parte delas inversiones en Europa fuerondirigidas antes de los años citados apaíses europeos y Rusia con finesextra económicos y por influencia delos gobiernos acreedores. Sobre esepunto Kuznets señala que los fondosinternacionales de capital disponi-bles sólo fluyeron en parte hacia loscanales de una demanda garanti-zada para la formación de capital.7

En cuanto a la estructura o meca-nismos financieros para la conver-sión de los ahorros en capital, el

5 Ver G. Soule, Economic forces in American History6 Simon Kuznets, op.cit.7 Simon Kuznets, op.cit.

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estudio de Goldsmith8 indica algu-nas tendencias significativas en laevolución norteamericana. En primertérmino esas tendencias señalan unmarcado cambio en la relación entrelos activos financieros o intangibles– acciones, bonos etc – y el capitalreproductivo o activos reales. El co-eficiente era muy bajo alrededor de1850, período del que se disponenlos primeros cálculos, cuando losactivos financieros representabanaproximadamente la mitad de losfísicos. Eso es muy natural, dado elescaso desarrollo de las institucionesfinancieras y las corporaciones denegocios o sociedades anónimas, lomismo que la deuda pública. Conposterioridad, la relación sigueinclinándose a favor de los activosfinancieros que en los últimos añosrepresentan un valor equivalente alcapital reproductivo. El proceso,como es evidente, representa lacreciente sustitución de la propiedaddirecta – en que se confunden dueñoy empresa – por la indirecta – en queesas dos categorías se separan y sonrelacionadas por títulos o valoresfinancieros. Por ejemplo, la explota-ción agrícola tradicional y la inver-sión o propiedad por la vía de unainstitución de seguros o de financia-miento.

Anota Goldsmith que “si la prime-ra mitad de este siglo es tomada enconjunto…se percibe que menos de uncuarto de la expansión neta total de losactivos de las unidades familiares, me-nos de un tercio de la de los gobiernoslocales y estaduales y de los negocios nointegrados en corporaciones, pero 3/5 delincremento de activos de las corporacionesno financieras, requirieron fondos exter-nos, es decir, tuvieron que valerse de loscanales financieros”.9

Otro aspecto digno de destacarseen el proceso de formación de ahor-ros y capital en Estados Unidos yque contrasta con la situación emer-gente en otros países capitalistasavanzados, es la importancia quemantienen los ahorros individualesen el volumen global, aunque suproporción haya disminuido ligera-mente con el tiempo.

Como se puede apreciar, aumentóla participación de las empresas ydel gobierno.

Finalmente, cabría aludir alhecho que representa un marcadocontraste con el modelo británicoque para Estados Unidos el procesode crecimiento y de capitalizaciónha debido muy poco a la transferen-cia de ingresos de otros países a cau-sa de sus inversiones en el exterior.La verdad es que a pesar de su con-dición de país acreedor, las entra-das por este concepto representanuna fracción muy pequeña de suingreso nacional. Esto se apreciamuy claramente en la escasa signifi-cación del intercambio exterior en laproducción norteamericana, que noha llegado al 5% en los últimos años.Parece claro que el mejoramiento delingreso disponible por ese caminotiene que manifestarse realmente enlos excedentes de importacionesrespecto a las exportaciones. Ysiendo reducido ese volumen respec-to al producto interno, difícilmentepuede ser aplicable ese margen parael ingreso global.

El problema puede apreciarse connitidez en algunas cifras sobre Amé-rica Latina. En 1955, por ejemplo, lasalida de capitales por servicios yremesas de utilidades representóunos 1.100 millones de dólares. Lasuma fue muy importante en compa-ración al valor de las exportacioneslatinoamericanas de ese año, quealcanzaron a 8.150 millones, perorelativamente insignificante compa-rada con el ingreso nacional del paísdel norte, que excedió los 300.000millones de dólares. Se trata, comose ve, de dos problemas distintos,que no deben confundirse en estemomento del análisis, aunque mástarde los apreciemos en distinta for-

ma al detenernos a considerar lacuestión de las contribuciones yaportes del capital extranjero.

La experiencia de Japón no harecibido tanta atención como lasanteriores. Sin embargo, es induda-ble que se trata de uno de los fenó-menos más fascinantes en la historiadel desarrollo económico. Primero,es el único país no europeo que halogrado introducirse al selecto clubde las naciones industrializadas y,en seguida que realizó esta hazañaen un ambiente poco propicio apa-rentemente para la aventura, comoera la última parte del siglo pasado,cuando una tras otra de las econo-mías de la periferia no capitalistafueron incorporadas al sistema deintercambio creado por las nacionesmás adelantadas. Segundo, signifi-ca un verdadero reto para los inves-tigadores la circunstancia sin para-lelo de que la radical transformaciónde la estructura productiva delJapón se desenvolvió dejando casiintacto el sistema socio-político tra-dicional, salvo en lo que respecta adesplazamientos entre los gruposdominantes.

Hasta ahora no ha sido posibleresolver enteramente la incógnitarespecto a la motivación o conjuro quehizo, prácticamente, saltar siglos a laeconomía japonesa. Entre las hipóte-sis más atractivas quizá esté la quemenciona Paul Baran10 y que tienealguna sugerencia digna de Toynbee.A juicio de ese autor, el proceso demutación del sistema productivo ini-ciado por la clase dirigente niponapuede interpretarse como la respues-ta al desafio planteado en Asia porla invasión comercial y política de

Según Kuznets, el ahorro bruto se distribuyó así en los dos períodosescogidos:

Personal Negocios Sociedades

No agrícola agricultura incorporados anónimas gobierno

1887-1906 43,3 8.1 8.4 33.5 6.81946-1949 36,1 8,0 4,4 36,5 14,6

8 R.W. Goldsmith, Capital formation and economic growth9 R. W. Goldsmith, op.cit.10 Paul Baran, op.cit.

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las grandes potencias. Ese fenómenosometió a una presión angustiosa ala sociedad japonesa, tradicional-mente hostil a toda penetraciónextranjera: o seguir la suerte de Chi-na y otros países del área, o erigirsecontra los colonizadores, no con lasarmas, que no ofrecían esperanza,sino con la misma organización y elinstrumento económico que habíahecho poderosos a sus enemigospotenciales. Su condición insular yla relativa pobreza de recursosnaturales seguramente favorecieronla elección y desarrollo de la segun-da alternativa.

La estrategia económica del Japónse asienta, como otras, en una funcióndecisiva de la agricultura. Por unlado, el Estado arrebató a los terra-tenientes el poder de tributación quetenian sobre los granjeros y queejercían por medio de los samurais.Por el otro lado, se realizó una in-tensa acción para elevar la producti-vidad de la explotación agrícola, conlos fines ya conocidos – aumentar laoferta de bienes y de mano de obra –pero recurriendo a los impuestos,para impedir que el aumento deingresos acrecentara su consumo ya objeto de canalizarlos hacia la in-versión. A esto se agregó la resueltapolítica gubernamental de establecerindustrias, desarrollar yacimientosmineros, astilleros etc., para entre-garlos a poderosos grupos privadosa bajo precio, o su compensación. Deeste modo, el Estado congenió suspoderes con los intereses de las gran-des casas empresariales, las zaibatsu.Fue un arreglo poco justiciero paraquienes habian suportado el peso dela tributación, pelo el objetivo cen-tral – la transformación del país – seobtuvo en un plazo relativamentebreve. Antes de la Primera GuerraMundial, en su enfrentamiento conRusia, Japón probó que ya era unade las grandes potencias.

La transferencia de los ahorroscreados por la política fiscal signifi-có el principal mecanismo de finan-ciamiento de la formación de capi-tal. Luego, los propios excedentes delos grandes consorcios, favorecidospor una política social y por unasituación de mano de obra excesiva,que restringía la lucha de los asala-

riados, pasaron a constituir la otrafuente básica de recursos. El capitalextranjero jugó, en general, un pa-pel secundario. Sólo en los años an-teriores a la Primera Guerra Mundi-al representó alrededor del 5% de lainversión doméstica. En verdad,pasaron a ser más importantes lasinversiones japonesas en el exteriory el flujo de ingresos provisto por laexpansión de su sistema colonial. Eldiscípulo resultó a la postre un des-tacado exponente de la política con-tra la que se había rebelado.

C. Revisión: el esfuerzointerno en la ruptura delcírculo de la pobreza

Una sumaria recapitulación delos aspectos primordiales en estascuatro experiencias tan destacadascomo particulares podría poner derelieve el papel estratégico de la po-lítica y el desarrollo del sector agrí-cola en relación a la liberación demano de obra para los otros sectores,la provisión de un excedente de ali-mentos y de materias primas paralas actividades industriales y comoreserva tributaria, como el caso delJapón Sólo en Inglaterra el comercioexterior tiene una significación im-portante como proveedor de alimen-tos, pero una vez que las inversionesy exportaciones ya habían crecidoconsiderablemente.

En lo relativo a los medios definanciamiento y acumulación decapital, encontramos que tanto enInglaterra como en Estados Unidoslas empresas y el ahorro personalproveen los principales recursos,canalizándose hacia la inversióngracias a un complejo sistema finan-ciero. En cambio, vemos que en Japóny en la U.R.S.S, con distintas moda-lidades y contenido, el ahorro creadopor la política fiscal constituye lafuente básica del proceso. En el casode Japón sobre todo en la fase inicialde la industrialización. Luego, vemosque el aporte de capital extranjerotiene una significación muy reducidaen la experiencia de E.E.U.U. y deJapón y prácticamente ninguna enlas de Inglaterra e de la U.R.S.S. yaun, que la transferencia de ingresosdesde el exterior, por la vía delrendimiento de inversiones, la rela-ción con los términos de intercambio

y los vínculos coloniales, revistaimportancia en Inglaterra y Japón ymuy poco en los Estados Unidosyninguna para la U.R.S.S..

Ahora, si proyectamos esos cua-dros a la evolución latinoamericanade las últimas décadas, para inten-tar un contraste muy simple de ca-racterísticas, tal vez se pusieran enrelieve los siguientes aspectos en elpor lo demás muy poco homogéneofenómeno latinoamericano. Salvo enlos casos de Argentina, México yBrasil, la agricultura no ha desem-peñado la función “clásica” de lasexperiencias antes comentadas. Encambio, la expansión de las activi-dades primarias ha constituido, engeneral, un medio para adquirir ma-nufacturas y bienes de capital en elexterior, o sea, para activar la indus-trialización de otros países. Las re-laciones entre los sectores I e II a lasque nos referimos más atrás, podríanproyectarse en sus líneas básicaspara interpretar el intercambio en-tre las naciones de producción pri-maria y las industrializadas. El sis-tema financiero en general y laformación de ahorros personalestienen poco peso en la acumulación.En casi todos los países, al lado dela inversión con recursos internos delas empresas, pesó la participación,directa e indirecta, del Estado. EnMéxico, la inversión pública se situóentre el 35% (1946) y el 43% (1953)del total. En Colombia, subió desdeun 2,2% en 1945 a un 23% en 1954.En Chile representó un promedio de35% entre 1946 y 1953. En Brasil, lascifras de CEPAL sitúan la inversiónpública en ese periodo desde un8,9% a un 14,6%.

MESTRADO EMANÁLISE REGIONAL

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no Estado da Bahia

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ResumoEste artigo discute as atuais difi-

culdades do processo de emergên-cia de novas identidades regionaisno extremo sul do Brasil.Palavras-chave: institucionalizaçãode regiões, emergência de identida-des regionais, conselhos regionais,Rio Grande do Sul, COREDE.

Abstract:This article undertakes a discus-

sion about the current difficulties onthe rise out of new regional identitiesin the extreme south of Brazil.

Key-words: institutionalization ofregions, emergence of regional identi-ties, regional councils, Rio Grandedo Sul, COREDE.

1. IntroduçãoOs diversos tipos de arranjos ins-

titucionais de caráter infra-munici-pal, municipal ou intermunicipal;micro ou mesorregional; e até esta-dual ou interestadual, podem servistos como decorrências inevitáveisda óbvia incapacidade de uma sim-ples estrutura do tipo União/Esta-dos/Municípios democratizar umasociedade que objetivamente se or-ganiza em uma dúzia de imensascidades metropolitanas, rodeadaspor 160 microrregiões polarizadas edominadas por aglomerações urba-nas ou cidades, e por uma imensavariedade de situações que ocorremem 390 microrregiões rurais.

Tais arranjos institucionais vi-sam a gerar governança, justamenteonde mais fica clara a debilidade go-vernamental, ou a quase falta com-pleta de governo. E nas partes doBrasil em que já houve mais desen-volvimento (Sul/Sudeste), essa de-bilidade ou falta de governo vem semanifestando com mais clareza nos

vazios institucionais que se situamentre a base – municipal — e o esca-lão intermediário – estadual.

Entre as experiências brasileirasdesse tipo de governança micro emesorregional destacam-se as dosdois estados do extremo sul que –talvez não por mera coincidência –têm os mais altos índices de desen-volvimento humano (IDH): SantaCatarina e Rio Grande do Sul. Combase em pesquisa realizada peloautor no primeiro trimestre de 20052,a seção 3 deste texto se servirá deconcisa descrição analítica, princi-palmente do caso gaúcho, para pro-por, na seção 4, discussão mais nor-mativa sobre condições de êxito ereal efetividade desse tipo de expe-riência. O que permite que se propo-nha no final um balanço sobre a insti-tucionalização dessas novas unida-des territoriais com base nos quatrocritérios enfatizados por Bandeira(2006), que não devem ser entendi-dos como etapas consecutivas: a)definição da forma ou abrangência;b) formação de imagem conceitual esimbólica; c) surgimento e institui-ções e organizações apropriadas; d)estabelecimento da região como partede um sistema.

2. O contextoHá sempre muita diversidade em

fóruns e conselhos criados, ou mo-dificados, por ações de atores sociaisque — por várias razões e em dife-rentes conjunturas — optam por seengajar e se empenhar pela promo-ção do desenvolvimento. No casobrasileiro essa diversidade tende aser exponencial, não apenas devidoà sua formidável heterogeneidade

natural e cultural (que pode ser de-composta em geográficas, históricas,etnológicas, etc.). Também – talvezprincipalmente — por diversas ca-racterísticas da evolução políticaque transformou essa imensa parteda América do Sul em federaçãotripartite constituída por 27 unida-des territoriais e 5.561 municípios,com graus muito heterogêneos deautonomia legal e dependência fi-nanceira de uma União que há meioséculo foi transferida para o coraçãodo Planalto Central, com a constru-ção de Brasília.

Uma das principais conseqüên-cias dessa estranha federação, quesó foi legitimada pela Constituiçãode 1989, é uma óbvia contradiçãoobjetiva entre estrutura governamen-tal e hierarquia territorial. Não ape-nas entre um Brasil metropolitano eo resto, comum em grosseiras abor-dagens urbanísticas que entendempor interior aquilo que está fora dealgumas das verdadeiras 12 aglome-rações metropolitanas. Ou — muitopior — fora de algumas das oficiais27 “RM” (Regiões Metropolitanas)e 3 “RIDE” (Regiões Integradas deDesenvolvimento). Simplesmentesão ignoradas as influências cruza-das de 37 aglomerações proto-metro-politanas, 77 centros urbanos, e ou-tros 567 núcleos, sobre os restantes4.500 municípios nos quais a rurali-dade é onipresente. E poucos se dãoconta de que o Brasil real é formadopor algo como 550 microrregiõespotenciais, das quais 60 são forte-mente marcadas por aglomerações,100 são significativamente urbani-zadas, e 390 são essencialmente ru-rais.

VICISSITUDES DA GOVERNANÇA CIDADÃ:OS CONSELHOS REGIONAIS GAÚCHOS (COREDE)

José Eli da Veiga1

1 Professor Titular do Departamento de Economia da FEA e do Programa de Pós-Graduação em Ciên-cia Ambiental da Universidade de São Paulo: www.econ.fea.usp.br/zeeli/ [email protected]

2 Informações bem mais detalhadas sobre os resultados dessa pesquisa estão em Veiga (2005).

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Além disso, apesar de já estar bemdemonstrado que existem no Brasilentre 9 e 11 macrorregiões, que emnada coincidem com as velhas de-marcações, quase todas as análisescontinuam obrigadas a usar os 26Estados (mais DF) agrupados em 5regiões como principais manifesta-ções das desigualdades espaciais. Etão ou mais delirantes são as que uti-lizam jurássicas dicotomias oficiais,como a do urbano versus rural, queno Brasil é interna aos municípios.

A esse chocante nevoeiro territo-rial soma-se o resultado ambivalenteda autonomia que foi atribuída aos5.561 pilares da singular RepúblicaFederativa. Não resta dúvida que adescentralização viabilizada pelaConstituição de 1989 foi benéficapara a educação e a saúde, duas dastrês dimensões mínimas do desen-volvimento. Prova disso é a melhoriados indicadores desses dois trunfossociais em enorme número de muni-cípios com baixos ou baixíssimosníveis de renda familiar, além demedonhas ou horripilantes condi-ções de saneamento. Todavia, emtermos de dinamização econômica,parece ter sido estéril essa pulveri-zação das transferências de recur-sos públicos. O Atlas do Desenvolvi-mento Humano (www.pnud.org.br)mostra que nos grotões a freqüênciaescolar melhorou cinqüenta vezesmais que a renda. Uma distorção quedecorre a extrema pulverização dosrecursos para investimentos e clama,portanto, por articulações intermu-nicipais de caráter microrregional nalinha das pioneiras sulistas.

3. A governança microrregio-nal sulistaO “Sistema de Desenvolvimento

Regional e Urbano (Sisdru)”, do pe-

ríodo de ditadura militar (GovernoEuclides Triches, 1971-74), e o “Pro-grama de Descentralização Regio-nal”, do período da redemocratiza-ção (Governo Pedro Simon, 1986-90), visaram ambos absorver e pro-mover as pré-existentes estruturasde atuação da máquina governamen-tal para fins de planejamento doprocesso de desenvolvimento. Aprincipal diferença do atual ambi-ente institucional e organizativo —que só começou a realmente emergira partir de 1990, na campanha elei-toral de Alceu Collares — está naênfase na participação da socieda-de civil na promoção do desenvolvi-mento regional.

São raros (e certamente pouco li-dos) os estudos que se propuserama reconstituir a trajetória históricadessas três consecutivas visões pú-blicas do desenvolvimento territo-rial.3 Por outro lado, há um rico co-nhecimento tácito disperso entre pro-tagonistas e observadores dessa ex-periência (de praticamente 35 anos),mas não se pode dizer que ele estejasistematizado (e, menos ainda, quetenha sido assimilado por significa-tivo número de quadros gover-namentais, políticos, acadêmicos,sindicais, etc., que hoje estão envol-vidos em ações de desenvolvimen-to). É um problema muito sério, pois,ao lado do semelhante caso catari-nense, a experiência de desenvolvi-mento regional gaúcha é, de longe, amais avançada do Brasil.4 Aliás,pode-se até perguntar se a dianteiradesses dois estados sulinos em ter-mos de desenvolvimento — apesarde não serem as mais ricas unida-des da federação – pode estar ligadaa um processo de construção institu-cional incomparavelmente mais vir-tuoso do que aquele que ocorreu noEstado de São Paulo, por exemplo.

A divulgação do Índice de Desen-volvimento Humano Municipal de2000 (IDH-M) revelou que é tão fortea superioridade dos catarinenses edos gaúchos nas duas dimensõesmais relevantes – longevidade e esco-laridade – que eles superam os paulis-tas. Por isso, dar atenção às diferen-

ças de desempenho entre esses trêsEstados pode ser muito elucidativo,particularmente para quem aindaacredita que crescimento e desenvol-vimento sejam sincrônicos.

O Estado de São Paulo concentra30% das empresas, 31% dos empre-gos e mais de 38% da renda geradapela economia formal brasileira.Como fica fora desse cálculo quasetodo o setor primário, no qual sãoraros os empreendimentos com ca-dastro nacional de pessoas jurídicas(CNPJ), pode-se supor que a econo-mia paulista abranja bem mais deum terço das empresas e dos empre-gos, e algo que se aproxima da meta-de da renda real do país. Não é de seestranhar, então, que seja mais ele-vada a renda per capita dos municí-pios paulistas. Em média, ela é 7%mais alta que a dos catarinenses e10% superior à dos gaúchos. Situa-ção que se inverte com as médias doIDH-M: 0,791 em SC, 0,783 no RS eapenas 0,779 em SP. Um contrasteque decorre do sofrível desempenhosocial de muitos municípios pau-listas.

Para procurar as raízes desseparadoxo, é bom começar pelo as-pecto que melhor espelha a diferen-ça: a distribuição dos municípios decada Estado segundo as três catego-rias definidas pelo Pnud. Como ne-nhum dos 1.405 municípios dos trêsEstados está em situação de baixodesenvolvimento (IDH menor que0,500), a comparação se resume aosdois grupos superiores: médio (IDHentre 0,500 a 0,800) e alto (IDH su-perior a 0,800). Têm alto desenvolvi-mento 42% dos municípios catari-nenses, 37% dos gaúchos, e somen-te 26% dos paulistas.

Certo, o Estado de São Paulo émaior e tem mais municípios. Masessa desculpa fica em farrapos quan-do ele é comparado à soma dos doisEstados sulinos. Juntos têm 760 mu-nicípios, dos quais 293 (39%) comalto desenvolvimento, enquanto sóhá IDH superior a 0,800 em 171 dos645 municípios paulistas. E a supe-rioridade sulista fica ainda mais pa-tente quando são considerados se-

Não resta dúvidaque a descentralização

viabilizada pelaConstituição de 1989 foi

benéfica para a educaçãoe a saúde...

3 Destacam-se: o capítulo IV de RÜCKERT (2001), pp. 348-494; e o volume 1 de BECKER (2002).4 O mesmo se aplica para certas regiões do Paraná, principalmente Sudoeste e Oeste.

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paradamente os indicadores sociaisque compõem o IDH. Por exemplo,no grupo formado pelos municípiosde alto desenvolvimento, a média deesperança de vida é de 75 anos emSanta Catarina, 74,4 no Rio Grande,e 73,4 em São Paulo. Para todos osoutros indicadores o que varia é aprimeira colocação, disputada pelosdois sulinos. São Paulo é sempre oterceiro...

Não há explicação razoável paraesse fenômeno que não passe peloavanço relativo das instituições gaú-chas e catarinenses de desenvolvi-mento regional. Enquanto gaúchose catarinenses azeitavam institui-ções locais que favoreciam proces-sos descentralizados de desenvolvi-mento, os paulistas reforçavam asque inibem o dinamismo e a moder-nização da maioria de suas microrre-giões. Enquanto no Sul já se discutequais poderiam ser as melhores for-mas de gestão de agências de desen-volvimento a serem criadas por di-nâmicos conselhos ou fóruns inter-municipais, São Paulo procura no-vas fórmulas de amparo paternalis-ta a municípios mais atrasados semo envolvimento solidário de seus vi-zinhos mais avançados. Claro, esseé um contraste que pode ser atribuí-do a profundas raízes históricas,pois em São Paulo predominaram asgrandes fazendas escravistas en-quanto o extremo Sul era povoadode forma democrática por colonos deorigem européia. Mas é um contras-te que foi confirmado no século XXem vez de ser contrariado.

O desempenho socioeconômicode qualquer pequeno município cer-tamente depende muito das qualifi-cações individuais de seu prefeito.Ele não pode fazer milagres, mas sãobem recorrentes os casos em que adinamização pode ser atribuída àeleição de uma pessoa “fora do co-mum”, capaz de estimular novos em-preendimentos e atrair para seumunicípio decisivos investimentosprivados e públicos. Quando ficapatente a mudança de “atmosfera”,constata-se inclusive o retorno deemigrantes que adquiriram algumaqualificação profissional e fizerampoupança suficiente para abrir no-vos negócios. Mas esse papel crucial

do prefeito não vai muito longe seestiver isolado, e não conseguir con-trabalançar a força de gravidade dosmunicípios que já dominam os vín-culos sócio-econômicos da região.

Torna-se assim necessária algu-ma forma de articulação microrre-gional dos municípios que incluaaquele que mais os influencia. Sóassim pode haver diagnóstico, pla-nejamento, divisão do trabalho e ca-pacidade operacional. Em todas asregiões do País já existem inúmerasindicações de tentativas informais dese estabelecer “pactos”, e até algu-mas iniciativas de criação de con-sórcios intermunicipais especializa-dos. Mas nada indica que a excelen-te experiência adquirida em SC e RSpelas “Associações de Municípios”e por seus respectivos “Fóruns de De-senvolvimento” e “Conselhos Regi-onais de Desenvolvimento” (CORE-DE) seja razoavelmente conhecida,e muito menos que esteja sendo emu-lada.

O pior é que muitas políticas dogoverno federal enveredam pela con-tramão, ao exigirem que pequenosmunicípios “se voltem para o próprioumbigo”, mediante criação de con-selhos municipais, quando o maisimportante seria induzir articulaçõesintermunicipais. É compreensívelque se queira incentivar a fiscaliza-ção da sociedade sobre o uso que asprefeituras fazem das de verbas fe-derais. Mas é equivocado pretenderque um conselho de um minúsculomunicípio possa sozinho diagnos-ticar e planejar seu próprio desen-volvimento.

Em movimento independente dasdemarcações oficiais adotadas pelogoverno estadual (Microrregiões Po-larizadas e Bacias Hidrográficas), epelo IBGE (Microrregiões e Mesorre-giões Geográficas), os municípioscatarinenses se organizaram em 21microrregiões “espontâneas”, co-nhecidas como regiões das associações,cada uma com seu respectivo centroregional, também chamado de “mu-nicípio-pólo”. As Associações deMunicípios catarinenses são insti-tuições de caráter cooperativo quecomeçaram a ser implantadas des-de a década de 1960. Mas foi só coma posterior multiplicação que o go-

verno estadual passou a estimularseus programas de trabalho e a apoiarsua articulação.

As duas primeiras reivindicaçõesmotivadoras do surgimento das As-sociações de Municípios catarinen-ses foram: construção de estrada (BR-282) e expansão da rede de energiaelétrica. Desde então, o leque de ob-jetivos não cessou de se ampliar. Aorganização foi sendo moldada pe-los vínculos sócio-econômicos e cul-turais que existem entre os municí-pios. E as associações ficaram cadavez mais profissionalizadas. Já em1998, mais da metade de seus em-pregados tinha nível superior, alémdo pessoal de nível médio ser prin-cipalmente constituído por técnicosem informática. E os municípios quemais se apóiam na estrutura das as-sociações são justamente aquelesque são considerados de médio e depequeno porte.

A partir de 1992, surgiram convê-nios entre o governo estadual e asAssociações de Municípios para quefossem elaborados “Planos Básicosde Desenvolvimento Regional”, quelogo depois passaram a ser chama-dos de “Planos Básicos de Desenvol-vimento Ecológico-Econômico”, parase adequarem ao “Programa Nacio-nal de Zoneamento Ecológico-Econô-mico”.

Como conseqüência, foi realiza-da uma viagem a diversos países daEuropa, com participação de algunsprefeitos, com o objetivo de conhe-cer as estratégias utilizadas para apromoção do desenvolvimento regi-onal. E foi essa a origem dos FórunsRegionais de Desenvolvimento,mais o Fórum Catarinense de Desen-volvimento, criado em 1996, e com-

O pior é que muitaspolíticas do governo

federal enveredam pelacontramão, ao exigirem

que pequenos municípios“se voltem para o próprio

umbigo”...

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posto de 59 entidades públicas e pri-vadas, que envolvem todos os seg-mentos organizados da sociedade.Com certeza uma das duas matrizesinstitucionais de desenvolvimentomais avançadas do País.

Foi em tudo semelhante o proces-so gaúcho de construção das insti-tuições e organizações de desenvol-vimento regional. Pode-se dizer atéque, tanto em SC quanto no RS, tudocomeçou nos anos 1970, com as in-fluências estimuladoras dos extin-tos Serphau e Sudesul5. E que, ape-sar das diferenças com o que agoraocorre em Santa Catarina6, o ambien-te institucional para o desenvolvi-mento regional permanece muitoparecido. A essência da questão re-side no fato de que, tanto quanto oatual governo Rigotto, os quatro pre-cedentes (de Simon, Collares, Brittoe Dutra) procuraram — cada um aseu modo – formas de convivência ecooperação com as embrionárias or-ganizações regionais.

3.1 A experiência gaúchaComeçar com este explícito e ine-

quívoco reconhecimento do lugar devanguarda que ocupam as institui-ções e organizações gaúchas de de-senvolvimento territorial não signi-fica que se deva contemporizar comqualquer de suas diversas insufi-ciências, distorções, mazelas, e ví-cios. Trata-se exatamente do contrá-rio. O que mais interessa nesta refle-xão é fazer a crítica desse complexosistema adaptativo institucional noqual evoluem organizações de cará-ter municipal (como os atuais con-selhos municipais de desenvolvi-mento, COMUDE), intermediárias,como são os COREDE, e superiores,como são as Mesorregiões “GrandeFronteira Mercosul” e “Metade Suldo RS”. É apontar os problemas eobstáculos que estão retardando e atécomprometendo um melhor desem-penho das regiões. E o que será ditoa seguir deve ser entendido maiscomo um conjunto de hipóteses que,por enquanto, foram insuficiente-mente testadas. 7

A principal pergunta de umaavaliação da experiência gaúcha sópode ser a seguinte: “por que ela nãoestá dando liga, apesar do respeito

à receita”? É que a dinâmica de emer-gência dos COREDE não poderia tersido mais virtuosa. Houve ampla li-berdade para que prevalecessem ini-ciativas com forte participação dospotencias protagonistas locais dodesenvolvimento. Foi um processomuito próximo da democracia dire-ta, além de quase sempre conduzi-do por elites científico-tecnológicasde focos de polarização regional. E,desde o início, esteve fortemente ca-sado com o Programa dos Pólos Tec-nológicos, inaugurado pelo governoSimon (desde 1987, com a criação daFundação de Apoio à Pesquisa,Fapergs), e certamente reforçado nogoverno Britto, quando a experiên-cia anteriormente liderada pela prin-cipal universidade comunitária daregião noroeste (UNIJUÍ) passou aser a grande referência.

Bastariam esse três elementospara que se pudesse prognosticar iné-dita aceleração do desenvolvimentodas regiões que melhor tirassem par-tido dessa invejável ferramenta polí-tica que pode ser um COREDE. To-davia, o balanço parece apontar pararesultado bem menos efusivo, e, porvezes, até contrário a tal expectativa.Não é difícil apontar regiões nasquais são muito duvidosas as pers-pectivas de mais desenvolvimento,muito embora tenham um COREDEque pode ser bem avaliado. E, no ex-tremo oposto, não seria difícil apon-tar região de surpreendente desem-penho desenvolvimentista, apesar deseu COREDE ser considerado entreos piores.

À primeira vista, tal constataçãopoderia ensejar uma rápida senten-ça: não existe qualquer tipo de cor-respondência entre a qualidade dos

COREDE e êxito em termos de de-senvolvimento regional. No entan-to, seria uma conclusão apressada ecomodista, pois só serviria para evi-tar uma análise mais detalhada dosfatores que mais contribuem paraque a ação de um COREDE seja efi-caz, neutra, ou até prejudicial aodesenvolvimento regional. Ou seja,o grande desafio de uma avaliaçãodeste tipo é enumerar (e se possívelclassificar, e mesmo hierarquizar) ascausas de uma indisfarçável frustra-ção com o desempenho dos CO-REDE.

Nesta perspectiva, a primeiraquestão que merece ser discutida tema ver com a escala. Isto é, com aabrangência espacial e político-ad-ministrativa das regiões representa-das pelos COREDE. Alguns chegama reunir mais de 30 municípios, oque por si só já cria imensas dúvi-das sobre a possibilidade de engen-drar uma elaboração coletiva demo-crática e realmente participativa deum projeto de território. Pior, há ca-sos de óbvia tensão entre pelo me-nos duas sub-regiões (na verdaderegiões), como demonstra a sobrevi-vência das respectivas associaçõesde municípios.8

Não se trata apenas de uma ques-tão operacional, embora seja difícilsequer imaginar uma reunião demo-crática e produtiva na qual estejampresentes 30 representantes de pre-feituras, mais 30 representantes deCâmaras Municipais, mais 30 repre-sentantes dos COMUDE, e mais “N”representantes dos diversos segmen-tos organizados da sociedade civil.Há também uma questão de hetero-geneidade, que compromete uma ver-dadeira identidade regional, além de

5 “Serviço Federal de Habitação e Urbanismo” e “Superintendência de Desenvolvimento da Região Sul”.6 No início de Janeiro de 2005, o governo de Santa Catarina enviou para apreciação dos deputados

estaduais um projeto de modernização administrativa, denominado “Cícerus”, em homenagem ao filó-sofo romano. Ele prevê maior atribuição às secretarias regionais criadas há dois anos, no início dogoverno Luiz Henrique. São oito secretarias mesorregionais, em torno dos principais pólos econômicos,e 22 microrregionais.

7 Tais hipóteses foram amadurecidas ao longo de entrevistas abertas com informantes-chave realizadasem Janeiro de 2005 em dez municípios gaúchos, além de contatos diretos com dirigentes de diversosCOREDE (“Produção”, “Nordeste” e “Noroeste Colonial”, “Fronteira Noroeste” e “Serra”) e da GFM:“Mesorregião Grande Fronteira do Mercosul”.

8 Um caso ilustrativo é o do COREDE “Noroeste Colonial”, no qual coexistem a AMUPLAN (com 12 municí-pios ao redor de Ijuí) e a AMUCELEIRO (com 21 polarizados por Três Passos). Pior: neste caso houvetentativa inicial de manter no mesmo COREDE também a região polarizada por Santa Rosa, atual COREDE“Fronteira Noroeste”, com 20 municípios.

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impedir um verdadeiro senso depertencimento.

Um caso que chega a ser chocan-te é o do COREDE auto-intitulado“Produção” (CONDEPRO), maisidentificado como “Planalto”, comsede em Passo Fundo. Em assem-bléia realizada dia 12/01/05, paraeleger o Conselho de Representan-tes, credenciaram-se 547 pessoas quesupostamente representavam os 21“segmentos”. Antes mesmo de entrarem qualquer discussão sobre a legi-timidade de conselho assim eleito,cabe perguntar como os 547 presen-tes poderiam ter tido algum tipo departicipação ativa nos trabalhos,caso houvesse algum assunto impor-tante a ser realmente objeto de vota-ção (e não apenas de deliberaçõespor unanimidade silenciosa, ou sim-ples aclamação).

Quando se levanta a questão daexcessiva escala das regiões supos-tamente representadas por essesCOREDE que têm duas ou três vezesmais municípios do que parece ra-zoável, a resposta dos interlocutoresé uma só: força política. É imediato oreflexo de ver o COREDE como uminstrumento de pressão9 sobre o go-verno estadual, mais do que um or-ganismo realmente voltado à açãoregional. Este viés de interlocuçãocom a instância superior para a rei-vindicação e defesa dos interessesda suposta região será discutidomais adiante. Mas antes é precisoressaltar que parece ser freqüente autilização dos COREDE em óbviasoperações de “lobby”, no sentido decriação de lastro para demandas degrande interesse de determinado“segmento” (o que não exclui, evi-dentemente, a possibilidade quetambém possam ser de relativo deinteresse regional).

O caso mais óbvio que pode sercitado é o dos interesses específicosdas universidades regionais, cujopapel foi certamente crucial para aemergência dos COREDE, e continuasendo vital para muitos deles. E éimpossível cometer exagero quandose enfatiza o lado positivo dessaparticipação das universidades des-de o início do processo de formaçãodos COREDE.

Como duvidar dessa vantagem,quando se sabe que regiões tendem

a ser criadas por cidades-pólo; e queneste início de Século XXI nada podeser melhor do que conseguir que talpolarização seja determinada peloconhecimento científico-tecnológicoem fertilização cruzada com empre-sas inovadoras? Chega a ser óbvia avantagem de ter as universidadescomo principais protagonistas dosCOREDE. Todavia, é preciso perce-ber que esse importante peso dasuniversidades também pode criardistorções.

A rigor, para que as universida-des pudessem desempenhar um pa-pel exemplar na orientação (e atécondução) dos COREDE, seria ne-cessário que elas evitassem qualquerenvolvimento com as inevitáveis dis-putas político-partidárias. Uma or-ganização voltada ao desenvolvi-mento regional só evolui e se fortale-ce se conseguir que o entendimentoe a concertação entre seus principaisagentes possa sobreviver aos perió-dicos terremotos eleitorais.

Se uma região realmente tem umprojeto de desenvolvimento construí-do com a participação de seus prin-cipais empreendedores públicos, pri-vados e sociais, esse projeto terá ne-cessariamente caráter supra-eleitorale deverá permanecer na agenda sejaqual for a eventual reviravolta polí-tica causada pelos últimos embates.Na verdade, essa capacidade de “jun-tar os cacos” pós-eleitorais e conti-nuar a ação conjunta pelos objetivose metas inscritos por consenso noprojeto regional é o principal sinalde maturidade de uma organização(seja conselho, fórum, ou mesmoagência). E a universidade deveriaser, em princípio, o “segmento” maiscapaz de evitar que a política parti-dária causasse sérios estragos noprocesso de concertação regional.

Infelizmente, parece estar ocor-rendo o inverso com boa parte dasuniversidades comunitárias que fo-ram tão decisivas para a emergên-cia dos COREDE.10 Há casos em queocorre exatamente o contrário. “Ra-chas” internos nas universidadessão transferidos para a vida dos

COREDE, fazendo como que umanova reitoria se afaste completamen-te, mesmo que continue cedendo al-gum tipo de infra-estrutura à direçãodo Conselho. Ou — o que é igualmen-te grave — concorde que um determi-nado docente continue prestando ser-viços na coordenação de um CORE-DE, mas sem qualquer tipo de en-volvimento institucional efetivo.

Essa instabilidade do comporta-mento das universidades certamen-te não seria tão grave se algum outro“segmento” do COREDE pudesse serum substituto à altura. No entanto,todos os demais atores têm muitomais propensão a se deixarem tra-gar pelos periódicos turbilhões elei-torais do que seria de se esperar dasuniversidades. Ou seja, em meio aprefeitos, vereadores, sindicalistas,e movimentos sociais, é de se espe-rar que representantes de universi-dades sejam os mais maduros e ca-pazes de conseguir que a continui-dade do trabalho coletivo não fossecomprometida por clivagens parti-dárias e ideológicas. Em vez disso,em alguns casos parece que os re-presentantes das universidades sãoos primeiros a “estragar a festa” aose deixarem envolver de forma irre-mediável nos conflitos político-par-tidários locais.

3.2 Três questões de fundoTudo isso sinaliza a imaturidade

do processo institucional. Por issomesmo, também seria errado atribuirà ideologização de reitores e pró-rei-tores toda a responsabilidade pelabaixa efetividade da ação de certosCOREDE. Na verdade, há pelo me-nos três questões de fundo que aju-dam a entender melhor essa fragili-dade comportamental dos principaisagentes do desenvolvimento regio-nal, a começar pela atuação daintelectualidade científico-tecnológi-ca representada pelas universidades.

(a) A primeira dessas questões defundo é a precariedade dos projetosde desenvolvimento regional. Salvoengano, nenhum COREDE chegoua produzir um verdadeiro plano de

9 Pressão que é sempre qualificada de “política”, mas na maior parte das vezes se assemelha mais auma pressão corporativa (e até sindical).

10 O papel da UERGS ainda não pode ser avaliado por ser muito recente e incerto.

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desenvolvimento regional, que tenharesultado de profunda análise obje-tiva de suas potencialidades, voca-ções, vantagens, oportunidades, ouchances de médio e longo prazo. Eque depois tenha sido amplamentedebatido, legitimado e assumidopela coletividade envolvida. Encon-tra-se com certa facilidade algumabrochura intitulada “Plano Estraté-gico de Desenvolvimento Regional”,ou coisa parecida. Mas não passa,em geral, de uma listagem de carên-cias regionais, mais ou menos hierar-quizadas, a depender da competên-cia do grupo de trabalho específicoque as coletou. Parecem muito maiscom aqueles “cahiers de doléances”dos Estados Gerais de 1789 do queprojetos ou planos de desenvolvi-mento.

Só quando existe um verdadeiroprojeto – que realmente demonstreque a viabilidade do desenvolvimen-to da região depende de determina-das ações estratégicas muito bemidentificadas – é que os diversos gru-pos sociais conseguem estabeleceras sinergias necessárias a colocá-lasem prática. Só quando percebem comclareza uma real perspectiva de pro-gresso é que as forças vivas de umaregião podem “vestir a camisa”, in-dependentemente se suas inclina-ções ideológicas, religiosas, políticas,etc. É isso que faz com que realmen-te se mobilizem para alavancar osrecursos necessários, batendo à por-

ta de outras instâncias que não ape-nas as dos orçamentos públicos doEstado e da União. E é isso que tam-bém pode ajudar a criar condiçõesde “blindagem” contra os estragosque resultam dos inevitáveis confli-tos de interesse entre partidos, sin-dicatos corporações, igrejas, empre-sários, etc.

(b) A segunda questão de fundo,que certamente contribuiu muitopara o agravamento da primeira, foia dinâmica incentivada por diversosgovernos estaduais de se comprome-ter a alocar uma pequena parte dosrecursos para investimento em fun-ção dos resultados de anual “con-sulta popular” ou “orçamento parti-cipativo”. Não pode haver dúvidade que a predisposição original dogoverno Collares de submeter essetipo de decisão aos novos COREDEfoi positiva e certamente ajudou mui-to em sua rápida estruturação. Toda-via, também criou uma séria armadi-lha, tanto para os governos seguin-tes, quanto para os próprios CORE-DE.

Por um lado, qualquer governoestadual gaúcho passou a se ver obri-gado a algum tipo de ritual do gêne-ro, sob pena de cometer um recuo noprocesso de democratização. Poroutro, qualquer COREDE prefere teressa oportunidade de abocanhar erepartir algumas migalhas orçamen-tárias do que se lançar nas incerte-zas da elaboração coletiva de umverdadeiro projeto de desenvolvi-mento que depois pudesse ser obje-to de contratos de médio prazo (porexemplo, os prazos dos “PlanosPlurianuais”, PPA).11 Como semprevalerá mais “um passarinho na mãodo que dois voando”, os COREDEconsagram 95% de suas energiasnesse tipo de operação anual, quealém de desgastante, gera muitas

frustrações nos municípios que nãoconseguem a verba que tinha sidoorçada para: construir o muro daescola “A”, ou construir uma qua-dra esportiva perto da escola “B”,mas que acabou não sendo sequerempenhada, muito menos executa-da.12

Não se trata de entrar em compa-rações sobre a condução dessas anu-ais “consultas populares” ou “orça-mentos participativos”, pois seusproblemas comuns são muito maisimportantes que seus diferentes de-feitos específicos. Infelizmente, aprincipal resultante desses rituaistem sido desviar os COREDE daprincipal missão que eles deveriamter assumido: elaborar projetos con-sistentes que pudessem ser objetosde negociações para a implantaçãode estratégias de desenvolvimentoregional.

Enfim, em vez de mobilizar a ca-pacidade de inovação dos principaisempreendedores (privados, públicose sociais) na elaboração de uma es-tratégia de construção da competiti-vidade sistêmica do território, osCOREDE abandonam esse objetivocentral. Eles são levados a despendersuas melhores energias em inúme-ros expedientes de varejo que pos-sam levar este ou aquele órgão dogoverno estadual a empenhar, e de-pois executar, esta ou aquela previ-são orçamentária. Em poucas pala-vras: os COREDE abdicam de seupapel no atacado ao se consumiremem pequenas ações de varejo.

(c) A terceira das principais ques-tões de fundo que comprometem aeficácia dos COREDE para a ação dedesenvolvimento regional está nosdiscutíveis graus de representati-vidade e legitimidade que lhes con-ferem as atuais regras de constitui-ção e funcionamento. Dos trinta e

Encontra-secom certa facilidade

alguma brochura intitulada“Plano Estratégico de

DesenvolvimentoRegional”, que parece

muito mais com aqueles“cahiers de doléances”dos Estados Gerais de

1789 do que projetos dedesenvolvimento...

11 Durante o Fórum dos COREDE realizado no final de fevereiro de 2005 em Nova Petrópolis, foi pos-sível notar em algumas intervenções do plenário uma séria preocupação com este problema. Toda-via, a posição predominante, a começar pela atitude dos dirigentes do Fórum, foi mais parecida comuma espécie de “sindicalismo de resultados”. Não valeria a pena abrir mão dessa rotina reivindicatóriapor migalhas do orçamento obtidas na lógica de varejo, de balcão. Enfim, uma opção preferencialpela obtenção de resultados imediatos, mesmo que irrisórios para o processo de desenvolvimentoregional.

12 É impressionante a importância e o tempo que ocupam em reuniões dos COREDE as reclamaçõescontra esta ou aquela Secretaria do governo estadual por não ter atendido até aquele momento estaou aquela demanda. Ou ainda, para ressaltar que o COREDE provavelmente conseguirá que sejaexecutado neste ano 80% do que foi aprovado no ano anterior.

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dois “segmentos” com direito de re-presentação no COREDE “NoroesteColonial” (NORC), por exemplo,quatro são membros natos: deputa-dos federais e estaduais com domi-cílio eleitoral na região, e os prefei-tos e presidentes de Câmaras muni-cipais dos trinta e tantos municípi-os envolvidos. Os outros 28 repre-sentantes e seus suplentes são esco-lhidos durante assembléia convoca-da para esse fim, na base do voto dequem se fez presente.

É muito discutível que isso possaser considerado como prática demo-crática. Pode-se até afirmar o opos-to, pois esse tipo de escolha dos re-presentantes de cada segmento ex-clui liminarmente quem não tivercondições de viajar naquele dia aolocal da assembléia. Pior, escancaraa possibilidade de que prevaleçamos que pertencem a algum “apare-lho” partidário, sindical, de ONG,etc. E esse tipo de viés anti-democrá-tico certamente causa prejuízos àcomposição balanceada de algunssetores decisivos dos empreendedo-res privados (associações de empre-sários), públicos (universidades, porexemplo), e sociais (movimentosmenos “aparelhados”).

Não é o que parece acontecer noCOREDE “NORC”, por razões quesó poderiam ser apontadas por umaanálise mais específica da situaçãoconcreta. No entanto, é exatamenteo que está ocorrendo com o CON-DEPRO (COREDE “Produção”, comsede em Passo Fundo), pois só apa-receram pessoas totalmente alinha-das pela identificação com o progra-ma do governo Olívio Dutra (PT) najá citada assembléia para escolherrepresentantes. E mesmo que issopossa significar alta representativi-dade “popular” (supondo-se que amaioria dos empreendedores sociaissiga essa linha), é óbvio que tambémrevela baixíssima representatividadedos empreendedores privados e pú-blicos. E podia-se contar nos dedosde uma mão o número de pessoaspresentes que elegeram representan-tes de algum dos tais “segmentos”.

O baixo grau de representativi-dade e de legitimidade de um CORE-DE também pode ter o sinal políticocontrário. Nesse caso, em vez de con-

tribuir apenas para uma maior letar-gia da ação regional, pode engen-drar fragmentação organizacional,com o surgimento de estrutura pa-ralela com os mesmos objetivos. Ali-ás, é o que já está ocorrendo namicrorregião chamada de “MédioAlto Uruguai”, por exemplo, onde aação da SDT/MDA (Secretaria de De-senvolvimento Territorial do Minis-tério do Desenvolvimento Agrário)provocou a criação de um novo con-selho regional (que será seu únicointerlocutor), e que terá missão idên-tica à do respectivo COREDE, o“CODEMAU”. E também ocorreuantes na “Grande Santa Rosa”,onde surgiu um “Fórum” paraleloao COREDE “Fronteira Noroeste”, ecom os mesmo objetivos.

Finalmente, é preciso registrarque não se deve subestimar um ceti-cismo mal disfarçado nas manifes-tações de vários presidentes de CO-REDE. Sempre fazendo questão deressaltar as virtudes desses conse-lhos, eles por vezes deixam escaparfrases bem surpreendentes, como,por exemplo: “O COREDE é umaplanta que não tem raiz”. É até mui-to duvidoso que essa metáfora sejaapropriada, pois o problema prin-cipal talvez não esteja nessa even-tual falta de “raízes”. Mesmo assim,a frase é muito reveladora de umnebuloso mal-estar com o desempe-nho de certos COREDE. Mal-estarque parece não ter sido ainda bemanalisado em razão de uma “místi-ca” que tende a atrofiar os esforçosde pesquisa nessa área.

Mais uma vez é preciso repetiraqui que essas três observações críti-cas não devem ser entendidas comoum “ataque” à experiência ou à va-lorosa tradição “corediana”. É exa-tamente o contrário, pois tanto osCOREDE, quanto seus interlocu-tores no governo estadual, só teriamvantagens em aproveitar este mo-mento para repensar a dinâmica or-ganizacional e institucional do de-senvolvimento das atuais 24 regiões.A partir de um balanço conjuntodesses 35 anos de experiência práti-ca, talvez seja possível retomar so-bre novas bases o relacionamentodos COREDE com as várias esferasde governo e, sobretudo, com orga-

nizações cruciais para o desenvol-vimento regional, como são os ban-cos de desenvolvimento (BNDES,BID e BIRD). Por outro lado, tudoindica que o ponto de mutação des-se processo passará necessariamen-te por uma “repactuação” do relaci-onamento entre os COREDE e o go-verno estadual.

Seria inócua pretensão tentar irmais longe neste tipo de reflexão. Enão apenas pelas características dotrabalho de pesquisa que deu origema este texto. Mesmo que a investiga-ção tivesse sido mais longa e maisprofunda, não poderia chegar a al-gum tipo de receita capaz de pres-crever as soluções para os proble-mas apontados. No máximo se podeaqui formular algumas recomenda-ções que talvez ajudem os atores en-volvidos a buscar tais soluções.

4. DiretrizesQualquer conselho microrregio-

nal do gênero dos COREDE visa aorganizar o processo de desenvolvi-mento no território, como alternati-va ao puro e simples comportamen-to dos mercados, que tangem os re-sidentes a se deslocarem para encon-trar oportunidade de trabalho e ge-ração de renda. Trata-se de uma prá-tica que pode ter perdido legitimi-dade com a ofensiva neoliberal dofinal do século 20, mas que volta comtoda a força para as agendas de de-senvolvimento. Há pelo menos qua-tro fatores que explicam essa voltado território ao domínio da açãopública: (a) ele está no centro dasestratégias que visam a competiti-vidade e a atratividade econômicas;(b) é nele que pode ser reforçada acoesão social; (c) é o melhor instru-mento de modernização das políti-cas públicas, já que impõe aberturae transversalidade; (d) apesar de neleestarem ancoradas as instituiçõeslocais, permanece um domínio deação de instâncias hierárquicas su-periores cujos graus de liberdade sãocada vez mais condicionados peloprocesso de globalização e pela cons-trução de acordos regionais supra-nacionais.

Enfim, renovar a concepção deterritório para uma política de orde-namento exige antes de tudo que ele

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seja entendido como ator de um es-forço constante de desenvolvimen-to, mas de um desenvolvimento noqual a coesão social é simultanea-mente uma aposta e uma alavanca.

Neste sentido, três insights mere-cem ser mais uma vez repetidos e en-fatizados: (a) a necessidade de com-binar concorrência com cooperação;(b) a necessidade de combinar confli-to com participação; e (c) a necessi-dade de combinar o conhecimentolocal e prático com o científico.

Três lições que embutem uma in-terrogação central sobre as condiçõesque permitem a emergência de insti-tuições mais favoráveis a essas trêscombinações. E a resposta — comonão poderia deixar de ser — é afir-mação de que o desenvolvimento de-pende essencialmente do papel cata-lisador que desempenha um projetoque tenha sido elaborado com am-pla participação dos atores locais, istoé, dos empreendedores privados,públicos e sociais que se identificamcom determinada região.

A orientação essencial de qual-quer estratégia de desenvolvimentoregional só pode ser a de estimular osurgimento desses “territórios-proje-to” e criar as condições para que elesconsigam alavancar recursos huma-nos e financiamentos (ou mesmodoações), tanto no âmbito nacionalcomo internacional. Por isso, a prin-cipal recomendação deste estudo éque a riquíssima experiência gaúchados COREDE seja auto-avaliada sobessa ótica. Até que ponto se podedizer que os COREDE estão favore-cendo o surgimento de “territórios-projeto” capazes de alavancar os re-cursos humanos e financiamentosnecessários ao desenvolvimento desuas respectivas regiões?

Como já foi bem explicitado aci-ma, por várias razões houve umaespécie de desvio de rota na trajetó-ria dos COREDE. Em vez de fazeremcom que pelo menos algumas das 22regiões iniciais se transformassemem “territórios-projeto”, os COREDEviraram instrumentos de reivindica-ção de investimentos que, em geral,pouco ou nada contribuem para odesenvolvimento regional (mesmoque muitas vezes possam contribuirpara responder a certas carências dealguns municípios).

Além de colocar em discussãouma possível repactuação da rela-ção dos COREDE com o governo es-tadual, tal constatação permite enfa-tizar mais quatro recomendaçõesduas das quais poderão ser facil-mente consensuais: (i) a capacitaçãodos “coredianos”; (ii) o papel estra-tégico da política de Ciência, Tecno-logia & Inovação (CT&I). Deve serconcebido com a máxima urgênciaum plano de capacitação dos agen-tes “coredianos” para a prática doplanejamento estratégico. E deve serdada máxima prioridade ao apro-fundamento da política descentrali-zada de CT&I, o único investimentoque poderá ter impacto de longo pra-zo para o desenvolvimento de “terri-tórios-projeto”.

É provável que as outras duasrecomendações provoquem muitapolêmica e não obtenham o consen-so necessário para que possam setornar efetivas: (iii) a necessária re-visão dos estatutos e regimentos in-ternos dos COREDE para que se tor-nem mais legítimos e realmente fa-voreçam a participação conjuntados empreendedores privados, pú-blicos e sociais; (iv) o incentivo àsubdivisão de COREDE gigantes ementidades mais adequadas às verda-deiras identidades regionais e quefavoreçam mais o sentido de perten-cimento por parte dos cidadãos en-volvidos.

Finalmente — mas de modo al-gum menos importante — é neces-sário enfatizar que Bandeira (2004)está certamente coberto de razãoquando diz que a experiência gaú-cha (assim como a catarinense), in-dica que os esforços de articulação econcertação têm mais possibilidadesde sucesso quando existem, nas re-giões, organizações dotadas de credi-bilidade que se disponham a propor-cionar apoio operacional efetivo econtinuado a essas iniciativas. Nocaso de Santa Catarina, esse papelfoi até agora mais desempenhadopelas Associações de Municípios doque pelas Universidades. No RioGrande do Sul ocorreu o contrário.

Considerando-se a literatura ci-entífica já disponível sobre os temascomo a “learning region” e a “know-ledge-based economy”, é razoável su-

por que a fórmula gaúcha venha ase mostrar superior, muito emboraainda seja cedo para uma avaliaçãocomparativa. Muitas universidadescomunitárias gaúchas certamenteexercem uma liderança efetiva emescala regional. Em geral, as univer-sidades não são vistas com descon-fiança, e raramente dão motivospara hostilidade de algum dos gru-pos sociais locais. Todavia, elas es-tão longe de ser neutras. Antes detudo por que têm interesses própri-os a defender. E é perfeitamente pos-sível que tais interesses nem semprecoincidam com as respostas neces-sárias aos desafios estratégicos dodesenvolvimento das regiões em queestão implantadas.

Bandeira (2004) destaca que obritânico John Goddard, reitor daUniversidade de Newcastle uponTyne, analisou os efeitos econômi-cos regionais das universidades,tanto para a OCDE, em 1997, quan-to para a Unesco, em 1998. E suasrecomendações foram no sentido quemais pesquisas empíricas venham acaracterizar três tipos de influênciadas universidades sobre as regiõesem que se localizam.

O primeiro é obviamente o efeitodireto da Universidade como empre-gadora e como geradora de fluxos degastos dentro da região, cujo impac-to ele considera eminentemente es-tático. Em segundo lugar, mencionaos impactos dinâmicos de interaçãoentre as universidades e as empre-sas localizadas na região. Esses im-pactos ocorrem através da ativida-de de pesquisa, do ensino, e do re-crutamento de graduados pelas em-presas da região, bem como atravésde programas de aperfeiçoamentoprofissional. O terceiro, aponta paraa contribuição das universidades aodesenvolvimento social e comunitá-rio das regiões em que atuam, atra-vés de sua influência geral sobre oambiente cultural local, sobre a for-mação de lideranças, e também di-retamente na formulação de visãoestratégica sobre os condicionanteseconômicos da região. A rigor, co-menta Bandeira (2004:101), esseengajamento direto na promoção dodesenvolvimento interessa à própriauniversidade, pois em geral depen-

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de também diretamente do dinamis-mo das áreas em que atua para asse-gurar os recursos necessários à suaprópria manutenção, reprodução, eexpansão.

No que se refere a esse papelcrucial para o desenvolvimentoregional que podem desempenhar asuniversidades, o que mais diferen-cia a situação gaúcha de situaçõescomparáveis em ambientes mais de-senvolvidos é a precária formaçãodos demais atores, agentes, ou repre-sentantes dos “segmentos”, comosão chamados nos COREDE. Con-trariamente ao que ocorre em situa-ções de mais desenvolvimento, asuniversidades comunitárias gaú-chas tendem a ocupar não apenas oseu espaço, mas muitos outros, dadaa carência de quadros bem formadosque sejam porta-vozes de outros in-teresses, ou pontos de vista. E se tal“invasão” pode muitas vezes até serbenéfica, em certos casos ela podeatrapalhar e retardar o processo deformulação, negociação e viabiliza-ção de alternativas.

5. ConclusãoA institucionalização de uma re-

gião pode ser vista como a culminân-cia de processo histórico. SegundoBandeira (2006), apoiado em Paasi(1986), tal processo envolve quatroaspectos que não devem ser enten-didos como etapas consecutivas: a)definição da forma ou abrangênciaterritorial; b) formação de imagemconceitual e simbólica; c) surgimentoe instituições e organizações apro-priadas; d) estabelecimento da regiãocomo parte de um sistema de regiões,com papel administrativo definido,associado à consciência regional dacomunidade. Quatro critérios sim-ples que permitem fazer um balançosintético da experiência gaúcha.

No que se refere à abrangênciaterritorial, o balanço é negativo, poisa propensão a ter força política fezcom que as regiões dos COREDEatropelassem identidades e perten-cimentos pré-existentes, e que atésubsistem na forma de associaçõesde municípios. Pior, algumas sãoformadas por número tão grande demunicípios que inviabilizam a pos-sibilidade de real participação de-mocrática.

Na formação de imagem concei-tual e simbólica, o balanço pode sersimultaneamente positivo e negati-vo. Ele é positivo no que se refere àimagem e à simbologia geral dosCOREDE como forma de gestão maisdescentralizada do território estadu-al, além de menos pulverizada queo poder local dos municípios. Masela é negativa em muitos casos emque os COREDE tentaram emplacardenominações simbólicas completa-mente artificiais, além de contrapro-ducentes. O caso extremo é o doCOREDE “Produção”, em regiãohistoricamente conhecida por “Pla-nalto”. Mas está longe de ser o único.

O aspecto em que o processo pa-rece estar mais avançado é o tercei-ro, que se refere ao surgimento dasinstituições e organizações corres-pondentes, pois foram muito ade-quadas em sua origem. Todavia, vi-cissitudes fizeram com que se des-viassem de sua principal missão. Emvez de realmente serem acelerado-res do desenvolvimento endógeno,os COREDE se tornaram essencial-mente instrumentos de reivindica-ção e pressão na partilha dos par-cos recursos do governo estadual.

Algo parecido deve ser dito so-bre o estabelecimento de cada regiãocorediana como parte de um siste-ma de regiões, com papel adminis-trativo definido, associado à cons-ciência regional da comunidade.Tem havido avanços bem significa-tivos no contexto estadual, mas queesbarram no atraso relativo em quese encontra o processo histórico deemergência regional fora da regiãoSul. E isso se manifesta com clarezano contraste entre as experiênciassulistas e as frágeis políticas regio-nais do Ministério da IntegraçãoNacional, com especial destaquepara a proposta de implantação doPrograma de Desenvolvimento deMesorregiões Diferenciadas.

O balanço é, portanto, bem nega-tivo, apesar de ser enorme o potenci-al dos COREDE que forem capazesde uma autocrítica que os redirecio-ne para a governança cidadã.

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BANDEIRA, Pedro Silveira. “Institu-cionalização de regiões no Brasil” Ci-ência & Cultura, ano 58 (1), janeiro-março 2006, pp. 34-35.

BECKER, Dinizar Fermiano (Coord)Pró-RS II. Por uma organização soci-al pró-desenvolvimento regional doRio Grande do Sul. 2 vols. (ConselhoRegional de Desenvolvimento do RioGrande do Sul) Santa Cruz do Sul:Edunisc, 2002.

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VEIGA, José Eli da. “Territórios paraum desenvolvimento sustentável” Ci-ência & Cultura, ano 58 (1), janeiro-março 2006, pp. 20-23.

MESTRADOEM ANÁLISEREGIONAL

O primeiro da sua categoria

no Estado da Bahia

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MACROCEFALIA URBANA EM RORAIMA E SUA

REPERCUSSÃO NOS SERVIÇOS DE SAÚDE

Barbara-Christine Nentwig Silva1

Araori Silva Coelho2

Resumo

O Estado de Roraima caracteriza-sepor apresentar um sistema urbanomacrocefálico, ou seja, com umagrande cabeça, a capital, Boa Vista,muitas vezes maior que as demais ci-dades do Estado. Assim, por exem-plo, Boa Vista é 24 vezes maior empopulação que a segunda cidade,Caracaraí. Isto se reflete, de formadestacada, na distribuição das funçõescentrais exercidas pelas cidades. Des-ta forma, o objetivo deste trabalho éo de fazer uma avaliação da macro-cefalia urbana em Boa Vista do pon-to de vista demográfico e funcional,este direcionado para os serviços desaúde considerando sua importânciapara o conjunto da população emtodo o Estado. O estudo demonstraque a concentração dos serviços desaúde em Boa Vista é exageradamentegrande, muito maior, em termos re-lativos, que a concentração demográ-fica. Há, portanto, graves problemasde acessibilidade aos serviços de saú-de no interior do Estado o que justi-fica a implantação de políticas públi-cas de descentralização.

Palavras-chave: Macrocefalia urba-na; funções de saúde; Roraima; BoaVista.

Abstract

The State of Roraima/Brazil ischaracterized by an urban macro-cephalic system, that is, with a bighead, the capital, Boa Vista, manytimes is greater than the other citiesof the State. Thus, for example, Boa

Vista is 24 times greater in populationthan the second city, Caracaraí. Thisis reflected clearly in the distributionof urban central functions. Therefore,the purpose of this paper is to makean evaluation of the urban macro-cephaly of Boa Vista taking demo-graphic and functional data, the lastrelated to health services consideringits importance for all the Roraimapopulation. The study shows that theconcentration of health services inBoa Vista is extremely exaggerated,much bigger, in relative terms, thandemographic concentration. Thus,there are serious problems in healthservices accessibility in the inlandwhich justify the introduction ofdecentralization in Roraima healthpublic policies.

Key words: urban macrocephaly;health functions; Roraima; Boa Vista.

Introdução

A análise da rede urbana brasileirarevela que a maioria dos Estados bra-sileiros apresenta uma estrutura urba-na do tipo macrocefálico, ou seja, comuma cidade, invariavelmente a capitalestadual, exageradamente maior que asdemais cidades. Se tomássemos comoparâmetro as regiões metropolitanas,os indicadores de macrocefalia seri-am ainda mais expressivos. As exce-ções são os Estados de Santa Catarina,

Espírito Santo, Paraíba, Tocantins,Acre, Rondônia, Pará e Amapá. Otermo tem sido mais associado àsgrandes cidades (São Paulo, Rio deJaneiro, Salvador, etc.) mas pode tam-bém ser aplicado a contextos em quecidades de porte médio, como é ocaso de Boa Vista, exercem um pa-pel altamente concentrador com re-lação ao sistema de cidades e da re-gião sob sua influência direta. (SILVA;SILVA, 2004a; SILVA; SILVA, 2004b;AMORIM; DINIZ, 2004).

Assim, o Estado de Roraima, lo-calizado na Região Norte do Brasil, éum dos Estados que apresentam amacrocefalia em sua organização ur-bana do ponto de vista demográficoe funcional, o que causa graves proble-mas de acessibilidade aos bens e ser-viços por parte da população distri-buída em todo o território estadual.

Por conseguinte, o objetivo destetrabalho é o de analisar a macrocefa-lia urbana de Boa Vista, a capital es-tadual, do ponto de vista demográfi-co e funcional, priorizando a análisedos serviços de saúde como um in-dicador das repercussões da exage-rada concentração populacional nacapital. Os serviços de saúde foramescolhidos considerando sua relevân-cia para o conjunto da população, nãoimportando, dentre outros aspectos,o sexo, a idade, a renda e o seu localde residência. Com isto, pretende-se

1 Professora Dra., UCSAL / Mestrado em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social,Pesquisadora do CNPq; e-mail: [email protected].

2 Bacharelando em Geografia, UFBA, Bolsista do CNPq; e-mail: [email protected].

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29Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BARDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Tabela 1 – População total, urbanae rural do Estado de Roraima – 2000

Estado emunicípios

Populaçãototal

Populaçãourbana

Taxa deurbanização

(%)

Populaçãorural

ESTADO 324.397 247.016 76,15 77.381Alto Alegre 17.907 5.195 29,01 12.712Amajari 5.294 799 15,09 4.495

Boa Vista 200.568 197.098 98,27 3.470Bonfim 9.326 3.000 32,17 6.326Cantá 8.571 1.155 13,48 7.416Caracaraí 14.286 8.236 57,65 6.050

Caroebe 5.692 1.977 34,73 3.715Iracema 4.781 3.228 67,52 1.553Mucajaí 11.247 7.029 62,50 4.218Normandia 6.138 1.500 24,44 4.638

Pacaraima 6.990 2.760 39,49 4.230Rorainópolis 17.393 7.185 41,31 10.208São João da Baliza 5.091 3.882 76,25 1.209São Luiz 5.311 3.447 64,90 1.864Uiramutã 5 802 525 9,05 5.277

Fonte: IBGE. Censo Demográfico – 2000.

demonstrar a relação direta entre umadeterminada estrutura espacial e oacesso aos bens e serviços por parteda população. Assim, uma estruturaurbana macrocefálica coloca gravesproblemas de consumo e uso de bense serviços em todo o território, exi-gindo deslocamentos, o que implicaem tempo e custos, ao contrário deuma estrutura urbana mais equilibra-da e, conseqüentemente, mais descen-tralizada e acessível.

A metodologia apóia-se na análiseestatística e cartográfica dos indicado-res demográficos e dos serviços desaúde, obtidos no site do IBGE<http://www.sidra.ibge.gov.br/cidadesat/default.php> e <http://www.sidra.ibge.gov.br>. Inicialmente,foram levantados os dados sobre po-pulação urbana e rural de diferentesperíodos censitários e, em seguida, osdados envolvendo, de forma detalha-da, 35 funções centrais relacionadascom os serviços de saúde, referentesao ano de 2002. Os dados demográ-ficos foram analisados com o objeti-vo de dimensionar o tamanho de BoaVista com relação às demais cidadesdo Estado. Na análise dos dados so-bre saúde foram aplicados os seguin-tes passos metodológicos:

– levantamento da existência (1) ounão (0) das funções centrais esco-lhidas em cada centro urbano; nãofoi necessário o levantamento dafreqüência de ocorrência de umadeterminada função, mas somen-te sua existência ou não;

– classificação das funções centraissegundo as suas freqüências deocorrência em cada cidade, ou seja,a sua existência ou não, com oobjetivo de definir grupos indica-dores de níveis diferentes;

– teste da homogeneidade internados grupos indicadores de níveisdiferentes através de medidas es-

tatísticas; a homogeneidade inter-na do grupo é satisfatória se o coe-ficiente de variação de cada gru-po indicador é menor do que ocoeficiente entre as médias dosgrupos consecutivos;

– classificação dos centros em níveishierárquicos e construção de umgráfico que relaciona visualmenteos centros urbanos e a freqüênciade ocorrência de suas funções coma classificação hierárquica;

– desenho do mapa com a hierar-quia urbana relacionada com osserviços de saúde.

Esta metodologia de análise funci-onal urbana segue, em termos resu-midos e com adaptações, a abrangenteproposta de Palomäki (1964) aplica-da no Brasil por vários autores, den-tre os quais Silva; Silva; Leão (1987).

Macrocefalia demográfica

Como foi analisado no trabalho deSilva; Silva (2004a), a população dascidades do Estado de Roraima, re-ferente ao ano de 2000, pode ser vistana tabela 1 onde se constata que 10das 15 cidades têm menos que 5.000habitantes, e duas têm menos de 1.000habitantes (Uiramutã, com 525 ha-bitantes e Amajari, com 799 habitantes).É preciso observar que nenhum mu-nicípio de Roraima possui vilas (sedesde distritos, segundo a definição doIBGE). Assim, a população urbanaapresentada corresponde à populaçãodas cidades (sedes dos municípios). Astaxas de urbanização são também bas-tante diferenciadas, sendo que o tama-nho demográfico de Boa Vista afetatoda a taxa média de urbanização doEstado de Roraima.

O histórico da posição relativade Boa Vista com relação ao Estado

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30 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Tabela 2 – Proporção entre a população de Boa Vista e a população do Estado de Roraima – 1950/2000

AnosCidade e Estado

1950 1960 1970 1980 1991 2000

População do Estado 18.116 28.304 40.885 79.159 217.583 324.397

População de Boa Vista 5.132 7.037 16.727 43.016 118.926 197.098

% da população de Boa Vista / Estado 28,33 24,86 40,91 54,34 54,66 60,76

Fonte: SILVA; SILVA, 2004a, p. 42, com base em BARROS, 1995; IBGE, 1950/2000.

Tabela 3 – Comparação entre Boa Vista em relação às demais cidadesdo Estado de Roraima com base no conceito de primazia urbana – 1991 e 2000

Cidades População1991

Proporção Porcen-tagem

Cidades População2000

Proporção Porcen-tagem

Boa Vista 120.157 – – Boa Vista 197.098 – –Mucajaí 5.222 23,01 4,35 Caracaraí 8.236 23,93 4,18Caracaraí 5.139 23,38 4,28 Rorainópolis 7.185 27,43 3,65Alto Alegre 3.356 35,80 2,79 Mucajaí 7.029 28,04 3,57São João da Baliza 2.309 52,04 1,92 Alto Alegre 5.195 37,94 2,64São Luiz 2.268 52,98 1,89 São João da Baliza 3.882 50,77 1,97Bonfim 1.221 98,41 1,02 São Luiz 3.447 57,18 1,75Normandia 1.146 104,85 0,95 Iracema 3.228 61,06 1,64

Bonfim 3.000 65,70 1,52Pacaraima 2.760 71,41 1,40Caroebe 1.977 99,70 1,00Normandia 1.500 131,40 0,76Cantá 1.155 170,65 0,59Amajari 799 246,68 0,41Uiramutã 525 375,42 0,27

Fonte: SILVA; SILVA, 2004a, p. 44, com base em dados do IBGE, 1991/2000.

começa a configurar, a partir de 1970,uma situação que revela a exageradaimportância da capital (tabela 2).

A população das cidades, com aproporção das cidades do interior doEstado e sua porcentagem com rela-ção à capital, Boa Vista, é apresenta-da na tabela 3 para os anos de 1991 e2000. Observa-se que, em 2000, BoaVista era quase 24 vezes maior que asegunda cidade do Estado, Caracaraí,e a população desta representava ape-nas 4,18% da população da capitaldo Estado.

Todos estes indicadores possibili-tam, portanto, caracterizar a rede ur-

bana de Roraima como sendo dotipo macrocefálica, ou seja, uma gran-de cabeça com um pequeno corpo.

Macrocefalia funcional dos servi-

ços de saúde

A macrocefalia demográfica deBoa Vista se reflete na distribuição dasfunções urbanas. Em princípio, as ci-dades de um sistema urbano, segun-do o modelo das localidades centrais(CHRISTALLER, 1966), deveriamter os serviços compatíveis com seutamanho demográfico e com suas ne-cessidades básicas. Entretanto, podeocorrer que a distribuição dos servi-

ços pelas cidades não siga exatamen-te a regra acima exposta, dificultan-do ainda mais o acesso aos bens eserviços por parte da população dis-tribuída em todo o território. Issodecorre dos efeitos negativos da ma-crocefalia, historicamente construída,combinados com a ausência de polí-ticas públicas específicas. A análise quese seguirá demonstrará que, no casode Roraima, tomando como parâme-tro os serviços de saúde, este proble-ma ocorre de forma destacada.

Para tanto, a tabela 4 mostra as 35funções levantadas nas 15 cidades doEstado (existência ou não existência

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31Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BARDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Tabela 4 – Número de ocorrência de funçõesrelacionadas com a saúde nas cidades de Roraima – 2002

FunçõesNº de

ocorrência

1 Estabelecimentos públicos de saúde sem internação 152 Postos de trabalho de nível superior 153 Equipo odontológico 144 Estabelecimentos de saúde que prestam serviços ao SUS 145 Postos de trabalho de auxiliar de enfermagem 146 Postos de trabalho de médicos 147 Postos de trabalho de nível técnico/auxiliar 148 Postos de trabalho de odontólogos 149 Estabelecimentos de saúde com plano de saúde próprio 13

10 Equipamentos para manutenção da vida 1211 Estabelecimentos públicos de saúde com internação 1212 Leitos disponíveis ao SUS 1213 Postos de trabalho de enfermeiros 1214 Postos de trabalho de técnicos de enfermagem 715 Equipamentos de diagnóstico através de imagem 616 Aparelhos de raio X até mais de 500 mA 517 Eletrocardiógrafos 318 Equipamentos por métodos gráficos 319 Grupo de geradores 320 Ultra-som ecógrafo 321 Estabelecimentos privados de saúde sem internação 222 Estabelecimentos de saúde com atendimento particular 223 Eletroencefalógrafos 124 Equipamentos de hemodiálise 125 Equipamentos para terapia por radiação 126 Equipamentos por métodos óticos 127 Estabelecimentos privados de saúde com internação 128 Estabelecimentos de saúde que prestam serviços

a plano de saúde de terceiros1

29 Estabelecimentos de saúde de apoio à diagnosee terapia privados

1

30 Estabelecimentos de saúde de apoio à diagnosee terapia públicos

1

31 Leitos particulares 132 Mamógrafos com comando simples ou com estereotaxia 133 Tomógrafos 134 Ultra-som doppler colorido 135 Raio X para densitometria óssea 0

Fonte dos dados: IBGE. Serviços de saúde – 2002. Elaboração: Autores.

das funções), arrumadas em ordemdecrescente de freqüência de ocorrên-cia. As primeiras duas funções são debaixo limiar e ocorrem em cada ci-dade, enquanto que 12 funções fo-ram somente encontradas em uma ci-dade. A função 35 não existe emnenhuma cidade segundo as infor-mações do IBGE. O teste estatísticosugere uma classificação em quatrogrupos que indicam homogeneidadeintragrupal maior do que de umaclasse para a outra (tabela 5).

A tabela 4 serviu como base parao desenho da figura 1 que mostra noeixo y as 35 funções de saúde na se-qüência da referida tabela e no eixo xa ocorrência destas funções nas 15cidades. O gráfico dá a visão da for-mação dos quatro grupos definidos.O primeiro grupo indicador envolveas variáveis (1) a (13); o segundo gru-po as variáveis (14) a (16), o terceirogrupo as variáveis (17) a (22) e o qua-tro grupo 12 variáveis (23) a (34) queocorrem somente em um centro ur-bano.

A figura 2 visualiza a distribuiçãodas funções de saúde em cada umadas 15 cidades do Estado, identifi-cando a ocorrência ou não das mes-mas nos centros urbanos, seguindo aseqüência da tabela 6. Como se per-cebe, Boa Vista possui 34 funções das35 arroladas. Já Iracema, no outroextremo dispõe apenas de seis fun-ções.

Na classificação dos centros urba-nos destaca-se evidentemente Boa Vis-ta, formando, isoladamente, o primeironível hierárquico (tabela 7). O segun-do grupo de cidades foi definido con-siderando a presença de todas as trêsfunções de saúde do segundo grupoindicador ou, pelo menos, duas fun-ções do segundo grupo e, no míni-mo, uma função do terceiro grupo.Assim, neste nível hierárquico enqua-dram-se quatro cidades. O terceironível de cidades envolve centros que

apresentam pelo menos duas funçõesdo segundo grupo ou duas funçõesdo terceiro grupo indicador. A estenível hierárquico pertencem três cida-des. O quarto nível é formado pelascidades com funções mais freqüente-mente distribuídas, sem apresentar asfunções mais raras. A figura 3 repre-senta o resultado da classificação aci-ma demonstrada. É preciso salientar

que algumas cidades menores, comoNormandia, tendem a ter mais fun-ções em decorrência de sua maior dis-tância de Boa Vista. Já cidades maio-res, mas bem próximas de Boa Vista,podem ter poucas funções, como é ocaso de Mucajaí.

Como resultado, foi elaborado ummapa da distribuição das cidades se-gundo os níveis hierárquicos relacio-

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32 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Tabela 5 – dos grupos de funções de saúdeHomogeneidade interna

Homogeneidade dos grupos

Absoluta RelativaGruposindicadores

Freqüência médiade ocorrência Desvio padrão

intragrupalDesvio padrão

intergrupal

Coeficientede variaçãointragrupal

Coeficientede variaçãointergrupal

Númerode funções

1 13,46 1,13 8,40 132,82 26,68

2 6,00 1,00 16,67 31,33 34,73

3 2,67 0,52 19,48 60,36 31,58

4 0,92 0,28 30,43 13

Elaboração: Autores.

Tabela 6 – Número de funçõescentrais de saúde nas cidadesde Roraima – 2002

Cidades Nº defunções

1 Boa Vista 34

2 Normandia 183 Alto Alegre 174 Rorainópolis 165 Caracaraí 16

6 Bonfim 167 Pacaraima 158 Caroebe 149 Amajari 13

10 São Luiz 13

11 Mucajaí 1212 Cantá 1113 São João da Baliza 1114 Uiramutã 9

15 Iracema 6

Fonte dos dados: IBGE. Serviços de saúde– 2002. Elaboração: Autores.

Tabela 7 – Classificação das cidades segundo as funções de saúde

Hierarquia dos centros urbanos Número de funções População1ª Boa Vista 34 197.0982ª Normandia 18 1.500

Alto Alegre 17 5.195Rorainópolis 16 7.185Caracaraí 16 8.236

3ª Bonfim 16 3.000Pacaraima 15 2.760Caroebe 14 1.977

4ª Amajari 13 799São Luiz 12 3.447Mucajaí 12 7.029Cantá 11 1.155São João da Baliza 11 3.882Uiramutã 9 525Iracema 6 3.228

Fonte dos dados: IBGE. Serviços de saúde – 2002. Elaboração: Autores.

nados com as funções de saúde (figu-ra 4). Como se observa, destaca-se BoaVista e o fato de que várias cidadespróximas da capital não atingiram umnível hierárquico médio demonstran-do sua dependência direta de Boa Vis-ta. No sul, Rorainópolis apresenta umnível que a define como um pequenocentro regional.

Visando expressar de formaquantitativa a macrocefalia urbanaem Roraima, com base nos servi-ços de saúde, foram selecionadastrês funções: leitos hospitalares,postos de trabalho de médicos,postos de trabalho de enfermeirose aparelhos de raio X (figura 5). BoaVista concentra 76% dos leitos hos-pitalares, 89% dos postos de mé-dicos, 81% dos postos de enfer-meiros e 81% dos aparelhos de raioX, contra 61% da população. Emtodos estes casos fica clara a con-centração dos equipamentos e ser-

viços de saúde em Boa Vista, comple-mentada pela informação do SUS deque só a capital dispõe de leitos deUTI (15 leitos) no Estado de Roraima.

A análise efetuada permite com-provar que a macrocefalia demográficade Boa Vista repercute de formadramática na distribuição dos serviçosde saúde em Roraima. Toda esta situa-ção é agravada pelas grandes distânci-as e pelo estado das rodovias o quetorna ainda mais problemático o aces-so das pessoas aos serviços de saúdeda capital, considerando o tempo e oscustos de deslocamento.

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33Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BARDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

20

15

10

5

0

25

30

35

129630 15

Ocorrência das funções

Funções

de

saúde

Fonte dos dados: IBGE.Elaboração: Autores.

Serviços de saúde2002.

Figura 1 – Frequênciade ocorrência das funções

de saúde e seu agrupamento

1

2

3

4

Gruposindicadores

20

15

10

5

0

25

30

35

11 1395 731 15

Cidades

Funções

de

saúde

Fonte dos dados: IBGE.Elaboração: Autores.

Serviços de saúde2002.

Figura 2 – Ocorrênciade funções de saúde

nas cidades de Roraima

Boa

Vsi

ta

Nor

man

dia

Alto

Ale

gre

Bon

fim

Ror

ainó

polis

Car

acar

Pac

arai

ma

Car

oebe

Am

ajar

i

São

Luiz

Muc

ajaí

Can

S. J

oão

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aliz

a

Uira

mut

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Irac

ema

me

rod

efu

nçõ

es

30

35

25

20

15

10

5

0

Cidades

Fonte dos dados: IBGE. Elaboração: Autores.Serviços de saúde 2002.

Figura 3 – Número de funções de saúdee classificação hierárquica das cidades de Roraima

1ª ordem

2ª ordem

3ª ordem

4ª ordem

Centro de

ConclusãoO pequeno tamanho demográfi-

co de muitas cidades de Roraima, evi-dentemente não justifica uma fortedescentralização dos equipamentos eserviços de saúde. Mas, mesmo as cida-des de porte um pouco maior, comoRorainópolis, Caracaraí e Mucajaí es-tão relativamente mal servidas.

Tudo indica, portanto, que a dis-tribuição dos serviços de saúde emRoraima necessita de uma avaliaçãoestratégica que leve em conta dois cri-térios básicos: (i) o tamanho da cida-de e (ii) sua localização relativa comrelação à capital e suas relações comoutras cidades e municípios vizinhos.Com base nisto, aparece como prio-ritário o apoio a Rorainópolis, comsua localização mais distante de BoaVista, no sul do Estado, influenciandoSão Luiz, São João da Baliza e Caroe-be, totalizando hoje uma demanda de42.000 pessoas, e Caracaraí, influenci-ando Iracema e toda a área central doEstado, atualmente somando quase24.000 habitantes. Seria o início do quese poderia chamar de uma “descen-tralização centralizada” dos serviçoscom base em Rodwin (1967), em ou-

tras palavras, de uma regionalizaçãoplanejada destes serviços visando tor-ná-los mais acessíveis a toda a popula-ção do Estado. Além disso, deveria serimplantado um amplo serviço de aten-dimento médico e odontológico comcaracterísticas móveis para o periódi-co atendimento básico in loco das po-pulações urbanas e rurais sem necessi-dade de deslocamento ou, como dizo Ministério de Saúde (2004, p. 21),de forma semelhante ao que propõeo já citado modelo de hierárquico-sistêmico das localidades centrais:

As ações e os serviços de saúde nãopodem ser estruturados apenas na es-cala dos municípios. Existem no Bra-sil milhares de pequenas municipalida-des que não possuem em seus terri-tórios condições de oferecer serviços dealta e média complexidade; por outrolado, existem municípios que apresen-tam serviços de referência, tornando-se pólos regionais que garantem o aten-dimento da sua população e demunicípios vizinhos.

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34 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Fonte dos dados: IBGE. – ; DNIT. – 2002.Serviços de saúde 2002 Mapa rodoviário RoraimaElaboração: Autores.

Boa VistaBoa VistaAlto AlegreAlto Alegre

Cantá

Caracaraí

UiramutãUiramutãPacaraimaPacaraima

Normandia

AmajariAmajari

BonfimBonfim

Mucajaí

Iracema

Caroebe

São Joãoda BalizaSão Joãoda Baliza

SãoLuizSãoLuizRorainópolis

BR-210

BR-210

BR

-174

BR

-174

BR

-174

BR-401

0 50 100 150 km

Estrada pavimentada

Estrada implantada

Limite municipal

Povoados

1ª ordem

2ª ordem

3ª ordem

4ª ordem

Centro de

Figura 4 Distribuição das cidades de Roraima segundoníveis hierárquicos relacionados com as funções de saúde – 2002

Tabela 8 – Distâncias entre Boa Vista e as demais cidades de Roraima

CidadesDistância

de Boa Vista (km)Tempo aproximado de

viagem*

Alto Alegre 89 1 h 50 minAmajari 158 3 h 10 minBonfim 125 2 h 30 minCantá 32 0 h 40 minCaracaraí 134 2 h 40 minCaroebe 354 7 h 00 minIracema 92 1 h 50 minMucajaí 52 1 h 00 minNormandia 183 3 h 40 minPacaraima 215 4 h 20 minRorainópolis 291 5 h 50 minSão João da Baliza 346 7 h 00 minSão Luiz 305 6 h 10 minUiramutã 299 6 h 00 min

* Média de 50 km/h.Fonte: FECOMÉRCIO/RR. 2002/2003.Guia turismo em Roraima.

Leitos hospitalares Postos de trabalho de médico

Boa

Vis

ta

Alto

Ale

gre

Pacara

ima

São

Luiz

Cara

cara

í

Norm

andia

Bonfim

Caro

ebe

Rora

inópolis

São

João

da

Baliz

a

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aja

ri

Uiram

utã

Cantá

Iracem

a

Mucaja

í

600

500

400

300

200

100

0

Boa

Vis

ta

Alto

Ale

gre

Cara

cara

í

Rora

inópolis

Mucaja

í

Bonfim

Norm

andia

Pacara

ima

Cantá

São

Luiz

Caro

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São

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Baliz

a

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aja

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Uiram

utã

Iracem

a

500

400

300

200

100

0

Boa

Vis

ta

Alto

Ale

gre

Mucaja

í

Rora

inópolis

Cara

cara

í

Pacara

ima

Bonfim

São

Luiz

Norm

andia

Am

aja

ri

Cantá

Iracem

a

Caro

ebe

São

João

da

Baliz

a

Uiram

utã

200

160

120

80

40

0

Postos de trabalho de enfermeiros

Boa

Vis

ta

Alto

Ale

gre

Cara

cara

í

Rora

inópolis

Pacara

ima

Am

aja

ri

Bonfim

Cantá

Caro

ebe

Iracem

a

Mucaja

í

Norm

andia

São

João

da

Baliz

a

São

Luiz

Uiram

utã

18

15

12

9

6

3

0

Aparelhos de raio X

Figura 5 – Número de leitos hospitalares,postos de trabalho de médicos, postos de trabalho

de enfermeiros e aparelhos de raio Xnas cidades de Roraima – 2002

Fonte dos dados: IBGE. Elaboração: Autores.Serviços de saúde – 2002.

Esta nova regionalização garanti-ria o atendimento de metas de efici-ência e eqüidade para o sistema desaúde do Estado de Roraima.

Referências bibliográficas

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BARROS, N. C. C. de. Roraima: paisagense tempo na Amazônia Setentrional. Reci-fe: Editora Universitária-UFPE, 1995.

CHRISTALLER, W. Central places inSouthern Germany. Englewood Cliffs:Prentice Hall, 1966 (original de 1933).

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ResumoO presente trabalho visa contribuir

para a discussão da perspectiva doTurismo Sustentável em áreas prote-gidas de fronteira, na Amazônia bra-sileira, a partir do olhar sobre os par-ques nacionais Montanhas de Tumu-cumaque e Cabo Orange, que confi-guram e materializam, em sua dinâ-mica, o encontro de duas lógicas dis-tintas de desenvolvimento, uma vezque se situam em área de fronteiracom a Guiana francesa e, ilustram acomplexidade de uma região ultrape-riférica da Europa e da América Lati-na, que gradualmente passa a com-por o imaginário coletivo, por sua im-portância geoestratégica, no âmbitoda diplomacia contemporânea e, emespecial, com relação à Convençãoda Diversidade Biológica.

Palavras-chave: parques nacionais,fronteira, turismo sustentável, Ama-zônia.

AbstractThe present work aims to contri-

bute to the discussion of the approachof Sustainable Tourism in protectedareas in the brazilian Amazonborder, from the case of Montanhasde Tumucumaque e Cabo OrangeNational Parks, which illustrate,directly, the challenges and conflictsbetween two different logics of deve-lopment in the Amazon region, at theborder of French Guiana, an “ultra-peripheric” region of the EuropeanUnion and the Latin America thatgradually increases in importancein the global imagination, for itsgeostrategic importance linked to thecontemporany diplomacy, and, inspecial, with the framework of theBiodiversity Convention.

Key Words: National parks, borderareas, sustainable tourism, AmazonRegion.

1. Introdução e PressupostosA utilização da base de recursos

renováveis para uso turístico seconstitui em tema central, no contex-to de ecossistemas tropicais, em pa-íses emergentes (ou em vias de de-senvolvimento), nos quais, a deman-da por inclusão social representafoco central de políticas públicas e,também, a garantia de manutençãode integridade de patrimônio natu-ral, de importância global. Essa afir-mação é ainda mais significativapara os países de megadiversidadebiológica, nos quais as estratégias deconservação estiveram, historica-mente, dissociadas da perspectivade desenvolvimento regional.

Nesse contexto, os parques nacio-nais emergem como pontos focaispara o desenvolvimento turístico eveículos potenciais de inclusão so-cial, principalmente em países comoo Brasil, ainda distantes das estatís-ticas mundiais de turismo, apesar desua condição de país de importanteliderança no âmbito da Convençãoda Diversidade Biológica. Esta afir-mação ganha ainda um significadomais expressivo, no âmbito das po-líticas públicas e sua articulaçãoprogressiva para a redução das de-sigualdades sociais. No momento, aDiretoria de Áreas Protegidas doMinistério do Meio Ambiente, empre-ende esforços para a elaboração do

Plano Nacional de Áreas Protegidasque, em seus princípios norteadores,busca compatibilizar a conservaçãodo patrimônio natural e a inclusãosocial. Da mesma forma, um esforçoconjunto dos Ministérios de Turismoe de Meio Ambiente, finaliza e revi-são das Diretrizes para a PolíticaNacional de Ecoturismo (EMBRA-TUR/IBAMA, 1994) e coloca em evi-dência as Unidades de Conservaçãoe a participação da sociedade comofocos prioritários para atuação futura.

Atualmente, no Brasil, existem 55parques nacionais, e este englobamaproximadamente 17.631.180 hecta-res.2 (IBAMA, 2005), distribuídos portodas as regiões do país, com eleva-da representatividade dos diferen-tes ecossistemas regionais. No en-tanto, o processo de criação de par-ques nacionais (e, a conseqüente de-manda de gestão), induzido pelomomento político brasileiro e pelaspressões internacionais, não foiacompanhado de uma estratégiaequivalente de inclusão social, oumecanismos de participação da so-ciedade na discussão de políticaspúblicas de proteção da natureza, oque acabou por consolidar uma ci-são evidente sociedade-natureza,causa provável de grande parte dosconflitos relacionados à existênciade áreas protegidas no Brasil. Noentanto, apenas poucos são utiliza-dos efetivamente para uso turísticoe, a maioria encontra-se ainda “emfase de implantação”. Assim, os par-ques nacionais, apesar de seu valor

ÁREAS PROTEGIDAS DE FRONTEIRA E TURISMOSUSTENTÁVEL NA AMAZÔNIA: ENTRE O

SURREALISMO E A INVENÇÃO

Marta de Azevedo Irving 1

1 Pesquisadora e Professora do Programa Eicos/IP/UFRJ. Trabalho realizado com apoio inicial daCAPES, do Museu de História Natural de Paris e, da DAP/SBF/MMA para as atividades de campo.

2 Para esta análise, não são consideradas terras indígenas ou quilombolas, por estas não seremconstituintes do SNUC.

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como patrimônio natural de impac-to global, contribuem ainda muitopouco como pontos focais para odesenvolvimento regional, a econo-mia local e a inclusão social.

Destes parques, cinco estão dire-tamente em área de fronteira do Bra-sil, na Amazônia e, significativamen-te distantes dos mercados emissorestradicionais: PN da Serra do Divisor,PN do Pico da Neblina, PN MonteRoraima, PN do Cabo Orange, PNMontanhas de Tumucumaque, sen-do os últimos dois de importânciacentral para o diálogo ético do turis-mo entre América Latina e Europa,na Amazônia. Esta região, de grandeimpacto no imaginário coletivo, repre-senta um atrativo patrimonial e sim-bólico, sem precedentes, a ser, certa-mente, capitalizado pelo turismo re-gional, a médio e longo prazos.

Becker (2005) assinala o signifi-cado geopolítico da Amazônia,como valorização ecológica de “du-pla face”, em termos de sobrevivên-cia humana e capital natural, sobre-tudo água e megadiversidade, numcontexto progressivo de mercantili-zação da natureza, ao que ela deno-mina “mercado da vida”. Segundoa autora, a Amazônia pode ser in-terpretada como um eldorado da con-temporaneidade, capital de realiza-ção atual e futura e, o único a per-tencer, em sua maior parte, a um sóEstado Nacional. Esta afirmação sesustenta em alguns argumentos erevela algumas tendências:

O novo valor atribuído ao potenci-al de recurso naturais confere àAmazônia o significado de fron-teira do uso científico-tecnológicoda natureza e, em sintonia com apolítica de formação de grandesblocos supranacionais, revela a ne-cessidade de pensar e agir na esca-la da Amazônia sul-americana”(p. 33-34)...

Enquanto espaço geográfico, terri-torial, a valorização estratégica daAmazonia decorre do novo signi-ficado por ela adquirido, o de umduplo patrimônio: o de terras pro-priamente dito, e o de imenso ca-pital natural. Na representaçãosimbólico-cultural, o valor da re-gião está condicionado pela centra-lidade que tem hoje no mundo abiodiversidade e a sustentabilida-de da Terra. (p. 35).

Assim, pensar o planejamentoturístico para a região focal de in-serção dos parques nacionais Mon-tanhas de Tumucumaque e CaboOrange (percebidos em seu conjun-to com as demais áreas protegidasdo Estado do Amapá e da GuianaFrancesa), se constitui num exercí-cio complexo e, ainda, surrealista eabstrato de projeção de cenários,numa região de “ultraperiferia”amazônica (MASTEAU, 1997). Estaregião, em processo de “transe silen-cioso” (IRVING, 2005), no qual o ter-ritório se transforma, de maneiraimperceptível para os distantes cen-tros de decisão, adquire uma novarepresentação no plano global pelovalor estratégico do patrimônio na-tural (notadamente a base de recur-sos hídricos e de biodiversidade), eemerge, como potencialidade, paraum novo modelo de integração ama-zônica.

Nesse contexto, o turismo, surgecomo uma projeção distante na eco-nomia local, como uma possibilida-de remota no mundo globalizadomas se materializa como um apelo,sem precedentes para a reflexão aca-dêmica e para a possibilidade dedistribuição de benefícios pelo usoda natureza, segundo a concepção eos compromissos centrais da Con-venção da Diversidade Biológica3. Seexpressa também, de maneira pro-gressiva como justificativa recorren-te no discurso político regional, sobforte pressão pela integração regio-nal e pelas demandas de desenvol-vimento, como mito e alternativapara a redenção regional, em contra-posição aos mecanismos convenci-onais de uso e ocupação de solo naAmazônia.

Mas em que escala e, de que ma-neira, pensar o turismo em Unida-des de Conservação tão diversifi-cadas ecologicamente, de elevadosignificado para a biodiversidadeglobal, mas ainda não efetivamenteimplantadas, distantes dos centrosurbanos e não competitivas na lógi-ca de mercado internacional? Comorefletir sobre planejamento turísticonum espaço protegido em que o aces-

so representa ainda uma aventuraimprevisível e atraente a poucos e,que, não é sequer “reconhecido eapropriado” pelos brasileiros, nemmesmo residentes em sua área deinserção? Que pressupostos éticosdeveriam antecipar a emergência doturismo regional?

Para o salto ainda surrealista so-bre planejamento turístico, nestecaso, algumas questões permanecemainda sem resposta: Em que basespensar o turismo em áreas protegi-das de uso indireto na Amazônia,tendo como fundamento a integra-ção regional? Qual a abordagem de-sejada para o turismo em áreas pro-tegidas de fronteira? Qual o Estadoda Arte do processo de gestão des-tes parques e quais as suas implica-ções em cooperação internacional?Como as políticas públicas preten-dem construir uma estratégia regio-nal para a gestão da biodiversidadee o desenvolvimento regional, umavez que os ecossistemas amazônicossão contínuos e transcendem as fron-teiras políticas?

Algumas dessas questões foramdiscutidas por Irving (2002a e 2005),tendo como ponto focal os desafios,conflitos, as potencialidades e res-trições para a gestão da biodiversi-dade em áreas protegidas e, em par-ticular, nos espaços para a coopera-ção transfronteiriça Brasil-França,na Amazônia. Na verdade, o tema dagestão da biodiversidade regionalconstitui ainda um desafio de con-tornos indefinidos, o que tende a di-ficultar seriamente as iniciativas deplanejamento turístico, principal-mente em função da complexidadeenvolvida em ecossistemas contínu-os envolvendo minimamente 3 paí-ses (Brasil, França e Suriname), sujei-tos e distintos arcabouços legais einstitucionais e lógicas diversifica-das, na interpretação de conservaçãode patrimônio natural e cultural.

Com base neste contexto previa-mente avaliado, o presente trabalho,de caráter exploratório, pretendecontextualizar o turismo, numa pers-pectiva de projeção de cenários ten-do, como focos centrais de análise,

3 Para este trabalho, o maior foco de análise estará dirigido à dinâmica do turismo no Estado do Amapáe sua interação com a Guiana Francesa.

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os parques nacionais de fronteira doEstado do Amapá, em suas poten-cialidades e interfaces com a GuianaFrancesa, tendo em vista as políti-cas públicas, a dinâmica regional e,as demandas futuras, na lógica deum território “em efervescência si-lenciosa”.

A pesquisa foi desenvolvida en-tre maio de 2004 e julho de 2005, si-multaneamente no Brasil e na Fran-ça, com base em pesquisa documen-tal e bibliográfica, entrevistas dirigi-das a interlocutores selecionados(pesquisadores, gestores de espaçosprotegidos e políticos dos dois paí-ses), questionários dirigidos aos di-retores de parques, análise de folhete-ria turística e pesquisa de campo4.

2. Parques nacionais Monta-nhas de Tumucumaque eCabo OrangeA contextualização preliminar

dos dois parques está apresentadaa seguir. No entanto, é importantemencionar que as informações sobrea área em questão são ainda limita-das e estão dispersas em alguns sitesespecializados e muitas publicaçõese documentos são de acesso limita-do. As informações a seguir apresen-tadas foram levantadas, principal-mente, nos sites do Ministério deMeio Ambiente (2004a), do IBAMA(2004), e na consulta a alguns veícu-los de comunicação e entrevistas re-alizadas em campo, sistematizadase discutidas em Irving (2005). Em-bora localizados numa mesma re-gião geográfica, os dois parques temcaracterísticas ecológicas bastantedistintas e, ilustram um gradiente dalinha de fronteira entre sistemasmarinhos e costeiros e áreas interio-res de floresta tropical densa masestão sujeitos progressivamente afortes pressões com relação ao usodos recursos renováveis.

2.1. Caracterização do Parque Nacio-nal Montanhas de Tumucumaque

O PNMT5 , criado por Decreto s/n,publicado no Diário Oficial de 23 deagosto de 2002, é a maior área prote-gida do mundo em floresta tropicale possui uma área de 3. 867.000 ha.Está localizado predominantemen-te na região noroeste do Estado do

Amapá, tendo também parte de suaextensão no Estado do Pará e fazfronteira com a Guiana Francesa e oSuriname (figura 1).

A região de inserção do PNMTse caracteriza por clima quente eúmido, dominada pela floresta tro-pical densa. Ela abriga também asnascentes dos principais rios doAmapá, como o Oiapoque, o Jari e oAraguari. Com relação ao patrimô-nio natural, o PNMT se caracterizapor uma elevada riqueza florísticae faunística e uma significativa di-versidade de habitats, uma daspotencialidades de maior relevân-cia para o desenvolvimento turísti-co, em geral, e para a pesquisa cien-tífica, em particular.

Entre as espécies de fauna podemser mencionados grandes carnívo-ros como a onça (Panthera onca) e asussuarana (Puma concolor) e prima-tas raros como o caxiu (Chiropotessatanas) de população muito reduzi-da em outras regiões. Pássaros comoas macaws (Ara cloroptera e Ara ma-

cao), marianinhas (Pionites melano-cephalata, jacus (Penélope marail), bei-ja-flor brilho de fogo (Topaza pela), egrandes pássaros frutívoros da copada floresta, tais como o Anambé-mi-litar (Haematoderus militaris), o pás-saro-boi (Perissocephalus tricolor) eo Gainambé (Procnias alba) são abun-dantes nas florestas bem conserva-das da região. Entre as espécies daflora podem ser citadas a maçaran-duba, maparajuba, cupiúba, jarana,mandiqueira, louros, acapu, mata-matás, faveiras, abioranas, cedrora-na, pracachi, piquá, tachi, entre ou-tras (IBAMA, 2004)

A importância ecológica do PNMTé reforçada ainda por este se inserirnum imenso corredor de biodiver-sidade, ligando toda a face oeste doEstado do Amapá até o nordeste doPará, que proporciona a interligaçãode diversas áreas protegidas, a gran-de maioria em ecossistema de flores-ta densa. O parque é ainda a peçamaior em um mosaico de unidadesde conservação que recobre mais de

Figura 1: Contexto de Localização do Parque Nacional Montanhas deTumucumaque

4 A continuidade da pesquisa está prevista no âmbito do Programa Eicos/IP/UFRJ e dos projetos decooperação Brasil-França para a Gestão da Biodiversidade e Desenvolvimento Regional, em fase deconstrução entre a Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Museu Nacional de História Natural deParis (MNHN), a Escola Nacional de Altos Estudos de Paris (EHESS) e, a Diretoria de Áreas Protegidasdo Ministério da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do Meio Ambiente do Brasil.

5 De acordo com o dispositivo do Artigo 1º do documento legal, “o parque tem como objetivo específicoassegurar a preservação de recursos naturais e da diversidade biológica, bem como proporcionar arealização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação, de recreação eturismo ecológico”. (Lei 9985/2000).

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50% da área do Estado do Amapá.Sem estradas e isolado de qualquergrande concentração urbana, o par-que está praticamente intocado, anão ser por alguns focos isolados degarimpo e pela presença do núcleopopulacional de Vila Brasil.

O parque situa-se numa regiãodespovoada, exceção à Vila Brasil,único núcleo populacional contidodentro dos limites do Parque. Noentanto, em seu entorno, há ocorrên-cia de garimpos. Em seu interior, fo-ram identificadas, pelo IBAMA, 25pistas de pouso clandestinas6, algu-mas ainda ativas. As atividades decaça e exploração irregular de ma-deira, até o momento, não constitu-em um problema maior para a fisca-lização.

Não existe acesso rodoviário aoparque, uma vez que as estradas exis-tentes são precárias e não chegamaos seus limites. Sem estradas, e iso-lado de qualquer grande concentra-ção urbana, o parque está pratica-mente intocado, a não ser por algunsgarimpos e pelo núcleo urbano deVila Brasil. Também não há no localinfraestutura turística de porte mas,com a perspectiva de finalização doplano de Manejo, a área poderá seraberta à visitação em 2006/2007 eum investimento nesse setor seráessencial para o desenvolvimentoturístico regional.

2.2. Parque Nacional do Cabo OrangeO PNCO foi criado pelo Decreto

n° 84.913 de 15.07.1980, está locali-zado no Estado do Amapá, nos mu-nicípios de Calçoene e Oiapoque7 epossui uma área de 619.000 ha, comfronteira direta com a Guiana fran-cesa (figura 2).

O clima da região é tropical, quen-te e úmido, com 3 meses de baixaprecipitação pluviométrica. As tem-peraturas médias anuais situam-seentre 24 a 26° C., e o nível pluviomé-trico entre 1750 e 2000 mm anuais.

Em contraste com os ecossiste-mas predominantes no Parque Na-cional Montanhas de Tumucuma-que, o Parque Nacional do CaboOrange tem função primordial napreservação de manguezais e decampos de planície do Amapá e per-tence à unidade de relevo PlanícieFluvio-Marinha Macapá-Oiapoque,que se constitui de áreas planas, nafaixa de terrenos quaternários, for-mados por sedimentos argilosos,siltosos e arenosos de origem mista,fluvial e marinha. O parque protegeuma grande extensão de mangue(uma faixa marítima a 10 Km de lar-gura da costa) e ecossistemas terres-tres, além de favorecer a educaçãoambiental e a pesquisa.

A vegetação se caracteriza predo-minantemente por espécies do man-gue como a siriúba (Avicenia nitida), omangue-vermelho (Rhizophora man-gue) e o mangue-amarelo (Laguncula-ria sp.). Os campos da planície doAmapá têm a cobertura vegetal abun-dante de gramíneas ciperáceas. Sãoencontrados o buriti (Mauritha flexuo-sa), mururés (Eichornia sp.), canara-nas (Echinoa sp.) e o capim-arroz.

A fauna local é rica e diversifi-cada e abriga várias espécies de tar-taruga, o peixe-boi (Trichechus inun-guis), bem como a avifauna,que me-rece destaque por ser o litoral ama-paense o último reduto de várias es-pécies anteriormente encontradasem todo o litoral brasileiro, entre elaso guará (Eudocimus ruber) e o flamin-go (Phoenicopterus ruber).

O PNCO, diferentemente da maio-ria dos parques nacionais brasilei-ros, possui 92% de sua área total re-gularizada. No entanto, alguns con-flitos e pressões sobre os ecossiste-mas locais são observados em fun-ção de pioneiros na ocupação da re-gião, que possuem fazendas no en-torno. São também registrados in-cêndios, invasões, atividades de pe-cuária, agricultura, caça, pesca, des-matamentos, mineração e erosão nointerior da área do Parque. É impor-tante também ressaltar a existênciade moradores dentro do parque econflito com criadores de búfalos. Arelação da administração com osmoradores da Borda Sul (remanes-centes de quilombo, reconhecidospela Fundação Palmares) tem sidopacífica mas com a comunidade deCunani (extrativistas) há problemasde solicitação de área, no limite suldo parque. Não há conflitos diretosentre o parque a área indígena a oes-te. Na localidade de Taperebá, osconflitos existem com pescadoresque vem do exterior8.

2.3. A importância histórica e culturaldo território na lógica da disputa

O território, que atualmente abri-ga os dois parques está associado aum percurso histórico da mais alta

Figura 2: Contexto de Localização do Parque Nacional de Cabo Orange

6 Informação obtida em reunião com o IBAMA em Macapá, em agosto de 2004.7 O acesso é feito através da BR-156, ou por rede fluvial (Rio Caciporé). De Oiapoque (670 Km da capital)

por via marítima, é possível chegar a Vila Taperebá que fica na área do Parque.8 Informações obtidas em questionário dirigido à equipe IBAMA/Parque Nacional de Cabo Orange.

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importância, na lógica da construçãode identidade do Brasil e da Françana região amazônica e, esse registroé apenas, marginalmente, conheci-da pela população dos dois países.Estes parques representam, portan-to, não apenas um registro de patri-mônio ambiental de importância glo-bal mas também uma memória, a serresgatada, não pelo ângulo da dis-puta de território, mas por sua facesimbólica e multifacetada, de sobre-posição de influencias culturais eétnicas, que cria uma paisagem sin-gular, de difícil reprodução no es-paço amazônico. Estas influenciasreproduzem duas realidades distin-tas, que trazem à reflexão o diálogonorte-sul ou ainda, os desafios deum espaço geográfico que concentra,simultaneamente, em toda a comple-xidade, a reflexão ética sobre o(des)envolvimento.

Este território representa o resul-tado do balanço de forças, entre di-versos países, desde os tempos re-motos da descoberta do continenteamericano até a época recente daRepública no Brasil. O percurso his-tórico recua desde a disputa entreportugueses e espanhóis e, a assi-natura imprecisa do Tratado de Tor-desilhas, passando pelas iniciativasdos demais países europeus em ocu-par a amazônia brasileira, até a dis-puta direta entre França e Brasil pelasoberania do território, entre o Ama-zonas e o Oiapoque. Confronto polí-tico finalizado apenas em 1900, porum Tratado de Arbitragem, decididona Suíça, que estabeleceu, no planointernacional, os limites definitivosde fronteira, reafirmando a base doTratado de Utrecht. Estudos detalha-dos sobre o tema são apresentadosem Masteau (1997) e Sarney et al.(2003), entre outros pesquisadores.

Evidentemente que a dimensãohistórica é extremamente complexae afeta, até os dias atuais, a dinâmi-ca do território e a paisagem cultu-ral de fronteira e merece um capítu-lo à parte na caracterização dos doisparques em questão, uma vez queamplifica a sua importância e trans-cende a interpretação apenas centra-da no discurso sobre a biodiversi-dade. No território dos parques e seuentorno, diversos são os registroshistóricos e as influencias recípro-cas entre Brasil e França, o que pare-

ce contribuir para um cenário pecu-liar na dinâmica amazônica, poucoestudado e negligenciado nos textostradicionais, que merece um olhar depesquisa mais aprofundado. Cabeainda enfatizar que o valor históri-co da região poderá representar umdiferencial de alta atratividade turís-tica para a região, em estratégias fu-turas de desenvolvimento, uma vezque integra um resgate identitáriopara os dois países e envolve, com-plementarmente, a história do Suri-name e todas as suas interfaces como contexto atual da União Européia..Com o objetivo de contribuir para avisibilidade desta dinâmica, o Qua-dro 1 apresenta, resumidamente, al-guns dos marcos históricos que po-deriam inspirar roteiros turísticospara a região. A resultante do modode ocupação do território é decorren-te do valor estratégico atribuído his-toricamente ao patrimônio natural eda integração progressiva de basesculturais distintas e, envolve, demaneira evidente, um processo gra-dual de troca entre etnias e civiliza-ções, de difícil reprodução em terri-tório amazônico.

2.4. A gestão dos parques como temacentral ao desenvolvimento turís-tico

O processo de criação dos doisparques materializa uma história dedecisões centralizadas e, evidente-mente conflitos, que, apenas recen-temente, começam a ser negociadosentre diferentes esferas do PoderPúblico. Com relação ao processo degestão e sua utilização para fins tu-rísticos, os parques não dispõemainda de Planos de Manejo consoli-dados. No caso do PNMT, uma par-ceria com a Conservation Internatio-nal e o Exército, tem apoiado expe-dições para levantamento de flora efauna, que subsidiarão a caracteri-zação ecológica do parque e a elabo-ração futura do Plano de Manejo,previsto para ser concluído em 2006.Da mesma forma que o Plano de

Manejo, o Conselho Gestor, previstopelo SNUC, com caráter consultivo,encontra-se ainda em formação econsolidação.9 O esforço, no momen-to, pela direção do parque, tem sidosensibilizar lideranças da região, nosentido de uma configuração maisdefinitiva e atuante do conselho. Como novo conselho empossado e, asinformações de flora e fauna e, da-dos sócio econômicos levantados, oPlano de Manejo poderá ser discuti-do construído, participativamente e,a área aberta à visitação, teoricamen-te, a partir de 2006/2007.

Da mesma maneira, embora oPNCO tenha sido criado em 1980, nãodispõe ainda de Plano de Manejo, emfase de planejamento e realizaçãopelo Projeto ARPA. O ConselhoGestor encontra-se também em fasede implantação e consolidação.10 Nãohá visitação em processo de rotina,embora já tenham sido iniciados tes-tes de visitação orientada com gru-pos oriundos de Caiena e, no mo-mento, encontra-se em fase de dis-cussão um Projeto de Turismo Inte-grado entre o Parque Nacional deCabo Orange e o Parque RegionalNatural da Guiana, ambos contíguosna linha de fronteira.

No entanto, para o planejamentoturístico, considerando o Plano deManejo, (associado ao Plano de UsoPúblico) essencial não apenas comodocumento técnico mas como instru-mento norteador de planos e progra-mas, qualquer iniciativa para o de-senvolvimento turístico no interiordo parque, só poderá ser idealiza-da, na prática, a partir de 2007, numaprevisão realista. Se esta restriçãoimpede o desenvolvimento de estra-tégias turísticas de curto prazo, elarepresenta também uma oportunida-de ímpar para o planejamento delongo prazo, capaz de anteciparimpactos e maximizar benefícios so-ciais e ambientais. Talvez este seja umdos diferenciais mais interessantesna perspectiva de planejamento tu-rístico para os parques nacionais

9 Um primeiro conselho havia sido criado, de maneira arbitrária, aparentemente sem qualquer represen-tatividade, vinculação ao parque ou lógica de participação social no processo de tomada de decisão.

10 A composição prevê as prefeituras locais, Exército de Fronteira, Batalhão Ambiental (Polícia Militar), Asso-ciação Comercial, Colônia de Pescadores (Taperebá), Representantes dos Cuninami (Quilombos), FUNAI,APIO (Povos Indígenas do Oiapoque), AGN (Associação Galibi-Warmorno Indígena), Assentamento deCaçipore e Assentamento de Vila Velha (Assentamento do INCRA), criadores de gado, comunidades lo-cais, Associação Ambiental, Pegadas do Oiapoque (ONG), IEPA (Instituto do Estado de Pesquisa do Amapá),IESA (Instituto de Estudos Socioambientais), INCRA, Associação de Catraeiros (transporte fluviais).

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Quadro 1: Principais Marcos do Histórico da Disputa de Fronteira na Região (continua)

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(conclusão)

Fonte: Doratioto, F.F.M. (2003).Obs: As informações resumidas refletem a leitura brasileira sobre a lógica da disputa de fronteira.

MESTRADO EM ANÁLISE REGIONALO primeiro da sua categoria no Estado da Bahia

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Montanhas de Tumucumaque e CaboOrange e sua região de inserção.

Um tema central para a gestão e,futuramente, para o desenvolvimen-to de circuitos turísticos regionais, dizrespeito à limitação de recursos hu-manos nos dois parques. As equipesdo IBAMA são extremamente redu-zidas e, embora estejam efetivamenteengajadas no processo de inclusãosocial para a gestão, dispõem de pou-cos recursos e meios efetivos para res-ponder a uma demanda cotidianaelevada e crescente, em termos decompromissos e ações de campo.

2.5. Contextualização sócio econômicaregional

Os dois parques inserem-se numconjunto total de 5 municípios doEstado do Amapá (Pedra Branca, Ser-ra do Navio, Laranjal do Jarí, Oiapo-que e Calçoene) e um município doPará (Almerim) Estes municípios es-tão apresentados, em termos de datade criação, população, densidade de-mográfica e IDH no Quadro 2.

A economia local se baseia nosetor primário e de serviços. No en-tanto, em alguns casos, como no mu-nicípio de Oiapoque, o comércio ga-

nha dimensões mais importantes eestabelece uma dinâmica distinta, derelação direta com a Guiana France-sa. De maneira geral, a agriculturade subsistencia, a criação de gado, apesca, a exploração florestal e mine-ral constituem a base da economialocal. A infraestrutura turística épraticamente inexistente e, o turis-mo, não constitui ainda elementosignificativo para a economia regio-nal, apesar da riqueza do patrimônionatural e cultural da região.

Um tema fundamental para dis-cussão, com relação à gestão dabiodiversidade regional e ao plane-jamento turístico, diz respeito àtemática indígena e sua integraçãoàs estratégias de desenvolvimento econservação de recursos renováveis.Nesta coexistem diversos grupos in-dígenas, alguns dos quais, em ambosos lados da fronteira com a GuianaFrancesa e, portanto, submetidos aum enquadramento legal e institu-cional distinto. Segundo Gallois eGrupioni (2003) são inúmeras asetnias indígenas no norte do Ama-pá. Os Galibi Marwono ocupam aTerra Indígena Uaçá e a Terra Indí-gena Juminã. Os Palikur ocupam asmargens do rio Urukawá, afluentedo Uaçá (Terra Indígena Uaçá), osKaripuna, as Terras Indígenas Uaçá,Juminã e Galibi do Oiapoque e, osGalibi do Oiapoque, a Terra Indíge-na Galibi do Oiapoque. No noroestedo Amapá os Wajãpi ocupam a Ter-ra Indígena Waiãpi. Próxima aoPNMT há também a Reserva Indíge-na de Tumucumaque.

O Ibama inaugurou recentemen-te um escritório/base de apoio parao parque Nacional de Tumucuma-que em Serra do Navio, municípioadotado como porta de entrada parao parque estão em fase de discussãoduas bases de apoio em Oiapoque eVila Brasil.

Na perspectiva regional, no en-tanto, a área dos parques e seu en-torno já se configuram, sutilmente,como cenário estratégico para a co-operação transfronteiriça com aGuiana francesa sob a ótica da ges-tão da biodiversidade, do desenvol-vimento regional e, a médio e longoprazos, a partir dos circuitos turís-ticos integrados.

Quadro 2: Municípios do Amapá associados à área dos PNMT e PNCO(Área, população, IDH, Principais Atrativos e ComunidadesFontes: www.amapa.net (Consulta em fevereiro 2005), www. Frigoletto.com.br/GeoEcon/menuecon.html (consulta em fevereiro 2005), PNMT: Parque Nacional Montanhas deTumucumaque. e PNCO: Parque Nacional do Cabo Orange.

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(15,8%), Fortaleza (8,5%), Recife(7,5%), Foz do Iguaçu (7,4%) e Búzi-os (6%). As cidades amazônicas nãose expressam, ainda, com expressivi-dade nas estatísticas turísticas.

No caso específico do Estado doAmapá, poucos são os dados recen-tes. As estatísticas disponíveis peloGoverno do Estado, entre 1998 e2001, demonstram também um cres-cimento progressivo da atividadeturística, conforme os dados apre-sentados no Quadro 4.

No entanto, a análise cautelosados dados informações existentestendem a reafirmar que, a visitaçãoao Estado, se dirige prioritariamenteà viagem de negócios. O patrimônionatural não parece figurar ainda nasestatísticas como um atrativo signi-ficativo, conforme os dados apresen-tados no Quadro 5. A visitação aoEstado é motivada basicamente pornegócios, representações comerciais,circulação de funcionários federaise estaduais, parentes de residentes,e outros grupos para os quais nãohá ainda motivação turística ou eco-turística.

Quanto à faixa etária, a grandeconcentração de visitantes tem ida-de entre 26 e 40 anos, provavelmen-te representando a faixa ativa dapopulação, engajada em negócios ouatividades profissionais diversas noEstado (Quadro 6).

Quadro 3: Entrada de turistas no Brasil, segundo regiões de residênciapermanenteFonte: Ministério do Turismo (Embratur), - Dados de 2002 revisados.

Quadro 5: Hóspedes nacionais e estrangeiros registrados nos meios dehospedagem do Amapá segundo o motivo de viagem – 2001Fonte: Ficha Nacional de Registro de Hóspedes (http://www.seplan.ap.gov.br/)

3. Estatísticas de Turismo noBrasil e a Perspectiva doAmapáDe acordo com o Anuário Estatís-

tico da Embratur de 2004 (Ministériode Turismo/EMBRATUR, 2004), oBrasil recebeu, em 2003, 4.090.590turistas estrangeiros, dobrando onúmero de visitantes recebidos em1995. Ainda assim, as estatísticas de2003 foram inferiores aos anos de1998 até 2001, nos quais se registrou,em média, cinco milhões de visitan-tes ao ano. (Dados resumidos segun-do as regiões de residência perma-nente no Quadro 3).

Ainda segundo a mesma fonte, areceita cambial gerada pelo turismointernacional no Brasil foi de US$

3.385.967, no ano de 2003, demons-trando um crescimento de 8% em re-lação ao ano anterior, com evidentetendência ao crescimento nos próxi-mos anos.

Quanto à origem, em 2003, os tu-ristas europeus (1.567.708 visitan-tes), representaram o contingentemais representativo, principalmen-te Alemanha, Portugal, França e Itá-lia. Em segundo lugar, o país foi vi-sitado por turistas sul-americanos(1.532.234 visitantes) e, em seguida,norte americanos (790.652), asiáti-cos (53.785), sendo 50% desse mer-cado proveniente do Japão.

No mesmo ano, as cidades maisvisitadas foram: Rio de Janeiro(36,9%), São Paulo (18,5%), Salvador

Quadro 4: Hóspedes Nacionais eEstrangeiros no Amapá entre 1998e 2001Fonte : Departamento de Turismo doAmapá (http://www.seplan.ap.gov.br)

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Quadro 6 Hóspedes nacionais e estrangeiros registrados nos meios dehospedagem do Amapá segundo a faixa etária - 2001Fonte: Ficha Nacional de Registro de Hóspedes (http://www.seplan.ap.gov.br/)

Quadro 7: Hóspedes nacionais e estrangeiros registrados nos meios dehospedagem do Amapá segundo o meio de Transporte – 2001Fonte: Ficha Nacional de Registro de Hóspedes (http://www.seplan.ap.gov.br/)

Quadro 8: Total de Visitantes bra-sileiros por Estado de Origem –2001Fonte: Departamento de Turismo (http://www.seplan.ap.gov.br/)

Quadro 9 – Total de Visitantes Es-trangeiros do Amapá por país deorigem – 2001

Fonte: Departamento de Turismo (http://www.seplan.ap.gov.br)

Pensando o acesso ao Estado, esteé feito prioritariamente por via aé-rea, o que confirma a origem distan-te dos viajantes que ali chegam, pro-vavelmente por razões profissionais(Quadro 7).

Com relação à origem dos turis-tas/visitantes brasileiros, os princi-pais estados emissores na região sãoo Pará e o próprio Amapá. Alem des-tes, o Estado do Amazonas aparecetambém nas estatísticas, o que pare-ce confirmar uma significativa cir-culação regional. (Quadro 8). Maschamam a atenção as elevadas esta-

tísticas de procedência do Rio de Ja-neiro e, principalmente, São Paulo,o que parece confirmar a hipótesedos negócios como motivação cen-tral para o deslocamento em direçãoao Amapá.

Com relação à origem dos turis-tas/visitantes estrangeiros (Quadro9), a procedência dominante é exata-mente dos franceses (de origem daGuiana francesa e do território cen-tral). Cabe lembrar ainda, que exis-

tem hoje vôos diretos e diários da AirFrance para Caiena e, algumas com-panhias regionais, de menor porte, jáoperam o circuito de cidades da Ama-zônia e do nordeste brasileiro direta-mente à Caiena e vice versa. E algu-mas tour operadoras já tem em seucardápio de ofertas, circuitos integra-dos entre o Brasil e a Guiana France-sa. Embora o fluxo entre os dois paí-ses já tenha caráter regular e sazonalestatísticas turísticas mais detalha-das são ainda incipientes11.

O Estado não dispõe de infraes-trutura turística significativa e osmeios de hospedagem são insufici-entes, em qualidade e quantidade

11 Durante a pesquisa, o Comitê de Turismo da Guiana em Paris informou que estava em curso aelaboração de um relatório técnico sobre o turismo regional mas não foi possível o acesso a estedocumento.

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para atender à demanda atual e qual-quer projeção futura. Não existe, nocontexto atual, uma rede efetiva deagências de viagem especializadaque possa dar suporte à visitação(Quadro 10). A pesquisa de campoindicou também que, embora asagencias existam nas estatísticas,elas tem baixa capacidade operacio-nal e de resposta, provavelmente emresposta a uma baixa demanda namaior parte do ano.

Na perspectiva do Governo doEstado do Amapá (2005), os parquesapenas recentemente foram incorpo-rados nos sites oficiais e nas estraté-gias de planejamento turístico. Maso Estado os divulga num conjuntode atrações envolvendo, entre ou-tras, a pororoca, o equinócio, o rioAmazonas, a Cachoeira Grande, aCachoeira de Santo Antônio , a Vilade Curiaú (área quilombola), o Mu-nicípio de Oiapoque e seus diversosdiversos atrativos e os diversos gru-pos e etnias indígenas (como osGalibi-Marwono,os Galibi do Oiapo-que, Juminã.

Em 2002, o PROECOTUR (Pro-grama de Ecoturismo da Amazônia)concluiu a Estratégia de Ecoturismopara o Estado do Amapá (MMA,2002), com base na interpretação dasinformações disponíveis para o Es-tado. O Relatório Final sistematizaa estratégia para o Estado12. A estra-tégia foi desenhada para uma abran-gência de 15 municípios, entre osquais Calçoene, Laranjal do Jarí,Oiapoque, Pedra Branca do Amapa-ri, e Serra do Navio. A estratégia pro-posta reconheceu e incluiu, portan-to, os cinco municípios do PNMT eseu entorno nas prioridades deli-

em Macapá, as minas abandonadasde manganês da Serra do Navio,alem do artesanato e da culinárialocal. No entanto, o relatório poucodetalha ou discute a influencia fran-cesa e a importância histórica da áreados parques nacionais como um va-lor agregado e valorização local dasestratégias regionais de turismo.

O relatório explicita claramentea limitação de infraestrutura turísti-ca, serviços e equipamentos comoum problema emergencial a serequacionado para o desenvolvimen-to do turismo no Estado. Na épocados levantamentos (2002), foramregistrados 39 equipamentos de hos-pedagem e, um total de 1.621 leitos.13

A maioria, muito simples, com até20 unidades habitacionais e admi-nistração familiar. Como equipa-mentos de alimentação, o relatórioquantificou 133 com oferta bastantelimitada.. No setor de entretenimen-to, a maior parte das alternativas estáconcentrada em Macapá. Segundo omesmo documento, a divulgação tu-rística e, os serviços, em geral, sãoprecários e, a maior parte está con-centrada em Macapá. Da mesma for-ma, o Estado é pouco conhecido pe-las agências de viagem nacionais einternacionais mas representa umproduto que, em geral, desperta ointeresse segundo a pesquisa reali-zada. O relatório propõe para o de-senvolvimento do turismo no Esta-do uma estratégia dirigida especifi-camente para a observação de fauna,em função da base de recursos reno-váveis de grande diversidade eabrangência, um roteiro para o mer-cado externo e cinco roteiros para omercado interno.

No entanto, para se pensar o tu-rismo regional, fortemente centradoem sua potencialidade natural e cul-tural, é fundamental que se contex-tualize o contexto do país e o tema,no âmbito de políticas públicas emcurso, também na esfera federal.Alem do PROECOTUR e do ARPA(Programa Áreas Protegidas para aAmazônia, que tendem a apoiar es-tratégias regionais integradas de

Quadro 10: Agências de viagem ins-taladas com registro na empresabrasileira de turismo - EMBRATUR– 1996-2001Fonte: Departamento de Turismo (http://www.seplan.ap.gov.br)

neadas para o turismo no Estado,mas ela não é clara sobre os encami-nhamentos futuros, a não ser pelaproposta de fortalecimento da infra-estrutura regional.

O relatório reafirma, também, aelevada potencialidade do Estadopara o ecoturismo. Alem da riquezaem recursos hídricos (Araguari, Jaríe Oiapoque e, principalmente o Ama-zonas e sua foz), a variedade de fisio-nomias vegetais e sua posição geo-gráfica (atravessada pela linha doEquador), o colocam em evidenciacomo potencialidade futura. É men-cionada também no documen-to, a importância do complexo siste-ma de áreas protegidas, federais eestaduais, entre as quais, a EstaçãoEcológica Maracá-Jipioca, a Reser-va Biológica do Lago Piratuba, a Es-tação Ecológica do Jarí, a FlorestaNacional do Amapá, a Reserva Ex-trativista do Rio Cajari, a ReservaBiológica do Parazinho, a ReservaBiológica da Fazendinha, a APA doRio Curiau, e a Reserva de Desen-volvimento Sustentável do Rio Irata-puru, alem dos parques nacionaisMontanhas de Tumucumaque eCabo Orange. Compõem também oconjunto as Reservas de PatrimônioNatural Seringal Triunfo, Ekinox,Lote Urbano, Retiro Boa Esperançae Retiro Paraíso. Assim, os PNMT ePNCO poderiam funcionar, no futu-ro, como áreas núcleo de ecoturismonuma perspectiva de circuitos inte-grados regionais, num mosaico com-plexo de áreas protegidas.

Segundo o relatório, o elevadograu de preservação da cultura lo-cal poderia também representar umdos pontos de maior interesse poten-cial para o turismo, como reflexo damiscigenação de hábitos e costumesao longo da história, entre negros,indígenas e ribeirinhos, expressosna culinária, na língua, no artesana-to e no modo de vida. Com este enfo-que alguns atrativos poderiam serpotencializados e integrados ao ro-teiro ecoturístico, como a Comuni-dade Negra Quilombola de Curiaú,a Fortaleza de São João e o Trapiche

12 Criado em 1998, com uma superfície territorial de 143.453,7 km2. e uma população de 457.843 habi-tantes em 2000 (IBGE, 2000), com crescimento populacional de 5,74% ao ano

13 Com maior concentração em Macapá, Santana e Oiapoque, a maioria, muito simples, com até 20 uni-dades habitacionais e administração familiar.

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conservação da biodiversidade euso sustentável de recursos renová-veis, está em fase de conclusão a re-visão das Diretrizes para a PolíticaNacional de Ecoturismo (EMBRA-TUR/IBAMA, 1994)14 como resulta-do de um esforço conjunto entre osministérios de Turismo e o de MeioAmbiente (MMA/Ministério do Tu-rismo, 2004 ).15

Uma importante inovação da re-visão das Diretrizes para a PolíticaNacional de Ecoturismo, se refere àcompreensão de que o Sistema Na-cional de Unidades de Conservação,criado pela Lei 9985/2000 (BRASIL,2000) representa um elemento cen-tral a ser inserido nas políticas deturismo. O documento identificou asseguintes estratégias para o plane-jamento do ecoturismo em âmbitonacional: a) Ordenamento, Normati-zação, Regulamentação e Monitora-mento; b) Informação e Comunica-ção; c) Articulação; d) Envolvimentoda Comunidade; e) Capacitação; f)Incentivos ao desenvolvimento doecoturismo; g) Infraestrutura; h) Pro-moção e Comercialização e; i) Uni-dades de Conservação. Da mesmaforma, encontra-se no Gabinete daCasa Civil para as providências ju-rídicas o Plano Nacional de ÁreasProtegidas com um forte compromis-so de articulação institucional, trans-versalidade e inclusão social. Assim,o ecoturismo no Estado do Amapápoderá se beneficiar, desde as eta-pas iniciais, de uma base de plane-jamento, também em articulação comas políticas do Governo Federal.

4. Turismo Sustentável: Umadiscussão possível no casoamazônico?O Brasil representa, no cenário e

nas estatísticas internacionais, ain-da um destino emergente, de impac-to reduzido nas estatísticas globais.No entanto, o fenômeno turísticoadquire um impacto progressivo naeconomia do país e se apresenta, nodiscurso político, como prioridadepara a inclusão social e para valori-zação do patrimônio natural, numanova perspectiva de desenvolvimen-to, que pretende sintonizar o cresci-mento econômico à conservação dosrecursos renováveis e à redução das

desigualdades sociais. Esta concep-ção parece representar um esforço nadireção da perspectiva global de sus-tentabilidade, cultivada a partir daRio 92, e que teve influencia direta naformulação do conceito de turismosustentável e, inspirou a Agenda 21do Turismo e do Código de Ética parao Turismo (IRVING, 2002 b).

Evidentemente que essa discus-são ganha, gradualmente, os espaçosdas políticas públicas, mas a expe-riência em planejamento turísticotem demostrado que, na verdade,existe uma enorme lacuna entre ateoria e a práxis e, as experiênciasconsideradas bem sucedidas, temabrangência ainda limitada e cará-ter experimental.

O planejamento turístico, de basesustentável, requer, por princípio,um compromisso ético, de respeito eengajamento de “quem está” e de“quem vem”, um intercâmbio realentre os sujeitos “que recebem” e osque “são recebidos” e, destes, com oambiente no qual interagem. Semesta interação harmoniosa, a trocade valores não se efetiva e o “espaçoda interação” ganha contornos ape-nas circunstanciais.

Essa afirmação é ilustrada commaior alcance quando se discute oturismo na região amazônica, degrande impacto no imaginário cole-tivo mas submetida a restrições só-cio econômicas e de acesso (em ter-mos logísticos e operacionais) e decusto.

No caso amazônico, “quem está”,atrai o imaginário coletivo, mas estáfreqüentemente excluído e distante desua própria autonomia, no processode tomada de decisão. E “quem vem”não parece ter ainda um rosto defi-nido, e representa, portanto, um “su-jeito oculto”, de motivações desco-nhecidas de uma realidade externaà região. Mas talvez chegue fascina-do pelo exótico amazônico que não

sabe definir, mas que precisa repro-duzir no seu cenário urbano, parapreencher as lacunas de seu cotidi-ano, na materialização do “mito mo-derno da natureza intocada” (DIE-GUES, 1996). Evidentemente que esteturista, que busca a Amazônia dis-tante como destino tem um perfilparticular que precisa ser interpre-tado, no momento em que estratégi-as turísticas para a região são dese-nhadas e/ou discutidas. Mas emque medida esse “sujeito oculto”, emtese, ávido por experiências enrique-cedoras e contato profundo com anatureza se diferencia dos “bandos”que invadem locais turísticos, e quedeles se apropriam e se afastam, coma mesma falta de cerimônia em quechegaram?

Elouard (1998) lança uma interes-sante questão sobre esse tema quemerece ser transposta para a refle-xão em foco. O autor questiona seexiste uma “arte de viajar”, que dis-tingue o turista cultivado solitárioou em pequenos grupos “do aventu-reiro ávido de “bons planos” ou “da-quele bando, de umas 50 cabeças”,que se beneficia de uma “super pro-moção”? Segundo Elouard (op. cit.)os “bandos” tendem a viajar, muitomais para confortar e reafirmar aopinião que tem de seu próprio mun-do do que para apreciar um outro.Assim, estes “permanecem” no lu-gar de origem, cultivam seus valo-res e querem reproduzir os mesmoshábitos, apesar do deslocamento queempreendem. Por outro lado, aque-les que se dispõem a enfrentar con-dições imprevisíveis de viagem e al-cançar a realidade distante comoforma de encontro com a alteridade,podem ser importantes parceirosnum processo de fortalecimento daidentidade local. Um tema portantoessencial a ser investigado para oplanejamento turístico local, se diri-ge ao perfil do turista (atual e proje-

14 O Plano Nacional de Turismo 2003/2007 é um instrumento essencial de políticas de turismo mas nãoserá detalhado nesta análise, de caráter mais regional.

15 A atualização das Diretrizes para a Política Nacional de Ecoturismo, que completou 10 anos em 2004, foio resultado de um esforço interinstitucional e envolveu vários segmentos da sociedade civil, governo,setor privado, pesquisadores e profissionais de turismo. O trabalho foi coordenado pelo Grupo temáticode Ecoturismo da Coordenação Geral de Segmentação, do Depto de Estruturação, Articulação eOrdenamento Turístico da Secretaria Nacional de Políticas de Turismo, do Ministério do Turismo, a partirde 5 oficinas, realizadas entre junho e novembro de 2004, em cinco regiões brasileiras, em parceria como Programa Nacional de Ecoturismo, da Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável-SDSdo MMA. O processo envolveu 206 profissionais.

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tado) numa projeção consistente decenários.

Além dos altos custos envolvidosnum deslocamento à Amazônia e àsdificuldades evidentes de acesso,que restringem e selecionam o perfildo turista, existe alguma estratégiade planejamento que garanta que oturismo à Amazônia poderá se con-figurar como uma alternativa sus-tentável e diferenciada?

Sob essa ótica, é essencial que seentenda a atração da Amazôniaconectada à leitura do exotismo tro-pical e da floresta virgem. SegundoQuella-Villéger (1998), o exotismorepresenta “a relação orientada doOcidente na direção do resto do glo-bo, a tensão do indivíduo face àheterogeneidade do mundo”. Assim,a Amazônia, para o turismo, tende-rá a resignificar num cenário aindadistante, o mito moderno da nature-za intocada, conforme a discussãode Diegues (1996).

Este parece ser o contexto de in-terpretação para os parques nacio-nais Montanhas de Tumucumaquee Cabo Orange, encravados numaregião “ultraperiférica”, em “efer-vescência silenciosa”, para os quaiso acesso é ainda limitado, mas que,ironicamente, situam-se em frontei-ra direta com a União Européia e seconfiguram como áreas protegidasestratégicas para a gestão da biodi-versidade global.

Embora o turismo não seja aindauma realidade na região, a base derecursos renováveis do Amapá (ne-les incluídos os parques nacionaisMontanhas de Tumucumaque e Ca-bo Orange) constitui, evidentemen-te, uma forte inspiração para rotei-ros integrados futuros, de grandepotencialidade para a região masque poderá atrair mercados emisso-res de fora do país, prioritariamenteeuropeus, numa conexão turísticadireta entre a Europa e a Amazônia.

Embora o desenvolvimento turís-tico na área dos parques e seu entor-no possa se configurar ainda comouma hipótese surrealista ou uma fic-ção, ela precisa ser interpretada soba ótica de território “em transe silen-cioso”, no qual será a cooperaçãocom a Guiana francesa e com oSuriname para a gestão da biodiver-

sidade e o desenvolvimento regional(incluindo circuitos integrados deturismo), a médio e longo prazos,essencial para qualquer estratégiagovernamental.

Embora os parques se insiram na“ultraperiferia” amazônica (MAS-TEAU, 1997), o cenário regional in-dica transformações evidentes noprocesso de desenvolvimento, deimpacto global, capazes de interfe-rir na lógica de uso e ocupação doespaço de fronteira e, assim, na pres-são sobre a base de recursos reno-váveis e, conseqüentemente, nos me-canismos de cooperação internacio-nal.

Esse “transe silencioso” é lento etende a escapar dos olhares desaten-tos das distantes metrópoles e cen-tros de decisão, o que torna a regiãoainda mais interessante como “labo-ratório” para a gestão da biodiversi-dade e o desenvolvimento regionalem área de fronteira, uma vez que osmecanismos para a proteção da na-tureza e inclusão social podem ser,em tese, discutidos e aprimoradosanteriormente à pressão das ativida-des humanas, que tende a ser cres-cente, pelo cenário observado. (IR-VING, 2005).

Ainda são incipientes as discus-sões no sentido de estratégias de co-operação internacional com os paí-ses vizinhos e o turismo ainda seconstitui em tema periférico em qual-quer fórum oficial. Nesse quadro, nãomenos flagrante é o distanciamentoainda evidente da pesquisa e daspolíticas públicas dirigidas à con-servação da biodiversidade e o de-senvolvimento entre os governosbrasileiro francês e, destes com oSuriname e a Guiana, ainda que arealidade socioeconômica e os ecos-sistemas extrapolem as fronteiraspolíticas.

No plano regional, a criação doParque Nacional do Sul da Guiana,em discussão há aproximadamente10 anos16 e, prevista para 2006 (NA-VET, 1998; CHARLES-DOMINIQUE,1998; FLEURY, 1998; LEPÊTRE,

1998; PREFECTURE DE LA RÉGIONGUYANE, 2003), em território contí-guo ao PNMT (confirmada, em dis-curso oficial do Presidente JacquesChirac, em Janeiro de 200517), poderepresentar um impulso nas estraté-gias regionais para a gestão da biodi-versidade e, conseqüentemente paraa cooperação Brasil-França.

Não é possível também desconsi-derar o diálogo direto entre o Estadodo Amapá e o Governo Regional daGuiana francesa. Alguns projetosocupam a pauta central de discus-sões e estão em real processo de ne-gociação e implementação, entre es-tes, a pavimentação integral do sis-tema viário que estabelece a ligaçãoentre Caiena e Macapá e, a constru-ção da ponte entre Saint Georges eOiapoque, interligando diretamen-te Brasil e Guiana Francesa. Em cur-so, encontra-se também a negocia-ção do Governo do Estado com a redeinternacional de hotéis Accor18, paraa construção de um hotel de alto ní-vel em Macapá, até 2006/2007, oque poderá favorecer a base para cir-cuitos turísticos regionais, envolven-do diretamente Caiena, Macapá eBelém e, num segundo plano, Ma-naus e as Antilhas. Este processopoderá ter ainda maior alcance como fortalecimento progressivo da BaseAeroespacial de Kouru, num cená-rio de aumento demográfico pro-gressivo e, o evidente crescimento davisitação turística e/ou de negóci-os, em ambos os lados da fronteira(MASTEAU, op. cit. e GOVERNO DOAMAPÁ, 2004).

Os parques nacionais de frontei-ra do Amapá representam a memó-ria histórica de um “território emtranse”, de elevada importância eco-lógica e geoestratégica.

Na perspectiva francesa, Barbault(1998) propõe uma ação e uma aber-tura para a cooperação com os paí-ses vizinhos, em especial o Brasil,para a pesquisa e a política de for-mação de recursos humanos, numcontexto amazônico global. O autorsugere também que o futuro Parque

16 Esse debate ilustra uma polêmica central no debate amazônico, que considera o confronto entre asperspectivas ecocêntrica e antropocêntrica na leitura da natureza.

17 Discurso proferido na Conferencia Internacional sobre Biodivesidade, Ciência e Governança (UNESCO)em Paris em 24 de janeiro de 2005.

18 Informação obtida em conversa com Alberto Gois em novembro de 2004.

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Nacional do Sul da Guiana funcio-ne como inspiração para uma Reser-va de Biosfera, o que viabilizaria aproteção da natureza e o uso susten-tável dos recursos renováveis.. UmaReserva de Biosfera transfronteiriça,poderia ter como núcleos o ParqueNacional Montanhas de Tumucu-maque e o futuro Parque Nacionaldo Sul da Guiana e, envolver os de-mais espaços protegidos da região,num exercício efetivo de cooperaçãobinacional.

No entanto, qualquer política decooperação regional deve conside-rar o Tratado de Cooperação Ama-zônico19, conforme também discuti-do por Brackelaire (1998) que advo-ga uma maior inserção da Guianano processo.20 Segundo o autor, atemática de conservação e gestão dabiodiversidade da Guiana se inserenum contexto regional muito maisamplo, no qual intervêm oito paísesamazônicos, vizinhos diretos ou in-diretos da Guiana Francesa, sendoo principal parceiro o Brasil, comfronteira comum de 655 km. Valelembrar que o Brasil é o país commaior extensão de fronteira diretacom a França.

Não menos significativo é o mo-mento político-institucional atual,em que França e Brasil se mobilizampara operacionalizar as suas políti-cas de biodiversidade e suas estra-tégias globais para a gestão dos es-paços protegidos, sendo que ambasas políticas se sustentam na lógicada gestão da biodiversidade com oenfoque de desenvolvimento regio-nal e uso sustentável dos recursosrenováveis. (IFB, 2003 a e 2003 b;BRASIL, 2000 a e b; BRASIL, 2002;IRVING, 2004 e MMA, 2004 b e c).Para os dois países, a oportunidadede intercambio cultural, de produ-ção científica conjunta, de inovação,de conhecimento compartilhado ede construção de um novo modelode cooperação internacional, basea-do no princípio de solidariedadeentre países, baseado numa perspec-tiva ética de desenvolvimento.

Nesse movimento possível, embusca da cooperação Brasil-França,alguns avanços político-institucio-nais estão em curso. Além de umabase legal formal e histórica entre os

dois países21, para a área temáticade gestão da biodiversidade e desen-volvimento sustentável, foi assina-do entre o Ministério de Meio Ambi-ente do Brasil e o Ministério de Eco-logia e do Desenvolvimento Susten-tável da França um Memorando deEntendimento, em outubro de 2004(MMA, 2004 c) buscando, entre ou-tros objetivos, cooperar em projetosambientais e de desenvolvimentosustentável ajustados às demandase prioridades políticas de meio am-biente dos dois países e, em especial,na região de fronteira Guiana fran-cesa/Amapá, no sentido de fortale-cimento das ações de cooperação re-gional.

Como desdobramentos deste Me-morando de Entendimento, foram re-alizadas reuniões oficiais entre osdois países em Brasília (abril de 2005),Macapá (Novembro de 2005) e Caie-na (dezembro de 2005), que geraramcomo resultado as bases de um Pla-no de Ação, em quatro temas priori-tários: Articulação político-institucio-nal, fiscalização, pesquisa e desen-volvimento local. Com relação ao de-senvolvimento local, encontra-se emfase de elaboração um projeto conjun-to de desenvolvimento turístico entreo Parque Natural Regional da Guia-na francesa e o Parque Nacional doCabo Orange como primeira iniciati-va com este objetivo.

No entanto, o turismo regional sópoderá ser competitivo, no planointernacional e, inclusivo, no cená-rio local, se estiver associado a umdiferencial de qualidade social e am-biental, tendo como marca a coope-ração Brasil-França e toda a sua sig-nificação cultural e identitária nocontexto amazônico. Sem este resga-te e a percepção do valor geoestraté-gico regional, o desenvolvimentoturístico tenderá a reproduzir osmodelos do exotismo tropical, nosquais os compromissos de inclusãosocial estão no discurso mas rara-

mente se materializam na prática.Nesta perspectiva, o valor agregadoem planejamento se expressa pelofato de que a potencialidade turísti-ca da região não responde ainda ainvestimentos em infraestrutura decurto prazo, e tende a se consolidarcomo alternativa de desenvolvimen-to apenas a médio e longo prazos, oque poderá contribuir para a possi-bilidade de capacitação local e es-tratégias diversificadas de desenvol-vimento local, nas quais o turismorepresenta apenas uma das possibi-lidades.

Neste cenário real entre o surrea-lismo e a invenção, o turismo emer-ge como potencialidade futura,numa nova perspectiva de integra-ção regional com base na valoriza-ção de patrimônio natural e cultu-ral, e como mecanismos possível deconstrução de cidadania global.

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19 Tratado estabelecido em 1978, envolvendo oito países amazônicos, tendo como um dos seus prin-cípios a afirmação e a defesa da soberania de cada um dos países membros para a gestão e uso dosrecursos naturais, neles compreendida a floresta amazônica.

20 Apenas recentemente está em discussão o status da França como país observador no Tratado deCooperação Amazônico.

21 Esse quadro legal e institucional é bastante consistente e já data de mais de 35 anos, a partir doDecreto No. 63.404 de 10 de outubro de 1968 que promulga o Acordo Básico de Cooperação Téc-nica e Científica com a França, apoiado no Acordo Quadro de 28 de maio de 1996.

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Departamento de Ciências Sociais AplicadasPROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EMDESENVOLVIMENTO REGIONAL E URBANO

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ResumoEste artigo procura discutir a real

contribuição do ecoturismo para odesenvolvimento local e a conserva-ção do patrimônio natural em espa-ços naturais protegidos, através daanálise dos resultados de algunsestudos realizados em alguns dosmais conhecidos “destinos verdes”da atualidade.Palavras-Chave: Ecoturismo, Desen-volvimento Local, Conservação daNatureza, Unidades de Conservação.

AbstractThis paper proposes an analysis

of the real contribution of ecotourismto local development and natureconservancy in protected areas, thruthe analysis of the experiences ofsome of the most known green desti-nies of nowadays.

Key Words: Ecotourism, Local Deve-lopment, Nature Conservancy, Pro-tected Areas.

As unidades de conservação têmse firmado como os espaços ideais elegítimos para a prática do ecoturis-mo nas últimas décadas. Isso ocor-reu, em parte por serem os espaçosque concentram a maior variedadede atrativos naturais relevantes ebiomas/espécies animais preserva-das, ao mesmo tempo em que sãoconsideradas o lócus de uma explo-ração sustentável da atividade, ten-do em vista a existência de um apa-rato legal e administrativo que, aomenos teoricamente, assegura limi-tes à sua utilização.

No âmbito desses espaços, a dis-cussão sobre o binômio ecoturismo/

O ECOTURISMO, O DESENVOLVIMENTO LOCALE A CONSERVAÇÃO DA NATUREZA EM ESPAÇOS

NATURAIS PROTEGIDOS: OBJETIVOSCONFLITANTES?

Carolina de Andrade Spinola1

desenvolvimento local introduz al-guns aspectos específicos, relaciona-dos com a sua condição de unida-des de conservação: a concentraçãomassiva de oferta complementar efluxos de demanda intensos concor-rendo com os usos tradicionais e his-tóricos da área; a existência de res-trições, em maior ou menor escala, àsua utilização, por atividades eco-nômicas e populações autóctones;os conflitos institucionais relaciona-dos com a sua administração e anecessidade de conhecimentos técni-cos específicos de manejo que asse-gurem a sua sustentabilidade.

Outro questionamento importan-te para se fazer nesse momento é aquem beneficia o desenvolvimentodo ecoturismo em espaços protegi-dos. Aos próprios espaços e seu patri-mônio natural? Às comunidades au-tóctones? Ao governo central? Aosturistas? ou aos mercados emisso-res, através do recebimento de partedas receitas de sua operação?

O presente artigo pretende, a par-tir da análise das experiências dealguns destinos ecoturísticos consa-grados, responder a essas indaga-ções. De início, far-se-á uma análisedas possíveis interações entre ecotu-rismo e Unidades de Conservação,considerando seus aspectos econô-micos, ecológicos e sócio-culturais.Em seguida, introduz-se uma dis-cussão muito controversa no tocan-te à questão da busca pelo desenvol-vimento local nesses espaços: o pa-pel das populações tradicionais. Por

fim, relacionando todos os elemen-tos levantados, e à luz das da defini-ção de desenvolvimento local sus-tentável, analisar-se-á quem são osgrandes ganhadores e perdedoresdesse processo e possíveis alternati-vas de mudança nesse cenário.

Custos e benefícios do turismoem Unidades de Conservação

Não são numerosos os estudossobre o impacto do ecoturismo noambiente específico das unidades deconservação. Normalmente, os tra-balhos que objetivam analisar asexternalidades da atividade o fazemde uma maneira geral, abrangendomais elementos do que aqueles pre-sentes em espaços protegidos. Poroutro lado, os estudos relativos aunidades de conservação tratam detodos os tipos de ameaças decorren-tes do uso econômico da área, inclu-sive o ecoturismo. Da interrelaçãoentre essas temáticas e consulta apublicações da OMT, obteve-se oelenco das variáveis abordadas nes-sa seção.

Diferentemente da análise que écomumente feita em relação ao tu-rismo convencional, o estudo dosimpactos do ecoturismo em Unida-des de Conservação deixa para umsegundo plano as implicações deordem econômica e social, se concen-trando no levantamento e monitora-mento de externalidades negativas,relacionadas com variáveis ambien-tais a exemplo de vegetação, fauna,solo e recursos hídricos. (MORSEL-

1 Doutora em Geografia (Concentração em Análise Territorial e Planejamento do Turismo) pela Uni-versidade de Barcelona – ES. Professora titular do curso de Turismo da Universidade Salvador –Unifacs; das Faculdades Jorge Amado e da Faculdade Castro Alves.

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LO, 2001, MATHIESON;WALL,1990; OMT,1992; PAGANI et al.,1999; THORSELL, 1984; SERRANO,2001). Os principais impactos nega-tivos listados na bibliografia de re-ferência podem ser melhor visuali-zados no quadro 1.

A vegetação é um dos atrativosprincipais de muitas unidades deconservação e, apesar de se consti-tuir em um recurso turístico primá-rio, quase todas as atividades recrea-cionais desenvolvidas pelos visitan-tes trazem algum tipo de impacto so-bre ela, como mudança na quantida-de e variedade de espécies, índicesde crescimento e estrutura cronológi-ca e diversidade de habitats.

Em relação à utilização de madei-ra por campistas e em construções

turísticas, Wall e Wright (1977) des-tacam o perigo que essa prática podetrazer para a sobrevivência de bos-ques e florestas que têm árvores mui-to jovens arrancadas e não repostas.Lindberg e Hawkings (1993) conta-bilizaram que, no Nepal, uma expe-dição padrão de 2 semanas gasta 8mil Kg de madeira enquanto na la-reira convencional das casas, gasta-se 5 mil Kg/ano.

Os incêndios verificados nasUC´s devem-se, em sua maioria, aações outras que a prática de ativi-dades recreacionais mas, não sepode ignorar o perigo representadopelas fogueiras de acampamentoacendidas em locais inapropriadose de maneira inadequada ou o danoque pode ser causado por restos de

cigarros displicentemente jogadosem áreas cuja vegetação seja muitoseca. Mathieson e Wall (1993) des-tacam esses como alguns dos fato-res responsáveis pelos incêndios emparques da Califórnia e Austrália.

A exclusão de vegetação podeatingir, além da madeira, outras for-mas de extração vegetal como a ex-ploração de frutos, plantas medici-nais, ornamentais, forrageiras, fo-lhas, bambus e fungos. Essa açãopode ser atribuída à comunidadelocal ou ao turista, que, direta ou in-diretamente colabora para a perma-nência do problema, colhendo “mu-das” de plantas ou alimentando ocomércio de artesanato elaboradocom base nesses materiais. Uma boaforma de resolver essa questão é atra-

Quadro 1 – Principais impactos ambientais negativos gerados pelo turismo em unidades de conservaçãoFonte: Autores referenciados. Elaboração própria.

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vés da criação de reservas extrativis-tas e regulamentação da exploraçãovegetal, restringindo-a àquelas espé-cies que podem se regenerar e deter-minando quotas máximas e períodosem que a atividade é permitida.

Embora aconteça em uma escalainfinitamente inferior à exclusão, aintrodução de espécies exógenastambém é um problema que pode re-sultar em desequilíbrio do ecossis-tema e aflige os administradores deunidades de conservação. Morsello(2001) destaca que dentre as espéci-es vegetais sob perigo de extinção,18% são ameaçadas por espécies in-vasoras. A autora alerta para o casoespecífico das ilhas, ambientes iso-lados em que os efeitos danosos daintrodução de novas espécies podemser desastrosos. Esse é o caso do ar-quipélago de Galápagos, em cujoparque nacional, o zoneamento im-pede a visitação da maioria das ilhasdesabitadas, onde a introdução deespécies exógenas seria capaz depôr em risco as espécies endêmicassingulares do local, que evoluíramcom tão poucas ameaças e propor-cionaram a Darwin o cenário idealpara o desenvolvimento de sua teo-ria sobre a evolução das espécies. Aadministração do parque já pensaem medidas para evitar esse proble-ma, através do estabelecimento dequarentena para as mercadorias quechegam e inspeção de passageiros,inclusive com a descontaminaçãodos seus sapatos. (WALLACE, 1993)

Finalmente, ainda relativo à ve-getação, o pisoteio das raízes e utili-zação do tronco das àrvores comoapoio nas passagens mais difíceisdas trilhas são procedimentos mui-tas vezes recomendados pelos gui-as mas, que ameaçam a sobrevivên-cia desses indivíduos. Westhoff(1967 apud WHELAN, 1991 ) cons-tatou esse fato estudando as se-quóias da Califórnia.

O lixo é um outro fator que, alémdo aspecto estético desagradável eda atração que exerce sobre insetose roedores, contribui para a altera-ção da estrutura do solo, bloquean-do a passagem da luz e do ar. Glick(1991) e Whelan (1991) alertam paraos prejuízos causados pelo lixo dei-xado pelos visitantes no ParqueNacional de Yellowstone2:

Os gêiseres Minute e Ebony, na baseNorri, no Parque de Yellowstone,cessaram suas erupções porcausado lixo depositado em suas bocas(GLICK, 1991, p. 65).

A remoção de fauna, assim comoacontece com a exclusão de vegeta-ção, é uma externalidade para a qualcontribuem principalmente os mora-dores locais, estimulados pelo valoratribuído a esses animais pelos visi-tantes. Em uma pequena parcela doscasos, pode-se falar em atividadesde caça e pesca realizadas pelos tu-ristas, notadamente nas reservas daÁfrica, de maneira clandestina, masé adquirindo artesanato e consumin-do pratos típicos elaborados com es-ses animais, que o seu impacto émaior. Em Fernando de Noronha, noBrasil, a caça aos tubarões foi incre-mentada com o objetivo de extrair asua cartilagem para a produção debijouterias. No Caribe, os visitantescompram jóias feitas com coral ne-gro e outros espécimes raros. (WHE-LAN, 1991).

Os turistas também interferem nadinâmica social das espécies animaise, em alguns casos chegam até a alte-rar os seus hábitos alimentares Amaioria dos relatos a respeito dessainteração turistas x fauna silvestrereferem-se a exemplos africanos enorte americanos, onde o efeito davisitação já é perceptível principal-mente no comportamento de grandespredadores. Gray (1973) ressalta, porexemplo, que o interesse dos turistasque fazem safári nos parques africa-nos em observar o momento da cap-tura de uma presa por um predador,ao mesmo tempo que se constitui noauge da experiência para o visitante,mina a privacidade dos animais ob-servados e frustra seu intento. Olindo(1991) também alerta para o impactodos balonistas sobre as manadas deelefantes do Parque Nacional doSerengeti; Glick (1991) relata a mu-dança no comportamento dos coiotes,que ficaram mais agressivos após seacostumarem a ser alimentados pe-los visitantes. O mesmo efeito foi per-cebido por Whelan (1991) com os ur-sos de Yellowstone.

No que diz respeito à poluição daágua, engloba-se nesse item o des-pejo de esgotos de empreendimen-tos turísticos em rios e mares, a con-taminação da água pelo combustí-vel de veículos de passeio como jet-skis, lanchas, etc; e, menos citadosmas, igualmente preocupantes, odano de longo prazo causado pelacontaminação de riachos e córregospela gordura dos utensílios domés-ticos lavados em água corrente pe-los campistas e por dejetos humanosdepositados inapropriadamente.Glick (1991) revela que esse é maisum dos problemas vivenciados peloParque de Yellowstone, onde já seconstatou a presença de parasitasdo tipo giárdia nas águas dos lagos.

Há também outros tipos de po-luição que não são citados por to-dos os autores como a poluição vi-sual e auditiva lembrada por Ma-thieson e Wall (1990). Elas se dão,principalmente, através da utiliza-ção de letreiros, luminosos e/ouconstruções pintadas com coreschamativas e, no segundo caso, atra-vés do comportamento descompro-missado dos visitantes e de algunsagentes da oferta que recorrem a apa-relhos de som e não se preocupamem manter um mínimo de silênciodurante passeios a áreas mais isola-das das UC´s.

Quando se procura listar as con-seqüências positivas oriundas daexploração da atividade, encontra-se sempre uma argumentação decunho econômico, que justifica a suaexistência em função dos ganhosobtidos pelas reservas e pelas comu-nidades. Raramente se discute sobrebenefícios ambientais que, emboramenos freqüentes do que os impac-tos apresentados, podem ter alcan-ce considerável em um contexto dedesenvolvimento planejado. Basica-mente, pode-se trabalhar com doisaspectos mais genéricos que são: a)os visitantes ajudam no processo desensibilização política e social paraa criação de leis e atração de investi-mentos que protejam esses espaços;b) o ecoturismo praticado dentro dosseus imperativos éticos contribui

2 “Minute and Ebony geysers, at Norris Geyser Basin in Yallowstone Park, have ceassed erupting becauseof litter carelessly tossed in their mouths” (tradução própria).

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para a melhoria da consciência am-biental de visitantes e moradores.Parte-se do pressuposto de que só sevaloriza aquilo que se conhece e,nesse caso, o ecoturismo pode pas-sar da posição de ameaça para a deinstrumento de conservação.3

Os argumentos econômicos a fa-vor do ecoturismo são inúmeros,bastante freqüentes em qualquerobra sobre o assunto e se resumemna possibilidade de auto-financia-mento que a atividade traz para asUC´s, aliada à melhoria da qualida-de de vida da comunidade local, queterá mais oportunidades de empre-go e renda.

Essa apologia aos benefícios eco-nômicos do turismo, ou do ecoturis-mo, não é novidade e, como já foiobjeto de inúmeros outros trabalhos,não tomará muito espaço desse arti-go. Mas, todavia, faz-se necessárioapresentar algumas experiências deespaços protegidos que reforçam oprimeiro argumento e demonstramque a melhoria da qualidade de vidadas comunidades locais está longede ser resolvida mediante um sim-ples aumento do fluxo de visitantese da arrecadação das UC´s.

Um dos maiores problemas en-frentados pelas UC´s e pelas econo-mias locais é a centralização dasoperações turísticas em mãos de em-presas estrangeiras que, preocupa-das com a qualidade de seus servi-ços e a maximização dos seus lucros,subutilizam os recursos produtivoslocais e, como conseqüência, têm umimpacto econômico bem menos re-presentativo do que se costuma con-siderar.

No Nepal, onde os locais hospe-dam os caminhantes, apenas US$0,20 dos US$ 3,00 gastos diariamen-te pelos turistas ficam com as comu-nidades. De acordo com o autor, oproblema maior são as operadorasestrangeiras que trazem seus supri-mentos e guias e contratam poucosnativos para guiar seus grupos(PUNTENNEY, 1990 apud WHE-LAN, 1991).

Das 32 operadoras de ecoturismobaseadas nos Estados Unidos (41%do total), 20 usavam guias locais;apenas 8 utilizavam agências ougerentes locais, 6 usavam cozinhei-

ros e 8 usavam motoristas da pró-pria comunidade. Das 20 que alega-ram usar guias locais, a maioria ostrazia de grandes cidades (IN-GRAM; DURST,1987 apud WHE-LAN, 1991).

Para Whelan (1991), um outroproblema relevante é a distribuiçãodos recursos que ficam no país coma atividade:

A economia nacional dos paísesreceptores normalmente são maisbeneficiadas do que as economiaslocais; um estudo concluiu que pelomenos 50% dos gastos dos turis-tas nos países em desenvolvimen-to ficam nesses países [...] entre-tanto, é pouco comum encontraressas receitas canalizadas de vol-ta para as comunidades locais ou,até mesmo, para o manejo das áre-as protegidas que geraram essa re-ceita4 (WHELAN, 1991, p. 10).

É o que também constata Olindo(1991) em relação aos Parques Naci-onais do Quênia. Segundo o autor,em 1990, apenas US$ 7 milhões, dosUS$ 350 milhões arrecadados com aatividade foram direcionados parao sistema de parques.

A baixa repercussão econômicaverificada nos casos relatados sedeve, também, à existência de pro-blemas relacionados com os altosníveis de corrupção e desorganiza-ção das estruturas administrativasdesses espaços. Não é incomum quea gestão dos recursos arrecadadoscom a atividade fique centralizadaem algum órgão burocrático, fre-qüentemente da administração fede-ral, sobrecarregado com outras atri-buições e/ou prioridades, o que qua-se sempre resulta no direcionamentoda receita para fins outros que não aconservação da UC. Muitas vezes, odinheiro arrecadado em uma unida-de mais lucrativa é dividido comoutros espaços protegidos, em umsistema de rateio nem sempre justo,como acontece em Galápagos:

Embora a administração do Par-que Nacional de Galápagos dispo-nha de mais recursos do que ou-tros parques do Equador, essesrecursos são ainda muito modes-tos e limitam o investimento noquadro de funcionários, treina-mento, equipamentos e infra-estru-tura. A receita gerada com a co-brança de ingressos de 40 dólarespagos por turistas estrangeiros,bem como as taxas pagas pelos vi-sitantes equatorianos e pelos ope-radores turísticos, ajuda a financi-ar outras áreas protegidas do Equa-dor. (WALLACE, 1993, p. 100).

Finalmente, a despeito de serembastante discretos e muitas vezesestarem mascarados sob o argumen-to de que são uma conseqüência ine-vitável em um ambiente onde a pre-sença do homem não é desejada e/ou permitida, os impactos sócio-cul-turais somam-se às repercussõeselencadas nesse capítulo e, ao mes-mo tempo em que vitimam as comu-nidades autóctones, podem servir deestopim para deflagrar um movi-mento de reação desses moradoresà implantação e conservação da UC.

Aspecto muito pouco exploradona bibliografia consultada, os impac-tos sócio-econômicos são citadossempre sob a ótica das ameaças re-presentadas pela presença de popu-lações no interior dos espaços pro-tegidos, enquanto que muito rara-mente, como no caso do trabalho daOMT(1992) e o de Diegues (1998) arelação inversa é destacada. Generi-camente, considera-se que as comu-nidades locais são beneficiadas coma criação de infra-estruturas básicase equipamentos de lazer, além depoderem desfrutar do intercâmbiocultural proporcionado pelo conta-to com pessoas diferentes, inclusiveprovenientes de outros países.

A análise das interações que seestabelecem entre comunidade au-tóctone e os meios físico e biótico dosespaços protegidos implica em uma

3 Exemplos de casos em que o ecoturismo tenha contribuído para a mudança de conduta da comu-nidade podem ser encontrados na seção 3.3.2.

4 The national economy of the host country is likely to do substantially better than the local economy;one study found that at least 50 percent of tourist expenditures in developing countries are likely tostay in the country (…) however, it is unusual to find those receipts channeled back to the localcommunities or even to the management of the protected areas that generated the income. (Tradu-ção Própria).

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discussão mais profunda e polêmi-ca, que envolve questões éticas, so-ciológicas e jurídicas, onde a suaprópria existência e permanênciasão contestadas, conforme será abor-dado em seguida.

As comunidades autóctones eo fenômeno turístico em Uni-dades de Conservação

A presença humana causa impac-tos, quase sempre negativos, fato quejustifica e fundamenta os argumen-tos contrários à permanência de co-munidades autóctones dentro de es-paços protegidos.

Sabe-se que o objetivo das áreasprotegidas, notadamente aquelasdenominadas de proteção integral5

é a preservação de atributos ecológi-cos importantes, através da criaçãode redomas ou ilhas, onde a nature-za pode permanecer intocada, lon-ge da ação devastadora do homem.Essa concepção, conforme analisa-do anteriormente, surgiu com a cria-ção dos primeiros parques nacionaisamericanos e se expandiu pelo mun-do, tendo influenciado a classifica-ção das categorias de UC´s existen-tes atualmente, quer seja no âmbitointernacional ou no contexto do Sis-tema Nacional de Unidades de Con-servação (SNUC) brasileiro.

Esse entendimento da relaçãohomem x natureza leva ao que a an-tropóloga Debra Bird Rose (apudMERCER, 2001) diz ser a “ encruzi-lhada dramática e lesiva” a que oshumanos chegaram como espécie, aoenxergar-se como elemento estranhoao meio-ambiente. De acordo comMercer (2001), ela se opõe a essa vi-são antagônica entre direitos huma-nos e ecológicos:

uma oposição que, em última ins-tância, é fatal tanto para o planetaquanto para a espécie humana. Amensagem rude de Bird é que nãotemos escolha senão atentar paraa “sabedoria dos antigos” e pres-tar muita atenção às percepçõesdas populações nativas sobre ofuncionamento e o papel dos ecos-sistemas (MERCER, 2001, p.119).

Diegues (1998) lembra que essemodelo de parques nacionais semmoradores para a preservação davida selvagem sofreu duras críticas

tanto dentro como fora dos EstadosUnidos, provenientes de correntesantropocêntricas, que defendem aconsideração do elemento humanoe ecocêntricas, como no caso do filó-sofo Baird Callicot (1991 apud DIE-GUES, 1998) que alertava para a im-portância das populações humanastradicionais do Terceiro Mundo naconservação da natureza.

De fato, quando se analisa as re-lações de conflito e simbiose entre ohomem e a natureza, em um contex-to de uma unidade de conservação,ignora-se, com muita freqüência, queessa presença humana está compos-ta por grupos diversos de pessoas,com interesses e costumes diferen-ciados. Pádua (1996) elenca a exis-tência de dois grupos: as populaçõespermanentes e transitórias que, porsua vez, subdividem-se em popula-ções indígenas, populações tradicio-nais, caçadores, extrativistas, cabo-clos, madeireiros, agricultores, ga-rimpeiros, mineradores, fazendeiros,população urbana, caçadores, gran-des pescadores, comerciantes, mis-sões religiosas, sem-terra, turistas epesquisadores. Segundo a autora,“há gente e gente”, ou seja, deve-seconsiderar que há aqueles que nãoconcorrem e, até mesmo impedem oobjetivo da conservação enquanto,outros, notadamente as populaçõesconsideradas tradicionais, que po-dem vir a se transformar em aliadasefetivas das administrações das UC´s.

Nesse contexto da discussão so-bre a importância das chamadaspopulações tradicionais, é funda-mental que se delimite a naturezadesse grupo de pessoas e que se asdiferencie dos demais habitantes dosespaços protegidos. As populaçõesconsideradas tradicionais se carac-terizam por:a) dependência e até simbiose com a

natureza, os ciclos naturais e osrecursos naturais renováveis apartir dos quais se constrói ummodo de vida;

b) conhecimento aprofundado danatureza e dos seus ciclos que sereflete na elaboração de estratégi-as de uso e manejo dos recursosnaturais. Esse conhecimento é

transferido de geração em geraçãopor via oral;

c) noção de território ou espaçoonde o grupo social se reproduzeconômica e socialmente;

d) moradia e ocupação desse territó-rio por várias gerações, ainda quealguns membros individuais pos-sam ter se deslocado para os cen-tros urbanos e voltado para a ter-ra dos seus antepassados;

e) importância das atividades desubsistência, ainda que a produ-ção de mercadorias possa estarmais ou menos desenvolvida, oque implica em uma relação como mercado;

f) reduzida acumulação de capital;g) importância dada à unidade fami-

liar, doméstica ou comunal e às re-lações de parentesco ou compadriopara o exercício das atividades eco-nômicas, sociais e culturais;

h) importância das simbologias, mi-tos e rituais associados à caça, àpesca e a atividades extrativistas;

i) a tecnologia utilizada é relativa-mente simples, de impacto limita-do sobre o meio-ambiente. Há re-duzida divisão técnica e social dotrabalho, sobressaindo o artesa-nal, cujo produtor (e sua família)domina o processo de trabalho atéo produto final;

j) fraco poder político, que em geralreside com os grupos de poder doscentros urbanos;

k) auto-identificação ou identifica-ção pelos outros de se pertencer auma cultura distinta das outras.

A crença de que as populações tra-dicionais podem se classificadas emuma outra categoria de análise quan-do se questiona a presença de mora-dores em espaços protegidos reside,principalmente, nas característicasa,b,h e i, listadas acima, refletidas nasatividades do fazer, do conhecer, dastécnicas patrimoniais e do camposimbólico dessas comunidades. Oconvívio das populações tradicionaiscom o meio-ambiente é consideradode mais baixo impacto e, até mesmo,benéfico para os objetivos da conser-vação, como reforça Diegues, enfati-zando a sua natureza:

5 Denominação utilizada no Brasil para designar as UC´s de uso mais restrito, como os parques nacionais.

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a simbiose entre homem e nature-za é muito mais evidente nas soci-edades indígenas brasileiras, porexemplo, em que o tempo parapescar, caçar e plantar é marcadopor mitos ancestrais, pelo apareci-mento de constelações estelares nocéu, por proibições e interdições.(...) Nesse sentido é importanteanalisar o sistema de representa-ções, símbolos e mitos que essaspopulações tradicionais constro-em, pois é com base nele que elasagem sobre o meio. (...) O imagi-nário popular dos povos da flo-resta , dos rios e dos lagos brasilei-ros, está repleto de entes mágicosque castigam os que destroem asflorestas (caipira, caipora, mãe damata, boitatá); os que maltratamos animais da mata (anhangá); osque matam os animais em épocade reprodução (tapiora), os quepescam mais do que o necessário(mãe d´água) (1998: p.92).

ora, grande parte das florestas tro-picais e outros ecossistemas aindanão destruídos pela invasão capi-talista é, em grande parte, habita-da por tipos de sociedades dife-rentes das industrializadas, isto é,por sociedades extrativistas, ribei-rinhos, grupos e nações indígenas.Muitas delas ainda não foram to-talmente incorporadas à lógica dolucro e do mercado, organizandoparcela considerável de sua pro-dução em torno da auto-subsis-tência. Sua relação com a nature-za, em muitos casos, é de verda-deira simbiose, e o uso dos recur-sos naturais só pode ser entendidodentro de uma lógica mais amplade reprodução social e cultural,distinta da existente na sociedadecapitalista (DIEGUES, 1998: p.79).

E continua mais adiante:

mas ainda mais importante, e me-nos reconhecido, o modo de vidasustentável nessas áreas de flores-tas e pobres em recursos é uma sal-vaguarda política contra a pilha-gem e degradação pelos interesseseconômicos comerciais e contra osricos. Ao contrário do preconceitoprofissional popular, há evidênciacrescente que quando as popula-ções pobres têm assegurados seusdireitos à terra e a uma quantida-de suficiente de bens para cobriros imprevistos, elas tendem a teruma visão de longo prazo, agar-rando-se tenazmente à terra, pro-tegendo e salvando árvores, asse-gurando-as para seus descenden-

tes. Nesse sentido, sua perspecti-va temporal é mais longa que a dosinteresses comerciais, que visamsomente os lucros do capital a cur-to prazo (CHAMBERS, 1987 apudDIEGUES, 1998, p.95).

Até mesmo nos Estados Unidos,como comentado anteriormente,sabe-se, hoje, que os parques nacio-nais não foram implantados emáreas despovoadas. Yellowstone, porexemplo, foi criado no território dosíndios Crow, Blackfeet e Shoshone-Bannock, estes últimos vivendo du-rante todo o ano dentro dos limitesatuais do parque. A necessidade desair do parque nunca chegou a sercompreendida pelos índios rema-nescentes, como fica claro nas pala-vras do chefe Standing Bear, da triboSioux:

nós não consideramos selvagens asvastas planícies abertas, os mara-vilhosos montes ondulados, as tor-rentes sinuosas. Somente para ohomem branco a natureza é selva-gem, mas, para nós, ela é domesti-cada. A terra não tinha cercas e erarodeada pelas bênçãos do GrandeMistério. (MCLUHAN, 1971 apudDIEGUES, 1998, p.28).

Nos tempos atuais, a importân-cia da discussão dessa questão sedesloca para os países menos desen-volvidos, onde vastas áreas deecossistemas relevantes são ocupa-das por habitantes fixos. Morselo(2001) estima que 50% das áreas pro-tegidas do mundo sejam habitadase, que na América do Sul, essa parti-cipação chegue a 86%. Estudo reali-zado pelo Nupaub (VIANA et al,1995) constatou que 83% dos par-ques nacionais implantados nos es-tados do Paraná, São Paulo, Espíri-to Santo e Rio de Janeiro possuemmoradores em seu interior. De acor-do com o Ibama (1997) essa partici-pação é menor, embora igualmentepreocupante, com 51% dos parquesnacionais, 265 das reservas biológi-cas e 28% das estações ecológicashabitadas. Apesar de não se disporde dados estatísticos precisos e maisrecentes, sabe-se que esse quadro épreocupante no País.

A consideração da natureza ma-nos impactante dessas comunida-

des tem levado à construção de al-gumas propostas que cogitam sobrea possibilidade da sua permanên-cia em suas moradias, desde queobserve-se o que Bailey (1992) deno-mina de o estereótipo do “bom sel-vagem”, partindo do pressuposto deque essas comunidades devem per-manecer imutáveis, alheias aos acon-tecimentos e transformações exter-nas, principalmente no que se refereà sua relação com os recursos natu-rais.

Freqüentemente se permite que aspopulações nativas (indigenous)permaneçam nas áreas protegidasdesde que continuem “tradicio-nais” (...) (muitas vezes para au-mentar seu valor turístico) enquan-to o resto do mundo se transfor-ma. A política de manejo para asreservas deve ser suficientementegeral e flexível para permitir varia-ções nos estilos administrativos emrelação aos grupos locais ao longodo tempo (BAILEY, 1992 apudDIEGUES, 1998, p.96).

Além de reprovável eticamente,visto que interfere em direitos fun-damentais dos seres humanos e re-duz essas comunidades a um papelquase inanimado de atrativo turísti-co, essa condição é absurda pelaimpossibilidade de se evitar o inevi-tável. Como manter as populaçõestradicionais vivendo sob condiçõesancestrais, sem conforto e acesso àsinformações, ao mesmo tempo emque se fomenta a sua exposição aopúblico visitante e, conseqüentemen-te a modos de vida bastante diferen-tes dos seus? A propósito desse fato,inclusive, é pertinente ressaltar quepara muitos moradores de espaçosprotegidos não é compreensível queo local possa ser visitado por foras-teiros e que a comunidade, muitasvezes estabelecida há gerações, te-nha que se retirar.

Quando uma unidade de conser-vação é criada sem o suporte dascomunidades que habitam o seu in-terior e as áreas vizinhas, o objetivoda conservação e o próprio ecoturis-mo estão fadados ao fracasso. Exem-plos dessa afirmação infelizmentesão bastante comuns, em paísescomo a Índia, Costa Rica e Quênia,para não se falar apenas do Brasil.

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Whelan (1991) cita o caso do Pro-jeto Tigre, na Índia, onde os parquesnacionais foram criados sem envol-ver os membros da comunidade esem oferecer-lhes opções econômicasque substituíssem o corte da madei-ra e a criação de gado. Como respos-ta, essas duas atividades econômi-cas nunca puderam ser extintas,continuando a existir dentro da áreado parque, ameaçando o projeto. Omesmo autor relata que, na CostaRica, há casos de incêndios e derru-bada de árvores causados pelos vi-zinhos e moradores que não foramindenizados após terem tido suasatividades econômicas proibidas.

Olindo (1991) nos apresenta ocaso do povo Masai na Reserva deMasai Mara, no Parque Nacional doSerengeti, Quênia. De acordo com ele,os pequenos proprietários de terralocais, passaram a sentir-se menosimportantes e privilegiados do quea fauna selvagem. Seus animais do-mésticos e fontes de água eram cons-tantemente ameaçados pelos gran-des mamíferos. Para enfrentar esseproblema, os Masai resolveram cons-truir cercas para isolar a vida selva-gem e evitar o acesso dela às fontesde água em suas propriedades, o quecausou uma diminuição no númerode animais.

Por outro lado, existem exemplosde experiências bem-sucedidas, emque a comunidade local se tornouimportante aliada dos projetos deconservação, como no caso do Pro-jeto Rara Avis, reserva particular lo-calizada nas montanhas da CostaRica. Whelan (1991) descreve oenvolvimento dos locais na opera-ção do projeto, provendo transpor-te, mantimentos para as expedições,alimentação e alojamento para osgrupos. Ainda na Costa Rica, cons-tatou-se que na comunidade deTortuguero, no entorno do ParqueNacional de Tortuguero, mais de70% das pessoas envolvidas com aatividade turística eram membros dacomunidade local.

Também em Belize procurou-seresolver o problema da retirada daspopulações tradicionais através dainserção dos moradores em ativida-des econômicas compatíveis quesubstituíssem a caça e a agricultura.

O Santuário da Vida Silvestre Cock-scomb, citado por Lindberg e Haw-kings (1993) ilustra bem esse proces-so, com o aproveitamento dos mora-dores desde em atividades tradicio-nais relacionadas com alojamento ealimentação até a venda de artesa-nato.

De forma diferente, a KWS –Kenya Wildlife Service, tentou resol-ver o impasse estabelecido com opovo Masai: optou-se por cobrar umataxa diária adicional de Us$ 10,00para os turistas estrangeiros, cujametade vai para um fundo adminis-trado pelos Masai, que determinamo melhor uso dos recursos para acomunidade.

No caso do Brasil, embora nãoexistam estudos detalhados que ana-lisem essa relação, sabe-se que a re-alidade não difere da dos países ci-tados anteriormente. Para o Ibama eperante a Legislação Brasileira, a si-tuação dos habitantes de unidadesde conservação de proteção integral,notadamente dos parques nacio-nais, é ilegal, devendo ser resolvidaatravés da desapropriação dos imó-veis particulares e indenização dosposseiros pelas benfeitorias cons-truídas (IBAMA, 1996).

Contudo, Morsello (2001) identi-fica alguns sinais de mudança nes-sa postura radical do órgão. Em par-te por incapacidade administrativae, também, por restrições orçamen-tárias, a remoção dos habitantes dasUC´s nunca foi possível. Com o pas-sar do tempo, entretanto, ao passoem que os prazos legais para a re-moção dos moradores iam se expi-rando, a administração do Institutocomeçou a sofrer influências do de-bate internacional que se estabele-ceu sobre esse tema, tendo passadoa admitir a relevância do tema e bus-cado encontrar soluções mais flexí-veis para o problema.

Um dos sinais mais claros dessapreocupação foi a criação de um gru-po de trabalho interno, em 1992,Centro Nacional de Desenvolvimen-to Sustentado das Populações Tra-

dicionais – CNPT6 com o objetivo deminimizar o impacto que as UC´stêm sobre a população local, partin-do do princípio de que a maior agres-são ao meio-ambiente é a miséria. Adespeito de seu significado simbóli-co, o CNPT não conseguiu avançarmuito além da criação das reservas7

extrativistas, enfrentando muitasresistências internas dentro da es-trutura do próprio IBAMA.

Em que pese a iniciativa da cria-ção do CNPT, continuam existindodirecionamentos divergentes dentroda estrutura do governo, e as açõesefetivas em prol das populações tra-dicionais acabam por direcionar-seunicamente para aquelas que habi-tam o entorno de áreas de proteçãointegral ou que estejam estabelecidasem unidades de uso direto.8

Em outras palavras, não existemindícios de que alguma mudançafundamental no tratamento da ques-tão ocorrerá no curto ou no médioprazo e, considerando-se a incapa-cidade administrativa para aplicara legislação vigente, subentende-seque, pelo menos essa ameaça, conti-nuará existindo por muito tempoainda nos espaços protegidos brasi-leiros.

A análise do ecoturismo comouma ferramenta para alcançaro desenvolvimento local emunidades de conservação

De todo o exposto sobre os casosanalisados, conclui-se que, a despei-to do forte poder desestruturante quepode exercer sobre comunidades eeconomias menos articuladas, a ati-vidade, em sua essência, apresentagrande potencial para se transfor-mar em uma ferramenta tanto da con-servação como do desenvolvimentolocal dos espaços naturais protegi-dos e suas populações tradicionais.O ecoturismo é uma das poucas ati-vidades em que a junção desses doisobjetivos é clara e direta pois suascondições de produção são particu-lares a exemplo das poucas barrei-ras à entrada e a adoção de estraté-

6 Criado através da Portaria IBAMA N 22, de 10/02/92.7 Até julho de 2004 haviam sido criadas 33 Reservas Extarativistas.8 Unidades de conservação consideradas de uso sustentável, que admitem algum tipo de manejo

econômico.

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gias artesanais que se traduzam nacriação de uma oferta difusa e debaixa intensidade e na gestão locale personalizada dos recursos.

O conceito de desenvolvimentolocal sustentável é uma derivação dopróprio conceito de desenvolvimen-to, trabalhado pela Geografia e pe-las Ciências Econômicas desde osseus primórdios e, mais recentemen-te, foi objeto das análises de Albu-querque (1997), Jordan e Zapata(1998), Valcarcel – Resalt (1998),Vazquez Baquero (1999a e 1999b),Rodriguez Gutiérrez (coord) (1999),Pérez Ramírez e Carrillo Benito(Coord) (2000). A relação entre tu-rismo e desenvolvimento está pre-sente nas obras de Rodrigues (1997),Benevides (1997), Souza (1997),López Palomeque (2000) e Irving(2002), enquanto as implicações es-pecíficas do ecoturismo em unida-des de conservação são abordadaspor Lindberg e Hawkings (org)(1995), Whelan (org) (1991), Wearinge Neil ( 2001), Fennel ( 2002) dentreoutros autores consultados paraesse estudo.

Como visto, a definição do termo“desenvolvimento” passou por umaevolução conceitual ao longo do tem-po, assumindo diferentes acepçõesque variaram do seu entendimentocomo sinônimo de crescimento eco-nômico, depois incorporando parâ-metros relacionados com o bem-es-tar das comunidades no que seconvencionou chamar de desenvol-vimento social ou sócio-espacial(SOUZA, 1997); e ainda, desenvol-vimento sustentável, desenvolvi-mento local e endógeno, para citarapenas algumas das denominaçõesmais utilizadas na produção cientí-fica sobre o tema. Para Perez eCarrillo (2000) o conceito de desen-volvimento local seria um novoenfoque do conceito de desenvolvi-mento, baseado no aproveitamentodos recursos endógenos (humanos,naturais e de infra-estrutura) ou, emsuas palavras:

aquele processo reativador da eco-nomia e dinamizador da socieda-de local que mediante o aproveita-mento dos recursos endógenosexistentes em uma determinadazona ou espaço físico é capaz de

estimular e fomentar o seu cresci-mento econômico, criar emprego,renda e riqueza e, sobretudo, me-lhorar a qualidade de vida e bemestar social da comunidade local(2000, p.48).

O local é entendido como o espa-ço socialmente construído e onde seconformam comunidades e se cons-troem identidades (COELHO E FON-TES, 1998).

Em linhas gerais, a perspectivado desenvolvimento local exige aintegração do turismo, e do ecotu-rismo no caso específico desse estu-do, de maneira compatível às condi-ções físico-ecológicas, econômicas esociais das unidades de conserva-ção e suas áreas de entorno maisimediato, através de um processo deplanejamento e gestão permanentee participativa da atividade, que pri-vilegie a construção de um poderendógeno por parte das comunida-des capaz de torná-las auto-geren-ciadas e independentes.

Contudo, esse não é um desafiofácil de ser vencido, ou melhor, tra-ta-se, justamente, da condição maisdifícil de ser alcançada, tendo emvista o baixo nível de instrução, in-formação e cidadania encontradosnas comunidades de áreas subde-senvolvidas do planeta, que são for-çadas a se adaptar a uma nova rea-lidade, muitas vezes não desejada.

Considerando todas as externali-dades levantadas e as dificuldadesde gestão enfrentadas por esses es-paços que, em sua maioria, continu-am a reproduzir o modelo excludentedos parques nacionais norte-ameri-canos, cabe questionar como, então,o ecoturismo pode contribuir para odesenvolvimento local das unidadesde conservação? Alguns autores ar-riscam sugestões mas todos são unâ-nimes ao concordar em pelo menosdois pontos: a) em que nenhumaação pode excluir a população local,de acordo com o princípio da orien-

tação social defendida pela concep-ção de turismo sustentável, e b) nanecessidade de planejamento paraqualquer ação com esse propósito.

Brandon (1993) esclarece que éimportante que se atente para o tipode participação comunitária que sebuscará nesse processo. Com baseem inúmeras experiências estuda-das, ela diferencia dois tipos de abor-dagem: a beneficiária e a participa-tiva.

A primeira consistiria na coopta-ção passiva da população local, atra-vés da oferta de postos de trabalho,de eventuais consultas quanto àssuas expectativas ou do repasse derecursos para a realização de açõescomunitárias ou a título de remune-ração compensatória em função dealgum transtorno provocado pelainiciativa. Exemplos dessa aborda-gem são citados por Lindberg &Huber (1993) na Zâmbia, em Fiji eno Quênia e pela própria autora, noMéxico9. Essa abordagem se asseme-lharia ao pagamento de uma esmo-la, que não conscientiza, não educae não contribui para o desenvolvi-mento individual e da comunidade.

Já a abordagem participativa,busca envolver as pessoas em seupróprio desenvolvimento através damobilização do seu potencial. Queelas sejam agentes ativos, gerenciemos recursos, tomem decisões e con-trolem as atividades que afetam asua vida, a exemplo do que ocorrecom os modelos de co-gestão de par-ques nacionais adotados na Austrá-lia. Mas, de acordo com Brandon(1993) a maior parte dos projetos deimplantação ecoturística segue aabordagem beneficiária, o que nãoimplica no verdadeiro engajamentoe participação dos locais.10

É importante ressaltar que o mo-delo participativo de planejamentoé mais difícil de ser implementado edemanda um horizonte temporal delongo prazo, quase sempre disso-

9 Na Zâmbia, o Programa de Administração de Äreas Comunitárias para Reservas Indígenas –CAMPFIRE, próximo ao Parque Nacional de Lwanga do Sul, distribui 40% dos recursos auferidos comos turistas para as comunidades vizinhas à área protegida. No Quênia, esse repasse é de 25%. EmFiji, a metade dos ingressos para o Parque e Reserva Florestal de Tavoro são destinados ao desen-volvimento de projetos comunitários.

10 Para mais detalhes sobre a abordagem participativa ver o relato da experiência Annapurna, noNepal em Brandon,(1993).

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ciado do timing da dinâmica empre-sarial e dos meandros da legislaçãoambiental que implicam no alija-mento das populações tradicionaisdo processo de planejamento dessasunidades.

As experiências relatadas de-monstram, portanto, que não é pos-sível perseguir os objetivos da con-servação da natureza e do desenvol-vimento local, especialmente nasunidades de conservação localiza-das nos países em desenvolvimen-to, sem atentar para as necessidadeshumanas de subsistência das popu-lações que os habitam e, conseqüen-temente, proceder-se a uma nova dis-cussão sobre os modelos de gestãoadotados nesses espaços e a sua ca-pacidade de equacionar todas asvariáveis derivadas do uso turísticodesses espaços.

A construção e o fortalecimentodo capital social de uma comunida-de não é um processo rápido. Deveobservar as peculiaridades da suacultura e respeitar a sua dinâmicaprópria. Ressalte-se, contudo, que aincorporação de inovações tecnoló-gicas no tecido empresarial e produ-tivo local, constitui-se na estratégiamais direta e segura de obtenção dodesenvolvimento local sustentável,através do turismo ou de qualqueroutra atividade econômica que sepense implementar.

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Departamento de Ciências Sociais AplicadasCurso de Ciências Econômicas (concentração em EconomiaRegional)

CEMPRE – Centro de Estudos Empresariais

UNIFACS – Universidade SalvadorPrédio de Aulas 8 – Campus Iguatemi – Alameda das Espatódias, 915Caminho das Árvores, Salvador, BA, CEP 41820-460Tel.: (71) 3273-8557 – E-mail: [email protected]

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ResumoEste artigo tem por objetivo pro-

blematizar teoricamente sobre a di-nâmica de competitividade geradapelas redes de cooperação e proporum modelo de análise de clusters deturismo a partir de um olhar multi-disciplinar entre as áreas de conhe-cimento da sócio-economia, geogra-fia-social e estudos de redes. Paraatender a este objetivo, inicialmenteo artigo apresentará o conceito dedesenvolvimento local, o papel dasredes de cooperação nos serviçosturísticos e o potencial de formaçãode clusters com base no fortalecimen-to das relações de cooperação einteração entre os agentes e atoresvinculados a um produto turístico.Em seguida, discutem-se os mode-los de competitividade de um clusterturístico, contrapondo-se a aborda-gem de competitividade sistêmica(ALTENBURG, 1998) como resulta-do das interações nos níveis meta,macro, meso e micro, com a aborda-gem do diamante (PORTER, 1999).A partir da avaliação crítica dos doismodelos de competitividade sugere-se um modelo alternativo que tempor objetivo avaliar as vantagenscompetitivas sistêmicas de clustersde turismo. Finalmente, destacam-seas vantagens e limitações do mode-lo e os possíveis resultado de apli-cação em análises do desenvolvi-mento local de clusters.

Palavras chaves: cluster de turismo,desenvolvimento local, competitivi-dade.

AbstractThe main objectives of this article

are to discuss the theory of the com-petitiveness dynamics generated by

CLUSTERS DE TURISMO:ABORDAGEM TEÓRICA E AVALIAÇÃO

Sieglinde Kindl da Cunha.1

João Carlos da Cunha2

the cooperation networks and topropose a model for analyzing tou-rism clusters based on a multidisci-pline approach, considering socio-economy, social-geography andnetwork analysis. This article willfirstly introduce the concept of localdevelopment, the cooperation net-work‘s role on tourism services andthe potential of clustering constitu-tion derived from the strengtheningof the cooperation and interactionrelationships between the agentsand players associated to a tourismproduct. Secondly the competitive-ness models of a tourism cluster willbe discussed opposing the SystemicCompetitiveness approach (ALTEN-BURG, 1998) as a result of the meta,macro, meso and micro levels againstthe Diamond approach PORTER,1999).An alternative model with theobjective of evaluating the SystemicCompetitive Advantages from tou-rism clusters is consequently sug-gested resulting from the criticalconsideration of both previousmodels. Lastly the advantages andlimitations of the proposed modeland the possible results of its em-ployment on the analysis of localclusters development are demons-trated.

Key words: tourism cluster, localdevelopment and competitiveness.

IntroduçãoO turismo nos últimos 50 anos

vem se destacando como uma dasatividades com maior potencial de

expansão em escala mundial. A par-tir dos anos 80, a aceleração do pro-cesso de internacionalização e aabertura das economias nacionaisprovocam verdadeira explosão naatividade de turismo, sendo apon-tado como o segundo setor maisglobalizado, perdendo em escalamundial somente para o setor finan-ceiro (SILVEIRA, 2002). Os avançostecnológicos do sistema de transpor-te e comunicações, com melhoriassignificativas da qualidade, reduçãodo tempo e dos custos das viagens,o aumento do número de viagens denegócios e as conquistas sociais (fé-rias remuneradas e finais de sema-na prolongado), tem atuado comoacelerador do processo de cresci-mento e globalização do turismo.

Pelo seu potencial de crescimen-to e por ser um produto que só podeser consumido in loco, o turismo as-sume papel de destaque como estra-tégia de desenvolvimento local. Aatividade do turismo tem sido o focodo planejamento regional tanto dospaíses desenvolvidos como em de-senvolvimento, com papel relevantena definição de diretrizes, estratégi-as e ações governamentais de cará-ter intervencionista direcionadapara reduzir as desigualdades soci-ais e regionais na busca de um de-senvolvimento sustentável. O turis-mo como setor estratégico nos pla-nos de Desenvolvimento Local, vemrecebendo atenção especial da Orga-nização Mundial do Turismo –OMT, com estudos e sugestões de

1 Doutora em Economia pelo IE/UNICAMP. Professora Sênior do Mestrado e Doutorado em Adminis-tração – CEPPAD –UFPR. skcunha unicenp.edu.br Skcunha brturbo.com.br

2 Doutor em Administração pela FEA/USP. Professor Titular do Departamento de Administração daUFPR. jccunha ufpr.br Jccunha brturbo.com.br

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modelos de planejamento (OMT,2004).

Este artigo tem por objetivo pro-blematizar teoricamente a dinâmicade “clusterização” dos serviços tu-rísticos e o potencial competitivo ge-rado pelas redes de cooperação e pro-por um modelo de análise de clusterde turismo, a partir de um olhar mul-tidisciplinar entre as áreas de conhe-cimento da sócio-economia, geogra-fia-social e estudos de redes.

Para atender a este objetivo, ini-cialmente o artigo apresentará o con-ceito de desenvolvimento local, opapel das redes de cooperação nosserviços turísticos e o potencial deformação de clusters a partir da coo-peração e interação entre os agentese atores vinculados a um produtoturístico. Em seguida, discute-se osmodelos de competitividade de umcluster de turismo, a partir da visãode competitividade sistêmica (AL-TENBURG, 1998), que considera acompetitividade como resultado dasinterações nos níveis meta, macro,meso e micro, e da abordagem decompetitividade do diamante dePorter (PORTER, 1999). A partir daavaliação crítica dos dois modelosde competitividade sugere-se ummodelo alternativo que tem por ob-jetivo analisar o potencial competi-tivo e os fatores propulsores do de-senvolvimento de clusters de turis-mo. Finalmente na conclusão, des-tacam-se as vantagens e limitaçõesdo modelo e os possíveis resultadoda aplicação do modelo em análisesde desenvolvimento e competitivida-de de clusters de turismo.

1 Redes de cooperação de ser-viços de turismo: potencialde formação de clustersA compreensão do processo de

desenvolvimento local a partir deatividades turísticas, cria um cam-po de interlocução entre três áreasde conhecimento: a sociedade, oambiente e a economia, que intera-gem e se reforçam mutuamente, emum contexto no qual a diversidadesocial e cultural e a diferenciaçãoprodutiva devem ser utilizadascomo recursos potenciais na geraçãode transformações, de competitivi-dade e de sustentabilidade.

O primeiro aspecto que chama aatenção é a multidisciplinaridade(economia, sociedade e geografiasocial), como elemento chave para aconstrução social dos territórios, queocorre através de redes de coopera-ção. Estas redes permitem explorarde maneira eficaz as eficiências co-letivas e/ou desenvolver as econo-mias externas nas relações sociaisde produção. Este é um conceito quese aproxima do conceito de capitalsocial que resulta da experiência associa-tiva, dos laços de confiança, das compe-tências e capacidades organizacionais edas configurações de caráter tácito ouinstitucionalizado que sedimentam re-lações interpessoais e interorganizacio-nais, passíveis de abordagem na óticada construção social dos territórios(SILVEIRA, 2002, p. 239).

O turismo possui um diferencialem relação as outras atividades pro-dutivas, pois é um produto que sópode ser consumido in loco, estimulao desenvolvimento de outras ativida-des econômicas (comércio, transpor-tes, meios de hospedagem, agênciasde viagens, artesanato, serviços deapoio), estimula o desenvolvimentoda infra-estrutura (estradas, aero-portos, saneamento, energia, etc),depende da sustentabilidade cultu-ral e ambiental e tem um forte efeitoindutor na geração de renda e em-prego local.

MONFORT (2000, p. 46) propõeo seguinte conceito de cluster turísti-co, adaptado a partir do conceito deAglomerações de Porter:

O conjunto complexo de diferen-tes elementos, entre os quais se en-contram os serviços prestados porempresas ou negócios turísticos(alojamento, restauração, agênciade viagens, parques – aquáticos,temáticos, etc.); a riqueza que pro-porciona a experiência das fériasde um turista; o encontro multidi-mensional entre empresas e indús-trias relacionadas; as infra-estru-turas de comunicação e transpor-te; as atividades complementares(dotação comercial, tradição emfeiras, etc.); os serviços de apoio(formação e informação, etc.); e osrecursos naturais e as políticasinstitucionais.

Enquanto Monfort destaca as ca-racterísticas e os componentes de um

cluster, Beni em artigo publicado noano de 2003, define cluster enfati-zando a articulação entre os agen-tes e a cooperação através da forma-ção de redes de empresas:

Cluster turístico é o conjunto deatrativos com destacado diferen-cial turístico, concentrado num es-paço geográfico delimitado dota-do de equipamentos e serviços dequalidade, de eficiência coletiva, decoesão social e política, de articu-lação da cadeia produtiva e de cul-tura associativa, e com excelênciagerencial em redes de empresas quegeram vantagens estratégicas com-parativas e competitivas (BENI,2003, p.74) (Grifos nossos).

Rodríguez Domínguez (2001, p.307), afirma que ao se trabalhar comclusters no turismo torna-se necessá-rio contemplar um nível geográficoreduzido, concreto, um destino tu-rístico, onde se pode adquirir umnúmero limitado de produtos turís-ticos. Nesta perspectiva,um clusterturístico define-se segundo os se-guintes critérios:• existe um âmbito geográfico local,

medido em função de conexõesreais;

• conforma relações comerciais, en-tendidas como a distância máxi-ma que permite a um fornecedorservir adequadamente aos seusclientes e desenvolver outras ati-vidades complementares, bemcomo muitos outros aspectos aexemplo da promoção, das esco-las de formação turística, etc.;

• contém infra-estruturas suficien-tes para toda a área;

• dispõe de uma estratégia própriamuito diferenciada, com caracte-rísticas de oferta ou de demandamuito distintas em relação ao res-to do território.Neste artigo desenvolvemos o

conceito de que um cluster turísticoestá associado a um conjunto deempresas e instituições vinculadasa oferta de um produto ou um con-junto de produtos turísticos. Estasempresas e instituições estão espa-cialmente concentradas e estabele-cem entre si relações verticais (den-tro da cadeia produtiva do turismo)e horizontais (envolvendo o inter-câmbio de fatores, competências e

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informações entre agentes vincula-dos a oferta dos produtos turísticos).

O cluster representado na figura1, apresenta conformação internaque geralmente inclui: a) um conjun-to de atrações turísticas que exerçamatração sobre os não residentes b)uma concentração de empresas deserviços turísticos: restaurantes,meios de hospedagem, serviços detransporte, artesanatos, agências deviagens, etc; c) setores de apoio àprestação de serviços turísticos; d)infra-estrutura apropriada e de bai-xo custo (estradas, energia, sanea-mento, serviços de saúde, segurança,etc); e empresas ou instituições quefornecem qualificações especializa-das, informações, capital financeiro;f) agentes internos organizados emassociações de classe; g) agênciasgovernamentais e outros órgãos re-guladores que exerçam influênciasobre a aglomeração turística.

2 Modelos de vantagens com-petitivas de clusters turísti-cosDe acordo com Altenburg (1998)

e Porter (1990), uma visão dinâmicade competitividade deve ser desen-volvida a fim de que, se possa pro-mover uma análise mais condizentecom a realidade econômica, políticae social nas quais as organizaçõesestão inseridas.

Altenburg enfatiza a dimensãodinâmica e sistêmica da competitivi-dade. Como visão dinâmica compre-ende a competitividade baseada nosresultados de capacitações acumu-ladas, estratégias adotadas pelasempresas e percepções quanto aoprocesso concorrencial e ao ambien-te econômico e institucional ondeestão inseridas. Nesta visão, acompetitividade resulta da capaci-dade dos agentes em formular eimplementar estratégias que permi-tam conservar posições sustentá-veis, destacando-se as vantagensassociadas à qualidade e produtivi-dade dos recursos humanos e àcapacitação produtiva e inovadoradas empresas. Esta dimensão dinâ-mica está condicionada por fatoresque podem favorecer e aperfeiçoar acapacidade de acumulação tecnoló-gica das empresas a partir dos di-

versos níveis de inter-relações dasorganizações com seu meio. Comodimensão sistêmica, Altenburg des-taca quatro dimensões que resultamdas ações entre os agentes e destescom o seu ambiente: níveis meta,macro, meso e micro.

Porter desenvolve o conceito decompetitividade associado ao con-ceito de valor. As empresas possu-em a capacidade de criar valor paraseus compradores pelo desempenhoobtido a partir de suas atividadesinternas e que constituem o que oautor denomina de cadeia de valo-res. A vantagem competitiva, sob aperspectiva da organização, é obti-da através das inovações alcançadasnestas atividades, ou na sua cadeiade valores e na capacidade de coor-denação das mesmas. As organiza-ções fazem parte de um sistema as-sociadas as cadeias de valores: for-necedores, clientes, canais de distri-buição e outros agentes do processoprodutivo. A capacidade de coorde-nar, de forma mais eficiente possí-vel este “sistema de valores” é quegera a vantagem competitiva.

A seguir analisa-se competitivi-dade associada às condições de umcluster turístico. O modelo de Com-petitividade Sistêmica do InstitutoAlemão de Desenvolvimento (AL-

TENBURG, 1998) e o modelo do dia-mante de Porter, serão adaptadospara explicar e relacionar as princi-pais variáveis da dinâmica compe-titiva de um cluster de turismo.

2.1 Modelo de competitividade sis-têmica

No enfoque sistêmico, a competi-tividade compreende o alinhamen-to de quatro dimensões de ação ob-jetiva: nível meta (valores, coesão so-cial, organização política); nível ma-cro (políticas macroeconômicas, co-mércio exterior e políticas regula-tórias); nível meso (interação entre oEstado e os atores sociais que desen-volvem políticas de apoio específi-co, fomentando a formação de estru-turas e articulando processos deaprendizagem a nível social); nívelmicro (ação interna às empresas nabusca simultânea de eficiência, qua-lidade, flexibilidade e rapidez de re-ação, estando muitas delas articula-das em redes colaborativas).

Em nível meta a competitividadede um cluster turístico se materializaquando o mercado (turistas) e as or-ganizações sociais (agentes que com-põe o cluster) se movem na mesmadireção e estão estreitamente asso-ciados, permitindo mobilizarsinergias em constante movimento

Figura 1 – Representação de um cluster turísticoFonte: elaborada pelos autores

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de correção e ajuste. Esta convergên-cia de direcionamentos se dá atravésda capacidade dos atores em com-partilhar uma visão conjunta, culturae valores no sentido de implementarestratégias de desenvolvimento quecriam vantagens socialmente apro-priáveis para os agentes locais.

As ações que influenciam a com-petitividade em nível macro são asações específicas do Estado que in-terferem no nível de atividade, nadistribuição e na forma de apropria-ção do produto gerado pelo clusterturístico a curto, médio e longo pra-zo. Um ambiente econômico, políti-co e institucional propício é condi-ção imprescindível para gerar com-petitividade de um cluster.

O nível meso depende da capaci-dade organizativa e estratégica deinteração e cooperação entre os nu-merosos agentes sociais que atuamna atividade do turismo ou que a elese relacionam. O meio que envolveas empresas tem sido influenciadopelas mudanças tecnológico-orga-nizativas, e pela superação do tra-dicional paradigma de produção for-dista. O novo paradigma das tecno-logias de informação e comunicaçãopossibilita a expansão e penetraçãode redes organizacionais em toda aestrutura sócio-produtiva, transfor-mando e reforçando os arranjos insti-tucionais que se vinculam ao cluster.

O nível micro compreende essen-cialmente a perspectiva de análiseda competitividade ao nível das em-presas do cluster de turismo que paramanterem sua vantagem competiti-va, enfrentam adversidades do meioque lhe é imposto pela competição,exigindo a definição de estratégias eprocessos de produção eficientes,flexíveis, com qualidade e velocida-de de reação.

O modelo de competitividadeapresentado por Altenburg permiteavaliar como as diferentes variáveisinfluenciam nos níveis de compe-titividade de um cluster turístico.Possibilitam ainda avaliar: as fragi-lidades e potenciais dos agentes ede suas relações; os valores cultu-rais comuns que orientam as estra-tégias de desenvolvimento; a posi-ção de cada ator na divisão socialdo trabalho do cluster de turismo; aslacunas, fragilidades ou potencia-lidades das políticas públicas; asestratégias de cooperação e de for-mação de redes entre os agentes; as-sim como as estratégias individuaisde competição e competitividade dasorganizações.

2.2 Modelo de competitividade dePorter

De acordo com Porter, o sucessode determinada empresa e ou de de-terminada indústria está associadoàs condições nacionais de seu paísde origem, na medida em que poten-cializam a adoção de estratégias pró-prias a partir de um contexto favo-rável ao seu desenvolvimento. O su-cesso de empresas e indústrias apartir deste favorecimento constitui-ria a vantagem competitiva de umanação.

Porter destaca quatro determi-nantes e mais o papel do governo edo acaso como determinantes davantagem competitiva de uma na-ção, região ou cluster: condições dosfatores; condições da demanda; in-dústrias correlatas e de apoio; estra-tégia, estrutura e rivalidade de em-presas. Estas condições são normal-mente encontradas em clusters turís-ticos. Na maioria dos clusters turísti-cos as atividades vinculadas ao pro-duto turístico, têm fortes ligaçõescom outras atividades industriais ede serviços (através da compra deequipamentos, treinamento, design,indústria de alimentos, vestuário,etc...), necessitam de condições defatores favoráveis, mercado exigen-te e sofisticado e de elementos quefortaleçam as estratégias de rivali-dade entre empresas.

Mais detalhadamente podemosverificar os determinantes do diaman-te de Porter em um cluster turístico:

• Condições de fatores: abrangemos recursos envolvidos no desen-volvimento das vantagens compe-titivas e podem ser encontradosnas atividades de: capacitação derecursos humanos para o traba-lho e de serviços prestados ao tu-rista, na disponibilidade de recur-sos físicos e atrativos turísticos,na disponibilidade de recursos doconhecimento (agencias de infor-mação e divulgação), na disponi-bilidade de recursos de capital(para financiamento de médio elongo prazo, destinados a infra esupra-estrutura turística); nainfra-estrutura de acesso aos pro-dutos turísticos (estradas, ener-gia, saneamento, etc) e nos servi-ços de segurança, etc.

• Condições de demanda: compre-endem os elementos de mercadoa que se reportam determinadasindústrias. Isto quer dizer que umcluster turístico terá seu desenvol-vimento associado à composiçãoe tamanho da demanda de seusprodutos e serviços, bem como aoseu padrão de crescimento e exi-gências de qualidade.

• Indústrias correlatas e de apoio:as indústrias correlatas compre-endem aquelas que fazem partedo sistema de cadeia de valores,ou seja, que em alguma das par-tes de sua cadeia de valores estejaassociada através de um proces-so ou produto à cadeia de valoresda empresa em foco. Já, as empre-sas de apoio compreendem forne-cedores e empresas que servemcomo canais de distribuição eintermediação.

• Estratégia, estrutura e rivalidadede empresas: este determinante lo-caliza-se na esfera interna da em-presa, associada às práticas ad-ministrativas adotadas por deter-minada indústria e suas respecti-vas firmas, à percepção dos agen-tes envolvidos no processo com-petitivo sobre comércio interno eexterno, à formação dos profissi-onais de determinada empresa eà influência de políticas governa-mentais no interior das organiza-ções.O modelo proposto por Porter

ainda acrescenta aos quatro deter-

As açõesque influenciam a

competitividade em nívelmacro são as ações

específicas doEstado...

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minantes os efeitos do acaso e dogoverno. O acaso está vinculado aosfenômenos da natureza, ou fatoresgeopolíticos tais como terrorismo,guerras, etc... Também para Porter, aação pública também afeta as ativi-dades de turismo através das políti-cas públicas, como por exemplo. ataxa de cambio, políticas de renda,taxa de juros, falta de controle dapoluição ambiental, regulação domercado de trabalho.

Ao compararmos o modelo dodiamante de Porter com o modelo deAltenburg, observamos claramenteque Porter enfatiza as variáveis quedefinem as condições de mercado,que estão associados ao tamanho dademanda e ao grau de sofisticaçãodesta demanda. Nas atividades tu-rísticas as condições de mercado sãoespecialmente importantes para es-timular inovações de produtos e ser-viços e estas variáveis são poucoexploradas no modelo de competiti-vidade de Altenburg.

Sem minimizar o papel da coo-peração entre as organizações, omodelo de Porter destaca a rivalida-de como variável estratégica essen-cial para desenvolver inovações ediferenciação na oferta de produtose serviços turísticos. Enquanto que,no modelo de competitividade a ên-fase é dada às variáveis de coopera-ção (especialmente a cooperação queocorre em nível meso) entre institui-ções públicas e organizações paradefinir estratégias de desenvolvi-mento da infra-estrutura, supra-es-trutura e das estruturas organizacio-nais do cluster turístico. A parceriapúblico-privada é colocada comoestratégica para a competitividadesistêmica no modelo de Altenburg.

3 Divergências e convergên-cias entre os modelos decompetitividade sistêmica eo diamante do porter: umaabordagem específica paraclusters de turismoOs dois modelos se complemen-

tam para a análise da competitivi-dade de clusters turísticos na medidaem que o modelo de competitividadesistêmica de Altenburg propõe-se adeterminar os níveis ou dimensões dacompetitividade com ênfase em vari-

áveis econômicas, que envolvem umconjunto complexo de fatoresdimensionados nos níveis meta,macro, meso e micro. Devido à com-plexidade e características sistêmicasdestes fatores, o agrupamento porníveis de competitividade facilita oprocesso de análise de estudiosos,pesquisadores, tomadores de decisãoe elaboradores de políticas uma vezque as análises de clusters turísticosdevem sustentar-se em abordagensque envolvam a visão holística,multidisciplinar e multiescalar dasrelações sociais, econômicas, cultu-rais e ambientais. As variáveis analí-ticas do modelo permitem avaliar ocluster pelo potencial dos agentes lo-cais de viabilizarem um projeto localde desenvolvimento do cluster turís-tico através da cultura associativa ede coesão social e do fortalecimentodas redes locais de cooperação.

Na avaliação da competitividadea nível meta e meso Altenburg tam-bém destaca, a capacidade internados agentes de formação de novos

negócios e a visão holística, multi-disciplinar e multiescalar dos agen-tes envolvidos no processo competi-tivo.

O segundo modelo apresentadotem sua origem em uma abordagemestratégica e, apresenta entre seusdeterminantes os elementos comunsà discussão mercadológica e de re-cursos estratégicos das organiza-ções. Estes elementos são especial-mente importantes em clusters turís-ticos uma vez que as organizações eagentes que o integram, sustentam-se no mercado, através da definiçãode estratégias de competição inter-na entre as organizações e tambématravés de estratégias externas decompetição com outros clusters turís-ticos.

A principal característica do mo-delo de Porter é a ênfase dada ainteração entre os determinantes dodiamante. Cada determinante encer-ra também um conjunto de agentesque promovem pressões sobre os ele-mentos dos outros determinantes, de

Figura 2 – O diamante de competitividade de um cluster de turismo.Fonte: Santos Silva (2004).

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forma que o grau de interação defi-ne a vantagem competitiva nacional.Fica destacado no modelo de Porterque a competição é o elemento deter-minante do sucesso de um cluster.

O autor do modelo do diamanteminimiza os elementos macroeconô-micos que interferem no desempe-nho da vantagem competitiva naci-onal, ou seja, nas condições do am-biente econômico favorável ao forta-lecimento do cluster turístico. Tam-bém não foi enfatizado no modelode Porter, os valores e culturas co-muns dos agentes para criar umambiente colaborativo voltado parao desenvolvimento contínuo das di-mensões sócio-econômica e ambien-tais do cluster turístico.

O modelo de Porter reconhece opapel do governo na definição depolíticas que interferem na compe-titividade do cluster turístico, masnão destaca a importância da cola-boração e da cooperação entre o go-verno e as organizações na defini-ção de estratégias de desenvolvi-mento de um cluster. Porter coloca ogoverno como um agente responsá-vel pela regulação e pela disponibi-lidade de infra-estrutura, sem enfa-tizar a relação sinérgica que ocorreentre os agentes públicos e privados.A parceria público-privado pode serum dos elementos fundamentais napromoção e apoio aos clusters turís-ticos, especialmente porque o Esta-do pode atuar em relações horizon-tais de cooperação com os demaisagentes, além de ser o agente facili-tador do desenvolvimento através deinvestimentos públicos na formaçãoda infra-estrutura básica de apoio aosetor de turismo.

O modelo do diamante de Porter,quando adaptado a estudos de com-petitividade de clusters deixa lacu-nas na análise dos fatores meta emeso. Porter não enfatiza a capaci-dade dos atores em compartilharuma visão conjunta no sentido deimplementar estratégias de desen-volvimento setorial e local e tambémminimiza a importância das relaçõese parcerias do setor privado com asinstituições públicas no sentido dedesenvolver um modelo cooperati-vo de desenvolvimento do cluster tu-rístico.

No entanto o modelo é rico quan-do se pensa em um modelo estratégi-co de desenvolvimento em nível mesoe microeconômico. O modelo de Porterdestaca a rivalidade como variávelestratégica essencial para desenvolverinovações e diferenciação na oferta deprodutos e serviços turísticos.

Embora ocorram lacunas na de-finição das variáveis estratégicasentre o dois modelos, a maioria dosdeterminantes da competitividadeapresenta variáveis convergentes,embora agregadas com tipologiasdiferentes. As relações convergentesidentificadas entre os dois modelossão apresentadas por variáveis fun-damentais para a competitividadede um cluster turístico, ou seja, osdeterminantes competitivos do mo-delo de Porter podem ser claramen-te identificados nas variáveis agre-gadas por níveis de competitividadedo modelo proposto por Altenburg.

Por exemplo, o nível meso dá ên-fase a discussão de elementos deinfra-estrutura, de relações entre asorganizações privadas e instituiçõespúblicas de apoio e a disponibili-zação dos recursos necessários aodesenvolvimento. Da mesma formao determinante proposto no modelode Porter sobre condições de fatores,também enfoca o mesmo conjunto de

elementos. O nível Micro, por suavez, compreende a dimensão da es-tratégia organizacional para a com-petitividade da mesma forma que odeterminante de “Estratégia, estru-tura e rivalidade de empresas” dosegundo modelo.

Na figura 3, apresenta-se umaproposta de avaliação das vanta-gens competitivas sistêmicas, a par-tir da combinação de variáveis apre-sentadas nos dois modelos discuti-dos neste artigo.

4. Vantagens e desvantagensna aplicação do modeloA aplicação do modelo de avalia-

ção do desenvolvimento e compe-titividade de clusters de turismo po-derá contribuir com subsídios aosformuladores de políticas de desen-volvimento local, no sentido de iden-tificar lacunas e potencialidades quepara o desenvolvimento competiti-vo do cluster de turismo. Como con-tribuição ao enfoque de políticaspúblicas ou de competitividademacro, o modelo poderá responderquestões tais como:• existem políticas de estímulo es-

pecíficas para o desenvolvimentodo Cluster turístico?

• se existem: Quais são estas políti-cas? São adequadas para as espe-

Figura 3 – Vantagens competitivas sistêmicas de clusters turísticosFonte: elaborada pelos autores com base nos modelos de competitividade sistêmica e odiamante da competitividade de Porter.

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cificidades do cluster local? Comocontribuem para a competitivida-de? Que política poderiam melho-rar a competitividade do cluster?

• qual o papel do estado na ofertada infra-estrutura de turismo?Quais as lacunas ou deficiênciasem termos de infra-estrutura físi-ca e de apoio ao turismo?A aplicação do modelo também

poderá contribuir em termos de po-tencial de organização interna docluster e de formulação de um proje-to local de desenvolvimento ao res-ponder questões tais como:• qual a capacidade dos agentes lo-

cais para formular um projeto es-tratégico para o desenvolvimentodo turismo?

• fatores que fomentam ou criamobstáculos ao associativismo ecooperativismo.

• como os agentes se organizampara atingir as metas de desenvol-vimento local?

• qual o plano estratégico de desen-volvimento do turismo local a cur-to, médio e longo prazo?

• quais são os principais agentescomponentes do cluster turístico?

• qual o papel que cada agente ocu-pa no cluster turístico?

• que tipo de relações que ocorrementre os agentes internos e qual aintensidade destas relações?

• quais atividades não são atendi-das pelos agentes locais?

• quem são os principais ofertantesde serviços turísticos internamen-te e quais são as atividades quenão são atendidas pelos agenteslocais?O modelo também permite res-

ponder questões sobre estratégias,estrutura e concorrência em nívelmicroeconômico, tais como:• qual o potencial competitivo da

indústria local?• quais as estratégias de concorrên-

cia das empresas dentro do clustere com os clusters turísticos concor-rentes?

• qual o potencial de inovação dasempresas componentes do cluster?

• quais as estratégias de concorrên-cia microeconômica em termos dediferenciação dos serviços e devantagens de custo?A aplicação de um de um modelo

estatístico, como por exemplo, o de

componentes principais, permitiráselecionar e hierarquizar as variá-veis com maior poder de explicaçãoem termos de competitividade docluster.

O modelo de vantagens competi-tivas sistêmicas de clusters turísticos,resultado da fusão dos dois mode-los analisados, apresenta uma visãoholística, multidisciplinar e multise-torial, resgatando através da abor-dagem sistêmica os conceitos decompetitividade.

A análise da competitividade declusters turísticos busca orientar es-trategicamente os agentes responsá-veis pelas políticas públicas, comotambém as empresas e instituiçõespúblicas e privadas em suas estraté-gias de competitividade, competição,cooperação e sustentabilidade.

ConclusãoO turismo vem se destacando

como uma das atividades com mai-or potencial de expansão em escalamundial. Pelo seu potencial de cres-cimento, e por ser um produto quesó pode ser consumido in loco, a ati-vidade assume papel de destaquecomo estratégia de desenvolvimen-to local. Contudo, mesmo com o po-tencial de desenvolvimento em todasas escalas e o papel relevante na de-finição das políticas públicas da ca-ráter intervencionista, pouco seavançou em termos de estudos, pes-quisas e modelos de medidas de im-pactos que a atividade de turismoexerce sobre uma localidade.

Este artigo teve por objetivoproblematizar teoricamente a análi-se de competitividade de cluster deturismo utilizando como embasa-mento o enfoque o modelo diamantede Porter e a análise sistêmica decompetitividade de Altenburg.

O modelo tem como fundamen-tação teórica o conceito e a tipologiade cluster, adaptando e integrandoos conceitos de competitividade àsdimensões econômicas, sociais, cul-turais, ambientais e políticas.

Os conceitos utilizados nos doismodelos, embora com foco e aborda-gem inicial diferente (o modelo sistê-mico tem um enfoque mais econômi-co de análise de impactos e o mode-lo do diamante de Porter, um enfoquemais de estratégia das organiza-

ções), não são contraditórios, masinteragem e dão uma visão maisabrangente dos fatores e variáveisque interferem na competitividadede clusters turísticos.

As associações realizadas acimae outras que ainda podem ser reali-zadas, determinam a complemen-taridade dos dois modelos. Não sediscute, neste enfoque, qual daque-les apresentados possa ser mais oumenos efetivo, todavia propõe-se quea adoção de ambos possa promoveruma análise mais apurada dos ele-mentos envolvidos no processo decompetitividade dinâmica e sistê-mica de um cluster de turismo.

O modelo proposto apresentauma visão holística, multidiscipli-nar e multisetorial do desenvolvi-mento local, resgatando, através daabordagem sistêmica, os conceitosde competitividade, eqüidade soci-al e desenvolvimento sustentável. Osresultados possibilitam orientar es-trategicamente agentes responsáveispelas políticas públicas, bem comoas empresas e instituições públicase privadas em suas estratégias decompetitividade, competição, coope-ração e sustentabilidade.

Como principal limitação do mo-delo destaca-se o seu corte temporal eregional, ou seja, o modelo é estático esua comparabilidade no tempo e noespaço depende da sua reaplicação.

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CEDRECENTRO DE ESTUDOS DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL

• – Análises regionais para programas dedesenvolvimento – Avaliações e acompanhamento de programas de fomento –Estudos de viabilidade econômica – Estudos setoriais de oportunidades deinvestimento – Estudos de localização industrial – Projetos de implantação eampliação de empresas – Diagnósticos municipais – Planejamento espacial eeconômico nos planos macro e microeconômicos – Planos diretores dedesenvolvimento urbano – análises urbanas.

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ResumoO objetivo desse artigo é analisar

a natureza e avaliar a eficácia deprogramas de qualidade adotadosno âmbito das administrações públi-cas estaduais do Brasil nos últimosanos. Para tal, é realizado um estu-do de caso do Programa de Quali-dade em Obras Públicas do Estadoda Bahia – QUALIOP, buscando-sedescrever os seus principais atribu-tos e, sobretudo, discutir a sua eficá-cia. Desta forma, os resultados apre-sentados decorrem de uma amplapesquisa de campo realizada juntoàs empresas executantes e aos con-tratantes de obras públicas no Go-verno do Estado da Bahia, mediantea aplicação de questionários estrutu-rados, com os quais se pretendeuressaltar as suas diferentes dimen-sões de desempenho, assim comoapontar as suas deficiências e requi-sitos de evolução. Os resultados dapesquisa indicam significativosavanços na melhoria dos processose nos mecanismos e instrumentos decontrole das obras públicas no Esta-do da Bahia.

Palavras-chave: Reforma do Estado,Modelo de Gestão, Mudança Organi-zacional, Programa de Qualidade.

AbstractThe purpose of this paper is to

study the nature of quality programsat Brazilian states and to assess itseffectiveness In order to do so, a casestudy of Bahia’s Quality Program inPublic Works – QUALIOP was de-veloped, searching to describe itsmain features and to evaluate itseffectiveness. The results presentedderived from a field research atoutsourced companies and publicworks contractors at Bahia State

A EFICÁCIA DOS PROGRAMAS DE QUALIDADENO SETOR PÚBLICO: O CASO DO QUALIOP

Augusto de Oliveira Monteiro1

Carlos Palma de Mello2

Government, which aimed to high-light the different performance di-mensions and the deficiencies, aswell as its requirements for furtherdevelopment. The results indicatesignificant improvements on the pro-cesses and control tools of the publicworks.Key-words: State Reform, Manage-ment Model, Organizational Chan-ge, Quality Program.

IntroduçãoAo longo da última década, o pro-

cesso de Reforma do Estado e asmudanças nos organismos públicosse aprofundaram e ganharam noto-riedade. Diversos governos realiza-ram um grande esforço para melhorfocar as atividades de governo noatendimento ao cidadão, tornandoa máquina estatal mais leve e pro-dutiva. As diretrizes desta reformaforam lastreadas no conjunto deprincípios da chamada Administra-ção Pública Gerencial, a saber: foconos resultados, indicadores de de-sempenho, parcerias, trabalho emrede, gestão do conhecimento, auto-nomia e responsabilização, transpa-rência, controle social e avaliação.

Os instrumentos desta reformaestão estabelecidos através da difu-são de novas tecnologias, da promo-ção de diálogos e da construção efe-tiva de parcerias e redes entre o Esta-do, instituições privadas e não-go-vernamentais. Procura-se mudar aqualidade gerencial das instituiçõespúblicas, pesquisando e imple-mentando novos modelos de gestão

que possibilitem a execução destastarefas, com o objetivo principal demelhorar a qualidade de vida do ci-dadão. Para isso, é necessário o de-senho de um novo Estado através deum ajuste fiscal, assim como refor-mas estruturais orientadas para omercado, com profundas repercus-sões na forma como o Governo atua,nas dimensões política, econômica,social e gerencial.

Também no âmbito da adminis-tração do Estado da Bahia, é possívelperceber um número crescente de pro-jetos que visam promover a evoluçãoda gestão pública. Alguns progra-mas estaduais parecem possuir estascaracterísticas, fazendo parte de umconjunto de movimentos que consti-tuem uma ampla agenda de trabalhode fins transformadores e que bus-cam, em certa medida, assegurar atransformação necessária à consoli-dação do novo modelo gerencial.

Desta forma, o objeto de estudodeste trabalho é o Programa de Qua-lidade em Obras Públicas do Estadoda Bahia – QUALIOP. Instituído for-malmente através do Decreto no

7.795, de 24 de abril de 2000, esteprograma pretende ser o agenteincentivador da inovação e da com-petitividade na atuação das empre-sas do setor de construção civil queatuam no Estado. Como resultado deextensa negociação entre o Estado ea cadeia produtiva, este programa éuma ação estratégica de introduçãoda Gestão pela Qualidade Total noâmbito das obras públicas estatais.O QUALIOP está alinhado como o

1 Doutor, Professor Titular da Universidade Salvador (Unifacs), Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Administração da Unifacs.

2 Mestre, Pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Administração da Unifacs, Coordenadordo Curso de Marketing do Centro Universitário da Bahia – FIB.

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Programa Brasileiro de Qualidade eProdutividade do Habitat (PBQP-H),coordenado pelo Ministério das Ci-dades.

O programa visa a melhoria dasobras públicas contratadas pelo Go-verno do Estado mediante um siste-ma evolutivo que monitora a quali-dade dos materiais, componentes, sis-temas construtivos e projetos, bemcomo os processos e procedimentosdos contratantes (órgãos do Estado).Seu funcionamento está calcado noestabelecimento de acordos setoriaiscom segmentos da construção civil econtratantes públicos, através da im-plantação de processos de qualifica-ção, homologação e certificação deprodutos, serviços e procedimentos.

O objetivo deste trabalho, portan-to, é avaliar e discutir a eficácia doPrograma QUALIOP na melhoriados processos de contratação, exe-cução e resultados das obras civisno Estado da Bahia. Sendo assim, éanalisado também em que medida oQUALIOP está alinhado com os pre-ceitos da Reforma Gerencial em cur-so no Brasil. Acredita-se que esteprograma esteja de acordo com aspropostas elencadas para este esfor-ço, figurando como um dos modelosde atuação com intenção de trans-formar a administração pública, re-presentando ainda um avanço nasrelações entre o Governo e o setorprodutivo privado.

Reforma do Estado e NovosModelos de Gestão Pública

Nos últimos anos, tem-se obser-vado um intenso debate acerca dopapel que o Estado deve desempe-nhar na vida contemporânea e o graude intervenção que deve ter na eco-nomia. No Brasil, o tema ganha rele-vância maior, tendo em vista que ogoverno, em razão do modelo de de-senvolvimento adotado, desviou-sede suas funções precípuas para atu-ar fortemente na esfera produtiva(BRASIL, 1995).

Bresser Pereira (1996) argumen-ta que a globalização empurrou oEstado na direção da redefinição desuas funções, antes fundamentadasna proteção e no fomento de suaseconomias e, neste momento, na ga-rantia da universalidade dos servi-

ços de educação básica, de saúde esegurança, financiando a formaçãodo capital humano e promovendo acompetitividade internacional dasempresas. O foco estaria centrado naregulação destes serviços ditos mo-nopolistas, além da intervenção ca-paz de compensar os desequilíbriospromovidos pela globalização.

Spink (1999) cita o Relatório dasNações Unidas de sua conferênciaem Brighton, em 1971, na tentativada definição de Reforma Adminis-trativa do Estado, como sendo o es-forço que tem como alvo a induçãodas mudanças fundamentais nossistemas de administração pública,através de reformas de todos os sis-temas ou, pelo menos, de medidasque visem à melhoria de um ou maiselementos-chave, como estruturasadministrativas, pessoal e proces-sos. Neste particular, estas são con-sideradas essenciais para a criaçãode capacidade administrativa neces-sária ao desenvolvimento econômi-co, alem da execução das funçõesgovernamentais essenciais.

A definição de Reforma Gerencialse encerra em sete características danova gestão pública: administraçãoprofissional, indicadores de desem-penho explícitos, maior ênfase nocontrole de resultados, divisão dasorganizações públicas em unidadesmenores, maior competição entreunidades, ênfase no uso de práticasde gestão originadas no setor priva-do, e ênfase em maior disciplina eparcimônia no uso de recursos.

A reforma do Estado pela via daReforma Gerencial da Administra-ção Pública é uma resposta ao pro-cesso de globalização em curso, compremente ameaça à autonomia dosEstados na formulação e implemen-tação de políticas públicas, e à cha-mada crise do Estado com início nosanos 1970, e consolidação a partirdos anos 1980 (BRESSER PEREIRA,1992).

A grande crise dos anos 1980,como cita o autor, reduziu drastica-mente taxas de crescimento dos paí-ses centrais, e levou à estagnaçãopor quinze anos a renda por habi-tante nos países em desenvolvimen-to. Este fato decorre da crise do Esta-do – uma crise fiscal, do modo de

intervenção econômica e social euma crise na forma burocrática deadministrar o Estado. Bresser Perei-ra ainda associa a crise ao carátercíclico da intervenção estatal, bemcomo à perda de autonomia decor-rente da globalização, como fora ci-tado anteriormente.

A intensa intervenção do Estadono mercado acarretou distorçõescrescentes nos anos 1980 que se tor-naram insustentáveis nos anos1990. No sistema capitalista, Esta-do e mercado são as duas institui-ções centrais que operam na coorde-nação dos sistemas econômicos.Desta forma, se um deles apresentafuncionamento irregular, é inevitá-vel que os efeitos da crise se façampresentes.

No Brasil, também nos anos 1980,esta crise caracterizou-se pela perdado crédito público e pela poupançapública negativa. Agravada pelo pro-cesso de globalização, a crise do mo-delo de intervenção acelerou o esgo-tamento do modelo intervencionistade proteção e substituição de impor-tações até então vitorioso. Por sua vez,a crise do modelo burocrático de ad-ministrar o Estado emergiu no finaldos anos 1980, em função do retro-cesso burocrático da Constituição de1988 (BRESSER PEREIRA, 1992). OPlano Diretor da Reforma do Estado(BRASIL, 1995) ainda cita que, a par-tir do início desta década, como re-sultado de reformas administrativasapressadas, notadamente no iníciodos anos 1990, verificou-se total de-sorganização dos centros decisóriosimportantes, que afetaram a “memó-ria administrativa” e desmantelarama sistema de informações para o pro-cesso governamental.

O Decreto-Lei nº 200, do final dos

A intensaintervenção do Estado no

mercado acarretoudistorções crescentes nosanos 80 que se tornaram

insustentáveis nosanos 90.

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anos 1960, visou conferir maior fle-xibilidade à Administração Pública,principalmente por meio da criaçãode autarquias, fundações e empre-sas públicas, resultando, em parte,em grande desenvolvimento econô-mico até o final dos anos 1970 (PA-CHECO, 1999). Este é considerado oprimeiro esforço na direção de umareforma administrativa no País(ABRÚCIO, 1997).

Timidamente, a reforma começanos anos 1980, em meio a uma criseeconômica com seu auge no iníciodos anos 1990. Problemas como oajuste fiscal, as privatizações e aabertura comercial foram atacadosde frente. Já a reforma administrati-va só começou efetivamente em 1995com uma proposta de reformulaçãogerencial do Governo, a qual apon-tava para a direção da moderniza-ção do serviço público, da busca daeficiência e profissionalização, daconsolidação do ajuste fiscal e domelhor atendimento da necessida-de dos cidadãos (BRESSER PEREI-RA, 1999).

Essa direção procurou dotar osgovernos de condições para enfren-tar falhas históricas, trazendo aoEstado mais condições de governabi-lidade, aqui definida como a capa-cidade de governo eficaz na condu-ção dos negócios públicos, e gover-nança, entendida como a capacida-de de comando, direção, coordena-ção e implementação de distintaspolíticas com ambientes mais demo-cráticos e eficientes, atendendo me-lhor às demandas dos cidadãos aum custo menor (DINIZ, 1997).

Ainda entre os objetivos da refor-ma havia duas mudanças funda-mentais. A primeira dizia respeito àredução do aparelho do Estado,privatizando e publicizando ativi-dades que necessitavam ter sua for-ma de propriedade redefinida. A se-gunda referia-se à assimilação daadministração gerencial naquelessetores voltados para a prestação deserviços ao público ou de operacio-nalização de atividades de fomentoou fiscalização.

A Reforma Gerencial nos paísesda Organização para Cooperação eDesenvolvimento Econômico – OCDE,assim como em alguns países em

desenvolvimento, foi baseada naidéia de transferir mais autonomia emaior responsabilidade aos admi-nistradores públicos, tornando aadministração pública voltada parao cidadão-cliente (BRESSER PEREI-RA, 1999). Nas duas direções, a ins-piração vem da administração pri-vada, distinguindo-se dela porquenão objetiva o lucro, mas o interessepúblico. A Reforma Gerencial preten-de uma governança forte, resultantede um Estado sadio no plano fiscale financeiro e competente no planoadministrativo.

Uma outra abordagem interpre-tativa do processo de construção daNova Gestão Pública é apresentadapor Abrúcio (1997), segundo o quala mesma pode ser compreendida apartir da análise dos seguintes mo-delos.• o primeiro modelo é o gerencia-

lismo puro, baseado na economiae eficiência: “fazer mais com me-nos”;

• o segundo denominado consu-merismo, com foco na flexibi-lização da gestão, qualidade nosserviços e na prioridade às deman-das do consumidor: é o “fazermelhor”;

• e o terceiro, a Public Service Orien-tation (PSO), focada na noção deeqüidade, de resgate do conceitode esfera pública e da ampliaçãodo dever social de prestação decontas (accountability).Desta forma, o Programa da Qua-

lidade e Participação na Adminis-tração Pública surgiu estrategica-mente enquanto principal instru-mento de aplicação do Plano Dire-tor da Reforma do Estado no Brasil.A proposta deste Plano era a de in-troduzir no Setor Público novos va-lores e comportamentos recomenda-dos pela Administração PúblicaGerencial. Além disso, pretendia-se,através do programa, viabilizar arevisão dos processos internos daAdministração Pública para melho-rar sua eficiência e eficácia. Consi-dera-se neste trabalho que a Quali-dade Total no Serviço Público é par-te integrante do conjunto de inova-ções gerenciais propostas pelo NovoGerencialismo.

Os termos “qualidade” e “parti-

cipação” definem bem a orientaçãoe ênfase que se deseja dar às açõesque são desenvolvidas pelo progra-ma. Neste sentido, a estratégia deimplementação observa as diretrizesdos programas de qualidade, inter-pretados e aplicados segundo a óti-ca da administração pública. A par-ticipação significa o envolvimentode todos os servidores independen-temente de cargos, função ou nívelhierárquico, além do compromissoda cooperação entre todos os envol-vidos na direção da satisfação detodos os clientes da organização(BRESSER PEREIRA, 1999).

Bresser Pereira (1996) assinalaque o Programa veio estimular no-vos esforços no sentido da busca damelhoria da qualidade da ação go-vernamental, em especial as comfoco na redução de custo e na me-lhoria na qualidade do atendimen-to prestado ao cidadão. Como ins-trumento desta empreitada, sugerea adoção de um modelo referencialde administração pública gerencial,que funcione como sinalizador paraas organizações públicas que dese-jem a gestão por excelência.

De acordo com Mendes (2000), aqualidade, no contexto aqui estabe-lecido pela temática das GestõesPúblicas, é um modelo de gestão ino-vador, que tem como objetivo aumen-tar a produtividade, reduzir os cus-tos, obter a satisfação do cliente e ele-var a competitividade. “A qualida-de, na sua essência, é uma forma degerenciar uma organização” (MOR-GAN; MURGATROYD, 1994, p. 38)e, em decorrência disso, confunde-se com o próprio conceito de políti-ca de gestão.

Monteiro (1991) assinala que, tra-tando-se de órgãos e empresas daadministração governamental, o be-nefício final consiste na melhoria daqualidade de vida da sociedade.Pode-se afirmar, seguindo as viasdesse pensamento, que a qualidadeda gestão implica na qualidade devida de uma sociedade.

A gestão pela qualidade e a ges-tão por resultados constituem umaprescrição gerencialista (FISHER,2003). A Gestão da Qualidade é ummodelo que revolucionou a Admi-nistração, de acordo com o método

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desenvolvido pelo americano W.Edwards Deming, adotado pela in-dústria japonesa no período do pós-guerra, em 1950. Outros autores con-tribuíram para construir a estruturae a história do Total Quality Mana-gement (TQM), tais como Ishikawa,Crosby, Feigenbaun e Juran.

O instrumental deste processodefinido no programa brasileiro é acertificação. No contexto da gerên-cia de processos, este expediente éde fundamental importância para aclassificação do grau de qualidadee eficácia desses processos, funcio-nando como “selo de qualidade”pelos resultados obtidos e pela ga-rantia de continuidade na produçãodos mesmos padrões alcançados(BRASIL, 1997). Esta metodologiaviria a ser amplamente defendidainclusive no objeto de pesquisa des-te trabalho.

Por meio do Programa, espera-semelhorar a Qualidade dos ServiçosPúblicos produzidos no Brasil, alémde apoiar o processo de mudançacultural burocrática para uma cul-tura gerencial. A finalidade última éa melhoria da qualidade de vida docidadão. Afinal, como ressalta Mon-teiro, “[...] qualidade total significa,em última instância, qualidade devida”. Em resumo, é preciso concen-trar esforços em cada uma das eta-pas: “[...] qualidade do processo;qualidade do que é processado; qua-lidade de resultados; qualidade dequem processa; qualidade de vidapara quem usufrui” (MONTEIRO,1991, p. 152).

Para Mendes (2000), no setor deserviços e, em particular, na Admi-nistração Pública, o enfoque geren-cial é de grande importância para aqualidade. Neste setor, a qualidadedepende muito dos executantes daação e dos que sofrem a ação – o ci-dadão. Sendo assim a qualidadedeve ser vista transformando o ci-dadão agora em usuário. Como tam-bém cita Kettl (1998), o Estado passaa atender às necessidades do cida-dão e não à conveniência burocráti-ca. A exemplo de todo o mundo, oscidadãos reclamam de filas intermi-náveis, atendimento descortês e deregras arbitrárias.

Decorrentes dos movimentos re-

formistas, os programas da qualida-de na gestão pública ainda desper-tam discussão acerca de dois dile-mas. O primeiro diz respeito ao im-pulso de organizar os governos paraque funcionem melhor e custem me-nos. As táticas comumente utiliza-das orientam-se por interesses decurto prazo, eventualmente atrela-dos à lógica dos processos eleitorais,o que torna ainda mais difícil me-lhores resultados a longo prazo. Osegundo dilema está relacionadocom a necessidade da busca de re-sultados bons e rápidos, concomitan-temente com os cortes orçamentári-os inerentes aos esforços de ajustefiscal. Isto tem, freqüentemente, im-pedido melhorias de desempenhomais significativas, com destaquepara os processos contínuos de mu-danças, que exigem recursos subs-tanciais para a sua implementação,além do envolvimento de um gran-de número de atores neste processo(KETTL, 1998, apud SPINK, 1999).

MetodologiaPara avaliação do desempenho e

resultados do Programa e verifica-ção do seu alinhamento com os pre-ceitos da Reforma do Estado em cur-so no País, foi realizada uma pes-quisa de campo, durante o segundosemestre de 2004. Nessa ocasião oprograma já contava com mais dequatro anos de instituído, contem-plando mais de 1.500 licitações coma observância das exigências doQUALIOP. Assim, esta pesquisa in-vestiga os possíveis ganhos de pro-dutividade desde a contratação atéa execução das obras, fazendo umlevantamento da presença e do usode instrumentos de controle destina-dos a garantir a melhoria de resulta-dos nas obras contratadas a partirdo dia 1º de dezembro de 2001.

Desta forma, foram realizadasentrevistas estruturadas com ocu-pantes de cargos estratégicos nasorganizações contratantes e execu-toras que participam do QUALIOP.As questões foram elaboradas usan-do a escala de Likert, para classifi-car de maneira direta as respostasdos entrevistados, facilitando assima sua tabulação e interpretação. Asentrevistas versaram sobre aspectos

objetivos e subjetivos referentes aosganhos de qualidade nos procedi-mentos ligados à contratação e à exe-cução das obras públicas, desde osaspectos formais, gerenciais até osresultados concretos da implemen-tação do programa.

Para a avaliação dos resultadosdo QUALIOP, foram adotadas qua-tro dimensões de análise. A primei-ra refere-se à percepção e ao cumpri-mento dos prazos estabelecidospara cada fase dos dois processos –contratação e execução. A segundatrata da presença e evolução dositens de controle desenvolvidos peloprograma, identificando ocorrênci-as de desvios e problemas de opera-ção. A terceira dimensão caracteri-za-se pelo nível de satisfação e peloatendimento de expectativas doscontratantes quanto ao resultado fi-nal da obra. A quarta e última estárelacionada com a redução dos cus-tos das respectivas obras.

As entrevistas foram efetuadascom empresas e instituições que par-ticiparam ou foram afetadas de ma-neira decisiva pelo programa QUA-LIOP. Vale salientar que em todos oscasos, as pessoas entrevistadas fo-ram selecionadas em função dos car-gos de direção e controle que exerci-am nas organizações a que perten-ciam. Foram executadas 60 entrevis-tas, sendo 35 delas com os executan-tes e o restante com os contratantes.Até o dia 17 de novembro de 2003,data da última atualização dos re-gistros do QUALIOP, o Programacontava com um total de 578 empre-sas qualificadas em diversos níveisevolutivos e setores, indicando umaboa adesão da cadeia produtiva aoPrograma.

Resultados da PesquisaOs resultados obtidos através

desta pesquisa são a seguir apresen-tados, tendo por base as quatro di-mensões analisadas através da apli-cação do questionário: cumprimen-to de prazos, itens de controle, aten-dimento à sociedade e redução decustos.

No que tange ao cumprimento deprazos, a redução do tempo gasto eo atendimento de padrões nessasatividades é fundamental para evo-

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lução de todo o processo. Esse resul-tado é muito importante para as ati-vidades de governo. É sabido que aadministração pública é reconheci-damente lenta na execução de suasatividades, e evoluções desse com-portamento podem indicar que osesforços de reforma estão surtindoefeito e trazendo mudanças paraesse ambiente organizacional.

Apesar de 72% de todos os entre-vistados declararem que as datas doprocesso de contratação não foramrespeitadas, 74% dos entrevistadosdeclararam que houve evolução noprocesso de contratação com a im-plantação do QUALIOP, principal-mente com a adoção do edital-pa-drão de licitação. A Figura 1, a se-guir, ilustra melhor este resultado.

Os executantes e contratantesapontaram a melhor seleção de em-presas autorizadas a participar dosprocessos de compra como um dosmaiores benefícios gerados peloQUALIOP. Em contrapartida, a máqualidade dos projetos foi indicadacomo a principal responsável peloatraso no processo de contratação eexecução das obras. É necessáriodestacar que uma melhor seleção deempresas também pode significarganhos, tanto na reforma do Estadocomo na melhoria da qualidade deseus processos. As decisões de con-tratação de governo se baseavam naspráticas burocráticas ou no atendi-mento de interesses particulares,sem uma atenção maior para medira competência do contratado ou ava-liar os resultados finais da contra-tação (BRASIL, 1995).

Foi destacada também a dificul-dade de caixa do Estado para tocaras obras de forma conveniente. Nes-se caso, a falta de recursos para a exe-cução de obras já contratadas, comoassinalado por Osborne e Gaebler(1994), demonstra que o governo ain-da decide em cima de componentespolíticos transitórios. A visão de cur-to prazo e os diversos projetos execu-tados simultaneamente impedem queessas obras tenham o abastecimentode recursos necessários para a suaconclusão no tempo esperado, semtrazer prejuízos à sua execução.

Nas atividades ligadas ao contro-le das obras, os resultados foram

bem positivos. Na grande maioriadas empresas e no entendimento doscontratantes, existe um controle mai-or dos materiais e dos serviços en-volvidos nas obras, conforme de-monstra a Figura 2. Alguns entrevis-tados declaram que esta prática, an-tes do QUALIOP, era deixada emsegundo plano.

Nesse caso, o QUALIOP foi cer-tamente capaz de trazer mudançasorganizacionais para a cadeia pro-dutiva e o ambiente do governo. Anatureza estratégica e cultural dasmudanças que ocorreram com a im-plantação e o uso dessas práticas decontrole, mesmo sendo utilizadaspara atender à finalidade de contro-le documental do programa, indicasignificativa evolução na gestão des-ses dois componentes.

Um resultado positivo na melho-ria das práticas de controle sempreé bem-vindo, principalmente quan-

do esses instrumentos, oriundos daesfera pública, sempre foram enxer-gados pela sociedade como excessi-vos e associados a práticas exagera-damente burocráticas. A forma con-sensual como foram implantadosimpediu exageros e trouxe o apoiodos envolvidos, a ponto de ser apon-tado por eles como um ganho gera-do com a implantação do programa.O poder de compra do Estado foiutilizado com sucesso na promoçãode avanços de gestão e controle nacadeia produtiva da construção ci-vil no Estado da Bahia. O QUALIOPfuncionou como verdadeiro indutorda qualidade e competitividade des-sa indústria local.

No aspecto de atendimento à so-ciedade, abordando as funcionali-dades e durabilidade das obras, asconseqüências não foram animado-ras. Segundo a percepção dos entre-vistados, o Programa ainda não che-

Figura 1 – Gráfico sobre o cumprimento de prazos de contratação execu-ção de obras.Fonte: Elaboração própria.

Figura 2 – Gráfico sobre a contribuição para a melhoria nas práticas decontrole e execução das obras públicas.Fonte: Elaboração própria.

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gou a esse nível de envolvimento,sendo que este aspecto também de-pende de projetos bem elaborados.É interessante notar que o novogerencialismo público prega um me-lhor atendimento às demandas dasociedade e, para isso, a melhoriadesses dois itens das obras públicasseria um passo importante.

Tanto a durabilidade quanto afuncionalidade foram aspectos quenão encontraram um posicionamen-to firme por parte dos entrevistados.Cabe ressaltar, no entanto, que opouco tempo decorrente entre aimplementação das obras avaliadase a realização desta pesquisa contri-buiu para este nível de desconheci-mento. As obras são novas e estesdois fatores dependem de um maiorintervalo de tempo para que possamser analisados. Os resultados sãoapresentados na figura 3.

Considerada a relevância destespreceitos da reforma do Estado, a

aferição da efetividade das ações degoverno e de seu desempenho, asso-ciados à implantação de uma cultu-ra gerencial, ainda precisam, nestecaso, de mais tempo para a sua veri-ficação.

A redução de custo, fator de inte-resse público, determinado pelosobjetivos de eficiência da adminis-tração pública gerencial e defendi-do pelo Plano Diretor de Reforma doEstado (BRASIL, 1995), foi certamen-te um ponto avaliado negativamen-te. Quase a totalidade dos entrevis-tados respondeu negativamente so-bre este aspecto como demonstra afigura 4. Neste caso, os conceitos de-batidos por Abrúcio (1997) quanto a“fazer mais por menos” ou à “pres-tação de contas” ainda não são con-templados pelo Programa.

Considerações FinaisO QUALIOP pode ser entendido

como um modelo de gestão inserido

no processo de reforma do estado. Foivisto, ao longo deste artigo, que o pro-cesso de reforma desenvolvido pelogoverno brasileiro, a partir no PlanoDiretor de Reforma do Estado de 1995,estava voltado para a consecução dealguns objetivos. Os principais são:o aumento da governança e governa-bilidade, dotando o governo de mai-or eficiência e eficácia, a redução dotamanho do estado, focando-o nasações que lhe são próprias, a transfe-rência de algumas das ações do go-verno central para os outros membrosda federação e a assimilação de prá-ticas gerenciais mais efetivas.

O modelo de gestão pela quali-dade utiliza-se de princípios inova-dores, em que se procura efetuar aredução de custos, o aumento daprodutividade e a conseqüente dimi-nuição de eventuais desperdícios. Ofoco central desse programa é a sa-tisfação dos clientes e a conseqüen-te melhoria da competitividade. AQualidade Total no ambiente gover-namental está associada à melhoriade atendimento ao cidadão. Nestecaso, é totalmente compatível com osmandamentos da Reforma do Esta-do. Estes e outros princípios centraisda Gestão pela Qualidade, como oincremento dos mecanismos de con-trole, foram medidos na pesquisa decampo, e comparados com os resul-tados alcançados com a implanta-ção do QUALIOP.

Em especial, foram registradosimportantes aperfeiçoamentos naspráticas de execução e controle dasobras, mesmo que, eventualmente, ocumprimento dos mandamentos doQUALIOP sejam encarados por al-guns como o mero atendimento acondicionantes burocráticos, man-tendo as empresas aptas a partici-par dos certames licitatórios. Outroganho importante está relacionadocom a melhoria do processo decontratação das obras. Mesmo comum alto percentual de entrevistadosdeclarando que os prazos não aten-deram à sua expectativa, um grandecontingente também declarou quehouve avanços significativos, prin-cipalmente no que se refere às atitu-des relacionadas com a padroniza-ção de processos.

Não obstante, observou-se que o

Figura 3 – Gráfico sobre a contribuição do QUAILOP para que as obrasatendam melhor a sociedade.Fonte: Elaboração própria.

Figura 4 – Gráfico sobre a contribuição do QUALIOP para a redução doscustos das obras públicas.Fonte: Elaboração própria.

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efetivo atendimento aos anseios docliente final do QUALIOP, o cida-dão, ainda não pode ser constatado.É prematuro afirmar qualquer coisasobre as funcionalidades e durabili-dade das obras ou aos custos demanutenção relacionados. Além dis-so, o modelo de contratação que pri-vilegia só o preço, como ainda é ocaso das obras públicas, não contri-bui para o incremento desses aspec-tos. Sendo assim, é difícil estabele-cer considerações sobre a utilidadedas obras. Isto ainda não é objeto doPrograma e sem dúvida não existe,dentro do escopo de suas atividades,resultados que demonstrem evolu-ção nesse sentido. Os resultadosmenos favoráveis, no entanto, estãoligados à variável custo. O progra-ma QUALIOP ainda não foi capazde reduzir o gasto do governo comessa atividade, tanto na execuçãoquanto na manutenção. Não foi pos-sível identificar efetivamente pro-gressos nesta área.

Adicionalmente, cabe observarque a dificuldade financeira que ogoverno local atravessou durante operíodo em exame parece ser apon-tada como a maior responsável pelonão cumprimento de prazos dasobras e pela manutenção de práti-cas ainda fora dos padrões da ges-tão pela qualidade. Por fim, cabe res-saltar que o QUALIOP mostrou-semais presente como instrumento decontrole de processos, o que refletemais diretamente as premissas domodelo burocrático de gestão públi-ca, e menos efetivo na obtenção deresultados finais, compatíveis comas diretrizes da administração pú-blica gerencial. Tratando-se, porém,de um programa relativamente re-cente, talvez seja necessário um mai-

or prazo de maturação para que osseus resultados finais sejam alcan-çados. Com a continuidade e evolu-ção deste modelo de gestão, ensejan-do a gradativa prevalência dos prin-cípios gerais da gestão da qualida-de entre contratantes e executantesde obras públicas no Estado da Bahia,é esperado um progressivo atendi-mento aos seus propósitos precí-puos, estendendo os seus benefíciosà sociedade.

Constata-se, portanto, atravésdesta pesquisa, a elevada dificulda-de para o efetivo estabelecimento deum estado gerencial, capaz de ori-entar-se por seus objetivos finais ede afastar-se de uma tradição buro-crática que impõe limites objetivos asua condição de eficácia e eficiên-cia. Não obstante, reflete também acrescente prioridade concedida àconstrução de programas voltadospara tal, o que nos permite esperarmelhores resultados em um futuronão muito distante.

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ResumoO artigo realiza uma análise es-

trutural do setor de supermercadosem Salvador, apresentando conside-rações teóricas, legais e mercadoló-gicas, relativas ao nível de rivalida-de, aos padrões de concorrência,concentração do mercado, níveis debarreiras à entrada, e levantamentodas técnicas de defesa da concorrên-cia utilizada pelos órgãos regulató-rios, numa tentativa de compreen-der as razões para a fraca penetra-ção das grandes cadeias de varejointernacional e nacional no merca-do relevante de Salvador, em funçãodo amplo processo de expansão, ado-ção de estratégias competitivas einternacionalização vigente no setorde supermercados. Neste sentido,são apresentadas as condições con-correnciais, efetivas e potenciais doreferido mercado relevante, na ten-tativa de obter informações e estabe-lecer relações de causalidade quepossam identificar e responder aosquestionamentos acima apresenta-dos. Para tanto, torna-se imprescin-dível analisar o contexto na qual es-tão inseridas as empresas supermer-cadistas de Salvador, a partir do es-tudo das forças estruturais quecondicionam as estratégias e o com-portamento das firmas atuantes nes-ta indústria.

Palavras-chave: Entrantes potenciais;Barreiras à entrada; Concentração domercado, Mercado relevante; Oligo-pólio; Estrutura de mercado.

Abstract:This article presents a structural

analysis of the supermarket sector,presenting theoretical, legal andmarket considerations related to the

level of rivalry, to the competitionpatterns, market concentration, levelof barriers to new entrances and apresentation of the competitiondefense techniques used by the regu-latory organs, in an attempt to under-stand the reasons for the weak pene-tration of the big chains of nationaland international retail in the rele-vant market of Salvador, regardingthe ample process of expansion,adoption of competitive strategiesand internationalization in vigor inthe supermarket sector. This way, itis presented herein effective andpotential competition conditions ofthe referred relevant market, in theattempt to obtain information andestablish causality relationshipswhich can identify and respond thequestions presented above. In orderto do that it is essential to analyzethe context in which the supermarketfirms in Salvador are inserted, fromthe study of structural forces whichcondition the strategies and thebehavior of the acting firms in thisindustry.

Key-words: Potential newcomers; Bar-riers to entrance; Market concentration;Relevant market; Oligopoly; Marketstructure.

1. IntroduçãoNeste artigo pretende-se analisar

a estrutura de mercado e os padrõesde concorrência vigentes no setor desupermercados em Salvador, a par-tir das tendências de internacionali-

zação do varejo. Neste sentido, ini-cialmente são feitas considerações eapresentados alguns fatos estiliza-dos que condicionam o processo evo-lutivo e das transformações estrutu-rais ocorridas na indústria de super-mercados nos últimos tempos. Comessas referências procura-se estabe-lecer uma análise do mercado rele-vante do setor supermercadista emSalvador, definindo-se a dimensãodo produto e o mercado geográfico,que fazem parte do raio de abran-gência desta indústria2 em Salvador.

Complementarmente, faz-se umarevisão da literatura de alguns aspec-tos concernentes à rivalidade e aospadrões de concorrência nos merca-dos e sua aplicabilidade no setor desupermercados em Salvador para, aposteriori, considerando-se as técni-cas utilizadas pela SEAE (Secretariade Acompanhamento Econômico) epelo CADE (Conselho Administrati-vo de Defesa Econômica) na avalia-ção de práticas anticompetitivas, ve-rificar se existe nexo causal entre onível de concentração do setor super-mercadista de Salvador e as barrei-ras à entrada de novas firmas.

Neste contexto, são apresentadosalguns aspectos que constituem fa-tores determinantes e explicativos darivalidade no setor de supermerca-dos no Brasil, utilizando-se comoreferencial teórico a literatura deOrganização Industrial (visão mi-croeconômica) e da Legislação Bra-sileira Antitruste (pareceres da Se-

ESTRUTURA DE MERCADO E PADRÕES DECONCORRÊNCIA: BARREIRAS À ENTRADA NO

SETOR DE SUPERMERCADOS EM SALVADOR

Cláudio Damasceno Pinto1

1 Economista –FCE-UFBA, Especialista em Finanças –EPGE-FGV e Mestrando em Análise Regional –UNIFACS, Coordenador do Curso de Gestão Mercadológica e Professor da disciplina Economia eMercado dos Cursos de Graduação Tecnológica da IBES. Email: [email protected];Telefone (71) 9967 2521

2 Conceito da microeconomia, caracterizado pelo conjunto de firmas atuantes num mesmo mercado.

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cretaria de Acompanhamento Eco-nômico sobre atos de concentração edefesa da concorrência no setorsupermercadista brasileiro e análiseeconômica de práticas ou condutaslimitadoras da concorrência, funda-mentada na Lei n° 8.884, de 11 dejunho de 1994). Esses trabalhos sãofortemente influenciados pela corren-te neo-schumpeteriana da firma, ver-tente do pensamento econômico quedireciona seus estudos para as ques-tões relacionadas à competitividadenos mercados, sobretudo em estrutu-ras oligopolísticas, destacando tam-bém aspectos da teoria da firma e daregulação econômica.

2. Principais aspectos e con-dicionantes do varejo bra-sileiroAs operações do setor varejista,

tradicionalmente, se caracterizavampor atributos pouco difundidos, re-duzido poder de mercado, poucadisputa concorrencial e competên-cias gerenciais limitadas. O setorindustrial dominava e coordenavatoda a cadeia produtiva, de tal ma-neira que, aos varejistas, cabiam ape-nas a função de agente intermediá-rio entre a indústria e o mercado, re-passando para os consumidores osprodutos que ali chegavam.

Esta situação começou a ser mo-dificada pelo poder emergente dasgrandes cadeias de varejo como aSears, nos Estados Unidos, ou aMarks & Spencer na Inglaterra que,em âmbito nacional, dominavam

uma grande parcela do mercado,sendo capaz de gerenciar a distri-buição dos produtos que negocia-vam. Essas grandes operações devarejo, tendo em vista a concentra-ção de mercado estabelecida, deslo-caram o poder de mercado do forne-cedor para o varejista (DIB, 1997).

Assim, na década de noventa, osetor supermercadista ganha impor-tância, ocorrendo uma transferênciade poder da indústria para o varejo.Algumas cadeias de supermercadostêm superado, em tamanho ou emfaturamento, diversas firmas do se-tor industrial, consideradas, ao lon-go da história, como as principaisresponsáveis pelo crescimento daseconomias capitalistas. O tamanhocrescente das cadeias de varejo esti-mulou as estratégias de expansãointernacional, de tal maneira que asreceitas obtidas nos mercados do-mésticos e a própria magnitude dastransações realizadas permitiram odesenvolvimento de competênciasgerenciais específicas, capaz de ala-vancar a internacionalização dasgrandes empresas do referido setor.

O varejo internacional, portanto,deixou de ser algo impulsionadoapenas pelas limitadas perspecti-vas de crescimento doméstico. Doponto de vista das firmas, a inter-nacionalização passou a se consti-tuir numa oportunidade de expan-são da base operacional para no-vos mercados, nos quais, os pro-dutos e serviços são valorizadospor uma intocada base de consu-midores, possibilitando maioreseconomias de escala e incrementodos lucros (DIB, 1997, p.4).

O aprofundamento da interna-cionalização, sobretudo no Brasil,provocou profundas transformaçõesna estrutura do mercado nacional eno interior das firmas, que estavamacostumadas a uma concorrênciadoméstica, muitas vezes regional,apresentando atributos pouco sofis-ticados, sem muita inovação, e es-trutura administrativa baseada nagestão familiar. Com a entrada deredes estrangeiras no setor as cadei-

as varejistas nacionais sentiram anecessidade de se adequar ao novocenário competitivo que se configu-rava já no início da década de no-venta.

Nos últimos anos, o número defusões3 e aquisições no varejo de ali-mentos cresceu rapidamente e o mer-cado brasileiro vem sendo uma dasalternativas para o aumento da par-ticipação externa. O crescimento ex-terno está associado a estratégias dediversificação, tendo em vista a pe-netração em mercados pouco explo-rados, mas com amplo potencial aser desenvolvido, conjugada a pró-pria necessidade de conseguir eco-nomias de escala e escopo.

Desde o começo da década de1990, com a entrada do grupo va-rejista Wal- Mart, até os dias atuais,percebe-se profundas transforma-ções que influenciam diretamentena configuração e dinamismo dosetor supermercadista no Brasil. Achegada deste grupo no Brasilpode ser considerada como umaterceira revolução no mercado, se-melhante à introdução do auto-ser-viço na década de 1950 com a redePeg-Pag, do grupo Pão de Açúcare a chegada dos hipermercadosCarrefour na década de setenta(PINTO, 2000 p.5).

A concentração do capital, fun-damentada no processo de globali-zação econômica, reduz o número defirmas atuantes no mercado, estimu-lando a competição entre as empre-sas “sobreviventes” que, em geral,possuem vantagens absolutas decusto, aporte financeiro, maioreseconomias de escala e vantagens dediferenciação de produtos e servi-ços. Por outro lado, a diminuição deempresas na indústria através defusões e aquisições das redes meno-res pelas empresas competitivas domercado cria barreiras à entrada denovos concorrentes e, conseqüente-mente, permite a formação de oligo-pólios bastante concentrados.

Assim, como os investimentos emmodernização e expansão deman-dam muitos recursos, a abertura decapital e associação com empresas

As operaçõesdo setor varejista,

tradicionalmente, secaracterizavam por

atributos poucodifundidos, reduzido

poder de mercado, poucadisputa concorrencial e

competências gerenciaislimitadas...

3 A fusão se caracteriza pela união de duas ou mais empresas, formando uma grande firma, cujocontrole administrativo geralmente é designado pela maior empresa (envolvida no processo) oupara a organização melhor posicionada economicamente (SANDRONI, 1999).

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estrangeiras são algumas das estra-tégias que vem sendo adotada pelasredes domésticas. Para as empresasestrangeiras, a penetração em mer-cados internacionais via aquisiçãoou fusão é mais vantajosa, pois ace-lera o conhecimento do mercado edos hábitos dos consumidores, ad-quirindo uma rede ou participandode uma firma já estabelecida no mer-cado, sem a necessidade de incorrerem vultosos custos de publicidade epropaganda na divulgação e fide-lização da marca.

Da mesma forma, esse processode associação facilita a exploraçãode sinergias, a conquista de marketshare e a entrada em novos merca-dos, no qual as empresas adquiri-das possuíam significativas partici-pações, superando rapidamente aetapa, em geral demorada, de culti-var o nome, fidelizar os clientes e,principalmente, formar canais dedistribuição e suprimento.

No caso do setor de supermer-cadista brasileiro, a luta competiti-va encontra-se diretamente associa-da a globalização da concorrênciaque impôs dificuldades e desafiospara as redes domésticas que tive-ram de realizar grandes investimen-tos ou alianças estratégicas paramanter e ampliar seu posicionamen-to no mercado. Neste contexto, exis-te uma relação de causalidade entreo processo de internacionalização ea formulação de estratégias na in-dústria de supermercados, mostran-do que são as estruturas de mercadoque condicionam as decisões de in-vestimento das firmas. No tocante aosetor supermercadista, são as forçasestruturais do mercado que determi-nam a conduta das empresas no in-terior da indústria.

As modificações provocadas nasestruturas da indústria de supermer-cados no Brasil, a partir da concen-tração do varejo, culminando com onúmero cada vez maior de firmas es-trangeiras disputando o mercadocom as redes nacionais, tem estabe-lecido um ambiente seletivo, no qualsomente as firmas bem posicionadas,com maior disponibilidade de fun-dos para a expansão, condutoras deinovações organizacionais e tecno-lógicas, conseguem permanecer nomercado.

A dimensão da concorrência é oparâmetro que orienta e condicio-na os movimentos competitivosdas firmas rivais e o próprio funci-onamento da economia capitalis-ta. O esforço relevante para a aná-lise da concorrência não se consti-tui num elemento estático, sendoconstantemente redelineado, a par-tir da evolução da indústria e con-seqüentemente das transformaçõesocorridas no comportamento dosagentes econômicos, os quais, deacordo com o cenário econômico,estabelecem novas metas, táticas eestratégias (POSSAS, 1999, p.69).

A estrutura de mercado se consti-tui num fator importante na análiseda decisão de investimento da firma,principalmente em indústrias extre-mamente concentradas, nas quais asempresas podem utilizar o investi-mento em capital fixo para impedir aentrada de novos competidores nomercado, ou seja, o investimento podeser utilizado como uma fonte de bar-reira à entrada. Assim, as inversõesem capital fixo pode sinalizar paraas entrantes potenciais que as firmasestabelecidas estão dispostas a reta-liar a entrada de qualquer novo con-corrente (OREIRO, 1997).

Em nível regional, percebe-seuma maior competição entre as em-presas localizadas no Centro-Sul dopaís através de uma vigorosa dispu-ta por consumidores. Redes comoCarrefour, Pão de Açúcar e Wal-Martadotam estratégias ousadas paraatrair compradores em suas lojas,envolvendo até guerra de preços en-tre as firmas varejistas. Entretanto,as armas usadas nesta disputa nãose resumem apenas a preços e pro-moções, existindo atributos como aqualidade no atendimento aos clien-tes, automação e modernização daslojas, criação e expansão de novosformatos de lojas e facilidade nasformas de pagamentos.

3. Estrutura do setor de super-mercados no mercado rele-vante de SalvadorNo Estado da Bahia, mais preci-

samente em Salvador, grande centrovarejista, não se verifica muita com-petição entre as redes varejistas. Oreduzido número de grandes cadei-as existentes e a própria concentra-ção do Bompreço nesta área impe-dem o desenvolvimento de umamaior competitividade e movimen-tos estratégicos agressivos em bus-ca de novos consumidores.

Neste sentido, a análise estrutu-ral da indústria de supermercadosem Salvador permite identificar ummercado caracterizado por um oligo-pólio4 concentrado e com pequenasfranjas (formada por pequenas lojasde vizinhança que não possuem osmesmos atributos das principais re-des pertencentes ao mercado rele-vante), existindo a presença de fir-mas estrangeiras, a exemplo do Wal-Mart, cuja entrada foi realizada viaaquisição da rede Bompreço em2004, sem provocar grandes altera-ções na estrutura de mercado vigen-te em função de que, nesta transa-ção, houve apenas a mudança doagente econômico.O processo de con-centração deste setor em Salvadornão se constitui num movimento re-cente, sendo estabelecida ao longodo tempo, onde o Bompreço aden-trou neste mercado comprando arede Paes Mendonça5 e a posterioripromoveu, a partir de estratégiasempresarias e influenciada pelo pro-cesso de concentração dos merca-dos, um movimento de expansão,adquirindo firmas médias locaiscomo o PetiPreço, além da firma G.Barbosa que possuía uma loja nestacidade.

Esse processo de concentraçãoestabelecido pelo Bompreço em Sal-vador produz dois efeitos sobre o

4 Tipo de estrutura de mercado na qual poucas empresas detém o controle da maior parcela do mer-cado. Reflete a tendência à concentração da propriedade em poucas empresas de grande porte, pelafusão entre elas, incorporação ou eliminação das pequenas firmas (por compra, dumping e outraspráticas restritivas. Tipo de mercado caracterizado pela existência de barreiras à entrada, na qual asfirmas atuantes normalmente competem via diferenciação do produto ou vantagem de custo, apresen-tando economias de escala, acesso aos canais de distribuição e não há perfeita mobilidade dos fatoresde produção. (SANDRONI, 1999).

5 Na década de 1980, a rede de supermercados Paes Mendonça dominava cerca de 80% do setor desupermercados em Salvador.

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aspecto concorrencial e competitivodo setor supermercadista soteropoli-tano, tendo em vista que a aquisiçãode empresas locais (ainda que nãopossuam o porte da firma líder, com-petiam em determinadas áreas geo-gráficas da cidade compreendidapelo mercado relevante) impede apenetração de potenciais entrantese ao mesmo tempo elimina um con-corrente, o qual foi absorvido no pro-cesso de aquisição.

Ao analisar as estratégias empre-sariais adotadas pelo Bompreço nosúltimos tempos, observa-se que estaempresa mantém uma posição de-fensiva em relação à concorrência,na medida em que possui cresci-mento restrito a região nordeste, nãose expandindo a outras áreas dopaís, para disputar novos consumi-dores. Assim, além de não atuar emoutros mercados, o Bompreço pos-sui condições de estabelecer barrei-ras estruturais à entrada de novasfirmas que possam ocupar sua lide-rança, seja através de economias deescala, vantagens de custo ou atémesmo pelo poder da marca, fideli-zando clientes.

Desta forma, como até então nãoexiste grande rivalidade entre as re-des no mercado soteropolitano, écorreto afirmar que as decisões deinvestimento do Bompreço estão di-retamente condicionadas aos movi-mentos dos entrantes potenciais quesinalizam uma provável penetraçãono setor supermercadista nordesti-no. Entretanto, a inexistência de ou-tras grandes e médias redes de su-permercados disponíveis para a re-alização de fusão ou aquisição porparte de uma grande cadeia varejis-ta nacional ou internacional, bemcomo a concentração de mercadoexercida pelo Bompreço, dificulta aentrada de novas firmas no merca-do relevante de Salvador.

Definido como o menor grupo deprodutos e/ou serviços e a menor áreageográfica necessária para que umasuposta firma esteja em condições deimpor aumentos de preço, o mercadorelevante se constitui num atributocrucial para a análise dos efeitosanticompetitivos potenciais de ope-rações que impliquem concentraçãode mercado e/ou condutas pratica-

das por empresas que se supõem de-tentoras de poder de mercado, cujoexercício abusivo incumbe à legisla-ção antitruste e às agências de defesada concorrência, estabelecendo me-canismos regulatórios que visam as-segurar o bem-estar econômico6.

Na determinação do mercado re-levante7 da cidade de Salvador, uti-lizamos as orientações e os parâ-metros adotados pela SEAE (Secre-taria de Acompanhamento Econô-mico do Governo Federal) nos pare-ceres sobre atos de concentração dosetor de supermercados. Este tipo decomércio varejista é conhecido comode auto-serviço ou auto-atendimen-to, em que o consumidor escolhe osprodutos que deseja adquirir, que seencontram acondicionados em gôn-dolas, e efetuam o pagamento dire-tamente nos caixas (BRASIL, 2004).

Neste sentido, caracteriza-se umsupermercado como um estabeleci-mento que apresenta suas principaisáreas de vendas constituídas demercearia, bazar e perecíveis, cercade 1.500 a 5.000 itens em exposição;de 3 a 40 check-outs8 e mais de 300m²de áreas de vendas e um faturamentoanual acima de R$ 1 milhão de reais;enquanto que um hipermercado édefinido como a unidade em quesuas principais seções de vendas sãoconstituídas de mercearia, bazar, pe-recíveis, têxteis e eletrodomésticos,compreendendo mais de 5.000 itensem exposição, mais de 40 check-outse mais de 5.000 m² de áreas de ven-das e um faturamento anual de nomínimo R$ 12 milhões de reais(BRASIL, 2003).

O horizonte de análise estudadoé o setor de super e hipermercados,de modo que o conceito de lojas devizinhança, mercearia, feiras, açou-gues e correlatos, ainda que possamrepresentar uma concorrência par-cial com o referido setor, não fazem

parte do mercado relevante. Isto por-que, o tipo de consumo que se prati-ca nesses pequenos estabelecimen-tos, via de regra, é o de conveniên-cia, na qual são realizadas peque-nas compras que suprem necessida-des imediatas, de tal maneira que osconsumidores não podem efetuar omesmo tipo de compra integrada pro-porcionada pelo supermercado ouhipermercado, se defrontado, por-tanto, com uma situação de substitu-tibilidade incompleta ou de menorgrau (BRASIL, 2003).

Do ponto de vista do espaço geo-gráfico, o mercado relevante de Sal-vador, compreende uma populaçãode 2.443.107 habitantes, de acordocom dados do IBGE em 2000, distri-buídos numa área de 325 km², ca-racterizada por uma população comdiferentes faixas de renda. Do pontode vista estratégico, as lojas de su-permercados apresentam localiza-ções privilegiadas, existindo umaestratégia de segmentação de merca-do em função de determinadas loca-lidades, fundamentado na deman-da e no perfil do consumidor.

Partindo de uma percepção me-nos restritiva, em 2003, a SEAE defi-niu para o mercado relevante de Sal-vador a hipótese de que o consumi-dor típico desloca sua demanda emdireção a outros estabelecimentossituados em um raio de 5 Km, a par-tir do ponto médio da área de con-centração das lojas, tendo em vistaque segundo esses estudos, essa é adistância máxima capaz de motivaro deslocamento do consumidor, umavez que corresponde ao raio de in-fluência de um hipermercado, con-forme tabela 1.

A análise dos dados acima, con-jugada com a concentração do setorde supermercados soteropolitano,favorecida também pelo processo deaquisição de redes médias e peque-

6 Por essas razões, a finalidade da política de defesa da concorrência é assegurar condições estru-turais para o adequado funcionamento dos mercados, preservando a livre iniciativa dos agenteseconômicos. Em última análise, o controle de concentrações deve restringir-se a evitar a formaçãode estruturas de mercado capazes de gerar prejuízos à eficiência econômica e/ou ao bem-estarsocial (BRASIL, 2004).

7 Cabe destacar que o conceito de poder de mercado afeta diretamente a própria delimitação domercado relevante, tendo em vista que o mesmo é definido como um lócus (produto/região) em queo poder de mercado possa ser hipoteticamente exercido, de tal maneira que as elasticidades-preçoda demanda e da oferta são os principais fatores dessa delimitação.

8 Caixas, pontos de vendas onde são registradas as mercadorias vendidas aos consumidores.

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nas na cidade de Salvador, nos últi-mos cinco anos, sobretudo por partedo Bompreço, possivelmente, afetouo comportamento do consumidor, nosentido de que antes das operaçõesde compra e venda, a exemplo dosnegócios envolvendo a rede PetiPreçoe G. Barbosa, o cliente tinha a opçãode realizar suas compras nas referi-das firmas, no Bompreço e nos con-correntes, e após as mesmas, o clien-te passou a ter uma opção a menos,encontrando-se, a partir daí, em piorsituação. Do mesmo modo, com 45lojas espalhadas pela cidade, a redede supermercados Bompreço domi-na a indústria de Salvador, de tal ma-neira que só existe competição em pe-quenos espaços compreendidos pelomercado relevante.

A competição em preços é um ele-mento fundamental no setor super-mercadista, visto que o consumidor,ao efetuar suas compras, costumafazer suas escolhas sobre a econo-mia que, potencialmente, pode rea-lizar. A acentuada rivalidade entreos concorrentes no que tange à com-petição em preços favorece ao bem-estar social e econômico dos consu-midores. Entretanto, no mercado re-levante de Salvador, a intensidadeda rivalidade é relativamente baixa,não existindo guerra de preços en-tre as redes, que apresentam partici-pações desiguais no mercado. Pre-sente em quase todos os estados nor-destinos, o Bompreço é líder absolu-to em Salvador e não há grandescompetidores para disputar o mer-cado em igualdade de forças.

Outro fator fundamental que in-fluencia a rivalidade, é o grau de di-ferenciação do produto ou serviçocriado pelas estratégias das empre-sas. No setor supermercadista, a di-ferenciação se constitui numa estra-tégia convergente entre as firmas, asquais investem cada vez mais nomarketing voltado para os clientes,

otimização da área de vendas,melhorias na qualidade do atendi-mento, ampliação das formas de cré-dito, que se constituem em atributosimportantes para conquista de no-vos consumidores (PINTO, 2000).

A partir de uma perspectiva di-nâmica, o desempenho no mercadoe a eficiência produtiva decorrem dacapacitação acumulada pelas fir-mas, que, por conseguinte, reflete asestratégias competitivas adotadasem função de suas percepções quan-to ao processo concorrencial e aomeio ambiente no qual estão inseri-das. Os padrões de concorrência9 sãoinfluenciados pelas característicasestruturais e comportamentais doambiente competitivo da firma, se-jam as referentes ao setor (mercadode atuação), sejam relacionados aopróprio sistema econômico (FER-RAZ et alii, 1995).

O setor supermercadista de Sal-vador, ao longo dos anos, não temsido alvo das grandes cadeias vare-jistas nacionais e internacionais, asquais tem realizado pesados inves-timentos para disputar fatias domercado brasileiro. Isto porque, emfunção do grande participaçãoexercida pelo Bompreço nesta cida-de, historicamente, não há grandeinteresse das empresas em adentrarneste mercado. Além da falta de es-paço físico, a consolidação do Bom-preço em quase todas as áreas domercado relevante tem inibido supos-tas tentativas de potencias entrantesnesta região.

4. Concentração do mercadoA concentração do mercado é

uma condição necessária para deter-minar a possibilidade estrutural de

existência de poder de mercado. Aliteratura econômica define que opoder de mercado é função crescen-te da concentração, em função dapossibilidade de maior colusão edomínio do setor. Entretanto, estarelação de causalidade não se cons-titui numa condição suficiente paraa verificação do exercício do poderde mercado, existindo outras variá-veis e métodos de avaliação para acomprovação efetiva de práticasanticompetitivas por parte de umadeterminada firma. Do mesmo modo,acredita-se existir uma correlaçãopositiva entre a concentração domercado e os níveis de barreiras àentrada como instrumentos de infe-rência e análise da existência efeti-va de poder de mercado.

De acordo com Possas et alii(1998), uma condição adicional de-cisiva para a avaliação do poder demercado é o nível das barreiras àentrada, apesar de não ser mensu-rável diretamente. Afirma-se que naausência de barreiras à entrada, porexemplo, se não houver custos irre-cuperáveis numa indústria, não épossível fixar preços acima dos cus-tos de forma persistente e significa-tiva. Desta forma, o nível das bar-reiras à entrada se constitui numavariável fundamental de análiseantitruste, não apenas para atos deconcentração (fusões e aquisições),horizontais e verticais, como tam-bém para condutas, já que a suapresença constitui um segundo fa-tor necessário, ainda que não sufi-ciente, para o exercício de poder demercado.

A Secretaria de Acompanhamen-to Econômico do Governo Federalatravés do embasamento legal doArt. 20 da Lei 8.884/94 define crité-rios para identificar se a concentra-ção gera o controle de parcela demercado elevada:• considera-se que uma concentra-

ção gera o controle de participa-ção de mercado suficientementealta para viabilizar o exercíciounilateral do poder de mercado

Tabela 1 -– Dimensões típicas da área de influência de supermercados

Tipo de loja Nº de check-outs Área de influência (Km)

Supermercado pequeno De 03 a 19 1.8Supermercado grande De 20 a 39 2.5Hipermercado 40 ou mais 5.0

Fonte: SEAE, 2003

9 Os níveis de competição em indústrias concentradas podem se alterar como resultado de modifica-ções nas posições relativas das firmas. O corolário deste processo é a diminuição do número defirmas atuantes no mercado, realização de fusões, joint venture e aquisições entre firmas indepen-dentes, de modo que apenas as maiores empresas sobrevivem na arena competitiva (KON, 1994).

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sempre que resultar numa parti-cipação igual ou superior a 20%do mercado relevante;

• admite-se que uma concentraçãogera o controle de parcela de mer-cado suficientemente alta paraviabilizar o exercício coordenadodo poder de mercado sempre que:a concentração tornar a soma daparticipação de mercado das qua-tro maiores empresas (C4) igualou superior a 75%; a participaçãoda nova empresa formada forigualou superior a 10% do merca-do relevante.De acordo com Possas et alii

(1998), uma estrutura de mercadosomente será eficiente, do ponto devista da maximização do bem estar-social, se a entrada for possível, sen-do impedida apenas pela políticade preços das empresas presentesno mercado. Neste sentido, a efi-ciência da estrutura de mercadodependerá do nível das barreiras àentrada10 e a saída na indústria,ou seja, de seu grau de contestabi-lidade11.

De acordo com (FARINA, 1990apud BASSO; SILVA, 2000, p. 1):

Considera-se um mercado comosendo contestável, quando nãohouver barreiras à entrada nemcustos à saída (sunk-costs) para asfirmas que eventualmente nele de-sejem ingressar. As empresas neleatuantes não estão protegidas deeventuais entradas do tipo hit andrun, firmas de fora que, atraídaspor lucros extra-econômicos dessemercado, nele ingressem e obte-nham lucro, isso ocorrendo antesque as firmas estabelecidas te-nham tempo de sair do negócio oumesmo alterar seu preços. Para queum determinado mercado seja con-testável, é necessária a maiorhomogeneização possível dos pro-dutos e o livre acesso aos métodosde produção para todos os produ-tores, que devem ter acesso à mes-ma tecnologia e possuírem a mes-ma demanda de mercado.

A análise das firmas atuantes nosetor supermercadista de Salvador,permite observar a desproporção domercado em termos de market share,demonstrando uma dificuldade dese implementar uma maior rivalida-de inter-firmas e uma maior compe-tição neste mercado. Algumas supo-

sições e considerações podem serfeitos em relação às firmas atuantesno setor de supermercados em Sal-vador e ao potencial destas empre-sas em estabelecer uma competiçãomais vigorosa com as principais re-des atuantes neste mercado, sobre-tudo em relação ao Bompreço, con-forme se observa na tabela 2.

Neste sentido, a rede de super-mercados Extra, bandeira pertencen-te a Companhia Brasileira de Distri-buição, maior empresa do setor desupermercados do Brasil, poderiaestabelecer uma disputa mais acir-rada com o Bompreço, mas em fun-ção do reduzido número de lojasdesta firma em Salvador (apenas 3unidades), verifica-se que a disputaconcorrencial com o Bompreço apre-senta um reduzido efeito. Do mes-mo modo, apesar da boa infra-estru-tura da empresa Atakarejo e das in-serções publicitárias na mídia tele-visiva realizadas por esta firma, ope-rando com prazos longos e aceita-

ção de cheques pré-datados em suasvendas, a sua atuação em Salvadorcom apenas uma loja, não conseguerivalizar com o Bompreço que pos-sui uma grande quantidade de lojasnesta cidade.

Em relação à rede Perini, as trêslojas que esta firma possui no mer-cado relevante em questão é consi-derada uma parcela muito baixa, eapesar de estarem revestidas de ca-racterísticas especiais (segmentaçãode mercado, marcas próprias, ope-rando fundamentalmente para umconsumidor com perfil de renda ele-vado, infra-estrutura razoável), per-tence uma rede local, com operaçõesrestrita a cidade de Salvador, nãopossui porte para rivalizar com asmaiores redes pertencentes a estaindústria. No tocante às redes Makro(duas lojas), Atacadão13 (1 loja) eMercantil Rodrigues (1 loja), pode-se afirmar que as mesmas detém umaparcela muito pouco expressiva domercado, fundamentadas no sistema

Tabela 2 – Participação (nº de lojas) das principais redes no Mercado Relevantede Salvador

Empresa Nº de lojas Participação de mercado (%)

Bompreço 4 5 64,29Companhia Brasileira de Distribuição 3 4,29Hiper Ideal 2 2,86Atakarejo 1 1,43Super Monteiro 1 1,43Perini Delicatessen 3 4,29Makro –Atacadista S/A 2 2,86Atacadão 1 1,43Ebal – Cesta do Povo 7 10,00Ponto Verde Supermercado 3 4,29G. Barbosa 0 1 1,43Mercantil Rodrigues 0 1 1,43

Total 100,00

Nota: Elaboração própria, a partir dos dados divulgados pela SEAE (2003) e pelaABASE12 em 2005.

10 A depender da magnitude das barreiras à entrada e da elasticidade-preço da demanda, uma firmapode exercer o seu poder de mercado praticando preços além dos níveis competitivos (preços acimado custo médio de produção), auferindo lucros supra-normais, sem tornar convidativa a entrada denovas firmas no mercado.

11 No tocante a política antitruste, na década de 80 foi criada a teoria dos mercados contestáveis,estabelecendo condições nas quais uma determinada estrutura de mercado pode apresentar de-sempenho competitivo nos preços (conduta) e nos custos (eficiência) apenas sob a ameaça deentrada da concorrência potencial. Ver POSSAS, 2002.

12 Associação Baiana de Supermercados13 Cabe salientar que a 2ª loja do Atacadão localiza-se no município de Lauro de Freitas, não fazendo

parte do mercado relevante de Salvador.

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atacadista, superando as vendas novarejo, de tal maneira que as mes-mas não tem condições de competirem igualdades de condições com oBompreço (BRASIL, 2003).

Além dos concorrentes mais ex-pressivos já mencionados, verifica-se a presença de outras duas redes,quais sejam Ponto Verde e Cesta doPovo-Empresa Baiana de AlimentosS/A (EBAL). A empresa Ponto Ver-de, rede varejista de pequeno porte,conta três lojas, em toda a cidade deSalvador, possuindo em suas lojasde 6 a 7 check–outs. O reduzido ta-manho da rede e das respectivas lo-jas denotam as limitações do PontoVerde14 em termos de competição nomercado considerado, concluindo-se pela sua incapacidade de plenaconcorrência com a firma líder des-ta indústria (BRASIL, 2003).

Do mesmo modo, a rede Cesta doPovo apresenta-se como uma alter-nativa de compras, fundamental-mente para clientes com perfil debaixa renda, ainda que nos últimostempos tenha diversificado o seu mixde produtos e a aceitação de cartõesde crédito para a realização de com-pras. Sendo assim, o pequeno portede suas lojas, combinado ao tipo deestratégia comercial pouco agressi-va da empresa, não credencia estafirma como um concorrente efetivono mercado relevante de Salvador(BRASIL, 2003).

Neste sentido, percebe-se umaelevada participação do Bompreço15

no setor de supermercados e hiper-mercados em Salvador e uma inca-pacidade das empresas concorren-tes disputarem o mercado em condi-ções equilibradas com esta empresa.Desta forma, cabe correlacionar onível de concentração do mercado ea existência de barreiras à entradanesta indústria, fato que pode sina-lizar para o exercício do poder demercado e adoção de práticas anti-competitivas vis-à-vis consumidorese fornecedores.

5. Barreiras à entradaPor barreiras à entrada entende-

se como qualquer fator em um mer-cado que ponha um potencial com-petidor eficiente em desvantagem,em relação aos agentes econômicosestabelecidos.

O principal fator estrutural a afe-tar o grau de coordenação das con-dutas das empresas estabelecidas éo nível de concentração da produ-ção e das vendas, visto ser razoávelsupor que comportamentos colusi-vos serão mais facilmente imple-mentados quando um reduzido nú-mero de firmas domina o mercado.Em mercados concentrados, a inten-sidade da concorrência potencial,inversamente proporcional à magni-tude das barreiras à entrada existen-tes, é um elemento crucial na deter-minação do desempenho observado.(PINTO, 2000).

Neste sentido, Possas (1990) des-tacou o consenso dos teóricos doparadigma Estrutura-Conduta- De-sempenho em utilizar a concentraçãoeconômica como elemento básico daestrutura do mercado e a intensida-de das barreiras à entrada como umelemento chave do poder de mercadodas firmas oligopolísticas e co-determinante do nível de preços, des-tacando que é possível estabelecerrelações e generalizações teóricasentre preços e barreiras à entrada.

Para Bain (1958), citado por Gon-çalves (2003) a condição de entrada16

de uma firma no mercado pode serdefinida como o estado de concor-rência potencial de possíveis novosprodutores/vendedores, podendoser avaliada pelas vantagens que asfirmas estabelecidas possuem sobreos competidores potenciais, sendoque estas vantagens se refletem nacapacidade de elevar persistente-mente os preços acima do nível com-petitivo sem atrair novas firmas paraa indústria em questão. Do mesmomodo, uma entrada consiste no es-tabelecimento de uma nova empre-sa que constrói ou introduz umanova capacidade produtiva em umaindústria/mercado. A ameaça deentrantes em um mercado dependedas barreiras à entrada existentes,conjugada a reação que o novo con-

corrente pode esperar dos competi-dores já estabelecidos.

Segundo Bain (1958) citado porGonçalves (2003), Porter (1986) e ba-seando-se nos estudos da Secretariade Acompanhamento Econômico(BRASIL, 2003), as principais fontesde barreiras à entrada são:• custos irrecuperáveis (sunk costs)

– Se constituem em custos que nãopodem ser recuperados quando aempresa decide sair do mercado.A extensão dos sunk-costs depen-de principalmente em função dograu de especificidade do uso docapital; da existência de mercadospara máquinas e equipamentosusados; da existência de mercadopara o aluguel de bens de capital;de volume de investimentos ne-cessários para garantir a distri-buição do produto (gastos compromoção, publicidade e forma-ção da rede de distribuidores);

• diferenciação de produtos – Ca-racterizado pelo controle de aces-so a tecnologia para projetar pro-dutos por parte das firmas já atu-antes no mercado; elevados gas-tos com propaganda e vendaspara garantir a fidelidade dos cli-entes, impondo aos potenciaisentrantes elevadas despesas paratornar seu produto conhecido eaceito no mercado; reputação daempresa perante os consumidoresatravés da durabilidade e comple-xidade dos produtos; acesso a ca-nais de distribuição que limitama utilização de determinadas for-mas de acesso ao consumidorpara novos concorrentes; A dife-renciação, portanto, estabeleceuma barreira à entrada, exigindoque as firmas entrantes incorramem custos elevados de publicida-de, serviços, para superar os vín-culos dos clientes junto às firmasfixadas no mercado;

• economias de escala – Se consti-tuem numa forma de barreiras à

14 O Ponto Verde recentemente passou a integrar a Redemix, uma aliança estratégica estabelecida porpequenos supermercados, com a finalidade de obter maior economia de escala nas compras epoder de negociação junto aos fornecedores, além de tentar fortalecer o poder da marca.

15 Market Share (participação relativa) calculado baseado no número de lojas estabelecido no mercadorelevante de Salvador.

16 Sendo assim, a compra do Bompreço pelo Wal-Mart em 2004 não se configura como uma entrada,tendo em vista que se constituiu num processo de aquisição de uma firma já estabelecida nestaindústria.

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entrada, pois a sua utilização exi-ge que as empresas entrantes aden-trem em larga escala, arriscando-se a uma forte reação das firmasexistentes ou ingressem no merca-do em pequena escala, incorrendoem desvantagens de custo;

• necessidade de capital – A neces-sidade de investir altos recursosfinanceiros em tecnologia e mar-keting para competir em igualda-de de condições com as empresasatuantes cria uma barreira à en-trada de novas firmas, sobretudose o capital for utilizado em ativi-dades arriscadas e irrecuperáveis,tais como publicidade e pesqui-sas em P & D;

• custos de mudança – Custos en-frentados pelo comprador quan-do muda de fornecedor. São con-siderados custos de mudança, oscustos auferidos de um novo trei-namento dos empregados, custode implementação de uma novatecnologia, novo equipamento au-xiliar, custos psíquicos de desfa-zer um relacionamento, havendo,portanto, custos de transação ex-ante e ex-post. A elevação destescustos, exige que as firmas entran-tes ofereçam um aperfeiçoamentoconsiderável em custo ou desem-penho, de modo que o compradordecida abandonar um produtor jáfixado na indústria;

• acesso aos canais de distribuição– Torna-se uma fonte de barreiraà entrada, dada a necessidade daempresa entrante de garantir adistribuição de seus produtos. Ad-mitindo-se que os canais de dis-

tribuição da indústria já estãosendo utilizados pelas firmas atu-antes, a recém-chegada organiza-ção precisa convencer os canais aaceitarem seus produtos atravésde descontos, verbas para campa-nha publicitária, etc., o que reduzo lucro e inibe a entrada das em-presas no mercado;

• desvantagens de custo indepen-dentes de escala – As firmas atu-antes podem ter vantagens de cus-tos (know-how, localização estra-tégica, subsídios governamentais,utilização da curva de aprendi-zagem, etc.) irrecuperáveis pelasempresas entrantes, independen-tes do tamanho e das economiasde escala das mesmas, se consti-tuindo numa barreira à entrada;

• política governamental - O gover-no tem o poder de regular, limitarou impedir a entrada de firmasnuma indústria, defendendo osinteresses sociais, impedindo prá-ticas oportunistas e anticompetiti-vas por parte dos agentes econô-micos, que possa afetar o funcio-namento dos mercados, bem comoevitar atos de concentração quepossibilitem a criação de empre-sas monopolistas em determina-do setor;

• localização estratégica – proximi-dade dos consumidores (enfati-zada pelo cliente em sua decisãode escolha de um determinadoestabelecimento para realizarsuas compras) e fornecedores (re-dução de custos de transportes,agilidade no processo de logísticae necessidade mínima de acumu-lar estoques). Neste sentido, emcidades com escassez de terrenos(vazios ou ocupados), o preço dalocalização tende a ser elevado, seconstituindo numa barreira à en-trada;

• fidelidade dos consumidores –Caracteriza-se como uma impor-tante fonte de barreira à entradano setor supermercadista, na me-dida em que os consumidores in-correm em custos ao mudarem desupermercados, condição quegera um efeito de aprisionamento(lock-in) dos consumidores nasredes estabelecidas. Associa-setambém a indisposição do consu-

midor de se locomover para ou-tras lojas, aos hábitos e costumes,localização das gôndolas ondeestão os produtos nas lojas em quedeterminados clientes costumamrealizar suas compras, ou até mes-mo imagem ou reputação que setem da firma;

• ameaça de retaliação por partedas firmas atuantes no mercado –As empresas pertencentes à in-dústria podem baixar seus preçose mantê-los, por no mínimo umano, em níveis inferiores aos vi-gentes antes da entrada. Este mo-vimento pode sinalizar para àspotenciais entrantes que as opor-tunidades de vendas serão inferi-ores àquelas que vigoram atual-mente, impedindo e/ou dificul-tando a entrada.A partir destas considerações te-

óricas apresentadas em relação aosprincipais tipos de barreiras à en-trada é possível identificar e correla-cionar tais atributos com algumascaracterísticas observadas no setorde supermercados em Salvador. As-sim, os principais tipos de barreirasà entrada identificados no mercadorelevante de Salvador via concentra-ção do mercado são:• economias de escala – associadas

à racionalização da estrutura delogística, tendo em vista que omaior volume de vendas permite,por exemplo a centralização doabastecimento das lojas em umúnico centro de distribuição, in-correndo em redução de custo.Ademais, a existência de um cen-tro de distribuição e o processo deautomação do setor de supermer-cados permitem às redes aumen-tar a área de vendas das lojas, ocu-pando espaços que normalmentese destinam aos estoques de mer-cadorias. Neste sentido, o Bompre-ço possui uma vantagem compe-titiva em relação à concorrência eisto pode inibir a entrada das prin-cipais redes de varejo em Salva-dor, na medida em que esta em-presa possui um centro de distri-buição nesta cidade, como tam-bém investe cada vez mais no pro-cesso de automação de suas lojas;

• diferenciação do serviço – Atra-vés do atributo de desenvolvimen-

A necessidadede investir altos recursosfinanceiros em tecnologiae marketing para competir

em igualdade decondições com as

empresas atuantes criauma barreira à entrada de

novas firmas...

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to de marcas próprias, o Bompreçoestabelece a diferenciação da mar-ca em relação à concorrência, con-quistando a lealdade do consu-midor e realizando uma integra-ção vertical para trás, estabelecen-do concorrência com firmas posi-cionadas à montante da cadeiaprodutiva. Por outro lado, o Bom-preço pode ser caracterizado comoum comprador com forte poder denegociação junto aos fornecedo-res, tendo em vista o seu tamanhoe a escala de compras que realiza.O desenvolvimento de programasde fidelização17 pode ser entendi-do como uma estratégia de marke-ting, na medida em que permite asegmentação do mercado, bemcomo a escolha do mix de produ-tos que serão oferecidos num de-terminado mercado ou numa lojaespecífica;

• necessidade de elevados investi-mentos em capital – Pertencente amaior rede de varejo do mundo, oBompreço possui acesso a fontesde capital de modo a promover oseu processo de expansão e con-solidação do mercado, exercendoa sua liderança e dificultando apenetração de novas empresasnesta indústria. Num setor emque as condições de crescimentoimponham a necessidade de con-sideráveis economias de escala,as firmas estabelecidas podemconsiderar lucrativo acumularuma quantidade de capital sufi-ciente para tornar não lucrativa aentrada de uma nova firma nomercado, conseguindo, com isso,manter seus lucros a um nívelmais alto do que obteriam casopermitissem a entrada de um novocompetidor (OREIRO, 1997).Localização estratégica – se cons-

titui numa barreira à entrada tendoem vista a escassez de terrenos ade-quados para a instalação de empreen-dimentos da magnitude de um super-mercado ou hipermercado, tendo emvista a característica estratégica des-te atributo, como também o fato degrande maioria das lojas das firmasjá atuantes no setor supermercadistaem Salvador possuírem localizaçõesprivilegiadas e definidas em funçãodo perfil do consumidor.

Desta forma, apenas no sentidoNorte da cidade (região compreen-dida pela avenida Paralela, no sen-tido do Aeroporto), é possível encon-trar disponibilidades de terrenos,dificultando a penetração via cons-trução de unidades próprias nestemercado. A liderança absoluta e otamanho ocupado pelo Bompreçoem Salvador se constituem, portan-to, em entraves ao desenvolvimentoe a consolidação de forma agressivade grandes cadeias (tais como Carre-four, Pão de Açúcar, etc) nesta região,sendo que todas estas empresas es-tão acostumadas a disputar a lide-rança dos mercados em que operam,possuindo elevadas participaçõesnas regiões Centro-Sul do Brasil.

A grande diferença das partici-pações relativas das empresas nestemercado e a eficiente logística doBompreço, possuindo lojas em diver-sos bairros da cidade de Salvador,todas localizadas estrategicamentepara atender os mais variados seg-mentos da sociedade, dificultam odesenvolvimento e a inserção denovas empresas neste mercado.

Face à inexistência de redes atra-tivas para a aquisição em Salvador,as empresas entrantes no referidomercado, terão que adquirir redesmenores, ou construir unidades pró-prias, o que requer pesados investi-mentos em marketing para conquis-tar clientes (que podem de constituirem sunk costs, custos irrecuperáveis,para determinada firma), podendoainda incorrer em retaliações dosprincipais competidores. Além dis-so, existe a possibilidade de recusados consumidores, que estão acos-tumados com as bandeiras locais18,sobretudo com a marca Bompreço,que possui forte identidade junto aos

consumidores de Salvador, se cons-tituindo também numa barreira àentrada.

6 ConclusõesO presente trabalho ao analisar a

estrutura de mercado e os padrõesde concorrência vigentes no setor desupermercados em Salvador, temcomo finalidade entender, analisare fomentar a discussão sobre as ra-zões pelas quais as grandes redes desupermercados nacional e interna-cional, tendo em vista o processo deexpansão e de internacionalizaçãodos mercados, não conseguem pene-trar de forma agressiva no setor desupermercados em Salvador, estabe-lecendo uma competição mais vigo-rosa com a firma Bompreço.

Neste sentido, o alto grau de con-centração do mercado, a elevadaparticipação do Bompreço nesta in-dústria e as barreiras à entrada exis-tentes constituem condições neces-sárias, contrariando, inclusive o Art.20 da Lei 8884/94, porém não sufi-cientes para configurar o exercíciodo poder de mercado no setor desupermercados em Salvador.

Uma das justificativas que a lite-ratura econômica relativa ao temadeste trabalho admite para o eleva-do tamanho e concentração de umadeterminada firma é o grau de efici-ência decorrente do ato de concen-tração. De acordo com a Secretariade Acompanhamento Econômico(BRASIL, 2003), tais eficiências apre-sentadas devem ser específicas daoperação, não podendo ser obtidasde outra forma menos restritiva àconcorrência, que não por intermé-dio da operação. Do mesmo modo,as eficiências devem derivar tão so-mente de economias reais, devendo

17 Em 1996, o Bompreço criou o Bomclube, um sistema de premiação à fidelização dos clientes, no qualos consumidores recebem uma bonificação (o cliente junta os pontos e depois troca por mercado-rias, sendo que cada um Real em compras vale um ponto). Esta estratégia além de se constituir numafonte de barreiras à entrada (a partir do fortalecimento da marca), possibilita a formação de umbanco de dados com as informações específicas de cada consumidor, se constituindo num processode customização. Com isso, é possível identificar o perfil da demanda e a freqüência de cada clientena realização de compras, podendo desenvolver um posicionamento específico para cada segmen-to-alvo (PINTO, 2000).

18 O atributo da fidelidade da marca é tão significante para o Bompreço em relação aos consumidoresque mesmo após ser vendido para o Wal-Mart, esta firma adotou a estratégia de manter a bandeiraBompreço, aproveitando o poder da marca fortemente consolidada no mercado de Salvador, alémdo elevado custo de mudança que teria que incorrer, mesmo se tratando da maior rede de varejo domundo.

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ser apresentadas de forma clara eprecisa, como também compensar osefeitos anti-competitivos resultantesda concentração, gerando eficiênci-as consideráveis.

Como forma de caracterizar eexemplificar as considerações acimamencionadas explicitaremos abaixoalgumas eficiências apresentadaspela Secretaria de Acompanhamen-to Econômico relativa ao setor desupermercados em Salvador, decor-rente do ato de concentração nº08012006976/01-58 referente à aqui-sição do Bompreço/Royal Ahold(BR Participações e Empreendimen-tos S/A dos ativos operacionais eestoques do G. Barbosa & Cia Ltda,tais como: Economia de escala, eco-nomias de escopo, transferências demelhores práticas e de melhorestecnologias, aumento do número deprodutos oferecidos e criação de umpoder de mercado compensatóriopor meio de utilização de marcaspróprias, melhorias da qualidade deprodutos e serviços ofertados e ge-ração de externalidades positivas(BRASIL, 2003).

Cabe salientar que a análise doreferido ato, bem como do parecer daSDE (Secretaria de Direito Econômi-co) nº 08012005104/99-51 relativo àaquisição pelo Bompreço de seis es-tabelecimentos comerciais do Peti-Preço, permite concluir que as infor-mações apresentadas pelas firmasenvolvidas nas operações não foramsuficientes para comprovar que aseficiências previstas não poderiamser obtidas de outra forma que nãoatravés da concentração (eficiênci-as específicas do ato), caracterizan-do-se como dados insuficientes evagos, sem apresentar justificativatécnica plausível para a viabilidadedas operações. Entretanto, apesardas restrições, ambas as transaçõesforam aprovadas pela SEAE (Secre-taria de Acompanhamento Econô-mico e pelo CADE (Conselho Admi-nistrativo de Defesa Econômica),após a apresentação, por parte doBompreço, firma adquirente, de es-tudos técnicos detalhados certifica-dos por auditores independentes.Tais documentos possuem caráterconfidencial, não sendo de fácil aces-so, nem tampouco se encontram dis-

poníveis ao público na internet.Sendo assim, tendo em vista as

considerações, características e par-ticularidades inerente aos setorsupermercadista de Salvador apre-sentadas neste trabalho, fundamen-tada na concentração do mercado ena existência de barreiras à entrada,configura-se que a identificação detais variáveis no mercado relevantede Salvador limitam a conduta depotenciais concorrentes e o própriodesempenho das firmas rivais, sejaem razão do seu reduzido porte e ouda pequena participação relativa(market share) que exercem em rela-ção ao Bompreço (líder do setor).

O fator mais preocupante, é quealgumas empresas incluídas no cál-culo da participação do mercadopelo nº de lojas, a exemplo da Cestado Povo e da firma Ponto Verde, nãoreúnem todas as características domercado relevante de supermercadoe hipermercado de Salvador, sendoacrescentados na pesquisa tão so-mente porque exercem parcialmenteconcorrência (substitutibilidade demenor grau) com o Bompreço, de talmaneira que a concentração do se-tor, considerando-se apenas as re-des de super e hipermercados con-forme definição da Secretaria deAcompanhamento Econômico (2003),deve apresentar índice ainda maiselevado.

Por essas razões, se faz necessá-rio à realização de uma ampla e mi-nuciosa pesquisa com a finalidadede verificar, de forma técnica e empí-rica, se existe excessiva concentra-ção de mercado sem a existência deeficiências econômicas que compen-sem ou suplantem tal condição, fa-vorecendo a probabilidade do exer-cício do poder de mercado de formaunilateral ou coordenada, ou se ooligopólio concentrado verificadoneste setor se adequa às especifi-cidades técnicas e mercadológicasreferentes a esta indústria em Salva-dor (aplicação do princípio da razoa-bilidade).

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ResumoA Agenda 21, apresentada na

Conferência das Nações Unidas so-bre Meio Ambiente em 1992 (RIO 92),apresenta três condições básicaspara a correta gestão dos resíduossólidos: reduzir, reciclar e reutilizar.Dentro dessa premissa busca-se dis-cutir alguns conceitos relacionadosao tema “resíduos sólidos” num con-texto voltado para a análise geográ-fica. Neste enfoque geográfico pro-cura-se relacionar os resíduos sóli-dos com o planejamento e recupera-ção de áreas urbanas, principalmen-te decorrentes dos impactos ambien-tais derivados da gestão incorretadestes resíduos. Destacam-se quaisassuntos são de interesse do futurolicenciado em Geografia e de que for-ma estes conceitos podem ser anali-sados. Assim, têm-se alguns pontosque devem ser de conhecimento des-te futuro profissional, alicerçado emaspectos técnicos, como normas econceituações, na busca da constru-ção do conhecimento geográfico.

Palavras chave: Resíduos sólidosurbanos; Práticas pedagógicas; Re-cuperação de áreas degradadas.

AbstractAgenda 21, presented in the

Conference of the United Nations onEnvironment in 1992 (RIO 92), pre-sents three basic conditions for thecorrect management of the solidresidues: to reduce, to recycle and toreuse. Inside of this premise onesearchs to argue some conceptsrelated to the subject “solid resi-dues” in a context directed towardthe geographic analysis. In thisgeographic approach it is looked torelate the solid residues with the

ÁREAS URBANAS DEGRADADAS: RELAÇÕESCOM A GESTÃO DOS RESÍDUOS SÓLIDOS

Generoso de Angelis Neto1

Bruno Luiz Domingos de Angelis2

Paulo Fernando Soares3

planning and recovery of urbanareas, mainly decurrent of the am-bient impacts derivatives of theincorrect management of these resi-dues. Which subjects are distingui-shed are of interest of the futurepermitted in Geography and of thatit forms these concepts can be analy-zed. Thus, one has some points thatmust be of knowledge of this profes-sional future, based in aspects techni-cian, as norms and conceptualiza-tions, in the search of the construc-tion of the geographic knowledge.

Key words: Urban solid residues;Practical pedagogical; Recovery ofdegraded areas.

Introdução O modo de vida dominante nos

dias atuais, influenciado pela pro-paganda e pelo consumismo, temlevado a uma apropriação nuncaantes vista em termos de sobrecargaambiental, em busca de matérias-primas exauríveis, em um espaço detempo bastante curto. Novas tecno-logias produzem novos tipos de re-síduos, cada vez mais inorgânicos,que tendem a aumentar seu tempode contaminação do meio até queretorne à natureza, de onde geral-mente são extraídos. O aumento dadensidade demográfica que vemocorrendo nas últimas décadas nos

grandes centros urbanos (principal-mente naqueles de países em desen-volvimento) em conseqüência doêxodo rural ou crescimento vegetati-vo da população (maior longevida-de) faz com que estas áreas necessi-tem, cada vez mais, de ações volta-das ao saneamento do meio, ou seja:abastecimento e distribuição deágua, eliminação de águas servidase destinação adequada dos resídu-os sólidos.

A correta gestão dos resíduossólidos esbarra numa série de fato-res como a inexistência de uma polí-tica federal de limpeza pública e asdescontinuidades administrativas.A ausência de uma política abran-gente em todas as esferas do poder(federal, estaduais e municipais) fazcom que ocorra a degradação am-biental em áreas urbanas, ocasio-nando densidades demográficaselevadas, diversidade de atividadese funções incompatíveis nas cidadesalém da carência de áreas para dis-posição adequada dos resíduos.Neste sentido, se faz necessário co-nhecer os principais aspectos envol-vidos na gestão dos resíduos sóli-dos e suas implicações sobre o meioambiente, nas etapas de coleta,transporte e destino final.

Classificação dos resíduos Entende-se aqui por “resíduo”

1 Prof. Dr do Departamento de Engenharia Civil e dos Programas de Pós-graduação em EngenhariaUrbana e em Geografia – Mestrado – da Universidade Estadual de Maringá/PR. Vice-Diretor doCentro de Tecnologia da Universidade Estadual de Maringá. E/mail: [email protected]

2 Prof. Dr do Departamento de Agronomia e dos Programas de Pós-graduação em Engenharia Urba-na e em Geografia – Mestrado – da Universidade Estadual de Maringá/PR. Vice-Diretor do Centrode Ciências Agrárias da Universidade Estadual de Maringá;

3 Prof. Dr do Departamento de Engenharia Civil e dos Programas de Pós-graduação em EngenhariaUrbana e em Geografia – Mestrado – da Universidade Estadual de Maringá/PR. Chefe do Departa-mento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Maringá.

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tudo aquilo que é descartado duran-te um processo produtivo, execuçãode uma atividade ou consumo, masque pode agregar valor ou ser utili-zado em outra função. Já o termo“lixo” será entendido como aquiloque já não tem função e não se agre-ga valor econômico. O quadro 1 apre-senta uma classificação geral dosresíduos de acordo com diversascaracterísticas que os mesmos po-dem possuir, fornecendo um pano-rama amplo de como pode-se classi-ficar os resíduos.

Para normalizar estes conceitos,definições e classificações, existemuma série de normas da ABNT (As-sociação Brasileira de Normas Téc-nicas), resoluções do CONAMA(Conselho Nacional do Meio Ambi-ente), portarias da ANVISA (Agên-cia Nacional de Vigilância Sanitá-

ria), além de normas e decretos fede-rais e estaduais. Com relação às res-ponsabilidades de gestão destes re-síduos, somente aqueles domicilia-res, comerciais e públicos são de res-ponsabilidade do poder públicomunicipal. Os demais são dos gera-dores.

O nível de vida da população, ograu de industrialização dos alimen-tos, os hábitos da população e fato-res sazonais influenciam a quanti-dade e a composição dos resíduosdomiciliares gerados. Estas varia-ções interferem diretamente nas ro-tinas de gestão dos mesmos, dificul-tando-as e gerando alguns transtor-nos para a população quando nãoresolvidas a tempo. O mesmo pode-se dizer com relação aos resíduospúblicos, que sofrem influência di-reta da arborização das vias públi-

cas, dos hábitos culturais da popu-lação de uma localidade e tambémda qualidade e conservação doslogradouros públicos.

Dentro deste enfoque, há que sedestacar algumas dificuldades de-correntes da própria gestão, dentreas quais pode-se citar, além dainexistência de política federal delimpeza pública, as limitações finan-ceiras, ausência de capacidade téc-nica (recursos humanos não quali-ficados), descontinuidades político-administrativas (tanto entre as trêsesferas de poderes públicos – fede-ral, estaduais e municipais – comoentre uma gestão e outra) e a falta decontrole ambiental, sem consideraras falhas operacionais decorrentesde cada uma das etapas de gestãodos resíduos: coleta, transporte edestino final dos mesmos.

Fonte: ANGELIS NETO (1999)

Quadro 1 – Classificação dos resíduos

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Caracterização dos resíduos Entre as diversas caracterizações

existentes para os resíduos sólidosapresentaremos a seguir aquela quemelhor representa o aspecto geográ-fico que aqui se pretende, ou seja,relacionada com a forma de produ-ção dos mesmos. Assim, destaca-sena seqüência os resíduos de cons-trução e demolição, os resíduos deserviço de saúde, os resíduos indus-triais, os resíduos agrícolas, os resí-duos domésticos ou domiciliares, osresíduos comerciais e os resíduospúblicos.

Resíduos de Construção e Demolição(RCD)

Sob esta denominação, encon-tram-se os resíduos decorrentes daconstrução, reforma, demolição e re-paros nas obras de construção civil.Com uma produção diária médiaem torno da metade de todos os resí-duos produzidos nas cidades, repre-sentam um grave problema ambien-tal, principalmente devido a seugrande potencial inerte, ou seja, suadificuldade em ser re-absorvido pelomeio ambiente e sua forma inade-quada de disposição (fundos de va-les, terrenos baldios e áreas degra-dadas).

Na busca de uma correta gestãodos mesmos, ou seja, sua utilizaçãopara outros fins, atividades especi-ais devem ter lugar no próprio can-teiro-de-obras. Estas atividades de-vem se concentrar na separação des-tes em caçambas independentes eindividualizadas, como as que reco-lhem cerâmicas vermelhas, argamas-sas, vidros e cerâmicas esmaltadas,concretos, pedras, areias e metaisalém daqueles produtos descartadoscomo “lixo”, entre os quais desta-cam-se o gesso e resíduos de limpe-za dos canteiros-de-obras. Esta se-paração deve-se ao fato de como es-tes resíduos de construção e demoli-ção serão utilizados, se em forma deagregados miúdo ou graúdo, oucomo materiais que devem apresen-tar elevada resistência estrutural.

Entre as vantagens de se proce-der a reciclagem dos RCD’s, desta-cam-se: redução do consumo de re-cursos naturais, proteção ao meioambiente, economia na aquisição de

matéria-prima, redução de áreas ne-cessárias para aterro, redução dageração de poluição, redução no con-sumo de energia e redução no preçode produtos, entre outros.

Um outro aspecto que merecedestaque é a utilização destes pro-dutos reciclados como material uti-lizável em tecnologias apropriadas,alternativas ou de baixa renda, vi-sando o aspecto social de políticaspúblicas urbanas. Assim, utilizan-do-se mão-de-obra local (geralmen-te não qualificada) pode-se implan-tar medidas de melhoria urbana emáreas mais pobres ou degradadas dacidade, aliando-se melhorias da qua-lidade ambiental com medidas deamplo alcance social. Dentre os pro-dutos reciclados que podem ser uti-lizados, após processamento em usi-nas apropriadas, destacam-se: blo-cos, painéis, briquetes, tubos, placas,meios-fios, elementos pré-moldadosvários, além da confecção de concre-to não-estrutural in loco. Além des-tas utilizações, tem-se ainda a dimi-nuição do passivo ambiental decor-rente das atividades de construçãocivil.

Resíduos de Serviço de Saúde (RSS) A Resolução RDC nº 33 da AN-

VISA define como geradores de RSStodos os serviços que prestem aten-dimento à saúde humana ou animal,incluindo os prestadores de serviçoque promovam os programas de as-sistência domiciliar, serviços deapoio à preservação da vida, indús-trias e serviços de pesquisa na áreade saúde, hospitais e clínicas, servi-ços ambulatoriais de atendimentomédico e odontológico, serviços deacupuntura, tatuagem, serviços ve-terinários destinados ao tratamentoda saúde animal, serviços de aten-dimento radiológico, de radioterapiae de medicina nuclear, serviços detratamento quimioterápico, serviçosde hemoterapia e unidades de pro-dução de hemoderivados, laborató-rios de análises clínicas e de anato-mia patológica, necrotérios e servi-ços onde se realizem atividades deembalsamamento e serviços de me-dicina legal, drogarias e farmácias,inclusive as de manipulação, esta-belecimentos de ensino e pesquisa

na área de saúde, unidades de con-trole de zoonoses, indústrias farma-cêuticas e bioquímicas, unidadesmóveis de atendimento à saúde edemais serviços relacionados à saú-de, humana e animal, que gerem re-síduos perigosos. De uma maneiramais coloquial, são aqueles resídu-os que apresentam riscos físicos,químicos ou biológicos sobre a saú-de do ser humano, gerados em esta-belecimentos como hospitais, labo-ratórios, farmácias, clínicas, hospi-tais veterinários, portos, aeroportose outros locais em que possa haverriscos de transmissão de doenças.

Estes resíduos devem ser geren-ciados de forma adequada em todasas etapas envolvidas: geração, acon-dicionamento, armazenamento, co-leta, transporte, tratamento e desti-no final, através da elaboração de umPlano de Gerenciamento de Resídu-os de Serviços de Saúde – PGRSS.Este Plano constitui-se num conjun-to de procedimentos de gestão, pla-nejados e implementados a partir debases científicas e técnicas, norma-tivas e legais, com o objetivo de mini-mizar a produção de resíduos e pro-porcionar aos resíduos gerados umencaminhamento seguro.

Os resíduos dos serviços de saú-de podem ser classificados, segun-do a Resolução RDC nº 33/2003 daANVISA, em:• Resíduos do Grupo A – Potencial-

mente Infectantes: Resíduos coma possível presença de agentes bi-ológicos que, por suas caracterís-ticas de maior virulência ou con-centração, podem apresentar ris-cos de infecção;

• Resíduos do Grupo B – Químicos:Resíduos contendo substânciasquímicas que apresentam risco àsaúde pública ou ao meio ambi-ente, independente de suas carac-terísticas de inflamabilidade,corrosividade, reatividade e toxi-cidade;

• Resíduos do Grupo C – RejeitosRadioativos: São consideradosrejeitos radioativos quaisquermateriais resultantes de ativida-des humanas que contenhamradionuclídeos em quantidadessuperiores aos limites toleráveisaos serem humanos, e para os

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quais a reutilização é imprópriaou não prevista;

• Resíduos do Grupo D – ResíduosComuns: São todos os resíduosgerados nos serviços abrangidospor esta Resolução que, por suascaracterísticas, não necessitam deprocessos diferenciados relacio-nados ao acondicionamento,identificação e tratamento, deven-do ser considerados como resídu-os sólidos domiciliares; e

• Resíduos do Grupo E – ResíduosPerfurocortantes: São os objetos einstrumentos contendo cantos,bordas, pontos ou protuberânciasrígidas e agudas, capazes de cor-tar ou perfurar.Através da RDC nº 33, a ANVISA

estabeleceu que até março de 2004todos os estabelecimentos que pro-duzem RSS’s deveriam se adequar aela. Para a solução deste problema,os estabelecimentos geradores deresíduos de serviços de saúde têmprocurado a união de esforços comosaída para a implantação de umaempresa para o tratamento de seusresíduos, além da elaboração de seusPlanos de Gerenciamento.

Resíduos Industriais Segundo ROCCA et al. (1993) re-

síduos sólidos industriais podemser caracterizados como:

os resíduos em estado sólido e semi-sólido que resultam da atividadeindustrial, incluindo-se os lodosprovenientes das instalações de tra-tamento de águas residuárias,aqueles gerados em equipamentosde controle de poluição bem comodeterminados líquidos cujas parti-cularidades tornem inviável o seulançamento na rede pública de es-gotos ou corpos d’água, ou exijam,para isso, soluções economicamen-te inviáveis, em face da melhortecnologia disponível.

Por um caminho semelhante,GERBER (1999) define resíduos sóli-dos industriais da seguinte maneira:

o resíduo industrial é aquele origi-nado das atividades de diversosramos da indústria (metalúrgica,química, petroquímica, papeleira,alimentícia). O resíduo industrialé bastante variado, podendo ser re-presentado por cinzas, lodos, óle-

os, resíduos alcalinos ou ácidos,plásticos, papel, madeira, fibras,borracha, metal, escórias, vidros ecerâmica. Nesta categoria, inclui-se a grande maioria dos resíduosconsiderados tóxicos.

A NBR 10.004/87 – ResíduosSólidos – Classificação – baseia-separa classificar os resíduos em lista-gens de resíduos reconhecidamenteperigosos e listagens padrões deconcentração de poluentes. A partirdestas listagens classifica os resídu-os quanto aos riscos potenciais aomeio ambiente e à saúde pública emtrês categorias:• Resíduos Classe I – Perigosos: São

classificados como resíduos Clas-se I ou Perigosos os resíduos sóli-dos ou mistura de resíduos que,em função de suas característicasde inflamabilidade, corrosivida-de, reatividade, toxicidade e pato-genicidade, podem apresentar al-gum risco à saúde pública, pro-vocando ou contribuindo para umaumento de mortalidade ou inci-dência de doenças e/ou apresen-tar efeitos adversos ao meio am-biente, quando manuseados oudispostos de forma inadequada;

• Resíduos Classe II – Não Inertes:Pertencem a classe dos resíduosnão inertes de Classe II os resídu-os sólidos ou mistura de resíduosque não se enquadram nas especi-ficações definidas para a Classe I(Perigosos) ou Classe III (Inertes).Apesar de não se enquadrarem nacategoria de resíduos perigosos,os resíduos Classe II podem apre-sentar características como com-bustibilidade, biodegradabilida-de e solubilidade em água; e

• Resíduos Classe III – Inertes: Sãoclassificados como Classe III ouresíduos inertes os resíduos sóli-dos ou mistura de resíduos sóli-dos que, submetidos ao teste desolubilização, não tenham comoresultado nenhum de seus cons-tituintes solubilizados em con-centrações superiores aos padrõesdefinidos pela NBR 10.004/87.

Resíduos Agrícolas Também conhecidos como resí-

duos rurais, são aqueles produzidosfora dos domínios das áreas urba-

nas em um município. Podem resul-tar de atividades agrícolas, comoembalagens de agrotóxicos e restosde culturas, ou da pecuária, como acriação de animais confinados.

Com relação às embalagens deagrotóxicos, é necessária a tripla la-vagem destas embalagens antes queas mesmas sejam encaminhadas aofabricante, por força de lei. Quandomanipuladas, é necessário o uso deequipamentos de proteção individu-al como luvas e máscaras, para evi-tar danos à saúde dos operários.Quando da limpeza dos equipamen-tos agrícolas após o uso, deve-sefaze-lo em locais específicos para tal,de forma a não contaminar os ma-nanciais superficiais e o solo.

Os restos de cultura que ficamsobre o campo após a colheita têm afunção, na maioria dos casos, de for-necer nutrientes e minerais, pela de-composição da matéria orgânica e re-absorção pelo solo. Há que se desta-car ainda a função de servir comobarreira física ao desencadeamentode processos do meio físico, comoerosões e assoreamentos, diminui-ção da velocidade das águas do es-coamento superficial, além de pro-porcionar uma melhor infiltraçãodas águas de chuva. Cuidados es-peciais deverão ser tomados para seevitar a queima da matéria orgânicaseca que fica sobre o solo, pois a quei-ma compromete a fertilidade pelaperda de minerais e nutrientes pre-sentes no solo.

A pecuária confinada, como acriação de gado (principalmente empaíses europeus) e de aves, gera umagrande quantidade de resíduos comelevada carga orgânica. No caso deaves, a produção de excrementosvem acompanhado da “cama”, ouseja, palha de arroz ou outro tipo dematerial inerte, que fica sob as gaio-las para acomodar estes resíduos.Devido à elevada carga orgânica queestes resíduos geram, necessário sefaz encaminhar o mesmo para umadestinação que não cause impactosambientais, como contaminações e/ou poluições.

Resíduos Domésticos ou Domiciliares São aqueles produzidos diaria-

mente nas casas e apartamentos, e

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que se constituem basicamente dosresíduos provenientes das ativida-des domésticas. São constituídospor restos de comidas, embalagensplásticas e de metais, papéis, ciscosde varrição, panos e matéria orgâni-ca. São gerados em grandes quanti-dades diárias, por isso devem serremovidos periodicamente do inte-rior das casas e apartamentos.

Resíduos Comerciais São aqueles gerados em estabe-

lecimentos comerciais e se aproxi-mam bastante das característicasdos resíduos domiciliares. Estão re-lacionados diretamente com as ati-vidades desenvolvidas no estabele-cimento, e podem apresentar em suaconstituição: papéis, restos de ali-mentos, embalagens e matéria orgâ-nica, entre outros. Não apresentamcoleta diferenciada com relação aosdomésticos e são gerados normal-mente nas zonas centrais ou comer-ciais das cidades.

Resíduos Públicos São aqueles resíduos produzidos

por atividades que se desenvolvemem logradouros públicos e cuja res-ponsabilidade é do poder público.Entre estas atividades destacam-sea limpeza de praias, bocas-de-lobo,pintura de meios-fios, podas de ár-vore, roçadas em lotes urbanos, lim-peza de logradouros públicos evarrição, entre outros. Seus princi-pais constituintes podem ser assimcaracterizados:• Restos orgânicos vegetais: são

aqueles provenientes da varriçãode folhas, podas de árvores, res-tos de roçadas em canteiros e pra-ças e que podem ser aproveitadoscomo composto orgânico ou serra-pilheira, desde que devidamentetratados e selecionados;

• Resíduos inorgânicos: provenien-tes dos vários serviços de limpe-za urbana, não logram apresentarqualquer possibilidade de reusoou reciclagem. São os materiaisinertes e os inservíveis; e

• Lodos: são os resíduos proveni-entes das bocas-de-lobo, bueirose canais em áreas urbanas. Devi-do à sua consistência e composi-ção, devem ser encaminhados ao

aterro sanitário para disposiçãofinal.

Gestão dos resíduos sólidos O gerenciamento correto dos re-

síduos sólidos urbanos apresentatrês etapas bastante características:a coleta, o transporte e o destino fi-nal. Falaremos brevemente sobrecada uma delas, dando enfoque so-bre os resíduos sólidos urbanos.

Coleta O usuário é responsável pela co-

leta interna, acondicionamento earmazenamento dos resíduos, que éfunção da quantidade, da composi-ção dos resíduos gerados e da fre-qüência de coleta. Cabe ao poderpúblico a definição de padrões, ti-pos ou métodos de acondicionamen-to e sua fiscalização na fase externa,dinâmica, e com roteiro elaborado.A eficiência dos serviços de coletadepende da universalidade dos ser-viços prestados e da regularidade damesma.

Transporte A necessidade da remoção dos

resíduos gerados para longe da fon-te geradora faz com que seja neces-sário um serviço de transporte efici-ente, na seqüência da coleta externaefetuada pela guarnição. A obtençãodesta eficiência depende de fatoreseconômicos (dimensionamento dafrota e de pessoal), técnicos (escolhado melhor itinerário, com menor per-curso “morto”) e higiênico (início dadecomposição dos resíduos). A es-colha do veículo de transporte estárelacionada com a quantidade deresíduos gerados, com a forma deacondicionamento dos resíduos ecom as condições de acesso aos pon-tos de coleta.

Destino Final A última etapa da gestão dos re-

síduos sólidos urbanos pode ser ca-racterizada sob dois aspectos: o des-tino final propriamente dito (em lixões,aterros controlados ou aterros sani-tários) e o tratamento, que compõe-sebasicamente da incineração, com-postagem e reciclagem.

A disposição dos resíduos dire-tamente em lixões a céu aberto é a pior

forma de disposição final, pois con-tamina o meio ambiente em váriosaspectos e causa uma série de im-pactos ambientais. Não possui am-paro legal e jurídico algum, sendocondenado pelo poder público e porórgãos ambientais em todo o país.Apresenta ainda o agravante de pro-porcionar a presença de seres huma-nos (especialmente crianças) e ani-mais que dali retiram seu sustento,seja in natura, seja através de materi-ais recicláveis garimpados e vendi-dos. Não conta com nenhuma formade proteção ambiental ou obra deengenharia, sendo os resíduos sim-plesmente lançados em uma áreaqualquer, geralmente fundos de va-les, cavas de pedreiras abandonadasou áreas degradadas.

Os aterros controlados caracteri-zam-se pelo revestimento do fundoda escavação, para evitar-se o con-tado dos resíduos sólidos deposita-dos e dos líquidos percolados com omeio externo, além de apresentarcompactação e cobertura diária (ouao menos regular) das células de re-síduos. São utilizados para comuni-dades que apresentam uma produ-ção máxima de 30 ton/dia de resí-duos em média.

Os aterros sanitários apresentam-se como a melhor forma de disposi-ção para os resíduos sólidos urba-nos, no tocante aos aspectos técni-cos, econômicos e ambientais. Sãoconsiderados obras de engenhariaonde os resíduos são dispostos emáreas previamente selecionadas, li-cenciadas e preparadas, com reves-timento de fundo, drenos de gases elíquidos percolados, além de siste-mas de queima dos gases gerados etratamento dos líquidos percolados.Embora tenham grande eficiência,começam a surgir problemas em al-gumas áreas urbanas, principal-mente nas grandes metrópoles, emdecorrência da falta ou carência deáreas para a implantação destes ater-ros, visto que seu período de vidaútil deve atingir próximo de 20 anos.

Os sistemas de tratamento dos re-síduos sólidos urbanos, em sua últi-ma etapa, apresenta como objetivoprincipal a redução da quantidadee periculosidade dos resíduos a se-rem aterrados. Além disso, justifi-

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cam-se pela escassez de áreas emgrandes centros urbanos, pela dis-puta de terras remanescentes, pelavalorização dos componentes dosresíduos e pela necessidade deinertização dos resíduos de serviçosde saúde. Assim, tem-se resumida-mente as formas mais comuns de tra-tamento como também suas vanta-gens.

A compostagem consiste na de-composição induzida de matéria or-gânica animal ou vegetal. Proporci-ona uma economia de área nos ater-ros, o aproveitamento agrícola damatéria orgânica gerada, a recicla-gem de nutrientes para o solo, alémde ser um processo ambientalmenteseguro e proporcionar a eliminaçãode patógenos.

A reciclagem é a derivação, coleta,separação e processamento de ma-teriais que iriam ao aterro, usadoscomo matéria-prima através de in-dústrias de reciclagem ou coleta se-letiva. Deve ser encarada como umconjunto de ações que visem simul-taneamente os aspectos social, eco-nômico e ambiental, com as vanta-gens de diminuir a quantidade deresíduos a ser aterrado, preserva osrecursos naturais, economiza ener-

gia, diminui a poluição e ainda geraempregos.

A incineração é definida como umatecnologia térmica, que atua acima de900º centígrados, com o objetivo dereduzir a massa e o volume dos resí-duos a cinzas, além de inertizá-los.Assim, suas principais vantagenssão a redução do volume de resíduosa ser aterrado, a redução do impactoambiental, a destoxificação dos resí-duos e a recuperação da energia tér-mica para outros fins.

Medidas para recuperação deáreas degradadas por resídu-os sólidos

Os problemas de gestão queocorrem no gerenciamento dos resí-duos sólidos urbanos nas fases decoleta (acondicionamento irregular efalhas na freqüência de coleta), detransporte (utilização de veículosimpróprios e itinerários inadequa-dos de coleta) e de destino final (au-sência de cobertura com materialinerte, ausência de sistemas de dre-nagem e coleta de líquidos percola-dos, ausência de impermeabilizaçãono contato resíduo x solo, utilizaçãode técnicas inadequadas de dispo-sição dos resíduos e ausência de es-

tudo criterioso para escolha do lo-cal de disposição) no caso de lixõesa céu aberto, não encontram respal-do jurídico na grande maioria dosinstrumentos legais disponíveis.

A correta gestão dos resíduossólidos urbanos é um dos maioresdesafios enfrentados pelos governosmunicipais, responsáveis pelas ati-vidades nestas áreas. Se por um ladopercebe-se a presença de problemasestruturais (como a falta de infra-es-trutura necessária, dificuldades deacesso a determinadas localidadese carência de informações reais e atu-ais sobre o problema) por outro nota-se a ausência de políticas para aárea, que privilegiem soluções glo-bais de médio e longo prazos. Comoconseqüência o poder público ficaimpedido de prestar os serviços ne-cessários e que atenda satisfatoria-mente a população, evitando-se osimpactos ambientais. Assim, apre-senta-se no quadro 2 as principaiscausas destes impactos ambientaisque causam degradações em áreasurbanas.

Em função dos fatores que cau-sam impactos ambientais por falhasna gestão dos resíduos sólidos ur-banos, surge a necessidade de dire-

Quadro 2 – Principais fatores que causam impactos ambientais por falhas na gestão dos resíduos sólidos urbanosFonte: ANGELIS NETO (1999)

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trizes que visem não só a recupera-ção das áreas degradadas por resí-duos sólidos, mas também algumaspropostas de forma a contribuir paraevitar a ocorrência destes impactos.Assim, apresenta-se no quadro 3 aseguir os instrumentos econômicos,educacionais e informativos comeste fim. Longe de se querer indicartodos os instrumentos potencial-mente utilizáveis para o planejamen-to e recuperação de áreas degrada-das por resíduos sólidos, destacam-se tão somente aqueles mais impor-tantes.

Conclusão A abordagem do tema sobre pla-

nejamento e recuperação de áreasdegradadas por resíduos sólidosensejou uma série de consideraçõesque descrevessem os conhecimentosenvolvidos nestes dois aspectos: sepor um lado houve a necessidade dese conhecer os tipos de resíduos só-lidos e as formas de gestão, além dosimpactos decorrentes de suas falhas,por outro houve a necessidade deexplorar alguns aspectos envolvidoscom a degradação de áreas urbanas,relacionadas com a gestão incorretados resíduos sólidos. Neste contex-to, procurou-se traçar um paraleloentre os problemas de gestão que

ocorrem com os resíduos e os poten-ciais instrumentos utilizáveis parao controle e desenvolvimento de im-pactos ambientais.

Os conhecimentos técnicos sobreos problemas ambientais são co-muns a diversas áreas de conheci-mento. Cabe ao futuro profissionalespecializar-se, dentro de sua áreade formação, de como fazer uso des-tes conhecimentos em busca de so-luções, técnica e economicamenteviáveis, para a melhoria da qualida-de ambiental. Os cursos da área deCiências Sociais Aplicadas são umexemplo bem acabado de como estesfuturos profissionais podem e devemagir: conhecedores do espaço que oscerca, num aspecto mais amplo doque comporta a palavra “espaço”,estes profissionais são responsáveispor, através de uma abordagem crí-tica, analítica e conclusiva, transfor-mar os conhecimentos técnicos empráticas pedagógicas, engajadasnum processo de transformação einseridas no contexto social, econô-mico e cultural da sociedade do mo-mento, sem descartar as conseqüên-cias das transformações históricassobre o meio. A análise do espaço,sob essa ótica, não deve ser estático,mas relacionado diretamente com odinamismo que a história produz,

transformando e re-transformando omeio a partir da presença humana eos processos tecnológicos envolvi-dos nesta ocupação.

ReferênciasAGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂN-CIA SANITÁRIA – ANVISA. Resolu-ção RDC nº 33 de 25 de fevereiro de2003. Dispõe sobre o regulamento téc-nico para o gerenciamento de resíduosde serviços de saúde. Brasília/DF.

ANGELIS NETO, G. As deficiências nosinstrumentos de gestão e os impactosambientais causados por resíduos só-lidos urbano: O caso de Maringá/PRTese, 1999 (Doutorado, Escola Politéc-nica da Universidade de São Paulo).

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NOR-MAS TÉCNICAS – ABNT – NBR 10004/87 – Resíduos Sólidos – Classificação.Rio de Janeiro: ABNT, 1987.

GERBER, W. Impacto ambiental: resí-duos sólidos e reciclagem. Pelotas:UCPEL, 1999.

ROCCA, A.C.C (org.). Resíduos sólidosindustriais. São Paulo: CETESB, 1993.

Quadro 3 – Instrumentos e diretrizes utilizadas para o controle e recuperação de áreas degradadas por resíduossólidos urbanosFonte: ANGELIS NETO (1999).

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AbstractThis essay surveys the theoretical

and empirical literature on the inter-dependence between economicgrowth and the financial sector. It isshown that typical financial sectorfunctions such as price discovery,risk sharing, and liquidity transfor-mation have a non-trivial effect onthe growth of the real sector of theeconomy. Gains come mainly fromreduced transactions costs as wellas better allocation of resources.International empirical evidencelargely supports the proposition thatmore financially sophisticated coun-tries grow at faster rates than finan-cially repressed ones. Nevertheless,several questions regarding the effectof financial development on econo-mic growth remain unanswered,and several suggestions for futureresearch are given in the final sectionof the paper.

Keywords: economic growth; finan-cial sector; financial development;interdependence.

ResumoEste ensaio revisa a literatura te-

órica e empírica sobre a interdepen-dência entre crescimento econômi-co e o setor financeiro. É apresenta-do que as funções típicas do setorfinanceiro tais como revelação depreços, compartilhamento de riscose transformação de liquidez têm umefeito não trivial sobre o crescimen-to do setor real da economia. Os gan-hos provêm principalmente da redu-ção dos custos de transação assimcomo da melhor alocação de recur-sos. A evidência empírica internaci-onal em geral apoia a proposição deque países mais sofisticados finan-

AN ESSAY ON THE INTERDEPENDENCEBETWEEN ECONOMIC GROWTH AND THE

FINANCIAL SECTOR

Paulo Renato Soares Terra1

ceiramente crescem a taxas mais rá-pidas do que países financeiramen-te reprimidos. Não obstante, muitasquestões sobre o efeito do desenvol-vimento financeiro sobre o cresci-mento econômico permanecem semresposta. Ao final do artigo, são ofe-recidas diversas sugestões para fu-turas pesquisas.

Palavras-chave: crescimento econô-mico, setor financeiro, desenvolvi-mento financeiro; interdependência.

The understanding of businesson an international scale usuallyrequires from the professional ana-lyst the mastering of several disci-plines: marketing, economics, fi-nance, operations management, andintercultural studies, among othersocial and human sciences. It istempting – in such a diverse field ofstudy – to attribute great importanceto conditions particular of a singlecountry, such as its history, the cul-ture of its people, its institutionalarrangements, and its particular eco-nomic environment. However, asany basic science course teaches, atheoretical model must be an accu-rate description of the real world andyet parsimonious enough to beimplemented with a finite number ofvariables. In my point of view, thisfact poses one of the central researchproblems in international businessstudies: are universal theories suit-able to understand economic agents’behavior under particular businessconditions in different countries? It

is within this broad framework thatthis paper is developed.

The main objective is to explorethe interdependence between themacroeconomic environment andthe financial sector and how the in-teractions between them affect thebusiness conditions of firms. Thepaper’s ultimate purpose is to derivea few lessons regarding the interde-pendence between the macroeco-nomic environment and finance thatmay be useful to a variety of partiessuch as academic researchers, eco-nomic policymakers in developingcountries, managers of local andmultinational private corporations,executives of international financialinstitutions, managers of the invest-ment fund industry, and the staff ofmultilateral organizations, particu-larly those interested in developingcountries.

The remainder of this paper isstructured as follows. The next sec-tion presents an overall literaturereview on the relationship betweeneconomic growth and the financialsector. Section 2 presents the mainempirical evidence on this subject,while the last section outlines a syn-thesis of this literature. From thissynthesis, I suggest several prospec-tive research topics for future inves-tigation.

1. Theoretical OverviewThe relationship between the fi-

nancial and the real sector of theeconomy and its potential effects on

1 Doutor em Administração pela McGill University (Montreal, Canadá), Professor Adjunto do Programade Pós-Graduação em Economia da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). O autoragradece à Fundação CAPES pelo apoio financeiro e ao Sr. Guilherme Heurich, bolsista de pesqui-sa, pela assistência na realização deste estudo. E-mail profissional: [email protected].

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growth were largely ignored untilthe late 1960s. It was with the break-through works of Goldsmith (1969),McKinnon (1973) and Shaw (1973)that financial markets come to oc-cupy a major role in the growth lit-erature. These authors argue that thedevelopment of the financial sectoris not simply a byproduct of overalleconomic growth, but rather lever-ages the growth process. It can as-sist in the breakaway from sluggisheconomic performance to acceler-ated growth, mainly through incen-tives to save and invest.

Based on quantitative compara-tive analysis of the financial struc-ture of between half to three dozencountries, Goldsmith (1969) tries toanswer the following questions: whofinances whom at different stages offinancial development; to what ex-tent; through which instruments;and with what effects on economicdevelopment. He concludes that (1)financial superstructure grows morerapidly than the infrastructure ofnational product and wealth (theratio of aggregate market value of allfinancial instruments to the value oftangible net national wealth in-creases); (2) this increase is boundedupwards (between 1 and 1½); (3)LDCs have much smaller ratios thanEurope and North America; (4) themain determinant of the financialsuperstructure is the separation ofthe saving and investment functionsamong different economic units; (5)the share of financial institutions inthe issuance and ownership of fi-nancial assets increases consider-ably with economic development; (6)this institutionalization of savingand ownership has affected the maintypes of financial instruments differ-ently: more progress on claims thanon equity securities; (7) financialdevelopment started everywherewith the banking system and hasbeen dependent on the diffusion ofscriptural money through the econo-my; (8) the share of the banking sys-tem in the assets of all financial in-stitutions has declined with eco-nomic development; (9) foreign fi-nancing has played a substantialrole in some phase of the develop-ment of most countries; (10) trans-

fers of technology and entrepreneur-ship have been easier to accomplish,and on the whole more successful,with respect to financial instrumentsand institutions than in many otherfields; (11) the cost of financing isdistinctly lower in financially devel-oped countries than in LDCs; and(12) as real income and wealth in-crease, in the aggregate and per headof the population, the size and com-plexity of the financial superstruc-ture grow, although the direction ofcausation could not be established.

McKinnon (1973) focuses on theextraordinary distortions commonlyfound in the domestic capital mar-kets of developing countries. Hefinds that the impact of monetary andfinancial policies on LDCs capitalmarkets is much greater than is gen-erally supposed, and that policiesoften stifle incentives to save andinvest. Repression of the financialsector is paralleled by the use of tar-iffs and quotas in an effort to pro-mote development by manipulatingthe foreign trade sector. The authorsuggests that a more effective strat-egy for economic growth would pro-ceed from a thorough liberalizationof domestic financial markets, theliberalization of the foreign ex-change market, and the lifting of re-straints on foreign trade. This strat-egy, which he calls a “bootstrap”approach for development, aims atsecuring a country’s own economicdevelopment without having to relyon foreign aid, foreign capital invest-ment, and multinationals’ direct in-vestment, technology, and manage-rial skills.

Shaw (1973) argues that the fi-nancial sector of an economy doesmatter in economic development. Itcan assist in the break from ploddingrepetition of repressed economic per-formance to accelerated growth.Numerous economies with low lev-els of per capita income and wealthhave been attracted at times to a de-velopment strategy that results in“shallow” finance. By distorting fi-nancial prices including real moneybalances, interest rates and foreignexchange rates, it has reduced thereal rate of growth and the size ofthe financial system relative to non-

financial activity. The author elabo-rates on the classical approach ofmoney, finance and capital accumu-lation by introducing uncertaintyand rigidities in output and finan-cial decisions. Also, his model di-verges from the Keynesian Liquid-ity Trap by considering money notas wealth but as debt of the monetarysystem. After outlining the prin-ciples of his model, the author dis-cusses financial repression, its nega-tive impact on growth, and its inter-relations with the monetary system,fiscal policy and international tradeand finance. As a subsidiary resultof his analysis, the author arguesthat financially repressed economiesnot only sacrifice the leverage forgrowth that could be realized fromfinancial deepening, improved fis-cal performance and closer integra-tion with external markets, but alsosuffer from a higher degree of short-term instability in the growth pro-cess. The author concludes that fi-nancial deepening along with com-patible reforms in the fiscal and in-ternational sectors may makegrowth paths both steeper andsmoother.

In traditional growth theory, itwas believed that financial interme-diation could have an effect on thelevels of the capital stock per workeror to the level of productivity, but noton growth rates. The breakthroughwork of Romer (1986), however, al-lowed the emergence of endogenousgrowth models in which institu-tional arrangements influence thegrowth rate endogenously, thus pro-viding the theoretical basis for a re-lationship between financial mar-kets and economic growth.

Pagano (1993) provides a simpleexample of how the financial struc-ture can affect growth. Assume a com-petitive economy where N identicalfirms produce output yt with indi-vidual capital stock kt according to:

αtt Bky = (Eq. 1)

Where B is the average capital stockin the economy, given by:

α−= 1tAkB (Eq. 2)

B it is taken as a parameter by theindividual firm and A is regarded

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as the social marginal productivityof capital. Aggregate output is thengiven by:

tttt AKNBkNyY === α (Eq. 3)

Aggregate investment is given by:

ttt KKI )1(1 δ−−= + (Eq. 4)

Where d is the rate of deprecia-tion of capital. For simplicity, as-sume a constant population and aclosed economy with no governmentsector. This implies that in capitalmarket equilibrium, savings mustequal investment. However, let’sconsider that a fraction 1 – f of sav-ings is captured by the financial sec-tor in the form of fees and spreads (itis assumed that these rents are to-tally consumed instead of rein-vested). Therefore:

tt IS =φ (Eq. 5)

Using Eq. 3, Eq. 4, and Eq. 5, thegrowth rate g at t + 1 is given by:

termediaries (1 – f) tends to be com-peted away, and the total resourcesavailable for investment increases,therefore increasing the growth rateg (BENCIVENGA, SMITh, and STARR,1996). Besides fees and spreads, thesize of f can also be affected by gov-ernment specific policies such as re-strictive regulations, taxation, andreserve requirements (AMABLE andCHATELAIN, 1996). Another wayfinancial markets can positively af-fect the growth rate is by providingefficient allocation of capital. Finan-cial intermediaries help investmentin projects with the highest marginalproduct of capital by collecting anddisseminating information on alter-native projects, and by encouragingindividuals to invest in riskier – andusually more productive – projectsby providing portfolio diversifica-tion (ATJE and JOVANOVIC, 1993;LEVINE and ZERVOS, 1996; Obst-feld, 1994). This risk sharing role ofthe financial sector affects the mar-ginal productivity of capital (A) bypooling resources and permitting thefunding of less liquid projects, pre-venting inefficient bankruptcy, aswell as creating the conditions fordiversification of volatility risks. Fi-nally, productivity may be increasedby technological specialization offirms, once these higher idiosyncraticrisks can be shared efficiently via thestock market.

More ambiguous effects of the fi-nancial sector over growth refer toits impact on the saving rate and theinterest rate. The existence of a finan-cial market may actually reduce s –and therefore g – for several reasons.By providing risk-sharing technol-ogy, the financial sector reduces theneed for precautionary savings ofhouseholds. Also, portfolio diversi-fication may lead to a negative effecton the saving rate if the (constant)risk-aversion coefficient is biggerthan unity (Pagano 1993; Devereuxand Smith, 1994). The financial sec-tor also extends credit for house-holds under the form of mortgagesand loans and this too reduces theneeds for precautionary savings.2

Finally, besides the effects of the di-rect financial sector cost f on growth,there are interest rate effects to beconsidered. The effect of the real in-terest rate on the savings rate is theo-retically ambiguous and definiteempirical evidence has not been pre-sented. If the development of the fi-nancial sector helps to narrow thespread and therefore raises the in-terest rate paid to savers, it is stillunclear what the impact should beon growth.

An interesting question howeveris not whether the existence of a fi-nancial sector contributes to growthbut how the development of such asector relates to economic develop-ment. In order to do so, it is essentialthat financial development be pre-cisely defined. Arestis and Deme-triades (1996) list three problems thatfinancial sectors are expected to re-solve: informational problems, prin-cipal/agent problems, and uncer-tainty problems. Informational prob-lems refer to problems such as ad-verse selection. Principal/agentproblems address problems such asmoral hazard and incentive mecha-nisms. Finally, uncertainty problemsrelate to risk sharing technologiessuch as insurance and portfolio di-versification. The degree of develop-ment of the financial sector wouldbe ideally measured by how well itresolves these problems. Of course,this is not an easy task, and mostempirical work in this area has cho-sen proxies related more to the sizeof financial indicators relative toaggregate output or per capita out-put. As a matter of fact, these indica-tors are more measures of depth andscope of the financial market ratherthan strict measures of its degree ofdevelopment, but this is a typicalshortcoming of empirical research.

It is easy to identify a typology offinancial systems. There are two ba-sic types often mentioned in the lit-erature: bank-based financial systemsand market-based financial systems.Bank-based systems rely on the in-volvement of the banking firm withindustrial firms as the main way to

(Eq. 6)

Where st denotes the gross sav-ings rate. Dropping the time sub-scripts, the steady state growth ratebecomes:

δφ −= sAg

(Eq. 7)

In short, financial markets mayaffect the growth rate directly throughthe portion 1 – f of savings that areconsumed in the financial interme-diation process. There are, however,other plausible ways in which the fi-nancial sector may influence growth.Pagano (1993) makes the distinctionbetween positive effects of financialdevelopment on growth and am-biguous effects.

Positive effects of a developed fi-nancial sector refer to the channel-ing of savings to firms and the im-provement of the allocation of capi-tal. As the financial sector becomesmore developed, the proportion ofsavings consumed by financial in-

2 Notice however, that if households take loans to finance the accumulation of human capital, then theeffect on growth may be ambiguous: a lower saving rate but perhaps a higher productivity of capital.

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transfer resources into production.Banks collect the savings of thehouseholds and invest such fundsaccording to its valuation tech-niques and private information of thefirms they work with. In such a sys-tem, the industrial firm’s ownershipis concentrated in a small number ofshareholders, each with a large stakein the company. Banks participateactively in the board of directors,management performance is evalu-ated by the small group of sharehold-ers, and changes in management aredecided usually within the scope ofthe firm. The market for corporatecontrol is small, and mergers andacquisitions are rare. Firms relyheavily on bank loans for their fi-nancing and not so much on equity.Banks exercise an important role inmonitoring corporate performanceand providing liquidity transforma-tion technology for the economy.Germany and Japan are usuallymentioned as examples of a bank-based financial system.

The market-based system on theother hand, relies on capital marketsas the main source of funds for long-term investment, either as debt orequity. Banks do not get closely in-volved with industrial firms, corpo-rate ownership is dispersed amonga large number of small sharehold-ers, and the market for corporate con-trol is very active. Management per-formance is monitored by marked-based mechanisms such as hostiletakeovers. Examples of such systemare the United States and the UnitedKingdom. Besides these two “pure”types of financial systems, there is acontinuum of intermediary possi-bilities in between. Also, one cannotunderestimate the role of banks inmarket-based systems: investmentbanks provide much of the financ-ing for hostile takeovers in the Uni-ted States.

With respect to the three problemsthat financial systems should re-solve, it is generally accepted that –under appropriate incentives – bank-based systems are more capable ofaddressing those problems thanmarket-based systems (Arestis andDemetriades, 1996). However, onecannot really establish that one sys-

tem is a priori more developed thanthe other. Moreover, one can observecountries with similar types of finan-cial systems but at different stagesof financial development. Finally,some empirical evidence exists for acomplementary role between thecapital market and the banking sys-tem (BOYD and SMITH, 1996; DE-MIRGÜÇ-KUNT and Levine, 1996b).

In this sense, it is useful to intro-duce yet another dimension of finan-cial development: the government’srole in administering prices andquantities in the financial sector, asin the case for interest rate controls,capital rationing, and directed lend-ing. A financial system is said to berepressed when such kinds of gov-ernment intervention are common.Liberalized financial systems, on theother hand, are those in which theeconomic agents decide the alloca-tion of capital based on market rates.The effects of repression on growth,in a government-administered fra-mework like the one discussed above,can occur in three ways: firstly, in-terest rate controls, taxation, andcapital requirements all depress fwhich in turn reduces growth. Sec-ondly, directed lending may allocateinvestment to sub-optimal projects,reducing the marginal product ofcapital.3 Finally, repressive policiesmay artificially reduce the real in-terest rate, which in turn may havean ambiguous effect on the savingrate. One can observe that bank-based financial systems allow for amore active role of the governmentin implementing repressive policies.Under a specific set of conditions,however, it can be shown that gov-ernment intervention on the financialmarket may indeed boost growth.Hellmann, Murdock, and Stiglitz(1996) focus on interventionist poli-cies to enhance deposit mobilization,while Levine (1996) contends thatintervention and/or regulation maybe growth enhancing in the presenceof pervasive market failures, but ad-mits that interventions themselvesmay at times cause or aggravateother market failures. Finally, Ama-ble and Chatelain (1996) suggest that

government policies that reduce theproblem of asymmetric informationare likely to have a positive effect ongrowth.

So far the financial sector as awhole has been discussed. One im-portant element of a financial sys-tem is the stock market. That is par-ticularly true not only for market-based financial systems but also formany emerging economies, whichobserved a great increase in interna-tional portfolio investment in theirdomestic markets since the early1990s. Demirgüç-Kunt and Levine(1996c) summarize the role of stockmarkets in economic growth underfour topics: creation of liquidity, riskdiversification, incentives to gover-nance, and price discovery.

Stock markets provide liquidityfor equity investment and thereforecreate incentives for longer-term in-vestment. The liquidity generated bya stock market reduces the transac-tion costs associated with holdingequity and therefore improves theallocation of capital towards higherproductivity projects. The positiveeffects of improved liquidity are two-fold: first, it allows the economy togrow faster because of an improve-ment in marginal returns (Boyd andSmith, 1996); second, because invest-ment in equity can be cheaply re-versed by selling shares in the mar-ket, higher volumes of savings areallocated in such projects (Benci-venga, Smith, and Starr, 1996). How-ever, one can list at least three po-tentially negative effects of liquidityon growth: by reducing the savingsrate through income and substitu-tion effects generated by higher av-erage returns, by reducing the needfor precautionary savings, and byencouraging investor myopia andtherefore relaxing monitoring (De-mirgüç-Kunt and Levine, 1996b).Although there is theoretical re-search on these effects, the empiri-cal evidence is still scarce.

The technology to diversify risksof specialized projects through thestock market affects growth by shift-ing a higher proportion of savingstowards riskier, higher return invest-

3 Not to mention moral hazard and rent seeking.

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ment projects. This boosts economicgrowth provided that the effects onthe savings rate (income and substi-tution effects, reduction of precau-tionary savings) do not offset thehigher productivity of capital.

Large and more liquid stock mar-kets may provide incentives that re-duce the principal/agent problembetween management and share-holders. The creation of an activemarket for corporate control is aneffective incentive to keep manage-ment’s interests aligned with share-holder interests. Moreover, the devel-opment of the stock market and thecreation of new financial instru-ments such as derivatives help in thedesign of incentive mechanisms formanagers to maximize shareholderswealth.

Finally, the price discovery func-tion of the stock market may affectgrowth in two ways. In relativelyinefficient markets, it pays investorsto research firms carefully beforemaking their investment decisions,since they can profitably trade us-ing their better information. Thisleads to an improvement of the qual-ity of the projects to be executed. Inefficient markets, all information isquickly revealed in prices, againcontributing to the quality of projects.However, this may lead to the free-rider problem: investors will notspend resources collecting informa-tion about firms if they cannot profitfrom it.4

2. Empirical EvidenceDespite the obvious implications

that the relationship between finan-cial development and economicgrowth may suggest, the empiricalliterature in this field is not as com-prehensive as one might expect. Be-yond the early studies of Goldsmith(1969) and McKinnon (1973), empiri-cal tests of such relationship are ingeneral recent. In a well-known pa-per, King and Levine (1993) studythe empirical link between a rangeof indicators of financial develop-ment and economic growth. Theyfind that indicators of the level of fi-nancial development (the size of theformal financial intermediary sectorrelative to GDP, the importance of

banks relative to the central bank, thepercentage of credit allocate to pri-vate firms, and the ratio of credit is-sued to private firms to GDP) arestrongly and robustly correlatedwith growth, the rate of physicalcapital accumulation, and improve-ments in the efficiency of capital al-location. Also, the predeterminedcomponents of these financial devel-opment indicators significantly pre-dict subsequent values of the growthindicators. The data are consistentwith the view that financial servicesstimulate economic growth by in-creasing the rate of capital accumu-lation and by improving the effi-ciency with which economies usethat capital. The authors concludedthat Schumpeter might have beenright about the importance of financefor economic development.

Similarly, Atje and Jovanovic(1993) empirically test whether fi-nancial development (especiallystock market development) affectsthe level and/or the growth rate ofeconomic activity, and they find asubstantial effect on both. They findno effect when the financial devel-opment proxy used is credit ex-tended by private and governmentbanks as a ratio to gross domesticproduct (GDP). However, when theproxy is the ratio of annual value ofall stock market trades to GDP, thedata strongly supports the model. Asfor level effects, the authors also findsignificant coefficients, although theestimates do not seem fully consis-tent with the tendency for interme-diation’s share in income to rise withthe level of development.

Murinde (1996) estimates an en-dogenous growth model in whichgrowth derives from the behavior ofeconomic agents in markets forcredit, bonds and shares using theZellner (1962) procedure for a groupof seven Pacific Basin countries. Theempirical investigation is furtherextended by using growth account-ing exercises and by extending theanalysis of the role of stock markets

as suggested by Atje and Jovanovic(1993). In particular, the empiricalanalysis indicates that stock marketdevelopment is significantly linkedto economic growth.

Odedokun (1996) provides an in-depth empirical analysis of the rela-tionship between financial develop-ment and the efficiency of invest-ment, proxied by the incrementaloutput-capital ratio. For his analy-sis, the author constructs a widerange of alternative indicators for fi-nancial intermediation, governmentintervention in the financial sector,interest rates, exchange rates, andinflation. His findings show that fi-nancial intermediation (measured interms of flow variables) is positivelyrelated to investment efficiency. Bycontrast, government interventionappears to be negatively related toefficiency. He also finds that policiesof real exchange rate appreciation,as well as high inflation are ad-versely related to investment effi-ciency. The relation between inter-est rates and efficiency remains un-determined in his analysis however.

Fry (1996) investigates the rolefinancial conditions have played inproducing the virtuous circles ofhigh saving, investment, outputgrowth and export growth in asample of Pacific Basin countriesduring the past few decades. Highsaving and investment stimulateoutput growth and export growth.In turn high growth raises savingand investment levels. The authorfinds that the relatively undistortednature of both financial and foreignexchange markets in these countrieshas been important to raise their sav-ing, investment, output and exportlevels over a long period of time.

Levine and Zervos (1996) exam-ine whether there is a strong empiri-cal association between stock marketdevelopment and long-term growth.The authors use cross-country re-gressions to examine the associationbetween stock market developmentand economic growth. Using data of

4 One can argue that recent developments in the U.S. stock market (e.g. Tyco, Enron, Worldcom, etc)cast doubt on the depth of the financial analysis carried on. In this case, free-riders have been punishedfor complacent reliance on market-generated information. I am thankful to Prof. Jan J. Jorgensen forpointing this out.

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forty-one countries over the periodfrom 1976 to 1993, they split thesample period so that each countryhas two observations with data av-eraged over each subperiod. Theauthors regress the growth rate ofGDP per capita on a variety of vari-ables designed to control for initialconditions, political stability, invest-ment in human capital, and macro-economic conditions. Then, they in-clude the composite index of stockmarket development. Thus theyevaluate whether there is a relation-ship between economic growth andstock market development that isindependent of other variables as-sociated with economic growth.They find a strong correlation be-tween overall stock market develop-ment and long-run economic growth.After controlling for the initial levelof GDP per capita, initial investmentin human capital, political instabil-ity, and measures of monetary, fis-cal, and exchange rate policy, stockmarket development remains posi-tively and significantly correlatedwith long-run economic growth.

Studies such as the one men-tioned above generally assume thatfinancial development causes eco-nomic growth. However, the direc-tion of causality between financialdevelopment and economic growthhas been a controversial issue in eco-nomics. Arestis and Demetriades(1996) challenge the causal interpre-tation of previous empirical workthat is based on a fragile statisticalbasis. Once contemporaneous corre-lation between the financial indica-tor and economic growth has beenaccounted for, there is no longer anyevidence of causality from financialdevelopment to economic growth.The second goal of the authors is todemonstrate that cross section datasets cannot address the question ofcausality in a satisfactory way. Theauthors conduct cointegration andcausality tests using time series datafor twelve representative countries.The results in all cases tend to jus-tify their claim for the importance ofinstitutional considerations andpolicy differences. The results de-pends very much on the institutionalcharacteristics, including the type of

financial system and the type of fi-nancial policies followed, as well asthe efficiency in implementing suchpolicies. Also, the authors find thatthe definition of the financial indi-cator used in the analysis also hasconsiderable importance for the re-sults.

The empirical definition of “stockmarket development” is the mainconcern of Demirgüç-Kunt andLevine (1996b). They contribute tothe literature by collecting and com-paring a broader array of empiricalindicators of stock market develop-ment than any previous study. Us-ing data on forty-four developingand industrial countries from 1986to 1993, the authors examine differ-ent measures of stock market size,market liquidity, market concentra-tion, market volatility, institutionaldevelopment, and integration withworld capital markets. The goal is toproduce a set of stylized facts aboutvarious indicators of stock marketdevelopment that facilitates andstimulates research into the linksamong stock markets, economic de-velopment, and corporate financingdecisions.

These authors find enormouscross-country variations in stockmarket indicators and attractive cor-relations among the indicators. Al-though many stock market develop-ment indicators are significantly cor-related in an intuitively plausiblefashion, the individual indicatorsproduce different country rankings.Although richer countries generallyhave more developed stock marketsthan pioneer countries, many mar-kets labeled emerging are more devel-oped than those in France, the Neth-erlands, Australia, Canada, Sweden,and Norway. Using measures of size,liquidity, and international integra-tion, the authors evaluate which mar-kets have been developing fastest overthe years. The article documents therelationship between the variousstock market indicators and mea-sures of financial intermediary devel-opment. Since debt and equity arefrequently viewed as alternative

sources of corporate finance, stockmarkets and banks are sometimesviewed as alternative vehicles for fi-nancing corporate investments. Theauthors document the cross-countryties between stock market develop-ment and financial intermediary de-velopment using measures of the sizeof the banking system, the amountof credit going to private firms, thesize of non-bank financial corpora-tions, and the size of private insur-ance and pension companies. Theyfind that most stock market indica-tors are highly correlated with thedevelopment and efficient function-ing of banks, non-bank financial cor-porations, and private insurancecompanies and pension funds.Countries with well-developedstock markets tend to have well-de-veloped financial intermediaries.Also, developing countries withwell-developed financial systemsare growing faster than developingcountries with under-developed fi-nancial sectors.5

Demirgüç-Kunt and Maksimovic(1996) empirically explore the effectof financial market development,particularly stock market develop-ment, on financing choices of firms.The authors use aggregated firm-level data for a sample of thirty coun-tries from 1980 to 1991. They mea-sure stock market development bythe ratio of market capitalization toGDP, the ratio of total value of sharestraded to GDP, and the ratio of totalvalue of shares traded to market capi-talization. Taking all the countriesin the sample together, the authorsfind that there is a statistically sig-nificant negative correlation betweenstock market development, as mea-sured by market capitalization toGDP, and the ratios of both long-termand short-term debt to total equity offirms. There is also a statistically sig-nificant positive relationship be-tween the size of the banking sectorand leverage. The relationship be-tween leverage and stock marketdevelopment loses significancewhen they control for variables thathave been identified in the corporate

5 Demirgüç-Kunt and Levine’s (1996b) data ends in 1993, before the Mexican and Asian crises. Thus,it would be interesting to test for the robustness of their results after these episodes.

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finance literature as determiningfirms’ financial structures.6 An inter-esting pattern emerges when the fullsample is broken down into sub-samples. In developed markets, fur-ther development leads to a substi-tution of equity for debt financing,especially for long-term debt. In de-veloping markets, large firms becomemore levered as the stock market de-velops, but small firms do not ap-pear to be significantly affected bymarket development. These findingssuggest that the development of astock market initially affects directlythe financial policies of only the larg-est firms. This may be because di-versification of ownership and theaggregation of information providedby the development of stock marketsinitially benefits the larger firmsmore because of the need to spreadfixed issuance costs and traders’costs of information acquisition.

Demirgüç-Kunt and Levine(1996a) discuss the relationship be-tween the initial state and reform ofthe financial system on the one handand public enterprise reform on theother hand. Based on detailed infor-mation of nine country case studies,they find that private enterprise re-form is more successful in countrieswith initially relatively well-devel-oped financial systems. Moreover,they find that private enterprise re-form is implemented much more suc-cessfully if such a reform is supple-mented by substantial and well-de-signed financial sector reforms.However, they underline the factthat the causal relationship betweenthe two kinds of reforms runs in bothdirections, and that exogenous fac-tors are important in determining theultimate outcome of both reforms.

Berthélemy and Varoudakis (1996)empirically test an endogenousgrowth model, which exhibits mul-tiple steady state equilibria due toreciprocal interactions between thefinancial and real sectors in theeconomy. The model shows that de-pending on the nature of steady state,there may exist a poverty trap inwhich the financial sector “disap-pears” and where the economy stag-nates, or endogenous economicgrowth may be positive and finan-

cial intermediation follows a normaldevelopment path. They supporttheir model by testing empirically theexistence of multiple steady stateslinked to the initial state of financialdevelopment in a cross-section of 95developed and developing coun-tries. Their results show that whileeducation is a pre-condition forgrowth, financial under-develop-ment may become a major obstaclein countries where the educationalpre-condition is satisfied. Moreover,they show that the optimality ofother policies such as trade policyand government expenditure policydepend on a reasonably well-devel-oped financial system. This resultleads to the conclusion that second-best policies in countries that havenot succeeded in developing a finan-cial system might be quite differentfrom the policies usually advocatedin a first-best framework.

3 SynthesisIn summary, there is a vast theo-

retical literature going back threedecades explaining the linkages offinancial sector development andeconomic growth. Under competi-tive markets the role of the financialsystem in channeling savings to-wards the highest return projects isbeneficial to welfare and allowsfaster growth. Moreover, as the finan-cial market develops and becomesmore competitive, transaction coststend to fall and the net savings di-rected to investment increase. There-fore, given these conditions, the fi-nancial sector plays an importantrole as a catalyst for growth. Morerecent literature, however, questionsthe direction of the impact of finan-cial development on aggregate sav-ings because of income and substi-tution effects. Also, improvements inrisk diversification may induce in-vestors to become reckless in theirresearch for projects because of thefree-rider problem, which may in theaggregate lead to less efficient re-source allocation.

The available empirical evidencein general supports the view that

overall financial development has apositive effect on economic growthand that stock market developmentin particular has an even more sub-stantial impact than banking devel-opment. There is however plenty ofevidence on the complementaryroles between banking system andstock market development as the fi-nancial system becomes more devel-oped. Government intervention onthe financial sector has been shownto be in general adverse to develop-ment, except in the presence of veryspecific market failures. Finally, theevidence on the effect of financialintegration with the global marketis as yet ambiguous.

A few aspects are not explored inthe literature and should deservemore detailed investigation. For in-stance, how do different financialintermediation systems (market-based versus bank-based) comparein terms of their contribution togrowth? Is competition policy in thebanking sector a major element of fi-nancial development and thereforeeconomic growth? Given differentinitial conditions (income, deposits,liquidity, etc), what are the policiesthat developing countries shouldaddress in order to develop their fi-nancial sectors? Similarly, givenimperfect competition in the bank-ing sector and incompleteness incapital markets that characterizedeveloping countries, how shouldpolicymakers proceed in order todevelop the financial sector in a sus-tainable fashion? Is there an optimalsequence of measures? How does therecent experience of developingcountries contrast to theory with re-spect to financial liberalization?What are the causality linkages be-tween the real sector and the finan-cial sector of the economy? To whatextent do macroeconomic factors in-fluence the degree of indebtednessof households and firms?

These are all interesting ques-tions whose answers will greatlycontribute to our understanding ofthe subtler interrelations between fi-nance and growth. Of course, ad-

6 Such as the ratio of net fixed assets to total assets, the ratio of earnings to total assets, the ratio of netsales to total assets, and the ratio of total assets to firm size.

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dressing all of them at once in asingle piece of research is a near im-possible task. Therefore, these top-ics are left as suggestions for futureresearch initiatives.

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Para que seu artigo seja publicado no próximo núme-ro da RDE (nº 14) o prazo para entrega dos originaisse encerra dia 31.08.06, e deverá ser enviado em CDou disquete de acordo com as NORMAS DE EDITO-RAÇÃO publicadas na página 123 deste número.

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ResumoO objetivo central deste artigo é

relatar a experiência do surgimentodo conjunto de empresas de confec-ção infantil do pequeno municípiode Terra Roxa – Paraná. A idiossin-crasia é um forte componente dosAPLs, no entanto, nesse caso adinamização de elementos ligadossinalizam para uma completa anti-vocação territorial na qual estáimersa a concentração de empresasde confecção infantil desse municí-pio. A capacidade de transformaruma rede de pessoas em rede de ne-gócios está fortemente associada àidéia de resistir e criar condições desobreviver no local onde se vive, quese expressa por meio do capital so-cial, transformando-o em elementoindissociável ao conceito territorial.O capital sinérgico colocado na his-tória de declínio econômico do mu-nicípio de Terra Roxa e a biografiade seus sujeitos sociais lideram aprodução e a geração de emprego erenda de tal magnitude que possibi-lita a reconfiguração econômica des-se município empobrecido.

Palavras chave: arranjo produtivolocal, capital social, desenvolvimen-to local, Terra Roxa-PR.

AbstractThe central objective of this article

is to report the experience of thesprouting companies of infantileclothes confection of the small cityof Terra Roxa- Paraná. The idiosyn-crasy is a strong component of theAPLs, however, in this case thedynamiting of elements signals to acomplete territorial anti-vocation inwhich is located the concentration

of companies of infantile clothesconfection of this city. The capacityto transform a net of people into abusiness net is strongly associatedwith the idea to resist and to createconditions to survive in the placewhere people live, that it is express-ed by the social capital, transform-ing it into an indissociable elementto the territorial concept. The syner-gic capital placed in the history ofthe economic decline of Terra Roxaand the biography of its socialcitizens leads to the production andgeneration of job and income of suchmagnitude that it makes possible theeconomic reconfiguration of thisimpoverished city.

Key words: local productive arran-gement, social capital, local develop-ment, Terra Roxa-PR.

1 IntroduçãoNo Brasil, o planejamento e as

políticas de desenvolvimento regio-nal estão ausentes da agenda doEstado por muitos anos, as primei-ras experiências remontam a déca-da de 1950 e as últimas a década de1970. A partir dos anos de 1980, apolítica econômica voltou os seusesforços para a estabilidade mone-tária. Recentemente, a década de1990 foi marcada por uma nova or-dem econômica, na vida pública eprivada dos cidadãos e empresas

brasileiras, pois o Estado não tinhamais condições de incentivar e fazerdispêndios financeiros para estimu-lar intensivamente qualquer setoreconômico ou mesmo região.

Não obstante esta situação, al-guns fenômenos de desenvolvimen-to se espraiavam pelo Brasil, sendoque muitos com característicasmarcantes, como a aglomeração demédias, pequenas e microempresasem uma mesma localidade, ligadasà produção de um ramo de ativida-de específico – industrial ou de ser-viço. Esta forma de organizar a pro-dução já havia sido registrada no fi-nal do século XIX na Inglaterra, porAlfred Marshall. Mas no Brasil, co-meçou a ser estudada de forma maisintensa há pouco mais de quinzeanos.

Atualmente, as políticas de fo-mento ao desenvolvimento regionale, até então, o esquecido desenvolvi-mento local tem nova roupagem,pois integram e favorecem ações en-tre o público e o privado. Já é extre-mamente conhecida a capacidade deempregar e de gerar renda das mé-dias, pequenas e microempresas, asquais, conciliadas ao fato de estaremagrupadas em torno de um mesmoramo de atividade, criam condiçõesfavoráveis ao sinergismo capaz deaumentar a competitividade e a so-brevivência no mercado.

ARRANJO PRODUTIVO LOCALDE TERRA ROXA: A ANTI-VOCAÇÃO?

Jefferson Andronio Ramundo Staduto 1

Ednilse Willers 2

Paulo Roberto Azevedo 3

1 Doutor em Economia Aplicada pela ESALQ/USP. Professor Adjunto do Colegiado do Curso de CiênciasEconômicas e do Mestrado em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da Unioeste/Campus deToledo. E-mail: [email protected].

2 Mestre em Desenvolvimento Regional e Agronegócio pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná(Unioeste/Campus de Toledo). E-mail: [email protected].

3 Doutor em Ciências Sociais pela UFRGS e Pós-Doutor pela Universidade do Texas. Professor Adjuntodo Colegiado do Curso de Ciências Sociais da Unioeste/Campus de Toledo. E-mail: [email protected].

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No Paraná, mais precisamente naregião Oeste do Estado, no municí-pio de Terra Roxa irrompe um des-ses fenômenos sócio-econômicos, oqual serviu de esteio para o municí-pio começar a remover a poeira dacrise que se arrastava desde meadosda década de 1970, devido a uma im-petuosa geada que dizimou os cafe-zais de toda a região. Isto resultouna perda de quase três quartos dapopulação do município em 20anos. A agricultura que fora o gran-de catalisador do surgimento da ci-dade, já não parecia tão benevolen-te, fazendo com que muitos deixas-sem as suas terras para buscar o sus-tento da família em outros locais.

Contudo, aparentemente do va-zio surgiu um número expressivo deindústrias de confecções de modainfantil. O hobby de uma das mora-doras da cidade, que poderia serapenas a tão sonhada renda extra,frutificou e liderou uma nova confi-guração econômica para o municí-pio cujos resultados já impactoupositivamente na estrutura econô-mico-social local.

O objetivo central deste artigo érelatar a experiência do surgimentodo conjunto de empresas de confec-ção infantil do pequeno municípiode Terra Roxa – Paraná. Este artigoavança de forma breve e concisa nosconceitos de capital social e territo-rialidade bem como no processo detransformação econômico-social queo Brasil e o Estado do Paraná viven-ciaram a partir da década de 1950,como forma de se compreender o pro-cesso de declínio econômico dosmunicípios pequenos, tal como Ter-ra Roxa, e suas necessidades demudanças em favor de sua sobrevi-vência econômica e social.

Para tanto, o artigo está divididoem cinco partes, sendo esta introdu-ção a primeira, seguida do quadroteórico que se subdivide na concei-tuação de capital social e territo-rialidade (tidos pela literatura eco-nômica regional recente como reaisdesencadeadores de desenvolvimen-to econômico). Na seqüência seráapresentado um breve resgate histó-rico do cenário econômico brasilei-ro e do Estado do Paraná da décadade 1950 em diante. Em seguida é re-latado o processo de transformaçãoeconômica do Município de TerraRoxa, destacando a nova configura-ção produtiva que surgiu a partir doano 2000 e que foi responsável pelaalteração da estrutura urbano-rural,existente até 1999, para a urbano-industrial. Nessa secção também sãoapresentados os resultados obtidosdas pesquisas realizadas nos anosde 2004 e 2005 sobre as causas dareestruturação produtiva ocorrida. Epara encerrar, as considerações fi-nais.

2 Quadro teóricoNa nova concepção de desenvol-

vimento econômico ganham impor-tância, entre outros, alguns compo-nentes socioculturais. O espaço dei-xa de ser contemplado simplesmen-te como suporte físico das ativida-des e dos processos econômicos,passando a ser mais valorizados osterritórios e as relações entre seusatores sociais, suas organizaçõesconcretas, as técnicas produtivas, omeio ambiente e a mobilização soci-al e cultural (MARTINELLI e JOYAL,2004). Neste contexto termos comocapital social e territorialidade pas-sam a centralizar as discussões aca-dêmicas enquanto promissoras ver-tentes de desenvolvimento econômi-co local.

O termo capital social tem sidoutilizado para contrapor a visãoeconomicista do desenvolvimentoeconômico, pois modifica o centro deanálise das relações econômicaspara as relações humanas e sociais,passando a ser reconhecido comoum ativo, no qual as estruturas soci-ais passam a ser vistas como recur-sos que podem desencadear o desen-volvimento econômico local.

Sendo o capital social um recur-so em potencial, sua utilização en-quanto instrumento que leva ao de-senvolvimento econômico está fa-zendo parte, desde meados da déca-da de 1990, das discussões acercados modelos de desenvolvimentoeconômico propostas pela Organi-zação para a Cooperação Econômi-ca e o Desenvolvimento – OCDE,Banco Mundial e a Comissão Eco-nômica para a América Latina –CEPAL (AMÂNCIO et al., 2005).Nesta configuração, o termo capitalnão se reporta, apenas, ao acúmulode riqueza ou a um estoque que ser-ve à produção e da qual a renda é oobjetivo, mas sim, a uma conotaçãode coletividade, onde um local co-mum é compartilhado por gruposcooperantes (MILANI apud AMÂN-CIO et al., 2005).

O capital social, no atual contex-to de desenvolvimento econômico, évisto como um ativo que oferece àslocalidades a possibilidade de con-solidar metas de desenvolvimentoeconômico por meio das própriaspotencialidades e capacidades dasociedade local. É o que Bourdieuapud Amâncio et al. (2005) afirma-va quando disse que o capital socialé um recurso que pode ser mobiliza-do com a finalidade de permitir aosgrupos e/ou indivíduos formas mú-tuas de ajuda e de cooperação, poispode ser tanto um estoque quanto abase de um processo de acumulaçãoque permite à determinada socieda-de ter maiores chances de competi-tividade e de sobrevivência no mer-cado. Neste formato, o capital socialcompreende a capacidade de orga-nização de uma sociedade, a qual,associada à vida econômica, à con-fiança e a cooperação transforma-seem potencialidades reais de inter-venção econômico-social, facilitan-do ações coordenadas que podem setornar a base do desenvolvimentoeconômico local.

Este processo se torna viável porter o capital social a função de criare de gerar oportunidades, capacida-des e potencialidades nos diversosatores de uma determinada socieda-de, é o que Putnam (1996) já demons-trou em suas pesquisas quando afir-mou que onde existe capital social, é

... uma impetuosageada dizimou os cafezais

de toda a região,resultando na perda dequase três quartos da

população do municípioem 20 anos...

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103Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BARDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ele o ponto fundamental para o de-senvolvimento econômico.

Freeman (1991) e Newby (1992),apud Albagli e Maciel (2003), tam-bém introduzem no contexto do ca-pital social a inovação, tida pelosautores como a capacidade de umasociedade, nas relações entre seusagentes, movimentos e organiza-ções, empenhar-se nas escolhas quelhes são mais adequadas dentre asopções disponíveis e acessíveis, bemcomo aplicar os resultados de suasopções onde e como serão mais pro-dutivas social e economicamente.

Mas o que é capital social? ParaPutnam (1996) capital social diz res-peito a determinadas característicasde uma organização social, comoconfiança, normas e sistemas, asquais contribuem para o aumentoda eficiência da sociedade, pois fa-cilita ações coordenadas em prolde um objetivo comum. É uma res-posta que contrapõe o mito de que asociedade é composta apenas porgrupos de indivíduos independen-tes, na qual cada um age para atin-gir objetivos pessoais. SegundoColeman (1990) apud Abramovay(2000), o capital social vem contra-por este mito, pois demonstra que osindivíduos não agem isoladamentee que seus objetivos também não sãodefinidos de forma individualizada.É diante desta constatação que asestruturas sociais contemporâneasdevem ser vistas como recursos,como um ativo, pois o capital socialé produtivo e através dele se tornapossível o alcance de objetivos quenão seriam atingidos de forma indi-vidualizada.

O capital social é um ativo coleti-vo de grupos inseridos numa estru-tura social. Trata-se de valores e cren-ças que os cidadãos compartilham,expressando socialização e consen-so normativo. Esta postura favoreceo espírito cívico e a vida cooperati-va, gerando espaços e estruturas detrabalho em equipe, instigando ainovação e a aprendizagem coletiva,fatores importantes para o dinamis-mo econômico recente (ALBAGLI eMACIEL, 2003). Sendo assim, pode-se dizer que vários podem ser os be-nefícios econômicos do capital soci-al, quais sejam: a) maior facilidade

de compartilhamentos de informa-ções e conhecimentos, devido a rela-ções de confiança, “espírito” coope-rativo, referências sócio-culturais eobjetivos comuns; b) conformação deambientes propícios ao empreende-dorismo; c) melhor coordenação ecoerência de ações, processos de to-mada de decisão coletiva e maiorestabilidade organizacional, contri-buindo para a redução de custos.

Mas é a partir da década de 1990,que se percebeu a existência de forterelação entre capital social e a forma-ção de aglomerações produtivas lo-calizadas. Estudos teóricos e empíri-cos4 demonstram que em aglomera-ções produtivas, especialmente aque-las reconhecidas como arranjos pro-dutivos locais, as empresas (de micro,pequeno e médio porte) têm mais con-dições de sobreviver de modo com-petitivo e sustentado. Em conjuntocom a sociedade local tem alcançadoíndices de crescimento econômicoque viabilizam a retomada do desen-volvimento econômico-social local(ALBAGLI e MACIEL, 2003).

Se o capital social é tido como umativo que possibilita a convergênciade interesses coletivos na direção dedeterminado objetivo, neste casopara o desenvolvimento econômicode uma localidade, então se faz ne-cessário entendermos também o sig-nificado que se está delineando parao espaço de ação deste capital so-cial, ou como se tem denominado naliteratura recente, o espaço territorialdo desenvolvimento.

Para a OCDE (1994) apud Abra-movay (2000, p. 385), “um territóriorepresenta uma trama de relaçõescom raízes históricas, configuraçõespolíticas e identidades que desem-penham um papel ainda pouco co-nhecido no próprio desenvolvimen-to econômico”. A idéia de que é apartir de uma realidade territorialespecífica que se pode desencadearo desenvolvimento econômico adveiodos exemplos de sucesso obtidos naTerceira Itália (década de 1980) e nosEUA (1980/1990) com o Vale do Si-lício. Nestes casos o desenvolvimen-to econômico foi resultado de formasespecíficas de interação social e da

capacidade inovativa e empreende-dora da população local, a qual, atra-vés de suas empresas conseguirampromover e construir ligações dinâ-micas que foram capazes de valori-zar conhecimentos, tradições e con-fiança, criando a sinergia necessá-ria entre os atores locais em prol doobjetivo comum de superar seu esta-do de estagnação econômica (ABRA-MOVAY, 2000).

Com base nestas experiências desucesso, percebeu-se que o desenvol-vimento econômico está diretamen-te ligado à emergência do potencialdo capital social local, bem como comas iniciativas de seus atores em ino-var e em definir planos de ação cole-tivos que os levem a agir em direçãoa projetos comuns que busquem de-sencadear o desenvolvimento econô-mico local. Neste contexto, o territó-rio é visto como um meio inovador,até porque, as empresas por si só nãose transformam em agentes inovado-res. Elas são partes de um meio ondea história, a organização, os compor-tamentos coletivos e o consenso queos estrutura é que são seus verda-deiros componentes de inovação.Sendo assim, os comportamentosinovadores de um território depen-dem, diretamente, das variáveis de-finidas no plano local e na densida-de de seu tecido institucional e capi-tal de relações (MAILLAT, 2002).

Storper (1996), apud Abramovay(2000), afirma que os sistemas pro-dutivos mais dinâmicos são aquelesque se caracterizam pelas inovaçõese que emergem das potencialidadesendógenas e diferenciadas de atorescoletivos ligados uns aos outros porobjetivos comuns e localizados. Ouseja, conforme Albagli (1999), é nonível local que se desenvolvem asempresas e as atividades úteis aodesenvolvimento econômico, sociale cultural de uma coletividade. É neleque se apresentam os elementos detransformações sócio-político-econô-micos, pois é o locus operandi de no-vas formas produtivas e de parceri-as, onde a competição cede lugar àcooperação.

Assim, os lugares estão se espe-cializando de acordo com suas con-

4 Ver mais referências www.ie.ufrj.br/redesist.

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104 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

dições naturais, de sua realidadetécnica e de suas vantagens de or-dem social. Na medida em que aspotencialidades dos lugares se evi-denciam, suas escolhas para o exer-cício dessa ou daquela atividade setornam mais precisas, o que, segun-do Santos (1996, p. 199) irá desenca-dear o sucesso dos empreendimen-tos lá existentes, “é desse modo queos lugares se tornam competitivos”.

O local passa a adquirir conota-ções socioterritoriais de ação, pas-sando a ser redefinido enquantoagente ativo dos processos de desen-volvimento econômico. Para tanto sefaz necessário pensar o territóriocomo um sistema, cujas ações coleti-vas devem objetivar a implantação ea gestão de projetos que potencia-lizem a economia local, gerando tra-balho e renda através da criação depequenas e médias empresas.

Ou seja, é preciso instigar o po-tencial competitivo do território, poisé através deste que se dinamiza aorganização e a participação dosagentes sociais nos processos dedesenvolvimento econômico local(MORAES, 2005). São as ações cole-tivas preconizadas por Schmitz(1997) tidas como a tônica que dina-miza as mudanças necessárias àconstrução de planos locais que pos-sam levar ao desenvolvimento eco-nômico. E são essas mesmas açõescoletivas que alteraram e estão mo-vimentando a economia de TerraRoxa, tendo nas empresas de con-fecções infantis o desencadeador desuperação da estagnação econômi-co que se apoderou do municípiodesde a década de 1970.

Mas para que se possa compre-ender, efetivamente, o processo dedesenvolvimento econômico do Mu-nicípio de Terra Roxa, se faz neces-sário resgatar, mesmo que em brevespalavras, seu contexto histórico,ampliando essa análise a partir darealidade econômica do país e dopróprio Estado do Paraná.

3 Um Brasil em transformação

3.1 A Compressão dos municípios pe-quenos

O processo de modernização daagricultura brasileira, não obstante,

aos benefícios econômicos e sociais,contribuiu para a concentração daterra. O sistema de produção vincu-lado pelo pacote tecnológico atrela-do ao crédito rural inviabilizou vá-rios produtores rurais. A policulturaexpressa pelo sistema de produçãotradicional, não apresentou a sus-tentabilidade econômica necessária,detonando a “bomba” imigratóriado campo para as cidades que ocor-reram na década de 1960. Este cená-rio acentuou-se nas décadas de 1970e 1980, e continuou na década 1990,cuja alteração da estrutura fundiáriapassou a ser o fenômeno que refor-çou os índices de urbanização emquase todos os estados brasileiros.

A partir da década de 1970, a pe-quena propriedade entra em crise.As estatísticas revelaram que o nú-mero de estabelecimentos rurais es-tava diminuindo e o impacto da con-centração de terra nos estados do Sulaumentando. Nas cidades do inte-rior as mudanças na estrutura fun-diária alteraram profundamente aestrutura econômica e a fixação dapopulação nessas localidades. Por-tanto, o estudo e a análise do movi-mento populacional das cidades bra-sileiras e paranaenses é fundamen-tal para entender o significado dastransformações sócio-econômicas eespaciais que ocorreram a partir dadécada de 1970.

A mão-de-obra rural ocupadacomeça a reduzir-se drasticamenteno campo em função do alastramen-to da mecanização das culturas desoja, trigo e milho. Um grande con-tingente populacional ficou sem tra-balho e renda. Não só a pequena pro-priedade desapareceu, mas tambémos trabalhadores rurais perderamseus postos de trabalho. Consideran-do essas duas situações, nos fortale-

ce a idéia de que o movimento mi-gratório campo-cidade no Brasil teveum forte caráter de expulsão, estimu-lando os residentes do meio rural ase deslocarem para as cidades e ou-tras regiões.

A Tabela 1 revela o impacto que amecanização agrícola causou nonúmero de mão-de-obra empregadana agropecuária brasileira. Este con-texto nos conduz a uma forte refle-xão sobre a necessidade dos muni-cípios, ou mesmo regiões, vislumbra-rem e concretizarem novas possibi-lidades de investir em mão-de-obranão-agrícola ou urbano-industrial.Alguns municípios estão conseguin-do renovar a vida produtiva comnovas atividades, produzindo de-senvolvimento com pouco ou mes-mo nenhum vínculo com a ativida-de agropecuária, tal como, é o casodas indústrias de confecção infantilde Terra Roxa.

O crescimento econômico dequalquer região (cidade, estado oupaís), pode ter um grande caráter de“espontaneidade”, ou seja, sem pla-nejamento. Por outro lado, o desen-volvimento pode ser planejado, pro-gramado e integrado do ponto devista social, produtivo e territorial.Ora, o Brasil já teve uma forte expe-riência de planejamento, por meio dediversos projetos de desenvolvimen-to iniciados na década de 1950, comos Planos de Metas. Nas décadasseguintes, no regime militar, outrosplanos de desenvolvimento foramadotados, mas estes tinham por al-cance as macrorregiões brasileiras.

Contudo, a classe dirigente do paíspercebeu que não bastava ter proje-tos de desenvolvimento bem conce-bidos e simplesmente fazer a suaimplementação. Havia o gargalo fi-nanceiro, pois os custos advindos

Tabela 1 - Trabalhadores Ocupados em Equivalente Homem naAgropecuária Brasileira e por região – 1970 a 1995/96

Fonte: IBGE-Censo Agropecuário (1970, 1980, 1985 e 1995/96).

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destes projetos estavam, em grandeparte, atrelados ao sistema financei-ro internacional. Além deste agra-vante, tinha-se ainda o problema dainflação.

Após um longo período de diver-sas tentativas de combate a inflação,somente na década de 1980/1990, éque o governo começa a ter êxito emseu controle. Mas, isto teve um custosocial e econômico considerávelpara o país. Foram lançados e im-plantados sete planos de estabiliza-ção monetária, transformando o Bra-sil em um laboratório de controle in-flacionário. O desenvolvimento pla-nejado por meio de políticas públi-cas foi praticamente abandonado eo crescimento das regiões e cidadesacabaram se tornando produtos deiniciativas privadas ou políticaspúblicas isoladas. Este fato contri-buiu para que, em meados da déca-da de 1990, conceitos como o empre-endedorismo se tornasse a palavrade ordem dos processos de cresci-mento econômico das localidades,ou mesmo, do planejamento, pormeio de mecanismos de interação dainiciativa privada e o público.

Nos últimos 30 anos a reorgani-zação territorial bem como a sua evo-lução pode ser revelada pelos aspec-tos demográficos dos municípios.Desta forma, deve-se examinar o ce-nário nacional, com a inversão dapopulação campo-cidade e a crise dapequena propriedade, afetando for-temente as pequenas cidades, commenos de 50 mil habitantes. Pode-seobservar por meio da Tabela 2 queestas cidades estão reduzindo a suaparticipação no total da população,

sendo liderados pelas cidades commenos de 20 mil habitantes. De umaparticipação de aproximadamente26% da população em 1970, redu-ziu-se para pouco mais de 18% em2000. Já as cidades entre 20 a 50 milhabitantes tiveram a sua participa-ção no total da população nacionalpraticamente estável com uma certatendência de baixa.

Este comportamento populacionaldemonstra uma certa crise geral daspequenas cidades e, principalmente,das menores. O movimento migrató-rio que aconteceu no sentido campo-cidade fortaleceu as cidades maio-res e apenas algumas conseguiramcrescer para alcançar o status de ci-dade média. O município de TerraRoxa fez parte do movimento geralque se observou no Brasil. Natural-mente, que cada região e cidade ti-veram suas particularidades, contu-do, muito de suas relações se igua-lam às causas já apresentadas aqui.

Sendo um pouco mais específi-co, a participação das cidades mé-dias não-metropolitanas (100 a 500mil habitantes), ao longo do perío-do de 1970 a 2000, cresceu expres-sivamente no total da populaçãobrasileira, passando de 10,29%, em1970, para 17,31%, em 2000, núme-ros esses não acompanhados pelascidades médias que fazem parte dasregiões metropolitanas, que cresce-ram apenas 1,31%, no período, epelas cidades de maior porte, ape-sar do crescimento que ocorreu nadécada de 1970 (BRITO, HORTA eAMARAL, 2004).

Outro fato que merece atenção éque de 1970 a 2000 ocorreu a eman-

cipação política de 1.555 municípi-os, sendo 1.149 de pequeno porte,com população de até 20 mil habi-tantes. No entanto, a participação dapopulação no total desses municí-pios diminuiu consideravelmente de28%, em 1970, para 19,8%, em 2000.Para os municípios do segundo ex-trato (20 a 50 mil habitantes), não foimuito diferente, ou seja, houve umaumento no número de municípios,mas a população total também di-minuiu cerca de 10% (Tabela 3).

As cidades médias exercem umagrande atração regional de empre-sas e, conseqüentemente, de traba-lhadores. Neste contexto, as trans-formações ocorridas no Paraná tam-bém refletiram as mudanças popula-cionais e as formas de organizaçãodas cidades de maior porte (cidadesmédias). O crescimento de algumase a redução de outras, foram resul-tantes das atividades sócio-econômi-cas, que por sua vez, foram cons-truídas ao longo de uma trajetóriade desenvolvimento marcadas porparticularidades e ao mesmo tempointegradas ao movimento geral dodesenvolvimento brasileiro e para-naense. Na região Oeste do Paraná,por exemplo, a crise que está ocor-rendo em muitos municípios peque-nos é reflexo do efeito de polariza-ção que está muito associado com aagroindustrialização.

3.2 O Paraná na segunda metade doséculo xx

No estado do Paraná até a déca-da de 1940, as atividades econômi-cas eram restritas, basicamente, à ex-tração da erva-mate e madeira. Nas

Tabela 2 – Distribuição da população urbana segundo sua classe de tamanho – 1970 a 2000

Fonte: Brito, Horta e Amaral (2001). Dados Básicos: IBGE-Censos Demográficos (1970, 1980, 1991 e 2000)

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décadas de 1950 e 1960 a produçãopreponderante era o café e ainda aextração da madeira. Contudo, foiatravés da expansão da cultura docafé que o Estado sofreu sua trans-formação sócio-econômica (LEÃO,1989).

A cultura do café era extrema-mente representativa no total daprodução agrícola e da economiaparanaense. “O crescimento acelera-do da cafeicultura no Paraná, tratou-se da mais dinâmica das economiasprimário-exportadoras do Brasil, amesma que fora a base sobre o qualse dera o desenvolvimento econômi-co de São Paulo, criara a ilusão deque o estado [do Paraná] trilhariaagora o mesmo caminho.” (MAGA-LHÃES FILHO, 1996, p.9).

No entanto, no final da décadade 1960, a economia cafeeira apre-senta sinais de sua fragilidade, poisa sustentabilidade política que o caféteve quando ocorreu a sua expansãoem território paulista no século XIXe início do século XX, já não se man-tinha na segunda metade do séculoXX. O foco do governo federal era aindústria que se desenvolvia no es-tado de São Paulo, cujo financiamen-to adveio do confisco cambial docafé. Neste período, o estado de SãoPaulo já não era o maior produtorde café, mas sim o Paraná, sobre oqual recaia todo o ônus pelo finan-ciamento.

O ano de 1975 foi um dos maisdifíceis na história da economiaparanaense, contribuindo para queocorresse a mudança do perfil daeconomia, tornando o Estado maisurbano-industrial e menos rural. Aagricultura, setor que representava

mais de 40% da renda interna doEstado, sofreu os efeitos dos fenôme-nos climáticos adversos, desde doinício desse ano, tendo por impactosecas anormais que se alternaramcom geadas violentas e com o exces-so de chuvas, o que resultou em pe-sados prejuízos para a agricultura.Nesse ano as perdas nas lavourasde café, trigo e cana-de-açúcar, naspastagens e criações de gado, noscampos de produção de sementes eem outras atividades vinculadas àagropecuária foram equivalentes amais de um terço do Produto InternoBruto do Estado. (A ECONOMIAPARANAENSE..., 1975).

“Em termos absolutos, as perdase prejuízos que resultaram da con-junção desses fatores, extremamen-te adversos, podem ser consideradascomo o maior revés da agriculturaparanaense, em toda a sua história”(A ECOMOMIA PARANAENSE,1975, p.61). A partir de então a eco-nomia do Estado começa a tomaroutra configuração, auxiliada pelointenso processo de modernizaçãoda agropecuária, sendo a região Oes-te do Paraná um dos territórios maisafetados por este processo, o qualalterou fortemente o seu perfil pro-dutivo.

3.3 A marcha para o oeste do ParanáA região Oeste do Paraná teve

dois fluxos colonizadores. O primei-ro oriundo do fluxo migratório dosestados do Rio Grande do Sul e San-ta Catarina, motivado principalmen-te pelas empresas colonizadoras. Osegundo foi impulsionado pela cul-tura do café, tornando-se uma exten-são da expansão do Norte do Esta-

do, a qual atravessou o Rio Pequiri.O fluxo populacional era mais hete-rogêneo, originava de São Paulo,Minas Gerais, Espírito Santo e doNordeste brasileiro. O povoamentodo Oeste do Paraná por estas pesso-as contribuiu para o surgimento devários municípios, tais como, TerraRoxa, Assis Chateaubriand, Paloti-na, Tupãssi, Corbélia, Cafelândia,entre outros (COLODEL, 2003).

Pode-se notar que o Oeste doParaná sofreu um processo migra-tório inverso ao que ocorreu no Bra-sil a partir dos anos 1950. No setorrural brasileiro ocorria um forte pro-cesso de esvaziamento, atraído pelocrescimento do setor urbano-indus-trial da região Sudeste, e principal-mente no estado de São Paulo. Aprodução agropecuária de modo ge-ral não tinha praticamente nenhu-ma incorporação tecnológica. A es-trutura fundiária concentrada eraapontada como uma das causas,pois com exceção do Sul do país ha-via grande predomínio dos latifún-dios. A forma preponderante de ex-pandir a produção era por meio daincorporação de terra. Com efeito,as fronteiras agrícolas tinham queser agregadas ao processo produti-vo nacional.

O Oeste paranaense era conside-rado a última fronteira agrícola doSul do país. A princípio a sua ocu-pação, idealizada na década de1930, tinha por componente princi-pal a segurança nacional, mas a par-tir da década de 1950 o grandeêxodo rural poderia comprometer aprodução agropecuária e a coloni-zação contribuiu para contrapor aeste movimento.

Tabela 3 – Classificação dos municípios segundo sua classe de tamanho – 1970 a 2000

Fonte: Brito, Horta e Amaral (2001). Dados Básicos IBGE/Censo Demográfico de (1970, 1980, 1991 e 2000).

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É a partir dos anos 1960, que aregião teve sua grande explosãopopulacional. Entre 1960 e 1970, aregião recebeu 374.082 pessoas, e ataxa decenal de migração de 0,82%a.a.. Neste período apenas o DistritoFederal, considerada área de fortíssi-ma atração populacional, recebeumais migrantes que o Extremo OesteParanaense (RIPPEL, 2004).

A partir da década de 1970, teveinício na região uma nova fase deprodução agrícola. A modernizaçãoda agricultura brasileira que se alas-trou fundamentalmente pelas regi-ões Sul e Sudeste encontrou condi-ções sócio-econômicas para ser im-plantada no Oeste do Paraná. O cré-dito rural oficial e subsidiado eraatrelado a um pacote tecnológico. Aslavouras temporárias, como as cul-turas de soja e trigo, foram as princi-pais responsáveis pelo crescimentoda produção agrícola e desenvolvi-mento da região. A produção nãoresultava mais da policultura desubsistência, mas da especializaçãona produção de soja e trigo destina-dos ao mercado interno e exporta-dor (PIFFER, 1997).

Os pequenos proprietários foramalvo deste processo de reorganizaçãodo espaço rural e muitos estabeleci-mentos desapareceram da contagemdos Censos Agropecuários. O esva-ziamento populacional do campo,resultante da queda da populaçãorural ocorrida nas regiões Norte e noOeste paranaense tiveram suas cau-sas nas transformações que constitu-íram a modernização da agrope-cuária. Essa redução ocorreu de for-ma mais nítida nessas regiões, ondehouve um grande adensamento po-pulacional decorrente da expansãoagrícola que ocorreu anteriormente.

O movimento de concentraçãofundiária foi um dos responsáveispelo forte processo de êxodo rural:entre 1970 e 1980 as migrações naregião Oeste do Paraná deixaram umsaldo negativo de 117.047 pessoas.Na década seguinte mais 62.295 pes-soas deixaram a região. Boa partedestas 179.342 pessoas deixou o se-tor rural (1970 a 1990) deslocando-se para o meio urbano. Em 1970 apopulação rural do Oeste do Paranáestava na ordem de 80%, já em 1980,a população rural e urbana iguala-

vam-se em 50%, iniciando a décadade 1990 com uma população urba-na de aproximadamente 71%. A al-teração na composição da popula-ção dos municípios na região Oestedo Paraná bem como no Estado tor-naram ambos mais urbanizadas.Esta situação está associada à ne-cessidade de geração de empregonas cidades.

A partir da década de 1990, a pro-dução agroindustrial nas regiõesprodutoras de grãos e outras maté-rias-primas agropecuárias cresceuverticalmente e começa a ter grandevisibilidade para a sociedade e ossegmentos políticos, o que contri-buiu para que essas regiões cami-nhassem para a viabilização do de-senvolvimento regional e, particular-mente, alguns municípios se tornas-sem pólos com grande área de influ-ência atraindo novos investimentose, fundamentalmente, a populaçãodos municípios vizinhos. Tambémse tornaram receptores de antigosprodutores rurais que hoje não temmais a sua propriedade agrícola.

Mais recentemente, a região Oestedo Paraná teve um grande processode agroindustrialização concentradaem alguns municípios em razão devários vetores derivados de vanta-gens locacionais. Do ponto de vistainstitucional também há vantagenspor meio do recebimento de royaltiespelos municípios lindeiros que fazemmargem com o lago de Itaipu. Há tam-bém o município de Foz de Iguaçuque é um pólo turístico. No caso deTerra Roxa apesar de ser um municí-pio lindeiro recebe um valor irrisó-

rio, não contribuindo como fatorexógeno para aumentar a sua vanta-gem locacional como ocorre com ou-tros municípios lindeiros e não foialvo de investimentos da indústriaprocessadora dos produtos agrope-cuários. De fato, havia um caminhoaberto para o forte declínio desse mu-nicípio.

3.4 No oeste paranaense, o solo de ter-ras roxas

O município de Terra Roxa estásituado na parte norte da RegiãoOeste do Paraná, e encontrou-se nocentro do fenômeno de ocupação ci-tado anteriormente. Em 1970, o mu-nicípio também ingressou na segun-da fase econômica paranaense, ca-racterizada pela produção agrícolacentrada no binômio trigo e soja, al-tamente tecnificada, mecanizada ecom largo uso de insumos. A transi-ção da primeira fase para a segundacontribuiu para a emigração do Oestedo Paraná, revelando grande a subs-tituição de mão-de-obra rural pormáquinas e equipamentos, acarre-tando na estrutura fundiária maisconcentrada.

Em Terra Roxa este processo deemigração foi particularmente dra-mático. Entre 1970 a 1980, conside-rando-se a migração inter-estadual,intra-estadual e intra-regional a po-pulação decresce de 37.452 habitan-tes para 25.535, e entre 1980 a 1990para 19.820 habitantes e, ainda, en-tre 1990 a 2000 o decréscimo deixaum saldo populacional de apenas16.293 habitantes no município,como demonstra o Figura 1.

Figura 1 – Evolução da população de Terra Roxa de 1970-2000.FONTE: IBGE- Censo Populacional (1970, 1980, 1991 e 2000).

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O decréscimo populacional domunicípio de Terra Roxa, principal-mente na década de 1970, pode serexplicado pela transformação nomodelo de produção agrícola queafetou todo Oeste do Paraná e que jáfoi comentado anteriormente. TerraRoxa não escapou da tendência ge-ral dos movimentos demográficosque ocorreu no Brasil, de redução detamanho das pequenas cidades. Ex-cluído os aspectos políticos, religio-sos, raciais ou mesmo de risco deintegridade física e psicológica o in-divíduo tem a sua moradia onde eleobtém a sua renda, por meio do seupróprio negócio ou tendo uma ocu-pação assalariada. A evasão popula-cional dos pequenos municípios nagrande maioria é reflexo do baixodinamismo econômico.

No Paraná principalmente nadécada de 1990, ocorreu intenso pro-

cesso de migração intrarregional.Esta situação não poupou, principal-mente, os municípios menores doEstado, tal como o município de Ter-ra Roxa, onde seus habitantes nãofixaram residência em função de nãovisualizarem a possibilidade de ge-ração de renda para suas famílias.Mesmo sendo a agricultura a gran-de geradora de renda para o muni-cípio, logo se percebeu que a mesmanão dava conta de atender a abun-dante oferta de mão-de-obra existen-te, até porque na situação de peque-no proprietário não havia muita de-manda de serviços. Outro agravan-te foi o fato de Terra Roxa estar cer-cada por várias cidades mais dinâ-micas, como: Cascavel, Toledo e Fozdo Iguaçu, e em segundo plano ascidades de Palotina e Guairá.

Para ilustrar a evolução da pro-dução agrícola do município, foram

selecionados 4 produtos, que repre-sentam as culturas produzidas pe-las propriedades familiares na dé-cada de 1970 – café, algodão herbá-ceo e milho. As figuras 2, 3, 4 e 5 de-monstram muito bem como a altera-ção da composição das culturas emTerra Roxa tornou desfavorável seucultivo para a pequena proprieda-de. As culturas do café e algodão fo-ram, praticamente, dizimadas nomunicípio. Eram produtos dinâmi-cos e cultivados pela pequena pro-priedade. O café na década de 1970reduziu a sua produção como dis-cutido anteriormente em virtude dageada de 1975 que afetou essa cul-tura no estado do Paraná. Já o algo-dão, na década de 1990, teve a suaredução devido ao deslocamento dacultura para a região Centro-Oeste(Mato Grosso do Sul, Mato Grosso eGoiás) porque propiciava a implan-

Figura 2 - Quantidade colhida de mandioca em Terra Roxa de 1974-2003 (tonelada)Fonte: IPARDES (2005)

Figura 3 - Quantidade produzida de algodão em Terra Roxa de 1990-2003 (em toneladas)Fonte: IPARDES (2005).

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Figura 5 – Quantidade produzida de café em Terra Roxa de 1990-2003 (em toneladas)Fonte: IPARDES (2005).

Figura 4 – Quantidade produzida de milho em Terra Roxa de 1990-2003 (em toneladas)Fonte: IPARDES (2005).

tação de um novo padrão tecnológi-co (a mecanização). As culturas domilho e mandioca continuaram a sercultivadas em grande parte para sub-sistência.

As transformações sócio-econô-micas que ocorreram no campo re-fletiram diretamente na redução dapopulação de Terra Roxa. Uma vezque, as opções de trabalho diminuí-ram com a redução da pequena pro-priedade, e as outras cidades maispróximas e até mais afastadas pare-ciam mais atrativas. No entanto, asituação começa a mudar com osurgimento das primeiras empresasde confecção infantil. As quais, apartir da segunda metade da déca-da de 1990, registram um rápido cres-cimento de absorção de mão-de-obra

local. A Figura 6 demonstra a mudan-ça do perfil do município, nos quaiso expressivo aumento do emprego damão-de-obra no setor industrial, so-brepõe o ramo tradicional local (agri-cultura) e inclusive serviço. Verifica-se que a partir de 1999 ocorreu cres-cimento abrupto da ocupação indus-trial e, por sua vez, crescem os seto-res de serviço e comércio.

4 Evidências empiricas daemergência do capital sociale territorialidadeNos primeiros anos da década de

1990, o cenário nacional, tanto eco-nômico quanto político, não eramuito favorável no Brasil bem comono Paraná. Os municípios da RegiãoOeste do Paraná já vinham enfren-

tando a crise das pequenas proprie-dades, como narrado anteriormen-te. Neste mesmo período, em TerraRoxa, inicia-se um fenômeno querefletia a necessidade de mudar. Aprimeira empresa de confecção in-fantil surgiu a partir do ideal de umadas moradoras em contribuir no or-çamento familiar.

Inicialmente, era um hobby deuma das moradoras de Terra Roxa,Dona Celma, que bordou o enxovalde seus filhos, que por sua vez, ex-pandiu a atividade de forma restritapara aumentar o orçamento famili-ar como é muito comum nas mulhe-res que não se engajam no mercadode trabalho, e preferem atuar porconto própria ou se deparam com arealidade de falta de oportunidade,

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e sem dúvida Terra Roxa não era umlugar propício para geração de em-prego. No entanto, esta atividadecomplementar tomou rumos maio-res, primeiro tornando-se atividadeprincipal da família, com a adesãodo esposo, isto ainda na primeirametade da década de 1990. Váriosfatores fizeram que alcançasse o êxi-to dessa atividade no âmbito famili-ar, no entanto, o mesmo se estendeue se alastrou pela cidade ávida porum modelo de sucesso que outrashabitantes queriam replicar comsuas famílias. Desta forma, estava-se levantando uma bandeira de re-sistência ao declínio econômico esem dúvida no logo prazo refletiriano dilaceramento do tecido social.

Em menos de cinco anos, a idéiade investir em confecções para be-bês contagiou parcela expressivados empresários locais e de novosempreendedores, os quais passarama investir neste segmento, iniciandouma nova fase na história econômi-ca de Terra Roxa. Mas foi em 2004que “nasceu” oficialmente a organi-zação denominada de “Arranjo Pro-dutivo Local de Moda Bebê de TerraRoxa”, em decorrência do crescentenúmero de empresas que se especi-alizaram no setor. Essa organizaçãoexpressou a vontade dos empresári-os em criar uma agenda em comumde discussões e ações para fortale-cer o coletivo das empresas locais

(ARRANJO PRODUTIVO CONFEC-ÇÃO MODA BEBÊ, 2004). SegundoStaduto, Willers e Azevedo (2005),em 2005 existiam cerca de 47 empre-sas regularmente abertas e ativas. Ecom a criação dessa organização oconjunto das empresas pode alcan-çar os conceitos mais elaboradosque a literatura configura como ar-ranjo produtivo local.

A seguir são colocadas algumasevidências sobre os elementos queconduziram para o crescimento des-sas empresas e ao desenvolvimen-to local, os quais estão assentadossobre um território que foi cons-truído fundamentalmente pelo pro-cesso de resistência dos seus mora-dores frente a um declínio econô-mico persistente.

A história dos empresários dasconfecções de moda bebê de TerraRoxa está diretamente vinculada àhistória do Oeste do Paraná, de umamaneira geral, e da história do mu-nicípio de um modo mais específi-co. A maioria absoluta dos empre-sários nasceu ou veio a residir ain-da criança no município, acompa-nhando o itinerário de seus pais. Se-gundo o LIS (2004), 67% dos empre-sários de confecções são nascidosem Terra Roxa ou residente desde ainfância, e 33% mudou para TerraRoxa depois dessa época.

O vínculo entre estes empresári-os e a história regional municipal é

a origem rural da grande maioria dosempresários. Entre 27 empresáriospesquisados, 21 deles (77,8%) sãofilhos de agricultores e 7 ainda tema agricultura como seu meio de vida.Este dado remete diretamente ao ín-dice de esgotamento de postos demão-de-obra no setor rural comodemonstrado anteriormente.

Com respeito às atividades reali-zadas anteriormente por esses em-presários, em boa parte dos casos,os mesmos já operavam em algumaatividade relacionada com a área emque atualmente estão empreenden-do. Entre os 27 entrevistados 9 atua-vam em áreas diretamente relacio-nadas ao setor de confecções, outros5 atuavam como empresários e osdemais eram autônomos ou funcio-nários assalariados. A origem dasempresas é proveniente de capitalautóctone, ou seja, as empresas nas-ceram com capitais oriundos da eco-nomia pessoal de cada um dos em-presários. Indagados diretamentesobre esta questão mais da metadedos empresários indicaram esse ex-pediente como a fonte de recursos doseu empreendimento (LIS, 2004).

As fontes de inspiração para atomada de decisão de ingresso noramo foram diversas, entre elas des-tacam-se principalmente o conheci-mento de atividades do ramo, opi-nião de amigos ou familiares doramo, bem como o aproveitamento

Figura 6 - Evolução da ocupação de trabalho, por setores da economia em Terra Roxa de 1985-2002.Fonte: RAIS (vários anos).

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de mão-de-obra local (LIS, 2004). Amaior parte das empresas de confec-ção infantil Terra Roxa foram cria-das a partir de 2000. Essas empre-sas na grande maioria são de microe pequeno portes sendo que cerca de96% tem menos de 100 empregados,e 71%, destas, tem até 20 emprega-dos, como ilustra a Tabela 4.

exportados e a competir com os pro-dutos de outros estados brasileiros,a Tabela 5 ilustra esta expansão.

ação própria. Esta constatação evi-dencia e valoriza o potencial artís-tico local.

Contudo, o que se destaca naanálise feita, é que as mudançasocorridas na estrutura econômicade Terra Roxa foram oriundas docapital social local e está refletindoem um rápido posicionamento nomercado de moda bebê. No casodeste município, o capital socialparece ter maiores proporções, porter uma parcela expressiva de em-presários nascidos no município.Este fato “criou” um vínculo maiorcom a idéia de crescer e morar nomunicípio natal. Um outro elemen-to importante para caracterizar aorigem comum dos empresários é aorigem rural dos mesmos, pois 78%deles afirmaram que entre as pro-fissões exercidas pelos pais estavaa de agricultor (Censo Empresarial,2005).

Outro indicador que representaum traço de capital social é as rela-ções constituídas entre os empresári-os, uma vez que, o círculo social deconvivência dos empresários é forma-do em sua grande maioria por pesso-as do mesmo ramo. A Figura 8 mos-tra que parcela pequena dos empre-sários pesquisados apresentava bai-xo nível de confiança nos seus cole-gas de atividade. Estes dados eviden-ciam uma forte propensão à coesãosocial, pois existe uma confiabilidademédia tendendo para o crescimentoentre os empresários.

Tabela 4 - Empresas de confecçãomoda infantil segundo o número deempregados em 2003.

Fonte: CAGED (2004).

As empresas no ramo de confec-ções infantis são na maior parte defabricação dos vestuários. Há outrasempresas atuando como prestado-ras de serviços, principalmente fa-zendo as costuras das roupas e apli-cando os bordados. É provável quecom a expansão da produção nospróximos anos a participação dasempresas prestadoras de serviços seamplie, como um processo naturalde complexificação e de fortaleci-mento da estrutura produtiva. Se-gundo o Censo Empresarial (2005),96% da empresas são de industriaisde confecção infantil e 4% são deprestadoras de serviços.

A mão-de-obra empregada nes-tes estabelecimentos é preponde-rantemente formal e os treinamen-tos ocorrem na maioria, no âmbitointerno das empresas (Figura 7). Oprocesso de aprendizagem iniciouextremamente endógeno, desta for-ma, espera-se haja forte respostasdos agentes com a introdução orga-nizada de treinamento da mão-de-obra, e que ocorra um aprendizadocoletivo.

O setor desde seu surgimentoampliou significativamente a abran-gência de seu mercado. Hoje seusprodutos não se limitam mais aomercado regional, passando a ser

Figura 7 - Qualificação nas próprias empresas confecção infantil de TerraRoxa por ocupaçãoFonte: Censo Empresarial (2005).

Tabela 5 – Destino das vendas dasempresas de confecção infantil deTerra Roxa em 2004

Fonte: Censo Empresarial (2005).

Segundo o Censo Empresarial(2005), constata-se que 82% das em-presas têm marca própria, um resul-tado extremamente positivo, poisconfigura a autonomia em termosde designer e de produção das pe-ças produzidas pelas empresas, au-mentando expressivamente as chan-ces de fixação das marcas no mer-cado. Desta forma, estas empresasdiferenciam-se das chamadas em-presas de facção. As empresas res-pondem por boa parte da criação desuas roupas, 75% têm até 100% decriação própria, 17% e 8% têm até90% e 80%, respectivamente, de cri-

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112 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Atualmente, com a implantaçãodo Grupo Gestor APL de Moda Bebêde Terra Roxa a totalidade dos em-presários vinculados a esta associa-ção declararam haver colaboraçãoentre as empresas, e cerca 93% dasempresas já recebeu algum tipo debenefícios. No Quadro 1 são listadosesses benefícios.

5. Considerações finais e pers-pectivasComo exaustivamente visto, o

município de Terra Roxa tinha uma

base econômica apoiada na produ-ção agropecuária e, atualmente maisdiversificada, tende a uma comple-xidade nas relações intersetoriaispelo efeito desencadeador geradopelas empresas de confecções infan-tis.

No final dos anos de 1950 até iní-cio da década de 1970, ocorre o es-gotamento da fronteira agrícola as-sociado ao processo de tecnificaçãoagrícola em áreas de ocupação maisantigas, o que gerou um importanteprocesso de emigração na região.

Com a modernização da agrope-cuária uma enorme quantidade demão-de-obra foi liberada e, não ten-do um suporte industrial urbanopróximo que pudesse representaralguma alternativa, a solução foi àmigração para outras fronteirasagrícolas, ou mesmo para centrosurbanos mais próximos. Foi o queocorreu em Terra Roxa entre 1970 a1980, quando praticamente 15 milpessoas, deixaram o município.

A incapacidade de absorção ur-bana se refletiu nos índices estacio-nários do emprego no setor da in-dústria e de serviços até, pelo menos,no final da década de 1990. É nesteperíodo (final de década de 1990 einício de 2000) que começam a proli-ferar as empresas de confecções in-fantis.

A origem familiar agrícola damaior parte dos empresários indicao esgotamento ocupacional do setore a necessidade de busca por outroscaminhos. A escolha deste caminho,num primeiro momento, deveu-se à

perspicácia de alguns empresáriosque perceberam um mercado promis-sor para empresas de confecções in-fantis, ainda na década de 1990.Num segundo momento, foi o apren-dizado e a percepção do setor, aindaem crescimento, que levou algunsempregados a tentarem o empreen-dimento próprio. O que aparece,sempre em comum, é que esses em-presários são em sua grande maio-ria moradores de longo tempo nomunicípio e, ainda, que são os gera-dores dos recursos financeiros utili-zados para iniciar seu próprio ne-gócio.

Contudo, a sociedade de TerraRoxa, 25 anos depois da grande per-da populacional da década de 1970,visualiza nas empresas de confec-ções infantis, uma nova oportunida-de de recuperação da economia lo-cal. Surge um nicho de mercado que,desde seu início já se configuroucomo opção de crescimento econô-mico.

Os empresários de confecção in-fantis perceberam que não resolve-riam as dificuldades de gerar rendae bem estar para suas famílias mu-dando para outras regiões. A estra-tégia encontrada pelas pessoas quedecidiram ficar em Terra Roxa foi ade apostar na idéia das empresas deconfecções infantis. Esta ação eviden-cia os principais agentes de mudan-ça da cidade e da sua população. Éo que se chama de capital social, e éesta particularidade que atribui umaterritorialidade específica e única, secomparado aos demais municípiosde seu entorno.

Enfim, nas décadas de 1970 e1980 o agente fundamental da eco-nomia do município foi a terra, tidacomo recurso físico que desenvolviao capital produtivo local. Hoje, o quefez Terra Roxa ganhar um “novo fô-lego” não é mais a terra, mas, simsua gente e sua capacidade de gerarrenda de um atividade que escapada vocação da região, a anti-voca-ção. Gente em sua maioria nascidaou criada no município e que, comomuitos outros agricultores e filhosde agricultores, viu seu meio de vidadefinhar em pouco mais de umageração. Agora, com o surgimento deum novo caminho de crescimento eco-

Quadro 1 - Exemplos de benefícioscitados pelos empresários das con-fecções infantis de Terra RoxaFonte: LIS (2004).

Figura 8 – Nível de confiança entre os empresários das confecções modabebê de Terra Roxa.Fonte: LIS (2004)

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nômico a ser trilhado, cuja expansãodepende, essencialmente, de sua po-pulação, tida como o verdadeiro ca-pital de sua retomada econômica.Essas pessoas são o diferencial decompetitividade e de sucesso destemunicípio, e é nelas que se deve in-vestir.

A constituição do Grupo GestorAPL de Moda Bebê de Terra Roxaparece ser um ato consciente nestesentido, e os empresários do setorparecem estar convencidos de quesua empresa depende desta “maté-ria prima”, que se configurou poruma “gente” que vive e trabalhanesta cidade. Desta forma, umaempresa que treina funcionáriosnão pode ser vista apenas como suaconcorrente, mas sim uma colabo-radora.

Para tanto, é necessário ter claroque a expansão econômica de hojesó aconteceu em função da existên-cia da existência da população quevive em Terra Roxa, apesar dela teruma composição heterogênea, poisfoi formada por imigrantes de váriosestados do Brasil, e de se tratar deum município jovem. As empresasde confecção infantil por mais quesejam de capital privado, têm umgrande componente de construçãocoletiva, cuja organização se confi-gura na atual constituição do APL.

Para uma gente que através desua história viu seus próximos par-tirem em busca de alternativas demelhoria da qualidade de vida. Parauma população que, muito provavel-mente, tenha, em cada família, umparente que, há anos atrás, tenhamigrado de seu local de origem e quehoje, muito provavelmente, tambémjá tenha em cada família um membroque já possua alguma experiêncianas empresas de confecções infantis.Desta vez, no entanto, não é a terra oprincipal bem, mas o seu povo. As-sim, como a terra se cultiva para pro-duzir, a “gente” de Terra Roxa tam-bém deve ser “cultivada” para quepossa manter-se produtiva.

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114 Ano VIII • Nº 13 • Janeiro de 2006 • Salvador, BA RDE - REVISTA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

ResumoA Região Nordeste do Brasil, ao

longo das décadas de 70 e 80, apre-sentou uma performance econômi-ca que, para os padrões de uma re-gião localizada na periferia do capi-talismo brasileiro, pode ser caracte-rizada como virtuosa. Apesar disso,esse resultado positivo, tanto no con-texto econômico quanto no social,não foram capazes de diminuir osníveis absolutos de pobreza.O obje-tivo principal deste trabalho é ana-lisar os determinantes do crescimen-to da Região Nordeste, no período1970-1996, a partir de um banco dedados sociais, demográficos e eco-nômicos ao nível das microrregiões– aglomerados de municípios comas mesmas características geoeconô-micas.

O trabalho está divido em seis se-ções. A primeira contempla a intro-dução. A segunda seção contemplabreves considerações sobre a dinâmi-ca do emprego e da população da re-gião nordestinas nos últimos anos.A terceira apresenta o marco teóricoe a quarta contempla a escolha domodelo econométrico a ser utilizado.A quinta seção mostra os principaisresultados obtidos e a última seçãoenumera as principais conclusões ealgumas recomendações.

Palavras chave: População, empre-go, Nordeste.

AbstractThe Northeastern Region of Bra-

zil, during the 70s and the 80s, has

DETERMINANTES DO CRESCIMENTO DAPOPULAÇÃO E DO EMPREGO DAS

MICRORREGIÕES DO NORDESTE DO BRASIL -1970/1996: UMA ABORDAGEM ECONOMÉTRICA

José Raimundo Vergolino 1

Alexandre Domingos Sávio Caldas Jatobá 2

had an economic performance that,considering a region located in theperiphery of the country, can becharacterized as virtuous. But theseresults were not sufficient enough todiminish the poverty level of theregion. The main purpose of thispaper is to analyze the determinantsof growth of the Northeast, in theperiod of 1970-1996, using a databank of social, demographic andeconomic variables in a microrre-gional perspective – group of citieswith similar geoeconomic features.

The paper is divided in six sec-tions. The first section contains theintroduction. The second is a briefsummary of the dynamics of popu-lation and employment in the region.The third and the fourth sectionscontain the theoretical approachand the econometric model used inthis work, respectively. The fifthsection shows the main results of theestimations. Finally, the last sectioncontains the conclusion and somerecommendations regarding publicpolicies.

Key words: population, employ-ment, Northeast.

IntroduçãoA Região Nordeste do Brasil, ao

longo das décadas de 70 e 80, apre-sentou uma performance econômi-ca que, para os padrões de uma re-

gião localizada na periferia do capi-talismo brasileiro, pode ser caracte-rizada como virtuosa. O Produto In-terno Bruto regional cresceu acimada média do país. Parte desse cres-cimento pode ser explicado peloavanço das atividades manufaturei-ras, cujas plantas procuraram se ins-talar nos principais sítios urbanosexistentes na região. A balança co-mercial regional com o resto do mun-do apresentou-se sistematicamentesuperavitária. O Índice de Desenvol-vimento Humano (IDH) regional,mesmo abaixo da média nacional,apresentou taxas de crescimento aci-ma da média do país, sugerindo aocorrência de um processo de con-vergências nos padrões de bem-es-tar. Esses resultados positivos, tan-to no contexto econômico quantosocial, rebateram, todavia, de formabastante tênue, sobre o panorama dapobreza e sobre o perfil de distribui-ção da renda pessoal.

No contexto demográfico, a regiãoNordeste apresenta singularidadesdignas de menção. Em 1996 abriga-va, aproximadamente, 44 milhõesde habitantes, e três Regiões Metro-politanas. É a segunda região brasi-leira em contingente populacional.Apresenta o maior percentual de fa-mílias pobres do país e de popula-ção rural, as maiores taxas de anal-fabetismo, mortalidade infantil efecundidade, a menor esperança de

1 Ph.D. em Economia-University of Illinois-USA. E-mail: [email protected] Mestre em Economia – UFPE E-mail:[email protected]

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vida ao nascer e o menor grau deurbanização. Além disto, desde osanos quarenta tem se constituídonum centro expulsor de populaçãopara o restante do país (CAMARA-NO, 1998).

Em relação ao comportamento doemprego, as evidências mais recen-tes indicam um processo de cresci-mento do grau de informalizaçãodos postos de trabalho acompanha-do de um processo de precarizaçãodesses empregos. Com efeito, o pro-cesso de industrialização que se ins-talou na Região, apoiada com recur-sos governamentais, foi intensivoem capital físico gerando, por via deconseqüência, um número reduzidode novos empregos formais. Sucede,todavia, que o rebatimento do pro-cesso de industrialização sobre osegmento terciário foi bastante inten-so. Nesse sentido foram criados cen-tenas de postos de trabalho, do tipoformal, no segmento terciário, masque não foram capazes de absorvergrande parte da População Econo-micamente Ativa. O excedente daPEA, bastante elevado, tomou o ca-minho da informalidade.

O desenvolvimento da atividadeindustrial na região Nordeste, comonão poderia deixar de acontecer, con-centrou-se naqueles sítios urbanos demaior nível de renda e que dispu-nham de uma boa oferta de infra-es-trutura econômica e social. O impac-to dessa concentração sobre o cresci-mento populacional dos aludidos sí-tios foi significativo, levando, numespaço de 40 anos, a formação de trêsgrandes regiões metropolitanas –Recife, Salvador e Fortaleza.

O entendimento do processo detransformação da economia e da so-ciedade nordestina, nas últimas trêsdécadas, não se apresenta trivial.Inúmeras variáveis sociais e econô-micas, fortemente interrelacionadas,explicam o comportamento da soci-edade. O objetivo desse trabalho éde investigar uma faceta da questão.Trata-se de analisar o comportamen-to da população e do emprego noespaço regional, no período 1970-96,fase que coincide com o período degrandes transformações da econo-mia brasileira e regional.

A dinâmica da população edo emprego

População

Historicamente, a Região Nordes-te vem apresentando característicasbem peculiares no que diz respeito asua dinâmica populacional. Segun-do Camarano (1998), as transforma-ções demográficas no Nordeste têmse dado de forma defasada em rela-ção às outras regiões brasileiras e osdiferenciais intra-regionais são bemmais expressivos do que os diferen-ciais inter-regionais.

A região contém o segundo maiorcontingente populacional do país,atrás apenas da Região Sudeste.Além disso, a região apresenta o mai-or percentual de população pobre ede população rural do país. Outracaracterística marcante da dinâmicapopulacional nordestina é que a re-gião tornou-se, desde os anos 40, umaregião de emigração. Assim, apesarde continuar sendo a região com osegundo maior contingente popula-cional do país, o Nordeste vem per-dendo ao longo dos anos sua posi-ção relativa. Em 1872, a populaçãodo Nordeste representava 47% dapopulação brasileira e, em 1996, essepercentual caiu para 28%. A tabela 1mostra que, em termos de crescimen-to populacional, o Nordeste obteve osegundo pior desempenho dentre asregiões brasileiras, atrás apenas daRegião Sul. Segundo Camarano(1998), este fraco desempenho da Re-gião Nordeste se deve, principalmen-te, das altas taxas líquidas de migra-ção negativas.

Como mencionado anteriormen-te, a região nordestina também apre-senta desigualdades intra-regionaisbastante acentuadas. Desde 1970 até1996, os três estados de maior con-tingente populacional detêm cercade 60% da população da região.Além disso, as microrregiões das trêsregiões metropolitanas da regiãoconcentravam, em 1996, 18% do to-tal da população. Considerando-setambém as microrregiões das de-mais capitais este percentual sobepara 28%. A tabela 2 evidencia opadrão concentrador das microrre-giões das capitais, uma vez que, en-tre 1970 e 1996, a taxa de crescimen-to de todas as capitais foi bem maiordo que a taxa de crescimento do con-junto das demais microrregiões daregião.

Deste modo, a dinâmica popula-cional nordestina apresenta duascaracterísticas bastante peculiares.Primeiramente, o Nordeste apresen-ta um padrão de concentração popu-lacional em torno dos seus princi-pais centros urbanos (as capitais).E, em segundo lugar, o Nordeste vemperdendo sua posição relativa emrelação à demais regiões do país.

EmpregoAs informações sobre emprego

em uma perspectiva temporal, a ní-vel microrregional, estão presentesnos Censos e desde 1986, são dispo-nibilizados, anualmente pela Raisdo Ministério do Trabalho. Destamaneira, será utilizado para a aná-lise da dinâmica do emprego nordes-tino, uma combinação dos dados dePessoal Ocupado publicados pelo

Tabela 1 – Nordeste: Índice de Crescimento da População dos EstadosNordestinos

Fonte: IBGE. Censos Demográficos

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IBGE através dos Censos Econômi-cos e Demográficos de 1970, 1980 e1991 e os dados da RAIS para osanos de 1991 e 1996.

Em termos estaduais, nota-se nocaso nordestino uma concentraçãodos empregos nos seus três princi-pais estados, a saber, Bahia, Pernam-buco e Ceará, semelhante ao caso dapopulação. Trata-se dos Estados daRegião que apresentam os maioresníveis de Produto Interno Bruto. Noperíodo analisado, a participação doemprego mantém-se em torno de 60%com um ligeiro aumento da concen-tração no período 1980-1996. A par-ticipação de Pernambuco no empre-go total, no período 1970/96, perma-nece estagnada enquanto cresce oíndice da Bahia e do Ceará. O fatosingular diz respeito à elevada par-ticipação do estado do Maranhão nototal do pessoal ocupado, sem apre-sentar uma forte correspondênciacom o PIB do Estado (tabela 3).

Outra característica da dinâmicado emprego na região é a forte con-centração nas regiões metropolita-nas e nas capitais. Entre 1970 e 1996,a concentração dos empregos nasmicrorregiões das regiões metropo-litanas e das demais capitais tem seintensificado. A tabela abaixo mos-tra que, em 1970, o emprego dasmicrorregiões das capitais represen-tava cerca de 6% do total do empre-go nordestino. Esta participaçãoaumentou para cerca de 26% em1996. Nota-se que o processo de con-centração foi mais intenso no perío-do 1980 a 1996 (tabela 4).

Marco teóricoO crescimento das regiões tem

sido bastante explorado pelos ana-listas regionais nos últimos trintaanos. Dentre os vários aspectos ana-lisados, destaca-se a discussão acer-ca do movimento e do crescimentopopulacional, como também do em-prego de algumas regiões em detri-mento à perda populacional e dimi-nuição do nível de emprego de ou-tras regiões. Em primeiro lugar, temsido dado destaque a questão da re-lação de causalidade entre a migra-ção ou o crescimento populacionale o nível de emprego. Em segundolugar, tem-se procurado determinar

Tabela 2 – Nordeste: Taxa de Crescimento das Microrregiões do Nordeste

Fonte: IBGE. Censos Demográficos

Tabela 3 – Nordeste: Participação dos Estados no Total do Pessoal Ocupado

Fonte: IBGE.Censos Demográficos 1970 e 1980. Para 1996 MT/Rais.

Tabela 4 – Nordeste: Participação das Microrregiões no Total do PessoalOcupado

Fonte: IBGE Censos Demográficos 1970 e 1980. Para 1996 MT/Rais.

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que outros fatores influenciam a mi-gração e o crescimento populacional,bem como a oferta de empregos deuma determinada região.

Existe uma corrente da ciência re-gional, liderada por Blanco3, Mazek4

e Lowry5, que defende que os diferen-ciais entre as taxas de migração a ní-vel de regiões são induzidos pelocrescimento diferenciado nas oportu-nidades de trabalho ou emprego. Estacorrente se baseia na Teoria da BaseExportadora do Crescimento Regio-nal. A segunda delas, defendida porBorts e Stein6, diz que as variações noemprego são induzidas por diferen-tes taxas de imigração.

O movimento de migração, assimcomo o crescimento populacional,provoca um deslocamento da curvade oferta de trabalho e, com isso, umamudança na remuneração do traba-lho/hora para baixo, caso a deman-da por trabalho permaneça inva-riante. A extensão deste deslocamen-to irá depender na composiçãodemográfica dos migrantes. Quantomaior o número de migrantes na fai-xa etária chamada “população eco-nomicamente ativa”, maior será estedeslocamento. A variação do empre-go que resulta do deslocamento daoferta de trabalho irá depender daelasticidade da demanda por traba-lho e na programação da oferta detrabalho na região. Além destes, avariação no emprego irá se refletirnos salários que são capazes de seajustar livremente ou não. As duascorrentes de pensamento acima des-tacadas discordam sobre a rigidezdas taxas de salário. Os seguidoresda teoria “emprego causa crescimen-to populacional” defendem que astaxas de salários são totalmente rí-gidas enquanto os seguidores da te-oria “crescimento populacional cau-sa emprego” defendem que se existerigidez nos salários, esta só diz res-peito a diminuição de salários.

Com o intuito de elucidar a rela-ção de dependência entre migraçãoe crescimento do nível de emprego,Muth (1971) utiliza o método de mí-nimos quadrados de dois estágiosonde as variáveis migração e empre-go total ou força de trabalho são tra-tadas como sendo simultaneamentedeterminadas. As variáveis cresci-

mento populacional natural e corpodas forças armadas são variáveisindependes das duas equações.Como determinantes do emprego to-tal e também da força de trabalhoforam incluídas as variáveis rendamédia das famílias em 1960 em rela-ção a 1950, a participação do empre-go industrial no emprego total dacidade em 1950 e o tamanho da áreapopulacional urbanizada em 1950.Na equação da migração, foram in-cluídas as variáveis taxa de desem-prego em 1950, renda familiar médiaem 1949, e duas variáveis dummyregionais, uma indicando as cidadesdo sul e outra para as cidades dooeste americano.

Os resultados alcançados porMuth mostram que tanto a migraçãoé determinada pelo nível de empre-go quanto o nível de emprego é de-terminado pela migração. No casoda equação do emprego e da forçade trabalho, obteve-se na maioria doscasos um coeficiente unitário para avariável migração. Porém, no casoda equação da migração, obteve-se,na maioria dos casos coeficientesvariando entre 0,6 e 0,7 para a variá-vel emprego. Assim, os dados estu-dados por Muth indicam que háuma relação de simultaneidade en-tre emprego e migração, porém, amigração tem um efeito maior sobreo emprego do que o emprego tem so-bre a migração.

Steinnes e Fisher (1974) introdu-ziram um modelo intra-urbano quepermite que o crescimento popula-cional e do emprego sejam simulta-neamente determinados. O ponto departida é o modelo de equilíbrio ge-ral convencional. Neste modelo, osconsumidores maximizam utilida-de. Esta utilidade depende dos pro-dutos e serviços que eles adquirem,da localização de suas residênciasem relação aos seus locais de traba-lho e de algumas amenidades loca-

cionais. Uma restrição orçamentáriaiguala a renda dos consumidoresaos gastos por eles feitos em bens eserviços.

Já as firmas objetivam maximizarseus lucros produzindo bens e ser-viços através da aquisição de insu-mos. Estes produtos e serviços sãoproduzidas em mercados competiti-vos. Os custos de produção variamde acordo com a localização da fir-ma. As firmas entram e saem do mer-cado até o momento em que os lu-cros se igualam entre as regiões aosníveis competitivos, e as famíliasmigram até o momento em que osníveis de utilidade são equalizadasa nível regional.

Neste tipo de modelo a popula-ção e o emprego não só se influenci-am, mas também várias outras vari-áveis os afetam. Estas variáveis tam-bém poderiam ser determinadas si-multaneamente, porém é necessárioassumir que as variáveis que afetama população e o nível de empregosejam consideradas exógenas. Omodelo, como sugerido por Steinnese Fisher (1974), apresenta a seguinteresolução:

TBEAP

SBPAE

PP

EE

+=

+=*

*

)2(

)1(

Onde, E e P são, respectivamente,o emprego e a população de umdado município; S e T são os vetoresdas variáveis que afetam E e P; osasteriscos indicam os valores deequilíbrio; AE e AP são os coeficien-tes das variáveis endógenas; e BE eBP são os coeficientes das variáveisexógenas. Mills e Price (1985) suge-rem que a população e o emprego seajustam aos seus valores de equilí-brio com defasagens, introduzindoas seguintes expressões:

( )( )1

*1

1*

1

)4(

)3(

−−

−−

−+=

−−=

PPPP

EEEE

P

E

λλ

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O índice –1 mostra a defasagem em um período, uma década neste caso.lE e lP são os coeficientes que indicam a velocidade do ajustamento com lE> 0 e lP < 1. Substituindo (1) e (2) por E* e P* em (3) e (4), tem-se:

( ) 1

1

1)6(

)1()5(

−++=−++=

PTBEAP

ESBPAE

PPPPP

EEEEE

λλλλλλ

Onde as variáveis endógenas E e P são determinadas simultaneamente edependem das variáveis exógenas e de suas defasagens.

Modelo empíricoEm um estudo realizado em 1985 para identificar os determinantes do

crescimento dos condados americanos durante os anos 70, Carlino e Mills(1985), utilizando o marco teórico acima descrito, sugeriram o seguintemodelo econométrico:

reduzida, foi possível o cálculo dediversas elasticidades.

Uma conclusão interessante ex-traída dos resultados das estimaçõesdiz respeito à não importância dasamenidades das cidades centrais(poluição e tráfego intenso de veícu-los) em relação aos movimentospopulacionais. Os coeficientes dasvariáveis dummy regionais sugeremque os efeitos das amenidades natu-rais são importantes para o movi-mento da população, são pouco im-portantes para o emprego total e nãosão importantes para o emprego in-dustrial.

Sobre o debate “população segueo emprego ou o emprego segue a po-pulação”, as elasticidades estimadasrevelam que, um aumento de 10% napopulação resulta em um aumento de4% no emprego total e de 3,5% noemprego industrial; enquanto que,um aumento de 10% no emprego to-tal leva a um aumento de 0,7% napopulação total. Estes resultados re-velam que a população determina oemprego. Finalmente, foi feita umaanálise da estabilidade do modeloutilizado e o sistema se mostrou ins-tável, revelando que as conclusõesacima destacadas aplicam-se ao cur-to prazo, não sendo possível realizarprevisões de longo prazo.

Seguindo Carlino e Mills (1985),Clark e Murphy (1996) também fize-ram uso do modelo de equilíbrio ge-ral e sugeriram o modelo apresenta-do na equação 9 para analisar osdeterminantes do crescimento dosmesmos condados americanos nosanos 80, onde FISCAL representa asvariáveis fiscais, LOCALCHARS re-presenta as características demo-gráficas, BUSCOND representa asvariáveis de ambiente para negóci-os, AMENITY são as amenidadeslocacionais e LOCATION represen-ta as variáveis dummy locacionais.Foi utilizado o método de mínimosquadrados ordinários de dois está-gios. Através do teste de White foidetectada a presença de heteroce-dasticidade. Para a correção das es-timativas, foi utilizada a técnica damatriz de covariância heterocedásti-ca de White.

Na equação da densidade popu-lacional foram encontrados sinais e

Onde, Pi é a população do con-dado i em 1980; Ei é o emprego totalde i em 1979; Pi-1 é a população de iem 1970; Ei-1 é o emprego total de iem 1969; PBi é a participação dos ne-gros na população de i em 1970; Ii éa densidade das estradas inter-esta-duais de i em 1982; Ti são os impos-tos governamentais per capita de iem 1972; Yi é a renda média familiarde i em 1970; CRi é a taxa de crimina-lidade por 100.00 habitantes de i em1975; Ui é a participação dos empre-gados sindicalizados no total dosempregados não-agrícola, por esta-do, em 1970; LAi é a quantidade deáreas agricultáveis em milhas qua-dradas de i; MSi é número médio deanos de estudo da população de iem 1970; IDBi é o valor total dos Tí-tulos do Desenvolvimento Industri-al emitidos em 1981, por estado; CCié a variável dummy que tem valorum se o condado possui uma cidadecentral; NMj são duas variáveisdummy, uma que assume o valor umquando o condado é adjacente a um

condado metropolitano, e outra queassume o valor um quando o conda-do nem é metropolitano nem adja-cente a um condado metropolitano;e Rj é cada uma das oito variáveisdummy regionais.

As equações (7) e (8), denomina-das de equações estruturais, foramestimadas através do Método de Mí-nimos Quadrados de Dois Estágios.Foi feita também uma estimação, uti-lizando o emprego industrial ao in-vés do emprego total pelo fato daindústria ser o setor chave em váriaseconomias. Todos os coeficientes es-timados tiveram os sinais esperadose se mostraram significantes a pelomenos 5%, e os coeficientes de deter-minação foram todos maiores do que95%, revelando a adequação do mo-delo. Foram também calculados oscoeficientes na forma reduzida, umavez que nesta formas, os coeficientesincorporam tanto os efeitos diretoscomo os efeitos indiretos de todas asvariáveis independentes. Além dis-so, através dos coeficientes da forma

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níveis de significância similares aoestudo de Carlino e Mills (1987) emrelação à variável emprego (+), po-pulação defasada (–), renda (+), e vá-rias dummies locacionais. As outrasvariáveis, em sua maioria, tem sinaisiguais, as os níveis de significânciadiferem. Em relação à equação doemprego, descobriu-se, assim comoCarlino e Mills (1987) que a popula-ção e a renda influenciam positiva-mente o nível de emprego. Contraria-mente ao estudo acima citado, opercentual da população negra e opercentual dos empregados sindica-lizados revelaram sinais negativose significantes. Finalmente, as vari-áveis dummy locacionais mantive-ram os mesmos sinais e níveis designificância.

Em relação às variáveis “novas”incluídas neste trabalho foi consta-tado, na equação da população, quetodas as categorias de variáveis, coma exceção das variáveis fiscais, mos-traram-se significantes. No caso daequação do emprego, somente asvariáveis da categoria amenidadelocacionais mostraram-se insignifi-cantes a 95% de nível de signifi-cância.

Foi feita uma análise consideran-do cinco setores econômicos (manu-fatureiro, construção, serviços, comér-cio e finanças/seguros/imobiliário -FSI). A variável endógena cresci-mento populacional é positiva emtodos os setores e significantes nosetor FSI. Quase todas as categoriasde variáveis são conjuntamentesignificantes a 95% de nível de con-fiança (as exceções são as amenida-des no setor de construção).

Finalmente, foi realizada tambémuma análise das elasticidades. Aselasticidades de curto prazo são de-rivadas das equações estruturais eas elasticidades de longo prazo sãoderivadas das equações na formareduzida. As elasticidades de curtoe longo prazos não se mostrarammuito diferentes, sugerindo que osefeitos de feedback entre populaçãoe emprego não são muito importan-tes. Finalmente, foi constatado que apopulação tem uma influência mai-or sobre o emprego do que a influên-cia do emprego sobre a população,principalmente nos setores comer-

ciais (serviços, comércio e FIS). Esteresultado contraria as conclusõesobtidas em Carlino e Mills para osanos 70.

Para analisar o crescimento dasmicrorregiões do Nordeste será uti-lizado um modelo semelhante aosmodelos acima apresentados. Nesteartigo serão realizadas duas estima-ções. A primeira delas refere-se aoperíodo 1970-1980 e a segunda refe-re-se ao período 1980-1996. Tambémserá utilizado o Método de MínimosQuadrados de Dois Estágios. O mo-delo tem a forma apresentada nasequações 11 e 12.

Onde POP é a população residen-te na microrregião i; EMP é o pesso-al ocupado da microrregião i, YPC éo PIB per capita de i, EDU é o índicede condição de vida para educaçãode i, HAB é o índice de condição devida para a habitação de i, RUR é ocrescimento do PIB agropecuário damicrorregião i, URB é o índice deurbanização de i definido como aparticipação da população urbanana população total, IND é o grau deindustrialização de i definido comoa participação do PIB industrial noPIB total de cada microrregião eDCAP é a variável dummy que as-sume valor unitário para as micror-regiões das capitais nordestinas. Osresultados e análises das estimaçõesestão apresentados na próxima se-ção.

Fonte de dados e resultadosEsta seção apresenta os princi-

pais resultados obtidos através daestimação do modelo acima desta-cado. Primeiramente, vale a penasalientar que os dados de popula-ção e urbanização foram extraídosdos Censos Demográficos de 1970 e1980, e da Contagem da Populaçãode 1996. Os dados referentes ao em-prego foram extraídos dos CensosEconômicos de 1970 e de 1980, e doCenso Demográfico de 1991. As pu-blicações acima citadas foram ela-

boradas pelo IBGE – Instituto Brasi-leiro de Geografia e Estatística. Paraa extrapolação dos dados até o anode 1996, foram utilizados os dadosda RAIS – Registro Anual de Infor-mações Sociais, desenvolvido peloMinistério do Trabalho. Os dadosdos Produtos Internos Brutos Total,Agropecuário e Industrial foram es-timados através de metodologia de-senvolvida por Maia Gomes, Vergo-lino e Monteiro Neto (1997). E, os ín-dices de condição de vida da habi-tação e da educação foram retiradosdo Atlas de Desenvolvimento Huma-no publicado pelo IPEA.

As tabelas 1 e 2 apresentam oscoeficientes das equações estrutu-rais e reduzidas, respectivamente. Deacordo com o método de mínimosquadrados de dois estágios, os coe-ficientes das equações estruturaisincorporam os efeitos diretos dasvariáveis exógenas sobre as endóge-nas e os coeficientes das equaçõesreduzidas incorporam tanto os efei-tos diretos quanto os indiretos (cau-sados pela simultaneidade). Destemodo, utilizando as equações redu-zidas, foram estimadas elasticida-des no ponto médio, apresentadasna tabela 3.

Os resultados constantes da ta-bela acima indicam que, no caso dasmicrorregiões nordestinas, a popu-lação provoca o aumento do empre-go. Isto é observado tanto para o pe-ríodo 1970-1980 quanto para o perí-odo 1980-1996. O coeficiente da po-pulação (POPit) na equação do em-prego mostrou-se significante nasduas estimações. A hipótese empre-go causa aumento da população érejeitada para o caso nordestino jáque, no período 1970-80, contraria-mente às expectativas, o coeficientemostrou-se negativo, indicando queo emprego age de forma a diminuiro crescimento populacional. No casoda estimação para o período 1980-1996, este mesmo coeficiente mos-trou-se insignificante.

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1970-80, as empresas têm oferecidomais empregos nas microrregiõescom menor índice de urbanização,provavelmente por causa das ame-nidades negativas das metrópoles(trânsito, poluição, maiores impos-tos, etc.). O fato dos demais coefici-entes mostrarem-se insignificantesrevela que, apenas diretamente, taisvariáveis não influenciam o cresci-mento do emprego nas microrre-giões do Nordeste.

A maioria dos coeficientes dasequações reduzidas mostraram-sesignificantes e com os sinais seme-lhantes aos obtidos na literatura(Muth (1971); Carlino & Mills (1985);Clark & Murphy (1996). Didatica-mente, uma melhor forma de anali-sar os resultados acima é através docálculo das elasticidades nos pon-tos médios das variáveis exógenas.Tais elasticidades encontram-se ex-postas na tabela 7.

De acordo com as elasticidadesestimadas das equações reduzidas,um aumento em 10% na populaçãodo período base provocou um au-mento de 1,34% (para o período1970-80) e de 8,80% (para o período1980-96) no emprego total. E, umaumento em 10% no emprego do pe-ríodo base provocou, por sua vez,uma queda de 0,86% (para o perío-do 1970-80) e de 0,73% (para o perí-odo 1980-96) na população. Estesresultados estão de acordo aos en-contrados nas equações estruturaise reforçam a idéia de que a popula-ção é que determina o emprego nocaso nordestino.

Em relação à variável renda,pode-se dizer que a mesma desem-penhou um papel discreto uma vezque um aumento em 10% na rendado período base provocou um au-mento entre 1,48% e 1,86% na popu-lação da microrregião, e entre 1,45%e 2,62% no emprego. Este resultadoé um pouco inferior aos resultadosencontrados por Carlino & Mills(1985) cujas respostas em relação aum aumento em 10% na renda dascidades americanas provocou umaumento em 3,1% na população e6,3% no emprego. Como os coefici-entes da variável renda nas equa-ções estruturais do emprego mostra-ram-se insignificantes, as elasticida-

Tabela 5 – Nordeste: Equações Estruturais para a População e o Emprego

Os números em parênteses indicam a estatística t.* insignificantes.Fonte: Elaboração nossa.

A inclusão de variáveis endóge-nas defasadas em um modelo deequações simultâneas objetiva repre-sentar outras variáveis que possaminfluenciar as variáveis endógenase que não foram incluídas no mode-lo. No presente caso todos os coefi-cientes mostraram-se significantes.

Em relação à equação da popula-ção, todas as outras variáveis obti-veram os sinais esperados e seme-lhantes aos encontrados na literatu-ra (Muth (1971); Carlino & Mills(1985); Clark & Murphy (1996)). Comexceção da variável educação na es-timação para o período 1980-1996,todas as variáveis mostraram-se es-tatisticamente significantes. Os coe-ficientes da variável crescimento doPIB agropecuário encontrados nas

equações da população indicamque, no caso nordestino, as micror-regiões que obtêm crescimento dosetor agropecuário tendem reter e atéaumentar sua população. Apesardisso, os resultados também revelamque as capitais obtiveram crescimen-to populacional superior às outrasmicrorregiões.

Em relação à equação do empre-go, somente as variáveis índice deurbanização (URBit-1) e dummy dascapitais para o período 1970-1980mostraram-se significantes. O coefi-ciente da dummy revela que no perí-odo acima citado o crescimento doemprego foi menor nas microrregiõesdas capitais do que nas demaismicrorregiões. O outro coeficientesignificante revela que, no período

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de 0,85% em 1980 e em 2,62% em1996. Isto mostra que o investimen-to no nível educacional é uma daspolíticas que poderiam ser utiliza-das para diminuir as diferenças en-tre as microrregiões do Nordeste.

Com relação a variável urbaniza-ção, os resultados mostram que quan-to mais urbanizada a microrregião,menor é o crescimento populacionalda mesma. As elasticidades em rela-ção ao emprego no período mostra-ram-se insignificantes na equaçãoreduzida em questão. Além destas,embora significantes, as elasticida-des da variável habitação em rela-ção à população e ao emprego foramas únicas a terem os sinais contrári-os aos esperados e encontrados naliteratura. Deste modo, torna-se ne-cessário uma investigação mais de-talhada acerca destes resultados.

Com relação ao grau de indus-trialização as elasticidades negati-vas revelam que tanto a populaçãoquanto à oferta de empregos têm sidorelativamente maiores nas micror-regiões menos industrializada, pro-vavelmente por causa dos maiorescustos existentes em microrregiõesque já possuem um parque industri-al consolidado, como por exemplo,sindicatos mais atuantes e maioresimpostos em relação à oferta de em-prego e maior poluição em relação àpopulação. Isso pode estar associa-do também ao padrão de industria-lização implantado no Nordeste quefoi do tipo intensivo no fator capitale poupador de mão-de-obra.

Finalmente, as elasticidades po-sitivas do crescimento do PIB agro-pecuário em relação à população eao emprego reforçam a hipótese deque um setor agropecuário forte égerador de empregos e atua comofator de sustenção da mão-de-obrana área rural afetando assim, o mo-vimento da população.

ConclusõesO presente artigo teve como obje-

tivo principal determinar os princi-pais determinantes do crescimentopopulacional das microrregiões doNordeste. Foi constatado que o ní-vel de emprego no ano base e a po-pulação são os principais determi-nantes diretos do crescimento na

Tabela 6 – Nordeste: Equações Reduzidas para a População e o Emprego

Os números em parênteses indicam a estatística t.* insignificantes.Fonte: Elaboração nossa.

Tabela 7 – Nordeste: Elasticidades da Forma Reduzida para a Populaçãoe Emprego

Fonte: Elaboração nossa.

des revelam que a renda influenciao crescimento dos empregos de for-ma indireta via população.

As elasticidades da variável edu-cação revelaram que um aumento em

10% no nível educacional da micror-região gerou um aumento na popu-lação em 1,56% em 1980 e de 2,14%em 1996. No caso da elasticidade emrelação ao emprego esse aumento foi

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oferta de emprego. Outras variáveiscomo renda, educação, habitação,crescimento agropecuário e grau deindustrialização agem de forma in-direta sobre o nível de emprego dasmicrorregiões.

Para a população, foi constatadoque todas as variáveis contidas narespectiva equação estrutural agemde forma direta sobre seu crescimen-to, enquanto que, as variáveis que sóestão contidas na equação estruturaldo emprego agem sobre o crescimen-to populacional de forma indireta.

Uma das principais conclusõesdo presente estudo foi a constataçãode que, no caso nordestino, a popu-lação determina o emprego. Assim,sugere-se a elaboração de políticaspúblicas que atuem naqueles espa-ços urbanos de médio e pequenoporte, onde as deseconomias exter-nas ainda não estão presentes, comvistas a evitar a migração para asáreas metropolitanas, onde os pro-blemas urbanos são graves e cujasolução implica em custos elevadosvis-à-vis as cidades de médio porte.

Concluindo, vale a pena salien-tar que este estudo tem caráter iné-dito no que diz respeito à RegiãoNordeste. Por isso, mais estudos se-rão necessários para auxiliar as au-toridades governamentais no quediz respeito a diminuição das desi-gualdades regionais existentes nasociedade nordestina.

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NORMAS DE EDITORAÇÃO

I – Entrega do MaterialOs artigos não deverão ultrapassar 30 páginas com

título, resumo e abstract e até cinco palavras-chave, emportuguês e outro idioma aceito pela revista, além da clas-sificação segundo o Classification System for Journal Articlesdo Journal of Economic Literature. O resumo e o seu corres-pondente em outro idioma deverá ser estruturado em umúnico parágrafo com, no máximo, 300 palavras. As resenhasdeverão ter, no máximo, 10 páginas (equivalentes a 2 500palavras). Deverão constar no final do artigo os dados refe-rentes ao autor, tais como: titulação, sua atividade atual,instituição a que esteja vinculado, endereço comercial eresidencial, telefones e correio eletrônico. Os originais devemser enviados à Secretaria da Revista em três vias impressas,das quais uma com identificação do autor e duas sem iden-tificação, e uma cópia em CD padrão IBM-PC, no formatoWord for Windows. Os originais devem ser acompanhados decarta submetendo o trabalho para publicação e de uma fo-lha à parte contendo informações completas sobre o(s) autor(es): nome, vínculo institucional, endereço para correspon-dência, telefone, fax e correio eletrônico. A RDE não aceitaartigos enviados exclusivamente por meio eletrônico(Internet). O endereço para a remessa é o seguinte

PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃOEM DESENVOLVIMENTO REGIONAL E URBANOSecretaria da Revista de DesenvolvimentoEconômico (RDE)Rua Dr. José Peroba 25Edifício Civil Empresarial, Sala 601 – Stiep41770235 – Salvador – Bahia

II – Apresentação Gráfica do Texto1. Especificações1.1. Papel, Espaço e Letras

Tamanho do papel: A4Tamanho das letras:– do corpo do trabalho 12– do título 16– de sub-títulos 14Tipo de letras: ArialEspaços: Entrelinhas: 1,5Superior:3,0 cmInferior:2,0 cmLateral direita:3,0 cmLateral esquerda:3,0 cm

2. Formatação• O texto deve ser justificado.•Nunca separar as sílabas para evitar desconfiguração

do texto ao ser aberto em outro computador.

• Usar somente a cor padrão do texto (preto).• As páginas devem ser numeradas.• Os gráficos, tabelas e figuras e/ou ilustrações deverão

ser fornecidos em monocromia (em preto e branco, com ousem tons de cinza), apresentados no corpo do texto enviado e,também, em anexo, nos formatos originalmente produzidos.

3. Primeira Página do Texto3.1. Título do artigoCentralizado na página a 3 cm da borda superior.

3.2. ParágrafosCada parágrafo deve ter um recuo de 0,5 cm na primeira

linha e nenhuma linha em branco entre eles, exceto para ossubtítulos que deverão ter apenas uma linha em branco de-pois do parágrafo que o antecede.

III – NotasAs notas devem ser devidamente numeradas e indicadas

no final do texto, antecedendo as referências.

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• As Tabelas e Quadros devem seguir as normas daABNT (padrão IBGE) e devem ser numeradas seqüen-cialmente.

• As figuras devem ser numeradas e apresentar título efonte.

V – ReferênciasDevem seguir os padrões estabelecidos pela ABNT.

VI – ResponsabilidadesÉ responsabilidade do autor a correção ortográfica e sin-

tática, como a revisão de digitação do texto, que será publi-cado conforme o original recebido pela editoração. O con-teúdo dos textos assinados é de exclusiva responsabili-dade dos autores.

VII – Procedimentos de avaliaçãoOs trabalhos submetidos serão avaliados no sistema

duplo cego por pareceristas, de instituições distintas da-quela à qual o(s) autor (es) está(ão) vinculado(s). Os direi-tos autorais dos trabalhos aprovados são automaticamen-te transferidos à RDE como condição para sua publica-ção. O resultado da avaliação de artigos recusados será co-municado ao autor, neste caso os originais poderão ser rece-bidos pessoalmente na redação da revista até um prazo de60 dias contados da data de postagem da comunicação,após o qual serão destruídos.

Os trabalhos submetidos à Revista de Desenvolvimento Econômico (RDE) devem enquadrar-se na linhaeditorial da revista. A RDE publica artigos e resenhas, assim como reedita trabalhos clássicos e documentoshistóricos relacionados à temática da revista. Os artigos e resenhas devem ser inéditos e não podem sersimultaneamente submetidos a outra(s) revista(s).

Podem ser submetidos trabalhos redigidos em Português, Inglês, Francês, Espanhol, Italiano e Alemão.Devem ser observadas as normas e orientações indicadas a seguir.

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Uma publicação da

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EMDESENVOLVIMENTO REGIONAL E URBANO

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