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ESPAÇO SOCIALISTA Organização Marxista Revolucionária Ano XI - N° 57 15 de abril a 14 de maio de 2013 Contribuição: R$ 1,00 125 anos depois, a burguesia mantém o seu projeto antinegro O ACE é parte de um conjunto de ataques do governo Avançar na mobilização, para além da marcha O “socialismo do século XXI” é socialismo? A alta do preço dos alimentos e a produção capitalista A luta dos trabalhadores contra o assédio moral Por uma Educação Pública sem empresários A crise econômica e a realidade dos bancários no Brasil

Ano XI - N° 57 15 de abril a 14 de maio de 2013 ...espacosocialista.org/portal/wp-content/uploads/2013/04/jornal-57.pdf · preços dos alimentos. A primeira é que uma parte importante

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ESPAÇOSOCIALISTA Organização Marxista RevolucionáriaAno XI - N° 57 15 de abril a 14 de maio de 2013

Contribuição: R$ 1,00

125 anos depois, aburguesia mantém o

seu projeto antinegro

O ACE é parte de umconjunto de ataques

do governo

Avançar namobilização, paraalém da marcha

O “socialismo doséculo XXI” ésocial ismo?

A alta do preço dosalimentos e a

produção capitalistaA luta dos

trabalhadores contrao assédio moral

Por uma EducaçãoPública semempresários

A crise econômica e arealidade dos

bancários no Brasil

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O ACE É PARTE DOPROJETO GLOBAL DO CAPITAL

PARA O PAÍSNunca houve tantas medidas do

Estado em prol da lucratividade docapital como nestes últimos anos, após aeclosão da crise mundial de 2008 –redução do IPI de vários setores, comdestaque para veículos, eletroeletrônicose construção civil; obras de infraestruturasob a lógica privada, como rodovias,portos, aeroportos, estádios e usinas;empréstimos do BNDES para asempresas, subsidiados pelo Tesouro;redução das taxas de juros para sustentaro endividamento e o consumo, etc.

Agora, com a desoneração da folha,os empresários deixam de contribuir comos 20% sobre a folha de pagamento,passando a uma alíquota de 1% ou 2%sobre o faturamento bruto, o que diminuidrasticamente o valor da contribuiçãopatronal. Uma renúncia fiscal (o Estadodeixa de arrecadar) de R$ 21,4 bilhõespor ano, com os 56 setores patronaisbeneficiados. Isso diminui a arrecadaçãoda Previdência Social, precarizando aindamais o SUS, e pressionado para uma novaReforma da Previdência, a fim deaumentar o nosso tempo de trabalho e

de contribuição.Todas essas medidas fazem parte de

um projeto maior de ataques aos direitosdos trabalhadores e sociais em geral, demodo a aumentar as oportunidades e alucratividade do capital, que atravessauma de suas maiores crises.

Para a burguesia que opera no Brasil,também é preciso aumentar a taxa deexploração na relação direta com ostrabalhadores.

Nos últimos anos, temos sentido oaumento dos ritmos de trabalho – queresultam em elevação dos acidentes detrabalho –, arotatividade da mãode obra e a reduçãodo piso de váriasc a t e g o r i a s .Entretanto, nessasações, o capitalenfrenta limitescomo os direitosmínimos contidos naCLT (ConsolidaçãoGeral das LeisTrabalhistas). Para a

burguesia, tornou-se central derrubar essalegislação.

Nesse sentido, surge o ACE (AcordoColetivo Especial), um projeto que se foraprovado pelo Congresso Nacional, instituique o negociado prevalece sobre o legisladoem qualquer situação. Atualmente, essapossiblidade só existe se for para ampliardireitos. Com o Ace, em outras palavras,as empresas ganham a liberdade depressionar os trabalhadores e sindicatos aaceitarem redução ou mesmo o fim dedireitos básicos, como a divisão das fériasem mais de dois períodos; pagamentoparcelado do 13º salário, até mesmo emparcelas mensais; ampliação do banco dehoras sem limites; contratação temporária;redução e terceirização de funcionários nasempresas sem nenhum limite, além deoutras manobras.

Dessa vez, o projeto não vem dogoverno, mas do Sindicato dosMetalúrgicos do ABC (CUT), em umaclara intenção de utilizar a imagem de umpassado de lutas e a força desse sindicatopara com isso enganar os trabalhadorescom o discurso de que a flexibilização éalgo moderno e positivo, que destravariaa produção e possibilitaria o aumento dosinvestimentos e dos empregos.

Isso obviamente é mentira. A relaçãode forças por categoria ou empresafavorece aos patrões, principalmente emmomentos de ameaça de desemprego.Apenas algumas categorias e sindicatosmuito fortes podem conseguir melhorarsua situação. A grande maioria terá seusdireitos arrancados.

Isso só demonstra uma vez mais aque ponto chegou a integração daburocracia sindical ligada à CUT, Força,CTB, UGT à cogestão do capital. Nãorelutam em entregar os direitostrabalhistas para defender seus amigospatrões, contanto que sua posição deburocracia privilegiada não seja afetada,nem tenha que voltar a trabalhar.

Desde que Hugo Chávez tornou-se presidente da Venezuela exerceu liderançanacional e internacional e desenvolveu o chamado “Socialismo do Século XXI”. Acompreensão desse fenômeno social é de crucial importância para todos aqueles quelutam pela superação do capitalismo. Esse é o foco do artigo sobre a situação políticainternacional.

Sobre a situação política nacional, voltamos nosso olhar para o Acordo ColetivoEspecial, o ACE, um dos principais ataques aos direitos do trabalhador, considerandoque a economia brasileira se mostra cada vez mais abalada pela crise sócio-políticaglobal.

Dos efeitos diretos e evidentes da crise sobre o Brasil, discutimos a situação dosBancários. Em que os bancos endurecem com os trabalhadores e aumentam aperseguição àqueles que minimamente se coloquem contra tal quadro.

No artigo sobre Educação, trataremos de demonstrar o que, de fato, motiva aexpansão do ensino de tempo integral. As necessidades atuais dos trabalhadores eseus filhos não estão contempladas nesse projeto.

À ocasião do aniversário de 125 anos de abolição da escravatura o racismoainda impera e a nossa saída é a luta antirracista, antigovernista, classista eanticapitalista.

Um problema que tende a se agravar no governo Dilma está sendo tratado noartigo sobre Assédio Moral, problema esse que, não sem motivos, tem crescido noserviço público.

Esses são os temas que apresentamos aos ativistas e militantes para um debatefranco.

NESTA EDIÇÃO

Acordo Coletivo Especial. Parte da Reforma Sindical eTrabalhista, foi proposto, em forma de projeto de lei, peloSindicato dos Metalúrgicos do ABC e pela CUT. Visa legalizara flexibilização de direitos trabalhistas (férias, 13º e outros),pois aquilo que se negocia em cada empresa ou categoria passaa valer, mesmo que reduza direitos. Se aprovado, ainda terácomo consequência o fim da soberania das assembleias dostrabalhadores e a utilização de urnas, possibilidade de vigênciado acordo rebaixado por tempo indeterminado, maiorintervenção do Estado na organização dos trabalhadores, entreoutros pontos.

O QUE É O ACE?

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A questão fundamental é: como barraro ACE, que é estrutural para a burguesia,que tem o respaldo do governo do PT eque é apresentado por sindicatos ecentrais com influência no movimento?

Primeiro, precisamos apostar namáxima denúncia junto aos trabalhadores,não apenas do ACE, mas demonstrar queeste faz parte de um projeto maior docapital, de ataques aos trabalhadores, eque inclui nos planos a Reforma daPrevidência, pagamento dos juros eamortizações da Dívida Pública,precarização dos serviços públicos,inflação, etc., com o objetivo de aumentara lucratividade do capital em crise. E esseprojeto maior é administrado pelogoverno Dilma (PT/PMDB/PSB) e porgovernos estaduais (PSDB/DEM), comapoio da CUT, Força, CTB e UGT, emque há uma divisão de tarefas, massempre a favor do lucro das empresas econtra os trabalhadores.

Também é preciso denunciar o papelentreguista que cumprem o Sindicato dosMetalúrgicos do ABC, a CUT e demaiscentrais que defendem o ACE e a políticapró-patronal do governo Dilma (PT).

Até agora, a campanha contra o ACEtem sido fragmentária – sem mostrar sualigação com o projeto maior do capital – etímida, muito abaixo da gravidade doproblema e do potencial de mobilizaçãotanto da CSP-Conlutas (dirigida peloPSTU) como da Intersindical (dirigida peloPSOL). Afora denúncias nos materiaisregulares dessas entidades, não temos vistouma campanha realmente ampla, comoutdoors, carros de som, internet, etc. Essasduas entidades sindicais possuemsindicatos importantes e têm dinheiro econdições para investir em uma campanha

AVANÇAR NA MOBILIZAÇÃO,PARA ALÉM DA MARCHA A

BRASÍLIAdeste tipo. Além disso, todos osdemais movimentos precisamdesempenhar essa denúncia echamar os trabalhadores a resistir.

Também é preciso tercuidado com setores da Força Sindical,CTB, etc, que, em função da pressão desuas bases, querem passar a impressãode que são contra o ACE, ligando-se aossetores não governistas como PSTU ePSOL, mas apenas em ações superestruturaiscomo seminários contra o ACE, fóruns, etc.Não mobilizam os trabalhadores de suasbases, e ao mesmo tempo seguemdefendendo e compondo o governoDilma, como se não fosse este o mentordo ACE (o sindicato dos metalúrgicos éapenas seu testa de ferro). O PDT (quedirige a Força Sindical) está no Ministériodo Trabalho, por exemplo. Não podemoscontribuir para essa confusão. Temos queajudar os trabalhadores a separar o joiodo trigo.

Assim, defendemos que a unidadecom setores governistas seja apenas naslutas de fato (paralisações, greves,bloqueios, passeatas), e não em eventossuperestruturais como seminários oufóruns permanentes.

Defendemos que seminários e debatessobre o ACE sejam organizados com asforças do campo antigovernista (CSP-Conlutas, Intersindical, independentes, etc),chamando amplamente os trabalhadores ea juventude, para fortalecermos a unidadeestratégica e construção de um polorealmente alternativo dos trabalhadorescontra os patrões, os governos e as direçõesgovernistas (CUT, Força, CTB, etc.)

A terceira questão é a de que acampanha contra o ACE deve apontarpara a necessidade de grandes

Todos os itens da cesta básica (coitadodo tomate que está sendo utilizado paradesviar a atenção!) tiveram aumentosacima da média inflacionária, e algunsacumularam nos últimos 12 mesesaumento de mais de 100%. Com os dados

à mostra, agora trata-se de procurarmosexplicar as razões de tanto aumento nopreço dos alimentos. A mídia, oseconomistas burgueses e o governo têmvinculado essa alta ao crescimento dademanda (local e mundial) e às mudanças

POR QUE O PREÇO DOS ALIMENTOS SOBETANTO, MESMO PRODUZINDO CADA VEZ MAIS?

mobilizações que busquem parar aprodução e a circulação de mercadorias,interferindo no próprio movimento docapital, de modo a obrigar o governo e aburguesia e a recuarem.

Nesse sentido, a marcha à Brasília,convocada pela CSP-Conlutas,Intersindical e outras entidades, é ummomento importante dessa luta, poispermite uma ação de rua em Brasília coma unificação dos vários movimentos eentidades que se colocam contra o ACE.A marcha também levanta outra questãofundamental, que é a da Anulação daReforma da Previdência aprovada como dinheiro do mensalão, além de outrasreivindicações. Pode-se combinar amarcha com atos e panfletagens nasregiões, pois muitos trabalhadores nãopoderão ir à Brasília.

Mas é preciso ir além da marcha.Propomos que seja marcada umajornada nacional de lutas com pelomenos um dia de paralisações, atosnas capitais e nas principais regiões,bloqueios e outras mobilizações contrao ACE, pela Anulação da Reforma daPrevidência de 2003 e demais itensda pauta de luta dos trabalhadores.

Também é preciso enfatizar que aluta contra o ACE deve ser parte de umaluta maior, no sentido de que ostrabalhadores assumam o controle dariqueza social, com um programa deruptura com a lógica do lucro, e emdireção a uma nova sociedade, semexploração e sob o controle democráticodos produtores, o socialismo.

do clima, como se essas questões nãotivessem nada que ver com a maneiraque está organizada a produção capitalistano campo. Essa explicação esconde ascausas reais do problema.

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PRODUZIR PARA ALIMENTAR OU PARA OLUCRO?

Para o capitalismo, a busca do lucroé o que interessa, mesmo se issorepresenta jogar fora ou queimaralimentos para poder aumentar seu preçono mercado (ou para reduzir prejuízo),como por vezes se faz[1].

Destacamos duas questões comocausas principais para o aumento dospreços dos alimentos. A primeira é que umaparte importante da produção agrícola nãoestá mais direcionada para alimentarpessoas. Uma parte cada vez maior do quese produz está direcionado para a produçãodos chamados biocombustíveis (falsamentepropagandeados como combustíveislimpos). Só nos Estados Unidos – onde10% dos combustíveis utilizados sãoproduzidos a partir do milho –, no anopassado, o consumo deste cereal para essafinalidade foi de aproximadamente 114milhões de toneladas. Para se ter ideia dosignificado e das consequências sociaisdisso, a produção mundial do cereal em2013 deve ser de 690 milhões de toneladas(http://www.agrolink.com.br), ou seja,quase 25% do total é destinado à produçãoestadunidense de etanol.

A outra causa que podemos destacaré ainda mais problemática: a escolha dequais alimentos produzir também trazconsigo consequências sociais e ambientais.Como muitos tipos de grãos sãomajoritariamente utilizados para raçãoanimal, o aumento da produção de carne,leite e queijos – geralmente identificadoscom ascensão econômica – influidiretamente na disponibilidade de grãos. Porexemplo, para produzir 1 quilo de carnebovina, são necessários 8 quilos de grãos ecerca de 20 mil litros de água, emitindo-seno processo o mesmo tanto de CO2 queum carro ao percorrer 1600 km. Só airracionalidade da produção capitalista podedesconsiderar essas questões, e, narealidade, ela mesma que faz ser assim.Pode-se ingenuamente imaginar que seproduz mais carne, pois cresce o consumo.A realidade é, no entanto, inversa: aumenta-se o consumo, pois se produz mais carne.

O consumo atual das classes médiasocidentais é mais elevado do que oconsumo em qualquer outra épocahistórica, isso porque a carne tem maiorvalor agregado, demanda mais trabalho, eassim é mais lucrativa. Como os capitaisindividuais e o capitalismo como um todoprecisam sempre crescer, aqueles setoresque mais repetem a lógica da produção pelaprodução são privilegiados – inclusive comsubsídios estatais. Sem a produção de carne,a produção de valor no agronegócio seriaapenas uma pequena parte do que é e osistema de crescimento total do capitalismosofreria um grande baque.

Também não merece crédito a ideiade que as alterações climáticas sãoresponsáveis naturais pela diminuição daprodução agrícola, como se fossem obrado acaso. As chuvas torrenciais, a seca, adesertificação são causadas pela maneiracomo se produz as coisas no capitalismo.A larga utilização de combustíveis, odesmatamento, a poluição dos rios sãoexatamente consequências desse tipo deprodução que altera profundamente oequilíbrio ambiental.

DILMA TAMBÉM ESTÁ POR TRÁS DESSAPOLÍTICA

No caso específico do Brasil, a baseda economia está na produção decommodities, como milho, soja, carne,petróleo e outros. São matérias-primaspara exportação com grande aceitação nomercado mundial. Dentre esses produtos,os agrícolas têm um grande peso namanutenção da balança comercial“favorável”, ou seja, no total de vendaspara o exterior. Só nos meses de fevereiroe março deste ano, os produtos agrícolasrepresentaram 40,9% de tudo que o paísexportou, e um volume de US$ 12,88bilhões. Esse é o modelo de produção doagronegócio, setor que representa 22% doPIB, mas que não atende às necessidadesmais fundamentais da população, e sim àprodução de mais dinheiro para os jámilionários representantes do capitalagropecuário.

É importante partirmos dessacaracterização da economia brasileiraporque o modelo de agronegócio aquidesenvolvido implica que a questãoalimentar da população não tem nenhumaimportância, a menos que se possa lucraralto com ela.

A razão do aumento dos alimentosestá relacionada, sobretudo, à globalizaçãoneoliberal, que encontra sua expressão no

agronegócio, expandindo, por sua vez, maise mais sua atuação, em detrimento daprodução familiar – expulsando milharesde famílias do campo e agravando osproblemas sociais nas cidades –, que é maisdiversificada - historicamente sempre foiela que abasteceu o mercado interno.

Essa forma de produzir conta com oapoio político e econômico do governoDilma, expresso principalmente pelarelação de proximidade que tem com abancada ruralista no congresso nacional.Os projetos de irrigação de terras nonordeste estão sendo direcionados paraempresas do agronegócio, o financiamentode projetos de expansão das empresassendo feito com dinheiro público, aorientação de pesquisas da Embrapa(empresa púbica de pesquisa) para áreasafins dos ruralistas, o seguro contra perdaspara os grandes produtores, o plano deexpansão da cana para fins de produçãode etanol, enfim, várias medidas vêmocorrendo para dar sustentação econômicapara as empresas do agronegócio.

A QUEM INTERESSA O AUMENTO DOSPREÇOS DOS ALIMENTOS?

Segundo João Pedro Stédile, aestrutura agrária brasileira é “hegemonizadapelo modelo do agronegócio que estácriando problemas estruturais gravíssimospara o futuro (...) 85% de todas as melhoresterras do Brasil são utilizadas apenas parasoja/milho, pasto, e cana-de-açúcar. Apenas10% dos proprietários rurais, osfazendeiros que possuem áreas acima de500 hectares, controlam 85% de todo ovalor da produção agropecuária,destinando-a, sem nenhum valor agregado,para a exportação (...) Somos produtoresde matérias-primas, vendidas e apropriadaspor apenas 50 empresas transnacionais quecontrolam os preços, a taxa de lucro e omercado mundial”. (www.mst.org.br/content/joao-pedro-stedile-o-dilema-da-reforma-agraria-no-brasil-do-agronegocio)

É evidente que o aumento dos preçosfavorece um setor importante dos grandesprodutores, atravessadores eespeculadores de plantão. Os mais pobressão, mais uma vez, os prejudicados, tantopela falta de acesso à alimentação dequalidade, quanto pelo fato de que oaumento dos preços representa umaredução mais impactante em sua renda.

A solução do problema passanecessariamente pela expropriação doagronegócio e do latifúndio, e destinaçãodessas terras aos trabalhadores do campo

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Ainda hoje a classe dominante nãodeixou de ser racista. O sistema capitalistanecessita da exclusão da população negrapara manter uma identidade nacionalbranca e para ter um setor da populaçãosubmetido ao trabalho precarizado, aobaixo salário ou ao desemprego e semcondição de prosseguir os estudos. Issotudo favorece o empresariado brasileiroe permite que haja exclusão mesmo 125anos após a abolição.

Na Educação o discurso ideológicode “igualdade racial” tem sido tãoreforçado que ainda hoje encontramosjovens universitários com vergonha deassumir ser cotista, embora sendo esseprograma do governo apenas uma açãomínima para “recompensar” o que foifeito contra os nossos ancestrais.

O número de negros que sebeneficiou das cotas raciais ainda é muitorestrito, visto que, há 15 anos o númerode universitários negros no Brasil era deapenas 2%. Hoje é de apenas 6%. Onúmero de brancos na universidade é de31,1% enquanto para alunos negros essepercentual é de apenas 12,8%, ou seja,53% menor.  Destacamos ainda que,durante os últimos dez anos, milhares dereais foram desviados do sistema de cotasnas universidades públicas para sustentaras universidades particulares através doPROUNI. Tudo isso demonstra o papelda burguesia e do governo brasileiro naexclusão do negro que precisa trabalharpara sobreviver.

Isso pode ser verificado quandoanalisamos a proposta de cotas dogovernador do estado de São Paulo o“College”. É uma espécie de estágioprobatório, que obrigará o aluno da redepública estudar mais dois anos e, ao finaldesse período, fazer uma prova. Ao ser

considerado apto, seguirá o estudo comocotista. Se for aprovado esse projeto, quedeverá se estender por todo o paíscontrariará as recentes pesquisas quemostram que os alunos cotistas não têmnotas inferiores aos demais e que em algunscasos têm nota superior, como aconteceuno curso de medicina da UERJ, um dosmais disputados do país, em que a notados cotistas foi 6,41 e a dos não cotistasque foi de 6,37 (Isto É – 10/04/2013).

Essa política para a Educação dogoverno do estado e do governo federalé para redistribuir as vagas existentes enão ter que construir mais universidades,investir em melhores salários e condiçõesde trabalho aos professores, em pesquisase em condições de aprendizagem.

Seja pela implantação de cotasproporcionais ou da lei 10639/03 (queinstitui a obrigatoriedade do ensino deHistória, Literatura, Cultura Africana e daslutas de resistência negra no Brasil) a lutado povo negro se faz necessária. Nãopodemos deixar nas mãos da burguesiabrasileira o controle de nossas vidas.

UMA LUTA ANTIRRACISTA ÉNECESSÁRIA: MAS DEVE SER DE

CLASSE, ANTIGOVERNISTA EANTICAPITALISTA

Vários grupos organizados domovimento negro ainda estão muitoatrasados e não seguem o caminho da lutae do enfrentamento às políticas dosgovernos federal e estadual. Temos nomovimento negro desde setores ligados àdireita, que, obviamente, não lutam pelatransformação dessa realidade e por umasociedade justa. E temos também as frentesparlamentares que permanentementebuscam soluções paliativas. Em São Paulouma dessas frentes apresentou a PL530,

projeto que reivindica apenas 50% dasvagas para alunos da rede pública (brancose negros) e não leva em conta o fato deque o estado possui 33% de negros, ouseja, não considera a proporcionalidade.Dessa forma, o negro continuará commenos vagas e a população rica manteráuma participação (porcentagem) nauniversidade que não condiz com arealidade social, isto é, não resolve o nossoproblema.

Temos ainda organizações negrasligadas ao governo como o MovimentoNegro Unificado (MNU), que quandosurgiu tinha como principal bandeira a lutacontra a violência policial à populaçãonegra. Mas, hoje se omite diante dogenocídio da juventude negra (ver Mapada Violência no Brasil 2012). Mantém-seinerte diante do aumento da exploraçãosobre o conjunto da classe trabalhadora,demonstrado através do empenho do PT/CUT em aprovar o Acordo ColetivoEspecial (ACE), que irá precarizar aindamais as nossas condições de trabalho.Esse projeto é incompatível com ainclusão da população negra no mercadode trabalho com garantias trabalhistas ecom cotas proporcionais para negros.

Por outro lado precisamos intensificaras lutas de combate ao racismo em centraissindicais de esquerda como a CSP-CONLUTAS e a Intersindical. Devemosretomar a bandeira da escala móvel detrabalho e salário, abandonada pelo meiosindical, com cotas proporcionais paranegros. As cotas proporcionais no mercadode trabalho devem ser levantadasconjuntamente (não condicionada), com abandeira de redução da jornada de trabalhosem redução de salários como forma degarantir trabalho a todos e a todas.

Essas lutas devem ser atreladas às

A BURGUESIA MANTÉM SEU PROJETOANTINEGRO

(como, por exemplo, as 150 mil famíliasque vivem em acampamentos e as 4milhões de famílias do bolsa família nocampo), para que possam produzir nãopara o mercado, não para o crescimentoirracional do capital, mas para aquilo queé necessário à satisfação alimentar daspessoas. Isso só acontecerá com umarevolução no campo, que rompa com osimperativos do mercado e dê aos homens

o controle da produção dos alimentosconforme as necessidades de todos.

Enquanto a revolução não se faz, noentanto, é necessário garantir novosassentamentos e o financiamento públicopara a agricultura familiar e para ospequenos proprietários, garantindo umaprodução mais diversificada, distribuidorade riqueza e saudável, medidas estas quetambém podem garantir o aumento da

produção de alimentos para o consumointerno, permitindo que haja umaacomodação dos preços.

125 ANOS DE “ABOLIÇÃO”

[Nota 1] No ano passado, em uma única granjabrasileira, enterraram-se vivos cem mil pintospor conta de um aumento no preço da raçãoque tornaria sua posterior venda “nãolucrativa”.http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,criador-enterra-114-mil-pintos-vivos,918270,0.htm

EDUARDO ROSA

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demais lutas da classe trabalhadora (poremprego, por moradia, por Educação,Saúde, etc.). Por isso a ação direta dapopulação negra também deve serincentivada a fim de que assuma o seuprotagonismo.

Precisamos impor, através da luta,

A LUTA DOS TRABALHADORESCONTRA O ASSÉDIO MORAL

O QUE É ASSÉDIO MORAL?Este artigo não pretende mostrar um

ampla definição de assédio moral, nemos mecanismos jurídicos para defini-lo.Para os interessados, há algumas boasreferências na última sessão deste artigo.

No entanto, não podemos nosescapar de tentar uma definição mínima.Na verdade, todo trabalhador acabapassando pelo que chamamos de “assédiomoral”. Afinal, como exporemos abaixo,este é um mecanismo comum eamplamente utilizado na estruturahierárquica de trabalho da sociedadecapitalista, para constranger trabalhadores.

Humilhação, constrangimento,menosprezo, insultos são algumas dasmuitas formas de assédio moral notrabalho, que comumente acontecem emrelações hierárquicas, principalmente daschefias para os subordinados. Entretanto,esta forma de opressão é invisível, poiso assediado não demonstraimediatamente o dano sofrido, podendosuportar, por muito tempo, uma situaçãocada vez mais degradante.

Muitos sequer exigem seus direitos,pois os abusos das chefias são tidos muitasvezes como aceitáveis, afinal “Fulano échefe”, ou superáveis, pois “foi só umdeslize” ou “ele perdeu a cabeça”.Enquanto isso, a velha prática de assediarmoralmente os subordinados prevalece.

Os trabalhadores, então, não devemaceitar tais práticas como toleráveis,denunciando as práticas imediatamentequando ocorrerem. Mas, além desimplesmente confiarem na justiçatrabalhista, devem, acima de tudo, seorganizar para coibir os assediadores equestionar a estrutura de trabalhoexistente.

O ASSÉDIO MORAL NO SERVIÇOPÚBLICO FEDERAL

O assédio no serviço público temuma característica diferente em relação

à iniciativa privada. Quando insatisfeitascom um funcionário, as empresas tratamde demiti-lo rapidamente. Mesmo assim,várias empresas não demitem ofuncionário e aí o assédio é utilizado paraforçar o funcionário a pedir demissão,não tendo acesso à indenização por parteda empresa e outros direitos. É o caso demuitos funcionários terceirizados e detrabalho mais precarizado, como asempresas de telemarketing.

No caso do serviço público, seja elemunicipal, estadual ou federal, como boaparte dos funcionários possui estabilidadeno trabalho, o assédio moral acaba sendoextremamente comum, como uma formade perseguição. Assim, caso o funcionárionão coadune com práticas imorais ou atéilegais da chefia, pode receber ameaçasou outras formas de humilhação.

Especificando-se no serviço públicofederal, estima-se, através de umlevantamento realizado em 2004 [2], que33% dos servidores públicos federaisrelataram casos de assédio moral. Detodos os afastamentos registrados, 12%são por transtornos mentais. Além disso,28% de todas as aposentadorias noserviço público federal são por invalidez.Estes e outros números combatem osenso-comum de que os funcionáriospúblicos são privilegiados, e colocam àvista o alto grau de estresse por quepassam os servidores da esfera federal.

Ao mesmo tempo em queobservamos esse cenário assustador, nãohá medidas concretas para diminuir oassédio moral, pelo contrário: a própriaestrutura do serviço público federalreforça essa situação. Toda a estruturahierárquica e com cargos comissionados,funções gratificadas e cargos de direçãoé pensada para favorecer a hierarquia eacaba também alimentando o assédiomoral. Sabe-se que, apesar dasjustificativas das administrações dos

diferentes órgãos, a alocação de taiscargos não ocorre através de critériostécnicos, mas políticos. As administraçõestampouco estão preocupadas com asaúde dos funcionários: sugerem que osassediados mudem de setor, abafam oscasos e não informam aos funcionáriosa respeito desses abusos. Por fim, abandeira de ser contra o assédio moralacaba sendo uma campanha levadaexclusivamente pelas organizações dostrabalhadores, como os sindicatos.

O TRABALHO NA SOCIEDADECAPITALISTA

O assédio moral é provavelmentetão antigo como o trabalho comoconhecemos. A estrutura de trabalhomudou ao longo das sociedades, massempre preservou o caráter de exploraçãode classe. Assim, como diria Marx eEngels no início do Manifesto do PartidoComunista, “a história de toda sociedadeaté aqui é a história da luta de classes”.Ou seja, desde o início das grandessociedades da antiguidade, a divisão dotrabalho social separa-se em várias classes,existindo as classes que participam daprodução dos bens de consumo e asclasses que apropriam-se do excedentede produção. À história caberátestemunhar o movimento de váriasdestas classes, a extinção de algumas, osurgimento de outras, até o acirramentomais agudo na sociedade capitalista: ostrabalhadores, que produzem toda ariqueza do mundo, e os capitalistas ouempresários, que usufruem da riquezaproduzida pelos trabalhadores.

O mecanismo pelo qual as classesdominantes mantêm seu controle sobreos dominados são vários e tambémmudaram ao longo da história. Nocapitalismo moderno, é vendida a ideiade que os trabalhadores são livres, pois

nos bairros, nas escolas, nas universidadese nos locais de trabalho o nosso direito àvida, ao estudo e ao trabalho. Somenteuma grande luta negra classista,antigovernista e anticapitalista poderámudar os rumos dessa sociedade injusta,racista e preconceituosa! 

SILAS JUSTINO

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votam em vários representantes queadministram suas cidades, estados e país(apesar de não haver mecanismos decontrole eficientes destes mesmosrepresentantes), mas não se questionamque o mundo do trabalho hoje é umaditadura, pois alguém emite ordens paraque alguém, que não participa dasdecisões da produção, as execute. Aí entratambém o assédio moral, que coíbequalquer questionamento dostrabalhadores para com seus chefes.

A IMPORTÂNCIA DA ORGANIZAÇÃO DOSTRABALHADORES

Quando chefes, gerentes e diretoressão identificados como assediadores, a

primeira medida dos funcionários é abriruma comissão de sindicância (e,posteriormente, um processoadministrativo disciplinar) para que sejamaveriguados os fatos e haja punição doassediador. Entretanto, mesmo que oassediador seja considerado culpado, émuito difícil que ele cumpra de fato umapena que desencoraje o assédio. Recebeuma advertência, mas continua com aspráticas desrespeitosas e humilhantes paracom seus subordinados. Às vezes,transfere-se o assediador para outro localde trabalho, onde continua assediandooutros funcionários.

Por isso, é essencial afirmar quesomente a organização dos funcionários

A CRISE ECONÔMICA E A REALIDADE DOSBANCÁRIOS NO BRASIL

de um setor, de um órgão ou de umacategoria inteira pode ser capaz de lutarcontra a prática do assédio moral. Apressão de fato em cima dos gestores,das reitorias, dos ministros é o únicoinstrumento que temos para exigir saídasjustas de situações pontuais, masprincipalmente, para questionar todo osistema.

ReferênciasSite com dados e estatísticas sobre

assédio moral: http://www.assediomoral.org/

Reportagem sobre Assédio Moral dosite do SINAL (Sindicato Nacional dosServidores do Banco Central): http://tinyurl.com/ccmajeu

Desde o início da crise econômicamundial, o governo do PT e todos os seusasseclas no movimento sindical, como osdirigentes do Sindicato dos Bancários deSão Paulo, Osasco e Região, se esforçampara dizer aos trabalhadores, no nossocaso bancários, que o Brasil está imune àcrise. Na verdade, o governo do PT usouos bancos federais para salvar o capitalque opera no país da quebradeira geralprovocada pela crise econômicainternacional.

Em 2008 começou o movimento doBanco Central de cortar os juros da taxaSELIC (que remunera os banqueiros quepossuem títulos da dívida pública) paraforçar os bancos de varejo a emprestarmais dinheiro, ao invés de comprar títulospúblicos. A queda da SELIC por si sónão foi suficiente para baixar os juros demercado, e havia a necessidade de fazercom que os trabalhadores continuassema consumir. BB e CEF reduziram os jurosdos seus empréstimos e teve início umaverdadeira farra de endividamento, comos trabalhadores se endividando emmassa para comprar imóveis, veículos eeletrodomésticos. Os últimos anos dogoverno Lula e os primeiros de Dilmaconsolidaram a “cidadania do crédito”,ou seja, a ilusão de que milhões depessoas estão “saindo da pobreza” eentrando na “classe média”, porque agorapodem consumir, sem que na verdadetenha havido aumento da sua renda.

Agora, começam a aparecer asconsequências. Na primeira década de

2000, os bancos se fartaram comaumentos de lucros na ordem de 15, 20 eaté 30% de um ano para o outro. Hoje arealidade é bem diferente. Vejamos osnúmeros da variação do lucro de 2012em relação a 2011 apresentados pelos 7maiores bancos: BB 0,65%(economia.estadao.com.br/noticias/negocios, 21/02); CEF 17,1% (Assessoriade Imprensa da CEF, 19/02/20);Bradesco 3,2% (UOL, 28/01/20); Itaú -5,13% (Agência Estado, 05/02/2013);Santander -24,32% (veja.abril.com.br/noticia/economia, 31/01/2013); HSBC -2,6% (www.feebpr.org.br/lucroban.htm,06/03/20).

Para tentar reverter essa situação delucros menores, os bancos atacam seusfuncionários com demissões, sobrecargade trabalho e assédio moral. Só em 2012,foram mais de 7.000 demitidos nosbancos privados, dos quais 3.000 só do“ S a t ã d e r ”   ( h t t p : / /avantebancario.blogspot.com.br/01/04/2013). Em 2013 o Bradesco já demitiu1299 bancários e o Santander 1128.

Enquanto os trabalhadores bancáriosenfrentam essa dura realidade, a direçãodo Sindicato de São Paulo, o maisimportante do país, representando umabase de mais de 100 mil trabalhadores,ou ¼ da categoria no país, está maispreocupado em fazer propaganda dogoverno. O Sindicato abandonou há muitotempo a luta pela estabilidade noemprego e contra a demissão imotivadanos bancos privados. Qualquer queda nos

lucros pode ser rapidamente resolvidapelos bancos pela demissão eintensificação do assédio moral,terceirizações e transferência do serviçopara os correspondentes bancários, commenores salários para esses trabalhadorese menor segurança e maiores custos paraos clientes.

Nesse quadro geral, os bancospúblicos também sofrem com a quedada lucratividade. Como o seu caráter debanco público está apenas na propriedade(parcialmente estatal no BB), mas suagestão já é inteiramente privada, osdirigentes e gestores empurram sobre osfuncionários as consequências da quedados lucros. Na CEF houve a explosão docrédito imobiliário, com o programa“minha casa minha dívida”. Paraviabilizar o atendimento aos tomadoresde empréstimo, a CEF teve que esvaziaras agências, expulsando a população debaixa renda, que necessita de serviçoscomo FGTS, Seguro-Desemprego e PIS.

É evidente que os bancários nãoconcordam com isso e lutam contra essasituação, apesar do sindicato. Um deles,o companheiro Messias Américo da Silva,funcionário da CEF em Osasco -SP há23 anos e militante histórico da categoria,está sendo processadoadministrativamente, com o objetivo deser demitido por justa causa,simplesmente por cumprir com a suafunção, que é de atender todos ostrabalhadores que a ele procuraram, e delutar por uma CEF que cumpra sua

DANIEL MENEZES E MÁRCIO CARDOSO

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Estamos assistindo no Brasil àexpansão do ensino de tempo integral.Governos municipais, estaduais e federal,passaram a expandir essa modalidade deensino. No entanto, algunsquestionamentos se fazem necessários: Oque se pretende com a expansão do ensinode tempo integral? Quais interesses estãopor trás da implantação dessa modalidadede ensino? As necessidades e os interessesdos trabalhadores e seus filhos estãocontempladas? Qual concepção deEducação os trabalhadores devemdefender?

Procuraremos, a partir desse artigo,mostrar quais interesses estão por trás daexpansão do ensino de tempo integral eapresentar de modo inicial um debateacerca da concepção de Educação Públicaa ser defendida pelos trabalhadores e seusfilhos.

O QUE SE PRETENDE COM A EXPANSÃODO ENSINO DE TEMPO INTEGRAL?Os governos de um modo geral,

independente da legenda partidária – PT,PSD, PMDB, PSDB, PSB, PTB, etc. –atuam no sentido de passar uma falsa ideiade que defendem o interesse geral dostrabalhadores. Essa constatação éimportante, pois nos ajuda a entender que,por trás da expansão do ensino de tempointegral, procura-se dar uma outra

conotação para a Educação Pública.A ampliação do tempo de

permanência dos alunos nas escolas nãotem como premissa a necessidade de maistempo e mais espaço para que se tenhauma escolarização mais ampla, sendonecessárias melhores condições objetivase subjetivas, possibilitando, com isso, níveisde formação – biológica, psicológica,social, cultural, científica, artística,espiritual e política – avançados.

Busca-se, com essa modalidade deensino, implantar no Brasil uma Educaçãopara a submissão, que conduz aoconformismo e à obediência hierárquica,além, é claro, de assumir um papel cadavez maior de controle social.

O cenário em que as atividadeseducativas se desenvolvem – as escolas –mais parecem cadeias, centros de detençãoque em nada contribuem para odesenvolvimento de práticas e capacidadesde refletir, discutir, buscar informações eagir politicamente. Os alunos ficam presosnas escolas para não praticarem crimes ounão ficarem expostos à criminalidade.

Tentando mostrar que esse modelofunciona, os governos hierarquizaram asredes de ensino público, de modo que amaioria das escolas funcionam de modoprecário e outras, por receberem maisrecursos técnicos e financeiros,sobressaem em relação às demais.

QUAIS INTERESSES ESTÃO POR TRÁS DAIMPLANTAÇÃO DESTA MODALIDADE DE

ENSINO?A implantação do ensino de tempo

integral no país, embora seja aplicada pelosgovernos do PT ao PSDB, vem carregadade interesses – empresas, bancos, ONG’se institutos – que permeiam a suaimplantação.

O Estado usa o seu aparatoideológico, de pseudo-harmonizadorsocial, para encobrir os interessesempresariais de banqueiros e ONG´s queestão por trás da implantação dessamodalidade de ensino. Na verdade, osgovernos cumprem apenas o papel deaplicadores desse projeto educacional.

Tomaremos como exemplo o ICE –Instituto de Co-responsabilidade pelaEducação – liderado por MarcosMagalhães, que presta serviços na regiãoNordeste, e agora está atuando tambémcom a SEE-SP e em outros estados – PE,RJ, CE, PI e SE –, o Movimento Todospela Educação e o Parceiros da Educação.

São grupos ”que sentiam falta em suasempresas de jovens qualificados” e que, dentrodo regime de acumulação flexível, queremuma mão de obra com uma formaçãoprecária e que seja obrigada a oferecer oseu corpo e o seu trabalho a qualquer preço.

POR UMA EDUCAÇÃO PÚBLICA SEMEMPRESÁRIOS PROFESSORES DO ESPAÇO SOCIALISTA

função de banco público.Na CEF em 2009 e no BB agora em

2013 houve reestruturações quereduziram a jornada de 8 para 6 horas deum importante contingente detrabalhadores, mas com redução desalários, e a condição de que não ingressemna justiça para receber a 7ª e 8ª horareferentes aos anos anteriores. Esse tipode reestruturação só pôde ser aplicado,evidentemente, com a colaboração doSindicato de São Paulo, controlado peloPT, ou seja, pelo patrão dos bancospúblicos. No caso do BB, o plano aindaestá em curso, e também a luta contraele. Na assembleia de 25 de fevereiro,graças ao trabalho das oposições, oSindicato foi impedido de assinar o acordoda Comissão de Conciliação Voluntária,que viabilizaria a aplicação do plano. Issofoi um importante golpe contra o plano

em nível nacional, aliado ao fato de que amaioria do público alvo não assinou otermo de migração, ou seja, não abriu mãode receber o que lhe é devido.

A represália do governo não tardou.Os bancários que lutam, ou questionamo novo plano são perseguidos de diversasformas. Até o momento sabemos de 15funcionários do BB sofrendo processosadministrativos em São Paulo, foco da lutacontra o novo plano, e 3 demitidos emBrasília. O ataque aos bancários seaprofunda e cada vez mais fica evidenteque a política de usar os bancos públicospara alavancar a economia, por meio deempréstimos, não se sustenta. Foi isso queprovocou a crise nos Estados Unidos. Écriminosa a conivência do Sindicato deSão Paulo com os planos dos bancos esua propaganda da política do governo.

 Também é necessário que o sistema

financeiro seja colocado sob controle dostrabalhadores bancários, e a serviço dosinteresses da classe trabalhadora, não deum punhado de especuladores. Nãopodemos mais permitir a lógica de“privatização dos lucros e socialização dosprejuízos”. O resultado do trabalho socialprecisa ser empregado para atendimentodas necessidades humanas dostrabalhadores, como ampliação da redeferroviária e metroviária, acabar com odéficit habitacional, fazer a reformaagrária, estruturar uma educação e saúdepúblicas e de qualidade, ampliação eavanço da ciência e tecnologia, etc.

Mas para que isso seja possível, ostrabalhadores precisam transformar asociedade atual para que acabem com olucro e a propriedade privada calcada naexploração do homem pelo homem, pormeio de uma Revolução Socialista.

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N

OS INTERESSES DOS TRABALHADORESESTÃO CONTEMPLADAS NESSA

MODALIDADE DE ENSINO?“Só faz sentido pensar na implantação de

Escolas de Tempo Integral se for uma concepçãode Educação Integral que represente umaampliação de oportunidades e situações quepromova aprendizagens significativas eemancipadoras.”  (Rosa in, Reflexões sobre aEducação Integral na Perspectiva da EscolaUnitária de Antonio Gramsci).

O currículo adotado nas escolas deensino de tempo integral empobrece aformação geral dos alunos, adaptando osconteúdos à formação de mão de obraprecária às empresas.

Nesse sentido, o trabalho se tornamuito mais um elemento de degradaçãoque de desenvolvimento. Trata-se de umaformação para um mundo do trabalhoalienado, que não humaniza.

A reestruturação produtiva, enquantoproduto do momento atual do capitalismoem crise estrutural, reduz ao mesmotempo o preço e a remuneração dotrabalho, e aperfeiçoa o trabalhadordentro de um regime de contrataçãotemporária, o que faz com que muitosalunos tenham que se preparar para otrabalho temporário, para a prática debicos e para trabalhar como camelô.

De acordo o modelo pedagógico doICE e das Diretrizes do Programa deEnsino Integral estado de São Paulo, aproposta de ensino de tempo integralimplantada em vários estados sematerializa nos seguintes pilares (Fonte:www.observatoriodaeducacao.org.br): Educação para Valores – EPV –

Formar o jovem como pessoahumana, dotado da capacidade deiniciativa (ação), liberdade (opção) ecompromisso (responsabilidade).Protagonismo Juvenil – Formação

que leve o jovem a atuar “como parte dasolução, e não parte do problema”. Associativismo Juvenil  –

Proporcionar o surgimento de múltiplase variadas formas de auto-organizaçãoentre os jovens, com finalidades sociais,esportivas, ambientais etc.Cultura da Trabalhabilidade –

Fomentar no jovem a compreensão daspossibilidades de sua inserção e atuaçãono novo mundo do trabalho, por meio daelaboração do seu Plano de Vida e Planode Carreira.Empreendedorismo Juvenil –

Estimular no jovem a capacidade deautogestão, cogestão e heterogestão (agestão hierarquizada, “por outro”, a maisutilizada nas empresas).

O programa Mais Educação, dogoverno federal, em que pese que sejabonito no papel, não leva em consideraçãoa realidade das escolas em que, semestrutura, assumirá o mesmo caráter dasdemais propostas, inclusive a proposta dogoverno federal de trabalho commonitores, não valorizando, com isso, osprofissionais da Educação Pública.

QUAL CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO OSTRABALHADORES DEVEM DEFENDER?

Pensamos que a Educação almejadapelos trabalhadores e seus filhos deve serligada a uma formação para o mundo dotrabalho, mas também deve propor açõespara concretizá-las em valores criados porele.

Dessa forma, o princípio educativopromove o desenvolvimento de condiçõesfísicas, mentais, afetivas, lúdicas, estéticasdo ser humano, capazes de ampliar acapacidade de trabalho na produção devalores e no seu uso em geral.

“Uma Escola que equilibre de modo justoo desenvolvimento da capacidade de realizartrabalho com o desenvolvimento das capacidadesintelectuais, combinando o rigor intelectual coma necessária relação com o mundo do trabalho”.(Gramsci in, Escola Unitária).

Uma Educação que aperfeiçoe astécnicas do trabalho coletivo para

assegurar a todos os trabalhadores umavida digna, liberta e culta.

Para uma Educação Integral paratrabalhadores, o tempo é necessário paraque tenhamos um pleno desenvolvimentodas suas potencialidades físicas e mentais.

Nesse sentido, a ampliação do tempose faz necessário, pois “(...) as necessidadeshumanas não se restringem ao âmbito dasnecessidades físicas: além de se alimentar, morar,vestir, tornaram-se necessários para o ser humanoo lazer, o saber, a arte, a espiritualidade, etc”.(Asbahr & Sanches in, A teoria do valor emMarx e a Educação).

Defendemos uma Escola única paratodos, que proporcione o acesso aoconhecimento científico e à cultura emgeral, ou seja, que se aproprie doconhecimento produzido socialmente pelahumanidade.

Na Educação Integral, teremos umaformação humana também integral, comvistas à emancipação individual e coletiva.Através do trabalho educativo, os alunosperceberão  a sua condição e buscarãosuperá-la, não sendo com isso, indiferentesao mundo que os rodeia, tornando-sesujeitos e agentes de sua história, epercebendo que são seres sociais.

Necessitamos de um sistema deensino público que possibilite aotrabalhador passar, quantas vezes sejanecessário, do trabalho às aulas dauniversidade e que defendaexclusivamente os interesses dostrabalhadores! Um trabalho pedagógicoque tenha a emancipação dostrabalhadores como horizonte, semdesenvolver as contradições históricasobjetivas, e que defenda o Socialismo.

“O Socialismo, ainda que os seus inimigosdigam o contrário, aspira a realizar a plenitudedo homem, isto é, libertar o homem da opressãodas classes, para que recupere, com a totalidadedas suas forças, a totalidade do seu eu”. (Poncein, Educação e Luta de Classes).

Por uma sociedade Socialista!

O “SOCIALISMO DO SÉCULOXXI” É SOCIALISMO?

A morte do presidente venezuelano Hugo Chávez em 5 de março passado, depoisde 2 anos de luta contra o câncer, que não o impediu de vencer a 14ª das 15 eleições deque participou, reabriu o debate sobre o significado do projeto chavista, sua “revoluçãobolivariana” ou “socialismo do século XXI” e as perspectivas para a Venezuela e aAmérica Latina.

Num momento inicial, os opositores de Chávez pela direita, o imperialismo e seusaliados latinoamericanos, as elites brancas, racistas e entreguistas que sempre governaram

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a América Latina de “veias abertas” e“relações carnais” com o imperialimo; osseus representantes na mídia, como revistaVeja, Folha e Estado de São Paulo, redeGlobo, etc.; todos comemoraram a mortede Chávez e anteviram o fim de seu projetopolítico. Chegou-se a falar até eminstabilidade e perigo de golpe naVenezuela, tamanho é o ódio despertadopelo chavismo e o desejo da direitaburguesa de retomar o poder a qualquercusto. Num segundo momento,consolidou-se a situação em que o vice deChávez, Nicolas Maduro, assumirá o papelde condutor do projeto. Uma vitóriaeleitoral do chavismo, porém, longe dedeixar “tudo resolvido”, nos coloca umaquestão muito séria, a de qual deve ser apostura dos revolucionários em relação aoprojeto chavista, seu balanço eperspectivas, sobre o que discutiremos aseguir.

ORIGEM DE CHÁVEZ E SUA TRAJETÓRIANA VENEZUELA

A origem do movimento chavista podeser buscada no “caracazo” de 1989, umimenso levantamento popular na capitalvenezuelana, em que os planos de“austeridade” (corte dos gastos sociais) dopresidente Carlos Andrés Perez gerarammanifestações colossais, saques aossupermercados, confrontos com a polícia,etc. O governo jamais se recuperou e ainstabilidade permaneceu no país. Em 1992um jovem coronel chamado Hugo Chávezliderou uma tentativa de golpe de estadoque foi derrotada, que o levou a algunsanos na prisão. Carlos Andrés Perez seriaafastado do poder em 1993, quando sofreuum impeachment por corrupção.

Ao contrário do restante da AméricaLatina, não houve golpes militares naVenezuela para reprimir as lutas popularese a “ameaça comunista”, desde a queda

do último ditador em 1958. Com isso,houve espaço para que se formasse umsetor nacionalista nas forças armadasvenezuelanas, de onde Chávez recrutouos integrantes do Movimento QuintaRepública. Com seu discurso contra aespoliação do país pelos Estados Unidose o imperialismo, Chávez foi se tornandocada vez mais popular. Em 1998, foi eleitopresidente, a primeira de suas váriasvitórias eleitorais. Em 1999 alterou aconstituição do país, que passou a sechamar República Bolivariana daVenezuela (em referência a Simon Bolivar,um dos líderes da independência dospaíses latioamericanos do domínioespanhol no século XIX e ídolo deChávez). Seu projeto político, em termosde discurso, era completar aindependência do país, contra osdominadores estrangeiros, desenvolvendoa soberania do Estado venezuelano.

REALIZAÇÕES DO CHAVISMOA principal luta para que o governo

de Chávez conseguisse desenvolver suasrealizações (redução da pobreza, dasdesigualdades sociais, do desemprego etc.)foi a retomada do controle da empresapetrolífera estatal, a PDVSA. O petróleoé a principal riqueza do país, respondendopor 95% das exportações e 45% daarrecadação federal (dados do CIA WorldFactbook, disponíveis em www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/ve.html). De acordo com a mesmafonte, a Venezuela é o 14º maior produtorde petróleo, com 2,45 milhões de barrispor dia e o 10º maior exportador, com1,69 milhões, e possui a 3ª maior reservacomprovada do mundo, com 209,4bilhões. Antes de Chávez, a PDVSA eracontrolada por uma camada de gerentescorruptos apelidada de “meritocracia”,que não tinha mérito nenhum, mas a

“esperteza” de roubar odinheiro da estatal paramontar negócios particulares.A burguesia venezuelana sesustentava nessa espoliação dodinheiro público, vivendoisolada do povo do própriopaís e cultivando o hábito deresidir em mansões em Miami.

A partir de Chávez, amaior parte da “meritocracia”foi expulsa ou passou acolaborar com seu governo.Com o aumento do preço dopetróleo nos anos 2000 (de

US$ 10,41 em 1998 para US$ 107,66 em2013 e picos de US$ 132,55 em 2008,considerando-se uma média dos preçosdo barril das veriedades de petróleo tipoBrent, Texas Oeste e Dubai Fateh – dadosdo Indexmundi (www.indexmundi.com/p t / p r e % E 7 o s - d e - m e r c a d o /?m e r c a d o r i a = p e t r % C 3 % B 3 l e o -bruto&meses=300), a renda estatalaumentou de maneira explosiva. Com isso,Chávez passou a sustentar programas debem estar social para a população pobredo país, tais como as chamadas “missões”,em que médicos (a maioria cubanos) eprofessores passaram a visitar as favelase periferias, o que nunca havia acontecido;ou ainda como o programa “Gran MissiónVivenda”, programa de moradia similarao “Minha Casa, Minha Vida” brasileiro,mas que, para o porte da sociedadevenezuelana, tem um impacto muitomaior (além de garantir que aqueles queganham até um salário mínimo recebamsua casa totalmente custeada pelo Estado).Apesar dessas importantes mudanças, nãohouve qualquer alteração substancial nosistema capitalista. A exploração cotidianados trabalhadores permanece inalteradae permanecem os problemas sociaistípicos do capitalismo: miséria, violência,corrupção... Como todo país capitalistapobre, periférico e explorado, a Venezuelachavista continuou vendendo petróleo aosEstados Unidos e continuou pagando asua dívida externa.

A OPOSIÇÃO DE DIREITAApesar da continuidade dos

elementos fundamentais do capitalismo,a ousadia de Chávez de dividir uma parteda renda do petróleo com os pobresenfureceu a burguesia local e oimperialismo, tendo, pois, respaldo,principalmente, no setor da população dealta renda do país. Em 2002 um golpe deEstado liderado pela Fedecamaras, afederação empresarial, tirou Chávez dopoder por dois dias e foi prontamentereconhecido pelos Estados Unidos. Noentanto, um milhão de pessoasprovenientes dos bairros periféricos deCaracas cercou o palácio presidencial,exigindo a volta de Chávez, que foireconduzido ao poder pelo setor leal dasforças armadas. Por todo o país, ostrabalhadores se preparavam para umconfronto armado, mas Chávez optoupela conciliação com os golpistas, que nãoforam punidos. Em 2003, os mesmossetores empresariais lideraram um

“A exploração cotidiana dostrabalhadores permaneceinalterada e permanecem osproblemas sociais típicos docapitalismo: miséria, violência,corrupção... Como todo paíscapitalista pobre, periférico eexplorado, a Venezuela chavistacontinuou vendendo petróleo aosEstados Unidos e continuoupagando a sua dívida externa”

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“lockout”, uma greve patronal, com ofechamento das empresas, na tentativa deparalisar a economia para derrubar ogoverno. Os trabalhadores reagiram maisuma vez e chegaram a tomar o controleda produção da PDVSA. No entanto, maisuma vez Chávez chegou a um acordo coma burguesia e paralisou as iniciativasautônomas dos trabalhadores.

Sem conseguir derrubar oudesestabilizar Chávez, a direita (apelidadade “esquálida”) optou por um discursoideológico raivoso, imputando aopresidente a pecha de ditador, nome peloqual é tratado na imprensa internacional,a despeito das inúmeras eleições quevenceu, de ter submetido seu mandato areferendo, etc. Pelos critérios dademocracia burguesa, não há nada de antidemocrático no governo chavista(discutiremos logo abaixo os critériossocialistas e de democracia operária). Oque não se tolera na verdade é o seudiscurso pseudo-socialista, pois aburguesia sabe o perigo que pode estarescondido nessa palavra, que havia sidobanida do vocabulário. Nos anosseguintes, a oposição mudou seu discursopara uma variedade menos raivosa econciliadora, “construtiva”, até porque ochavismo não rompeu em nada com ocapitalismo, e muitos burgueses passarama fazer parte do partido chavista.

O NACIONALISMO BURGUÊS DO SÉCULOXXI

O exemplo de Chávez se irradiou parao restante da América Latina, comimportantes diferenças de país para país,mas ainda assim como parte de umprocesso comum. O continente passou porum importante ciclo de lutas populares nadécada passada, com grandes mobilizaçõescontra os efeitos mais nefastos doneoliberalismo e da mundialização típicosda década de 1990. São exemplos desseciclo a “guerra da água” em 2000 e a“guerra do gás” em 2003 na Bolívia, aqueda de presidentes em 1997, 2000 e 2005no Equador, e o mais massivo de todos, o“argentinazo” de 2001. Esses processos deluta representam uma resposta dostrabalhadores do continente aos efeitos dacrise anterior do capitalismo, por volta doano 2000. Entretanto, foram caracterizadaspela ausência de um projeto quequestionasse não apenas os efeitos doneoliberalismo, mas o capitalismo como umtodo.

Como parte daquilo que chamamos

de crise da alternativa socialista, as lutasdo início da década passada não tinhamcomo referência um projeto detransformação revolucionária do conjuntoda sociedade, mas o simples atendimentode demandas parciais. Não eram baseadosnuma tentativa organizada de tomar opoder e o controle da produção a partirdos locais de trabalho, mas sim emmobilizações em que os trabalhadoresapareciam diluídos como habitantes dedeterminados bairros ou regiões do país.Com isso, ao invés de avançar para umaruptura completa com o capitalismo, essesimportantes movimentos de luta foramadministrados por dentro dos mecanismosda democracia burguesa, ou seja, foramdesviados para a ocupação de cargos noEstado. Elegeram-se candidatos quediziam representar a continuidade daslutas, exatamente para paralisá-las.Mantiveram-se as estruturasfundamentais do capitalismo, o Estado, aconstituição, a propriedade privada, asforças armadas, etc.

Os dirigentes eleitos para paralisar asmobilizações, como Hugo Chávez naVenezuela, Evo Morales na Bolívia,Rafael Correa no Equador, retomaramum discurso nacionalista, que nem chegouaos pés do nacionalismo do século XX (oqual chegou a expropriar empresasestrangeiras que exploravam petróleo,como fez Cárdenas na década de 1930no México). Sustentaram-se numa espéciede “nacionalismo de commodities”,baseando-se no aumento conjuntural dospreços dos hidrocarbonetos, minérios,produtos agrícolas, etc., que caracterizoua primeira década do século, paraimplantar algumas políticas sociaislimitadas, das quais as populaçõeslatinoamericanas sempre foramcronicamente carentes. De outro lado,como representação de saídas menos“radicais” e a partir de uma negaçãomenos contundente dos efeitos doneoliberalismo em sua roupagem mais“pura”, elegeu-se Lula no Brasil, cujagestão neoliberal teve um papel decisivopara impedir o avanço das lutas e moderaros programas dos novos presidentes “deesquerda” ou que rompiam com opredomínio dos partidos tradicionais quese elegeriam dali em diante, como osKirchner na Argentina, Bachelet no Chile,Vasquez no Uruguai, Lugo, no Paraguai,Ortega na Nicarágua, etc. Todoslimitaram-se a um certo grau de avançoem políticas sociais, e, em larga medida,

numa gestão aceitável para a burguesia.

AS FRAGILIDADES DA ALEGAÇÃO DE UM“SOCIALISMO DO SÉCULO XXI”A “revolução bolivariana” na

Venezuela foi o protótipo e modelo detodos esses movimentos. Ao dizer quedefende um “socialismo” busca confundire dar um ar de esquerda e anticapitalistaao seu projeto que todos sabemos não temnada de socialista. Trata-se de umaconfusão proposital, para atrair o apoiode todos os que simpatizam com osocialismo. Essa confusão proposital é umestelionato, uma manobra de usurpaçãodo conceito de socialismo para defendera continuidade do capitalismo. Com isso,a nomenclatura termina por realizar duasconfusões: primeiramente, induz à ideiade que no século XX houve socialismo;em segundo lugar, na verdade, escamoteiaas reais distinções deste projeto para coma ideia de socialismo.

Em primeiro lugar, o fato de que ométodo proposto para alcançar osocialismo não é uma rupturarevolucionária, mas a eleição de candidatosque impulsionem um “processo demudanças”. Ora, já vimos no caso daprópria Venezuela como a burguesia reageno caso de uma tentativa de “mudanças”,com o golpe e o lockout, e como Chávez,ao invés de aprofundar as mudanças, optoupor conciliar com os golpistas. Ou seja, aintenção de fato nunca foi romper com ocapitalismo, mas continuar convivendocom ele. A lição é de que não existesocialismo sem a tomada do poder, adestruição da máquina do Estado (forçasarmadas, polícia, judiciário, legislativo eexecutivo), a expropriação dos meios deprodução (fábricas, minas, fazendas,bancos, etc) e a sua gestão coletiva.

Em segundo lugar, o fato de que o“socialismo do século XXI” não se baseiana classe trabalhadora, a classe que produztoda a riqueza social. As bases sociaisoriginárias do movimento chavista forame continuaram a ser as forças armadas, asquais se juntaram, posteriormente, ossetores mais poderosos da burocraciavenezuelana; ou seja, as bases sociais dochavismo residem no próprio aparato doEstado. Os trabalhadores respaldam ochavismo por causa das pequenasmelhorias (ainda que importantes) queobtiveram, mas são essencialmente umobjeto passivo, uma massa pronta a atendera seu governo, no “seguidismo” típico dochavismo. Não são os trabalhadores que

EXPEDIENTEEste jornal é editado mensalmente sob responsabilidade da coordenação do EspaçoSocialista. Os textos assinados não necessariamente expressam a opinião da organização.

Contatos: www.espacosocialista.org [email protected]

determinam os rumos do movimento, maso próprio Chávez e agora seus sucessoresé quem decidem tudo. Os trabalhadoresnão aparecem como sujeito socialautônomo, com organização nos locaisde trabalho, a partir de onde se possasocializar a produção, mas comomoradores dos bairros, cujo papel é elegercandidatos chavistas e pressionar porverbas do Estado. Contra isso afirmamosem alto e bom som: não existe socialismosem a classe trabalhadora autodeterminada!

Em terceiro lugar, o fato de que nãohá uma verdadeira democracia operáriana Venezuela chavista, mas a mesmademocracia burguesa de sempre. Cháveznão só manteve a estrutura do Estadoburguês como a usou para reprimir ostrabalhadores em diversas greves eprocessos de luta, prender dirigentessindicais, etc. As organizações dostrabalhadores foram forçadas a se dissolvere seus militantes a entrar no partidochavista, o PSUV, acatando o centralismoburocrático, o projeto eleitoral e abstendo-se de apresentar divergências. Aqueles quenão aceitassem seriam rotulados de “contrarevolucionários” e aliados da direita“esquálida” e do imperialismo.

Em quarto lugar, ainda que ochavismo tivesse avançado para um maiorcontrole estatal, o que nem sequeraconteceu numa escala significativa, osocialismo não é o mesmo que estatização,nem se limita a uma simples divisão darenda através do Estado. O socialismose define pela existência de organismosauto determinados dos trabalhadores,compostos por representantes eleitos pelabase em cada local de trabalho, commandatos revogáveis a qualquer tempo,responsáveis por gerir coletivamente aprodução, decidindo o que produzir,como produzir e em que quantidade,acabando com a separação alienada ehierárquica entre economia e política,entre os que decidem e os que executam,entre os que fazem trabalho braçal eintelectual. Tudo isso está ausente doprojeto chavista. Por ter mantido aspróprias características de sua origemmilitar, sua concepção de mundo éhierárquica e burocrática: cabe aopresidente decidir e ao povo obedecer.

NEM PRÓ IMPERIALISMO NEM PRÓCHAVISMO: POR UMA ALTERNATIVA

SOCIALISTA E OPERÁRIA!Em função dessas diferenças

gritantes entre o chavismo e o socialismo,muitos socialistas passaram a fazeroposição sistemática a Chávez. Nessaoposição, entretanto, várias correntessocialistas foram longe demais, a pontode ultrapassar a barreira de classe.Passaram a defender bandeiras epalavras de ordem idênticos ao dosopositores burgueses, participando demanifestações lado a lado com os“esquálidos”. O exemplo mais claro desseerro foi o do PSTU no Brasil, que aderiuà campanha do “Não” no referendoconstitucional sobre reeleição em 2009,apoiando as manifestações dosestudantes “esquálidos” por democracia.

De outro lado, por conta do cercoglobal do imperial ismo contra ochavismo e seus derivados, muitascorrentes socialistas adotaram a posturade apoio (às vezes, crítico) a Chavéz.Com isso, levam em consideração asrealizações do chavismo, os programassociais, etc., e desconhecem seus limites,que descaracterizam qualquer pretensãode socialismo (manutenção docapitalismo, do Estado, da propriedadeprivada, centralização burocrática, etc.).Ainda assim, essas correntes se colocamcomo parte do campo chavista,priorizando a defesa da “revoluçãobolivariana”, em re lação aodesenvolvimento de organizaçõesautônomas dos trabalhadores. O exemplodessa postura no Brasil é o do PCB ecorrentes próximas.

Essas duas posições cometem o errode perder a referência de classe. Ochavismo não é um movimento desuperação radical da miséria da classetrabalhadora e não serve como caminhopara o socialismo. Ainda assim, aVenezuela e outros países em que seestabeleceram governos nacionalistasburgueses no século XXI se tornaramalvos preferenciais do imperialismo edevem ser defendidos contra qualquertentativa de golpe ou de intervenção.Mas os trabalhadores devem se manterindependentes desses governos, pois docontrário serão as maiores vítimasquando são derrubados, seja pela viaeleitoral ou pela força, como aconteceucom Lugo no Paraguai, que foi

derrubado sem esboçar qualquer reação.Esses governos são incapazes de reagir,como foi demonstrado várias vezes nahistória, e o chavismo o demonstroumais uma vez, pois seus dirigentes sãoincapazes de romper com a barreira declasse, com a propriedade privada e oEstado. Essa l ição é crucial nummomento histórico em que o capitalismoatravessa uma de suas mais violentascrises e a luta de classes tende a ficarmais aguda e transparente. Apesar de nossolidarizar com o sofrimento por quepassa o povo venezuelano, somos todoschamados a reaf irmar que só asuperação do capitalismo pode pôr fima todas as mazelas que acometem aVenezuela. Esta superação, porém, sópode se dar por uma autêntica revoluçãosocialista, revolução esta para a qual sefaz necessário o desenvolvimento deorganismos de luta da classe trabalhadoraarmados com um programa de rupturacom o capitalismo, completamenteindependentes de correntes pequeno-burguesas, nacionalistas e burocráticas.Nesse sentido, a oposição que fazemosao chavismo não se estende às lutas dopovo venezuelano; pelo contrário, noscolocamos prontamente emsolidariedade às suas lutas contra aburguesia e contra os interesses doimperialismo.

“Se fosse necessário dar umadefinição o mais breve possível doimperialismo, dever-se-ia dizer que oimperialismo é a fase monopolista docapitalismo. Essa definiçãocompreenderia o principal, pois, por umlado, o capital financeiro é o capitalbancário de alguns grandes bancosmonopolistas fundido com o capital dasassociações monopolistas de industriais,e, por outro lado, a partilha do mundoé a transição da política colonial que seestende sem obstáculos às regiões aindanão apropriadas por nenhuma potênciacapitalista para a política colonial deposse monopolista dos territórios doglobo já inteiramente repartido.” (Lênin,O Imperialismo, fase superior docapitalismo”)

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