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7/31/2019 Anseios Crpticos 2- Paulo Leminski
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Paulo Leminski
Anseios Crpticos2
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Copyright 2001 Paulo Leminsky
Todos os direitos desta edio reservados :
CRIAR EDIES LTDA.
Rua Jos de Mello Braga Jr., 279
81.540-280 Curitiba PR
Fone/Fax: (41) 362 0468 / 362 6756
homepage: www.sintomnizado.com.br/criaredicoes
e-mail: [email protected]
Capa: Nexo Design
Programao Visual: Criar Edies
Editorao: Jefferson Schnaider
Reviso: Iria Zanoni Gomes
Atendemos pelo reembolso postal
PROIBIDA A REPRODUO TOTAL OU PARCIAL DESTA OBRA, ATRAVS
DE QUALQUER MEIO, SEM AUTORIZAO DO EDITOR.
Impresso no Brasil
Printed in Brazil
2001
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OORREELLHHAASS DDOOLLIIVVRROO
Em 1986, a convite de Criar Edies, Paulo Leminski
organizou, em dois volumes, textos nos quais deixara fluir seu
talento de polemista-ensasta-demolidor-criador: seus anseios. O
resultado foram duas pastas abarrotadas com recortes de jornais,
cpias de posfcios e prefcios, e textos datilografados. O primeiro
volume Anseios Crpticos 1 / anseios tericosfoi editado em
1986. O segundo, os anseios prticos, deveria sair no ano
seguinte.
No entanto, s hoje chega aos leitores. Por um lado, osazares dos planos econmicos colocaram a Criar numa
quarentena da qual s retornou em outubro de 2000. Por outro,
em 1989, Paulo resolveu polemizar em outras dimenses. No
bastasse, os originais sumiram, resistindo a trs mudanas e, 15
anos depois, se materializaram no fundo de uma caixa na qual
deveriam estar apenas exemplares de antigos suplementos
literrios.
So estes os anseios/ensaios que publicamos agora.
Diferentemente dos que esto no primeiro volume, no qual
Leminski dizia ter reunido as noes tericas bsicas a partir
das quais pensava, estes, os prticos, esto voltados para a
anlise de obras e de autores.
Reunidos pela primeira vez em livro e na ordem queLeminski estabeleceu, discutem obras de Brecht, Rimbaud,
Haroldo de Campos, Sartre, Guimares Rosa, Euclides da Cunha,
Dante, Whitmann, Fante, Jarry, Ferlinghetti, John Lennon,
Mishima, Becket, Joyce, Petrnio.
Alguns so inditos, outros so inditos em livro, outros
foram publicados em jornais e revistas de circulao nacional
(Folha de S.Paulo, Leia Livros, Veja), e outros saram em jornais de
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tiragem restrita ao Paran (Gazeta do Povo, Correio de Notcias).
Em todos, a marca que fez de Leminski um polemista de talento,
colocando em questo as obviedades literrias do momento, do
que estamos todos muito carentes nos dias de hoje, quando opensamento nico nos provoca infindveis bocejos de tdio.
Outras obras da CRIAREDIES:
Crtica da Razo Tupiniquim, de Roberto Gomes
Mal Comportadas Lnguas, de Srio Possenti
Riachuelo, 266, de Carlos Dala Stella
Alma de Bicho, de Roberto Gomes
Nuvem Feliz, de Alice Ruiz
Paulo Leminski Filho nasceu em
Curitiba, em 24 de agosto de 1944. O
pai descendia de poloneses e, a me,
urea Pereira Mendes, de portugueses,
ndios e negros. Aos 8 anos, fez oprimeiro poema. Dos 12 aos 14 anos
permaneceu como oblato no Mosteiro
de So Bento/SP. Aos vinte anos j
participa de eventos relacionados
literatura. Iniciou duas faculdades direito e letras ,
abandonando ambas. Foi professor de cursinho, jornalista,
redator de publicidade, tradutor, compositor, letrista. Traduziu,
entre outros, Um atrapalho no trabalho, de John Lennon, Sol e ao,
de Mishima, e Satyricon, de Petronius. Foi parceiro de Moraes
Moreira, Itamar Assumpo, Arnaldo Antunes, Guilherme Arantes
e Ivo Rodrigues. Como compositor, teve canes gravadas por
Caetano Veloso e Ney Matogrosso, entre outros. Apresentou o
polmico Jornal de Vanguarda, na TV Bandeirantes, em 1988.
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Catatau (prosa experimental) foi publicado em 1975. Seus
poemas esto em vrios livros: Quarenta cliques, 1979, No fosse
isso e era menos/No fosse tanto e era quase, 1980, Polonaises,
1981, Caprichos e relaxos, 1983, Agora que so elas, 1984,Distrados venceremos, 1987, Guerra dentro da gente, 1988.
Faleceu em 7 de junho de 1989, aos 44 anos.
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sumriom, de memria
latim com gosto de vinho tinto
um texto bastardo
taiyo to tetsu: entre o gesto e o texto
lennon rindo
ferlinguete-se!
o uivo e o silncio
jarry, supermoderno
folhas de relva forever: a revelao permanente
mxico
sertes anti-euclidianos
trans/paralelas
significado do smbolo
o veneno das revistas da inveno
grande ser, to veredas
e o vento levou a divina comdia
poeta roqueiro
aventuras do ser no nada: quem tem nusea de Sartre?
tmidos e recatados
traduo dos ventos
prosa estelar
bonsai: niponizao e miniaturizao da poesia brasileira
histria mal contada
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m, de memria.
Os livros sabem de cor
milhares de poemas.
Que memria!
Lembrar, assim, vale a pena.
Vale a pena o desperdcio,
Ulisses voltou de Tria,
assim como Dante disse,
o cu no vale uma histria.
Um dia, o diabo veio
seduzir um doutor Fausto.
Byron era verdadeiro.
Fernando, pessoa, era falso.
Mallarm era to plido,
mais parecia uma pgina.
Rimbaud se mandou pra frica,
Hemingway de miragens.
Os livros sabem de tudo.
J sabem deste dilema.
S no sabem que, no fundo,ler no passa de uma lenda.
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latim com gostode vinho tinto
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as veias abertas da roma antiga
De C. Petrnio no h muito que dizer. Dormia o dia
inteiro e dedicava a noite para seus trabalhos e prazeres. Muitos
ficam famosos por seus empenhos (industria). Ele era famoso porsua preguia (ignavia). No era considerado um homem que corre
atrs do proveito, mas dos prazeres sutis (erudito luxu).Tudo que
dizia e fazia era descontrado e sem esforo, e sua simplicidade
cativava como uma gentileza. Mas soube ser enrgico quando no
servio pblico, primeiro como procnsul na sia, depois como
cnsul. A seguir, retirou-se para a vida privada e seus vcios
favoritos e, como tal, foi aceito no crculo mais ntimo do
imperador Nero, onde reinou como um verdadeiro rbitro da
elegncia (el egantiae arbiter). Nero nada fazia sem antes consultar
seu sofisticado corteso. Isso suscitou a inveja de Tigelino, outro
corteso, que contra Petrnio arma uma intriga, envolvendo seu
nome com conspiradores. Sabendo-se perdido, antes da ordem do
prncipe, Petrnio decide suicidar-se, abrindo as veias do brao.
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Um mdico grego abria-as, o sangue corria, e ele as fechava
depois. Voltava a abri-las, e as fechava, assim muitas vezes.
Enquanto isso, impvido, Petrnio no se entregava a conversas
sobre a imortalidade da alma. Na realidade, fazia versos lbricos efteis. E assim fazendo morreu, com a maior naturalidade. Nunca
lisonjeou os poderosos, nem o prprio Nero. Ao contrrio.
Escreveu uma narrativa onde descreve os excessos do imperador,
atribuindo-os a jovens depravados. E ao morrer enviou-lhe a
narrativa. Assim Tcito, o maior dos historiadores romanos,
descreveu, em seus Anais, a vida e o fim de Petrnio, e a gneses
do Satyricon.
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Poucos livros tm biografia to acidentada como este
Satyricon, o primeiro dos romances, a obra mais
escandalosamente original da literatura latina.
Oficialmente, consta como sendo o romance escrito porCaius Petronius dito Arbiter, corteso e ntimo do imperador Nero,
que este condenou ao suicdio, no ano de 65, por se achar
envolvido na conspirao da famlia dos Pises contra o louco
imperador poeta.
Mas na ficha do Satyricon, tudo so conjecturas e
hipteses que j produziram rios de tinta entre os sbios, do
Renascimento para c: o livro, alis, foi um dos primeiros textos
impressos; sua primeira edio, em Milo, de 1477.
O texto que hoje temos , certamente, parte de um texto
maior, que se perdeu nos azares da Histria, talvez um quinto
apenas do original (fragmentos dos captulos XV e XVI). Mesmo
assim, esse texto se sustenta como uma obra inteira.
A autoria tambm no segura.
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Toda a argumentao sobre a autoria se baseia num
clebre trecho do historiador romano Tcito, que viveu por volta de
120 da nossa era, cinqenta e cinco anos depois da morte de
Caius Petronius.Nele, Tcito fala do corteso voluptuoso que, condenado
ao suicdio por Nero, escreve ao morrer uma longa stira para
zombar do ridculo tirano.
Certas evidncias, porm, laboram contra a identificao
do Satyricon, que temos hoje, com essa stira do corteso de Nero.
Primeiro, porque no verossmil que um homem pouco
antes de morrer tenha foras para compor uma obra que, no