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Ao Rui e aos meus pais

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ii

Agradecimentos

Qualquer tese de mest rado envolve uma forte componente de colaboração ent re um grupo mais

ou menos alargado de pessoas. Esta const itui um exemplo em que a t roca de ideias e a

aprendizagem colaborat iva foi cont ínua e fundamental para o seu desenvolvimento.

Uma aprendizagem ‘ lida’ numa bibliograf ia diversif icada, mas também ‘ debat ida’ at ravés do

contacto pessoal e directo com pessoas que, de uma ou de out ra forma, apoiaram este t rabalho,

descrevendo experiências pessoais, dando conselhos, fazendo crít icas, sugerindo áreas de

invest igação, etc. A todos elas o meu sincero agradecimento.

Em especial, gostaria de expressar a minha sincera grat idão à Professora Doutora Isabel Breda

Vázquez, orientadora cient íf ica desta tese que lhe deve muita da sua paciência, aj uda e crít ica

const rut iva e um cont ributo determinante para ela se ter t ransformado num desafio agradável e

est imulante.

Destacar, ainda, o meu agradecimento à Secção de Planeamento do Território e Ambiente da

FEUP pelas instalações e recursos disponibilizadas, em part icular a aj uda incansável de Paula

Ramos e Manuel Guimarães.

Agradeço ainda o apoio e informação disponibilizada pela Fundação para o Desenvolvimento do

Vale de Campanhã e Porto 2001, S.A. e a todas os ent revistados no âmbito da análise dos estudos

de caso, cuj a disponibilidade foi fundamental para a realização do Capítulo 3.

Desej o ainda exprimir reconhecimento a todos os que me têm est imulado e aj udado no meu

percurso académico e prof issional, sendo j usto destacar o amigo Flávio Nunes por ser um

interlocutor sempre presente.

Por últ imo, mas em primeiro lugar, mencionar o apoio e incent ivo permanente e incondicional

dos meus pais ao longo de toda a minha vida.

Ao Rui, por ser essencial.

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Resumo

Esta tese aborda as questões do Planeamento Colaborat ivo, enquanto paradigma alternat ivo que

propõe uma reformulação da forma organizat iva e de funcionamento do planeamento territorial

dominante, sugerindo a const rução de redes de comunicação e cooperação horizontais ent re

diversos actores sociais - administ ração pública, sector privado e comunidade, de forma

individual ou organizada.

A primeira parte deste estudo é dedicada à ref lexão sobre as principais fragilidades do

Planeamento dominante, em especial no que diz respeito à part icipação pública. Reflecte-se

sobre a evolução do Planeamento à luz da emergência de novos problemas e das razões de ser da

sua limitada ef icácia, teórica e prát ica, para promover o bem estar da sociedade no seu

conj unto. Formula-se a hipótese de que, não obstante as suas limitações, o Planeamento

Colaborat ivo revela potencialidades que devem ser integradas, ainda que com os devidos

cuidados, no Planeamento Territorial e, em part icular, em est ratégias de Regeneração Urbana.

A segunda parte deste estudo procura analisar um conj unto vasto de ideias que esta “ nova

avenida de invest igação” tem movimentado e enquadrar as teorias da part icipação no

Planeamento Territorial. Releva a importância de uma correcta def inição dos níveis e est ratégias

de part icipação, dos st akeholders ou selecção de metodologias part icipatórias. No ponto

seguinte ref lecte-se sobre o direito à part icipação no sistema de planeamento português,

nomeadamente nas recentes inovações suscitadas pelos princípios e programas da União

Europeia e alterações int roduzidas ao nível legislat ivo.

O terceiro capítulo detém-se sobre a forma como foi integrada a component e da part icipação

em duas est ratégias de regeneração urbana no município do Porto. A requalif icação do Bairro do

Cerco integrada no Sub-Programa Urban para o Vale de Campanhã, e a requalif icação urbana e

revitalização económica para a Baixa Portuense inseridas no Programa Port o Capit al da Cult ura

2001.

Conclui-se que a qualidade da planif icação e condução de processos de part icipação, se

repercute no nível de confiança ent re as partes e condiciona a ef icácia da concepção e

implementação de est ratégias de planeamento

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Resumé

Cet te tèse aborde les quest ions de planif icat ion colaborat ive, comme paradigme alternat if qui

propose une reformulat ion de la forme organizat ive et du fonct ionnement de la planif icat ion

térritoriale dominante, suggérant la const ruct ion de réseaux de comunicat ion et de coopérat ions

horizontales ent re les divers acteurs sociaux - administ rat ion public, secteur privé et

comunauté, de forme individuel ou organizé.

La première part ie de cet essai est dedié à la ref lect ion sur les principales fragilités de la

Planif icat ion dominante, en rapport à la part icipat ion publique. Ça se ref lete sur l’ évolut ion de

la Planif icat ion, à la lumière de l’ émergence de nouveaux problèmes et des raisons de ça faute

d’ éf icacité, teórique et prat ique, pour promovoir le bien êt re de la société dans son ensemble.

L’ hypothèse formulé, non obstant ses limitat ions, la Planif icat ion Colaborat ive révele des

potencialités qui doivent êt re intégrés, même avec certaines précaut ions, dans la Planif icat ion

Térritoriale et , en part iculier, en st ratégies de Regénérat ion Urbaine.

La deuxième part ie de cet essai analyse un vaste ensemble d’ idées que cet te “ nouvelle avenue

d’ invest igat ion” mouvemente et encadre les téories de part icipat ion de la Planif icat ion

Térritoriale. On relève l’ importance d’ une correcte def init ion des nivaux et des st ratégies de

part icipat ion, des st akeholders ou select ion de metodologies part icipat ives. On réf léchie sur le

droit à la part icipat ion du système de planif icat ion portuguais, surtout dans les récentes

inovat ions suscité par les principaux programmes de l’ Union Européène et les mutat ions int roduit

au niveau de la législat ion.

Le t roisième chapit re se ret ient sur la forme comme a été intégré la composit ion de la

part icipat ion en deux st ratégies de regénérat ion urbaine du municipe de Porto. La

requalif icat ion du Quat ier du Cerco intégré dans le Sous-Programme Urbain pour le Vale de

Campanhã, et la requalif icat ion urbaine et revitalisat ion economique pour la Baixa Portuense

inserée dans le Programme Port o Capit ale de la Cult ure 2001.

On conclut que la qualité de la planif icat ion et la conduite de procès de part icipat ion, se

repercute au niveau de la confiance ent re les deux et condicionne l’ éf icacité de la concept ion

et de l’ implementat ion de st ratégies de planif icat ion.

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Abst ract

This thesis approaches the issues of Collaborat ive Planning, as alternat ive paradigm that

proposes a reformulat ion of the organizat ive form and funct ioning of the dominant territorial

planning, suggest ing the const ruct ion of horizontal communicat ion and cooperat ion networks

among several social actors – public magement , private sector and community, in an individual

or organized way.

The f irst part of this study is dedicated to the thought on the main fragilit ies of dominant

Planning, specially in what concerns the public part icipat ion. It becomes apparent on the

evolut ion of Planning, under the light of ever emerging problems and the reasons for it s limited

eff icacy, both in theory and pract ice, in order to promote well being for the society as a whole.

The surging hypothesis is one by which, notwithstanding its limitat ions, Collaborat ive Planning

reveals capabilit ies that should be incorporated, although with due caut ion, on the Territorial

Planning, even more so, specif ically in Urban Regenerat ion st rategies.

The second part of this study is meant to analyse a vast set of ideas that this ‘ new invest igat ion

avenue’ has been put t ing in mot ion, as well as posit ioning part icipat ing theories on the

framework of Territorial Planning. Reveals how important really are, a correct def init ion of

part icipat ing levels and st rategies, by stakeholders or part icipat ing methodologies select ion.

Under the following sect ion, some thought will be given to the wright to part icipate under the

Portuguese planning system, namely after the recent innovat ions brought by European Union’ s

principles and programs as well as due to the changes made at the law level.

The third chapter focuses on the way the part icipat ion component was integrated in two urban

regenerat ion st rategies in Porto municipalit y. The Bairro do Cerco renewal under the Urban sub-

program for Vale de Campanhã, as well as the urban renewal and economical revitalizat ion of

downtown Porto under the program Porto Capital da Cultura 2001.

The conclusion is that the quality of planning and conduct ing part icipat ion procedures, is

ref lected at the level of t rust amongst part ies and determines the ef icacy of creat ing and

implement ing of planning st rategies.

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Índice Geral

Agradecimentos ......................................................................................................................................... ii

Resumo .....................................................................................................................................................iii

Resumé ..................................................................................................................................................... iv

Abstract...................................................................................................................................................... v

Índice Geral .............................................................................................................................................. vi

Índice de Quadros ..................................................................................................................................... ix

Índice de Figuras........................................................................................................................................ x

Apresentação .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1

Capítulo 1 – Planeamento Colaborat ivo: Emergência e oportunidade num contexto de novos

problemas e desafios... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3

1.1 - Introdução.............................................................................................................................................. 3

1.2 - Os principais dilemas e críticas ao Planeamento Tradicional................................................................ 7

1.3 - Identificação das vantagens do Planeamento Colaborativo................................................................. 29

1.3.1 - A promoção da inclusão social e criação de capital social ........................................................... 30

1.3.2 - O incremento da confiança nos decisores e decisões ao longo do tempo..................................... 38

1.3.3 - A promoção de boas práticas de governação................................................................................ 45

1.4 - Identificação das limitações do Planeamento Colaborativo ................................................................ 56

1.4.1 - Limitações de planificação ........................................................................................................... 59

1.4.2 - Limitações processuais ................................................................................................................. 69

1.4.3 - Implementação das decisões......................................................................................................... 78

Capítulo 2 – Teorias da part icipação e sua implementação no sistema de planeamento

terr itor ial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81

2.1 - Introdução............................................................................................................................................ 81

2.2 - Análise conceptual. Níveis e tipos de participação pública................................................................. 83

2.3 - Poder e estratégias da Administração pública para a incursão da participação pública .................... 100

2.4 - Os representantes de interesses (stakeholders) .................................................................................. 112

2.5 - Metodologias de participação em contextos diversificados de Planeamento Territorial................... 120

2.5.1 - Metodologias e abordagens disponíveis ..................................................................................... 124

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2.5.2 - Comentário relativo à correcta selecção e uso de metodologias ................................................ 133

2.6 - Da teoria à prática do Planeamento Colaborativo em Portugal ......................................................... 135

2.6.1 - Influência das iniciativas e programas da UE para as práticas de planeamento ......................... 136

2.6.2 - O direito à participação no sistema de Planeamento Português: elaboração dos instrumentos de

gestão territorial e Avaliação de Impactos Ambientais.......................................................................... 142

Capítulo 3 – o processo de part icipação em duas est ratégias de regeneração urbana... . . . . . 152

3.1 - A pertinência dos estudos de caso no contexto e objectivos da tese. Opções metodológicas ........... 153

3.2 - Porto 2001 . a participação institucional entre diferentes níveis da administração pública e num

partenariado público/privado ..................................................................................................................... 161

3.2.1 - Antecedentes e definição do modelo institucional e programa de actividades da Porto Capital

Europeia da Cultura .............................................................................................................................. 162

3.2.2 – O objectivo da renovação urbana da Baixa do Porto................................................................. 172

3.2.3 – O objectivo Revitalização Económica do Comércio e Serviços da Baixa do Porto .................. 181

3.2.4 – Algumas conclusões sobre o processo de participação.............................................................. 194

3.3 – Requalificação do Bairro do Cerco . um exemplo de participação comunitária............................... 197

3.3.1 - Programa URBAN ..................................................................................................................... 201

3.3.2 - Sub-Programa Urban do Vale de Campanhã............................................................................. 205

3.3.3 - A Requalificação Urbana e Ambiental do Bairro do Cerco ....................................................... 210

3.3.4. – Análise dos resultados .............................................................................................................. 221

3.3.5 –Aprendizagens e lições para o futuro.......................................................................................... 223

Conclusões f inais ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 225

Anexos .... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 230

Anexo 1 - Alguns indicadores de democracia em Portugal – anos 80 /90................................................. 231

Anexo 2 – Orçamento Participativo de Porto Alegre ................................................................................ 232

Anexo 3 - O conhecimento popular e científico ........................................................................................ 235

Anexo 4 - Alguns factores explicativos da cultura de não participação em Portugal................................ 236

Anexo 5 – O direito à participação, na Constituição portuguesa............................................................... 237

Anexo 6 - O direito à informação e participação nos Planos Municipais de Ordenamento do Território

(Decreto-Lei 380/99) ................................................................................................................................. 239

Anexo 7 - Lista de documentos analisados................................................................................................ 240

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Anexo 8 - Lista de entrevista realizadas .................................................................................................... 242

Anexo 9 – A cronologia no acesso à informação na Porto 2001 ............................................................... 244

Anexo 10 – Reunião na Porto 2001 para a definição da estratégia de regeneração da Baixa ................... 245

Anexo 11 – Âmbito de investigação no estudo de caso ‘Porto 2001’ ....................................................... 247

Anexo 12 – URBCOM - Sistema de Incentivos a Projectos de Urbanismo Comercial............................. 248

Anexo 13 – Comunicado da Associação dos Comerciantes à Comunicação Social sobre os episódios

associados ao Programa de Revitalização Económica da Baixa................................................................ 250

Bibliografia ... . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 254

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ix

Índice de Quadros

Quadro 1-1: A transição do Plano-Produto para um Planeamento Processo..................................................... 8

Quadro 1-2: Elogios e críticas dos Projectos Urbanos .................................................................................... 18

Quadro 1-3: A transição de modelos de governância no Planeamento............................................................ 51

Quadro 1-4: Motivações para a participação ................................................................................................... 63

Quadro 1-5: Algumas mudanças, nas práticas e nas leis, exidas pelo Planeamento Colaborativo .................. 74

Quadro 2-1: Metodologias Unidireccionais................................................................................................... 127

Quadro 2.2 – Metodologias interactivas ........................................................................................................ 129

Quadro 2-3: Abordagens de Envolvimento ................................................................................................... 131

Quadro 3-1: Cronologia da constituição da Porto 2001 ................................................................................ 171

Quadro 3-2: Cronologia de decisões associadas ao programa de renovação urbana..................................... 177

Quadro 3-3: Cronologia do programa de revitalização do comercio e serviços da Baixa............................. 187

Quadro 3-4: Cronologia no relacionamento do partenariado ........................................................................ 188

Quadro 3-5: A mediatização da discordia na imprensa escrita ...................................................................... 192

Quadro 3-6: Cronologia dos principais marcos de assunção do Vale de Campanhã como área estratégica de

intervenção autárquica ........................................................................................................................... 206

Quadro 3-7: Resumo dos problemas e recursos / dinâmicas locais do Vale de Campanhã........................... 213

Quadro 3-8: Perfil sócio-económico dos moradores residentes no Bairro do Cerco..................................... 215

Quadro 3-10 : Fases da concepção estratégica e emplementação do Bairro do Cerco .................................. 217

Quadro 3-11: Os resultados das várias etapas na intervenção no Bairro do Cerco ....................................... 221

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Índice de Figuras

Figura 1-1: Desafios para as políticas de planeamento territorial................................................................... 53

Figura 1-2: Variáveis que influenciam os resultados da participação ............................................................ 61

Figura 1-3: Motivações para a participação.................................................................................................... 63

Figura 2-1: Parâmetros para avaliar a participação ........................................................................................ 86

Figura 2-2: Escada de Participação de Shelley Arnstein, 1969...................................................................... 89

Figura 2-3: Escada do Poder do Cidadão ....................................................................................................... 93

Figura 2-4: A complexidade na prática do Planeamento Urbano................................................................... 98

Figura 2-5: Os quatro domínios da prática social......................................................................................... 100

Figura 2-6: Funcionamento do sistema político ........................................................................................... 102

Figura 2-7: Tipos de estratégias de soluções de problemas.......................................................................... 109

Figura 3-1: A localização dos estudos de caso ............................................................................................. 153

Figura 3-2: Os estudos de caso ..................................................................................................................... 155

Figura 3-3: A Área de Intervenção da Porto 2001na Baixa Portuense......................................................... 173

Figura 3-4: Alguns episódios no relacionamento no partenariado para a revitalização económica da Baixa

............................................................................................................................................................... 193

Figura 3-6: Os objectivos do Sub-Programa Urban para o Vale de Campanhã ........................................... 211

Figura 3-5: Evolução dos custos associados à participação institucional dentro do partenariado criado para a

Revitalização Económica da Baixa........................................................................................................ 226

Figura 3-7: Tendências contraditórias .......................................................................................................... 228

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1

APRESENTAÇÃO

A emergência de novos problemas e desafios para o planeamento territorial, tem suscitado a

const rução de abordagens e metodologias alternat ivas que procuram ult rapassar a rigidez e

lacunas das formas de intervenção t radicionais. Nesta tese procura-se analisar o cont ributo das

abordagens part icipatórias ou colaborat ivas para a qualif icação e ef icácia de intervenções do

planeamento do território.

Para isso, o presente estudo encont ra-se dividido em t rês capítulos.

A primeira parte é dedicada à explicação dos novos contextos de problemas e desafios que têm

j ust if icado a emergência e oportunidade do Planeamento Colaborat ivo, pelo que se começa por

ter em atenção as principais crít icas e dilemas que se colocam ao Planeamento dominante e, em

seguida, as principais mais valias que podem ser promovidas por este paradigma. A saber, a

promoção da inclusão social e const rução de capital social, o incremento da confiança nos

decisores e decisões ou o desenvolvimento de boas prát icas de governação.

Para além do ‘ elogio’ às abordagens da colaboração e comunicação no Planeamento Territorial,

procede-se à ident if icação das suas principais limitações, ao nível da planif icação, do processo e

implementação, argumentando-se que da revisão dos seus ‘ prós e cont ras’ resulta a convicção

de que o saldo é posit ivo pelo que é fundamental uma viragem do planeamento para uma

recent ragem nas necessidades e aspirações ‘ das comunidades’ , o que deverá ser feito com

consciência das dif iculdades que podem emergir durante o processo.

Argumenta-se, portanto, que esta corrente de Planeamento, como out ras, integra virtudes e

limitações, mas que a crescente complexidade e fragmentação, inst itucional e social, dos

sistemas territoriais que são obj ecto do planeamento, j ust if icam uma crescente aposta nos

valores da colaboração, comunicação, humanização e democrat ização das prát icas de

planeamento, devendo não se excluir, à part ida, a ‘ utopia do consenso’ e da ‘ part ilha’ , possível

at ravés de um bom relacionamento social e inst itucional.

No sent ido de se apresentarem vias para a incursão das teorias colaborat ivas na prát ica do

planeamento territorial procede-se à invest igação das principais teorias da part icipação,

mediante uma ref lexão cent rada nas questões mais prát icas como os signif icados que o conceito

de part icipação sugere, a hierarquização dos vários níveis e parâmet ros de part icipação, a

análise à forma como a dist ribuição de poder na sociedade inf luencia os processos de decisão, a

def inição dos representantes de interesses para a part icipação em processos de decisão, etc.

Põe-se, ainda, em evidência a diversidade de metodologias de part icipação disponíveis,

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ident if icando-se as suas principais funções e alguns contextos em que j á foram aplicados

mediante uma revisão a experiências de planeamento colaborat ivo descritas na literatura. O

capítulo dois, cent rado nas questões mais processuais do Planeamento Colaborat ivo, f inaliza-se

com uma ref lexão à inf luência da pela União Europeia e recentes inovações da lei do

planeamento português no respeitante ao direito à part icipação dos cidadãos no processo de

decisão do planeamento territorial. Sustenta-se que, não obstante, a existência destas j anelas

de oportunidade, mantêm-se raros os exemplos de boas prát icas de planeamento colaborat ivo

em Portugal.

No capítulo t rês, confirma-se a suspeita deixada em aberto no capítulo dois. Com base na análise

e descrição de dois processos de part icipação em est ratégias de regeneração urbana, uma

focalizada no cent ro do Porto (‘ Baixa Portuense’ ) out ra na parte oriental da freguesia de

Campanhã (‘ Vale de Campanhã’ ), descrevem-se os principais episódios e metodologias ut il izadas

que permitem confirmar a inf luência do nível de sucessos de processos part icipatórios no nível

de sucesso das intervenções de planeamento territorial.

Tendo-se concluido que a qualidade da planif icação e condução de processos de part icipação, se

repercute no nível de confiança ent re as partes e condiciona a ef icácia da concepção e

implementação de est ratégias de planeamento

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CAPÍTULO 1 – PLANEAMENTO COLABORATIVO: EMERGÊNCIA E OPORTUNIDADE NUM

CONTEXTO DE NOVOS PROBLEMAS E DESAFIOS

1.1 - Int rodução

O Planeamento Territorial, tal como out ros campos disciplinares, tem evoluído ao longo do

tempo graças às mutações que vão ocorrendo no contexto socioeconómico e polít ico onde opera,

do qual está dependente e que, simultaneamente, inf luencia.

Ou sej a, um contexto de novos problemas e dilemas tem exigido o repensar das suas ideias e

prát icas, gerando um debate ininterrupto sobre os obj ect ivos e valores que incorpora, as

metodologias e papeis que at ribui a planeadores e cidadãos, sobre o modelo de organização do

território que melhor t raduz o interesse público, sobre as consequências das várias decisões e

metodologias de intervenção, etc.

Um debate bastante inf luenciado por um contexto de diálogo com out ras ciências sociais, pela

existência de diferentes formações académicas e princípios ideológicos nos prof issionais do

Planeamento Territorial e incitado pela gradual emancipação da população civil, à luz das

t ransformações económicas, sociais, e polít icas ocorridas nas últ imas décadas.

Gonçalves et al. (2000) refere que a “…emergência de um público reflexivo, atento aos dilemas decorrentes da

relação entre a ciência e as dinâmicas económicas e políticas e aos riscos gerados por aplicações tecnológicas,

tem sublinhado a necessidade de serem repensados os processos de decisão democrática quebrando o domínio

que sobre eles exerce o discurso dos técnicos e reduzindo a distância entre eles e o cidadão” (contracapa do livro

Cultura Científica e Participação pública, organizado Gonçalves et al., 2000).

Também Rosa Pires (1994) partilha desta opinião, afirmando que “o cidadão tende crescentemente a recusar um

papel passivo, de mero fornecedor de informação, para assumir uma postura de maior participação e afirmação,

ou seja, o papel de um consumidor que intervém directamente na definição dos contornos do “produto” urbano

que o sistema de planeamento procura definir” (Pires, 1994)

Um debate que muito embora evidencie sinais de internacionalização, facilitados pela

globalização informat iva do mundo actual que aproxima as ideias e o diálogo ent re

invest igadores de países diferentes, é enformado pelas característ icas part iculares do contexto

territorial onde é produzido

Pense-se, por exemplo, como terá de ser diferente o entendimento de “participação pública” para cidadãos que

vivem em países com profundas tradições democráticas (como o Reino Unido ou Suécia) relativamente a outros

residentes em países onde se tenha iniciado recentemente a transição de um regime autoritário e opressivo para

um sistema democrático. O exemplo desta situação pode ser a República Checa ou de outro país que tenha

resultado da desintegração política da Europa de Leste, mas também de outros países localizados noutros

continentes que tenham iniciado o período de transição, como por exemplo a África de Sul, após o fim do

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apartheid ou de países da América Latina recentemente democratizados. Em todos eles o contexto político

influenciou a percepção de Planeamento e da participação pública, como ilustra Maier (2001) referindo-se à

experiência da população Checa num contexto de cinco décadas de autoritarismo até finais dos anos 80:

“Planning was felt to have little importance among people who were accustomed to living under the whims of a

totalitarian regime. The real influence of ordinary citizens’ wills upon their own lives, rights, and status was so

insecure, very low value was placed on anything was beyond the realm of the immediate future. Day-to-day

gains became a dominant objective for most people, considering the high risk of any long-term effort or

investment” (Maier, 2001, p.708)

O debate sobre o Planeamento, por exemplo sobre o cont role e gestão da expansão urbana com

vista a minimizar externalidades negat ivas, promover a j ust iça social ou incrementar qualidade

vida urbana, ou de promover o emprego ou a sustentabilidade ambiental, muito embora sej a

condicionado pelas característ icas part iculares de cada Estado-Nação é cada vez mais permeável

à inf luência que as empresas t ransnacionais exercem sobre o território

Por este motivo e atendendo “à expansão do espaço económico e político das organizações trasnacionais e a

transnacionalização dos sistemas de produção, distribuição, comércio e consumo” que, segundo as Nações

Unidas, tem vindo a desmantelar o poder dos estados nações para gerir e intervir na sua economia, tem vindo a

ser realçado o papel crucial que pode e deve ser assumido pela sociedade civil, não para se substituir ao governo,

mas para assumir um papel de “shape and steers” (moldar e guiar) os temas públicos e a actuação de

funcionários públicos, monitorizando a implementação de políticas públicas de forma a estar assegurada uma

governância democrática, responsável, tr ansparente e inclusiva (United Nations, 2000). Uma actuação que

segundo a própria organização mundial é crucial para que o presságio de John Cavanagh (do Institute of Policy

Studies, dos EUA apresentado num Fórum sobre globalização em 1995) não se concretize, evitando-se, em pleno

século XXI “um brutal regresso ao século XIX do Capitalismo”, o que poderia resultar do facto do século XX ter

sido “um século forte na criação de direitos para as empresas globais, mas fraco nos direitos nacionais de

trabalho e ambiente ”. É no sentido de prevenir que tal aconteça, com consequências desastrosas para o ambiente

e coesão social, que as Nações Unidas têm afirmado que “a sociedade civil deverá reconstruir a sua

democracia nacionalmente, contr ibuindo para uma governância global internacional” (United Nations,

2000)

Ent re as necessidades locais e as oportunidades ou ameaças geradas por dinâmicas globais,

aprofunda-se a noção de incerteza na act ividade de planeamento, nomeadamente no que diz

respeito a um conj unto diversif icado de temas: sobre a forma de antecipar oportunidades

futuras, sobre como definir e concret izar metas de intervenção perante um Estado

economicamente debilitado e um sector privado que actua com vista a um lucro imediato, ou

sobre a forma de assegurar, simultaneamente, as necessidades e aspirações de est ratos sociais

com enormes privações económicas e de elites cuj as necessidades se cent ram em dimensões

mais imateriais da vida social, como a cultura ou o lazer.

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Dúvidas sobre o modelo de planeamento mais adequado para dar resposta às novas exigências de

pluralismo, democracia e coordenação, de uma mult iplicidade de escalas e agências de

Planeamento públicas e privadas que, frequentemente, evidenciam uma sobreposição de

competências, obj ectos ou obj ect ivos de intervenção. Dúvidas sobre que soluções propor para a

panóplia de problemát icas sociais emergentes, como as da exclusão social, segurança urbana, ou

a concorrência territorial a fundos governamentais ou europeus, ou na at racção de invest imentos

geradores de emprego.

Para Healey (1992), a resposta a esta questão passa pela concepção de um novo hardware de

Planeamento1, que crie um novo sistema organizat ivo e de prát icas (um novo sof t ware) que

possibilite ao Planeamento Territorial funcionar como uma “ empresa democrát ica e

comunicat iva” . Para tal, Healey (1992) propõe a criação de plataforma organizacional e técnica

baseada na const rução de redes de comunicação e cooperação ent re uma pluralidade de

sectores da sociedade (público, privado, mas, principalmente, comunidade), que permita a

const rução de diagnóst icos e est ratégias conj untas de acção, com vista à mediação dos diversos

interesses territoriais e prossecução de obj ect ivos da j ust iça e equidade social e como de

sustentabilidade ambiental.

Este capítulo cent ra-se exactamente nestas questões.

Em concreto, desenvolve-se uma revisão aos argumentos dos próprios const rutores teóricos desta

corrente (alternat iva) de Planeamento2, no sent ido de ident if icar e ref lect ir sobre algumas das

suas principais virtualidades que poderão j ust if icar uma adopção mais generalizada pelo Sistema

de Planeamento Português, ao que se segue uma confrontação com um conj unto de alegadas

limitações, teóricas e metodológicas, que têm vindo a ser desenvolvidas por um grupo de crít icos

da fundamentação teórica e viabilidade prát ica deste paradigma.

A revisão a este debate sobre os prós e os cont ras da emersão de um novo paradigma, de raiz

social e ant ropocênt rica, que tem evidenciado uma grande riqueza ref lexiva durante os últ imos

anos3, será antecedido pela ref lexão de alguns dos principais dilemas e fragilidades do

Planeamento Tradicional e das correntes que foram emergindo durante as últ imas décadas do

século XX.

1 por hardware refere-se, por exemplo, à estrutura legal de Planeamento que define o padrão organizacional e institucional dos vários níveis de planeamento, num determinado tempo e espaço

2 Cuja designação parece ainda não ter estabilizado, à volta de denominações como �Planeamento Colaborativo�, �Planeamento Comunicativo�, �da Participação�, etc.

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Refira-se, para f inalizar, que este capítulo não procura fazer uma espistemologia do

Planeamento contemporâneo, porque se reconhece a dif iculdade deste desafio e a variabilidade

da evolução cronológica dos acontecimentos de país para país (em função das suas

part icularidades internas - est rutura governamental e legal, contexto e evolução sócio-

económica, sistema e t radição de planeamento, …,), mas aprofundar em Portugal um debate

que a nível internacional se mantém em cont ínua ebulição de ideias.

3 Como facilmente se constata da análise aos artigos publicados, durante os últimos anos, em algumas das mais prestigiadas revistas de planeamento internacional, como a Urban Studies, Town Planning Review , Journal of the American Planning Association, Environment and Planning ou Les Annales de la Recherche Urbaine e que são mencionados na Bibliografia

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1.2 - Os principais dilemas e crít icas ao Planeamento Tradicional

Na primeira parte deste capítulo desenvolve-se uma análise crít ica às principais fragilidades do

Planeamento dominante, em especial no que diz directamente respeito à part icipação pública.

Nesse sent ido, ref lecte-se sobre a evolução paradigmát ica do Planeamento à luz da emergência

de novos problemas e das razões de ser da sua limitada ef icácia, teórica e prát ica, para

promover o bem estar da sociedade no seu conj unto.

Conclui-se que após a crise económica e de legit imidade do Planeamento dos anos 70, os

teóricos viriam a propor novos obj ect ivos e formas de intervenção territorial que, muito embora

revelassem diversidade, evidenciavam também, em comum, uma crescente sensibilidade para as

questões sociais e da legit imação da intervenção pública, o que, durante a década de 90,

haveria de j ust if icar a emersão de alguns arquipélagos de “ boas prát icas” de planeamento e uma

nova proposta teórica e metodológica, mais cent rada em valores humanistas e nas necessidades

e aspirações dos dest inatários das intervenções, visando um desenvolvimento territorial mais

sustentado .

O Planeamento, tal como out ras ciências, const itui um corpo de conhecimentos teóricos e

prát icos que supõe métodos e obj ect ivos de estudo próprios que se foram alterando ao longo do

tempo por um processo de auto-ref lexão interna ou de “ importação teórica e metodológica” 4, o

que tem gerado uma alternância de paradigmas5 que divergem sobre o que deve ser a prát ica do

planeamento ou em que metodologias esta deve assentar.

Sem procurar fazer a revisão deste debate, o que de resto não seria possível no espaço que lhe é

dedicado nesta dissertação, argumenta-se que a grande t ransição no Planeamento Territorial

(conforme é exposto no Quadro 1-1) ocorreu durante os anos 70, bastante inf luenciada por um

contexto de crise económica mundial e de incerteza associada a fenómenos de globalização e

desregulação mundial, que determinaram a t ransição da predominância dos planos f ísicos de

organização territorial para a criação de inst rumentos de Planeamento mais operat ivos que

permit iram um processo de decisão e de intervenção mais part ilhado, numa primeira fase só

pelo sector público e sector privado, mas, mais recentemente, também inclusivo da sociedade

civil.

4 nomeadamente em países com uma menor tradição e debate em planeamento Territorial, como é o caso de Portugal, onde, no entanto, se tem verificado que a adopção de modelos de actuação produzidos no exterior se confronta com estrangulamentos de ordem diversa, como o enquadramento legal vigente, a tipologia de competências evidenciadas pelos planeadores, um défice de debate interno, uma estrutura hierárquica administrativa que procura a manutenção e estabilidade dos procedimentos anteriores, etc. Acrescente-se em abono da verdade que esta condição de receptáculo de teorias e experiências práticas produzidas no exterior, tem, vindo a ser alterada, graças a uma maior produção científica nacional na área do Planeamento Territorial, como pela pressão exercida pelos meios de comunicação social a um debate mais intenso das agendas políticas, que são frequentemente dominadas pelas questões do Planeamento (�)

5 O paradigma representa uma matriz organizacional de uma ciência. Um conjunto de princípios, teorias, estratégias e metodologias para abordar a complexidade do real.

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Quadro 1-1: A t ransição do Plano-Produto para um Planeamento Processo

2ª G.M até anos 70

Período de regulação, do Urbanismo Moderno baseado na Carta de Atenas e simbolizado por Courbusier .O planeamento Territorial privilegia uma intervenção física (emanada da arquitectura e engenharia e interpretada pelo urbanismo) que se resume à produção de documentos com o obj ect ivo de apoiar a capacidade de invest imento público e regular a t ransformação do território pelo sector privado e comunidade. O plano não considera situações alternat ivas nem uma f lexibilidade e adaptação durante o processo de implementação. As dinâmicas territoriais são desvalorizadas bem como o factor “ incerteza” .

Pós 1970

Giddens fala do paradigma da sobremodernidade, Morin no da complexidade ou pós-modernidade…

A Globalização das formas de produção, comercialização e dist ribuição, inf luencia os contextos de mudança que se tornam mais rápidos. A internacionalização das redes de comunicação e t ransportes, facilita o processo de fragmentação da sociedade, economia e planeamento (planeadores que t rabalham simultaneamente na esfera pública e privada, decisões públicas tomadas por organismos públicos ou privados (com capitais exclusivamente ou parcialmente públicos ou privados…)Assume-se a noção de incerteza

At ravés de soluções completamente desenhadas (por exemplo zonamentos de uso do solo, dist ribuição de infra-est ruturas e equipamentos, …) que requerem um elevado grau de cont rolo, desenvolvem-se padrões de dist ribuição assentes na racionalidade dos decisores

Encara-se a sociedade como um todo, o que permite ident if icar um alegado interesse público.

Com base nas teses funcionalistas para a organização das act ividades no espaço, a racionalidade dos decisores é predominantemente dedut iva: parte de ideias e princípios de actuação deduzindo, a part ir daí, a forma e os meios, que se baseiam pouco na análise empírica e nos contextos e dinâmicas territoriais

Há um elevado cent ralismo no sistema de decisão e cont rolo e, frequentemente a encomenda dos planos a equipas exteriores às inst ituições planeadoras que não irão implementá-lo

Desvalorizam-se as questões sobre o conteúdo e processo do Planeamento

Valoriza-se a compreensão dos aspectos processuais, funcionais e organizacionais do território. O Planeamento deixa de ser exclusivamente f ísico para passar a ser também social e económico. Ao nível dos inst rumentos de Planeamento, valoriza-se a preparação de polít icas, est ratégias e programas em vez de planos. Valorização dos aspectos processuais e substant ivos do planeamento. Valorização das questões da organização e gestão dos processos. Assume-se que face a uma mult iplicidade de variáveis é dif ícil a previsão. Assume-se um maior pragmat ismo com a const rução de alternat ivas para est imar evoluções futuras, valorização dos processos e meios e face à forma e f ins, menor abst racção teórica e maior consideração da análise empírica. O processo de decisão e cont rolo é concebido de forma cíclica e interact iva, passando a estar mais descent ralizado, o que reforça o poder local e a possibilidade de uma maior coordenação horizontal e de negociação com o sector privado, mais recentemente também comunidades. Começa a exist ir uma visão pluralista do interesse comum

A propósito da diversif icação de “ teorias” no Planeamento, Lynch (1981), refere que se deve

dist inguir ent re a teoria do Planeamento e a teoria no Planeamento, ou sej a, as teorias relat ivas

ao processo de planeamento, nomeadamente os valores que incorpora, os princípios e obj ect ivos

que ident if ica,…, em det rimento das teorias substant ivas sobre as temát icas abordadas no

planeamento (sobre a cidade, t ransportes, habitação,…).

Por seu lado, Cardoso (1987) propõe dicotomias analít icas ent re Teoria Posit iva, referente aos

factos versus Teoria Normat iva respeitante aos valores e ent re Teoria Processual , relat iva ao

processo versus Teoria Subst ant iva relat iva aos conteúdos6. Muito embora considere

fundamental a consciência destas dist inções, este autor salienta a dif iculdade prát ica em

6 questão claramente evidenciada no Capítulo 3, onde com base na descrição do processo de planeamento associados aos dois estudos de caso se evidencia a importância não só do debate dos conteúdos mais específicos ou substantivos da disciplina (relativos, por exemplo, à mobilidade, habitação, etc.), mas também sobre a forma como os assuntos são discutidos e o processo que leva à definição dos problemas e das estratégias de intervenção.

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mapif icá-las, mencionando, a t ítulo de exemplo, a dif iculdade de diferenciar um “ facto” de um

“ valor” .

Esta dif iculdade, associada à t radicional tendência para a desvalorização das questões

processuais face às substant ivas, que tem determinado a dominância dos conteúdos técnicos dos

programas de formação específ ica dos planeadores, em det rimento do desenvolvimento de

competências mais processuais (relacionadas com a gestão de conflitos, mediação de interesses

ou comunicação com grupos diversif icados) tem impedido uma clarif icação do “ behind t he

scenes” das diversas formas de poder que inf luenciam as decisões no planeamento.

Olhar para det rás dos cenários, ou das arenas em que são tomadas as decisão relat ivas ao

Planeamento Territorial é uma preocupação fundamental para Healey (1997a) que considera que

o Planeamento não é uma act ividade neut ral nem inocent e, mas que integra uma componente

profundamente polít ica e valorat iva, frequentemente inf luenciada pelos poderes de

determinados grupos que procuram moldar a agenda pública (por exemplo dist ribuição de

subsídios, cont ratação de serviços, etc.) consoante os seus interesses privados (Healey, 1997a,

p.85)

Referindo-se à origem das forças de poder que inf luenciam as decisões do Planeamento

Territorial, Hhakee (1997b) refere que, para além do Governo, existem fontes de inf luência

diversif icadas com est ratégias mais ou menos visíveis socialmente: “ These sources include

pressure groups, lobbyist s, mass media, and so on. The role of t hese groups may be eit her

visible or obscured and t hey make use of bot h formal and informal arenas” (Hhakee, 1997b,

p.256)

Este mesmo autor refere que as “ agendas polít ica” , def inidas como “ a set of subst ant ive issues

t hat planning t r ies do t ackle or resolve” (Khakee, 1997b, p.255), resultam da compilação de um

conj unto de preocupações gerais de planeadores e decisores polít icos, mas também de

considerações mais pragmát icas como a oportunidade de at racção de fundos que inf luenciam, a

j usante, a própria agenda planeamento territorial, const ituída por um processo desprovido de

sistemat icidade e incremental7, que suscita o conj unto de questões procedimentais levantadas

por Khakee (1997), nomeadamente:

How do issues come onto a planning agenda? Why do some issues receive serious attention in the planing

process and others do not? How do planners and decision-makers narrow their choices from a large set of issues?

How and why do planning agendas change over time? (…) (Khakee, 1997b, p.255),

No fundo, questões que se associam a um elevado nível de discrecionaridade do processo de

decisão, bastante inf luenciada, especialmente desde os anos 70, por uma grande permeabilidade

às questões económicas, polít icas e, mais recentemente, sociais

7 A este propósito ver Cardoso (1987)

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Yiftachel e Huxley (2000) analisando a diversidade de correntes de Planeamento nas últ imas

décadas, observam que a teorização no Planeamento ocorreu frequentemente fora das fronteiras

inst itucionalizadas da disciplina do planeamento (em campos teóricos próximos da geograf ia,

economia, ciência polít ica, estudos de raça e género, …), o que os levou a concluir, que existe

uma definição conceptual de “ teoria do Planeamento” que é arbit rária e, em certa medida, vai

correspondendo ao t rabalho de invest igação realizado pelos auto-proclamados teoristas deste

campo disciplinar (Yif tachel e Huxley, 2000, p.907) Mas também, naturalmente, à concepção

que se vai const ruindo dos obj ect ivos da act ividade do Planeamento e das próprias funções do

território…

Hobbs (1996) defende que as diferenças de paradigmas ao longo do tempo decorrem de um

conj unto de factores combinados que, em cada período histórico, vão produzindo característ icas

dist intas de Planeamento. Valorizando, em especial, a inf luência das circunstâncias materiais

nas quais o Planeamento é levado a intervir8 e a abordagem dominante em cada uma delas,

Hobbs (1996) conclui que nos últ imos cinquenta anos se desenvolveram quat ro t ipologias de

Planeamento diferentes no Reino Unido. A saber, a de arqui t ect ura/design, dominante no f inal

da década de 40, numa altura em que a abordagem do Planeamento se cent ra nos aspectos

f ísicos e técnicos do cont rolo t erri t orial ; a segunda, desenvolvida nas décadas de 50 e 60,

dominada pelas quest ões ambient ais; a terceira, durante os f inais dos anos 60 e início dos

anos 70, correspondente a uma abordagem de Planeamento est rat égica e funcional e,

f inalmente, a abordagem empreendedora baseada em parcerias de intervenção ent re a

administ ração pública e sector privado que caracterizaram os anos 80.

Nestas t ipologias de Hobbs, observa-se, de resto, uma forte inf luência de alguns campos

disciplinares na formatação do que deve ser o Planeamento Territorial, por exemplo nas

propostas de uma vertente de intervenção mais f ísica, da engenharia ou arquitectura, na

inf luência de uma vertente mais funcional da economia ou geograf ia, ou de uma componente de

maior sensibilidade ambiental das ciências da Terra, como a Ecologia ou Biologia.

Acrescente-se que, muito embora este autor não ref ira a dimensão social, parece-me que esta

tem sido a últ ima tendência das polít icas de intervenção públicas britânica, nomeadamente das

est ratégias de regeneração urbana que têm procurado reverter o declínio est rutural e ciclo de

pobreza de algumas áreas onde se concent ram grandes bolsas de pobreza, desemprego ou

formas de tensão urbana, questão que será recuperada mais à frente

Interessa, de resto, sublinhar que todas estas vertentes de Planeamento são, como propõe Rosa

Pires (1995), “ ideias socialmente const ruídas9” , resultantes de um debate e negociação sobre a

8 por outras palavras o contexto das pressões económicas que prevaleceram no período da emersão de cada paradigma

9 �o aparecimento, ascensão e esbatimento da importância de conceitos e ideias, bem como a sua eventual difusão pela generalidade dos agentes sociais não surge do nada nem se afirma no vazio� (Rosa Pires, 1995)

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melhor forma de intervir face ao conj unto de problemát icas territoriais existentes em cada

momento histórico e território específ ico

Por exemplo no período pós IIª guerra mundial, num contexto de expansão económica e urbana,

os inst rumentos de planeamento t raduziam-se essencialmente em planos de ordenamento com

vista a regular o crescimento urbano (Sousa Lobo, 1997). As intervenções dos governos da Europa

Ocidental faziam-se, quase exclusivamente, numa lógica de acção assistencialista própria do

Estado Providência, at ravés de planos de grandes invest imentos públicos tais como rede viária,

infra-est ruturas, habitação, emprego, serviços de apoio às famílias, etc., que, na Europa

afectada pela Guerra procuravam coordenar as aj udas económicas internacionais. Era um

período dominado pela componente f ísica do planeamento, que se caracterizava pelas

metodologias do urbanismo e desenho urbano na gestão e uso do solo e por uma fort íssima

intervenção polít ica, que cont ribuía para a reconst rução física e económica e para elevar o

moral do pós-guerra (Hobbs, 1996).

Hall (1992) que associa as origens do moderno Planeamento Regional e Urbano à necessidade de

dar resposta aos problemas suscitados pela Revolução Indust rial de f inais do séc. XVIII,

reconhece que o Planeamento de meados do século XX visava também minimizar os impactos da

indust rialização, mas principalmente os fenómenos da difusão urbana10.

O obj ect ivo principal do Planeamento é o de providenciar uma est rutura espacial das act ividades

e dos usos do solo sendo para tal criados modelos que apresentavam, mediante a representação

gráf ica do Plano e escrita de Regulamentos, uma visão ideal de futuro.

Tais inst rumentos, ut il izados dominantemente até aos anos setenta, são crit icados por Busquets

(1995) por assumirem uma at itude funcionalista e rígida: “ …eram planos de correcção f ísica,

com vist a a uma dist r ibuição ópt ima de pessoas, bens e serviços,…, al icerçavam-se num

zonament o que privi legiava a at ribuição de um espaço próprio a cada t ipo de função

est abelecida e possuíam uma inst rument ação confusa que dif icul t ava a gest ão da cidade”

(Busquet s, 1995, p.11).

Muito embora os Planos Directores fossem importantes para a criação de um planeamento global

de infra-est ruturas de importância est ratégica (est radas, aeroportos, espaços verdes, etc.),

mediante uma visão de mais longo alcance do que o raciocínio de curto prazo da sociedade e

10 A preocupação com o fenómeno de difusão urbana é evidente nas temáticas dominantes da altura: estudo do processo de expansão urbana, sentidos de estruturação, compreensão do processo de descentralização. A própria criação da actividade de Planeamento Territorial parece ter resultado da necessidade de dar resposta à organização física da cidade: controlar expansão urbana, construção de infra-estruturas de transporte, solucionar os problemas da degradação da vida urbana e resultantes actividade industrial, como poluição, barulho, etc.

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polít icos, estes associavam-se a alguns problemas, associados ao facto de serem vagos, muito

abst ractos ou se basearem em teses funcionalistas, o que dif icultava a sua gestão

“the central point, though, is that this type of planning is still essentially spatial – whatever the scale and

whatever the sequence. It is concerned with the spacial impact of many different kinds of problems and with the

spatial impact of many different kinds of problems and with the spatial coordination of many different policies”

(Hall, 1992, p.4)

A cidade “como uma colecção de funções”, em que “cada função urbana se organizava independentemente

procurando organizar as suas condições de funcionamento” (Luz Pereira, 1984), gerava problemas como o

aumento de movimentos pendulares urbanos, com as decorrentes consequências ambientais e para a qualidade de

vida da população, a especulação imobiliária que, nalgumas áreas, gerava gradativamente a extinção de algumas

funções fundamentais para o equilíbrio do sistema (por ex. A residencial das áreas centrais, que beneficiavam de

uma maior acessibilidade), etc.

Para além destas consequências, Healey (1990) considera que estes modelos desorganizavam as

relações sociais e aspectos qualitat ivos de salvaguarda do ambiente, agravando a assimet rias

ent re as diferentes regiões. Para além destes aspectos da salvaguarda ambiental e coesão

territorial, Nunes (1999) ident if ica ainda out ros equívocos como a convicção de que cont rolando

as t ipologias territoriais se cont rolariam as forças socio-económicas que as t ransformam; o de

pressupor que os diversos agentes individuais e inst itucionais estariam dispostos a obedecer às

normas estabelecidas ou o de desenvolver uma abordagem demasiado rígida perante os

imponderáveis do processo de desenvolvimento.

Para além destes aspectos, eram crit icadas as formas de decisão e gestão burocrát icas e

cent ralizadas, a tendência para a const rução de um quadro conceptual bastante intelectualizado

e distanciado da linguagem e compreensão da maior parte dos cidadãos11, o que, segundo

Klosterman (1985) favorecia a reprodução das desigualdades sociais

“Just as markets are dominated by gigantic national and multinational conglomerates, the political arena is

dominated by individuals and groups who use their access to government officials and other elites to protect their

status, privilege and wealth and ensure that government acts in their interest… (…)“The result is an “exploitation

of the great by the small” in which small groups with narrow, well defined interests – such as doctors and

lawyers – can organize more effectively to achieve their objectives than larger groups – such as consumers – who

shared more broadly defined interests” (Klosterman, 1985)

Não obstante um aprofundamento da conj untura de desacreditação do Planeamento, em que se

começa a defender uma maior descent ralização da decisão e aproximação e adequação aos reais

interesses da sociedade, o período de posit ivismo da ciência moderna inf luencia os planeadores

11 a quem lhes restava interpretar o sucesso ou insucesso das intervenções de Planeamento pela sua prática quotidiana, no respeitante às qualidades sensoriais do lugar que eram avaliadas �através da vista, ouvido, olfacto e tacto�, relativamente a aspectos como o barulho, o cheiro ou a impressão visual que dele emana�Esta componente sensorial e relativa à avaliação do espaço, fundamental para Lynch (1982) e para outros autores que mais tarde viriam a defender um enfoque mais antropocêntrico do Planeamento eram praticamente ignorados pela visão e intervenção física do Planeamento do pós-guerra, cujo enfoque era primordialmente económico e funcional

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que, part icularmente em contextos de ref lexão académica12, procuram uma adaptação dos

conceitos, inst rumentos e técnicas das “ ditas” ciências exactas ao Planeamento.

Com base nos princípios económicos de minimização de custos e maximização de benefícios, são

criados modelos matemát icos que procuravam na abst racção da complexidade do real a

dist ribuição dos usos do solo13 (indust rial, comercial) ou a compreensão matemát ica do real que

procurava ser cont rolada at ravés de previsões f iáveis

O mundo muda constantemente de forma que os Planeadores não conseguem prever… Segundo Hall (1988) o

erro do Planeamento pode ocorrer em vários sentidos: em relação ao meio externo às decisões de Planeamento

que se desenvolve rapidamente com resultados imprevisíveis e, internamente, o Plano pode estar errado por causa

da complexidade das inter-relações dos diferentes níveis do sistema de Planeamento e dos diferentes actores

neste campo.

Ainda segundo Hall (1988), o mundo que o Planeamento Urbano e Regional procura controlar é muito maior e

mais rico em conteúdo do que a pequena parte da realidade representada por qualquer modelo. Reduzir a

realidade a termos esquemáticos, por meio de um modelo é necessariamente mais difícil e o erro seguramente

maior

Ignorava-se o facto de que a sociedade modif ica o seu comportamento em função do

conhecimento que sobre eles adquire, de que os fenómenos territoriais são historicamente

condicionados e socialmente determinados e de que a sua complexidade só é parcialmente

dissecada por indicadores e inst rumentos estat íst icos. O determinismo destes modelos

confrontava-se também com realidades imprevistas

“The cities produced by positive models,…, were of neat, regular, homogenous zones. Their very poor

approximation to reality was the source of much of the criticism directed at these models and reflected the overly

simplistic assumptions upon which they were based and the important factors and motivations they ignored.

Their failure to recognize and account for the idiosyncratic and subjective values that motivated much human

behavior was critiqued by behavioral and humanistic approaches placed the question of the complexity of human

motivation at the center of their inquiry” (Hall, 1998, p.21)

Distante do senso comum e do próprio contexto complexo e part icular onde as decisões humanas

t inham lugar, observava-se uma autonomização do Planeamento face a out ras ciências e uma

especialização interna por áreas temát icas (t ransportes, habitação, comércio,…), o que ia, cada

vez mais, fragmentando a teoria e prát ica de Planeamento público, ele próprio j á integrado num

sistema de administ ração pública bastante espart ilhado por sectores de intervenção (educação,

habitação, economia…)

12 face ao desenvolvimento da estatística e informática, que vieram permitir a manipulação de uma elevada quantidade de dados e com grande rapidez

13 por exemplo os modelos de Burguess, Hoyt, referidos por Hall, Tim (1998) ou o de Christaller que haveriam de influenciar a investigação em Portugal

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Assim, em vez do ideal de uma visão e prát ica de Planeamento holíst ico e pró-act ivo de longo

prazo, os planeadores eram crit icados por terem um papel react ivo e fragmentário.

Este reducionismo na análise da complexidade do real é, aliás, uma das principais crít icas de

Morin (1994) à ciência moderna, postulando, por isso, o “ princípio da complexidade” mediante

numa nova relação de comunicação inter e t ransdisciplinar e uma at itude de ref lexão que

permita uma reavaliação das “ verdades inquest ionáveis” .

“…o encarar da prática científica segundo este princípio de complexidade traz ainda uma vantagem que é de

importância fundamental: é que nesta relação comunicativa e interactiva, o desenvolvimento do pensamento

científico é chamado a reflectir sobre si mesmo, ganhando a dimensão crítica da reflexividade e abrindo à

consciência dos princípios ocultos que comandam as suas próprias elucidações e relativamente às quais não deve

permanecer em tal estado de cegueira” (Morin, 1994, p.217)

O Planeamento não passou à margem deste período de quest ionamento social, cont ribuindo, ele

próprio, para o debate teórico que reequacionava as metodologias, obj ect ivos e resultados da

invest igação/ acção da ciência moderna. De facto, no interior desta comunidade cient íf ica,

alguns planeadores começavam a quest ionar e reformular o paradigma “ tecnocrát ico”

argumentando que este subalternizava os cidadãos face à técnica e interesses dominantes, o que

dissimulava as tensões territoriais e impedia a sua mediação

Rosa Pires (1995) com base em estudos académicos realizados durante os anos 70, ident if ica

alguns dos aspectos que permit iram o que ele designa por “ período de desmit if icação da

act ividade do planeamento” ou de “ revolta do cliente” . A saber, a consciência de alguns efeitos

perversos das propostas do Planeamento (por exemplo a criação a adaptação da cidade ao

automóvel ou a lógica de const rução de habitação social, . . ,), a noção de que o interesse público

não é algo de cient if icamente ident if icável, mas o resultado de “ uma const rução social” face à

diversidade de interesses que caracteriza o sistema social e de que o planeamento não é uma

act ividade “ neut ral” , mas evidencia uma est reita ligação ou até dependência com as dinâmicas

de mercado e com o quadro polít ico envolvente; a ausência de rigor cient íf ico na sustentação de

muitas propostas de planeamento, nomeadamente devido à ausência de informação detalhada e

actualizada, o que se associava a níveis de incerteza elevados; a elaboração de (fúteis)

j ust if icações de cariz técnico-cient íf ico progressivamente mais sof ist icadas mas também mais

esotéricas e distanciadas da realidade; a falta de poder da act ividade do planeamento ou de

desresponsabilização ao at ribuir ao sistema democrát ico a decisão últ ima sobre as opções a

tomar (Rosa Pires, 1995, 28-30)

Esta e out ras crít icas, associadas a um contexto de uma forte crise económica e social mundial

dos anos 70, que se iria agudizar em 1973/ 74, geravam diversos movimentos sociais que, de

comum, t inham a forte crít ica ao Estado Social e à act ividade de Planeamento

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Aumenta o protesto contra as condições de trabalho e de vida nas cidades, que alegadamente se tinham

convertido em simples espaços para a reprodução da força de trabalho, os movimentos ecologistas alertavam para

a deterioração da vida urbana e, no geral, da Biosfera, decorrente do modelo de acumulação capitalista, etc.

(Adaptado, Capel, 1981, p.406), em que o desemprego era crescente e escassos os recursos financeiros do Estado

É neste contexto de insat isfação crescente ent re a cidade que se desej a e a cidade que se

vivência e de divórcio ent re as necessidades da população e act ividade da acção governat iva e

do Planeamento que alguns autores recuperam as teses liberais de Adam Smith, defendendo a

promoção da liberdade de escolha e de acção das forças de mercado.

Segundo Sousa Santos (1994) “a representação democrática perdeu o contacto com os anseios e as necessidades

da população representada e fez-se refém dos interesses corporativos poderosos. Com isto, os cidadãos alhearam-

se da representação…” (Sousa Santos, 1994, p.215) neste contexto estavam criadas as condições para a emersão

das teorias económicas liberalizantes

É, pois, nesta conj untura de crises, de credibilidade do Planeamento e económica, a nível

mundial e f iscal dos Estados “ providência” , que se postula uma redução da regulação e

intervenção pública. Mesmo nos países com maior t radição em Planeamento contesta-se a

necessidade da intervenção do Estado, pelo menos nos moldes clássicos, e sugere-se uma

alteração de princípios ideológicos e de inst rumentos de Planeamento para a intervenção e

gestão do sistema urbano

“Recent events in Great Britain, the United States, and other Western societies indicate that planning’s status is

again being questioned and that the “great debate” had never really ended. National planning efforts have been

abandoned in Britain and the United States; and the public agenda in both countries now focuses on deregulation,

privatization, urban enterprise zones, and a host of other proposals for severely restricting government’s role in

economic affairs. Planning is increasingly attacked in the popular press, academic literature, and addresses to

Parliament and Congress…” (Klosterman, 1985, p.5)

“The crises in production, rising unemployment and generalised depression, which have occurred intermittently

since the mid-1970’s and changes in the 1980’s, have introduce a considerable amount of uncertainty in the

economic, political and social domains” (Khakee, 1997b, p.258)

Face a esta noção de incerteza, facilitada pela globalização económica, os defensores das teses

neo-liberais enfat izam o papel do sector privado e as virtualidades da privat ização de serviços

públicos, para a localização dos recursos e actuação de uma forma mais ef iciente do que

burocrát ico e “ pesado” sistema do Estado.

Defendem um planeamento mais f lexível e “ processual” , capaz de se adaptar a novos contextos

de mudança (oportunidades…), at ravés de est ratégias que mobilizem actores e recursos,

mediante uma gest ão-act iva sobre o processo, com maiores níveis de adaptabilidade e agilidade

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face aos imponderáveis do futuro que permit isse a int rodução de aj ustamentos, por exemplo, ao

longo do período de implementação e da própria mudança das necessidades sociais, à medida

que se alteram as condições reais à part ida, por exemplo, as “ constantes e inevitáveis”

alterações associadas à volat il idade dos recursos ou às oportunidades imprevisíveis de se criarem

parcerias (Nunes, 1999)

É neste contexto de “ reconst rução do Planeamento” (Rosa Pires, 1995, p.31) que nas últ imos

t rês décadas do século XX se irá desenvolver o que Campbell e Fainstein (1996) designam por

“ diversi f icação” de paradigmas” ou Healey (1997b) int itula por “ novas direcções do

Planeamento” .

Por exemplo no campo económico a act ividade do Planeamento deixa de se relacionar com a

orientação dos grandes invest imentos públicos e passa a preocupar-se com minimizar as falhas

do mercado ou apoiar as tendências do sector privado. Acomodando-se às ideias neo-liberais que

defendem a privat ização da intervenção pública e de desregulação dos mercados, rest ringe-se o

papel do governo a uma iniciat iva ent repreneurial (Healey, 1997a, p.14) em vez de reguladora,

com repercussões sociais e ambientais que haveriam de exigir o recuo destas ideias e a

concepção de um planeamento para um desenvolvimento mais equilibrado e de concertação que

haveria de ser designado por de Planeamento Est ratégico.

A própria vertente da intervenção física do Planeamento modif icava-se. Afastava-se de uma

concepção do zonamento e regulação do edif icado, portanto do cont rolo da forma da cidade,

para assumir, sob uma forte inf luência de arquitectos, a est ratégias da renovação urbana at ravés

da intervenção por Proj ectos Urbanos.

“this meant that public sector became more interested in enabling rather than providing it directly and in

stimulating development rather than regulating it”. (Healey et al., 1997b, p.12)

Para Sousa Lobo (1997) foi um período em que a recessão económica se associou à descentralização de

competências e à emersão de uma filosofia de contratualização que visava a repartição de competências (e de

custos) pelas várias entidades envolvidas

Esta nova f ilosof ia urbaníst ica de intervenção por grandes Proj ectos Urbanos14, por vezes

integrava-se numa est ratégia de planeamento mais geral, mas, a maior parte das vezes, como

refere Healey (1997b), ignorava-a, ult raj ava-a ou interpunham-se no seu caminho, o que gerava

uma certa inversão do processo de decisão, passando a tomar-se decisões do part icular para o

global

14 são projectos operativos que desenham de novo a forma urbana (procurando a integração de diversas funções, infra-estrutura e edificação), no sentido de criar num grande sector de cidade uma grande capacidade indutiva e catalisadora de recursos. A intervenção por projectos urbanos visa primordialmente a manipulação da forma urbana, através de grandes

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Um exemplo a este propósito foi, no caso concreto de Lisboa, o Plano Director Municipal e o Planeamento

Estratégico em curso no início dos anos 90, ter definido para a frente ribeirinha onde se viria a localizar a EXPO

uma Plataforma Logística para a Área Metropolitana de Lisboa (atendendo à sua equidistância ao Porto de

Lisboa, Aeroporto e ligações rodo e ferroviárias - A1, Montijo, Chelas...), que, na altura, foi considerada como

uma infra-estrutura fundamental naquele local, para assegurar a manutenção da competitividade económica da

AML, mas que viria a ser ignorada pela decisão política e intuitiva (uma vez que não pressupôs estudos prévios)

da EXPO para aquele local..

Observa-se, portanto, uma passagem gradual da dominância dos planos de est rutura, ou de t ipo

similar, para os proj ectos urbanos, o que é o mesmo que dizer, do planeamento de regulação

para um de negociação com o sector privado, que encoraj ava a criação de partenariados

baseados preponderantemente em interesses económicos e de t ransformação territorial, que

foram especialmente evidentes em países como a Inglaterra e França durante os anos 8015

“A recrudescência do liberalismo no domínio do urbanismo está perfeitamente simbolizada pelas reformas e pela

política conduzida pelo governo de Mrs. Thatcher, a partir do início dos anos 80… (…) Ao pôr em causa uma

tradição muito forte de town-planing, as reformas do governo conservador britânico promoveram uma concepção

de market led planning: é o mercado que escolhe, que decide o crescimento, as mutações urbanas; e os poderes

públicos seguem-no, ajudam-no, apoiam as suas escolhas, corrigindo eventualmente também os seus excessos e

completando as suas insuficiências…16” (Ascher, 1998, 139)

Ascher referindo-se às críticas ao zonamento e à emergência da vaga liberal no planeamento urbano em países

como a França refere que nos anos 80 os planos tornaram-se obsoletos e que eram entendidos como “pesadas

carcaças, susceptíveis de refrear as suas iniciativas de atracção dos criadores de emprego e dos investidores

imobiliários e de um custo eleitoral sem qualquer relação com as necessidades de uma regulação colectiva. A isto

juntava-se uma crise do financiamento público, que, em qualquer dos casos, fazia depender muito muito

largamente a realidade e a eficácia das escolhas públicas da possibilidade de lhes associar ‘parceiros privados’ e,

por isso, de lógicas bastante distintas daquelas que tinham informado a elaboração dos anteriores documentos de

urbanismo” (Ascher, 1998, p.140)

Progressivamente ia diminuindo a dualidade entre os sectores público e privado, através de uma privatização de

serviços sociais que eram antes públicos, ou da con(fusão) que Campbell e Fainstein (1996) observam entre

público e privado, nomeadamente face a planeadores que exerciam funções simultaneamente no sector público e

privado, questionando sobre quais seriam os seus clientes ou se eles também se tinham privatizado. Brownill e

Florio (2000), contestam, por exemplo, o processo de criação de entidades privadas autónomas, não eleitas

democraticamente, que gerem capitais públicos como as Urban Development Corporations

�peças desenhadas�: parques urbanos, temáticos, ..Defende-se um planeamento por projectos em vez de um planeamento através de planos

15 Na Europa do Sul a abordagem era orientada por Projectos Urbanos para a promoção do desenvolvimento territorial é mais recente tendo-se iniciado nos anos noventa. Em Portugal, iniciou-se com a Expo-98 e viria a ter continuidade em projectos como a operação de renovação urbana inserido no Programa �Porto 2001, Capital Europeia da Cultura� ou mediante a criação do Programa POLIS.

16 um exemplo paradigmático de uma destas operação é a intervenção nas Docklands em Londres cuja avaliação se tem associado a inúmeras controvérsias

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No entanto, forma de intervenção que emergiu nos anos 80 e se tem mant ido bastante presente

nas intervenções urbanas da Europa Ocidental até aos nossos dias, tem sido alvo de out ras

crít icas, mas também elogios. A saber:

Quadro 1-2: Elogios e crít icas dos Proj ectos Urbanos

Elogios Crít icas

Ult rapassam o relat ivo impasse dos planos municipais e polít icas estatais (Busquets, 1995 )

O “ out of dat e” do planeamento Tradicional (Healey, 1997b)

Ult rapassarem regulações e est ratégias em curso sem uma devida ref lexão prévia.

Não atendem aos novos valores e preocupações da sociedade, nomeadamente as questões ambientais e sociais

Permitem uma intervenção pro-act iva que não se limita a uma mera função de “ comando e cont rolo” e permite a implementação de proj ectos que consubstanciam o market ing t errit orial , incrementando a sua capacidade para at rair, reter e potencializar recursos económicos, fundamentais para o bem-estar da sociedade.

Segundo Healey (1997b) crít icas recentes a esta corrente de Planeamento referem que ela negligencia que o conhecimento deve ser obt ido at ravés de um processo de debate democrát ico que inclua as diferentes partes interessadas.

É de facto paradigmát ico o desinteresse desta corrente de Planeamento relat ivamente às questões de part icipação pública.

A intervenção por Proj ectos Urbanos cont ribui para uma renovação urbana sem precedentes e para a própria renovação inst rumental da Planeamento, que passa a acompanhar melhor as dinâmicas territoriais em curso (Busquets, 1995)

Permitem ult rapassar os est rangulamentos t radi-cionais do Planeamento Normat ivo, nomeadamente a segregação ent re os sectores público e privado na actuação urbana (at ravés de parcerias com vista à sua concepção e implementação), bem como a carga burocrát ica e administ rat iva que bloqueia a criação de dinâmicas territoriais posit ivas, por parte do estado (criação de emprego, renovação urbana, etc.)

Muitos destes proj ectos de urbanismo associaram-se a respostas ad hoc sem capacidade est ratégica (sem visão integrada e abrangente) e a inúmeros problemas e crít icas sociais, nomeadamente incerteza no mercado de propriedade (os proprietários que não eram favorecidos por estes proj ectos, queixavam-se de t ratamento inj usto pelo estado), dúvida, por parte de grupos ambientais e comunitários, relat ivamente aos obj ect ivos de planeadores e polít icos face a estes proj ectos urbanos, nomeadamente devido à falta de rigor orçamental e de t ransparência de procedimentos.

Out ras crít icas associaram-se às questões de especulação fundiária suscitados por estes proj ectos, bem como à deslocação dos problemas sociais para out ras áreas sem a resolução das suas causas, etc.

Para Pereira (1984) esta redução da intervenção estatal servia para “ acomodar e facilitar as

exigências de mercado, mantendo o st at us quo e os privilégios da classe de poder” , o que

aumentava a polarização social.

Para Sousa Santos (1997) o período de desregulação dos anos 70, haveria de most rar as suas

consequências nos anos 80, que foi segundo este sociólogo “ uma década para esquecer” face ao

agravamento das desigualdades sociais e incremento de um processo de exclusão social no

interior dos países cent rais, que ele designa por “ criação do t erceiro mundo int erior” (Sousa

Santos, 1997, p.19). Para além destas consequências sociais em período de ressaca neo-liberal,

Busquets (1995) refere out ras como a degradação da própria imagem da cidade, a não

salvaguarda de valores pat rimoniais e ambientais ou o desequilíbrio da rede viária, de

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t ransportes, de equipamentos, com evidentes consequências económico-territoriais. Por estes

mot ivos Busquets (1995) repudia as “ improcedent es y sin sent ido” at itudes de desregulação do

sistema que, segundo ele, se concret izam em prát icas urbaníst icas de laissez-faire alicerçada

em polít icas casuíst icas e negociações arbit rárias.

Todas estas questões suscitavam um intenso debate sobre o conflito latente ent re as decisões do

Planeamento e os valores da vida humana.

A este propósito Capel (1981), citando Rodovan Richta, refere que o que realmente se questiona nos anos 70 e 80

é o “modo inteiro pelo que o sistema da ciência se aproxima ao mundo e ao homem, é a habilidade deste sistema

para fazer frente às necessidades reais do desenvolvimento social da população e da formação prospectiva da sua

vida social” (Capel, 1981, p.407),

A crise urbana generalizada deste período, relacionada com diversos problemas sociais e de

funcionamento da cidade: desemprego, afastamento do local de t rabalho/ residência, escassez

de áreas verdes, aumento poluição atmosférica e t ráfego automóvel, etc. que não t inham

correspondência com as expectat ivas de desenvolvimento humano da sociedade e que eram

interpretadas como o resultado da acção de planeadores e administ radores públicos ao serviço

de interesses económico privados, pela incapacidade da act ividade do planeamento enformar e

orientar a acção governat iva, o que punha em causa a própria relevância social do Planeamento

e a capacidade de comunicação ent re as diversas esferas de decisão e invest igação da

sociedade.

Ao Planeamento, colocavam-se concretamente as questão complexas de:

1. como est ruturar a vida pública a part ir de uma sociedade pluralista e com a inexistência de

um interesse público cient if icamente ident if icável

“in the welfarist model, the public sector itself was expected to undertake, manage and regulate development in

line with a generalized and unitary conception of the public interest” (Healey, 1997b)

2. de como lidar com um elevado défice de autonomia face a esferas de decisão mais vastas,

como a económica ou polít ica, que condicionam os limites em que o próprio Planeamento

pode operar, passava-se, simultaneamente, a tomar-se consciência da natureza

eminentemente ideológica do Planeamento, enquanto processo de const rução cient íf ica;

Campbell e Fainstein (1996) a este propósito, colocam, por exemplo, a Teoria do Planeamento entre o campo da

economia política e da história das ideias, uma vez que, segundo estes autores, ambos influenciam a imaginação

colectiva, as possibilidades e limitações do planeamento e a identidade profissional dos planeadores

3. de como lidar com a crescente complexidade dos sistemas urbanos, onde se agudizavam

problemas económicos, sociais e ambientais.

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No domínio das polít icas urbanas, por exemplo, e em part icular ao nível de est ratégias de

regeneração urbana, as soluções eram incapazes de resolver os problemas. Vázquez et al.

(2000), analisando as intervenções desenvolvidas neste domínio nos países da Europa Ocidental e

durante as décadas de setenta e oitenta, referem que estas polít icas, promovidas “ com o

obj ect ivo de invert er ciclos de perda de dinamismo e at é de exclusão de det erminadas part es de

cidade relat ivament e ao rest o da mesma” , se pautaram “ por abordagens fort ement e sect oriais,

embora, nalguns casos t enha havido uma preocupação em operar uma art iculação ou

combinação de âmbit os de acção” . Apesar desta preocupação e segundo os mesmos autores, “ os

resul t ados obt idos com est e t ipo de int ervenção foram, de uma forma geral , l imit ados,

part icularment e pelo fact o das mesmas não se encont rarem inseridas em est rat égias urbanas

mais vast as. Não se conseguiu produzir dinamismos signif icat ivos no que respeit a a formas de

parcerias públ ico-privado, nem suscit ar uma ampla part icipação da sociedade ou das

comunidades int eressadas” (Vázquez et al. , 2000: 9)

A análise feita por estes autores aborda as limitações das polít icas públicas nomeadamente por

negligenciarem as dimensões sociais e económica dos problemas e por intervirem sectorialmente

sobre problemas abrangentes e complexos incapazes de gerarem dinâmicas mais sustentáveis nos

territórios em crise.

Estas e out ras crít icas, suscitavam cont ínuos debates sobre os obj ect ivos, as f inalidades, sobre a

razão de ser do Planeamento.

Relativamente à primeira questão, Hall (1992) refere que o objectivo básico do Planeamento não é bem

entendido porque, na realidade, há provavelmente dezenas (segundo ele, uma lista que nunca mais acaba…) de

objectivos associados a esta actividade (sendo, alguns deles, de difícil compatibilidade ou mesmo contraditórios).

Refere, também, que muitos dos processos que o Planeamento visa controlar são processos humanos e que estes

não são tão bem percebidos como as leis das ciências físicas, pelo que devem ser estudados com o contributo das

ciências sociais (Hall, 1992, p.9)

Assim, segundo Hall (1992), a complexidade do processo de Planeamento decorre do seu carácter,

simultaneamente, multidisciplinar e multi-objectivos, o que explica o processo de contínuo debate através do

qual se procura, continuamente, reequacionar a distância entre o que é e o que deve ser o Planeamento.

Uma incerteza que é recorrente no Planeamento Territorial e relat iva a aspectos diversif icados:

a compreensão dos processos territoriais e tendências em curso, a ident if icação dos

dest inatários e obj ect ivos de intervenção, a selecção das metodologias a promover ou a

intervenção com vista à sat isfação de um proclamado “ interesse comum” , …, que, como alguns

autores têm argumentado, não é mais do que uma pluralidade, frequentemente cont raditória,

de interesses (Brownill e Darke, 1998; Maiden, 1999)

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“O planeamiento institucionalizado defendía intereses supuestamente comunes, y desde luego su práctica era

como mínimo manifiestamente antidemocrática. Las comisiones de urbanistas estaban lejos de representar los

intereses de una sociedad ad plural. Además se ponía en duda que un urbanismo excesivamente polarizado por la

realidad física de la ciudad fuera capaz de responder de su complejidad social” (Caz et al., 1999, p.410)

Conforme se ia tendo uma consciência mais nít ida das principais fragilidades do Planeamento,

out ros autores preocupavam-se em explorar os principais argumentos que legit imavam e

fundamentavam esta act ividade pública. A este propósito Campbell e Fainstein (1996) j ust if icam

a relevância do Planeamento em alterar o curso existente dos eventos pela necessidade de se

minimizarem as externalidades negat ivas suscitadas pelo mercado livre não intervencionado e de

se procurar uma maior racionalidade na organização ambiental e sócio-económica do território.

A mesma opinião é part ilhada por Klosterman (1985) que, avaliando os argumentos polít icos e

económicos a favor e cont ra o planeamento, salienta a necessidade da intervenção

governamental para se diminuírem as falhas do sistema do mercado livre, ident if icando

concretamente quat ro grandes t ipologias de funções do Planeamento.

1. A primeira, seria a de providenciar a informação necessária para o mercado e o próprio

estado poderem enformar as suas tomadas de decisão, at ravés de um Planeamento

Indicat ivo que desenvolvesse um sistema de informação sobre vários domínios

(demográf ico, económico, de uso do solo, etc.) e que permit isse elaborar proj ecções a

longo prazo.

2. A segunda função, at ravés do desenvolvimento de um Planeamento Económico e Ambiental,

seria a de providenciar à população bens públ icos fundamentais para a colect ividade (como

espaços verdes urbanos, infra-est ruturas de saneamento básico, de t ransportes, etc.),

cont rolando, simultaneamente, as externalidades negat ivas que resultam das decisões

individuais de produção ou consumo destes bens e que não são contabilizadas pelos custos

de mercado (por exemplo, poluição do ar, congest ionamentos de t ráfego, abandono de

fogos em áreas urbanas, etc.).

3. Ao Planeamento deveria caber, ainda, a tarefa de promover o maior número de

externalidades posit ivas, isto é, de ganhos para os privados e colect ividade at ravés de uma

coordenação integrada dos diferentes agentes envolvidos na intervenção de um

determinado território.

4. Finalmente, caberia ainda aos planeadores, desenvolver várias formas de Planeamento

Social, de forma a compensar as desigualdades da dist ribuição de bens e serviços básicos e

essenciais para a sociedade, como os de saúde, educação, habitação,….

Não obstante a ident if icação de todos estes argumentos a favor do Planeamento, Klosterman

reconhece serem j ust if icações só parcialmente suf icientes para determinarem a existência de

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uma act ividade de Planeamento autónoma, uma vez que todas estas funções, da

responsabilidade do governo, poderiam ser realizadas por governantes não planeadores

(Klosterman, 1985). Esta opinião começa, aliás, a ser progressivamente part ilhada por alguns

sectores da sociedade que tomam consciência das diferenças ent re as decisões planeadas e

executadas e da sua escassa relevância para os seus problemas quot idianos e começam a exigir a

sua part icipação nas decisões que os afectam

A exigência de uma maior adequação do planeamento às dinâmicas em curso e aos vários

interesses territoriais, at ravés de uma mediação e concertação de interesses ent re actores para

a criação de uma est ratégia colect iva, suscita a emersão de uma importante t raj ectória de

invest igação da década de 90: o Planeamento Est ratégico, que envolveu a ref lexão e aplicação

de um quadro teórico inovador, oriundo da gestão e planeamento empresarial que viria a

permit ir o reforço da ef icácia da act ividade de Planeamento Territorial.

O contexto em que emergiu e os mot ivos porque foi idealizado, foram o da globalização

económica mundial e de escassez de recursos, decorrente quer da crise f iscal do Estado

Providência quer da alteração do sistema de produção mundial, que determinaram fortemente a

natureza e f inalidades deste paradigma, preocupado em maximizar o desempenho económico

dos territórios para at rair, reter e potenciar recursos escassos que os capacitava para um cenário

de compet it ividade acrescida.

Healey (1997b) assinala três mudanças fundamentais para a emersão do Planeamento Estratégico dos anos 80:

1. A reestruturação económica de muitas regiões urbanas, através de novas formas de produção, bem como

uma expansão e diversificação do sector dos serviços a gerarem pressões nas regiões urbanas, que leva a

comunidade política a promover as economias urbanas de forma pró-activa;

2. A combinação do stress fiscal do sector público e a onda das filosofias neo-liberais que geraram um novo

relacionamento entre sectores público e privado;

3. A crescente influência política dos movimentos ambientais e de todo um conjunto de lobbies que focaram

de forma significativa a atenção política nos impactos de projectos no ambiente local

Em alguns países, por exemplo no Reino Unido, observou-se, no entanto, uma alteração da

t raj ectória de evolução dos propósitos iniciais desta corrente. Aos obj ect ivos de natureza

exclusivamente económica, que geravam perspect ivas simplistas e redutoras, ao nível do

envolvimento de actores e do próprio diagnóst ico e const rução da est ratégia17, seguiu-se uma

17 gerando o desenvolvimento de procedimentos de parceria, contratualização e negociação com um leque restrito de actores, predominantemente do sector económico privado, e que sublinhavam aspectos como a eficiência e rendibilidade das intervenções públicas ou da competitividade territorial, em detrimento de questões mais directamente ligadas ao quotidiano das populações

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abordagem mais abrangente, caracterizada por uma maior relevância das preocupações sociais e

metodologias de part icipação cívica.

referindo-se à natureza do Planeamento Estratégico, Healey et al. (1997b) referem: “entendemo-lo como um

processo social através do qual um conjunto de pessoas em diversas relações institucionais e posições se juntam

para desenhar um processo de planeamento e desenvolvimento de conteúdos e estratégias para a gestão da

mudança espacial. Este processo gera não só resultados formais em termos de propostas de políticas e projectos,

como um quadro de decisões que pode influenciar relevantemente as partes no seu futuro investimento e

actividade de regulação. Pode gerar ainda formas de entendimento, de construção de acordos, de organização e

mobilização..

Passou, portanto, a outorga-se uma importância acrescida ao envolvimento de um leque mais

alargado de agentes, no sent ido de se estabelecer, conj untamente, parcerias que criassem

sinergias locais. Do ponto de vista metodológico ident if icam-se, hierarquizam-se e programam-se

colect ivamente obj ect ivos e est ratégias de intervenção que visam concent rar recursos

económicos e t runfos territoriais limitados em aspectos crít icos ou oportunidades suscitadas por

dinâmicas externas.

Conforme assinala Healey (1997b), o Planeamento Est ratégico abandona a intenção de comandar

o território de uma forma sectorializada e autoritária, procurando com base no diálogo com os

actores locais (sociedade civil e sector empresarial), um quadro de referência prospect ivo e

global18 que permita um processo de tomada de decisões operat ivas, sem contudo as

predeterminar de forma total e antecipadamente.

“Trata-se de juntar numa base territorial relações que foram separadas em muitos casos por distinções funcionais,

por sectores (por ex. económico, educação, habitação, saúde…) com vista à identificação de quais os pontos

estratégicos comuns e construir na capacidade institucional essa ligação” (Patsy Healey, 1997b)

Emerge, portanto, um paradigma que defende explicitamente o enfoque est ratégico numa

planif icação “ processo” que deve ser capaz de se adaptar, at ravés de uma regulação variável

mas com critérios de t ransparência, a situações de futuro incerto ou de dúvida quanto à melhor

solução, mas sendo capaz de proteger ou conservar os bens públicos (pat rimoniais,

ambientais,…) que permitam a sustentabilidade dos ecossistemas (naturais e art if iciais) e a

qualidade de vida da população.

“O transporte de algumas decisões que supostamente deveriam ser tomadas no Plano para a gestão é inevitável

para que o comprometimento se faça ao longo do processo de Planeamento. Com esta alteração de “tempos”

passa, mais facilmente, a ser possível usufruir da vantagem de se tomarem decisões mais acertadas, uma vez que

estas tenderão progressivamente a transitar para o momento em que o maior número de dados disponíveis sobre a

evolução de determinada conjuntura e/ou pelo facto da gestão (dada a sua vertente negocial) envolver a discussão

18 Não só inter-sectorial como de coordenação entre todos os níveis de administração pública

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com os promotores das iniciativas”(Nunes, 1999, p.12) Valoriza-se, portanto a gestão-activa do Planeamento, a

ideia de Planeamento “processo”, em detrimento do conceito Planeamento “produto”.

Em síntese, com vista a aumentar a coerência do processo de tomada de decisões, evitando

custos desnecessários e garant indo a ef icácia da coordenação de recursos públicos, o

Planeamento passa a assumir um carácter mais interact ivo e negocial, procurando const ruir

plataformas act ivas de colaboração que permitam uma f ilosof ia de intervenção urbaníst ica

est ratégica. Valorizam-se portanto, também, factores mais intangíveis como a aposta na criação

de capital inst itucional, de criação de pactos territoriais com vista a obj ect ivos part ilhados, etc.

Para além da const rução teórica da abordagem est rat égica, a crise do Planeamento associada às

preocupações de alguns teóricos pelo aprofundamento das desigualdades na sociedade, suscitou

a emergência de um paradigma crít ico do reducionismo do raciocínio técnico compreensivo,

nomeadamente na interpretação simplista de “ interesse público” e apologista de um

Planeamento const ruída pelos diversos representantes dos interesses sociais do território.

Out ros teóricos mais radicais chegavam mesmo a defender uma concepção de planeamento,

defensora dos mais indigentes da sociedade.

Tal sensibilidade aos problemas sociais, bastante inf luenciada pelos estudos de alguns teóricos

marxistas que cent ravam a sua análise nas consequências sociais e ambientais de est ratégias de

desenvolvimento cent radas nas prioridades do sector privado, part ia da ref lexão sobre as

cont radições existentes ent re o caráct er social do t erri t ório e o seu cont rolo pela propriedade

privada ou ent re a resist ência do sect or privado à int rusão governament al e à exigência de que

este socializasse o cont rolo do território de forma a criar condições para o funcionamento do

modelo de acumulação capitalista, propunham uma reformulação da natureza e metodologias do

Planeamento Territorial.

Bastante influenciadas pelo desenvolvimento da ciência social francesa durante os anos 60, notabilizada por

nomes como o filósofo Henry Lefevbre ou a herança cultural de Durkheim defendendo que o “espaço é um

produto social”, estas ideias viriam a influenciar o desenvolvimento de uma teoria marxista do espaço (Capel,

1981, 410-411) e o aparecimento da perspectiva estruturalista ou “radicais” no Planeamento19.

19 Segundo Capel, existiu um conjunto de mudanças que afectaram o sistema de relações internacionais e o conjunto da sociedade ocidental favorecendo a emersão deste conjunto de estudos, nomeadamente:

– final da Guerra Fria e a emergência da coexistência pacífica Este/Oeste, que permitiu um novo reflorescimento da reflexão marxista no bloco capitalista que, na visão deste autor, viria a contribuir para o enriquecimento da própria teoria marxista e das próprias ciências sociais;

– as mudanças que se produziram nos países em vias de desenvolvimento, nomeadamente a culminação do processo de descolonizador e a crítica ao complexo sistema de dominação imperialista (mediatizado pelas Conferências de Bandung, 1955, e, principalmente, conferência Mundial sobre Comércio e Desenvolvimento, celebrada em Genebra, em 1964);

– finalmente, a crise do Sistema Capitalista suscitado pelas �contradições da própria economia capitalista�, nomeadamente o problema de energia e matérias primas que resultou do controle destas riquezas por apenas alguns países (Horacio Capel, 1981)

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Hall (1992) destaca dentro estudos neo-marxistas20 os escritos de Castells “Urban question” (escrito nos anos 70)

e o “City and the grass roots” (de 1983), centrados nas questões de conflitos sociais, poder entre classes e política

urbana e os de David Harvey, como o “Social justice”, que se centra na análise das consequências sociais do

modelo de produção capitalista, desafiando, segundo Klosterman (1985) desafiou os planeadores a uma função

que não fosse apenas a da manutenção de um bom ambiente e manutenção da ordem social, mas o papel mais

complexo de corrigir os desequilíbrios sociais, através de uma mediação entre os diversos grupos sociais com

vista a uma maior pressão no sentido da Democracia.

Muito embora alguns destes t rabalhos tenham sido crit icados por reduzirem as decisões

individuais a explicações est ruturais mais profundas, é-lhes reconhecida a sua importância por

adicionarem uma nova dimensão ao debate sobre a legit imidade e desígnios do Planeamento

Territorial, inf luenciado novas teorias no Planeamento. Rosa Pires (1995) ident if ica t rês destas

teorias que emergiram nos anos 70:

1. O Increment al ismo, desenvolvido por Lidblom (1973) e Cammis (1979) que defende a

ut il ização de metodologias capazes de acolher a diversidade social e desenvolve a

descrição dos condicionantes técnicos, polít icos e administ rat ivos da act ividade de

planeamento

2. o Planeament o Advocat ório personif icado pelas teorias de Paul Davidoff 21, que nos anos

60, a part ir da análise à pobreza das cidades americanas, viria a publicar um art igo

int itulado “ Advocacy and Plural ism in Planning” , em que este autor propõe para a

act ividade do Planeamento um papel de defesa dos interesses dos grupos sociais mais

necessitados (Healey 1997a, p.25) de forma a não se perpetuar o monopólio de

determinados grupos económicos

“Como en un processo judicial, los urbanistas podían – debían – actuar así como abogados de los interesses de

sus clientes, mantinéndolos adecuadamente informados y defendiendo sus intereses” (Caz et al., 1999, p.411)

Os teóricos estruturalistas, que influenciaram Davidoff, observaram que as instituições formais do estado da

sociedade capitalista (também a actividade de planeamento) promoviam sistematicamente o interesse dos que

controlam a produção capitalista, criando e mantendo as condições que conduziam à eficiente acumulação do

sector privado (Klosterman, 1985)

Em síntese, a consciência crescente das desigualdades económicas e sociais existentes no mundo (entre países com diferentes graus de desenvolvimento, mas também entre cidadãos que habitam os mesmos territórios) incitou a que (também) na actividade do Planeamento Territorial se propusesse um reequacionar dos seus valores, mais coincidentes com os princípios da equidade social e valores como a sustentabilidade ambiental ou respeito inter-geracional.

20 inspiradas na obra de Marx que apresentou os conflitos inerentes entre as forças de produção (os detentores do capital) e a restante sociedade.

A título de curiosidade refira-se que esta corrente emergiu nos EUA, num país, onde, inversamente, se viria a desenvolver uma tradição liberal que defende a livre actuação dos mecanismos do mercado face à intervenção do Estado

21 A par da perspectiva do Planeamento Advocatório, desenvolveu-se a do Planeamento Equitativo, que segundo Klosterman (1985) emergia de uma forma menos combativa que a primeira, postulando que os planeadores defendessem os interesses dos pobres a partir do sistema, indo buscar as ideias dessa minoria e integrando-as na agenda pública

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3. o Assessorial, de Rondineli (1971): reconhece que a act ividade do planeamento é apenas

um dos agentes de t ransformação que inf luencia o processo de desenvolvimento, por isso

propõe um papel de assessoria da act ividade do Planeamento para os restantes agentes

envolvidos no processo de t ransformação, nomeadamente o papel de recolher e

disponibi l izar informação, descrever os impact os de vários cenários de int ervenção

possíveis, coordenar, sensibi l izar e concert ar os diferent es agent es int ervenient es no

processo de t ransformação, etc. (Rosa Pires,1995, p.26)

Contestando a subserviência da act ividade de Planeamento à lógica do mercado como a forma

mais adequada de orientar o processo de desenvolvimento, estes autores defendem prát icas de

planeamento mais “ plurais” e socialmente legit imadas pelos vários interesses da sociedade, com

base nos princípios de equidade social e com vista ao incremento da qualidade de vida das

comunidades com menores recursos económicos

Não obstante a importância destas ideias para reequacionar a natureza do Planeamento,

Klosterman (1985) ident if ica algumas limitações desta corrente que designa por est ruturalista,

nomeadamente:

/ a dif iculdade de ident if icar o interesse da comunidade, especialmente em comunidades

muito heterogéneas como as urbanas,

/ o facto de grupos de líderes, mesmo quando eleitos democrat icamente, não representarem

o grupo de membros dessa comunidade;

/ a dif iculdade em representar e defender o interesse difuso e vasto de diferentes grupos

dist intos que part ilham o mesmo espaço;

/ a existência de informação escassa, por parte do sector público, para enformar

adequadamente o processo de decisão.

Com esta e out ras correntes reformistas do Planeamento, começa a estar ent reabert a a porta

para a part icipação pública, ela própria “ forçada” por um processo cont ínuo de reivindicação da

sociedade civil que exige não só um maior direito à informação, como à part icipação

Se considerarmos que o que está em causa é uma verdadeira desconst rução do Planeamento (da

sua razão de ser, dos seus propósitos, das suas formas de actuação “ cient íf icas” e

“ obj ect ivas” …,) podemos admit ir, como observa Healey (1997a) este foi um momento em que se

int roduziu o discurso da pós-modernidade no Planeamento, nomeadamente dos desafios da

aprendizagem colect iva e colaboração numa sociedade crescentemente fragmentada que

“ celebra a diferença” (Healey 1997a, p.32)

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“… It raises questions about the very enterprise of planning it self, as a practice of managing co-existence in

shared places. It challenges any effort in collective debating and organising “ (Healey, 1997a, p.43)

Neste contexto de ref lexão interna e de autocrít ica, mas também de cont radição ent re o

aumento de complexidade da realidade urbana (dimensão dos aglomerados, heterogeneidade

social, rácica, económica dos seus habitantes, . . .) e o emagrecimento dos recursos do Estado ou

ent re a mult iplicação dos locais de governação e a dif iculdade na sua coordenação, emerge uma

proposta para a reformulação do Planeamento com base em metodologias de colaboração e

comunicação ent re um número e t ipologias de representantes cada vez mais diversif icado e

representat ivo da sociedade

Yif tachel e Huxley (2000) falam de uma viragem comunicat iva na teorização do Planeamento

Regional e Urbano, em que emergem novas formas de “ collaborat ive” ou "deliberat ive”

planning, citando, respect ivamente Healey (1997a) e Forester22 em que se rej eitam concepções

monolít icas23 e simplistas de sociedade (Yif tachel e Huxley, 2000, p.907). Defendem-se

procedimentos e prát icas de deliberação mais j ustas, favorecidas pela criação de ligações e

relações horizontais interact ivas ent re os representantes dos vários grupos de habitantes ou

ut il izadores do território e formas de t rabalho e aprendizagem colect iva que viabilizem a

const rução de consensos, pelo menos em relação a alguns temas que mobilizem para uma acção

comum

“In a society of multiple stakeholders with diverse concerns, hierarchical forms of articulating public policy and

firm boundaries between public and private action are being displaced by more fluid and horizontal

relationships” (Healey, 1998b, p.3)

De certa forma para provar que não se t rata de uma utopia, Healey (1997a) refere que estas

ideias e metodologias colaborat ivas estão j á a ser usadas em diversas áreas da polít ica pública

em países que têm vindo a ult rapassar as formas de organização hierárquicas e cent ralizadas e

se tem procurado const ruir redes de t rabalho baseados em partenariados horizontais com vista

ao desenvolvimento territorial

“In some countries, long-established policy, local governance cultures have encouraged the emergence of broad-

based local collaborative approaches into the routine of spatial planing practice, notably in Scandinavia” (Healey,

1997a, p.34)

22 privilegiando a esfera da comunicação, Forester lançou um olhar crítico ao poder das estruturas que desenhavam as �infra-estruturas comunicativas� dentro da qual as decisões de planeamento são frequentemente determinadas, tendo preocupado-se, em trabalhos subsequentes na forma como o discurso das comunidades pode ajudar a desenhar práticas mais justas e democráticas (Yiftachel e Huxley, 2000, p.908)

23 que deixa de ser olhada como um todo homogéneo nos seus valores, aspirações e maneiras de viver, para passar a ser interpretada como um todo diversificado e heterogéneo composto por múltiplos grupos sociais, eles próprios muitas vezes heterogéneos, pense-se nas necessidades das crianças em detrimento dos restantes grupos etários, por exemplo

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Durante o desenvolvimento desta dissertação esperamos corroborar esta visão, mediante a

apresentação do que gostamos de designar por arquipélagos de boas prát icas de Planeament o

Territ orial

Em síntese:

A história da teoria do Planeamento da segunda metade do século XX, em part icular a part ir dos

movimentos sociais dos anos 70, num momento em que Portugal iniciava os seus primeiros

capítulos da democracia, revela uma tendência para a part icipação pública passar a ser

entendida como processo fundamental de legit imação social do planeamento territorial.

Na intercepção de várias correntes imbuídas de ideologias diversas que emergiram como forma

de superar o reducionismo funcional do Planeamento Clássico, a “ part icipação pública” passa a

ser encarada como uma componente fundamental para uma mais correcta orientação e

legit imação do Planeamento, mas, frequentemente, só ao nível, inconsequente, da retórica

polít ica.

Um dos denominadores comuns dos novos paradigmas const ruídos após a ‘ crise de legit imidade’

dos anos 70, passou a ser à anuência à importância de uma maior descent ralização e

democrat ização do processo de tomada de decisão tendo, no entanto, evidenciado um fraco

aprofundamento teórico e prát ico dessas ideias.

Tal hiato virá a ser superado pelo Planeamento Colaborat ivo e a sua cent ragem na invest igação e

aplicação de metodologias e abordagens de comunicação e colaboração em contextos de

Planeamento Territorial.

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1.3 - Ident if icação das vantagens do Planeamento Colaborat ivo

Como vimos no ponto anterior, vários autores têm vindo a propor uma reformulação das

metodologias de Planeamento de “ comando e cont rolo” , (Innes, 1994, 1997; Healey, 1997a,

1998b) de forma a possibilitar a const rução de um Planeamento Territorial mais condicionado e

legit imado socialmente, que permita uma correcta interpretação do conceito de interesse

público, que, como Campbell e Marshall (2000) observa é uma noção que varia não só ent re

classes sociais, prof issionais ou grupos polít icos, mas também ent re planeadores24 e

evolut ivamente ao longo do tempo, gerando uma cont ínua reavaliação das questões “ para quê,

para quem, de que forma” .

Neste ponto, com base na ident if icação dos principais argumentos que defendem a incursão da

part icipação pública na teoria e prát ica do Planeamento territorial, ref lecte-se sobre o potencial

de melhoramento das abordagens part icipatórias para a concret ização de um Planeamento

Territorial mais responsivo, às reais necessidades da população, inclusivo de todos os grupos

sociais evitando a est igmat ização dos indivíduos, a vulnerabilidade social e a pobreza e mais

int egrado do ponto de vista das dimensões de intervenção com vista à obtenção de resultados

mais efect ivos e duradouros.

Nesse sent ido, desenvolve-se uma ref lexão est ruturada em t rês pontos essenciais e indissociáveis

que ident if icam algumas mais val ias ou funções associadas ao Planeamento Colaborat ivo. A

saber:

1. A promoção da inclusão social e cr iação de capital social

2. O incremento da confiança nos decisores e decisões ao longo do tempo

3. A promoção de boas prát icas de governação

De forma a funcionarem como f io condutor desta ref lexão, enunciam-se duas questões de

part ida:

/ Face ao contexto de acelerada mudança e fragmentação social, económica e polít ica da

sociedade contemporânea, quais os cont ributos das abordagens part icipatórias para um

Planeamento Territorial mais ef icaz?

/ Atendendo à inef iciência das (t radicionais) abordagens hierárquicas de planeamento e à

dif iculdade de impor, por lei, formas de actuação ao sector privado e comunitário, qual o

potencial da abordagem colaborat iva para a const rução de um planeamento mais

est ratégico e produt ivo, não só ao nível de recursos tangíveis como intangíveis?

24 �For urban designers this public interest may be the preservation of public space and architecture that promotes a shared sense of community. For environmental planners, this may include the preservation of natural resources and open space for the public�s enjoyment� Campbell e Marshall (2000)

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1.3.1 - A promoção da inclusão social e cr iação de capital social

Conforme tem sido observado por alguns autores (Giddens, 1993; Ascher, 1995) o crescente

déf icit de democracia e cidadania das urbes contemporâneas const itui uma problemát ica de

contornos gradualmente preocupantes, uma vez se consubstancia num enfraquecimento da

consciência individual de pertença a uma colect ividade, podendo dif icultar ou impossibilitar a

implementação de acções colect ivas, necessárias às vivências urbanas.

Balducci (2001) ut il iza a noção de “ fragmentação” para referir a quebra de conexões ent re

partes da cidade e o todo (pense-se por exemplo na erosão das ligações ent re territórios urbanos

que concent ram bolsas de pobreza e a restante cidade) e para designar a fractura no

relacionamento dos cidadãos com o seu espaço de vizinhança. Observando a tendência para o

enfraquecimento das relações sociais locais em det rimento de uma mult iplicidade de novas

conexões baseadas em af inidades económicas, prof issionais, culturais,…, e em novas formas de

ut il ização da cidade25, Balducci (2001) ident if ica algumas consequências como:

/ O aparecimento de novos problemas e desafios para o Estado resolver, muito embora sem

um alargamento de recursos, podendo, a t ítulo de exemplo, referir-se a necessidade da

criação de polít icas de market ing territorial para a at racção de invest imentos privados e

públicos (nacionais ou europeus) com vista a assegurar o f inanciamento e sustentabilidade

de grandes proj ectos urbanos geradores de visibilidade territorial (universidades, cent ros de

congressos, museus,…) e notoriedade num contexto de grande mobilidade de capital e de

informação;

/ A crise de representação ent re comunidades e polít icos eleitos, que tem gerado uma

crescente insat isfação e onda de contestação, difundindo-se e acentuando-se a ameaça do

síndroma Nimby26

/ A percepção de isolamento, por parte de indivíduos e famílias, que tem incrementado o

sent imento de insegurança urbana e de polarização social, etc.

Estes são, no fundo, os resultados negat ivos de uma “ evolução regressiva da cidadania urbana”

(Vargas, 2001) que tem sido suscitada por factores diversos como o aumento de fragmentação

social e territorial (Balducci, 2001), a instabilidade e acelerada mudança da era da globalização

económica, tecnológica e mediát ica que tem gerado uma acentuação da erosão aos direitos do

25 por exemplo, ao nível dos locais de consumo ou lazer, valorizando-se as grandes e periféricas superfícies comerciais em detrimento de formatos de pequena dimensão de proximidade

26 �not in my backyard�, que consiste na oposição por parte de grupos residentes à realização na proximidade do seu domicílio de uma intervenção urbana ou construção de um equipamento colectivo, não porque contestam a sua utilidade ou por não se sentirem directamente abrangidos (o que, no entanto, pode acontecer), mas porque não o querem dentro de portas.

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cidadão (Vargas, 2001), a existência de polít icas cent ralizadoras que favorecem a

incontestabilidade das certezas dos peritos ou de polít icas descent ralizadoras que fragmentam

exageradamente os locais de decisão e favorecem localismos eleitorais de curto prazo ( Ascher,

1995), etc.

Segundo Ascher (1995), o desmembramento entre o global e local é decorrente não só de lógicas económicas,

que inscrevem o local em espaços supranacionais ou de orçamentos europeus que se destinam a comunidades

locais, como da transferências de competências políticas que podem suscitar um curto-circuito entre as várias

escalas de decisão,..., e gerar, com maior acuidade, dificuldades em arbitrar interesses públicos a diferentes

escalas territoriais e temporais (curto, médio, longo prazo)

São, portanto, vários e, inclusive, cont raditórios, os factores que têm cont ribuído para o recuo

da cidadania urbana e que têm revelado capacidade para “ distender laços sociais, minar

inst ituições polít icas e est imular a const ituição de pequenas comunidades fechadas” (Ascher,

1995, p.102)

Esta tendência para a individualização ou integração em pequenos grupos de interesses,

frequentemente, sem correspondência com os grupos sociais de vizinhança territorial, é

denominada por Ascher de “ civilidade minimal” .

são formas de relacionamento de indivíduos que coexistiam quase exclusivamente dentro dos seus microgrupos,

desenvolvendo “com os outros” um conjunto de relações minimais e de indiferença, (Ascher, 1995, p. 102)

Sousa Santos (1985) relacionando estas forma de relacionamento27 com o fenómeno de

globalização, que tem produzido a intensif icação das relações a nível mundial e uma

interpenet ração ent re diferentes escalas espaciais, observa uma cont radição existente ent re um

maior nível de solidariedade global – de proximidade ao nosso igual que está no exterior (sendo

esta solidariedade orientada por valores semelhantes: como a defesa do ambiente, dos direitos

dos animais, etc.) e, simultaneamente um distanciamento aos que nos estão próximos

Em determinadas situações, no entanto, este distanciamento inverte-se e a população local une-

se, protestando cont ra decisões de poderes públicos, locais ou nacionais, o que no domínio do

ordenamento territorial se tem designado por nimbismo.

as controvérsias no domínio do planeamento têm sido amplamente mediatizadas pelos meios de comunicação

social, relacionando-se segundo Gonçalves et al. (2000) com a percepção, cada vez mais generalizada, de que os

peritos divergem entre si, das consequências das decisões públicas o que prova que o acesso a metodologias

rigorosas e objectivas não lhes confere o dom da infiabilidade, as controvérsias sobre os interesses subjacentes às

Segundo Ascher (1998) esta reacção dos cidadãos relativamente a decisões públicas é a expressão de indivíduos que, por se sentirem fora da colectividade, consideram que esta apenas tem obrigações para com eles e não direitos, pelo que questionam esse interesse geral, face ao seu prejuízo pessoal ou interesse privado

27 reduzida ao mínimo denominador comum entre cidadãos

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decisões públicas (económicos, profissionais, políticos, etc.) ou a convicção de que em situações de risco (ex.

instalações de tratamento de resíduos tóxicos, etc.) os técnicos e políticos não podem ser os únicos a deliberar

Esta panóplia de percepções, associadas à crescente consciência da existência de grupos de

pressão que inf luenciam as agendas e decisões públicas, têm originado um incremento da

desconfiança da população face às decisões públicas que se baseiam exclusivamente em

princípios técnicos e racionais e suscitando uma mult iplicação de protestos, cada vez mais

frequentes, também, em Portugal28

“…Public officials, groups of experts and powerful pressure groups capture control of policy-agenda setting and

the definition of the terms of discourse from popular movements, encouraging techno-corporativist practices

rather than inclusionary debate. Policy initiatives focus on national or international regulatory criteria, rather than

on specific interrelations which people and firms have with the natural worlds in which they exist. Moral and

aesthetic issues are downplayed, and converted into the vocabulary of economic calculus. If people object, they

are labelled as NIMBY’s, pursuing resistance to any development, whereas they may rather be full of

mistrust about the way government and business go about thinking about their concerns”( Healey, 1997a,

p.194)

Uma contestação que põe em causa não só a concret ização de proj ectos colect ivos como

favorece a tendência para desintegração da sociedade em grupos de interesses mutuamente

exclusivos, o que põe em causa a própria noção de direitos e deveres dos membros de um estado

(Giddens, 1993).

O que passa a estar em causa parece ser a própria vivência “ em conj unt o” de cidadãos num

determinado território e o sent imento de conf iança para com os seus representantes

democrat icamente eleitos, exigindo um repensar do conceito de cidadania29 uma vez que

segundo Vargas (2001) esta “ é uma categoria em const rução” , podendo o seu conteúdo evoluir

ao longo da história.

Observe-se, por exemplo, como os ideais iluministas do século 18, nomeadamente os de igualdade, em termos de

direitos e obrigações ou os de liberdade e de tolerância, se têm afirmado no mundo democrático ao longo da

segunda metade do século XX, onde não obstante se tem observado um aprofundamento das situações de

28 bastante frequentes em períodos de processo eleitoral, como ocorreu recentemente aquando das eleições presidenciais em Janeiro de 2001, em que os protestos se multiplicaram em várias partes do país suscitando o boicote, total ou parcial, da população às urnas. Tais protestos estiveram frequentemente relacionados com decisões controversas de Planeamento Territorial. Por exemplo, em Souselas (freguesia do concelho de Coimbra) contra a decisão de instalação de uma co-incineradora de resíduos industriais perigosos, em Mondrões (concelho de Vila Real) pela necessidade de estradas e arranjo das vias existentes, etc. (Joana Cardoso, 2001; in http://noticias.sapo.pt/artigos/CCBCDF,cggjge.html)

29 esta preocupação tem sido evidente em contextos diversificados: no educacional, tendo justificado o desenvolvimento do Projecto �Educação para a Cidadania Democrática�, desenvolvido entre 1997 e 2000 pelo Conselho da Europa, que viria suscitar o lançamento do livro A educação para a Cidadania no Sistema Educativo Português (1974-1999), editada pelo Ministério de educação/GAERI/IIE ,em Abril 1999; no contexto associativo registe-se a profusão de forums de discussão on-line e de conferências o tema da cidadania, promovidos, por exemplo, pela CIVITAS � Associação Portuguesa da Defesa e Promoção dos Direitos dos Cidadãos; em contextos políticos a-propósito dos elevados índices de abstenção às eleições (por exemplo nas presidenciais, do passado dia 13 de Janeiro de 2001, a abstenção foi da ordem dos 49%do total dos eleitores, equivalente ao terceiro maior valor de abstenção da UE dos últimos 27 anos), etc.

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exclusão social, por motivos raciais, profissionais ou outros, que tem gerado uma crescente erosão e fragilidade

do conceito de cidadania.

Tem-se observado, portanto, uma tendência contraditória nas sociedades modernas: globalmente a de uma evolução

positiva, mas em determinados estratos sociais, um empobrecimento no acesso a determinados direitos, o que pode

coloca estes cidadãos em situações de exclusão dentro da sociedade.

Refira-se que os direitos de cidadania integram diversas dimensões de direitos. A tipologia clássica de Marshall

(1973), citada por Giddens (1985), integra, por exemplo o direito civil, implica o respeito pela liberdade de

expressão do indivíduo, o direito à propriedade e igualdade perante a lei, etc., o direito político, a possibilidade

de todos os cidadãos participarem em eleições ou concorrerem a lugares público ou o direito social, diz respeito

à prerrogativa de qualquer indivíduo usufruir de um padrão mínimo de bem estar, e que interpela as próprias

funções do Estado Providência. Podendo a propósito colocar-se algumas questões:

/ Por exemplo quando se põe em causa alguns destes direitos poderão estar em causa alguns dos deveres do

cidadãos?

/ No que respeita aos direitos à informação e participação no Planeamento Territorial (direitos que estão

consagrados pela lei portuguesa), quando estes não se consubstanciarem em boas práticas de Planeamento

e em processos de decisão transparentes e legitimados pela população poderá estar em causa o dever de

aceitar as decisões públicas por parte da administração? Até que ponto não são legítimos movimentos

Nimby?

A respeito do debate sobre o conceito de cidadania, Villaverde Cabral (2000) defende que mais

importante do que um excessivo grau de formalismo na def inição desta noção, é a criação de

indicadores que permitam avaliar a sua concret ização prát ica.

Do esquema clássico de Marshall, Cabral reflecte sobre a cidadania política - ou seja a liberdade de expressão e

de associação, bem como o direito de eleger e de ser eleito para todos os cargos representativos (direitos que para

serem plenamente usufruídos exigem a mobilização, individual e de forma activa dos cidadãos30), propondo

como indicadores de democracia a participação cívica, política e eleitoral ou a confiança da população na

capacidade do sistema político para resolver os principais problemas da sociedade.

Refira-se, que a concretização destes direitos está dependente da mobilização dos cidadãos, mas é facilmente

influenciada pelas instituições, que podem promover, ou não, uma maior abertura e valorização da participação

cívica (Anexo 1)

A opinião de Vainer (1998), com base numa ref lexão sociológica sobre a diversidade na cidade e

as consequências do Planeamento Est ratégico, é que é fundamental promover um urbanismo da

“ tolerância” , de forma a inverter-se alguns processos negat ivos em curso, como o aumento das

desigualdades e processos de degradação socio-espacial, a precarização do emprego, aumento

de violência e marginalidade urbana, aumento de condomínios fechados, parques de

estacionamento e cent ros comerciais fechados, etc.

30 Ao contrário dos direitos sociais, assumidos pelo Estado relacionados, por exemplo, com a inviolabilidade da pessoa ou igualdade perante a lei

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Defendendo uma noção abrangente de Planeamento, que integre o valor, act ivo e funcional, que

decorre da heterogeneidade e do intercâmbio cultural, Vainer (1998) rej eita a ideia de um neo

darwinismo urbano 31, e defende a “ utopia” de uma cidade j usta e tolerante” … Interpretando o

conceito de “ utopia” como o de uma via que “ abre uma passagem at ravés do possível e supera a

inércia nat ural do homem à capacidade de reformulação const ant e do universo humano” .

E que ultrapasse o reducionismo do Planeamento Estratégico que Vainer (1998) critica por ter gerado a

tematização da cidade com vista ao seu marchandising e posterior venda no mercado das cidades, num contexto

de concorrência territorial que tem gerado uma homogeneização dos espaços, respondendo aos interesses do

capital em detrimento dos seus residentes

Sobre a diversidade na cidade Ansay e Schoonbrodt, citados por Ascher (1998) caracterizam-na como “um lugar

de encontro de diversos”, afirmando que “a cidade é, antes de tudo, lugar de encontro não dos semelhantes, mas

dos diferentes”, sendo, ainda, segundo Madeck e Murard (1995) “a origem e a sede de todos os problemas

sociais” nomeadamente dos que resultaram da “oposição entre as ‘classes populares’ e ‘as outras”.

Para a concret ização de tal “ utopia” , no que se refere ao ideal de um Planeamento plural e

democrata, Healey (1997a) propõe as metodologias do Planeamento Colaborat ivo para gerar uma

interact ividade social em processo de const rução de consensos relat ivos à ident if icação de

assuntos de preocupação comum, à def inição e hierarquização de problemas, ao desenho de

“ knowledge resources” , à art iculação de soluções ou ao desenvolvimento de ideias sobre a forma

de como por as soluções em prát ica (Healey, 1997a, p.86)

É precisamente nesta interact ividade que reside uma das principais característ icas e

originalidades do Planeamento Colaborat ivo32, que favorece, como observa Vázquez (1998) uma

const rução ‘ part icipada’ de diagnóst icos e decisões, situando “ a part icipação de actores sociais

relevantes no cerne de todo o processo de produção de planos, para além de os responsabilizar

na condução de soluções e polít icas de desenvolvimento” .

Relat ivamente à const rução part icipada de diagnóst icos, Costa Lobo (1996) considera-a

relevante, notando o valor da part icipação para lembrar que os problemas existem…” é

import ant e que alguém alert e para a discussão dos problemas” . . sendo, naturalmente, tanto

mais importante esta dimensão quanto for o distanciamento ent re os locais de decisão e dos

problemas (Costa Lobo, 1996, p.63). Esta é, de resto, a tendência dos maiores cent ros urbanos,

cuj a expansão territorial e demográf ica tem suscitado uma dif iculdade crescente na resolução

dos problemas e o acentuado distanciamento ent re decisores e cidadãos.

Ainda sobre as questões da part icipação pública no Planeamento Territorial, Rosa Pires (1994)

relaciona-as com a noção de cidadania, nomeadamente com as suas dimensões básicas dos

31 Isto é das relações de competição entre os seres vivos, que geram prejuízo para ambos ou para os mais fracos, na linha de explicação teórica de Darwin sobre a evolução natural das espécies.

32 mas, como iremos ver no ponto 1.2.2, simultaneamente, onde residem as principais dificuldades

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“ direito e os deveres” do cidadão, concluindo que a possibilidade da comunidade inf luenciar as

decisões governat ivas corresponde, simultaneamente, a um direito e dever do cidadão, mas cuj a

efect iva concret ização prát ica depende da “ disponibilidade” da administ ração pública para

possibilitar ” sonhar a possibi l idade de mudança e de um percurso que sej a mut uament e

aceit ável pelos int ervenient es no processo…”

Ora, desta oportunidade de uma part icipação act iva protagonizada pela comunidade e restantes

actores locais no que diz respeito às questões do planeamento e gestão territorial33, poderá

resultar a produção de uma série de produtos intangíveis vitais para a prosperidade

socioeconómica de um território. Um destes “ ingredientes” fundamentais é o capital social:

“Pode-se definir a competitividade social, ou o que muitos agentes chamam “capital social” de um território,

como a capacidade dos diferentes agentes e instituições em actuarem juntos e eficazmente a nível do território. É

um estado de espírito, uma verdadeira “cultura”, que assenta na confiança mútua e na vontade e capacidade de

reconhecer, exprimir e articular interesses individuais e colectivos.

A competitividade social é um elemento básico a ter em conta numa abordagem territorial e diz respeito à

organização dos agentes e às relações entre as pessoas, entre agentes e instituições e entre as próprias

instituições. A competitividade social faz da proximidade física dos agentes e das instituições que trabalham a

nível local um trunfo para formular uma ‘inteligência colectiva’ num projecto de território, ajudando a tornar o

território mais competitivo em relação ao mundo exterior ao mesmo tempo que enriquece os seus lados de

solidariedade internos” (European Commission, 2000a)

“Social capital creates local economy prosperity. This finding by Putnam (1993), Fukuyama (1995), Coleman

(1988, 1990) and other social scientists has lent legitimacy to what those involved in community economic

development have known intuitively for years: the level of inter-personal trust, civic engagement and

organisational capability in a community counts” (Wilson, 1997, p.745)

Estudos de caso invest igados por Putnam (1993) provaram, de facto, a relevância de um st ock de

capit al social , def inido por aspectos da organização social34, para o aumento do potencial de

desenvolvimento económico de um território.

Estes estudos vieram a confirmar o que j á se desconfiava relat ivamente à possibilidade da

existência de fortes relações de solidariedade e de confiança locais, favorecerem a criação de

acções concertadas público-privado, do “ saber fazer” em termos da gestão democrát ica local

promover a ident idade territorial e o sent imento de pertença dos cidadãos o que, a j usante,

promovia a prosperidade económica e coesão social local.

De facto, como Healey (1997, 1999) tem vindo a observar quanto maior for a acumulação de

capital social, maior poderá ser a capacidade cívica da população para se organizar e mobilizar

33 questões que, de resto, mobilizam significativamente a atenção dos cidadãos,

34 como a existência de redes de trabalho e de cooperação entre empresas, a partilha de equipamentos e de serviços ou a troca de informação

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em áreas e obj ect ivos de interesse colect ivo. Desta mobilização poderá resultar a produção de

recursos intangíveis suplementares como “ capital intelectual” ou “ capital polít ico”

fundamentais para uma maior t roca de informação horizontal at ravés de relações pessoais e

prof issionais signif icat ivas que permitam aprendizagens em conj unto e a ident if icação de

soluções “ que vão para lá da visão limitada de cada um…”

Vários autores (Putnam, 1993; Innes e Booher, 1999), têm, de facto, reconhecido o potencial de

desenvolvimento socioeconómico associado à existência destes recursos intangíveis, pelo que

têm vindo a propor um aprofundamento da ut ilização de metodologias que reforcem a sua

produção e cuidados suplementares para evit ar a sua dest ruição.

Innes e Booher (1999) têm proposto, por exemplo, metodologias de consensus building (construção de

consensos) e a utilização de algumas técnicas inovadoras para a resolução de conflitos entre stakeholders (por

exemplo a do Role Playing, ...), de forma a se irem produzindo progressivos avanços através de uma partilha de

perspectivas e de um debate colectivo de sugestões

Para além da consciência da possibilidade de produção ou dest ruição de recursos fundamentais

para a prosperidade dos territórios, deve considerar-se o carácter f lexível e dinâmico da

cidadania

Vargas (2001), sugere que se fale de cidadania como um processo em descobrimento, uma vez que é um conceito

que evidencia fracturas, retrocessos, recuperações… Referindo a título de exemplo a forma como se tem vindo a

descobrir e construir o conceito de “cidadania europeia”, ao longo dos últimos 50 anos.

A descoberta de direitos, segundo Vargas (2001) pode suscitar um enorme potencial transformador na sociedade

ao longo do tempo… Neste ponto reflecte-se exactamente sobre o potencial transformação da sociedade

associado a um direito ainda por explorar na maior parte do mundo democrático: o direito da participação cidadã

no Planeamento Territorial.

A este propósito deve pensar-se no cont ributo que pode ser dado pelos prof issionais de

planeamento para o obj ect ivo de uma maior conquista dos direitos individuais dos cidadãos, o

que alguns autores, como Friedmann (1996) têm designado por empowment e que se pode

t raduzir num aumento de auto-est ima e confiança pessoal que facilita a inclusão social, mas

também para o fortalecimento da capacidade organizacional de um território, permit indo a

const rução de visões de futuro conj untas, com a part icipação de todos os grupos sociais e não

apenas de algumas elites, culturais ou económicas.

“In addition to creating jobs, disbursing loans, generating income, training the labour force and delivering

services, development planners must now confront head on the fuzzy task of shaping levels of inter -personal

trust, feelings of belonging and responsibility and the quality and efficacy of civic engagement in a

community.” (Wilson, 1997, p.745).

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Estas novas responsabilidades, pressupõe, como nota Wilson (1997) uma reformulação dos

próprios currículos dos cursos minist rados nas universidades de forma a se poderem adequar os

processos de ensino-aprendizagem dos planeadores aos novos desafios contemporâneos sendo,

para tal, abarcar não só competências de um “ saber” e “ saber fazer” est ritamente técnico35,

mas também de um “ saber” e “ saber fazer” processual, associado às tarefas de comunicação

com grupos sociais diversif icados, à gestão e mediação de conflitos, à promoção de metodologias

de t rabalho que promovam dinâmicas de grupo e aprendizagem social, etc. (Wilson, 1997, p.748)

No fundo competências que permitam uma gradual subst ituição do modelo de planeador

“ técnico” que possui a expert ise e o status e se mantém distanciado do “ cliente” , para um

modelo de “ colaboração e part icipação” em que se assume que tanto o cliente como o

prof issional têm conhecimentos importantes sobre o problema e que, por conseguinte, devem

optar pelo estabelecimento de conexões prof issionais alicerçadas na confiança e colaboração.

A este nível, as met odologias de Planeament o Colaborat ivo poderão oferecer um valioso

cont ributo, uma vez que permitem o incremento do nível de confiança interpessoal, a criação de

compromissos cívicos ou o reforço da capacidade organizacional na sociedade, ent re os sectores

privado, público e também com o actualmente designado “ terceiro sector” , a sociedade civil.

“Collaborative efforts in defining and developing policy agendas and strategic approaches to collective concerns

about shared spaces among the members of political communities serve to build up social, intellectual and

political capital which becomes a new institutional resources. It generates a cultural community of its own,

which enable future issues to be discussed more effectively, and provides channels through which all kind of

other issues, (…) may be more rapidly understood and acted upon.” (Healey, 1997, p.310)

35 conhecer as dinâmicas territoriais em curso, os programas de financiamento disponíveis, saber fazer relatórios de candidatura estratégicos, planos de zonamento, etc.

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1.3.2 - O incremento da confiança nos decisores e decisões ao longo do tempo

Esta ent rada de ref lexão sobre as mais valias do Planeamento Colaborat ivo, alicerça-se com em

duas ref lexões principais, por um lado, nas questões do agir com competência e a percepção da

comunidade relat ivamente a esta capacidade da administ ração pública, por out ro com a ref lexão

do cont ributo das abordagens da part icipação para a qualif icação dos processos e produtos de

planeamento territorial.

O agir com competência relaciona-se para Boterf (2001), com “ a capacidade de seleccionar,

combinar e mobilizar recursos, pessoais e de rede, para elaborar respostas pert inentes em

situações prof issionais” .

Segundo este autor este “ agir com competência” passa pela incorporação de recursos internos

(cognit ivos, de memorização, de conhecimento, experiência, emocionais, etc.,) e externos (que

designa por “ redes de recursos” – de documentação, bancos de dados, peritos... , etc.) que, em

conj unto, podem gerar resultados prof issionais, em termos de produtos ou serviços, com um

maior valor acrescentado para os dest inatários, que experimentam uma sensação de sat isfação

face aos que lhes é oferecido

Para Boterf (2001) esta percepção posit iva é resultante de um t rabalho art iculado em t rês pólos

fundamentais:

1. o saber agir, que pressupõe recursos, t reino, em combinação, de recursos, situações

variadas de aprendizagem, retornos de aprendizagem de experiências, situações

prof issionalizantes, etc.;

2. o poder agir, ao nível da organização do t rabalho, da existência de meios disponíveis, da

at ribuição e delegação do poder, gestão do tempo, etc.; e

3. o querer agir, que facilita e possibilita a part ilha das questões e de informações sobre

problemas, soluções ou resultados esperados, incent iva a um contexto de confiança,

part ilha e apoio.

Da sistemat ização de Boterf (2001) em torno dos t rês pólos anteriormente referenciados,

salienta-se como fundamental a “ do querer agir” , uma vez que, como aliás é frequente em

contextos organizacionais hierárquicos, pouco incent ivadores à inovação e ao t rabalho em

equipa, a presença das out ras duas dimensões - do “ saber agir” e “ poder agir” , só por si não é

determinante do querer agir com competência em situações complexas e pluridimensionais,

muito exigentes quanto ao nível dos conhecimentos técnicos, mas, principalmente, de

competências relacionais a mobilizar.

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Esta aliás é uma das principais dif iculdades que se coloca à prát ica do Planeamento Territorial

contemporâneo: a exigência de uma colaboração extensiva e, não raras vezes, intensiva, para a

resolução de problemát icas que dependem da actuação de vários níveis de decisão, a várias

escalas, por vários actores, eles próprios com idiossincrasias pessoais - do saber, poder e queres

fazer…

Assim, perante uma crescente complexidade, extensão e mult idimensionalidade dos

“ organismos” urbanos36 e das patologias que desenvolvem, coloca-se, cada vez mais, a questão

de como const ruir e desenvolver competências colect ivas que permitam combater a natureza e a

origem destes sintomas.

Kearns e Paddison (2000), caracterizando como “ int ensas as interacções face-a-face e

crescent es os f luxos de informação e comunicação a longas distâncias” dos sistemas urbanos,

observam que da “ espessura inst itucional do território” , cuj a densidade é resultante de

processos evolut ivos (polít icos, sociais, funcionais,.. . ,), resultam diferentes competências de

t rabalho em equipa pelos agentes locais, o que condiciona a própria agilidade e ef icácia das

polít icas, est ratégias ou programas de acção definidos.

Balducci (2001) apresenta, de resto, a relação que se estabelece ent re part icipação comunitária

e Planeamento Territorial, explicando o cont ributo da primeira para o sucesso do segundo:

/ o sucesso das est ratégias de regeneração urbana depende de abordagens que superem

efect ivamente a fragmentação sectorial e que mobilizem os actores locais e associações de

cidadãos

/ as abordagens part icipatórias têm conquistado legit imação e credibilidade vindo a superar

os insucessos das abordagens tecnocrát icas dirigidas para a resolução de problemas locais,

pelo que é importante a implementação de programas que promovam uma maior

part icipação local

/ a resistência da população a alguns programas deve ser encarada como uma consequência

da falta de habilidade dos promotores para lidar com as necessidades e exigências locais

/ o sucesso da implementação de proj ectos depende da forma como estes proj ectos

assumem, em si, as razões da população local, devendo encarar-se a part icipação dos vários

actores locais como uma condição para a viabilidade do sucesso (comercial, social, polít ico)

desses proj ectos de desenvolvimento local

36 que consoante as formas, dimensões ou formas de funcionamento que apresentam podem ser designadas por: �conurbações�, �megalópoles�, �áreas metropolitanas�, �cidades�..

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Reflect indo sobre os usos da part icipação no Planeamento, Balducci (2001) ident if ica, para além

das razões j á referidas (da procura de uma maior inclusão social na fase de concepção, da

redução da resistência comunitária à implementação ou de procura de melhores impactos no

desenvolvimento dos proj ectos), mais uma ent rada de duplo sent ido :

por um lado a const rução de polít icas mais ef icientes mediante uma melhor selecção de

est ratégias, nomeadamente ao nível da const rução de uma orientação geral e de acções

concretas para territórios

por out ro, o fortalecimento de um sent imento de pertença dos cidadãos aos territórios e aos

restantes agentes do seu espaço de vizinhança de forma a dissipar o sent imento de

“ bewilderment ” ou “ spaesamento” , em italiano, que t raduz o estado de desorientação de quem

se sente perdido dent ro de um território e que parece estar associado a um aumento de

insegurança urbana, à perda da consciência pelos direitos e deveres de cidadão na sociedade

contemporânea, à difusão de sent imentos Nimby, à dif iculdade de tomar decisões face a

complexidade de problemas e de hipóteses de intervenção, etc.

As ideias e abordagens do Planeamento Colaborat ivo, frequentemente referenciadas com out ros

t ipo de designações, como iremos ter oportunidade de apreciar ao longo desta dissertação, têm

vindo a ser, cada vez mais, valorizadas por um número diversif icado de mot ivos como se procura

apresentar seguidamente.

A este respeito, o Departamento de Ambiente do Reino Unido, em 1994, promoveu uma

avaliação aos resultados obt idos pela incursão da part icipação pública em diversos contextos de

planeamento e em várias cidades do Reino Unido, tendo concluído que este t ipo de abordagens

promovem uma:

/ resolução mais ef icaz de conflitos,

/ maior ef icácia na obtenção de obj ect ivos e

/ maior cont r ibuição para a qualidade f inal dos produtos de Planeamento

Por seu lado, Davies (2001) a part ir da avaliação do cont ributo da part icipação para as temát icas

ambientais, conclui que esta permite uma maior democrat ização desta área temát ica,

permit indo uma integração das diversas percepções (opiniões, discursos, sensibilidades)

comunitárias para as várias decisões dos planeadores

Davies (2001) nota que a concepção de planeamento como uma empresa comunicativa (Healey, 1997b) cria

esperança numa forma democrática de planeamento no contexto contemporâneo. Observa que a noção de

democracia evocada supõe um entendimento mútuo e intersubjectivo referenciável a um determinado espaço e

tempo.

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Conclusões semelhantes foram, de resto, ret iradas por Gonçalves et al. (2000, p.156),

relat ivamente à avaliação de um conj unto de estudos de caso no Reino Unido (em Hampshire e

Sheff ield)37 que envolveram a part icipação comunitária relat ivamente à gestão de resíduos

sólidos e da água, tendo-se concluído que:

/ O envolvimento das comunidades permite “ melhorar a qualidade e relevância das análises

dos técnicos e reforçar a sua legit imação e aceitação pública”

/ O papel dos leigos qualif icou a ident if icação dos problemas a analisar e a est ruturação dos

debates: os públicos tenderam a alargar o leque de questões a analisar, por comparação

com as que os peritos int roduziam, não se rest ringindo às temát icas mais directamente

relacionadas com impactos ambientais e incluindo out ras como as de economia do sistema,

o cont rolo de aplicação dos regulamentos, etc.

/ O facto das pessoas serem quot idianamente expostas a várias fontes de informação, (que

não só as cient íf icas e técnicas, como por exemplo as da sua experiência pessoal, as

informações veiculadas pela comunicação social, pelos grupos act ivistas, etc.) permit iu-lhes

a comparação e ponderação de informação de diferente origem sobre a mesma temát ica,

qualif icando as decisões f inais

/ Observou-se, ainda, uma maior exigência por parte da população na percepção e avaliação

dos riscos ambientais, repercut indo-se essa exigência não só na análise da magnitude dos

riscos, como na forma de lidar com eles ao nível dos processos de decisão.

Por seu lado Navarro (s/ data)38 analisando o processo de decisão e implementação da

dist ribuição de fundos públicos que é desenvolvido na cidade brasileira de Porto Alegre at ravés

de abordagens de part icipação, que aí são of icialmente designados por “ orçament o

part icipat ivo” (Anexo 2), conclui que a ut il ização destas metodologias para além de terem

“ mudado radicalment e a hist ória das relações polít icas e sociais na cidade e t er ul t rapassaram

as expect at ivas iniciais” , uma vez que geraram:

/ Uma redução do desperdício usual no uso de recursos públicos;

/ Um processo de descent ralização do poder municipal, que define como “ inédita e real” ,

com uma inevitável diminuição da concent ração de poderes nas mãos do perfeito;

/ A diminuição, se não o abandono, pelo menos a visível redução de prát icas clientelistas e

de corrupção;

37 estudadas por Judith Petts e Steven Yearley

38 Sociólogo e Professor da Universidade Federal de Rio Grande do Sul

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/ Uma maior racionalidade e ef iciência da administ ração

/ Uma maior j ust iça social na alocação de recursos públicos

Ainda no contexto brasileiro, Pyle (2001) avaliou o proj ecto de concepção e implementação da

pavimentação de ruas e saneamento básico numa favela do Recife, concretamente no bairro de

João de Barros concluindo que a ut il ização dos procedimentos part icipat ivos ao longo de todo o

processo, permit iu a criação de uma relação de parceria ent re o governo e comunidade, a

promoção de uma cidadania act iva, assente em mecanismos que permit iram à comunidade

inf luenciar as decisões públicas

Pyle (2001) concluiu que os impactos deste proj ecto ult rapassaram largamente os benefícios

directos relat ivos à saúde e conforto da população, gerando também impactos indirectos, mas

interrelacionados como:

/ um maior invest imento dos moradores em suas casas, subst ituindo barracos por casas de

alvenaria

/ um mais fácil acesso de carros e ambulâncias, que permit iu uma mais fácil recolha de lixo e

uma diminuição de act ividades criminosas.

/ um maior dinamismo económico nas act ividades instaladas, nomeadamente na af luência e

vendas do Cent ro de aprendizagem de carpint aria e fabricação de armários

/ uma maior integração urbana e territorial desta área na est rutura urbana e económica do

Rio de Janeiro.

Crescentemente defendidas por organismos internacionais doadores de f inanciamentos, as

abordagens part icipatórias têm-se assumido como requisitos obrigatórios de alguns regulamentos

associados a programas da União Europeia, questão aprofundada no capítulo 2 e, ao nível

mundial, no apoio aos países em vias de desenvolvimento protagonizados pelo World Bank:

“In 1994, the World Bank concluded that stakeholder participation would enhance the quality, effectiveness and

sustainability of its projects. As the Bank aims to become more accountable and client-centred, it is encouraging

the governments it assists to promote the participation of a wide range of stakeholders, especially the poor

themselves” (Wilson, 1997, p.750)

Esta crescente incursão da part icipação pública no planeamento local, tem vindo a aligeirar

crít icas e polémicas associadas a uma suposta visão monolít ica e distanciada do senso comum

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por parte da administ ração39, favorecendo uma percepção mais posit iva dos processos de decisão

no planeamento.

Minimizando as críticas sociais e de alguns autores, por exemplo de Lourenço (1997) ou Sousa Santos (1987)

relativa à predominância dos pareceres técnicos e científicos nas diversas esferas de tomada de decisão da

sociedade portuguesa ou à própria politização da ciência que, segundo alguns autores, decorre da dependência da

investigação académica ao aparelho do estado.

Outras controvérsias associadas às decisões científicas relacionam-se com facto da utilização de metodologias

supostamente rigorosas e objectivas não conferir aos cientistas e decisores o dom da infalibilidade ou o processo

de burocratização e tecnocratização dos processos de decisão se ter “transmutado” em interesses económicos e

políticos ou de grupos de pressão local (Gonçalves et al., 2000, p.4).

Higgins e Morgan (2000) por seu lado, têm vindo a valorizar o cont ributo destas novas

metodologias de t rabalho para lidar com novos problemas e desafios e est imular a criação de um

“ pensamento criat ivo” permita a const rução de soluções inovadoras e ef icazes.

“…Creative thinking is a key capability that helps individuals and organisations deal with and manage change,

which is fundamental do the nature of the planning process. As change becomes more rapid and discontinuous, it

is crucial that there are people in the profession that are able to turn problems into oppor tunities, while

acknowledging the contradictions. Often, this involves seeing things from a new perspective and breaking

away from traditional ways of thinking that may have lost their meaning” (Higgins e Morgan, 2000, p.1117).

Exemplos de actuações capazes de transformar potenciais constrangimentos em oportunidades, foram as de

alguns territórios que souberam aproveitar factores como a multiplicidade étnica, que poderia ser um foco de

potencial conflito social, na oportunidade (bastante valorizada por muitos turistas) de uma diversificada oferta

cultural, comercial, …, no fundo de uma heterogeneidade que se afirma pela positiva. Alguns destes espaços, já

designados por “territórios de tolerância” têm vindo a granjear uma crescente visibilidade internacional por

valorizar a sua diversidade cultural e rácica. Tal é o caso de metrópoles cosmopolitas como Londres, cuja

diversidade rácica está bem patenteada pelo publicitado festival de Nothing Hill ou áreas comerciais na China

Town; ou Sydney que se tem evidenciado pela sua celebração da diversidade e tolerância sexual através da

organização de paradas gay,

Em síntese, a const rução de competências colect ivas territoriais ent re todos os sectores da

sociedade tem favorecido:

/ O adicionar de valor social à act ividade de Planeamento Territorial, incrementando o nível

de confiança da população nos modos de decisão e actuação da administ ração pública;

/ O aprofundar da colaboração territorial com vista à resolução de conflitos e obtenção de

consensos;

39 a este propósito note-se que o Inquérito às Atitudes Sociais dos Portugueses (ASP), de 1999, que foi coordenado por Villaverde Cabral e Vala, concluiu que �os portugueses consideram que os seus governantes raramente ou nunca os ouvem em matérias que lhes dizem directamente respeito�, para mais ver http://noticias.sapo.pt/artigos/CCDAAI,chafaa.html

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/ A qualif icação dos produtos f inais do planeamento, mediante a criação de situações

favoráveis ao debate e ref inação de alternat ivas e est ratégias;

/ A prevenção do aparecimento de possíveis focos de contestação pública, antecipando uma

melhor recepção pública às decisões e maiores níveis de at ract ividade dos territórios;

/ A const rução de capital relacional, gerando maiores níveis de responsabilidade e dest reza

nos part icipantes e uma maior predisposição para envolvimentos futuros.

Pode-se, pois, concluir que o envolvimento da comunidade no Planeamento Territorial tem

deixado, gradualmente, de ser interpretado como uma barreira adicional ao desenvolvimento,

mas como uma forma de acelerar e qualif icar o processo decisório gerando uma antecipada

criação de valor como o aumento da responsabilidade pessoal dos part icipantes, uma maior

predisposição à implementação das soluções ou coordenação da actuação dos vários actores

locais.

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45

1.3.3 - A promoção de boas prát icas de governação

Part indo da hipótese de que o Planeamento Colaborat ivo pode favorecer melhores prát icas de

governação territorial, este ponto est rutura-se em duas temát icas essenciais: em primeiro lugar,

ref lecte-se sobre os factores que têm cont ribuído para a crescente complexif icação e

dif iculdade da tarefa da governância nas grandes áreas urbanas contemporâneas; em segundo, e

a part ir da clarif icação conceptual da noção de governância, com base na opinião de alguns

planeadores, procede-se à ident if icação das principais tendências do novo modelo “ alternat ivo”

de governância que tem vindo a ser formatado internacionalmente e aplicado, pontualmente, no

tempo e espaço, a alguns contextos de planeamento

O interesse pelas questões da governância resultou do efeito conj ugado de uma maior

complexidade, dinâmica e diversidade dos sistemas territoriais (Valente Oliveira, 2001). Em

causa passou a estar a habilidade do estado para lidar com a “ natureza” das sociedades urbanas

definida por Richard Margerum (1999) como, simultaneamente, polít ica e complexa.

Pense-se na complexidade associada à expansão urbana difusa, desordenada e descont ínua, à

fragmentação funcional e locat iva, à mult iplicação de agentes territoriais ou de modos de vida

urbanos ou à est rat if icação socioeconómica geradora do que Kearns e Paddison (2000) designam

pelo território dos “ bit s and pieces” .

Dos bocados e pedaços que se vão ligando, muito embora de forma descontínua, como resultado de novas formas

de uso da cidade que se repercutem na construção de novas formas espaciais resultantes, por exemplo, da procura

da vida suburbana, como lugar de residência, consumo ou trabalho, com um progressivo afastamento aos centros

tradicionais que vão transformando em lugares “distantes” associados às conhecidas patologias urbanas de

degradação dos edifícios, falta de fluidez de trânsito, abandono residencial, perda de vitalidade comercial,…

Pense-se no desf io associado à def inição do melhor sistema de governância europeia, que regule

as relações e competências desta instância comunitária sem se imiscuir em competências dos

estados, no desafio associado à formulação de polít icas de Planeamento Territorial, que

dist ribua ef icazmente os meios f inanceiros de todos para as partes, permit indo, por exemplo a

concret ização de um idealizado esquema de desenvolviment o para o espaço europeu baseado

num policent rismo que anseia uma maior coesão e equilíbrio territorial e promova a criação de

redes de complementaridade e colaboração.

Pense-se na emergência do desafio da governação nos tempos da globalização, que tem

int roduzido o debate sobre a “ governância global” , nomeadamente sobre a forma, a

configuração inst itucional de uma governância internacional capaz de lidar com algumas

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dinâmicas supranacionais (económicas, sociais, ambientais), que ult rapassam as competências

do Estado.

Pense-se no desafio da própria governância local associado à necessidade da resolução de

problemas locais que têm origens globais e exigem soluções, simultaneamente, globais e locais.

A este propósito alguns autores têm vindo a sublinhar que o local, não obstante ser construído pela sobreposição

de interesses locais e globais, pode ser actor e “dono do seu destino” (Rosas, 199, p.37), conforme defendem

Amin e Thrift (1993).

“We therefore reject views of the local in the global as autarchic ‘contingent’, amoeba-like, expressive of only

physical fixity in the space of global capital flows or of identity and stability in the unseating speed of modern

existence. Instead, we wish to emphasise the continued salience of places as settings for social and economic

existence, for forging identities, struggles and strategies of both local and global nature” Amin e Thrift (1993).

Para Bourdin (1998) é a própria atomização da sociedade que tem gerado uma diminuição da

governabilidade e exigido o desenvolvimento de modelos de governação mais ef icazes para gerir

um sem número de interesses limitados e part iculares de diversas inst ituições e organizações

(sindicatos, associações ambientais, etc.).

Para este autor, também, a consciência de que a acção pública não é só o que faz o estado, pela

af irmação de proj ectos de partenariado ent re sector público e privado e de coligações com as

colect ividades territoriais, tem aumentado o interesse pela ref lexão sobre a gestão urbana,

nomeadamente sobre novas formas de organização de proj ectos de desenvolvimento territorial,

oo que tem vindo a suscitar um crescente interesse pelas técnicas modernas de gestão de

empresas, de concertação, etc. (Bourdin, 1998, p.184).

Para Bourdin (1998) a noção de “ governância” 40 repousa na ideia de que governar hoj e consiste

na coordenação de uma mult iplicidade de actores para produzir um mínimo de interesses

comuns numa sociedade fragmentada. É, portanto, evidente a relação que este autor estabelece

ent re o obj ect ivo da governância e um processo de coordenação que, em sua opinião, pressupõe

uma mobilização colect iva em torno do obj ect ivo de concertação permanente.

Também no campo da teoria do Planeamento esta associação tem sido estabelecida

recorrentemente.

Por exemplo, Healey (1997a) refere-se ao conceito de “ governância” para designar a maquinaria

formal do governo, as alianças informais e a rede de t rabalho at ravés das quais os grupos

económicos, ambientais e de vizinhança se inter ligam com a administ ração pública local para

gerir aspectos de interesse colect ivo.

40 um neologismo influenciado pelo termo inglês �governance� e francês �gouvernace�

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“it is a matter of specific geography and history how responsibility are distributed between formally-recognised

government agents and…other areas of governance” (Healey, 1997a, p.208).

Propõe, de resto, um novo sent ido e modelo de governância, caracterizado por mais colaboração

e menos hierarquia. Para tal sugere uma reformulação da hard inf rast ruct ure existente, por

exemplo ao nível do enquadramento legal que define as relações e os cent ros de poder, e a

criação de uma sof t inf rast ruct ure, i.e., uma prát ica de planeamento baseada numa

aprendizagem mútua e const rução de suf icientes consensos (Healey, 1997a, p.199).

Kearns e Paddison, (2000) referem-se à “ governância urbana” como a acção de governo da

cidade, incluindo o conj unto do sistema de relações ent re inst ituições, organizações e

indivíduos, que é capaz de assegurar a realização de proj ectos colect ivos. Estes autores face à,

j á referida, complexidade dos sistemas urbanos contemporâneos af irmam a necessidade do

Planeamento Territorial se adaptar mediante a criação de novos arranj os inst itucionais que

possibilitem melhores resultados.

Valente de Oliveira (2001) caracteriza por “ governância” a forma como estão organizadas as

act ividades do governo, dos agentes polít icos, administ rat ivos e sociais, considerando, de uma

forma sintét ica, que a governância é a análise a quem faz o quê e como, por dist inção com o

que é que se faz (Valente de Oliveira, 2001, p.7).

Reflect indo sobre o debate da governância ao nível do Ordenamento do Território, Valente de

Oliveira (2001) apresente alguns aspectos que, em sua opinião, j ust if icam que se opte por um

modelo est ruturado por formas de t rabalho e inst rumentos que permitam a interacção “ como

forma de aprendizagem” ent re os vários sectores da sociedade. A saber:

1. O facto do ordenamento do território se apresentar como um corpo privilegiado para a

def inição de novas formas de interacção ent re o governo e sociedade;

2. Dos sistemas territoriais (regiões, cidades, bairros, . . .) serem sempre sistemas complexos

que têm de ser administ rados por “ formas que têm de ter variedade para fazer face à

variedade” . Assim começa-se por reclamar mais inter-relações do que ordens…” o dit ador,

mesmo i luminado não t eria capacidade para cont emplar a imensa variedade de sit uações

que se põe” ;

3. Há garant ias e direitos dos cidadãos que têm de ser acautelados sendo, para isso,

necessário produzir leis. “ Todavia as leis concebidas no recolhimento dos gabinetes sem

resultar de um longo processo ent re administ radores e administ rados correm o risco de ser

inconsequentes” . Por esse mot ivo Valente de Oliveira (2001) propõe um carácter

interaccionista para as formas e est ilos de governância (Valente de Oliveira, 2001, p.31).

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A este propósito Balducci (2001) reflectindo sobre a experiências de planeamento no caso de Milão, conclui ser

fundamental um processo de discussão pública sobre o tipo de transformações desejáveis para a cidade, com vista

à criação de condições para o desenho de soluções políticas mais viáveis, que possam reduzir a forma

incrementalista e desregulada de como essas decisões habitualmente são tomadas. Balducci entende que só com

uma visão partilhada dos problemas e oportunidades, se poderá criar uma visão geral de desenvolvimento que

impeça que as decisões tomadas no dia a dia sejam influenciadas por pressões oportunísticas de interesses

privados (Balducci, 2001, p.7).

Também Kearns (2000) converge para esta opinião postulando a adopção de um modelo de

governância colaborat ivo capaz de se adaptar a uma act ividade de planeamento territorial que

é:

/ “ mult i-níveis” , por se desenvolver no interior de um conj unto de redes com uma elevada

densidade de relacionamentos, associando-se a uma sobreposição de escalas de decisão e

intervenção, diferentes temporalidades e especif icidades de obj ect ivos, etc;

/ globalizada, uma vez que as relações de um território local podem t ransitar do nível

nacional para o internacional, por exemplo por afectação de polít icas comunitárias dirigidas

para o local ou procura de internacionalização do local;

/ exigente em termos da necessidade de colaboração territorial com vista à obtenção de

vantagens comparat ivas, como a capitalização de oportunidades de invest imentos, at racção

de fundos governamentais, etc.

Muito embora as característ icas, apresentadas por Kearns (2000), só por si, pudessem j ust if icar

um modelo de governância est ruturado em formas t rabalho, formais ou informais, baseadas na

colaboração e part ilha ent re indivíduos e inst ituições, públicas e privadas, relat ivamente a

assuntos de interesse comum, na realidade este está dependente de out ros factores a montante.

Newman e Thornley (1996) ident if icam, por exemplo, a inf luência da est rutura legal e

governamental por determinar, onde se situa o locus do poder ou escala territorial de decisão41,

a dist ribuição das responsabilidades pelos vários departamentos do estado, a abrangência do

sistema de planeamento, a sua relação com comunidade e sector empresarial, etc.

Em qualquer particular instância, as formas e estilos de governância representam uma mistura de tendências, por

exemplo resultantes de tensões para responder às exigências de vários grupos sociais. A este propósito, Ferrão

(1999) afirma que “ os modos de governância (…) são o produto de contingências locais de transição cultural dos

lugares e comunidades política e a dinâmica de mudança que moldam essas tradições…” (Ferrão, 1999, p.240)

41 sendo a este nível importante o balanço entre governo central e local, uma vez que condiciona a autonomia e força do Planeamento Urbano a um nível mais próximo do cidadão,

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Para além da inf luência exercida pela maquinaria legal e administ rat iva de um estado, out ros

autores (Oliveira, 2001; Balducci, 2001, Figueiredo, 2001) ident if icam a importância da própria

espessura inst itucional do território, caracterizando-a pela diversidade, qualidade e número das

inst ituições, mas também pelo grau de interacções que estas estabelecem, considerando-a

crucial para a capacidade de concertação dos actores em torno de alguns consensos e para uma

mobilização para a acção

“Há sociedades, como a holandesa, em que o número e a variedade das organizações da chamada sociedade civil

é enorme, para todos os assuntos se encontrando um rosto associativo que agrega os problemas e para eles, além

da representação, oferece sugestões de soluções” Valente de Oliveira (2001)

Também nesse sentido, Balducci entende que o “overcrowding” (ou elevada lotação) de arenas de decisão

constitui um recurso, em vez de um obstáculo, uma vez que, num momento em que a instabilidade é contínua,

esta mobilização territorial de actores pode permitir a criação de consensus building à volta de ideias de

desenvolvimento, podendo mobilizar para a acção.

Balducci (2001) vai mais longe e afirma que o discurso público que não for capaz de orientar uma multiplicidade

de acções, que vão para lá das tarefas da autoridade formal do plano, nunca terá condições para o efectivar,

principalmente se considerarmos que, não raras vezes, essas decisões são tomadas por equipas exteriores à

administração, contratadas para essa função específica e sem responsabilidades pela sua implementação, o que se

consubstancia num gap entre as formulações e concretizações

Em suma, parece haver algum consenso em redor da importância da “ coordenação” de vários

interlocutores locais, não só para qualif icar as tomadas de decisões individuais, como a

formatação de est ratégias colect ivas propiciando uma mais ef iciente ut il ização, gestão e

potencialização de recursos e meios, de forma a que como aconselha Figueiredo (2001) “ as

polít icas públicas e os proj ectos privados de empresas e organizações em geral, deixem de se

limitar a um zapping cont inuado sobre o território” (Figueiredo, 2001, p.5)

Para tal Healey (1997a) propõe que se desafiem as t radicionais relações de governância

hierárquica e se promova uma noção de “ collaborat ive governance” ao nível do Planeamento

Territorial (Healey, 1997a, p.199), de forma a que se diminua o diferencial ent re o papel act ual

e o desej ável para o Planeamento Territorial (Healey, 1992).

Nesse sent ido Kearns (2000) considera que é imprescindível que se ult rapasse a ideia de

“ readquirir cont rolo” em det rimento da ideia de “ gerir e regular as diferenças”

(…) fala-se, cada vez mais, da necessidade de criação de partenariados, aludindo à necessidade de criação de um

conjunto de parcerias de actores que juntam esforços para atingir objectivos em comum. Estes partenariados

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podem desenvolver-se num quadro de geometria variável, quanto aos intervenientes, promotores da cooperação,

objecto de cooperação, etc. (Kearns, 2000)

Também no III Encontro Nacional de Planeadores do Território (1999, in

http://sweet.ua.pt/~appla/arquivo/conclusoes3.html, p.3) se salientou a necessidade de “coordenação e

cooperação entre os vários organismos, instituições e actores sociais e económicos locais para a implementação

de acções concretas em termos de Desenvolvimento Regional e de Políticas regionais”.

A este propósito Elizabete Figueiredo assinalou a importância da reorganização do Estado aos vários níveis de

Planeamento, a importância da reorganização dos serviços e organismos e da cooperação e coordenação entre

eles, mas, também, da capacidade de compreender a forma como a sociedade está organizada e da capacidade de

mobilizar os vários actores nessa sociedade para os objectivos do Desenvolvimento Regional

A este respeito, Valente de Oliveira (2001) é peremptório quando af irma que j á não faz sent ido

os “ tempos em que o governo de uma sociedade era suscept ível de desempenho por poucos,

at ravés de formas muito hierarquizadas, com um chefe no topo” , mediante um modelo

“ piramidal de exercício da autoridade e desempenho de funções colect ivas” (Valente de

Oliveira, 2001, p.8). Um modelo que, de resto, é crit icado por Ascher (1998) por avaliá-lo como

“ pesado e inadaptado à variedade do local, por ser bloqueado pelas próprias burocracias e

const ituir um factor de deseconomia de escala” (Ascher, 1998, p.120)

Não obstante as críticas ao modelo hierárquico de governação, Oliveira (2001) refere a dificuldade de se proceder

a uma reforma administrativa decorrente das próprias barreiras colocadas pela própria administração que resiste à

perda de poder ou lugares de trabalho. Para além da dificuldade de desburocratizar o sistema e eliminar

obstáculos à iniciativa privada, observa-se uma tendência para uma privatização que não salvaguarda os

interesses dos cidadãos.

“A atracção da privatização relacionava-se com o encaixe de frutos financeiros de transferência de propriedade,

…passar para terceiros o ónus da definição de preços, etc.” (Oliveira, 2001, p.17) muito embora se entendesse

que esta podia ser uma solução interessante frequentemente não foi balizado pelos interesses sociais

“O mercado é um mecanismo de regulação eficaz em muitas circunstâncias, mas não em todas. Não se deve

privatizar porque isso está na moda e lavar as mãos, porque o mercado funciona. (…) Ele nem sempre funciona”

(Oliveira, 2001, p.19)

João Ferrão (1999) observa que se t rata de um período de t ransição, marcado pela necessidade

de rever crit icamente as propostas de natureza neo-liberal que propuseram subst ituir na década

de 80 a visão keynesiana (Quadro 1-3).

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Quadro 1-3: A t ransição de modelos de governância no Planeamento

Décadas 60, 70 Décadas 80, 90

“ estado assistencialista” , “ cidade gestora”

Marcadas pela “ ortodoxia assistencialista” , assente em polít icas públicas redist ribut ivas de t ipo Keynesiano para combater situações de maior privação que se vivia nas cidades.

Dominam os valores da cent ralização e gestão polít ico-administ rat iva. Há uma visão cent ralizada e hierárquica do exercício do poder, baseadas em relações vert icais aos vários níveis do poder

“ estado empreendedor” , “ cidade promotora”

Emergência da “ ortodoxia da compet it ividade, desenvolvida num ambiente de crescente liberalização dos mercados e de desregulação económica

As f inalidades sociais são subordinadas a prioridades económicas. Defende-se que apenas a crescente compet it ividade de empresas e lugares conseguirá criar mais riqueza e intensif icar processos de inovação.

Considera-se que o mercado, e não o estado, poderá ser agente de mudança.

Ao nível do planeamento territorial procuram-se os valores do empreendorismo proveniente do mundo empresarial. Esta tendência é evidente ao nível da aposta no market ing t errit orial que se desenvolve em contextos de crescente (real ou virtual) compet it ividade urbana.

Observa-se um emagrecimento e empresarialização de segmentos signif icat ivos da administ ração pública com o obj ect ivo de uma maior ef iciência da acção.

Formas de intervenção urbana

Baseiam-se em procedimentos mecânicos de dist ribuição de riqueza promovidos pelo estado providência.

A dist ribuição de riqueza é independente dos usos at ribuídos aos montantes e baseia-se em critérios de necessidade e obj ect ivos de j ust iça social.

Formas de intervenção urbana

Int roduz-se uma f ilosofia de compet ição ent re cidadãos na gestão e dist ribuição de recursos públicos. Promovem-se parcerias público-privado, mult iplicando-se as formas de cont ratualização

Consequências

Cultura de reivindicação assistencialista em que a pobreza signif ica mais acesso a fundos públicos, sem se assegurarem necessariamente boas prát icas da ef icácia e sustentabilidade do invest imento

Consequências posit ivas

+ reforço capacidade iniciat iva e agilização processos de decisão e gestão da administ ração

+ descent ralização baseada numa f ilosof ia de part ilha de responsabilidades

Consequências negat ivas

+ ambiente de compet ição por recursos públicos e de capacidades técnicas ent re autarquias

+ aprovações casuíst icas

+ parcerias com sector privado, valorizando interesses do sector económico em det rimento de sociais

+ gestão cont ratualizada que favorece, sobretudo no caso de pacotes abertos e de ausência de obj ect ivos de longo prazo, alguma instabilidade e fragmentação no que se refere a acções desenvolvidas

Baseado em João Ferrão (1999)

Um momento de t ransição que procura inventar uma abordagem al t ernat iva, que saiba ret irar as

devidas lições das ortodoxias anteriores e que permita a formatação de um modelo de

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governância baseado no obj ect ivo da const rução de um est ado socioeconómico capaz de

privi legiar a inovação democrát ica como element o cent ral dos processos de desenvolviment o e

bem est ar da população, para o que se torna fundamental (como, de resto, se salientou nos

pontos anteriores) a ideia de territórios inclusivos e integradores, guiados pelos princípios de

cidadania onde, como refere Ferrão (1999) “ a diferença sej a um valor posit ivo de dist inção para

cada um e para todos e também de realização pessoal e de af irmação da cidade enquanto

colect ividade territorial” .

Para tal, Ferrão (1999) propõe uma arquitectura42 “ que permita conciliar as vantagens da

organização de t ipo vert ical com os benefícios resultantes da mobilização e part icipação de

actores dist intos nas várias questões que se colocam a diferentes escalas geográf icas,

est imulando a consolidação de uma ‘ inteligência colect iva’ (Ferrão, 1999, p.6) baseada em

abordagens part icipatórias de forma a poderem-se estabelecer ligações ent re “ as partes e o

todo” (Balducci, 2001, p.115)

Por seu lado Gibelli (1999), reconhecendo a insat isfação perante os resultados obt idos pelas

abordagens e cenários inst itucionais que caracterizam o actual estado do planeamento,

nomeadamente à escala met ropolitana e a tensão face à necessidade de um novo modelo de

governação no planeamento, defende uma lógica de governação incrementalista na qual a

inst ituição sej a o resultado de um processo de const rução progressiva de consensos ent re os

principais actores inst itucionais locais, segundo uma ópt ica de “ visione condivisa” .

Uma visão com “ divisão” ou redist ribuição e part ilha de competências e responsabilidades

fundada sobre a complementaridade e interact ividade inst itucional. Segundo Gibelli (1999) esta

formulação j ust if ica os seus fundamentos com a consideração de que “ t al i approcci sembrano

garant ire una migl iore ef f icacia di r isul t at i e maggiori opport unit à di ampl iament o e

diversif icazione nel t empo del le compet enze e del le funzioni esercit at e al la scala vast a: è

appunt o i l t ema del la ‘ governance’ che si fa st rada come superament o del model lo t radizionale

di carat t ere gerarchico-piramidale” (Gibelle, 1999, p.89)

Sem procurar aprofundar o modelo de Gibelle (1999) ref ira-se que ela propõe um processo de

delegação de competências segundo uma ópt ica progressiva, iniciando-se por uma delegação de

competências modestas, seguida de fases consecut ivas em que se procura at ingir uma maior

maturidade. No fundo, um alargamento de poderes dependente do alargamento de proj ectos

42 Particularmente no respeitante à formulação de políticas urbanas, propõe que o nível central seja o patamar �normativo e estratégico�, cabendo-lhe a definição de grandes linhas estratégicas de desenvolvimento e das condições de enquadramento de reformas, políticas e programas ao nível nacional; o nível regional seria o da mobilização para o debate acerca das condições de desenvolvimento, segundo o ponto de vista de cidadãos e organizações, assumindo a coordenação das políticas e programas com forte incidência territorial; finalmente, o nível mais próximo do cidadão (local) deveria ser o nível operacional implicando, para tal, os actores da área, nomeadamente sector público, privado, associativo, etc. (Ferrão, 1999, p.6)

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ent retanto alcançados. “ Un model lo apert o e increment ale in cui I pot eri vengono conquist at i

dal le ist i t uzioni sovralocal i at t raverso una legit t imazione che deriva loro dal le buone

prest azioni, piut t ost o che per decret o” (Gibelle, 1999, p.96)

Em suma, num contexto em que se mult iplicam os actores e inst ituições territoriais, públicas e

privadas, a ref lexão internacional sobre os modelos de governância no planeamento territorial

sugere uma forte aposta na interacção horizontal capaz de ir auscultando, envolvendo,

comprometendo e assegurando a part icipação dos diferentes nós da rede de t rabalho.

A criação de l inks e formas de relacionamento mais efect ivos, vert icais mas especialmente

horizontais visam uma mais efect iva coordenação ent re os vários actores de decisão43 e a criação

de modos de governância mais democrát icos e pluralistas, que permitam uma melhor integração

sectorial nas formas de intervenção, com vista à criação de sinergias, ao incremento da

agilidade dos actores e à capacidade de aprendizagem e de inovação colect iva

Está portanto lançado o desafio para um maior correcto relacionamento ent re a administ ração

pública e comunidade, ent re o sector público e privado (não se resvalando para situações de uma

proximidade que favoreça grupos de interesses específ icos, nem para um distanciamento que

impeça o correcto funcionamento económico e social dos territórios), ent re as várias inst ituições

do sector público de forma a evitar-se uma compart imentação ent re os vários sectores, saberes

disciplinares ou organizações responsáveis pela produção e gestão de conhecimentos e decisões,

que, no seu conj unto, ponha em causa uma ef iciente governabilidade do território.

O segredo está, como sugera Valente de Oliveira (2001), citando Piccoto (1997),na criação de

polít icas que assegurem os t rês vért ices do t riângulo:

Figura 1-1: Desafios para as polít icas de planeamento territorial

43 antecipando, por exemplo, de forma prospectiva, impactos de decisões sectoriais para os restantes elementos do sistema e, globalmente, para o próprio funcionamento do sistema.

market friendly, i.e, amigas do mercado

people friendly, i.e., amigas das pessoas

environmental friendly, i.e.,amigas do ambiente

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O desafio para o Planeamento Territorial é, em suma, o da conciliação dos critérios de

sustentabilidade ambiental, social e económica, sendo est ratégico e fundamental a ut il ização de

abordagens de planeamento colaborat ivo para o envolvimento e mobilização de actores na

concepção e implementação de polít icas e programas

Como síntese da ref lexão est ruturada sobre o potencial de melhoramento da abordagem

colaborat iva para o Planeamento Territorial, assinalem-se as suas qualidades:

/ de promoção da cidadania, nomeadamente dos direitos e responsabilidades dos cidadãos na

definição da visão de futuro ideal para o território, podendo incrementa o sent imento de

pertença dos cidadão em relação ao seu local de residência;

/ de produção de capital social, inst itucional e intelectual, com repercussões para a

prosperidade territorial e incremento da confiança interpessoal;

/ na qualif icação dos produtos de planeamento e incremento da confiança para com os

representantes eleitos pelo sistema de representação democrát ica;

/ para lidar com a fragmentação e complexidade das sociedades urbanas, favorecendo

modelos de governância interaccionistas, mais adaptados à diversidade de interesses locais.

Associada à crescente profusão de art igos sobre as virtualidades das abordagens part icipatórias

no Planeamento Territorial, especialmente ao nível internacional, permite observa-se ainda:

1. uma inquest ionável riqueza ref lexiva sobre o que deve ser e como se deve promover o

planeamento, quest ionando-se o que se produz (o out put do Planeament o t erri t orial) e a

forma como se produz (o processo);

2. um carácter ainda embrionário desta corrente, que se caracteriza por uma evidente

ebul ição terminológica ainda não estabilizada e uma implementação pontual, que, no

entanto, evidencia j á um número crescente de seguidores entusiasmados com o potencial

que ela encerra

3. um denominador comum de rej eição à t radição tecnocrát ica do planeamento e aos modelos

de governância cent ralizados e hierárquicos, postulando um Planeamento mais j usto,

equitat ivo, dialogante e preocupado com a const rução de suf icientes consensos ent re os

vários sectores da sociedade;

Como ponto f inal e menos posit ivo, nota-se um déficit de ref lexão sobre as limitações desta

corrente, o que tem dif icultado uma ref lexão sobre os seus pontos fracos, nomeadamente ao

nível das metodologias da part icipação e condicionado o seu aperfeiçoamento.

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No sent ido de minimizar esta lacuna, no ponto seguinte, faz-se uma revisão da bibliograf ia sobre

as limitações ou dif iculdades com que se confronta o Planeamento Colaborat ivo que é, não

obstante apresentada de uma forma resumida e necessariamente breve.

Considera-se que uma maior consciência das suas principais debilidades, poderá sugerir vias para

a sua minimização e um aperfeiçoamento teórico e prát ico que permita um fortalecimento das

algumas das suas potencialidades, anteriormente ident if icadas.

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1.4 - Ident if icação das limitações do Planeamento Colaborat ivo

Muito embora a maior parte dos exemplos da literatura de Planeamento em que a abordagem

colaborat iva tem emergido como tema principal, se reportem, predominantemente, à

apresentação das virtualidades deste Paradigma, alguns autores têm focalizado a sua atenção

nas dif iculdades que se colocam à sua conceptualização teórica e, principalmente,

implementação prát ica, em termos do desenvolvimento de boas prát icas colaborat ivas ou de

implementação concreta dos out put s daí resultantes.

Tais invest igações, que se cent ram na razão de ser dos relat ivo fracasso da implementação do

Planeamento Colaborat ivo, têm vindo a possibilitar uma ref lexão aprofundada sobre os

problemas associados à planif icação de proj ectos de part icipação pública no planeamento

territorial, à necessidade de ident if icar antecipadamente alguns imponderáveis que emergem

durante o envolvimento de actores, à necessidade de ult rapassar os obstáculos que se opõem à

implementação de decisões, etc.

Part indo do pressuposto de que estas perspect ivas const ituem cont ributos para a qualif icação

teórica deste paradigma, desenvolve-se uma revisão aos principais argumentos que quest ionam

esta corrente, o que permit irá, durante o próximo capítulo (Capítulo 2), cent rar o estudo das

teorias da part icipação na descoberta de percursos capazes de superar, ou pelo menos

minimizar, os problemas que são seguidamente ident if icados.

Com vista a uma maior clareza exposit iva, eles são diferenciados em t rês grandes grupos,

correspondentes a t rês fases do próprio ‘ proj ecto’ de part icipação pública, ident if icando-se,

portanto, as limitações associadas:

1. à planif icação do proj ecto de part icipação;

2. ao processo de envolvimento dos actores; e

3. à implementação das decisões.

Refira-se que, com esta est rutura de apresentação, não se pretende ser exaust ivo, nem abarcar

todo o t ipo de problemát icas que se colocam ao desenvolvimento do Planeamento Colaborat ivo,

mas, apenas, int roduzir o debate sobre alguns dos principais problemas que j ust if icam a

manutenção de um elevado nível de cept icismo por parte de algumas secções da comunidade

cient íf ica.

“A multi-stakeholder society seems to require the latter and the more participatory forms of policy development

provided by inclusive collaboration multi-party planning approaches” (1998, p.15)

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“Collaborative planning as an approach in a multi-stakeholder society is thus justified because it is more efficient

(…) because it is more politically legitimate and because it ‘adds value’ to the on going flow of place-making

opportunities for creative synergy and developing the capacity among stakeholders to wok together locally to

solve common problems” (Healey, 1998, p.18)

A part ir deste pequeno ext racto de Healey (1998b) acerca de algumas das vantagens da

abordagem colaborat iva, podem ident if icar-se, de modo int rodutório, algumas dif iculdades que

lhe são int rínsecas, nomeadamente a dif iculdade de planif icar processos colaborat ivos ent re

múlt iplos representantes de opinião ou a dif iculdade de gerir processos deste t ipo e de chegar a

consensos, que sej am, simultaneamente, aceites por todos os part icipantes e coincidentes com

os princípios basilares do planeamento, nomeadamente j ust iça e equidade social ou preservação

ambiental.

Quer isto dizer que as virtualidades que Healey(1998b) apresenta (maior ef iciência,

legit imidade, valor…) estão dependentes do próprio sucesso do proj ecto colaborat ivo e de uma

correcta interpretação do conceito, t radicionalmente vago e unitário de “ interesse público” .

Em causa está a legit imação social das decisões at ravés da const rução de novas formas de

organização e de part icipação horizontal que, não podem, no entanto, ser indissociáveis das

dif iculdades associadas ao estabelecimento de critérios ‘ pacíf icos’ para a selecção dos

representantes ou das ‘ melhores’ metodologias para a criação de compromissos sustentáveis ao

longo do tempo.

Conforme observa Davies (2001) “however, despite the abundance of political and academic support for the idea

of greater public participation in planning every day experiences do not, as yet, suggest a revolution in practice”

(Davies, 2001, p.194),

There are still significant gaps between theory and practice and between political rhetoric and what Flyberg

(1998) calls de real politik or real rationality of planning process”

Os próprios processos de envolvimento público no Planeamento Territorial evidenciam inúmeras

debilidades. A este propósito, ref iram-se, por exemplo as conclusões de um estudo do

Departamento de Ambiente Britânico (Department of Environment , 1994) que incidiu sobre a

avaliação da ef icácia de experiências de planeamento colaborat ivo ocorridas no Reino Unido no

início dos anos 90. Numa invest igação, em que se reconheceram os méritos da part icipação

pública e a importância do invest imento público neste domínio, sobressaíram, no entanto, como

est rangulamentos:

1. o desenvolvimento de experiências de envolvimento ad hoc, fragmentárias, ocasionais e

não regulares, muitas vezes guiados pela escolha de métodos específ icos em vez de

planif icações globais do processo;

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2. a incapacidade da concepção de envolvimentos abrangentes e integrados, que não se

rest ringissem a meros input técnicos;

3. a escolha limitada de metodologias, associada, segundo o DOE (1994), a preconceitos ao

nível da planif icação que se repercut iram no est ilo de colaboração e das relações

desenvolvidas

4. a ausência de um processo global de part icipação, devidamente fundamentado, capaz de

capacitar os part icipantes a desenvolverem exercícios de part icipação, de uma forma mais

sustentada e ef icaz ao longo do tempo, de proj ecto para proj ecto

Estas e out ras dif iculdades são analisadas ao longo deste ponto de ref lexão. Para j á f ica a ideia,

no respeitante às conclusões ret iradas por este departamento governamental de um país com

longas t radições em planeamento e pioneiro, a par com os EUA, Norte da Europa, etc., no

desenvolvimento deste t ipo de abordagens part icipatórias, que nos anos 90 o Reino Unido

evidenciava experiências de Planeamento Colaborat ivo que se caracterizavam por serem

circunstanciais, não estarem integradas em processos de planif icação globais e corresponderem

a pouco mais do que meros input s técnicos para as formas de Planeamento e governância

t radicionais.

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1.4.1 - Limitações de planif icação

As primeiras experiências de Planeamento Colaborat ivo dos anos 60 e 70, realizadas em países

com maior t radição em Planeamento e democracia, corresponderam a pouco mais do que um

mero exercício de informação e legit imação pública (DOE, 1994; Mc Dade, 1998).

Muito embora os mecanismos legais existam desde 1969 (no caso britânico), o envolvimento público genuíno

mantém-se de forma consistentemente baixo, mantendo-se o discurso profissional e a influência de grupos de

interesses organizados (Davies, 2001).

Davies (2001) salienta, portanto, o déf icit de implementação do direito à part icipação dos

cidadãos no processo de planeamento territorial, não obstante a existência de legislação criada

para garant ir essa democrat ização.

As razões para j ust if icar tal situação são, naturalmente, múlt iplas e, provavelmente, não muito

diferentes das que se vivenciam actualmente em Portugal, numa altura em que o direito à

part icipação no processo de decisão está consagrado legalmente, mas em que os procedimentos

se alteram de uma forma lenta e burocrát ica.

Razões que se prendem, em Portugal, com um déficit de invest igação de novas formas de

t rabalho e metodologias que promovam esta ‘ j anela de oportunidade’ para uma maior

t ransparência administ rat iva, com o receio de alguns planeadores e polít icos do insucesso destas

experiências e pela recusa de algumas elites dominantes em part ilhar o poder, i.é., de

fundamentar decisões, de esgrimir argumentos com terceiros, de abrir o debate sobre o futuro

do território aos vários ‘ interesses locais’ .

Face a esta situação, o planeamento mantém-se conduzido pelos interesses do mercado e perícia

técnica (Barlow, 1995) mas suscitou a const rução de novos discursos polít icos (‘ bem parecidos’ )

em que é valorizada a retórica da part icipação nas decisões do planeamento e em que, com

pouca seriedade e uma crit icável dest reza, as decisões de ‘ alguns’ são apresentadas como sendo

as de ‘ todos’ , ou as formas de inquérito público sobre proj ectos ou planos j á f inalizados e

cristalizadas como exemplos paradigmát icos de ‘ boas prát icas’ de colaboração.

“A participação não pode ser confundida com, ou limitada a, ‘auscultações públicas’ previstas, por exemplo, no

processo de aprovação de um PDM (inquérito público). A participação deve começar na avaliação dos valores e

na determinação das metas e objectivos antes, portanto, da sua cristalização” Rebelo (1996, p.10).

Mesmo a nível internacional são, de facto, raros os arquipélagos de boas prát icas de

Planeamento Colaborat ivo, que têm vindo a emergir, por vezes associados à const ituição de

novos modelos organizat ivos como partenariados que procuram catalisar a acção de vários

agentes em torno de proj ectos de base local, desenvolvendo uma colaboração abrangente que

vai para lá das formas de governância t radicionais (ent re sectores público e privado) e envolvem

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organizações não governament ais e cidadãos, associados ou individualmente, em redes de

t rabalho horizontais

“Urban policy initiatives must now involve public-private partnerships working together to decide local priorities

and strategies and then to implement them. Increasingly these partnerships are expected to incorporate a

community element” (Duffy e Hutchinson, 1997, p.351)

“…this partnership and collaboration symbolises a blurring of the boundaries between the public and private

sectors, between state, market and community, which the post-war welfare state had tended to maintain” (Healey,

1998a, p.1533)

Muito embora se contabilizem sucessos, também têm vindo a ser detectados alguns problemas.

Healey (1998a) refere, por exemplo, a falta de sustentabilidade destas parcerias ao longo do

tempo, nomeadamente após o f im da existência de fundos, o que, segundo ela, realça os

próprios obj ect ivos subj acentes à sua criação.

�Conflicting comprehension of the aims and roles of community involvement is often played out within some

form of public-private partnership, which has been imposed as a criterion for funding (Duffy e Hutchinson, 1997,

p.351)

Out ra das crít icas que tem vindo a ser associada a este modelo comunicat ivo, é a aparição de

um certo cansaço ent re os part icipantes e que decorre da mult iplicação dos debates em várias

arenas e com diversos actores, face à necessidade de const rução de consensos para a acção

colect iva.

A par desse cansaço associado à necessidade de part icipar em muitas reuniões, Healey (1998b)

nota uma certa crise de “ voluntariado da comunidade” , que não será de todo indiferente à

tendência dos cidadãos para o individualismo e desenvolvimento de relações minimais em

comunidade.

“Many commentators have spoken of the practical difficulties of working in partnerships. There are numerous

further accounts of the political and pragmatic difficulties encountered in incorporating community participation

into partnerships and urban policies. These include the selection of community partners, their degree and level of

involvement, unequal positions in terms of both power and authority, clash of cultures and norms, different

degrees of commitment and working styles” (Duffy e Hutchinson, 1997, p.351)

Para além destes problemas há um ‘ sem f im’ de dif iculdades que se associam à concepção de um

proj ecto de Planeamento Colaborat ivo, pelo que é imprescindível (antes do início do “ j ogo de

t roca de argumentação” , do debate propriamente dito) um rigoroso processo de planif icação que

permita encont rar respostas para estas e out ras questões:

/ Como proceder a uma correcta selecção de grupos de interesses da comunidade local?

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/ Como gerar novas formas de pensar e partilhar face a políticas complexas?

/ Que tipo de arenas de debate poderão permitir a inclusão de vozes que tradicionalmente não são ouvidas?

/ Como ajudar os representantes a partilhar dilemas e experiências?

/ Como gerar formas de pensar criativas e a construção de discursos com poder de gerar convicções entre as

partes?

/ Como encorajar a aprendizagem mútua e o desenvolvimento de competências de colaboração?

/ Como activar formas de capital institucional para futuras ocasiões ?

/ (adaptado de Healey, 1998b)

Algumas das variáveis disponíveis para selecção, individual ou combinação e que afectam o

out come da part icipação, que é uma variável dependente são, segundo Mc Dade (1988):

Figura 1-2: Variáveis que inf luenciam os resultados da part icipação

A. Ident i f icação dos grupos de opinião locais, públ icos e pr ivados (def inição

dos st akeholders)

Um problema que se coloca ao obj ect ivo de incorporar ideias de uma mult iplicidade de actores

com vista à legit imação social e implementação das soluções, é, naturalmente, o da definição

dos agentes locais, amplamente designados por st akeholders, que devem ser representat ivos da

diversidade de interesses local, num momento específ ico.

Que critérios utilizar para a selecção destes grupos? A escala dos problemas? O tipo dos possíveis impactos das

decisões do planeamento para a comunidade? Os que são mais antigos ou mais recentes? Os melhor ou pior

organizados? Todos ou só alguns? Qual é a legitimidade dos representantes para as organizações que representam

ou face aos restantes participantes?

“the concept of ‘stakeholder’ is in part a ‘scoping’ device to encourage those at the core of defining and

developing policy agendas to recognise the universe of people affected by what happens.

Técnicas Dinheiro gasto

Audiência convidada

Composição social das cidades

Entusiamo dos part icipantes

Técnicas Dinheiro gasto

Audiência convidada

Composição social das cidades

Entusiamo dos part icipantes

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But it can also be used more actively to encourage stakeholders to get involved in the policy process: people

‘with stakes’ may come together to discuss what they think about the issues affecting the place where this stake

is…” (Healey, 1998b)

Healey (1998b) considera que devem ser chamados a part icipar os cidadãos mais directamente

afectadas pelos problemas ou pelas decisões de determinadas polít icas públicas, mas também os

cidadãos com interesses que, mediante processos interact ivos possam vir a ‘ pensar diferente’ ,

mediante aprendizagens mútuas que permitam uma f ixação de posições colect ivas

Tal opinião não é, no entanto, consensual, podendo ut il izar-se out ro t ipo de critérios,

igualmente lógicos, para se definir a audiência representante dos legít imos interesses da

comunidade.

Esta questão é especialmente importante se atendermos a que o processo de planeamento pode tomar diferentes

formas e apresentar diferentes resultados, consoante o leque de stakeholders envolvido, o poder de relação entre

eles ou o contexto institucional de envolvimento .. (Healey, 1998b, p.14)

Duffy e Hutchinson (1997) comentam que tem havido pouco esforço a def inir o que se entende

por ‘ comunidade’ ou a clarif icar as diferentes definições de comunidade, acrescentando, ainda,

que ‘ uma comunidade’ é raramente homogénea em termos das suas expectat ivas internas44.

Para além da ambiguidade indissociável da def inição de ‘ comunidade’ , estes autores observam a

nebulosidade associada a conceitos e ideias que se ut il izam recorrentemente em contextos de

planeamento colaborat ivo, e que, por sua vez, revelam diferentes obj ect ivos, formas e níveis de

envolvimento comunitário.

“…Phrases such as ‘participation’, ‘incorporation’, ‘empowerment’, ‘capacity building’ and ‘consultation’ all

reflect a different emphasis on community involvement” (Duffy e Hutchinson, 1997, p.351)

Para além deste aspecto, verifica-se que têm subjacentes diferentes hipóteses de definição

do grupo de debate que está sempre imbricado às próprias ‘racionalidades’ para a

participação.

Sobre esta temát ica, Campbell e Marshall (2000) ident if icam cinco t ipologias de mot ivações para

a part icipação, atendendo a duas variáveis: o número de part icipantes e as mot ivação para a

part icipação, podendo estar mais cent radas na comunidade ou nos interesses individuais

44 Questão a que voltaremos no capítulo 2

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Figura 1-3: Mot ivações para a part icipação

Quadro 1-4: Mot ivações para a part icipação

Part icipação comunitária

Esta perspect iva sublinha a importância da part icipação dos indivíduos para assegurar o bem-estar colect ivo. A part icipação não é vista como algo opcional, mas uma obrigação fundamental de cada indivíduo como membro da sociedade. Valoriza-se o obj ect ivo da igualdade e o da ‘ locality’ para o debate (muito embora Campbell e Marshall (2000) reconheçam a proliferação das nonspace-based communit ies). Nesta perspect iva, a part icipação é um processo polít ico encarado como potencial providenciador de dois benefícios: aumento desenvolvimento pessoal e confiança e melhor apreciação dos interesses e aspirações dos out ros

Polít ica do consumidor

Esta t ipologia enfat iza os direitos do consumidor para expressar as suas preferências com vista a inf luenciar as decisões públicas. O papel do governo é facilitar a expressão dessas preferências (dos consumidores dos serviços públicos - educação, saúde, t ransportes..) e responder maximizando a escolha pública

Polít ica da presença

A exclusão e marginalização de alguns grupos do processo polít ico existente é o ponto de part ida desta perspect iva. Argumenta-se que os interesses destes grupos têm de ser tomados em conta por população que part ilha a sua ident idade e experiência. Defende-se que estes interesses não podem ser só auscultados, mas estar presentes no processo de decisão para t ransformar as est ruturas preexistentes

Democracia deliberat iva

Planeamento Colaborat ivo

Esta perspect iva crit ica o ênfase que tem vindo a ser colocado na part icipação como forma de promover os auto-interesses. Em subst ituição, sublinha a importância de contextos inst itucionais e prát icas que promovam o diálogo aberto e encoraj em a emergência de soluções part ilhadas at ravés da descoberta de novas formas de conhecimento e entendimento. O envolvimento act ivo de um vasto grupo de part icipantes, frequentemente referidos como st akeholders é fundamental para esta perspect iva, contudo os part icipantes não devem ser vistos a eles próprios como envolvidos numa ‘ batalha’ de interesses, em que o seu papel é ganhar uma causa part icular, mas actuar como deliberadores dispostos a aprender a part ir do input dos out ros. Consequentemente o número de pessoas que deve ser incluído neste processo é menor do que na perspect iva comunitár ia implica. Neste caso, o papel do governo local é facilitar essa t roca aberta: a aprendizagem colect iva sobre o que se pensa sobre os assuntos, uma aprendizagem mútua antes de se f ixarem posições, um processo comunicat ivo que visa um maior conhecimento sobre os part icipantes e possíveis impactos das várias soluções, o desenvolvimento de interconexões ent re assuntos, temas, polít icas. Nesta perspect iva o processo polít ico torna-se mais part icipat ivo e envolve diferentes modos e linguagens

Part icipação inst rumental

A part icipação visa interesses privados e não o bem estar colect ivo

Número de participantes

Motivação para a participação

Politics of the

consumer

Politics of

presence

Deliberative

democracy

Communitarian

participation

+

-

Instrumental

participation

Interesse pessoal Focado na comunidade

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Este quadro, que sublinha a natureza dos interesses para a part icipação, possibilita uma ref lexão

sobre as inúmeras hipóteses para a const ituição da est rutura organizacional para o

desenvolvimento do processo de part icipação:

/ Valorizar em part icular os interesses dos consumidores de uma determinada área ?

/ Outorgar part icular importância aos grupos excluídos e marginalizados ?

/ Desafiar o focus de interesses e concent rar o processo de decisão no desenvolvimento de

prát icas inst itucionais que facilitem o diálogo aberto à apreciação de novas formas de

conhecimento ent re representantes dos vários sectores?

Davies (2001) critica que determinadas vozes sejam excluídas dos processos de participação e valores públicos

escondidos, criticando o planeamento colaborativo pela sua arbitrariedade. Segundo ela os canais para o

envolvimento existem, mas a participação formal é dominada pelos profissionais de planeamento, políticos,

consultores e grupos organizados de interesses económicos. Observa que estes participantes são membros do

público, mas que a sua participação representa explicitamente os interesses específicos de determinados grupos

económicos em detrimento dos da comunidade local

Conforme refere Williams et al. (2001), torna-se cada vez mais evidente a falta de consensos

sobre quem é o público ou o que é que o envolvimento público signif ica. Estes autores observam

muita inconsistência no ‘ como’ e ‘ quando’ o público deve ser envolvido ou quem é envolvido em

nome do público. Também relevam a enorme falta de estudos que documentem como os

cidadãos querem estar envolvidos

Um aspecto crit icável associado ao desenho da est rutura do grupo de ‘ part icipação’ é a

frequente falta de clarif icação e fundamentação dos crit érios usados para a selecção dos

represent ant es de int eresses.

Idealmente considera-se que devem ser inclusivos de grupos sociais de base territorial com

interesses ou abordagens dist intas ou mesmo conflituosas, de grupos minoritários

t radicionalmente excluídos e também da habitual representação dos grupos económicos e da

administ ração pública, voltamos a esta questão no capítulo 2.

Se por um lado interessa manter o processo suf icientemente aberto para não const ringir a

criat ividade dos part icipantes, por out ro interessa orientar a tomada de decisão para conclusões

que possam ser integrados nas decisões públicas e concret izadas em programas de acção

colect ivos. Para tal é fundamental uma correcta avaliação dos recursos e contexto inst itucional

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e polít ico territorial, de forma a permit ir uma correcta ident if icação do âmbito de debate

relevante para se definir a agenda de t rabalho. (ver C)

É também importante def inir desde a planif icação do proj ecto o âmbito de envolvimento que

este irá oferecer, muito embora, possa vir a ser redesenhado, colect ivamente, durante o

processo de interact ividade na fase processual.

O DOE (…) concluiu a este propósito que a falta de definição prévia do “scope” do processo de envolvimento

gera frequentemente aos participantes desilusão devido às falsas expectativas criadas. Por esse motivo se o

âmbito do projecto de participação não for discutido deve-se contar com diferentes concepções por parte de cada

um dos participantes

até que ponto os problemas (aparentemente) locais devem ser resolvidos a esta escala? Por exemplo as decisões

relativas ao parque da cidade do Porto são locais (municipais) ou metropolitanas? As decisões relativas à parte

ocidental da cidade condiciona o futuro da parte oriental? as decisões relativamente a este caso poderão

condicionar a criação de outros parques noutros locais?

Por seu lado, Breda Vázquez (1998) nota que uma incorrecta ‘ formulação do problema’ , pela

ausência de uma perspect iva analít ica t radutora dos processos, se pode repercut ir no próprio

desenvolvimento do processo de part icipação. Um correcto diagnóst ico exige, não só o

reconhecimento ‘ das causas dos processos’ como a compreensão da sua evolução ao longo do

tempo, as inter-relações do problema, as possíveis soluções que se antevêm, etc. Só com um

diagnóst ico correctamente formulado se poderá prosseguir para um primeiro desenho dos

stakeholders, das arenas, das metodologias, variáveis que, no entanto, podem ser reavaliadas

conforme, no decorrer do processo, as impressões iniciais sej am repensadas, fundamentadas e

legit imadas com a experiência de out ros agentes territoriais.

B. Clar i f icação dos obj ect ivos do proj ect o de envolviment o,

Na fase da planif icação é importante esboçar os principais obj ect ivos do proj ecto de

part icipação que, no entanto, deverão ser redesenhados durante a fase do debate. Nesse sent ido

é fundamental proceder-se a uma correcta:

/ ident if icação dos recursos disponíveis: f inanceiros, humanos, tempo, etc. O tempo, é de

resto um elemento fundamental: se faltar poderá não haver espaço temporal para a

conquista de consensos ent re as partes

/ ident if icação dos obst áculos inst it ucionais e pol ít icos da área: as relações de int eresse,

que podem decidir possibilidades de aproximação ou afastamento; relações de af inidades

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ou host il idades, isto é de modalidades de, ou cont rárias, à ent re aj uda e concertação; das

relações de poder e de conflito, etc.

Qual é a espessura institucional da área? Qual o resultado do mapeamento da rede institucional e cívica ? Como

se tem caracterizado o relacionamento entre actores locais? São grupos muito heterogéneos com passados ou

histórias conflituosas? Têm preocupações ou interesses em comum?

A experiência do desenvolvimento do programa comunitário LEADER, dirigido para as zonas rurais (European

Commission, 2000a) relevou que podem existir vários obstáculos institucionais que podem impedir o equilíbrio

entre as vantagens dos grupos ou um ambiente favorável à construção de consensos, nomeadamente:

/ a existência de um clima de desconfiança e de conflito entre os principais agentes;

/ a falta de abertura para todos os agentes exprimirem abertamente o seu ponto de vista;

/ a existência de formas tácitas de exclusão que podem impedir a participação de certos grupos sociais n

processo de reflexão/acção.

Outro aspecto ilustrado pela European Commission (2000a) a propósito do LEADER é que a existência de

sobreposição de competências entre instituições pode ser uma fonte de equívocos, oposição e conflito, baseado

numa difícil relação de interesses e poder que dificultam ou bloqueiam o sucesso de projectos de

desenvolvimento de base territorial local.

O déficit de conhecimento aprofundado de determinadas áreas territoriais (não só ao nível

demográf ico, económico, . . , mas também relacional e inst itucional) tem impedido um processo

de planif icação mais contextualizado em função das suas característ icas, por exemplo da

especif icidade cultural dos part icipantes, herança inst itucional, dinâmicas em curso, etc.

Para além da definição de uma planif icação que permita um processo de part icipação adequado

ao contexto social abrangido, Rebelo (1996) considera essencial um processo de part icipação

adequado ao inst rumento de ordenamento (ou urbaníst ico) em elaboração.

Segundo este autor, “desenvolver um esquema de participação para uma sociedade pouco organizada e sem

interlocutores não é o mesmo que o fazer para uma com grande organização e interlocutores activos. A forma de

comunicação e de tomada de consciência e de decisões numa comunidade rural, não é seguramente a mesma para

uma comunidade urbana e prestadora de serviços. Por outro lado os procedimentos a adoptar para um PDM não

serão os mesmos que se aplicaria para um PP de uma zona de lazer. A par da importância do contexto social, a

avaliação das ‘motivações de participação’, separando entre a mera defesa dos interesses pessoais e o desejo de

participação comunitária, e o ‘valor dado à participação’ constituem áreas a não negligenciar (Rebelo, 1996)

C. Selecção das met odologias e dos moment os de envolviment o

A exploração desta temát ica é desenvolvida detalhadamente no capítulo 2, ref ira-se não

obstante as limitações que têm vindo a ser ident if icadas ao nível de planif icações incapazes de

explorar todo o potencial de benefícios que podem ser oferecidos pelos diferentes t ipos de

métodos. Nomeadamente ao nível da pesquisa e obtenção de informação para uma melhor

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formatação das soluções (inquéritos, ent revistas, . .), de fornecer informação (vídeos, dados

estat íst icos, . .) ou os métodos interact ivos que deverão estar adaptados aos grupos

part icipantes, obj ect ivos do proj ecto de part icipação e relevância de cada método, ou mistura

de métodos

Verif ica-se, no entanto, a existência de déf icit de ref lexão sobre estas metodologias

especif icamente sobre a sua relevância para situações específ icas: gestão de conflitos ent re os

part icipantes, empowerment de grupos em desvantagem, em função dos temas em debate, etc.

No respeitante ao momento em que se int roduzem as metodologias, este está depende das suas

característ icas e obj ect ivos, sendo no entanto evidente a escassa ut il idade de processos de

part icipação (debate) em fases muito tardias, em que as decisões estão j á prat icamente

tomadas e cristalizadas pelos decisores públicos.

A partir do estudo de um conjunto de experiências que envolveram a participação pública em avaliações de

impacto ambiental (AIA), Petts(2000) conclui que “a contribuição das populações tem sido demasiado tardia para

que as opiniões e anseios da população possa entrar em linha de conta nas decisões finais”

Muito embora comecem a ser publicados alguns manuais que oferecem sugestões de planif icação

e iniciação de proj ecto de Planeamento Colaborat ivo (destaque-se as publicações do DOE, 1994

e de Huib Ernste, este com acesso facilitado pela internet em 2001), verif ica-se, não obstante, a

raridade deste t ipo de manuais, nomeadamente dos que procuram oferecer mais do que uma

simples sistemat ização de metodologias adaptadas a situações específ icas (recursos disponíveis,

historial de part icipação, t ipologias de problemas, etc.)

É no entanto, evidente que qualquer abordagem part icipatória deve integrar uma cuidadosa

iniciação e preparação do processo de envolvimento, devendo envolver a consideração de alguns

dos seguintes aspectos, relat ivos à avaliação do apoio dos grupos ao proj ecto e das desej áveis

característ icas desde proj ecto de part icipação pública (DOE, 1994)

– Como se define a comunidade a envolver?

– Há comprometimento entre todas ou a maior parte das partes: abertura para o processo e nível do apoio ou

resistência das instituições. Há possibilidade de se atingir um apropriado nível de debate?

– Qual a abordagem e recursos para o processo?

– Que tempo, contexto e forma para o projecto de envolvimento?;

– scope (âmbito) do projecto é claro para todos? Todos concordam?

– projecto tem o apoio dos que têm o poder, para assegurar uma posterior implementação das decisões?

– Está-se a considerar o envolvimento em todas as fases?

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Se estas ou out ras questões não forem respondidas poderá haver uma deficiente maturação do

processo de planif icação, podendo repercut ir-se numa :

/ menor obj ect ividade da programação dos vários momentos da interacção e tomada de

decisão;

/ menor ref lexão sobre os imponderáveis associadas à evolução do processo de debate

(momentos de discórdia, negociação ou cooperação, alteração do nível de confiança ao

longo do processo, etc.).

Outras questões metodológicas relacionadas com o t rabalho em conj unto, também poderão ser

alvo de debate ent re os part icipantes, nomeadamente a importância de capturar o signif icado

dos acordos, a importância das regras de diálogo, respeito e confiança mútua ent re os

part icipantes. A importância dos vários part icipantes clarif icarem o seu entendimento sobre a

natureza e importância do processo de envolvimento, ou as suas expectat ivas relat ivamente ao

t rabalho conj unto, o que poderá permit ir uma melhor compreensão da argumentação dos

diversos actores e uma antecipada abertura e a disponibilidade para a criação de uma relação

aberta ao longo do processo.

Deve, também, antecipadamente, ref lect ir-se, em grupo, sobre a possibilidade dos resultados

f inais serem qualitat ivamente diferentes dos que inicialmente se imaginavam individualmente,

sendo aí que reside a mais valia do proj ecto: a aprendizagem colect iva que permite ult rapassar

as visões limitadas de cada um, recusando a ideia de que neste processo uns ganham e out ros

perdem. O ganho tem de ser colect ivo.

Face ao que foi dito, nota-se que a const rução de ef icazes consensos f inais está directamente

condicionada pela visão inicial do proj ect o de colaboração, uma vez que esta se repercute no

processo de planif icação (def inição do grupo de envolvimento, dos obj ect ivos do proj ecto, nas

est ratégias adoptadas, . .) Quer-se com isto dizer, que o próprio insucesso dos resultados obt idos

com esta forma de planeamento pode residir na forma como se visualizam as várias fases do

proj ecto Colaborat ivo, ao nível da planif icação.

È evidente que uma concepção inicial l imitada ou enviesada, condiciona o nível de legit imidade

dos representantes e de credibilidade e confiança do processo de envolvimento, conforme f ica

evidenciado pelas conclusões ret iradas dos estudos de caso invest igados no Capítulo 3.

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1.4.2 - Limitações processuais

Relat ivamente às dif iculdades processuais do planeament o “ como acção comunicat iva” , Vázquez

(1998) ident if ica a problemát ica de se estabelecerem prát icas interact ivas com razoáveis níveis

de debate e consensos sat isfatórios quando:

/ é muito diferenciada a natureza dos agentes envolvidos,

/ são acentuadas as diferenças na percepção dos mesmos conceitos,

/ há dif iculdades em se difundir adequadamente a informação;

De facto, algumas das dif iculdades ident if icadas durante o desenvolvimento de processos

interact ivos ent re st akeholders para a resolução de problemas, associam-se à incapacidade dos

part icipantes de estabelecerem razoáveis níveis de debate o que pode ser mot ivado por

inúmeros factores, como, por exemplo, diferentes formas de compreender e expressar a

realidade ou conceitos

“Termos como ‘descentralização’, ‘empowerment da comunidade’, ‘colaboração’ e ‘participação pública’

tornam-se frases do momento, mas há uma considerável ambiguidade em redor destes termos…” Campbell e

Marshall (2000, p.321)

Se mesmo dent ro de um único campo disciplinar (por exemplo dent ro do planeamento) há uma

considerável ambiguidade no uso dos conceitos, como é referido por Campbell e Marshall (2000,

p.321), tal dif iculdade estará bastante mult iplicada em contextos comunicat ivos que envolvam

uma grande diversidade (prof issional, cultural, . . ,) de agentes.

É, de resto, um dos principais desafios que se coloca ao nível do desenvolvimento de processos

interact ivos ent re técnicos e comunidade, principalmente com a de menores níveis de inst rução,

devido à diferente “ forma” do conhecimento cient íf ico e conhecimento vulgar.

“O conhecimento vulgar ou popular, às vezes denominado senso comum, não se distingue do conhecimento

científico nem pela veracidade nem pela natureza do objecto conhecido: o que os diferencia é a forma, o modo

ou método e os instrumentos do ‘conhecer” (Anexo 3)

De facto, um mesmo objecto ou fenómeno, como salientam Lakatos e Marconi (1995, p.14) pode ser matéria de

observação tanto do cientista como do homem comum, a diferença é que o conhecimento “comum” é uma forma

espontânea de conhecer, que se adquire pelo contexto directo com as coisas, pela experiência quotidiana, e, ao

contrário a ciência constroi-se “de forma ascendente e descendente, indo gradativamente do facto particular para

o geral e vice-versa” e integrando a dimensão compreensiva, relativa aos conteúdos, e a metodológica que

abrange aspectos mais lógicos e técnicos, nomeadamente a construção de raciocínios, de proposições e

enunciados (Lakatos e Marconi, 1995, p.21)

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Reconhecendo-se, à part ida a legit imidade de ambos t ipos de conhecimento para o diagnóst ico

de problemát icas territoriais e para a ponderação (consideração e conciliação) de todos os

interesses envolvidos, quer públicos quer territoriais, a grande dif iculdade estará em estabelecer

processos comunicat ivos ef icazes

Gonçalves et al. (2000) analisando a participação pública nos debates e decisões científicas, considera

fundamental a existência de algum nível de literacia científica da população, por exemplo ao nível de

conhecimentos básicos sobre conceitos, teorias, métodos, etc., que permita uma melhor compreensão destas

ciências e que capacite o cidadão para participar eficazmente.

Williams et al. (2001) sobre a questão da participação da comunidade na gestão e disposição das armas químicas

e nucleares (que passou a ser uma preocupação das instituições federais e estado americano depois do fim da

Guerra Fria), defende que “o público não pode participar de forma significativa sobre o que não pode perceber”,

por exemplo a gestão de armas

No caso de grupos sociais com menores níveis de literacia, que se concent ram, por vezes, em

algumas áreas territoriais em declínio, tem–se vindo a sublinhar a importância do seu

empowerment , at ravés de abordagens part icipatórias que permitam a consideração das suas

necessidades e aspirações e, simultaneamente que os co-responsabilizem para a concepção,

implementação e manutenção dessas est ratégias de regeneração urbana. Neste sent ido,

acentua-se o desafio de processos comunicat ivos e metodologias de t rabalho ef icazes e

adaptadas às característ icas socioculturais dos part icipantes, o que nem sempre tem sido

conseguido. Por exemplo, Duffy e Hutchinson (1997), com base em bibliograf ia diversif icada e

nas suas próprias experiências prof issionais, ao nível da avaliação do Programa Pobreza 3 no

Reino Unido (desenvolvido pela União Europeia, para áreas em desvantagem , ent re 1989-94),

concluíram que:

/ os grupos comunitários têm poder nos partenariados só ao nível operacional e que este

poder de inf luência circunscrito pode gerar conflitos

“Recent reviews of the operation of the Single Regeneration Budget Challenge Fund schemes suggest that in

Round 1 at least, community and voluntary groups were rarely involved at a strategic level during the bidding

phase and were only incorporated into the scheme when participation and support become necessary for its

implementation. Groups who have not participated in designing projects which purport to be for their benefit are

then expected to devote their own resources and energies to make them work, whether or not it reflects their

priorities.” (Duffy e Hutchinson, 1997, p.352)

Diga-se que muitos das decisões que são tomadas à margem dos partenariados e que os afectam directamente,

transformam-se em focus de descontentamento entre os participantes, exigindo posteriormente maiores esforços

para o redesenho das decisões conflituosos e procura de consensos para outros temas. Um exemplo

paradigmático desta situação é estudado detalhadamente no Capítulo 3, a propósito das ‘lutas’ e desilusões que

estiveram associadas a um partenariado para a revitalização económica da Baixa do Porto, desenvolvido sob

pretexto do Porto Capital da Cultura 2001 e para a canalização de fundos do URBCOM para esta área (ver

Capítulo 3)

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/ Os grupos comunitários são vistos como um inst rumento de implementação

Duffy e Hutchinson (1997) referem que, frequentemente, a incorporação da comunidade nas abordagens

participatórias é percepcionada como uma forma útil para uma melhor gestão de recursos. Esta visão

instrumentalista tem, no entanto, vindo a ser criticado por alguns grupos comunitários que sentem que os seus

parceiros os vêem como um simples “management tool” (1997, p.353)

/ A dif iculdade de definir as est ruturas de representação

Duffy e Hutchinson (1997) referem, por exemplo a dificuldade de seleccionar alguns grupos em detrimento de

outros, principalmente quando existem histórias anteriores de rivalidades (sociais, religiosa,..): “.In areas where

several communities co-exist, political decisions by funding partners about which community they will enter into

partnership with raises tensions.. (…)

Professional community development staff felt that geographic communities tended to exclude those who were

stigmatised within their areas, or that communities were divided, by ethnic origin or along political and religious

lines, as in the two projects based in Liverpool and Northern Ireland (…)” (Duffy e Hutchinson 1997, p.354)

Se algumas destas dif iculdades das abordagens part icipatórias se relacionam com o ‘ saber’ e

‘ poder’ colaborar, muitas delas têm radicado, também, no ‘ querer part icipar’ , uma vez que esta

disposição signif ica, em últ ima instância, a admit ir part ilhar o poder de decisão ou inf luência, a

disponibilizar-se para j ust if icar propostas e tornar t ransparente a racionalidade da

argumentação.

/ Querer cooperar… Quanto maior for a predisposição, de actores e inst ituições, para

cooperar, menores serão as dif iculdades e os obstáculos na part ilha das questões e a

valorização da integração de saberes;

/ Saber cooperar… Para tal deverão reavaliar-se os currículos de formação dos planeadores, a

formação cont ínua dos intervenientes territoriais ao longo do tempo, a descrição de

histórias de boas prát icas de cooperação, etc.;

/ Poder cooperar… Para a const rução de prát icas de colaboração não chega saber e querer

cooperar , tem que se poder... Para que tal sej a possível pressupõe-se a criação de micro-

est ruturas ou plataformas de comunicação ent re a rede dos vários intervenientes do

território (organizações, públicas e privadas e sociedade). Como vimos não chega a

existência de polít icas ou programas que incent ivem a colaboração territorial, tem que se

definir regras e métodos de t rabalho ef icazes para formas de governância colaborat iva nas

fases do proj ecto, etc.,

Out ra questão que deve ser colocada, e é fonte de discórdia ent re vários teóricos, é a do papel

dos planeadores nos processos colaborat ivos. Para além de à part ida se reconhecer o déf icit de

competências comunicat ivas e procedimentos de mediação dos planadores em processos

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interact ivos, coloca-se a questão de qual deve ser o seu papel nos momentos de envolvimento

dos stakeholders:

/ Papel Neut ro? em que o planeador procura comportar-se como um elemento que se limita a

coordenar as propostas

/ Papel Act ivo? De um prof issional que não descarta as suas responsabilidades, analisando as

tendências a longo prazo dos fenómenos, alertando para as possíveis consequência dos

cenários, etc., e em que defende os valores do planeamento (conservação de recursos,

equidade social, pluralismo, gestão racional, …).

Para além de se definir se se deve ter um planeador est i l ist a, que dá opiniões sobre as

expectat ivas ou necessidades dos clientes, ou um planeador al faiat e, que se limita a responder à

encomenda, Rebelo (1996) ident if ica out ros potenciais dilemas que se colocam ao técnico de

planeamento quando promove processos de part icipação pública45:

/ Filosóf icos: por exemplo ent re os valores sent idos pelo bairro e os valores do planeamento;

/ Orçament ais e de ident if icação de prioridades: associadas às necessidades, mas limitações

orçamentais;

/ De compet ição polít ica: promovidos por vários grupos em compet ição com interesses

diferentes; (como responder, simultaneamente, a obj ect ivos de natureza ambiental e

económica ? como evitar uma manipulação dos processos por grupos de maior poder?)

/ De pol ít ica geográf ica: relacionados como visualiza a escala territorial de intervenção ou

dos problemas, por exemplo ent re t ratar a cidade ou município como um todo ou

diferencialmente a cidade, a aldeia ou bairro

/ Técnicos e psicológicos: ent re a decisão de qual é o interesse público, face aos vários

interesses privados

Atendendo à natureza mult ifacetada dos problemas, muitos autores têm vindo a defender que os

planeadores sej am aj udados a perceber o mundo, nomeadamente a fazer conexões ent re os

t radicionais sectores de intervenção e as dimensões económica, social e polít ica,

45 muito embora se reconheçam muitos consensos sobre os princípios que devem nortear a sua actividade. Rebelo (1996) destaca os princípios da prevenção (considerar de forma antecipada as acções com incidências negativas espaciais com vista a reduzir ou eliminá-las), sustentabilidade (garantir o uso e transformação do solo se processem de forma equilibrada, respeitando os valores ecológicos essenciais e a qualidade do património natural e construído), coordenação (assegurar compatibilização entre as várias políticas nacionais: de ordenamento territorial, desenvolvimento económico e social, conservação e valorização da natureza), unidade e solidariedade (assegurar o equilíbrio entre as diversas regiões do país e qualidade de vida dos cidadãos, bem como coesão económica e social), participação (garantir o acesso a informação e audição dos cidadãos na elaboração, aprovação e execução dos instrumentos do ordenamento do território), cooperação (entre todos os níveis da administração, departamentos do estado e empresas concessionárias de serviços públicos, nomeadamente ao nível de informação que afecte o ordenamento territorial), ponderação (na elaboração e execução dos instrumentos do ordenamento do território).

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Campbell e Marshall (2000) que estudaram o caso dos EUA ao nível do desenvolvimento do planeamento

colaborativo referem que a “arte do planeador” deve ser a apreciação informada de que pouco se sabe,

preocupações sobre quando e onde poderá buscar informação adicional e a capacidade para desenvolver quadros

interpretativos que permitam conexões com cidadãos para fazer apropriados julgamentos.

Partindo da apreciação de como se sabe pouco sobre as cidades e regiões, o envolvimento público tem,

inevitavelmente, um papel importante. Rosa Pires (1995) defende o contributo da interactividade para a

qualificação das propostas do planeamento:

“(…) o planeamento é inerentemente interactivo sendo pois útil e desejável valorizar essa interactividade. Uma

forma de o fazer é através do debate que, apoiado num conjunto de regras de boa execução se encara como uma

oportunidade para ‘aprendizagem social’ e formação de opinião entre os vários agentes de alguma forma

envolvidos.. “ (Rosa Pires, 1995, p.45)

Ent re os apologistas desta corrente há, então, alguma convergência para a defesa de que a

democracia representat iva se pode enriquecer por abordagens part icipatórias, que permitam à

administ ração pública e planeadores:

/ Fazer a gestão dos diversos interesses territoriais;

/ Catalisar a part icipação dos agentes locais para uma maior legit imação social das decisões

/ Part ilhar responsabilidades e tarefas, interessando boas parte da população para a

realização das iniciat ivas

/ Correr o risco do debate aberto e confrontação, o que revela maior maturidade intelectual

e nível de respeito pelos direitos dos cidadãos

Para além deste debate, Ascher (1995) e Vázquez (1998), colocam a tónica na dif ícil conciliação

dos interesses das gerações actuais, com uma escala temporal de curto e médio prazo, com os

das gerações futuras, de longo prazo.

Voogd (2001) ref lecte sobre a cont radição existente ent re ‘ interesses individuais’ versus

‘ interesses colect ivos’ , crit icando a abordagem part icipatória do planeamento por não ter

suf icientemente em conta a existência de dilemas sociais, nomeadamente o conflito que existe

ent re a escolha individual que visa maximizar o seu próprio interesse e a escolha que será

melhor para o grupo e a sociedade no seu todo46.

Voogd (2001), notando que este como todos os paradigmas têm vantagens e desvantagens, sendo

mais ou menos fashionables em períodos diferentes, observa que a principal desvantagem do

46 �Much of the literature on the public participation tends to concentrate on the how, who, where and when of public involvement, that is to say the operationalization and refinement of the process, rather the why of public participation more particularly the underlying rationales and consequences of the adoption of such approach� Campbell e Marshall, 2000, p.323)

Que racionalidade mobiliza os grupos para o envolvimento público? Qual a natureza dos interesses que são articulados em abordagens de planeamento colaborativo (públicos ou privados)?

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Planeamento Comunicat ivo é ter em si o paradoxo dos dilemas sociais, nem sempre conseguindo

dar resposta ao “ interesse público” o que faz dele um planeamento vulnerável

Por seu lado Margerum (1999) refere os problemas associados à própria dif iculdade dos

stakeholders representarem grupos ou organizações, durante o processo comunicat ivo e de

decisão, propriamente dito. Por vezes estes representantes referem perspect ivas suas que não

foram formuladas e legit imadas pelos grupos que representam, o que pode gerar problemas ao

nível da fase de implementação (obstáculos pelos representados). Out ras vezes os stakeholders

sentem-se na obrigação de, cont inuamente consultar os seus grupos e esperar o seu feed-back (o

seu apoio) o que at rasa os processos e dif iculta a obtenção das próprias mais valias da

interact ividade.

Estudos de Margerum (1999) sobre processos de consensus building nos Estados Unidos e

Aust rália revelaram ainda percepções limitadas dos representantes face ao seu papel no grupo.

Af irmavam ver-se como providenciadores de informação técnica e conselho ao grupo, mas

consideravam limitada a sua inf luência no grupo, desvalorizando o processo de criação de

soluções por interact ividade.

Out ras limitações sobre a forma como decorrem os processos de planeamento colaborat ivo estão

ligadas com a manutenção de procedimentos e leis hierárquicas que procuram a manutenção das

relações inst itucionais, distorcendo os esforços de prát icas de planeamento e governância

horizontais.

Healey (1998b) alerta, exactamente para o facto desta nova prát ica de planeamento pressupor

mudanças:

Quadro 1-5: Algumas mudanças, nas prát icas e nas leis, exidas pelo Planeamento Colaborat ivo

Mudança nas prát icas - responsabilidade das elites locais que governam

Mudança nas leis e procedimentos – responsabilidade governos cent rais e UE (para Estados Membros)

Const ruir redes horizontais de t rabalho e partenariado

Desenvolver mapeamento de stakeholders e procurar formas de os envolver no desenvol-vimento de polít icas

Criar e manter arenas para um debate aberto sobre temas e est ratégias

Cult ivar e promover o debate público dos cida-dãos, e de out ros t ipos de argumentação para além da técnica

Cult ivar prát icas que conectem ideias est ratégi-cas para regular invest imentos e decisões

Maior poder local e regional, maior invest i-mento na coesão social, desenvolvimento económico e sustentabilidade ambiental

Impor leis para as elites governamentais res-ponderem às preocupações dos stakeholders

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O planeamento colaborat ivo dif icilmente poderá ter sucesso com as hierarquias nas est rutura de

poder e decisão. De resto, a própria implementação dos acordos locais está dependente da

descent ralização de poderes e recursos locais.

Out ro grande tema de debate é o dos l imites dos consensos e compromissos no Planeamento

Sendo as relações de conflito, as expressões de relações de interesses de rej eição ou poder

(European Commission, 2000), que resulta, por exemplo quando algum agente se sente lesado e

em que não lhe é proposta nenhuma compensação, tem surgido um produt ivo debate em torno

da importância da negociação e dos consensos

Alertando para o facto de durante o processo de envolvimento cada stakeholder procurar

maximizar e af irmar a sua argumentação em det rimento das restantes, Ascher (1995) contesta

que o produto de planeamento que decorre deste processo de “ negociação” sej a o mais

favorável para a sociedade no “ seu todo”

“De facto, os interesses dos diferentes actores ou grupos de actores, não sendo a priori convergentes, remetem,

em termos de um interesse geral processual, não só para a formação de um acordo em torno de um compromisso,

como também para a transformação do consentimento em adesão e do compromisso em valor positivo. É o que

podemos chamar de ‘consenso’, quer dizer, o compromisso transformado em valor positivo e sustentado pelo

conjunto dos actores abrangidos. Ora, há toda uma reflexão sociopolítica que se reelabora em torno da noção de

consenso e uma moda, vinda dos países com mais forte tradição consensual ou comunitária, que deixa perceber

que os conflitos de todas as espécies se podem dissolver através da negociação e do ‘agir comunicacional’47…

Teses que Ascher contesta atendendo à “crescente complexidade da sociedade e a multiplicação dos sistemas de

referência” o que dificulta a formação de compromissos e acordos. Concordando com a ideia de negociação, que

caracteriza por “um recurso tanto mais indispensável quanto se esgotam os instrumentos habituais como a

tradição, as crenças comuns, o parecer científico”, Ascher (1995, p.130) contesta a noção de consenso por:

1. se tornar ambígua, pois olhando apenas para o resultado poderíamos esquecer as

divergências e as oposições que os precederam e em certa medida que lhe dão

consistência;

2. consenso nem sempre se acomoda muito bem às regras democrát icas t radicionais: a

regra da maioria, nomeadamente, não encoraj a part icularmente a formação do

compromisso, ainda que as maiorias desej em, em geral, que o consenso se forme em

torno das decisões por elas tomadas

47 Bastante influenciada pelo trabalho de Jurgen Habermas que desenvolve a tese do agir comunicacional, que defende que uma interacção racionalizante permitiria construir consensos através do diálogo. Para um maior aprofundamento ver Healey (1997a)

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Com uma opinião diferente, Rosa Pires (1995) sustenta que o debate baseado na elucidação de

argumentos e perspect ivas poderá facilitar a obtenção de ‘ consensos alargados’ em torno de

questões est ratégicas, sendo para tal necessário que o prof issional de planeamento não sej a um

mero mediador ou negociador, mas, pelo cont rário, que saiba invest ir em critérios e soluções.

A este propósito Rosa Pires (1995) segue a perspect iva de Healey sobre o dilema “ do critério de

valorização de propostas” , defendendo que, durante o processo comunicat ivo o planeador

deverá proj ectar alguns valores que derivam do seu conhecimento prof issional, de uma forma

pragmát ica com vista aos valores da sustentabilidade ambiental, j ust iça e equidade social (Rosa

Pires, 1995, p.46) Trata-se, no fundo, segundo este autor de reduzir a arrogância de saber o que

deve ser, sem assumir uma at itude passiva de mero art iculador de interesses.

Uma opinião não muito diferente tem Costa Lobo (1996). Para este invest igador que foi provedor

da qualidade de vida da C M Lisboa:

“a solução do compromisso não é branca nem preta: é cinzenta. E essa, muitas vezes, é a pior de todas as

soluções, porque não corresponde nem a uma posição lógica de um ponto de vista, nem à de outro – é uma

solução mista inconveniente. Que se pode então fazer nesta situação? Proponho uma resposta imaginativa, a que

chamamos terceira via que é uma alternativa que não é nem uma nem outra das iniciais, mas que corresponde a

criar uma nova solução que não estava na mesa no momento da tomada de decisão. Se adoptarmos esta atitude,

muitos casos encontram soluções interessantíssimas. Ainda não estão tomados partidos face à nova situação

criada, não há ainda uma posição de princípio contra e, portanto, pode encontrar-se eventualmente um consenso,

uma solução convergente e melhorada até porque ela resulta de um conhecimento das outras duas”(Costa

Lobo, 1996, p.68).

Subj acente a este debate acerca da problemát ica da obtenção de consensos está a existência de

uma pluralidade de posições, por vezes de conf litos, sobre qual deve ser a forma de tomar

decisões e actuar, o que gera a dif iculdade de t ransformar posições individuais e aparentemente

cont raditórias em plataformas de decisão e acção com relat ivos concensos, que permitam

maiores níveis de coordenação e produção de mais valias que não existem se tal não acontecer.

Como ideias f inais:

/ A part icipação deve ser feita ao nível do programa e de forma const rut iva, para evitar o

carácter normalmente react ivo (de t ipo NIMBY – not in my backyard) e sectorial da

part icipação em proj ectos que estão em fase de conclusão, e em que é mais dif ícil a

const rução de consensos. O debate público permite ident if icar melhor as várias

oportunidades e impactos de vários cenários;

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/ Part icipar sem Planeamento Colaborat ivo pode ser perigoso, só se reaj e ao que é polémico,

essa polémica pode ser criada por interesses específ icos (económicos, polít icos, forças de

lobbying,

/ O obj ect ivo da const rução de consensos não é um tema fácil, reconhecendo-se a

dif iculdade de obtenção de consensos às várias escalas de decisão quot idianas: no

condomínio, dent ro de um mesmo grupo prof issional, dent ro de um grupo de cidadãos,

etc.;

/ Há quem afirme e, frequentemente com razão que grande parte da part icipação é inút il,

muita conversa para depois se chegarem às mesmas conclusões ou para poucas alterações

aos proj ectos iniciais, mas não se devem esquecer as suas virtualidades, enunciadas ponto

1.2, nem os os limites ao planeamento t radicional, apresentados em 1.1 (quanto

diagnóst ico se faz sem ut il idade nenhuma? Quantos quadros de acção se concebem sem a

part icipação dos visados e que depois são contestados e acabam por revelar uma escassa

ut il idade? Qual é o gap existentes às várias escalas de planeamento ent re intenções e

concret izações?;

/ a part icipação da população no processo de decisão permite um maior nível de

envolvimento e compromet imento com as decisões, melhor aceitação e implementação das

decisões e sustentabilidade das intervenções ao longo do tempo;

/ A part icipação deve prossupor responsabilização dos part icipantes, todos, de uma forma ou

de out ra devem comprometer-se com determinadas acções para a implementação das

decisões definidas colect ivamente;

/ o déficit de avaliação dos proj ectos de part icipação pública no planeamento, relaciona-se

com um déficit de clarif icação e art iculação dos obj ect ivos e critérios de ef icácia dos

proj ectos de envolvimento. Este é um factor negat ivo para uma melhor ref lexão sobre os

processos, para a interiorização da experiência obt ida por parte de part icipantes e

invest igadores;

/ Também há várias racionalidades para a part icipação? Se alguma dela é mobilizada por

movimento voluntaristas (melhorar o bem estar da comunidade ou assegurar qualidade de

vida das novas gerações, também é verdade que há muita part icipação polit izada e

interessada (baseada em mot ivos económicos, visibilidade pessoal, etc.)? Observa-se ainda

que existem vários grupos de pressão que inf luenciam a opinião pública e o sent ido da

part icipação (via media, ONG, etc.), no fundo que há muita polit ização do processo de

part icipação no planeamento.

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1.4.3 - Implementação das decisões

Muito embora Margerum (1999) conclua que nos processos de planeamento colaborat ivo se

alcançam consensos ent re os part icipantes, este autor observa que existem um conj unto de

dif iculdades na implementação das decisões const ruídas ao longo do processo.

Reportando-se à invest igação exploratória que realizou a estudos de caso desenvolvidos nos EUA

e Aust rália, que abarcavam temát icas e contextos de planeamento diversif icados48 e em que

procurou analisar os resultados obt idos pelos grupos (em termos de confiança, consensos,..) e os

produtos resultantes dessas abordagens part icipatórias (em termos de programas e polít icas) a

principal conclusão deste autor foi a dif iculdade da t ransferência do capital cr iado para a

acção.

A dif iculdade de implementar as decisões a que se chegou a consenso, relacionam-se, segundo

Margerum (1999) com a existência de uma part icipação pública limitada, uma falta de rumo

est ratégico e dif iculdades ao nível da implementação de acordos, devido a uma escassa

clarif icação da forma, meios e responsáveis pela sua implementação, durante o processo de

envolvimento.

Com um maior detalhe, apresenta-se uma listagem de limitações, adaptada das conclusões do

estudo de Margerum (1999) que iluminam alguns dos mot ivos que j ust if icam o déf icit de

implementação das decisões das experiências de planeamento colaborat ivo, por exemplo ao

nível de programas e polít icas públicas:

1. muitos stakeholders não avançam da forma como f ica estabelecido na fase do debate, em

parte devido a problemas comunicacionais (diferentes personalidades, existência de

conflitos,..) o que impede uma adequada consolidação de decisões para t ransitarem para a

fase de implementação

2. alguns factores est ruturais const ituem obstáculo a essa implementação: por exemplo a

disparidade de poder ent re stakeholders, ou a falta de poder e recursos para a sua

concret ização. Por vezes chegam-se mesmo a tomar decisões que estão dependentes de

out ros fóruns alternat ivos

3. existe uma falta de orientação est ratégica durante o processo, de onde resultam falhas no

estabelecimento das prioridades e ident if icação das acções específ icas para a sua

concret ização. Em vez de se apresentar o que se vai fazer, os grupos tendem a apresentar o

que gostariam de fazer, de onde resulta um déficit de hierarquização das prioridades. Por

vezes são mesmo definidas acções pouco exequíveis e de dif ícil implementação, atendendo

aos recursos disponíveis

48 para a qual utilizou como metodologia um conjunto extensivo de 100 inquéritos a participantes dessas reuniões, análise a memórias descritivas de reuniões, declarações políticas, conclusões das reuniões, etc

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4. observa-se, ainda, uma falta de envolvimento comunitário durante a fase de

implementação, a existência de dif iculdades de implementação porque houve detalhes que

não foram analisados durante a fase de planeamento

5. por vezes também há resistência polít ica e da administ ração pública à implementação das

decisões, at ravés de um não aj ustamento das polít icas e programas às decisões que daí

resultaram. Frequentemente tal dif iculdade decorre da legislação formal e polít icas

preexistentes, out ra da incapacidade de gerir a gestão diária (baseada na interpretação de

leis, condução de proj ectos, . .) com essas decisões

6. também se observa que muitas organizações representadas por stakeholders aceitam

part icipar em processos colaborat ivos, mas não concordam em modif icar os seus

procedimentos, polít icas, com vista à implementação

7. para além da falta de capacidade dos stakeholders explicitarem as est ruturas de

importância das decisões, observa-se uma falta de capacidade destes representantes

explicitarem como as várias decisões podem ser realizadas, o que se relaciona com um

déficit de cont ratualização das várias acções

Em síntese, parece clara a tendência da viragem do planeamento para a focagem nas

necessidades e aspirações ‘ das comunidades’ , mas a prát ica é mais problemát ica.

São vários os obstáculos que se colocam à reformulação dos modelos de governância hierárquicos

e que const rangem a oportunidade da part icipação comunitária.

São várias as dif iculdades que se colocam ao desenvolvimento de processos colaborat ivos

ef icazes, o que tem gerado uma certa desilusão à sua volta.

Já se sabe que há dif iculdades, mas que as mais valias que podem decorrer desta aposta são

várias.

Subscrevo a opinião de Balducci (2001) que, sem deixar de ref lect ir sobre as fragilidades e

dif iculdades das abordagens part icipatórias no planeamento, considera que, nem por isso, se

deve de deixar de as usar com os devidos cuidados: “ (…) this fragilit y requires to handle

part icipat ion with care moving away either from a posit ion that j ust ify any kind of part icipat ion

per se and from the opposite posit ions…” (Balducci, 2001, p.10)

De facto, é preciso bom senso para abordar as questões da part icipação e cuidados especiais a

manusear estes processos de part icipação, mas é fundamental não escamotear as sua mais valias

e aproveitá-las est rategicamente.

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CAPÍTULO 2 – TEORIAS DA PARTICIPAÇÃO E SUA IMPLEMENTAÇÃO NO SISTEMA DE

PLANEAMENTO TERRITORIAL

2.1 - Int rodução

“Development must come from ourselves, must include us, we must trust and believe that our response can help

us to regenerate through our own efforts” Amdam (1999, p.582)

“… Resource for planners who aim to go beyond traditional participation and conflict resolution – who would

like to explore opportunities and alternatives for effective collaboration and participation in local problem

solving and policy making” Dep. Urban Affairs and Planning

“At first people refuse to believe that a strange new thing can be done,

and then they begin to hope it can be done,

Then they see it can be done—

Then it is done, and all the world wonders why it was not done centuries ago”

Frances Stuar, site “Centre for Collaborative Planning… engaging communities for action” 49

Neste capítulo, at ravés das necessárias operações de leitura à bibliograf ia nacional e

internacional, descreve-se o actual ‘ estado da arte’ do Planeamento Colaborat ivo, abordando-

se, para tal, temát icas diversif icadas como o entendimento do conceito de part icipação pública,

de diferentes níveis e formas de part icipação, de est ratégias e metodologias promovidas pela

administ ração pública para a sua incursão no planeamento territorial, ent re out ras.

Procura-se, no fundo, analisar um conj unto vasto de ideias que esta “ nova avenida de

invest igação” tem movimentado e int roduzir alguns dos debates teóricos que têm sido mais

frequentemente est imulados. De forma int rodutória, colocam-se algumas questões simples, mas

relevantes para a ref lexão no presente capítulo, nomeadamente:

/ Como é def inido o conceito de part icipação pública ? Quais os mot ivos que suscitaram a sua

incursão na agenda polít ica internacional?

/ Porque mot ivos o planeamento territorial pode ser um campo privilegiado para a incursão

das abordagens part icipatórias?

/ Quais as formas e metodologias disponíveis para a resolução de conflitos de interesses no

planeamento territorial e a integração desta “ bandeira” polít ica no processo de tomada de

decisão pública?

49 in http://www.connectccp.org/

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Com base nestas e out ras questões, o capítulo 2 é est ruturado em cinco pontos momentos

principais:

No ponto 2.2, procura-se analisar e sistemat izar o conteúdo da literatura consultada

relat ivamente ao entendimento do conceito de part icipação pública, à problemat ização da

existência de diferentes interesses sociais nas matérias de planeamento territorial, que suscitam

situações de conflito e desafios como o de negociação ou mediação, a existência de vários

níveis, escalas ou formas de part icipação pública.

A part ir destes novos insight s sobre os t ipos ou propósitos da part icipação pública, ref lecte-se,

no ponto 2.3, sobre os vários t ipos de est ratégias da administ ração para a promoção de

proj ectos de part icipação pública, analisando-se as at itudes e obj ect ivos subj acentes a cada uma

delas, bem como a sua apt idão para potencializar as mais valias do Planeamento Colaborat ivo.

Para além de se ref lect ir ainda acerca do debate sobre as temát icas devem const ituir obj ecto de

part icipação pública, ref lecte-se no carácter polít ico do processo de decisão do planeamento

territorial.

Por out ro lado, argumenta-se que as est ratégia def inidas pelos decisores públicos condicionam, a

j usante, a adopção de abordagens ou metodologias específ icas.

No ponto 2.4 ref lecte-se sobre o conceito de stakeholder e a importância de uma atenta

def inição dos representantes da sociedade num proj ecto de part icipação pública. Quest iona-se,

por exemplo a importância das abordagens part icipatórias no planeamento territorial para se

minimizarem as desigualdades na repart ição de poder e inf luência no processo de decisão

pública.

No ponto 2.5 para além de se ident if icarem e caracterizarem dois grupos de metodologias de

Planeamento Colaborat ivo, as de uma direcção e as int eract ivas, descrevem-se algumas

experiências prát icas documentadas na bibliograf ia internacional sobre a aplicação das

metodologias interact ivas em contextos de Planeamento territorial. A caracterização de algumas

dessas metodologias e ident if icação de experiências concretas de planeamento onde elas foram

implementadas e se têm pautado por sucessos, visa ident if icar algumas situações de aplicação

prát ica recente destas metodologias interact ivas, sem serem no entanto aprofundadas.

Desenvolve-se ainda um breve comentário relat ivo à correcta selecção de matodologias com

base nos recursos disponíveis

No ponto 2.6 ref lecte-se sobre o direito à part icipação no sistema de planeamento português,

nomeadamente nas recentes inovações suscitadas pelos princípios e programas da União

Europeia e alterações int roduzidas ao nível legislat ivo

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2.2 - Análise conceptual. Níveis e t ipos de part icipação pública

Como nota int rodutória, deve ser referenciado o caráct er abrangent e, mult idimensional e

complexo das questões associadas à part icipação públ ica por envolverem um conj unto vasto de

temát icas, desde as ligadas ao sector privado, gestão empresarial, desenvolvimento

organizacional, inovação, liderança ou t rabalho em equipa (Innes, 1998), até às relacionadas

com o sector público, como a dist ribuição de competências e poderes ent re inst ituições às várias

escalas territoriais, sem esquecer as que envolvem os vários interesses part iculares de diversos

grupos sociais.

Em Portugal este tem sido, de resto, um campo de invest igação pouco explorado pela

comunidade cient íf ica, não obstante o desenvolvimento, pontual, de algumas invest igações

académicas que têm sido realizadas sobre temát icas que lhe são próximas ou mesmo

t ransversais, como, por exemplo, a análise do processo de tomada de decisão polít ico e suas

relações com o planeamento territorial (Pereira, 1994), a inf luência da part icipação pública no

processo de decisão cient íf ico (Gonçalves, 2000), o potencial da part icipação pública para a

qualif icação e legit imação do Planeamento Territorial (Rosa Pires, 1995) o direito à informação e

part icipação dos part iculares no urbanismo português (Sardinha, 1995), as limitações das

abordagens part icipatórias no planeamento territorial (Vázquez, 1999), a forma de part icipação

dos cidadãos na formação de decisões do planeamento urbaníst ico português (Costa Lobo, 2001),

etc.

Não obstante esta diversidade, observa-se, no entanto, um déficit de ident if icação de

est ratégias ou metodologias que permitam a incursão da part icipação pública no planeamento

territorial, da descrição de experiências concretas de planeamento que tenham integrado

abordagens part icipatórias ou da ref lexão sobre vias que permitam a minimização de algumas

das dif iculdades ident if icadas no ponto 1.4. São, no entanto, cont ributos valiosos que têm vindo

a acompanhar a profusão do debate sobre a part icipação no planeamento nos vários cantos do

mundo e a sensibilizar os decisores polít icos e técnicos para a necessidade de uma maior

abertura do processo de decisão à sociedade civil.

Ao nível do debate internacional, que se tem, caracterizado por uma maior profundidade e

diversidade no debate, nomeadamente ao longo das últ imas t rês décadas, verif ica-se, no

entanto e, em parte, devido à escala que este se desenvolve, alguma ambiguidade conceptual e

terminológica, que parece indissociável:

/ da diversidade de contextos territoriais onde os vários discursos são produzidos, no

respeitante, por exemplo, a especif icidades socio-polít icas locais, à est rutura do sistema

de planeamento, enquadramento legal do direito à part icipação, t ipologias de

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planeamento dominante e inst ituições que o promovem, etc. e que dif iculta a avaliação das

abordagens part icipatórias ou análise comparat iva de casos documentados, por exemplo ao

nível da comparação de metodologias, dos níveis de part icipação at ingidos, etc.50;

/ à diversidade de situações geradoras de discursos cent rados na part icipação pública, cuj o

exemplo paradigmát ico são os discursos polít icos em circunstância de campanha eleitoral,

em sectores de serviços públicos (educação, saúde, etc.)

Estes e out ros factores têm cont ribuído para um déficit de estabilização conceptual na teoria do

planeamento colaborat ivo, que também tem sido facilitada pela ut il ização indiferenciada de

designações como: ‘ part icipação comunitária’ , ‘ part icipação pública’ , ‘ envolvimento público’ ,

‘ planeamento comunicat ivo’ , ‘ planeamento colaborat ivo’ , etc., pela ut il ização de terminologia

est rangeira (ex. stakeholders, planning for real, . . , ) ou a criação de neologismos que ilust ram

algumas das novas preocupações do planeamento (por exemplo, com ‘ governância’ territorial).

A este propósito observe-se, também, a abrangência de sent idos associados ao conceito de

‘ part icipação’ 51 que revelam múlt iplas perspect ivas, por vezes complementares, sobre o

conceito52.

McDade (1998) considera que a part icipação pública é um t ipo part icular de relação ent re o

estado (polít icos e burocrát icos) e o resto da sociedade, sendo a const rução desta relação uma

certa forma de dist ribuição de poder e inf luência.

Para Fernandes e Duarte (1985)53, a part icipação é a intervenção e inserção quer nos órgãos

inst itucionais, quer em organizações diversas de forma informal ou pontual.

Fernandes (1997) defende a não unicidade do conceito de part icipação e conecta-o ao conceito

de democracia, af irmando que a democracia deve ser def inida pelo nível de part icipação que ela

permite ou promove e que, nesse sent ido, se pode desconst ruir o conceito de part icipação em

dois conceitos o de:

50 a este propósito comparem-se, por exemplo, os artigos do checo Maier (2001) com o norueguês Amdam (1998) 51 Por exemplo, o Dicionário da Porto Editora refere que esta palavra de origem latina (participatione) tem vários sinónimos, conforme o sentido e momento em que é utilizado. Por exemplo o acto ou efeito de participar, pode querer significar �anunciar�, �comunicar�, �informar�, �dar parte de�� mas também �fazer parte integrante�, �associar-se pelo pensamento�, �acompanhar solidariamente�, �ter ou tomar parte�, etc. (Dicionário da Porto Editora On Line, 2001 in http://www.portoeditora.pt/dol/,), uma pequena recolha de definições permite, portanto, concluir da heterogeneidade do conceito, evidente pela pluralização de sentidos que lhe estão associados.

52 A reflexão sobre o significado de �público� ou �comunidade� (de onde decorre a designação �participação comunitária� ou �pública�) é desenvolvido no ponto 2.5. 53 que desenvolveram uma investigação sobre a participação da mulher na vida política portuguesa

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/ part icipação act iva, correspondente a “ exercer, com capacidade autónoma, uma

inf luência no processo de decisão” ;

/ part icipação passiva e dependente, que, segundo ele, é mais frequente e em que “ as

pessoas são associadas a alguns procedimentos sem intervir na fase f inal da decisão” . A

este nível Teixeira (1997) observa que “ um efeito democrát ico é produzido at ravés de

act ividades que fazem despertar a ilusão de liberdade e part icipação (Teixeira, 1997,

p.184).

Por seu lado, Maier (2001), citando Glass (1979), def ine part icipação pública como uma

oportunidade providenciada pela administ ração aos cidadãos e uma forma de part ilha de poder

com os cidadãos

“Glass (1979) defined ‘citizen par ticipation’ as ‘providing citizen with oppor tunities to take par t in

governmental decision or planning processes’. Viewed from this standpoint, participation is quite contrary to

the very principle of the totalitarian power pyramid found in the Soviet-dominated part of Europe until the end of

the 1980s. Any attempt to provide for the empowerment of citizens in the processes of planning was oppressed

because this process could lead to challenging the central control. As such, any attempts to develop citizen

participation were condemned to failure (or at least marginalization and formality), as long as the central power

was effective” (Maier, 2001, p.709)

Sharaf (1996) considera que popular part icipat ion, “ concerns issues that can create

opportunit ies for expanding the involvement of people in the polit ical, economic and social l ife

of a nat ion” (Sharaf, 1996, p.10).

Baseando-se numa resolução das Nações Unidas sobre participação pública em que são definidos os princípios da

‘participação comunitária’, este autor cita a definição a que chegaram um grupo de especialistas sobre o tema, em

1975: “the creation of opportunities to enable all members of a community and the larger society to actively

contribute to and influence the development process and to share equitably in the fruits of development” (Sharaf,

1996, p.10)

Mais cent rado na área do planeamento, o Department of Environment (1994) britânico refere

que os proj ectos de part icipação têm o obj ect ivo específ ico de “ bring people t oget her in various

ways t o engage around t hat part icular planning or development issue” (DOE, 1994, p.8).

Enfim, o conceito de part icipação está, de facto, associado a diversas ideias e campos de

intervenção na sociedade, caracterizando-se, de uma forma geral, pela intervenção dos cidadãos

ou organizações de cidadãos na tomada de decisão pública, nomeadamente no respeitante a

decisões que afectam mais directamente as suas vidas ou interesses.

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Paraor Sharaf (1996), a part icipação pode relaccionar-se com a procura de part ilha dos

benefícios do desenvolvimento pela sociedade, o que permite j ust if icar, em parte, que esta área

de intervenção pública sej a prioritária nas reivindicações de part icipação da sociedade civil, na

medida em que as decisões do planeamento condicionam, de forma inequívoca, a qualidade de

vida, quot idiana, dos cidadãos. Observa-se, no entanto que existem várias escalas, formas e

t ipos de part iciapação, conforme pretende demonst rar a seguinte f igura baseada em Sharaf

(1996)

EscalasEscalas de de participaçãoparticipação Forma Forma como como sese inicia inicia aaoportunidade para oportunidade para a a participaçãoparticipação

tipostipos de de participação participação nonoprocesso processo de de decisãodecisão

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Custosduração projectosescolha representantes

PARTICIPAÇÃOPASSIVA

(limitada a tarefasassinaladas pelaadministração)

PARTICIPAÇÃO ACTIVA(é a própria participação pública

que determina acções deenvolvimento)

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ivos

)

de forma

directaenvolve decisores e

cidadãos e debate face-a-face, ocorre em escalasmenores e sociedades

menos complexas

indirectaalguns membros da

sociedade representamrestantes, ocorre em escalasmaiores ou sociedades mais

extensivas

Figura 2-1: Parâmet ros para avaliar a part icipação

Para além do debate desenvolvido sobre o(s) signif icado(s) do conceito de part icipação e

ident if icar alguns parâmet ros para caracterizar a part icipação, ref lecte-se seguidamente sobre

os mot ivos que levaram à emersão das questões da part icipação para a agenda polít ica

internacional.

A maior parte dos autores concorda que o interesse por estas temát icas se iniciou nos anos 60,

numa altura em que surgiram os primeiros estudos sobre o tema e em que este foi int roduzido,

ainda que lentamente, na agenda polít ica e de planeamento de alguns países e de organizações

internacionais.

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McDade (1988), reportando-se à história da Grã Bretanha, refere que o desinteresse polít ico e

académico pela part icipação pública no processo de tomada de decisão até aos anos 60, suscitou

o incremento das crít icas dos cidadãos aos planeadores, que passaram a ser acusados de não

cumprir as suas tarefas de forma democrát ica, suscitando uma reivindicação pública que foi

confrontando os polít icos com a necessidade de darem respostas aos ‘ eleitores’ .

“In all democratising societies, the issue of par ticipation has been increasingly becoming impor tant. It

attains growing interest in all segments of public services and governmental policies. The attitude of particular

public and governmental organisations may, however, vary from willingness to acknowledge citizens and citizen

initiatives as partners to viewing them as enemies of streamlined and orderly processes. (Maier, 2001, p.709)

Dois exemplos de act ivismo pró-part icipação promovidos em Portugal, têm sido os

protagonizados por dois professor catedrát icos, um do Inst ituto Superior Técnico da Universidade

de Lisboa e planeador, o out ro da Faculdade de Let ras da Universidade de Coimbra e sociólogo,

respect ivamente, Costa Lobo (2001) e Sousa Santos (1994). Ambos favoráveis a uma maior

part icipação pública na administ ração pública com vista a uma maior t ransparência e ef icácia,

Costa Lobo (2001), que foi Provedor da Qualidade de Vida da CMLisboa vem propondo uma

“ reforma das prát icas de planeamento nacional” , Sousa Santos, inspirado pela experiência do

município de Porto Alegre, no Brasil (Anexo 2) vem mobilizando a população organizada para a

criação de um modelo de part icipação para a gestão autárquica (de Coimbra):

“A prática profissional tem revelado anomalias gritantes que interessa rodear na medida do possível mas também

clama por modificações mais ousadas e reformas mais estruturantes (…); a tão falada transparência do

executivo municipal está longe de ser atingida…; situações de funcionários mal utilizados ou “na prateleira”

deviam ser cabalmente esclarecidas para conhecimento da opinião pública e debate…; o mercado dos projectos

pr ivados deve ser revisto e examinado, evitando mecanismos de mecanismo de influência menos

escrupulosa ligados à administração camarár ia ou aos serviços públicos de tutela;… há que facilitar a

par ticipação do cidadão…” (Adaptado, Costa Lobo, 2001, p.15).

“Nos últimos anos, as propostas da Associação Cívica Pró-Urbe foram recebidas pelo poder autárquico com

alguma hostilidade, mas não lhe será fácil, a partir de agora, ignorar as deliberações do Conselho da Cidade”

(declarações de Boaventura Sousa Santos ao Jornal Público, 7 de Julho de 2001, “Nacional”, p.11). Segundo o

mesmo jornal, o Conselho da Cidade presidido por Sousa Santos, é um órgão sem legislação que o sustente, mas

que integra já 26 associações cívicas e 15 personalidades de Coimbra, eleitas em congresso, cujo principal

objectivo é a promoção do debate público e apresentação de propostas alternativas de gestão da cidade54.

Se a oportunidade de part icipação dos cidadãos tem sido um processo dif icultado pelos

detentores do poder, indiferentemente, em todos os países do mundo, também é verdade que

esta pressão tem sido um dos principais motores para a mudança de mentalidades, muito

54 Jornal Público, �Nacional�, 7 de Julho de 2001, p.11

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embora o processo sej a dif ícil como descreve Maier (2001), acerca da prát ica na República

Checa durante os anos 9055.

“The legitimisation of business involvement in the process of planning is fully compatible with the trend of

development-oriented planning which has prevailed since the mid-1990s. The voice of public initiatives and

newly emerging weak and hard-up non-governmental organisations (NGO’s) have thus far had little chance of

penetrating the ‘coalitions of money and power’ established in some towns between business groups and local

officials. Also planners have mostly hesitated to view citizen initiatives and NGOs as par tners or even

allies” (Maier, 2001, p.711).

Out ros autores, têm vindo a defender que a corrente noção de part icipação comunitária foi

popularizada pelas Nações Unidas e seus corpos of iciais com vista ao desenvolvimento

comunitário, e que actualmente tem sido aplicada a diversas áreas, como a saúde, educação,

habitação, t rabalho social ou desenvolvimento rural e urbano, quer em programas

governamentais quer em não governamentais. Esta é, de resto a opinião de Sharaf (1996) ou

Midgley (1986) que lêem nos relatórios das Nações Unidas uma crescente aproximação do

conceito de ‘ part icipação pública’ ao de ‘ desenvolvimento social’ . De facto, o esforço

concertado de fortalecer as inst ituições dos países mais pobres é visto pelas Nações Unidas como

uma oportunidade para act ivar e acelerar o processo de desenvolvimento socioeconómico nesses

países, assegurando uma dist ribuição mais equitat iva dos benefícios” (Midgley, 1986, p.13)

A Japan International Cooperation Agency (1995) refere, de resto, que o debate sobre as questões da participação

e boa governância é inseparável das estratégias das estratégias assistencialistas aos países em vias de

desenvolvimento desde os anos 50. Segundo esta agência, a crise económica mundial dos anos 70, associada ao

aumento do preço do petróleo, suscitou que os fundos dos países doadores para os PVD recentemente

descolonizados, deixassem estar tão disponíveis como antes, o que se viria a reforçar após o final da Guerra Fria.

Face a um crescente cepticismo relativamente à utilização dos fundos de desenvolvimento, os PD, com uma

crescente limitações nos seus orçamentos, passaram a exigir que esses fossem utilizados de uma forma mais

efectiva e eficiente, nomeadamente para a promoção democrática, protecção dos direitos humanos e reformas

políticas. Às estratégias centradas no crescimento económico e industrialização dos anos 60, que visavam um

incremento das infraestruturas económicas de países recentemente independentes56, passou-se, nos anos 70, para

uma estratégia que visava uma maior justiça social e menores diferenças entre ricos e pobres. O ênfase é posto na

estratégia de promover directamente os mais pobres, ao nível da promoção das suas necessidades básicas

(educação, saúde, ..) e o conceito de par ticipação comunitár ia nasce da consciência dos benefícios que

poder iam resultar da par ticipação activa dos beneficiár ios no desenvolvimento desses projectos.

55 Recorde-se que a independência da República Checa ocorreu em 1989, correspondendo à sua passagem de um �soviet-fashion dirigism� (Maier, 2001, 710) para um regime pluralista de tipo ocidental. O período de transição democrática do país e de descentralização de poderes para níveis inferiores, fez-se lentamente e, ao nível do planeamento, caracterizou-se por debate, por exemplo, em redor do papel de controle, que o planeamento deveria possuir. Foi também um período em que os empreendedores privados tomaram consciência dos benefícios que poderiam decorrer da influencia das decisões públicas para o seu interesse privado, mas que os grupos comunitários eram dificilmente aceites. 56 Acreditava-se que o resultado do crescimento económico estaria concentrado inicialmente numa parte da cidade, mas que posteriormente se iria expandir para todos os grupos. Segundo a Japan International Cooperation Agency (1995) tal objectivo foi sendo impedido pela corrupção sistemática dos governos, falta de transparência no processo de decisão, ineficiente gestão do sector público, etc.

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89

Em síntese, o conceito de part icipação é frequentemente ambíguo e são sugeridas origens

diversas para o debate sobre o tema. Interessa, pois, proceder-se a uma revisão bibliográf ica das

principais ref lexões sobre as teorias da part icipação, nomeadamente das que revelam uma maior

pert inência para o campo de aplicação do planeamento territorial.

Um dos primeiros estudos sobre esta temát ica foi desenvolvido por Arnstein, em 1969, (Maiden,

1999; McDade, 1998), que apresentou uma “ escada de part icipação” com vários degraus, em que

cada um correspondia a um determinado nível de envolvimento dos cidadãos.

Figura 2-2: Escada de Part icipação de Shelley Arnstein, 1969

Um modelo que, segundo Williams et al. (2001) cont inua a providenciar um quadro de t rabalho

út il para def inir a part icipação pública, pelo que muitos estudos têm vindo a aplicar esta escada,

para relevar o signif icado da part icipação pública e o sent ido de colaboração.

O modelo de Arnstein muito embora sej a reconhecida por ter permit ido diminuir a ambiguidade

à volta do conceito de part icipação, é crit icada por evidenciar:

1. Uma percepção demasiado abrangente do entendimento de part icipação: designando por

‘ part icipação’ os níveis de manipulação, t erapia ou informação, que se situam na base da

escada e que hoj e não podem ser aceites como de genuíno envolvimento público57 ou os

níveis de informação, consult a ou apaziguament o que correspondem a estádios de

57 Esta contradição da Teoria de Arnstein - entre o que é apresentado como participação nos anos 60 e o que hoje se admite como merecendo tal designação- ilustra também, de alguma forma, o próprio carácter evolutivo deste conceito que, no fundo, é uma construção histórica e social.

Manipulação

Terapia

Informação

Consulta

Apaziguamento

Partenariado

Delegar poderes

Controlo do cidadão

Manipulação

Terapia

Informação

Consulta

Apaziguamento

Partenariado

Delegar poderes

Controlo do cidadão

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envolvimento muito limitados em que o cidadão se vê obrigado a part icipar de forma

react iva sobre propostas f inalizadas e que não t iveram em conta as suas opiniões ou

necessidades.

Esta questão remete-nos, de resto, para o paradoxo que já tinha sido observado por Teixeira (1997) de uma

“participação” que é “passiva”. Sharaf (1996) dsigna estas formas de envolvimento como “pseudo-participação”,

(contrários a uma autêntica participação) e Cullingworth (1988) de “não participação” correspondentes a pouco

mais do que um mero exercício de informação para os que detêm o poder de decisão. De facto, o ritual da

participação não tem, necessariamente repercussões sobre a forma como são tomadas as decisões, podendo

corresponder, a pouco mais do que um mero procedimento burocrático ou de retórica política

2. Maier (2001), refere que Arnstein analisa o dinamismo da mudança no envolvimento dos

cidadãos no planeamento, dist inguindo dos degraus mais baixos da escada, de ‘ não

part icipação’ , em que há manipulação e terapia dos cidadãos, até níveis intermédios de

informação e consulta, em que os cidadãos têm o poder de dar conselhos, até níveis

superiores em que o cidadão toma o cont rolo sobre o processo de decisão.

“The next steps are placation where citizens have an advisory position, and partnerships where trade-offs are

made between powerful and ‘ordinary’ citizens. Only on the top of the ladder does the citizens’ role reach the

rungs of delegated power and citizen control, where citizens have a major role in decision-making processes”

(Maier, 2001, p.709)

No topo da escada, posicionam-se os níveis de maior poder para o cidadão, como as relações de

partenariado, delegação de poder ou cont rolo do cidadão é, no entanto, cont roverso, que,

conforme é proposto pela metáfora da escada, o mais desej ável sej a sempre evoluir-se para o

topo em termos da part icipação pública (McDade, 1998). De facto, como observa Maiden (1999)

mais cont rolo não signif ica necessariamente melhor cont rolo e tal nível de cont rolo pode não

corresponder ao desej o da sociedade, que pode preferir uma responsabilização técnica das

decisões.

Maier (2001) que também interpreta na metáfora de Arnstein a ideia de que é desej ável uma

part icipação com um gradual aumento de tomada de poder pelos cidadãos, discorda desta visão,

observando que, frequentemente o cidadão recusa esta responsabilização ou considera-se

incapaz de assumir o poder de decisão:

“In my view, an opportunity to take part in planing and decision-making may not necessarily lead to real

participation: the citizenry may fail to take part or even they may refuse it, feeling their incapability or lack of

willingness to take responsibility” (Maier, 2001, p.709)

Cullingworth (1988) caracterizou a população em termos da sua predisposição para a

part icipação, designando-a por act iva ou inact iva. Ao nível da população act iva, interessa

quest ionar a natureza da part icipação que está em causa, a de indivíduos que não olham para lá

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dos seus interesses ou a que se cent ra mais nos interesse da comunidade ? (a este propósito ver

as racionalidade para a part icipação propostas por Campbell e Marshall, 2000, e apresentadas no

1.4). Ao nível da população que não desej a part icipar, Cullingworth (1988) ident if ica mot ivos

diversif icados como: circunstâncias pessoais, receio por potenciais conflitos, falta de interesse,

baixas expectat ivas em relação ao processo de decisão (possibilidade de inf luenciar decisão) ou

falta de conhecimento58.

Outra crít ica de McDade (1988) à Teoria de Arnstein prende-se com o facto desta revelar uma

explicitação deficiente dos diversos conceitos ut il izados e problemat ização das dif iculdade de se

at ingirem os vários degraus da escada.

Por out ro lado, a opinião de Maiden (1999) é que estes níveis não são necessariamente exclusivos

podendo mais do que um nível ser simultaneamente experimentado por uma mesma

comunidade. Maiden (1999) crit ica ainda o simplismo desta escada observando que para cada

degrau da escada existem um conj unto vasto de experiências ou categorias de part icipação

possíveis. Por exemplo, ao nível do degrau da “ informação” podem exist ir diferenças claras no

t ipo e qualidade da informação t ransmit ida, ou no de “ consult a” diversos t ipos de

aprofundamento e consequências para a revisão das propostas iniciais.

Percebe-se, portanto, que as questões da part icipação, mesmo em cada um dos níveis

ident if icados por Arnstein, integram um conj unto complexo e cont ínuo de situações, que

dif icilmente podem ser def inidos de uma forma genérica e isolada. Mesmo face a casos

concretos existem diferentes formas de perceber o nível de part icipação obt ida, o que parece

estar relacionado com a ideologia, base polít ica, experiência ou formação prof issional,. . . , de

diferentes indivíduos, grupos sociais ou prof issionais. É, portanto, fundamental, quest ionarem-se

ideias aparentemente adquiridas e admit ir-se que muitos processos part icipatórios ocorrem sem

ef icácia.

O DoE (1994) a este propósito sugere que no início de um proj ecto de part icipação os vários

part icipantes sej am convidados a clarif icar o nível de part icipação porque aspiram e o que

entendem por esse nível.

Atendendo à variabilidade de interpretações participação pública, um primeiro passo no arranque de um processo

de participação pública deve passar pela explicitação das expectativas ou objectivos que são perseguidos, por

cada um dos diferentes actores envolvidos - comunidade civil e sectores privado e público, bem como as suas

expectativas em relação ao processo de participação. A definição do que se espera de um processo de

participação pública deve passar, também, pela explicitação da extensão da participação, nomeadamente se esta

58 Aqui podem entrar aspectos diferenciados como o conhecimento sobre as temáticas em análise, as janelas de oportunidade que existem para a participação, os conhecimentos para expressar correctamente essas ideias, etc.

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se irá restringir a temas específicos ou se deve ser mais abrangente, outro aspecto relevante, ainda que

modificável ao longo do processo, é o da explicitação dos resultados finais que idealmente se gostariam atingir

colectivamente. A clarificação de todas estas dimensões – o que envolve a participação, a extensão das temáticas

a abordar durante o processo, os produtos finais esperados e a sua significância social, entre outros, têm

implicações ao nível da definição das técnicas apropriadas para encorajar a participação (DoE, 1994)

Todos os participantes, não só os promotores do processo de participação , regra geral as autoridades

governamentais, como os demais actores envolvidos, devem, pois, estar conscientes dos objectivos que

pretendem atingir em termos do processo de envolvimento público, bem como clarificar essas expectativas ao

grupo. Só depois desta fase de clarificação de objectivos e de expectativas por parte de todos os participantes, é

que o grupo poderá definir, colectivamente, as finalidades e objectivos gerais para a prossecução dos trabalhos,

ao que se seguirá a definição do quadro estratégico e metodológico a implementar. O próprio papel de cada um

dos participantes deverá ser reflectido em conjunto, nomeadamente o dos profissionais de planeamento, cuja

função poderá variar de acordo com a interpretação subjectiva de cada um dos participantes sobre o que envolve

a participação

Outras teorias de part icipação mais recentes têm-se cent rado sobre a necessidade de perceber a

part icipação em termos de um processo de “ empowerment ” de indivíduos e comunidades,

valorizando a importância da delegação de poderes a indivíduos ou comunidades em situações de

desvantagem

Midgley (1986) observa que a ideia de que os pobres e população oprimida (do ponto de vista económico, social,

..) deveria ser mobilizada e encorajada a participar no processo de tomada de decisão para o desenvolvimento

social ao nível local, só foi formalizada e popularizada ao longo das últimas décadas. De resto, segundo este

autor, tem-se vindo a assumir a participação pública como um dos objectivos do desenvolvimento social,

defendendo-se que a participação dos cidadãos no processo de tomada de decisão e implementação, pode

promover maiores níveis de desenvolvimento (Midgley, 1986).

A participação passa, então a ser vista mais do que como um mero indicador, um factor de desenvolvimento

A este propósito, Innes (1998) refere que nos EUA tem-se vindo a desenvolver, com maior

relevância, uma rede interligada de “ comunicat y advocacy” desenvolvida por agências não

lucrat ivas e assentes em princípios comunicat ivos, que t rabalham conj untamente e de forma

f lexível, at ravés de redes informais para “ produzir poder polít ico para grupos em desvantagem”

Tem-se vindo, ainda, a desenvolver a ideia de que o cidadão é um consumidor que pode

escolher ent re várias alternat ivas e que pode passar a responsabilizar-se pelas suas próprias

escolhas at ravés de um processo act ivo de tomada de decisões. Uma tomada de poder referida

por Maiden (1999), com base num estudo de Burns et al (1994) que adaptaram a escada de

Arnstein a uma versão mais aplicável à situação contemporânea (Browill et al. , 1998). A escada

de poder do cidadão que a seguir se representa, apresenta os vários níveis de poder do cidadão

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Cont rolo do Cidadão

12. Cont rolo independente

11. Cont rolo confinado

Part icipação Cidadão

10. Delegar cont rolo

9. Partenariado

8. Descent ralização limitada de tomada de decisões

7. Quadros consult ivos ef icazes

6. Consulta genuína

5. Alta qualidade da informação

Não part icipação do Cidadão

4. Cuidado com o cliente

3. Informação deficiente

2. Consulta cínica

1. Publicidade enganosa

Figura 2-3: Escada do Poder do Cidadão

Sem poder aprofundar esta teoria, pela impossibilidade de aceder directamente ao estudo de

Burns59, o que f ica claro desta escada é que existe uma importante dist inção ent re informar a

população, consultá-la ou envolvê-la no processo de tomada de decisão. Out ros aspectos que se

destacam desta escada é a incursão de aspectos como a de publicidade enganosa ou consulta

cínica, que se relaciona, respect ivamente, com um exagero de publicidade ou com um aparente

poder, que não corresponde à realidade que se delega à comunidade.

Brownill, Razzaque e Kochan (1998), defendem que a “ consulta” à comunidade sobre temát icas

da governância urbana, supõe, sempre, um entendimento das relações de poder ent re uma

agência e os seus públicos, uma vez que as questões da consulta, relacionam-se em essência,

com o nível de inf luência e cont rolo na concepção e implementação polít ica.

O facto destas teorias serem meras simplif icações de uma realidade muito mais complexa, pode

ser ilust rada pela relação de partenariado, que não obstante ser classif icada como uma forma

de poder do cidadão, pode na realidade não ser consubstanciada dessa forma, o que, em parte,

se relaciona com os próprios obj ect ivos subj acentes à const ituição de um partenariado.

59 BURNS, D.; HAMBLETON, R and HOGGART, P. (1994) � The politics of descentralization, Basingstoke, MacMillan.

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Maiden (1999), citando Mackintosh (1993), ident if ica t rês modelos que muito embora pouco

acrescentem sobre o nível de poder do cidadão, ilust ram os obj ect ivos subj acentes à

const ituição de partenariados.

1. Modelo de alargamento de orçamento – ocorre em situações em que os parceiros se

j untam para ter acesso a fundos de uma terceira parte (governo cent ral, comunitários,…)

aos quais não poderiam aceder de out ra forma. Para a candidatura a fundos públicos,

optam, por vezes, por uma mera “ reprodução” de metodologias de part icipação, devido ao

seu carácter de obrigatoriedade.

Também Amdam (1999) observa que muitas vezes a participação pública não é mais do que um tiyual com vista

à obtenção de financiamentos: “a local community or regional authority that develops plans and strategies for

development that they themselves do not have faith in or believe can be realised, is seldom successful. Such

planning is often a task stimulated from above to get access to founds or to fulfil national goals, a symbolic or

ritual kind of planning” (Amdam, 1999, p.581)

Geddes (1999) também observa que a criação de partenariados locais60 tem sido incentivada por programas

nacionais (como o Dévelopment sociale des Quarties (DSQ) da França, o Single Regeneration Budget Challenge

Fund, que é um programa de regeneração urbano britânico, Flemish Fund for the integration of the Under

Privileged, na Bélgica, etc.) e programas comunitár ios como o URBAN, LIDER, de Combate à Pobreza, etc.

2. Modelo de sinergia – neste modelo a const ituição do partenariado baseia-se nos benefícios

que se presumem resultarem do t rabalho conj unto ent re diferentes parceiros, mediante a

part ilha de conhecimentos, recursos ou culturas de t rabalho,… na confiança de que o

somatório dos resultados deste t rabalho conj unto, será maior que a soma individual das

partes. Tal modelo tem evidenciado especial relevância para encoraj ar a criação de

partenariados em contextos de regeneração urbana

3. Modelo de t ransformação – neste caso o obj ect ivo da criação de partenariados é desafiar o

convencional sistema organizacional de funcionamento propondo novas abordagens e

formas de t rabalhar com parceiros.

É, no entanto, de salientar que alguns dos partenariados que são const ituídos podem ref lect ir

mais do que um destes modelos sendo mais importante do que t ipif icar as várias situações,

salientar que quanto maior for a consciência da imprescindibilidade do envolvimento público ao

nível destas relações de part ilha tanto maior será o seu sucesso e genuinidade.

Mc Dade (1998) crit ica, por exemplo, os paradoxos que se estabelecem na const ituição de

partenariados locais a part ir de polít icas cent ralistas, nacionais ou comunitárias, com vista ao

desenvolvimento de est ratégias bot t om-up. Em alguns casos uma correcta concepção local dos

60 Independentemente das características das áreas territoriais para onde são criados (escala, funções predominantes ou localização, por exemplo, para centrais urbanas, rurais, industriais�) e problemáticas de planeamento que querem solucionar (exclusão social, degradação urbana e ambiental, declínio económico, ..

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proj ectos, baseada em prát icas de boa governância e part icipação dos potenciais beneficiários

destes partenariados gera resultados que têm sido avaliados como muito posit ivos (Vázquez et

al. , 2001), mas nout ros polít icas cent ralistas nacionais que não delegam competências e fundos

para o nível dos problemas esbarram com resultados decepcionantes que se caracterizam por

baixos níveis de sat isfação dos part icipantes

Por seu lado, Azevedo (1993), que assume uma posição favorável à const ituição de soluções de

partenariado61, defende que eles são uma condição importante para a promoção e reforço do

desenvolvimento territorial, ident if icando dois t ipos consoante as suas f inalidades e regras de

funcionamento:

/ partenariado horizontal, que envolve, normalmente, ent idades de estatuto público ou

privado de base local e representantes de diferentes sectores e interesses, com vista à

resolução de problemas, por exemplo no aproveitamento de potencialidades comuns como

a concepção e execução de planos de desenvolvimento local.

/ partenariado vert ical, que associa inst ituições locais, regionais e cent rais, de estatuto

público/ privado e const ituem-se, normalmente, para dar corpo a alguma intervenção

concreta em favor do desenvolvimento da zona, que exij a a part icipação de diversos t ipos

de poder (Azevedo, 1993, p.213)

Verif ica-se nestas definições, designadamente na de partenariado horizontal, quando faz

referência à inclusão dos representantes de vários interesses territoriais, uma referência ainda

que não explicite a ideia de part icipação da comunidade. De facto, este autor considera que a

criação de partenariados “ const itui um factor mobilizador das forças locais e das próprias

comunidades, reforçando elos de solidariedade e de união em torno de valores comuns,

federando interesses e conferindo maior representat ividade face a interlocutores exteriores”

(Azevedo, 1993, p.215).

Out ras vantagens que este autor apresenta de um maior envolvimento das inst ituições locais na

análise e resolução dos problemas que se colocam, relaciona-se com o aparecimento de soluções

mais pert inentes e ef icazes para esses problemas, at ravés da aproximação e coordenação ent re

ent idades públicas e privadas, de nível cent ral, regional e local.

Para além do envolvimento dos sectores privado e público referido por Azevedo (1993), tem-se

vindo a af irmar a importância da part icipação de organizações não governamentais voluntárias

61

que, define como formas institucionais que associam organizações privadas e públicas, de âmbito central, regional e local, em torno de objectivos comuns

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(por exemplo, ambientais) e comunitárias (de moradores, culturais, …) é t ido como essencial de

forma a agarrar e promover toda a energia, competências e recursos existentes na sociedade.

A teoria do planeamento dos últ imos 20 anos, especialmente a publicada nos EUA e Europa

setent rional, releva o crescente interesse pelas formas de negociação do sector público com o

privado, o que aparece muito ligado à própria falência económica do ‘ Estado Providência’ e ao

intento de promover um planeamento empreendedor, caracterizado pela cont ratualização com o

sector empresarial.

Se num primeiro momento a comunidade f icou totalmente arredada deste processo deste

processo de negociação, num segundo momento e face às insistentes crít icas à administ ração

pública e planeamento pelas consequências que daí resultaram (capítulo 1.1), a administ ração

pública deixa de estar unicamente pressionada pelos grupos de pressão económicos e passa a ser

também coagida pelos grupos act ivistas comunitários que exigem processos de decisão mais

t ransparentes e j ustos para todos os interesses territoriais e não só para os grupos de maior

poder de inf luência.

Aos planeadores era, cada vez mais, exigido o papel de mediação de conflitos, de const rução de

acordos ent re partes, de negociação com um leque crescente de agentes territoriais.

Muito embora em Portugal esta seja uma área de formação praticamente ignorada pelos cursos de graduação e

pós-graduação no planeamento territorial, observa-se no estrangeiro uma crescente facilitação destas

competências, sendo o caso mais paradigmático desta situação os EUA.

“You will learn how to use dialogues to bring stakeholders (public groups, business sectors, government,

educational bodies) into effective groupings to reach agreement and draw up action plans to implement that

agreements strategies planned in advance of time of crises will be more widely accepted, and consensus plans

will make a more persuasive case to governments and the public” pelo Department of Environmental and

Sustainable Development, University of New Brunswick (http://www.unb.ca/web/enviro/cdm/cdmread2.htm)

A este propósito McDade (1998) analisa t rês teorias que explicam o t ipo de relações que se

podem desenvolver na sociedade, ident if icando vários obj ect ivos para a incursão da part icipação

pública.

A perspect iva de t ipo consensual, parte do pressuposto que a sociedade é um sistema estável

caracterizado por uma aceitação comum de uma cultura, valores e organização, pelo que o

Planeamento deve ser encarado como um exercício técnico apolít ico conduzido pelo interesse

público. Nesta perspect iva os problemas sociais são totalmente at ributáveis aos problemas de

comunicação ent re decisores e público e, assim, a part icipação pública visa, prioritariamente,

resolver os problemas de comunicação ent re os diferentes actores com vista à criação de

consensos.

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Na perspect iva pluralista entende-se que a sociedade é vista como sendo const ituída por diversos

grupos de interesses e valores e o planeamento como uma act ividade predominantemente

polít ica em que os polít icos são os árbit ros f inais. Neste entendimento, os problemas sociais são

resultado de um sub-representação de certos interesses do sistema democrát ico, pelo que a

part icipação const itui uma via fundamental para esses grupos inf luenciarem os decisores

públicos e os planeadores devem actuar como advogados dos mais indigentes.

Na perspect iva de conflito argumenta-se que sempre exist iram incompat ibilidades de interesses

na sociedade, que o conflito é endémico e os problemas sociais resultam dos conflitos ent re

grupos, nesse sent ido o obj ect ivo principal da part icipação pública é a redist ribuição de poderes

e recursos.

Destas diferentes formas de entendimento dos diferentes interesses da sociedade resultam,

simultaneamente, diferentes visões para a part icipação pública.

Bruton e Nicholson (1987) observando as desigualdades existentes em qualquer sociedade (no

acesso à informação, produção, def inição e legit imação do conhecimento), consideram o

conflito, em vez do consenso, uma das componentes do processo de decisão. Na opinião destes

autores, sendo o planeamento uma act ividade primeiramente relacionada com o espaço físico,

por exemplo ao nível da alocação de recursos, esta é uma act ividade potencialmente geradora

de conflitos, por exemplo relat ivamente a quem cont rola as decisões. Sendo os grupos com

maior recursos (por exemplo skil ls) os que em qualquer processo de decisão normalmente saem

beneficiado (Bruton e Nicholson, 1987, p.83), interessa ref lect ir sobre o signif icado das

“ bargaining posit ion” , isto é das decisões que são negociadas para que sej am aceitáveis pelas

várias partes.

Segundo Feindt (2000) na maior parte dos países ocidentais há uma mult iplicidade de

mecanismos para resolver conflitos públicos, podendo ser dist inguidos t rês modos de

legit imidade democrát ica:

1. de Democracia Representat iva- este é o modo dominante na maior parte dos países

ocidentais. No campo prof issional do planeamento territorial as act ividades de planeamento

urbano têm de ser supervisionadas e licenciadas pela autoridade de planeamento local, que

são inst ituições burocrát icas são responsáveis face a uma assembleia municipal que é eleita

pela parte da população que tem direito a votar;

2. de Democracia Directa- em alguns locais, como no caso da cidade de Hamburg (Alemanha),

os cidadãos têm adicionalmente o direito de iniciar o referendo sobre tópicos isolados. O

resultado obriga, por um determinado número de anos, dependente do tema, as

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autoridades públicas a respeitarem as decisões populares que não podem ser anuladas pelo

execut ivo municipal ou assembleia municipal. Esta forma pode ainda gerar posições de veto

na negociação de polít icas públicas ou temas de planeamento;

3. de Democracia Cooperat iva: nos últ imos anos tem ganho maior atenção e legit imidade este

modo de tomada de decisão. Nesta def inição ent ram um conj unto de act ividades na sua

maior parte desenvolvidas pelo município para envolver os cidadãos no processo de

formulação polít ica e implementação das decisões, em que se procura que os cidadãos se

assumam como co-planeadores e co-organizadores.

Referindo a tendência geral dos anos 80 de uma maior democracia e pluralismo político no mundo,

nomeadamente de países em vias de desenvolvimento que testemunharam a emergência de eleições

parlamentares e presidenciais através de sistemas políticos multipartidários, Japan International Cooperation

Agency (1995) refere que o sentido original de democracia significa igual participação dos membros da

sociedade no processo de tomada de decisões da sociedade. E se, num primeiro momento passa pela participação

em processos de eleições representativas, nos anos mais recentes tem-se vindo a defender uma participação

pública que não se restrinja às eleições, mas que integre a democracia participatória: “As seen by the

participatory democracy trend, participation is again to be understood as something of core value in democracy”

(Japan International Cooperation Agency, 1995, p.7)

Na actualidade a ut il ização de termos como ‘ conflito’ , ‘ negociação’ , ‘ cooperação’ denota uma

complexidade indissociável do processo de planeamento territorial.

Repare-se, por exemplo, como sugere Azevedo (1993), que o colaborar no planeamento

territorial (por exemplo na revisão de um Plano Director Municipal) pode integrar um processo

negociação, que se bem sucedido corresponde a uma cooperação ent re as partes e obtenção de

consenso

“As instituições intervêm naturalmente num determinado ambiente, de forma individualizada, nalguns casos

segundo práticas de competitividade e até mesmo de conflitualidade. Ora numa situação de partenariado a

intervenção das instituições (parceiros) pauta-se pela cooperação e coordenação de posições e acções…”

(Azevedo, 1993, p.215)

O esquema seguinte realça a complexidade e tensão que se associa à pluralidade de interesses

da sociedade, que exigem do planeador o desafio da const rução de consensos.

Figura 2-4: A complexidade na prát ica do Planeamento Urbano

PARTICIPAÇÃO

conflitualidade

competitividade

Concertação,Coordenação,

harmonização face aobjectivos específicos eface a quadros de acção

estratégica

CONFLITOS CONSENSOS

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Judith Innes62 (1998) referindo-se ao contexto específ ico dos Estados Unidos da América e ao

papel aí desempenhado pelos planeadores, af irma que este é predominantemente de negociação

e comunicação com um conj unto diversif icado de grupos de interesses (da comunidade, de

invest idores, of iciais eleitos, etc.) Crit ica, no entanto, que os planeadores se confrontem

frequentemente com a falta de guidel ines para a acção, nomeadamente ao nível das questões

ét icas relacionadas com o dilema da definição do saber “ a quem responder” .

Nos EUA, o Planeamento Territorial é dificilmente aceite em vários estados, não existindo, por exemplo, a

obrigatoriedade de planos ou da contratação de técnicos de planeamento. A actividade neste país, segundo Innes

(1998) é, de resto, bastante afectada pela fusão ou sobreposição de responsabilidades entre diferentes níveis de

agências públicas (federal, estatal e local), com diferentes missões e responsabilidades, sendo também bastante

forte a acção de grupos de pressão movidos por um conjunto de temáticas (de ambiente regional, como a

qualidade do ar, gestão de água, preservação de espécies, etc), e para uma forte tendência para a criação dos

movimentos NYMBI (Ascher, 1995 ).

Ao longo dos últimos anos, tem aumentado este desafio do papel de negociação por parte dos planeadores nos

EUA (nomeadamente devido ao facto de vários grupos de interesses organizados terem integrado o processo de

tomada de decisão do planeamento)

O Department of Urban Affairs and Planning de Virgínia, EUA, refere-se a esta nova forma de fazer

planeamento que soube reinventar a sua natureza básica: “the role of the planner has evolved from grand

designer to technician/expert to a facilitator who assists community members as they develop a collective vision

for the future. Virtually every aspect of planning requires that a planer come into contact with the general public

– through public hearings, commission meetings, plan review sessions, community problem-solving sessions, or

office appointments.”

62 que acumula os cargos de Directora do Instituto de Desenho Urbano e Regional e Professora de Planeamento Regional e Urbano da Universidade de Califórnia, em Berkeley

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2.3 - Poder e est ratégias da Administ ração pública para a incursão da

part icipação pública

Neste ponto ref lecte-se sobre as questões de poder na sociedade e a forma como inf luenciam as

decisões da administ ração pública, especif icamente do planeamento territorial. A este propósito

quest ionam-se as est ratégias ut il izadas pela administ ração pública para a promoção de

abordagens part icipatórias, nomeadamente em termos dos seus obj ect ivos, dist inguindo-as

quanto à sua capacidade de promoverem um envolvimento público mais ef icaz que não se limite

a um mero momento de auscultação pública.

Finalmente, int roduz-se uma questão essencial que, no entanto, tem passado relat ivamente à

margem do debate no Planeamento Colaborat ivo: que ‘ espaço’ deve ser obj ecto de part icipação

do planeamento territorial (todos os temas, só alguns ? quais?)

De forma int rodutória, para facilitar a compreensão de conceitos como ‘ Estado’ ou ‘ sociedade

civil’ , apresenta-se uma “ cartograf ia holíst ica” (simplif icada) que foi criada por Friedmann

(1996) para int roduzir algumas questões sobre as relações de poder na sociedade (Friedmann,

1996, p.28).

Figura 2-5: Os quat ro domínios da prát ica social

Espaço de vida(território)

ESTADO

COMUNIDADEPOLÍTICA

SOCIEDADECIVIL

ECONOMIAEMPRESARIAL

ESPAÇO ECONÓMICO GLOBAL

a

a’

b b’

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Friedmann (1996) expõe quat ro domínios da prát ica social, cada qual com um núcleo autónomo

de inst ituições que governa a respect iva esfera e com dist intas formas de poder – estatal, social,

económico e polít ico, de acordo com os recursos que os actores que cada área consegue

mobilizar.

Deste esquema o que se torna mais interessante, como sugere o seu autor, é um olhar mais

atento às fracturas existentes dent ro de cada domínio ‘ aparentemente’ homogéneo, o que

permite ver, para lá da sobreposição inter-domínios, em que se inf luenciam reciprocamente

embora com diferentes níveis de inf luência, uma pluralidade de grupos com natureza e

interesses, por vezes, bastante diferentes ou até cont raditórios.

“…Quando olhamos mais de perto (para o esquema), a unidade aparente quebra-se e as fronteiras que até então

eram nítidas, começam a misturar-se. O estado tem muitos centros de poder que estão frequentemente em

desacordo uns com os outros e que raramente actuam de forma coordenada. A sociedade civil divide-se ao longo

de conhecidas linhas de fractura, de classe social, casta, etnicidade, raça, religião e género. A economia

empresarial é composta de actores em conflito feroz entre si, aliando-se apenas quando é conveniente para o

interesse colectivo. E a comunidade política é, evidentemente, o terreno quintessencial do conflito entre grupos e

facções diferentes, envolvendo os três domínios restantes (…)(Friedmann, 1996, p.28)

Pereira (1994) concorda com esta perspectiva, descrevendo o poder estatal como sendo composto por uma rede

complexa de entidades, com concepções específicas da realidade, objectivos próprios e por vezes contraditórios,

construídos a partir das competências que lhe estão fixas

No respeitante à sobreposição de domínios, Friedmann (1996) refere que “ Os quat ro domínios da

prát ica social têm relações t radicionais umas com as out ras. No ocidente, ao longo dos últ imos

200 anos, o poder tem-se vindo a acumular no eixo vert ical a-a’ l igando o estado com a

economia empresarial, largamente a expensas do eixo horizontal b-b’ , que liga a sociedade civil

à comunidade polít ica” (Friedmann, 1996, p.32). Este processo é designado por Friedman como

um ‘ disempowerment ’ sist emát ico, que ocorre a todas as escalas territoriais, mas que poderá

ser ao nível da escala local o início da inversão desta perda sistemát ica de poder da sociedade

para o Estado e agentes económicos, o que Friedmann (1996) nomeia por desenvolvimento

alternat ivo.

“(…) Aqui, a luta envolve a redefinição dos papeis entre o estado e a sociedade civil e a economia empresarial,

com atenção especial dada às novas formas de participação política no planeamento, acção comunitária,

organização económica e relações de género nas comunidades doméstica e política. Mais importante ainda é que

um desenvolvimento alternativo envolve um processo de empowerment social e político cujo objectivo a longo

prazo é reequilibrar a estrutura de poder na sociedade, tornando a acção do estado mais sujeita a prestação de

contas, aumentando os poderes da sociedade civil na gestão dos seus próprios assuntos…” (Friedmann, 1996,

p.32)

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Também Pereira (1994), analisando a intervenção do Estado numa t ripla perspect iva teórica, o

porquê (das mot ivações que est imulam a intervenção polít ica), o onde (modo como se define) e

o como (ao nível das est ruturas decisionais que lhe vão dando forma), conclui que o exercício de

poder da administ ração pública condiciona a ordem espacial e a apropriação não equitat iva dos

diferentes grupos sociais - dominados e dominantes, que procuram a lógica de organização que

melhor corresponde aos seus interesses.

Conclui, portanto, da existência de uma conflitualidade, latente ou expressa, na ut il ização

territorial e a dif iculdade de compat ibilizar interesses e assegurar o equilíbrio social pela acção

pública que gera diferenciações no território. De facto, como salienta Pereira (1994) a decisão

pública, enquanto opção sobre o que fazer e não fazer, exerce impactos territoriais e pode gerar

conflitos, resultante da integração da agenda dos obj ect ivos de uns grupos em det rimento de

out ros

Refira-se, de resto, como nota esta autora, que a análise à componente política da decisão, embora fundamental,

esteve sempre arredada das investigações do planeamento territorial até aos anos 70 centrando-se em análises

“mais objectiva”, como os factores naturais, económicas, sociais, até que, a partir dessa altura, começou por se

confinar à reflexão sobre os propósitos enunciados pelo poder para um território (ou seja, como e o quê se

pretendia atingir num determinado período temporal) e, mais recentemente, face às discrepâncias entre o que o

Estado diz que pretende fazer e concretiza (entre a retórica - o que se propõe a fazer, e realidade - o que se faz de

facto), passou-se a profundar o estudo das causas deste gap entre projectos e concretizações (Pereira, 1994, p.14)

Figura 2-6: Funcionamento do sistema polít ico

Sobre o funcionamento desse sistema, Pereira (1994) refere que ele é inf luenciado por input s do

meio que são “ pedidos de natureza e intensidade dist intas e afectam ‘ clientelas’ específ icas’

(Pereira, 1994, p.25) às quais o sistema procura responder com mot ivações próprias, mediante a

f ixação de critérios, perante a incapacidade de sat isfazer todas as necessidades diagnost icadas.

É dessa permeabilidade diferenciada da administ ração face aos pedidos, com repercussões para

uma progressão diferencial das solicitações (Pereira, 1994) que surgem diferentes “ agendas”

públicas, isto é, diferentes definições de áreas que serão suj eitas à intervenção pública. Cada

SISTEMAPOLÍTICOInputs do meio Outupts sobre

o meioSISTEMA

POLÍTICOInputs do meio Outupts sobre o meio

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proj ecto polít ico específ ico é const ruído em redor de t rês dimensões: o discurso dos

intervenientes63, o poder e est rutura dos actores e os interesses e est ratégias delineados pelo

autor.

Finalmente, deste proj ecto no presente, irão resultar novos inputs que, no futuro, procurarão

inf luenciar, uma vez mais, as decisões polít icas, sendo, portanto, um processo recíproco e

cont ínuo.

Out ro aspecto que tem vindo a ser salientado por alguns invest igadores é a select ividade

organizada do sistema que determina a supremacia de uns pela exclusão sistemát ica de out ros

(Pereira, 1994, Healey, 1997a, Giddens, 1999, McDade, 1999)

Healey (1997a), por exemplo, observa a inf luência das relações sociais hierárquicas na

const rução const rução social e de intervenção polít ica no território, sublinhando que as decisões

não ocorrem num território neut ro, mas moldado por forças de poder desigual. Giddens (1996,

1999), defende que o poder é um fenómeno sempre presente na vida social, estando presente na

est rutura de classes (por exemplo ao nível de raça e etnicidade).

McDade (1999), a propósito das questões de poder, refere que a part icipação da comunidade

envolve a aceitação por parte dos polít icos e prof issionais de providenciar algum poder à

sociedade civil que só pode ser at ingido se for t irado aos out ros.

Por seu lado, Brownill (1998), ref lect indo sobre as formas de governância na zona este das

Docklands de Londres, sugere que a evolução das formas de governância desta área, ref lect iu

mudanças nas relações sociais e de poder. Se desde a 2ª GM o modelo de governância promovido

era o da dependência e poder do ‘ welfare st at e’ , durante os anos Thatcher iriam caracterizar-se

por um modelo de independência e de poder do sector privado, a que se seguiu uma batalha

ent re o modelo de dependência e independência, nomeadamente ao longo dos anos 80,

caracterizado por uma grande crít ica e contestação comunitária ao planeamento

‘ ent repreneurial ’ . A que se seguiu um modelo de interdependência, at ravés da ênfase colocada

em partenariados que procuraram ser mais inclusivos autorizando a presença do 3º sector, como

é designada a sociedade civil por alguns autores.

Refira-se, no entanto, como nota Cullingworth (1988) que a part icipação da comunidade nestes

partenariados, só por si não garante que esta sej a uma part icipação efect iva, nem que inf luencie

as decisões polít icas.

63 sobre o discurso dos interveniente Pereira (1994) nota que cada actor vê, avalia e age em função das suas percepções e apoia a estratégia do discurso que formula com uma argumentação que realça uns aspectos, subestima outros e apaga ainda

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Enfim, muito embora o planeamento procure ter sempre presente as várias inter-relações

territoriais, ent re as necessidades e aspirações das várias comunidades e as possibilidades do

sector público, ent re as act ividades económicas e o espaço onde se desenvolvem, ent re acções e

efeitos, imediatos e de longo prazo, const ituindo uma área de intervenção com múlt iplas

aplicações das formas de governância colaborat iva, conforme nota Healey, (1997a), na realidade

tem-se caracterizado por prát icas que criam linhas de fractura ent re decisores e as partes

interessadas, sendo, apenas, envolvidos nas prát icas de colaboração alguns poderosos interesses.

Face a este diagnóst ico, o desafio do Planeamento Colaborat ivo tem procurado quebrar estas

fracturas, redesenhando pontes ent re sectores da comunidade e suscitando uma maior abertura

e promoção da part icipação de públicos que até agora estavam excluídos do processo de decisão

Com essa intenção a administ ração pública, por vezes de forma sincera, tem vindo a autorizar

várias margens de manobra à part icipação comunitária sobre temas que anteriormente não eram

âmbito de discussão pública. As est ratégias de part icipação pública usadas pela administ ração,

revelam, no entanto, diferentes formas de encarar a part icipação, baseando-se naturalmente

em diferentes raciocínios polít icos e f ilosóf icos sobre a importância da manutenção do poder ou

da sua part ilha com ‘ terceiros’ .

Por exemplo uma ideologia tolerante e igualitária tem tendência a gerar modelos político de “governância

democrática” e a promover uma participação pública que não seja encarada como um meio para obter

determinados fins (como a candidatura a fundos comunitários, melhores resultados nas eleições, etc.) mas o

desenvolvimento do potencial de comunidade (do capital social e intelectual), que se possa repercutir em

melhores níveis de decisão e coesão social.

Por exemplo, concepções de uma administ ração pública que desej e promover uma democracia

part icipat iva terão de ser necessariamente diferentes das de um governo cent ralista, zeloso pela

concent ração de poderes. A este propósito ref licta-se sobre alguns ext ractos do discurso do

presidente do município de Porto Alegre64, Raul Pont , a propósito da experiência part icipat iva

deste município baseada no debate sobre o orçamento público que const itui um dos elementos

mais importantes da gestão municipal (Anexo 2):

“É inegável que na maioria dos países de democracia liberal, o sistema de representação vive um processo de

crise de legitimidade, que se expressa na abstenção eleitoral, na apatia e não participação político-social e nos

baixos índices de filiação partidária. As causas variam entre os diferentes países mas se pode afirmar que as

principais residem: no processo de burocratização e no carácter autoritário das administrações e parlamentares;

na falta de ocorrência entre o projecto e o programa eleitoral e prática dos eleitos; na incapacidade desses

sistemas garantirem a reprodução do capitalismo com legitimidade frente a evidência dele ser reprodutor da

desigualdade e da exploração sociais; etc. (…)

outros. Trata-se, no fundo, de moldar uma realidade em defesa dos objectivos que persegue 64 situado no Estado de Rio Grande do Sul, no Brasil

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Nesse quadro é que a nossa exper iência de onze anos de democracia par ticipativa em Por to Alegre,

adquire sentido e impor tância” (Pont, 2001). Baseado em reuniões plenárias, regionais e temáticas,

organizadas a partir de um regulamento interno produzido e melhorado pelos participantes, Pont afirma que este

modelo corresponde: uma forma de resistência ao neoliberalismo predominante, que a democracia participativa

revela potencial mobilizador e conscencializador; que a democracia participativa não é contrária à representação

e existência de uma rede social que também influenciam polítcas públicas; que a sua importância não é só para

decidir como para formar comissões de controlo e fiscalização, mas também crítica e exigência; que promove a

auto-organização popular e autonomia; que no caso de Porto Alegre, incorpora, através do regulamento, o critério

de proporcionalidade quando a comunidade não encontra um consenso e também o espírito de solidariedade

através da definição de variáveis para hierarquizar obras e serviços, como a população ou carência do

equipamento público (…) (Adaptado Pont, 2001)

Para além desta forma de interpretar a part icipação pública, existem out ras, que estão, de

resto, na base de um conj unto diversif icado de est ratégias de incursão da part icipação pública

que têm vindo a ser usadas e avaliadas.

McDade (1998) def ine quat ro t ipologias de est ratégias de part icipação da administ ração

pública:

1. a est ratégia “ t op-down” , na qual a autoridade mantém o cont role, def inindo e gerindo a

agenda durante o processo de part icipação pública, o que lhe permite determinar o sent ido

das polít icas propostas e a escolha das prioridades.

Alguns críticos deste tipo de estratégia, como Nelson (1997), citado por McDade (1998), consideram, que ela é

antes de tudo uma opção política, e não técnica em que “local councils determined the terms on which people

participated, whilst using participation to check their worst excesses and justify their claims to democratic

status”.

Nesta est ratégia, a imagem de um processo de part icipação aj uda a legit imar as decisões do

governo e pode sat isfazer obj ect ivos eleitorais, caracterizando-se, no entanto, por um

déficit de abertura dos decisores a novas opiniões e uma mera forma de informar a

população das decisões da administ ração;

2. a est ratégia “ bot tom-up” outorga à part icipação um diálogo interact ivo baseado na

part ilha de informação com vista à obtenção de resultados que procuram ir mais além dos

normalmente obt idos por grupos de part icipação rest rito e est ratégias fechadas e

unidireccionais.

Esta est ratégia frequentemente foca-se em comunidades não muito extensivas, permit indo

o desenvolvimento de procedimentos de audição e aprendizagem interact iva

Amdam (1999) referindo-se a esta estratégia, mas numa perspectiva mais vasta que corresponde à da própria

escala e processo do Planeamento Local desenvolvido “a partir de baixo”, afirma que ela “must engage all

important local actors, build a common understanding of challenges and capability and a common trust related to

the local response”. Amdam (1999) vai mais longe quando enfatiza os projectos de “confidence building” (de

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“construção de confiança”), afirmando que são estratégias fundamentais de autodesenvolvimento e confiança

relacionada com a capacidade da resposta local

Pereira (1994) apresenta alguns dos motivos que suscitaram a inverão do modelo de actuação hierárquica do

estado, proporcionando, adicionalmente, uma maior flexibilidade a um planeamento-processo, que viria a

facilitar novos inputs para o processo de decisão:

“O entendimento da implementação como acto administrativo vigorou até aos finais dos anos 60, quando surgem

as primeiras tentivas para encontrar formas de minorar os desfasamentos reconhecidos entre as intenções e as

realizações. Faludi (1973) preconiza então as estruturas de monotorização e uma maior flexibilidade das

propostas, como forma de assegurar mais eficácia à intervenção pública. A ideia do plano-processo, em

substituição do plano-imagem durante anos reinante, ganha progressivamente adeptos” (Pereira, 1994, p.35)

3. a est ratégia “ Yes-but ” : designa a situação em que a autoridade ut il iza de forma retórica a

est ratégia bot t om-up, mas encont ra dif iculdades no desenvolvimento do processo de

part icipação, só se comprometendo com o desenvolvimento de determinados proj ectos e

propostas. Nesta est ratégia as autoridades definem prat icamente toda a agenda e não

aceitam obrigações face a determinados temas. Em síntese, enquanto o processo se

mantém em aberto pode ser considerado uma est ratégia bot t om-up, até ao momento em

que os part icipantes são select ivos na aceitação das conclusões, t ransformando-se numa

est ratégia t ipo Yes-but ;

4. e a est ratégia “ Limi t ed dialogue” envolve as situações em que a autoridade desenha uma

abordagem de t ipo top-down, mas com maior f lexibilidade. O diálogo com o público é

interact ivo, mas frequentemente dent ro de parâmet ros previamente def inidos. Visa

receber ecos do público, com vista a corrigir propostas públicas, com o intuito de uma

maior adequabilidade de proj ectos ou polít icas públicas aos seus dest inatários.

Conclui-se, portanto, que as est ratégias de Planeamento Colaborat ivo variam relat ivamente a

um conj unto diversif icado de aspectos, dos quais se pode salientar o nível de interact ividade e

dist ribuição de poder ent re as partes interessadas, a capacidade de criação de consensos

durante o processo ou face a resultados f inais, a abertura da agenda do processo de

part icipação, etc.

Enquanto, por exemplo, a est ratégia “ top-down” é predominantemente uma abordagem de um

sent ido, em que a informação é t ransmit ida para o público numa fase posterior a serem tomadas

as decisões fundamentais, que não beneficiam do input dos principais dest inatários dessas

decisões, j á a est ratégia “ bot tom-up” é alicerçada no conhecimento e part ilha dos problemas

locais, que é possível graças a uma descent ralização do local de decisão (arenas, representantes

envolvidos, etc.) e de poderes, podendo permit ir um melhor nível de resposta às reais

necessidades da comunidade.

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É evidente que subj acente a estas duas est ratégias estão duas concepções cont rastantes de

sociedade e de Estado.

Relat ivamente às est ratégias “ Yes-but ” e “ Limited Dialogue” , McDade (1988) considera que elas

são uma forma dissimulada dos decisores desenvolverem processos de part icipação pública, uma

vez que correspondem a formas limitadas na part ilha de poder, podendo gerar falsas

expectat ivas aos part icipantes. Enquanto no primeiro caso é a Administ ração Pública que, do

leque total dos resultados produzidos pelo processo de part icipação pública, selecciona os que

tenciona implementar, j á na est ratégia de “ Limited Dialogue” ela opta por def inir a agenda

polít ica e a escolher individualmente as opções de debate, de forma a assegurar o equilíbrio do

poder. Observe-se que McDade (1998) para além de ident if icar e problemat izar as principais

est ratégias desenvolvidas pela administ ração pública, posiciona-se crit icamente face a t rês de

quat ro t ipos de est ratégias por si def inidas, valorizando a bot tom-up.

Deve no entanto sublinhar-se a dif iculdade de desenvolver com sucesso uma abordagem deste

t ipo, com uma suficiente abertura para não condicionar os part icipantes, mas com o cuidado da

clarif icação de alguns pontos est ruturantes do debate, de forma que este não se alargue para

dimensões menos realistas, atendendo aos recursos económicos ou margem de manobra dos

part icipantes.

Idealmente, parece ser necessário encont rar um mix das est ratégias bot t om up e Yes-but , em

que o Planeamento é const ruído de baixo para cima e ancorado numa realidade imediata e

localizada, mas com uma agenda suf icientemente f lexível para orientações criat ivas e de forma

a proporcionar guidelines suf icientes para que se obtenham consensos no respeitante à

problemát ica def inida colect ivamente e de possível implementação (é irrealista pensar que se

podem estabelecer acordos alargados face a tudo).

Sharaf (1996) concorda com a t ipologia proposta por Midgley (1986) para def inir os modos da

administ ração lidar com a part icipação pública, destacando o modo:

1. ant i-part icipatór io - neste caso o Estado não tem intenção de incluir a part icipação pública

no processo de decisão ou de part ilhar o poder com terceiros. Pode ser ainda uma forma de

minimizar o envolvimento comunitário caso existam pressões nesse sent ido

2. manipulat ivo - neste caso o Estado dá uma impressão retórica da sua preocupação com o

apoio à part icipação comunitária, escondendo os verdadeiros mot ivos que o levam a

desenvolver abordagens part icipatórias, por exemplo um maior cont rolo social ou polít ico,

uma redução dos custos dos proj ectos. Deste envolvimento podem resultar alguns

benefícios, mas limitado, nomeadamente ao nível do t rabalho interact ivo

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3. incrementalista – o Estado admite a ideia da part icipação comunitária, mas não as integra

nas prát icas e procedimentos da act ividade local. É o modo usualmente encont rado em

sociedades com fortes governos cent rais. O estado aprova a confiança na part icipação ao

nível local, mas, ao mesmo tempo, considera que as soluções de desenvolvimento social são

mais vastas e não podem ser encont radas localmente. Considera que se os obj ect ivos

sociais e polít icos estão mal def inidos há uma subsequente falta de acção est ratégica. A

at itude prevalecente pelo estado é a tomada de decisões ao nível local, at ravés das formas

de pensar e de ver as soluções das elites polít icas. Associadas a estas decisões costuma

estar uma cent ralização de poderes, at itudes tecnocrát icas, rot ina e inf lexibilidade de

procedimentos do aparelho burocrát ico, que cria impedimentos a uma genuína part icipação

pública

4. e part icipatór io – este é o carácter da aliança ent re o Estado e a part icipação comunitária.

Para tal o regime part icipatório deve ser facilitado por mecanismos que envolvam a

comunidade, sendo para tal necessário providenciar recursos e coordenação que permita o

desenvolvimento de abordagens part icipatórias às várias escalas territoriais

(nomeadamente local e regional). Esta f ilosof ia de governação dá apoio e reconhecimento

aos grupos comunitários e voluntários que têm cont rolo sobre o desenvolvimento de

proj ectos

Em síntese, o Estado pode ser um iniciador e promotor de um processo de decisão part icipada,

mas também poderá const ituir um obstáculo à sua realização.

No caso de procurar implementá-la de forma genuína deve ser dada uma preocupação especial à planificação do

projecto, para que haja uma adequação entre objectivos / estratégia / processo /…DoE (1994), concretamente:

– adequação da estratégia de participação ao projecto que se pretende desenvolver, sendo para tal fundamental

a clarificação dos objectivos do projecto

– escolher uma estratégia adequada aos stakeholders que se vão envolver e aos seus objectivos de participação

(pretendem influenciar decisões, dar informação, ter conhecimento de projectos, ..)

– é necessário uma correcta identificação das metodologias para reflectir os objectivos da administração (a

estratégia que se está a implementar) que também deverá estar adequada às características e propósitos dos

vários grupos de participantes.

– os objectivos dos participantes em processos participatórios varia bastante, podendo afectar as suas atitudes

no processo de envolvimento (sua abertura, julgamentos, propostas,…), pelo que, num processo inicial de

participação, é conveniente que todos os actores envolvidos partilhem e articulem os seus objectivos,

procedimento que permite, a todos os participantes, a compreensão das áreas onde existe consenso e

diferença, com vista à construção de um processo negocial aceite por todos

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Relat ivamente à questão em aberto do “ espaço” que deve ser concedido à part icipação pública,

por out ras palavras à abrangência que deve ser obj ecto da part icipação pública, Yearley,

Forrester e Bailey (2000), segerem a teoria de Funtowicz e Ravetz, para a formulação teórica

dos contextos de decisão que devem ser abertos ao parecer público.

Tendo definido duas dimensões, que consideraram importantes no processo de decisão - os riscos

de decisão e a incerteza dos sistemas - Funtowicz e Ravetz avaliando a sua variação relat iva

consoante as problemát icas de avaliação da ciência, def inem t rês t ipos de est ratégias para o

processo de tomada de decisão: o da ciência aplicada, da consultadoria prof issional65 e ciência

pós-normal.

É a part ir deste t ipo de raciocínio, que Funtowicz e Ravetz defendem que o processo de decisão

deve integrar a opinião da comunidade (para além da dos académicos, peritos governamentais e

polít icos), sempre que para as problemát icas em análise não se vislumbrem soluções fáceis,

decorrente de um elevado risco de decisão ou da incerteza face à evolução dos sistemas.

Em suma, estes autores defendem que sempre que o potencial de riscos de decisão for elevado e

se reconheçam áreas de desconhecimento no funcionamento dos sistemas, se deva recorrer ao

parecer ou à legit imação da população, optando-se por uma est ratégia de tomada de decisão de

decisão que designam por “ ciência pós-normal” .

Figura 2-7: Tipos de est ratégias de soluções de problemas

65

Considerando que quando a incerteza dos sistemas e riscos de decisão são baixos, estamos no ramo da “ciência aplicada” e que quando a incerteza ou os riscos de decisão (ou ambos) são elevados se deve optar por uma “consultadoria profissional” (Yearley e outros, 2000)

Ciênciaaplicada

Consultadoriaprofissional

Ciênciapós-normal

Baixo

Baixo Alto

Alto

Incerteza dos sistemas

Riscos de decisão

Ciênciaaplicada

Consultadoriaprofissional

Ciênciapós-normal

Baixo

Baixo Alto

Alto

Incerteza dos sistemas

Riscos de decisão

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Esta teoria, que apresenta um esforço de ident if icação, ainda que de uma forma algo genérica e

crit icável, do “ espaço” a que deverá corresponder a inf luência da opinião pública na produção e

cert if icação do saber cient íf ico, é por Yearley et al. (2000) por:

/ part ir do pressuposto de que a incerteza e os riscos de decisão são variáveis independentes,

ou que podem ser compat íveis e mensuráveis;

/ não quest ionar o conceito de certeza do conhecimento e considerar uma única escala de

incerteza que não integra, em termos qualitat ivos as diferentes formas do “ não saber” ;

/ defender que a especialização cient íf ica, quando aplicada aos principais problemas

polít icos, só necessita dos cont ributos complementares do sector comunitário em situações

de um elevado nível de incerteza;

/ não apresentar soluções para a implementação da part icipação pública, nem a explicitação

dos indivíduos ou grupos de indivíduos que deveriam envolver-se no processo part icipat ivo

ou os critérios que deveriam basear a avaliação de questões como a incerteza, riscos ou a

própria mediação da part icipação.

De facto, Yearley, Forrester e Bailey (2000), na linha de muitos out ros planeadores j á referidos

anteriormente, propõem um papel mais abrangente para a part icipação das comunidades que

abranj a todas as temát icas do Planeamento, de forma a moldar as concepções abst ractas66 e,

por vezes, generalizantes de técnicos ou polít icos, acrescentando “ factos alargados aos

problemas societais” (Yearley, et al. , 2000). Segundo esta corrente teórica, só com a integração

de diferentes t ipos de conhecimentos se poderá produzir um conhecimento de qualidade

superior e legit imado pelos dest inatários.

Relat ivamente a esta divergência ent re os que defendem alguma rest rição às temát icas de

part icipação da população e os que propõem uma intervenção mais generalizada da população

para todas as temát icas cient íf icas socialmente relevantes para a população, parece-nos que tal

decisão depende do próprio contexto de planeamento que se considere (do ponto de vista da

cultura de part icipação das inst ituições e comunidade, da est rutura de competências dos

técnicos e polít icos, do grau de democracia part icipat iva j á experimentada, etc.). Reconhecem-

se, naturalmente, no entanto, a necessidade de se t irar part ido de algumas das possibilidades da

part icipação que são, de resto sistemat izadas por Chito e Caixinhas (1992, p.926, 927),

nomeadamente:

66 Segundo Yearley e outros (2000), vários estudos em âmbitos de investigação diversificadas (análise de risco, compreensão pública da ciência, política ambiental,�) têm chegado à conclusão, por repetidas vezes, que as especializações técnicas acerca da realidade física têm entrado em conflito com o conhecimento das pessoas que vivem nos locais e que este conhecimento, em vez de ser inferior ou deficiente é mais sensível às realidades locais

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1. Informação/ Educação: mediante o contacto permanente, geram-se oportunidades para uma

informação interact iva e bidireccional, criando-se condições para uma aprendizagem dos

vários intervenientes, conferindo-lhe um pendor necessariamente pedagógico;

2. Ident if icação dos problemas, valores e necessidades: a part icipação permite ident if icar

estes elementos essenciais para superar dif iculdades ligados a proj ectos, designadamente a

resistência à sua implementação;

3. Aval iação al t ernat ivas: tendo em conta os efeitos directos e indirectos é possível mediante

um processo de part icipação pública, o balanço das várias alternat ivas, nomeadamente com

a integração de uma maior abrangência das dimensões de avaliação (económicas, sociais,

ambientais…)

4. Resolução consensual de conf l i t os: a part icipação dos interessados poderá permit ir a

clarif icação dos vários interesses e valores em j ogo o que poderá beneficiara resolução dos

vários pontos em desacordo procurando-se pontos de consensualidade

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2.4 - Os representantes de interesses (stakeholders)

A part icipação pública requer est ruturas comunitárias que representem vários segmentos da

sociedade e que funcionem como um canal aberto para t roca de visões, informação, e t rabalho

desenvolvido colect ivamente (Sharif , 1996)

Como observa Grimshaw (2001) o t rabalho em rede (network) tornou-se uma importante forma

de t rocar conhecimento67 verif icando-se uma mult iplicação do número dos prof issionais cuj o

t rabalho é apenas o de coordenar e organizar informação, que é cada vez mais diversa. A

consciência da necessidade de olhar para lá de fronteiras prof issionais rest ritas e de

especialidades do conhecimento, abrangendo-se visões mais vastas, tem promovido o

desenvolvimento de proj ectos inter-disciplinares e t rabalho de grupo em organizações cada vez

mais complexas.

Ao nível do planeamento territorial, como act ividade pública, tem-se vindo também a exigir uma

maior inclusão de todos os interesses da comunidade, na formulação e implementação de

polít icas de intervenção pública, (Healey, 1996; Kumar e Paddison, 2000) o que tem vindo a

recent rar as atenções na questão de uma representação mais equitat iva e j usta dos vários

interesses.

O entendimento do conceito de “ comunidade” deverá, então, ser feito não de uma forma

simplista, associável a um único e ident if icável grupo (étnico, social, cultural, de interesses

económicos...), mas de uma forma mais aprofundada associando-o a um conj unto diversif icado

de “ comunidades” e interesses, que por vezes são divergentes ou mesmo conflituantes num

mesmo espaço geográf ico.

A difícil da definição de comunidade relaciona-se com a questão de quem deve participar ou ficar de for a:

Quem são as pessoas de uma comunidade ? as que vivem num determinado território? As que têm características

em comum (religiosas, profissionais, ..) ? as que têm uma identidade social organizada de uma determinada

forma?

Healey (1997a) chama a atenção para “ the relat ional ‘ webs’ or networks in which we live our

lives” (Healey, 1997a, p.57) as redes de vizinhança, as de associações em que tomamos parte

(prof issionais, de lazer, . .), etc. e que podem variar no espaço e tempo e ter como ponto focal

várias arenas (clubes, fóruns, colóquios temát icos, . .) em que se part ilham sistemas de

signif icados, de valorização, etc.

67 para além de trocar informação para benefícios mútuos, pode haver ainda partilha de recursos e capacidades na rede de trabalho, com vista a perseguir objectivos comuns para benefícios mútuos. Este deve ser de resto o objectivo de redes de colaboração no planeamento territorial.

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No fundo, pode falar-se de várias comunidades, compostas por indivíduos, grupos, organizações

em sociedade, revelando um determinado nível de coesão ent re os seus elementos.

No Glossário do livro Rich Mix, de Brownill e Darke (1998b), refere-se sobre “community”: “this word refers to

something shared which may be a territory and/or a common ethnicity, common interest, etc. It is often used

ideologically to imply that fellow residents in a locality should have common interests and friendly interactions.

This may be the case or there may be several communities occupying the same territory (Brownill e Darke,

1998b, p.43)

Por seu lado, Madec e Murard (1995) defendem que a definição de comunidade não se pode limitar à população

que habita numa determinada área, mas deve considerar-se a população que usa essa área por motivos de

trabalho, de visita, etc. Defendem a importância de expandir a definição da comunidade para lá das pessoas que

mais directamente e imediatamente são afectadas por um processo de desenvolvimento territorial, podendo

incluir-se grupos com relevância para a comunidade local e suas ligações a esses grupos, como o sector privado,

associações não governamentais, etc.

Observa-se, portanto, a diversidade de entendimentos que o conceito de comunidade sugere

sendo no entanto um tema fundamental, atendendo a que o desf io para o planeamento

est ratégico e comunitário é “ f ind ways of collaborat ing across the webs of relat ions with a

‘ stake’ in an urban region’ s future, to develop new ways of think about how to share place and

space which can endure over t ime” (Healey, 1997a, p.247)

Para que sej a possível por em andamento este processo de colaboração é imprescindível

organizar a part icipação. Ident if icar os vários públicos que devem ser chamados a part icipar e

as arenas em que se irá desenvolver a t roca.

“A Key task is to explore who has a ‘stake’ in an issue, and where discussion might take place” (Healey, 1997a,

p.269)

Para tal é fundamental categorizarem-se as ident idades e secções de comunidade, processo que,

no entanto, não é nem inequívoco nem invariável ao longo do tempo.

Repare-se, por exemplo, como um indivíduo participa simultaneamente em vários grupos sociais (desportivos,

religiosos, culturais…) e como essa participação é variável, em termos de intensidade ao longo do tempo. A

delimitação geográfica tem, de resto, perdido o sentido que possuía antes do avanço e globalização das

telecomunicações e economias, pense-se, por exemplo, nas novas redes de contacto que se estabeleceram no

espaço virtual mundial, nomeadamente na vasta teia que é a world wide web

Reflicta-se nas características de uma comunidade baseada na net: “the nature of the internet is such that people

are only part of an internet community when they actually choose to participate in the activities of the

community” a comunidade da internet é uma verdadeira comunidade virtual pós-moderna, podendo caracterizar-

se pela sua existência temporal, esporádica e sem existência territorial

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Crowther (2000) considera ainda que o desenvolvimento da net e crescente utilização pelos indivíduos tem

providenciado a esses cidadãos uma forma de fazerem ouvir as suas vozes, permitindo mecanismos de protesto

mais eficazes

A rápida e complexa a t ransformação cultural, social, económica da sociedade tem-se

alicerçado, no entanto, em denominadores comuns ou assuntos de preocupação colect iva ent re

indivíduos ou grupos como o ambiente, a polít ica, a luta social, que tem gerado a criação de

alianças sociais (Maiden, 1999)

Teixeira Fernandes (1997) interpreta esta modalidade de organização da vida social como um campo de

solidariedade e criatividade fundamental, uma vez que “sem organização, designadamente nas sociedades

complexas de hoje, a actividade colectiva torna-se difícil e mesmo impossível, ou não alcança o indispensável

nível de desenvolvimento”. As associações constituem, então, o nível de organização necessário em sociedade

para que seja possível “potencializar as acções individuais e normalizar as actividades colectivas”, muito embora

o grau de burocratização destas associações possa, também, funcionar como “um mecanismo amortecedor de

dinamismos sociais (Fernandes, 1997, p.186)

A consciência da existência de uma mult ipl icidade de grupos comunitários cada um com a sua

agenda própria, ao nível dos obj ect ivos, necessidades, aspirações, deverá colocar ao planeador a

questão de quem deve ser envolvido no debate para que o processo de decisão público adquira

uma maior relevância e validade? Neste contexto, uma correcta def inição dos leque interesses e

perspect ivas territoriais é fundamental. Neste contexto é fundamental examinar o conceito

teórico de st akeholders:

“Stakeholders are those individuals, groups and organizations, which have an interest or concern and influence

in a given planning area, system or outcome. Stakeholders may not necessarily live in given planning area but as

a consequence of their concerns and the activities that they pursue, they do share risks, costs and benefits”

(Kumar e Paddison, 2000, p.206)

Amaral e Magalhães(2000) traduzem stakeholder por “representante de interesses”, ou “pessoa ou identidade

com legítimo interesse numa área e que como tal adquire algum direito de intervenção” (Amaral e Magalhães,

2000, p.8)

“A stakeholder is usually a person or organised group which believes its interests are significantly affected by the

issues under discussion. It may be affected by, or its actions may have an effect on the decisions to be taken”

podendo ir para o processo de negociação com posturas fortemente negociais como é sugerido pelo site que

aborda algumas e cuidados a ter em processo de participação / negociação (para maior pormenor ver UNB

Consensus Decision Making (1997) disponível em http://www.unb.ca.web/enviro/cdm/cdmread2.htm

Também o artigo 2 da Aarhus Convection que foi promovida pela União Europeia e envolveu um acordo de

vários países sobre o acesso à informação, participação pública e justiça, define “public concerned” como as

pessoas ou organizações afectadas ou que podem ser afectadas ou que têm interesses no processo de decisão

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Não obstante ser fundamental uma correcta ident if icação dos vários grupos de stakeholders para

uma part icipação mais equitat iva dos vários interesses no processo de decisão e aprendizagem

colect iva, incluindo, ent re out ros, a população local, os invest idores (internacionais, nacionais,

regionais ou locais), as organizações privadas e as não governamentais (Kumar e Paddison, 2000,

p.206), tal não é minimamente consensual:

De facto, como evidenciam Amaral e Magalhães (2000), o conceito de stakeholder é muito

complexo e pode suscitar diversas interpretações:

1. Modo empresarial – neste visão, os stakeholders poderão representar os interesses do

capital. Como numa sociedade por acções, os accionistas (“ stockholders” ou

“ shareholders” ) têm uma intervenção na condução dos negócios da sociedade;

2. Modo social – em representação da sociedade e seus interesses mais vastos os obj ect ivos

dos “ stakeholders” é assegurar que os benefícios e valores sociais não são desvirtuados

pelos interesses económicos.

Ou sej a este envolvimento deve ser promovido não com obj ect ivos meramente inst rumentais

(por exemplo: alargamento do ‘ orçamento’ , candidatura a programas que requerem

partenariados) mas também servir para uma legit imação das decisões de planeamento.

Uma questão que se pode colocar, prende-se, exactamente, com o espírito que tem presidido à

selecção dos vários grupos de representantes para processos de decisão no planeamento ou

intervenção territorial.

Geddes (1999) mediante invest igações desenvolvidas a partenariados locais criados por

programas da União Europeia, dist ingue cinco grandes categorias de potenciais “ partners” que

costumam part icipar no processo de decisão polít ica. A saber, agências do sector público, sector

empresarial e empregados, sindicatos e organizações locais laborais, agências do sector

voluntário e organizações comunitárias e representantes de grupos t radicionalmente excluídos

ou em desvantagem (minorias étnicas, idosos, mulheres, etc.,) (Geddes, 1999, p.55).

Williams et al. (2000) analisando a part icipação pública em temát icas públicas (a invest igação

que realizam cent ra-se exactamente na análise do padrão de envolvimento público ent re

residentes que vivem na proximidade de armas químicas, nomeadamente sobre o t ipo e

intenções de part icipação) refere que, frequentemente os membros do público são seleccionados

com base na sua diferente capacidade para const ruir cada uma das funções da part icipação, por

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exemplo de informação. Assim, segundo estes autores, os cidadãos tendem a ser recrutados

pelos conhecimentos específ icos que representam ou detêm relat ivamente a um específ ico

grupo de interesses. Consequentemente, ainda segundo Williams et al. (2000), os cidadãos que

não possuem característ icas dist int ivas tendem a ser excluídos da part icipação.

Midgley (1986) sublinha que as formas de representação comunitárias tradicionais são seccionais dos interesses e

aspirações de toda a comunidade, uma vez que, frequentemente, os grupos mais pobres são os que têm menor

poder para expressar as suas opiniões. A pobreza destes cidadãos é frequentemente interpretada como motivadora

de passividade e indiferença, mas frequentemente o problema é a falta de oportunidade para o envolvimento

destes grupos.

Observa-se, portanto a tendência para se assumir explicitamente característ icas individuais ou

de grupo podem condicionar, socialmente ou a nível das faculdades individuais, a possibilidade

de uma part icipação act iva em sociedade, e que estes grupos que têm sido alvo de exclusão

social deverão ser t razidos da margem, para a arena de decisão (Bronwill e Darke, 1998b).

As conclusões de um trabalho de investigação de Fernandes e Duarte, publicado pela Comissão da Condição

Feminina, sobre as causas da discriminação da mulher em órgãos e instituições estatais, durante o início dos anos

80, é concludente quanto ao facto do género poder condicionar a sua participação em sociedade.

Reflect indo sobre as questões do mult iculturalismo territorial, Bronwill e Darke (1998b)

defendem a necessidade da apreensão da diversidade de ident idades da comunidade (do “ r ich

mix” territorial, como o designam), nomeadamente para que sej a possível uma correcta

def inição de est ratégias de regeneração urbana... Argumentam que só com um melhor

entendimento dos mot ivos pelo que alguns grupos são relevantes para a agenda da regeneração

(sexo, raça, etc.), se poderá desenvolver um processo de regeneração mais genuíno, inclusivo e

sustentável ao longo do tempo. Para que tal sej a possível alvit ram uma abordagem part icipatória

destes grupos.

“The solutions to the problems such areas face cannot be found solely in policies aimed at those living in them

wider issues about global and national economic processes and national and local government policy in relation

to issues such as education, heath and housing all have their impact. Nevertheless the goal of sustainable

regeneration cannot be met without a reorientation of policy, placing the issues of race and gender in the

mainstream of area regeneration” (Bronwill e Darke, 1998: vi).

Em, alguns países, a consciência de tal situação tem procurado ser minimizado at ravés de

iniciat ivas de “ empowerment ” (de dar poder a determinados grupos) que visam cont rabalançar

as desigualdades existentes ao nível do acesso ao poder de decisão.

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O empowerment pode ocorrer a diferentes níveis (individual, organizacional, comunidade,...) dependendo,

segundo Hogan (2000), de contextos pessoais e outros, como legal, social, etc. Esta autora é inequívoca ao

afirmar que “many professions desempower clients, either consciously or unconsciously” (Hogan, 2000, p.18).

“Wang and Loo (1998) in their study on participation of poor and formerly disempowered people in the US

wrote that “…have-nots, referring to poor citizens, especially minorities, are the real concern of what is

commonly known as citizen participation..” (Maier, 2001, p.710).

De facto, fortes cont rastes sociais mantêm-se na sociedade ent re os que são capazes de usar os

seus direitos cívicos e defender os seus interesses e ent re os que são marginalizados e excluídos,

tendo estes últ imos começado a at rair o crescente interesse de planeadores e polít icos que

defendem uma maior inclusão social e, consequentemente processos de decisão com uma

melhor representação social para a obtenção de consensos mais concordantes com o “ interesse

público” de uma determinada comunidade.

Não se deverá esquecer, como recorda Sharaf (1996) que a part icipação pública na tomada da

decisão é um direito humano, apolít ico e um inst rumento essencial para a regeneração urbana,

só possível at ravés de um processo colaborat ivo, que beneficie de cont ínua aprendizagem e

interacção ent re os part icipantes.

A este propósito Kumar e Paddison (2000) consideram a confiança, como uma componente

fundamental do processo de colaboração, ent re o t rabalho conj unto de stakeholders e com vista

à obtenção de acordos organizados e formalizados horizontalmente:

“trust is vital for collaboration because only trusting stakeholders can fruitfully begin interaction and

communication leading towards collaboration…” “all interactions and acts of joint sense making are, among

other things, the acts of placing trust among participants (…) “trust is central to human existence”… “all

economic transactions involve trust It is advantageous to trade with trusting partners. Distrust is expensive…”

“comparative studies also reveal that economies of high trust societies develop much faster than low trust

societies (Kumar e Paddison, 2000, p.205).

Um dos principais problemas de perda de confiança nos processos de participação, relaciona-se, segundo Maiden

(1999) com o descrédito gerado pelas autoridades públicas por não concretizarem as decisões definidas por

processos de participação pública alargados, que geram uma percepção de cinismo face às intenções dos

promotores destes projectos (o sucesso de iniciativas futuras fica imediatamente condicionado).

Defendendo que a conf iança é o salto de boa-fé que permite aos st akeholders acreditar que “ o

out ro” está interessado na prosperidade dos restantes e que não irão actuar sem antes

considerar os impactos das suas acções sobre o out ro, (Kumar e Paddison, 2000, p.209),

argumentam que a conf iança e a colaboração se reforçam mutuamente.

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Para tal, Kumar e Paddison (2000), def inem o Planeamento Colaborat ivo como um ‘ processo

int eract ivo e interpretat ivo ent re diferent es represent ant es de grupos de int eresses

(st akeholders),devendo ter como aspectos fundamentais:

/ A formação dos locais de debate pelos stakeholders: as arenas, locais em que se desenvolve

a interacção ent re “ representantes” , devem ser desenhadas e redesenhadas pelos próprios

part icipantes com o obj ect ivo de providenciar, a todos eles, um ambiente amigável e

confortável que não beneficie nenhum em part icular;

/ A interacção como acção comunicat iva: a interacção deve ocorrer sobre condições de

racionalidade comunicat iva, o que implica que os representantes, em situações part iculares

de debate, sat isfaçam as condições de discurso ideal: inteligibilidade (assegurando-se que o

que se diz é compreensível para todos), sinceridade, legit imidade (perceber as posições dos

out ros e assumir a sua dent ro das normas e lógicas da sociedade) e autent icidade

(veracidade);

/ O conhecimento ou percepção da forma: admit indo que os stakeholders têm diferentes

sistemas de entendimento (diferentes formas de conhecimento e de aproximação ao

mundo, de raciocínio e de valorização) e de comunicação e que todas são válidas e

nenhuma é superior à out ra, estas deverão ser conhecidas at ravés de diálogo, experiência e

aprendizagem colect iva (por exemplo, aprendendo a ler evidências não verbais e

simbólicas)

/ A existência de consensos e divergências: As diferenças ent re diferentes grupos deverão ser

discut idas e não dissimuladas. Não se pode esperar uma obtenção generalizada de

consensos;

/ O respeito por todos os membros: o que signif ica que todas as opiniões deverão ser ouvidas,

respeitadas e valorizadas. Os pontos de concordância poderão surgir da interacção ent re

diferentes discursos (“ Every stakeholder has a voice and hear” );

/ A capacidade crít ica e ref lexiva. t rata-se da capacidade de avaliar o nosso e o discurso dos

out ros, com discernimento e com capacidade de aj uizar;

/ A const rução mútua de interesses. a interacção tem em vista uma aprendizagem recíproca,

um exercício de const rução colect iva e de entendimento ent re os stakeholders.

/ A clarif icação do plano de discursos: o desenvolvimento de um plano de acções ou de

qualquer out ro documento polít ico, que sej a preparado em condições de Planeamento

Colaborat ivo deve conter os discursos e os sistemas de signif icado dos vários grupos de

stakeholders (Adaptado, Kumar e Paddison, 2000, p.206-208)

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Também Putnan (1993) af irma que a conf iança é o “ lubrif icant e” da colaboração e que pode

exist ir para uns assuntos e não para out ros, afectando a base e cognição de confiança. Sugerindo

como indicadores de confiança:

1. as redes de t roca social e de delegação de poderes: As rede de t roca social, foram

const ituída de forma operacional at ravés da criação de est ruturas organizacionais

separadas. O processo de colaboração ent re st akeholders confiam-lhes ou delegam-lhes

tarefas ou poderes, representat ivos de um nível de confiança. enquanto organizações

hierárquicas inibem a confiança, organizações horizontais promovem-na, at ravés de densas

redes sociais de part ilha;

2. reciprocidade e protecção do interesse dos out ros: a reciprocidade representa o cerne da

confiança, correspondendo, no fundo, à expectat iva de bons comportamentos por parte dos

restantes part icipantes, isto é que protej am os interesses dos out ros;

3. A total e sincera part ilha de informação: exist indo bons níveis de confiança a

possibilidade de má ut il ização de informação é reduzida;

4. Ir de encont ro às expectat ivas dos restantes part icipantes: os parceiros esperam que as

suas expectat ivas possam ser sat isfeitas num processo de colaboração. De todas as formas

uma das maiores tarefas é a própria obtenção de consensos e implementação de um

determinado programa de acções de intervenção;

5. Existência de um comportamento desej ável esperado- em situações de confiança os

part icipantes esperam que os out ros se comportam de uma maneira desej ável, cont ribuindo

para a f inalização desse proj ecto;

6. Nenhum sent imento de vulnerabilidade – onde se estabelece confiança, não se sente

vulnerabilidade, o que permite a part ilha de diversos pensamentos, convicções e valores de

forma livre e franca porque eles se sentem seguros a revelar informação e que esta não

será ut il izada pelos restantes parceiros para quebrá-la;

7. O Cont rolo e a certeza- a confiança e o cont rolo complementam-se mutuamente, uma vez

que o cont rolo cont ribui para a confiança por const ruir confiança at ravés da estabilização e

criação de certeza;

8. Part ilha de valores pelos st akeholders e o factor tempo- numa fase inicial pode exist ir

confiança ent re indivíduos ou organizações sem se explorar os valores de ambos. Mas,

quando o tempo passa, a confiança só irá amadurecerse exist irem presumidas similaridades

ent re os valores dos parceiros. Por este mot ivo o factor tempo é tão importante para

desenvolver e sustentar a confiança ent re st akeholders. O tempo providencia novas

situações e circunstâncias nas quais o processo de aprendizagem tem lugar. Acrescente-se,

ainda que o cont rolo pode incrementar a certeza, mas não leva à confiança.

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2.5 - Metodologias de part icipação em contextos diversif icados de

Planeamento Terr itor ial

Um aspecto que se tem procurado sublinhar ao longo deste capítulo é a necessidade de uma

ref lexão antecipada sobre algumas escolhas crít icas que condicionam o sucesso de qualquer

proj ecto de part icipação pública

“Remember that cooperative planing means that all affected actors and public, as well as all those who can

contribute to the solution, are to be involved in the process. Co-operative planning is not a form of public

relations management. It is also different from public information and public education. Although it might

involve all these other activities as well, the main issue is finding and implementing solutions for problems in

a cooperative way” (Ernste et al., 2001, p.4)

A este propósito Ernste et al. (2001), baseando-se num curso de “ cooperat ive planning” que

desenvolveram no Departamento de Planeamento Urbano da School of Publ ic Pol icy and Social

Research da Universidade de Califórnia (Los Angeles), disponibilizaram na world wide web uma

listagem de sugestões e conselhos sobre o design, da iniciação, moderação e avaliação do

processo de cooperat ive planning68, que por eles é est ruturado, de uma forma f lexível, em sete

degraus consecut ivos: o de exploração, iniciação, def inição de problemas e critérios para

possíveis soluções, procura de opções, const rução de conclusões e implementação.

O primeiro st ep, de exploração, corresponde exactamente ao início da planif icação do proj ecto.

Inicia-se antes do processo de envolvimento, numa fase em que se procura a caracterização do

problema e est ruturaração do processo de planeamento cooperat ivo, ident if icando-se os

principais assuntos para o debate, part icipantes, recursos e const rangimentos.

Ernste et al. (2001) consideram que nesta fase se devem ter em atenção:

/ A definição do problema - extensão, condições fronteira, constrangimentos… , e as formulações

alternativas ao problema;

/ A recolha de informação sobre a complexidade do problema: técnica (que se relaciona com o próprio tema

de planeamento em análise), da rede de representantes de interesses (número, posições contraditórias,

interdependência entre actores,…), dos assuntos societais que envolvem o projecto de participação (qual a

sua dimensão histórica? que sensibilidade política ao projecto? é expectável a resistência da sociedade ou

dos políticos à implementação de determinadas soluções?), da organizacional (enquadramento temporal,

limites tempo, recursos financeiros, potencial de insucesso, ..). Estes autores referem que uma condição

crucial para o sucesso ou insucesso dos projectos de planeamento cooperativo é a sensibilidade dos

políticos para os assuntos em jogo (pode optar-se por não se incluir os políticos no trabalho de grupo, de

forma a evitar-se uma politização das soluções encontradas ou a transferência de situações de bloqueio

68 Um �Survival Kit� que se baseou em longas experiências de utilização, mais ou menos ad-hoc de metodologias, e em que se explicitam recomendações inspiradas em Jurgen Habermas, argumentando-se de que não há nada mais prático do que uma forte teoria para influenciar a praxis quotidiana (Ernste et al., 2001, p.1)

Afirmam que este kit, como qualquer kit de sobrevivência ou guia de viagem não oferece, nem prescreve uma forma única para prosseguir caminhos, mas fornece, apenas, algumas orientações sobre o que se pode encontrar pelo percurso...

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político para este processo, ou a inclusão dos políticos para um maior apoio e comprometimento com o

projecto, com vista a aumentarem as hipóteses de uma implementação bem sucedida)

/ Segundo Ernste et al. (2001) quando se decide levar por diante um projecto de participação deve redigir-se

um documento com todos os achados inicias, um plano de acção para o projecto, que cubram os seguintes

aspectos: Qual o problema? Porque há a necessidade de acção? Qual o propósito e objectivo do projecto

(missão) ? Qual é a autoridade e fonte de recursos? Como os públicos e participantes deverão ser

envolvidos? Quais os actores chave e os seus papeis? Como deverá ser faseado o projecto cooperativo?

Para além da complexidade associada à planif icação, deve ainda destacar-se o carácter

interligado de algumas decisões sobre o proj ecto de part icipação. Assim, por exemplo, se os

iniciadores do proj ecto optarem por def inir os stakeholders de uma forma corporat ivista, i.e.,

optando por incluir um número rest rito de actores no processo de part icipação69 (Healey, 1997a,

p.270), também ao nível da selecção de metodologias de part icipação se irá optar nas

metodologias cent radas em pequenos grupos de t rabalho. Inversamente, uma selecção mais

inclusiva e heterogénea de representantes exigirá uma selecção de metodologias mais adaptadas

a grupos com maior diversidade cultural, de formas de expressão, etc. Em suma, o mapeamento

dos stakeholders (Healey, 1997a) condiciona, a j usante, a selecção dos disposit ivos para o

envolvimento dos part icipantes.

Para se poder escolher correctamente é fundamental ter-se presente as várias possibilidades

metodológicas disponíveis para a aplicação de abordagens part icipatórias em contextos de

Planeamento Territorial. Nesse sent ido, fez-se a revisão do ‘ estado da arte’ das metodologias do

Planeamento Colaborat ivo mediante uma invest igação baseada em dois momentos est ruturantes:

1. recolha de informação sobre experiências de Planeamento Colaborat ivo (publicada ou

disponível na Internet ) que foram consultadas em bibliotecas diversif icadas

como as das Faculdades de Engenharia, Arquitectura e Letras da Universidade do Porto, da Universidade de

Aveiro e da Brooks University, em Oxford (UK). Nesta última, para além do acesso a bibliografia não disponível

em Portugal, beneficiou-se do testemunho de investigadores que têm presenciado a implementação prática de

projectos de Planeamento Colaborativo, nomeadamente em contextos de regeneração urbana, como Brownill (no

caso das Docklands, de Londres) ou Sharaf (em Manchester e em campos de refugiados palestinos localizados

em cidades jordanas).

2. leitura crít ica ao material recolhido, com vista à ident if icação e sistemat ização de

metodologias de Planeamento Colaborat ivo. Por limitações de tempo, optou-se por

apresentar uma listagem de metodologias sem desenvolver uma abordagem comparat iva às

69 Healey (1997a) refere que esta forma de selecção era a que caracterizava os partenariados constituídos no Reino Unido até aos anos 90, que restringiam a participação ao sector empresarial e governo, excluindo a participação de outros tipos de representantes.

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suas potencialidades, limitações, situações ideais de aplicação, etc., o que poderá

const ituir uma tema de invest igação de próximos t rabalhos

Acrescente-se, ainda, que a listagem de metodologias apresentada e que sofreu inf luência de

uma listagem publicada pelo DoE (1994), não integra, não obstante, todas as opções existentes

ou j á experimentadas em contextos de Planeamento Colaborat ivo (nem muito menos todas as

possiblidades de adaptações, variação ou combinação ent re elas) servindo, apenas, para ilust rar

algumas possibilidades existentes.

A própria caracterização que se faz de cada metodologia pode ser crit icável, uma vez que não

existe nem deve exist ir rigidez na sua ut il ização, mas antes uma f lexibilidade em cada situação

de aplicação part icular (temát ica de planeamento, característ icas dos part icipantes,…)

exist indo, por este mot ivo, um espect ro de variação perfeitamente aceitável na implementação

de cada t ipologia de métodos interact ivos.

Como impressões gerais deste processo de invest igação resultou a ideia de uma:

/ uma escassa “ oferta” de experiências documentadas, quer em termos de número, quer de

diversidade (temát ica, geográf ica e metodológica) que f icou aquém das expectat ivas

iniciais e que permit iu consolidar a ideia de que esta é uma avenida de invest igação em

const rução. Pode falar-se de “ ilhas de sucesso” ou de momentos ou f lashes de democracia,

como propõe Kensen e Tops (2001)

“During these Kodak moments of democracy, something changes for the better in the power relationship between

those involved. We label a change for the better when it allows people to relate to democracy in ways that make

sense to them” (Kensen e Tops, 2001, p.6);

/ As metodologias de part icipação pública podem ter muitas adaptações, variações e

combinações, o que dif iculta a sua descrição. Observa-se, ainda, em alguns documentos,

uma escassa fundamentação das opções metodológicas tomadas, bem como uma escassa

descrição da forma como são aplicadas ou os resultados que vão sendo obt idos;

/ Algumas fontes revelam um fraco nível de confiança e f iabilidade, por exemplo devido a

uma grande generalização ou um discurso algo retórico70 ou com pendor ideológico ou

polít ico (dá a ideia de que “ muito do que é chamado de part icipação não o é” realmente):

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/ A documentação “ académica” , desenvolvida por invest igadores que part icipam como

avaliadores externos nos processo e não são “ parte interessada” (publicada em revistas de

especialidade, j ornais, dissertações para graus académicos) revelam uma maior

obj ect ividade e rigor. Refira-se, no entanto, que é prat icamente impossível pensar numa

total imparcialidade dos invest igadores, uma vez que, eles próprios, possuem concepções

ideológicas e teóricas próprias (podendo ser, por exemplo, adeptos de determinados

pressupostos teórico, consoante a sua formação académica, experiência prof issional ou

princípios pessoais que inf luenciam a valorização que fazem dos acontecimentos...)

Observe-se como a própria produção cient íf ica funciona dent ro de um esquema de cont rolo

cient íf ico, relacionado com a própria hierarquia académica e de validação da produção

cient íf ica.

Innes (1998) considera, no entanto, que os académicos deveriam prestar mais atenção aos práticos (que operam

no interface político/técnico/comunidade, porque são eles que estão ‘na linha da frente’ de um contexto em

rápida mudança e a experimentar abordagens que ainda não tinham sido discutidas antecipadamente de forma

teórica. Segundo ela, os planeadores académicos têm muito a aprender com estas práticas de Planeamento, mas

também muito com outras temáticas: a mudança, instituições, dinâmicas de grupos e processos políticos, etc.;

/ Um maior desenvolvimento destas temát icas está espacialmente concent rado nos países

com um maior nível de desenvolvimento económico e t radição em Planeamento (os que

apresentam, de resto, melhores níveis de literacia da população, t radição na acção de

grupos de pressão e dos meios de comunicação, …,) e em países em vias de

desenvolvimento, receptores de fundos económicos e do apoio de ONG’ s, devido à

obrigatoriedade crescente desses fundos serem geridos com uma maior part icipação da

sociedade civil, o que tem em vista assegurar uma governância mais t ransparente, inclusiva

e equitat iva, uma melhor ef iciência na aplicação dos f inanciamentos, cont role para evitar

desvios, clientelismos ou corrupções, logo a procura de maior durabilidade dos efeitos dos

invest imentos

70 tendência para se descrever como deveria ter ocorrido, em vez de como ocorreu. Muito do conteúdo de propaganda (ou manipulação�), é produzido pelos próprios responsáveis dos processo de decisão, que tendem a sublinhar alguns aspectos e escamotear outros, evidenciando um déficit de imparcialidade e de descrição de metodologias utilizadas e seus resultados.

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2.5.1 - Metodologias e abordagens disponíveis

“The challenge for planning is to develop new practices. These need a breadth which admits of diverse ways of

knowing and being, and which have the capacity to reflect on, and call attention to what lies behind the ‘politics

of interests” (Healey, 1997a, p,244)

“The new roles being played by development planners require a bundle of tools and methods for community-

building which go well beyond substantive expertise “ (Wilson, 1997, p.752)

Muito embora se reconheça que as boas metodologias, só por si, não asseguram o sucesso do

envolvimento público (DoE, 1994), reconhece-se que uma incorrecta selecção e ut il ização de

metodologias pode minar o processo. Reconhece-se, ainda, face à diversif icado das funções das

metodologias, os potenciais benefícios que podem resultar da aplicação combinada de vários

t ipos de metodologias.

Por “metodologia” entende-se o caminho para se chegar a um fim que, por sua vez, pode incluir ou exigir, um

conjunto de técnicas que são o conjunto de processos que permitem fazê-lo. No fundo com isto pretende-se dizer

que o método indica o caminho e a técnica ajuda a percorrê-lo, contudo nem sempre é fácil utilizar esta distinção,

pelo que se optou por uma simplificação terminólogica e pela utilização do conceito de ‘metodologia’ para

qualquer dispositivo que permitisse o envolvimento público, exceptuando-se as situações de utilização

combinada de várias metodologias optando-se pela designação de ‘abordagem’ (conceito que é também usado

por outros investigadores, como McDade, 1999; Sharaf, 1996, etc.)

Dos at ributos das metodologias ident if icadas pelo DoE (1994), destaque-se pela sua importância:

/ a f requência:

as vezes que são usados. A maior parte das experiências de planeamento colaborat ivo só são

ut il izados os métodos uma vez, mas algumas metodologias, como quest ionários, tendem a

ser usados numa base mais regular durante o proj ecto.

/ a ext ensão:

refere-se ao leque de part icipantes. Por exemplo os quest ionários oferecem uma

possibilidade de obtenção de informação a part ir de uma amost ra mais alargada, enquanto a

maior parte dos métodos interact ivos só podem ser aplicados a pequenos grupos em cada

momento. A select ividade é implícita à ut il ização dos métodos interact ivos o que levanta a

problemát ica da representação e selecção dos grupos que podem estar envolvidos.

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Quanto às suas característ icas, podem ser def inidas duas categorias principais: as de um sent ido

ou t raj ecto, e as interact ivas ou de acção recíproca71. (DoE, 1994)

A primeira t ipologia de metodologias de um sent ido (Quadro 2-1) é assim designada pelas

metodologias que aí se integram não promoverem um processo de debate ent re os part icipantes,

visando apenas ‘ t roca de informação’ unidireccional, ora para:

/ t ransmissão de informação - cuj o obj ect ivo é a vinculação de informação ou decisões,

at ravés de reuniões informat ivas, exibições,…;

/ descobert a ou obt enção de informação - permite aos técnicos de planeamento a obtenção

de informação mediante quest ionários, inquéritos, ent revistas,…;

/ a campanha/ promoção - que se foca na autopromoção ou tentat iva de manipulação at ravés

de publicidade em meios de comunicação, cartas à população, etc. Muito embora estas

metodologias t radicionalmente fossem mais usadas pela esfera polít ica, actualmente vários

grupos comunitários têm começado a usá-los para contestarem decisões governamentais,

apresentarem soluções alternat ivas ao problema, enfat izarem a sua postura de protesto nos

media, etc.

Por seu lado, as metodologias interact ivas (Quadro 2.2) conforme sublinha o Department of

Environment (1994) britânico, são usadas para encoraj ar um debate const rut ivo, focando-se na

part ilha de informação e procura de soluções de uma forma colect iva

“Includes those which are used specifically to encourage constructive debate, design development, discussion,

negotiation, and active participation. As such, many methods are no more than devices to get people started, and

can hence vary noticeably in terms of how different groups (rather than leaders) use them in different situations,

and in terms of what emerges at the end” (DoE, 1994, p.15)

71 Refira-se que, em alguns casos as metodologias de um tipo podem transformar-se na de outro: por exemplo, em situações em que uma reunião pública que tradicionalmente enfatiza a transmissão de informação se transforma num evento interactivo.

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O trabalho interactivo desenvolve-se através de práticas comunicativas através das quais os participantes

aprendem uns com os outros sobre factos, interesses e preferências. Isto envolve a reflexão sobre o que as

pessoas dizem e as imagens que usam (respostas emocionais, expressões, etc. (Healey, 1997a, p.249)

Desenvolve-se através de actividades organizada e colectiva, que se baseiam na interacção entre grupos distintos

(seleccionados pelos promotores da iniciativa). A função do moderador é fundamental (devendo apresentar bons

níveis de liderança de grupo e de competências interpessoais) de forma a providenciar de forma clara os

objectivos do envolvimento, facilitar a interacção entre os grupos de pessoas (assegurando, por exemplo, que

todos têm a oportunidade de falar, sem favorecer participantes ou expressando juízos de valor), promover o

debate (mantendo os participantes informados sobre as expectativas em relação ao grupo e tópicos de discussão,

ajudando a gerar ou explorar assuntos, por exemplo através da colocação de perguntas abertas, etc.) (Gibbs,

1997)

Estas são as metodologias de part icipação mais efect ivas, pois permitem uma t roca act iva de

informação, fundamental na avaliação e procura de resolução colect iva de problemas, são, no

entanto, normalmente preteridas em relação aos t radicionais por serem menos familiares aos

técnicos de planeamento e exigirem mais tempo, competências e recursos.

Maiden (1999) converge para esta opinião, observando que a escolha de metodologias tem sido

minimal e rest r ingida a um reduzido número de opções, o que desfavorece a obtenção de

maiores benefícios para o processo de Planeamento Colaborat ivo.

De facto, são evidentes as diferenças, do ponto de vista da extensão dos obj ect ivos ou

resultados esperados, que se perseguem quando se ut il izam metodologias como o Planning for

Real ou simples técnicas como os Inquérit os de opinião

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Quadro 2-1: Metodologias Unidireccionais

(objectivo: esclarecimentos à população)

Metodologia Caracter ização sumária

Exposições Podem ser dispendiosas e “ High-Tech” , ou mais económicas e simples. Podem ser realizadas de muitas formas: em paralelo, várias sessões ocorrem em simultâneo, ou em rotação, com apenas uma sessão. Podem ser concebidas pelos promotores das iniciat ivas (administ ração pública, “ developers” comunidade), ou então pela comunidade para most rar propostas alternat ivas. Algumas exposições podem ainda servir como meio para obter comentários e “ feedback” , i.e. podem assumir-se como eventos de obtenção de informação.

Reuniões Publicas

Normalmente são eventos publicitados e de livre acesso, em que as ideias são expostas para uma apreciação mais geral e eventualmente com o intuito de facilitar o processo de tomada de decisão. O debate rest ringe-se a perguntas da plateia e são respondidas pelas partes interessadas ou pelos seus consultores técnicos. Caracterizando-se por apresentarem informação, no entanto, algumas reuniões publicas mais informais podem evoluir para um formato mais interact ivo, embora muito excepcionalmente.

Panfletos Muito variados, em formato e qualidade, podem circular de forma aleatória (por exemplo no decorrer de uma exposição) ou formalmente (mediante, por exemplo, o depósito de panfletos nas caixas de correio dos visados)

Relatór ios Ut ilizados para fornecer informação, alguns podem ser substanciais (extensos e detalhados quanto ao obj ecto da informação) mas estes raramente são produzidos especif icamente com vista ao envolvimento da comunidade. Diga-se que enquanto os panfletos são sempre de dist ribuição gratuita, os relatórios são normalmente pagos o que limita a sua circulação.

Cartas Informat ivas

Podem ser preparadas e dist ribuídas com alguma periodicidade (ex. Carta informat iva da j unta de freguesia para munícipes) ou associadas a um proj ecto específ ico que estej a a decorrer. Podem por vezes procurar a obtenção de informação (ex. conter um quest ionário, com um envelope RSF- retorno sem franquia), mas normalmente o seu obj ect ivo é veiculá-la.

Slide Shows É uma reunião unidireccional cuj a característ ica é a informação ser ilust rada com recurso a acetatos, cartolinas, meios informát icos, etc. para um auditório que pode ter recebido antecipadamente alguma cópia dessa informação. Não obstante estes meios serem gradualmente menos ut il izados, à medida que o vídeo se tem implementado, são olhados como mais acessíveis uma vez que podem facilitar a preparação prévia dos part icipantes convidados para essas reuniões. Neste caso esta metodologia assume o papel de uma metodologia interact iva.

Videos Mais produzidos pelos “ developers” (empresários responsáveis por um determinado empreendimento) e menos pelas autoridades locais, estas metodologias funcionam como material de promoção focados, em parte, para a comunidade local (potenciais consumidores) ou com o obj ect ivo de definir “ lobbies” (pró-ambiente, polít icos, . .). São muitas vezes ut il izados em exposições

Representação em computador

(Computer Aided Design)

Permitem a representação das propostas a t rês dimensões em computadores e possibilitam a animação das imagens, com a vantagem destes sistemas suf icientemente simples para a ut il ização por não especialistas. Alguns destes sistemas permitem a int rodução de alterações (cenários possíveis) e a visualização dos impactos de cada cenário idealizado (ex. Sistemas Informação Geográf ica, CAD/ CAM) Alguns dos defensores destas metodologias são, também, entusiastas do potencial da realidade virtual, uma vez que podem permitem, antecipadamente, a experimentação dos resultados dos proj ectos.

Modelação

Envolve a const rução de uma representação à escala real da proposta de t ransformação ou de desenvolvimento que se quer promover, o que é feito, normalmente, no local onde será implementado. Alguns arquitectos ut il izam écrans, proj ecções e out ros equipamentos para simular as “ environmental changes” . É também vulgar a const rução de maquetes, a escalas de menor pormenor, destes proj ectos.

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(objectivo: �Fact Finding�)

Metodologia Caracter ização sumária

Quest ionários Os surveys são executados à população local, para descobrir o que é que a população pensa sobre propostas polít icas ou sobre as necessidades da área. São ut il izados para estudos diversif icados, de larga escala (amost ra extensiva) e visam respostas pessoais escritas, de cidadãos ou grupos específ icos (agregado familiar, associações, etc...) São definidas diferentes amost ras, diferentes métodos de dist ribuição dos quest ionários (local, tempo, .. .) e o t ratamento da informação recolhida também pode assumir várias formas. A credibilidade estat íst ica requer uma preparação cuidada, e pode haver necessidade de envolver empresas especializadas.

Quest ionário de Rua

Invest igadores colocam questões sobre um determinado tema (ex. Proj ecto urbano) num local público ou porta a porta. O conteúdo das questões e a técnica é semelhante à ut il izada nos quest ionários a diferença é o contacto cara-a-cara

Ent revistas São normalmente realizados por um grupos diversif icados que querem obter informação, por exemplo: ent revistas da administ ração pública a cidadãos sobre um proj ecto específ ico, ou, também, de representantes da comunidade a vários grupos dessa mesma comunidade Estas ent revistas podem ser realizadas a “ targets” diversif icados: indivíduos, famílias ou grupos reduzidos e em local pré acordado, normalmente em casa dos inquiridos. Dada a maior amplitude de tempo necessário para a sua realização, as questões podem ser mais abrangentes, de âmbito mais alargado, mais abertas e de conteúdo mais qualitat ivo do que as colocadas at ravés de um quest ionário.

Exemplo: esnt revistas moradores do Parque Jaú (Oliveira e Anderson, 1999)

(objectivo: por os destinatários das campanhas do lado do responsáveis por essas campanhas promocionais)

Metodologia Caracter ização sumária

Comunicados Podem ser programados, organizados e coordenados por um grupo que procura inf luenciar out ros actores ou decisores. São planeados para assegurar uma maior inf luência a um numero vasto de decisores e imprensa at ravés de cartas cuidadosamente elaboradas.

Lobbying Grupos ou indivíduos t rabalhando j untos para inf luenciar uma decisão at ravés de persuasão cara-a-cara (frente-a-frente) bem como at ravés de out ras formas (cartas, anúncios televisão, publicação de anúncios em j ornal)

Dar Evidência

(apresentar provas ou

testemunhos)

É uma oportunidade para realizar uma campanha formal quando grupos da comunidade e indivíduos decidem apresentar um proj ecto local aos que quest ionam o proj ecto ou até às autoridades locais.

Publicidade Através de posters, panfletos e eventos com o obj ect ivo de maximizar o conhecimento sobre uma determinada situação e de modo a aumentar o número de pessoas envolvidas.

É uma metodologia mais comum em act ividades de contestação ao proj ecto, mas também é usado para os promover.

Grupos de Intervenção

Planeiam e organizam act ividades (como por exemplo campanhas publicitárias) onde há pouca abertura dos promotores á part icipação pública.

As act ividades destes grupos são muito variadas e podem ir desde uma pressão discreta sobre os implementadores até ao protesto público.

(Adaptado, DOE, 1994, p.62-63)

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Quadro 2.2 – Metodologias interact ivas

(objectivo: promover troca de ideias com vista à construção de soluções)

Metodologia Caracter ização sumária

Design Workshops

Esta metodologia, adaptada da prát ica dos EUA e inicialmente integrada na abordagem UDAT Urban Design Assistence Teams (ver abordagens), caracteriza-se pelo convite a uma equipe de profissionais para desenharem soluções para problemas ident if icados localmente. Para tal, realizam-se reuniões, em que são consultadas as populações e autoridades locais, planeadores ent re out ros agentes locais, procurando uma melhor concepção das soluções para o bairro, município, etc. (depende da escala definida para o problema/ oportunidade). A maior parte dos eventos ocorre aos f ins de semana, são muito intensos e partem da análise dos problemas e oportunidades para ident if icar formas de avançar, soluções de concepção e est ruturas de implementação. Exemplo: proj ecto de part icipação definido para as áreas de Oxfens Area, em Oxford e Wycombe (anexo__) (McDade, 1999)

Pequenos grupos de t rabalho:

Normalmente const ituídos por grupos de 8 a 15 pessoas, podendo complementar reuniões de t rabalho mais amplas e abrangentes. Um termo genérico para um conj unto vasto de técnicas que permite aos agentes locais discut ir, a avaliar, aprender e planear a forma como podem inf luenciar os processos de desenvolvimento ou propostas especif icas. O t rabalho do grupo pode ser formal ou informal, sobre um determinado tópico ou muito abrangente, quanto à periodicidade pode ser regular ou ocasional.

Podem ser “ cit izen j uries” : grupos de cidadãos que representam o público em geral, com vista a reunir-se colect ivamente e explorar um tema polít ico ou uma decisão específ ica. Como em qualquer t ribunal, as testemunhas apresentam informação e o j úri faz questões. Depois deliberam ent re eles antes de tornarem as conclusões públicas que são decididas atendendo às aspirações da comunidade

Focus Group Versão especif ica de um pequeno grupo de t rabalho. A escolha das pessoas envolvidas é mais select iva, as reuniões são efectuadas numa base regular para discut ir um conj unto de tópicos planeado e antecipadamente definido. Por vezes a part icipação das pessoas envolvidas é remunerada (DoE, 1994). O número de part icipantes varia muito, Gibbs (1997), recomenda 6 a 19, mas que out ros invest igadores têm usado out ros valores. Segundo Gibbs (1997) esta metodologia visa a obtenção de grandes quant idades de informação (várias visões, experiências ou perspect ivas) em curtos espaços de tempo, sobre um determinado tópico. Pode ser ut il izada em vários momentos (num momento preliminar ou exploratório de estudos de caso, durante um estudo, por exemplo para o seu desenvolvimento ou avaliação on-going de um determinado programa ou quando este termina. Gibbs (1997) considera que esta técnica é part icularmente valiosa em situações onde existem diferenças de poder ent re part icipantes e decisores,…, e se espera explorar o nível de consenso a part ir de um determinado tópico. O focus grupo evidencia, no entanto, algumas limitações: a cont rovérsia em generalizar os resultados para toda a população, atendendo ao reduzido número de part icipantes envolvidos, dúvidas quando à legit imidade destes representantes, dif iculdade no desenvolvimento destas act ividades quando o grupo de part icipantes é muito heterogéneo (profissões, níveis culturais, interesses, …) e déficit de riqueza processual (de opiniões, experiências, etc.) quando o grupo é muito homogéneo relat ivamente a algumas característ icas específ icas

Exemplo: definição de parâmetros para desenvolver um modelo computorizado sobre qualidade de ar em Sheff ield (Yearley et all, 2000)

Foruns Operam de formas muito variadas para gerar polít icas, propostas, proj ectos ou simplesmente como “ mesas redondas” para debate. A gestão do forum e as prát icas variam bastante.

Exemplo: foruns promovidos no âmbito do programa PREZEIS (para melhorar as condiçõs de vida da população que vive nas favelas do Brazil, evitando a sua remoção) (Pyle, 2000); Nordvest Forum, promovido numa cidade norueguesa para fazer o updat ing da sua capacidade de gestão (Amdam, 2000)

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Planning for Real

Tal como os UDAT’ s (Urban Design Assistance Teams), o Planning for real é, simultaneamente, uma metodologia e a espinha dorsal da abordagem que se designa com o mesmo nome e combina várias metodologias (ver abordagens). Normalmente esta metodologia tem inicio com a realização de reuniões públicas ou eventos comunitários em que é apresentado um modelo t ridimensional (maquete) com material de apoio (documentação que sustenta a realização do proj ecto) de forma a despoletar o debate informal ent re os part icipantes e com profissionais. Pode ser usado para diferentes propósitos e com a associação de out ras técnicas como o brainstorming “ tempestade de ideias” , em que toda a gente é livre para apresentar comentários, ou para conseguir promover debates mais detalhados sobre os resultados propostos, permit indo pesar diferentes opções de soluções obt idas de reuniões prévias

Mc Dade (1998) observa que esta abordagem reconhece os benefícios do envolvimento comunitário desde o início do processo de debate, pondo ênfase no uso criat ivo e acessível de uma maquete da área em debate.

Simulação (role-play, j ogo de papeis) e Trails, (caminhos)

Metodologias adaptadas da educação ambiental e metodologias pedagógicas.Nas simulações as pessoas podem art icular e perceber as visões e aspirações dos out ros, desenvolvendo ao mesmo tempo as suas próprias ideias e at itudes. As consequências podem actuar como fornecimento de informação ou levantamento de factos.Sendo esta técnica ut il izada com grupos, potencia oportunidades para o debate e a negociação ent re diferentes perspect ivas da comunidade.

IInnes e Booher (1999) caracterizam o ” role playing” (j ogo de papeis) como um exercício de aprendizagem est ruturada em que papeis ou situações reais são representadas por pequenos grupos que, em cada momento, assumem determinados papeis que lhes são designados com vista à análise e resolução de problemát icas relacionadas com esses papeis. Referem ainda a metodologia de bricolage é descrita como o “ ir const ruindo progressivamente” acordos, at ravés de uma criat ividade colect iva criada a part ir de um processo interact ivo e de debate em que são const ruídas decisões que dif icilmente poderiam ser antecipáveis individualmente

Visitas: Levar um grupo a visitar uma comunidade que tenha recentemente completado uma iniciat iva ou proj ecto similar. Estas visitas de “ demonst ração” podem ser muito informais permit indo a discussão casual e o debate ou muito est ruturadas com discussão antecipada, tomada de notas, ent revistas e com o obj ect ivo de recolher informação.

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Quadro 2-3: Abordagens de Envolvimento

Planning for Real

A “ Neighborhood Init iat ives Foundat ion” desenvolveu e promove esta abordagem, que tem vindo a ser ut il izada em contextos territoriais diversif icados de planeamento graças à sua abrangência e polivalência. Esta ent idade ut iliza esta metodologia (Planning for Real) para promover processos de envolvimento comunitários cont ínuos e por períodos de tempo mais longos, aliando-a, para tal, às metodologias de preparação que permitem o desenvolvimento das competências da comunidade.

Antes da int rodução e preparação de qualquer grande evento, existe, normalmente, o acompanhamento da comunidade at ravés de pequenas ou grandes reuniões de grupo e, também, at ravés de sessões informais de formação, com vista à obtenção de acordos quanto aos obj ect ivos, métodos de t rabalho e papeis a desempenhar durante o processo de envolvimento público

As reuniões promovidas dent ro desta abordagem e por esta fundação, são apoiadas por material de apoio e um conj unto diversif icado de recursos que tem sido desenvolvido ao longo dos anos pela fundação (ex: informat ion packs). Esta abordagem é normalmente aplicada à escala do “ neighborhood” (bairros) ou a áreas urbanas mais alargadas (met rópoles, municípios, . .)

RUDAT e CUDATs

A RUDAT (Regional Urban Design Assistance Team) foi desenvolvida nos EUA à 20 anos, pelo “ American Inst itute of Architects” . O mesmo conceito foi adoptado no UK tendo o nome mudado para CUDAT sendo subst ituído o “ regional” por “ Community” . Tal como no Planning for Real, esta abordagem tem sido associada à sua metodologia: uma equipa mult idisciplinar de especialistas externa ent ra no proj ecto para uma sessão de t rabalho intensiva e com a duração reduzida (por exemplo 4 dias). A sessão inicia-se e termina com uma reunião pública. As reuniões de t rabalho são abertas e podem recorrer a uma variedade de metodologias, que permitem aos especialistas a recolha de opiniões e comentários da comunidade. Refira-se, no entanto, este evento deve ser precedido de um longo período de preparação, recolha de recursos, e disseminação de informação at ravés da ent idade local que prepara todos os intervenientes para estas sessões de t rabalho. Em suma, esta abordagem incluí a criação de uma equipa de acompanhamento local que permite o interface com a equipe exterior convidada e possibilita futuras conexões e eventualmente o retorno dos especialistas para novas visitas.

Não existe, contude, suf iciente clarif icação da forma como devem ser desenvolvidas as reuniões, verif icando-se, no entanto, na prat ica dos EUA e no UK que o iniciador (quem promove) e a origem do dinheiro (quem paga) não inf luenciam os resultados nem as act ividades à posteriori, uma vez que existe uma certa independência da equipe responsável pelo proj ecto de envolvimento. Finalmente, nos EUA, o enfoque passou a cent rar-se na valorização de equipas que auxiliem as comunidades locais a promover, de forma auto-sustentada, os seus próprios proj ectos

Const rução de consensos

As metodologias de communit y building têm vindo a ser ut il izadas de forma muito limitada nos últ imos 20 anos (Kingley, 2001) e em poucos países.

É uma forma de resolução de disputas, normalmente sem enquadramento legal específ ico, que, segundo o DoE (1994) é bastante ut il izadas nos EUA e Canadá, em part icular para as contendas em assuntos ambientais.

As abordagens de communit y building visam a const rução proj ectos colaborat ivos em que os part icipantes aprendem a t rabalhar conj untamente e a experimentar a relação de confiança com os out ros, no que diz respeito a problemát icas endereçadas a áreas territoriais concretas.

Esta abordagem oferece um conj unto de princípios e procedimentos aos quais todas as partes têm que aderir previamente, para uma aceitação f inal dos resultados, daí ser fundamental que os procedimentos sej am claros, embora adaptáveis às diferentes situações

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Segundo Kingley et al. (2001) não há uma metodologia definida para a const rução destes proj ectos e que podem exist ir uma enorme diversidade de temát ica para a sua aplicação. O DoE (1994), observa que as metodologias aplicadas nesta abordagens são muitas vezes limitadas e normalmente confinadas às metodologias de “ focus groups” (ver quadro 2.2)

Esta abordagem pode ser ut il izada em qualquer estádio de desenvolvimento e, como princípio os resultados não devem ser determinados por quem quer que o inicie, podendo ser a administ ração pública ou out ro organismo semi-público convidado para a mediação de problemát icas específ icas.

Desafiando as visões divergentes ent re os vários representantes de opinião, esta metodologia confronta os assuntos (os conteúdos de Planeamento) e não as pessoas que, em conj unto, são est imuladas a desenvolver um diálogo genuíno e const rut ivo (diferente da discussão que não é mais do que um ping pong de opiniões “ o argumento que vai, bate e regressa...“ (Innes e Booher, 1999).

Caracteriza-se por visar a mediação ent re diferentes grupos de interesses com vista à obtenção de acordos ent re grupos conflituantes e poder produzir de capital social e humano, capaz de providenciar uma base social mais sólida para o futuro.

São vários os exemplos descritos na literatura sobre a ut il ização desta abordagem especialmente no contexto dos EUA, conforme revela um estudo recentemente realizado por algumas fundações americanas (com intervenção nesta área (como a Anie E. Carsey ou a Rockfeller) em colaboração com o Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano, que fundaram um proj ecto para a ident if icação da extensão da aplicação desta metodologia e suas implicações para a concret ização do que eles designam como mainst ream americano. Muito embora negando que esta abordagem é um remédio para todos os problemas (“ We do not conclude here that community building is a panacea” (Kingley e out ros, 2001), por não resolver problemát icas como a criação de empregos ou de oportunidades concretas para diminuir a pobreza o isolamento social, esta abordagem revela algumas mais valias: “ there are many case experiences showing that community building init iat ives can make an important dif ference in people’ s lives; that they can enhance opportunit ies for those now impoverish and, probably more important , equip them much more powerfully to take advantage of opportunit ies that become available to them” (Kingley, 2001, p.3).

Out ro exemplo da sua ut il ização, desta vez aplicada à definição da localização e funcionamento de instalações de t ratamento de resíduos, desenvolvida em Hamshire, Reino Unido, pode ser consultado em Pet ts (2000)

Abordagens de descent ralização

Duas das maiores alterações em termos das preocupações dos governos locais têm sido a) estar mais perto do consumidor; b) assumir uma posição mais potenciadora e menos imposit iva. Em algumas administ rações locais, principalmente em regiões int ra-urbanas isto gerou a um processo de descent ralização at ravés da delegação de poder e administ ração de recursos para níveis inferiores.

Um modelo organizacional comum e no cent ro deste processo pode estar a existência de um fórum territorial local, ocorrendo frequentemente a t ransferência f ísica de profissionais da administ ração para essas organizações. A intenção de delegar poder visa um maior envolvimento da comunidade porque inclui a criação de uma est rutura que pode ser usada ao longo do tempo e com qualquer proj ecto que possa ocorrer naquela área. Estas organizações e fóruns têm representat ividade das bases locais, devem ter obj ect ivos e funções claras, ser abertos e intervir em vários estádios de qualquer processo. Há alguma incerteza relat ivamente à forma como podem lidar com proj ectos de desenvolvimento supra-locais com impactos local

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2.5.2 - Comentário relat ivo à correcta selecção e uso de metodologias

As metodologias de part icipação devem ser encaradas como um meio e não como um f im. Deve

haver f lexibilidade para alterá-las ao longo do processo e também quanto ao processo para os

part icipantes avançarem pelos seus próprios meios, respeitando normas muito gerais.

McDade (1998) sublinha que a participação pública é muito mais do que consulta pública que se limita a

questionar a opinião do público de forma muito reactiva. A principal diferença é que a participação convida a

população a participar com o público para tomar um papel activo ao longo do tempo.

Em algumas experiências de Planeamento Colaborat ivo tem-se observado a tendência para a

ut il ização um “ bat ido” de técnicas cada vez mais diversif icado (const ituído, por exemplo, por

reuniões públicas, quest ionários de opinião, fóruns de discussão, etc.), que procura um melhor

entendimento e clarif icação do que é a heterogénea “ vontade pública” . Mais importante do que

uma aparente complexif icação técnica parece ser a correcta ut il ização dessas técnicas, em

termos de simplicidade e adequação aos obj ectos de planeamento e à comunidade em questão.

A escolha de métodos deve, não obstante ser feita com base em inúmeros critérios como:

/ quem vai usá-los (característ icas dos part icipantes)

/ nível de competências e recursos exigida (tempo, dinheiro, . .)

/ em que estádio do processo de planeamento a metodologia vai ser ut il izado

/ o t ipo de resultados que pode gerar ou que se desej a.

As met odologias t êm de est ar adequadas aos recursos exist ent es, aspect o que deverá ser

considerado na fase da plani f icação dos proj ect os de planeament o colaborat ivo

Conforme vários autores têm assinalado (Maiden, 1999; DoE, 1994) os estudos cent rados na

part icipação têm evidenciado uma maior tendência para focar a teoria e os efeitos da

part icipação do que nos recursos disponíveis, que têm sido pobremente examinados na

literatura. Parecendo, no entanto, evidente a inf luência dos recursos disponíveis para a selecção

de metodologias e suas implicações na natureza do proj ecto.

Maiden (1999) considera que em momentos de maiores const rangimentos económicos e em que

as autoridades não possam disponibilizar consideráveis gastos para part icipação, poderá haver

implicações na sua ef icácia e a própria implementação das decisões que dependam de

f inanciamentos públicos.

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Para além de recursos para por a funcionar o proj ecto de part icipação é preciso tempo.

Atendendo ao consumo de tempo, associado à fase de planif icação, de envolvimento dos

part icipantes, etc. algumas pessoas vêem-nos como tempo que vão perder, não contabilizando,

no entanto, os obstáculos que poderão encont rar na fase de implementação de um proj ectos não

part icipado (ver estudos de caso, Capítulo 3). É portanto a avaliação dos custos de tempo, o que

passará pela contabilização das horas ut il izadas pelos vários of iciais de planeamento nestes

processos de envolvimento (reuniões, análise de informação, etc.), que deverão ser

confrontados com os ganhos ao nível da coordenação ou maior ef iciência na fase de

implementação

Não é aceitável que se coloque de parte um proj ecto de planeamento colaborat ivo sem uma

avaliação obj ect iva de custos/ benefícios de recursos - tempo, dinheiro, etc.

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2.6 - Da teoria à prát ica do Planeamento Colaborat ivo em Portugal

Não obstante os avanços no campo da teoria e metodologias do Planeamento Colaborat ivo, a que

j á t ivemos oportunidade de fazer referência ao longo do capítulo 2, a prát ica de planeamento

nacional revela pouco desenvolvimento neste domínio.

Começa, no entanto, a desenhar-se uma t ransição, ainda que lenta, para a experimentação de

abordagens part icipatórias que tem sido inf luenciada por dois factores principais:

1. Uma tentat iva de adaptação de algumas prát icas nacionais às exigências de programas e

princípios comunitários;

2. As recentes inovações no direito à part icipação na legislação de planeamento português, ao

nível dos inst rumentos de gestão territorial e de avaliação de impactos ambientais

Este ponto desenvolve-se, exactamente, com base na ref lexão sobre estas inf luências para as

prát icas de planeamento nacionais. Int roduz-se o debate que, a nível internacional, os princípios

da União Europeia têm suscitado, nomeadamente os que têm moldado de forma mais

determinante (por exemplo ao nível dos programas de f inanciamento) o direito dos cidadãos à

part icipação e, ao nível nacional, as recentes alterações j urídicas que têm consubstanciado uma

maior abertura do planeamento à part icipação, não obstante ainda não se poder avaliar os seus

resultados e ao nível teórico exist ir uma opinião consensual dos autores sobre o déf icit de

abertura do sistema à part icipação das comunidades locais.

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2.6.1 - Inf luência das iniciat ivas e programas da UE para as prát icas de planeamento

“… os cidadãos também têm um papel próprio a desempenhar. Todos os cidadãos e residentes na UE têm direito

a uma administração urbana transparente, responsável e eficaz, bem como o direito de influenciar a forma como

as suas comunidades locais e cidades são administradas…”

(Comunidades Europeias, 1995: 5)

Neste ponto formula-se a hipótese de que as direct rizes da União Europeia para os 15 estados

membros que a integram, por exemplo Portugal, tem vindo a inf luenciar a legislação desses

estados e a j usante as prát icas de planeamento no que diz respeito, especif icamente, à

part icipação pública

Procurando ref lect ir sobre a inf luência da União Europeia para a agenda polít ica e de

planeamento nacional, no que diz directamente respeito ao direito à part icipação dos agentes

não governamentais, apresentam-se as principais orientações formatadas por esta organização

polít ica sobre o tema.

A ent rada de Portugal na Comunidade Europeia em 1986, correspondeu ao início de um período

de reformas est ruturais, associadas à possibilidade do acesso a fundos comunitários que passam

a ser disponibilizados mediante regulamentos j urídicos, que, a j usante, condicionaram os

procedimentos associados à candidatura ou aplicação desses fundos e adaptaram a legislação

nacional a regulamentos e direct ivas comunitárias.

Por exemplo, Gonçalves ( 2000) refere que no âmbito da União Europeia foram adquiridas certas inovações

jurídicas e processuais como a adopção de avaliações de impacto ambiental (AIA), as leis de acesso à informação

administrativa e os inquéritos e audições públicas, o que tem facilitado o escrutínio público das bases científicas

da formação das decisões públicas (Gonçalves, 2000, p.156)

“Partenariat et participation de la population ont reçu un fort soutien au niveau des institutions européenes : ainsi

le Conseil de l’Europe a-t-il en 1989 adopté une resolution (résolution 208) plaidant en faveur d’un plus grand

rôle de la population aux échelons local et regional ; et de nombreux programmes de la Communauté

européenne, puis de l’Union Européenne (Poverty 3, URBAN, INTEGRA, entre autres) ont illustré l’importance

donnée au partenariat et à la participation de la population. » (Atkinson, 1998, p.79)

De facto, as polít icas e programas da UE proporcionaram o enquadramento e estabelecem

exigências à forma de actuação do planeamento dos vários Estados Membros, tendo estabelecido

exigências como a necessidade de concepção e implementação de um planeamento mais

equitat iva dos diversos interesses territoriais. Out ra das exigências internalizadas pelos

contextos nacionais foi a da necessidade de uma maior ef icácia na disponibilização de

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informação à comunidade, para que esta pudesse part icipar act ivamente nas questões do

planeamento (Barlow, 1995).

Lançando o desafio à administ ração pública da const rução de um planeament o part icipado com

vista a gerar melhores níveis de governância, democracia e envolvimento dos cidadãos, as

direct ivas comunitárias procuravam não só uma melhor concertação e coordenação dos diversos

níveis da administ ração, como com as do sector privado e organizações de cidadãos.

A este propósito um documento emanado pela Presidência da EU em 1988, afirmava que os Estados Membros da

UE tinham de “... enfrentar o desafio adicional de estender a democracia local através do envolvimento de

stakeholders, incluindo cidadãos, na formulação e implementação integrada de estratégias para o

desenvolvimento sustentável. A construção de partnerships entre residentes e actores locais que podem

influenciar o futuro das suas comunidades e, ao mesmo tempo, permitir maiores níveis de participação evitando a

alienação do processo político” (adaptado, Presidence of the European Union, UK, 1998)

A valorização da part icipação pública passa a constar explicitamente num conj unto diversif icado

de documentos emanados directamente dos órgãos da UE, nomeadamente da Comissão

Europeia72, um orgão que inf luencia as principais decisões relat ivas às prioridades da UE, por

exemplo ao nível da elaboração de polít icas est ruturais, incluindo Programas para a gestão de

fundos est ruturais e direct rizes para as polít icas dos Estados Membros e que tem assumido como

obj ect ivo chave da sua actuação, a redução das disparidades ent re as diversas regiões da UE e

promoção do Princípio Subsidiariedade, consagrado pelo Tratado da União Europeia.

“na União Europeia, passou-se a falar muito no princípio da subsidiariedade para regular as relações e para

distinguir as competências das instâncias comunitárias versus as dos países-membros. As primeiras não devem

ficar afogadas em decisões sobre matérias que não respeitam ao conjunto da União, em nome da sua própria

eficiência (…) A governância de qualquer grande instituição – governo ou grupo de empresas – não prescinde da

aplicação sistemática do princípio de subsidiariedade, para se poderem concentrar os estratos mais elevados na

definição de estratégias, os intermédios na das tácticas e os executivos na implementação bem gerida das

medidas que traduzirem as anteriores (Valente Oliveira, 2001, p.27)

Acrescente-se que o princípio da subsidariedade é indissociável de uma abordagem de baixo para cima: “Les

collectivités régionales et locales comptent parmi les acteurs clé de la politique européene de développment

spatial. L’application des options politiques nécessite le soutien actif des autorités régionales et locales et des

pertites villes des milieux ruraux, jusqu’aux grandes régions métropolitaines. Les collectivités régionales et

locales réalisent les objectifs de la Communauté en agissant pour ansire dire « par le bas » grâce à leur

propre coopération. » (UE, 2001, p.47)

72 o orgão executivo e detentor da iniciativa política e legislativa da UE e responsável pela execução e gestão de diferentes políticas e pelo acompanhamento da aplicação das directivas, regulamentos e decisões comunitárias.

A Comissão trabalha, de resto, em estreita cooperação com outras instituições comunitárias e todos os governos dos estados membros. Muito embora seja função da Comissão fazer propostas, todas as decisões legislativas mais importantes são tomadas pelos ministros dos estados membros reunidos em conselho de ministros, em co-decisão com o Parlamento Europeu que é eleito democraticamente (em alguns domínios este é simplesmente consultado)

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Um dos principais documentos emanados pela Comissão Europeia sobre Ordenamento do

Território foi o EDEC73, que lançou os obj ect ivos para o Desenvolvimento do território da U.E .

É um documento que põe ênfase no Desenvolvimento Espacial, uma vez que o Planeamento Territorial não é

competência da UE, mas dos Estados Membros (Kratke, 2001) e que apresenta um quadro político de referência

para melhorar a cooperação das políticas sectoriais comunitárias com impacto significativo sobre a estrutura

espacial, destinando-se, por isso, a decisores públicos e privados.

Com base num t riângulo cuj os vért ices são a sociedade, economia e ambiente, o EDEC apresenta

como obj ect ivos chave a coesão económica e social, a compet it ividade equilibrada para o

território europeu e a preservação do pat rimónio natural e cultural dos locais. Nesse sent ido, os

Minist ros de Ordenamento do Território da UE concordaram em est ruturar os seus campos de

acção com vista: ao desenvolvimento de um sistema urbano policênt rico e uma nova relação

campo/ cidade, a assegurar uma acessibilidade equivalente em infra-est ruturas e saber e ao

desenvolvimento durável, gestão prudente e preservação do pat rimónio natural e cultural. Neste

cenário est ratégico reconheceu-se que as polít icas integradas geram mais valias que as

sectoriais que actuam de forma isolada, postulando-se a criação de novas modalidades de

coordenação ent re polít icas sectoriais e modalidades de cooperação na est rutura polít ica

administ rat iva. Assim, com vista a um maior equilíbrio, coesão socioeconómica do espaço

comunitário e durabilidade das intervenções, desenvolveu-se o conceito operacional de

desenvolvimento territorial integrado, que tem em vista uma coordenação vert ical mais f lexível

ao nível das várias escalas de decisão (comunitário, regional, local) e melhor cooperação

horizontal de polít icas sectoriais com incidência territorial : « La coopérat ion est la clé d"une

pol it ique de développement spat ial int égrée» (SDEC, p.3874 )

A visão territorial de futuro comunicada pelo Esquema de Desenvolviment o do Espaço

Comunit ário (1999), cuj os obj ect ivos, conforme é sublinhado pelo próprio documento, devem

ser perseguidos por todas as inst ituições europeias, independentemente das escalas polít icas e

administ rat ivas regionais e locais, tem inf luenciado, a j usante, o próprio quadro de referência

para a polít ica urbana da UE. A este nível, observa-se a tendência para valorizar a dimensão

urbana da polít ica espacial europeia, não só porque ela concorre para o sucesso do modelo de

desenvolvimento policênt rico proposto, como por aí se concent ram algumas das maiores

oportunidades, est rangulamentos e desafios contemporâneos (por exemplo, o da governância ou

da inclusão urbana, . .)

73 elaborado pelo Comité de Desenvolvimento Espacial, cuja discussão final foi feita pelo encontro de Ministros de Ordenamento do Território da União Europeia, em Potsdam em de Maio 1999. 74 Commission Europeenne (Maio 1999) - �Schéma de Développement de l�Espace Communautaire � Vers un développement spatial équilibré et durable du territoire de l�UE�

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Dois exemplos dessa focalização nas problemáticas urbanas são as comunicação da Comissão “Towards an

Urban Agenda in the European Union” (1997) e “Urban Sustainable Development in the EU: a Framework for

Action” (1998) que viriam a determinar o aparecimento de programas de iniciativa comunitária, como o

URBAN. Acrescente-se que 4 dos principais objectivos e guias para acção desta política foram: “Strengthening

economic prosperity and employment in towns and cities”, “Promoting equality, social inclusion and

regeneration in urban areas”, “Protecting and improving the urban environment: towards local and global

sustainability”, “Contributing to good urban governance and local empowerment

A polít ica da UE para as áreas urbanas, t raçada mediante um ‘ quadro de acção’ 75 sublinha a

necessidade de fortalecer a economia urbana, minimizar a exclusão social, criar capital

inst itucional das regiões e promovendo o envolvimento dos cidadãos:

“…é importante assegurar a participação dos cidadãos e dos sectores privado e das comunidades locais,

garantindo desse modo que sejam tidas em conta as aspirações dos principais intervenientes, sejam satisfeitas as

necessidades dos beneficiários-alvo locais, sejam mobilizados todos os recursos possíveis e seja atribuído maior

valor à propriedade e empenhamento, aumentando desse modo a legitimidade e a eficácia”(Comissão Europeia,

1999, p.7)

Para tal a União Europeia desaconselha formas de governância hierárquicas geradoras de

segregação inst itucional e que são obstáculos para a comunicabilidade e prosperidade territorial.

Inversamente, aconselha-se o incent ivo a processos de decisão inst itucionais promotores de uma

maior part icipação e integração das acções de parceiros do sector urbano público, sector privado

e das comunidades locais, desde o nível europeu ao nível local, promovendo de forma a

incrementar a sinergia e cooperação ent re os processos e recursos inst itucionais existentes

Também o relatório de Coesão Económica e Social (2ª versão provisória, ainda não publicado,

apresentado no início de 2001, que se refere aos fundos est ruturais do novo período de

programação 200-2006), vem reaf irmar o princípio da coesão económica e social na const rução

da ident idade europeia , propondo um melhoramento da ef icácia e evolução dos inst rumentos, o

que poderá passar pelo desenvolvimento de partenariados mais inclusivos.

“outre l’effort de cohésion en termes financiers, les nouveaux règlemts préconisent la poursuite du système de

programmation par objectif mais simplifié et plus flexible, un contrôle plus strict de l’additionnalité, un

partenariat plus inclusif et responsible, ainsi qu’un modèle de gestion plus orienté vers les résultats.”

(Commission Europeenne, 2001)

Efect ivamente, na preparação do novo Q.C.A. observou-se o destaque concedido à est rutura de

partenariado, com vista a um papel de maior responsabilidade e part icipação dos vários

‘ partners’ numa gestão. Definiu-se, nesse sent ido, que a at ribuição de fundos est ruturais se

75 �Desenvolvimento Urbano Sustentável na UE: um Quadro de Acção�(1998)

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devia associar, durante os próximos 6 anos, à criação de partenariados inclusivos, interact ivos e

act ivos na def inição de orientações est ratégicas, e que se caracterizassem por uma gestão

responsável e t ransparente, com uma monitorização e avaliação integral (Comissão Europeia,

2000, p.81)

No “Deuxiéme Rappor t sur la cohesion Economique et sociale” da Commission Europeenne (2000),

especificamente no capítulo das perspectivas de programação para o período de 2000-2006 da UE, acentua-se a

importância da convergência e de crescimento das regiões menos prósperas, graças a uma mais eficaz

combinação de esforços dos estados membros da Comunidade que permita a obtenção de impactos mais positivos

dos investimentos a realizar. Esta é, de resto, a orientação da política de distribuição de fundos estruturais do 3º

QCA.

On observe aujourd’hui un élargissement progressif de la structure du partenariat : aprés une premiére phase

d’inclusion des partenaires régionaux et locaux – 1989-1993, les partenaires socio-économiques ont été peu à peu

intégrés – 1994-99 - , tandis que l’inclusion des représents de la société civile – organismes non

gouvernementaux, associations, mouvements pour l’égalité des chances – se dessine commmme le défi de la

pér iode 2000-2006 (Commission Europeenne, 2000, p.81)

Observa-se, portanto, uma grande aposta, do ponto de vista organizat ivo, em est ruturas de

partenariado que procuram ser mais inclusivas dos vários interesses territoriais e uma polít ica de

coesão mais descent ralizada no interior dos Estados Membros76. Para tal propõe-se uma

def inição mais alargada de parcerias ent re as autoridades locais e regionais e out ras autoridades

competentes, os parceiros económicos e sociais e out ros organismos competentes (incluindo

ONG, sector do ambiente, etc.), caracterizando-se por uma interact ividade e act ividade em

todas as fases da programação

Ainda desta pesquisa sobre os princípios da UE face à part icipação pública, deve destacar-se a

posição de dois importantes órgãos consult ivos da Comissão Europeia: o Comité Económico e

Social e o Comité das Regiões. O primeiro representa os interesses e visões da sociedade civil

organizada, perante a Comissão, o Conselho e o Parlamento Europeu, sendo obrigatoriamente

consultado sobre questões de polít ica económica e social; o segundo é composto por

representantes das autarquias regionais e locais, com o obj ect ivo de zelar pelo respeito da

ident idade e prerrogat ivas regionais e locais, devendo ser obrigatoriamente consultado em

domínios vastos, como o da polít ica regional e ambiente77.

No primeiro bolet im t rimest ral lançado pelo Comité das Regiões (“ A Voz das Regiões” ) lançado

em Novembro 2000, os obj ect ivos de uma cidadania act iva e por formas de governância mais

ef icazes revelam grande destaque, como se ilust ra com os seguintes ext ractos, ret irados da

primeira página:

76 em que a relação Comissão Europeia/Estados-Membros se define através de três agentes-chave com responsabilidades claramente definidas � a Comissão, a Autoridade de Gestão do Programa e o Comité de Acompanhamento 77 in UE � As instituições da UE, http://europa.eu.int/inst-pt.htm, 2001.

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Mercedes Bresso (presidente da Província de Turim): “A Europa deve ser construída pelos cidadãos e para os

cidadãos. É essencial assegurar a participação das colectividades territoriais locais e regionais, as quais, por

serem as mais próximas do terreno e das necessidades de cada região, devem desempenhar um papel de incentivo

e de animação a fim de garantir uma transparência cada vez maior e de gerar um fluxo de ideias entre os cidadãos

e as instituições. É fundamental garantir o Princípio da Proximidade e da Democracia, de forma a reformar os

processos de decisão graças à participação dos cidadãos e dos seus representantes eleitos, nomeadamente a nível

local e regional”.

Graham Tope (membro do “Sutton London Borough Council): “A União Europeia deverá ser uma União da

oportunidade, uma União que crie o quadro no qual possam inscrever-se a participação e as iniciativas dos

cidadãos. O Princípio da Subsidiariedade deve ser entendido à luz de uma parceria horizontal e idêntica entre as

diversas esferas de governo e não ser aplicada de forma limitada e rígida em termos de uma repartição

estritamente vertical e hierarquizada das competências entre níveis de governo, repartição esta que afasta muito o

cidadão da UE. O processo decisório já não é linear: assume, cada vez mais, a forma de uma rede que envolve

uma grande variedade de actores e interessados. Isto pressupõe novos instrumentos que permitam preservar a

transparência e responsabilidade…”

É portanto evidente na posição do Comité das Regiões o destaque que é dado à implementação

de boas prát icas de governância inst itucional, não só ao nível vert ical mas part icularmente

horizontal, o que deverá passar por uma part ilha de poderes e decisões no interface

administ ração e sociedade civil organizada. Trata-se do discurso da não imposição, do diálogo

const rut ivo, da part icipação ao nível do programa e da selecção de alternat ivas que visa, se não

a criação de consensos (frequentemente impossíveis pela conflitualidade de opiniões ao nível

técnico, polít ico, da comunidade), pelo menos o debate aberto e t ransparente durante o

processo de decisão

Se, por um lado, se reconhece a dif iculdade de criar consensos na área do planeamento

territorial, reconheça-se, ao nível da UE, o consenso gerado sobre o tema. Sobre a legit imidade

da part icipação dos vários actores da comunidade, ONG’ s, sector privado, público às várias

escalas, sendo, para tal, ao nível de cada Estado-Membro fundamental, a criação de canais de

comunicação ef icazes que permitam uma melhor coordenação inst itucional e de

cont ratualização ent re as várias agendas locais (ambientais, sociais, económicas,..)

Deve-se, de forma cada vez mais séria e responsável, encarar a part icipação dos vários actores

territoriais em matéria de ordenamento territorial como uma via para a coesão, solidariedade e

inclusão social. Uma via para a criação de espaços de cooperação apropriados ent re as várias

est ruturas administ rat ivas e de gestão territorial, o reforço da part icipação das colect ividades e

invest idores locais em processos de negociação e cont ratualização na realização de proj ectos

comuns, a promoção de proj ectos territoriais integrados de forma a ult rapassarem-se as

limitações das polít icas sectoriais, com vista a garant ir a criação de efeitos de sinergia (Ver

Capítulo 3 sobre a reaqualif icação do bairro do Cerco, co-f inanciada pelo Programa URBAN)

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2.6.2 - O direito à part icipação no sistema de Planeamento Português: elaboração dos

inst rumentos de gestão terr itor ial e Avaliação de Impactos Ambientais

Em Portugal, as decisões de planeamento são tomadas por alguns ‘ especialistas’ do território

(planeadores, engenheiros, arquitectos, geógrafos, …) e por decisores polít icos, que se baseiam

no, maior ou menor, conhecimento que detêm sobre as necessidades e aspirações da população

local, a evolução dos processos territoriais (expansão ou declínio urbano, tendências de

relocalização de act ividades ,. . ,), das dinâmicas exógenas (invest imento empresarial,

oportunidades de f inanciamento de programas nacionais ou comunitários,….), etc. Em

dependência desse conhecimento e detalhe de informação, existe sempre a variável incerteza

relat iva à necessidade de tomar decisões actuais atendendo a cont ingências futuras.

O processo de decisão no planeamento territorial tem sido, ao longo dos últ imos anos,

fortemente dominado por uma organização polít ica de t radição cent ralista (Sousa Lobo, 1997) e

por formas de decisão tecnocrát icas (Rosa Pires, 1994) que não relevam a opinião dos cidadãos,

o que tem dif icultado, segundo Chito e Caixinhas (1992) “ uma melhor adequação dos proj ect os

ao meio e às preocupações fut uras da população” (Chito e Caixinhas, 1992, p.924).

À crít ica a esta desconsideração e consequente desvalorização dos recursos da comunidade pelos

decisores (Monteiro e Simões, 1995) tem-se associado o elogio por formas de governância

horizontais, e alicerçadas em redes de coordenação horizontal, que não dispensam uma

concertação inter-inst itucional e com a comunidade local (Figueiredo, 2001; Valente de Oliveira,

2001).

A prát ica quot idiana revela, no entanto, uma realidade bem diferente, quer na relação

administ ração / administ rados, quer na integração de opiniões dos cidadãos no planeamento

territorial.

Craveiro e Nunes da Silva (2000) com base numa revisão crít ica aos diplomas j urídicos que

enquadram o direito à part icipação na elaboração de inst rumentos de gestão territorial analisam

as alterações na definição de inquérito público e as suas repercussões em termos da sua

ef icácia.

“O DL 560/71 vem sujeitar à “formalidade” do inquérito público, durante 30 dias, os Planos Gerais e Parciais de

Urbanização, mas dele exceptua os Planos de Pormenor, muitas vezes responsáveis por urbanizações de grande

impacto (artigo 3.º, n.º 2). No entanto, com raras excepções, este procedimento correspondeu, tão só, a um

sancionar das propostas do Plano, pois os agentes, em particular à população, apenas era dado a conhecer os

resultados do Plano enquanto solução finalista, sem a consequente avaliação de sugestões ou negociação.

Posteriormente, o DL 69/90 de 2 de Março – que integrou num único instrumento legal o regime jurídico dos

diversos Planos Municipais de Ordenamento do Território até aí dispersos por diplomas de épocas e concepções

diferentes – veio (…) dilatar o tempo do inquérito público aquando da proposta final, não podendo ser inferior a

30 dias e alarga-o aos Planos de Pormenor. No entanto, eliminou a modalidade de participação existente no

anterior quadro jurídico do PDM, contido no Dec. Reg. 91/82 de 29 de Novembro, o qual, no seu artigo n.º 14,

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estabelecia a possibilidade de, durante a elaboração do projecto do Plano, os munícipes e as diferentes entidades

interessadas dirigirem à Câmara Municipal as observações que entendessem formular sobre as soluções e opções

propostas. Pretendia-se, então, consagrar a modalidade participativa dos cidadãos na elaboração dos planos à

semelhança da “participação preventiva dos cidadãos” existente no direito alemão, solução que é certamente mais

eficaz ainda que mais trabalhosa, pois implica prévia negociação” (Craveiro e Nunes da Silva, 2000, p.32,33)

Em síntese, não obstante o direito à part icipação dos cidadãos nos inst rumentos de planeamento

territorial ser const ruída de progressos e ret rocessos ao longo do tempo, tem-se caracterizado

genericamente por momentos e procedimentos tardios e desaj ustados dos processos de decisão,

equivalendo na maior parte das vezes a meras circunstâncias de informar e receber

‘ reclamações’ sob a forma escrita.

Este est ilo de part icipação, burocrát ico e realizado a j usante da cristalização das decisões tem,

como é natural, convidado a formas de part icipação “ interessadas” (por exemplo, a dos

proprietários que conseguem avaliar de forma directa os prej uízos causados pelo índice

const rut ivo def inido pelo plano para a sua propriedade, etc.), nomeadamente dos grupos mais

informados, que conseguem interpretar a linguagem técnica do planeamento e formular por

escrito as sua reclamação, sugerindo alternat ivas viáveis para os seus interesses.

Ut il izando a terminologia de Craveiro e Nunes da Silva (2000), pode-se af irmar que ela tem sido

predominantemente ‘ reivindicat iva’ , caracterizada por momentos de protesto, de reclamações

individuais e de grupos em det rimento de uma part icipação ‘ proposit iva’ , sob a forma de

propostas, ou de out ro t ipo durante a fase de elaboração dos inst rumentos de planeamento.

Esta situação é, de resto, inf luenciada pela forma como a generalidade da administ ração encara

a part icipação: como um formalismo administ rat ivo que deve ser ult rapassado, em vez de uma

oportunidade para um melhor diagnóst ico local, da criação de um quadro de actuação mais

legit imado, etc.

Desta situação, e da tendência para a complexif icação terminológica de ideias que não são

simplif icadas nem clarif icadas pela população, tem resultado uma passividade da opinião pública

que condiciona a própria confiança da população no sistema e a sua predisposição para a

part icipação, com repercussões para a qualidade e diversidade do capital informat ivo que chega

à equipa do plano.

Muito embora o direito à part icipação pública estej a previsto na Const ituição (Anexo 5), a

prát ica administ rat iva nacional revela dif iculdades em “ evitar a burocrat ização, a aproximar os

serviços das populações e a assegurar a part icipação dos interessados na sua gestão efect iva,

designadamente por intermédio de associações públicas, organizações de moradores e out ras

formas de representação democrát icas” (Art . 267º, Título IX, Const ituição da República)

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“Efectivamente, após 25 anos de democracia, temos consagrado na Revisão Constitucional de 1997 (n.º 5 do

artigo 65.º) o “Princípio da Participação dos interessados na elaboração dos instrumentos de planeamento

territorial e cujos princípios gerais já se encontravam no artigo 8.º do Código de Procedimento Administrativo

(DL 442/91 de 15 de Novembro, com as alterações introduzidas pelo DL 9/96 de 31 de Janeiro” (Craveiro e

Nunes da Silva, 2000, p.36)

Costa Lobo (2001) cita, por exemplo a Lei 83/95, de 31 de Agosto, que prevê situações em que a lei possibilita a

“participação dos cidadãos em procedimentos administrativos e o direito de acção popular para a prevenção, a

cessação ou perseguição judicial das infracções nr. 3 do artigo 52º da Constituição” (Costa Lobo, 2001b, p.36),

mas na realidade estas situações são desconhecidas pela maioria dos cidadãos e é restrito o grupo capaz de

mobilizar os seus direitos.

Deve, no entanto, assinalar-se que, não obstante o predomínio de modelos de governância

caracterizados por um exercício de poder cent ralizado e baseado em relações vert icais,

exist iram algumas experiências de part icipação na prát ica de planeamento portuguesa, das quais

o movimento SAAL – Serviço Ambulat ório de Apoio Local , foi um dos mais paradigmát icos. Por

promover uma abordagem part icipatória para a reabilitação de zonas de habitação degradada

(erradicação de barracas e ilhas), por basear-se em redes horizontais de part ilha de diagnóst icos

e soluções, ent re ‘ brigadas de apoio técnico’ mult idisciplinares e moradores de bairros

degradados (organizados em comissões de moradores)

Esta experiência de part icipação de est ratos sociais mais insolventes, e t radicionalmente

excluídos do processo de planeamento, desenvolve um modelo de democracia directa e

part icipat iva, que visa romper com o modelo autoritário da ditadura, mas que, segundo Teotónio

Pereira será ext into pelo próprio modelo de democracia representat iva que se viria a instaurar.

“…em 1976 o sistema foi repentinamente suspenso por decisão governamental sendo Ministro da Habitação

Eduardo Pereira, no quadro da chamada normalização democrática: o SAAL foi considerado excessivamente

revolucionár io face ao sistema representativo, por se encontrarem nos seus alicerces formas de democracia

directa” (Teotónio Pereira, 1993, p.30) Tratava-se portanto de uma metodologia política, social e tecnicamente

inovadora que conflituava com os interesses politizados da democracia representativa. Teotónio Pereira identifica

particularmente os vários grupos parlamentares que olhavam este modelo de actuação urbanística com

desconfiança (Teotónio Pereira, 1993)

Bastante polit izado e debat ido, quer em termos dos mot ivos que levaram à sua ext inção78 quer

dos resultados que proporcionou, o SAAL evidenciou, no entanto, um correcto quest ionamento

78 �(�) Em 1976, no momento em que o movimento de moradores começava a entrar em declínio, o SAAL estava condenado à extinção, não tanto pelos pretextos então invocados pelo poder, mas porque se situava em contradição com as novas orientações de política económica e social. De resto, a acusação de �má utilização de dinheiros públicos� nunca foi seriamente comprovada, a acusação de �envolvimento partidário� era ridícula num processo em que o controlo das operações cabia, segundo o próprio despacho fundador às organizações de moradores, e a acusação de �incompetência� dos técnicos do SAAL (que reunia a �nata� dos arquitectos e urbanistas portugueses, a começar pelo Álvaro Siza Vieira) só poderia ter sido feita por ignorância do trabalho desenvolvido. Basta referir que à data da sua extinção e ao fim de pouco mais de dois anos de experiência o SAAL envolvia mais de 150 operações, em vários concelhos do país, com especial incidência nas áreas

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dos meios de intervenção ut il izados até então (e com pouco sucesso) para a resolução do

problema da habitação79 e eliminação de barracas e ilhas.

O modelo experimentando era bastante inf luenciado pelas metodologias que estavam na ordem

do dia nos meios técnicos internacionais (bastantes ligadas às experiências de desenvolvimento

do 3º mundo80), baseadas no desenvolvimento de metodologias simples mas ef icazes para o

levantamento de necessidades, recolha de informação e debate sobre proj ectos em Assembleias

Gerais de Moradores.

É com o novo regime j urídico que clarif ica o enquadramento procedimental associado à

Avaliação de Impacto Ambiental (decreto-lei n.º 69/ 2000) e aos inst rumentos de gestão

territorial (decreto-lei n.º 380/ 1999), que se assiste a uma mudança signif icat iva na concepção

do direito de part icipação dent ro do quadro legal de Planeamento Português, passando a ” ..a

art icular a democracia representat iva com formas de democracia part icipat iva, permit indo assim

um maior envolvimento dos cidadãos nos principais processos de mudança” (Chito e Caixinhas,

1992, p.924).

Uma nova legislação que promove a deslocação do processo de part icipação da sociedade de

j usante para montante do próprio processo de decisão81, passando-se de procedimentos de

part icipação pública que visam uma mera “ validação” de Planos j á criados e f inalizados, para a

oportunidade dos cidadãos part iciparem numa fase muito preliminar da elaboração desses

inst rumentos (Anexo 6)

Se é verdade que estes enquadramentos legais vêm abrir novas ‘ j anelas de oportunidade’ para a

part icipação dos cidadãos no planeamento territorial, também é verdade que a sua ef icácia

depende das próprias prát icas dos decisores e da dupla abertura do sistema de administ ração

pública: por um lado, para dar informação os cidadãos, pois só se pode part icipar quando se está

informado, por out ro a saber receber e valorizar essa part icipação

metropolitanas de Lisboa e Porto, onde se concentravam os principais núcleos de habitação degradada, �� (Gaspar Pereira, In prefácio de Rodrigues, 1999).

A extinção do SAAL correspondeu também à extinção de modelos de governância com transferência e partilha de poderes entre o estado e a população. Refira-se que no modelo de democracia representativa dominante, a população mantém-se confinada a pronunciar um veredicto sobre a actuação global do governo de 4 em 4 anos sobre um programa diversificado de propostas. 79 Por exemplo as políticas de habitação que deslocaram a população do centro do Porto para bairros sociais periféricos e concentrados, concentrando os problemas de desemprego, pobreza, marginalidade etc. e simultaneamente colocando estes estratos de população mais insolventes, em condições de desfavorecimento no relativamente a oferta desta área em serviços públicos - saúde, transportes, etc. (ver cap. 3, a propósito da caracterização do Vale de Campanhã) 80 a este propósito ver Friedmann, 1996 81 A este propósito Teresa Anderson, na VI conferência de Qualidade de Ambiente realizada em Lisboa em 1999, afirmava que �num plano é fundamental promover a participação dos interessados em fases muito preliminares e aparentemente com poucos tópicos de discussão�, sendo útil desenvolver mecanismos de concertação em fases muito iniciais da elaboração dos documentos

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“O direito de informação corresponde, indiscutivelmente, a um aperfeiçoamento da própria democracia, ao

permitir aos cidadãos o acesso à informação na posse da Administração, e, por via de tal acesso, poderem

compreender não só o funcionamento da Administração, mas a fundamentação das decisões administrativas que

os possam afectar (positiva ou negativamente) como cidadãos individualmente considerados ou como cidadãos

enquanto membros da colectividade” (Sardinha, 1995, p.65)

Relaciona-se, ainda, com as questões de posse e part ilha de informação e poder na sociedade,

segundo Sardinha (1995) “ a posse de informação é um privilégio” e sempre que a Administ ração

revela relutância em divulgá-la de boa vontade, este const itui “ um processo de t irar poder a

algumas classes concedendo import ância a quem dispõe dela” (Sardinha, 1995, p.64)

O Art igo 5 do decreto-lei 380/ 99, que estabelece o regime j urídico dos inst rumentos de gestão

territorial82, consagra o direito à informação dos part iculares no processo de Planeamento

Português, af irmando que todos os interessados têm o direito a ser informados sobre a

elaboração, aprovação, acompanhamento, execução e avaliação dos inst rumentos de gestão

territorial, devendo a autoridade de planeamento dar uma adequada publicidade na área de

intervenção do plano, relat ivamente a um conj unto diversif icado de temas: a decisão de

desencadear um processo de elaboração, alteração ou revisão dos planos, as conclusões das

diversas fases, o teor dos elementos a submeter a discussão pública, as conclusõe e

procedimentos de avaliação, …

No Preâmbulo do decreto-lei, para além de se realçar a importância do direito à informação,

sublinha-se a importância da part icipação dos interessados mediante a ideia de uma

administ ração aberta e voltada para os cidadãos

“o princípio consagrado na revisão constitucional de 1997, no novo n.º 5 do artigo 65.º, de participação dos

interessados na elaboração de instrumentos de planeamento territorial, quer na vertente de intervenção,

assegurada ao longo de todo o procedimento, que na vertente da divulgação, alargando-se o dever de

publicitação, designadamente através da comunicação social, das decisões de desencadear os processos de

elaboração, alteração ou revisão, da conclusão das diversas fases e teor dos elementos a submeter a discussão

pública, das conclusões desta, bem como dos procedimentos de avaliação” (Ministério do Equipamento do

Planeamento e Adm. do Território, 1999, p. 6590).

Efect ivamente, o art igo 6 do decreto-lei 380/ 99 consagra o direito de part icipação de todos os

cidadãos, bem como das associações representat ivas dos interesses económicos, sociais,

culturais e ambientais nos procedimentos de elaboração, execução, avaliação e revisão dos

inst rumentos de gestão territorial, funcionando este como uma garant ia dos part iculares face ao

próprio plano

82 e que vem operacionalizar o Princípio da Participação e Concertação de interesses (na elaboração e aprovação de instrumentos de gestão territorial) da Lei 48/98, de 11 de Agosto, que estabelece as bases da política de ordenamento do território e Urbanismo.

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As diferentes fases procedimentais dest inadas à part icipação dos interessados ou de discussão

pública encont ram-se sistemat icamente descrita pelos art igos 33, 40, 48, 58 e 77.

Diga-se, no entanto, que a existência destes direitos ‘ de per si’ não garante que a prát ica de

planeamento lhes outorgue um signif icado substant ivo, principalmente se atendermos à

diversidade de interpretações que pode exist ir na interpretação dos vários princípios da lei83

Para além da existência de alguns factores crít icos para a t radicional falta de cultura de não

part icipação em Portugal (Anexo 4), existem alguns factores crít icos à concret ização dos direitos

de part icipação no planeamento reklacionados com as questões que seguidamente se

apresentam:

1. A falta de sugestões para a concret ização do it inerário procedimental que se propõe.

Verif icando-se um enorme déficit de sugestões metodológicas para a implementação

prát ica destes direitos. Tal relaciona-se, em parte, com a falta de debate sobre as questões

da part icipação no planeamento territorial, que, como j á referimos, tem sido bastante

limitada, mas principalmente pela falta de preocupação do Estado com esta temát ica;

2. as dif iculdades no desenvolvimento de procedimentos de diálogo e concertação ef icazes,

dent ro das várias inst ituições ou níveis da administ ração do sector público, de onde

resultam polémicas frequentemente mediat izadas na imprensa escrita (ex. conflitos

suscitados pelo relacionamento inter-inst itucional ent re CMP e Porto 2001, no âmbito da

Porto 2001) O déficit de competências de diálogo e de concertação tem suscitado uma

perda de credibilidade no relacionamento ent re administ ração e administ radores;

3. O déficit de conhecimento de metodologias, principalmente das interact ivas para

providenciar aceitáveis níveis de debate da sociedade nas questões do planeamento

(fóruns, focus grupo, etc.) Reconhecendo-se insuficientes as metodologias unidireccionais

propostas pela lei (ut il ização de formulários, por escrito, sessões de esclarecimento que

frequentemente são pouco mais do que monólogos sobre temas de planeamento com um

reduzido espaço para ‘ perguntas…’

4. Existe, ainda, uma insuficiente divulgação da lei, não obstante as melhorias que se têm

vindo a observar a este nível e deverão ut il izar-se formas de divulgação mais acessíveis

para est ratos sociais mais insolventes, que não têm acesso ao j ornal, que não conseguem

perceber a informação disponibilizada pelos editais nas j untas de freguesia, etc. O

‘ empowerment ’ destes grupos é especialmente importante no desenvolvimento de

est ratégias de regeneração urbana como se apresenta no Capítulo 3 e para que esta lei não

83 recorde-se, por exemplo, só para o significado de �participação� o conjunto de interpretações que lhe podem estar associados (ver 2.1)

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sirva só os interesses dos grupos que melhor se conseguem fazer representar munidos, ou

não de advogados)

“Mas por fim, não se pode deixar de for a problematização da adesão à participação, que não se faz por decreto.

Se por um lado os profissionais do urbanismo foram tomando consciência da necessidade daquele instrumento

para a robustez da implementação das propostas, há claramente um retrocesso na mobilização das populações no

processo urbanístico, ao invés do que se passa com as propostas ambientais, mais mobilizadoras, porquanto de

resultados mais visíveis na óptica dos meios de comunicação” (Craveiro e Nunes da Silva, 2000).

De facto, para além das inovações legislat ivas anteriormente referidas e respeitantes à

elaboração ou revisão dos inst rumentos de gestão territorial, deve considerar-se o processo de

Avaliação de Impacto Ambiental (A.I.A.), def inido pelo decreto-lei n.º 69/ 2000, de 3 de Maio,

enquanto inst rumento de planeamento que promove a part icipação pública na avaliação dos

riscos ambientais. Prát ica que, de resto, se vem a aprofundar internacionalmente:

A título meramente ilustrativo, recordem-se as palavras de Kofi Annan, apresentadas no prefácio do Guia de

implementação dos princípios da Aarhus Convention84, que prossegue a orientação do Princípio 10 da Declaração do

Rio, em que se sublinha a necessidade do desafio da �democracia ambiental� e defende um novo relacionamento

entre público e autoridades governamentais:

“The active engagement of civil society, both in the formulation on policies and in their implementation, is a

prerequisite for meaningful progress towards sustainability” (Kofi A. Annan Secretário Geral das N. Unidas,

2000)

Ou, o prefácio produto final de um workshop sobre boas práticas de participação pública ao nível local85, cujas

principais conclusões foram a necessidade da incursão da participação pública na tomada de decisão ao nível

local; a necessidade de auxílio à população para o seu envolvimento em procedimentos de tomada de decisão

(capacity building) e a identificação de algumas ‘boas práticas’ e procedimentos para encorajar um debate

relativo (DETR, 2000):

“We all believe that by being more open we can make decisions that improve the quality of life for everyone (…)

Solutions that exclude the public are unlikely to be real solutions” Michael Meacher (Julho 2000) Ministro do

Ambiente do Reino Unido.

Classif icado pelo Minist ro do Ambiente e Ordenamento do Território do governo português, José

Sócrates86 como “ o paradigma dos sist emas de part icipação públ ica em processos de decisão

administ rat iva” este processo prevê a realização de estudos e consultas públicas para a recolha

84 o resultado de um processo de trabalho conjunto entre 39 países e UE sobre os direitos dos cidadãos no acesso à informação, participação e justiça sobre assuntos ambientais, ratificado a 25 de Junho de 1998, em Aarhus (Dinamarca) um dos princípios basilares desta convenção é que as soluções que excluem o público não são soluções realísticas

85 ocorrido em Newcastle-upon-Tyne, em Dezembro de 1999 e promovido pelo Conselho Económico e Social das Nações Unidas, designadamente pelo Comité de Política Ambiental e que viria a ser publicado pela delegação britânica de Ambiente (DETR) e que envolveu uma participação alargada de 121 governos, autoridades locais, ONG�s e representantes do sector privado, 86 in prefácio do Guia de apoio ao novo regime de Avaliação de Impacto Ambiental, Partidário e Pinho, 2001

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de informação, ident if icação e previsão dos efeitos ambientais de determinados proj ectos87,

decidindo sobre a viabilidade da sua execução, bem como a proposta de medidas que evitem,

minimizem ou compensem esses efeitos88.

Tendo como obj ect ivo carrear para o processo de tomada de decisão o modo como o público

potencialmente afectado por um proj ecto valoriza os respect ivos impactes ambientais e sociais

(Part idário e Pinho 2001, p.27), a part icipação pública assume no processo de avaliação de

impacto ambiental uma importância fundamental, uma vez que considera a componente do

‘ input ’ comunit ário em t rês, das seis fases do processo de Avaliação de Impacto Ambiental,

designadamente na de Definição de Âmbito, a de Apreciação Técnica e de Pós-Aval iação89.

Observe-se, no entanto, que só na fase de Avaliação Técnica é obrigatório o processo de

auscultação pública90, ao passo que na fase de Definição de Âmbito esta só ocorre se o dono do

proj ecto o solicitar e, na fase de Pós-Avaliação, se os interessados se auto-mobilizarem para

t ransmit ir informações ou reclamações, por escrito, ao IPAMB.

Concretamente sobre a fase inicial do processo de AIA, a lei consagra que o proponente do

proj ecto possa apresentar uma proposta de def inição do âmbit o de Estudo de Impacte Ambiental

à Comissão de Avaliação91, podendo, se entender, propor uma fase de auscultação pública.

Nesse sent ido, o processo de part icipação nesta fase está dependente da iniciat iva e proposta do

proponente do proj ecto, o que signif ica que nesta fase, j á por si facultat iva, também é

facultat ivo o processo de auscultação pública.

Se considerarmos que nesta fase se procede à ident if icação e selecção de questões ambientais

signif icat ivas potencialmente afectadas pelos potenciais impactes causados pelo proj ecto seria

desej ável que o processo de consulta pública não est ivesse dependente da vontade do

proponente do proj ecto, principalmente se atendermos a que, quando esta vontade não se

verif ica, é curto o prazo legal para a Comissão de Avaliação deliberar sobre a proposta de

87 projectos que, pelas suas características, tipologias e dimensões, são considerados potencialmente gravosos para o ambiente ou porque, independentemente das suas características se localizam em �áreas sensíveis�.

88 Este processo compreende a preparação de um Estudo de Impacte Ambiental da responsabilidade do proponente do projecto e a condução de um procedimento administrativo � o processo AIA (propriamente dito) da responsabilidade do Ministério do Ambiente e do Ordenamento do Território e integrando sequencialmente seis fases interrelacionadas: 1) a Selecção dos Projectos; 2) Definição do Âmbito; 3) Elaboração do EIA (Estudo de Impacto Ambiental); 4) Apreciação Técnica do EIA; 5) Decisão DIA; e 6) Pós Avaliação 89 A fase de Pós-Avaliação, que implica acções de monitorização e auditoria ambiental, destina-se a assegurar um acompanhamento do projecto, durante as fases de construção e exploração, com vista a uma verificação rigorosa dos impactes previstos e da aplicação e nível de eficácia das condições de aprovação, entre as quais se encontram as medidas de minimização de impactes ambientais mais negativos. 90 Na fase de Apreciação Técnica o processo de consulta pública é obrigatório e são estabelecidos os diferentes períodos de consulta, protagonistas da participação (consoante o tipo e dimensão dos projectos) locais, prazos e material de informação pública para consulta pública. 91 um documento, elaborado pelo proponente no âmbito do procedimento AIA, que deve incluir a descrição sumária do projecto, identificação e avaliação de possíveis impactos e medidas de gestão ambiental que os possam minimizar ou evitar

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definição de âmbito do proponente (de 30 dias). Esta questão é relevante se atendermos se

repercute numa vinculação dos termos de referência do EIA ent re a Comissão e proponente.

De resto, segundo Partidário e Pinho (2001) a prática internacional tem vindo a demonstrar que a definição do

âmbito é um dos passos cruciais do processo de AIA, para garantir a qualidade do EIA, permitir o envolvimento

antecipado das entidades e grupos do público com interesse, reduzir o potencial de conflito de interesses no

processo, facilitar a decisão e assegurar, deste modo uma maior eficácia AIA” (Partidário e Pinho, 2001, p.20)

Afigura-se, portanto, importante sublinhar alguns aspectos, associados à part icipação e ao

momento em que esta se incorpora no processo de avaliação:

/ Quanto mais cedo forem detectados os problemas levantados por um proj ecto específ ico,

melhor se poderá avaliar a viabilidade da sua execução ou as correcções a incorporar para

minimizar esses impactos;

/ Quando o público é consultado num momento em que o proj ecto está em fase f inal, pode

surgir o descrédito ou a falta de credibilidade quanto ao papel da part icipação na tomada

de decisão pública;

/ A concret ização do direito à part icipação exige uma cultura de t ransparência e abertura

das inst ituições, sendo ainda necessário a promoção mais frequente pelas inst ituições

responsáveis

“A prática política a nível do poder local, exige serviços abertos e dialogantes que, mais do que executores de um

poder central, se mostrem empenhados na realização das iniciativas dos cidadãos, compatibilizando, em perfeita

harmonia, a liberdade com um Estado de Direito” (Teixeira Fernandes, 1997, p.187)

/ Para além das reuniões inst itucionais obrigatórias que a lei prevê é importante a realização

de encont ros de carácter mais facultat ivo, com as forças vivas da zona, que promovam

metodologias interact ivas, o que permit irá uma qualif icação das decisões f inais. O próprio

sucesso do envolvimento público depende da energia colocada pelas comunidades locais na

part icipação, percebendo-se a importância de uma sustentabilidade ambiental promovida a

part ir de ‘ dent ro’ .

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152

CAPÍTULO 3 – O PROCESSO DE PARTICIPAÇÃO EM DUAS ESTRATÉGIAS DE

REGENERAÇÃO URBANA

��envolver a população significa, antes de mais, implicá-la no processo de construção da Porto 2001. De facto, este

acontecimento deve ser encarado como um projecto, i. é., algo aberto a sugestões, com suficiente margem de

flexibilidade para acolher a participação colectiva. Não queremos reproduzir velhos modelos que assentam na

distinção entre cidadãos de primeira � os fabricantes de visões do mundo � e cidadãos de segunda, meros

consumidores passivos de decisões que lhe são alheias� (Porto 2001 �Teixeira Lopes e Pedro Pombo, responsáveis

pela área de envolvimento público na Programação Cultural, In Portoscópio n.º 0, página 3, s/data)

�..O projecto Azulejaria comunitária incentivou as crianças, uma vez que foi um trabalho produzido por elas e assim

vão ter gosto naquilo que fizeram e ao mesmo tempo não vão estragar e isto vai também influenciar os pais, a família

e outros moradores�. Creio que foi mais importante este trabalho ter sido feito pelos miúdos do que por qualquer

artista famoso� Representante da população local In Fundação para o Desenvolvimento para o Vale de Campanhã

(1998a)

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3.1 - A pert inência dos estudos de caso no contexto e obj ect ivos da tese.

Opções metodológicas

Este capítulo envolve a ref lexão sobre a forma como foi integrada a component e da part icipação

em duas intervenções no município do Porto, associadas ao sub-programa Urban para o Vale de

Campanhã, nomeadamente à acção de requalif icação de um bairro social, e às componentes de

requalif icação urbana e revitalização económica para a Baixa inseridas no Programa Port o

Capit al da Cult ura 2001.

Figura 3-1: A localização dos estudos de caso

Entendida como uma componente fundamental da governância urbana, a part icipação é

encarada de uma forma abrangente não só ao nível dos seus protagonistas, integrando todo o

espect ro de t ipologias de agentes em presença no território (dos sectores público, privado, e

comunidade), como ao nível das fases em que integra o processo de Planeamento (da

programação, na definição da est ratégia, implementação, monitorização,…,) ou dos obj ect ivos

que pode desempenhar (de legit imação social e inst itucional, de comparação de alternat ivas, de

definição e selecção das prioridades do “ interesse público” , etc.)

É com base neste entendimento do próprio conceito e f inalidades de part icipação, que se

seleccionaram dois estudos de caso que testemunham, em nosso entender, duas est ratégias

dist intas de regeneração urbana, quer em termos da forma como são envolvidos os diversos

agentes, quer da arquitectura inst itucional base envolvida ou da forma como foram definidas as

áreas de intervenção para superar as situações de degradação ou carência urbana

diagnost icadas.

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Se no caso do Vale de Campanhã, inserido na parte oriental da cidade, t radicionalmente a mais

socialmente vulnerável do Porto, a percepção de situação cumulat iva de perda é evidente pelo

nível de insegurança, associado a fenómenos de toxicodependência e da condições de

habitabilidade da população que reside nos bairros sociais que aí foram sendo const ruídos desde

os anos 60, j á ao nível da Baixa Tradicional do Porto este diagnóst ico poderá ser menos

consensual.

Relaciona-se com as repercussões e desequilíbrios que o modelo de expansão urbana gerou e de

onde resultou uma perda demográf ica, da velha cent ralidade para novas cent ralidades

residenciais, que se foram est ruturando at ravés de um modelo polinucleado met ropolitano, que

deixava de procurar o cent ro do Porto como dest ino primordial das suas deslocações comerciais.

Tal tendência de perda de at ract ividade residencial da Baixa, associou-se ao declínio comercial

que não tem sido, de resto, alheia ao próprio padrão de dist ribuição met ropolitano das (novas e)

grandes superfícies comerciais de Matosinhos, Maia ou Vila Nova de Gaia que, com uma melhor

rede de acessibilidade, estacionamento e diversidade da est rutura da oferta comercial

(concebidas e geridas por gabinetes especializados em est ratégia empresarial, com uma forte

aposta nos domínios de logíst ica e market ing) têm aumentado a concorrência à Baixa e reforçado

a sua tendência de declínio92.

Assim, o obj ecto da invest igação desta tese, os processos de part icipação em est ratégias de

regeneração urbana, fez com que se considerasse benéfica a selecção de duas experiências de

planeamento, bastante diferentes quanto ao t ipo de actores envolvidos, âmbito de intervenção

ou as formas de f inanciamento, de forma a poder ref lect ir-se sobre o cont ributo do

envolvimento, social e inst itucional, na criação de novas formas de governância local ou na

superação de determinadas problemát icas locais que podem ser caracterizadas como graves se

atendermos à persistência est rutural dos problemas ou à sua complexidade, relacionada com a

concent ração no espaço geográf ico e pluridimensionalidade das t ipologias dos problemát icas

presentes (associadas às condições de habitação, qualidade de vida, economia urbana,

segurança, etc.).

Uma das hipóteses de t rabalho lançada no início da análise aos estudos de caso era que “ a

promoção de uma part icipação ef icaz favorecia o sucesso das intervenções de planeamento e, ao

cont rário, a ausência ou processos de part icipação mal conduzidos poderiam condicionar esse

sucesso” , muito embora, só por si, pudesse não determinar o seu insucesso.

Para avaliar esta suposição definiu-se metodologicamente a necessidade de invest igar,

sistemat izar e descrever o conj unto de circunstâncias que acompanharam o processo de

planeamento e de part icipação nos dois estudos de caso seleccionados.

92 Ver Rio Fernandes (1992); Barata Salgueiro (1996)

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O historial dos acontecimentos t inha em vista, a compreensão do cenário em que se desenrolou

a acção, das circunstâncias legais, e do funcionamento do sistema de planeamento, que

determinaram diferentes níveis de poder e inf luência ent re os “ actores” e durante o processo de

decisão. Da análise aos vários episódios que marcaram o processo de planeamento conclui-se a

importância da componente da part icipação no planeamento territorial. Saliente-se, desde j á e

numa fase anterior à descrição dos processos, que estes dois exemplos foram intencionalmente

seleccionados por testemunharem duas formas visivelmente diferentes de part icipação

Avaliação do processo de participação em duas estratégias de regeneração urbana

Inseridas em contextos de declínio

Baixa portuenseBaixa portuense, nomeadamente:•do declínio da população residente•degradação da oferta habitacional•perda de dinamismo comercial eserviços•perda de população visitante(estudantil, associada a serviçospúblicos, etc,)

Vale de CampanhãVale de Campanhã,nomeadamente:•aumento de fenómenos demarginalidade e toxicodependência•aumento da degradação da área(bairros sociais e envolvente)•falta de oferta de emprego

a oportunidades de financiamento:

Avalia-se, especificamente

Requalificação urbana

Bair ro Social do Cerco do Vale de CampanhãPrograma de Revitalização EconómicaPrograma de Renovação

CAPITAL EUROPEIA DA CULTURA 2001 PROGRAMA URBAN

Figura 3-2: Os estudos de caso

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No caso da requalif icação da Baixa, o processo de part icipação é predominantemente

protagonizado pelo envolvimento de diferentes níveis da administ ração pública e do sector

privado, estando o sector comunitário arredado ou desconsiderado do processo de planeamento

urbano; enquanto no processo de regeneração urbana do bairro do Cerco (inserido no Vale de

Campanhã) o processo de part icipação foi focalizado para a mobilização dos directos

beneficiários das intervenções, os moradores do bairro.

No caso da est ratégia de regeneração da Baixa a forma como foi conduzido o processo de

part icipação inter-inst itucional acabou por suscitar conflitos de interesses ent re as concepções e

proj ectos defendidos pelos sectores público e o privado para o cent ro da cidade do Porto;

enquanto que a requalif icação do Bairro do Cerco no Vale de Campanhã, desenvolvida num

bairro social caracterizado por alguma est igmat ização, carência de invest imentos (públicos e

privados), e ausência de mot ivos de at racção para uma população exterior ao bairro (devido à

sua mono-funcionalidade residencial e má imagem criada pela concent ração de casos de

toxicodependência e marginalidade) não revelou conflitualidade.

O estudo da conflitualidade associada a iniciativas de desenvolvimento urbano em centros de cidades tem sido

recorrentemente analisada na literatura do planeamento, o que revela a actualidade e a relevância da

problemática.

Por exemplo, Feindt (2001) investigou os conflitos suscitados por um projecto de desenvolvimento urbano,

concebido pela administração pública para a área central da cidade de Hamburg e que consistia na expansão de

um grande centro de exposições para essa área e que envolveu um projecto de participação para debater as

potenciais repercussões desse desenvolvimento para o ambiente urbano local (por exemplo, ao nível de volume

de trânsito, capacidade de estacionamento, etc.).

Não obstante a dificuldade associada à conciliação de uma diversidade de interesses presentes numa cidade como

Hamburg, que Feindt (2001) caracteriza como “cidade global”, no sentido de pluralista, dividida e segregada

social e funcionalmente, onde existem objectivos de diferentes níveis (por exemplo os metropolitanos ou os da

comunidade local), observou que a participação que envolveu vários sectores da sociedade, incluindo a

comunidade local residente no centro de Hamburg, favoreceu:

a clarificação de interesses e factos e a procura de soluções mais reconciliantes, respondendo a critérios de

justiça, competência, legitimação social e eficiência. Nesse sentido, Feindt (2001) afirma que mesmo face a

assuntos extremamente complexos, a participação ajuda a perceber melhor os impactos dos vários cenários de

decisões e a encontrar ‘melhores’ soluções;

o aumento da rapidez da tomada das decisões de planeamento, gerando resultados com maior relevância social

para os vários grupos participantes, a partir de uma base de entendimento comum. Em síntese a participação

pública revelou benefícios sob o ponto de vista de consumo de tempo, e relevância social dos resultados;

Para Feindt (2001) o Planeamento Urbano, enquanto actividade pública, deve confrontar-se com a segregação

funcional, económica e cultural existente no território urbano, devendo procurar equilibrar os aspectos locais e

translocais do desenvolvimento e a minimizar os impactos negativos da criação de projecto translocais. Não

obstante esta opinião, reconhece que o modo de resolução de conflitos dominante é o do sistema político da

democracia representativa e que as metodologias da “democracia cooperativa”, só são promovidos quando os

políticos pretendem ganhar algo (por exemplo apoio político ou de implementação de projectos…)

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Ao nível dos estudos de caso definidos para esta invest igação, procurou-se uma análise

detalhada e ‘ agarrada ao local’ que proporcionasse uma ref lexão sobre a inf luência da

part icipação nos processos de planeamento territorial. Obj ect ivamente, procurou-se ref lect ir

sobre:

/ Os obj ect ivos e agendas dos vários grupos de agentes territoriais part icipantes no processo,

bem a evolução da sua actuação (por ex. pontos de convergência e divergência) ao longo do

tempo;

/ O nível de debate promovido pelas inst ituições com os dest inatários das acções, de forma a

analisar o modo como a part icipação permit iu um acréscimo de democrat ização das

decisões, de coordenação horizontal e criação de capital inst itucional e intelectual

mobilizado para a acção. A este nível assume, ainda relevância:

/ o t ipo de art iculação ent re as inst ituições criadas para a gestão de programas ou eventos e

o gabinete técnico local do município, nomeadamente no af inar est ratégias de intervenção,

na horizontalidade e coordenação das polít icas sectoriais t radicionais, na execução dos

programas de act ividades, etc.;

/ As garant ias de cont inuidade e sustentabilidade das est ratégias de regeneração em curso,

nomeadamente após o f inal dos prazos… dos programas comunitários, da vigência das

inst ituições;

/ Os momentos e metodologias capitalizaram a part icipação da comunidade e dos agentes

locais (exist iu esta preocupação? Sobre que temát icas? At ravés de que metodologias e com

que resultados?)

/ Os obj ect ivos com que foram criadas as parcerias locais, e se a sua criação pressupôs a

cont ratualização de vontades, tarefas e a part i lha de responsabilidades ao longo do tempo.

O enfoque cent ral deste capítulo é, portanto, o papel e a ef icácia do processo da

part icipação na formatação e implementação das duas formas de intervenção terr itor ial

seleccionadas.

Para a prossecução dos obj ect ivos apresentados anteriormente, def iniu-se uma metodologia que

se pode resumir em quat ro momentos sequenciais:

1. Análise de documentos associados aos dois estudos de caso, designadamente publicações das

inst ituições responsáveis pelas intervenções, especif icamente Fundação para o

Desenvolviment o do Vale de Campanhã e Port o 2001, S.A., e, complementarmente, Câmara

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Municipal do Porto e dos restantes parceiros (ex. Associação dos Comerciantes do Porto). A

análise é feita em termos dos obj ect ivos est ratégicos apresentados por estes documentos

que permitem compreender as posições dos vários actores no processo (Anexo 7);

2. Análise dos diplomas legais que

/ est iveram na base da criação destas novas t ipologias organizat ivas no contexto do

planeamento local93, no sent ido de clarif icar a história e obj ect ivos da sua formação

(nomeadamente em termos dos mot ivos que presidiram à sua criação, o t ipo de

t ransferência de poderes e competências do gabinete técnico da CMP para estas

inst ituições, o t ipo de vinculação a planos previamente aprovados ou compromissos no

âmbito do planeamento previamente assumidos, a sua forma de organização interna e de

relacionamento com out ras inst ituições e população

/ a legislação que regulamenta os programas que permit iram o f inanciamento destas

intervenções;

3. A recolha, análise e confronto de informação publicada pelos orgãos de comunicação social

escrito, o que, permit iu uma actualização constante da forma como evoluía o processo,

nomeadamente posições públicas assumidas pelos vários agentes, as posições que exist iam

face às decisões, etc. Para além disto permit iu perceber como a própria agenda dos órgãos

de comunicação ia sendo inf luenciada pelas movimentações dos vários actores,

nomeadamente at ravés do envio de comunicados, da criação de conferências de imprensa,

na criação de cont rovérsias,

4. Atendendo a que não foi possível part icipar directamente, como espectadora, em todo o

processo optou-se pela técnica da “ ent revista em profundidade” aos principais actores que

est iveram envolvidos no processo de planeamento e que, após a realização do convite, se

disponibilizaram para tal (Anexo 8).

Refira-se que as entrevista revelaram-se como a técnica ideal para compreender o conflito de interesses e as

tensões relativamente à forma ou ao conteúdo das decisões tomadas. Os entrevistados apresentavam a sua

interpretação pessoal dos processos o que permitiu, mediante a confrontação de vários discursos, identificar os

factores críticos à construção de consensos ou os motivos que justificaram as tensões e as dificuldade na

implementação dos projectos concebidos. O acesso à riqueza das formas e conteúdos de discursos que eram

livremente produzidos pelos entrevistados a partir de perguntas abertas como “como avalia o processo de

participação..” foi extremamente importante, principalmente se considerarmos que esta informação muitas vezes

não existe descrita nem publicada.

As entrevistas foram desenvolvidas a partir de guiões base estruturados, a que se seguiu a sua redacção e análise

como um documento interno de trabalho, que visou genericamente explorar:

93 A Porto 2001 é uma empresa privada de capitais exclusivamente públicos e a Fundação para o Desenvolvimento de Vale de Campanhã é uma fundação de direito privado sem fins lucrativos),

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- a forma como os projectos de intervenção foram desenvolvidos;

- as atitudes dos decisores e restantes actores envolvidos face ao diálogo e construção de consensos;

- a influência das abordagens de participação na qualificação das decisões finais de planeamento e na

eficiência da sua implementação;

Há um aspecto que considero que não devo deixar de expressar e se relaciona com as

dif iculdades sent idas no acesso à informação no caso da Porto 2001, S.A.. Se no caso da

Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã toda a equipe most rou total

disponibilidade, desde a sua Directora até à restante equipe técnica, j á no relacionamento com

a empresa (sublinhe-se const ituída exclusivamente por capitais públicos) a dif iculdade em

aceder à informação só foi sendo superada por muita obst inação (Anexo 9)

A Porto 2001, SA, durante muito tempo dificultou o acesso à informação (oral ou escrita) revelando uma

desvalorização dos responsáveis por esta empresa pela investigações que estava em curso (esta desvalorização

eventualmente poderá ser entendida à luz das críticas que a Direcção da ACP lançava à Porto 2001 pelo alegado

déficit de diálogo desta empresa que, na altura, era bastante mediatizado pelos meios de comunicação social

escritos). Por outro lado, pode colocar algumas questões: quais os deveres de empresas privada e sociedades

anónimas constituídas exclusivamente por capitais públicos no que respeita à disponibilização de informação?

Estas empresas “privadas” estão desobrigadas a colocarem à disposição da população informação que pode ser

fundamental, não só para trabalhos de investigação, como para processos de participação pública mais eficazes?

Com base nos obj ect ivos def inidos para a avaliação dos estudos de caso, é apresentada a

sistemat ização do processo de planeamento para cada um dos casos, seguido por uma ref lexão

sobre o processo de planeamento sob a ópt ica da part icipação de actores.

Refira-se, no entanto, que a forma como se apresentam os dois estudos de caso e se procede à

avaliação da componente da part icipação, está fortemente condicionada pelo momento em que

eles se desenvolvem.

Relat ivamente à Baixa portuense, a execução dos proj ectos de renovação urbana cont inua em

curso, muito embora com inúmeras alterações face aos proj ectos iniciais e fora da

calendarização prevista, devido a circunstâncias múlt iplas que serão analisadas seguidamente.

No caso do programa de revitalização económica, na altura em que se redige este capítulo

(Agosto de 2001) a candidatura do Estudo Global ao URBCOM ainda não t inha sido subscrita pela

ACP o que impossibilitava a candidatura do proj ecto de urbanismo comercial da ‘ Baixa

portuense’ a fundos comunitários, mantendo-se um longo período de impasse que dura desde

Julho de 2000.

No caso da requalif icação do Bairro de Cerco, o proj ecto de arquitectura j á t inha sido executado

e o Sub-Programa Urban f inalizado e avaliado pela ent idade gestora, a Fundação para o

Desenvolvimento para o Vale de Campanhã. Por out ras palavras, a análise realizada é feita num

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momento posterior ao envolvimento público e própria requalif icação urbana do bairro. Nesse

sent ido, a avaliação baseou-se na informação documental disponível e relato dos ent revistados

de onde se procurou avaliar os principais pontos fortes e fracos do processo.

De seguida faz-se a descrição dos estudos de caso. Para tal apresenta-se, individualmente, as

característ icas gerais de cada uma das est ratégias de regeneração urbana, das inst ituições que

os conceberam e geriram e o papel que a part icipação desempenhou em cada um dos casos.

Apresenta-se a arquitectura inst itucional criada para o desenvolvimento dos proj ectos, bem

como os seus obj ect ivos de intervenção, as metodologias ut il izadas, os protagonistas da decisão,

as característ icas locais a que estes se dest inaram94.

A descrição que se apresenta centra-se, portanto, nas metodologias do processo de planeamento e não nas

características dos territórios intervencionados, muito embora se reconheça a imprescindibilidade de um

conhecimento detalhado do local para a identificação das dinâmicas, positivas e negativas, em curso, das

necessidades e aspirações dos vários grupos presentes no território, bem como das suas características pessoais e

culturais para se implementarem metodologias de planeamento colaborativo. Mas como ao nível deste trabalho

de investigação não se tratava de propor a programação de processos de planeamento colaborativo para estes

territórios, as limitações (relacionadas com o tempo e dimensão de uma tese de mestrado) exigiram que se

valorizasse a descrição do processo em detrimento do local.

Daí a valorização que se at ribui à descrição dos momentos de mediação que exist iram durante o

processo de decisão, nomeadamente em termos dos seus obj ect ivos, da variedade de métodos e

de actores envolvidos, da fase em que ocorreu, ou do seu sucesso em termos da criação de

maiores níveis de confiança ent re os part icipantes, sat isfação face aos resultados, prevenção ou

resolução de conflitos, etc.

Refira-se que, para além deste t ipo de análise mais qualitat iva procurou-se desenvolver out ra

mais quant itat iva, cent rada em informação estat íst ica (como a duração e frequência das

reuniões, o número total de reuniões e local onde se realizarem, o t ipo de documentos que

permit iram formalizar acordos, número de part icipantes, etc.) o que não foi possível por esta

informação não estar sistemat izada.

Sublinhe-se, f inalmente que a at itude presente ao longo de toda esta invest igação foi o mais

const rut iva possível, ciente das dif iculdades prát icas indissociáveis da concepção, concertação

ou implementação de qualquer processo de planeamento e metodologias de part icipação,

considerando, no entanto, relevante lançar um debate que é aqui iniciado.

94 Refira-se que a descrição (social, cultural, económico, etc.) das áreas de intervenção destes projectos só foi feita quando se considerou estritamente necessário para a compreensão do processo de planeamento, uma vez que estas beneficiaram de uma correcta e exaustiva descrição nos diversos trabalhos técnicos publicados pelas instituições (ver Bibliografia)

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3.2 - Porto 2001 . a part icipação inst itucional ent re diferentes níveis da

administ ração pública e num partenariado público/pr ivado

Neste ponto apresenta-se a caracter ização da Porto 2001, S.A., em termos do seu modelo

organizat ivo e de int ervenção nas vertentes da Requalif icação Urbana e Revitalização Económica

para a Baixa do Porto.

Entendendo-se que a análise ao modelo organizat ivo da Porto 2001, deve ser feita dent ro da

est rutura de governância local em que este se insere e as interacções (tornadas públicas) que se

estabeleceram ent re os vários actores e inst ituições ao longo do tempo, devem ser apresentadas

por terem condicionaram a concepção e ef icácia da implementação da operação Porto 2001.

Assim, uma pequena parte da história da Porto 2001, especif icamente a que se refere à

est ratégia de requalif icação urbana da Baixa, é apresentada de forma evolut iva, faseada em

vários momentos desde a sua génese até à actualidade (Setembro de 2001)

Para tal desenvolveu-se uma metodologia baseada na análise de todos os estudos e documentos

técnicos realizados ou encomendados pela Porto 2001, por forma a compreender de um modo

dinâmico como foi sendo const ruído o processo de decisão relat ivo à est ratégia de regeneração

da Baixa e qual foi o cont ributo dos vários actores neste processo. A apresentação de uma forma

sistemat izada de todo o manancial informat ivo consultado, visa, em últ ima instância, uma

apresentação obj ect iva e rigorosa das várias visões est ratégicas que foram sendo const ruídas

para apoiar tecnicamente o processo de tomada de decisão.

As ent revistas, às personalidades que foram acompanhando, directa ou indirectamente a

operação Porto 2001, permit iram apreender as est ratégias e o protagonismo dos agentes, bem

como os diversos factores que moldaram a sua forma de intervenção.

Em suma, neste ponto, sistemat iza-se a documentação produzida pela (ou para a) Sociedade

Porto 2001 S.A. no que toca à est ratégia de regeneração para a Baixa e ident if icam-se os

principais momentos e mot ivos de polémica e tensão (inst itucional ou social), paradigmát icas da

óbvia conflitualidade de interesses existente num território cent ral (do ponto de vista da

localização, da concent ração comercial e de serviços, públicos e privados) como o da Baixa

Tradicional do Porto.

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3.2.1 - Antecedentes e def inição do modelo inst itucional e programa de act ividades da Por t o

Capi t al Europeia da Cult ura

“A apresentação da candidatura do Porto a Capital da Cultura da Europa95 no ano 2001 é, antes de mais, a

consequência lógica de um trabalho de reabilitação urbana e investimentos em infraestruturas viárias, culturais e

universitárias desencadeadas após a revolução de 1974 e, especialmente, na última década (…) Para ganhar este

desafio, a cidade estará dotada, no final deste século, das infraestruturas necessárias. Mas o esforço de

investimento tem sido igualmente aplicado nas áreas imateriais, mas imprescindíveis, de fomento da criação e

fruição culturais, abertas ao confronto de ideias e formas de expressão que chegam de todo o mundo

Câmara Municipal do Porto (2001, disponível em: http://www.cm-porto.pt/2001/introd.html)

Depois de Lisboa ter j á sido Capital Europeia da Cultura em 1994 e de realizar, alguns anos mais

tarde, o evento Expo-98, o município do Porto apresentou, em 1997, a sua candidatura para a

realização da Capital Europeia da Cultura em 2001.

No relatório de candidatura do Porto aos Minist ros da Cultura dos Quinze alega-se a posição

duplamente periférica do Porto, no território nacional e espaço europeu, e a vontade polít ica de

relançar internacionalmente esta cidade média europeia sem se anularem as suas

especif icidades locais. A candidatura é apresentada como o corolário dum t rabalho de

reabilitação urbana, especialmente do Cent ro Histórico, Zona Oriental da cidade e Frente

Ribeirinha e de forte invest imento na recuperação e const rução de equipamentos culturais

(Relatório de Candidatura da CMP, 1997). Os principais mot ivos que a fundamentam são

pat rimoniais – a Classif icação de Pat rimónio Cultural da Humanidade do Cent ro Histórico do

Porto, pela UNESCO, a riqueza e autent icidade do edif icado, …etc. -, cul t urais, relacionado com

a dinâmica do Calendário Anual de Acontecimentos da cidade e sociais, relacionados com o

crescente interesse dos cidadãos pelas let ras e artes.

A decisão da escolha das cidades Porto e Roterdão para a realização do evento “ Capit al Europeia

da Cult ura 2001” é publicamente comunicada a 28 de Maio de 1998.

Nesse momento, o então Presidente da Câmara Municipal do Porto e o Minist ro da Cultura

(respect ivamente, Fernando Gomes e Manuel Maria Carrilho) convidam Artur Santos Silva, uma

f igura de prest ígio da cidade ligada à presidência de um banco, para liderar o proj ecto.

Santos Silva irá iniciar funções como Presidente da Comissão Instaladora a 3 de Julho de 1998, à

frente de uma equipe const ituída por vereadores da Cultura e Urbanismo do Execut ivo Municipal

(respect ivamente, Manuela Melo e Nuno Cardoso), o que, só por si evidencia a forte art iculação

que se desej ava criar ent re o execut ivo e a empresa que ia gerir o evento e os vectores em que a

95

que foi instituída, em Maio 1992, pelo Conselho de Ministros da Cultura das Comunidades Europeias, com o objectivo de nomear, em cada ano, a(s) cidade(s) a quem caberia o prestígio de organizar uma manifestação cultural que fosse expressão da riqueza e diversidades culturais europeias e um meio para melhorar as relações culturais entre esses países e para promover a cidade e país promotor.

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execut ivo municipal desej ava ‘ amarrar’ o evento - o da promoção cultural e da requalif icação

urbana do Porto.

Com as at ribuições de def inir o modelo legal e inst itucional da empresa que iria ser const ituída

para gerir o evento, bem como as bases programát icas em que este iria assentar e a respect iva

previsão orçamental, a Comissão Instaladora comprometeu-se perante o Estado e Município do

Porto, a apresentar o seu Relatório a 28 de Setembro de 1998 (cerca de dois meses após a

eleição de Santos Silva) que iria inf luenciar de forma determinante as várias decisões

subsequentes.

Este Relatório vem reafirmar as principais orientações da candidatura do Porto ao evento,

nomeadamente a intenção de cruzar o local ismo e a int ernacional ização em termos da

organização do leque de manifestações culturais e requalif icação cultural do Porto, que deveria

combinar a chamada “ produção efémera” , relacionada em especial com as artes de palco e com

a “ polít ica de revitalização e requalif icação do pat rimónio edif icado” ao nível dos equipamentos

e espaço público.

a este nível e relativamente à área da Baixa apresentava-se a intenção de intervir, com diferentes níveis de

profundidade e objectivos no Auditório Nacional Carlos Alberto, Cadeia da Relação/Centro Português de

Fotografia, no Ballet Teatro (emergente Teatro do Bolhão), Coliseu, Teatro Nacional de São João ou na

construção de uma Galeria Municipal e Biblioteca (Almeida Garrett, integrada na Rede Nacional de Leitura

Pública) no Palácio de Cristal. Para além destes, deve destacar-se o projecto de construção da Casa da Música (na

antiga Remise dos STCP, na Boavista), um edifício dedicado exclusivamente a diferentes tipos de música, bem

como a espaços de ensaio de orquestras idealizado por Rom Koolhaas. Este edifício, em forma de poliedro,

integra, por exemplo, dois auditórios para 1300 e 300 lugares, salas de ensaio, restaurante, bares entre outros

serviços, que contam com um parque estacionamento subterrâneo para 600 automóveis, etc. absorveu 8,5 milhões

de contos, dos 13, 2 milhões que foram disponibilizados para a Renovação e construção de equipamentos

culturais

Os grandes obj ect ivos de fundo dest a est rat égia global são a revitalização e renovação

económica do Porto histórico, de forma a “ at rair mais habitação para j ovens para o cent ro” ou

“ est imular a dimensão económica” , at ravés do “ relançamento do turismo cultural e de

negócios” , que permit iria criar emprego qualif icado na área cultural e de lazer (Adaptado,

Comissão Instaladora, 1998)

Para tal propunham-se met odologias de t rabalho que cont ivessem parte da forte carga

t ransformadora96 que se pretendia incut ir ao proj ecto:

96

o evento Porto 2001 é uma “oportunidade que permite concentrar esforços, simplificar processos, acelerar e concretizar intervenções, colocando em evidência a imagem global da cidade”.

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Ao nível da programação cultural o empenho era a mobilização dos agentes culturais com vista à

apresentação de propostas para a realização de proj ect os pi lot o que foram seleccionados e

alguns f inanciados pela Porto 2001.

Na prática, para a selecção dos projectos, o departamento de Programação Cultural da Porto 2001 definiu uma

grelha de apresentação de projectos à Porto 2001, que definia os objectivos principais que deveriam ser

valorizados pelos projectos (por exemplo os programas de cariz estruturante e duradouro, sem por em causa a

componente lúdica e festiva dos eventos; a aposta no alargamento, fidelização e formação de públicos,

nomeadamente através do contacto imaginativo com as escolas e movimento associativo, etc.) e as condições

mínimas para a apresentação dos projectos. A saber, a caracterização da entidade promotora, memória descritiva

do projecto, local e data de realização, previsão orçamental detalhada, clarificação do tipo de apoio a prestar pela

Porto 2001. A Porto 2001 apresentava, ainda, alguns dos factores que valorizava na selecção dos projectos, por

exemplo, possíveis efeitos multiplicadores do projecto, a sua possível continuidade para além de 2001, etc.,

definindo-se como data limite de entrega das propostas o Agosto de 1999. Outro aspecto realçado pela Comissão

Instaladora era a relação que se pretendia estabelecer entre a requalificação urbana a programação cultural,

afirmando-se no Capítulo 3, no ponto 2.3 deste Relatório, que se deveria “privilegiar eventos e actividades que

potenciem a requalificação urbana também integrada na Porto 2001, com destaque para a revitalização da

Baixa a criação de ‘circuitos culturais’ ancorados nos equipamentos e património existente, o centro histórico,

as franjas ribeirinha e marítima e espaços informais (fábricas, armazéns, jardins, pátios de bairro, etc.)

Na requalif icação urbana a aposta apresentada cent rava-se numa est ratégia de intervenção

qualif icante ao nível dos equipamentos culturais e espaço público. Propunha-se, para tal, a

intervenção de arquitectos consagrados que est imulassem, não só, o papel social que o espaço

público poderia desempenhar na cidade, como os efeitos de at ract ividade que este poderia

induzir nas funções residencial e económica na cidade

“…requalificar o meio urbano é uma tarefa cada vez mais importante para permitir abrir a cidade a novas

iniciativas, a novos projectos, ultrapassando ou evitando situações de estagnação ou mesmo de declínio da

cidade” (…) O espaço urbano assume um papel crucial na vida social e na decisão de novas localizações, quer

para famílias, quer para as empresas ( Adaptado Comissão Instaladora, 1998, p.4.1-1)

Nesse sent ido, a Comissão Instaladora da Porto 2001, com a colaboração de um grupo de

arquitectos e equipe da Câmara Municipal do Porto (Anexo 10), organizou o programa de

intervenções urbanas est ruturado em quat ro eixos est ratégicos, que, por sua vez, se

desmult iplicavam num conj unto acções sobre o espaço público com vista a desenvolver um

conceito de “ Sist ema” , cuj o orçamento total correspondia a 50 milhões de contos (Comissão

Instaladora, 1998)

“Este sistema (de Espaço Público) será pontuado por acções de grande qualidade arquitectónica, com a marca,

nomeadamente, da Escola do Porto, em articulação com outras expressões artísticas adaptadas ao espaço público.

Serão intervenções, altamente qualificantes e coerentes, de forma a criar uma imagem de marca.” (Comissão

Instaladora, 1998, p.4.1-2).

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Os eixos estratégicos propostos eram: O Porto Histórico e Monumental (orientado para a intervenção na cidade-

centro); O Percurso da Água (que visava explorar a relação da Cidade com o Douro e Atlântico); O Porto

Moderno e Contemporâneo (situado ao nível da intervenção da Boavista); e

as Intervenções de Articulação e Coesão Urbana, com o objectivo de dar coerência ao conjunto de intervenções

anteriores e estender a todo o tecido urbano da cidade a marca do Porto 2001 (uma das acções que se previa era,

por exemplo, o arranjo dos espaços envolventes das estações do Metro)

Dentro de cada um destes eixos eram, por sua vez, identificadas as várias zonas âncora a intervir, cuja descrição

era realizada com um considerável nível de pormenor em termos da área, tipo de acções a realizar ou os motivos

que fundamentavam cada opção. Por exemplo, para o primeiro eixo, designado por Porto Histórico e

Monumental, que corresponde à Baixa do Porto a intervenção era estruturada em quatro grandes intervenções no

espaço público:

1. A Cordoaria/Leões/Praça Carlos Alberto e Praça de Lisboa;

2. da Praça da Batalha à Ribeira;

3. Praça D. João I (e envolvente);

4. Avenida da Ponte/Praça Almeida Garret e Praça da Liberdade;

A concepção da intervenção para estas áreas incluía, por sua vez, um largo espect ro de

f inalidades como se percebe da leitura das intenções da Comissão Instaladora para a Baixa:

“ …melhorar a imagem urbana, revit al izando a função residencial , requal if icação do parque

edif icado, criando um sist ema de espaços públ icos, melhorando a mobil idade urbana,

aument ando a qual idade ambient al , modernizando e fort alecendo a base económica (comércio e

serviços)” (Comissão Instaladora, 1998, p.4.1-3).

A Comissão Instaladora apresenta, portanto, uma abordagem mult isectorial para o proj ecto de

requalif icação da baixa portuense. Tratava-se do desf io de uma intervenção de largo espect ro

que integrasse a requalif icação da habitação, a revitalização económica e as questões da

funcionalidade bem como a estét ica do espaço público.

Tal concepção, muito embora evidenciasse uma adequação aos domínios-problema que se

diagnost icam para a Baixa97, revelava uma excessiva ambição do ponto de vista da extensão das

zonas âncora abrangidas por cada eixo e da própria abrangência dos obj ect ivos que se def iniam

para a intervenção se atendermos às limitações no f inanciamento e nos t imings disponíveis para

a sua concret ização.

Era, portanto um programa de intervenção maximalista, o que se poderá j ust if icar pela procura

dos seus responsáveis apresentarem um relatório ambicioso com vista a disponibilização de um

orçamento alargado da parte do governo cent ral para o Porto. Refira-se, contudo, que da leitura

deste relatório f ica a ideia que se pretendia, em poucos anos, resolver os principais problemas

97 Relacionados com o elevado número de devolutos, perda demográfica e de degradação do património edificado e arquitectónico, falta de fluídez no trânsito e declínio da actividade económica comercial

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est ruturais da Baixa (mobilidade, espaço público, habitação, comércio e serviços) o que revela

alguma falta de planeamento est ratégico ou, até, falta de adequação em termos do âmbito e

horizonte de acção que deveria caracterizar o evento Capital Europeia da Cultura98. Esta

est ratégia de “ falta de est ratégia” pode ser entendida como uma opção de “ não decidir j á” ,

deixando em aberto vários rumos possíveis ou ilust ra a própria indefinição99 que ainda se

mant inha sobre o tempo de act ividade da própria empresa. a Comissão Instaladora esperava que

esta t ivesse um período de funcionamento mais alargado, para lá do f im da Capital Europeia da

Cultura de forma a melhor poder focalizar o IIIºQCA para os obj ect ivo que iam sendo definidos.

Tal viria a ser liminarmente posto de parte pelo primeiro minist ro que considerava que tal

poderia gerar uma sobreposição de competências ao nível local (CMP e Porto 2001, SA)

O que f ica claramente assumido é a intenção da Comissão Instaladora de requalif icar

urbanist icamente a cidade at ravés de uma forte intervenção física, realizada por Proj ectos

Urbanos da autoria de “ arquitectos de marca” com vista a melhorar a estét ica da cidade e

suscitar, ainda que indirectamente, uma dinâmica posit iva nas out ras funções urbanas,

nomeadamente na residencial, económica e turíst ica. Tratava-se, portanto, de fazer uma forte

aposta no market ing territorial do Porto, mediante a imagem da Escola de Arquit ect ura do Port o

ao nível do espaço público.

Dois últ imos aspectos, ainda sobre o Relatório da Comissão Instaladora, que se cent ram nas

questões da governância urbana.

O primeiro relaciona-se com alguns dos princípios de acção que são defendidos para a

operacionalização do proj ecto, de onde se podem destacar t rês grandes intenções inter-

relacionáveis: a de “ fomentar o partenariado com inst ituições locais e o envolvimento da

população da cidade” , a de “ capitalizar o evento a favor da cidade, sua população e sua

cultura” e a “ de estabelecer um bom nível de art iculação e de sat isfação com os portuenses”

“Ser capital Europeia da Cultura em 2001 servirá, além de tudo, para restabelecer uma relação saudável e de

certo modo orgulhosa dos portuenses com a sua cidade…” , ou “Os equipamentos, a reabilitação urbana, o

esforço de criação de um melhor ambiente são investimentos subaproveitados se a cidade não for apropriada

98 Quase dois anos depois deste relatório, Teresa Lago já como presidente da Sociedade assume por primeira vez em conferência de imprensa cuja agenda era a avaliação do Programa de Actividades e de Requalificação Urbana (empreitadas concluídas, ..), que o programa inicial de intervenção na cidade era �irrealista�, justificando assim o facto de muitas expectativas criadas terem sido defraudadas. Afirmou que muitos projectos eram incompatíveis com o financiamento que existia e com o tempo que tínhamos para fazer as obras, acrescentando que na fase de arranque da Porto 2001 não havia percepção do custo real das obras, pelo que só quando os contratos começaram a ser negociados se foi apercebendo que era preciso ir cortando nas intervenções. in Púlico, 7 Julho 2001 99 Por exemplo, o Eixo 4 do programa de requalificação urbana integrava um número diversificado de operações de intervenção que iam desde intervenções nas estações do Metro, aos Caminhos do Romântico ao à ideia de Requalificação de Bairros Sociais, defendendo-se um reordenamento físico e reabilitação dos espaços exteriores dos bairros que contribuiriam para a sua integração na cidade. O debate com o grupo de arquitectos, a que já fizemos referência, também defendia a �requalificação e desghetização dos bairros camarários e/ou sociais da cidade não só pela requalificação e integração do seu espaço público no espaço urbano da cidade, bem como pela dotação de equipamentos adequados e estritamente necessários, recuperação dos espaços de habitar e os próprios edifícios de habitar� (Comissão Instaladora, 1998: An.2-8)

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antes de mais para quem nela habita e trabalha” (Comissão Instaladora, Set. 1998: 6 e 7). Esta preocupação em

intervir de forma adequada às necessidades e aspirações da população, que tinha em vista, em última instância,

melhorar a sua qualidade de vida, levou a que a Comissão de Instalação propusesse a criação de uma “Comissão

de Acompanhamento de Avaliação da Porto 2001” que, “deveria ser um polo de reflexão independente e

distanciado sobre os trabalhos de concepção, planeamento e execução”. A sua função deveria ser a de um

“interlocutor construtivo que elaboraria relatórios de acompanhamento e pareceres com a tarefa da: análise

sistemática de posições públicas ou manifestações informais de opinião dos cidadãos sobre a 2001,

nomeadamente os que se exprimem na comunicação social; avaliação dos custos/benefícios dos resultados

alcançados tanto na criação de melhores infra-estruturas culturais, como na reabilitação do património e

urbanística ou mecenato; criação de um Observatório sobre transformações económicas, sociais e culturais

operadas em função do projecto, entre outras. Não obstante todo este discurso, a Comissão prevista nunca foi

implementada, tendo sido a sua criação totalmente ignorada, o que impediu a implementação de todas as mais

valias que se apresentavam ao nível de um acompanhamento mais qualitativo, com vista a resultados intangíveis,

da articulação e concertação institucional e com a comunidade local.

As questões mais auto-reflexivas, não ligadas directamente “ao fazer obra”, foram constantemente

subalternizadas para segundo plano durante o processo de implementação prática das ideias que tinham sido

formuladas teoricamente, o que dificultou um acompanhamento mais flexível e eficaz do processo associado a

uma avaliação on-going que viabilizasse o diagnóstico das várias circunstâncias que não podiam ser antecipáveis

na fase de formulação estratégica e desenvolvimento das necessárias medidas correctivas

O segundo aspecto, relaciona-se com a ident if icação das dif iculdades que “ pesavam

negat ivamente sobre a def inição do proj ecto” que eram, segundo a Comissão Instaladora:

- pouco tempo que os separava de 2001;

- A necessidade de art icular alguma programação com a cidade de Roterdão e,

- Sobretudo, a excessiva expectat iva que a aceitação da candidatura do Porto desencadeou

nos meios culturais, sociais e polít icos, não só na cidade, mas em toda a AMP e Região Norte.

Ent re as expectat ivas criadas pelo evento, nomeadamente em relação a criar uma nova dinâmica

de requalif icação urbana no Porto, e a necessidade de lutar cont ra o tempo, tornava-se

fundamental def inir a questão do modelo legal da empresa que seria const ituída para gerir o

evento.

A Comissão Instaladora propôs um modelo semelhante ao da Expo 98, baseado numa ent idade de

est rutura empresarial formada exclusivamente por capitais públicos e cuj os principais

accionistas seriam o Estado e Município do Porto. É com base neste modelo que é const ituída a

empresa Sociedade Porto 2001, S. A.100, abreviadamente designada por Por to 2001, através do

100 É constituída por três órgãos sociais: a Assembleia Geral, constituída pelos accionistas a quem compete, entre outras tarefas, a aprovação do Plano Anual de Actividades ou eleição dos titulares dos órgãos sociais, �; o Conselho de Administração, composto por um número ímpar de membros, no mínimo 13 e no máximo 19, reúne, pelo menos, mensalmente e a quem cabe, entre outras coisa, aprovar o programa do evento, definir as áreas de intervenção e as acções de

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decreto-lei n.º 418-B/ 98, de 31 de Dezembro de 1998, que define como obj ecto social da Porto

2001 “ a concepção, planeamento, promoção, execução e exploração de todas as acções que

viessem a integrar o evento Port o Capit al Europeia da Cult ura 2001 ou as que com ele se

relacionam no âmbito da Requalif icação urbana,” . Para tal dispõe de um orçamento global de

42,5 milhões de contos101, para cobrir a programação cultural e as obras de renovação urbana,

incluindo o restauro e const rução de equipamentos e um prazo de vigência até 30 de Junho de

2002.

Determinando-se que, a partir desta data “todos os investimentos, bem como os respectivos suportes documentais

e registos, que a Porto 2001, S. A. realize ao abrigo das competências, direitos e obrigações conferidos à

sociedade pelo município do Porto (…) serão à data da extinção da sociedade, transferidos para a Câmara

Municipal do Porto” (artigo 7.º-A do decreto-lei 38/2001, de 8 de Fevereiro de 2001)

Durante este período de vigência (no fundo, de Janeiro de 1999 a 30 de Junho 2002), a Porto

2001, S.A. detém, para além das competências da concepção (de definir o que fazer, onde,

como, com quem, para quê), planeamento e execução de obras (de coordenação de recursos

económicos e humanos, de lançar e gerir empreitadas,..) nas zonas urbanas do programa de

requalif icação102 “ . . as compet ências, direit os e obrigações, quer do município do Port o, quer

de organismos públ icos da administ ração cent ral do Est ado, no âmbit o do QCA III, em programas

que se adequem à execução do seu obj ect o est at ut ário, mediant e cont rat o-programa, j á

celebrado ou a celebrar ent re o município do Port o, organismos públ icos da administ ração

cent ral do Est ado e a Port o 2001, S. A.” (art igo 3 pelo decreto-lei 38/ 2001, de 8 de Fevereiro de

2001).

No fundo, a Porto 2001 passava a deter as competências, mas também as obrigações, da gestão

de programas comunitários que concorressem para os obj ect ivos da renovação e revitalização

urbana nas zonas que t inham sido previamente definidas e aprovadas pelos accionistas. Era uma

via para assegurar o f inanciamento dos proj ectos, que seria ut il izada, por exemplo, na

renovação da frente marít ima do Porto, designadamente no proj ecto de renovação urbana do

Arq. Solà-Morales para a Avenida Montevideu, que viria a ser f inanciado pelo programa POLIS103

que, no Porto, é gerido pela Sociedade Porto 2001.

requalificação urbana, elaborar o Plano de Actividades, aprovar o seu orçamento e acompanhar a sua execução, eleger comissão executiva composta por três a cinco administradores,�; e o Conselho Consultivo, constituído por um máximo de 18 membros eleitos pela assembleia geral, pelo prestígio que granjearam nas diversas áreas da actividade da sociedade, designadamente arquitectura, urbanismo, história, etc., cabendo-lhe dar pareceres sempre que fosse solicitado,�) Adaptado e muito resumido do decreto-lei 418-B/98.

101 Muito embora o orçamento solicitado ao Governo, pela Porto 2001, S.A e C.M.P., fosse de 60 milhões de contos

102 definidas pela sociedade Porto 2001 e aprovadas pela CMP e Estado, através dos Ministros das Finanças, Equipamento Social, Planeamento, Economia e Cultura, de acordo com as suas competências próprias

103 Programa de Requalificação Urbana e Valorização Ambiental das Cidades do Ministério do Ambiente e Ordenamento do Território

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Outro exemplo da forma como a Porto 2001 (leia-se Estado e CMP) procurou f inanciar os seus

proj ectos por via da candidatura a programas comunitários, foi o da const ituição de um

partenariado com o sector privado (ACP e UNIHSNOR) que visava a candidatura a um Programa

de Revitalização do Comércio Tradicional com vista a apoiar o invest imento privado dos

comerciantes nos seus estabelecimentos e na concret ização do programa de requalif icação do

espaço público. Inicialmente esperava-se que o programa f inanciador fosse o PROCOM, mas o

at raso no andamento do processo de candidatura e a ent rada do IIIºQCA, acabaria por definir que

fosse o URBCOM, programa de revitalização do comércio t radicional que mantém, de resto, as

principais característ icas do anterior programa (Anexo 12). Todo este processo, aparentemente

simples, iria t ransformar-se num doloroso e prolongado conj unto de conflitos ent re as partes,

que foi estudado em profundidade e é apresentado no ponto 3.2.3, por se considerar que é

paradigmát ico do que pode acontecer quando um partenariado é criado com o obj ect ivo

imediato de assegurar recursos económicos e não se alicerça em bases sólidas de confiança

mútua e part ilha de responsabilidades (decisão, na cont ratualização de tarefas) ent re os

part ners.

Out ra questão que se liga às questões da governância local, não relacionada com a criação ou

funcionamento de partenariados, mas com a coordenação ent re inst ituições, públicas e semi-

públicos, democrat icamente eleitas ou não, era como seria o relacionamento e art iculação

inst itucional ent re a Porto 2001 e os seus accionistas… Da interpretação do diploma legal que

definiu as relações da empresa com a est rutura de governância onde esta se insere, nada fazia

antecipar mot ivos para a existência de conflitos, uma vez que:

1. Os elementos que const ituem a equipe técnica da Porto 2001, não foram eleitos, mas

convidados pessoalmente pelo execut ivo por deterem a sua confiança polít ica e técnica;

2. Programa de Act ividades e todas as deliberações da Assembleia Geral da Porto 2001, S. A.

careciam da aprovação dos seus accionistas, Câmara Municipal do Porto e Estado (art igo 5,

do Decreto Lei 418-B/ 98, de 31 de Dezembro de 1998);

3. Os proj ectos urbanos da Porto 201, muito embora não est ivessem suj eitos ao licenciamento

municipal de obras t inham que se submeter ao parecer da Câmara Municipal104 que se devia

pronunciar no prazo máximo de 30 dias (art igo7, n. 4, do decreto-lei 418-B/ 98),

4. enquadramento legal que regulamentava, do ponto de vista do processo de planeamento, a

actuação da Porto 2001, visava genericamente uma total coordenação ent re esta e os seus

accionistas e, a part ir daí, proporcionar-lhe uma enorme margem de manobra para ignorar:

o sistema de planeamento burocrát ico (em termos do respeito pela cascata de planos

104 o que era feito ao nível do executivo, sem passar pelo Assembleia Municipal ou pelos vários departamentos técnicos dos serviços de planeamento municipal.

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existente ou da t ramitação legal para a aprovação de proj ectos, uma vez que as decisões

eram tomadas ao nível do execut ivo camarário e não nos serviços..,) e as opiniões dos

dest inatários das suas acções (em termos da legit imação social das decisões que eram

tomadas). A celeridade no processo de decisão e de aprovação de proj ectos urbanos é um

dos aspectos que melhor caracteriza o modus operandi da Porto 2001, que, no entanto, foi

sendo alvo de inúmeras crít icas que repudiavam o est ilo autoritário, ad hoc e tecnocênt rico

do processo de tomada de decisão de uma empresa que, sob o argumento da urgência “ em

lançar e executar obra” 105, subest imava a opinião dos restantes agentes territoriais

Situação que revela algumas similaridades com a estudada por Brownill, Razzaque e Kochan (1998) a propósito

da operação de regeneração urbana das Docklands londrinas, no sector oriental, tendo retirado algumas

conclusões sobre as oportunidades de participação no modelo de regeneração britânico, nomeadamente:

A mudança de atitude da autoridade privada responsável pela intervenção (LDDC – London Docklands

Development Corporation) ao longo do tempo, motivada por um conjunto de críticas pelo déficit de consulta

pública, durante os anos 80 e de vários sectores da sociedade: parlamento, residentes, municípios, sector privado.

Em finais dos anos oitenta, num período que se começa a atribuir uma maior importância à incursão da

participação pública em estratégias de regeneração urbana, alguns programas nacionais, como o City Challenge

Budget apostaram na criação de partenariados mais inclusivos, com participação da comunidade e a LDDC

revela uma maior abertura à comunidade local adaptando-se ao contexto desenvolvido pela política de

planeamento britânico.

Relativamente às questões da governância, associadas às estruturas e processos em que as decisões eram

tomadas, estes autores reflectem nas Urban Development Corporations, que durante os anos 80 foram co-

responsabilizadas pela governância local, não sendo, no entanto, “part of directly elected local or central

government”. As principais críticas que estes autores lançam às UDC’s e ao modelo de “entrepreneurial

governance”, é o modelo burocrático tradicional de governo ser substituído por de unelected boards, comandadas

por agências com uma mentalidade “can do”, associada a uma agilização das operações com grande nível de

discrição dos gabinetes. A grande crítica é o déficit de mecanismos de consulta pública e o facto destes órgãos

não estarem condicionados pelas regras de informação pública. (por exemplo as agendas e actas de reuniões não

eram públicas)

Outras críticas que se tem associado a estas empresas é a forma como existe um processo de “patronagem”, em

que o “patrão” tem direito de nomeação dos funcionários destas agências, podendo gerar-se uma espécie de

clientelismo, em que “o patrão segura o poder para ser usado arbitrariamente pelos que lhe asseguram lealdade”,

sendo, portanto, uma forma de concentração de poder por um órgão eleito constituído pelos amigos dos que têm

poder

A tomada de decisões relat iva ao Plano de Act ividades da Sociedade Porto 2001 era, também,

mot ivo recorrente de cont rovérsia ent re o interlocutor do Estado (Manuel Maria Carrilho) e a

Porto 2001 (Santos Silva) que t inham diferentes entendimentos do que deveria ser a Port o,

105 Ao nível do contacto directo que tive oportunidade de estabelecer com o responsável pelo Departamento de Requalificação Urbana da Porto 2001, foi evidente o estilo polémico de afirmações como �mais vale uma má decisão do que não decidir nada�� ou �quanto mais dinheiro tivessemos, mais dinheiro gastaríamos�.

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Capit al Europeia da Cult ura. Para Santos Silva e C.M.P. devia fazer-se uma forte aposta na

componente da requalif icação urbana do proj ecto e enquanto Carrilho defendia uma maior

primazia da programação cultural. Estas divergências inst itucionais, relat ivas à descent ralização

de competências e recursos para o Porto e em part icular para a Porto 2001, associadas à crise

que se t inha aberto no relacionamento pessoal ent re Santos Silva e Manuel Maria Carrilho,

levaria à demissão do presidente da Porto 2001, prat icamente, um ano após a const ituição

formal da sociedade, no dia 9 de Novembro de 1999106

Com a polémica instalada, o Minist ro da Cultura, Manuel Maria Carrilho, decide que a decisão da

escolha do subst ituto de Santos Silva para a presidência da Porto 2001, deve caber ao execut ivo

da Câmara Municipal do Porto, que acaba por recair sobre Teresa Lago107 que viria a assumir a

presidência do Conselho de Administ ração e Comissão Execut iva em Dezembro de 1999.

A polémica que envolveu a saída de Santos Silva, associada à demissão de alguns elementos da

equipe que crit icavam o est ilo que Teresa Lago procurou imprimir à sociedade, iria manter a

nota de polémica que se associava à concepção do evento

Quadro 3-1: Cronologia da const ituição da Porto 2001

Cronologia Acontecimentos

28 Maio 1998 At ribuição do evento Capital Europeia da Cultura ao Porto (e Roterdão pelo Conselho de Minist ros da UE)

3 Julho 1998 Eleição pelo Estado e CMP de Artur Santos Silva para presidente da Comissão Instaladora (que integrava também os vereadores da CMP Nuno Cardoso e Manuela Melo)

28 Setembro 1998 Apresentação do Relatório da Comissão Instaladora

31 Dezembro 1998 Const ituição da empresa Porto Capital da Cultura 2001, SA

9 Novembro 1999 Demissão de Artúr Santos Silva, devido a ruptura com Carrilho sobre desentendimentos sobre a natureza do programa da Porto 2001

15 Dezembro 1999 Teresa Lago é convidada e assume a presidência do Conselho de Administ ração e Comissão Execut iva da Porto 2001, SA

106 Numa altura em que Fernando Gomes já tinha deixado a presidência da Câmara do Porto para ocupar o lugar de Ministro de Administração Interna e em que Nuno Cardoso assumia a Presidência da Câmara (desde 26 Outubro de 1999).

�É sintomático que Nuno Cardoso e Manuela Melo, vereadora responsável pelas questões culturais, ambos pertencentes à Comissão Executiva da Porto 2001, tenham tomado assento � numa inequívoca manifestação de solidariedade � na mesma mesa em que Santos Silva anunciou a sua demissão. Ficou assim evidente o seu apego às concepções do homem que acabara de bater com a porta com enorme estardalhaço crítico contra Manuel Maria Carrilho. Depois de se ter afirmado �determinado� a continuar com o projecto, o ministro da Cultura ter-se-à apercebido de que a demissão do poderoso presidente do BPI deixará rasto no Porto e que a falta de sintonia com a autarquia no que diz respeito à prossecução do projecto ameaçava continuar� Dezembro 1999 Expresso. Esta demissão haveria de inaugurar o primeiro conjunto de polémicas associado ao projecto, aqui protagonizado entre o interlocutor o Estado e o presidente da Sociedade Porto 2001.

107 Professora universitária, astrónoma responsável pelo Planetário, que já era membro do Conselho Consultivo da Porto 2001

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3.2.2 – O obj ect ivo da renovação urbana da Baixa do Porto

Um dos aspectos mais visíveis da Porto 2001, foram as obras.

Realizadas num grande número de ruas e num curto espaço de tempo, integravam-se na

est ratégia de requalif icação urbana da Porto 2001, que assentava na renovação urbana e

revitalização económica (do comércio e serviços da Baixa)

O termo renovação urbana refere-se predominantemente ao incremento das condições f ísicas,

no entanto ao nível da operação Porto 2001 foi ut il izado para referir o obj ect ivo do incremento

da imagem e funcionalidade do espaço público e equipamentos culturais.

Tendo-se optado por ret irar do obj ecto desta invest igação a análise aos impactos territoriais

gerados pela const rução ou requal if icação de equipament os cul t urais108, optou-se, no entanto,

por referenciar a dimensão da renovação urbana do espaço público, no que diz respeito à área

“ Baixa” , área territorial, de resto, coincidente com a própria zona de int ervenção do programa

de revitalização económica.

No âmbito desta escala de análise, mais rest rita, optou-se por desenvolver uma descrição muito

genérica ao programa de renovação109 , o que se relacionou, ent re out ras mot ivos, com o facto

de exist ir uma distância assinalável ent re as propostas ou intenções das concret izações

De facto, da ideia inicial da concepção e desenvolvimento de uma est ratégia de regeneração

urbana que integrasse vários sectores de intervenção, habitação, espaço público, revitalização

económica (Anexo 11), evoluiu-se para uma modelo de intervenção mais rest rita, não só quanto

ao obj ect ivo da actuação (sectorial), como a própria extensão da área, menor que a

inicialmente proposta. De equipes mult idisciplinares de proj ecto que tencionavam intervir ao

nível da renovação de fachadas de habitações, no reordenamento funcional e estét ico do espaço

público, na forma de mobilidade110, que se confrontaram com inúmeros obstáculos (dos quais se

pode destacar a decisão do Governo de não avançar com o Programa de Habitação para a Baixa,

alegadamente pelo volume de orçamento exigido) evoluiu-se para formas de intervenção mais

f ísicas e ao nível do espaço público. Uma das grandes crít icas que se pode colocar desde, dent ro

do âmbito da tese, foi a falta de infomação sobre o t ipo de alterações realizadas ao proj ectos de

108 até porque a maior parte dos que beneficiaram de obras ou foram construídos de raíz ainda não estão em funcionamento, como é o caso do Auditório Carlos Alberto, Cadeia da Relação, ou Casa da Música, etc., no entanto, tem sido evidente o efeito de atractividade positiva gerada por alguns equipamentos que estão já em funcionamento, por exemplo o edifício que foi construído nos Jardins do Palácio de Cristal e que integra, uma Galeria Municipal, Auditório e a Biblioteca Almeida Garret (integrada na rede de leitura pública) que tem promovido um notável afluxo de pessoas, de um largo espectro de idades e classes sociais a esta área, sendo, portanto, expectáveis, aumentos de atractividade nas área onde se localizam estes equipamentos o, que estará, naturalmente, dependente da própria dinâmica criada pela sua gestão cultural 109 intervenção predominantemente física ao nível da repavimentação de ruas e passeios, a infraestruturação do sub-solo, a remodelação de praças e jardins ou a renovação do equipamento urbano 110 a este propósito vejam-se as propostas de arquitectos na publicação - Porto 2001 �Regresso à Baixa�, 2000

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execução que foram aprovados e apresentados à cidade111, e que criaram falsas expectat ivas que

não se viriam a concret izar. O site da Internet da Porto 2001, S.A., é paradigmát ico a este nível

pelo déf icit de informação, de pormenor e actualidade que revela no que diz respeito á

intervenção na cidade

Com o propósito da requalif icação global de toda a área cent ral da Baixa, a Porto 2001 procedeu

à delimitação das áreas onde se iriam processar e localizar as intervenções de requalif icação.

Desse t rabalho resultou a demarcação de uma extensa área da Baixa que foi denominada por

“ Área de Int ervenção da Port o 2001” e que abrange toda a área cent ral do Porto. Esta área foi

dividida em cinco sub-áreas de intervenção e dent ro de cada uma delas eram criadas menores

espaços a proj ectar, designados por “ unidades de proj ect os”

Figura 3-3: A Área de Intervenção da Porto 2001na Baixa Portuense

111 evidente por exemplo pela redução da equipe inicial de projectistas que à competência da arquitectura, o que esteve condicionado por factores económicos e de prazos

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Um dessas áreas é a Área de Intervenção Cent ral112, correspondendo ao corredor def inido pela

Ponte D. Luís, a sul, e pela Estação da Trindade, a norte, incluindo a Avenida da Ponte, a Praça

Almeida Garret t , a Praça da Liberdade, Avenida dos Aliados, Praça General Humberto Delgado e

Largo da Trindade (Porto 2001, 1999a).

Dois proj ectos para perímet ros desta área, nomeadamente a ‘ Avenida da Ponte’ e ‘ Praça da

Liberdade’ foram ent regue ao Arq. Siza Vieira enquanto que as restantes quat ro zonas ‘ unidades

proj ecto’ foram obj ecto de um concurso de ideias.

A área de Intervenção central, segundo a Porto 2001, não foi sujeita a um processo de consulta, uma vez que as

grandes intervenções nela previstas estavam já entregues a projectistas ou equipas de projecto ou existiam

compromissos nesse sentido, com projectistas num período anterior à criação do Programa da Porto 2001, S.A.

Por exemplo as obras associadas à construção da rede Metro do Porto, da responsabilidade do Arq. Eduardo

Souto Moura ou o projecto da Av. da Ponte entregue à equipa do Arq. Siza Vieira (Porto 2001, 1999a).

No respeitante a esta avenida, à Avenida D. Afonso Henriques (mais conhecida por Avenida da Ponte, que liga a

Estação de São Bento ao arruamento de acesso ao tabuleiro superior da Ponte de D. Luís), Siza Vieira foi

convidado a projectar uma solução para um alegado “problema urbanístico da cidade” resultante de demolições

dos anos 40 que expuseram a Sé e lhe retiraram as construções que antes a envolviam. O projecto foi concluído a

20 Dezembro de 2000 e divulgado no ano seguinte através do material informativo e promocional da Porto 2001,

onde se declara a impossibilidade de execução do projecto por esta sociedade (devido à sua data de extinção, em

meados de 2002) e a decisão deste ser deixado à cidade, como um legado da Porto 2001. Ainda, no prospecto

informativo da Porto 2001 sobre a Av. da Ponte, sublinha-se a importância de que este não seja “mais um dos

muitos projectos criados para esta avenida”, pelo que esta sociedade toma sobre si a responsabilidade de “criar as

condições para a sua execução” para lá do evento Porto 2001. Para tal salienta a necessidade da “criação de

parcerias que permitam viabilizar a execução do projecto, que trabalhem os programas, que cruzem os interesses,

que angariem os recursos, e que planeiem o futuro” (Paulo Sarmento e Cunha113, in prospecto informativo da

Porto 2001 intitulado “ Avenida da Ponte”). Projecto que viria a ser chumbado pelo executivo municipal por uma

alegada falta de adequação do projecto ao programa inicial proposto. Esta ocorrência de deixar projectos como

‘legado’ é, de resto, pouco original se atendermos a que a história do urbanismo e planeamento português tem-se

caracterizado, como conclui Pereira (1994), por um enome défice de implementação das propostas.

Relativamente ao projecto da Praça da Liberdade o site da Porto 2001 (consultado em Setembro de 2001),

esclarecia que, para além da alteração de pavimentos e ruas e passeios e a reutilização de antigos candeeiros de

lampião o Arq. Siza Vieira propunha a mudança de posição da estátua equestre de D. Pedro V, virando-a para o

edifício da C.M.P. (Sociedade Porto 2001, in http://www.porto2001.pt/) Uma intervenção que viria a ser alvo de

112 representada na figura 3.3 pela cor cinzenta 113 Responsável pelo Departamento de Renovação Urbana e Equipamentos Culturais da sociedade Porto 2001, SA, que integrava os sub-departamentos de Requalificação Urbana da Baixa Portuense, Renovação Urbana e Ambiente, Equipamentos culturais e revitalização económica.

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alguma controvérsia, associada à ideia da deslocação da posição da estátua de D. Pedro V, mas o projecto nunca

viria a ser iniciado por decisão do executivo municipal (questão que retomaremos no ponto 3.2.3)114

Relat ivamente às restantes quat ro áreas do Programa de Requalif icação da Baixa, a Porto 2001

promoveu um Concurso de Ideias (leia-se de proj ectos de arquitectura) int itulado “ pensar a

Baixa” .

Est ruturado por um ‘ Programa’ e ‘ Regulamento’ (apresentados na publicação “ Porto 2001

Regresso à Baixa” (1999a).

para o qual foram convidadas 14 equipes de arquitectos, que, com base num regulamento geral,

relat ivo, por exemplo às questões da mobilidade que visavam a criação de um sistema coerente

e funcional de espaço urbano, e intenções programát icas, deveriam proj ectar as suas propostas

de arquitectura para a área em que concorriam. Para este propósito a Baixa foi dividida em

quat ro áreas, Oeste A, Oeste B, Leste A e Leste B, que correspondiam, grosso modo a um

sistema urbano organizado pela envolvente às Praças da Cordoaria, Carlos Alberto, Batalha e

D.João I115(Figura 3-3).

Após a análise das propostas, a Comissão de Apreciação de Trabalhos, const ituída

predominantemente por elementos da sociedade Porto 2001, determinou a selecção dos

proj ectos vencedores para cada uma das quat ro áreas a concurso. Após essa selecção, a Porto

2001 decidiu reuni-los e apresentá-los à cidade, at ravés de uma exposição realizada no foyer-bar

do Teat ro Rivoli, promovendo ainda a publicação, a que j á f izemos referência: “ Port o 2001,

regresso à Baixa” 116 e a que se associou uma série de quat ro debates públicos, realizados nos

cafés Piolho e Maj est ic, durante quat ro semanas, ent re 19 de Junho e 12 de Julho 2000.

114 Para além dos projectos já referidos, e que se integram na área de investigação desta tese, pode fazer-se ainda referência geral a outros projectos urbanos, nomeadamente os concebidos e em fase de execução para a frente marítima do Porto - Av. Montevideu e Marginal do Parque da Cidade. Da autoria do arquitecto catalão Manuel de Solá-Morales, o projecto para a Avenida Montevideu integrou a requalificação da zona marítima situada entre a Praça Gonçalves Zarco e Praia do Molhe e o da Av. Marginal do Parque da Cidade, localizada entre as praças Gonçalves Zarco e da Cidade do Salvador, englobou, ainda, a envolvente ao Castelo do Queijo. Ambos os projectos, pela forma como atentavam contra o �verde� foram bastante alvo de polémica, fortemente mobilizada por ONG�s e partidos políticos da oposição.

Outro projecto que deve ser referido foi o concebido pela Arq. Graça Nieto Guimarães para a renovação dos Caminhos do Romântico, tendo sido projectado e executado no Vale de Massarelos. Com o objectivo de requalificar alguns largos, miradouros e restaurar fontes e lavadouros uma área onde ainda persistem algumas hortas, campos e motivos de interesse ligados ao Romântico como a Casa Tait ou o Museu Romântico da Quinta da Macieirinha. Esta intervenção integrou ainda a requalificação da Rua da Restauração com vista a uma ligação mais eficaz de Massarelos à Baixa.

115 Com maior detalhe, refira-se que a Área de Intervenção Oeste A corresponde ao edifício da Reitoria da U.P. e todo o conjunto envolvente, a Rua da Restauração, Jardim da Cordoaria, Praça de Lisboa e a zona envolvente aos Clérigos; a Área de Intervenção Oeste B corresponde ao sistema urbano definido pelas ruas de Cedofeita, Breiner, Miguel Bombarda, Largo da Maternidade e Júlio Dinis; a Área de Intervenção Leste A corresponde à Praça da Batalha, inclui zona dos Guindais, Parque das Camélias, Batalha e a encosta que confina com a Estação de S. Bento; finalmente, a Área de Intervenção Leste B correesponde ao sistema definido pelas ruas de Santa Catarina, Passos Manuel, Formosa, Fernandes Tomás, Sá da Bandeira e Praça D. João I. (Porto 2001, 1999a)

116 Uma publicação que, para além de apresentar as Intenções Programáticas e Regulamento do Concurso que enformaram os projectos de arquitectura das várias equipes apresenta todos os projectos que participaram no cuncurso e o Relatório de Avaliação Final da Comissão de Apreciação dos Trabalhos.

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No prefácio desta publicação, é ainda possível, a partir da leitura das observações introdutórias de representantes

da Porto 2001 (Teresa Lago e Paulo Sarmento e Cunha) e da Câmara Municipal do Porto, (Manuela Melo e Nuno

Cardoso) perceber a consonância, em termos de objectivos e metodologias propostas, entre a Câmara Municipal

do Porto e Sociedade Porto 2001, conforme se percebe das afirmações de do presidente da Câmara, Nuno

Cardoso:

“Desde o primeiro dia que a Porto 2001, Capital Europeia da Cultura foi encarada como um instrumento

estratégico com uma dupla face: por um lado, mostrar que somos capazes de realizar um programa de eventos

que agradem a públicos diversificados; por outro, intervir, de forma decisiva, no tecido urbano de modo a

reabilitá-lo de forma integral”. Afirma, ainda, que as obras de requalificação são uma oportunidade para os

portuenses e que as obras vão ser uma das peças fundamentais da Porto 2001 para que a Baixa volte “a ter

eléctricos, deslocações a pé aprazíveis e o comércio tradicional potenciado” (Porto 2001, 1999a: 10)

Aumentar a informação e proporcionar um momento crít ico ao processo de renovação em curso,

em que a questão teórica assumisse um papel cent ral, eram os obj ect ivos chave destas

iniciat ivas promovidas pela Porto 2001. Os debates vieram a assumir, de facto, uma componente

teórica e informat iva muito marcada, uma vez que, na prát ica, correponderam à apresentação

dos proj ectos vencedores, para cada uma das áreas a concurso, pelos seus autores. Na prát ica

eram ‘ reuniões de esclarecimento’ , predomiantemente unidireccionais e relat ivas a questões

técnicas dos proj ecto de arquitectura, a que se seguia um curto período de perguntas ou

crít icas.

Frequentemente os part icipantes censuraram a falta de debate na concepção dos programas dos

proj ectos, lamentando que esta oportunidade não t ivesse sido const ruída pelos habitantes da

cidade em debate com invest igadores e técnicos municipais.

Face a estas crít icas e ao interesse manifestado pelas pessoas que af luiram em grande número

aos exíguos cafés t radicionais da Baixa, a Porto 2001 organizou um debate f inal, desta vez no

Rivoli, com as quat ro equipas de arquitectos e os protagonistas associados ao evento da

Requalif icação Urbana. Com o auditório completamente repleto e numa altura em que as

decisões relat ivas à requalif icação urbana da Baixa j á estavam tomadas e as obras de renovação

em curso, repet iram-se as crít icas ao déf icit de abertura dos decisores na auscultação dos

pareceres da população residente, ut il izadora, etc.

A part ir deste momento a Porto 2001 e CMP117 passaram a evidenciar uma maior preocupação

com a divulgação de informação relat iva ao programa de requalif icação para a Baixa, que se

manteve, não obstante, uma excessiva generalização, conforme ilust ra a descrição dos proj ectos

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vencedores pelo sit e of icial da Porto 2001, que se manteve inalterado durante mais de dois anos.

A saber:

Batalha - Adalberto Dias - aqui destaca-se o redesenho da praça e criação do funicular dos Guindais, que

permitirá efectuar a ligação com a quota Baixa ao nível do Rio;

D. João I – Alexandre Alves Costa e Sérgio Fernandez - as alterações propostas reforçarão o carácter de zona de

lazer que teve originalmente;

Cordoaria – Camilo Cortesão e Mercês Vieira - numa área dominada pelo Jardim da Cordoaria, Cadeia de

Relação e Torre dos Clérigos, irá reforçar-se a criação de percursos para peões;

Carlos Alberto – Virgínio Moutinho - o espaço será reorganizado com introdução de um espelho de água. (site

Sociedade Porto 2001, última consulta em Agosto 2001 in http://www.porto2001.pt )

A abertura of icial do programa de renovação urbana da Porto 2001 ocorreu em Fevereiro de

2000, com o início das obras na Rua da Restauração, mas a calendarização prevista para as obras

não se viria a concret izar, nem em termos da extenção das obras previstas118, nem nos prazos

inicialmente previstos.

Quadro 3-2: Cronologia de decisões associadas ao programa de renovação urbana

Cronologia Acontecimentos

Janeiro 1999 Início dos t rabalhos de definição do Programa de Intervenção para a Baixa do Porto

Fevereiro 1999 Porto 2001 promove a Consulta para a Elaboração do Programa de Requalif icação da Baixa Portuense, para tal convida um conj unt o de reput ados arquitectos a part icipar num Concurso de Ideias para o Programa de Int ervenção da Baixa

Para tal t inha definido as intenções programát icas da requalif icação da área cent ral da cidade, at ravés do Relatório da Comissão Instaladora e definido um regulamento simplif icado (onde são integradas as principais linhas programát icas da mobilidade para a Baixa)

Segundo Porto 2001 (Paulo Sarmento e Cunha in Regresso à Baixa: ) as propostas foram produzidas em tempo relâmpago (em t rês semanas por equipas mult idisciplinares)

Selecção dos proj ectos vencedores para cada zona de intervenção da Baixa pela Comissão de Apreciação dos Trabalhos

Março/ Junho 1999 Apresentação dos 14 t rabalhos das equipes de arquitectos e dos 4 que foram selecionados at ravés de uma exposição de t rabalhos no Rivoli e publicação que apresenta os diferent es modos de int erpret ar a cidade e de propor a sua requalif icação

Junho/ Julho Cinco debates sobre o Programa de Requalif icação em curso para a Baixa, promovidos nos cafés Piolho, Maj est ic e, o últ imo Rivoli

117 Muito embora pouco contribuísse para a compreensão do programa de intervenção da Baixa e como iam decorrendo as várias empreitadas, o site da CMP (www.cm-porto.pt) revelava, no entanto, bastante preocupação na difusão de informações de trânsito relativamente a alterações de transito ocorridas na cidade

118 Refira-se que as obras de requalificação urbana incluíam, para além da renovação total das infra-estruturas (rede de águas pluviais, abastecimento de água, águas residuais domésticas e iluminação pública, a intervenção à superfície integrava a alteração de questões formais e funcionais (dimensão de passeios, faixa de rodagem, novos revestimentos, mobiliários urbano, etc.)

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A decisão polít ica de intervir na requalif icação urbana da Baixa, foi associada à necessidade de

resolução dos problemas de mobilidade o que suscitou, por parte da C.M.P. e Porto 2001, a

encomenda de um estudo técnico119 que permit isse a formulação de uma ideia de conj unto, em

termos de mobilidade, para a Baixa.

Para tal encomendaram a elaboração de um estudo de mobilidade, cuj o principal factor crít ico

era a pressão dos prazos, uma vez que exist ia urgência no lançamento do caderno de encargos

para o concurso de ideias, fundamental para o início do t rabalho das equipes de arquitectos, e

posterior selecção dos proj ectos para cada zona, adj udicação das empreitadas, de forma a que

tudo est ivesse pronto no t iming previsto.

Os obj ect ivos principais desse estudo foram a integração do t raçado e característ icas do Met ro

no sistema de t ransportes públicos120, racionalização do modelo do serviço de autocarros

urbanos e suburbanos com criação de novos corredores BUS; a reinstalação e extensão da rede

de eléct rico, mediante a criação de uma anel circular que permit iria unir as principais áreas

intervencionadas da Baixa como apoio as deslocações a pé; t ratamento do sistema pedonal como

componente est ruturante da mobilidade na Baixa, hierarquização da rede viária e const rução de

parques de estacionamento subterrâneos.

O facto desta encomenda não ter integrado um processo de debate que permit isse um debate

alargado com os vários agentes que operam nesta área suscitou uma polémica que viria a

quest ionar a própria confiança ent re partners da revitalização económica

A tomada de decisão técnica sem consulta pública e debate sobre o melhor ou melhores

conceitos de mobilidade para a Baixa (que não ocorreu ao nível dos valores do programa) viria a

re-localizar esse debate ao nível dos proj ectos, no momento de execução dos proj ectos de

arquitectura. A crít ica relacionava-se com o desfasamento ent re as expectat ivas e realizações

(de const rução do met ro, reinstalação do eléct rico, de aumento de af luência de consumidores á

Baixa) e face a algumas aparentes cont radições: ent re a aposta num sistema de t ransportes

públicos e pedest re, (mediante um alargamento de passeios e est reitamento de faixas de

rodagem) e a const rução de parques de estacionamento que criavam uma oferta de lugares de

119 Encomendado pela Porto 2001 e CMP à empresa APB, Arquitectura e Planeamento, Lda. e ao Instituto de Construção da FEUP, envolveu a participação de consultores e investigadores em transportes, como António Pérez Babo ou Pires da Costa. A metodologia seguida por estes autores foi condicionada por estar em curso o projecto metro do Porto, um meio de transporte de média e grande capacidade cujo potencial de transporte de pessoas à Baixa exigiria uma maior aposta em áreas pedonais e uma aposta na intermodalidade. Apresentando um breve diagnóstico às disfunções que afectam a mobilidade na Baixa, optan-se por valorizar a definição de objectivos gerais de mobilidade desejáveis para a Baixa e as algumas vias para a sua concretização

120 Está programada a construção de duas linhas de metro que se cruzam na Estação da Trindade: a linha 1 de Gaia ao Hospital de S. João, com paragens em S. Bento, Av. dos Aliados e Trindade e a linha 2, Matosinhos/Campanhã, com paragens na Trindade, Bolhão e Campo 24 de Agosto.

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estacionamento subterrâneo aparentemente sobre-dimensionada numa área rest rita121 o

potencial de at racção de alguns equipamentos públicos localizados nesta área (hospital Santo

António, CMP, t ribunal ou teat ros, ) que podem gerar uma inef iciência também associada á

diminuição das faixas de rodagem, a maior parte das vezes sem a oferta de autocarro em canal

próprio

Se por um lado, se propunha uma redução do estacionamento à superfície, por outro propõe-se a criação de novos

parques de estacionamento subterrâneos, que, segundo a Porto 2001 e CMP, inclusive, permitiria a substituição

dos lugares retirados à superfície pelos criados no sub-solo (chegou-se mesmo a afirmar que com a criação destes

parque de estacionamento subterrâneos iria aumentar a oferta de estacionamentona Baixa).

Entre a decisão de aumentar a oferta de estacionamento na Baixa (através da criação de mais lugares de

aparcamento para veículos individuais, que criavam o atractivo e expectativa da utilização do automóvel privado)

e a decisão, simultânea, de implementar nessa área um novo conceito de mobilidade com uma redução do

transporte individual em detrimento do transporte público em canal próprio, nomeadamente metro e eléctrico,

dando prioridade ao peão (mediante o alargamento do tamanho dos passeios e estreitamento das faixas de

rodagem), ficava a dúvida sobre a eficiência da circulação na Baixa e, consequentemente dos transportes públicos

rodoviários no futuro para a Baixa, (que partilham o canal com o individual). A este respeito, o próprio Programa

de Mobilidade aconselhava a necessidade da realização de estudos mais aprofundados que permitissem saber

com mais rigor até que ponto deverá ser levado o processo de criação de mais parqueamento central, bem como a

política tarifária a implementar, o que nunca se viria a realizar.

O estudo técnico da mobilidade para a Baixa, inf luenciou diversos estudos e proj ectos que

realizados a j usante, nomeadamente a def inição do regulamento e o caderno de encargos para o

concurso de ideias da Baixa (por exemplo na def inição da dimensão da largura dos passeios e

faixa de circulação, etc.), inf luenciando a forma de proj ectar o plano horizontal do espaço

público, bem como o programa de revitalização do Comércio na componente de invest imento no

Espaço Público, uma vez que a equipe técnica responsável pelo programa de revitalização do

comércio e serviços para a Baixa def iniu que se int erpret assem as medidas adopt adas pelo

Programa de Mobil idade para a intervenção ao nível do espaço públ ico da Zona de Intervenção

do URBCOM (Quaternaire Portugal, Vol. 2, 2000, p.5)

“As acções de remodelação dos espaços colectivos integram-se em programas mais abrangentes de reabilitação

da malha urbana, conduzidos de forma concertada, pela CMP e pela Sociedade Porto 2001. São precisamente os

termos de concertação urbanística que permitem considerar resultados potencialmente relevantes da intervenção

urbanística prevista à escala de cidade” (Quaternaire Portugal, Vol 2, 2000, p.4)

Em suma, a margem de manobra (por exemplo ao nível da comparticipação do financiamento) disponível pelo

Programa de Revitalização do Espaço Público da área intervencionada da Baixa é deixada à competência da

Porto 2001, pelo que a remodelaçãpo dos espaços colectivos da estrutura comercial da Baixa irá ser concretizada

pelo Programa de Mobilidade para a Baixa do Porto e projectos de execução concluídos

121 para além dos parques já existentes, por exemplo nos Clérigos ou na proximidade da C.M.P, os parques de estacionamento concessionados e a instalar foram: Carlos Alberto, Praça D. João I, Campo 24 de Agosto, Praça do Infante, Trindade o dos leões.

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Segundo os seus autores, este programa foi pensado como um hardware sobre o qual iriam correr

vários softwares – o da const rução e funcionamento do met ro, da reinstalação do elect rico, da

racionalização dos autocarros, comboio, de uma maior integração intermodal, da polít ica da

tarifa integrada ent re operadores, da logíst ica para o abastecimento da Baixa, etc. Exigindo, por

conseguinte, não só um bom funcionamento dos vários subsistemas de t ransporte, como de

coordenação e gestão por parte da est rutura comercial local, ao nível da logíst ica de cargas e

descargas, por exemplo, de forma a minimizar os congest ionamentos, incrementando a

at ract ividade desta área.

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3.2.3 – O obj ect ivo Revitalização Económica do Comércio e Serviços da Baixa do Porto

O Programa de Revitalização do Comércio e Serviços da Baixa foi concebido inicialmente como

uma peça integrante de uma est ratégia mais vasta que incluia, por exemplo, a componente de

habitação (que seria mais tarde abandonada pela Porto 2001) mas depressa veio a assumir-se

como um programa essencial não só para o f inanciamento da renovação do espaço público da

Baixa, como para o debate sobre a dist ribuição de poder e inf luência dent ro de partenariados.

Neste ponto analisa-se toda a t ramitação e debate associado ao programa de Revitalização do

Comércio e Serviços da Baixa, com vista à leitura dos obj ect ivos que est iveram subj acentes à

criação deste partenariado, do papel que protagonizou no processo de tomada de decisão, dos

mot ivos que geraram a discódia e a ruptura ent re os seus elementos e como se processou o longo

processo de negociação e impasse que lhe esteve associado.

A análise a este processo permit irá ret irar algumas conclusões que const ituirão o leit mot ive

para um debate mais amplo sobre o papel da part icipação no planeamento e em part icular

dent ro de partenariados de base territorial local ou sobre a inf luência do envolvimento do sector

privado na concepção e implementação de programas que exij am uma part icipação conj unta do

sector público e empresarial.

O obj ect ivo de Revitalização Económica da Baixa envolveu a criação de um partenariado

const ituído por quat ro inst ituições: duas representantes do sector privado e duas do sector

público, designadamente:

Associação dos Comerciantes do Porto (ACP)

União das Associações de Hotelaria e Restauração do Norte de Portugal (UNIHSNOR)

A Camara Municipal do Porto (CMP)

A Porto 2001, SA

O partenariado ent re estas inst ituições e o o Ministério da Economia é estabelecido at ravés da

assinatura de um Protocolo de Cooperação, assinado a 18 de Setembro de 1999, que viria a

estabelecer um apoio de 10 milhões de contos para a revitalização económica da Baixa e que

começaria por viabilizar o início de algumas obras de renovação do espaço público da Baixa.

Refira-se que este Protocolo, estabelecido ent re o Ministério da Economia, município do Porto e

est ruturas representat ivas das empresas, parece seguir os princípios de acção est ipuladas pelo

próprio Programa Operacional de Economia para o período de 2000 a 2006, em termos da

mudança de comportamento da Administ ração Pública no que respeita à conj ugação de

interesses e meios para a melhoria de compet it ividade sistémica, propondo para tal a criação de

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part enariados, que permitam a cooperação e concert ação ent re organismos da Administ ração e

ent idades ext ernas envolvidas na execução dos proj ect os (adaptado POE, 2001, p.14 e 15)

“O Programa Operacional de Economia aprofunda enquanto princípio orientador o espírito de cooperação, tendo

subjacente o aprofundamento de uma nova era de colaboração entre os sectores público e privado, nas actuações

que visam, nomeadamente, colmatar “falhas de mercado” e robustecer e desenvolver o tecido empresarial, no

quadro das políticas do Ministério da Economia” (POE, 2001, p.7)

Refira-se que o urbanismo comercial apresenta-se, no contexto do Programa Operacional de Economia (POE),

como um instrumento importante para promover o desenvolvimento das cidades e de outros espaços de menor

dimensão, em simultâneo com uma organização territorial mais equilibrada, activando e dinamizando sinergias

entre o comércio e a defesa do património, sem esquecer a qualidade de vida dos cidadãos.

É no sentido de promover a complementaridade de interesses, efeitos sinergéticos de carácter estruturante, o

alargamento das áreas de influência das políticas sectoriais, atingindo novos extractos dimensionais e

geográficos, disseminando boas práticas e antecipando a resolução de questões da estratégia do desenvolvimento

empresarial, que se desenvolvem instrumentos de “Parcerias e Iniciativas Públicas”. Segundo o POE a lógica de

par tenar iado pressupõe um esforço acrescido das entidades parceiras como forma de ultrapassar a

resistência à mudança e às dificuldades de mobilizar para a cooperação constatadas a diversos níveis.(POE,

2001, p.11).

Com a implementação deste instrumento o Ministério da Economia procura, ainda, “a transformação da cultura

organizacional dominante em Portugal, de pendor individualista e fechada ao exterior no que respeita às

empresas” e “uma contribuição para a alteração do quadro de governação da Administração Pública na sua

relação com os agentes económicos e as organizações do mercado”

A part icipação conj unta e concertada de poderes públicos e agentes económicos (empresas e

associações representat ivas destes), quer ao nível da fase de concepção das acções como do seu

acompanhamento, é, ainda, um dos princípios orientadores (art igo 3) do Decreto-Lei n.º 70-

B/ 2000 que vem aprovar o enquadramento para a criação de inst rumentos de polít ica de acção

económica para o período de 2000 a 2006.

“Torna-se indispensável uma maior intervenção das estruturas representativas das empresas tanto na concepção

como no acompanhamento das acções para que estas possam com a sua experiência e mais próximo

conhecimento da realidade colaborar com a administração no desenvolvimento de uma política económica

adequada a uma fase de mutação necessariamente exigente” decreto-lei n.º 70-B/2000, de 5 de Maio

Por seu lado, os agentes económicos que assinaram o protocolo e que passados dois anos olham

com desencanto para a forma como evoluiu o relacionamento inst itucional dent ro do

partenariado tendem a olhar esta forma de cooperação público/ privado, como um inst rumento

polít ico que foi assinado em vésperas de eleições com vista a testemunhar uma concertação

embrionária, quer ao nível da clarif icação dos conteúdos e conceitos dent ro do partenariado,

quer das expectat ivas de cada parceiro ou dos processos de decisão que estavam em curso e que

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pudessem ter repercussões para o obj ect ivo do Programa de Revitalização Económica da Baixa.

Este foi, aliás, o caso do Programa de Mobilidade.

Segundo o sector empresarial, um estudo cuj a natureza inf luenciava de forma directa a

act ividade do comércio e serviços (afectando potencialmente a polít ica de cargas/ descargas, a

capacidade de at racção de mercado consumidor em termos de facilidades de circulação ou

estacionamento proporcionados, etc.). Enfim, um estudo que poderia inf luenciar a própria

est ratégia de revitalização económica da Baixa e, a j usante, a própria predisposição dos

empresários para o invest imento na Baixa, mas que não foi nem apresentado, nem part icipado

pelos parceiros da revitalização. De resto, os part ners af irmam tomar consciência da sua

existência num momento tardio (aquando a ent rada da nova direcção da ACP e num momento

que o Estudo f inal para o Programa de Revitalização estava quase f inalizado), acusando, por

isso, a Porto 2001 e CMP de uma pequena t raição ao sector privado. Segundo a UNIHSNOR a

ocultação deste documentos dent ro do partenariado, provocou o início de uma relação de

desconfiança dent ro deste.

Conforme j á se referiu, o Programa de Revitalização do Comércio e Serviços para a Baixa do

Porto visava a candidatura desta est rutura comercial t radicional a um Proj ecto Especial de

Urbanismo Comercial que viabilizasse a compart icipação, at ravés de fundos comunitários, de

parte dos invest imentos privados e de requalif icação do espaço urbano que aí se realizassem.

Para tal, a Porto 2001 encomendou, a uma empresa de consultadoria com experiência na área de

urbanismo comercial, Quat ernaire Port ugal , um estudo de revitalização para o comércio e

serviços da Baixa que seria apresentado em dois momentos que corresponderam, na prát ica, a

dois documentos: o Estudo Prévio e Global.

A este propósito, ref ira-se que, no momento em que ocorreu a assinatura do protocolo de

cooperação no partenariado const ituído para o efeito e em que a empresa cont ratada iniciava a

realização do Estudo Prévio para o Programa de Revitalização da Baixa, estava-se j á no términos

do IIQCA, mas ainda se pensava que a candidatura aos fundos comunitários iria ser feita pelo

PROCOM. Tal, no entanto, não viria a acontecer porque o Estudo Global é f inalizado j á sob o

enquadramento de um novo Quadro Comunitário de Apoio e de um novo sistema de incent ivos a

proj ectos de urbanismo comercial pelo que a est rutura comercial da zona de int ervenção da

Baixa portuense viria a candidatar-se ao URBCOM.

O processo de negociação ent re o município, sociedade Porto 2001 e Ministério da Economia é

descrito na própria int rodução do estudo Global, como um proj ecto de grande importância pela

grandeza da compart icipação de fundos comunitários que pode despoletar para o obj ect ivo da

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requalif icação comercial no espaço privado e público, bem como por algumas facilidades que se

esperavam para a aplicação do programa ao Porto:

“A negociação das condições de apoio ao Programa com o Governo determinou que, sem perder de vista outras

intervenções, físicas e imateriais, sobre o território alvo que vão ser realizadas, esta visão de programa

experimental e alargado desse, entretanto, lugar a uma versão de projecto especial PROCOM. A especialidade

seria assegurada não só pela magnitude financeira do investimento comparticipado, mas também por algumas

condições particulares de elegibilidade, realização e acompanhamento dos investimentos a realizar por parte dos

empresários do sector” (Quaternaire Portugal, 2000, p.3)

Em Julho de 2000, o Estudo Global do Programa de Revitalização do Comércio e Serviços da

Baixa é concluído, sendo const ituído por t rês volumes122 que são ent regues à Porto 2001 e

parceiros, com vista à sua análise, formulação de sugestões e expectável aprovação.

No primeiro volume realiza-se um diagnóst ico muito detalhado à oferta e procura comercial e de

serviços da Baixa, avaliando-se o desempenho desta est rutura comercial e a def inição

est ratégica que poderia est imular a sua revitalização (especif icada ao nível de obj ect ivos gerais,

específ icos e linhas gerais de operacionalização). É ainda apresentada a Zona de Intervenção que

se poderá candidatar ao Programa e os critérios de elegibilidade para os proj ectos de

candidatura das empresas.

Todos os parceiros concordaram, na generalidade, com este volume. Na Adenda ao Estudo Global, que viria a ser

realizado pela ACP em Agosto de 2001 (um ano depois! Porque até lá a ruptura dentro do partenariado e o

impasse que se lhe seguiu não gerou condições para a construção de consensos) afirma-se que “O Estudo Global

merece o nosso acordo geral quanto ao conteúdo do Volume I, que de uma forma exaustiva e cr iter iosa analisa a

actual situação do comércio e serviços da zona de intervenção, apresentando uma estratégia global, para os mais

diversificados problemas que afectam o sector.” , sendo, no entanto referidas algumas situações pontuais de

desacordo ou indefinição, relativas a horários de funcionamento, formação, gestão de programa e gestão do

espaço público intervencionado, que aqui não importa pormenorizar.

Alguns dos resultados ao nível do diagnóstico do Estudo Global são: perda de dinâmica demográfica e

residencial, degradação do parque habitacional, deslocalização de funções da Baixa, dificuldades de

acessibilidade e mobilidade, reduzida capacidade ao nível de lugares de estacionamento, dificuldade em realizar

cargas e descargas, concorrência gerada por grandes superfícies comerciais, envelhecimento da capacidade

empresarial tradicional, reduzida atractividade dos estabelecimentos comerciais (horários, preços, atendimento)

O volume dois, que é vocacionado para a def inição do programa de invest imento no espaço

público, atendendo ao facto de que grande parte da intervenção urbaníst ica conduzida pela

122 Acrescente-se que, para além dos três volumes que constituem o Estudo Global, a empresa técnica apresentou uma caracterização exaustiva de todos os estabelecimentos situados na zona de intervenção, designadamente em termos das características físicas do espaço comercial � exterior (montras, toldos, fachadas ..) e interior (tectos, paredes, etc.), bem como a descrição e avaliação dos equipamentos e serviços disponiblizados pelo estabelecimento (pagamento electrónico, gestão informatizada de stocks, etc.)

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Port o 2001 para a Baixa se concent rou no tecido comercial abarcado pelo URBCOM (Quaternaire

Portugal, Estudo Global, 2000, p.6, vol. III), decide optar por uma concordância com todas as

decisões j á tomadas anteriormente pela Porto 2001 ao nível do programa de remodelação dos

espaços públicos.

Af irmando que a intervenção em espaço público, ao nível do programa de Revitalização do

Comércio e Serviços, só fazia sent ido se est ivesse art iculada com exigências como “ os termos e

bitolas de organização espacial, os sistemas e infra-est ruturas de mobilidade, soluções de

pavimentação, equipamento e mobiliário urbano, ent re out ras soluções relat ivas às

infraest ruturas urbaníst icas” (Quaternaire Portugal, 2000, p.6), a equipe técnica remete o

programa de intervenções no espaço público para a concret ização dos programas em curso pela

Porto 2001, designadamente o Programa de Renovação Urbana da Baixa.

Esta decisão viria a const ituir o cerne do desacordo ent re ACP e o Estudo Global, por out ras

palavras ent re os comerciantes e a est ratégia de revitalização definida para a Baixa pela CMP e

Porto 2001 que encomendaram um Programa de Mobilidade, deconhecido pelas est ruturas

representat ivas dos empresários do comércio e serviços da Baixa e com o qual estes viriam a não

concordar.

A oposição assumida pela ACP face à estratégia de intervenção no espaço público proposta pelas várias equipes

técnicas (da mobilidade, arquitectos para a renovação, ..), alicerça-se num diagnóstico de perda (que, de resto, é

mais ou menos coincidente com o da QP: de uma perda selectiva de população residente, nomeadamente da

população mais jovem com maior apetência e capacidade financeira para o consumo, de emprego, nomeadamente

Banca, Seguros e serviços para áreas mais periféricas o que se tem associado a uma perda de afluxo de população

à Baixa, de perda de estudantes pela relocalização dos polos universitários, etc… ) e, principalmente, da proposta

de uma estratégia totalmente diferente da encomendada pela CMP e Porto 2001. Uma acente na certeza que se

deve aumentar a acessibilidade à Baixa: porque o comércio de proximidade vem perdendo significado e que,

portanto, esta estrutura comercial deve poder concorrer com outras acessibilidades, o que exige maior fluidez e

escoamento de trânsito

O volume t rês, correspondente ao Plano de Comunicação, orienta-se para o obj ect ivo da

divulgação “ atempada segura e sustentada do Programa j unto aos públicos alvo def inidos

procurando, simultaneamente, mot ivar e dinamizar esses públicos para a adesão ao programa

(nomeadamente os estabelecimentos comerciais inseridos na área de int ervenção do programa e

organismos of iciais)” . Segundo a equipe técncia este plano pretendia gerar consensos e

entusiasmar em torno da intervenção, garant indo um êxito da adesão e publicitação, mas foi

crit icado por const ituir uma espécie de programa de sedução com vista uma minimizar dos

custos face aos benefícios do programa.

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Num momento em que era f inalizado o Estudo Global, dois factores iriam ser determinantes para

o início do desentendimento ent re a ACP e Porto 2001:

1. por um lado, a publicação das normas reguladoras do URBCOM123 (que veio outorgar um

maior protagonismo à ACP (até aí t inha sido escamoteado pela Administ ração Pública) e,

simultaneamente, um repensar do est ilo de governação da própria Porto 2001 e CMP que

deixam de poder realizar o programa de revitalização de uma forma mais autónoma (sem

const rangimentos de tempo ou técnicos, associados à necessidade de estabelecer processos

de negociação e consensos com out ros agentes territoriais) e pondo em causa o própria est ilo

de t rabalho da Porto 2001, baseado em formas de decisão expeditas, sem envolver processos

de part icipação (que não os dos seus consultores técnicos). A publicação do enquadramento

legal do URBCOM não correspondeu às expectat ivas da Porto 2001 que contava com a criação

de condições de excepcionalidade na gestão do URBCOM para o Proj ecto de Revitalização

económica da Baixa Portuense. Segundo os próprios técnicos da Porto 2001, essas

expectat ivas t inham, de resto, sido criadas durante o processo negocial com a administ ração

cent ral, o que os levou a esperar “ o f inanciament o da t ot al idade do invest iment o, a criação

de est rut ura própria de gest ão, a condução do processo pela Port o 2001, S.A., et c.” Tal não

seria previsto ao nível das normas do URBCOM, o que veio a por em causa o próprio mot ivo

para que t inha sido criada esta “ Agência da Câmara Muncipal do Porto” : a agilização de

procedimentos e uma maior ef icácia na lançamento, adj udicação e execução de obras;

2. Outro factor que concorreu para a emergência de conflitualidade dent ro do partenariado

relacionou-se com a subst ituição da direcção da Associação dos Comerciantes do Porto,

que veio def inir um novo est ilo na liderança, mais act ivo e crít ico e colocar novas exigências

que, até esse momento, não eram previsíveis quer pela relat iva passividade da ant iga

direcção da ACP, quer pelo déf icit de mobilização que a Porto 2001 t inha imprimido no

partenariado. A ent rada em cena desta nova direcção, liderada por uma comerciante da

Baixa – Laura Rodrigues, e associada a uma est ratégia muito reivindicat iva viria a impor o

debate sobre a part ilha de poder e inf luência dent ro do partenariado e levantar out ro t ipo

de dilemas que se associam frequentemente a processos de part icipação: a dif iculdade em

manter compromissos ao longo do tempo, nomeadamente quando existe uma mudança dos

representantes das est ruturas, o dilema na representação em est ruturas associat ivas onde

existem diferentes secções de associados, em termos da at itude face à mudança, ao

invest imento, à reivindicação dos direitos de parceiros.

123 através da Portaria 317-B.2000, de 31 de Maio 2000 (ver Anexo). As normas do URBCOM não eram substancialmente diferentes das do anterior PROCOM.

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Quadro 3-3: Cronologia do programa de revitalização do comercio e serviços da Baixa

Cronologia Acontecimentos

Julho de 1999 Apresentação do Programa de Mobil idade para a Baixa do Port o – Cenário Prospect ivo (estudo definit ivo) pela Equipe Técnica à Porto 2001

Setembro 1999 Assinatura do Protocolo de Cooperação ent re Ministér io da Economia e partenariado para a Revitalização económica da Baixa. Início do Estudo Prévio do Programa de Revitalização do Comércio e Serviços da Baixa

Novembro 1999 Estudo Prévio ent regue informalmente ao Secretário de Estado do Comércio que negoceia algumas alterações

Maio 2000 Publicação do Regulamento do URBCOM – Portaria 317-B.2000

Junho de 2000 Ent rada em funções da nova Direcção da ACP. A Porto 2001, S.A. envia à Secretaria de Estado do Comércio a adenda ao Estudo Prévio e a Ficha Técnica de Candidatura ao Porj ecto de Urbanismo Comercial124, esta últ ima assinada por todos os parceiros, tendo estes documentos formalizado a candidatura da cidade ao URBCOM

Após a f inalização e apresentação do Estudo Global pela equipa técnica (em Julho de 2000)

sucedeu-se um momento de negociação, ruptura, impasse e de nova negociação conforme

procura ser, genericamente, sintet izado pelo seguinte quadro:

124 os signatários concordam com os objectivos que são apresentados (ponto 5): reforçar a posição e competitividade do tecido comercial da Baixa Portuense, modernizar as empresas comerciais e dotá-las de capacidades acrescidas em termos de gestão e marketing estratégico, renovar e reforçar as condições físicas e logísticas de apoio à actividade comercial na Baixa Portuense, qualificar o espaço urbano de suporte e contribuir para a consolidação de alguns sectores urbanos determinantes ao centro de cidade

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Quadro 3-4: Cronologia no relacionamento do partenariado

ACP Porto 2001 Julho 2000

ACP considera que, nas mais variadas reuniões em que esteve presente foi notória a falta de abertura da Porto 2001 para aceitar, de forma prát ica, as obj ecções de fundo que eram apresentadas pela ACP. ACP exige uma revisão do Programa de Mobilidade “ Rua a Rua”

Ent rega do Estudo Global pela equipa técnica (Quat ernaire Port ugal) Realização de sessões públicas com os Comerciantes da Baixa para apresentação dos resultados preliminares do Estudo Global. Apresentação do Estudo Global aos parceiros, reunião em que f icou decidido estabelecer um período até f inal de Setembro para que os parceiros analisassem os documentos e formalizassem sugestões tendo em vista a provação do documento

Agosto 2000 ACP cont inua a censurar o at raso na f inalização das obras, crit ica a Porto 2001 pela falta de abertura às suas reivindicações sobre o Programa de Mobilidade da Baixa e vai reafirmando os direitos legais que possui . Ruptura ent re ACP e Porto 2001

A Porto 2001 realiza de Agosto a Outubro de 2000 sucessivas reuniões com a ACP e UNIHSNOR a f im de apresentar e explicitara totalidade dos proj ectos de arquitectura referentes à Requalif icação Urbana “ Rua a Rua” Realização de act ividades preparatórios para a instalação do Gabinete da Baixa. Dent ro deste proj ecto específ ico, foi realizada a primeira reunião ent re os representantes das inst ituições parceiras (chegou a estar disponível um local para o gabinete)

Setembro 2000 A ACP chamou a si a condução dos proj ectos. A proposta que foi recusada pela ACP

De Set embro a Dezembro de 2000 a Porto 2001 desenvolveu um conj unto de contactos com as Comissões de Rua, que foi sendo intensif icado ao longo do período. Passa a considerar fundamental a interacção com estas comissões para o Programa de Revitalização Económica da Baixa

Outubro 2000 Em reunião promovida pela DGCC, foi sol icit ado à Port o 2001 SA que conj unt ament e com a ACP revisse o Plano de Comunicação e de Formação do Proj ect o, t ambém sol icit ou a ent rega de document ação que j ust i f icasse a inclusão de 3 novos arruament os: R.da Assumção, St o. Ildefonso e Sant o André. A DGCC aut orizou aos parceiros a colocação do Est udo Global em Consult a Públ ica ainda que sem a Aprovação Prévia concluída

Com a publicação da Alteração dos Estatutos da Porto 2001, SA – Decreto Lei 38/ 2001, a sociedade Porto 201, SA, beneficia da delegação de competências, direitos e obrigações da CMP e organismos públicos da administ ração cent ral, no âmbito de programas que concorram para os seus obj ect ivos e área de intervenção.

Janeiro 2001 Em reunião realizada a 9 de Janeiro, ACP apresenta à Porto 2001 o caderno reivindicat ivo e o parecer técnico que encomendou a out ra empresa sobre o Programa de Mobilidade para a Baixa

A Porto 2001 considera que o parecer técnico sobre o Plano de Mobilidade se resume a assuntos relacionados com o estacionamento, cargas e descargas e opção do sistema eléct rico

A ACP ent rega à Porto 2001 a Adenda Fevereiro 2001

Porto 2001 apresenta parecer à Adenda Março 2001

O Secret ário de Est ado do Comércio concova uma reunião a 5 de Março onde concede à ACP 45 dias para elaborar uma adenda ao Est udo Global a ser aprovada por t odos os parceiros

Julho 2001 CMP, ACP, UNIHSNOR e Port o 2001 decidem at ribuir a condução do processo à CMP

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Conforme se percebe da leitura do quadro anterior, com a ent rada em act ividade da nova

direcção da ACP, inicia-se um conj unto de crít icas à administ ração pública relacionadas com a

forma como foram planeadas e decorrem as obras, censurando-se os at rasos sistemát icos na

conclusão das empreitadas, sem correspondência com a calendarização prevista pela ACP e com

graves custos económicos para os comerciantes, que acusam a quebra acentuada de facturação

nos seus estabelecimentos125

Numa primeira fase a ACP exige o aumento no ritmo das obras (mais 1 turno de t rabalho e ao f im

de semana) e mais tarde indemnizações devido aos prej uízos causados pela simultaneidade na

execução de várias obras (segundo a ACP, porque a Porto 2001 t inha t ransformado a Baixa num

estaleiro durante um inverno muito rigoroso, e a situação dos comerciantes era insustentável

exigiam-se situações de excepcionalidade para os comerciantes (solicitação que viria a ser

dirigida à assembleia municipal, mais tarde assembleia da república e ainda dent ro do programa

URBCOM

Mais tarde o mot ivo de discórdia ent re direcção da ACP e a Porto 2001 relaciona-se com o t ipo

de soluções propostas pela Porto 2001 e CMP para o espaço público. Alegando que a intervenção

se baseia num programa de mobilidade que cont raria as actuais tendências de mobilidade do

mercado consumidor (propondo uma redução do estacionamento à superfície, diminuição de

faixas de rodagem que condicionam a f luidez do t rânsito , etc.) os comerciantes defendem que

estas não são soluções acertadas para inverter o processo de declínio da Baixa pelo que devem

ser revistas. Quando a ACP põe em causa o programa de mobilidade está a por em causa os

fundamentos que alicerçaram toda a est ratégia de revitalização da Porto 2001, nomeadamente

os proj ectos de arquitectura do espaço público (que se baseiam na est ratégia de mobilidade que

condicionou o regulamento do concurso de ideias) e a própria est ratégia de reabilitação infra-

est rutural do espaço público da baixa.

A direcção da ACP não concordando com esta formulação técnica da Porto 2001 e CMP decide

não subscrever a candidatura ao PROCOM para impedir que este modelo de cidade fosse

f inanciado por este programa, alegando ainda terem muito tempo para aj ustar ideias até ao f im

do IIIQCA (2006)

A ruptura inst itucional que ocorre dent ro do partenariado e que irá por em causa a candidatura

ao URBCOM (à compart icipação do invest imento publico e privado para a requalif icação da

est rutura comercial t radicional pelos fundos comunitários), e o f inanciamento de alguns

proj ectos de arquitectura do Programa de Renovação da Baixa punha, a j usante, em causa, a

125 Em Junho de 2000, em comunicado, a ACP afirma que as obras em curso na R. do Almada e Praça Filipe de Lencastre registam decréscimos da ordem dos 80 a 90%

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própria concret ização do programa de mobilidade (ex. reinstalação do circuito do eléct rico que

em f inais de 2001 corresponde a um conj unto descont ínuo de linhas)

Conforme se tornavam maiores as críticas à porto 2001, maiores eram as preocupações da Porto 2001 na sua

campanha promocional com vista não só a aumentar a informação aos munícipes como de publicitar que as

vantagens decorrentes das obras eram superiores aos custos que elas impunham. Com o título “uma nova cidade

vai nascer” esta campanha incluiu uma maior aposta no esclarecimento sobre as obras e a criação de meios para

receber sugestões da população. Por exemplo a instalação de uma caixa de correio no exterior do Edifício

Península (em frente escritório Porto 2001) e maior promoção no seu site da Internet.

Em síntese, a divergência dent ro do partenariado, nomeadamente ent re Porto 2001/ CMP e ACP,

era cada vez mais evidente relacionando-se com as diferentes visões do que deveria ser a Baixa

(uma percepção const ruída em diferentes horizontes temporais e interesses pessoais) e que se

concret izava, em termos prát icos, em diferentes ideias do que deveria ser o tamanho dos

passeios e das faixas de rodagem, o estacionamento à superfície, ou os principais factores de

at ract ividade a proporcionar à população (automóveis vs ambiente; sustentabilidade vs

movimento; eléct rico vs automóveis, etc.)126.

A determinada altura a divergência no partenariado incluia as diferenças quanto à própria

dist ribuição de poder de decisão e dos temas que deveriam ser integrados no processo negocial

relat ivo ao programa de revitalização da Baixa. Enquanto os comerciantes exigiam rever o

programa de renovação urbana “ rua a rua” (leia-se programa de mobilidade e aspectos formais

dos proj ectos de arquitectura para o espaço público com repercussões na act ividade comercial

da Baixa), a Porto 2001 considerava inaceitável esta exigência de reavaliar todas as decisões

urbaníst icas que estvam tomadas e que, em seu entender, eram da sua competência.

Se dent ro do partenariado o distanciamento ent re o sector público e privado foi crescente a

part ir do momento em os representantes do sector empresarial se confrontaram com o programa

de mobilidade, observava-se simultaneamente:

/ um distanciamento ent re os dois representantes do sector privado (associações do comercio

e a de hotelaria e restauração), que foi, de resto, pouco mediat izado, porque a UNIHSNOR,

ainda que não concordasse com o défcit de part ilha das decisões durante o processo,

considera a candidatura ao URBCOM deveria ser viabilizado pela ACP, por forma a

possibilitar a compart icipação dos invest imentos dos comerciantes que o desej assem fazer;

126 Enquanto a estratégia global definida pela Porto 2001, CMP e reafirmada pelo Estudo Global defende a ideia de transformar o centro da cidade, numa área sustentável, mediante uma forte aposta na intermodalidade de TP�s e desincentivo do transporte individual, e diminuição de estacionamento à superfície (que, no entanto, era acompanhado com a criação de parques de estacionamento, mas estritamente dos canais de circulação), os comerciantes querem que esta área beneficia de níveis de acessibilidade e estacionamento comparáveis com outras áreas comerciais concorrentes na cidade

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/ as divergências no sector da administ ração pública ent re presidente da Porto 2001 e

presidente Câmara Municipal do Porto, de resto bastante mediat izado pelos orgãos de

comunicação social graças às crít icas que estes mutuamente se dirigiam at ravés destes

canais, tendo resultado de um conj unto de circunstâncias durante o processo de execução.

A saber: o não cumprimento dos calendários previstos para as obras de renovação urbana na

Baixa gerou: crít icas da ACP à Porto 2001 e CMP (num período em que esta cont inuava a

inviabilizar a apresentação da candidatura da Baixa ao URBCOM,) seguidas por crít icas do

execut ivo municipal à gestão que a Porto 2001, que haveria de determinara a não

autorização da abertura de novas frentes de obras antes de uma reavaliação do execut ivo

(ref ira-se que, muito embora os proj ectos j á t ivessem sido antes aprovados pelo

execut ivo127, cabe a este orgão a função de gerir as obras no espaço público o que era

acompanhado de medidas como a alteração do t rânsito, colocação de sinalização, etc.);

/ o desgaste que sofreu o relacionamento pessoal ent re os responsáveis pela Porto 2001 e

C.M.P. decorrente, nomeadamente das dif iculdades associadas ao processo de

implementação das obras, ao período pré-eleitoral em que se vivia (o distanciamento à

Porto 2001 poderia ser uma manobra polít ica do execut ivo da CMP para afastar o ónus

polít ico da má gestão de interesses e t imings associados ao processo de requalif icação

urbana? De facto, da grande art iculação inicial ent re o execut ivo municipal e Porto 2001,

passou-se para um divórcio ent re a empresa e o accionista?), o que iria a def inir que o

execut ivo municipal decide-se não autorizar a abertura de novas frentes de obra enquanto

as obras em curso não est ivessem terminadas, a Porto 2001 crit ica-se as dif iculdades que o

execut ivo colocava à implementação do programa que ele próprio aprovou

A discórdia ent re o execut ivo municipal e Sociedade Porto 2001, viria por em causa o bom

relacionamento inst itucional ent re a empresa e um dos seus principais accionistas e gerar uma

aproximação est ratégica ent re a CMP e ACP que ocorre, não se pode ignorar, num período pré-

eleitoral.

127 a aprovação era, de resto, aprovada de forma expedida pelo prosidente e um pequeno grupos de assessores do executivo: que, de uma forma algo informal, diferente da apreciação mais tradicional que segue os procedimentos clássicos percorrendo os vários serviços municipais. Os contributos da própria equipe técnica da Câmara eram muito pontuais e desvalorizados face decisões Porto 2001 e aos pareceres das cúpulas da câmara. Esta situação viria a gerar algum desconhecimento dos serviços da câmara relativamente à tramitação das decisões, sendo pertinente colocar-se a questão sobre o tipo de receptividade que foi criada para os serviços da CMP assumirem os projectos após o fim da empresa Porto 2001, em meados de 2002.

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Quadro 3-5: A mediat ização da discordia na imprensa escrita

Cronologia Acontecimentos descritos pela imprensa (Público e JN)

24 Junho 2001 Cardoso opõe-se à abertura de novas frentes de obra por considerar que não estão garant idos os recursos f inanceiros para o efeito (nomeadamente ao nível do URBCOM que ainda não t inha sido subscrito pela ACP) e por exigir uma reprogramação para defenir o que poderia ser feito

Junho 2001 Teresa Lago considera “ incompreensível o procedimento de Cardoso, af irmando que só os f inanciamentos da Cordoaria e D. João I cabem nas verbas definidas pelo URBCOM. Afirmando que o presidente só quer criar dif iculdades muito embora t ivesse aprovado o “ lote das obras” para 2001 e crit ica os at rsos na f inalização dos parques de estacionamento das praças da Cordoaria e D. João I que não são da sua competência, mas at rasam o t rabalho de intervenção à superfície

28 Junho 2001 “ as int enções programadas para a Rua dos Clérigos e Praça da Liberdade f icam suspensas at é 3 de Julho, dat a em que será real izada uma reunião ent re Nuno Cardoso, Teresa lago e José Sasport es (Minist ro da Cult ura) com o obj ect ivo de se fazer um balança..” Públ ico

A est ratégia de aproximação da Porto 2001 a algumas comissões de Rua, (argumentando que

dialogava com quem queria resolver os problemas) e a vontade evidenciada por alguns

comerciantes em f inalizar as obras na sua área de act ividade gerou uma certa divisão interna

dent ro dos comerciantes, apreciando-se a existência de duas posições dist intas das comissões de

rua, face à posição assumida pela direcção da ACP:

/ os que alinhavam com a posição da ACP e at ravés de baixos assinados se manifestavam

cont ra o início das obras e implementação dos proj ectos previstos para as ruas onde

exerciam a sua act ividade empresarial – Comissão da Rua do Almada;

/ os que concordando com a posição da ACP assumiam uma posição mais pragmát ica –

Comissão da Rua dos Clérigos que se afastam da posição da ACP e CMP e pedem à CMP que

autorize a abertura da empreitada nesta área de forma a que as obras se realizem dent ro

da data acordada com a Porto 2001128, antes do período de Natal.

As Figuras 2 e 3 procuram de sintet izar a evolução conturbada das relações dent ro do

partenraiado de revitalização, podendo concluir-se de forma genérica, que exist iu pouca

concertação e entendimento tendo susgido a descoordenação e conflito j á referida.

128 A estratégia de aproximação iniciada pela Porto 2001 de diálogo com as comissões de rua, levou à assinatura de um protocolo entre os 30 comerciantes das Zona dos Clérigos e Porto 2001 para que as obras começassem a 18 de Junho e terminassem a 30 Outubro

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Figura 3-4: Alguns episódios no relacionamento no partenariado para a revitalização económica

da Baixa

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3.2.4 – Algumas conclusões sobre o processo de part icipação

A opção por uma descrição detalhada do processo de planeamento associado à formatação da

est ratégia de revitalização económica e de renovação urbana para a Baixa do Porto, como j á se

fez referencia, visou avaliar a inf luência exercida pela planif icação e condução do processo de

part icipação no de planeamento, nomeadamente em termos da sat isfação dos dest inatários e do

sucesso na implementação das propostas.

Se na parte teórica se t inha colocado a hipótese de que os programas formatados ao nível da

União Europeia inf luenciavam as prát icas nacionais, no estudo de caso analisado, que envolveu

especif icamente o programa Urbcom, observou-se o efeito negat ivo e cont roverso gerado por

legislação nacional ‘ had hoc’ que, não só, cont raria a tendência no direito à part icipação na

legislação de planeamento nacional vigente, como os princípios e regulamentos subj acentes à

at ribuição de fundos económicos pela Comissão Europeia.

A legislação publicada nacionalmente para agilizar procedimentos municipais que ignore os

princípios do direito à part icipação, concent rando poderes em empresas de planeamento que

ignorem os interesses territoriais pode gerar cont rovérsias com repercussões graves para o

sucesso das est ratégias de regeneração urbana.

Ent re uma legislação criada pelo governo cent ral e municipal para ‘ fazer obra’ e sem

preocupações pela legit imação dos processos de decisão e uma legislação comunitária que

postula uma real part ilha de poderes de decisão, nomeadamente ent re a administ ração pública e

o sector privado, com o obj ect ivo de catalizar melhores resultados para a modernização

económica da área obj ecto de intervenção e incent ivos, assist iu-se a uma recorrente divergência

na interpretação da lei, na interpretação do signif icado de part icipação ent re os partners

envolvidos

Ent re a precipitação da assinatura de um protocolo em vésperas de eleições sem ser precedida

por uma desej ável const rução de rot inas de t rabalho conj untas, de part ilha de ideias, de

const rução de diagnóst icos, cenários de acção conj unta, seguiu-se a desilusão do divórcio num

partneariado em que as divergências eram mediat izadas publicamente, em que os modelos de

poder e t rabalho hierárquicos impediam uma convergência que, durante meses, pareceu e foi

impossível (Anexo 13).

Para além das crít icas às decisões substant ivas da administ ração, muitos dos problemas dent ro

do partenariado relacionaram-se com questões metodológicas e processuais, gerando decisões

pouco consensuais e frequentemente conflituosas e polémicas.

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Out ro aspecto observado foi a forte inf luência das decisões polít icas sobre o processo de

intervenção urbana. A tendência para a tomada de decisão ser unilateral, def inida ao nível da

‘ cúpula do execut ivo municipal’ , dispensando um debate mais alargado com o gabinete técnico

municipal que, sistemat icamente, era ignorado durante o processo.

Por out ro lado, a desconcent ração de tarefas para a nova empresa ‘ municipal’ , sem uma

correcta interacção com a equipe técnica municipal, suscitava dúvidas relat ivamente ao nível de

coordenação na intervenção e gestão da cidade e, de sustentabilidade dos programas após o

terminus da Porto 2001, S.A., altura em que o gabinete técnico local virá a reassumir

competências anteriores. Em síntese, da operação Porto 2001, houve a lamentar um déficit de

coordenação e boas prát icas de relacionamento ent re o execut ivo muncipal com o seu gabinete

técnico local, mas tamb+em ent re o gabinete técnico e a Porto 2001. Observe-se, de resto, que

os principais estudos técnicos que viabilizaram as principais est ratégias da operação Porto 2001

foram formatados por equipas técnicas ‘ convidadas’ sem responsabilidades em termos da

implementação das suas propostas técnicas.

Verif icou-se, ainda, que o ‘ programa de encomentdas’ às equipes técnicas não beneficiava de

um alargado debate e consenso local, não tendo beneficiando de uma antecipada legit imação

social, nomeadamente dos partners dos programas.

Da diferente formatação das encomendas, por diferentes grupos de interesses, resultavam

diferentes soluções apresentados pelas equipes técnicas. O episódio mais paradigmát ico desta

situação foi o associado à discórdia sobre o modelo de mobilidade para a Baixa do Porto: duas

concepções diferentes do ‘ ideal’ de mobilidade para esta área (a da C.M.P./ Porto 2001 e ACP),

com entendimentos diferentes do modelo de mobilidade que poderia incrementar a

at ract ividade da área, originaram duas propostas substancialmente diferentes, mas que podem

ambas ser consideradas correctas do ponto de vista da fundamentação técnica.

Este exemplo releva, portanto, a importancia do t rabalho técnico ter sido const ruído sobre

hipóteses insuf icientemente debat idas e acordadas por todos os actores locais. Nesse sent ido é

fundamental o desenvolvimento de abordagens part icipatórias para a legit imação social

(comunidade, sector privado e público) das encomendas aos gabinetes técnicos, para evitar que

a insat isfação face aos proj ectos se repercuta em polémicas como a associada ao programa de

revitalização da baixa.

Em síntese, mais importante do que uma complexa e extensa fundamentação teórica parece ser

a const rução de bases sólidas de acordos relat ivos ent re grupos sociais diferentes, sendo para tal

fundamental iniciarem-se abordagens part icipatórias em estádios muito iniciais do processo de

planeamento, numa altura em que ainda existem margens manobra que permitam um debate

const rut ivo sobre o programa de ideias.

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Outras questões poderiam ser debat idas como a questão das responsabilidades polít icas em

processos de planeamento que envolvam agências privadas const ituídas exclusivamente por

capitais públicos e geridas por protagonistas que não são eleitos democrat icamente, mas que

têm uma elevada margem de discrecionaridade. Deste debate deveria sair uma clarif icação dos

responsáveis polít icos pela concepção e implementação do Programa de Act ividades, de forma

a evitarem-se est ratégias de aproximação/ distanciamento conforme os contextos pareçam mais

ou menos favorável/ desfavorável a colagem/ descolagem polít ica.

Ao nível da operação da Porto 2001 foi evidente, numa fase inicial do processo de decisão, a

enorme inf luência e aproximação ent re execut ivo municipal e Porto 2001, mas durante o

processo de execução do extenso programa aprovado colect ivamente por empresa e acionista

foi-se observando um distanciamento, principalmente quando as crít icas se agudizavam e que

se concret izou numa espécie de ruptura inter-inst itucional. Curiosamente, o partenariado foi

assinado, apressadamente, em vésperas eleitorais e o protagonismo polít ico municipal com

vista à resolução dos diferendos Porto 2001/ ACP ocorrem precisamente, por iniciat iva do

execut ivo municipal, também, em vésperas de eleições.

Deve invest ir-se mais na questão da gestão dos processos e da governância inst itucional de

longo prazo, uma vez que o tempo horizonte de planeamento não se compadece com os

calendários polít icos

Num sistema de governância local em que a est rutura de inst ituições se mult iplica (ent re

fundações, agências municipais, sociedades anónimas const ituídas por capitais exclusivamente

públicos ou semi-públicos, …) dividindo ent re si responsabilidades e competências que, por

vezes, se sobrepõe, quanto ao obj ecto social, a escala ou forma de actuação, é cada vez mais

importante a questão de como se processa a governância ent re si. É fundamental a criação de

redes de t rabalho inclusivas, de inst ituições e agentes territoriais, público, privado,

comunitário associado, cidadãos..,

No conceito de partenariado, que tem subj acente a existência de uma relação ent re parceiros

que são independent es ent re si torna-se fundamental uma maior aposta na formatação de

diagnóst icos e quadros de acção definidos localmente que permitam uma ref lexão e acção

ef icaz de vários actores, fundamentais para a obtenção do efeito de sinergia.

Em suma, a operação Porto 2001 most ra, claramente, que deve haver um maior invest imento

em prát icas de diálogo e rot inas de t rabalho int ra e inter-inst itucionais.

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3.3 – Requalif icação do Bairro do Cerco . um exemplo de part icipação

comunitár ia

Se na invest igação da “ est ratégia de regeneração urbana desenhada para a Baixa” , que, de resto

se viria a t ransformar numa intervenção dominantemente sectorial de ‘ renovação urbana’ , a

análise ao processo de part icipação correspondeu, quase em exclusivo, à avaliação do

envolvimento das inst ituições públicas e privadas, e dent ro deste às decisões, polít icas e

técnicas, dos responsáveis pelo programa (Porto 2001 e accionista C.M.P.), uma vez que ao

sector empresarial foi-lhe outorgado um papel inst rumental e a sociedade civil foi arredada do

processo129; j á no estudo de caso apresentado seguidamente, relat ivo ao proj ecto de

Requalif icação do Bairro do Cerco, a comunidade residente e as associações e inst ituições locais

são os principais protagonistas da part icipação

“Com o Projecto URBAN cofinanciado pela Câmara Municipal do Porto, estamos a trabalhar para melhorar a

qualidade de vida no Vale de Campanhã. E vamos fazê-lo consigo porque participar é isso mesmo – significa que

em vez de fazermos para preferimos fazer com a população, as instituições locais, as escolas, que só serão

verdadeiramente objecto deste projecto se forem, permanentemente, o seu principal sujeito”

Maria José Azevedo (Presidente do Conselho Executivo da Fundação para o Desenvolvimento do Vale de

Campanhã e Vereadora da Habitação da C. M. P.) in Port’Oriente130, nr. 0 ( Janeiro/Março 1997 2)

O carácter inovador deste proj ecto assentou, exactamente, nesta abordagem da administ ração

pública…” Fazer com a população, em vez de para a população…” , uma concepção que tem

subj acente a própria f ilosof ia de actuação do programa que f inanciou as intervenções – o

programa Urban131: um programa comunitário, cuj as principais característ icas são a

mult isectorialidade das intervenções orientadas para uma área específ ica e o reforço da

autonomia dos actores locais e, em part icular, dest inatários das acções132. Para tal, para além

de promover acções de formação prof issional con vista ao desenvolvimento cognit ivo desses

actores, capacitando-os para uma melhor integração prof issional e social, observa-se a aposta na

mobilização dos actores locais para a def inição, part ilhada, das est ratégias de revitalização

socio-económica. Preocupações, de resto, totalmente pert inentes se atendermos a que os

‘ territórios em crise’ , que são a missão do Urban, tendem a ser percepcionados pela população

de fora do bairro e descritos pela comunicação social, como “ áreas problemát icas” com

‘ consumo de drogas e fenómenos de marginalidade’ , o que gera para os residentes um

129 exceptuando os exemplos pontuais de sessões públicas de esclarecimento (designadas por debate), onde predominaram as metodologias de participação unidireccionais, de esclarecimento e promoção dos projectos urbanos selecionados e a executar para a baixa portuense, num momento em que se observavam estreitas margens de abertura para eventuais reformulações

130 Uma revista criada para ser um espaço aberto às sugestões da população e instituições do Vale de Campanhã. Caracterizou-se, no entanto, por apresentar predominantemente a informação sobre as iniciaticas da Fundação para o Desenvolvimento para o Vale de Campanhã

131 �Em 1989, a Comissão das Comunidades Europeias lança o primeiro Programa de acções inovadoras que, em três anos, haveria de levar ao documento �Europa 2000� e à definição da iniciativa comunitária Urban� (Sousa Lobo, 1997, p.77)

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sent imento desprest igiante e mesmo est igmat izante, perdendo o gosto pelo bairro ou mesmo a

sua auto-est ima.

Geddes (1999) num recente trabalho de investigação sobre o contexto de política social e económica da União

Europeia em que se desenvolvem os partenariados e os interesses envolvidos nos partenariados locais, observa

como a definição dos programas da UE se relaciona com as mudanças socio-económicas em curso,

nomeadamente novos padrões de desemprego, pobreza e exclusão social; a crítica às limitações dos mecanismos

de representação democrática e a necessidade de um envolvimento mais directo para lidar com complexidade dos

sitemas, dimensões das cidades, etc.

O obj ect ivo do empowerment é, de resto, implícito à ideia de implicar a população no seu

próprio desenvolvimento – “ a população deveria ser o suj eit o desse desenvolviment o…” , daí a

aposta feita pela administ ração no envolvimento da população, e seus representantes

associat ivos, na procura das soluções para uma requalif icação do bairro que sat isf izesse os seus

habitantes

Existiu ainda, no caso da Requalificação do bairro do Cerco, preocupação em explicar aos moradores, os ‘limites

de transformação deste programa comunitário, uma vez que ele não financia a requalificação dos espaços

interiores do edificado, que são propriedade da câmara, mas apenas as fachadas exteriores dos edifícios e os

espaços público envolvente. Face a estas limitações e à decisão da Câmara de só intervir em casos muito

pontuais, em situações em que se diagnosticava total impossibilidade dos inquilinos de as realizarem procederem

a essas obras por não possuirem recursos, muitas destas casas mantêm as fracas condições de habitabilidade a que

se associou a construção destes bairros nos anos 60, 70 não proporcionando á população algumas condições

mínimas de qualidade de vida133

Como refere Lyons et al. (2001) o obj ect ivo do empowerment pressupõe uma t ransferência

parcial do cont rolo das decisões para as comunidades e organizações locais e exige um processo

de capacit y building, isto é de const rução e gestão de competências.

Para Friedmann “ a abordagem de empowerment , que é fundament al para um desenvolviment o

al t ernat ivo, coloca a ênfase na aut onomia das t omadas de decisão das comunidades

t erri t orialment e organizadas, na democracia direct a (part icipat iva) e na aprendizagem social

pela experiência. O pont o de part ida é a local idade, porque é a est e escala que a sociedade civi l

é mais pront ament e mobil izável em t orno de t emas locais” (Friedmann, 1992: prefácio),

permit indo “ reequil ibrar a est rut ura de poder na sociedade, t ornando a acção do est ado mais

suj eit a a prest ação de cont as e aument ando os poderes da sociedade civi l na gest ão dos seus

próprios assunt os” (Friedmann, 1992, p.33), permit indo o incremento do poder social, polít ico e

psicológico do cidadão.

132 sobre os princípios e lógica de intervenção subjacente a esta iniciativa ver ponto 2.6.1 da tese

133 por exemplo a existência de banheira na casa de banho, só possuiam chuveiro em casas de banho de dimensões exíguas

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Friedmann outorga especial importância ao desenvolvimento da componentem mais pessoal e individual do

empowerment, definindo o empowerment psicológico como uma “percepção individual de força”, que se

manifesta “num comportamento de auto-confiança”, podendo resultar de uma acção “vitoriosa nos domínios

social ou político”, uma consequência da participação na vida colectiva, embora possa também resultar de

trabalho intersubjectivo (Friedmannn, 1992, p.35).

Por sua vez, Lyons et al. considera que um processo de empowerment pode ocorrer em qualquer nível da rede

social e organizacional devendo, por isso, valorizar-se o papel da aprendizagem colectiva

“Empowerment can take place at distinct organizational levels, ranging from individuals, through households to

communities. In both cases, we accept empowerment as being an increase in influence and control through an

acquisition of knowledge and skills” (Lyons et al., 2001, p.123)

Este é, de resto, o entendimento da f ilosof ia Urban sobre as formas de incent ivar processos de

inclusão social, daí a aposta que concede à formação e o desenvolvimento das capacidades dos

agentes e população local, à criação de redes de part ilha de informação (ao nível local, por

exemplo at ravés de foruns educat ivos locais e europeu, difundindo o exemplo de boas prát icas

de planeamento e gestão que são desenvolvidas a nível local), convindando a comunidade e

agentes inst itucionais para processos de decisão o que tem mot ivado ao ensaio de abordagens de

part icipação mais interact ivas e inovadoras do que as t radicionais.

Por esse mot ivo, optou-se por analisar o Sub-Programa Urban para o Vale de Campanhã e dent ro

do leque de act ividades desenvolvido, especif icamente, o proj ecto de requalif icação do Bairro

do Cerco, que esteve integrado num programa de requalif icação de bairros sociais, mais

abrangente, mas que foi caracterizado apresentado como “ um proj ect o exemplar no domínio da

requal if icação urbana” .

“A Reabilitação urbana do Bairro do Cerco do Porto constitui um bom exemplo do modelo de intervenção que

valorizámos. Baseou-se num projecto que respeitou um conjunto de etapas metodológicas que consideramos

essenciais e paradigmáticas de um programa de desenvolvimento social e urbano”

Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã (2001, p.119)

Neste ponto avalia-se esse carácter de ‘ exemplaridade’ , no que diz directamente respeito às

questões da part icipação nas formas de decisão da requalif icação. Para tal, ident if icam-se os

obj ect ivos do proj ecto de requalif icação do Bairro, com especial relevância para as questões

mais intangíveis relacionados com as metodologias de envolvimento comunitário. Ident if icam-se

as acções e iniciat ivas implementadas para a prossecução desses obj ect ivos e descreve-se o

envolvimento da comunidade e os potenciais resultados daí resultantes.

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No início do estudo foram colocadas algumas questões de part ida:

/ porque mot ivos se decidiu optar por uma est ratégia de envolvimento que comportava

custos adicionais (de tempo, f inanceiros, humanos,…), quando se poderia ter optado por

uma abordagem t radicional menos consumidora de recursos, associada à mera adj udicação

do proj ecto técnico de arquitectura, da empreitada e monitorização? Será que os resultados

decorrentes de um processo não part icipado seriam substancialmente diferentes, do ponto

de vista da qualidade das soluções propostas e sat isfação local, ou poderiam suscitar out ro

t ipo de gastos relacionados com a implementação ou manutenção das obras?

/ Em suma, porque mot ivos se decidiu gastar mais tempo e dinheiro para dialogar (perguntar,

ouvir, j ust if icar,) com uma população com habilitações académicas reduzidas, em que o

primeiro ciclo do ensino básico é o grau predominante e em que a grande maioria são

reformados ou excluídos do mercado de t rabalho?

/ Porque mot ivos se apostou num t rabalho de envolvimento comunitário com uma população

que é arrendatária de habitação municipal e em que o f inanciamento do proj ecto de

requalif icação se fazia por fundos comunitários ? Porque não se optou por um processo de

decisão expedito ao nível de um gabinete técnico e adj udicação de obra?

/ Valerá a pena adaptar a f ilosof ia de actuação do programa Urban (nomeadamente da

t ransversalidade das acções e criação de parcerias alargadas com especial destaque para os

dest inatários das intervenções) em est ratégias de regeneração urbana à escala nacional e

local?

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3.3.1 - Programa URBAN

“…Difficult living conditions aggravate the problems and distress of individuals. The social tensions involved

and the lack of economic prospects are therefore reflected in negative attitudes on the part of the inhabitants

towards their environment. This vicious circle is at the root of both conflicts and increasing imbalances,

particularly in those areas where these problems are most severe. The innovation proposed under the URBAN

programme is that it seeks to break this vicious circle by reasserting the value of the individual through and not

despite the individual’s environment…” (European Union, 2000, – Community initiative URBAN 1994-99: An

initial evaluation in http://inforegio.cec.eu.int/.)

Atendendo à concent ração de um conj unto de problemát icas diversif icadas com repercussões no

nível de criminalidade, tensão e exclusão social em zonas urbanas, onde são mais evidentes e

problemát icos os cont rastes sociais, a União Europeia, no início dos anos 90, decidiu lançar uma

inciat iva comunitária que designou por “ URBAN” para dar resposta ao fenómeno de degradação

urbana que se tem agravado na generalidade das cidades europeias e em áreas diferenciadas134

Os problemas que estas áreas evidenciam são problemas económicos, associados a um desemprego de longa

duração, formas de trabalho precário com baixos níveis salariais, …; demográficos, relacionados com as

consequências de pobreza extrema como a marginalidade ou baixos níveis de sucesso de escolaridade dos jovens,

…; ou funcionais, ligados, por exemplo, à monofuncionalidade de algumas áreas, por exemplo áreas com elevada

concentração de habitação social, como a envolvente ao bairro do Cerco, onde é evidente a carência ou elevados

níveis de degradação dos equipamentos sociais.

Segundo Andersen (2001) estes são problemas resultantes das próprias mudanças ocorridas na sociedade e são

favorecidos por uma inicial concentração de pobreza ou carência numa área que contribui para atracção

sequencial de novos problemas. O que quer dizer que a segregação de algumas áreas urbanas não é uma simples

consequência das características sociais dessas áreas, mas também o resultado de uma diferenciação social e

espacial: “These areas are not just a simple result of social inequality and segregational forces, they are also by

themselves creating new segregation and inequality. In these neighbourhodds strong self-perpetuating processes

have been started that by complicated mechanisms pull them into a down-wrd spiral from which they seldom

come up again by themselves “ Hans Andersen (2001, p.5)

No entendimento de Madec e Murard (1995) a exclusão, assim como a fractura social são noções bem práticas:

cada um de nós pode traçar uma fronteira entre aqueles que considera seus iguais e aqueles em relação aos quais

experimenta sentimentos mistos de desconfiança ou piedade decorrente ou não minimizada pelas decisões do

planeamento (Madec e Murard, 1995, p.7)

É um programa vocacionado para as áreas urbanas e para combater o início do referido processo

de cont ínuo empobrecimento, que revela fortes possibilidades da reprodução dos problemas, daí

ser designado por alguns autores por “ ciclo vicioso” (Andersen et al. , 2001, p.8) ou “ espiral” ou

134 do ponto de vista geográfico (centro, periferia, ..) e funcional (áreas residenciais, industriais, comerciais.)

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202

“ engrenagem de decl ínio” (Breda-Vásquez et al. , 2000:7), atendendo à forma como cada t ipo de

privação tem impacto nas restantes.

Uma t raj ectória de declínio que quando não é prevenida ou enfrentada a tempo, se pode

associar a elevados custos sociais e urbaníst icos, sendo, em situações de adiantada decadência

urbana, de dif ícil inversão, nomeadamente devido à dif iculdade de incent ivar o sector

empresarial a invest ir e criar emprego em áreas com reduzidos níveis de at ract ividade,

segurança ou poder de compra do mercado residente.

Como se expõe em Breda Vásquez et al. (2000) estes custos representam despesas suplementares para o

indivíduo e Estado, podendo contabilizar-se três tipologias diversificadas, mas complementares: custos sociais e

humanos, associados à perda de capital humano despoletado pela existência de fortes carências ao nível escolar e

de formação profissional que se podem repercutir em formas de exlusão do mercado de trabalho (principalmente

de trabalho formal) e se associam a situações generalizadas de baixos rendimentos, desemprego, quebra de

sentido cívico, degradação de infraestruturas públicas e privadas, crescimento de criminalidade urbana, etc;

custos económicos, relacionados com três aspectos diferentes: a dificuldade de mobilizar a iniciativa privada para

projectos de investimento, as despesas adicionais associadas a fracos níveis de conservação de infraestruturas

existentes e a esforços de requalificação urbana; e, por último, custos urbanos, associados não só à percepção da

área no todo urbano como as despesas que o indivíduo (residente, investidor) e a administração pública (local e

central) deverá despoletar para minimizar os efeitos negativos da área (Breda Vásquez et al., 2000, p.8)

Face a estas problemát icas e ao insucesso dos resultados produzidos pelas intervenções públicas

sectoriais, o Urban135, enquadrado, naturalmente, pelos princípios ou f ilosof ias de acção da

polít ica urbana europeia (de subsidaridade, sustentabilidade ambiental, igualdade de

oportunidades, coesão social, . .) def iniu como meta para a regeneração:

/ O reforço da prosperidade económica e o emprego, destas áreas procurando promover as

oportunidades de formação e a criação de emprego at ravés de uma acção em parceria com

os poderes polít ico, privado e comunidade

/ A inclusão social at ravés da capacitação da população at ravés acções de formação

prof issional, da provisão de serviços sociais, mediante a criação de uma rede de

equipamentos colect ivos ou apoio à rede de associações locais

/ A protecção do ambiente com vista a uma sustentabilidade local e global

/ A cont ribuição para uma boa governância local com base num quadro de parcerias

alargadas (público-privado-associat ivo) mais adequado para a coordenação e mobilização

dos diferentes t ipos de agentes e operacionalização das intervenções

135 das 115 operações piloto da iniciativa comunitária Urban desenvolvidas na União Europeia entre 1994-1999, seis foram criadas em Portugal, dirigindo-se quatro para a Área Metropolitana de Lisboa, tendo tido grande visibilidade a do Casal

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Em síntese, numa frase, o Urban procura a “ réhabil i t at ion économique et sociale des vi l les et

des quart iers en crise” 136, caracterizados por elevados níveis de desemprego, pobreza e

problemas sociais e ambientais, assumindo, para tal uma “ discriminação posit iva” destes

território mediante grandes f inanciamentos em domínios de intervenção diversif icada, desde os

“ materiais” aos “ imateriais” , permit indo o desenvolvimento de um modelo de intervenção mais

holíst ico, capaz de equacionar de forma integrada a intervenção simultânea nos vários domínios

problema destas áreas.

A saber, a reabilitação de infraestruturas obsoletas, a melhoria dos serviços sociais, o upgrade da qualidade

ambiental e combate à exclusão social, a dinamização do emprego local ou a formação profissional de forma a

aumentar os conhecimentos e as oportunidades dos residentes e capacitando-os para a resolução dos problemas,

vriando formas de cooperação com outras organizações e agentes interessados. Para tal, o Urban combina, ao

nível do financiamento, dois Fundos Estruturais: o FEDER - o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional,

criado para a redução dos desiquilíbrios regionais através de ajudas a investimentos produtivos e infraestruturas e

o FSE - Fundo Social Europeu, vocacionado para o financiamento de investimentos relacionados com acções de

recursos humanos, meios que poderiam ser, ainda, combinados com outras origens de financiamento. Como já

referimos os fundos disponibilizados por este programa não permitem intervir em todos os âmbitos, mas têm

contribuido para uma maior integração das acções empreendidas pelas autoridades nacionais e municipais na

preparação de estratégias urbanas globais

Trata-se, portanto, de um programa de auxílio (de emergência?) às autoridades públicas locais

que, em meio urbano, enfrentam dif iculdades f inanceiras para responder

à necessidade de proporcionar um número crescente de serviços a uma população com escassos

meios económicos e que vive em áreas cada vez mais degradadas por um est rutural

desinvest imento público e privado.

Com vigência entre os anos 1994 e 1999 o Urban I contou com um orçamento total de 600 milhões de euros para

o apoio a projectos piloto em cidades de grande e média dimensão (com uma população superior aos 100.000

habitantes), muito embora, em situações excepcionais outras áreas urbanas, com uma dimensão inferior a este

limiar, fossem integrada. As área beneficiárias deste programa deveriam ser áreas “em perda”, perímetros

geograficamente delimitados, caracterizados por uma elevada taxa de desemprego, baixos níveis educativos,

tecido urbano deteriorado, elevada percentagem de beneficiários de subsídios sociais, más condições de

habitação, falta de equipamentos sociais. (recolhido na Comunicação 96/C 200/04, de 10.07.01996)

Para para além de uma fonte de f inanciamento, este programa parece ser uma fonte de

esperança e inspiração para os que acreditam na importância de uma acção pública concertada

Ventoso, e duas para a Área Metropolitana do Porto, nomeadamente para a freguesia de S. Pedro da Cova (em Gondomar) e Vale de Campanhã.

136 European Commission Services in http://inforegio.cec.eu.int/

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204

com o sent imento comunitário, em modelos de desenvolvimento alternat ivo baseado em

processos descent ralizados, part icipados e f lexíveis137, capazes de tornar mais real a utopia da

inclusão e coesão social.

“…Some of the success of URBAN is due to its clear commitment to having residents of a neighbourhood

participate in the development and implementation of the programmes. Thus the citizens involved in the

measures participate in the decision-making process, and the problems of urban instability can be solved at

grassroots level due an atmosphere os trust and local consensus” (European Union, 2000, p.4)

“A intervenção Urban é, portanto, um instrumento de acção local, cuja filosofia de trabalho coloca em primeiro

plano os participantes e a participação. Ela foi concebida, desde a sua origem, com o contributo dos actores

locais, que identificam os problemas e as necessidades e sugeriam as respostas julgadas adequadas. Mais do que

pensar nas pessoas, o Urban foi desenhado a pensar com as pessoas…” (Fundação para o Desenvolvimento do

Vale de Campanhã , 1997, p.9)

“Com o URBAN ficou demonstrado que pode promover-se uma política urbana participada de base local e

integrando as múltiplas componentes que garantem um efectivo desenvolvimento social e urbano…”

(Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã, 2001, p.9)

137 �Assentes em modalidades de gestão que passam por um permanente diálogo interpessoal e interdisciplinar no diagnóstico, planeamento e execução, isto é, na tomada de decisão sobre o que fazer, como, quando e com quem fazer� (Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã, 2001, p.28)

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3.3.2 - Sub-Programa Urban do Vale de Campanhã

Integrado num programa e est ratégia de intervenção mais ampla para a parte oriental da

cidade138, o obj ect ivo de requalif icação do Vale de Campanhã visava produzir t ransformações ao

nível urbaníst ico e social, compensando défices de equipamentos e valências sociais, at ravés da

recuperação, criação e dinamização de espaços e serviços de apoio à população, de forma a

reduzir as desvantagens urbaníst icas, simbólicas, e culturais que caracterizam o sector mais

oriental do município do Porto.

Assim, o Sub-Programa Urban para o Vale de Campanhã integrou-se numa est ratégia de

intervenção mais vasta para esta área, baseada part icularmente na requalif icação do espaço

físico e equipamentos sociais. O Sub-Programa Urban é fundamental para o sucesso dessa

est ratégia, não só pela magnitude dos invest imentos que disponibiliza e que não exist iam ao

nível municipal, como pela aposta que faz em dimensões mais imateriais do desenvolvimento

(formação prof issional, inserção prof issional, desenvolvimento de redes de debate local, etc.)

“Reabilitar e requalificar uma vasta área urbana como o Vale de Campanhã, que atingiu níveis

excepcionalmente elevados de degradação urbanística, pobreza e exclusão social, constitui para a cidade

uma pr ior idade urbana e social inquestionável. É, igualmente, uma excelente oportunidade para ensaiar à

escala de um território alargado uma nova política de cidade e as suas respectivas modalidades de intervenção”

Maria José Azevedo, Presidente do Concelho Executivo da Fundação para o Desenvolvimento do Vale de

Campanhã (Fundação, 2001, p.9)

Segundo Geddes (1999), o conceito de ‘exclusão social’ reconhece não só a privação dos pobres, mas também a

sua incapacidade para exercer completamente os seus direitos sociais, culturais e políticos, verificando-se, em

situações de uma múltipla, persistente e um concentrado estado de privação, que pode estar em causa o estado de

coesão social, com repercussões para fenómenos de insegurança, marginalidade, etc. O conceito de exclusão tem,

de resto, subjacente a ideia de separação entre os que têm e não têm (recursos, emprego, aceitação social, etc.)

O quadro seguinte apresenta a cronologia de preparação e integração deste inst rumento na

est ratégia do município do Porto.

138 Uma estratégia que integra um amplo programa de projectos como os do domínio das comunicações viárias (por exemplo a construção da �Av. 25 de Abril� projectada para passar por cima da VCI e ligar as Praças da Flores e Corujeira), de âmbito urbanístico, como o conjunto de obras de requalificação da Zona do Freixo como a construção de um Complexo Lúdico e Tecnológico, a despoluição dos afluentes do rio Douro, a recuperação do Palácio do Freixo e o Museu da Indústria, etc.

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Quadro 3-6: Cronologia dos principais marcos de assunção do Vale de Campanhã

como área est ratégica de intervenção autárquica

1991-93: Elaboração do Plano Est ratégico do Vale de Campanhã

1994: Criação da Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã

1994: Candidatura ao Programa Urban

1995: Início da Concret ização do URBAN _Vale de Campanhã

Extraído e adaptado de GUERRA, P. (2001, p.76)

Após a elaboração do Plano Est ratégico que viabilizou a candidatura desta área ao Urban e a sua

aprovação, a Câmara Municipal do Porto criou a “ Fundação para o Desenvolviment o do Vale de

Campanhã 139, com o obj ect ivo imediato de operacionalizar o proj ecto associado ao Sub-

Programa Urban para o Vale de Campanhã, sem excluir, contudo, o desenvolvimento de out ras

iniciat ivas que concorressem para a esta missão social, que era a da gestão do Urban,

designadamente ut il ização deste programa para o desenvolvimento de intervenções com vista

reequilíbrio f ísico e socioeconómico do Vale de Campanhã, com repercussões para a qualidade

de vida da sua população.

Uma descent ralização de competências e serviços camarários para esta inst ituição que para

além de libertar a câmara de um acréscimo de t rabalho associada à gestão do novo programa,

permit ia a mobilização e coordenação de esforços ao nível horizontal e vert ical 140 com vista à

resolução de problemas concretos ident if icados localmente e, graças à disponibilidade e

proximidade da equipe técnica, resolvidos de forma mais ef icaz e adaptada aos contextos locais.

Em est reita sintonia e colaboração com o execut ivo municipal, nomeadamente com o Pelouro de

Acção Social e Habitação, a Fundação, const ituída por uma equipe j ovem e mult idisciplinar (de

assistentes sociais, sociólogas, ent re out ras, com experiência no Programa Pobreza 3, apoio

social em bairros, etc.) procurou uma aproximação ao tecido social e inst itucional e a

valorização da part icipação dos moradores. Alguns dos principais desafios da Fundação foram:

/ mobilização da população, nomeadamente de grupos t radicionalmente excluídos de

processos de decisão, para uma cidadania act iva e implicação em proj ectos de interesse

comum, nomeadamente para os de requalif icação e reconversão dos bairros

139 formalmente criada, como instituição de direito privado sem fins lucrativos e declarada de utilidade pública por despacho do Primeiro Ministro, a 9 de Dezembro de 1996 140 por exemplo para tornar possível, a favor do territótio de intervenção, a mobilização de um conjunto diversificado de serviços, que estão divididos por vários departamentos municipais - jardins, arruamentos, limpeza, habitação, desporto, etc.

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“a participação e a mobilização da comunidade era um fim, mas começou por ser um meio, uma condição

indispensável. Podemos afirmar que foi o primeiro objectivo e principal meio” (Fundação para o

Desenvolvimento do Vale de Campanhã, 2001, p.51);

/ implicação da população na const rução de soluções para os seus problemas, o que

pressupunha a desvalorização de uma lógica assistencialista e a valorização do potencial

local;

/ valor ização das pessoas como o principal recurso e actor do processo, em que o Urban era

apenas um contexto facilitador

“partimos do princípio de que melhorar as condições do meio, superar os défices existentes era importante e

necessário mas não suficiente; a mudança qualitativa mais importante passava pela valor ização do ‘capital

humano’, condição essencial de desenvolvimento.” (Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã,

2001, p.50);

/ const rução de consensos ent re inst ituições e associações locais, at ravés da criação de

espaços e tempo adequados ao efect ivo exercício da part icipação, que proporcionava

condições para que os agentes locais se auto-organizassem e f izessem ‘ mais, melhor e

diferente’ .

Sendo de destacar a criação de um Fórum associativo permanente que incluiu vários projectos dos quais se

podem destacar:

1. Encontros inter -institucionais: um projecto que consistiu em reuniões (quer nas sedes dos referidos

organismos quer na Quinta da Bonjóia) periódicos de elementos (quadros associativos e técnicos) das

instituições e serviços locais e envolveu a divulgação de iniciativas

2. Forum dos actores locais: uma iniciativa que consistiu num encontro annual em que se debateram temas

sugeridos pelos lideres das colectividades locais e em que se adoptou como estratégia a valorização do

trabalho desenvolvido pelos mesmos, a participação de oradores exteriores prestigiados (aos quais

dificilmente teriam acesso) e almoço/convívio que visava valorizá-los enquanto lideres da comunidade

local;

3. Forum da comunidade Educativa: com base em temas específicos ligados com a escola, desenvolviam-se

reflexões com a participação dos agentes educativos locais, que ajudavam a rede de escolas, dos vários

níveis, a definir os seus projecto educativos com base no contexto onde se inserem e do seu papel enquanto

agentes de desenvolvimento; etc.

Com base na planif icação de um conj unto de metodologias de part icipação de um sent ido, para

recolher ou vincular informação e interact ivas, para a const rução de consensos na resolução de

problemas locais, que foram implementadas ao longo de um conj unto sequencial de etapas,

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desde o diagnóst ico ao processo de avaliação de iniciat ivas141, a Fundação para o

Desenvolvimento do Vale de Campanhã desenvolveu uma metodologia de t rabalho part icipada,

em est rita interacção com o tecido social local, que viria a permit ir:

/ a elencagem dos actores e out ros recursos locais;

/ o depoimento das associações e inst ituições locais sobre os est rangulamentos ou j anelas de

oportunidade locais.

Por exemplo, logo na fase inicial da sua actividade, a Fundação promoveu um conjunto de entrevistas a todos os

actores do Vale de Campanhã, com vista à formatação do diagnóstico preliminar dos problemas e

necessidades locais a partir das várias perspectivas locais. Uma reflexão que seria mais tarde debatida pela rede

de associativa e institucional local viria a permitir uma identificação de recursos e dinâmicas sociais locais;

/ um enorme acesso a informação por todos, o que permit ia prevenir a prevenção de

eventuais focos de conflito relat ivamente ao programa de intervenção (observe-se como o

facto da intervenção concent rar a sua intervenção em obras de fachada poderia ser gerador

de potenciais focos de conflito e contestação da população residente em bairros

degradados);

/ a const rução de planos de acção dent ro de parcerias técnicas e inst itucionais;

/ a criação de uma relação de empat ia e confiança da Fundação com a rede de actores

locais que se iria repercut ir numa boa aceitação local;

Esta empatia era evidente pela forma afectiva como os residentes e utentes dos bairros (vendedoras ambulantes

ilegais, residentes, professores dos centros) reconheciam as técnicas da Fundação e lhe apresentavam os

problemas.

“o trabalho da Fundação assenta no pressuposto de que não existe desenvolvimento efectivo sem a implicação

das populações, sem o aumento da sua capacidade de auto-organização, sem pleno aproveitamento dos recursos

locais e sem a articulação com projectos e dinâmicas mais globais. Nesta perspectiva, a filosofia or ientadora da

intervenção pode definir -se por dois aspectos fundamentais: ser centrada nas populações (moradores,

colectividades e instituições locais) e enquadrada por um projecto mais vasto de desenvolvimento social

urbano.” (Virgínia Sousa, coordenadora técnica do projecto, 2001);

141 o inquérito e as entrevistas e para recolha de informação, por exemplo para a construção das acções de formação ou de informação e pomoção: o �Autocarro do emprego�. Ao nível das interactivas podem-se referir as reuniões com moradores sobre o projecto de requalificação do (envolveu a troca de ideias entre moradores e o arquitecto, primeiro à volta da maquete do ante-projecto e, complementarmente, no próprio local de intervenção, que viria a sugerir soluções para o consenso)

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/ a criação de est ruturas relacionais com um maior nível de coordenação, promovendo boas

prát icas de governância ao nível:

/ Horizont al : apoiando a const rução de espaços de part ilha de informação e de

conhecimento para a const rução e fortalecimento de pactos estabelecidos em

modelos de organização cuj o funcionamento era em rede (de escolas,

associações/ inst ituições locais)

“O modelo de intervenção que se propõe conjuga, num mesmo processo, a acção, a investigação e a

avaliação, sendo, por isso, aberto, flexível e interactivo. Ele deverá ser pensado, definido e redefinido

em função das dinâmicas que for capaz de desencadear, dos resultados que conseguir produzir, dos

conhecimentos que obtiver e da evolução dos acontecimentos e da realidade interna e externa em que

se opera e se insere” (Fundação para o Desenvolvimento do vale de Campanhã, 1997, p.9);

/ Vert ical : ent re município, fundação e actores locais, permit indo uma aprendizagem

colect iva de dois sent idos: de baixo para cima e de cima para baixo favorecendo

uma adequação das polít icas sectoriais lançadas de um nível superior

No fundo, favoreceu a criação de redes aprendizagem e t rabalho na sociedade, nomeadamente

no sector associat ivo, com um profundo conhecimento das dinâmicas locais, mas

t radicionalmente fora do alcance das economias estatal e empresarial, que era incent ivado a

capacitar-se para se tornar num cent ros de acção autónoma (Friedman, 1996) valorizando as

potencialidades endógenas locais. Em síntese, a Fundação para além das expectat ivas relat ivas

aos resultados imediatos e visíveis da operacionalização da componente f ísica do programa

esperava a criação de resultados mais intangíveis, mas com potencial para criar compet it ividade

local e inclusão social, como a criação de sinergias locais a part ir de um melhor sof t ware e

orgware local, i.e. prát icas de actuação e de organização locais.

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3.3.3 - A Requalif icação Urbana e Ambiental do Bairro do Cerco

Conforme j á se referiu, a invest igação realizada ao processo de requalif icação urbana do Bairro

do Cerco visou, em últ ima instância, avaliar as metodologias criadas e desenvolvidas com vista à

mobilização dos residentes para a part icipação neste processo de t ransformação, o que visou não

só prevenir eventuais tensões ent re as expectat ivas e as concret izações, como de legit imação e

apropriação das soluções por via de um processo de empowerment .

Para o prossecução destes obj ect ivos est ruturou-se esta apresentação em t rês pontos diferentes:

1. diagnóst ico do Vale de Campanhã142 e Bairro do Cerco, com especial destaque para a

caracterização do Bairro intervencionado, tendo esta sido dividida em dois pontos: o da

descrição dos perf is sociográf icos da população residente (realizada com base numa

invest igação académica na área de sociologia que, at ravés de um inquérito realizado à

população permit iu caracterizar com rigor cient íf ico esse universo demográf ico) e a de

descrição f ísica e funcional da área, com base em ent revistas à equipe técnica da Fundação,

análise documental, observação de campo e conversas informais com população residente;

2. ident if icação dos obj ect ivos gerais da requalif icação dos bairros sociais do Vale de

Campanhã e da sua inserção numa est ratégia de intervenção mais vasta para Campanhã;

3. análise das metodologias de part icipação desenvolvidas na concepção do proj ecto de

requalif icação do Bairro do Cerco, com especial ênfase para as act ividades incluídas no

proj ecto de “ Azulej aria Comunitária” .

A requalif icação do espaço envolvente a alguns bairros sociais localizados no Vale de Campanhã,

nomeadamente os bairros de Machado Vaz, Cerco e Lagarteiro, visava dar resposta a um dos t rês

domínios de intervenção est ratégicos seleccionados pela Fundação para reverter o declínio do

Vale de Campanhã: “ a melhoria das condições sociais básicas, ao nível do espaço urbano e dos

elementos ambientais (reabilitação urbana, requalif icação funcional dos espaços..) (Fundação

para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã, 2001, p.32), complementares aos restantes que

se apresentam na f igura seguinte.

142 com vista à análise do contexto territorial alargado onde onde se insere o Bairro do Cerco

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Objectivos geraisObjectivos gerais do

Programa Urban

para o Vale deVale de

CampanhãCampanhã

Requali

ficaç

ão fu

ncional

Requali

ficaç

ão fu

ncional

ee

revita

lizaç

ão ec

onómica

revita

lizaç

ão ec

onómicaReabilitação Urbanística e

Ambiental

Dinamizar sociedadeDinamizar sociedadecivil e civil e estruturasestruturas

associativas associativas eeinstitucionaisinstitucionais

Figura 3-6: Os obj ect ivos do Sub-Programa Urban para o Vale de Campanhã

Dos obj ect ivos gerais do Sub-Programa Urban para o vale de Campanhã, assumiu uma relevância

prioritária o da requalif icação urbana e ambiental, uma vez que:

/ técnicos e moradores concordavam na avaliação de que o estado de degradação do

edif icado era um dos principais problemas da área, circunstância part icularmente grave

atendendo ao nível económico da população arrendatária de habitação municipal;

/ a intervenção poderia produzir mudanças qualitat ivas imediatas na vida dos moradores,

reforçando o efeito posit ivo criado pela promoção de equipamentos mult ivalências na área,

quer ao nível de espaços educat ivos, associat ivos e sociais, quer at ravés da criação de

novos equipamentos sociais, como o Cent ro Comunit ário Casa das Gl icínias, no Bairro

Machado Vaz.;

/ a melhoria das condições urbaníst icas da área poderia repercut ir-se numa maior

at ract ividade da área face a “ out ros” grupos sociais e funções urbanas, também no

incremento da própria auto-est ima dos residentes;

/ a reconversão dos espaços envolventes aos bairros sociais, poderia ser um factor essencial

de revitalização da vida comunitária e de reforço das sociabilidades locais, graças a uma

melhor apropriação individual e colect iva dos espaços

Face este largo espect ro de oportunidades que se colocavam pela oportunidade de invest imento

público para o domínio da requalif icação física do exterior e envolvente dos Bairros sociais do

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212

Lagarteiro, Machado Vaz e Cerco, em que os principais beneficiários eram, naturalmente, foi

def inida uma ampla gama de obj ect ivos que iam desde o arranj o f ísico dos espaços (da pintura

do exterior dos edif ícios, criação de espaços verdes, de ringues desport ivos, de mobiliário

urbano, etc.), a melhorias funcionais (estacionamento, condições de realização do mercado de

levante) que, se esperava produzissem repercussões no domínio “ at itudinal” :

Obj ect ivos físicos:

Promover a recuperação do edif icado degradado e a valorização estét ica da envolvente

urbana;

Promover a recuperação e manutenção dos espaços verdes;

Obj ect ivos funcionais:

Eliminar as barreiras arquitectónicas e melhorar as condições de mobilidade da população

portadora de deficiência

Dotar os parques infant is e os j ardins que se encont rem degradados das condições que

possibilitem a sua (re)ut il ização

Criar processo de implantação de novos equipamentos urbanos, como os mercados de levante

e os quiosques, at ravés do apoio e acompanhamento da população envolvida

Criar um plano de manutenção e conservação part icipado pelos moradores at ravés, por

exemplo, de uma empresa de inserção

Art icular do obj ect ivo de requalif icação com o de animação cultural e desport iva do espaço

público com vista à criação de uma nova relação de sociabilidade ent re os moradores e com

o espaço de convívio

Obj ect ivos at itudinais:

Criar um processo dialogado que favoreça a auto-organização dos moradores e crie at itudes e

dinâmicas facilitadoras da preservação dos bairros

Preparar um programa de manutenção e conservação dos espaços reabilitado e promover o

processo de auto-organização dos moradores e de uma dinâmica

(Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã, Plano de actividades para 1999/2000 e 2001)

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Em suma, a recuperação da envolvente dos bairros sociais ult rapassava obj ect ivos est ritamente

de requalif icação física e reconversão funcional, integrando obj ect ivos mais imateriais

relacionados com uma desej ável mudança da percepção dos residentes em relação ao seu local

de residência, com vista a uma melhor apropriação e sat isfação face ao bairro, bem como uma

maior sustentabilidade das acções, mediante uma melhor conservação dos espaços reabilitados

pela população local.

Refira-se que para além dos problemas evidênciados pelo nível de degradação do bairro, o

território onde este se integra corresponde a um espaço onde se acumulam problemas conforme

se sistemat iza no quadro seguinte:

Quadro 3-7: Resumo dos problemas e recursos / dinâmicas locais do Vale de Campanhã

Problemas Recursos / dinâmicas

Económicos: declínio da indúst ria local; taxas de desemprego e de desemprego j uvenil muito superiores à média da cidade e região Norte; precariedade do emprego e t rabalho informal ou subterrâneo muito generalizados;

Sociais: elevada incidência de pobreza e de exclusão social; desqualif icação simbólica da área face à cidade (est igmat ização da população); problemas de consumo e o t ráf ico de drogas;

Educação e formação prof issional: taxas elevadas de insucesso escolar e de abandono precoce da escola; elevada percentagem de act ivos sem a escolaridade básica e sem um mínimo de qualif icação prof issional;

Urbaníst icos e ambientais: elevada concent ração de habitação social; acentuada degradação do edif icado, da envolvente urbana e dos espaços verdes; problemas de insalubridade e saneamento básico; descont inuidade física relat ivamente à malha urbana envolvente (fenómenos de guet ização)

Equipamentos sociais: insuf iciência quant itat iva e qualitat iva de equipamentos e serviços de apoio social

Existência de uma est rutura etár ia relat ivamente j ovem

Existência da maior mancha verde cont ínua da cidade do Porto;

Valioso pat r imónio arquitectónico, incluindo vários edif ícios notáveis (palácios e out ros)

Histór ia e t radições culturais locais muito r icas;

Tecido associat ivo local extenso, diversif icado e com muitas t radições;

Vários programas e proj ectos de renovação e requalif icação da zona oriental

Num diagnóst ico em que os est rangulamentos se sobrepõem aos recursos, eles próprios

frequentemente subaproveitados, mult iplicavam-se um conj unto de problemas com origem na

própria sociedade143 ou em polít icas do estado inef icientes, como as associadas aos consecut ivos

143 Por exemplo nas transformações ocorridas, particularmente a partir dos anos 70, na esfera produtiva, associada à modernização do tecido produtivo e flexibilização de mercados de produção e de trabalho, que gerararam, no seio de uma

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programas de realoj amento municipal, geradores do “ estendal de patologias sociais”

anteriormente ident if icado.

Mercê esses programas de realoj amento de est ratos de população insolvente, que na sua maioria

morava no cent ro do Porto, em ilhas ou barracas, o Vale de Campanhã tornou-se, apart ir dos

anos 60/ 70 na área mais densif icada de bairros sociais do Porto, concent rando 1/ 3 dos bairros do

município e uma população est imada em 12 mil pessoas.

Esta área de acentuada degradação do edif icado e espaço envolvente aos bairros sociais

(designadamente de j ardins e mobiliário urbano), tem resultado, de resto, da ausência de

programas adequados para a conservação destes áreas municipais e do da relação negligente que

muitos moradores mantêm com o espaço em que habitam.

Para além de consequência da desinserção social e pobreza da população residente, a

degradação do bairro favorece também a exclusão social dos que aqui residem para a população

exterior ao bairro e, por consequência, para a residência que se sentem est igamat izados e

isolados social e urbaníst icamente

Segundo Guerra, I. (1994) os moradores de bairros sociais sentem com intensidade o estigma de viver num

bairro, não porque assumam em si um estatuto desviante, mas porque interiorizam essa imagem pública

socialmente desvalorizada.

Em part icular o Bairro do Cerco144 onde estão recenseados, cerca de 3.050 habitantes revela

alguns graves problemas sociais que foram confirmados por um recente inquérito desenvolvido e

aplicado pela socióloga Guerra, P. (2001) (ent re Junho e Julho de 1996) a um total de 509

pessoas, mediante processos de amost ragem cient íf icos, de onde resultou o seguinte perf il da

população residente:

população operária com baixos níveis de instrução e formação, com uma capacidade limitada de reconversão e adaptação a novas formas de produção contextos de elevados níveis de desemprego de longa duração, com repercussões no plano social, como fenómenos de marginalidade ou toxicodependência, etc. 144 Composto por 34 blocos e 892 fogos, construídos entre 1963/91

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Quadro 3-8: Perf il sócio-económico dos moradores residentes no Bairro do Cerco

‚ 77,2% sexo feminino

‚ 44,8% tem mais de 60 anos

‚ 68,4% são casados ou vivem em união de facto

‚ 50,7% pertencem a grupos const ituídos por 2-4 elementos

‚ 73,5% são naturais do concelho do Porto

‚ 60,3% têm na sua maioria 1º Ciclo do Ensino Básico

‚ 50,7% abandonaram o sistema de ensino quando t inham 9-12 anos porque era necessária a sua colaboração no orçamento domést ico

‚ 50% subsistem com uma pensão de reforma

‚ 40% são operários, art íf ices e t rabalhadores similares, 30,4% t rabalhadores não qualif icados

‚ mais de metade exerce ou exercia prof issão no concelho do Porto

‚ 63,4% inserem-se no lugar de classe do operariado indust rial

‚ 61,1% auferem mensalmente um rendimento que não ult rapassa 49 mil escudos

Fonte: Guerra, P. (2001)

As característ icas que ressaltam da caracterização da população residente são a baixa taxa de

qualif icação escolar e a predominância de prof issões pouco qualif icadas e socialmente

desvalorizadas, o que esteve grandemente condicionado por uma dinâmica de vida marcada,

desde muito cedo, por dif iculdades e const rangimentos e que se reiteram no actual ciclo de vida

(Guerra, P, 2001, p.196).

Segundo Guerra, P. (2001) “estamos perante um perfil sociográfico, na generalidade, marcado por uma situação

de exclusão, porque conjuga e congrega um cumulativo de situações objectivas de carência (emprego,

rendimentos, recursos escolares, etc.), mas também, um conjunto de constrangimentos simbólicos de existência

(aspirações escolares e profissionais, fechamento e redução das condições sociais, fechamento e imobilismo

geográfico)” (Guerra, P., 2001, p.197)

O inquérito realizado permit iu ainda ret irar out ras conclusões sobre a percepção desta

população relat ivamente a um conj unto diversif icado de questões. Por exemplo a opinião dos

moradores de que este bairro evidencia uma má imagem para o exterior (muito embora

considerem que é pior a de out ros bairros, por exemplo S. João de Deus) o que é associado ao

consumo e t ráf ico de drogas, com repercussões para o ambiente social (conflitualidade

existente) e ambiente f ísico do Bairro (degradação) e com responsabilidades para a Câmara

Municipal que é senhoria do Bairro e tem negligenciado a sua conservação. Os moradores são

ainda responsabilizados por revelarem alguns comportamentos conflituosos (Guerra, P., 2001).

Relat ivamente à sua situação face ao sistema polít ico, consideram situar-se numa posição

‘ marginal e exterior’ , o que, em sua opinião, os prej udica relat ivamente ás prioridades que

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hierarquizam. Existe, portanto, uma at itude de desconfiança e descrédito face aos orgãos de

poder, o que se associa, segundo Guerra, P: (2001), “ a uma reivindicação de t ratamento

preferencial e diferenciado” , o que “ não pode ser dissociado da interiorização de um status

inferior e de uma certa incapacidade na mobilização de recursos (polít icos, simbólicos, culturais,

etc.)” (Guerra, P, 2001, p.389).

Os residentes no Bairro revelaram, ainda, ter um escasso conhecimento do sub-Programa Urban

para o Vale de Camapnhã, tendo, no entanto, de algumas medidas concretas em curso, como a

recuperação das casas ou o fomento da act ividade desport iva.

Tal desconhecimento está, em parte, associado a um déficit de part icipação cívica, como nota

Guerra, P. (2001):

“A adopção de atitudes de inércia e de ausência de protagonismo é um fenómeno transversal à globalidade dos

indivíduos que foram inquiridos. O desinteresse face á participação e gestão conjunta da vida do Bairro pode ser

confirmado pela percentagem insignificante de inquiridos que declara participar em reuniões de moradores nos

seus blocos. As razões aventadas prendem-se com o individualismo das pessoas e com a inexistência de hábitos e

rotinas ao nível da discussão e defesa de interesses comuns. Paralelamente, os moradores revelam ainda um

desinvestimento face às dinâmicas e estruturas associativas do Bairro. Vislumbra-se, neste contexto, um

fenómeno de ‘desafiliação’ associativa, dada a baixa taxa de adesão às associações” (Guerra, P., 2001)

Uma situação que se relaciona com três motivos principais: o desinteresse face às actividades promovidas pelas

associações, a falta de credibilidade dessas associações145 ou a falta de disponibilidade dos cidadãos do Cerco

que percepcionam, no entanto, as mais valias destas associações para a animação da vida local:

“Apesar deste afastamento face ao tecido associativo local, as associações são apreciadas como muito

importantes para o Bairro, porque ajudam a resolver os problemas das pessoas, fomentam o convívio e inter-

ajuda e projectam uma boa imagem para o exterior. Nesta resposta evidencia-se uma mitigação entre o ser e o

dever ser, a sua importância justifica-se não no plano das realizações efectivadas, mas das funções idealizadas”

(Guerra, P., 2001, p.390)

Também no respeitante ao diagnóst ico do Bairro do Cerco, mas agora da perspect iva da

Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã, o Quadro 3-9 aprofunda alguns

problemas, f ísicos e sociais, a que j á f izemos referência.

145 por exemplo: Futebol Clube do Cerco do Porto; Clube de Pesca do Bairro do Cerco do Porto; Associação para o Desenvolvimento Comunitário do Cerco do Porto

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Quadro 3-9: Principais problemas do Bairro do Cerco

Sociais Físicos

Forte concent ração de grupos sociais vulneráveis, com baixos níveis de inst rução, recursos económicos e de inserção prof issional146

Existência de fenómenos com grande visibilidade de marginalidade/ delinquência e t ráf ico e consumo de droga

Fracos níveis de escolaridade e elevado insucesso escolar

Monofuncionalidade e fragilidade da base económica local

Elevado desemprego ou emprego precário, que, para além de ser um factor de empobrecimento das famílias pode desencadear certos comportamentos desviantes e ant i-sociais, principalmente nas camadas mais j oves.

Concent ração de habitação social com fracos níveis de qualidade (ex. fogos sem banheira)

Degradação física dos edif ícios e sobrelotação das habitações

Fraco nível de organização na conservação dos espaços, pela ausência de uma gestão do condomínios (por exemplo ao nível de limpeza) dos espaços colect ivos

Espaços públicos em situação de abandono, servindo de depósitos de lixo sem fruição pela população a não ser por grupos de j ovens com comportamentos divergentes

Falta de iluminação das ruas e espaços públicos

Carência de infraest ruturas e de t ransportes de art iculação com o meio envolvente que acentua o efeito de ghet to

Para a est ratégia de reconversão e requalif icação do Bairro do Cerco a Fundação para o

Desenvolvimento do Vale de Campanhã concebeu uma metodologia de t rabalho part icipado nas

várias etapas de acção, que foram realizadas ent re 1997 e f inais de 2001.

Quadro 3-10 : Fases da concepção est ratégica e emplementação do Bairro do Cerco

Etapas de intervenção Act ividades / iniciat ivas

Diagnóst ico e planeament o de int ervenção

Reuniões com as associações, inst ituições e serviços locais para conhecer as suas perspect ivas e prioridades;

Observação e estudo das modalidades de apropriação dos espaços públicos por parte dos seus residentes;

Exposição, apresentação e discussão pública dos proj ectos de arquitectura;

Contactos informais e difusão de informação j unto dos residentes sobre as acções planeadas;

At ravés do “ autocarro do emprego” presou-se informação e apoio a grupos específ icos e esclarecimentos sobre o Urban

Requal if icação f ísica e animação dos espaços reabil i t ados

Execução do plano de reabilitação física dos blocos e de requalif icação dos espaços exteriores (zonas verdes, desport ivas, espaços comuns e arruamentos);

Implantação de mobiliário urbano, criação de parques infant is e de áreas desport ivas;

Desenvolvimento de um proj ecto de azulej aria comunitária no âmbito do processo part icipado de reabilitação do Bairro do Cerco do Porto;

Dinamização de um programa de animação cultural cent rado na (re)apropriação de espaços reabilitados

Adaptado Fig. 6 de publicação da Fundação para Desenvolvimento para Vale de Campanhã (2001, p.69)

146 Guerra (2001), refereindo-se aos bairros sociais do Vale de Campanhã refere, ainda, uma sobrelotação dos alojamentos que constitui factor de desconforto e gera uma degradação mais rápida da habitação, para além de violência e promiscuidade

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Segundo a própria ent idade promotora, a recuperação e manutenção dos espaços públicos do

Bairro do Cerco, envolveu uma est rat égia pedagógica e mobil izadora da população local,

desenvolvendo para tal metodologias de decisão f lexíveis e part icipadas que poderiam faci l i t ar a

apropriação do “ novo bairro” .Tal est ratégia assentou:

Na valorização das necessidades e aspirações da população residente, mediante a sua

implicação no processo de concepção da t ransformação do bairro (1999a), para tal foi

realizado um inquérito directo e, acompanhado em diferentes momentos, por um plano de

informação/ formação dirigido aos diferentes agentes envolvidos;

Na mobilização abrangente de actores e recursos, com destaque para a art iculação que se

procurou fazer em termos inst itucionais, com a administ ração local, colect ividades, escolas,

e inst ituições part iculares, procurando encont rar soluções consensuais que fossem

reconhecidas e assumidas pelos diferentes actores (Câmara Municipal do Porto, Associações

locais, Moradores dos bairros, Junta de freguesia de Campanhã, QUERCUS, Dirigentes

Associat ivos, Moradores dos Bairros, Cent ro de Paralisia Cerebral, Escolas);

Numa est ratégia de requalif icação part icipada, tendo envolvido as seguintes fases:

1. Fase de planif icação

Realização de inquéritos à população para reconhecimento do espaço físico e humano do bairro,

complementado por ent revistas dos técnicos da Fundação às associações locais. São planif icadas

as metodologias de part icipação e avaliados os custos da requalif icação, atendendo ao estado de

conservação da área. A equipe de arquitectura convidada (do Arq. Virgínio Mout inho) para o

desenvolvimento do proj ecto de requalif icação, part icipa em reuniões de diagnóst ico com

representantes locais.

2. Fase programação - tt rraabbaallhhaarr aa ppooppuullaaççããoo ee ccoomm eellaa:

Realização de reuniões conj untas ent re a equipe técnica de arquitectura, Fundação e redes de

actores locais (associações – ex. Quercus, escolas e inst ituições locais – ex. Representante Junta

de Freguesia) na fase dos obj ect ivos do programa147. O proj ecto de azulej aria comunitária

147 Relativamente a estas reuniões de trabalho com uma diversidade de actores locais, a Drº Virgínia Sousa, directora técnica da Fundação, relevou como aspectos mais importantes: a forma como os participantes foram perdendo os preconceiros entre si, a sua importância por terem sido levantados problemas ao programa e, mais tarde, na fase de consulta ao ante-projecto. Concretamente, foram levantados problemas objectivos, como o da localização do mercado de levante e simbólicos como o da reabilitação de uma fonte. Estes e outros aspectos foram discutidos, em grupo com a equipe de arquitectos, no local

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envolve reuniões preparatórias com professores e animadores (de escolas locais de 1º, 2º ciclo,

ATL e cent ro de dia) que planif icam o proj ecto.

3. Fase proj ect ual

Desenvolvimento do proj ecto pelo arquitecto. Para além do reordenamento f ísico e dos espaços

comuns, mediante a reabilitação de j ardins, mobiliário urbano, espaços infant is etc; foi

encomendada a criação de equipamentos para o bairro de forma a minimizar-se a sua mono-

funcionalidade e promover a sua abertura à cidade. Para além da criação de quiosques no praça

cent ral e criação de instalações para a realização de uma feira semanal148, criaram-se áreas de

desportos radicais, recantos para out ras prát icas desport ivas e um anfiteat ro ao ar livre com

polidesport ivo.

Nesta fase, ao nível das escolas, iniciou-se o desenvolvimento do proj ecto de azulej aria. Com

implicação dos agentes educat ivos, os j ovens produziram desenhos para posteriormente serem

colocados nas empenas dos blocos.

4. Fase consult a

A apresentação do ante-proj ecto foi feita primeiro at ravés de plantas, e complementado com

uma maquete. Durante um mês foi debat ido com populaçã e associações locais.

Técnicas de serviço social, asseguram, bloco a bloco, a sua explicação à população residente no

bairro. Uma das questões a negociar era a normalização das marquises que t inham de passar a

obedecer a um determinado modelo.

Nas escolas foram apresentados à comunidade, os t rabalhos dos alunos no âmbito do proj ecto de

azulej aria e procedeu-se à selecção dos t rabalhos

5. Fase de execução

Execução do proj ecto de reabilitação dos edif ícios, mediante a reparação telhados, subst ituição

de caixilharias, encerramento lavandarias e pintura com cores fortes. A aplicação de paineis de

azulej os, criados pelas crianças, nas empenas e em algumas fachadas dos edif ícios, que permit iu

a sua diferenciação, bloco a bloco.

148 ainda não estão em funcionamento, porque estes quiosques foram construídos em terreno da camara pelo que t~em de ser submetidos a concurso público para a adjudicação daqueles espaços.

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Para além da execução física dos proj ectos, procedeu-se à const ituição informal de parcerias

necessárias para o funcionamento dos quiosques e mercado de levante e para a const ituição de

uma empresa local para a manutenção dos j ardins.

Em síntese, a requalif icação estét ica e funcional do Bairro do Cerco, procurou, não só uma

requalif icação física como uma genuína mudança de at itude dos residentes face ao seu bairro,

implicando-os na concepção e desenvolvimento das melhorias que aí se promoveram e se

baseavam:

/ numa aposta em soluções de qualidade arquitectónica que rest ituissem a dignidade ao

bairro e marcasse uma ruptura com anteriores conceitos e aitudes (daí a aposta em cores

fortes e alegres);

/ numa reabilitação em extensão e profundidade, integrando a requalif icação exterior dos

blocos habitacionais, renovação e reorganização dos espaços públicos, das est ruturas de

apoio à animação (espaços para j ovens: ringues, diversão infant il,…), ou o envolvimento de

escolas e colect ividades;

/ na animação do espaço público, desenvolvido at ravés de um programa lúdico e cultural

focalizado na praça cent ral;

/ na criação de um esquema de manutenção dos espaços e j ardins da responsabilidade da

empresa de inserção j ardins e ofícios.

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3.3.4. – Análise dos resultados

O balanço da requalif icação do Bairro do Cerco, realizado pela Fundação para o Desenvolvimento

do Vale de Campanhã, no encerramento do Sub-Programa Urban, em Junho de 2001, na Quinta

da Bonj óia, relevou os seguintes aspectos:

/ ident if icação da população em relação à forma como ocorreram as t ransformações no seu

bairro;

/ o usufruto do espaço público, nomeadamente as crianças nos parques infant is, os j ovens no

ringue com bancadas e balneários e no espaço de j ogos radicais;

/ a comodidade com que se circula nas ruas, nomeadamente as pessoas com deficiências

f ísicas, da qualidade, estét ica e funcional e do mobiliário urbano;

/ a animação gerada para o espaço cent ral do bairro;

/ a expectat iva de realização da feira semanal do bairro, podendo ser factor de at racção

para população exterior ao bairro.

Quadro 3-11: Os resultados das várias etapas na intervenção no Bairro do Cerco

Etapas de intervenção Resultados

Diagnóst ico e planeamento de intervenção

Planeamento part icipado e amplamente discut ido, nomeadamente relat ivo ao proj ecto de regeneração do bairro

Concret ização de um proj ecto inovador e exemplar nos seus métodos e processos

Produção de um efeito mult iplicador em consequência da art iculação de um programa urbano com intervenção social, at ravés do diagnóst ico da situação face ao emprego e do planeamento e execução de acções no domínio socioeconómico

Requalif icação física e animação dos espaços reabilitados

Requalif icação efect iva da imagem física e simbólica dos bairros alvo de intervenção urbana;

Apropriação posit iva dos novos espaços e revitalização das sociabilidades e dinâmicas comunitárias;

Const ituição de um grupo de j ovens implicado no programa de animação e revitalização cultural;

Reforço signif icat ivo do “ gosto pelo bairro” e da ident idade local resultante do efeito de personalização dos blocos habitacionais devido à implantação de painéis de azulej os concebidas pelas cr ianças e j ovens residentes

Adaptado Fig. 6 de publicação da Fundação para Desenvolvimento para Vale de Campanhã (2001, p. 69)

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3.3.5 –Aprendizagens e lições para o futuro

A part ir do estudo de caso analisado, conclui-se que o envolvimento dos actores em processos de

intervenção urbana, mediante uma part ilha de obj ect ivos e soluções, se assume como um factor

decisivo para o sucesso dessas operações, não só no curto prazo, como para assegurar a

manutenção dos resultados ao longo do tempo, graças a uma maior sat isfação e ident if icação

dos dest inatários, com os resultados das intervenções.

De facto, a incursão de metodologias de part icipação no urbanismo e planeamento em geral

revelam a potencialidade de envolver uma população t radicionalmente excluída, e de assegurar

uma formatação de soluções mais aj ustada às necessidades locais e uma ‘ renovação’ dos direitos

da cidadania capaz de promover uma maior inclusão social, com repercussões para o nível de

segurança urbana.

Para além de permit ir encont rar o ‘ espírito dos lugares’ , o planeamento colaborat ivo, mediante

as suas metodologias de ‘ ouvir e dialogar’ com ‘ os out ros’ , pode cont ribuir para uma melhor

relevância e resposta das est ratégias de regeneração urbana às situações de pobreza e privação

múlt ipla de que padecem algumas áreas.

O Bairro do Cerco coincidente com este diagnóst ico, beneficiou da integração da componente da

part icipação no processo de planeamento, o que permit iu relevar algumas das dimensões

posit ivas deste Bairro: a criat ividade e o interesse dos j ovens que part iciparam num proj ecto de

azulej aria comunitária que viria a permit ir a ident if icação ‘ única’ de cada bloco; a explicitação

de aspirações e necessidades da rede de associações locais que permit iu um melhor

aproveitamento dos espaços públicos do bairro, a part icipação da rede das escolas local que

permit iu momentos de interacção e de procura de soluções educat ivas comuns, a ident if icação

de novas funcionalidades para o bairro, a part ir de dinâmicas locais e tendo em vista o obj ect ivo

de at rair a visita de novas pessoas ao bairro (mercado, feira, praça de animação, etc.)

Acrescente-se, ainda, que a requalif icação do Bairro do Cerco, integrada na intervenção

promovida pelo Sub-Programa Urban para o Vale de Campanhã, é reveladora da forma como os

princípios da União Europeia afectam os modos de governância local, sem, contudo, os

predeterminar à part ida.

Para além de um alargamento dos recursos disponíveis para o invest imento em proj ectos de

regeneração urbana locais, este programa promove de forma ef icaz o princípio da

subsidariedade, mediante est ratégias desenhadas a part ir do envolvimento da população e

inst ituições locais at ravés de abordagens da administ ração bot t om-up.

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Para além da inf luência posit iva suscitada pelos princípios do programa Urban, deve destacar-se,

a atenção colocada pela equipe técnica da Fundação para o Desenvolvimento do Vale de

Campanhã nas questões da planif icação e condução dos processos de part icipação o que era, de

resto, amplamente assumido e documentado nas publicações desta inst ituição.

Por out ro lado, a est ratégia de regeneração da área visou não só proporcionar margens de

protagonismo à população, de forma a aproximar o proj ecto de requalif icação do imaginário

local, como uma intervenção mult idimensional que integrou a requalif icação física e funcional

do Bairro, associada à recuperação dos edif ícios (coberturas, subst ituição das caixilharias,

encerramento das lavandarias, printuras exteriores) e da envolvente aos blocos (instalação de

um pequeno mercado de levante, do espaço para a realização da feira semanal, colocação de

equipamentos para a prát ica de desportos radicais e um espaço de cultura e animação no cent ro

do bairro) e a obj ect ivos imateriais relacionados com o desenvolvimento de oportunidades de

formação, o apoio a iniciat ivas a associações locais ou o lançamento de proj ectos para a

promoção socio-desport iva e cultural.

No fundo, a est ratégia de regeneração do Bairro do Cerco não se focalizou, unicamente, no

arranj o de edif ícios e j ardins, mas adicionalmente no obj ect ivo do empowerment dos cidadãos

que são frequentemente est igmat izadas por residirem num bairro social e insat isfeitos pelo nível

de degradação da área.

Este const itui um exemplo em que a part icipação pública acrescentou valor à intervenção

urbana, facilitando não só a implementação dos proj ectos, como o incremento do sent imento de

ident if icação e implicação dos residentes e inst ituições locais (rede de escolas, de associações,

…,) neste proj ecto.

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CONCLUSÕES FINAIS

No início desta dissertação foi lançada a hipótese de que a ef icácia das intervenções territoriais

era, ent re out ros factores, condicionada, pelo sucesso do envolvimento dos dest inatários das

acções. Com o conceito de ‘ ef icácia’ equacionava-se, por exemplo, a relação ent re os resultados

da intervenção e os obj ect ivos dos proj ectos, o nível de sat isfação dos dest inatários ou out ras

componentes complementares como a ‘ sensibilidade’ às aspirações locais, a ‘ pert inência’ face

às dinâmicas e problemát icas em curso, a ‘ relevância’ ent re os obj ect ivos da intervenção e as

necessidades que lhe deram origem ou a ‘ sustentabilidade’ medida pela capacidade dos

impactos se prolongarem no tempo após o f im da intervenção.

Sem pretenções de uma análise exaut iva de indicadores de ef icácia, a análise global aos estudos

de caso permit iu ret irar algumas conclusões gerais rsobre a inf luência da part icipação nos

processos e resultados de planeamento.

Assim, constata-se que a part icipação pode incrementar a qualidade dos resultados f inais, pela

integração de um número mais vasto de agendas sociais no conceito operacional de ‘ interesse

público’ , bem como gerar benefícios mais intangívies como o da inclusão social ou melhoria da

governância local.

Inversamente, também se conclui que est ratégias de intervenção com déficit de diálogo e

rot inas de t rabalho associados, evidenciam dif iculdades na criação de soluções mutuamente

aceitáveis para todos, mas potencialmente cont rovérsas

No caso concreto da Porto 2001, verif icou-se uma inversão do método de planeamento não se

procurando agarrar ideias e amarrar vontades locais para a concret izar quadros de acção

comuns, mas, em primeiro lugar, um ‘ alargamento do orçamento disponível para a intervenção

na Baixa’ (mediante a candidatura a fundos comunitários - Urbcom), associado a uma fraca

amplitude das fontes de informação e do espect ro de intervenientes no processo de decisão que

esteve rest ringido, quase exclusivamente, ao execut ivo autárquico, Porto 2001 e equipes

técnicas convidadas para áreas específ icas, tendo-se ignorado, quase por completo, a

sensibilidade da comunidade não t écnica resident e na Baixa.

A tardia e insuf iciente interacção ent re agentes territoriais condicionou:

1. a qual idade das decisões: sustentando-se num fraco nível de cont ratualização de vontades

na fase da concepção, mas forte nível de contestação na fase de implementação, (chegando

mesmo a ocorrer oposição à concret ização dos proj ectos, mediante a realização de baixos

assinados cont ra as obras em curso em algumas ruas). O desenvolvimento de est ratégias

pouco part icipadas viriam a gerar cont rovérsia, como a associada a um novo conceito de

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mobilidade para a Baixa, sem que previamente se t ivesse desenvolvido um modelo

alternat ivo de logíst ica de cargas/ descargas ou se t ivesse desenvolvido os sub-sistemas de

t ransportes públicos (met ro, por exemplo), ou a associada ao programa de renovação urbana

por proj ectos urbanos para o espaço público; não foram discut idas ao nível do programa mas

apenas apresentadas em proj ecto, condicionando o nível de apoio e resist ência à

implement ação dos proj ect os;

2. os cust os durant e a fase de implement ação (consumo de t empo e dinheiro adicionais) criado

pelas obj ecções e resist ência social às obras, desenvolvidas em gabinetes polít icos e

técnicos, em curto espaço de tempo e sem um adequdo nível de interacção social e

inst itucional.

+

Custos departicipação

-

Fase de concepção Implementação

•Processos de decisão expeditos•Pouco tempo dedicado à participação e

contratualização de vontades nopartenariado

Custos adicionais:•inviabilização da candidatura ao programaURBCOM•erosão de capital institucional•consumo de tempo•financeiros: estudos técnicos alternativos

Figura 3-5: Evolução dos custos associados à part icipação inst itucional dent ro do partenariado

criado para a Revitalização Económica da Baixa

Para além dos custos acrescidos, observou-se algum desânimo dos envolvidos o que esteve

associado ao desaproveitamento de uma oportunidade para a inversão de perda da Baixa e

associado à evidente incapacidade de coordenação e gestão com bons níveis de consenso local.

Em suma, as abordagens metodológicas baseadas em pré-conceitos (em conceitos prévios), com

pouca abertura a processos de aprendizagem colect iva ent re actores chave da sociedade

(sectores público, privado e comunidade, nomeadamente organizações não governamentais a

est ruturas associat ivas locais) condicionam o êxito de processos de planeamento, principalmente

se envolverem fortes níveis de t ransformação do pré-existente ou potenciais impactos para as

act ividades instaladas.

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É, por isso, fundamental a criação de processos de part icipação que permitam uma, ainda que

relat iva, const rução de consensos ent re grupos e uma gradual legit imação das decisões de

planeamento, de forma a se minimizarem riscos de contestação ou discódia, capazes de por em

causa a implementação dos proj ectos, ou uma cont ínua e gradual erosão de capital social e

inst itucional, com repercussões negat ivas para o nível de compet it ividade e governância dos

territórios

Este estudo prova a importância de abordagens de planeamento interact ivas ao nível da

def inição de programas de intervenção e logo numa fase inicial, muito especialmente quando se

pretender lidar com invest imentos de larga escala, partenariados que exigem a mobilização de

esforços de diversos agentes e se podem associar a fases de profunda t ransformação urbana

É fundamental procurar estabelecer-se um processo de part icipação ent re todas as partes

interessadas e em todos os momentos do processo de part icipação (concepção, planif icação,

implementação, monitorização, avaliação) para que não se def inam opções penalizadoras para

alguma das as partes e de modo a que as decisões f inais tenham em conta as aspirações e

necessidades de todos os actores locais, especialmente em situações de partenariado. O

entendimento dos pontos de vista de todos os part icipantes na avaliação de impactos (sociais,

económicas e ambientais) e das várias alternat ivas possíveis é condição essencial para o sucesso;

Em ambos os casos, as prát icas de planeamento foram fortemente inf luenciadas pelos

regulamentos dos programas de f inanciamento que viabilizaram as intervenções,

designadamente URBAN e URBCOM. Observou-se, não obstante diferentes níveis de concordância

com as imposições legais destes regulamentos, nomeadamente no que diz respeito à part ilha de

poder de decisão, à importância conferida à democrat ização do processo de planeamento, etc.

Por out ro lado, deve evitar-se a cont radição ent re a tendência no que respeita ao direito à

part icipação no no sistema de planeamento português e legislação comunitária (por ex.

t ransposição da direct iva comunitária URBCOM que faz a exigência da criação de formas de

t rabalho conj unto, propõe uma real part ilha de poder ent re execut ivo municipal e representante

da est rutura empresarial) ao cont rário da legislação associada á criação da Porto 2001 que

procurava uma agilização dos processos e superação das próprias direct rizes legais que vêm

sendo publicadas em Portugal (ver cap. 2)

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+

Direito à participação

Nível dedemocratização das

decisões

-

Legislação de planeamento nacional(ex.: Dec.. Lei 380/99)e comunitária (URBCOM, URBAN,

…)

Legislação had hoc que conferecompetências e deveres a agências

privadas de planeamento, constituídasexclusivamente por capitais públicos

Figura 3-7: Tendências cont raditórias

Observa-se ainda que o facto de se ter um formato imposto, desenhado no quadro das polít icas

europeias e não ao nível local ou cent ral não impede que se gerem situações mais aceitáveis do

ponto de vista da subsidariedade do que o formatado ao nível nacional e local que revelou um

maior cent ralismo;

Há determinados ingredientes fundamentais em qualquer processo de planeamento e de

intervenção urbana como a conf iança ou t ransparência que foram desconsiderados na operação

Porto 2001 evidente pelo def icit de debate de alguns proj ectos, capacidade e f lexibilidade

negocial de ambas as partes para procurar superar as diferenças ou de mediat ização do conflito

que foi tornando ainda mais desgastado o processo e dif icultado o entendimento ent re as partes.

A Porto 2001 crit icou a est ratégia da presidente da ACP acusando-a de que a mediat ização

constante de polémicas não cont ribuia para a obtenção de consensos, alegando que esta era uma

est ratégia que t inha em vista a sua promoção pessoal e não a procura de soluções para

ult rapassar os conflitos, mas também o presidente da C.M.P e Porto 2001 mediat izaram as suas

diferenças e t rouxeram para a praça pública as fracturas associadas a este polémico processo;

A criação de empresas privadas para a concret ização de proj ectos com contornos de grande

visibilidade, capaz de at rair invest imento, população e actuar como catalizador de uma

regeneração mais vasta devem ser ut il izados com os devidos cuidados. Importa assegurar que,

por det rás dos inst rumentos de market ing urbano exista uma est ratégia concertada pelos actores

locais, estando alicerçada na confiança ent re as partes e processos de part icipação e actuação

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eficazes. A sustentabilidade destas intervenções está dependente dessa convergência e

entusiasmo local.

À semelhança do que vem acontecendo em países que j á vivenciaram as consequências negat ivas

de um planeamento que ignora os interesses da comunidade, é urgente a promoção de

programas de Regeneração Urbana que envolvam verdadeiramente as comunidades locais.

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ANEXOS

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Anexo 1 - Alguns indicadores de democracia em Portugal – anos 80 / 90

% de pessoas que não pertencem a qualquer associação (recreat iva, religiosa, cultural, . .)

Portugal 64 %149

Europa 52 %

Fonte: Braga da Cruz (s/ data)

A participação política, segundo Braga da Cruz (s/ data) tem vindo a caracterizar-se por duas grandes tendências:

o aumento do abstencionismo e da volatilidade eleitoral

O abstencionismo no início dos anos 80 e 90150

Eleições Legislat ivas Eleições Autárquicas Eleições presidenciais

1979 12.87% 1979 26.2% 1980 15,8%

1991 32.23% 1989 45.5% 1991 38.1%

Fonte: Braga da Cruz (s/ data, p.361)

“As formas tradicionais de participação política, eleitoral e institucional têm vindo a diminuir, mas tem vindo a

aumentar a assinatura de petições, a aprticipação em manifestos ou defesas de causas, tais como movimentos

ecológicos, direitos humanos,...” Braga da Cruz (s/ data, p.367)

149 Dentro deste associativismo, destaca-se a maior percentagem de participação em associações desportivas e recreativas, seguidas pelas religiosas, culturais e sindicatos. Desta percentagem de portugueses que pertencem a algum tipo de associação, verifica-se que 80% do total desempenha algum tipo de actividade voluntária para essa associação. De onde se conclui que há maior associativismo do que activismo em Portugal (Braga da Cruz, s/data, p.357). Braga da Cruz (s/ data) justifica este fraco associativismo e débil activismo por uma �deficiente e cada vez menor confiança nas instituições e consciência generalizada de impotência perante elas� (Braga da Cruz, s/ data, p.357) 150 Refira-se que para além de um decréscimo da participação eleitoral, tem-se registado uma menor filiação partidária. Braga da Cruz (S/data) relaciona este facto com uma crescente estabilização política nacional e por uma menor politização da vida social, observando-se que a política mobiliza, cada vez menos, os cidadãos portugueses, que reveleam uma das percentagens de interesse mais baixa de toda a Europa (Braga da Cruz, s/ data, p.366)

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Anexo 2 – Orçamento Part icipat ivo de Porto Alegre

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Anexo 3 - O conhecimento popular e cient íf ico

Lakatos e Marconi (1995) defendem que o conhecimento cient íf ico se diferencia do popular

muito mais no que se refere ao seu contexto metodológico do que propriamente ao seu

conteúdo.

Conhecimento popular Conhecimento cient íf ico

Valorat ivo

Reflexivo

Assistemát ico

Verif icável

Falível

Inexacto

Real (factual)

Cont igente

Sistemát ico

Verif icável

Falível

Aproximadamente exacto

(adaptado de Lakatos e Marconi, 1995, p.15)

Ambos, portanto, verif icáveis e falíveis, o que, à part ida, não poderá deslegit imar o

conhecimento popular que face às suas característ icas se revela vantaj oso, nomeadamente:

/ por ser um conhecimento sensit ivo, ou sej a referente a vivências, estados de ânimo e

emoções da vida diária;

/ conhecimento subj ect ivo, pois é o próprio suj eito que organiza as suas experiências e

conhecimentos, tanto os que adquire por vivência própria quanto os “ por ouvir dizer” ;

/ assistemát ico, pois esta organização das experiências não visa a uma sistemat ização de

ideias, nem na forma de adquiri-las nem na tentat iva de validá-las

Se o planeamento territorial visa uma qualif icação dos territórios, enquanto espaços onde é bom

estar e viver, é fundamental ent rar em linha de conta com “ o ver” , “ sent ir” e “ esperar” da

população que os vivência quot idianamente e, em últ ima instância, const itui o principal medidor

de sucesso dessas intervenções

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Anexo 4 - Alguns factores explicat ivos da cultura de não part icipação em

Portugal.

Factores crít icos à aplicação da lei.

Histór icos

herança do estado novo de não part icipação, associada a uma cultura da autoridade. Democrat ização recente do sistema de representação polít ica. Tradição lat ina e conservadora que bloqueia a part icipação social organizada

Modelo de urbanização desequilibrada que não est imulou uma rede de urbanidade equilibrado. Legado histórico das autarquias portuguesas com escassos meios e déficit de promoção de part icipação comunitária

Profissionais

Pouca t radição de Planeamento Territorial associado a uma formação técnica muito cent rada no Planeamento Físico. Pouco conhecimento e formação nas áreas crít icas de mudança da lei do direito à part icipação. Falta de confiança e de credibilização do Planeamento vigente (suscitada por cont rovérsias, associadas a corrupções e ao quest ionamento do t ipos de interesses económicos e polít icos dominantes, etc.). Pouca abertura e procura de novas metodologias ou opções de Planeamento (ex. Planeamento Colaborat ivo). Escasso aprofundamento de prát icas de diálogo. Dif iculdade em inovar, em termos de prát icas, de relacionamento administ ração/ cidadãos, etc.

Legislação

Escassa descent ralização de poderes, polít icos e económicos, do estado cent ral para as autarquias.

Polít icos

Tradição num modo de funcionamento do poder polít ico distanciado da sociedade local, o que gera um crescente isolament o em relação a parceiros inst itucionais e sociais. Modelos de governação hierárquicos, pouca descent ralização de competências e muita burocracia

Sociais

Baixos níveis de escolarização da população portuguesa, que condicionam a compreensão das principais temát icas em discussão pública e o desej o de part icipar const rut ivamente na procura do interesse público e não apenas em prol de interesses privados. Ausência de uma at itude pró-act iva dos cidadãos face ao processo de Planeamento Territorial, muito embora começasse a ser mais react iva face a temát icas de

risco. Déficit de uma ref lexividade e debate plural sobre as questões territoriais151

Económicos

Período de infraest ruturação tardia (saneamento básico, const rução rede viária e equipamentos colect ivos) que gerou uma preponderância das decisões técnicas e subordinação de out ras dimensões (sociais, l igadas ao impacte ambiental, etc.)152

Indust rialização e dest radicionalização do rural tardias, baseada sobretudo numa rede empresarial familiar difusa, a par da quase total ausência de importantes grupos económicos

151 Lourenço et al. (1997) observa que a proximidade entre ciência e poder pode assumir a ocultação ou até a negação do conflito, uma vez que corresponde a processos de decisão fechados e não conflituosos, que impedem a própria avaliação de outros pareceres técnicos e da própria participação da comunidade civil (Lourenço et al., 1997, p.48). Também Gonçalves (1997) partilha desta opinião referindo que em Portugal o recurso ao parecer científico nas diversas áreas da política pública tem afastado o debate, favorecendo mais o exercício da autoridade do que a procura de um diálogo aberto e pluralista com os grupos de interesses e movimentos sociais (Gonçalves, 1999, p.157) 152 Lourenço et al. (1997) , justifica, ainda, a débil participação pública portuguesa no domínio do processo de tomada de decisão do Planeamento Territorial, por um contexto de infra-estruturação tardia do nosso país, que tem dominado a agenda política, desviando-a de problemáticas do domínio processual relacionadas, por exemplo, as finalidades das próprias políticas públicas, com a avaliação de outras alternativas, da legitimação social das decisões, etc.

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Anexo 5 – O direito à part icipação, na Const ituição portuguesa

Capítulo II - Direitos, liberdades e garant ias de part icipação polít ica

Art . 48º Part icipação na vida públ ica

1 Todos os cidadãos têm o direito de tomar parte na vida polít ica e na direcção dos assuntos públicos do país, directamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos.

2 Todos os cidadãos têm o direito de ser esclarecidos obj ect ivamente sobre actos do Estado e demais ent idades públicas e de ser informados pelo Governo e out ras autoridades acerca da gestão dos assuntos públicos.

Art . 52º Direit o de pet ição e direit o de acção popular

1 Todos os cidadãos têm o direito de apresentar, individual ou colect ivamente, aos órgãos de soberania ou a quaisquer autoridades pet ições, representações, reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos, da Const ituição, das leis ou do interesse geral e bem assim o direito de serem informados, em prazo razoável, sobre o resultado da respect iva apreciação.

2 A lei f ixa as condições em que as pet ições apresentadas colect ivamente à Assembleia da República são apreciadas pelo Plenário.

3 É conferido a todos, pessoalmente ou at ravés de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de acção popular nos casos e termos previstos na lei, incluindo o direito de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indemnização, nomeadamente para:

a) Promover a prevenção, a cessação ou a perseguição j udicial das infracções cont ra a saúde pública, os direitos dos consumidores, a qualidade de vida e a preservação do ambiente e do pat rimónio cultural;

b) Assegurar a defesa dos bens do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais.

TÍTULO IX - Administ ração Pública

Art . 267º Est rut ura da Administ ração

1 A Administ ração Pública será est ruturada de modo a evitar a burocrat ização, a aproximar os serviços das populações e a assegurar a part icipação dos interessados na sua gestão efect iva, designadamente por intermédio de associações públicas, organizações de moradores e out ras formas de representação democrát ica.

2 Para efeito do disposto no número anterior, a lei estabelecerá adequadas formas de descent ralização e desconcent ração administ rat ivas, sem prej uízo da necessária ef icácia e unidade de acção da Administ ração e dos poderes de direcção, superintendência e tutela dos órgãos competentes.

3 A lei pode criar ent idades administ rat ivas independentes.

4 As associações públicas só podem ser const ituídas para a sat isfação de necessidades específ icas, não podem exercer funções próprias das associações sindicais e têm organização interna baseada no respeito dos direitos dos seus membros e na formação democrát ica dos seus órgãos.

5 O processamento da act ividade administ rat iva será obj ecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos meios a ut il izar pelos serviços e a part icipação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.

6 As ent idades privadas que exerçam poderes públicos podem ser suj eitas, nos termos da lei, a f iscalização administ rat iva.

Art . 268º Direit os e garant ias dos administ rados

1 Os cidadãos têm o direito de ser informados pela Administ ração, sempre que o requeiram, sobre o andamento dos processos em que sej am directamente interessados, bem como o de conhecer as resoluções definit ivas que sobre eles forem tomadas.

2 Os cidadãos têm também o direito de acesso aos arquivos e registos administ rat ivos, sem prej uízo do disposto na lei em matérias relat ivas à segurança interna e externa, à invest igação criminal e à int imidade das pessoas.

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3 Os actos administ rat ivos estão suj eitos a not if icação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos.

4 É garant ido aos administ rados tutela j urisdicional efect iva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo, nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de quaisquer actos administ rat ivos que os lesem, independentemente da sua forma, a determinação da prát ica de actos administ rat ivos legalmente devidos e a adopção de medidas cautelares adequadas.

5 Os cidadãos têm igualmente direito de impugnar as normas administ rat ivas com eficácia externa lesivas dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos.

6 Para efeitos dos nºs 1 e 2, a lei f ixará um prazo máximo de resposta por parte da Administ ração.

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Anexo 6 - O direito à informação e part icipação nos Planos Municipais de

Ordenamento do Território (Decreto-Lei 380/ 99)

Fase inicial: Câmara publicita a determinação da elaboração do plano. Faculta aos interessados

todos os elementos relevantes para o conhecimento do estádio dos t rabalhos. Durante um

período que não deve ser inferior a 30 dias, os interessados podem apresentar as suas

reclamações, observações ou sugestões para serem consideradas na elaboração/ revisão plano

Fase elaboração e inquérito público: com a antecedência mínima de 15 dias, em que este

período não pode ser inferior a 60 dias, procede à abertura de um período de discussão pública,

at ravés de aviso a publicar no Diário da República e a divulgar na comunicação social, das quais

consta a indicação do período de discussão, das eventuais sessões públicas a que haj a lugar, dos

locais onde se encont ra disponível a proposta do plano, acompanhada do parecer da comissão

mista de coordenação ou da comissão de coordenação regional e dos demais pareceres

eventualmente emit idos, bem como da forma como os interessados podem apresentar as suas

reclamações, observações e sugestões

Despois do período de discussão pública a Câmara municipal pondera as reclamações,

observações, sugestões e pedidos de esclarecimento apresentados pelos part iculares, f icando

obrigada a resposta escrita fundamentada perante aqueles que invoquem: 1) a desconformidade

com out ros inst rumentos de gestão territorial ef icazes; 2) a incompat ibilidade com planos,

programas e proj ectos que devessem ser elaborados em fase de elaboração; 3) a

desconformidade com disposições legais e regulamentos aplicáveis; 4) a eventual lesão de

direitos subj ect ivos. Sempre que necessário ou conveniente, a câmara municipal promove o

esclarecimento directo dos interessados, quer at ravés dos seus próprios técnicos, quer at ravés

do recurso a técnicos da administ ração

A Câmara Municipal divulga e pondera os respect ivos resultados e elabora a versão f inal da

proposta para aprovação. São obrigatoriamente publicas todas as reuniões da câmara municipal

e da assembleia municipal que respeitem à elaboração ou aprovação de qualquer categoria de

inst rumento de planeamento territorial. Concluída a versão f inal da proposta segue-se a fase de

pareceres externos (Comissão de Coordenação Regional, sobre conformidade com as disposições

legais e regulamentos vigentes, art iculação e coerência da proposta com os obj ect ivos,

princípios e regras aplicáveis ao município def inidos por quaisquer out ros de inst rumentos de

gestão territorial ef icazes) e apresentado em Assembleia Municipal, mediante proposta

apresentada pela Câmara Municipal. Podem ser propostas alterações pela Assembleia Municipal

ao execut ivo municipal e segue-se a avaliação e rat if icação do Governo, podendo ser exigido ao

município uma reapreciação

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Anexo 7 - Lista de documentos analisados

Documentação produzida pela ou para a sociedade Porto 2001 S. A.

CÂMARA MUNICIPAL DO PORTO (7 Novembro 1997) - Candidatura do Porto à UE (apresentada por

Manuela Melo, vereadora da Cultura da CMP em Luxemburgo)

COMISSSÃO INSTALADORA da Porto Capital Europeia da Cultura (Setembro 1998) - Relatório da

Comissão Instaladora

SOCIEDADE PORTO 2001, S. A. (1999a) e FAUP - Porto 2001: regresso à Baixa: consulta para a

elaboração do Programa de Requalif icação da Baixa Portuense

SOCIEDADE PORTO 2001, S. A. (Julho de 1999b) - Programa de Requalif icação Espaço Público da

Baixa Portuense

COSTA, A. Pires; STUSSI, Roberto; BABO, António Pérez e TAVARES, José Pedro (Julho de 1999) -

Programa de Mobilidade para a Baixa do Porto – Cenário Prospect ivo

QUATERNAIRE PORTUGAL, S.A (Novembro 1999) - Estudo Prévio do Programa de Revitalização do

Comércio e Serviços da Baixa Portuense

QUATERNAIRE PORTUGAL, S.A (Julho 2000) - Estudo Global do Programa de Revitalização do

Comércio e Serviços da Baixa Portuense

Documentação produzida pela ou para ACP – Associação dos Comerciantes do Porto

ASSOCIAÇÃO DOS COMERCIANTES DO PORTO e URBE “ NÚCLEOS URBANOS DE PESQUISA E

INTERVENÇÃO (Julho 1999) - Parecer sobre o Programa de Mobilidade para a Baixa do Porto

ASSOCIAÇÃO DOS COMERCIANTES DO PORTO e PAUTA, L.da. (Maio 2001) - Adenda ao Estudo

Global e Revisão dos Proj ectos de Requalif icação da Baixa Portuense

Convocatórias e comunicados enviados para comunicação social e parceiros

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Documentação produzida pela ou para a Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã

SOUSA, Virgínia Vinha Leite de (2001) - “ URBAN – Vale de Campanhã / Port o: Const ruindo novas

pont es para a vida” , Resumo da comunicação proferida no 1º Forum Qualidade de Vida Urbana,

realizada na Fundação Dr. António Cupert ino de Miranda

FUNDAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DO VALE DE CAMPANHÃ:

/ (1997) - O Vale de Campanhã e as suas Associações

/ (1998a) - Colecção Aprendizagem em Movimento. n.º 1 – Azulej aria Comunitária – Um

proj ecto na reedif icação do Bairro do Cerco do Porto; n.º 2 – Feira Medieval – Percurso de

um Proj ecto

/ (1998b) - “ Pensar a Escola Const ruir Proj ect os” , I Forum de Proj ectos Educat ivos do Vale de

Campanhã

/ (1999a) - Plano de Act ividades 1999/ 2000

/ (1999b) - O Vale de Campanhã na memória da Gente

/ (1999c) - Roteiro do Vale de Campanhã

/ (1999c) - Const ruir uma escola Inclusiva, in II Forum da Comunidade Educat iva do Vale de

Campanhã

/ (2000a) - Associações com História O Pat rimónio Associat ivo do Vale de Campanhã

/ (2000b) - Catálogo da Exposição Máquinas de brincar

/ (2001a) - Catálogo da Exposição Concurso da Criação de Brinquedos

/ (2001b) - Urban do Vale de Campanhã. Relatório Final

Part icipação no Encerramento do Sub-Programa Urban do Vale de Campanhã, na Quinta da

Bonj óia nos dias 28 e 29 Junho

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Anexo 8 - Lista de ent revista realizadas

Estratégia de Intervenção na Baixa do Porto

PORTO 2001

Eng. Paulo Sarmento e Cunha (Porto 2001 SA, Departamento Requalif icação e Revitalização e

membro do conselho de administ ração)

Dr. Amaral de Sousa (revitalização económica Porto2001)

Eng. Alves da Silva (responsável pela coordenação das obras da Baixa)

Dr.º António Pedro Pombo (Porto 2001 SA, envolvimento público na Programação cultural)

ASSOCIAÇÃO DOS COMERCIANTES DO PORTO

Dr.ª Micaela Palhares (j urídica Associação dos Comerciantes do Porto)

Dr. Jorge Santos (comissão de Comerciantes da Zona dos Clérigos)

CÂMARA MUNICIPAL DO PORTO

Eng. Manuel Miranda (Câmara Municipal do Porto)

UNISHNOR

Dr. Condé Pinto (Director Execut ivo)

Outras ent revistas

Drº Artur Santos Silva (1º Presidente Porto 2001, S.A.)

Eng. Artur Costa (Programa de Revitalização Económica)

Eng. António Babo (Programa de Mobilidade para a Baixa)

Arq. Virgínio Mout inho (responsável pelo Proj ecto Urbano Praça Carlos Alberto )

Professor Álvaro Costa (Serviços de Transportes Colect ivos do Porto)

Drº Nuno Corvacho (Jornal Público)

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Fundação para o Desenvolvimento do Vale de Campanhã

Equipa operacional da Fundação

Dr.ª Maria Virgínia Vinha Leite de Sousa (Directora Técnica do Proj ecto)

Drª Cláudia Manuela Sousa Costa (t rabalho com associações locais/ inst ituições)

Drª Maria Manuela Moreira Mart ins

Drª Daniela Morais Almeida (formação prof issional e emprego)

População residente no bairro do Cerco

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Anexo 9 – A cronologia no acesso à informação na Porto 2001

/ Dezembro 2000: at ravés de ofício dirigido a Teresa Lago, são apresentados os obj ect ivos de

invest igação da tese e é solicitada a consulta a documentos sobre o processo de decisão da

Porto 2001 associado ao proj ecto de Requalif icação da Baixa Portuense, bem como a

marcação de uma ent revista com a directora;

/ Abril de 2001: sem resposta à carta enviada e após uma prolongada insistência com a

secretária de Teresa Lago, procedeu-se ao reenvio de um novo pedido de reunião sobre o

processo de planeamento da Porto 2001, ao qual obt ive como resposta a indicação de que

poderia falar com Paulo Sarmento e Cunha, responsável pelo Departamento de

Requalif icação Urbana

/ Maio de 2001: Após cinco meses de insistência, obtém-se uma primeira ent revista com o

responsável pela Requalif icação urbana da Porto 2001. Face à abrangência das questões

apresentadas e a complexidade do processo, foi verbalizada a disponibilidade da marcação

de uma série de ent revistas, complementares a esta, com vista ao esclarecimento de alguns

temas que ainda não t inham sido abordados.

/ Muito embora a disponibilidade manifestada e a cedência de alguma informação não

publicada (ex. Relatório Comissão Instaladora), durante um extenso período de tempo não

foi disponibilizada qualquer out ra ent revista, alegadamente por falta de disponibilidade de

agenda

/ Agosto 2001: após prolongada insistência com a secretária de Paulo Sarmento e Cunha, foi

agendada mais uma (e últ ima ent revista) a que se associou de forma informal uma conversa

com os responsáveis pelo programa de revitalização comercial e obras na Baixa,

respect ivamente Amaral de Sousa e Alves da Silva.

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Anexo 10 – Reunião na Porto 2001 para a definição da est ratégia de regeneração

da Baixa

Um grupo rest rito de arquitectos (Álcino Sout inho, Álvaro Siza, Eduardo Souto Moura, Fernando

Távora, José Manuel Soares, Manuel Correia Fernandes, Pedro Ramalho) part iciparam numa

reunião, realizada a 21 Julho 1998, a convite e dirigida por Santos Silva e com as part icipações

de Nuno Cardoso (na altura, membro Comissão Instaladora e Vereador de Planeamento da CMP) e

os assessores do execut ivo municipal para as questões da mobilidade, António Babo e Pedro Silva

cuj o tema principal foi o papel da componente da requalif icação urbana do Programa Port o 2001

– Cidade Europeia da Cult ura.

Nesta reunião, redigida por Manuel Correia Fernandes e apresentada no anexo do Relatório da

Comissão Instaladora quest ionaram-se os arquitectos presentes, enquanto membros do seu grupo

prof issional, sobre qual poderia ser a sua intervenção na concret ização dos obj ect ivos de

requalif icação do Porto ou sobre quais as acções avaliavam como mais urgentes, etc.

Do debate, resultou um conj unto diversif icado de conclusões como:

A falta de informação e de debate que existe na cidade do Porto sobre as questões de

planeamento. A pouca informação que o grupo de arquitectos det inha sobre o real estado da

cidade: proj ectos, obras em curso, . . , bem como os compromissos j á assumidos ou em vias de os

serem pelos diferentes sectores de administ ração (isto era tanto mais relevante para os

proj ectos e obras de grande expressão física)

A ausência de uma ideia (de um f io condutor) para as diversas intervenções na cidade

desconhecimento sobre os critérios de avaliação dos diversos proj ectos e obras previstas ou em

curso (tanto na fase do seu lançamento, programação ou concret ização)

Defenderam que a Porto 2001, muito embora o seu âmbito limitado e horizonte bem definido,

deveria retomar a discussão sobre a cidade

Concordaram que os critérios que seriam mais importantes para o t rabalho de requalif icação

urbana da Porto 2001, seriam o princípio de unidade, de noção de conj unt o e de qual idade; nem

que para isso fosse necessário rever os proj ectos em curso, o que poderia levar à sua

reformulação (simples ou profunda) ou até mesmo suspensão, se most rasse inadequação,

ausência de sent ido ou eventual impacto negat ivo no conj unto de obras.

Nessa mesma reunião o Vereador de Planeamento da CMP, Nuno Cardoso e seus assessores

apresentaram um documento de t rabalho para discussão onde j á constavam enumerados e

ordenados problemas e diversos proj ectos e ideias para a cidade. O documento que organizava

as Intervenções Urbanas para a cidade em quat ro grupos de problemát icas: Áreas Temát icas de

Int ervenção, Acções Âncora, Out ras Acções e Acções Difusas na Cidade, viria a inf luenciar de

forma determinante a proposta de act ividades da Comissão Instaladora, observando-se uma total

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art iculação (sobreposição?) da est ratégia da CMP com a que seria assumida como a da Porto

2001.

Finalmente, as ideias síntese que sairam da reunião foram: a prioridade de intervenção que

deveria ser dada ao espaço urbano e neste aos adj acentes a equipamentos importantes para o

evento cultural e a prioridade ao programa de equipamentos. O grupo dos part icipantes

presentes na reunião defendeu, ainda, os seguintes princípios de acção:

“ os cidadãos devem ser contemplados, por igual, nas acções a empreender, devendo rej eitar-se

liminarmente a ideia de que existe uma cidade nobre e de primeira que vai absorver “ a parte de

leão” dos meios à disposição e a de uma cidade de segunda que apenas vai assist ir aos festej os e

a quem apenas se pede que part icipe ou que, fundamentalmente, cont ribua”

“ O Programa Porto 2001 deve apelar à part icipação das forças vivas, inst ituições e organizações

act ivas da cidade no esforço que se pretende generalizado e colect ivo de qualif icação da

imagem urbana do Porto..” (Comissão Instaladora, 1998: An.2-8)

Em suma este foi um momento chave na recolha de informação e elaboração est ratégica,

mediante a part icipação act iva do execut ivo municipal e seus assessores para a área da

mobilidade, Porto 2001 e alguns arquitectos que potencialmente poderiam vir a integrar a

componente da requalif icação urbana at ravés dos seus proj ectos.

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Anexo 11 – Âmbito de invest igação no estudo de caso ‘ Porto 2001’

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Anexo 12 – URBCOM - Sistema de Incent ivos a Proj ectos de Urbanismo Comercial

Regras de candidatura e de concessão de apoios f inanceiros a proj ectos de urbanismo comercial

no âmbito Programa Operacional Economia (Decreto-Lei n.º317-B/ 2000)

Metodologia e faseamento dos proj ectos

art igo 4.º - Faseamento dos proj ectos

os proj ectos de urbanismo desenvolvem-se em parceria e art iculação ent re as empresas, as

est ruturas associat ivas comerciais e de serviços e a administ ração local e cent ral (Porto 2001?)

art igo 5.º - Estudo Prévio e qualif icação do proj ecto global

2 - a qualif icação do proj ecto global é feita por meio de um estudo prévio do qual deve

constar a proposta de definição da área de intervenção e os elementos necessários à

avaliação dos critérios de qualif icação.

3 - a elaboração do estudo prévio referido no número anterior e o correspondente

desenvolvimento do proj ecto são da competência conj unta da est rutura associat iva e CMP

4 - a apresentação do estudo prévio é feita pela est rutura associat iva na Direcção-Geral do

Comércio e da Concorrência (…)

5 - A qualif icação do proj ecto global de urbanismo comercial é at ribuída por Despacho do

Ministério da Economia, sob proposta da unidade de gestão competente, com base no

parecer da DGCC referido no número anterior

art igo 6.º - Estudo Global da área de intervenção

1 - Após a qualif icação do proj ecto global de urbanismo comercial é desenvolvido um estudo

global que consiste na definição de medidas e acções de desenvolvimento comercial e

urbano para a área de intervenção nos domínios da modernização das act ividades

empresariais, da qualif icação do espaço público, da promoção do proj ecto global e da

formação prof issional.

2 - o estudo global da iniciat iva e responsabilidade da est rutura associat iva é realizado por

uma equipa devidamente qualif icada para o efeito e seleccionada at ravés de concurso, na

base de um caderno de encargos e termos de referência, devidamente aprovada pela DGCC

(?)

3 - Antes de ser remet ido à DGCC para apreciação, o estudo global deve obter a

concordância da est rutura associat iva e da câmara municipal

4 - Após a aprovação do estudo global pela DGCC, o Minist ro da Economia aprova as Normas

Específ icas do proj ecto Global de Urbanismo Comercial que incluem, nomeadamente, a

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definição da área de intervenção, invest imentos complementares e respect ivas aplicações

relevantes e períodos de apresentação de candidaturas, bem como a componente relat iva à

formação prof issional

5 - O estudo global é obrigatoriamente obj ecto de consulta pública por um período de 30 dias

úteis

6 - Posteriormente à sua aprovação pela DGCC o estudo global é obj ecto de apresentação

pública.

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Anexo 13 – Comunicado da Associação dos Comerciantes à Comunicação Social

sobre os episódios associados ao Programa de Revitalização Económica da Baixa

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