Upload
others
View
3
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
Política e historiografia na Independência: a trajetória de Joaquim José da Silva
Maia entre Brasil e Portugal, 1776-1831
WALQUIRIA DE REZENDE TOFANELLI ALVES*
Introdução:
Na historiografia brasileira há muitas reflexões sobre a relação entre biografia e
história. Destacam-se as pesquisas que têm investigado o uso desse gênero para a
construção do Estado Nacional, quando da separação do Brasil de Portugal e, sobretudo,
seu delineamento após a abdicação de D. Pedro I, em 1831. Nota-se que o Instituto
Histórico e Geográfico Brasileiro fundado, em 1838, tinha o propósito de escrever a
história do Império do Brasil, conformando também uma memória nacional. Seus
membros, em 1839, inauguraram uma Revista e nela adotaram sessão intitulada:
“Biografia dos Brasileiros Distintos por Letras, Armas, Virtudes e etc...”. Um de seus
principais entusiastas, segundo Armelle Enders, foi Januário da Cunha Barbosa que
vaticinou contra o esquecimento dos “cidadãos dignos de mérito”, cujas vidas serviriam
de “exemplos virtuosos” e “lições práticas” (ENDERS, 2004: 177). Atribuiu-se
centralidade à biografia aliada à concepção “pedagógica” da história então assentada no
topos historia magistra vitae. Tal noção coabitou e, cada vez mais, cedeu espaço a
aspirações ilustradas e perspectiva de autonomização da História, trazendo às narrativas
características científicas. (OLIVEIRA, 2015: 276-277; ARAÚJO, 2011:134-135).
Para a construção de um panteão nacional formado por “grandes homens”, havia
seleção baseada em interesses e objetivos políticos. Deve-se ter em vista que o
financiamento e o prestígio da instituição dependeram de vínculos estreitos com D. Pedro
II (GUIMARÃES, 1995:485-486). Além disso, as biografias publicadas na Revista do
IHGB passaram pelo crivo de seus membros cujas escolhas consideraram laços de
proximidade e de admiração (ENDERS, 2004:181). Pensar sobre os critérios que os
membros do IHGB utilizaram para selecionar os biografados é ainda mais interessante,
pois alguns homens deste panteão viveram durante o período colonial ou nasceram em
Portugal, mas foram lembrados pelos serviços prestados na América Portuguesa.
Postulando cronologia linear para a história do Brasil, muitos historiadores no século
*Doutoranda no Programa de História Social da Universidade de São Paulo (USP) e bolsista CAPES.
2
XIX, demarcaram periodização desde o “descobrimento”, em 1500, valendo-se da
experiência da colonização portuguesa e da continuidade da monarquia como elementos
constitutivos para a memória e para a história. (ENDERS, 2004: 181-182). O IHGB não
foi espaço exclusivo para a divulgação de biografias. Observa-se a escrita de obras fora
da instituição, a exemplo da publicação de João Manuel Pereira da Silva (1817-1898)
intitulada Varões ilustres do Brasil durante o período colonial e de Sébastien Auguste
Sisson (1824-1893) com o título Galeria de brasileiros ilustres contemporâneos.
Segundo Temístocles Cezar, assim como no IHGB, esses trabalhos exploraram a noção
“pedagógica” da história associada à retórica da nacionalidade, o que produziu “discurso
historiográfico e político extremamente persuasivo” (CEZAR, 2003: 75).
O objetivo nesse trabalho é apresentar aspectos da trajetória de vida do negociante
Joaquim José da Silva Maia (1776-1831) de modo que auxilie na compreensão de seu
projeto em defesa do Império luso-brasileiro, derrotado com a consolidação da separação
entre Brasil e Portugal1. Também busca-se problematizar produções historiográficas que
interpretaram Maia como “áulico”, “conservador”, “absolutista” e “reacionário”, quando,
inequivocamente, foi um defensor da monarquia constitucional no Brasil e em Portugal.
Por fim, também se investigará o motivo do encobrimento do projeto de Maia na
historiografia e de sua biografia, considerando a atuação de seu filho, Emílio Joaquim da
Silva Maia que, como membro da Sociedade Auxiliadora da Indústria Nacional e do
IHGB, tentou recuperar a memória do pai na década de 1840, não obtendo sucesso.
Trajetória de Joaquim José da Silva Maia:
Joaquim José da Silva Maia nasceu na cidade do Porto, em Portugal, em 03 de
dezembro de 1776. Em 1796, se estabeleceu na Vila da Cachoeira na capitania da Bahia,
lançando-se no comércio. Por volta de 1802, transferiu-se para a capital Salvador. Foi
proprietário da sumaca Voador e do bergantim Nelson, realizando viagens regulares a
regiões meridionais na década de 1810. Os carregamentos de Maia, em sua maioria,
1Para embasar a proposta de Joaquim José da Silva Maia a respeito de um Império luso-brasileiro, o trabalho
ampara-se no estudo de Maria de Lourdes Viana Lyra sobre a utopia de um “poderoso” e “vasto” Império
Português (LYRA, 1994).
3
compunham-se de carne seca, couro, sebo, açúcar, aguardente e farinha de trigo2. Maria
Beatriz Nizza da Silva apontou que Maia possuía cabedal suficiente para considerá-lo no
tráfico de escravos. (SILVA, 2008: 18) Ademais, sinalizou para a possibilidade de que o
negociante tenha se filiado à maçonaria. (SILVA, 2008:165-166).
Em 10 de fevereiro de 1821, Maia participou do movimento que ligou a Bahia às
Cortes de Lisboa. Por esse motivo, em 1° de março do mesmo ano, passou a redigir o
periódico Semanário Cívico e a defender uma monarquia constitucional e representativa
com a participação de portugueses da América e da Europa nas Cortes de Lisboa. A visão
de Maia era bastante pragmática. Por ter sua atividade principal ancorada no comércio e,
tendo em vista que seus negócios se expandiam para a África e para a Europa, vaticinou
pela preservação de uma ampla rede de negócios luso-brasileira, criticando, em
contrapartida, o Tratado de 1810 que garantiu aos britânicos posição vantajosa no
mercado da América Portuguesa. (SEMANÁRIO CÍVICO, n°29, 1830:05).
Para o negociante, as ações de Sebastião José de Carvalho e Melo (Marquês de
Pombal) no século XVIII, deveriam orientar os ministros de D. João VI, para que
obstruíssem a ingerência britânica no comércio luso-brasileiro3. Sopesando essas
experiências, advogou pela adoção de medidas protecionistas a fim de viabilizar a
participação do Império Português na concorrência com outros Impérios que também se
constituíam. Defendeu a manutenção do tráfico de escravos e projetou reformas de
infraestrutura nos portos, na agricultura e no comércio, apontando ser necessário
aumentar a qualidade e quantidade da produção luso-brasileira, para que só assim, os
portugueses tirassem vantagens no livre-comércio. Em sua opinião, o sucesso do Império
Português dependia da prosperidade mútua entre os Reinos de Brasil e Portugal:
Portugal não pode prosperar, e enriquecer, sem que outro tanto aconteça ao
Brasil; é o que já experimentamos na época do Ministério do Marquês de
Pombal, e na subsequente; quando Portugal prosperou no seu comércio,
navegação e indústria, foi também quando o Brasil fez os grandes progressos
em todos os ramos da sua agricultura, navegação e comércio. (SEMANÁRIO
CÍVICO, n° 12, 1822: 03).
2Os registros das embarcações de Joaquim José da Silva Maia estão disponíveis em diversos números dos
periódicos Idade d’Ouro do Brasil e Gazeta o Rio de Janeiro entre os anos de 1810 a 1818. 3Sobre a política econômica de Sebastião José Carvalho de Mello e seu sucessor, D. Rodrigo de Sousa
Coutinho, ver: (CARDOSO; CUNHA, 2011).
4
Em 25 de outubro de 1821, o negociante defendeu que a capital do Império deveria
ser exclusivamente Lisboa, opinião que lhe rendeu muitas divergências, especialmente,
com periódicos fluminenses (SEMANÁRIO CÍVICO, n°35, 1821: 01-02). Tal defesa de
Silva Maia não foi despropositada, pois grupos nas províncias no Norte e no Nordeste
interpretaram como desvantajoso um centro de poder na América Portuguesa com o
príncipe regente, optando apenas pela capital em Lisboa com a qual, inclusive, tinham
maior alinhamento político e de negócios. (ALVES, 2018:140).
O Semanário Cívico foi publicado até 19 de junho de 1823 e, através dele, Maia
fez críticas a D. Pedro e à proposta de separação endossada por grupos políticos sediados
no Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Na Bahia, apoiou as tropas lideradas por
Inácio Luís Madeira de Mello contrariando o projeto de separação encabeçado no Centro-
Sul. Lá escreveu também o periódico Sentinella Bahiense (1822) apoiando a posição de
grupos em Salvador pela fidelidade às Cortes de Lisboa. Com o fim da guerra civil, em
02 de julho de 1823 e com a derrota de Madeira de Mello, Maia se retirou com a divisão
portuguesa para o Maranhão, onde chegou, em 14 de julho de 1823. Declarou ter jurado
a Independência na Câmara de São Luís, em 07 de agosto, solicitando passaporte,
segundo ele, como “brasileiro” para se estabelecer com a família no Porto, em Portugal.
Aportou na cidade, em 1° de janeiro de 1824 e retomou as atividades no comércio
(BRASILEIRO IMPARCIAL, n°03, 1830:04). Foi nesse período que produziu um
manuscrito sobre o Maranhão elencando que na província havia dois partidos divididos:
um dos que queriam conservar a união com Portugal, e outro pela
independência política do Brasil: mas este último partido estava subdividido
em imperiais, que queriam aderir-se ao Rio de Janeiro, e outros que desejavam
governo democrático4 (MAIA, 1824: f.01)
Em 18 de julho de 1826, o negociante iniciou a publicação do periódico Imparcial,
motivado pela notícia de que D. Pedro enviara uma Carta Constitucional do Brasil para
ser outorgada em Portugal. Tendo em vista o reconhecimento da Independência, em 29
de agosto de 1825 e a morte de D. João VI, em 10 de março de 1826, Maia remodelou
seu projeto de acordo com as novas circunstâncias, interessado na manutenção dos
4Agradecemos o Prof. Dr. Marcelo Cheche Galves por ter compartilhado conosco a transcrição do
manuscrito de Joaquim José da Silva Maia sobre o estado político do Maranhão.
5
negócios entre Brasil e Portugal. Assim, se entre 1821 a 1823 havia qualificado D. Pedro
como um “jovem e inexperiente príncipe” iludido pelos “áulicos” no Rio de Janeiro, a
despeito de José Bonifácio de Andrada (SEMANÁRIO CÍVICO, n°69, f.03); em 1826,
declarou apoio ao Imperador do Brasil, por acreditar que este capitanearia um projeto
constitucional e representativo para a monarquia em Portugal (IMPARCIAL, 1830, n°01,
f.02). Apesar da possibilidade de reunião das duas Coroas ter sido cogitada, D. Pedro teve
de abdicar ao trono em favor de sua filha, D. Maria da Glória, por pressões na política
interna do Brasil e no cenário mundial (BARBOSA, 2004:07). O assunto da separação do
Brasil, aliás, foi discutido durante as negociações para o reconhecimento da
Independência mediadas pelos britânicos, antes mesmo da morte de D. João VI
(SANTOS, 2015: 299-300). No decreto de 1826, D. Pedro determinou que a filha deveria
casar-se com o tio, D. Miguel e ambos deveriam jurar a Carta Constitucional, assim, esta
assumiria o trono quando chegasse à maioridade. (LOUSADA; FERREIRA, 2000: 113).
D. Miguel recebeu a notícia das decisões de D. Pedro, em 1826, enquanto estava
no exílio, em Viena. Ali havia se estabelecido desde sua participação na “Abrilada”, em
30 de abril de 1824. Na ocasião, D. Miguel na condição de comandante-em-chefe, havia
determinado prisões de ministros de D. João VI, a pretexto de serem maçons, obrigando
também seu pai e rei a refugiar-se. O movimento foi rapidamente contido, mas causou
comoções contra o infante (LOUSADA; FERREIRA, 2000: 77-78). Depois da morte de
D. João VI e das determinações de D. Pedro, D. Miguel demonstrou adesão aos planos
do irmão. Chegou a jurar a Carta Constitucional e a assumir os esponsais com a sobrinha
de Viena e, apesar de ter se recusado a fazer escala no Rio de Janeiro antes de ir a Portugal,
foi nomeado regente, em 03 de julho de 1827. (LOUSADA; FERREIRA, 2000:124-137).
Quando D. Miguel chegou a Lisboa, em 22 de fevereiro de 1828, apressou-se a
afastar-se dos acordos. Transigiu com camaristas, nobres e camponeses pobres que o
aclamaram rei “absoluto”, optando pela convocação de cortes que emulassem os antigos
usos e costumes do Reino, aditando representantes do clero, da nobreza e do povo para
ressignificar sua condição no poder, em 11 de julho de 1828. Conforme apontou Andréa
Lisly Gonçalves, não há consenso na historiografia sobre a natureza do governo de D.
Miguel, porém “a ideia de retorno ao absolutismo não passa de um recurso ideológico,
6
já que o Estado absolutista já havia sofrido abalo suficiente com as revoluções liberais,
para que se pudesse voltar a uma ordem antiga”. (GONÇALVES, 2019:257-258).
É curioso notar que no Imparcial de 16 de setembro de 1826, Silva Maia chegou
a fazer previsões sobre o que aconteceria se D. Miguel não honrasse os acordos com o
irmão e a sobrinha. Alguns dos pontos elencados foram: que uma crise diplomática se
abriria com o Brasil e com a Inglaterra, resultando em conflito militar. Os negócios em
Portugal estariam ameaçados, visto que dependiam das relações com Brasil e Grã-
Bretanha para escoar seus principais produtos. Ademais, a crise se agudizaria pelo fato
de que muitos “capitalistas”, frente à mudança de governo, ocultariam seus cabedais ou
emigrariam, transferindo suas riquezas ao estrangeiro. (IMPARCIAL, n°18, 1826:03).
Um mês após D. Miguel iniciar seu reinado, Maia foi preso na cadeia da Relação
no Porto, em 27 de março de 1828. Segundo ele, por ter sido citado em uma devassa e
acusado por testemunhas anônimas de participar do movimento de 24 a 28 de julho de
1827 (IMPARCIAL, n°32, 1828:01). Esse movimento ficou conhecido como
“Archotadas”, visto que liberais protestaram à noite sob a luz de archotes, contra a
demissão do ministro da guerra, General Saldanha, durante a Regência de D. Isabel Maria
(VARGUES; TORGAL, 1998: 64). Mais tarde, em 1830, apontou que o motivo real de
sua prisão se deu porque D. Miguel tentou acabar com “o único periódico constitucional
que então existia” no Porto, conduzindo o redator à prisão “preventiva” por ter apoiado
abertamente D. Pedro IV e a Carta Constitucional desde 1826 (MAIA, 1841:10).
Maia tinha 51 anos de idade quando foi preso. Na ocasião, alegou ser “a primeira
vez que em nossa vida nos achamos violentamente reclusos, e isto em nossa pátria natural
[Porto], aonde viemos procurar asilo” quando “comoções violentas” afetaram, entre 1822
e 1823, “nossa pátria adoptiva [a Bahia]”. O negociante mencionou a sua infelicidade e
a de sua esposa, Joaquina Rosa da Costa, que “estando enferma no ato da nossa prisão”
teve a doença agravada e “sucumbiu em três dias, sendo sepultada em terra estrangeira,
sem lhe poder dizer o último adeus!”. Lamentou-se também pelo filho, Emílio Joaquim
da Silva Maia, por ter abandonado os estudos em Coimbra onde cursaria o primeiro ano
de medicina, para “vir socorrer seu infeliz pai, e sua mãe moribunda”. Disse que pouco
antes de ser preso, já se preparava para voltar ao Brasil (IMPARCIAL, n°32, 1828:01).
7
A prisão do redator do Imparcial durou pouco. Maia escapou, em 21 de maio de
1828, graças à Revolução Liberal do Porto iniciada, em 16 daquele mês. Apesar de elogiar
no Imparcial os militares que dela participaram, em sua memória de 1830, disse que não
possuíam energia necessária para a condução de uma revolução, pecando pelo excesso de
moderação. (MAIA, 1840:33). Vasco Pulido Valente, ao comentar as ações desses
militares, disse que “os ‘liberais’ não faziam inimigos gratuitamente, porque esperavam
conseguir o apoio da quase totalidade do exército”, prezando por evitar uma guerra civil.
Além disso, pesou sobre o movimento, a conjuntura internacional desfavorável aos
liberais, com a França de Carlos X, a Inglaterra de Wellington, a Espanha de Fernando
VII e o Império Austríaco que “apesar de desaprovarem pelo princípio a coroação de D.
Miguel, não o queria destituído de lugar-tenente”, porque não reconheceriam D. Isabel
Maria e temiam uma “revolução” semelhante à de 1820. (VALENTE, 2006: 99-102).
Nuno Gonçalo Monteiro observou que com o fim do movimento, em 03 de julho
de 1828, D. Miguel deu início a uma intensa perseguição aos liberais, instituindo um
Tribunal da Alçada do Porto, em 14 de julho de 1828. Não se sabe exatamente o número
de perseguidos políticos durante o regime miguelista, todavia, o autor estima que
ultrapassou 20.000 pessoas, tendo em vista uma população de três milhões de habitantes
à época. (MONTEIRO, 2013: 60). Em 1830, Maia disse que para a Alçada do Porto não
bastou sequestrar os seus bens. Seu genro teria sido preso, a quem considerava inocente.
Seu amigo e guarda-livros, José Antonio de Oliveira Barros foi executado e o padre,
Manoel Rodrigues Braga que serviu de censor ao Imparcial, foi condenado a dez anos de
degredo para Angola. (BRASILEIRO IMPARCIAL, n°07, 1830: 04).
Após o fim da revolução, Joaquim José da Silva Maia e seu filho fugiram para a
Galiza, na Espanha, na companhia da Divisão das Tropas Constitucionais e dali partiram
para o exílio. Em 1829, Maia se fixou no Rio de Janeiro, onde publicou o periódico O
Brasileiro Imparcial, cuja duração foi de janeiro a dezembro de 1830. Nele apoiou D.
Pedro no Brasil que sofria com a impopularidade em seu governo. Diversas vezes,
descreveu o posicionamento da comunidade internacional acerca dos emigrados do
governo de D. Miguel. Procurou persuadir os “brasileiros” de que “a causa da Rainha
Fidelíssima não era tão estranha ao Brasil”, visto que “D. Maria 2°, Rainha
8
Constitucional dos Portugueses reanimará as relações de comércio, e de amizade entre
Portugal e o Brasil”. Em sua visão, “os dois povos irmãos regidos pelo mesmo sistema,
pelo Pai, e pela Filha, mutuamente se auxiliarão para manter suas respectivas
Constituições” (BRASILEIRO IMPARCIAL, n°38, 1830: 01-02).
Vê-se que, Silva Maia, em 1830, continuou a defender que os dois territórios
poderiam ter ganhos mútuos desde que empregassem o sistema constitucional e aliassem
seus interesses no comércio. Reconheceu a Independência política do Brasil, mas não a
separação definitiva dos negócios luso-brasileiros:
A Independência deste Império está solidamente firmada não tanto pela
garantia dos Tratados com algumas Potências, como pelo caráter dos dois
povos; nenhum deles se querem mais unir politicamente, e só pelas relações de
comércio, e de amizade. (O BRASILEIRO IMPARCIAL, n°22, 1830: 03).
O Brasileiro Imparcial foi um periódico muito criticado. Contra ele diversos
jornais lançaram acusações, como o Aurora Fluminense de Evaristo Ferreira da Veiga.
Em 1830, Veiga acusou Maia de ser “português” contrário aos “brasileiros”, lembrando
seu passado na Bahia, quando se opôs à separação no Semanário Cívico. (AURORA
FLUMINENSE, n°376, 1830: 01). Acusou-o, ainda, de participar do “partido áulico
recolonizador”, posto que “o Imparcial é pago por essa mesma cabala, tão inimiga das
liberdades do Brasil como as de Portugal”. Para ele, esta cabala “palaciana” “retinha
no Rio de Janeiro os emigrados, como instrumentos (...) para seus fins criminosos”.
(AURORA FLUMINENSE, n°404, 1830: 03). Maia se defendeu das acusações, dizendo
portar passaporte como “brasileiro”, expedido por autoridades legais desde quando jurou
a Independência na Câmara no Maranhão, em 1823. Alegou que sua cidadania estaria
amparada pela Constituição de 1824, no art.6 § 4, por ter cumprido todas as exigências5.
Na condição de exilado, disse que o Consulado em Portugal e as delegações do Império
do Brasil nas Cortes da Europa, em 1829, “nos reconheceram por súdito do mesmo
[Império do Brasil], e nos deram novos Passaportes com os quais nos apresentamos
nesta Corte”. (BRASILEIRO IMPARCIAL, n°79, 1830: 01).
5 Para mais informações sobre a questão da cidadania atribuída por decretos e leis durante o Primeiro
Reinado, ver: (RIBEIRO, 1997).
9
Nívea Carolina Guimarães notou as desavenças entre Evaristo da Veiga e Silva
Maia, comentando a condição de emigrado deste último, que o levou a ser detratado como
“áulico”. Também chamou a atenção para o fato de que o redator do Aurora Fluminense
não considerou desarrazoada a possibilidade de retorno de D. Pedro, em 1833, para reaver
os direitos do filho no Brasil na condição de tutor ou, ainda, encabeçar sua subida ao
trono a “pretexto de aceder à vontade geral dos povos”. Mostrou que naquele contexto,
havia desconfianças, apesar de remotas, por parte de Veiga sobre a possibilidade de
aproximação entre os territórios (GUIMARÃES, 2016: 42 et seq.). Para Evaristo da
Veiga, muitos personagens descontentes com a situação na Regência, poderiam tentar
convencer D. Pedro de “que a sua presença é aqui precisa para salvar a Monarquia”,
vendo que os exemplos, como o de Carlos V na Espanha, poderiam levá-lo a se arrepender
da abdicação de 1831. (AURORA FLUMINENSE, n°724, 1833: 02).
As disputas na imprensa na década de 1820 e de 1830, revelaram-se intensas. Os
vocabulários carregados de sentidos políticos foram mobilizados insistentemente, assim
como vários recursos retóricos e acusações cotidianas marcaram os assuntos nas diversas
folhas (MOREL, 2002; BASILLE, 2018). Diferentes projetos divulgados expressavam
também diferentes expectativas de negócios de grupos ligados à política, dando vazão a
concepções liberais diversas. Se por um lado, o liberalismo de Maia dizia respeito às
vantagens de se manter vínculos comerciais entre Portugal e Brasil, por outro lado, o
liberalismo de Evaristo da Veiga, próximo ao de Bernardo de Vasconcellos, pautava-se
em prerrogativas da livre-concorrência, excluindo vantagens de portugueses nos portos
brasileiros (AURORA FLUMINENSE, n°71, 1828: 01).
Joaquim José da Silva Maia faleceu, em março de 1831, segundo o redator d’O
Moderador “pela rotura de um aneurisma do coração”. Para ele, Maia foi “um campeão
vigoroso e ousado que desapareceu da carreira da polêmica”. Chamou a atenção para o
“inacreditável” fato de que durante seu enterro, “um número assaz considerável de
estouvados” se reuniu “para ultrajar o seu cadáver, [e] insultar as últimas honras que a
religião tributa a seus filhos”. Essa afronta, em sua visão, se deveu ao “ódio de partido
[que] sobrevive à mesma morte”. Foi preciso intervenção da polícia e de religiosos de S.
Antônio, para preservar a igreja da profanação. (O MODERADOR, n° 81, 1831: 03).
10
Biografia, memória e política:
Situando as discussões sobre biografia enquanto possibilidade para a escrita da
história na atualidade, é importante ter em vista o movimento errático que o gênero
suscitou, fornecendo diversas compreensões e indagações para a história. Conforme
apresentou Sabina Loriga, na segunda metade do século XX, sobretudo na década de
1980, novo paradigma marcou os estudos sobre biografias no momento em que entraram
em crise modelos interpretativos sustentados sobre escala abrangente de análise, como o
marxismo e o estruturalismo. Foi crescente o interesse pela democratização do perfil dos
biografados, ampliando investigações sobre a memória dos vencidos, das mulheres, dos
pobres e de todos os excluídos da história “oficial”. (LORIGA, 2011:213).
As discussões sobre biografia e historiografia são importantes para esse trabalho,
na medida em que descortinam os interesses políticos e os apelos teleológicos dos autores
que procuraram formar um panteão de “homens ilustres” durante o processo de
construção e consolidação do Estado Nacional. Destaca-se o trabalho de Cecilia Helena
Lorenzini de Salles Oliveira que, ao considerar a dinâmica da lembrança e do
esquecimento, observou que a seleção de personagens a serem imortalizados ou
esquecidos, assim como de interpretações e de marcos cronológicos adotados na
historiografia, precisam ser considerados como derivativos de interesses políticos para a
conformação de uma memória. (OLIVEIRA, 1999: 17-18). No mesmo sentido, ao
estudar a província do Maranhão que, assim como a Bahia não aderiu prontamente à
proposta separatista de 1822, Marcelo Cheche Galves, valendo-se das interpretações de
Cecília Salles Oliveira, observou que desde o século XIX com John Armitage até 1970,
a historiografia obscureceu os diversos projetos afirmando que na América Portuguesa
teria havido uma unanimidade pela separação, visto ser objetivo de muitos autores
encobrir personagens e propostas que defenderam expectativas políticas diferentes, muito
divulgadas em províncias como Pará, Maranhão e Bahia (GALVES, 2010:17).
Na historiografia dedicada ao tema da Independência, são poucas as referências
sobre a trajetória de vida de Joaquim Maia ou estudos que investigaram seu projeto
político. A maioria dos estudos sobre ele, o caracterizaram como um “português”
contrário aos “brasileiros” na luta pela Independência. No século XIX, houve tentativa de
11
obscurecer os diversos projetos, sedimentando interpretação de que a separação foi
resultado da oposição entre “portugueses” e “brasileiros”, entendimento que já foi
problematizado por produções recentes que abordaram as complexidades no processo de
configuração das identidades nacionais (Cf. MARSON, OLIVEIRA, 2018; JANCSÓ;
PIMENTA, 2000, RIBEIRO, 2002).
Em Reclamação do Brasil de 1822, José da Silva Lisboa comentou que o
Semanário Cívico havia “obstado o reconhecimento público da dignidade da regência
de S. A. R.” e que, em 1821, no Rio de Janeiro, existia uma “cabala anti-brasílica”
“mancomunada com sua Sociedade Correspondente fixa na Bahia” da qual Maia teria
participado (LISBOA,1822: 35 et seq.). Já em 1830, na História dos principais sucessos
do Brasil, Lisboa apontou que os “cabalistas portugueses” tinham ódio dos “patriotas
brasileiros” (LISBOA, 1830: 05). John Armitage, em História do Brasil de 1837,
seguindo a interpretação de Silva Lisboa, fez referências à Bahia dizendo que ali havia a
“preponderância” de “portugueses natos” e, por esse motivo, a Junta Provisória não
reconheceu a “autoridade de D. Pedro como Regente” demarcando a oposição entre
“brasileiros” e “portugueses” (ARMITAGE, 1837:28).
Em obra póstuma intitulada História da Independência do Brasil de 1916,
Francisco Adolfo Varnhagen relatou que “esbravejaram na Bahia, os inimigos da causa
brasílica”, referendando o Semanário Cívico como um de seus representantes.
(VARNHAGEN, 1916: 409-410). Por sua vez, Nelson Werneck Sodré, em 1966, também
mencionou o aparecimento do Semanário Cívico, em 1821, na Bahia, como representante
da “imprensa áulica” ao lado da Idade d’Ouro do Brasil. Caracterizando o periódico
como “absolutista”, disse que merecia “o apelido de ‘semanário cínico’ que lhe puseram
os baianos”, destacando o “luso” Silva Maia como seu redator. (SODRÉ, 1999:49).
Seguindo interpretação de Sodré, Consuelo Pondé de Sena realizou estudo, em 1983,
sobre o Sentinella Bahiense, que foi republicado, em 2016. Segundo a autora, seu objetivo
era “comentar a propaganda antinacionalista promovida pelo referido Jornal”,
considerando o “português” Joaquim José da Silva Maia como “reacionário” por ter sido
contrário aos “patriotas brasileiros” no contexto da Independência. Christiane Peres
Pereira defendeu, em 2013, dissertação para investigar a trajetória de Maia e suas
12
participações na imprensa. Todavia, nota-se que a autora polemizou com o personagem,
considerando-o “português”, “áulico” e “conservador”, cujos pensamentos políticos, em
toda a sua trajetória, denotavam uma postura por um “constitucionalismo exacerbado, à
maneira liberal conservadora, portuguesa, de ser” (PEREIRA, 2013:15).
Nota-se que na década de 1840, Emílio Joaquim da Silva Maia (1808-1859), filho
de Joaquim José da Silva Maia procurou retomar a memória do pai. Observa-se, que desde
cedo, declarou alinhamento à posição política de seu progenitor. Em 1826, aos dezessete
anos, escreveu uma carta avisando a ele de seu alistamento no Corpo dos Voluntários
Acadêmicos de Coimbra para combater milícias miguelistas. Seu pai valeu-se da
declaração do filho, para dizer que entre os voluntários, havia “estudantes brasileiros,
que com generoso entusiasmo quiseram fazer causa comum com seus condiscípulos
portugueses” (IMPARCIAL, n°56, 1826:03). Orgulhoso, publicizou a carta de Emílio,
dizendo que “nosso filho, mancebo de 17 anos (natural da Bahia) frequentando o 3° ano
filosófico” havia se alistado. Um trecho da carta do jovem foi publicado no Imparcial,
onde justificou sua atitude dizendo que, como brasileiro, quis dar um testemunho ao
“nosso Imperador” de que na Europa “os brasileiros” defendiam seus direitos:
fui dos primeiros a alistar-me, e o mesmo fizeram mais vinte e tantos
Brasileiros: queremos dar um testemunho ao nosso Imperador que cá na
Europa sabemos pugnar pelos seus direitos; e uma prova autêntica aos
Portugueses do amor fraternal que lhes consagramos. Tenho lido e relido todos
os artigos de guerra, e tenho-me exercitado em todas as evoluções militares.
Console minha Mãe; diga-lhe que não tenha medo: e se eu morrer na
campanha, lembre-lhe que para as Espartanas era um dia de júbilo aquele em
que recebiam a notícia da morte de um filho no campo da honra em defesa da
pátria. Lance-me a sua benção e esteja certo que eu voltarei com o meu escudo
ou sobre o meu escudo (IMPARCIAL, n° 56, 1826: 03).
Emilio Maia se exilou com o pai, em 1828, depois de desarticulada a Revolução
do Porto. Chegou ao Rio de Janeiro, em 1829, já bacharel em filosofia. Segundo Lúcia
Garcia, Maia permaneceu no Brasil apenas alguns meses, transferindo-se a Paris, onde
formou-se em Ciências Físicas e Matemática, diplomando-se, em 1833, em Medicina e
retornando ao Rio de Janeiro naquele mesmo ano (GARCIA, 2004: 21). Na capital, fez
parte dos principais círculos intelectuais (e políticos), tornando-se membro da Sociedade
Auxiliadora da Indústria Nacional e sócio fundador do Instituto Histórico e Geográfico
Brasileiro. A ele coube presidir sessão dedicada à História na Instituição. Interessante
13
notar que Emílio Maia fez discurso pela memória de Evaristo da Veiga, em 1837, e recitou
elogio histórico a José Bonifácio, em 1838. Tais personagens tinham sido opositores de
seu pai, entre 1822 e 1830, entretanto, as questões históricas e políticas já não eram as
mesmas naquele momento, estando Emílio Maia ambientado àquela conjuntura.
Maia só editou e publicou as memórias do pai, em 1841, durante o reinado de D.
Pedro II. Disse que os espólios do falecido “chegaram às suas mãos, em 1834”, mas é
possível que, por cautela política, julgou propício publicá-los na década de 1840. Na
edição, disse que foi levado “pela ideia de pagar um tributo à memória de meu Pai (...)
porque nisso mesmo quis dar uma prova de todo o meu respeito e amor filial” (MAIA,
1840: VII). Com o título de Memórias Históricas, Políticas e Filosóficas da Revolução
do Porto em Maio de 1828 e dos Emigrados Portugueses pela Espanha, Inglaterra,
França e Bélgica, Emílio Maia dedicou a obra ao IHGB para “acobertá-la com o vosso
nome, porque ela necessita do mais alto apoio, e [para] cumprir, como já disse, uma
obrigação contraída desde que me associei aos vossos trabalhos”.(MAIA, 1841:V).
Frente à dedicatória, procurou justificar as posições políticas que seu pai adotou, dizendo
que estava acometido pelas afecções do momento. Não negou que os personagens ali
criticados, alçaram no atual cenário, a condição de heróis, todavia, preferiu não modificar
as palavras do autor, pedindo escusas e considerações ao público:
Convenho em que muitas asserções se acham hoje, senão desmentidas, ao
menos minoradas pela conduta posterior de muitos indivíduos, de que tratam
estas Memórias (...) convenho igualmente, em que escrevendo meu Pai no
meio dos sofrimentos e privações a sua pena não se achava isenta das afecções
do momento, e que eu podia haver retocado o quadro que ele traço, mudando
os trajes de muitas personagens, que depois vestiram outras galas, e se
apresentaram hoje como heróis e beneméritos da Pátria; porém neste caso seria
mister inverter o pensamento do autor. (MAIA, 1841: VIII)
Emílio Maia se implicou naquela narrativa ao relatar que acompanhou o “Pai em
toda essa desgraçada emigração”, sendo testemunha de suas vivências e intempéries
para defender o constitucionalismo e a causa de D. Pedro IV. Reiterou que os valores do
passado devem ser considerados em seu tempo, prevenindo-se das críticas e julgamentos
de seus contemporâneos à obra:
Em minha posição social como Brasileiro, e como homem de uma profissão
estranha a negócios políticos, não podia hoje ter em vista menoscabar o crédito
de ninguém, e muito menos de homens eminentes, que por uma série de
serviços prestados desde 1832 até esta data, se tem constituído acima de toda
14
a censura; mas a verdade histórica da época anterior em nada deslustra estes
serviços, porque eles foram em prol da causa, de que meu finado Pai se mostrou
tão corajoso propugnador. Se algum interesse tem estas Memórias é o de serem
escritas na época em que os fatos não podia ser contestados, e em que a causa
constitucional se achava abandonada à sua própria sorte; então não podíamos
julgar os homens, como hoje, por seus feitos posteriores (MAIA, 1841:IX).
Em 1844, publicou outro escrito de seu pai, dessa vez, na revista Minerva Brasiliense
com a qual colaborava. Intitulou-o Memórias históricas e filosóficas sobre o Brasil,
informado ter sido escrito, em 1824. (ver: ALVES, 2016).
Em vista da exposição, constata-se a tentativa de Emílio Maia não só para
justificar a memória do pai como para defendê-la. Nota-se que o próprio médico, apesar
de sua intensa atividade intelectual, não adquiriu um “lugar” de destaque na memória e
na historiografia, posto que são poucos os trabalhos dedicados a esse sócio do IHGB,
conforme observou Lúcia Garcia (GARCIA, 2004: 11-12). Diante de todas essas
tentativas, seu pai não conseguiu ser integrado ao rol de “ilustres”, mesmo com os
esforços do filho para lembrar a sua luta pela causa de D. Pedro e da filha em Portugal
que, indiretamente, se correspondeu com a de D. Pedro II, como ele mesmo observou
(MAIA, 1841: VIII). Joaquim Maia foi encoberto pela memória que se constituiu ao longo
do século XIX. Nas poucas vezes em que foi lembrado, foi retratado como um “áulico”,
“conservador”, “absolutista” e “recolonizador”. Essas inculpações foram endossadas por
parte da historiografia no século XX que repetiu as acusações de inimigos
contemporâneos a Maia na imprensa, como se procurou mostrar.
Torna-se evidente que motivações políticas foram fundamentais para que a
memória de Maia fosse encoberta no Brasil, ou ainda, para que a ele fosse legado um
perfil como inimigo dos “brasileiros” por ser considerado “português” e “absolutista”,
tanto no século XIX quanto no século XX, mesmo que o negociante tenha defendido
projeto liberal ao longo de toda a sua trajetória e tenha se declarado “brasileiro”. Maia
realizou modelações em seu projeto adequando-o às transformações políticas, mas não
deixou de defender a manutenção das relações de negócio e a monarquia constitucional e
representativa em Portugal e Brasil. Estudar sua trajetória de vida e expectativas é
importante, pois pode espelhar as de outros personagens que defenderam semelhante
projeto. Sua proposta para um “Império luso-brasileiro” foi vencida e, por essa razão, a
15
memória de Maia foi alvo de disputas e distorções, posto que a historiografia destacou
personagens e projetos favoráveis à separação, expressando interesses políticos inerentes
ao momento em que foram produzidas.
Considerações Finais:
Procurou-se mostrar nesse trabalho, que o projeto pela separação não foi o único
a ser defendido na década de 1820 e que, só recentemente, estudos têm sido dedicados à
investigação da multiplicidade de projetos e da atuação de grupos distintos nas diversas
províncias, refletindo, em certa medida, sobre a condição política de ser cidadão
português ou brasileiro, após 1823, e sobre diferentes concepções liberais engendradas
nos anos de 1820 e 1830. Apesar da separação, vínculos de natureza política, de
parentesco e de negócios não seriam facilmente dissolvidos, restando a grupos que
participaram do mercado luso-brasileiro, antes e após a Independência, disputarem e
defenderem a reaproximação entre os territórios para conservar suas redes de negócios.
Tais expectativas, apesar de perderem força, só foram completamente descartadas na
abdicação de D. Pedro, em 1831 e, sobretudo, sua morte, em 1834. Abordar, portanto,
aspectos da biografia de Maia, desnudando que mesmo sendo pai de um dos membros do
IHGB não conseguiu se destacar no panteão formado por “homens ilustres”, evidencia as
relações de poder e de política na dinâmica dos que foram lembrados ou encobertos pela
memória e pela historiografia que se constituíram ao longo do tempo sobre a
Independência do Brasil.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ALVES, Walquiria de Rezende Tofanelli. Expectativas para a “nação portuguesa” no
contexto da Independência: o projeto de Joaquim José da Silva Maia (1821-1823).
Dissertação de mestrado, Campinas. UNICAMP, 2018.
______. Expectativas para o Império luso-brasileiro: a memória histórica e filosófica sobre
o Brasil de Joaquim José da Silva Maia (1820-1824). Anais do XXIII Encontro Estadual de
História, ANPUH, 2016.
ARAÚJO, Valdei Lopes. Sobre a permanência da expressão historia magistra vitae no século
XIX brasileiro. In.:______; NICOLAZZI, Fernando; MOLLO, Helena Miranda; (Orgs.).
Aprender com a história? O passado e o futuro de uma questão. Rio de Janeiro, Editora FGV,
2011, p. 131-147.
BARBOSA, Silvana Mota. Autoridade e Poder Real: Benjamin Constant e a Carta
Constitucional Portuguesa de 1826. Locus, v. 10, n. 2, 2004, pp. 07-22.
16
BASILLE, Marcelo. Regência e imprensa: percursos historiográficos. Almanack, Guarulhos,
n°20, 2018, p. 01-09.
CARDOSO, José Luís; CUNHA, Alexandre Mendes. Discurso econômico e política colonial
no Império luso-brasileiro (1750-1808). Tempo, vol. 17, n°31, 2011, p.65-88.
CEZAR, Temístocles. Livros de Plutarco: biografia e escrita da história no Brasil do século
XIX. In.: Métis. História e Cultura, Revista de História da Universidade de Caxias do Sul, v.
2, n.3, 2003, p. 73-94.
ENDERS, Armelle. Os vultos da nação: fábrica de heróis e formação dos brasileiros. Rio de
Janeiro, Editora FGV, 2014.
FERREIRA, Maria de Fátima Sá e Melo & LOUSADA, Maria Alexandre. D. Miguel. Lisboa:
Círculo de Leitores, 2009.
GALVES, Marcelo Cheche. “Ao público sincero e imparcial”: Imprensa e Independência do
Maranhão (1821-1826). Tese de Doutorado. Universidade Federal Fluminense, 2010.
GARCIA, Lúcia Maria Cruz. Emílio Joaquim da Silva Maia. Um intelectual no Império do
Brasil. Dissertação (mestrado). Rio de Janeiro, UERJ, 2004.
GONÇALVES, Andréa Lisly. O apoio popular à monarquia no contexto das revoluções
liberais. Varia História. Belo Horizonte, vol. 35, n. 67, p.241-272.
GUIMARÃES, Lucia Maria Paschoal. Debaixo da imediata proteção de Sua Majestade
Imperial: o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (1838-1889). RIHGB. Rio de Janeiro,
a. 156, nº 388, 1995, p. 459-613.
GUIMARÃES, Nívea Carolina. O movimento miguelista nas páginas d’Aurora Fluminense
(1828-1834). Dissertação de Mestrado, Mariana, UFOP, 2016.
JANCSÓ, István; PIMENTA. João Paulo G., Peças de um mosaico. Revista de História das
Ideias. Coimbra, Universidade de Coimbra, v. 21, 2000.
LOUSADA, Maria Alexandre; FERREIRA, Maria de Fátima Sá e Melo. D. Miguel. Lisboa:
Círculo do Livro; Centro de Estudos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa, 2009.
LYRA, Maria de Lourdes Viana. A utopia do poderoso e vasto império: Portugal e Brasil
bastidores da política, 1798-1822. Rio de Janeiro. Sette Letras, 1999.
MONTEIRO, Nuno Gonçalo. A Vida Política. ______. Jorge M. Pedreira (Coords). História
Contemporânea de Portugal 1808-2010 (vol. 1). ______. António Costa Pinto (Orgs). Lisboa.
Fundación MAPFRE & Objectiva, 2013. MOREL, Marco. Papeis incendiários, gritos e gestos: a cena pública e a construção nacional
nos anos 1820-1830. Topoi, Rio de Janeiro, 2002, pp. 39-58.
LORIGA, Sabina. O Pequeno X. Da biografia à história. Tradução Fernando Scherbe. Belo
Horizonte, Editora Autêntica, 2011.
OLIVEIRA, Cecília Helena L. de Salles. A astúcia liberal. Relações de mercado e projetos
políticos no Rio de Janeiro (1820-1824). São Paulo, Editora Ícone e Edusf, 1999.
______. MARSON, Izabel Andrade. Liberalismo, monarquia e negócios: laços de origem.
In: MARSON, Izabel Andrade; OLIVEIRA, Cecília Helena de Salles (Orgs). Monarquia,
liberalismo e negócios no Brasil:1780-1860, São Paulo. Edusf, 2013.
OLIVEIRA, Maria da Glória de. Biografia e historia magistra vitae: sobre a exemplaridade
das vidas ilustres no Brasil oitocentista. Porto Alegre, Anos 90, vol. 22, n°42, 2015, p. 273-
294.
PEREIRA, Christiane Peres. A imparcialidade para doutrinar: os impressos de Joaquim José
da Silva Maia no Brasil e em Portugal (1821-1830). Dissertação de Mestrado, Rio de Janeiro,
UFRRJ, 2013.
17
RIBEIRO, Gladys Sabina. A liberdade em construção. Identidade nacional e conflitos
antilusitanos no Primeiro Reinado. Rio de Janeiro Relume Dumará, 2002.
______. “Inimigos Mascarados com o Título de Cidadãos”. A vigilância e o controle sobre
os portugueses no Rio de Janeiro do Primeiro Reinado. Acervo. Rio de Janeiro, v. 10, n°2, p.
85-98.
SANTOS, Guilherme de Paula Costa. No calidoscópio da diplomacia: formação da
monarquia constitucional e reconhecimento da Independência e do Império do Brasil, 1822-
1827.Tese (Doutorado). USP, São Paulo, 2015.
SENA, Consuelo Pondé de. A imprensa reacionária na independência: Sentinela Bahiense.
Salvador. Centro de Estudos Baianos da Universidade Federal da Bahia, 1983.
SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro. Mauad, 1999.
SILVA, Maria Beatriz Nizza da. Semanário Cívico. Salvador, EDUFBA, 2008.
VALENTE, Vasco Pulido. Os militares e a política. Lisboa, Imprensa Nacional Casa da
Moeda, 2005.
VARGUES, Isabel Nobre; TORGAL, Luís Reis. Da revolução à contra-revolução: vintismo,
cartismo. Absolutismo. O exílio político. In: MATOSO, José. História de Portugal, vol.5.
Lisboa, Círculo de Leitores, 1993, p.65-87.
Fontes:
ARMITAGE, John. História do Brasil, desde a chegada da real Família de Bragança, em
1808, até a abdicação do Imperador D. Pedro I, em 1831. Rio de Janeiro. Tipografia de J.
Villeneuve e Comp., 1837.
LISBOA, José da Silva. Reclamação do Brasil. Partes VIII e IX. Imprensa Nacional, 1822.
______. História dos principais sucessos políticos do Império do Brasil. Parte X. Seção III.
Tipografia Imperial e Nacional. 1827-1830
MAIA, Joaquim José da Silva. Estado político do Maranhão em 19/11 do ano próximo
passado, dia em que saiu o Bergantim Nelson, chegado a esta corte no dia primeiro do
corrente em de janeiro de 1824. In.: Biblioteca Nacional, Sessão de manuscritos, BN MS –
31,33,022 (n.003).
______. Memórias históricas, políticas e filosóficas da revolução do Porto de maio de 1828
e dos emigrados portugueses pela Espanha, Inglaterra, França e Bélgica. Rio de Janeiro.
Tipografia Laemmert, 1841.
VARNHAGEN, Francisco. História da Independência do Brasil. 2° Edição, RIHGB, 1938.
Periódicos: Idade d’Ouro do Brasil. Bahia. Tipografia Viúva & Serva Carvalho, 1810-1822.
Semanário Cívico. Bahia. Tipografia Viúva & Serva Carvalho, 1821-1823.
O Brasileiro Imparcial. Rio de Janeiro. Tipografia do Diário, 1830.
O Moderador. Rio de Janeiro. Tipografia de Ogier, 1830.
A Aurora Fluminense. Rio de Janeiro. Tipografia do Diário, 1830.