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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1445168-8, DA VARA DA FAZENDA

PÚBLICA DE PINHÃO

Apelante : ELIAS FARAH JÚNIOR

Apelado : MINISTÉRIO PÚBLICO

Relator Designado: LEONEL CUNHA

EMENTA

1) DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL

PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO (ARTIGO 23, DA LEI Nº

8.429/92). ASSÉDIO MORAL PRATICADO POR PREFEITO,

EM RAZÃO DE PERSEGUIÇÃO POLÍTICA A SERVIDORES

PÚBLICOS MUNICIPAIS. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (ARTIGO 11, LEI Nº 8.429/92).

CARACTERIZAÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.

a) Considerando que a ação foi proposta em

03/07/2009, e que o mandato do Prefeito Municipal, ora

Apelante, terminou em 31/12/2004, não há que se falar

em prescrição, visto que o ajuizamento da demanda se

deu dentro do prazo quinquenal previsto no artigo 23,

da Lei nº 8.429/92.

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Apelação Cível nº 1445168-8

b) No caso, ficou comprovado, especialmente

pela prova testemunhal, que o então Prefeito do

Município de Reserva do Iguaçu atuou, dolosamente, a

fim de prejudicar servidores públicos municipais que

apoiaram o candidato adversário durante a campanha

para a Prefeitura, causando-lhes sérios abalos morais.

c) A prática da conduta desvirtuada, demonstra

a violação de princípios da Administração Pública,

especialmente os princípios da legalidade,

impessoalidade e moralidade, caracterizando, assim, a

prática de ato de improbidade administrativa, previsto

no artigo 11, da Lei nº 8.429/92.

d) Nesse aspecto, destaca-se que segundo o

Enunciado nº 10, das 4ª e 5ª Câmaras Cíveis, é

necessária a comprovação do dolo para a condenação

nos atos de Improbidade Administrativa previstos nos

artigos 9º e 11, da Lei nº 8.429/1992. Entretanto, é

importante esclarecer que o dolo não se confunde com

a má-fé do agente, isto é, com a vontade qualificada

por obter um resultado danoso.

e) O dolo é, conceitualmente, a vontade livre de

realizar o resultado vedado em Lei. A má intenção não

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importa, pois a imputação está relacionada à ofensa ao

preceito legal, não ao resultado esperado pelo agente.

Isso significa dizer que há dolo ainda que o sujeito aja

de boa-fé, isto é, na crença subjetiva de que a atitude

era correta e traria benefícios.

f) Assim, o dolo necessário para a condenação

de violação a princípios é o genérico, e não o dolo

qualificado pela má-fé, conforme entendimento

contemporâneo desta Corte, bem como do Superior

Tribunal de Justiça.

g) É bem de ver que os atos averiguados nos

presentes autos atentam frontalmente contra a base

principiológica da Administração Pública brasileira, de

forma que devem se aplicar as sanções previstas no

artigo 12, inciso III, da Lei nº 8.429/92.

2) DIREITO ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA. READEQUAÇÃO DAS SANÇÕES

IMPOSTAS, COM BASE NOS PRINCÍPIOS DA

PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE.

a) Reconhecida a improbidade administrativa,

impõe-se observar, na fixação da sanção, os princípios

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da proporcionalidade e da individualização, bem como o

disposto no parágrafo único, do artigo 12, da Lei nº

8.429/92: “Na fixação das penas previstas nesta lei o

juiz levará em conta a extensão do dano causado,

assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente”.

b) No caso, deve ser mantida a sanção de

suspensão dos direitos políticos do Apelante,

readequada, no entanto, para que perdure pelo prazo

de 03 (três) anos.

c) Igualmente, a multa civil fixada na sentença

se mostra excessiva, devendo ser arbitrada em valor

equivalente a 02 (duas) vezes a remuneração percebida

pelo agente.

d) Por outro lado, não tem cabimento, no caso, a

condenação do Apelante à proibição de firmar contratos

com o Poder Público, ou dele receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa

jurídica da qual seja sócio majoritário, pois não é

aplicável ao caso, já que a improbidade foi praticada no

exercício de cargo público e não em razão de contrato

com a Administração Pública

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Apelação Cível nº 1445168-8

3) APELO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.

Vistos, RELATÓRIO

1) Em 03/07/2009, o MINISTÉRIO PÚBLICO

ajuizou AÇÃO CIVIL PÚBLICA (fls. 03/14) em face de

ELIAS FARAH JÚNIOR, sustentando que: a) em

14/03/2001, instaurou-se inquérito civil, com a

finalidade de apurar irregularidades na exoneração e

contratação de funcionários pela Prefeitura do

Município de Reserva do Iguaçu; b) o Réu, à época

Prefeito do referido Município, utilizava vagas do quadro

de servidores comissionados, nomeando apadrinhados

políticos para exercerem atividades típicas de

servidores efetivos, contudo, sem a prévia aprovação

em concurso público; c) o Réu constrangia servidores

efetivos a trabalhar em condições degradantes ou a

não desempenhar suas atribuições, com o intuito de

que pedissem exoneração dos cargos; d) as seguintes

situações ocorrem após a posse do Réu: ANDRÉ

LUSTOSA DE SIQUEIRA e EDICLÉIA MARIA DOS SANTOS

MENDES foram obrigados a trabalhar, cada um, em

uma sala isolada, com apenas uma cadeira; PEDRO

AGOSTINHO MENDES recebeu suspensão por ter se

recusado a realizar atividades distintas das atribuições

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Apelação Cível nº 1445168-8

de seu cargo; PAULO CÉSAR BATISTA NUNES recebeu

descontos, injustificados, enquanto reparos eram

realizados no local em que iria trabalhar; NIVALDO

RIBEIRO teve descontos no salário, mesmo tendo

trabalhado; ROMILDO DE OLIVEIRA CALDAS foi

impossibilitado de registrar seu cartão-ponto; e) após

vencer as eleições municipais, o Réu alterou a Lei de

contratação de comissionados e realizou 94 (noventa e

quatro) nomeações, todas para “pagar” promessas de

campanha, bem como deixou de pagar metade dos

salários de servidores que não o apoiaram na

campanha; f) o então Prefeito violou os princípios da

moralidade, legalidade, isonomia e impessoalidade,

praticando ato de improbidade administrativa, previsto

no artigo 11, da Lei nº 8.429/92. Requereu a

condenação do Réu nas sanções previstas no artigo 12,

inciso III, da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº

8.429/92).

2) ELIAS FARAH JÚNIOR apresentou defesa

prévia (fls. 42/58), alegando que: a) preliminarmente, a

ação de improbidade administrativa prescreve em 05

(cinco) anos, contados do término do mandato; b) a Lei

nº 8.429/92 é inconstitucional, sendo inclusive objeto

da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.182-6, que

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tramita no Supremo Tribunal Federal; c) a Lei de

Improbidade Administrativa somente se aplica a

funcionários públicos, mas não a agentes políticos; d) o

MINISTÉRIO PÚBLICO é parte ilegítima para figurar no

polo ativo e, também, só poderia ter proposto a ação

após o julgamento pela Câmara Municipal.

3) A decisão de fls. 63/73 afastou

preliminares, recebeu a inicial e determinou a citação

do Réu.

4) ELIAS FARAH JÚNIOR contestou (fls.

79/101), argumentando que: a) a decisão que recebeu

a inicial é nula, pois foi publicada após a confecção do

mandado de citação; b) deve ser reconsiderada a

decisão que afastou as preliminares ou,

subsidiariamente, ser acolhida a contestação como

Agravo Retido; c) está prescrita a pretensão de

condenar o Réu pela prática de ato de improbidade

administrativa; d) as nomeações e movimentações de

servidores do Município de Reserva do Iguaçu foram

realizadas em conformidade com a legislação vigente;

e) mesmo que houvesse erros administrativos, não há

dolo ou prejuízo ao erário, que possibilite a condenação

por improbidade administrativa; f) o Réu sempre atuou

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pautado pelos princípios da boa-fé e da moralidade.

5) O MUNICÍPIO DE RESERVA DO IGUAÇU

requereu o ingresso no feito, na condição de

litisconsorte ativo necessário (fls. 113/114).

6) Realizou-se audiência de instrução (fls.

145/146 e 151/161).

7) A sentença (fls. 940/955) julgou

procedente o pedido inicial, “para reconhecer a prática

de ato de improbidade administrativa que atentou

contra os princípios da administração pública e

condenar o réu Elias Farah Júnior, nas seguintes sanções

(art. 12, inciso III da Lei nº 8.429/92):

a) suspensão dos direitos políticos no

patamar de 5 (cinco) anos, a demandar comunicação à

Justiça Eleitoral após o trânsito em julgado desta

sentença, a quem competirá a implementação da

medida, nos termos do art. 77 do Código Eleitoral;

b) pagamento de multa civil fixada em 40

(quarenta) vezes sobre o valor da remuneração

percebida pelo agente, devidamente corrigida

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monetariamente pelo índice do INPC/IBGE, a partir da

publicação desta decisão e até a efetiva quitação, com

juros de mora de 1% ao mês a contar do primeiro dia

imediatamente posterior ao trânsito em julgado desta

decisão, a ser revertido em favor do Município de

Pinhão/PR;

c) proibição de contratar com o Poder

público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou

creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por

intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio

majoritário, pelo prazo de 03 (três) anos, cuja

efetivação se dará após o transito em julgado, com

comunicação às três esferas da Administração Pública”

(fls. 954/955).

Ainda, condenou o Réu ao pagamento das

custas processuais, deixando de condená-lo em

honorários advocatícios.

8) ELIAS FARAH JÚNIOR apelou (fls.

965/987), sustentando que: a) preliminarmente, está

prescrita a pretensão do MINISTÉRIO PÚBLICO,

considerando que a citação ocorreu mais de 05 (cinco)

ano após o término do mandato do Apelante; b) as

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nomeações e movimentações de servidores no

Município sempre se pautaram nos princípios da

legalidade e moralidade administrativa, estando dentro

da autonomia administrativa do Prefeito; c) não há dolo

ou prejuízo ao erário, inexistindo, assim, qualquer ato

de improbidade administrativa; d) o suposto assédio

moral foi praticado pelo então Secretário de

Administração, LINCOLN BRAGA; e) as sanções

impostas desrespeitam os princípios da razoabilidade e

da proporcionalidade.

9) Contrarrazões nas fls. 1034/1040.

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

a) Da prescrição

Quanto à prescrição, versa a Lei nº

8.429/92: “Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos

as sanções previstas nesta lei podem ser propostas: I –

até cinco anos após o término do exercício de mandato,

de cargo em comissão ou de função de confiança”.

Assim, considerando que o mandato de

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Prefeito de ELIAS FARAH JÚNIOR terminou em

31/12/2004, e que a presente demanda foi ajuizada em

03/07/2009, não há que se falar em prescrição.

b) Da improbidade administrativa

Sustenta o MINISTÉRIO PÚBLICO que o Réu,

ELIAS FARAH JÚNIOR, após ser eleito Prefeito do

Município de Reserva do Iguaçu, praticou diversos atos

arbitrários e discricionários, com a finalidade de

prejudicar servidores públicos que apoiaram o

candidato do partido político contrário, nas eleições

municipais, incidindo, assim, no artigo 11, “caput”, da

Lei nº 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa).

Dispõe o referido artigo, no seu “caput”:

“Art. 11. Constitui ato de improbidade

administrativa que atenta contra os princípios da

administração pública qualquer ação ou omissão que

viole os deveres de honestidade, imparcialidade,

legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente;”

A sentença (fls. 940/955) julgou procedente

o pedido inicial e condenou o Réu nas seguintes

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sanções, previstas no artigo 12, inciso III, da Lei nº

8.429/92: a) suspensão dos direitos políticos pelo prazo

de 05 (cinco) anos; b) pagamento de multa civil no

valor de 40 (quarenta) vezes o valor da última

remuneração percebida pelo agente; c) proibição de

contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, por intermédio de

pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo

prazo de 03 (três) anos.

A prova dos autos é eminentemente

testemunhal, razão pela qual se faz necessária a

menção expressa aos depoimentos, colhidos em

audiência de instrução.

De pronto, menciona-se a situação de

EDICLÉIA MARIA SANTOS MENDES, que era Orientadora

Educacional. Perguntada se teve problemas após o Réu

ter assumido o mandato de Prefeito, respondeu que:

“Sim. Eu fiquei fechada numa sala na parte

administrativa da Prefeitura. Eu tinha uma cadeira e eu

dentro da sala. Eu aguentei, no máximo, uns dois

meses, e aí eu pedi a conta. O meu trabalho seria nas

escolas, orientando os alunos e professores. Eu fui

convocada para numa sala do lado do Administrador,

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Apelação Cível nº 1445168-8

Secretário de Administração, e nesta sala só tinha uma

cadeira e eu. E eu não fazia nada, e tinha uma pessoa

que ficava me cuidando na porta. Porque eu era

adversaria política, votei no outro candidato” (cf.

depoimento gravado em CD). Ainda, afirmou que era

vigiada pela pessoa que cuidava do Prefeito e do Vice-

Prefeito na época, sendo que, quando ia ao banheiro,

era escoltada por tal pessoa, não podendo se ausentar

da sala, sob pena de levar falta. Reforçou que não tinha

absolutamente nenhuma função e que, por esse

motivo, sofreu diversos abalos morais. Por fim, explicou

que, conforme informado por LINCOLN BRAGA

(Secretário de Administração), o motivo de tal

tratamento era puramente político, tendo a ordem

partido do Senhor Prefeito, ora Apelante.

ROMILDO DE OLIVEIRA CALDAS, que era

servidor concursado no cargo de Técnico em

Agropecuária, vivenciou situação semelhante. De

acordo com seu relato, depois que ELIAS FARAH JÚNIOR

assumiu o mandato de Prefeito, ocorreram algumas

mudanças, sendo designado para exercer funções que

não eram as suas, como, por exemplo, assentar meio-

fio. Narrou: “Começaram a aparecer descontos, por eu

não querer mais fazer desvio de função. Queria

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trabalhar como Técnico em Agropecuária” (cf.

depoimento gravado em CD). Após um período, voltou a

realizar suas funções de origem, contudo, mais uma vez

o deslocaram para atribuições que não eram suas: “Me

tiraram da função novamente, isso foi um ano e meio

antes de encerrar o mandato, em 2003. Aí me

designaram para ficar no Viveiro Municipal, por uma

ordem do Secretário de Agricultura, o Senhor MARCOS

LEANDRO TEIXEIRA, dizendo que eu iria trabalhar no

Programa Florestas Municipais. Aí o Programa já não

tinha mais convênio com a Prefeitura. Aí eu fiquei um

ano e meio no Viveiro Municipal, me sentindo um inútil,

não consegui dar uma orientação técnica no período de

um ano e meio. (...). Aí o Secretário da Agricultura

queria que eu fosse capinar, por exemplo. A minha

função era desenvolver renda para a Agricultura

Familiar, não ficar carpindo o Viveiro” (cf. depoimento

gravado em CD).

No depoimento de GENIR MAJOR, que, à

época, era Auxiliar de Serviços Gerais, ficou claro que

houveram problemas no final do mandato do Apelante.

Alegou que “quando chegava para assinar a folha, ela

não estava lá. (...). Nesse período, teve vezes que meu

pagamento deu R$ 106,00 (cento e seis reais)” (cf.

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Apelação Cível nº 1445168-8

depoimento gravado em CD). Perguntado se estavam

querendo lhe prejudicar, porque iria votar em outra

pessoa, respondeu, imediatamente: “Com certeza”.

Ainda, afirmou que tinha propaganda eleitoral do

candidato do outro partido em sua moto, o que pode ter

gerado a retaliação.

Mais um caso evidente de perseguição

ocorreu com PEDRO AGOSTINHO MENDES, que assim

relatou: “Na época eu trabalhava lá. Eu era concursado

como encanador. Aí, nós estávamos trabalhando num

colégio e, não sei por que motivo, ele me retirou da

minha função, e me levou pro pátio de obras. E no

outro dia, me mandou plantar grama. E como eu era

concursado, eu falei que plantar grama eu não ia,

porque não era a função” (cf. depoimento gravado em

CD). Narrou que, após se recusar a plantar grama, o

Prefeito retirou seu cartão ponto, mas mesmo assim

continuou trabalhando. Ao se recusar a assinar as férias

pelo período em que continuou trabalhando, recebeu

30 (trinta) dias de suspensão. Alegou que teve que

entrar na Justiça para obter os respectivos valores,

tendo julgada procedente sua demanda.

Como se vê, após o ingresso do Apelante

no cargo de Prefeito do Município de Reserva do Iguaçu,

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Apelação Cível nº 1445168-8

o trabalho de diversos servidores do Município foi

drasticamente afetado. Sem nenhuma explicação lógica

ou racional, os servidores municipais foram designados

a praticar atividades distintas de suas funções originais,

sendo por vezes, inclusive, atividades vexatórias e

humilhantes.

LINCOLN BRAGA, que à época era

Secretário de Administração do Prefeito e,

aparentemente, também seu “homem de confiança”,

não soube explicar porque o funcionário ANDRÉ

LUSTOSA SIQUEIRA, sobrinho do ex-Prefeito ficou à

disposição, na sede da Prefeitura, sem realizar nenhum

trabalho, ao invés de ficar no Posto de Saúde,

prestando serviços. Ressalte-se que ANDRÉ LUSTOSA

SIQUEIRA era servidor concursado no cargo de

Atendente de Posto de Saúde. De igual forma, não

soube explicar porque a servidora EDICLÉIA MARIA

SANTOS MENDES ficou na sede da Prefeitura, sem

realizar atividades de sua função, mesmo sendo ela

Orientadora Educacional concursada.

Dessa forma, percebe-se a clara intenção

do Apelante em prejudicar servidores municipais que

apoiaram o candidato adversário nas eleições

anteriores. Inegável, portanto, que ao se utilizar do

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Apelação Cível nº 1445168-8

cargo de Prefeito Municipal para perseguir adversários

políticos, causando assédio moral, o Apelante afrontou

os princípios da Administração Pública, em especial os

princípios da legalidade, moralidade e impessoalidade.

Vê-se, assim, que diante das circunstâncias

do caso, a gravidade da violação das normas da

Administração Pública perpetrada justifica o

entendimento da subsunção das condutas ao disposto

no artigo 11, da Lei de Improbidade Administrativa.

Nesse aspecto, destaca-se que quando

tratar de ato de improbidade por violação a princípios,

exige-se inexoravelmente a conduta dolosa, como já

pacificaram as 4ª e 5ª Câmaras Cíveis deste Tribunal:

“Enunciado n.º 10 Faz-se necessária a

comprovação do elemento subjetivo de conduta do

agente para que se repute seu ato como de

improbidade administrativa (dolo, nos casos dos arts.

11 e 9º e, ao menos, culpa nos casos do art. 10 da Lei

n.º 8.429/1992)”.

Contudo, cumpre destacar que o dolo não

se confunde com a má-fé e só o primeiro é exigido. Isto

porque, embora ambos sejam feições subjetivas da

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conduta, ligadas a um elemento volitivo, ocorrem em

planos distintos. A má-fé é plenamente subjetiva e

caracteriza-se pela vontade de prejudicar, locupletar-

se, fazer algo danoso a alguém. Há, assim, uma

dimensão de vontade prejudicial, isto é, analisa-se o

animus do agente em relação àquilo que ele esperava

obter, e, se o esperado é danoso, há má-fé. Esta

vertente já há muito foi abandonada no direito pátrio.

Nessa toada, o dolo é, conceitualmente, a

vontade livre de realizar o resultado vedado em Lei. É a

Lei que pondera a qualidade negativa da conduta, não

o julgador. Observe-se que a má intenção não importa,

pois a imputação/subsunção está relacionada à ofensa

ao preceito legal, e não ao resultado esperado pelo

agente. O juízo de reprovação de determinada ação já

foi antecipado pelo ordenamento jurídico, independente

da expectativa pessoal do agente quanto ao seu

resultado. Isto não significa atribuir responsabilidade

objetiva, mas verificar se o agente teve vontade de

praticar a conduta tipificada, que é negativa “ex vi

lege”, por força da Lei.

Isso significa dizer que há dolo ainda que o

sujeito aja de boa-fé, isto é, na crença subjetiva de que

a atitude era correta e traria benefícios. Vale dizer: não

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importa o “animus” subjetivo do agente público (estar

de boa ou de má-fé), pode, inclusive, acreditar que age

em benefício do Município, mas se o faz

deliberadamente contra os princípios da Administração,

há dolo de violação aos princípios, simplesmente.

Não basta que os atos do Administrador

sejam benéficos à Administração: sua execução deve se

dar nos trilhos da legalidade, conforme as razões

públicas, e não o entendimento particular do

Administrador.

Assim, é possível dizer que a má-fé seria

uma dimensão qualificada, específica, do dolo –

importante para a dosimetria da pena, mas jamais a

sua ausência caracterizaria necessariamente a

inexistência de conduta dolosa. O dolo é uma categoria

mais ampla. A Lei, assim, não exige o dolo tomado

apenas em seu sentido psíquico, de má-fé. Não é

necessário, assim, o dolo específico, qualificado, mas é

possível caracterizar a conduta punível ainda que com

dolo genérico.

É precisamente o que ocorreu neste caso. É

possível averiguar que o Apelante ELIAS FARAH JÚNIOR,

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ao perseguir servidores públicos, pelo fato de serem

adversários políticos, o fez de modo amplamente

contrário aos princípios da Administração Pública, como

especificamente analisado, na recapitulação dos fatos.

Sua atitude não foi culposa – isto é, não

ocorreu por fator alheio à sua vontade. Pelo contrário,

foi apenas por conta da vontade do Apelante ELIAS

FARAH JÚNIOR em alterar as atribuições de

determinados funcionários que violaram princípios.

Por fim, observe-se que esta Câmara aceita

pacificamente o dolo genérico em sua jurisprudência

mais recente:

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA

POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITO

MUNICIPAL. UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO MUNICIPAL PARA

VIAGEM DE FÉRIAS. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS

NORTEADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DOLO

GENÉRICO. PRESENÇA. ATO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA CONFIGURADO. MULTA CIVIL DE UMA

VEZ A REMUNERAÇÃO. EXCESSO CONFIGURADO.

REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE

PROVIDO. MAIORIA” (TJPR - 5ª C.Cível - AC - 1267951-3

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- Paraíso do Norte - Rel.: EDISON DE OLIVEIRA MACEDO

FILHO - Por maioria - J. 03.03.2015)

“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE

RESPONSABILIDADE POR ATO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA. PEDIDO JULGADO PARCIALMENTE

PROCEDENTE. ATO ÍMPROBO QUE RESTOU

CONFIGURADO POR ATENTAR CONTRA OS PRINCÍPIOS

DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EXIGÍVEL, NESTE CASO,

PARA CONFIGURAÇÃO DA IMPROBIDADE APENAS O

DOLO GENÉRICO, OU SEJA, VONTADE DE REALIZAR O

ATO QUE ATENTEM CONTRA TAIS PRINCÍPIOS.

PRECEDENTES DO STJ. GESTOR PÚBLICO MUNICIPAL

QUE DEIXOU DE DAR DESTINAÇÃO ÚTIL À OBRA

INICIADA POR SEU ANTECESSOR. ARGUMENTOS

TRAZIDOS QUE NÃO JUSTIFICAM TAL OMISSÃO,

OFENDENDO, ASSIM, OS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE,

LEGALIDADE, ECONOMICIDADE E EFICIÊNCIA. APELO

CONHECIDO E DESPROVIDO” (TJPR - 5ª C.Cível - AC -

1009098-7 - Francisco Beltrão - Rel.: COIMBRA DE

MOURA - Unânime - J. 12.11.2013, destaquei).

É também o entendimento do Superior

Tribunal de Justiça:

“ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL.

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Apelação Cível nº 1445168-8

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPROBIDADE

ADMINISTRATIVA. ART. 11 DA LEI Nº 8.429, DE 1992.

PREJUÍZO AO ERÁRIO OU ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DO

AGENTE. ELEMENTOS DISPENSÁVEIS. PRESENÇA DO

ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO GENÉRICO. REEXAME DO

CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1.

"Os atos de improbidade administrativa descritos no art.

11 da Lei n. 8.429/92 dependem da presença do dolo

genérico, mas dispensam a demonstração da ocorrência

de dano para a administração pública ou enriquecimento

ilícito do agente" (AgRg no AgRg no AREsp nº

533.495/MS, Relator Ministro Humberto Martins, DJe de

17/11/2014).(...)” (AgRg no REsp 1400571/PR, Rel.

Ministro OLINDO MENEZES (DESEMBARGADOR

CONVOCADO DO TRF 1ª REGIÃO), PRIMEIRA TURMA,

julgado em 06/10/2015, DJe 13/10/2015, destaquei).

Assim, ELIAS FARAH JÚNIOR, consciente e

deliberadamente, na qualidade de Chefe do Poder

Executivo Municipal, alterou funções de servidores

municipais, causando-lhes abalos morais, e afrontando

os princípios da Administração Pública, notadamente, a

legalidade, impessoalidade e a moralidade.

Nessas condições, caracterizada a violação

ao princípio da legalidade, mesmo não existindo

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Apelação Cível nº 1445168-8

enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário, é possível a

tipificação da conduta no artigo 11 da Lei de

Improbidade Administrativa.

Outra situação que, embora não

completamente esclarecida, merece destaque, é o

ocorrido com algumas das Professoras do Município.

MARIZA DUARTE era concursada no cargo

de Professor, trabalhando em uma Escola do Município

antes do início do mandato de ELIAS FARAH JÚNIOR,

contudo, após essa data passou para o setor de

Documentação Escolar. Apesar de ter gostado da

experiência nova, teve problemas com pagamentos.

Afirmou: “O problema foi que no mês de setembro, do

último ano do mandato do Prefeito, eu trabalhei normal,

oito horas. Mas daí, a gente recebeu o pagamento

assim que passou a eleição, mas nesse mês eu fui

descontado o contraturno. Eu não recebi meu

contraturno” (cf. depoimento gravado em CD). Afirmou

que antes, sempre recebia esse valor, porque estava

trabalhando oito horas, ao invés de quatro horas.

De igual forma, DANIELE CRISTINA CALDAS,

que era Professora, assumiu o cargo de Supervisora

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Apelação Cível nº 1445168-8

Escolar. Narrou que: “O problema veio no final do

mandato do Senhor ELIAS FARAH, pelo fato de que eu

tinha dobra de horário, então eu tinha oito horas. No

mês de setembro eu trabalhei oito horas no cargo e não

recebi a minha dobra de quatro horas. E no mês de

outubro, após as eleições, eu fui chamada na Secretaria

de Educação e a Secretária de Educação, então me

falou que eu não estaria mais à frente da supervisão

(...)” (cf. documento gravado em CD).

Ainda, ROSELI TEREZINHA NUNES, que era

professora no Município, relatou que, apesar de ter

trabalhado por oito horas, não recebeu os respectivos

valores, mesma situação descrita pelas outras

testemunhas (MARIZA DUARTE e DANIELE CRISTINA

CALDAS). Alegou que, em razão de ter sido adversária

política do então Prefeito, recebeu apenas pelas quatro

horas referentes ao cargo concursado que possuía.

Assim, há indícios de que ocorreram

irregularidades em relação à alteração de lotação de

algumas Professoras Municipais, contudo, conforme

elucidou o Juiz a quo, “não obstante as alegações da

testemunha pareçam verídicas, o conjunto provatório é

frágil e precário, motivo pelo qual, deixo de reconhecer

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Apelação Cível nº 1445168-8

eventual ato improbo, por parte do réu, nesse ponto” (f.

948).

c) Da dosimetria da pena

Verifica-se que o Apelante ELIAS FARAH

JÚNIOR praticou dolosamente o ato tipificado no artigo

11, “caput”, da Lei nº 8.429/1992, o que enseja a

responsabilização conforme o artigo 12, inciso III, da Lei

de Improbidade Administrativa:

“Art. 12, III - na hipótese do art. 11,

ressarcimento integral do dano, se houver, perda da

função pública, suspensão dos direitos políticos de três

a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem

vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e

proibição de contratar com o Poder Público ou receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa

jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de

três anos”.

A pena, no entanto, deve ser dosada

conforme a conduta praticada, como já assentaram as

4ª e 5ª Câmaras Cíveis:

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Apelação Cível nº 1445168-8

“Enunciado n.º 34. As sanções previstas na

Lei Federal n.º 8.429/1992 não são necessariamente

cumulativas, cabendo ao magistrado dosá-las de acordo

com os princípios da razoabilidade e da

proporcionalidade”.

As sanções legais por atos de improbidade

devem ser dosadas diante do grau da culpa do agente e

guardar correlação lógica com a conduta praticada,

observando-se os princípios da razoabilidade e da

proporcionalidade, a fim de que sejam adequadamente

individualizadas.

No caso, considerando a gravidade da

improbidade praticada, as sanções aplicadas devem ser

readequadas.

Inicialmente, não é razoável a aplicação da

suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 05

(cinco) anos, visto ser a dosagem máxima desta

sanção. Considerando a extensão das condutas

praticadas pelo Apelante, ELIAS FARAH JÚNIOR, que

afrontaram os princípios da Administração Pública,

especialmente os princípios da legalidade, moralidade e

pessoalidade, é caso de reduzir a suspensão dos

direitos políticos para o prazo de 03 (três) anos.

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Apelação Cível nº 1445168-8

Quanto à multa civil arbitrada na sentença,

observo-a fixada em grau excessivo, o que,

possivelmente, tornará seu adimplemento mais

dificultoso. Dessa forma, reduzo, também, a multa civil

para o valor correspondente a 02 (duas) vezes o valor

da remuneração percebida pelo agente, mantidos os

índices de correção e juros de mora estipulados na

sentença.

Por fim, vale frisar que não tem cabimento,

no caso, a condenação do Apelante à proibição de

firmar contratos com o Poder Público, ou dele receber

benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa

jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 03

(três) anos, pois não é aplicável ao caso, já que a

improbidade foi praticada no exercício de cargo público

e não em razão de contrato com a Administração

Pública.

ANTE O EXPOSTO, voto por que seja dado

parcial provimento ao Apelo, readequando as sanções

impostas, a fim de:

a) reduzir a suspensão dos direitos

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políticos do Apelante, ELIAS FARAH JÚNIOR, para o

prazo de 03 (três) anos;

b) reduzir, também, a condenação do ex-

Prefeito ELIAS FARAH JÚNIOR ao pagamento de multa

civil para o valor de 02 (duas) vezes a remuneração;

c) excluir a condenação à proibição de

contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou

incentivos fiscais ou creditícios, direta ou

indiretamente, ainda que intermédio de pessoa jurídica

da qual seja majoritária, pelo prazo de (03) três anos.

DECISÃO

ACORDAM os Desembargadores integrantes da Quinta

Câmara Cível deste TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO

DO PARANÁ, por maioria de votos, em dar parcial

provimento, em menor extensão, ao Apelo, nos termos

da fundamentação.

Proferido o voto condutor, divergiu dele o

Desembargador LEONEL CUNHA, sendo acompanhado

pelo Desembargador LUIZ MATEUS DE LIMA. Na

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prorrogação do julgamento (art. 942, § 1º, CPC/15),

votaram os Juízes Substitutos em 2º Grau EDISON DE

OLIVEIRA MACEDO FILHO e ROGÉRIO RIBAS, ambos

pela divergência.

Presidiu o julgamento o Desembargador

LEONEL CUNHA, com voto.

Curitiba, 12 de abril de 2016.

Desembargador LEONEL CUNHA

Relator Designado

Desembargador CARLOS MANSUR ARIDA

(com declaração de voto vencido em separado)