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ICM 2007 A Instrumentação Científica e a Metrologia Aplicadas à Engenharia Civil 5 de Novembro de 2007, LNEC, Lisboa APLICAÇÕES DE FOTOGRAMETRIA NA MONITORIZAÇÃO DE ESTRUTURAS Jónatas Valença 1 ,Eduardo Júlio 2 , Helder Araújo 3 1 ISISE, DEC, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal, [email protected] 2 ISISE, DEC, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal, [email protected] 3 ISR, DEEC, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal, [email protected] Resumo: Hoje em dia, com o desenvolvimento da fotografia digital e do tratamento digital da imagem, a fotogrametria, método desenvolvido no início do séc. XIX, apresenta novos campos de aplicação com vantagens relativamente aos métodos tradicionais. Neste artigo, aborda-se a aplicação da fotogrametria na monitorização de estruturas, sendo apresentados os seguintes casos de estudo: (a) ensaios laboratoriais, à rotura e diferidos, de vigas de grande vão (20.0 m) em betão de alta resistência pré-esforçado; (b) ensaio laboratorial, até à rotura, de uma ligação metálica viga-coluna; (c) ensaio de carga numa ponte pedonal. Os resultados obtidos com a metodologia adoptada foram validados por comparação com os valores medidos com transdutores de deslocamentos (LVDT’s) em pontos de referência. Concluiu-se que a fotogrametria pode ser utilizada na monitorização de estruturas, com idêntica precisão e com vantagens adicionais, relativamente aos métodos tradicionais: (1) pode ser considerado um número quase ilimitado de pontos de medição, sendo a informação processada automaticamente, contrariamente aos métodos topográficos; (2) não é necessário hardware específico, pelo que pode ser utilizado em qualquer uma das situações em que os LVDT’s se revelem inadequados, devido a dificuldades de posicionamento, como no caso das pontes, ou devido a condições particulares extremas, tal como em ensaios laboratoriais sujeitos ao fogo, ou mesmo, devido a restrições de espaço para pequenas zonas de ensaio. Palavras Chave: Fotogrametria, monitorização, levantamentos geométrico, métodos ópticos. 1. INTRODUÇÃO A avaliação do comportamento de estruturas de grande porte, como pontes ou barragens, assim como de elementos estruturais ensaiados em laboratório, implicam a sua monitorização. Os deslocamentos são usualmente obtidos por métodos topográficos, no primeiro caso, e através da utilização de transdutores de deslocamentos, no segundo caso. No entanto, estes processos revelam desvantagens importantes: os métodos topográficos requerem muito tempo de processamento e os transdutores de deslocamentos apenas podem ser posicionados num número restrito de pontos, condicionados pelo número de aparelhos disponíveis e pelo espaço envolvente ocupado por cada um. Em certas condições extremas, como ensaios ao fogo, pode mesmo não ser possível a sua utilização [1]. O objectivo do estudo exposto neste artigo é o desenvolvimento de uma metodologia de aplicação deste método na monitorização de estruturas. Nos dois primeiros exemplos indicados, os resultados são validados através da comparação com os métodos tradicionalmente utilizados em ensaios laboratoriais. Nos restantes três exemplos, a metodologia proposta é utilizada em situações em que a aplicação dos métodos tradicionais é difícil ou mesmo inviável. A utilização da técnica de fotogrametria terrestre apresentou vantagens importantes relativamente aos métodos tradicionalmente aplicados: rapidez de execução; precisão dos resultados; quantidade de informação obtida (3D); custos significativamente menores. 2. FOTOGRAMETRIA 2.1. Sinopse histórica A palavra Fotogrametria, deriva de três palavras de origem Grega, photos, gramma e metron que têm, respectivamente, o significado de: luz, descrição e medidas. A American Society of Photogrammetry define-a como “a arte, ciência, e tecnologia para obter informação fidedigna acerca dos objectos físicos e sua envolvente através de um processo de gravação, medição e interpretação de imagens fotográficas com base em testes padrão de energia de radiação electromagnética e outros fenómenos” [2]. A transformação de um plano de imagem (2D) para uma vista 3D é uma transformação que envolve vários parâmetros e pressupostos, tais como: o conhecimento de certas características intrínsecas da câmara (distância focal e ângulos de rotação); e informação acerca dum ponto no sistema de coordenadas global. Os algoritmos utilizados no processamento das imagens e a teoria que os regula baseiam-se nos princípios da geometria da imagem, aliada aos modelos de câmara considerados e à sua calibração [3]. Hoje em dia, com o desenvolvimento da fotografia digital e do tratamento digital da imagem, a fotogrametria, método desenvolvido no início do séc. XIX, apresenta novos campos de aplicação com vantagens relativamente aos métodos tradicionais. Esta técnica vem sendo utilizada em diversas áreas, além da tradicional aplicação à topografia e cartografia através da fotogrametria aérea, a qual utiliza câmaras métricas e implica elaborados planos de voo, tais como: arquitectura; engenharias civil, mecânica, industrial,

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ICM 2007 A Instrumentação Científica e a Metrologia Aplicadas à Engenharia Civil

5 de Novembro de 2007, LNEC, Lisboa

APLICAÇÕES DE FOTOGRAMETRIA NA MONITORIZAÇÃO DE ESTRUTURAS

Jónatas Valença 1,Eduardo Júlio 2, Helder Araújo 3

1 ISISE, DEC, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal, [email protected] 2 ISISE, DEC, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal, [email protected] 3 ISR, DEEC, Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal, [email protected]

Resumo: Hoje em dia, com o desenvolvimento da fotografia digital e do tratamento digital da imagem, a fotogrametria, método desenvolvido no início do séc. XIX, apresenta novos campos de aplicação com vantagens relativamente aos métodos tradicionais. Neste artigo, aborda-se a aplicação da fotogrametria na monitorização de estruturas, sendo apresentados os seguintes casos de estudo: (a) ensaios laboratoriais, à rotura e diferidos, de vigas de grande vão (20.0 m) em betão de alta resistência pré-esforçado; (b) ensaio laboratorial, até à rotura, de uma ligação metálica viga-coluna; (c) ensaio de carga numa ponte pedonal. Os resultados obtidos com a metodologia adoptada foram validados por comparação com os valores medidos com transdutores de deslocamentos (LVDT’s) em pontos de referência. Concluiu-se que a fotogrametria pode ser utilizada na monitorização de estruturas, com idêntica precisão e com vantagens adicionais, relativamente aos métodos tradicionais: (1) pode ser considerado um número quase ilimitado de pontos de medição, sendo a informação processada automaticamente, contrariamente aos métodos topográficos; (2) não é necessário hardware específico, pelo que pode ser utilizado em qualquer uma das situações em que os LVDT’s se revelem inadequados, devido a dificuldades de posicionamento, como no caso das pontes, ou devido a condições particulares extremas, tal como em ensaios laboratoriais sujeitos ao fogo, ou mesmo, devido a restrições de espaço para pequenas zonas de ensaio.

Palavras Chave: Fotogrametria, monitorização, levantamentos geométrico, métodos ópticos.

1. INTRODUÇÃO

A avaliação do comportamento de estruturas de grande porte, como pontes ou barragens, assim como de elementos estruturais ensaiados em laboratório, implicam a sua monitorização. Os deslocamentos são usualmente obtidos por métodos topográficos, no primeiro caso, e através da utilização de transdutores de deslocamentos, no segundo caso. No entanto, estes processos revelam desvantagens importantes: os métodos topográficos requerem muito tempo de processamento e os transdutores de deslocamentos apenas podem ser posicionados num número restrito de pontos, condicionados pelo número de aparelhos disponíveis e pelo espaço envolvente ocupado por cada um. Em certas condições extremas, como ensaios ao fogo, pode mesmo não

ser possível a sua utilização [1]. O objectivo do estudo exposto neste artigo é o desenvolvimento de uma metodologia de aplicação deste método na monitorização de estruturas. Nos dois primeiros exemplos indicados, os resultados são validados através da comparação com os métodos tradicionalmente utilizados em ensaios laboratoriais. Nos restantes três exemplos, a metodologia proposta é utilizada em situações em que a aplicação dos métodos tradicionais é difícil ou mesmo inviável. A utilização da técnica de fotogrametria terrestre apresentou vantagens importantes relativamente aos métodos tradicionalmente aplicados: rapidez de execução; precisão dos resultados; quantidade de informação obtida (3D); custos significativamente menores.

2. FOTOGRAMETRIA

2.1. Sinopse histórica

A palavra Fotogrametria, deriva de três palavras de origem Grega, photos, gramma e metron que têm, respectivamente, o significado de: luz, descrição e medidas. A American Society of Photogrammetry define-a como “a arte, ciência, e tecnologia para obter informação fidedigna acerca dos objectos físicos e sua envolvente através de um processo de gravação, medição e interpretação de imagens fotográficas com base em testes padrão de energia de radiação electromagnética e outros fenómenos” [2]. A transformação de um plano de imagem (2D) para uma vista 3D é uma transformação que envolve vários parâmetros e pressupostos, tais como: o conhecimento de certas características intrínsecas da câmara (distância focal e ângulos de rotação); e informação acerca dum ponto no sistema de coordenadas global. Os algoritmos utilizados no processamento das imagens e a teoria que os regula baseiam-se nos princípios da geometria da imagem, aliada aos modelos de câmara considerados e à sua calibração [3].

Hoje em dia, com o desenvolvimento da fotografia digital e do tratamento digital da imagem, a fotogrametria, método desenvolvido no início do séc. XIX, apresenta novos campos de aplicação com vantagens relativamente aos métodos tradicionais. Esta técnica vem sendo utilizada em diversas áreas, além da tradicional aplicação à topografia e cartografia através da fotogrametria aérea, a qual utiliza câmaras métricas e implica elaborados planos de voo, tais como: arquitectura; engenharias civil, mecânica, industrial,

geológica, aeroespacial e naval; astronomia; medicina; arqueologia; operações censitárias e investigação forense.

A aplicação da técnica da fotogrametria terrestre na monitorização de estruturas de grande porte, como pontes, tem como objectivo acompanhar a evolução dos deslocamentos no tempo. Também, no caso de ensaios laboratoriais, destaca-se a monitorização de deslocamentos, até à rotura, em vigas de pequeno vão [4 e 5]. Pode, igualmente, referir-se a determinação de flechas em vigas sujeitas a elevadas temperaturas através de fotogrametria [1] e a determinação de deformações em vigas através da utilização de laser scanning [6].

2.2. Equipamento fotográfico

O equipamento utilizado nos casos de estudo a seguir descritos foi: (a) nos ensaios de vigas de grande vão e no ensaio de carga da ponte pedonal, uma máquina digital Single Lens Reflex (SLR) Nikon D70 com uma resolução de 3008×2000 pixel. No primeiro caso utilizou-se uma lente com uma distância focal de 24 mm e, no segundo, caso uma distância focal de 50 mm; e (b) no ensaio laboratorial, até à rotura, da ligação metálica viga-coluna utilizou-se uma máquina digital compacta Olympus C-8080, com uma resolução de 3264×2448 pixel e uma lente com uma distância focal de 140 mm.

2.3. Metodologia adoptada

A metodologia utilizada nos levantamentos fotogramétricos, com o objectivo de monitorizar o comportamento da estrutura, consistiu na aplicação sequencial dos passos a seguir enumerados [7].

1. Colocação de miras em pontos de controlo, a utilizar como referência nos vários projectos e/ou dos quais existe informação obtida através de outro processo;

2. Colocação de miras em pontos a monitorizar, de forma a obter informação que, embora redundante, revela-se importante no processamento fotogramétrico, facilitando a marcação e a referenciação e aumentando a precisão do método;

3. Tomadas fotográficas de vários pontos de vista; 4. Construção de um projecto fotogramétrico, com

software específico; marcação e referenciação de pontos; processamento e verificação da informação introduzida, com vista à detecção atempada de possíveis erros. Trata-se de um processo iterativo que se vai refinando à medida que se adiciona mais informação;

5. Atribuição de um factor de escala ao modelo, que pode ser definido utilizando os pontos de controlo. Este procedimento, quando efectuado com precisão, incluindo uma rigorosa calibração do equipamento fotográfico utilizado, resulta numa rápida convergência dos resultados para a solução correcta;

6. Atribuição de restrições ao modelo, caso existam. A informação relativa aos pontos de controlo pode igualmente ser utilizada com este fim;

7. Orientação do modelo, através da definição da direcção de dois eixos coordenados;

8. Exportação (DFX) do modelo 3D gerado;

9. Sobreposição dos modelos obtidos, com base nos pontos de controlo, dos vários projectos realizados.

2.4. Precisão e parâmetros de controlo

O sucesso de um projecto fotogramétrico depende, em grande parte, do correcto posicionamento das estações fotográficas. O levantamento fotográfico adequado pode ser obtido através do cumprimento de algumas regras. O objectivo destas regras empíricas é a obtenção de parâmetros de controlo do projecto com valores dentro dos intervalos recomendados. Os parâmetros de controlo mais relevantes são: (1) ângulo de intersecção - define o ângulo máximo entre os raios de um determinado ponto, obtido a partir de diferentes fotografias. O seu valor ideal é 90º, podendo ser inferior, mas nunca menor do que 30º; (2) área de convergência - representa a percentagem de área da fotografia, relativamente à sua área total, em que existe informação relevante (pontos marcados). Quanto maior for este valor, mais elevada é a precisão; (3) resíduo - parâmetro que quantifica a distância entre a marcação de um dado ponto em cada uma das fotografias consideradas e o seu posicionamento final, após processamento e convergência do projecto. Pode ser quantificado segundo o seu valor máximo ou através de uma média – RMS (Root Mean Square). Quanto menor for este valor, maior será a precisão. A utilização de miras de precisão, cujo centro do círculo branco em fundo preto é determinado automaticamente no processamento da imagem, é essencial para obter resíduos inferires a 1 pixel.

3. CASOS DE ESTUDO

3.1. Ensaios em vigas de grande vão

Foram realizados ensaios à rotura e diferidos em vigas com 20.0 m de vão e secção em I, no âmbito de uma tese de doutoramento [8]. A evolução das flechas com o carregamento foi determinada em várias secções das vigas, através de LVDT’s. A configuração deformada das vigas foi obtida com levantamentos fotogramétricos, realizados durante várias fases dos ensaios, para testar a eficácia desta técnica e da metodologia adoptada na monitorização de deformações em estruturas. Os ensaios realizaram-se em espaços laboratoriais diferentes estando, por este motivo, sujeitos a condições distintas. No entanto, dado que ambas as vigas estavam colocadas junto a uma parede, os levantamentos fotográficos foram efectuados por varrimento perpendicular ao plano de interesse, utilizando entre 13 e 16 fotografias no ensaio de rotura e 8 ou 9 no ensaio de fluência (Figura 1). O vão de 20.0 m das vigas era elevado, comparativamente às dimensões dos laboratórios e ao espaço neles disponível para colocar estações. Este facto condicionou o número de sobreposições das tomadas e o valor do ângulo de intersecção. Valores próximos do ideal (90º) para o ângulo de intersecção não foram fáceis de obter, devido à existência de obstáculos. O maior número de estações utilizadas no ensaio de rotura deveu-se à existência de mais condicionantes, que prejudicaram o campo de visão e a qualidade das tomadas fotográficas: (1) obstruções físicas – instalações de outros ensaios e materiais armazenados, exigiram uma divisão num maior número de

troços do levantamento fotográfico no ensaio de rotura; (2) velocidade do ensaio – esta pode ser uma condicionante importante quando se pretende aplicar a fotogrametria como método de monitorização e se dispõe apenas de uma máquina fotográfica. Nos ensaios de rotura as vigas foram imobilizadas em algumas das fases durante as quais se efectuaram as tomadas fotográficas, ultrapassando o problema. O ensaio de fluência decorreu de forma contínua após o carregamento. Dadas as menores obstruções físicas existentes e consequente utilização de apenas 8 ou 9 estações, o seu levantamento fotográfico realizou-se de forma rápida, o que aliado ao carácter lento da deformação por fluência, não afectou os resultados; (3) condições de luminosidade – este parâmetro pode ter um papel importante nos resultados obtidos. Quando a luz existente é heterogénea, com áreas sub-expostas e/ou áreas sobre-expostas, pode ser difícil efectuar a necessária correcção. As tomadas foram realizadas nas condições de luminosidade naturais. Não foi planeada qualquer espécie de iluminação artificial específica, com vista ao melhoramento e homogeneização das condições de luminosidade existente. Durante o ensaio de rotura o sol prejudicou as tomadas em determinadas horas, durante a tarde, incidindo na viga na forma de feixes que produziram áreas sobre-expostas - hot-spot em imagens maioritariamente sub-expostas. Esta situação deveu-se à disposição das clarabóias na cobertura do laboratório e ao facto do ensaio demorar 6 horas e 30 minutos, o que resultou em condições de luz natural distintas nas várias fases do ensaio. A fim de minorar os efeitos desfavoráveis da luz, fotografou-se no programa de exposição manual através do modo de medição pontual da luz. Todo o processo se realizou de uma forma expedita, principalmente no ensaio de rotura, onde se utilizaram muitas estações e o tempo de paragem do ensaio era reduzida. A luz era medida em dois ou três pontos, decidindo-se qual a exposição (relação abertura do obturador/velocidade de disparo) a utilizar na estação. Durante a execução do projecto fotogramétrico, efectuou-se um rastreio de todos os pontos que apresentavam uma sobre-exposição excessiva (pontos hot-spot reflectance), eliminando-os do projecto.

Foram colocadas miras de precisão, espaçadas de 0.5 m, nos banzos superior e inferior, a meio da alma da secção da viga e na área envolvente, nomeadamente na parede dos laboratórios. Os vários projectos, cada um correspondendo a uma determinada fase do ensaio, têm em comum o facto de possuírem as mesmas miras fixas. Os modelos obtidos, exportados em formato DXF, foram sobrepostos tendo por base estes pontos (Figura 2). Considerando como pontos de controlo as secções das vigas onde estão colocados transdutores de deslocamentos, 9 no ensaio de rotura e 5 no ensaio de fluência (Figura 3), é possível determinar a precisão relativa do levantamento efectuado, através dos parâmetros de controlo. Observa-se uma precisão elevada com valores médios do resíduo RMS inferiores a 0.4 pixel, resultante de ângulos de intersecção médios entre 72º e 81º e áreas de convergência entre 22% e 41%.

Figura 1 – Varrimento perpendicular ao plano de interesse.

Figura 2 –Sobreposição dos modelos DXF.

Pontos de controlo no ensaio de rotura: S2, S3, S4, S5, S6, S7, S9 e S10. Pontos de controlo no ensaio diferido: S3, S5, S7, S8, S9 e S10.

Figura 3 – Esquema de carga e pontos de controlo.

Na Figura 4, apresentam-se os valores medidos no ensaio de rotura com os transdutores de deslocamentos, sobrepostos com os resultados obtidos através dos levantamentos fotogramétricos, para diferentes fases de carregamento, desde o início do ensaio até uma posição do actuador igual a 700 mm, num total de 5 fases (levantamentos intermédios com o actuador a 150, 250, 425 e 500 mm). Regista-se uma coincidência de valores, com uma diferença média de 1.1%, correspondente, em valor absoluto, a 2.2 mm (Figura 5).

Deformada: Fotogrametria vs LVDT's (*)

-830

-730

-630

-530

-430

-330

-230

-130

-30

70

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20

L (m)

[mm]

F0: Configuração inicial - Fotogrametria F150: 150mm no actuador - FotogrametriaF250: 250mm no actuador - Fotogrametria F425: 425mm no actuador - FotogrametriaF500: 500mm no actuador - Fotogrametria F700: 700mm no actuador - FotogrametriaF150(*): 150mm no actuador - LVDT F250(*): 250mm no actuador - LVDTF425(*): 425mm no actuador - LVDT F500(*): 500mm no actuador - LVDTF700(*): 700mm no actuador - LVDT

Figura 4 –Resultados fotogramétricos versus LVDT’s (*).

| Variação|: Fotogrametria vs LVDT's (*)

L (m)

0.0

1.0

2.0

3.0

4.0

5.0

6.00 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20

S2 S3 S4 S5 S6 S7 S8 S9 S10

∆ [%]

F150: 150mm no actuador F250: 250mm no actuadorF425: 425mm no actuador F500: 500mm no actuadorF700: 700mm no actuador

Figura 5 –Resultados fotogramétricos versus LVDT’s.

O ensaio diferido foi, ainda, modelado através do método dos elementos finitos (MEF) no âmbito de uma dissertação de mestrado [9]. Dado que a deformação por fluência é significativa nas primeiras horas, realizou-se uma tomada 2 horas e 30 minutos após a aplicação da carga. Foi realizada uma nova tomada 88 dias após o carregamento. Regista-se, mais uma vez, uma coincidência de valores nos pontos de controlo entre os dois métodos, com uma diferença média de 0.8%, correspondente, em valor absoluto, a 0.5 mm (Figura 6). Comparativamente aos resultados numéricos, a diferença média – em 40 miras colocadas no banzo inferior – foi de 6.7%, observando-se grandes diferenças nas secções junto aos apoios (Figura 7). Excluindo da análise 2.5 m da viga em cada extremo, onde o erro é maior, a variação média foi de 2.9%, idêntica à variação de 3.0% registada nos pontos de controlo.

Deformada: Photogramemtry vs LVDTs (*)

-120

-80

-40

0

40

80

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20

L (m)

[mm]

F0: Configuração iniciual - Fotogrametria F2h30: 2h30 após o carregamento - FotogrametriaF88dias: 88 dias após o carregamento - Fotogrametria F2h30(*): 2h30 após o carregamento - LVDT'sF88dias(*): 88 dias apóso carregamento - LVDT's

Figura 6 –Resultados fotogramétricos versus MEF.

IVariaçãoI : Fotogrametria vs MEF

01020304050607080

0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20

L (m)

∆ [%]

F0: Configuração inicial F2h30: 2h30 após o carregamentoF88: 88 dias após o carregamento

Figura 7 –Resultados fotogramétricos versus MEF.

Os resultados obtidos nos dois ensaios realizados demonstram que foi possível contornar as condições adversas de luminosidade, existentes em algumas das tomadas no ensaio de rotura, assim como as restrições físicas que impediram a colocação de determinadas estações. O procedimento adoptado implicou um rastreio cuidadoso dos pontos, o qual levou à eliminação dos pontos sobre-expostos e à adição de mais fotografias ao projecto, de forma a manter os valores dos parâmetros de controlo do programa ao mesmo nível dos projectos gerados com tomadas em boas condições de luminosidade e sem restrições físicas relevantes (ensaio de fluência). Este facto, aliado aos resultados obtidos com os LVDT’s, demonstra que a fotogrametria é um método viável e fiável, não só na monitorização de ensaios como também no acompanhamento de estruturas em serviço, nomeadamente em obras de grande porte como pontes e barragens. Comparativamente com as técnicas tradicionais de monitorização a fotogrametria apresentou várias vantagens. Registou-se uma quantidade incomparavelmente superior de informação, determinando-se os deslocamentos em 120 pontos (tantos quantas as miras colocadas), em lugar dos apenas 9 e 5 transdutores de deslocamentos utilizados no ensaios de rotura e de fluência, respectivamente. A ocorrência de um possível incidente, como o descolamento de algumas miras, torna-se desta forma irrelevante, pois não afecta os resultados obtidos, ao contrário do mau funcionamento de algum dos poucos LVDT’s, para além dos prejuízos materiais daí decorrentes. Uma desvantagem da

fotogrametria prende-se com a necessidade de interrupção do ensaio no caso deste ser executado a uma velocidade incompatível com o tempo das tomadas. Tal facto impossibilita o levantamento fotogramétrico no caso de se utilizar uma máquina fotográfica. Os restantes inconvenientes, referidos na monitorização com os LVDT’s, foram ultrapassados pela fotogrametria.

3.2. Ensaios de ligação metálica viga-coluna

Ensaios de rotura em ligações metálicas viga-coluna, realizados no âmbito de uma tese de doutoramento [10], foram inicialmente monitorizados com transdutores de deslocamentos. No final de 10 dos 12 ensaios previstos, constatou-se a dificuldade em obter resultados fidedignos a partir do momento em que o material atingia o regime plástico. Desta forma, recorreu-se à técnica da fotogrametria terrestre para monitorizar os dois últimos ensaios. O objectivo principal consistia na calibração de um modelo numérico que simulasse o comportamento da ligação. A nível fotogramétrico, o objectivo implicava a determinação dos deslocamentos no plano de imagem, ficando em aberto a possibilidade da determinação dos deslocamentos perpendiculares ao plano de imagem. A metodologia adoptada consistiu na colocação de uma moldura metálica envolvente da área de interesse do ensaio, na qual se posicionaram os pontos fixos, utilizados como pontos de controlo (Figura 8). Foi efectuado um varrimento perpendicular à estrutura nas tomadas fotográficas, utilizando 6 estações que convergiam para o centro da moldura metálica, em cinco fases de cada ensaio (Figura 9). Os modelos resultantes dos vários projectos fotogramétricos foram determinados com valores médios de 0.12 pixel para o resíduo RMS, 61º para o ângulo de intersecção e 49% para a área de convergência.

Figura 8 – Ligação metálica viga-coluna.

Figura 9 – Ligação metálica viga-coluna: a) localização das estações fotográficas; b) chapas de apoio aos LVDT’s.

Dado que os pontos fixos estavam nas mesmas condições dos pontos a monitorizar – mesmos valores para os parâmetros de controlo e distância focal da lente – considerou-se que a precisão dos deslocamentos obtidos seria igual à variação dos pontos fixos entre os cinco projectos realizados em cada ensaio. O valor médio obtido foi de 0.1 mm nas três direcções consideradas e sempre inferior a 0.3 mm. Na direcção perpendicular ao plano de interesse, a precisão foi duas vezes menor do que nas direcções do plano de imagem. No entanto, dada a reduzida grandeza dos valores em questão, foi possível determinar os deslocamentos nas três direcções com elevada precisão. Em ambos os ensaios o maior deslocamento foi registado na mesma área, com valores de 41.64 mm e 41.24 mm de deslocamento horizontal (Figura 10). De salientar que dos 1450 pontos considerados (143 e 147 miras em cada ensaio, nas 5 fases consideradas), apenas em 3 situações os deslocamentos não foram obtidos, devido ao descolar das miras ou devido ao seu posicionamento relativamente às estações utilizadas. Os resultados permitiram calibrar e validar o modelo numérico construído, cumprindo o seu objectivo.

Figura 10 – Sobreposição dos modelos DXF: Antes e depois do ensaio.

3.3. Ensaio de carga de uma ponte pedonal

No ensaio de carga de uma ponte circular pedonal em Aveiro, que liga o canal de São Roque e as duas margens do canal de Boritões da Ria de Aveiro, foram determinados deslocamentos na estrutura, através da técnica da fotogrametria. A ponte é constituída por perfis metálicos nos quais apoia um pavimento de madeira e é suspensa por oito cabos ligados a um mastro em forma de laço, atirantado a um maciço de betão situado na margem direita (Figura 11). A estrutura metálica que suporta o pavimento de madeira do tabuleiro encontra-se organizada em 55 módulos. A guarda de protecção lateral do tabuleiro é constituída por vidro laminado ondulado, o qual permite a visualização da envolvente. A guarda interior do tabuleiro e das rampas são em aço inox. O objectivo da monitorização foi a calibração e validação do modelo numérico construído para simular o seu comportamento estrutural. Para o efeito colaram-se 83 miras de precisão na estrutura, colocadas nas almas dos perfis metálicos, junto aos banzos inferiores, com o objectivo de minimizar a sombra projectada pelos banzos superiores. Foram efectuados levantamentos fotogramétricos da geometria da estrutura antes, durante e após o carregamento. Em cada uma destas fases foi construído um modelo fotogramétrico da estrutura, com o objectivo de quantificar os deslocamentos verticais ocorridos durante o ensaio. A sobrecarga aplicada à estrutura foi materializada com o posicionamento alternado de voluntários, previamente pesados, em três posições distintas: Zona SE; Zona SW; e Zona NE (Figura 12).

Figura 11 – Ponte pedonal circular de Aveiro.

107 106

105 104

103 102

101 100 99 98 97 96 95 94

88 87 86 85 84 83 82 81 80 79

73 72 71 70 69 68

67 66

65 64

63 62

61 60

55 54 53 52 50

49 48

47

45 44 43 42

40 39 38

37 35

34 33 32 30 29 28 27 25 24 23 22

20 19 18 17

15 14 13

12

10 9

8 7

5 4 3 2 1

ZONA SE

ZONA SW

ZONA NE

Figura 12 – Localização das miras e zonas carregadas.

Nas Figuras 13 a 15, apresentam-se a localização da carga e a deformada respectiva nas três situações consideradas. Devido à necessidade da existência de condições de luminosidade aceitáveis nos levantamentos fotográficos, durante o carregamento apenas se realizou o levantamento fotogramétrico da configuração deformada na zona carregada. Com este procedimento foi possível executar todas as tomadas fotográficas antes de escurecer. Na fase anterior e posterior ao carregamento, realizaram-se levantamentos fotogramétricos da totalidade da estrutura, nos quais se utilizaram 32 e 30 fotografias, respectivamente. Na execução dos projectos isolados das três zonas carregadas foram utilizadas entre 11 e 14 fotografias. Com a metodologia adoptada foi possível registar os valores dos deslocamentos verticais das miras coladas, assim como as diferenças entre o seu posicionamento antes e após o carregamento. Algumas condicionantes implicaram uma diminuição da precisão dos resultados fotogramétricos obtidos: (1) condicionantes que afectaram as tomadas fotográficas; e (2) condicionantes que afectaram o projecto fotogramétrico. As imagens obtidas em contra-luz, os ângulos de convergência inadequados entre fotografias de determinados pontos, a vibração da estrutura devido à acção do vento e das pessoas, assim como a distância e condições de luz desfavoráveis dos pontos fixos de referência, são factores que inevitavelmente contribuíram para a introdução de erros nos resultados obtidos. Contudo, os projectos fotogramétricos apresentaram valores médios de 0.48 pixel para o resíduo RMS, 38º para o ângulo de intersecção e 39% para a área de convergência. A diferença média registada entre a posição das miras na fase anterior ao carregamento e na fase após a descarga foi de 0.25 cm (0.31, 0.27 e 0.18 cm, nas zonas SE, SW e NE, respectivamente). Os valores máximos dos deslocamentos verticais, registados durante as três situações de carga, situaram-se entre 2.0 e 3.0 cm. Na zona SE a mira 84 registou 2.32 cm, na zona SW a mira 64 atingiu 2.97 cm e na zona NE registou-se 2.78 cm na mira 100. O deslocamento da mira 66, na zona SW, não foi obtido devido à colocação acidental de um acelerómetro na frente desta, no âmbito do ensaio dinâmico realizado. Os resultados permitiram calibrar e validar o modelo numérico de análise do comportamento estrutural da ponte.

Flechas no carregamento

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

94 95 96 97 98 99 100 101 102 103 104 105 106

Miras

[cm]

Figura 13 – Carregamento da Zona NE

Flechas no carregamento

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

3.5

62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72Miras

[cm]

Figura 14 – Carregamento da Zona SW.

Flechas no carregamento

0.0

0.5

1.0

1.5

2.0

2.5

3.0

79 80 81 82 83 84 85 86 87

Miras

[cm]

Figura 15 – Carregamento da Zona SE.

4. CONCLUSÕES

Com este artigo, demonstrou-se que a fotogrametria é uma técnica aplicável na monitorização do comportamento em serviço de estruturas de grande porte, assim como na monitorização de ensaios laboratoriais. A diferença de precisão entre este e os métodos tradicionais revelou-se irrelevante apresentando a técnica da fotogrametria terrestre várias vantagens relevantes: facilidade de aplicação; rapidez no tratamento dos dados; quantidade e qualidade da informação obtida (3D); inexistência de limitações como a não linearidade material ou limite de curso, ao contrário dos LVDT’s; e custo baixo; inigualáveis pelos métodos tradicionais de monitorização.

Foi possível determinar as configurações deformadas em ensaios laboratoriais em vigas de grande vão (20.0 m) com uma diferença média inferior a 1.0% entre a fotogrametria e os LVDT’s, num universo de 54 valores comparados – pontos de controlo. Foi possível ultrapassar restrições físicas e de luminosidade através de um planeamento correcto do levantamento fotográfico e/ou com a utilização

de mais estações. A monitorização de ensaios laboratoriais foi efectuada com uma precisão média de 0.1 mm e sempre inferior a 0.3 mm em qualquer das direcções, mesmo em regime não linear, obtendo deslocamentos fiáveis e precisos, impossíveis de determinar com os LVDT’s, como se constatou no ensaio de rotura de ligações metálicas viga-coluna.

De salientar que, para obter resultados de confiança, é essencial uma verificação criteriosa dos pontos de controlo e/ou pontos fixos, os quais devem estar, no mínimo, nas mesmas condições dos pontos a monitorizar.

REFERÊNCIAS

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[2] American Society of Photogrammetry (ASP), Manual of photogrammetry.4.ed. Falls Church VA, Chester C., 1980.

[3] Fu, K.S., Gonzalez, R.C., Lee, C.S.G., Robotics – Control, Sensing, Vision, and Intelligence, McGraw-Hill International Edition, 1987.

[4] Whiteman, T, Lichti, D, Chandler, I, Measurement of Deflections in Concrete Beams by Close-Range Photogrammetry, Symposium on Geospatial Theory, Processing and Applications. Ottawa, 2002.

[5] Fraser, C, Automated Off-Line Digital Close-Range Photogrammetry: Capabilities & Application, 3rd International Image Sensing Seminar on New Developments in Digital Photogrammetry. Japan, 2001.

[6] Gordon, S., Lichti, D., Stewart, P, Franke, J., Structural Measurement using Terrestrial Laser scanners, Proceedings, 11th FIG Symposium on Deformation Measurements, Santorini – Greece, 2003.

[7] Valença, J., Aplicações de Fotogrametria à Engenharia de Estruturas, Dissertação de Mestrado, Universidade de Coimbra, Coimbra, Maio de 2006.

[8] Fernandes, P., Vigas de Grande Vão Pré-Fabricadas em Betão de Alta Resistência Pré-Esforçado – Viabilidade, Dimensionamento, Fabrico e Comportamento, Tese de Doutoramento em Engenharia Civil, especialidade de Estruturas, Universidade de Coimbra, Coimbra, 2006.

[9] Costa, D, Comportamento Diferido do Betão: Modelação Numérica do Comportamento de Fluência de Vigas de Betão de Alta Resistência, Dissertação de Mestrado em Engenharia Civil, especialidade de Estruturas, Universidade de Coimbra, Coimbra, 2006.

[10] Jordão, S., Comportamento de ligações soldadas em nó interno com vigas de diferentes alturas e aço de alta resistência, Tese de Doutoramento em Engenharia Civil, especialidade de Estruturas, Universidade de Coimbra, Coimbra, (a publicar).