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Apoio: Patrocínio: Realização · O GŒnio da Montanha Era uma vez um gŒnio que vivia sobre as montanhas e passava todo o seu tempo observando o que acontecia a sua volta. Um dia,

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O Gênio daMontanha

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O Gênio da Montanha

Era uma vez um gênio que vivia sobre asmontanhas e passava todo o seu tempo observandoo que acontecia a sua volta. Um dia, estavaescondido atrás de uma árvore, espiando osmovimentos de uma encantadora mocinha quebrincava e gracejava alegremente em volta de umacascata de água, juntamente com algumascompanheiras. O espetáculo era tão sedutor egracioso, que o gênio da montanha ficou muitoimpressionado e desejou compartilhar de taisalegrias e satisfações.Querendo observar melhor o gracioso grupo democinhas pensou em converter-se em um corvo, efoi pousar sobre os ramos de um grande carvalhoque estendia a sua sombra sobre a cascata. Mas,bem depressa compreendeu que aquelametamorfose não era conveniente, porque os seusolhos de corvo lhe apresentavam as coisas sob umaspecto desagradável, tanto que um ninho de ratoslhe teria despertado maior interesse do que asrisonhas mocinhas.Então voou para trás de uma moita e transformou-se em um belíssimo jovem. Dessa maneira estavacerto de poder compreender a fundo a vida humana.De fato, no seu ânimo não tardaram a nascer

sentimentos e sensações que nunca experimentaraantes. Compreendeu dessa maneira no queconsistia a alegria, o amor, o prazer, o sofrimento ea desilusão.A encantadora moça, que ele tanto admirara,chamava-se Sônia e era filha do rei que dominavanaquele tempo a vasta região no meio da qual seerguia o Monte do Gigante. A mocinha ia todos osdias passear pelos campos, juntamente com assuas jovens damas de companhia, parando asombra das árvores seculares, colhendo floresperfumadas, ervas e morangos que eram depoisservidos à mesa real. Nos dias mais calmos,preferiam ficar junto a cascata e, algumas vezes,mergulhavam na água.Depois de ter visto aquela fascinante criatura, ogênio da montanha sentiu-se subjugado pela suabeleza e voltou todos os dias ao pé da cascatarumorejante, para tornar a ver o rosto daquela aquem amava.Mas, antes que ela tornasse a aparecer,transcorreram várias semanas. Finalmente, por umatarde mais quente que de costume, Sônia resolveuir dar um passeio e saiu do palácio, acompanhadapor duas fiéis damas de companhia.Mas, qual não foi o seu espanto, ao achar o lugarcompletamente transfigurado !As rochas brutas estavam recobertas de mármore ede alabastro; a água não se precipitava mais,espumando com ímpeto, mas brotava com ummurmúrio acariciador do centro de um tanque demármore, caindo em leque, transformada em umachuva deliciosa que cintilava como orvalho de

pedras preciosas.Rosas, jasmins, cravos e jacintos floresciam emvolta do tanque, formando uma coroa florida,alternada com corimbos multicores. A direita e aesquerda da fonte abriam-se duas magníficasalamedas, conduzindo ambas a uma gruta com asparedes recobertas de cristal de rocha quecintilavam aos reflexos do sol com deslumbrantebrilho.No fundo da fantástica gruta estava uma mesaposta, sobre a qual figuravam os frutos mais raros eas bebidas mais deliciosas.Não sabendo se devia dar crédito aos própriosolhos, a princesa ficou atônita. Devia demorar-senaquele lugar encantado, ou devia fugir?Mas a curiosidade foi mais forte e a moça quisobservar com atenção todas aquelas maravilhas,provando mesmo alguns dos frutos que se achavamsobre a mesa.Depois, quis conceder-se o prazer de um banho,mergulhando na água límpida e perfumada dotanque de mármore, que refletia o azul puríssimodo céu.Mal, porém, entrara na água, uma força irresistívele misteriosa começou a arrastá-la para o fundo, emum abismo que parecia sem fim. Em vão a moçatentou firmar os pés no fundo argênteo que lheinspirara tanta confiança, quando o observara damargem; em vão as jovens damas de companhiatentaram agarrar-lhe a loura cabeleira que flutuavana água. Em poucos instantes a desventuradaprincesa desapareceu, engolida pelas ondas.As jovens damas de companhia arrancaram os

cabelos, torceram as mãos, gritando e chorando tãoalto que os seus lamentos ecoavam por toda afloresta. Mas nenhuma delas tinha a coragem deatirar-se a água para ir buscar a filha do rei. Derepente uma das damas, chamada Brunilda, foitomada por um acesso de desespero e, invocandoem altas vozes o nome da adorada princesinha,atirou-se de cabeça na água. Mas ficou emaranhadaem uma planta aquática que a manteve flutuandoe, malgrado todos os seus esforços, não lhepermitiu mergulhar.Então a jovem dama se juntou as companheiras etodas se dirigiram para o castelo, a fim decomunicar ao rei a dolorosa notícia daqueladesgraça.Encontraram-no em o momento em que saía dopalácio para ir caçar e, chorando amargamente,puseram-no ao corrente de tudo quanto acontecera.O rei foi tomado de uma angustia indescritível e deum desespero tão tremendo que rasgou as roupasque trazia vestidas; depois, arrancou a coroa dacabeça, atirando-a ao chão e continuando a invocara filha adorada, em altíssimos gritos.Quando conseguiu dominar a própria dor, correu aolugar onde acontecera a desgraça, porém nãoencontrou mais a fonte de mármore nem oscanteiros de flores. O cenário retomara o seuaspecto costumeiro, com a cascata espumantecircundada pelas árvores.O rei não podia suspeitar que a filha tivesse sidoraptada e, depois de ter chorado amargamente aperda da princesa, resignou-se por fim a vontade deDeus, e procurou distrair-se, dedicando-se à caça.

Entretanto, a encantadora Sônia descera até aoreino do gênio da montanha, que a acompanharagentilmente ao longo de um caminho subterrâneo,ao fundo do qual se achava um maravilhoso castelo,comparado ao qual o de seu próprio pai era umaninharia.A princesa repousou durante algum tempo e depois,quando se refez do estonteamento, reencontrou-serecostada em fofo diva. Vestia uma túnica de sedacor-de-rosa, apertada na cintura por um cinto deprata, recamado de pedras preciosas que cintilavamcom reflexos deslumbrantes e que seria digno depertencer a uma fada.Um belíssimo jovem se achava a seus pés; era ogênio da montanha, que falava do seu fantásticoreino subterrâneo, convidando-a depois a segui-lo,para fazê-la visitar as salas do palácio, luxuosas ede incomparável esplendor.Três lados do palácio eram flanqueados poresplendido jardim, cujos canteiros eram adornadoscom as mais belas flores. As pradarias eram cheiasde árvores de cujos ramos pendiam as frutas maisdeliciosas e de aspecto maravilhoso de ver-se; amoça nunca vira semelhantes, nem mesmo na mesado rei.Milhares de passarinhos, de plumagens multicores edouradas, chilreavam entre os ramos e saltitavamao longe das alamedas, em um concerto delicioso egentil. Sônia observava todas aquelas coisas comolhar assombrado, e o gênio da montanha aacompanhava, sem se cansar de contemplá-la e deescutar sua deliciosa voz, que o fascinava cada vezmais.

Mas a princesa não se sentia feliz como ele, porquea sua alma estava perturbada por uma grandemelancolia e o seu coração estava apertado deangustia.Ao gênio da montanha não passou despercebida atristeza que emanava dos belíssimos olhos damoça, e compreendeu logo que ela não quereria sersua esposa enquanto fosse perturbada pelopensamento nostálgico do seu pai e do mundo queabandonara em circunstâncias tão dramáticas.E, não obstante todos os seus esforços para distraí-la, ela permanecia taciturna e absorta, com osbelos olhos velados de lágrimas.- Ela está triste porque lhe falta a distração domundo - pensava o gênio -. Os homens estãohabituados a viver em sociedade e a divertir-se.Aqui, em vez disso, a princesa pode falar somentecomigo e não tem ninguém em quem se confie ou aquem peça um conselho. Ninguém, a não ser eu,goza das suas graças fascinantes e da suaextraordinária beleza. Que hei de fazer?Pensou ainda um momento, e depois se voltou paraSônia, dizendo-lhe:- Minha divina menina, eu quereria que tuvencesses a tua tristeza e me falassessinceramente, como a um companheiro devotado eafeiçoado. Dessa maneira já não te sentirias tão sónesta casa, deserta demais para ti. Vês aquelecesto? Encontraras nele tudo o que necessitas parate tornar agradável a vida.Assim dizendo, conduziu a moça até junto de umcesto cheio de nabos que colhera em um campoterrestre.

Sônia deu uma olhadela distraída naqueles nabos,depois colheu uma rosa e começou a esfolha-lamelancolicamente.- Toma esta varinha marchetada - prosseguiu ogênio -. Tocando com ela um dos nabos, poderástransformá-lo no objeto ou pessoa que tiveresvontade de ver. Assim, qualquer desejo teu poderáser satisfeito.Em seguida se afastou deixando sozinha a princesa,que logo quis por a prova a varinha mágica.- Minha cara Brunilda, - exclamou, tocando em umdos nabos do cesto - vem imediatamente tercomigo.Mal acabara de pronunciar aquelas palavras, viu aseus pés a fiel dama de companhia, chorando dealegria e acariciando-lhe as mãos, que inundava delágrimas.Tratava-se da realidade, ou de uma ilusão?Sem fazer a si própria essa pergunta, Sônia seentregou a doce alegria de encontrar-se, de novo nacompanhia da sua amada companheira debrinquedos, correndo com ela ao longo dasalamedas e colhendo as flores mais belas. Depois,conduziu-a ao seu quarto e mostrou-lhe os seusvestidos; as duas mocinhas estavam tão satisfeitasque nem sequer perceberam que o tempose passava velozmente e que a noite já vinhacaindo.Brunilda contemplava extasiada os vestidos, osvéus, os enfeites e as jóias da princesa,prorrompendo com freqüência em gritos deadmiração.- Que bom gosto! Como escolheste bem!

Mesmo que não fosses tão bonita, merecias damesma forma a coroa de rainha da beleza!O gênio da montanha as espiava sem servisto, alegrando-se com a satisfação de Sônia ecomprazendo-se de sua fina intuição que o fizera lertão bem na alma humana. Desde então a princesamudou de gênio e tornou-se alegre edespreocupada. Um a um, todos os nabos do cestose converteram nas jovens damas decompanhia com as quais sempre compartilhara osseus divertimentos. Os dois últimos nabos, quisporém transformá-los, um em belíssimo gato e ooutro em gracioso macaquinho.Restabelecida desse modo a sua pequena corte, amoça indicou uma tarefa especial a cada uma dasdamas de companhia e teve de reconhecer que nãopoderia ser melhor servida do que assim. As moçassabiam satisfazer os seus menores desejos,cercando-a de cuidados e de afetuosas atenções.Durante algum tempo a princesa pareceu satisfeitacom aquela nova existência; todos os dias asmagníficas salas do palácio ressoavam de músicase de cantos, aos quais se alternavam as danças,jogos e banquetes. Mas, passadas algumassemanas, Sônia notou que as suas pequenas damasde companhia empalideciam de maneira estranha.Enquanto ela parecia cada vez mais bem disposta echeia de vida, as pobres mocinhas tomavam umaspecto de flores fanadas.Todas afirmavam que se sentiam muito bem eestavam reconhecidas ao gênio da montanhaporque não lhes deixava sentir falta de coisaalguma; de fato, tinham sempre tudo aquilo que

desejavam, mas contudo o sorriso desapareceu bemdepressa dos seus lábios exangues.E uma bela manhã, levantando-se da cama depoisde plácido sono, a princesa teve a triste surpresade ver vim ao seu encontro um grupo de velhinhascorcovadas que, não podendo segurar-se naspernas, caminhavam apoiadas a bastões e muletas.Até o macaquinho se arrastava com muitadificuldade pelo chão, e o belo gato manquejava demaneira a inspirar piedade.Impressionada e presa de terrível angustia, a moçaatravessou o salão, correu ao terraço adornado dehera e de flores, depois chamou o gênio damontanha, que não tardou a comparecer diantedela, perguntando-lhe o que queria.- Malvado e infame gênio! - gritou a princesa - Porque queres privar-me da única alegria que meanima a vida? Da companhia das minhas amigas deinfância? Se não lhes restituíres a mocidade e a boadisposição de antes, eu te castigarei com o meuódio e com o meu desprezo!- Não te encolerizes, belíssima filha dos homens! -respondeu o gênio -. Estou pronto a fazer por titudo aquilo que está em meu poder, mas não possoir de encontro a algumas leis imutáveis.�Enquanto os frutos da terra estavam frescos,podias animá-los segundo a tua vontade, masagora que o suco dos nabos murchou, eles tem demurchar. Porém não te desoles, minha adoradamenina; vou trazer-te outro cesto de nabos epoderás redespertar as vidas que tanto teinteressam. Vai tu própria ao prado, ondeencontrarás o que precisas. Mas primeiro toca com a

tua varinha nas criaturas vivas que te fizeram tãoboa companhia.�Assim dizendo, o gênio da montanha afastou-se e aprincesa tocou com a sua varinha multicor as velhasdecrépitas, o macaco e o gato, que setransformaram logo em nabos murchos.Depois, correu ao jardim, na esperança de encontraroutro cesto de nabos frescos, mas, nãoencontrando coisa alguma, começou a correr pelasalamedas, gritando e desesperando-se. Poucodepois viu surgir de novo o gênio, com ar tão tristee desconsolado que a fez compreender logo quetodas as esperanças estavam perdidas.- Onde estão os nabos? Enganaste-me, então?- Minha pobre e doce amiga, - respondeu o gênio,com voz magoada - perdoa-me se te fizapressadamente demais uma promessa que estavaconvencido de poder manter. Andei muito, para verse podia encontrar o que queres, mas os nabosestão todos murchos, nas despensas, porquechegou o inverno e a vegetação esta morta. Aquipermaneceu a primavera, graças a tua presença, eas flores ainda só desabrocham por onde tu passas. . . Tem pois paciência por mais três meses, eentão poderás reaver a companhia que tanta faltate faz.Sônia voltou-lhe as costas chorando e correu afechar-se no seu quarto.Entretanto, o gênio da montanha, não querendoficar inativo, voltara à terra, indo a cidade, ondecomprou um burro e alguns sacos de sementes quecarregou no lombo do animal. Depois cultivou umavasta zona de terra situada no meio-dia e

encarregou um espírito seu dependente de acenderum grande fogo nas entranhas da terra, de modoque o seu calor emanasse à superfície, esquentandoo ar dos campos.Certo dos bons resultados, apressou-se atranqüilizar Sônia e levou-a a visitar as plantações.A moça sentiu renascer a esperança no seu coraçãoe, desde aquele dia, continuou a dirigir-se comfreqüência ao campo, preferindo-o aos jardinscheios de flores e frutas.Mas a sua alma permanecia imersa na tristeza.Durante longas horas permanecia sentada nasmargens de um ribeirão, contemplando as águasmúrmuras, nas quais jogava as pétalas das floresque ia desfolhando.Mas o gênio da montanha não podia deixar deconstatar que todos os seus esforços paraconquistar o amor de Sônia eram inúteis. Eleconhecia pouco a mente e o coração humano eagora compreendia que se tinha iludido julgandosair-se bem do seu intento prodigalizando a moçatoda espécie de atenções e carinhos. Não; a belaprincesa nunca se tornaria a soberana do seu reino.E, de fato, Sônia não podia corresponder ao amordo gênio, porque era noiva do príncipe Ladislau,amigo de seu pai, que já marcara o dia docasamento, pouco antes dela ter desaparecidomisteriosamente da terra.Ao saber a tremenda notícia, o príncipe fora tomadode louco desespero e abandonara o seu palácio,vagueando pelas montanhas e gritando às árvores eao céu, a sua inconsolável dor.A sua fiel Sônia não sofria menos do que ele, mar

sabia esconder o seu desgosto sob uma aparênciade calma e tranqüilidade que impedia o gênio dedescobrir o seu segredo.Depois de ter estudado longamente um meio quelhe permitisse evadir-se daquela estranhaprisão, a moça imaginou um estratagema que lhepareceu viável.Tendo voltado a primavera, os nabos, que durante oinverno tinham vegetado sob a terra, graças aocalor do fogo, amadureceram, e a astuta Sôniacomeçou a apanhá-los, transformando-os nos serese nas coisas mais disparatadas.O gênio da montanha julgava que a princesa fizessetudo aquilo para ter um divertimento inocente, mas,na realidade, ela nutria outras intenções.Um dia pegou em um nabo e transformou-o em umaabelha dizendo-lhe- Minha pequena abelha, peso-te que voe para olado de onde nasce o sol e que vás ao reino dopríncipe Ladislau, sussurrando ao ouvido dele que asua Sônia ainda é viva, mas não pode voltar para oseu lado, sendo escrava do rei dos espíritos daterra, que mora debaixo da montanha, e quepretende casar com ela. Nao te esqueças de dizer-lhe todas estas coisas e, quando voltares, traze-meboas notícias da sua fidelidade e do seu amor pormim.A abelha levantou vôo, porém mal começara aafastar-se, uma andorinha esfomeada pegou-a como bico e engoliu-a, com grande desgosto de Sônia.Então a moça pensou em servir-se de um grilo e,quando o teve diante de si, ensinou-lhe compaciência tudo o que deveria contar ao príncipe.

- Salta, meu caro grilinho! Salta de um lado para ooutro no monte e vai até ao palácio do príncipeLadislau, dizendo-lhe que a sua Sônia espera serlibertada por ele.O grilo obedeceu imediatamente, encaminhando-sena direção que lhe fora indicada pela moça, mas, aochegar perto de uns arbustos, uma cegonhaagarrou-o com o seu longo bico e engoliu-o de umasó vez.Tendo falhado também a segunda tentativa, aprincesa não quis desanimar e transformou um naboem um pássaro, dizendo-lhe- Voa, meu caro pássaro, voa de árvore em árvore,até ao palácio do meu noivo, e informa-o de que asua Sônia fugira da prisão onde se acha e pede-lheque se encontre, dentro de três dias, com escolta ecavalos, no fundo do vale de Maio, pronto pararecebê-la entre os bravos.A ave levantou vôo e bem depressa a moça aperdeu de vista.O desventurado príncipe Ladislau errava entre osbosques e florestas; sua mágoa se tornara maispungente com o reflorir da primavera, que lhe faziarecordar a bela flor que perdera, a sua Sônia !Sentado a sombra de um carvalho, ali estavaimóvel, com a cabeça apertada entre as mãos e, dequando em quando, proferia o nome da noiva.Mas de repente ouviu uma voz desconhecida, queexclamava por sua vez :- Sônia !O príncipe apurou o ouvido e, alguns instantesdepois, escutou outra vez repetir aquele nomeadorado. Então levantou o olhar e viu um pássaro

que esvoaçava entre os ramos da árvore.- Pobre pássaro !- murmurou ele -. Por quepronuncias este nome, que pertence unicamente aum infeliz já agora resolvido a abandonar a vida?Assim dizendo, pegou em uma pedra para atirá-lacontra a ave e obrigá-la a fugir, mas o pássarorecomeçou a falar, repetindo, sílaba por sílaba, tudoo que lhe dissera a princesa prisioneira.A grata novidade pareceu clarear a alma enegrecidado jovem príncipe, e a mortal angustia que lhedilacerava o coração desapareceu como por encanto.Sem dúvida as palavras pronunciadas pela avedeviam ser uma lição aprendida de cor.Ladislau apressou-se a voltar ao castelo, ondereuniu um grupo de cavaleiros, que ele próprio quisconduzir até ao vale de Maio.Nesse meio tempo, Sônia tinha preparado o seuplano de fuga.O gênio da montanha estava muito contente por verque ela o tratava com maior gentileza ecorrespondia com docilidade as suas afetuosascaricias.Sua alegria era tão grande que um olhar, umsorriso, uma palavra de Sônia, eram suficientespara fazê-lo enlouquecer de felicidade.Na manhã seguinte, mal despontara o sol, a jovemvestiu-se de noiva, enfeitando-se com todas asjóias que o gênio lhe dera de presente e cingindo afronte uma coroa de flores. Ao ver aparecer aquelacelestial visão, o gênio da montanha sentiu-seinvadir por profunda comoção e prostrou-se aosseus pés, exclamando :- Oh , maravilhosa e divina menina, suplico-te que

não me faças mais sofrer esta angustiosa incerteza!Promete-me que te casarás comigo, e eu te dareitodos os tesouros do meu reino subterrâneo, eseremos felizes!Sônia baixou os olhos, e respondeu timidamente :- Como é possível que uma mísera mortal como eupossa resistir a um gênio como tu? A tua paixãovenceu! . . . Confesso-te chorando e escondo asminhas lágrimas com estes véus.- Lágrimas! E por que, minha fascinante criatura?Cada gota de teu pranto cai no meu coração comoum espinho ardente . . . Nao ! Nao!... Eu quero atua amizade, mas não exijo o teu sacrifício.- Nao compreendes então a razão do meu pranto? -acrescentou a jovem -. Meu coração corresponde aoteu, mas a minha alma esta aflita de receio. Pensoque a minha beleza deverá fanar-se, ao passo quetu não envelhecerás . . . A beleza terrestre a florque murcha . . . Como poderei saber que um dianão virás a cansar-te de tua esposa?- Pede-me uma prova do meu amor e da minhafidelidade - exclamou o gênio -. Obedecerei aqualquer ordem tua . . . Fala meu amor! Só assimpoderás fazer uma idéia da minha devoção!- Pois bem - disse então a astuta Sônia - quero pora prova a tua bondade e o teu amor por mim!Vai ao campo dos nabos, e conta-os. Quero saberquantas serão as damas de companhia quecomparecerão ao meu casamento . . . Trata de nãome enganar e de não errar ao contá-los. Esta é aprova de amor que te peço.Embora sofresse muito por ter de afastar-se daprincesa, o gênio da montanha obedeceu sem mais

comentários e dirigiu-se ao campo dos nabos,começando a contá-los pacientemente. Quandoterminou, quis ter a certeza de que não seenganara e contou-os pela segunda vez. Mas, comoo número que encontrou então não correspondia aoprimeiro, recomeçou a contagem, obtendo ainda umresultado diferente dos dois primeiros.Isso não deve espantar ninguém, visto que opensamento do gênio estava voltadoconstantemente para a encantadora moça queperturbara o seu coração.Mas, entretanto, a astuciosa Sônia punha emexecução o seu plano de fuga e, depois de tertransformado um nabo em cavalo, pulou-lhe para olombo e fugiu a todo o galope, chegando ao vale deMaio, onde encontrou o príncipe Ladislau que aesperava com indizível ansiedade e a acolheu entreos braços com um grito de alegria.Quando conseguiu finalmente obter o número exatode nabos, o gênio da montanha, que não tinha dadofé do que acontecera, voltou ao palácio, contente esatisfeito porque estava em condições detestemunhar a noiva o seu grande amor por ela.Mas o terraço onde a deixara estava deserto.Então, correu ao jardim, percorreu todas asalamedas, depois entrou no palácio, visitando todosos aposentos e chamando em altos gritos a suaSônia.Mas ninguém respondia aos seus apelosdesesperados.Somente então ele pensou na possibilidade de umengano e, libertando-se do seu incomodo aspectohumano, voou muito alto, no espaço, para dominar

a terra lá em baixo. Uma hora depois, avistou amoça que fugia a cavalo em direção ao vale deMaio.Tomado de intensa cólera, bateu duas nuvens umacontra a outra, provocando um raio, que caiu nafloresta, estilhaçando um carvalho. Mas entretantoa princesa já atravessara os confins do seu reino eele nada mais pôde contra ela.O gênio da montanha andou vagueando muitotempo no espaço, urrando o seu tremendodesespero a todos os ventos. Depois, voltou ao seupalácio subterrâneo, que ficara deserto,e fez ressoar as paredes com os seus dolorososgemidos.Nem mesmo o encantador jardim tinha maisqualquer atração para ele; as flores de fantásticosreflexos variados, as frutas marchetadas de ouro,as alamedas umbrosas e perfumadas, lembravam-lhe a moça que sonhara desposar e feriam-lhe ocoração com indizível tormento.Enfim, a sua dor não achou outro desafogo senão ode imprecar contra os homens, ao meio dos quaisresolveu nunca mais voltar.Tendo tomado esta decisão, voltou a superfície daterra e bateu três vezes com o pé no chão. Logo opalácio encantado desapareceu e a terra se abriuaos pés do gênio da montanha, que se abismou atéao centro do seu reino, levando consigo o seu ódioe o seu desprezo pelos homens.Nesse meio tempo, o príncipe Ladislau reconduzia anoiva ao castelo de seu pai, que a acolheu comjúbilo indescritível.O casamento foi celebrado poucos dias depois com

grande magnificência e, mais tarde, o príncipefundou uma cidade que, ainda hoje, tem o seunome.A extraordinária aventura da filha do rei no montedos Gigantes, e sua fuga audaciosa e cheia deperigo, tornaram-se objeto de conversa entre oshabitantes e constituíram depois uma espécie delenda que se transmitiu de pai a filho, até hoje.Não faltou sequer a ironia do povo, que acaboubatizando o gênio da montanha com o apelido de�Contanabos�.

FIM