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" EDITORA VOZES Petrópolls Danilo Gandin Carlos Henrique Carrilho Cruz Planejamento na sala de aula 11 Pressuposto conceitual básico 111 Modelo do plano de sala de aula IV Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do livro, SP, Brasil) Gandin, Danilo Planejamento na sala de aula / Danilo Gandin CarIos Henrique Carrilho Cruz. - 13. ed. - Petró~olisl RJ : Vozes, 2012. ISBN 978-85-326-3359-0 Bibliografia. 1. Educação - Finalidades e objetivos 2. Pedagogia 3. Planejamento educacional 4. Sala de aula - Direção r. Cruz, Carlos Henrique Carrilho. 11.Título. 06-4990 índices para catálogo sistemático: 1. Sala de aula: Proposta pedagógica: Educação 370 CDD-370 A inteligência da ação: o marco operativo V Diagnóstico, a ligação teoria/prática VI Necessidades, conceito-chave VII A programação como consequência VIU Funcionamento na prática

Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

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Page 1: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

" EDITORAVOZES

Petrópolls

Danilo GandinCarlos Henrique Carrilho Cruz

Planejamento na sala de aula

11

Pressuposto conceitual básico

111

Modelo do plano de sala de aula

IV

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do livro, SP, Brasil)

Gandin, Danilo

Planejamento na sala de aula / Danilo GandinCarIos Henrique Carrilho Cruz. - 13. ed. - Petró~olisl RJ :Vozes, 2012.

ISBN 978-85-326-3359-0Bibliografia.

1. Educação - Finalidades e objetivos2. Pedagogia 3. Planejamento educacional4. Sala de aula - Direção r. Cruz, Carlos HenriqueCarrilho. 11.Título.

06-4990

índices para catálogo sistemático:1. Sala de aula: Proposta pedagógica:

Educação 370

CDD-370

A inteligência da ação:o marco operativo

V

Diagnóstico, a ligaçãoteoria/prática

VI

Necessidades, conceito-chave

VIIA programação como consequência

VIU

Funcionamento na prática

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cham para a manutenção do faz-de-conta, mas de um planeja-mento que tenha como perspectiva a construção de uma reali-dade, através da transformação da realidade existente.

INSISTIMOS: COMO O ENSINO ESTÁ ORGANIZADO EM DIS-CIPLINAS, TEMOS QUE PARTIR DELAS. A PROPOSTA, CONTU-DO, É IR SUBSTITUINDO O ESTUDO DE DESCIPLINAS PELOESTUDO DE TEMAS. AGORA NÃO É POSSÍVEL FAZER ISTO DEMODO COMPLETO. É NECESSÁRIO IR DEDICANDO TEMPOSPARAO CONTEÚDO PRÉ-ESTABELECIDO E, CADA VEZ MAIS, IRCONSTRUINDO PROJETOS COM TEMAS INDO ALÉM DA DIS-CIPLINA, EMBORA PARTINDO DELA.

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Pressuposto conceitual básico

Entendemos que é necessário, cadavez mais, conjugar o verbo "edu-car-se" e deixar de lad~oo verbo"educar". Cremos, também, que aescola pode contribuir para que aspessoas se eduquem.

A educação é um processo complexos. Com Paulo Freire,insistimos que "ninguém educa ninguém, ninguém se edu-ca sozinho, os homens se educam entre si, mediatizados pelomundo" (Pedagogia do oprimido).

A partir disso, fica bem claro que o verbo a conjugar é"educar-se" e não "educar". Fica explícito, também, que todatentativa de "educar" é um processo de domesticação. Se "'edu-camos", estamos, de um jeito ou de outro, fazendo a cabeça daspessoas, forçando-as, não lhes permitindo construírem sua his-tória e, do ponto de vista social, estamos contribuindo para quese mantenha a atual deSigualdade.

Desde logo, queremos acentuar que pensamos a educaçãocomo um processo exigente e que não estamos defendendoconfusão e bagunça. Não estamos propondo que cada um façao que bem entender. Também queremos acentuar que o res-peito pela caminhada das pessoas não significa abrir mão da-

5.Desde logo é claro que, mesmo para a escola, não estamos pensando s6 emconhecimento e, muito menos, apenas em informações. A escola participa,queira ou não, de todo o processo educativo que envolve, pelo menos, conhe-cimentos, habilidades e hierarquias de valores.

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quilo que consideramos correto: cada um e cada grupo devemsempre defender sua verdade com energia - isso também écontribuição ao educar-se -, mas não impô-Ia de modo algum.a que queremos ressaltar é que os valores, os rumos, as nor-mas devem ser construídos em conjunto e que todo esforço etodo sacrifício não têm sentido em si mesmos, mas somentequando forem dirigidos à consecução de algo importante que,no caso, é sempre um tipo de sociedade e um tipo de pessoaclaramente caracterizados.

Mas o que é o "educar-se"? Dito de outra maneira, comodefinir uma pessoa educada?

"Educar-se" consiste em:1. definir e buscar a própria identidadé (pessoal e de grupo);2. apropriar-se de instrumentos para participar na sociedade7;

3. assumir um compromisso social;4. aceitar algum tipo de transcendência;S. estar sempre em construção.Uma pessoa educada é, então, aquela que:• continuamente busca sua própria identidade e participana construção da identidade de algum grupo;• domina instrumentos para participar utilmente na socie-dade;• sabe que faz parte de um grupo social, respeita seus se-melhantes, tem consciência da existência de estruturas so-ciais e se propõe a construí-Ias (reconstruí-Ias) em conjun-to com os outros;• é capaz de pensar e de vivenciar algo além dos interessesimediatos próprios ou dos pequenos grupos aos quais per-tence; em outras palavras, é capaz de incorporar à sua vida·

6.A partir do pensamento de Francisco Taborda, em Cadernos da AEC,n.14.'l.A partir do pensamento de Dermeval Saviani, em Revista de EducaçãoAEC, n. 34.

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a dimensão do que nos é superior, chegando, possivelmen-te, até Deus;• vive como alguém que sempre aprende, sempre desa-prende e aprende de novo; alguém que faz o que está ditoacima como um processo contínuo.É claro que ajudar as pessoas a "educar-se" não é tarefa

apenas da escola; mas é evidente, também, que a escola devecontribuir para isso. Mais ainda: mesmo que a escola queira fi-car, neutralmente, passando conteúdos pré-estabelecidos, elaestará participando da luta de construção das pessoas e da so-ciedade, só que, neste caso, reforçando a domesticação.

Este resumo do que é o "educar-se" serve aqui para definirnosso posicionamento básico, que vai ter consequências sobreo tipo de planejamento que propomos e sobre alguns pressu-postos sem os quais não se pode entender o que se lerá adiante.

Tais pressupostos são, basicamente, os que passamos a in-dicar:

• O centro do processo educativo não deve ser o conteúdopré-estabelecido como faz a escola hoje.Qualquer professor(a) estaria de acordo em dizer que o

centro do processo não é o conteúdo; mas, em sua prática, agrande maioria faz dele todo o processo. Muitas vezes, issoacontece até contra sua vontade. De fato, há uma "cultura",dentro da escola, junto aos pais dos alunos e em todo o sensocomum social, de que se vai para a escola para memorizar algu-mas informações, normalmente consideradas inúteis até pelasmesmas pessoas que as exigem.

• O centro do processo educativo também não pode ser oaluno.Este é desastre tão conservador como centrar o trabalho no

conteúdo. Apesar de seus importantes aspectos positivos, é,talvez, pior, porque reforça uma perspectiva de subjetivismo ede busca de interesses individuais; é o suspiro final do antropo-centrismo renascentista, tão necessário naquele momento etão sem possibilidades agora que se converteu em egoísmo, in-dividualismo e domínio de alguns sobre os outros. É preciso

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atentar, de qualquer modo, que, embora muita gente propug~ne por uma proposta desse gênero e embora professores e pro-fessoras, na prática cotidiana, aceitem uma atenção maior àsquestões trazidas pelos alunos, não há grandes resultados nessa~ireção. O ruim ainda é o anseio e a continuada pregação dessetIpO de proposta por acadêmicos e por outras pessoas: eles têmtrazido prejuízos ao trabalho na escola, porque oCa) profes-sor(a) ?erde o rumo, já que tudo fica muito subjetivo, e desani-ma, ate porque o atendimento aos gostos de todos, além de eti-camente não desejável, é impossível.

- O centro do processo educativo escolar deve ser, sem-pre, um projeto político-pedagógico.Esta é a grande proposta educacional dos últimos 30-40

anos. Embora isso passe despercebido para a maioria das pesso-as que trabalham em escola, apresenta-se muito claro e defini-do em dois sentidos:

1. no sentido sociológico, é o que ocorre na prática: não háprocesso educativo que se efetive sem um projeto socialcondutor (um futuro desejável para a sOciedade); mesmoquando as pessoas não têm esse projeto explicitado, e, atémesmo, quando o negam, estarão "educando" ou ajudandoo "educar-se" dentro de uma concepção de homem e deSOciedade;

2. no sentido filosófico, é o dever-ser que precisa ser indi-cado: todo esforço educacional deve propor um futuro hu-mano - deve fazer isso explicitamente -, para que tal pro-jeto guie todo o trabalho que se realize.

A IDEIA DE QUE O CENTRO DO PROCESSO ESCOLAR ÉUM PROJETO POLÍTICO-SOCIAL CONSTITUI, FILOSOFICA-MENTE, O PONTO DE PARTIDA E O HORIZONTE DESTE LI-VRO; OFERECER INSTRUMENTOS PARAVIVER ISSO NA PRÁ-TICA, NO DIA-A-DIA DAS SAlAS DE AULA, É SEU OBJETIVO.

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-Em todas as áreas, mas sobretudo na educação, o cami-nho se faz enquanto se anda.

A grande descoberta é que não há exemplos prontos e fe-chados8 para seguir. O que há é qm horizonte social que inclui nãouma forma acabada de estruturas sociais, mas um conjunto deprincípios que servem de rumo dentro de uma realidade deter-ominada e uma proposta metodol6gica que torne possível a apro-ximação deste horizonte. E tudo isso decidido pelo grupo queestá envolvido numa mesma empreitada. Deve haver, também,um conjunto de ferramentas capaz de facilitar, para o grupo, aelaboração de tal horizonte, a compreensão da prática e a deci-são sobre os caminhos para aproximar a prática daquele horizonte.

No campo escolar, isso se manifesta com a proposta de:1. um projeto político-pedagógico, construído de formacoletiva;2. um processo de planejamento, constituído por um conjun-to de conceitos, modelos, técnicas e instnlmentos, organica-mente estruturados, e sob a coordenação de uma equipe oude uma pessoa que domine a ferramenta que daí surge.- Há necessidade de uma nova proposta social e culturalpara a humanidade.Estamos em um momento da história humana l"Jn que as

hierarquias de valores que vieram sendo construídas já não dãoconta de nossa problemática e em que uma nova hierarquiadeve ser arquitetada para um período de paz e de progresso.

- Esta hierarquia não pode ser construída por alguns ilumi-nados, mas precisa ser obra de todos ou, pelo menos, de

8. É necessário deixar claro q~e, no que diz respeito a um processo de plane-jamento, há, sim, "receitas" . .As diversas propostas de planejamento são fer-ramentas para decidir para onde se quer ir e quais os caminhos que se vai to-mar. Sendo ferramentas, são construídas de forma definida e devem ser usa-das da maneira apropriada para cada uma. Uma pá tem uma receita: um fim,um modo de ser, uma técnica de uso. Não convém utilizar a pá quando se ne-cessita de um martelo.

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muitos, porque todos podemos trazer nosso saber, nossaemoção, nossas opções para tal construção. Isso não é as-sim porque alguns queiram que assim seja: é assim porquenão será mais possível a aceitação de uma hierarquia de va-lores que venha da ação de apenas um pequeno grupo.• Nisto se estabelece claramente um horizonte para o tra-balho educacional, mesmo o escolar: a necessidade de quetodos se eduquem no sentido indicado acima, porque sóassim todos teremos condições de participar na construçãode uma nova sociedade.• Para realizar este tipo de revolução, serão necessárias mu-danças em todos os campos. Não poderão oCa) profes-sor(a) e a escola em geral falar na transformação do mun-do, na construção de uma nova sociedade, sem mudar oque estão fazendo na sala de aula e no restante de suas ati-vidades.• A transformação só é possível quando se investe na mu-dança das estruturas.Por sua própria condição, a educação escolar, mais na práti-

ca do que no discurso, esforça-se de maneira constante e efici-ente para converter as pessoas e preservar as estruturas. Tentadomesticar os alunos para que as estruturas não sofram qualquerarranhão. No próprio discurso, é clara esta proposta: diz-se que,se as pessoas s~ converterem, elas transformarão as estruturas.Com isso, evita-se qualquer discussão sobre poder e sobre o do-mínio que uns exercem sobre os outros.

É preciso que se tenha clareza nisso: se de verdade se queruma transformação em proveito de todos, que promova a igual-dade, a fraternidade, a esperança e a justiça, será necessário mu-dar as estruturas sobre as quais se tem poder.

• Para a eficiência e a eficácia na mudança das estruturas daeducação e da sociedade, é preciso dispor de instrumentosadequados que represeritem, eles mesmos, uma transfor-mação estrutural. Por isso propomos, para a sala de aula, acorrente de planejamento que já se consagrou em outras ati-vidades, chamada de planejamento participativo.

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Modelo do plano de sala de aula

Um plano será um instrumento deconstrução da realidade se tiver trêselementos: a definição do que sequer alcançar; a indicação da dis-tânda a quese está desseideal;a pro-posta para diminuir tal distânda.

o plano de sala de aula, aquele que o professor precisa ela-borar para desincumbir-se de seu trabalho cotidiano, faz partede um conjunto - o processo de planejamento da escola.

Numa escola que vive um processo de planejamento, have-rá planos globais (de médio e de curto prazos) que se referem atoda a instituição, e planos de cada um dos setores, isto é, decada uma de suas partes, como, por exemplo, da direção, daorientação educacional, da coordenação pedagógica.

São, também, setores (partes) da escola cada uma das tur-mas de alunos. Cada uma delas deve ter um plano profunda-mente concatenado com o plano global da escola, porque deleretira as ideias básicas de sua fllosofia.

Nesse sentido, cada plano de sala de aula é parte do esforçogeral que a escola empreende. Aquilo que a escola, como insti-tuição sodal, quer alcançar e que está expresso em seu marcoreferencial, guiará o trabalho de cada professor(a) e de cadaturma de alunos. Se assim não for, é provável que cada profes-sor(a) e cada grupo de alunos, mesmo tentando fazer o máxi-mo, trabalhem segundo seu senso comum pessoal e, até, se-gundo o humor de cada momento. A escola não terá, nessecaso, uma identidade ideal clara, que é uma condição básicapara que se estabeleça um processo de ajuda eficaz ao edu-

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car-se das pessoas que dela participam, e para que se estabele-ça uma presença social construtora.

A concatenação destes planos está analisada no livro já cita-do, A prática do planejamento participativo. Repetimos aqui ofundamental para facilitar a compreensão.

A escola deve ter um plano9 que se comporá da forma indi-cada no modelolO a seguir:

9. Mais adiante apresentaremos, também, uma sugestão de como devem agiros professores quando sua escola não tem esse plano de que falamos aqui.Acontece, até, que, se um bom grupo de professores for elaborando e viven-dando seus planos da forma como indicaremos, alcançará inevitavelmenteque a escola como um todo passe a ter um processo de planejamento: na prá-tica do planejamento, já se viu muitas vezes que a vivênda de planos setoriaisse ampliou para o planejamento global. Mas é claro que, do ponto de vistateórico, devemos apresentar nossa proposta num contexto de planejamentosuficientemente estruturado.

10.Obviamente não utilizamos aqui a palavra modelo com o significado deexemplo. Ela significa um esquema que representa os elementos de uma rea-lidade e a relação entre eles. Para maior simplicidade, então, podemos dizerque um modelo de plano é o esquema deste plano, isto é, a indicação de suaspartes, a sequência em que elas aparecem e a dependência que há entre elas.

Ou, em linguagem de planejamento:I-MARco REFERENCIAL

1. MARco SITUACIONAL

2. MARco POLÍTICO

3. MARco PEDAGÓGICO

II - DIAGNÓSTICO

III - PROGRAMAÇÃO

• Objetivos• Políticas e estratégias

• Normas• Atividades permanentes

Os livros que tratam dos planos de sala de aula falam emobjetivos gerais. Quase sempre estão se referindo, nesse caso,à realidade global desejada (marco ou projeto político) e àrealidade educacional e escoléir desejada (marco ou projetopedagógico). Por isso estabelecem a confusão: como não pen-sam num plano global de escola do tipo apresentado pelo mo-delo anterior, sugerem que, cada professor defina estes taisobjetivos gerais, o que, se fosse viável, traria direções diver-gentes ao esforço global de educação daquela escola. O quefalta nesses livros é a clareza sobre a distinção entre projetopolítico-pedagógico da escola, marco operativo da disciplinaou área de estudo e objetivos da prática diária; falta, também,clareza sobre a relação que esses elementos têm entre si. Comoconsequência, não ajudam o professor a ser mais claro e maiseficaz. Falam em grandes objetivos, em cultura, em realidade,em hist6ria, e, na página seguinte, prendem-se aos conteúdospré-estabelecidos, chegando a exemplificar assim: "identifi-car (sic) as regras gramaticais".

PROPOSTA DENOVA PRÁTICA* Ações

.---)~I * Comportamentose atitudes

* Regras* Rotinas

xRealidade educacional

desejadaEscola desejada

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2. diagnóstico de determinada turma de alunos para a qualse está elaborando o plano, a cargo do docente r~spectivo,junto com seus alunos;

3. definição de ações, de atitudes, de normas e de rotinaspara um período de tempo, naquela turmaI2•

Este plano de sala de aula concatena-se com o plano da esco-la (quadros das páginas 24 e 26). A escola, quando tem um pla-no, apresenta sua filosofia (chamamos isso de marco referenci-al) que é, de f~to, um projeto político-pedagógico. Será daí quepartirão todos os planos das disciplinas, áreas de estudo, dclos,séries, conjuntos de séries, cursos e habilitações daquela escola.De fato, o que chamamos antes de "filosofia" do plano de sala deaula é uma expressão de como aquele setor da escola vai contri-buir para o alcance da realidade desejada (horizonte político-pe-dagógico) da escola. É claro que cada disciplina, área de estudo,ciclo, série, conjunto de séries, curso 'ou habilitação terá, além,dessa fonte de inspiração, uma outra, que é a natureza própriaque lhe é concemente. Este último elemento trará a diferençaentre os diversos trabalhos da mesma escola porque, por exem-plo, a matemática tem sua própria natureza, diferente da histó-ria; e o anterior será fonte de unidade, porque todos os esforçosrealizados se organizam a partir do mesmo referendal; isso per-mite, inclusive, o trabalho integrado que os arautos da interdis-ciplinaridade tentam mas não alcançam.

12.Cada um desses três elementos (partes) de um plano de sala de aula seráexplicitado em um capítulo próprio, mostrando sua caracterização a formade elaboração e algum exemplo. '

lU

A inteligência da ação:o marco operativo

Sem um horizonte que nos en-cante e nos tome esperançosa aluta, não passaremos de tarefei-ros, carentes de perspectivas e deresultados.

Caracterização

Em um plano de sala de aula, a primeira preocupação é de-frnir o marco operativo, ou seja, a proposta básica da discipli-naI3, a indicação do rumo que se pretende seguir, o horizonteque se busca, o projeto de contribuição da disciplina ao cresci-mento das pessoas e à construção de uma sociedade.

Ao dizer que esse é o primeiro elemento de um plano desala de aula, não estamos desconsiderando a realidade. Isso pordois motivos, que explicitamos a seguir.

1. Como ficou claro, o plano de sala de aula é um plano se-torial em relação ao plano global da escola; neste plano glo-bal, há um marco situacional que é o situar-se do grupo narealidade, o estabelecer como esse grupo entende a socie-dade em que está inserido e quais os principais problemasque nela detecta.

13.Toda vez que se escrever disciplina, entenda-se que isso pode ser utiliza-do também para áreas de estudo, ciclos, séries, conjuntos de séries, habilita-ções e cursos. Buscaremos, de ora em diante, escrever apenas disciplina(s)quando se tratar desse conjunto.

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2. Depois de estabelecer o marco operativo, isto é, de ela-borar tal referencial da disciplina, dever-se-á, a partir deleesc~ever um diagnóstico, no qual a realidade próxima - in~clumdo o estado em que estão os alunos, a prática do pro-fessor e da turma - será estudada, analisada e avaliada en-fim, comparada com esse mesmo marco operativo c~m aprofundidade de que for capaz o grupo que planej~.Os autores que insistem em dizer que o primeiro elemento

de um plano de sala de aula é a análise da realidade a "sonda-ge~-~iagnós~co", o estudo sobre os alunos, um est~do antro-pologlco-soclal, a análise da situação, perdem-se e não contri-buem para a eficácia do planejamento, porque:

I. pres~põem um referendal teórico pessoal (deles, auto-res) retIrando, do professor, a possibilidade de construí-Ioem seu grupo;

2. ou desistem desse tipo de referendal, aceitando e levan-do o professor a aceitar o senso comum pedagógico corren-te, com um conteúdo pré-estabelecido pela "cultura" for-molizada (sic!) da escola; até fazem extraordinárias con-versas, sobre significação (em geral, "re-significação") doconteudo, so~re seu .vínculo com o social, sobre o resgatede uma porça~ de COIsase ... contribuem, depois, para queos alunos contínuemdecorando a capital da Etiópia as ca-racterísticas dos celenterados, o nome completo do; presi-dentes do Brasil, a definição de co-seno, a diferença da vo-gal e da semivoga1...

3. confundem os professores quanto ao que seja um verda-deiro diagnóstico do trabalho de sala de aula, porque osprofessores pensarão que a aproximação inicial e sem cri-t~ri~s à r~alidade já é um diagnóstico; sem um bom diag-nostICOnao haverá ação eficaz, isto é, sem ele a escola semanterá ~essa repetição interminável de conteúdos pré-estabeleCIdos e sem sentido para não-especialistas e, con-sequentemente, na reprodução ingênua das desigualdadessociais que já conhecemos.

31 •

TRABALHAR COM CONTEÚDOS PRÉ-ESTABELECIDOS ÉUMA DAS BARREIRASMAIS FORTES NA SOMA DE DIFICUL-DADES PARAALCANÇAR MUDANÇAS SIGNIFICATIVAS. TERCONTEÚDOS PRÉ-ESTABELECIDOS, ANTES DE PENSAR O QUESE QUER, É COMO TER UM CAMINHO DEFINIDO ANTESDE SE SABERAONDE SE QUER IR.

O marco operativo, enquanto proposta ideal da disciplina,organiza-se ao redor dos aspectos que constituem o "educar-se".Depende, portanto, da concepção de educação que o grupotem. Dito de outra forma, explicita, para a disciplina, os mes-mos aspectos que constituem o "educar-se" para aquelas pes-soas que, juntas, compõem o marco operativo e/ou o "educar-se" segundo o projeto político-pedagógico da escola, expresso emseu referencial.

Este marco operativo parte, para isso, das duas fontes apre-sentadas no quadro anterior:

1. o marco referendal (político e pedagógico) da escola, doqual retira a hierarquia de valores, o projeto social e pedagó-gico que será elemento de unidade de todos os esforços dainstituição; assim, realiza a ideia de integração dos esforçosdas disciplinas, áreas de estudo etc., tentada muitas vezesatravés da interdisciplinaridade, quase sem resultado;2. a natureza da disciplina que traz sua maneira própria decontribuir na construção social e pessoal, na perspectiva daglobalidade instituída pelo grupo todo da instituição.Assim, o marco operativo da disciplina contém, essencial-

mente:• a inteligência da ação a ser desenvolvida na disciplina;• a razão de ser do que se faz em sala de aulaj• os princípios metodológicos coerentes com isso.O texto do marco operati~o deve ser a manifestação clara

das opções das pessoas ou da pessoa que o elabora(m). Assim,serão usuais palavras como "optamos", "desejamos", "quere-mos", que são expressões de que algo será buscado pelo grupo

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e não é apenas um conjunto de princípios impessoais. Contu-do, não basta ser expressão de vontade: é preciso que o textofundamente de maneira teórica aquilo pelo que agrupo opta.

o MARCO OPERATIVO É UM CONJUNTO DE OPÇÕES,COM AS EXPLICAÇÕES TEÓRICAS QUE FUNDAMENTAM OPORQUÊ DESSA OpçÃO. ELE EXPRESSA A CONVICÇÃO DOGRUPO SOBRE A DISCIPLINA, A ÁREA DE ESTUDOS ETC.

Como elaborar

Para a elaboração do marco operativo de disciplinas, áreasde estudol4

, ciclos, séries etc., duas situações são possíveis:1. os professores são poucos, digamos, até cinco;2. os professores são muitos.Explicitamos o modo de proceder neste segundo caso, jul-

gando que a primeira situação, por ser mais simples, possa terum procedimento adaptado a partir deste.

Reúnem-se os professores de uma disciplina, área de estudo,ciclo etc. de uma escola1S• Para se construir um marco operativocomo tarefa participativa são necessários quatro movimentos:

• que cada pessoa reflita individualmente, deixe claras suasconvicções pessoais, faça opções, registre por escrito o quepensa e o que sente;

14~O futuro trará o fim das disciplinas e das áreas de estudo para o ensino bási-co, substituídas pelo estudo de temas da natureza e da sociedade ou da cultu-ra. O fato, portanto, deproponnos planos para disciplinas, áreas de estudo, sé-ries, conjunto de séries não significa que concordemos com essa divisão do fa-zer escolar. Obviamente a escola deve sofrer uma reinvenção tal que exclua taldicotomização, acabando com séries, com obrigatoriedade de todos seguiremdeterminadas disciplinas e de receberem notas. Pensamos, contudo, que, en-quanto fonnos construindo a revolução, temos que dar dignidade ao que esta-mos fazendo e, mais do que isso, fazer algo que apresse essa revolução.15.Também temos trabalhado com municípios que, por terem uma rede pe-quena de escolas, reuniram todos os professores de uma disciplina para ela-borarem seus marcos operativos. Escolas da mesma entidade mantenedoratambém podem usar esse esquema.

33 •

• que se elabore um texto, reunindo tudo o que tiver sidoescrito individualmente;• que o grupo analise e avalie o texto e se pronuncie sobreseu conteúdo;• que duas ou três pessoas elaborem outro texto, levandoem conta o texto inicial e o que apareceu nos debates.Num primeiro momento, só trabalham os professores, au-

xiliados, se for o caso, pelos supervisores e por outros especia-listas; nada impede, contudo, que, aos poucos, os professoresabram discussões a respeito com seus alunosl6•

Para iniciar a elaboração de marcos operativos de discipli-nas, áreas de estudos, cursos, habilitações, ciclos, séries ou con-juntos de séries, temos utilizado com proveito um conjunto deperguntas que apresentaremos logo adiante.

Estando cada professor com a lista de perguntas - as queindicamos ou outras que a coordenação julgue mais próprias-,utilizamos um roteiro de trabalho muito preciso, que passamosa indicar.

1. Cada professor responde as perguntas que julga impor-tantes e sobre as quais pensa que pode dar seu parecer;nesta etapa, cada professor utiliza todas as fontes que pu-der, sobretudo sua experiência, livros e outros textos,mastrabalha individualmente.2. Um ou dois professores17 ou a coordenação pedagógicafazem um texto preliminar, reunindo, com algum esquemalógico, as ideias que estão nas respostas individuais; nessemomento, deve-se ter atenção para não fazer resumo e paranão omitir ideias: deve-se apenas reunir, com as mesmas

16.Na sequência dos trabalhos, isto é, na elaboração do diagnóstico e da pro-gramação, cada professor trabalhará basicamente com seus alunos.11.Se forem menos do que seis professores que estiverem elaborando ummarco operativo, deve-se, assim mesmo, pedir um trabalho individual decada um sobre as perguntas, mas, depois, com suas respostas, eles se reunirãoe elaborarão juntos um textoi também, nesse caso, é sumamente aconselhá-vel elaborar duas ou três versões, propiciando um tempo de reflexão e de lei-tura entre uma e outra.

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palavras escritas pelos professores, todas as ideias presen-tes, somente excluindo o que não se entende, o que é cla-ramente repetido ou o que não responde à pergunta.3. O texto, multiplicado de modo a existir uma cópia paracada professor, é apresentado numa plenária (lido em vozalta), explicando-se o modo pelo qual foi redigido.4. O texto deve ser discutido pelos professores, em grupos(o ideal é que os grupos tenham seis ou sete pessoas). Nes-sa discussão, deve-se ter em mente sobretudo:

• destacar aquilo que parece mais importante;• pedir a retirada daquilo com que não se concorda;• propor modificações de partes com que se concordamas não totalmentej

• solicitar a inclusão de algo de que se sente falta.5. As observações de cada grupo são apresentadas em reu-nião plenária, sem serem discutidas.6. Com tais observações, as mesmas pessoas mencionadasno item 2 refazem a redação; em geral, essa redação é sufi-ciente, mas pode haver a necessidade de fazer uma novaavaliação em grupo(s) e de refazer o textol8.

Algumas perguntas .•.

que ajudam na elaboração do marco operativo de disciplina oude área de estudo:

1. Conceitue sua disciplina ou área de estudol9•

18.A grande pergunta que o grupo de professores (e a coordenação) deve-sefazer aqui e na avaliação indicada no item 4, ou em outras que ocorram, é:este texto tem suficiente clareza, precisão, consistência, riqueza para servirde base para um diagnóstico na sala de aula e para gerar prática (ações, atitu-des, regras e rotinas) para todo um ano letivo?

19.Fique claro que é por economia que utilizamos o conjunto "disciplina ouárea de estudo·. Na prática, o coordenador deve preparar um instrumentocom as perguntas, no qual se mencione disciplina ou se diga área de estudo.Melhor ainda se escrever, por exemplo: "Conceitue a disciplina língua portu-guesa" .

35 •

2. Qual a abrangência, os principais aspectos de sua disci-plina ou área de estudo?3. Como esta disciplina ou área de estudo se liga ao quadrogeral da(s) ciência(s) de que faz parte?4. Qual o significado desta disciplina ou área de estudo nomundo de hoje?5. Historicamente, como surgiu esta disciplina ou área deestudo e de que forma ela tem ajudado a desenvolver os va-lores dos marcos político e pedagógico da escola?6. Quais devem ser as características desta discipli::la ou áreade estudo para que possa contribuir para a r~alização dos va-10res constantes no marco político e nas liahas da propostapedagógica da escola?7. Que compromiss os e que opções esta di.sciplina ou áreade estudo vai ajudar a construir?8. Que habilidades e linhas básicas de saber esta disciplina ouárea de estudo deve desenvolver para as diferentes idades?9. Como esta disciplina ou área de estudo se organiza emfunção das idades, nos graus e nos ciclos ou nas séries?10. Que princípios metodológicos são adequados para rea-lizar a proposta do ideal desta disciplina ou área de estudo?11. Quais as principais operações mentais que devem serdesenvolvidas por es1:a disciplina ou área de estudo?12. Por que esta disciplina ou área de estudo deve constardo currículo escolar?13. Que características deve ter o trabalho nesta disciplinaou área de estudo para que seja um trabalho de qualidade?14. Com que elementos (saberes, habilidades, atitude~,conhecimentos ...) esta disciplina ou área de ~studo contn-buirá para que o aluno:

• busque sua própria identidade e ajude a construir aidentidade dos grupos a que pertence?• se aproprie de instrumentos (dizer quais são) para par-ticipar na sociedade?

Page 12: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 36

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37.

• assuma um compromisso social, que seja, de preferên-cia, de participação, de igualdade, de justiça,de fraterni-dade?• vivencie mais algum tipo de transcendência?• desenvolva a capacidade de estar sempre em cresci-mento?

Convém deixar claras algumas questões a propósito dessasperguntas:

1. Não é necessário, repetimos, que as perguntas sejamrespondidas todas por todos os professores participantes;há, inclusive, algumas que se superpõem, o que não temmuita importância, uma vez que elas servem para recolhero máximo de material para a construção do marco operati-vo. Os participantes devem, por consequência, ser orienta-dos para que respondam a um número mínimo de pergun-tas (por exemplo, quatro ou cinco) escolhendo as que lhesparecerem mais importantes.2. Essas perguntas não guardam qualquer ordem: isso nemfoi tentado, porque, em verdade, não tem importância; re-colhidas as ideias através das perguntas, o material deve serposto na ordem qqe.o grupo julgar mais clara e eficiente.3. Depois que, cada professor respondeu as perguntas indi-vidualmente, ao se redigir a primeira versão do marco ope-rativo, devem as perguntas ser esquecidas: elas servem ape-nas para levantar as ideias, mas não devem servir, de modoalgum, como roteiro ou esquema.4. Sempre que for possível, deve-se levar em conta o grauou o conjunto de séries ou o(s) ciclo(s) para que se está fa-zendo a proposta, porque muitas vezes a resposta às per-guntas será diferente conforme a idade mais frequente dosalunos; caso extremo que serve de exemplo: fazer este tra-balho tendo em mente uma turma do noturno, de adultos,e outra de crianças em escola comum.

•....

Sobre o próprio conteúdo das perguntas, cabem duas ob-servações extremamente importantes:

A. Estarnos supondo, na proposta acima, que, na escola emque se está elaborando esses marcos operativos das disciplinasou das áreas de estudo ou séries, há um plano global, com mar-cos político e pedagógico; se isso não ocorrer, será necessáriomodificar a lista das perguntas. Por exemplo: a pergunta 6 deveser eliminada e é preciso incluir com destaque perguntas do tipoda n. 7 e da n. 14, preferivelmente colocando-as no início.

Sugerimos, nesse caso, um conjunto de perguntas mais oumenos assim:

1. Que valores queremos reforçar com esta disciplina ouárea de estudo?2. Que contribuições esta disciplina ou área de estudo devedar para diminuir os grandes problemas de nossa sociedade?3. Qual a contribuição social que esta disciplina ou área deestudo vai trazer?4. Além de conhecimento e desenvolvimento de habilida-des, que outra contribuição esta disciplina ou área de estu-do trará à educação das pessoas?5. Com que elementos (saberes, habilidades, atitudes, co-nhecimentos ...) esta disciplina ou área de estudo contribui-rá para que o aluno:

• busque sua própria identidade e ajude a construir aidentidade dos grupos a que pertence?• se aproprie de instrumentos (dizer quais são) para par-ticipar na sociedade?• assuma um compromisso social, que seja, de preferên-cia, de participação, de igualdade, de justiça, de fraterni-dade?• vivencie mais algum tipo de transcendência?• desenvolva a capacidade de estar sempre em cresci-mento?

Page 13: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 38

6. Qual a abrangência, os principais aspectos de sua disci-plina ou área de estudo?

7. Que características deve ter o trabalho nesta disciplinaou área de estudo para que seja um trabalho de qualidade?8. Como esta disciplina ou área de estudo se liga ao quadrogeral da(s) ciência(s) de que faz parte?

9. Qual o significado desta disciplina ou área de estudo nomundo de hoje?

10. Que compromissos e que opções esta disciplina ou áreade estudo vai ajudar a construir?

11. Que habilidades e linhas básicas de saber esta discipli-na ou área de estudo deve desenvolver para as diferentesidades?

12. Que princípios metodológicos são adequados para rea-lizar a proposta do ideal desta disciplina ou área de estudo?

B. Não só para disciplinas ou para áreas de estudo são ne-cessários planos e, portanto, marcos operativos. O mesmo mo-delo deve ser utilizado para outras situações, que comentamosa seguir.

• Planos para cada série ou ciclo. Quando se tratar da parteinicial do Ensino Fundamental, como o trabalho curricular nãodeve, de modo algum, ser por disciplinas ou por áreas de estu-do, é necessário fazer o plano para o ciclo ou para a série ouconjunto delas. Novamente é preciso pensar perguntas próprias.Se, na escola, há um marco referencial, sugerimos as perguntasque passamos alistar.

1. Quais devem ser as características do trabalho nesta sé-rie ou ciclo, a fim de que ele possa contribuir para a realiza-ção dos valores constantes no marco político e no projetopedagógico da escola?

2. Que compromissos e que opções esta série (ciclo) vaiajudar a construir?

3. Que habilidades e linhas básicas de saber esta série (ci-clo) deve desenvolver?

39 •

4. Que princípios metodológicos são adequados para reali-zar a proposta do ideal desta série (ciclo)?5. Que elementos são úteis, necessários ou importan.tespara estabelecer o ideal desta série (ciclo)?6. Quais as principais operações mentais que devem serdesenvolvidas por esta séde (ciclo)?7. Que características deve ter o trabalho nesta série Cci-clo) para que seja um trabalho de qualidade?8. Com que elementos (habilidades, saberes, atitudes, econhecimentos) contribuirá esta série (ciclo) para que oaluno:

• busque sua própria identidade e ajude a construir aidentidade dos grupos a que pertence?• se aproprie de instrumentos (dizer quais são) para par-ticipar na sociedade?• assuma um compromisso social, de participação, deigualdade, de justiça, de fratemidade?• cresça na opção pela transcendência?• se compreenda corno ser em contínuo crescimento?

Observação:

Se na escola em questão não houver um marco político eum marco pedagógico, será necessário :substituir a pe:6Unta n. 1pelas seguintes:

1. Que valores queremos reforçar com esta série (ciclo)?2. Que contribuições esta série (ciclo) deve dar para dimi-nuir os grandes problemas de nossa sociedade?3. Qual a contribuição social que esta série (ciclo) vai trazer?4. Que contribuição, além do conhecimento, dará esta sé-rie (ciclo) para a educação das pessoas?

Page 14: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 40

• Planos para um conjunto de séries, para um curso ou parauma habilitação. Como plano intermediário entre o plano glo-bal da escola e o plano das disciplinas ou das áreas de estudo ou,ainda, de cada série ou ciclo, eles são muito úteis e aconselháveis- às vezes, necessários. Trata-se, por exemplo, de planos:

1. do conjunto de séries formado pelas quatro primeiras doEnsino Fundamental ou pelas quatro últimas deste mesmograu;

2. de toda a Educação Infantil ou Ensino Fundamental ouEnsino Médio;

3. de habilitações, como as de magistério ou de contabili-dade.

Exemplos

Os exemplos que damos são parágrafos de textos de mar-cos operativos que se aproximam tecnicamente do que se disseanteriormente. São passíveis de aperfeiçoamentos e, natural-mente, não são completos20•

Geografia

"Consideramos a geografia como fundamental na forma-ção de um aluno crítico, interativo em seu espaço geográfico,que busque recriar este espaço na perspectiva social, pensan-do-o como bem comum e não pertencente apenas de uma clas-se social privilegiada."

"Queremos, como proposta de linha de trabalho, que oaluno se situe em sua realidade socioeconômica e política e, apartir dela, caracterize as discrepâncias existentes, levando-o aum compromisso de transformá-Ias, não se sentindo superiorou inferior por causa da classe social que ocupa."

20. Naturalmente não é a quantidade de páginas escritas que vai dizer da qua-lidade de um marco operativo. Convém insistir, contudo, que uma boa pro-posta ideal de trabalho, alicerçada na teoria, s6 será possível com reflexão etrabalho, que se traduzirá num texto denso e, quanto possível, completo.

41 •

"Optamos por dar ênfase a uma geografia que respalde oprojeto político-social proposto em nossa escola, que é de au-tonomia, de compreensão da realidade e de busca da justiça eda participação."

"Queremos um estudo da geografia que tenha, como ma-terial básico de trabalho, não só o livro-texto, mas todos os fa~tos, situações, acontecimentos veiculados pelos meios de co-municação social Gomais, revistas, rádio e televisão)."

Observações

O 1° parágrafo explicita princípios em que o grupo crê : "ageografia ajuda na formação crítica do aluno"; "O aluno é um serque interage com seu espaço geográfico"; "O espaço geográficoé um bem comum e não privilégio de uma classe social".

O 2° parágrafo exprime a opção por uma linha de trabalhoque situa o aluno em sua realidade socioeconômica e política.Em outras palavras, diz que: quer uma geografia inserida narealidade e não alienada, desvinculada do que ocorre nos cam-pos social, econômico e político.

O 3° parágrafo assume uma linha de trabalho crítica e inse-rida na realidade social para respaldar o projeto político-peda-gógico, que é o centro de todo o trabalho que se desenvolve naescola. Essa afirmativa caracteriza o marco operativo como for-ma de realização, em sala de aula, dos valores propostos no pla-no global da escola.

O 4° parágrafo cuida da característica básica que se querpara a metodologia, buscando que ela seja coerente com o quese disse antes. Para isso, afirma que utilizará notícias de jornais,noticiário de TV, como meios de concretização de sua opção,porque o livro-texto sozinho não tem condições de situar o alu-no em uma realidade dinâmica e mutável.

A metodologia e também os valores e os princípios assumi-dos pela escola estão implícitos e, às vezes, explícitos nas op-ções feitas: .

• o aluno: sujeito de seu desenvolvimento pessoal;

Page 15: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 42

• uma prática educativa que analisa criticamente a realida-de social;• prática dialogal, dialética, pelo confronto com as discre-pâncias sociais;• defesa de princípios como o bem comum, a igualdade social;• compromisso com um projeto de transformação social;• utilização de material didático atualizado e diversificadoque proporcione uma visão global de fatos, situações e acon-tecimentos, ajudando no desenvolvimento da consciênciacrítica.

Educação Infantil

"Queremos uma educação que trabalhe com a criança apartir do seu 'eu', deixando-a desenvolver suas potencialidadese auxiliando-a nisto. Desejamos que, desde esta idade, as cri-anças desenvolvam sua consciência de que são agentes da his-tória pessoal e social e de que, por isso, são responsáveis e de-vem desenvolver um senso de disciplina, sempre para resulta-dos maiores, nunca para constrangimento e limitação. Por isso,buscaremos ajudá-Ias a reconhecer a importância de sua inteli-gência, de sua afetividade, de sua capacidade de relacionamen-to e de construção .."

"Atuaremos, junto às crianças, conforme os princípios deliberdade, justiça, amor e fraternidade, de modo que elas pos-sam compreender esses valores na prática do dia-a-dia ..Isso noslevará à valorização do grupo como espaço para a descoberta delimites e de possibilidades, sempre na busca:

• da própria identidade e a do grupo;• de instrumentos para serem úteis na sociedade;• da construção de um compromisso social transformador;• da aceitação de transcendências cada vez mais amplas;• da abertura para crescer sempre.""Desejamos, assim, contribuir para o despertar e o cresci-

mento da capacidade social, através do relacionamento diário,com solidariedade e com participação."

43 •

"Escolhemos cultivar, entre nós (crianças e professores),alguns valores que julgamos fundamentais e que estão presen-tes no marco referendal da escola:

• espírito de comunhão e de partilha;• constante busca de crescimento pessoal e grupal;• abertura para a realidade, à luz de princípios construídosparticipativamente e <juestionados sempre."

Page 16: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

vDiagnóstico J a ligação

teoria/prática

o diagnóstico compara aquilo quese pensa e se quer com aquilo quese faz na prática. O diagnóstico é,sempre, um julgamento da reali-dade e da prática, à luz de um re-ferenda!. A intermediação entre opensar e o agir é feita pelo diag-nóstico.

Caracterização

Se alguém vai construir uma ponte, tem que fazer um diag-nóstico: vai analisar as dificuldades de construção, vai verificar odinheiro e outros recursos de que dispõe. Isto quer dizer que vaiestudar as possibilidades de construção para decidir-se por umcaminho: vai fazer um julgamento à luz das leis da economia e daengenharia, leis estas que serão seus critérios de análise.

Se alguém v~icomprar um sapato, faz um diagnóstico: exa-mina e julga a realidade a partir de critérios. Ou seja, vai consi-derar as diversas propostas de venda e vai analisá-Ias segundosuas possibilidades, tendo como critérios para tomar uma deci-são aquilo que pensa sobre sapatos, aquilo de que gosta e nãogosta.

Como se vê nos dois exemplos, há três elementos presen-tes em qualquer diagnóstico:

• um referendal;

Page 17: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 46

• uma realidade (ou uma prática);• um juíz021,

o DIAGNÓSTICO É UM JUÍZO:

• SOBRE UMA REALIDADE CONCRETA (SOBRE UMA PRÁTICN; -

~~~Z DOS CRITÉRIOS APRESENTADOS PELO REFEREN-

Quando um professor vai fazer um diagno'Sti'cod I. e uma c as-s~ - Junto com seus alunos, como advogamos, ou sozinho _ re-asa levar e~ conta a existência desses três elementos: so~~ntequan~o estIverem presentes os três é que se pode diz háum diagnóstico. er que

t Esses t,rês elementos, p1;lrao plano de sala de aula apresen-am-se aSSIm: '

1. o re~erencial é o marco operativo sobre o qual falno capItulo anterior' amos,~b~l~:~dad~ estado dos alunos e do professor, suas pos-

tá . es ~ d tes,naquela sala de aula, e a prática que sees VIvenCIan o; .

k o jU(íz)oé o conjunt~ de conclusões a que chega oCa)pro-esso~ ~ - de preferência junto com os alunos - sobre suas

condiçoes, seu m?do d~ trabalhar, os resultados que estão~~nçando, ~u seja, é a Indicação da distância entre a reali-

e e.a prática, por um lado, e o ideal expresso no marcooperatlvo, por outro.

21.Apalavra "juízo"foi,'àsvezes mal- d'da "dar-lhe aqui tima conotaçãomo~' de f~ten I, . I~sl~tImosque não se deveto diz que, numa realidade ou prática aIgo, o .tgnostlco é um juí~oenq.uan-cando as causas) apartir dos critéri' o V8I m ou que algoV8Imal (mdi-C?operativo, Não se trata de achar ~~~d~~o~m ~;vef~rencia~,aqui o mar-dIZque há tal doença de uma tal forma . t ~ ICOaz um Juizoquandodo o doente de nada.' ,Com ais causas; e não está acusan-

"":.---- ..•...... -.-

47 •

Há uma grande diferença entre o exemplo do sapato, daponte e do trabalho em sala de aula; mas há, também, urnagrande semelhança. A semelhança é que estão presentes ostrês elementos; a diferença é que, no exemplo da ponte, só vãoser importantes referenciais científicos e técnicos (os referen-ciais políticos e/ou sociais presidiram a decisão sobre construirou não a ponte); no cas o do sapato, há uma mistura de conheci-mento teórico e de gosto, sobressaindo, em geral, o gosto; nocaso do professor, o referendal é um conjunto de opções em-basadas (assim deveria ser) em teoria, opções estas que deve-riam, preferencialmente, ser feitas pelo conjunto de docentesda disciplina, área, ciclo, série ...

Isso nos leva ao sentido do planejamento e à pergunta so-bre sua finalidade, isto é, à discussão sobre a serventia do pla-nejamento. Porque, de fato, haverá diferentes definições dediagnóstico porque atribuem-se diferentes finalidades para oplanejamento; para cada uma das finalidades, a concepção dediagnóstico é diferente.

Podemos identificar, na prática, pelo menos, nove22 finali-dades para o planejamento:

1. organizar a instituição para que funcione sem sobressal-tos, isto é, sem problemas: para que se mantenha em bomfuncionamento;2. escolher uma dentre várias alternativas que se apresentam;3. definir as etapas e o modo de realizar algo que se temque fazer;4, melhorar qualitativamente o que se está fazendo;5. expandir quantitativamente a produção de algum bem;

22.Estas finalidades superpõem-se, de modo que várias ou quase todas sãobuscadas simultaneamente.As únicas que se excluem mutuamente são as den. 8 e 9. De qualquermodo, inclusive porque essa é uma questão quase ausen-te na literatura do planejament:o, o que queremos é contribuir com este deba-te, profundamente útil naprática: embora essa indicação de finalidades tenhasido cuidadosamente verificacla na prática e nos textos sobre planejamento,não podemos ainda afirmar que outras finalidades não sejam importantes e,até, que algumadas que indicamos não possa ser assumida por outra.

Page 18: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 48

6. distribuir os recursos de que se dispõe;7. introduzir novas estruturas ou novas maneiras de fazer;8. contribuir para a manutenção das estruturas sociais exis-tentesJ com a introdução de mudanças técnicas e formais;9. propor uma nova realidade social e contribuir para suaconstruçãoJ através da transformação de estruturas da rea-lidade existente.Comprar um sapatoJ por exemploJ é um planejamento re-

lacionado principalmente à finalidade 2J ao passo que construira ponte vincula-se ao que indica o item 3. Já o trabalho do pro-fessor e dos alunos em sala de aula está predominantementevinculado ao item 9 (ouJ como é frequente, ao item 8)23.

É fundamental essa compreensão para que se possa enten-der o planejamento de sala de aula e todo o planejamento nocampo social. De fatoJ para resolver problemas desvinculadosda globalidadeJ pode alguém contentar-se com os tipos de pla-nejamento que realizem as finalidades dos itens 1 a 7J mas quemplaneja no campo educacional terá que agregar a seu trabalho afinalidade do item 9 (ou a do 8)J porque está tratando da globa-lidade eJ sobretudoJ está lidando com a construção das pessoas eda sociedade. Fará issoJ mesmo que não queiraJ mesmo que digaque isso não faz parte de seu horizonteJ porque não pode ha-ver neutralidade nisso. Algumas ações humanas podem conten-tar-se com a dimensão técnica, mas há outrasJ como a educaçãoJ

23. A contradição mais comum nas escolas é entender e praticar as finalida-des definidas de 1 a 7, pensando ou dizendo que se está trabalhando na pers-pectiva de transformação da realidade, como o indicado no item 9. Na verda-de, as finalidades arroladas sob os n. 1 a 7 referem-se a questões técnicas, li-mitando-se, por isso, ao planejamento operacional, conforme indicado naspáginas 35 a 38 e 55 do livro A prática do planejamento participativo, de Da-nilo Gandin. As finalidades 8 e 9 apontam para o planejamento político deque se fala nas mesmas páginas. As instituições, os grupos e os movimentosque se negam a optar entre uma das finalidades, a do item 8 ou a do item 9,estãoJ em verdade, optando pela 8: dizem que se limitam a fazer planejamen-to para as finalidades que estão sob os n. 1 a 7 e contribuem, deliberada ou in-genuamente, para a finalidade n. 8. Pensamos que fica claro que todos es-tamos em processos de planejamento com as finalidades de I a 7J mas que,queiramos ou não, realizamos tambémJ sempre, a de n. 8 ou a de n. 9.

49 •

que têm incluída necessariamente a dimensão políticaJ social eideológica.

A partir dessas finalidades, segundo aquela ou aquelas queé ou são objeto de nosso interesse, vamos ter clareza sobre qualdiagnóstico nos interessa.

Se o professor entende o planejamento a partir da intençãçde definir o como vai "transmitir" o conteúdo "obrigatório" (fi-nalidade 3)J terá uma concepção de planejamento - e de diag-nóstico. Esta concepção será bem diferente daquela que teráoutro professor que partisse de uma pergunta assim: "qual é oprojeto político-social que constitui meu horizonte e qual é oprocesso para contribuir em sua construção?" (item 8 ou 9).

O primeiro terá uma visão de diagnóstico respon~en_do aquestões como: quais são os interesses dos alunos~ quaIs sa? osproblemas que apresentam na aprendizagem? qu.aIs os motIv~sde distração de meus alunos? como são as famílIas em relaçaoao interesse pela escola?

O segundo perguntar-se-áJ ao trabalhar no diagnóstico: atéque ponto estamos contribuindoJ eu e meus alunosJ para a cons-trução da sociedade proposta em noSSOprojeto político-pedagó-gico? que fatos e situações de nossa prática mostram qu~ esta-mos bem e quais mostram que estamos malJ perante o hOrIzontede nossa disciplinaJ área de estudoJ ciclo ou série? quais são asdificuldades e quais são os pontos de apoio para que a nossa prá-tica contribua melhor para esta construção? quais são as causasdo que não vai bem?

Se alguém julgar o que propomos neste livro muito inovador,deve dar-se conta que o novo não éJ primeiramenteJ uma meto-dologia ou um modelo: de fatoJ estes só são diferentes porquepropomos uma educação que se relacione com um projeto so-cial

Jo que

Jem geralJ não é a prática das escolas hoje nem o ~s-

forço da maioria de nossas mais gradas autoridades educaCIO-nais. Pensamos a escola como uma instituição que se envolve ex-plícita e fortemente com a fmalidade de planejamento n. 9 ~di-cada acima e não como um lugar onde se passa um conteudopré-estabelecido

Jsem dar-se conta dos terríveis resultados so-

ciais e das consequências pessoais dessa prática.

Page 19: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 5°51 •

Queremos contribuir para dar significado sodal ao traba-lho escolar e isso só pode ser feito pela intermediação de umdiagnóstico que seja a avaliação da prática e dos resultados quese alcançam, à luz de um referendal de pessoa, de sociedade ede educação.

Como elaborar

Para elaborar um diagnóstico de uma sala de aula, o profes-sor deve coordenar o trabalho. Precisa, além disso, dar-se con-ta de que o diagnóstico é uma avaliação continuada, no míni-mo, como a de um médico que, de tempos em tempos, analisaa situação do doente à luz da teoria da saúde. Sob a coordena-ção do professor, ele e seus alunos devem organizar-se para res-ponder, de maneira continuada, à seguinte pergunta: até queponto estamos vivenciando aquilo que está proposto em nos-so marco operativo?

Na prática, isso significa realizar uma série concatenada deações que terão como resultado um diagnóstico inicial e, depois,pela continuidade do trabalho investigador, um diagnóstico sem-pre atualizado.

Partindo do marco operativo da disciplina, área de estudos,ciclo ou série, o professor24 deverá:

• listar os temas (áreas temáticas) que estão no marco ope-rativo, porque estes serão os temas da investigação que sevai processar e do diagnóstico que disso resultará;

• propor perguntas (uma ou duas para cada tema) a fim desaber com clareza o que é preciso investigarj

24. Seria bom que essa tarefa de preparação do diagnóstico fosse preocupa-ção dos coordenadores pedagógicos, para que eles auxiliassem os professoresa realizá-Ia com eficiência. Pensamos que essa é uma das funções do coorde-nador pedagógico, do profissional que normalmente se chama de supervisor.Pelas condições de tempo e de preparação que têm, esses profissionais pode-rão trazer ajuda muito importante ao professor.Também é verdade que essa preparação (estabelecimento dos temas e dosindicadores) pode ser realizada em conjunto pelos professores da mesma dis-ciplina, área de estudo, ciclo ou série - depois, cada um deles terá que coor-denar a elaboração do diagnóstico na(s) sua(s) turma(s).

• estabelecer, para cada um dos temas, conforme a(s) per-gunta(s), os indicadores, cuja presença e intensidade se bus-carão na prática, a fim de responder circunstanciadamentea(s) pergunta(s) e, assim, saber até que ponto o ideal pro-posto em cada tema se realiza na prática.

Podemos ver, em um exemplo, como isso se realiza.

Tema: situar-se na realidade socioeconômica e política2s•

Pergunta: Até que ponto esta turma de alunos compreen-de política e socialmente a realidade na qual está inserida e écapaz de agir dentro dela?

Indicadores26:

• conhecimento da diversidade de condição social das pes-soas;

25. O tema foi retirado de um marco operativo de geografia, num parágrafoque dizia assim: "Queremos, como proposta de trab~ho, que o alun.o se sit~eem sua realidade socioeconômica e política e, a partir dela, caracterIZe as dis-crepâncias existentes, levando-o a um compromisso de transformá-Ias, nãose sentindo superior ou inferior por causa da classe social que ocup~" ..Vale a pena insistir que aqui estamos naquilo que é, em verdade, o diagnósti-co: trata-se de verificar até que ponto a realidade e a prática estão de acordoou não com aquilo que é o referendal para aquela realidade (no caso: até queponto os alunos desta turma situam-se na realidade sociopolítica, no sentidoexpresso no marco operativo). Isso é que tem de ser verificado para poder,depois, propor uma programação para mudar a realidade, a fim de aproxi-má-Ia do referencial para ela estabelecido. E para isso necessitamos Iistar m-gicadores, sem os quais não teremos segurança em nosso trabalho posterior.E isso que é absolutamente novo em relação ao atual modo de agIr das esco-las: buscar deterrninadamente resultados pensados em conjunto (no marcooperativo) para transformar uma realidade que se estuda no diagnóstico.26. Indicadores são sinais verificáveis da existência de algo não verificável dire-tamente; os indicadores também mostram a amplitude e o grau dessa existên-cia. Se alguém vai a uma praia deserta e deseja saber se aí estiveram pessoas re:centemente terá que utilizar-se de indicadores. A passagem das pessoas por lUnão é verificável diretamente, mas pode-se saber se por aí passaram através dautilização de indicadores. Assim, a pessoa vai verificar: a existência de pegadashumanas; a existência de restos de fogueira; a existência de lixo. Se encontraresses indicadores, saberá que pessoas aí estiveram, mesmo que não tenha vistoessas pessoas. Se melhorar seus indicadores, vai poder determinar se aí estive-ram há muito ou há pouco tempo, quantas pessoas eram aproximadamente e,até se eram ou não bem-educadas. Ver GANDIN, D.lndícadores, sinais fÚA

redzídade no processo de planejamento. São Paulo, Loyola,2oo3.

Page 20: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 52

• identificação das causas geopolíticas da desigualdade eescalonamento por sua importância relativa;

• emissão de juízos de valor sobre realidades sociaisdiversas;

• compreensão da influência das condições geográficas navida das pessoas;

• identificação das regiões (do mundo ou da América Lati-na ou do Brasil), segundo suas condições de facilitar a vidahumana.

É claro que muitos outros indicadores podem ser acrescenta-dos. A regra de ouro é, aliás, a de que quanto maior for o númerode indicadores, melhor será o diagnóstico. De resto, quanto maisclaro e profundo for o conhecimento teórico, mais fácil será es-tabelecer os indicadores e, consequentemente, o diagnóstico.

Os exemplos de indicadores apresentados acima referem-se a um tema que diz respeito apenas aos alunos. Vale a pena,pensamos, apresentar outro exemplo que envolva um esforçomais amplo na sala de aula. Se um marco operativo diz, porexemplo, que o trabalho em sala de aula deve ser participativo,é preciso incluir esta área temática nas investigações para sechegar ao diagnóstico. Para saber até que ponto o trabalho desala de aula é participativo dever-se-á, ao realizar o diagnóstico,verificar a existência, a frequência e a profundidade de indica-dores assim:

• utilização de trabalhos de grupo;

• definição da programação de sala de aula em trabalhoconjunto de professor e alunos;

• fixação de normas de convivência pelos alunos;

• determinação, em conjunto, dos processos de avaliação;

• possibilidade de tempo para estudos dos alunos, além doque o professor apresentar.

53 •

FEITA ESSA PREPARAÇÃO, QUE ENVOLVE UM CONJUNTODE INDICADORES PARA CADA ÁREA TEMÃTICA DO MARCOOPERATIVO, TEREMOS UM INSTRUMENTO DE AVALIAÇÃO. ÉPRECISO, ENTÃO, APLICÁ-LO, ISTO É, VERIFICAR ATÉ QUE PON-TO ESTES INDICADORES ESTÃO PRESENTES NA VI~NCIA DOSALUNOS E NA PRÁTICA DE SALADE AUlA, AÍ INCLUÍDOS ALU-NO E PROFESSOR.

A. Antes mesmo de começarem as aulas, o professor poderascunhar um conjunto de hipóteses sobre como estarão seusalunos.

A partir dos indicadores, ele escreve o que pensa que vai en-contrar na realidade de seus alunos. Poderá utilizar, para isso, osapontamentos existentes sobre a turma. Contará, também, comelementos oriundos de sua experiência com alunos da mesmaidade, da mesma série e das mesmas condições. Recorrerá, ain-da, ao que consta no diagnóstico do plano global da escola.

Fica claro, de qualquer maneira, que isso tudo são hipótesesque vão ser de muita importância para escrever o diagnóstico 2

mas que não podem, nesse momento, ser consideradas comodefinitivas.

B. Após receber seus alunos27, o professor vai coordenar aelaboração do diagnóstico inicial, nos primeiros dias de aula, edo diagnóstico continuado, no decorrer do ano ou semestre le-tivo. Para isso:

1. apresenta-lhes o marco operativo e abre uma análise, dei-xando claro que serão aquelas ideias as que dirigirão os tra-balhos de sala de aula; nesse momento, pelo menos para osalunos mais crescidos, seria importante debater o marco ope-

27.& partes do plano que o professor tem até este momento são:• marco operativo, elaborado, sempre que possível, em conjunto com seuscolegas da mesma disciplina, área de estudo, ciclo ou série, com a contribui-ção de supervisor ou coordenador pedagógico;• rascunho de alguns elementos de diagnóstico, onde sobressaem as princi-pais hipóteses;• roteiro e instrumentos para chegar ao diagnóstico inicial.

Page 21: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

• 54

rativo e, até, modificar algum de seus pontos, se isso parecerpensamento grupal importante28;

2. deve trabalhar com eles para elaborar o diagnóstico; estetrabalho consistirá em pedir aos alunos que se pronunciem- por escrito sempre que puderem fazê-Io, ou oralmente,nos outros casos - sobre sua situação perante o conjuntodos indicadores, sempre respondendo as perguntas; é im-portante que isso seja feito individualmente, depois empequenos grupos (com estes grupos elaborando um texto apartir das respostas individuais) e em plenária, na qual ostextos serão apresentados; serão, depois, reencaminhadosaos pequenos grupos, para sua análise, com as conclusõesapresentadas outra vez em plenária; é evidente que, alémdisso, o professor poderá utilizar testes, observações, pro-vas; com todo esse material, o professor elabora o diagnós-tic029, que é reapresentado - ou não - aos alunos;3. deve rever periodicamente o diagnóstico, a partir de no-vos instrumentos de avaliação, de novas análises que faz

28. É claro que, para o marco operativo, a parte mais importante deve ser atri-buída aos professores, não aos alunos, mas é evidente que, naquilo que o marcooperativo tem de político-social, os alunos podem trazer contribuições interes-santes.Por outro lado, convém insistir que todos nós necessitamos aprimorar a capa-cidade de conviver com aquilo que não está pronto e definitivo, ou seja, abrirnossas possibilidades de participarmos na construção do horizonte e da reali-dade e não apenas de reproduzirmos o já feito, o já aceito hegemonicamente.29. Ressalte-se que o diagnóstico é uma avaliação e que o professor pode de-sincumbir-se sozinho dessa tarefa ou realizá-Ia com a participação de seusalunos. De qualquer modo, deve seguir os indicadores listados e acrescentaros que lhe parecerem úteis. Fazer diagnóstico nos moldes que estamos indi-cando é também maneira de dar dignidade à avaliação escolar. O que impor-ta, realmente, não é a avaliação individual, mas a avaliação da turma, a fim deque se chegue a definir quais são as necessidades (em função do marco ope-rativo) daquela turma. De fato, é desejável que os alunos, individualmente,atinjam diferentes níveis porque são pessoas diferentes, mas é desejável,também que, como turma, haja uma aproximação aos ideais estabelecidos nomarco operativo. Esta aproximação aos ideais do marco operativo não querdizer memorizar, em quantidades cada vez maiores, informações de dúbiasignificação; será caracterizada por um contínuo "educar-se", que incluirá,certamente, conhecimentos que sejam instrumentos para as pessoas partici-parem na sociedade.

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com seus alunos, de avaliações nas reuniões do conselho declasse e de observações que realiza; com isso cornplemen-ta por escrito o diagnóstico inicial elaborado no começo

" ') ddas aulas; o diagnóstico inicial falará só (ou quase so. osalunos mas as atualizações do diagnóstico inicial inclulrão,també~, um juízo sobre Sl.la(do professor) prática.

Observações quanto à elaboração do diagnóstico

A elaboração do diagnóstico talvez seja a maior difi.culdadeque os professores vão encontrar em termos de planejamentode sala de aula.

Estamos todos acostumados apenas a apontar problemas enão temos cultura de reflexão mais profunda e de discussão dasrelações de causalidade para chegar a descobrir as necessidades.Pior que isso: como o fazer escolar confunde-se, em nosso sensocomum pedagógico, com o "passar" conteúdos pré-estabele-cidos, a questão do diagnóstico como uma busca incessante dedescobrir necessidades fica algo muito distante.

Isto nos deve alertar a que façamos todo o esforço para queos textos de diagnóstico não sejam, apenas, enunciados de difi-culdades que os professores enfrentam. com poucas indicaçõ~sde causas (ou, pelo menos hipóteses) que pu~essem enCam1-nhar a descoberta das necessidades naquela realidade c()ncreta.

Por isso tudo, na redação do diagnóstico, é pre~iso muitaatenção para:

1.partir das áreas temáticas do marco operativ?: tu?o.e so-mente o que elas contêm deve ser assunto do dlagn<lstlCo;2. insistir na distância que há entre a prática e os ideais pro-postos no marco operativo, utilizando, par~ isso, pergun~sassim30:Até que ponto no dia-a-dia da realldade e da pratl-

30. Estamos supondo possíveis áreas temáticas de possíveis marcos operati-vos. Na prática concreta, é preciso muito rigor para elabora: perguatas a par-tir do marco operativo determinado que se tem entre as m~C)s (é melhor quesejam assim abrangentes para permitir a participação e já onentarem para umjulgamento da prática).

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ca de nossa turma estamos desenvolvendo o espírito críti-co? Até que ponto os alunos e o professor entendem a lin-guagem como uma expressão da cultura? Até que pontoconhecemos e utilizamos o método científico? Até que pon-to respeitamos as outras pessoas?3. avaliar com rigor os processos, as atitudes, as práticas, osconteú?os, os modos de conviver, as metodologias, as re-gras eXistentes, os resultados que se vai conseguindo, en-fun,-cada detalhe da nossa prática do dia-a-dia, de profes-sor e.de alunos, incluindo tudo o que se faz e o que se vi-venCia, na escola como um todo, naquilo que isso influi na-quela turma;

4. não pensar em culpa ou em culpados; é importante quese ~escubra quão distantes estamos daquilo que é nossohonzonte, a fim de poder caminhar mais e melhor não quenos sintamos culpados ou que culpemos a outros;S. encaminhar tudo, sempre, para a descoberta das neces-si~a~es, isto é} daquilo que é exigido, pela realidade e pelapratica, daquele professor e daquela turma, para se aproxi-marem do que ficou estabelecido no marco operativo.

Exemplos

Apresentamos dois exemplos de parágrafos de diagnósti-co, com o sentido de apontar para possibilidades em sua lin-guagem, não para indicá-Ias como perfeitos e, muito menos,como completos.

Geografia

"Mesmo que os alunos possuam um bom conhecimento degeografia física em termos de Rio Grande do Sul, tendo traba-lhado num contexto de tempo e de espaço que serão básicospara a sequência da aprendizagem, desconhecem as diferençasde desenvolvimento socioeconômico das regiões brasileiras."

"Isto ocorre porque os alunos vêm de uma série anteriorem que foram desenvolvidos apenas conhecimentos dos aspec~tos regionais."

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"Outro fator importante para o desconhecimento dessarealidade é o pouco contato com jornais, revistas e telejornais,onde aparecem informações diárias que, sendo analisadas, po-dem levar ao conhecimento dos problemas que acontecem noBrasil, em termos de disparidades econômicas."

Observação

Necessidades que emergem dessa análise diagnóstica:• conhecimento, por parte dos alunos, das diferenças 50-

cioeconômicas das regiões brasileiras;• análise e compreensão crítica das disparidades socioeco-nômicas das várias regiões do Brasil;• aproveitamento de notícias de jornais, revistas e telejornais.

Matemática

"A aprendizagem em matemática tem sido, nos últimostempos, uma farsa. O que tem acontecido, de fato, é que os alu-nos, com raras exceções, tornaram-se meros repetidores e/ouexecutores de mecanismos e truques na resolução de exercíciosmatemáticos, mas sem a mínima consciência do conhecimentomatemático envolvido nessa atividade. Tudo isso acontece porterem muitos deles esquecido a matéria, por serem imaturos enão terem sido ajudados a trabalhar no sentido de desenvolve-rem o pensamento lógico; isso ocorre, sobretudo, por falta deuma sequência lógiCa,por falta de uso de material concreto, porfalta de exemplos mais ligados ao cotidiano dos alunos."

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VI

Necessidades, conceito-chave

Quem compreender o conceito denec::essidade e puder trabalhar efi-cientemente com ele descobriu aessência do planejamento.

Planejar é descobrir as necessidades de uma realidade e sa-tisfazê-Ias3!.

Tudo converge para isso: ao dizer o que se quer alcançar e,em seguida, verificar a que distância se está deste ideal, desco-brem-se as necessidades, traduziclas como situações concretasexigidas pelo marco operativo (que indica o NECEsSÁRIO TEÓ·RICO) e não presentes na realidade. O que se propõe para aprática (fazer e ser) serve para satisfazer essas necessidades, ouseja, para mudar as situações concretas que marcam essa dis-tância entre a prática e o ideal.

A NECESSIDADE É ALGO REQUERIDO POR UMA REALI-DADE (PRÁTICA), NUM MOMENTO DETERMINADO, EM FUN-çÃO DE UM DEVER-SER EXPLICITAMENTE DEFINIDO NUMREFERENCIALOU ACEITO POR ALGUM MOTIVO.

Se há uma pessoa num clima muito frio e ela está fora decasa, com pouco agasalho, uma necessidade surge: manuten-ção do calor produzido pelo organismo. É importante obser-

31.Convém ressaltar que a parte mais difícil do planejamento não é propor oque fazer ou propor modos de ser, porque isso é decorrência; mais difícil échegar a definir com precisão as necessidades através do confronto entre oreferendal e a prática ou realidade.

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var, desde logo, que a necessidade, no exemplo, não é "vestiruma roupa", "comprar uma roupa", "chegar perto do fogo" ou"entrar para um lugar abrigado";' estas são possíveis satisfaçõespara a ~ecessi?ade enunciada; quem está preso a soluções prees-tabelecIdas so pensará nessas formas de satisfação, sem dar-se~onta da verda~eira necessidade; isso limita e, de certa forma,Impede o planejamento, cuja função é, também, criar soluçõesnovas.

. A necessidade é apenas a expressão daquilo que a realidadeeXI?e; como vamos satisfazê-Ia, depende de uma reflexão pos-tenor: a programação.

.. Daí já se observa um dos piores erros no tipo de planeja-mento que hoje se realiza e que tem merecido críticas muitof~rt~s_dos que escrevem a respeito do assunto: as pessoas, as ins-tItUlçoes, o governo examinam a realidade sem um referencialteóri~o~social e parte~ para ações já preestabelecidas, negando,na pratIca, todo planejamento político-social; prendem-se às fi-nalIdades enunciadas no capítulo anterior sob os n. I a 7 e nemsequer se dão conta de definir-se com respeito às finalidades 8 e9. O governo, por exemplo, faz estatísticas educacionais _ cha-ma isso de diagnóstico - e começa a distribuir televisores, a im-plantar calendários rotativos, a construir Cieps, Ciecs, Caics eoutra~ coisas, a determinar conteúdos mínimos para cada série,a avalIar as escolas por aquilo que os alunos memorizaram ...

Com esse ~odo de agir, põem o enfoque na solução deproblemas - deIXam o que é central no planejamento, o concei-to d~ necessidade. Como um médico que, diante de uma dor,receI~asse analgésicos e nada mais fizesse; estaria trabalhandoem ~Ima de um problema, a dor, mas não descobriria a(s) ne-cessIdade(s) ~, consequentemente, não ajudaria a pessoa a sa-rar. No planeJ~ento, essas pessoas e instituições fazem piord.oque esse médICO:agem como outro que, ao contatar um pa-cIente com dor na mão direita, "solucionou o problema", cor-tando-lhe a mão.

~om isso, as necessidades não são satisfeitas porque, ver-dadeIramente, nem são detectadas. E encontramos livros "en-sinando" planejamento no campo social como um processo desolucionar problemas!

···· .•,·'"'··-··~;;;:.. llOi"=i'lIlllliiilllllllilll _

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Fica claro no exemplo da pessoa sem agasalho suficiente: ,anecessidade nasce da dialética entre o dever-ser (corpo aquecI-do) e a realidade concreta (o frio daquele momento), ou sej a, anecessidade nasce do confronto entre o que se estabelece comodesejável, como necessário teórico e aquilo que r.ealmente exis-te ou se pratica. Dito de outra forma: a necessIdade (algo re-querido por uma determinada realidade) está aí presente po~.que o necessário teórico não está se verificando naquela reah-dade concreta.

Outro exemplo: uma escola escreve, em seus referenc:=iais,que o desenvolvimento da consciência crítica é algo deseJ~vele que seu trabalho escolar deve c~ntribuir para isso; ~~ analIsarsua prática, descobre que não ha um processo sufIcIent~ dedesenvolvimento da consciência crítica, que isso se mamfes-ta, entre outras coisas, pelo fato de que muitos professores im-pedem qualquer manifestação dos alunos em sala de aula. Anecessidade é clara: maiores possibilidades de que os alunostomem a palavra em sala de aula.

Mas, com isso, não se tem, ainda, uma proposta de prática.Será necessário, agora, definir como se vai satisfaz~r essa ne-cessidade, propondo ações, atitudes, regras ou rotmas, comoveremos no próximo capítulo.

Mais um exemplo: se, numa sala de aula, digamos de línguaportuguesa) a proposta filosófica (~hamamos es:~ propost~ .demarco operativo) incluir o conheCImento, a anahse e a CrIticados meios de comunicação social e, paralelamente, for desco-berto que os alunos não leem jornais, uma das necessidades seráo conhecimento dos jornais da cidade por parte dos alunos.

É claro que outras necessidades a acompanharão - é preci-so descobri-Ias todas e, então, propor satisfação para aquelasque podem ser satisfeitas no tempo de duração do plano -; nocaso do planejamento de sala de aula, este tempo é sempre deum ano ou um semestre letivo, embora, como veremos, a pro-posta de prática não pode ser para todo o período, ~as paratempos menores, à medida que se vai agindo e atuahzando odiagnóstico, ou seja, redennindo as necessidades.

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Dizer que o planejamento é o processo de descobrir neces-sidades concretas, através da avaliação da realidade, à luz deum necessário teórico e, depois, satisfazê-Ias através de ações,regras, atitudes e rotinas é algo profundamente simples. Maspode trazer alguns erros perniciosos, não porque isso não sejaverdadeiro e bom, mas porque há uso dessas mesmas palavrasem outros contextos e porque o processo escolar está trancadopor conceitos inveterados e práticas "obrigatórias".

Vamos pensar numa turma de alunos. O professor fará pla-nos com eles, a fIm de descobrir necessidades e satisfazê-Ias. Ogrande problema é que, na perspectiva do senso comum quetem orientado as escolas, o necessário teórico básico é memo-rizar um conteúdo pré-estabelecido; por isso o professor tentadescobrir o que os alunos têm que fazer concretamente paradecorar os tais conteúdos; e diz - isso também já está pré-esta-belecido - que as necessidades são: que o aluno fique quieto,que ouça com atenção o que o professor diz, que faça o deverde casa, que os pais o controlem etc. E a desgraça está feita,porque o aluno, muito mais que aprender o tal conteúdo, apren-de a fingir, a "comportar-se" enquanto alguém está controlando,a não pensar, a julgar enfadonho o ato de aprender ... E asverda-deiras necessidades nem são tocadas; pior: o planejamento nemé convidado.

Aí aparecem algtinsautores que falam em necessidades doaluno, em ser ele o centro do processo, e em outras coisas pare-cidas. Mas isso tudo, com o tal do conteúdo pré-estabeleci-do. E o professor se desespera diante dessa contradição, perdetoda sua consistência pessoal e começa a pensar que não há sal-vação, no que está certo, pelo menos enquanto não se livrarde tais conteúdos, para estudar as verdadeiras necessidades deseus alunos e da sociedade.

Quando falamos em necessidades neste livro e colocamossua descoberta e sua satisfação como o resumo do planejamen-to, pensamos em necessidades descobertas por um processocientífico de abordar a prática e a realidade e não em necessida·des pré-estabelecidas que são confundidas com os problemas. Épreciso distinguir problemas (situações que causam mal-estar,como uma febre) e necessidades (situações exigidas pela reali-

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dade à luz de uma teoria em confronto com a realidade, comoa diminuição de tantos graus na temperatura do organismo).

Como se observa e como já foi dito antes, o anúncio da ne-cessidade não traz consigo sua satisfação. Não es1:amos, de fato,falando em necessidades que, de antemão, "sabemos" quais sãoe que satisfação devemos dar-lhes; ~stam?s ~ropondo um pr<:.cesso de planejamento para descobnr qUalSsao elas numa reali-dade determinada e para buscar a melhor satisfação para cadauma, dentro do que é possível realizar naquele momento, comaquela consciência, com aqueles recursos.

Necessidades aparentes são as que aparecem logo, a partirde uma análise rápida, sem um referendal teórico ligado à~fi-nalidades 8 ou 9, conforme explicitação do capítulo antenor;são, por isso mesmo, necessidades que respondem a ~m~ con-cepção e"stática da realidade, meramente no campo tecmco ~uformal, e não a uma perspectiva de mudança para a construçaode uma nova realidade.

Nesse sentido, detectar necessidades aparentes tem umcaráter conservador, porque elas se limitam a r~cuperar u~aforma que se pensa necessária para aquela reab~a~e. AsSlID,numa escola se se reunirem os professores para mdlcar as ne-cessidades, ~les apontarão imediatamente coisas como: melho-res salários, número menor de alunos em sala de aula, acompa-nhamento dos pais no que se refere aos deveres dos alunos,maior presença dos pais na escola, mais estudo dos alun~s ~emcasa, mais (ou menos) reuniões, mais equipamen-:.o, teleVlsao .evídeo para cada sala, não-existência de aulas aos sabado~ ... TaiSnecessidades são, em geral, materiais ou} pelo meno,:', hg~das acoisas por fazer, mais próximas dos problemas, e nao onenta-das por uma hierarquia de valores fundamentados nu~ refe-rendal teórico-doutrinário. Em geral, satisfazer neceSSIdadesdesse tipo resulta em gastos - de tempo, de trabal~o e de re-cursos -, sem que isso signifique mudança ?a reahdade. Talmudança exige satisfação de necessidades mal~ profundas, quedizem respeito aoS fms e não somente aos meIOS.

Deter-se nos aspectos fOf!llais equivaleria a~ proce.dim~n-to de um médico que tratasse da febre com mUlta eficlêncla -

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o que é bom e não mau -, mas não aprofundasse a descobertadas causas desta febre, para, verdadeiramente, tratar a doença.Equivaleria a acentuar a eficiência, sem chegar à eficácia.

Para descobrir as necessidades, não pode o médico base-ar-se no senso comum, no que todos dizem: terá que conhecero mais claro possível, o necessário teórico que representa o idealde saúde de uma pessoa naquela idade, e examinar o pacientepara ver quais são as diferenças entre a realidade atual de seu or-ganismo e aquele necessário teórico.

Quando se pensa isso para a sala de aula, o que se toma im-portante é descobrir necessidades que, em seu conjunto, cubramtoda a globalidade do fazer escolar, enquanto parte do processoeducacional das pessoas e de construção de uma realidade social.

Obviamente isso vai depender do referencial com que setrabalha.

Mas, de qualquer modo, é preciso que haja clareza sobre ofato de que necessidades não surgem apenas do que diz respeitoao ser pessoal- individual - de quem está diretamente vincula-do à escola, mas refere-se, também, ao que é social, isto é, aoque se refere ao global da sociedade que a escola, como institui-ção social, também ajuda a construir. Então, quando cada áreade estudo, disciplina etc. propõe seu necessário teórico (marcooperativo), deverá levar em conta todo o crescimento de cada~a das pessoas que diretamente participam da escola, espe-CIalmente de seus alunos, mas necessitará, também, pensar suapresença social com a influência que vai representar na constru-ção dessa mesma sociedade. Por isso é que o marco operativo dadisciplina, área de estudo etc. vai levar em conta o referencialteórico da escola que se propõe, como horizonte, um projetopolítico-social; vai, além disso, preocupar-se com o significadosocial da disciplina, área de estudo etc.

Ê natural que, a partir daí, uma vez que o necessário teóri-co considerou esses aspectos mais abrangentes, as necessi-dades concretas, derivadas do diagnóstico, apresentem-se comum quadro mais amplo do que aquele que simplesmente consi-dera cada pessoa separadamente.

VII

A programação como consequência

o fazer as coisas e o ser de umdeterminado modo decidem tu-do. Desde que este fazer e esteser s~am resposta a necessidadesconcretas, descobertas por umaavaliação da prática à luz das exi-gências do horizonte que se esta-beleceu.

Advertência

Este é o capítulo mais difícil, tanto para escrever comopara compreender. Alguns conceitos comuns em escola serãorevistos. Mesmo alguns "estudados" em cursos de preparaçãode professores serão apresentados com denotações e conota-ções diferentes. O planejamento de sala de aula, com os qua-drinhos que tentam ajudar o professor a dizer como e com quevai "dar aulas", serão redimensionados. Embora sejaimportan-te que docentes planejem o como e o com que, o mais impor-tante - e é disso que trata este capítulo - é a decisão sobre oque e o para quê. Isto vai ser repetido à saciedade. Será neces-sário que o leitor tenha clareza do que este livrinho apresentouaté aqui e que tenha abertura para aceitar uma mudança realno fazer da escola, inclusive admitindo um novo conteúdo, no-vas metodologias, nova avaliação e nova organização geral doensino. Não que isso possa ser feito imediatamente, de modototal, através do esforço de professores isolados, de grupos deprofessores ou, até, de escolas. Pode, sim, ser iniciado. E, tal-vez, essa mudança na sala de aula seja mais importante do queoutras que se têm tentado na escola como um todo, como é o

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- -""_~'P ""llIIl'~~'_"""" •••••••••• ••• _---------------------- --:

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caso do projeto político-pedagógico. De modo que, se um pro-fessor e, até, uma escola for utilizando 30% (OU qualquer outrapercentagem) de seu tempo para fazer o que diremos a seguir econtinuar utilizando o restante para continuar "transmitindo oconteúdo pré-estabelecido", preparando para esse vestibularmaluco, no qual o reitor da universidade não seria aprovado, ese der conta de que isto acontece por impossibilidade (pressãoda comunidade e dos alunos, concepções de educação, normasdas "autoridades educacionais" ...), estará fazendo sua parte narevolução da escola que não é apenas desejada, mas necessária.

Caracterização

A programação é a proposta32 concreta para fazer aconte-cer, gradativamente, os valores, os princípios, as prioridades, asopções ideais estabelecidos no marco operativo; não de formadireta, isto é, definindo o ideal no marco operativo e,logo, umaprática, mas através da proposta de satisfação das necessidadesconcretas daquela sala de aula determinada, necessidades estasdetectadas pelo diagnóstico.

32. Há, claramente, neste modelo de plano dois tipos de proposta:1. um z:noz:nen!oe um es~aço para o tipo de opções e de teorização envolvi-das na mdicaçao das finahdades mais gerais (o marco referencial)'2. um momento de explicitar concretamente o que fazer e o modd de ser decomportar-se (a programação). 'Est~ .duas propostas são interligadas pelo diagnóstico. A programação fazmais: Junta o novo momento, o da prática, com o estabelecido fUosoficamen-te no referendal teórico; .é disso que vem a força deste modelo de planeja-mento e desta metodologta: estabelecer a coerência do que se pensa e se dizcom aquilo que se faz e se vive.Muitas vezes, na linguagem ligada à escola, as finalidades mais gerais as doitez:n ~ acima, são chamadas objetivos gerais; denominamos isto de ~arco.Inslstlm~s que, embora a linguagem comum e, até, alguns modelos no campod~ I;'laneJamento ~ceitem o_nome de "objetivos" para isso, nós não podemosuti1Jzar a expressao, para nao cair em confusões. Ressaltamos: sempre que,neste texto, se encontrar a palavra "objetivo", ela estará designando uma ca-tegoria da programação, isto é, uma proposta de fazer concreto com a indi-cação do resultad? para o qual esse fazer é indicado. Junto com ~ estratégias,as no~as e as atlVIdad~s permanentes, esta categoria integra as quatro quecompoem a programaçao.

A elaboração do diagnóstico (confrontando a realidade e aprática existentes com o ideal traçado no marco operativo) seI-ve para se chegar às necessidades concretas daquela turma elealunos; serve, também, para descobrir as possibilidades e os I i-mites da prática. A partir disso abre-se a possibilidade de inter-venção para transformá-Ia. A proposta desta intervenção é afunção da programação.

A intervenção na realidade pode ser feita de quatro forma.sdistintas:

• ações;• atitudes;• regras;• rotinas.Essas quatro categorias são as de que se dispõe para satisfa-

zer aquelas necessidades que é possível satisfazer no tempo deduração do plano (no caso, um semestre ou um ano letivo) enaquelas condições em que se trabalha.

É importante observar que essas quatro categorias são deduas naturezas diferentes: duas delas (as ações e as rotinas) es-tão no campo do fazer e as outras duas (as atitudes e as regras)no campo do ser. É uma grande contribuição do planejamentoparticipativo às teorizações que buscam diminuir a distância.entre o que se diz e o que se faz. Verdadeiramente, para trans-formar a realidade, ou seja, para construir novas realidades a.partir da existente, é necessário fazer, sobretudo para mudarestruturas, e é preciso ser, para mudar as mentes e os corações.Concretamente, com essas quatro categorias de programar aprática se estará dando oportunidade às duas dimensões neces-sárias à intervenção lúcida.

É fundamental, para elaborar um bom plano, distinguir comprecisão essas quatro categorias de propostas de intervenção narealidade. Para aumentar o esclarecimento a respeito, alertamosque estamos usando, aqui e agora, não no restante do livro, aspalavras em seu significado comum de dicionário, e propomosum exercício.

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Constam abaixo 16 possíveis propostas de prática, sendoquatro de cada uma das seguintes categorias: ações, atitudes,regras e rotinas. Em todas, falta o resultado que se pretendealcançar: o intuito aqui é, apenas, o de exercitar a diferença en-tre cada uma delas. Tente indicar as quatro de cada uma dascategorias. Leve em conta que as rotinas também são ações,mas a proposta é repeti-Ias, com periodicidade estabelecida;que as regras são fechadas e, por isso, podem ter sua vivênciaou execução controladas; que as rotinas podem parecer com asregras, mas aquelas têm periodicidade e estas são para quandofor o caso; que as propostas de atitude são orientações, conse-lhos e que as regras são propostas para não permitir exceções.

I. Pintar a sala 204.2. Fazer mais exercícios físicos.3. Respeitar os mais velhos.4. Jogar uma partida de vÔleiàs quintas, à noite, e aos sába-dos, à tarde.5. Só atravessar a rua na faixa de pedestres.6. Reunir todos os alunos no pátio, às segundas, às 8 horas,para a leitura de um texto de reflexão.7. Comparar o editorial do CP com o editorial da ZH dodia 5 de setembro sobre a Independência do Brasil.8. Todos os professores devem apresentar plano de seu tra-balho dentro do modelo oficial escolhido.9. Visitar o Centro de Tradições Gaúchas "XYZ".10. Prestar atenção às diferenças entre as pessoas.11. Analisar, na I a hora das aulas de quinta-feira, as man-chetes do jornal "X".

12. Nunca realizar trabalho de grupo sem antecedê-Io porum trabalho individual.13. É proibido fumar nesta sala.14. Ler mais.

15. Comprar vinte cadeiras para o auditório.

69 •

16. Realizar, na direção, uma avaliação global da prática es-colar no último dia útil de cada bimestre.

Formas de apresentação

Na organização de planos, as diversas correntes de planeja-mento foram utilizando conceitos muito parecidos. Isso se fazpara imprimir clareza na prática.

Para o planejamento participativo, essa divisão para a pro-posta de prática é fundamental. E como sempre dissemos nodecorrer deste livro, o bom resultado vem de uma convicta li-gação entre o ideal e a proposta prática. Para que isso aconteça,utiliza as quatro categorias apresentadas anteriormente, acres-centando a cada proposta que assim surgir o resultado que seespera de sua vivência, seguimento ou execução. Assim, quan-do se acrescenta a essas quatro categorias uma finalidade reti-rada do marco operativo, isto é, um dos resultados indicadosem nosso horizonte ideal, elas se constituem Üá estamos usan-do os termos em seu sentido técnico, não mais como estão nodicionário) como:

• OBJETNOS;

• ESTRATÉGIAS;

• NORMAS;

• ATIVIDADES PERMANENTES.

Isto quer dizer que, quando o professor, sozinho ou, prefe-rencialmente, com seus alunos, for estabelecer concretamentea prática do trabalho, não vai pensar em conteúdos pré-estabe-lecidos, mas vai pensar nessas quatro categorias de propostas,sempre tendo em mente satisfazer as necessidades que o diag-nóstico inicial mostrou e que o diagnóstico continuado for des-cobrindo.

A programação constará, então, de quatro listas, cada qualcom uma das categorias de programação indicadas acima, istoé, uma lista de objetivos, outra de estratégia,s, a terceira de nor-mas e a última de atividades permanentes. E claro que a ordemaqui não importa. É claro, também, que pode haver programa-

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ções em que não constem as quatro categorias. E sobretudoque uma lista não estará relacionada a outra: cada 'proposta d~qualq~er uma das categorias serve para satisfazer uma ou maisneceSSIdades detectadas no diagnóstico.

.Ao ~e elaborar uma programação, as questões básicas sãomUlto sImples:

Que necessidades aparecem no diagnóstico?Queobjetivos,estratégias,normas,

atividades permanentes

são aptas e possíveis para superá-Ias, em parte ou total-mente?

Para a compreensão completa dessas categorias, caracteri-zaremos. c~d~ uma delas e apresentaremos alguns exemplos,sempre mSIstmdo, sobre estes últimos, que foram retirados dealguma realidade escolar e que, portanto, não podem ser trans-l~d~dos ~ara outra escola. Em cada realidade concreta é neces-sano re~hzar tod~ o ~rocesso para se poder saber qual é a pro-gramaçao que vaI satIsfazer aquelas necessidades concretas da-quela realidade. Outra advertência, que aliás já foi feita é deque a programação não pode ser feita para todo o períod~ leti-vo, mas para um tempo (de que trataremos depois), e aumen-tada para novos tempos, à medida que o definido anteriormen-te for sendo realizado ou suficientemente vivenciado ou final-mente, considerado inexequível pelo diagnóstico contin~ado.

l. Objetivos

Objetivo é a expressão

• de uma ação concreta,

11 •

• a ser realizada pelo professor, pelos alunos ou, concomi-tantemente, pelo professor e pelos alunos,• para sanar determinada(s) necessidade(s),• e, assim, transformar a realidade,• para aproximá-Ia do que ficou estabelecido no marcooperativo.Por isso, em seu modo de apresentação, o objetivo tem

duas partes: ao enunciar um objetivo, deve-se dizer o que sevai fazer e para que se vai fazê-Io. Não bas'ta, portanto, definiro que se vai fazer; é fundamental que se saiba para que se pro-põe a ação. É também fundamental que este "para que" daação concreta seja retirado do marco operativ033• Também nãobasta dizer a finalidade, isto é, o "para que'· se vai fazer algumacoisaj isto seria não saber o que fazer.

Como elaborar objetivos

Grande atenção deve ser posta ao elaborar objetivos paraque eles tenham as duas partes de que são constituídos:

1. O que se vai fazer é a indicação da ação que será realizada.2. Para que fazê-Ia é a indicação do resultado que se pre-tende alcançar, em nosso caso sempre uma finalidade reti-rada do marco operativo da disciplina, área de estudos, ci-clo, série ...A primeira parte do objetivo será sempre propo~ta no infi-

nitivo porque indica uma ação. Deve ser uma ação limitada,muito precisamente expressa e perfeitamen.te exequível para otempo previsto.

33. Fique claro que esta forma de estabelecer objetiv<>s não é uma invençãoou uma descoberta peregrina; ela é comum na prática diária. O governo deum estado tinha uma verba e perguntaram ao secretário qual era o objetivode seu uso. Ele respondeu: "Comprar vinte viaturas para a polícia, a fim deaumentar a segurança do bairro X". Como se vê, foi apresentado um "o quefazer" e um "para que fazê-Io" .

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Exempl034: Comparar textos do realismo literário brasilei-ro com textos de autores atuais.

Pode-se, também, indicar uma série de ações concretas se-quenciais (para, depois, incluir um resultado para todas elas).Por exemplo:

• elaborar um código de ética da televisãoj• assistir a alguns capítulos de uma novela de televisãoj• destacar pontos da novela que condizem e pontos quecontrariam o código de éticaj

• enviar uma carta, com as conclusões, à rede de televisãoresponsável pela novela.

Exemplos em Ci~ncias

• comparar os vegetais com os animaisj• debater a origem dos seres vivos.

Como se vê, são ações que professor e alunos podem de-senvolver num tempo pré-estabelecido a fim de satisfazer ne-cessidade(s) bem determinada(s), para aquela turma de alu-nos, no espírito daquele marco operativo.

A indicação da ação concreta ainda não constitui o objeti-vo. Ele só se completa com a indicação do resultado pretendi-do, isto é, a fmalidade35, retirada do marco operativo.

Aqui aparece a grande força do planejamento como o esta-mos propondo. A razão, o sentido, a fmalidade daquilo que se

34. Atenção: nestes exemplos iniciais, porque queremos acentuar o modo deredigi-Ios, s6 estamos apresentando as ações, ou seja, a primeira parte dos ob-jetivos e não os objetivos completos. Mais adiante eles serão completados.Na prática da sala de aula concreta, é imprescindível que eles sejam apresen-tados com as duas partes.

35. Note-se que esta é uma grande deficiência na escola: não se tem em men-te com clareza o resultado pretendido. Com isso, muitas ações são realizadasmuito mais por costume do que por compreensão da relação entre um traba-lho e um f11ll buscado explicitamente.

13 •

faz já estão contidos no marco operativo. Por isto dele se extraio para que da ação (das ações) indicada(s) e se fecha o círculo:aquilo que eram ideias no marco operativo transforma-se, ago-ra, em prática.

Somente chamaremos de objetivo ao conjunto ação-finali-dade. A ação isolada carece de sentido e leva a desastres, corno.decorar nomes de rios, regras de gramática ou fórmulas de ma-temática e de física. A finalidade indicada sozinha, embora possaser impulsionadora de bons sentimentos, não gera, diretamente,práticas coerentes e transformadoras.

A finalidade (o "para que") condiciona a ação, ou seja, aação será realizada com o espírito que o resultado pretendidoindicaj assim, o conjunto das ações, ao ser realizado, juntamen-te com o restante da programação, vai construindo a realidadeanunciada no marco operativo.

Por isso completamos os exemplos iniciados acima. O deciências poderá ser enunciado assim:

Comparar os vegetais com os animais e debater a origemdos seres vivos para compreender como se relacionam e inte-ragem os elementos da natureza.

As ações foram propostas porque aquele grupo de alunosdemonstrou ter necessidade do resultado imediato que elastrarão e a finalidade mais remota foi retirada do marco operati-vo da disciplina de ciências.

Da mesma forma se apresentam os exemplos de línguaportuguesa acima iniciados:

Comparar textos do realismo literário brasileiro com tex-tos atuais para compreender a literatura como expressão deuma cultura:

• elaborar um código de ética para a televisãoj• assistir a capítulos de novela de televisãoj• destacar pontos da novela que condizem com o código deética elaborado e pontos que o contrariamj

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• enviar uma cartaJ com as conclusõesJ à rede de televisãopara aumentar a compreensão sobre os meios de comuni-cação social e a capacidade de avaliá-los e para crescer noposicionamento ético da expressão humana.

A reunião de várias ações sob um único para que exige queeste seja o sentido do conjunto das ações propostas.

Outros exemplos

Para a disciplina fundamentos psicológicosJ

na habilitaçãomagistério:

• observarJ identificar e registrar por escrito as caracterís-ticas mais comuns nas atividades das crianças e correlacio-nar as observações feitas com a idade delas para conhecer ecompreender o desenvolvimento do ser humano.Para a terceira série do Ensino Fundamental:• resolver e elaborar histórias matemáticas que envolvamexpressões numéricas para desenvolvimento do raciocíniológico e criação de alternativas que ajudem a resolver situa-ções do dia-a-dia.

Objetivos e conteúdos

QUANDO SE ASSUME O PLANEJAMENTO PARTICIPATI-V036 EM SALA DE AULA, TRABALHA-SE COM OBJETIVOS ENÃO COM CONTEÚDOS.

Esta afirmativa é tão simples quanto complexa. Pois aí estáo que tem caracterizado a escola hoje em dia: ela foi reduzida à

36. Planeja~ento participa~ivo. é aqui entendido como uma tendência glo-bal do planejamento neste InícIO de século, desenvolvido no final do séculopassa~o, conforme, a.náli~e feita no segundo capítulo do livro A prática dop~nela"!ento partzczpattvo, de Danilo Gandin, Editora Vozes. Ver, tam-bem, artigo do mesmo autor no n. I da revista virtual veiculada no endereçowww.curricuIosemfronteiras.org

7S •

função de transmissora de informações desarticuladas e desli-gadas da cultura e da realidade; piorJ à função de transmissorade informações sem sentidoJ porque sem ligação com a vida ecom a prática. As disciplinas (as matérias) deram à escola umjeito de quem está especializando; ora, como especializar cri-anças e adolescentes não tem sentidoJ ela ficou com uma "ciên-cia" esclerosada e formalizada. Ainda mais: ficou com alguns"conteúdos" J desprezando outros tão ou mais importantes;quem ousariaJ por exemploJ se pensasse deixar de lado paratoda a população (não-especializados e técnicos, enquanto dis-ciplinas mais gerais para a vidaJ incorporadas ao estudo de te-mas da natureza e da sociedade)J conhecimentos de direitoJ

economiaJ política, saúdeJ educaçãoJ sociologiaJ religião ...?Queremos uma sala de aula que trabalhe temasJ sem se im-

portar com disciplinas. Que trabalhe seriamenteJ com apro-fundamento em conhecimentosJ habilidades e valores J mas quepriorize o estudo de temas da naturezaJ da organização da socie-dade em que se vive e da cultura da humanidadeJ cultura estaentendida em sua dimensão mais abrangente. Não é possíveltrabalhar agora, na totalidade do tempoJ com uma proposta as-sim. É preciso fazer concessões· e trabalhar parte do tempo (quetal 70% para começar?) com o conteúdo pré-estabelecido e uti-lizar o restante para ir modificando o sentido da escolaJ com oestudo de temas transdisciplinaresJ sem preocupação com asdisciplinas e com cuidado no modo de aprender, na autonomiaJno crescimento da consciência ...

A programação no plano de sala de aula vai produzir proces-sos que se integrem no esforço mais amplo da escolaJ o de seruma instituição com presença político-social na construção deum mundo desejávelJ na escolha das pessoas que dela participam.

E estamosJ de novoJ na afirmativa inicialJ de que é precisopensar em objetivos e não em conteúdos; os conteúdos estarãointegrados em cada objetivo ou dele serão derivados. S6 se acei-tarmos issoJ poderemos sair da mesmice; só assim poderemosrealizar alguma mudança importante no fazer pedagógico e es-capar da terrível situação de querermos mudar o mundo semmudar uma vírgula naquilo que estamos fazendo.

Page 32: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

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Certamente estamos ainda muito longe de alcançarmos issose considerarmos a prática vigente, em que o professor simples~mente segue o livro didático. A educação escolar é "conteudis-ta", isto é, prende-se a um mundo onde o importante era passara!gumas informações úteis37 para as pessoas e que elas não pode-nam alcançar sozinhas ou em suas famílias. Não entendeu a es-cola que isso já não é assim e continuou fazendo a mesma coisa, ,so que, agora, cpm menos convicção porque se deu conta, emparte, do descalabro que isso representa.

As escolas são tidas como "fortes e boas" se "dão" muitoconte~do aos a~uno~.Es~aafirmativa, além da carga ideológicaespeclfi7a, tem unp~caçoes financeiras significativas: os pais pa-gam ~als para matricular os filhos nessas escolas. Esse apelo fi-nanceIrO é extremamente forte hoje em dia para as escolas. Porisso, é difícil às instituições e aos professores acreditarem que sedeve trabalhar com objetivos e não com conteúdos. Fica maisfácil fazer um discurso transformador e deixar-se condicionarpelo senso comum.

Por outro lado, é verdade também que muitos professoresq~erem fazer. a mudança e não encontram instrumentos apro-pnad?s para ISSO.Seremos repetitivos, mas vale a pena: comeste lIvro, queremos oferecer instrumentos e, sobretudo abriruma nova discussão a respeito de conteúdos e do fazer ~a salade aula. E pensamos exatamente no imenso número de profes-sores e demais profISsionais da educação e, até, em governan-tes e conselhos de educação que não estão satisfeitos com oque se faz na escola ..

A diferença fundamental entre uma proposta conteudistae a busc~ de realizar um trabalho significativo para cada pessoaem partIcular e, sobretudo, para a sociedade como um todo ,

~l.~ote-se que, ~uando falamos em utilidade, não queremos dar-lhe o signi-ca o de aproveItamento econômico ou financeiro imediato. Não estamos

de modo algum, advogando que a escola seja apenas ou sobretudo para que a~pessoa,s ~e prc:parem como mão-de-obra ou para que possam ganhar dinhei-ro. O util aqw é tudo o que é necessário ao ser humano, como, por exemplo,a filbosofia, a fé,. a esperança, a poesia, o amor, a política, a celebração ... e,tam ém, a cOtnlda, a casa, o vestuário, o bem-estar ...

'l'l.

está no ponto de partida. No planejamento participativo apli-cado à sala de aula, a referência que define o processo é o pro-jeto político-social e pedagógico expresso no marco operativoda disciplina, área de estudo, ciclo ou série (naturalmente coma inspiração que lhe vem do projeto político-pedagógico da es-cola). A partir desse marco, a realidade e a prática são avaliadase as necessidades que surgem são a fonte da programação. Aproposta ideal, contida no marco e expressa como opção, comoconvicção pessoal do professor e do grupo, é o critério que dásignificação e estrutura ao trabalho pedagógico.

Ora, se afirmamos que o marco operativo deve estruturaro processo, estamos dizendo, ao mesmo tempo, que não é oconteúdo pré-estabelecido, aquele do livro didático, que o faz.

O conteúdo adquire nova perspectiva, aliás já teorizadapor muitos estudiosos da educação escolar ao longo da históriae até repetida por professores e outros profissionais da escolaque, contudo, fazem outra coisa.

TUDO O QUE SE VIVE NO ESPAÇO ESCOLAR E ATÉ FORADELEPOR INFLUÊNCIA DIRETA DA ESCOLA É O CONTEÚDO.

Por isso, será difícil acentuar suficientemente a ideia deque as estratégias, as normas e as atividades permanentes sãotão importantes como os objetivos, no esforço de satisfazer asnecessidades e, com isso, aproximar a realidade existente darealidade desejada. Em verdade, o conteúdo é o conjunto depropostas nessas quatro categorias.

A estruturação conteudista não questiona se determinadoconteúdo é necessário ou não, se ajuda ou não no crescimentodo aluno e na construção da sociedade. Não examina, por exem-plo, se o aluno cresce na definição e busca de sua identidade,se adquire instrumentos aptos para participação na socie-dade, se assume um compromisso social e se vivencia algumtipo de transcendência. Isto não faz parte dos conteúdos pré-estabelecidos e, assim, não aparece.

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A realidade social em suas várias dimensões foi fragmenta-da, n.ae~cola, em conteúdos. Esses conteúdos, concebidos comome~çao de compr~ensão. da realidade, assumiram vida própriae.autono~a e, com ISSO,alIenaram-se da realidade de que deve-nam ser dunensões e não partes estanques.

A natureza da ação corresponde à natureza dacompreensão. Se a compreensão é crítica, ou pre-ponderantemente crítica, a ação também o será.Se é mágica a compreensão, mágica também seráa ação38.

Mas, na escola, pensa-se que, "passando" os conteúdos osal~~os aprenderão, magicamente, a pensar, a refletir, a juÍgarcntIcamente e a se comprometerem socialmente. Todos sa-bem que isso não é verdade, mas continuam agindo como sefosse ...

_ Essa pe~spectiva revela o grau de consciência que se tem daa~ao educat~va. Repensada, a educação deve ter em si a dimen-sao de finalIdade, de significância, do "para que" se faz aquiloq~e est~ se~do proposto. Essa dimensão que dá sentido e criti-cIdade a açao é retirada do marco operativo da disciplina áreade estudo, ciclo ou série. '

. . A esse conj.unto ação concreta/finalidade chama-se de ob-JetIvo no planejamento participativo.

O conteúdo .que n~o resi~tir a esta fórmula não terá digni-dade para ser umversahzado, Isto é, não merecerá que se percacom ele o tempo de todas as crianças e de todos os professores.

Se algum professor tiver que trabalhar com seus alunos al-gum desses" conteúdos", terá que fazê-Io como uma concessãoe, para escarmento coletivo, deveria escrever em seu plano:

• memorizar as capitais dos países da Europa para conten-tar nossos pais;

38. FREIRE, Paulo. Educação comoprática da liberdade. São Paulo' Paze Terra ..

19 •

• distinguir o seno do co-seno para compreender que avida é dura e que não se deve reclamar de nada;• decorar o nome dos donatários para que cresça a capacida-de de obediência, mesmo quando não se entenda o porquê;• estudar os principais casos de supletivismo (professor,isto é de língua portuguesa) para diminuir a capacidade cri-oadora e para embotar o espírito crítico;• estudar os fenômenos da ressonância magnética para com-preender que somos ignorantes e que temos pouca possibi-lidade de construir nossa vida sem sermos guiados39•

2. Estratégias

Há necessidades que não podem ser satisfeitas por ações(objetivos). Por isso a programação, também na sala de aulal

necessita ser completada com as outras três categorias indica-das para intervir na realidade e na prática, a fim de dar satisfa-ção às necessidades surgidas no diagnóstico, a partir do neces-sário teórico estabelecido no marco operativo.

Uma dessas categorias é a das estratégias .Em geral, professores e outros profissionais da escola têm

dúvidas quanto à própria conceituação de estratégia. E os auto-res de livros para escolas não têm ajudado em nada.

Partiram todos de uma razoável definição que afirmava,aproximadamentel o seguinte: estratégia é o modo de realizarações e de alcançar resultados.

Depois, a partir desta palavra "modo", passaram a enten-der estratégia como ação menorl detalhadal pensada para al-

39. É provável que não se encontre um professor que concorde em escrevertais finalidades nas ações que propõe e realiza com seus alunos. Infelizmente,porém, na prática cotidiana das escolas atuais, isso é exato e verdadeiro, mes-mo que possa servir para uma risada. Essas finalidades são aspectos concre-tos, visíveis, daquilo que os autores ch.Jmam de "currículo oculto": a escola eos professores propalam objetivos explicitamente e realizam outros que nãoquerem apresentar ou que nem sabem que estão alcançando.

Page 34: Apostila de Didática - Planejamento na sala de aula

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cançar algo maior. Assim, naquele horrível modelo de planeja-mento que professores - e escolas de professores - ainda usamhoje, começaram a aparecer coisas assim, na coluna reservadapara as estratégias: identificar as mudanças ocorridas na IdadeMédia a partir do século XlIIi situar a Europa no processo decomercialização ...

Essas propostas nada têm a ver com estratégiasi são pro-postas de ações. Pior: encontram-se autores de livros sobre pla-nejamento de sala de aula abrindo capítulo intitulado "Meto-dologia ou estratégia", tratando disso como se as duas coisasfossem a mesma. E aí, muitíssimas vezes, estratégia se confun-de com técnica. As pessoas enunciam uma técnica que vão uti-lizar e chamam a isso de estratégia. E dizem solenemente: es-crever uma redação é uma estratégia.

Ora, nada disso é sustentável.Estratégia é, em verdade, a expressão• de uma atitude,• a ser vivenciada pelo professor, pelos alunos ou por pro-fessor e alunos,

• para sanar determinada(s) necessidade(s),• e, assim, transformar a realidade,• para aproximá-Ia do que está definido no marco operativo.Estratégia é maneira· de vivenciar um valor, modo prático

de se comprometer com um princípio, orientação para realizara prática para que ela tenha determinada direção. O conjuntode estratégias Gunto com as normas, como veremos) é aqueleespírito que serve de guia a tudo o que faremos.

Nesse sentido, uma estratégia é um modo de viver. Alguémpode dizer que propõe uma estratégia para sua vida quando de-cide que vai fazer exercícios físicosi estabelecer isso não é defi-nir uma ação concreta fechada (como se faz no objetivo), mas étomar uma atitude que vai ter consequências muito importan-tes, inclusive a de gerar ações concretas.

No campo social, como numa escola, é um exemplo assu-mir a participação. A participação não é algo que se faz e se es-

81 •

gota, como, por exemplo, reformular o regimento da escola.Propor participação como estratégia é comprometer-se comum valor, é definir que tudo o que se realizar, na duração doplano, será feito com participação. É a proposta de uma atitu-de que vai "temperar" tudo o que se realizar, principalmenteo que está previsto na programação do plano, mas, também,algo que for realizado sem nela constar.

Por esses exemplos, já se vê a importância das estratégiasnum plano. Elas geram um modo de viver e um modo de agirque vai interferir poderosamente na transformação da realida-de, para aproximá-Ia, sempre mais, à realidade desejada, pro-posta no marco operativo.

No caso da sala de aula, as atitudes propostas são de menorabrangência do que, por exemplo, as que são incluídas no planoglobal da escola. É que em: planos mais amplos, até porque du-ram mais, trabalha-se com princípios gerais que são as políti-cas, ao passo que nos planos menos abrangentes, como o desala de aula, pode-se trabalhar só com estratégias.

De fato, políticas e estratégias são da mesma natureza, masde abrangência diferente4o• Ambas estão na categoria de "tem-pero" da prática de uma instituição ou de um grupo.

Num plano de uma instituição, será necessário que cons-tem políticas e estratégias - estas são, nesse caso, maneiras prá-ticas de vivenciar aquelas. Mas num plano setorial, como o desala de aula, pela sua pouca abrangência, é melhor que constemsó estratégias, retiradas das que constaram no plano da escola(ou do curso ou habilitação) ou que foram estabelecidas espe-cialmente para aquela realidade pequena.

O que é preciso reafirmar: objetivos e estratégias (comonormas e atividades permanentes) devem responder a necessi-dadesi formarão, no plano, duas listas distintas, separadas,que não terão correspondência direta, isto é, que serão inde-

40. Há boas indicações sobre o tema no livro A prática do panejamento parti-cipativo, de Danilo Gandin, Editora Vozes, principalmente no capítulo inti-tulado "A programação· .

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pendentes, já que respondem a necessidades diferentes. Porexemplo: se o marco operativo de uma disciplina falar em soli-dariedade e o diagnóstico demonstrar que os alunos entre sinão se ajudam, pode-se propor uma atitude para o professor:estimular os alunos a se ajudarem nas dificuldades surgidas porocasião das provas. Não é necessário, nesse caso, estabeleceruma açãoi só a atitude. É claro que esta atitude deve ser cobra-da através da avaliação continuadai é claro também que ela po-derá gerar muitas ações.

Recordando e insistindo: a primeira parte de um objetivo éuma ação concreta e a primeira parte de uma estratégia é umadisposição, uma postura, uma atitude. Uma ação é uma pro-posta de algo que se faz e, uma vez realizada, esgota-se até co-mo proposta (identificar as características das aves em contra-posição às características dos mamíferos), ao passo que a atitu-de é uma proposta que perdura, com a qual não se sabe exata-mente que ações se irão desencadear (conferindo no dicionárioo significado de toda palavra nova que aparecer).

A escolha de uma atitude (na estratégia) ou de uma ação(no objetivo) - isso vai valer também para as rotinas e para asregras - dependerá da própria natureza da necessidade. Defato, há necessidades que requerem uma dessas categorias desatisfação e necessidades que requerem outra.

Como elaborar estratégias

Da mesma forma que os objetivos, as estratégias respon-dem a uma ou mais necessidades. Ainda da mesma forma, têmduas partes: uma primeira, em que se propõe a atitude e umasegunda, em que se identifica o resultado que se pretende, estesempre retirado do marco operativo. De novo / podem ser lista-das duas ou mais atitudes e uma só finalidade para elas. Dife-rentemente dos objetivos, nos quais a primeira parte é umaação determinada que se esgota, nas estratégias a primeira par-te é a proposta de uma atitude.

Duas observações importantes:

83 •

A primeira é a de que, num plano global de uma institui-ção, por exemplo de uma escola, não é necessário indicar a fi-nalidade nas estratégias porque elas estão ligadas à respectivapolítica que lhes dá tal finalidade.

A segunda é a de que podem ser retiradas, para a sala deaula, estratégias de planos mais abrangentes, como o da escola,do curso, da habilitação, da série, do ciclo, do conjunto de séries/oalém daquelas que, especificamente, são construídas para a prá-tica concreta daquela sala de aula. Isso, contudo, deve sempreser feito à luz do diagnóstico, ou seja, para satisfazer necessida-de(s) surgida(s) para aquela turma de alunos.

No que diz respeito à forma verbal, aconselhamos o uso doverbo no gerúndio. Se isso trouxer problemas, use-se o verbono infinitiv041•

Sugerimos o verbo no gerúndio por três motivos principais.Em primeiro lugar, porque assim são redigidas no Plano Globalda Escola, vinculadas a uma política da qual são forma de vi-vência. Em segundo lugar porque/ usando o verbo no gerúndiopara indicar a atitude e retirando o "para que" do marco opera-tivo, caracteriza-se, com mais força, a estratégia como formade realização de um princípio ou valor nele expresso. Final-mente porque assim distinguem-se melhor as estratégias dosobjetivos, estes sempre expressos com verbos no infinitivo.

Insistimos que, no plano, estratégias e objetivos devem serapresentados em duas listas independentes. O que queremosdizer é que não é através de estratégias que se alcançam obje-

41. Há um outro modo, também muito eficiente, de apresentar as estratégias.É a repetição das áreas temáticas do marco operativo, indicando, para cadauma delas, as atitudes que o diagnóstico mostrou necessárias: nesse caso, ca-beria melhor o gerúndio - é por isso que se pensa nele: uma forma de vivenci-ar um princípio. Esta forma, contudo, traz duas dificuldades - se puderemser superadas, os resultados serão excelentes: poderia levar a deixar de ladoestratégias importantes por não se descobrir em qual dos temas elas cabem epoderia levar a fazer uma lista de estratégias para servir sempre, independen-te do diagnóstico.

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tivos42• E mais: são categorias diferentes de programação, di-ferença essa que vem do fato de que cada uma delas é aptapara satisfazer necessidades de natureza distinta.

Alguns exemplos talvez sejam úteis para ajudar os professo-res a distinguirem claramente os objetivos das estratégias. Ao veros exemplos, é preciso ter clareza sobre o fato de que há estratégi:;lSque podem servir a mais do que a uma disciplina ou área de estudoe que há outras que são especificas para uma disciplina determina-da ou para uma área de estudo. O importante é que elas sejam pro-postas a partir do marco operativo daquela disciplina ou área de es-tudo e daquele diagnóstico que dele foi consequência. Os exem-plos não podem ser transpostos imediatamente para outra prática:eles são postos aqui apenas para exemplificar como é o modo deapresentar as estratégias, que tipo de conteúdo elas veiculam; emcada caso elas devem ser pensadas com cuidado para responderàquelas necessidades lá presentes.

Exemplos gerais

• Examinar atentamente, com rigor e precisão, as questõesantes de respondê-Ias para capacitar-se mais no domínio deuma comunicação eficaz.

• Desmascarar os conflitos sufocados e ouvir com atençãoos colegas para ajudar na formação de uma pessoa crítica e deum ambiente fraterno e solidário.

Exemplos específicos

Exemplo em língua portuguesa• Propiciar contato com livros, revistas e jornais na sala deaula, utilizar-se de textos de revistas e jornais como mate-

42. Se a palavra objetivo for usada num sentido genérico, como na vida diária,até teria sentido dizer que estratégias ajudam a alcançar objetivos. Nós,contudo, estamos utilizando a palavra objetivo num sentido bem específico(ação mais resultado esperado), conceituação essa tecnicamente necessáriapara que se possa tll'dr todo o proveito do planejamento e, sobretudo, da pro-gramação.

85 •

rial de trabalho didático e analisar em sala de aula o noticiá-rio de TV e notícias de jornais e revistas, para que o domí-nio da linguagem seja, cada vez mais, instrumento de leitu-ra crítica dos meios de comunicação social.

Exemplo em ciências• Propor novos questionamentos sobre fatos ou fenôme-nos naturais, buscando as teorias sobre as questões propos-tas, elaborando hipóteses de explicação dos fatos ou fenô-menos, observando se as hipóteses se verificam na prátic2 eelaborando conclusões por escrito para desenvolver o espí-rito científico.

Exemplo em matemática• Identificar as dimensões matemáticas presentes na reali-dade, interpretar e colocar em linguagem matemática fa-tos, notícias e informações veiculados nos meios de comu-nicação social para que se perceba o quanto ela está inseri-da no contexto histórico-social onde é produzida e que elaajuda a produzir.

3. Normas

As normas, como as demais categorias de uma programa-ção, saem das necessidades levantadas no diagnóstico. Como jáfoi salientado, as necessidades são satisfeitas de quatro formasdiversas e uma delas é o estabelecimento de normas.

Elas têm como sua primeira parte uma regra, um limite daconvivência social. Dizem respeito às condições de trabalho,tanto do professor como do aluno. Aplicam-se em determina-das situações concretas e devem ter sempre explícitas a finali-dade para a qual estão sendo propostas. Essa finalidade é reti-rada do marco operativo da disciplina, área de estudo, ciclo ousérie e também do marco referendal do Plano Global da Esco-la. Elas devem ser inteiramente entendidas e bem circunscri-tas. As estratégias - que têm a mesma natureza - são sugestão,

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orientação; as normas são obrigação. Pode-se dizer que se cum-pre o plano mesmo que nem sempre se vivenciem, todas e to-talmente, as estratégias; não se pode dizer que o plano se exe-cuta se alguma norma, alguma vez, foi rompida sem sanção ousem, pelo menos, advertência.

Coerentes com o planejamento participativo e com umprojeto político-pedagógico de educação que privilegia a liber-dade, devem ser redigidas43 sempre com os alunos e não paraos alunos. É necessário que os alunos percebam, com a clarezapossível, a necessidade daquela norma de convivência, paraque possam cumpri-Ia com consciência e com liberdade.

O não cumprimento das normas implica ou, pelo menos,pode implicar sanções, estas também definidas com os alunos.

Exemplos44

O professor não poderá repreender publicamente o alunoou a turma usando palavras agressivas, para que se estabeleçamrelações dialógicas e construtivas.

O aluno só poderá entrar em sala até dez minutos após oinício das aulas para ajudar na formação da consciência dos di-reitos e deveres que tem para com a turma.

É proibido o uso de palavrão em sala de aula para que hajaum clima de respeito nas relações interpessoais.

43. As estratégias e as normas, uma vez estabelecidas, permanecem as mes-mas durante o ano, se o diagnóstico continuado assim o indicar. Contudo,devem ser registradas a cada bimestre para que não se corra o risco de esque-cê-las. Caso, no conselho de classe, o diagnóstico da turma indicar a necessi-dade de novas normas ou estratégias, devem ser propostas, observando sem-pre com cuidado sua coerência com os princípios propostos no marco opera-tivo da disciplina, área de estudos, ciclo ou série ou no marco de referenciada escola, pois é deles que se tira o sentido e finalidade das normas e das es-tratégias.

44. Como sempre, nossos exemplos preocupam-se, basicamente, com a téc-nica de proposição e não podem ser entendidos como sugestão para seremaproveitados nos planos.

87 •

4. Atividades permanentes

As atividades permanentes também são construídas pararesponder a necessidades daquela turma determinada de alu-nos descobertas no diagnóstico. Em sua primeira parte, elas

, d· .expressam uma rotina, isto é, uma ação que eve repetIr-se eque já tem periodicidade determinada. São, portanto, da mes~ma natureza que os objetivos,. distinguindo-se deles (que ex-pressam uma ação a ser realizada uma única vez) porque sãoações que se repetem. Naturalmente, para elas também sedeve incluir uma segunda parte que diga o resultado que se espe-ra daquela rotina, resultado este obviamente retirado do marcooperativo.

Quase tanto como nas normas e mais do que_no~ ~bj~tivose nas estratégias, essa categoria de programaçao e mdIcadapara a satisfação de necessidades adminis~r~ti~as: C?u:stões,por exemplo, relacionadas ao uso de matenaIS, a diSCIph?a, ao"funcionamento" geral daquela sala de aula ... podem nao tersido contempladas no marco operativo, ao passo que o diagnós-tico detecta necessidades nessas áreas. O "para que" em taiscasos pode derivar-se de princípios ad~inist~ativos, com,o.obom desdobramento das atividades, a eXIstêncIa do necessanopossível para a realização de tarefas ... , e não s.e r~ferir direta-mente ao marco operativo; contudo, na maIOrIa das vezes,mesmo que de forma indireta, encontram-se no marco opera-tivo todos os "para ques" necessários.

Exemplos

No último período de aula da semana será revisto o planoda próxima semana, para que se desenvolva o compromisso e oespírito de grupo.

Ao final de cada dia de aula se fará uma oração para o de-senvolvimento da relação com o transcendente (terceira sériedo Ensino Fundamental).

O aluno-monitor de matemática estará à disposição doscolegas às quintas-feiras à tarde, no colégio, para crescimentona solidariedade.

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Todos os dias, um aluno será encarregado de trazer um jor-nal para a aula, para que o ensino se desenvolva sobre a realidadee para que cresça o sentido da ajuda mútua.

Outros exemplos de programação

Objetivos

• Visitar a fábrica "XYZ" e elaborar um relatório dessa vi-sita, a fim de se aperfeiçoar na capacidade de se expressarcom precisão nos assuntos relativos à profissão.• Estudar o relacionamento entre a raça branca e a raça ne-gra e os conflitos daí surgidos, a fim de crescer no compro-misso social de compreensão e respeito às culturas.• Realizarum estudo exploratório da realidade da vila "XYZ"Ireunindo o que mais chamar a atenção dos alunos, para au-mentar a compreensão da situação de pobreza e crescer nasolidariedade.

• Estudar a variação dos preços dos produtos não alimentí-cios nos supermercados AI B e CI para iniciar a compreen-são de como s~reaI.izao processo econômico em nosso país.• Debater a Questão da liberdade, analisando sua compre-ensão através'da história e buscando tomadas de posiçõespessoais e grupaisl a fini de firmar sua própria identidade ede viver mais claramente a cidadania.

• Interpretar a crônica "Recado ao senhor 903"1 de RubemBraga, para aumentar a compreensão de que a realidadepode ser julgada de maneiras diversas e para entender oque contribui para esta diversidade.

Estratégias

• Buscar sempre as causas dos fenômenos, para crescer emsegurança e responsabilidade.

• Ouvir com atenção os argumentos dos colegas I para me-lhorar as condições de trabalho em equipe.

89 •

• Ter a mente aberta a dúvidas I para crescer na flexibilida-de e na tolerância.• Utilizar textos de autores atuais, para compreender me-lhor a relação entre literatura e cultura.• Usar a aula expositiva apenas para encaminhar os traba-lhos, a fim de que os alunos sejam mais construtores de selJconhecimento.

Normas• Ninguém poderá deixar a aula sem pedir licença à turma,a fim de que aumente a responsabilidade.• Todos os alunos deverão apresentar a solução de um pro-blema de disciplina I em forma de texto ou de exposiçãooral, a fim de que aumente sua segurança.

Atividades permanentes• Realizar todas as sextas-feiras, ao final da tardei uma ava-liação da semanal para crescer na determinação da buscade resultados previamente definidos grupalmente.• Visitar na última quinta-feira de cada mês I um grupo ouambient~ de cultura diferente, para entender e aceitar di-ferenças culturais.

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UIII

Funcionamento na prática

É melhor nada fazer do que agirsem luz e sem resultados. Piorainda é agir para resultados quesão maus.

o planejamento apresenta-se com três faces, todas neces-sárias para sua eficácia: a elaboração, a execução e a avaliação.

Utilizamos, de propósito, a palavra faces (rostos) e não fa-ses (etapas) para significar que as três estão sempre presentesao mesmo tempo, embora uma possa prevalecer num tempo eoutra, noutro. Queremos dizer que, quando há um processo deplanejamento, o grupo estará, sempre, elaborando, executan-do e avaliando. Não há, portanto, urna etapa de planejamento eoutra de execução, e uma tercdra de avaliação. O que há sãomomentos fortes de uma ou de outra dessas faces, sobretudoda elaboração, quando da preparação de um plano para durarum tempo maior.

Para facilitar o entendimento de todo o processo que ex-plicitamos neste livro e, mais, para que se animem os educado-res a se aproximarem, na prática, do horizonte que traçamos,destacamos alguns pontos-chave dessas três faces, buscando,principalmente, ver como se encaixam as partes e quais são osprocedimentos para alcançar resultados.

A Sequência para a elaboração

Do ponto de vista do ideal do planejamento, o plano desala de aula é daqueles que se vai elaborando no decorrer de

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todo o ano ou semestre letivo. Não é possível começar o ano ouo semestre com tudo decidid045•

, D~e o professor esforçar-se para chegar o mais próximo pos-slv~l disso. Queremos dizer que nem sempre é possível realizartal Ideal, mas que é necessário aproximar-se cada vez mais dele.

1. Elaboração do marco operativo da disciplina ou área deestudo, ciclo çm série.

. .Isto é feito junto com os colegas professores da mesma dis-c~pl~naou áre.a de estudo, ciclo ou série, com o auxílio de espe-Cialistas, de hvros e de outros materiais escritos.

Normalmente, um marco operativo é escrito para um anoou pa~a um semestre, sendo, depois, revisto e, se necessário,reescnto a cada ano ou a cada semestre; a tendência é quequando ele atingir um certo grau de eficácia, introduzam-s~pou~as alterações, buscando, isso sim, torná-l o cada vez maisprecIso, fundamentado, claro, abrangente, convincente) ilumi-nador, propulsor da ação.

A ElABORAÇÃO DO MARCO OPERATIVO É FEITA ANTESDE COMEÇAREM AS AULAS. SE HOUVER NA ESCOLA OCOSTUME DE SE RECOLHEREM OS PLANOS DOS PROF~S-SORES, NESSE MOMENTO SOMENTE LHES SERÁ EXIGIDO OMARCO OPERATIVO E, TALVEZ, O ROTEIRO E OS INSTRU-MENTOS COM QUE CHEGARÃO AO DIAGNÓSTICO INICIAL.

2. Elaboração do diagnóstico~sto é feit.o junto com os alunos e, obviamente, não pode

servtr ~om~ diagnóstiCO de uma turma para outra. Deve abran-ger a sltuaçao dos alunos e a prática do professor, junto com to-

45" Não ~ flexibilidade do plano no sentido comum que se dá ao conceito~Oltaqwlo que se est~belece?, como proposta prática será mesmo realizado;p ano que se CO~r61 ~ medida que se vai executando. Isso acontece, sobre-

tudo! p~d;de tagn6~tl(:'o não pode, nesse caso, ser elaborado de uma vez. Acontin

dw e s avahaçoes é que vai deixar claras as necessidades de cada

um os momentos.

93 •

das as condições existentes, como interesses, dificuldades, pon-tos de apoio e causas das falhas.

No caso de um plano de sala de aula, como em todos osplanos de realidades bem restritas, o diagnóstico é uma das par-tes que deve ser continuamente refeita, uma vez que alunos eprofessor crescerão, isto é, mudarão, como resultado da progra-mação que se executa e porque as situações concretas são mais .mutáveis do que as realidades bem abrangentes .

Como haverá tais transformações, mudarão também as ne-cessidades, porque umas serão satisfeitas e outras surgirão.

Uma das questões difíceis na escola de hoje é definir dequanto em quanto tempo dever-se-ia consolidar, por escrito,alterações nO diagnóstico inicial.

Parece claro que todos os dias o diagnóstico vai se aprimo-rando. Mas não se pode modificá-Io por escrito todos os dias.

Por outro lado, é claro também que aquilo que não for escri-to não traz resultados. É esta, aliás, uma deficiência terrível daescola, a de não se escreverem os verdadeiros ideais, aSverdadei-ras falhas, com suas causas verdadeiras, as verdadeiras práticas.

Por tudo isso, sugerimos que cada escola estabeleça a perio-dicidade da escrita dessas modificações no diagnóstico inicial.Deve levar-se em conta, para fixar esse tempo, que são necessá-rias complementações no diagnóstico para que se possa ir pro-pondo novoS objetivos e, eventualmente, novas estratégias, nor-mas e atividades permanentes. Assim sendo, sugerimos, tam-bém, que não se ultrapasse o tempo de um bimestre para tal re-formulação do diagnóstico; sendo possível, é bom diminuir essetempo e realizar a atualização escrita do diagnóstico a cada pe-ríodo de 12 a 30 tempos de aula, conforme a disciplina ou áreade estudo tiver mais ou menos carga horária. Em se tratando deturma com professor(a) único(a), parece que o tempo poderiaser de duas em duas semanas.

É importante utilizar os conselhos de classe para esse apri-moramento do diagnóstico. Não apenas porque essa prática vaipermitir mais clareza nas necessidades, como, também, por-

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que facilitará a vida de cada professor, geralmente sobrecarre-gado de trabalho.

SE HOUVER O COSTUME DE PEDIR QUE OS PROFES-SORES ENTREGUEM CÓPIA DE SEUS PLANOS, DEVE-SE, DE-POIS DA PRIMEIRA SEMANA DE AULA OU UM POUCO MAIS,SOLICITAR QUE ENTREGUEM O DIAGNÓSTICO INICIAL COMA RELAÇÃO DAS NECESSIDADES NA TURMA. DEPOIS, SERÃOSOLICITADOS PERIODICAMENTE (TEMPO DE 12A 30 TEMPOSDEAULA OU DE UM BIMESTRE)AJUSTES DO DIAGNÓSTICO.

3. Preparação da programação

É bom que isto seja feito pelo professor com seus alunos.Logo após o diagnóstico inicial, a partir da lista de necessi-

dades, serão propostos objetivos para um período determinadode tempo (12 a 30 tempos de aula ou um bimestre) e estratégias,normas e atividades permanentes, sem especificação de tempo.

Não é possível indicar objetivos (que incluem a realizaçãode ações) para todo o semestre ou o ano letivo. É, contudo, viá-vel propor estratégias, normas e atividades permanentes semespecificar o tempo, porque estas não se esgotam e, se não ces-sarem as necessidades que as exigiram, podem ser repetidas.

Periodicamente - com a mesma periodicidade com que sécomplementa o diagnóstico - a programação é, novamente,proposta. Nessa nova proposta, os objetivos têm que ser intei-ramente outros, uma vez que os anteriormente indicados se es-gotaram, pois suas ações foram realizadas; as estratégias, asnormas e as atividades permanentes poderão seguir as mesmas- é o que mais vai acontecer - ou serão acrescidas umas e/ouretiradas outras, em virtude de as necessidades terem sido sa-tisfeitas e de outras terem aparecido com a complementaçãodo diagnóstico.

95 •

NAS ESCOlAS EM QUE SE E?G~~I~:~~~~~~~~~DO PROFESSOR,A PROGRAMAÇAO , DE NORMAS E DELISTAS (DE OBJETNOS, DE ESTrT~~GUE AO FINALATIVIDADES PERMANENTE~U~ SJ~O COM O DIAGNÓS-

~~~=S=~,~GUNDO~R1p~=Ep:J~:BELECIDA, O PROFESSOR ~RESENT ,DO, A NOVA PROGRAMAÇAO.

B. Execução do plano no dia-a-dia

d I ó depois de estarLogo nos primeiros dias s:~~ a~~::s ~ada professor terá

pelo menos uma semana com do ~adro seguinte. Esseum plano que se .apresentla na f~~r;;; co~o ficou indicado an-lano será, depOls, comp emen .p d tudo essa mesma estrutura.tes, conservan o, con ,

PlANO DA DISCIPLINA "X"(ou área de estudos ou ciclo ou série)I. MARcO OPERATIVO

11. DIAGNÓSTICO

Necessidades11I. PROGRAMAÇÃO

1. Objetivos2. Estratégias3. Normas4. Atividades permanentes

Agora, o professor depara-se com os proce~imentos con-d di dia Para J'unto com seus alunos.eretos o a-a- , b'

• realizar as ações e as rotinas, respectivamente, dos o Je-tivos e das atividades permanentes; ..

. d ão a pnrnelra parte,• vivendar as regras e as atltu es que s .t'vamente das·normas e.das estratégias.respec I ,

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• 96

Não é necessário mesmo 'um plano dizendo de~alh d porque nem e possível, escreverlizar essa r _ a amente como e com que se vai rea-l p dogramaçao. Se o professor quiser como "mandam"

a guns Coor enadores ped ó' d' .do plano de sala de ul ag glCOSe to os os lIvros que tratamtabelecendo t' . a a,.e~crever um plano para cada aula, es-tal's J:. , eCnIcas, atIVIdades, recursos e outras coisas que

, ncara com nojo do I .con'unto d' - p aneJamento e passará a escrever umdática Pass::.~tençoes ou a redProduzir partes dos livros de di-d d' a adapresentar to os os anos o mesmo plano mu-

an o apenas a ata e aos po fu . 'conteúdos formalizad~s. ucos, re gtar-se-á numa lista de

Além disso, o mais important· I bcri to, para cada aula, perder_se_,e. ao e a orar planos, por es-tância. De fato, com esse ti a no que. tem menos lmpor-pensa que está planejando ePfic~ec~roced~mento, o .~rofessortiram todas as decisões políticas d ~ a pIor parte, Ja que lhedo neste livro. o po que estamos indican-

Por isso - porque além de tud' ,cessa

d'rio.l

d·nsistir que ;s professoreso~~~~~:::~dp~c~~mVOo-'pélne-

que eCI e: ano

1. o que se vai fazer e o que se vai vivenciar'2. para que se vai fazer e vivenciar estas cOi~as.Insistir também:

1. em que, para decidir sobre o que se disse ant .é p . b enormentereClSOsa er o que se quer alcançar e a que distA . '

está disso, tudo através da elaboração de um anCla setivo e de um diagnóstico; marco opera-

~ como e com que vamos vivenciar e realizar o que pro ra-_amos, ~ue deve ser preparado (isto é plane' d) g

nao preCIsa ser escrito. 'la o , mas

- curs~Snqe~:s~~:; eenmtão,planejar, isto é, pensar o modo e os re-_ <u pregar na realização d I -

sao a primeira parte dos obJ'etivos be a~ue as aço.es quesa - , m corno e necessáno penr como vao se realizar as estraté .. -permanentes Ê·· glas, as normas e as atividadesar os process~s :~:~~~ê~\~:liza~ar, cdomseus alunos, para avali-n o.

97 •

o que deve ser sempre escrito modifica os elementos domodelo de plano antes indicado, como ficou explicitado noitem A deste capítulo. Isso é o que realmente importa decidir enão os detalhes do como agir - estes sim sempre à mercê dascircunstâncias que se apresentarem.

C. Avaliação de todo o processo

Antes de mais nada, acentuamos que vale aqui o que jáconsta no capítulo "A avaliação no planejamento", do livro Aprática do planejamento participativo, de Danilo Gandin.

No caso do planejamento de sala de aula, por causa doscostumes hoje existentes, há duas dimensões de avaliação quedevem ser consideradas:

a) a avaliação dos alunos;b) a avaliação de todo o processo.Obviamente, quando propostas de planejamento e de edu-

cação semelhantes às deste livro estiverem sendo vivenciadasna prática, só será necessário falar do segundo desses tipos deavaliação, porque ele englobará o primeiro.

Sobre a avaliação dos alunos, já estão claras algumas ideiasque precisam ser postas em prática:

• não tem sentido "dar" notas ou conceitos aos alunos indi-vidualmente, uma vez que é desejável que cada um cresçao mais possível, naqueles aspectos que, por formação ante-rior ou escolha, estiver mais apto ou interessado46j

• contudo, a avaliação do que a turma, como um todo, rea-liza e alcança, é indispensável, quando feita à luz de um re-

46. Não é possível pensar que cada um de nós tem que ser um resumo da hu-manidade, sabendo tudo sobre tudo. Qualquer sociedade necessita de pes-soas que, juntas, dominem todos os campos das ciências, da fé, da arte, da fi-losofia ... mas não é necessário que cada um de nós alcance tudo. A práticaque tem esse fundamento anula as possibilidades de as pessoas buscarematingir o melhor naquilo que é seu viver. Precisamos de esportistas, físicos,poetas, filósofos, matemáticos, ge6grafos ... mas todos não podemos ser tudo.

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Conselhos de classe, momentosde diagnóstico

Muitas vezes as reuniões não mu-dam nada porque lhes falta refe-rencial e persistência num mesmorumo.

IX

A proposta do plano de sala de aula aqui apresentada trazprofundas mudanças na prática e-ducativa da escola. Ao proporum marco operativo como referencial de trabalho, ao exigir umdiagnóstico, inicial e contínuo, de onde se extraem as necessida-des que darão origem à programação, ao não aceitar conteúdos"pré-estabelecidos", ela sinaliza uma mudança de eixo nas práti-cas da avaliação e, como consequência, nos conselho de classe.

Como pôde ser visto nos capítulos referentes ao diagnósticoe ao funcionamento na prática, o conceito de avaliação contidonesta proposta está vinculado a um processo de trabalho quevisa a ajudar o aluno a ir se construindo como pessoa humana, seinstrumentalizando para uma participação social crítica, assu-mindo um compromisso social amplo e se relacionando com atranscendência. Isso é radicalmente diferente do que avaliar odomínio de conteúdos pré-estabelecidos para passar de ano.

Não propomos que se reúnam os professores para entrega-rem as notas/conceitos dos alunos e muito menos para dize-rem: "como está, Manoel vai ter que repetir o ano" ou "Joãozi-nho é indisciplinado" ou "Maria é desatenta" ou "deve estaracontecendo alguma coisa na farrn1ia do Alfredo" .

ferencial, com critérios claros e explicitados (no caso, omarco operativo);• essa avaliação da turma precisa ser pensada como parteda avaliação global da prática, à luz do marco operativo.Mora isso, não se trata, fundamentalmente, de parar de vez

em quando para avaliar a execução do plano. Trata-se, muitomais, de estabelecer o círculo "virtuoso" de, continuamente:

• rever o "para onde se quer ir" (marco operativo);• verificar como se está indo;• propor ações, atitudes, regras e rotinas, para ir sempremais depressa e mais fortemente.É claro que paradas para acentuar a face da avaliação e,

consequentemente, a de elaboração, serão úteis e, às vezes, ne-cessárias.

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