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5/24/2018 ApostilaQuimicaQuanticaV2-slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/apostila-quimica-quantica-v2 1/91 QUÍMICA QUÂNTICA  Notas de Aula  Ademir J. Camargo UEG – UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS  AGOSTO/2008

Apostila Quimica Quantica V2

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  • QUMICA QUNTICA Notas de Aula

    Ademir J. Camargo

    UEG UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIS

    AGOSTO/2008

  • Constantes fsicas ....................................................................................................................... 4

    Captulo 1 .................................................................................................................................. 6 1.1 Introduo qumica quntica ............................................................................................ 6

    1.2 A catstrofe do ultravioleta ................................................................................................. 7

    1.3 Modelo de Rayleigh - Jeans ............................................................................................... 12

    1.4 O modelo de Max Planck ................................................................................................... 20

    1.5 Efeito fotoeltrico .............................................................................................................. 24

    1.6 Modelo atmico de Bohr .................................................................................................... 26

    1.7 A natureza ondulatria da matria ................................................................................... 31

    Captulo 2 ................................................................................................................................ 34 2.1 Movimento harmnico simples (MHS) .............................................................................. 34

    2.2 Movimento ondulatrio ..................................................................................................... 35

    2.3 Soluo de DAlembert para a equao da onda ............................................................... 39

    2.2 Srie de Fourier e integral de Fourier ............................................................................... 42

    2.3 Velocidade de um pacote de onda ...................................................................................... 45

    2.4 Argumentos para se chegar equao de Schrdinger ...................................................... 48

    2.5 A equao de onda para uma partcula livre ...................................................................... 49

    2.6 Partcula sob a ao de um potencial escalar ..................................................................... 52

    2.7 Regras para escrever a equao de Schrdinger ................................................................ 54

    2.8 A equao de Schrdinger independente do tempo ............................................................ 56

    Captulo 3 ................................................................................................................................ 62 3.1 Partcula livre ..................................................................................................................... 62

    3.2 Partcula em uma caixa unidimensional com potencial infinito ......................................... 66

    3.2 Relao entre o princpio da Incerteza e a partcula na caixa unidimensional .................. 71

    3.2 Funes ortogonais ............................................................................................................. 71

    3.3 Aplicaes da partcula na caixa unidimensional ............................................................... 72

    3.4 Partcula em uma caixa unidimensional com potencial finito ............................................ 72

    3.4 Partcula em uma caixa tridimensional .............................................................................. 74

    3.5 O oscilador harmnico ....................................................................................................... 76

    3.6 A energia do ponto zero ...................................................................................................... 81

    3.7 Momento angular ............................................................................................................... 81

    3.8 tomos hidrogenides ........................................................................................................ 89

  • 3

  • Constantes fsicas

    Constante Smb Valor (SI) Valor Gaussiano Velocidade da luz no vcuo c 82,99792458 10 m/s 102,99792458 10 cm/sCarga do prton e -191,602177 10 C 'e -104,80320710 statC Permissividade do vcuo

    0 2 2/-128,8541878 10 C Nm Constante de Planck h -346,6260810 J s -276,6260810 erg s Constante de Rydberg

    HR 171,0967710 m 151,0967710 cm Raio de Bhor

    0a 110 5,291772 10a m= 80 0,5291772 10a cm=

    Massa do eltron me 319 10939 10, kg 289 10939 10, g

    Integrais

    ( )1

    0

    1n axn

    nx e dx

    a

    + += I.1

    ( )( )

    2

    1 20

    1 2

    2m ax

    m

    nx e dx

    a

    + + = I.2

    Funo gama

    ( ) 10

    n tn t e dt

    = .1( ) ( )1n n n + = .2( )1 !n n + = .2

    12

    = .3( )1 3 2 11 1,2,3,

    2 2m

    m mm

    + = = " " .4

    IzaelHighlightTranquilo

    IzaelHighlight

  • 5

  • 6

    Captulo 1

    1.1 Introduo qumica quntica

    No final do sculo XIX muitos fsicos acreditavam que as leis fundamentais da fsica

    j estavam completamente estabelecidas. Mecnica, termodinmica, teoria cintica, ptica e

    teoria eletromagntica formavam a estrutura fundamental da imponente fsica do sculo XIX.

    Qualquer problema poderia ser resolvido desde que se escolhesse adequadamente a teoria a

    ser empregada. Talvez, no mximo, um pequeno refinamento destas leis fosse necessrio.

    A fsica clssica estava dividida fundamentalmente em duas partes: a teoria corpuscu-

    lar e a teoria ondulatria. Aceitava-se, na poca, que matria era formada por corpsculo e a

    luz tinha uma natureza ondulatria. Corpsculo e onda pareciam ser coisas distintas.

    Entretanto, o pensamento fsico sofreu uma reviravolta profunda em um perodo rela-

    tivamente curto de tempo, que se estende do final do sculo XIX ao incio do sculo XX.

    Aps esta reviravolta, os fundamentos bsicos da fsica clssica permaneceram, mas reas

    completamente novas surgiram. difcil descrever em detalhes todos os acontecimentos que

    ocorreram nesta poca. Mencionaremos apenas os principais fatos que marcaram este perodo

    histrico no desenvolvimento da fsica: descoberta do efeito fotoeltrico por Hertz em 1887,

    descoberta dos raios-X por Roentgen em 1895, descoberta da radiotividade por Becquerel em

    1896, descoberta do eltron por J. J. Thomson em 1897, hiptese quntica da radiao do cor-

    po negro por Planck em 1900, hiptese quntica do efeito fotoeltrico por Einstein em 1905,

    modelo do tomo de Thomson em 1907, experincias de espalhamento com partcula por Geiger, Marsden e Rutherford em 1909, modelo atmico de Rutherford em 1911, confirmao

    dos clculos de espalhamento de Rutherford por Geiger e Marsden em 1913, modelo atmico

    de Bhor em 1913, a hiptese de Louis de Broglie em 1924 e finalmente a equao de onda por

    Erwin Schrdinger em 1926.

    A descoberta da teoria da relatividade de Einstein, embora tenha sido um feito signifi-

    cativo para o desenvolvimento da fsica, no teve grande impacto nos fundamentos da qumi-

    ca. Entretanto, a mecnica quntica surgida a partir deste terremoto sofrida pela fsica clssica

    teve papel fundamental no desenvolvimento dos fundamentos tericos da qumica moderna.

    Quando se usa a mecnica quntica no estudo dos fenmenos da qumica costume

    cham-la de qumica quntica.

  • 7

    Entre as vrias descobertas ocorridas no final do sculo XIX, duas tiveram papel fun-

    damental na motivao inicial do desenvolvimento da mecnica quntica: a catstrofe do ul-

    travioleta e o efeito fotoeltrico. As leis da fsica clssica, quando aplicadas ao estudo destes

    dois fenmenos falharam brutalmente.

    Devido importncia histrica destes dois fenmenos naturais no nascimento da me-

    cnica quntica, analis-los-emos com um pouco mais de profundidade.

    1.2 A catstrofe do ultravioleta

    Um corpo negro um objeto terico que absorver 100% de toda radiao que nele in-

    cide. Nenhuma radiao capaz de atravessar ou ser refletida pelo corpo negro. Como h ab-

    soro total de todas as radiaes incidentes, o corpo negro, quando frio, aparece como um

    objeto perfeitamente negro. Quando aquecido, o corpo negro se comporta como uma fonte

    ideal de radiao trmica, isto , se o corpo negro a certa temperatura estiver em equilbrio

    trmico com outros objetos na mesma temperatura, na mdia, ele emitira tanta radiao quan-

    to absorver, para cada comprimento de onda. Um corpo negro a temperatura T emite exata-

    mente os mesmos comprimentos de ondas com as mesmas intensidades que emitiria um am-

    biente em equilbrio a temperatura T. Como o ambiente em equilbrio trmico apresenta um

    espectro que depende apenas da temperatura de equilbrio, ento existe uma relao direta

    entre a temperatura dos corpos e o espectro emitido. A temperatura ambiente, o corpo negro

    emite radiao na regio do infravermelho, mas medida que a temperatura vai aumentando,

    o corpo negro comea a emitir radiao com comprimento de ondas menores que passa pelo

    vermelho, laranja, amarelo, branca e azul. Se aumentar mais a temperatura o corpo negro co-

    mea a emitir na regio do ultravioleta.

    O termo corpo negro foi introduzido por Gustav Kirchhoff em 1860. At o presente

    momento, no se encontrou na natureza ou foi possvel sintetizar em laboratrio um material

    com tais propriedades. Na prtica, o material que apresenta propriedades mais prximas das

    propriedades do corpo negro o carbono. Na forma de grafite, o carbono, capaz de absorver

    e emitir em todos os comprimentos de onda, mas somente 3% da radiao incidente so ab-

    sorvidas.

    Nos experimentos laboratoriais usa-se, como boa aproximao ao corpo negro ideal,

    uma grande cavidade com um pequeno orifcio (Figura 1.1). As radiaes que incidem no

    corpo negro atravs do orifcio sofrem mltiplas reflexes em seu interior, e tem pequena

  • 8

    probabilidade de deixar a cavidade sem ser absorvida. Analogamente, o orifcio atua aproxi-

    madamente como um radiador de corpo negro ideal. Portanto, podemos dizer que existe um

    equilbrio trmico entre a radiao eletromagntica e as paredes da cavidade. importante

    relembrarmos que toda carga eltrica oscilante emite radiao eletromagntica na mesma fre-

    qncia em que a carga oscila. Analogamente, quando uma radiao eletromagntica com

    freqncia incide em uma partcula carregada, a partcula oscilar com freqncia . Como temperatura o resultado da energia cintica mdia (agitao) das partculas das paredes da

    cavidade no difcil entender a natureza do equilbrio estabelecido.

    Figura 1.1 Uma cavidade com um pequeno orifcio uma boa aproximao de

    um corpo negro ideal devido s mltiplas reflexes e absores que a radiao incidente sofre no interior da cavidade.

    A radiao emitida pelo corpo negro chamada de radiao de corpo negro ou ra-

    diao de cavidade, porque usamos uma cavidade com orifcio como aproximao do corpo

    negro ideal. Teoricamente, o comprimento de onda mximo emitido infinito. Isto significa

    que, na Figura 1.2, a curva da potncia de energia emitida por comprimento de onda nunca

    toca o eixo-x, isto , ela assinttica ao eixo. Fixada a temperatura de equilbrio, a quantidade

    de energia emitida por comprimento de onda apresenta valor definido. Esta propriedade o

    que torna possvel a construo do grfico da potncia de energia radiada versos comprimen-

    to de onda (Figura 1.2).

  • 9

    Figura 1.2 Potncia da energia radiada verso comprimento de onda.

    As estrelas so consideradas aproximaes grosseiras de corpos negros ideais, devido

    alta densidade gasosa. Para cada temperatura, a curva de densidade de energia tem seu valor

    mximo (pico) para um determinado comprimento de onda. Na Figura 1.2, todos os mximos

    encontram-se na regio do infravermelho. medida que a temperatura aumenta os mximos

    deslocam-se para a regio do ultravioleta (menor comprimento de onda). O total de energia

    emitido dado pela rea sob a curva, assim quanto maior a temperatura maior ser a rea e,

    portanto, maior a quantidade de energia emitida. Como h energia na radiao, pode-se falar

    de uma densidade de energia no interior da cavidade:

    ( ) ETV

    = , (1.1)onde representa a densidade de energia na cavidade a qual depende da temperatura de equi-lbrio da cavidade, E a energia total e V o volume da cavidade.

    As ondas eletromagnticas so portadoras de momento, produzindo uma presso tnue

    (presso de radiao) quando so refletidas ou absorvidas na superfcie interna da cavidade

    do corpo negro. A presso da radiao eletromagntica incidente em uma superfcie que a

    absorve ou a reflete foi deduzida teoricamente por James Clerk Maxwell em 1871 e Adolfo

    Bartoli em 1876. A comprovao experimental foi realizada por Lebedev em 1900 e por Er-

    nest Fox Nichols & Gordon Ferrie Hull em 1901. Para obter uma expresso matemtica da

    presso de radiao, suponha, inicialmente, que uma onda eletromagntica plana incida per-

    pendicularmente sobre uma superfcie perfeitamente absorvente. Seja Q a quantidade de mo-

    mento por unidade de volume. A quantidade de momento que chega superfcie por unidade

  • 10

    de tempo zQ c A . Aqui zc representa a velocidade da luz na direo do eixo z, perpendicu-lar superfcie e A a rea de incidncia do pacote de radiao superfcie. Se a superfcie

    for um absorvente perfeito, esta ser tambm a quantidade de momento absorvida por unidade

    de tempo. Aqui, estamos supondo que a quantidade de momento que chega superfcie apre-

    senta uma distribuio uniforme. Como a presso igual fora divida pela rea, temos que

    2 zz z

    Qc AFora variao de momentoP Qc mcrea rea A

    = = = = = . (1.2) Na expresso acima A rea de incidncia do pacote de radiao eletromagntica, m a mas-

    sa total da radiao que chegam superfcie por unidade de tempo, perpendicular superfcie.

    No existe, a priori, nenhuma razo para que a incidncia na superfcie da cavidade seja per-

    pendicular. Relembrando que 2 2 2 2x y zc c c c= + + , onde c representa a velocidade em qualquer direo, e que as velocidades nas direes x, y e z so todas igualmente provveis, temos que

    x y zc c c= = , o seja 2 2 2 213

    3z zc c c c= = (1.3)

    Substituindo a Equao (1.3) na Equao (1.2), temos

    2 21 13 3z

    P mc mc E= = = (1.4)Na Equao (1.4) usamos a relao de Einstein: 2E mc= . A densidade de energia uma pro-priedade intensiva, isto , no depende do volume da cavidade. Esta propriedade pode ser

    verificada experimentalmente. Fazendo V=1 na Equao (1.1), obtemos a equao que rela-

    ciona a presso de radiao com a densidade de energia no interior da cavidade:

    13

    P = . (1.5)No caso em que a superfcie uma refletora ideal, a variao da quantidade de mo-

    mento por unidade de volume incidente na superfcie igual a 2Q: variao de momento =

    momento final momento inicial. Neste caso, a Equao (1.5) deve ser multiplicada por dois,

    i.e., 2 3P = . Experimentalmente, verifica-se que a densidade de energia no interior da ca-vidade depende apenas da temperatura. A relao entre densidade de energia e temperatura

    pode ser obtida atravs da termodinmica. Para derivar esta relao, escreva a energia (E) em

    funo da entropia (S) e do volume (V) e em seguida calcule a derivada total da energia:

    ( )E E S ,V= V S

    E EdE dS dVS V

    = +

  • 11

    dE TdS PdV= (1.6)Na obteno da Equao (1.6) fizemos uso das relaes termodinmicas ( )VE S T = e ( )TE V P = . Dividindo (1.6) por V com T constante, obtemos:

    T T

    E ST PV V

    = . (1.7)Usando a relao termodinmica de Maxwell ( ) ( )T VS V P T = , pode se reescrever a Equa-o (1.7) como segue:

    T T

    E PT PV T

    = . (1.8)Como

    ( ) T

    E ET E VV V

    = = = . (1.9)Alm disso,

    ( )1 1 3 3V

    P dP TT dT

    = = (1.10)Usando as equaes (1.10) e (1.9) em (1.8), temos:

    ( )( )

    4

    4

    1 1 d 1 4 4 =T 3 3 dT

    4 4

    dT d dTdT T

    ln lnT k lnT ln ln T

    ln ln T

    = = = + = + ==

    4T = , (1.11)onde -15 -3 4=7,569x10 erg.cm .grau . A Equao (1.11) conhecida como lei de Stefan-Boltzmann. O nome de Boltzmann est ligado a esta lei porque ele foi capaz de deriv-la teo-

    ricamente, enquanto que Stefan a obteve experimentalmente. A emisso de energia de uma

    cavidade por unidade de rea de abertura diretamente proporcional densidade de energia,

    , no interior da cavidade. Esta emisso de energia na forma de radiao eletromagntica por unidade de rea chamada de poder emissivo total (total) e dado por 4total T = , onde

    -5 -2 -1 -45,672 10 erg.cm .s .k = ou -5 -2 -45,672 10 W.m .k = . Como a emissividade dire-tamente proporcional temperatura, podemos usar esta equao para estabelecer uma escala

    de temperaturas absolutas.

    Todas as dedues anteriores so consistentes, pois, foram baseadas nas leis da termo-

    dinmica que so confiveis. A energia no interior da cavidade o resultado da soma das e-

  • 12

    nergias de vrios comprimentos de ondas. A densidade de energia d resultante das contri-buies das radiaes com comprimentos de ondas entre e d +

    ( ),d T d = , (1.12)onde ( ),T a funo de distribuio da densidade de energia no interior da cavidade do corpo negro. Se a forma analtica da funo de distribuio ( ),T for conhecida, podere-mos calcular a densidade total de energia no interior da cavidade por quadradura da Equao

    (1.12):

    ( )0

    ,T d = . (1.13)Esta equao representa a soma das contribuies de todos os comprimentos de onda de zero

    ao infinito para a cavidade em equilbrio trmico a temperatura T. Lembre-se que a densidade

    de energia uma funo da temperatura T, isto , fixada a temperatura, a densidade tambm apresentara valor definido. Medir os comprimentos de onda das radiaes emitidas pelo corpo

    negro bastante fcil. Verifica-se, experimentalmente (Figura 1.2), que o comprimento de

    onda mximo, max , desta distribuio inversamente proporcional temperatura, i.e.,

    max 2 21 c 1,445

    T c cm k = = . (1.14)A Equao (1.14) conhecida como lei de deslocamento de Wien ( em homenagem ao

    fsico alemo Wilhelm Carl Werner Otto Fritz Franz Wien que recebeu o prmio Nobel em

    1911 pela descoberta da lei do deslocamento em 1893). A constante c2 chamada de segunda

    constante da radiao. A Figura 1.2 ilustra a lei do deslocamento de Wien. Usando esta lei

    poderemos calcular, por exemplo, que o comprimento de onda mximo de um corpo negro

    que se encontra a 1000K max=2900 nm. Outra aplicao da lei de Wien que com ela po-demos calcular a temperatura das estrelas, medindo seu comprimento de onda mximo. Um

    dos problemas da fsica do final do sculo XIX era obter uma expresso analtica para a fun-

    o de distribuio da densidade de energia ( ),T .

    1.3 Modelo de Rayleigh - Jeans

    John William Strutt, 3rd Baron Rayleigh (1842-1919), com uma contribuio menor

    de Sir James Hopwood Jeans (1877 1946), derivou uma frmula para a funo de distribui-

    o ( ),T usando conceitos consagrados da fsica clssica. Rayleigh usou o teorema da

  • 13

    eqipartio da energia. Este teorema afirma que quando a energia mdia de um sistema de-

    pender apenas do quadrado da velocidade ou do quadrado do deslocamento, cada grau de li-

    berdade do sistema contribuir com 2KT para a energia mdia total. Aqui, K representa a

    constante de Boltzmann e T a temperatura do sistema. Por exemplo: a energia cintica mdia

    de translao de um tomo 3 2KT . Pois, cada grau de liberdade (movimento na direo x,

    movimento na direo y e movimento na direo z) contribui com 2KT . No caso das oscila-

    es (como por exemplo, o oscilador harmnico unidimensional) a energia total KT, isto ,

    2KT para a energia potencial e 2KT para a energia cintica. Somando as duas contribui-

    es temos KT para a energia mdia total para o oscilador harmnico unidimensional clssi-

    co. As ondas estacionrias em equilbrio no interior da cavidade s podem ter certos compri-

    mentos de ondas ou modos vibracionais. O termo modo vibracional usado como sinnimo

    de onda estacionria porque a cada onda estacionria no interior do corpo negro est associa-

    da a um modo de vibrao das partculas nas paredes do corpo negro. Rayleigh e Jeans calcu-

    laram o nmero desses modos vibracionais ou nmero de ondas estacionarias, dN , compre-

    endidos entre e d + por unidade de volume da cavidade. O valor que eles encontram foi ( )48dN d = . Nos pargrafos seguintes, vamos derivar esta expresso em detalhes.

    Para simplificar o problema, consideraremos uma cavidade metlica cbica com ares-

    tas L. No h perca de generalidade na argumentao devido ao fato de estarmos usando um

    tipo particular de cavidade, pois, como veremos adiante, o nmero de ondas estacionrias no

    depende do tipo de material empregado ou da forma geomtrica da cavidade. As paredes so

    aquecidas uniformemente at certa temperatura T. As paredes emitem radiaes. Isto ocorre

    por causa dos movimentos acelerado dos eltrons na parede metlica devido agitao trmi-

    ca. Ao invs de estudarmos detalhadamente o comportamento dos eltrons na parede da cavi-

    dade, estudaremos o comportamento das ondas eletromagnticas no interior da cavidade. Co-

    mo j mencionado, as ondas eletromagnticas estacionrias na cavidade no podem assumir

    qualquer valor . Na realidade, o campo eltrico E da onda deve ter um valor zero na superf-cie metlica, isto , amplitude zero. Do contrrio, a onda seria absorvida pelas paredes metli-

    cas e no seria refletida. Alm disso, as ondas estacionrias no interior da cavidade devem

    satisfazer a equao da onda em trs dimenses:

  • 14

    22

    2 2

    1 EEc t

    = , (1.15)onde 2 o operador Laplaciano, c a velocidade da luz, E denota o campo eltrico da onda eletromagntico e t o tempo. O operador Laplaciano, em coordenadas cartesianas assume a

    seguinte forma: 2 2 2

    22 2 2x y z

    = + + . A Equao (1.15) pode ser escrita, em coordenadas

    cartesianas, como segue: 2 2 2 2

    2 2 2 2 2

    1E E E Ex y z c t

    + + = . (1.16)A soluo da Equao da onda deve obedecer s condies de contorno, isto , o campo el-

    trico deve ter amplitude zero nas paredes metlicas. Uma maneira simples de resolver esta

    equao atravs do mtodo da separao de variveis. Para implementar este procedimento,

    supomos que a soluo possa ser escrita como um produto de quatro funes:

    ( ) ( ) ( ) ( ) ( ), ,E E x y z f x g y h z T t= = (1.17)Derivando (1.17) em relao s variveis x, y, z e t e substituindo em (1.16), temos:

    ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )

    2 2

    2 2

    2 2

    2 2

    " ; "

    " ; "

    E Ef x g y h z T t f x g y h z T tx yE Ef x g y h z T t f x g y h z T t

    z t

    = = = =

    2

    1" " " "f g h T f g h T f g h T f g h Tc

    + + = .

    (1.18)

    Em favor da simplicidade, omitimos as variveis em (1.18). Dividindo (1.18) por f g h T , temos:

    2

    " " " 1 "f g h T f g h T f g h T f g h Tf g h T f g h T f g h T c f g h T

    + + =

    2

    " " " 1 "f g h Tf g h c T

    + + = (1.19)A Equao (1.19) pode ser rearranjada da seguinte maneira:

    ( )( )

    ( )( )

    ( )( )

    ( )( )2

    " " " "1f x g y h z T tf x g y h z c T t

    = + (1.20)A Equao (1.20) apresenta uma caracterstica interessante. O lado esquerdo s depende de x

    e o lado direito no depende de x. As variveis x, y, z e t so independentes. Essa igualdade s

    possvel se os lados da equao forem iguais a uma constante, digamos 2k . O sinal negati-vo e o quadrado foram usados para simplificar os clculos que se seguiro. Logo, teremos

  • 15

    22

    " " " 1 "f g h T kf g h c T

    = + = (1.21)Resolvendo (1.21) para a funo f(x), teremos:

    2 2" " 0f k f k ff

    = + = (1.22)A Equao (1.22) uma equao diferencial ordinria (EDO) homognea, linear e com coefi-

    cientes constantes. Uma maneira simples para resolver esse tipo de equao supor que a

    soluo seja do tipo ( ) rxf x e= . O procedimento consiste em derivar duas vezes f(x) e substi-tuir em (1.22) para encontrar os valores de r:

    onde i representa a unidade complexa ( 1i = ). Portanto, temos duas solues para (1.22): 1 2e

    kix kixf e coskx isenkx f e coskx isenkx= = + = = (1.23)Nas solues acima fizemos uso da frmula de Euler: xie cosx isenx= + . Como f1 e f2 so linearmente independentes, a soluo geral de (1.22) a combinao linear de f1 e f2

    ( ) ( )( ) ( )

    ou

    kix kixf Ae Be A coskx isenkx B coskx isenkx

    = A+B coskx Ai Bi senkx

    = + = + + +

    ( ) f x =Ccoskx+Dsenkx (1.24)Em (1.24), ( )f x representa a componente x da amplitude do campo eltrico da onda estacio-nria. A condio de contorno exige que a amplitude seja zero nas paredes, pois, do contrrio,

    no teramos uma onda estacionria. Assim, para 0x = devemos ter ( )0 0f = e para x L= devemos ter ( ) 0f L = . Usando a primeira condio, encontramos o valor da constante C:

    ( )0 0 00 0f Ccosk Dsenk

    C C=0= +

    = +

    Substituindo C em (1.24), temos

    ( )f x Dsenkx= (1.25)Usando a segundo condio de contorno, temos:

    ( ) ( ) 0f x Dsenkx f L D senkL D senkL= = = (1.26)Em (1.26), a constante D no pode ser zero, pois se isto ocorrer significa que f(x) zero para

    qualquer valor de x, ou seja, a funo f identicamente nula. Esta soluo no nos interessa.

    ( )2 2 2 2 22 2 2

    ' e " 0 0

    0 ,

    rx rx rx rx rxf re f r e r e k e e r k

    r k r k r ki

    = = + = + =+ = = =

  • 16

    Logo, devemos fazer ( ) 0sen kL = . Mas, ( )sen kL ser zero quando xkL n = , ou seja, xk n L= . Usando o valor de k em (1.26), obtemos ( )f x :

    Usando procedimento anlogo ao descrito acima, encontramos as solues para as funes

    g(x) e h(z):

    ( ) yn y

    g y F senL = e ( )

    zn zh z G senL = (1.28)

    Procedimento similar pode ser usado para encontrar a soluo geral de ( )T t : ( ) ( )0( )T t H cos ckt H sen ckt= + . (1.29)

    H0 e H so constantes a serem determinadas. Quando 0t = , a onda est na parede da cavidade e, portanto, a amplitude zero, isto , ( )0 0T = . Logo,

    ( ) ( ) ( )0 00 0 0.T H cos ck 0 H sen ck H= + = Substituindo 0H em (1.29) temos

    ( ) ( )T t H sen ckt= (1.30)O valor funcional de (1.30) no alterado quando fazemos 2t t

    kc= + . De fato,

    ( ) ( ) ( )( ) ( )

    2 2 2 2

    2

    T t H sen kc t H sen kct H sen kct cos2 +cos kct sen kc kc

    T t H sen kct T tkc

    + = + = + = + = =

    Logo, 2 kc o perodo de (1.30). Por outro lado, sabemos que o perodo de uma onda ele-tromagntica dado por c , onde o comprimento de onda e c a velocidade da luz. I-gualando estes dois valores, obtemos o valor para a constate k:

    2 2kkc c

    = = . (1.31)k chamado de nmero de onda, pois expressa o nmero de comprimento de ondas em um comprimento de 2. Em espectroscopia, o nmero de ondas indicado por e definido como sendo o inverso do comprimento de onda: 1 = . Substituindo k em (1.30), temos a funo T(t):

    ( ) 2 ctT t H sen = (1.1)

    A soluo geral de (1.17) obtida multiplicando as funes f(x), g(y), h(z) e T(t):

    ( ) xn xf x D senL = (1.27)

  • 17

    ( ) ( ) ( ) ( )2

    2

    yx z

    yx z

    E f x g y h z T t

    n yn x n z ctE D sen F sen G sen H senL L L

    n yn x n z ctE D F G H sen sen sen senL L L

    = =

    =

    02yx zn yn x n z ctE E sen sen sen sen

    L L L

    =

    , (1.32)

    onde E0=DFGH. Note que a funo de onda E=E(x,y,z,t) funo peridica de x, y, z e t.

    Derivando parcialmente (1.32) duas vezes em relao a x, y, z e t e substituindo em (1.16),

    temos: 22 2 22yx znn n

    L L L

    + + =

    22 2 2

    2

    4x y z

    Ln n n + + = . (1.33)Como a freqncia e o comprimento de onda esto relacionados pela equao c = , po-demos reescrever (1.33):

    2 22 2 2

    2

    4x y z

    Ln n nc+ + = . (1.34)

    Note que (1.34) tem dois graus de liberdade, i.e., fixado os valores de nx e ny o valor de nz fica

    determinado. Do ponto de vista matemtico, significa que existem duas ondas na cavidade

    que obedece a condio (1.34), i.e., suponha que nx=1 seja fixado, ento poderamos ter, por

    exemplo, ny=2 e nz=3 ou ny=3 e nz=2. Essas duas possibilidades obedecem a condio (1.34).

    Os fsicos costumam interpretar este fato dizendo que a Equao (1.34) representa duas ondas

    eletromagnticas de freqncia polarizadas perpendicularmente. No devemos esquecer tambm que a condio para que uma onda estacionria exista na cavidade expressa por

    (1.33) ou (1.34). L fixo, pois a aresta da cavidade metlica cbica, e a freqncia varia de zero ao infinito. Para cada valor da freqncia , o nmero de modos vibracionais N poss-veis, resultante das combinaes ex y zn , n n , deve obedecer a condio (1.34), i.e.,

    2 2 2 2 2 24x y zn n n L c+ + = . Portanto, n, dado por ( ) ( )1 12 2 2 2 2 22 24x y zn n n n L c= + + = , representa o raio de uma esfera no espao dos in s. Quanto maior for maior ser o nmero de modos vibracionais possveis, pois maior a superfcie da esfera, e cada ponto da superfcie da esfera

    representa uma onda estacionaria possvel de se encaixar na cavidade. Se for zero, ento o nmero possvel modos ser zero. Para sabermos o nmero total N de combinaes possveis

    para todos os comprimentos de ondas possveis basta calcular o volume da maior esfera que

  • 18

    contm as demais. Lembre-se que estamos trabalhando no espao dos ns. Portanto, N ser

    dado por

    ( ) ( )33 2 2 2 24 43 3 x y zN = n n n n = + + , (1.35)que o volume da esfera de raio n. Como visto anteriormente, cada onda eletromagntica no

    interior da cavidade a combinao de duas outras ondas polarizadas perpendicularmente

    uma em relao outra. Portanto, devemos multiplicar a Equao (1.35) por dois. Um segun-

    do problema de (1.35) que esta equao leva em considerao tanto os valores positivos

    quanto os negativos dos in s. Mas, na soluo de (1.16), consideramos apenas os valores po-

    sitivos dos nx, ny e nz. Assim, devemos dividir (1.35) por oito, isto , s nos interessa a primei-

    ra octante da esfera. Feito essas correes, podemos tomar o volume como uma medida do

    nmero de modos vibracionais ou ondas estacionrias no interior da cavidade metlica cbica.

    Esta aproximao tanto melhor quanto maior for o tamanho da cavidade em relao aos

    comprimentos de ondas. Este exatamente o caso das ondas eletromagnticas em uma cavi-

    dade finita. Usando (1.34) em (1.35) obtemos finalmente uma expresso para o clculo do

    nmero de modos vibracionais, N, na cavidade:

    ( )3

    2 2 3 3232 2 2 2

    2 3

    2 4 4 88 3 3 3x y z

    L LN n n nc c

    = + + = = . (1.36)

    Tendo obtido uma expresso para o clculo do nmero de ondas estacionrias na cavi-

    dade em funo da aresta L e da freqncia , gostaramos de saber qual a distribuio des-tas ondas por unidade de freqncia , i.e., gostaramos de saber qual a taxa de variao de N em relao ? Fazemos isto derivando N em relao :

    3 3 3 2

    3 3

    8 83

    dN d L Ld d c c

    = =

    3 2

    3

    8 LdN dc

    = (1.37)De acordo com o teorema da eqipartio da energia, a energia de cada modo vibracional

    kT . A densidade de energia entre e d + por unidade de volume da cavidade 3 2 2

    3 3 3 3

    8 8kTdN L kT kTd d dL L c c

    = = = (1.38)Fixado a temperatura T, a densidade de energia d pode ser escrita como ( ),d T d = , onde ( ),T a funo de distribuio da densidade de energia no interior da cavidade em funo de e T. Comparando esta equao com (1.38), temos a frmula de Rayleigh-Jeans:

  • 19

    ( ) 328 kT,T =

    c (1.39)

    A frmula de Rayleigh - Jeans para a distribuio da densidade de energia no interior

    da cavidade em funo da freqncia, prediz uma densidade de energia infinita quando

    ou 0 (Figura 1.3), isto , uma densidade de energia infinita na cavidade, o que um absurdo. A Equao (1.39) mostra que mesmo os corpos a baixas temperaturas so capa-

    zes de emitir radiaes a altas freqncias. Assim, de acordo com a fsica clssica no deveria

    haver escurido. A Equao (1.39) pode ser expressa em termos do comprimento de onda ao invs da freqncia . Primeiramente, derivamos a expresso c = :

    2

    cd d = (1.40)No intervalo de freqncia e +d, a relao entre ( ),v T e ( ),T pode ser expressa por

    ( ) ( ), ,T d T d = (1.41)O sinal negativo indica que d e d tm sentidos opostos, isto , enquanto aumenta di-minui. Usando c = e as Equaes (1.39) e (1.40) na Equao (1.41), temos

    ( ) 48, kTT d d = . (1.42)A funo de distribuio da densidade de energia no interior da cavidade pode ser escrita co-mo

    ( ) 48, kTT = . (1.43)

    Figura 1.3. Grfico mostrando a distribuio da densidade de energia ( ),T em funo de

    . A frmula de Rayleigh - Jeans mostra que quando 0 ( ),T .

  • 20

    1.4 O modelo de Max Planck

    Se um modo vibracional pode assumir uma quantidade arbitraria de energia, desde ze-

    ro at infinito, ento no existe motivo lgico para a frmula de Rayleigh - Jeans produzir

    um valor absurdo. Ela foi obtida a partir de conceitos da termodinmica que so inquestion-

    veis at o presente momento. Ento, por que a frmula no funciona?

    Max Planck, aos quarenta e dois anos, raciocinou de um modo diferente: suponha, por

    hiptese, que os osciladores possam apresentar uma quantidade discreta de energia, i.e., n0

    osciladores encontram-se no estado fundamental cuja energia relativa ser denotada por zero,

    n1 osciladores com energia , n2 osciladores com energia 2 e assim por diante (Table 1.1).

    Table 1.1 Distribuio das energias nos osciladores de acordo com Planck. Energia () 0 2 3 4 ...

    N0 de osciladores n0 n1 n2 n3 n4 ...

    Suponha, ainda, que a distribuio dos osciladores seja governada pela lei de distribuio de

    Boltzmann 0 ikT

    in n e= . O nmero total N de osciladores

    ( )0 1 2 3

    02 3 4

    0 0 0 0 0

    2 3 40

    =

    = 1

    ii

    kT kT kT kT

    kT kT kT kT

    N n n n n n

    n n e n e n e n e

    n e e e e

    =

    = = + + + + + + + + +

    + + + +

    ( ) ( ) ( ) ( )2 3 40 = 1 kT kT kT kTN n e e e e + + + + (1.44)

    Fazendo kTx e = , a Equao (1.44) pode ser escrita como ( )2 3 400

    1

    1

    N n x x x x

    nNx

    = + + + + + =

    (1.45)

    Na equao acima usamos a propriedade da soma das sries geomtricas. A energia

    mdia ( E ) dos osciladores pode ser calculada dividindo a energia total pelo nmero de osci-

    ladores:

    0 1 2 3 4

    2 3 40 0 0 0

    0 2 3 4

    2 3 4kT kT kT kT

    n n n n nEnergia totalETotal de osociladores N

    NE n e n e n e n e

    + + + + + = =

    = + + + +"

  • 21

    2 3 40 ( 2 3 4 )NE n x x x x= + + + + (1.46)

    Relembrando que

    ( )2 3

    21 1 2 3 4

    1x x x

    x= + + + +

    ( )2 3 4

    2 2 3 41x x x x xx

    = + + + + (1.47)Usando o resultado (1.47), a Equao (1.46) pode ser escrita como

    ( )0 21xNE nx

    = (1.48)Usando a Equao (1.45) na Equao (1.48), temos:

    ( ) ( )0

    0 2 1 11n x xE n E

    x xxou

    = =

    , onde usamos = .1

    kTkT

    kTeE x ee

    = (1.49)Dividindo a Equao (1.49) por kTe , tem-se, para a energia mdia dos osciladores, a seguin-

    te expresso:

    1kTE

    e= (1.50)

    Para encontrar a funo de distribuio da densidade de energia ( ),T procede-se simi-larmente ao descrito na formulao de Rayleigh - Jeans. Ao invs de usamos kT para o clculo

    da energia mdia do oscilador, usa-se energia mdia E do oscilador dada por (1.50), isto ,

    substitui KT da Equao (1.43) pelo valor de E dado por (1.50):

    ( ) ( )4 8, 1kTT e = (1.51)A anlise da Equao (1.51) mostra que se a energia for constante, ( ),T tende para in-finito quando 0 . Max Planck percebeu que a frmula de Wien poderia ser obtida de (1.51) se fizesse a energia do oscilador, , diretamente proporcional freqncia de oscila-o:

    hch = = , (1.52)onde a freqncia de oscilao e h uma constante de proporcionalidade, conhecida, atu-almente, como constante de Planck, cujo valor 6,6260x10-34J.s. Substituindo (1.52) em

    (1.51), teremos para a funo de distribuio da densidade de energia a seguinte frmula:

  • 22

    ( ) ( )58, .

    1hc hc kT4 kT

    8hchcT

    e e -1

    = =

    (1.53)

    A Equao (1.53) mostra que o limite da funo de distribuio de densidade ( ),T , tende a zero quando 0 , i.e., ( )

    0, 0lim T = . Isto ocorre porque a parte exponencial tende ao

    infinito mais rapidamente do que a parte polinomial tende zero.

    Figura 1.4 Grfico comparativo entre as frmulas de Planck e Rayleigh-Jeans.

    A lei do deslocamento de Wien pode ser obtida da frmula de Planck calculando a de-

    rivada da funo de distribuio da densidade de energia no interior da cavidade e igualando a

    zero:

    ( ) ( )( )

    ( )( )

    4 52

    25

    4 52

    -8 5 1,0 0

    1

    5 1 0

    5 1 0

    5 0

    1 1 10,0143876 1,445 5 5

    hc hckT kT

    hckT

    hc hckT kT

    hc hckT kT

    mx

    hchc e ed T kTd e

    hce ekT

    hce ekT

    hckT

    hcT m k cm kk

    = = =

    =

    =

    = =

    21 11, 445 5mx

    T cm k c = = (1.54)Na Equao (1.54), c2 a segunda constante de quantizao; h a constante de Planck

    (h=6,6260x10-34J.s); k a constante de Boltzmann (k=1,38066x10-23J/k). Em (1.54), usamos o

  • 23

    fato de que 1hc

    kTe >> e fizemos a seguinte aproximao: 1hc hckT kTe e . Como foi visto anteriormente, para grandes valores de a frmula de Rayleigh - Jeans concordava com os valores experimentais. O problema surgia quando 0. Portanto, a frmula de Planck deve concordar com a frmula de Rayleigh - Jeans para grandes valores de . De fato isto acontece: se grande, ento 1hc

    kT

  • 24

    rando o trabalho de Planck, logo uma explicao lgica apareceria e a fsica clssica estaria

    salva.

    1.5 Efeito fotoeltrico

    Quando um raio de luz atinge uma superfcie metlica limpa, no vcuo, a placa metli-

    ca emite eltrons. Este fenmeno encontra-se ilustrado na Figura 1.5. O efeito fotoeltrico foi

    descoberto e investigado em 1887 pelo fsico alemo Heinrich Rudolf Hertz (22/021857 -

    1/01/1894). As principais caractersticas do efeito fotoeltrico so:

    a) Os eltrons no so ejetados at que a radiao atinja certa freqncia mnima ca-racterstica do metal;

    b) A energia cintica dos eltrons emitidos pela superfcie metlica ao ser atingida pela luz aumenta linearmente com a freqncia luminosa;

    c) A energia cintica dos eltrons no depende da intensidade da luz, somente da fre-qncia;

    d) A quantidade de eltrons ejetados proporcional intensidade da radiao lumino-sa;

    e) No h intervalo de tempo entre a radiao incidente e os eltrons ejetados.

    Do ponto de vista da fsica clssica, o eltron est ligado placa metlica por certa e-

    nergia potencial W. Para retirar um eltron que est ligado ao metal deve-se fornecer ao el-

    tron uma energia W. Esta energia denominada de funo trabalho W. Se, alm disso, o

    eltron emitido pelo metal possuir energia cintica, a energia total do eltron ser dada por

    20

    12total

    E m W= + . (1.58)

  • 25

    Figura 1.5 Quando a luz incide no prato emissor, os eltrons so emitidos e coletados pelo prato coletor

    gerando uma corrente eltrica. Variando o potencia da bateria pode-se interromper a corrente de eltrons. Desta forma, a energia cintica dos eltrons emitidos pode ser medida.

    Provavelmente, o eltron adquire esta energia do raio de luz. Classicamente, a energia

    do raio de luz dependeria exclusivamente da sua intensidade, e a energia deveria ser absorvida

    continuamente pela placa metlica. Do ponto de vista clssico, pode se demonstrar que, para

    uma radiao de pequena intensidade e valor razovel W (energia necessria para retirar o

    eltron da superfcie metlica), aps o comeo da iluminao, um grande perodo de tempo,

    dias ou mesmo anos, deveria se passar antes que qualquer eltron pudesse adquirir energia

    suficiente para ser emitido do metal. Aps este perodo de tempo, uma grande quantidade de

    eltrons deveria apresentar energia suficiente para ser emitido e uma corrente contnua deve-

    ria ser observada fluindo do metal. Aumentando a intensidade da radiao, o tempo necessrio

    para a emisso dos eltrons deveria diminuir. Entretanto, experimentalmente, no se observa

    intervalo de tempo entre a radiao incidente e a emisso dos eltrons. A proporcionalidade

    entre a intensidade luminosa e a corrente razovel do ponto de vista clssico, mas a ausncia

    de intervalo de tempo entre a radiao incidente e a emisso de eltrons no pode ser explica-

    da classicamente.

    Em 1905, o fsico terico alemo Albert Einstein (14/03/1879 18/04/1955) forneceu

    uma elegante explicao para o efeito fotoeltrico. Do ponto de vista clssico, a energia da

    radiao incidente absorvida continuamente e compartilhada entre todos os eltrons do

    metal. Cada eltron recebe uma pequena parte da energia total. Einstein sups que a energia

    da luz estivesse concentrada em pacotes de energia, quanta de energia de Planck, h. Einstein ainda sups que um quantum de energia fosse absorvido por um nico eltron e que no pu-

    desse ser dividido com os demais. Logo, a energia do eltron, aps receber um quantum de

    energia, deve ser h e deve ser igual energia total do eltron ejetado:

  • 26

    20

    12Total

    E h m W = = + (1.59)A Equao (1.59) a famosa equao fotoeltrica proposta por Einstein em 1905. Por

    este trabalho, Einstein foi laureado com o prmio Nobel em 1921. De todos os trabalhos de

    Einstein este foi o que gerou maior impacto tecnolgico. Pode-se ver que abaixo de certa fre-

    qncia crtica, 0 , dada por 0 0h W = , o eltron no adquire suficiente energia do quantum de luz para escapar do metal. Isto explica a freqncia mnima observada 0 . Maior intensi-dade significa maior quantidade de ftons incidindo no metal e, portanto, maior quantidade de

    eltrons ejetada; a energia cintica do eltron ejetado independe da intensidade luminosa.

    Com o valor da constante de Planck, obtida no tratamento da radiao do corpo negro,

    a Equao (1.59) fornece excelente explicao para o efeito fotoeltrico. Contudo, neste mo-

    delo, Einstein falou de fton, partcula de luz carregando energia h, ou seja, Einstein estava falando da quantizao da energia luminosa. Idia desconfortvel para a poca em que se a-

    creditava que a energia era contnua.

    1.6 Modelo atmico de Bohr

    No final do sculo XIX, os fsicos sabiam que havia eltrons no interior dos tomos, e

    quando estes eltrons eram chacoalhados emitiam luz e outras radiaes eletromagnticas.

    Mas ainda permanecia um curioso mistrio a ser resolvido. Quando um raio de luz passa atra-

    vs de um prisma, a luz branca decomposta pelo prisma nas cores do arco ris. Entretanto,

    quando os cientistas olhavam a luz proveniente de um nico elemento, hidrognio, por exem-

    plo, eles no viam todas as cores do arco ris. Eles observavam apenas algumas linhas brilhan-

    tes de certas cores. Na realidade, cor no exatamente o termo correto a ser usado, pois, so-

    mente algumas linhas eram visveis. Estas linhas coloridas ou linhas espectrais so caracters-

    ticas de cada elemento, formando uma espcie de assinatura do elemento.

    Estas linhas espectrais foram vistas pela primeira vez por William Wollaston em 1802.

    Em 1814, o alemo Joseph von Fraunhofer as estudou de modo sistemtico, catalogando-as.

    Fraunhofer marcou cuidadosamente a posio de cada linha, mas no tentou dar uma explica-

    o do por que estas linhas apresentavam tais caractersticas. Por volta de 1850, o fsico Gus-

    tav Kirchhoff decidiu investigar o fenmeno com a ajuda do qumico Robert Bunsen (o inven-

    tor do bico de Bunsen). Eles seguraram varias substncias nas chamas do bico de Bunsen. A

    luz emitida pelo elemento aquecido foi separada em seu espectro usando um prisma. Eles ob-

  • 27

    servaram que cada elemento apresentava seu prprio conjunto de linhas que era diferente do

    conjunto de linhas dos outros elementos. Na realidade, por volta de 1860, eles descobriram

    dois novos elementos, csio (132,9155Cs ) e rubdio (85,47

    37 Rb ), ao analisar o conjunto de espectros

    que no correspondia a nenhum outro elemento conhecido. Mas tarde, os elementos qumico

    hlio ( 4,002 He ), argnio (39,95

    18 Ar ), nenio (20,18

    10 Ne ), kriptnio (83,80

    36 Kr ) e xennio (131,30

    54 Xe )

    foram descobertos usando a espectroscopia.

    A descoberta do espectro de absoro por Fraunhofer foi acidental. Fraunhofer no es-

    tava estudando este tipo de fenmeno em particular. Na verdade, ele estava simplesmente

    testando um moderno prisma que havia construdo. Quando a luz solar entrou por uma peque-

    na fenda e atingiu um dos prismas, formou-se o espectro de um arco ris colorido, como espe-

    rado. Entretanto, o espectro continha uma srie de linhas escuras. Antes da luz branca do sol,

    que contm toda faixa do espectro, atingir o prisma, ela passa pelo ar da atmosfera que con-

    tm vrios tipos de gases. Alguns dos comprimentos de onda da radiao solar so absorvidos

    pelo ar. Sendo que o restante da radiao atravessa a atmosfera, atinge o prisma e so decom-

    postos produzindo o espectro observado. A anlise cuidadosa mostra que o ar atmosfrico

    produz um espectro de absoro com mais ou menos 600 linhas escuras. Em homenagem a

    Fraunhofer essas linhas foram denominadas de linhas de Fraunhofer. Usando as linhas espec-

    trais podemos saber a composio elementar das estrelas. Pois, cada elemento qumico apre-

    senta um nico conjunto de linhas espectrais.

    Em 1885, o matemtico suo Johann Jakob Balmer (01/05/1825 12/03/1898) exa-

    minou quatro linhas do espectro visvel do tomo de hidrognio. Os comprimentos de ondas

    examinados foram: 410 nm (violeta), 434 nm (azul), 486 nm e 656 nm (vermelho)

    ( 91 10nm m= ). Ele trabalhou esses nmeros e descobriu que eles se ajustavam em uma equa-o simples:

    2 2

    1 1 1 3, 4,5,6.2H

    R nn

    = = (1.60)A constante 7 11,09677 10HR m

    = conhecida, atualmente, como constante de Rydberg. O nmero n um nmero inteiro positivo. A frmula acima produz o comprimento de onda 656

    nm quando n = 3 e o comprimento de onda 410 nm quando n 6. Esses nmeros so conheci-

    dos como srie de Balmer. A srie de Balmer encontra-se na regio do visvel. Posteriormen-

    te, encontraram na parte no visvel do espectro do hidrognio outras sries que obedecem a

    frmulas bastante similares frmula de Balmer. Por exemplo, a srie de Lyman, que est

    inteiramente na regio do ultravioleta e as linhas espectrais da srie de Paschen que se encon-

  • 28

    tra no infravermelho. A Tabela 1.2 resume as vrias frmulas espectrais para o tomo hidro-

    gnio.

    Tabela 1.2 Sries espectrais

    2 2

    1 1 1 2,3, 4,1H

    R nn

    = = " Srie de Lyman (ultravioleta)

    (1.61)

    2 2

    1 1 1 3, 4,5,6.2H

    R nn

    = = Srie de Balmer (visvel)

    (1.62)

    2 2

    1 1 1 4,5,3H

    R nn

    = = " Srie de Paschen (infravermelho)

    (1.63)

    2 2

    1 1 1 5,6,7,84H

    R nn

    = = " Srie de Brackett

    (1.64)

    2 2

    1 1 1 6,7,85H

    R nn

    = = " Srie de Pfund

    (1.65)

    Uma generalizao das frmulas espectrais foi feita por Johannes Rydberg em 1888 para as

    linhas espectrais do tomo de hidrognio:

    2 2

    1 1 1 HR k n = (1.66)

    Para 1k = temos a srie de Lyman, para 2k = temos a srie de Balmer, 3k = a srie de Pas-chen etc. A frmula acima pode ser estendia para tomos hidrogenides:

    2 2

    1 1 1HR Z k n

    = . (1.67)Na equao acima, Z representa o nmero atmico.

    Em 1911 surge o modelo atmico do fsico nuclear neozelands Ernest Rutherford

    (30/08/1871 19/10/1937). O modelo de Rutherford, baseado em seu famoso experimento do

    espalhamento das partculas alfas (ncleo de hlio, 2+2 He ), apresentava inconsistncia com a

    teoria do eletromagnetismo clssico. O seu modelo assemelhava-se ao sistema solar, isto , o

  • 29

    tomo era formado por um ncleo central denso e positivo rodeado por eltrons circulante

    com cargas negativas, onde o ncleo tinha um dimetro 10.000 vezes menor do que o tomo.

    O problema do modelo que cargas eltricas em movimento acelerado emitem radiao ele-

    tromagntica. Portanto, os eltrons estariam emitindo energia constantemente e entrariam em

    uma rbita espiralada que acabariam por colidir com o ncleo. Nestas condies nenhum -

    tomo seria estvel. Contudo, observamos na natureza exatamente o contrrio. A maioria dos

    tomos apresenta istopos estveis. A instabilidade do modelo atmico de Rutherford foi re-

    solvida em 1913 pelo fsico dinamarqus Niels Bhor. O modelo de Bohr para o tomo de hi-

    drognio consiste em um ncleo central com uma carga positiva e+ e um eltron de carga e , girando ao redor do ncleo com velocidade , em uma rbita de raio r (Figura 1.6).

    Fora

    velocidade

    +

    -

    Figura 1.6

    Para adquirir estabilidade mecnica, a fora de atrao eletrosttica deve ser igual

    fora centrifuga, isto , a soma das foras deve ser zero:

    0eletrosttica centrifugaF F+ = 2 2 2

    22 0

    e m emr r r

    + = = . (1.68)Nesta seo, usaremos o sistema cgs de unidades. As cargas e+ e e so dadas em

    statcoulomb (statC), tambm chamada de unidade eletrosttica de carga. Neste sistema, a lei

    de Coulomb assume uma forma relativamente simples: 2 2F e r= . A energia total do siste-ma soma das energias cinticas ( 2 2m )e potencial ( 2e r ):

    2 2

    2totalm eE

    r= . (1.69)

    Usando a Equao (1.68) transformamos a Equao (1.69) em

  • 30

    2

    2totaleEr

    = . (1.70)Classicamente, como o eltron est acelerado, o sistema deve irradiar energia. Para evitar esta

    dificuldade, Niels Bhor rompeu totalmente com a tradio e postulou que:

    a) Somente algumas rbitas so permitidas; b) Nas rbitas permitidas, o sistema estvel; c) Quando um eltron salta de uma rbita para outra ele absorve ou emite energia, sen-

    do a freqncia da radiao emitida dada por E h = .Quando o eltron vai de uma rbita interna para uma rbita externa ele absorve energia, em sentido contrrio emi-te energia;

    d) O momento angular do eltron L m r= um mltiplo inteiro de = : L n= = . =1,2,3,m r n n = = ". (1.71)

    Para determinar a velocidade do eltron, primeiro modificamos (1.71) e depois a substitumos

    em (1.68):

    nmr

    = =

    2 2 2

    e n e emr r r n

    = = == = (1.72)Observe que a velocidade em (1.72) diminui com o aumento de n. O raio pode ser determi-nado usando (1.71):

    2 2 2

    2 e nm r n mr n rn me

    = = = == == . (1.73) Para 1n = temos que 2 2 0r me a= == , onde 0a o raio da primeira rbita de Bohr, conhecido como raio de Bohr.

    2 2 2 28 11

    02 2

    1 0,529 10 5,291772 10nr a cm mme me

    = = = = = = = . (1.74) Usando o valor de r obtido na Equao (1.74) na Equao (1.70), obtm-se para a energia

    total a seguinte expresso: 2 2 2

    2 2 20

    2

    12 22

    ne e eE

    nr a nme

    = = = =. (1.75)

    Observe que a energia total s depende do valor de n. Quando o eltron salta de um nvel k de

    menor energia para um nvel n de maior energia, a variao de energia do eltron : 2 2

    2 20 0

    1 12 2nk n ke eE E Ea n a k

    = =

  • 31

    2

    2 20

    1 12nkeEa k n

    = . (1.76)

    Utilizando o terceiro postulado de Bohr, temos 2 2

    2 2 2 20 0

    2

    2 20

    1 1 1 1 2 2

    1 1 12

    nke c eE h ha k n a k n

    ea hc k n

    = = = =

    2

    2 20

    1 1 1 , onde 2H H

    eR Rk n a hc

    = = . (1.77)O valor da constante de Rydberg RH encontrado usando a (1.77) concorda muito bem com os

    valores experimentais. Contudo, Bohr obteve a constante de Rydberg usando um procedimen-

    to nada clssico.

    A partir dos trabalhos de Bohr, a natureza corpuscular da luz no dava mais para ser

    ignorada. Bhor conseguiu mais adeptos para sua teoria do que um pastor conseguiria fiis para

    sua igreja. A conexo entre matria e radiao estabeleceu-se firmemente. Na dcada seguinte

    descoberta de Bohr, o que agora denominado teoria quntica clssica ou antiga teoria

    quntica floresceu. A interpretao sistemtica dos dados catalogados dos espectros progre-

    diu. O modelo atmico de Bohr-Sommerfeld, utilizando-se de rbitas circulares e elpticas foi

    introduzido, mostrando-se muito til. A partir do estudo dos espectros, Bohr construiu uma

    tabela peridica terica que concordava com a dos qumicos. Um detalhe era diferente; de

    acordo com Bohr, o elemento 72, que os qumicos situavam entre as terras raras, no era uma

    terra rara, e sim um membro da quarta famlia com titnio e zircnio. Mais tarde, estudo das

    linhas espectrais mostrou que o zircnio era uma mistura de zircnio e o elemento 72, o qual

    recebeu o nome de Hfnio. A teoria de Bohr destruiu os ltimos vestgios de resistncia ao

    conceito quntico. A natureza da luz assumiu de vez um carter dual.

    1.7 A natureza ondulatria da matria

    A parte matemtica do modelo atmico de Bohr convincente; mas algumas das su-

    posies que foram feitas por Bohr so bastante arbitrarias. Como, por exemplo, por que o

    momento angular do eltron s pode assumir certos valores? E por que o eltron emite ou

    absorve energia quando ele salta de um nvel para outro?

  • 32

    O modelo de Bohr realmente explica os resultados experimentais para os tomos hi-

    drogenides, mas por que o tomo comporta dessa maneira?

    Em 1923, cerca de 10 anos aps Bohr ter publicado seus resultados, Louis-Victor De

    Broglie apareceu com uma idia fascinante: matria, ele sugeriu, realmente consiste de on-

    das. Os argumentos de De Broglie para sua suposio exige algum conhecimento da teoria da

    relatividade e do eletromagnetismo. Resumidamente podemos fazer a seguinte argumentao

    para justificar a frmula de De Broglie: segundo a teoria da relatividade de Einstein matria e

    energia relativstica esto relacionadas pela equao abaixo

    2 2 2 2 40= p E mc c m c E p c= + = , (1.78)

    onde E a energia, m a massa relativstica da partcula, m0 a massa de repouso, c a velo-

    cidade da luz e p o momento. O primeiro termo dentro da raiz representa a energia cintica e

    o segundo a energia de repouso. O fton no tem massa de repouso. Por outro lado, de acor-

    do com Planck e Einstein, a energia de um fton E h hc = = . Combinando esta equao com (1.78), temos

    ? ? ou h c h hp c p

    p

    = = = . (1.79)Louis De Broglie levanta a hiptese de que (1.79) vale para partculas tambm. Isto , existe

    uma onda associada partcula. Se a teoria de De Broglie estiver correta, ento podemos justi-

    ficar as suposies arbitrrias no modelo atmico de Bohr. Um eltron com massa m e veloci-

    dade deveria ter um comprimento de onda igual a h hp m

    = = . (1.80)Agora, como o eltron possui uma onda associada e est em movimento circular ao redor do

    ncleo, ento o comprimento da rbita deve ser um mltiplo do comprimento de onda . Do contrrio resultaria em uma interferncia destrutiva da onda do eltron com ela mesma e a

    rbita no seria estvel. Matematicamente, devemos ter:

    2 nr n = , (1.81)onde nr o raio da rbita sob estudo e n um nmero inteiro positivo. Inserindo (1.80) em

    (1.81), teremos:

    2 2 2n n n nn

    h nhr n r n m rm

    = = = . (1.82)Sabemos que o momento angular, L, para uma rbita circular n dado por n nL m r= . Ento, se assumirmos que o eltron se comporta como uma onda com dado pela frmula de De Broglie, obteremos automaticamente a restrio sobre o momento angular imposta por Bohr:

  • 33

    2hL n n= = = . (1.83)

    O modelo de De Broglie impressionante e funciona muito bem. Mas, seria este modelo ape-

    nas um truque matemtico? Ou realmente as partculas apresentam um comportamento on-

    dulatrio?

    Poucos anos aps De Broglie publicar sua hiptese, vrios experimentos foram feitos

    mostrando o comportamento ondulatrio dos eltrons. O primeiro destes experimentos foi

    feito em 1927 por Clinton J. Davisson e Lester H. Germer da Bell Telephone Laboratory.

    Com anlise cuidadosa, eles mostraram que um feixe de eltrons havia sido espalhado pela

    superfcie de um cristal de nquel com ngulos de espalhamento preditos pela frmula de

    Bragg para a difrao de raio-x com comprimento de onda dado pela frmula de De Broglie.

    No mesmo ano de 1927, G. P. Thomson, filho de J. J. Thomson relatou seu experi-

    mento em que um feixe de eltrons foi difratado por uma fina folha de ouro. Os experimentos

    de Davisson e Germer e Thomson provaram que as ondas de De Broglie no eram apenas

    convenincias matemticas. Elas existiam de fato. Em 1937 estes pesquisadores receberam o

    prmio Nobel pelos seus trabalhos. A confirmao da teoria de De Broglie introduziu a duali-

    dade na natureza das partculas fundamentais. Uma partcula deixava de ser simplesmente

    uma partcula e adquiria um carter de onda. Esta idia conduziu muito rapidamente ao de-

    senvolvimento da mecnica ondulatria ou mecnica quntica por Heisenberg e Schrdinger.

    Todas as nossas idias modernas sobre estrutura atmica e molecular baseiam-se na mecnica

    ondulatria. Os conceitos distintos (onda ou partcula dos fsicos do sculo XIX) agora esto

    ligados de modo permanente. A mecnica quntica surge como uma contradio em termos

    do pensamento fsico do sculo XIX. A questo de se um eltron ou um fton partcula ou

    onda perdeu todo o significado. Podemos dizer, com preciso, em que circunstncia mais

    til tratar o eltron como uma partcula clssica ou o fton como uma onda clssica. Sabemos

    agora quando devemos considera os aspectos ondulatrios das partculas clssicas e os aspec-

    tos corpusculares das ondas eletromagnticas clssicas. Qualquer classificao final em part-

    cula ou onda seria artificial. Tanto partculas como ondas possuem uma natureza mais geral

    do que seus prprios nomes indicam. Utilizamos-nos dos velhos nomes, porm compreenden-

    do totalmente o carter mais genrico da entidade em questo. Em 1927, Werner Heisenberg

    e Erwin Schrdinger formularam independentemente a lei que governa o movimento de uma

    partcula. A discusso neste texto estar restrita formulao de Schrdinger.

  • Captulo 2

    PROCURANDO A EQUAO DAS ONDAS DE MATRIA

    2.1 Movimento harmnico simples (MHS)

    A Figura abaixo mostra uma partcula P movimentando com velocidade constante em

    um crculo de raio A. Ao mesmo tempo uma partcula Q movimenta-se para cima e para bai-

    xo ao longo da reta y de tal modo que a coordenada y das duas partculas so sempre iguais.

    A velocidade angular da partcula P em radianos dada por t = . Se =0 e t=0, ento para um tempo t qualquer, temos

    t = . (2.1)

    Figura 2.1 Movimento oscilatrio com amplitude A constante e perodo 2T = . A coordenada y de Q igual coordenada y de P, a qual dada por

    ( ) ( )y A sen A sen t = = . (2.2) O movimento de oscilao de Q chamado de movimento harmnico simples (MHS). Por

    definio, um objeto executa um movimento MHS se seu movimento puder ser descrito por

    uma funo do tipo Asent, Acost, Asen(t+) ou Acos(t+). Estas funes diferem entre si apenas pela escolha da origem e so chamadas de funes sinusoidais. Muitos fenmenos

    podem ser descritos usando estas funes: a vibrao de um diapaso, o movimento de um

    pndulo, uma bolinha presa na ponta de uma mola etc. Para um ciclo completo de oscilao

    da partcula Q, que corresponde a uma revoluo completa de P, temos

  • 35

    2 2t T = = = . (2.3)

    chamado de freqncia angula do movimento oscilatrio da partcula Q. T o perodo, i.e., o tempo necessrio para que ocorra uma oscilao ( 2T = ) e a freqncia de osci-lao que igual ao inverso do perodo ( 1 2T = = ). Se considerarmos P como um pon-to z do ponto complexo, ento o movimento do ponto P pode ser descrito como

    ( ) ( ) i tz x yi A cos t i A sen t Ae = + = + = , (2.4) onde ( )x Acos t= e ( )y Asen t= e A a amplitude da oscilao ou amplitude da funo. Muitas vezes melhor trabalha com a forma complexa. Neste caso, o movimento da partcula

    Q dado pela parte imaginria de z. A velocidade de Q pode ser obtida como segue:

    ( ) ( ) ( ) ( )i tdz Ai e A i cos t isen t A sen t i A cos tdt

    = = + = + . (2.5) A velocidade de Q ( ) ( )Q dy dt A cos t Bcos t = = = . Aqui, B(=A) representa a ampli-tude da velocidade. A energia cintica da partcula

    ( ) ( )2 2 2 21 1 12 2 2

    2 2K m mA cos t mB cos t = = = . (2.6) Se o sistema for ideal, i.e., no houver perca de energia durante a oscilao, ento a energia

    total E igual soma da energia cintica com a energia potencial. A energia cintica ser

    mxima quando a energia potencial for nula, i.e., quando ( ) 1cos t = . Logo, a energia total 2 21 10

    2 2E K Potencial m B m B= + = + = . (2.7)

    Observe que a energia depende da amplitude da velocidade ao quadrado.

    2.2 Movimento ondulatrio

    Definiremos onda como sendo uma perturbao que se propaga atravs do espao e

    do tempo, geralmente transportando energia de um ponto a outro sem que haja transporte de

    massa (ou com pequeno transporte de massa). As ondas mecnicas se propagam atravs de

    um meio material, enquanto que as ondas eletromagnticas so capazes de viajar atravs do

    vcuo.

  • 36

    = f(x-x0)

    x

    Figura 2.2 Translao sem deformao da funo ( )f x = .

    A Figura 2.2 mostra a translao da funo ( )f x = ao longo do eixo x sem que haja deformao do grfico da funo. Matematicamente, a translao da funo no sentido posi-

    tivo do eixo x dada por

    ( )0f x x = . (2.8)De modo similar, a translao da funo ( )f x = no sentido negativa do eixo x por uma distncia x0 dada por

    ( )0f x x = + . (2.9)Se x0 for varivel no tempo, isto , se 0x t= , ento as equaes (2.8) e (2.9) so escritas resumidamente como

    ( ) ( ),x t f x t = . (2.10) A expresso (2.10) tem a forma adequada para representar fenmenos que se propagam ao

    longo do eixo x sem sofrer deformaes. No caso particular em que ( ),x t for uma funo sinusoidal ou harmnica, temos

    ( ) ( ),x t A senk x t = . (2.11)Esta expresso representa uma onda que se propaga direita com amplitude constante A. A

    constante k foi introduzida para permitir uma maior flexibilidade na descrio do movimento.

    O perodo X da funo ( ),x t em relao x pode ser obtido como segue:

  • 37

    ( ) [ ] [ ]22

    22 .

    A sen k x X k t A sen kx kX k t A sen kx k t

    kx kX k t kx k tkX

    Xk

    + = + = + + = + = =

    (2.12)Aqui, X representa o perodo espacial da funo ( ),x t . O perodo espacial da funo de onda chamado de comprimento de onda e denotado por . Fazendo X igual a lambda em (2.12), temos 2 k = ou 2k = . Como k representa o nmero de ondas em um com-primento de 2, ele recebe o nome de nmero de onda. Muitas vezes, o termo nmero de onda usado para designar o nmero de comprimento de onda por unidade de comprimen-to, i.e., 1 ou 2k . Mantendo x constante a Equao (2.11) pode ser reescrita como segue:

    ( ) ( ) ( ) ( )A sen kx k t A sen k t kx A sen k t A sen k t = = + = + . (2.13)Aqui, kx constante = = e o sinal negativo incorporado pela constante A. comparando (2.13) com Asen(t+) (ver movimento harmnico na seo 2.1), vemos que k = , isto , k representa a freqncia angular da onda. Usando o valor de k, temos

    2 = . (2.14)Comparando as equaes (2.3) e (2.14) temos uma importante expresso que relaciona o

    comprimento de onda , a freqncia e a velocidade de propagao da onda : 22 = = . (2.15)

    Reescrevendo a Equao (2.11), temos

    ( ) ( ) ( ),x t A sen kx k t A sen kx t = = . (2.16)De modo similar ao realizado para a parte espacial, podemos calcular o perodo temporal T de

    (2.16):

    2 2 12

    T = = = . (2.17)

    Finalmente, podemos escrever (2.16) como segue:

    ( ) ( ) 2, 2 2x x tx t A sen kx t A sen t A senP

    = = = . (2.18)

    A Equao (2.18) descreve uma onda sinusoidal que se propaga no sentido positivo do eixo x,

    com perodo espacial ou comprimento de onda e velocidade sem deformao. De modo similar uma sinusoidal viajando no sentido negativo do eixo x pode ser descrita pela funo

    abaixo:

  • 38

    ( ) ( ) 2, 2 2x x tx t A sen kx t A sen t A senP

    = + = + = + . (2.19)

    Combinando = com 1T = podemos relacionar o perodo espacial com o perodo temporal T: T = = .

    A funo (2.18) descreve um movimento ondulatrio sinusoidal que se propaga sem

    deformao no sentido positivo do eixo x. Existem muitos tipos de perturbao que se propa-

    gam no espao e que so classificados como movimentos ondulatrios. As funes que des-

    crevem estes movimentos so, em geral, complexas. No entanto, estas funes so solues

    de uma equao geral do movimento ondulatrio chamado equao da onda. Existem muitas

    formas para se obter a funo de onda que depende do tipo de fenmeno ondulatrio que se

    est estudando. Nesta seo vamos derivar a equao dinmica que descreve a vibrao

    transversal de uma mola elstica como, por exemplo, a corda de um violo de comprimento

    L. Suponha que esta corda esteja distendida ao longo do eixo x e presa nas duas extremidades,

    isto , em x=0 e x=L. Agora, d um pequeno puxo na corda. A corda comear a vibrar.

    Nosso propsito encontrar a deflexo ( ),x t da corda em qualquer ponto x a qualquer tempo 0t > . Devemos obter ( ),x t como soluo de uma equao diferencial parcial. Va-mos supor que a corda seja homognea e perfeitamente elstica, isto , no oferece resistncia

    flexo. Suponha ainda que a tenso da corda esticada seja alta o suficiente de tal modo que

    podemos desprezar a fora gravitacional e que o movimento transversal da corda seja peque-

    no e restrito ao plano vertical (veja Figura 2.3).

    T2

    T1

    x x+x L

    P

    Q

    Figura 2.3 Deflexo da corda em um tempo fixo t.

    Como a corda no oferece resistncia deflexo, a tenso tangencial curva da corda em

    cada ponto. Sejam T1 e T2 as tenses nos pontos P e Q, respectivamente. Como o movimento

  • 39

    dos pontos apenas vertical, no existe movimento na direo horizontal. Logo, as compo-

    nentes das tenses na direo horizontal devem ser constantes, isto :

    1 2T cos = T cos = T = const. . (2.20)As componentes das tenses na direo vertical so 1T sen e 2T sen . O sinal negativo apareceu porque a componente de T1 est dirigida para baixo. Usando a lei de Newton, temos

    ( )2 1 2

    ,2resultante

    x tT sen T sen = F ma x

    t = = . (2.21)

    Aqui, m x = a densidade linear da corda homognea. Dividindo (2.21) por (2.20), te-mos

    ( )2 12

    2 1

    ,2 x tT sen T cos x= tan - tanT cos T cos T t

    = . (2.22)

    Como tan e tan so as inclinaes da curva da corda em x e x+x, temos

    x

    tan =x , e x x

    tan =x

    +

    . (2.23)Dividindo (2.22) por x, temos

    ( )2

    ,1 2

    x x x

    x tx x x T t

    +

    = . (2.24)

    Fazendo x tender a zero, obteremos uma equao diferencial parcial linear: ( ) ( )2

    2 2

    , ,1 22

    x t x tx t

    = , (2.25)onde a velocidade da onda e dado por 2 T = . Esta a equao da onda monodimen-sional. Para o caso tridimensional, temos

    ( ) ( )22 2 2, , ,1, , , x y z tx y z t t

    = ou ( )( )22

    2 2

    ,1,t

    tt

    =

    rr . (2.26)

    Na Equao (2.26), ( ), , ,x y z t uma funo peridica de x, y, z e t que d a amplitude da onda e a velocidade de propagao da onda.

    2.3 Soluo de DAlembert para a equao da onda

    Na soluo da Equao (2.25) usando o mtodo de DAlembert, criamos duas novas vari-

    veis:

  • 40

    m x ct e n x ct= + = . (2.27)Agora, passa ser funo das variveis m e n: ( ),m n = . O procedimento consiste em derivar duas vezes em relao a x e a t e substituir na Equao (2.25):

    ( )2

    x m x n x m n

    xx m n mm x mn x nm x nn xx

    xx mm mn nn

    m nm n m n

    = + = += + = + + += + +

    (2.28)

    ( )2 2 22

    t m t n t m n

    tt m n mm t mn t nm t nn tt

    tt mm mn nn

    m n c cc c c m c n c m c n

    c c c

    = + = = = + = +

    (2.29)Substituindo (2.28) e (2.29) em (2.25), temos

    ( )2

    2 2 22

    2

    1

    12 2

    2 2

    0

    xx tt

    mm mn nn mm mn nn

    mm mn nn mm mn nn

    mn m n

    =

    + + = ++ + = +

    = =

    (2.30)Integrando (2.30) em relao a n , encontramos

    ( )

    2

    m n m n

    g nn

    = =

    (2.31)Integrando (2.31) em relao a n, temos

    ( ) ( ) ( )( ) ( )

    2

    1 2

    d f n dn g n dn f m

    f n f m

    = = += +

    (2.32)

    Substituindo os valores de n e m, temos a soluo geral de DAlambert da funo de onda:

    ( ) ( ) ( )1 2,x t f x ct f x ct = + + . (2.33)f1 representa uma perturbao que viaja para a esquerda e f2 representa uma perturbao que

    viaja para a direita.

    Exerccio 2.1 Verifique que as funes ( ) ( )0,x t senk x t = e ( ) ( )0, ik x tx t e = so solues de (2.25).

  • 41

    Uma onda propagando-se na direo do eixo-x no precisa ser interpretada obrigatori-

    amente como estando concentrada no eixo-x. Se uma onda descrita pela funo ( )x t = se estender por todo o espao, fixado t, toma o mesmo valor em todos os pontos do espao com mesma coordenada x. Mas, x constante representa um plano perpendicular ao eixo-x, o

    qual ser denominado de superfcie de onda ou frente de onda. Se a frente de onda for um

    plano, a onda ser designada como onda plana. Se for cilndrica ser chamada de onda ciln-

    drica e se for esfrica ser uma onda esfrica. Assim, uma funo do tipo ( )x t = des-creve uma onda plana que se propaga na direo positiva do eixo-x. Devemos ter em mente

    que em uma onda plana o importante a direo de propagao da frente de onda. Essa dire-

    o de propagao pode ser descrita por um vetor unitrio u perpendicular ao plano da onda.

    A orientao dos eixos de coordenadas mais ou menos arbitrria. conveniente expressar a

    onda plana ( )x t = de modo independente aos eixos coordenados. Dado um ponto r no plano de onda, podemos relacion-lo com x e u usando o produto escalar. Fazemos isto com a

    ajuda da Figura 2.4:

    ( )x cos = r , (2.34)( ) ( )cos cos = =u r u r r . (2.35)

    Comparando as equaes (2.34) e (2.35) obtemos x = u r . Substituindo o valor de x em ( )x t = , temos

    ( )t = u.r . (2.36)

    Figura 2.4 A frente de onda de uma onda plana que se propaga na direo do eixo-x um

    plano perpendicular ao eixo-x.

  • 42

    A Equao (2.36) representa uma onda plana a uma distncia mdia x = u r da origem do sistema coordenado viajando na direo do vetor u. Para o caso de uma onda senoidal pode-

    mos escrever,

    ( )0senk t = u.r . (2.37)Outra maneira de se escrever uma onda plana na sua forma complexa:

    ( )0exp ik t = u.r . (2.38)Neste ponto, conveniente definirmos o vetor k= k u com mdulo 2k = = (usa-mos o fato de que 2 2 = = ) e que aponta na direo de propagao da onda e per-pendicular superfcie de onda. O vetor k assim definido designado de vetor de propaga-

    o da onda ou vetor nmero de onda. Usando esta definio as equaes (2.37) e (2.38)

    podem ser expressas como segue:

    ( ) ( ) ( )0 0 0 x y zsenk t sen t sen k x k y k z t = = = + + u.r k r (2.39)( ) ( ) ( )0 0 0 x y zexp ik t exp i t exp i k x k y k z t = = = + + u.r k.r . (2.40)

    Na Equao (2.40), kx, ky e kz so as componentes do vetor k que satisfaz a relao 22 2 2 2 2

    x y zk k k k + + = = . (2.41)

    2.2 Srie de Fourier e integral de Fourier

    Se :f \ \ uma funo peridica de perodo 2L, integrvel e absolutamente inte-grvel, ento ( )f x pode ser expandida em uma srie de Fourier:

    ( ) 012

    n nn

    a n x n xf x a cos b sinL L

    =

    = + + . (2.42)Os coeficientes na e nb so chamados de coeficientes de Fourier e so dados por:

    ( )1 LnL

    n xa f x cos dx n=0, 1, 2,L L

    = " (2.43)( )1 Ln

    L

    n xb f x sin dx n=0, 1, 2,L L

    = " (2.44)A srie de Fourier pode ser expressa sob forma complexa usando a frmula de Euler:

  • 43

    ie cos isen = + , (2.45)

    2 2

    i i i ie e e ecos e seni

    + = = . (2.46)Usando as equaes (2.46), obtemos

    2 2 2 2

    in x in xn n n nL L

    n na b a bn x n xa cos b sen e e

    L L i i

    + = + + . (2.47)Logo, os coeficientes de in x / Le e in x / Le so dados por

    ( ) ( )1 12 2 2 2

    L in xn n L

    n n nL

    a bc a ib f x e dxi L

    = + = = (2.48)

    ( ) ( )1 12 2 2 2

    L inn n L

    n n nL

    a bc a ib f x e dxi L

    = = + = (2.49)

    Resumindo, se f : \ \ for peridica de perodo 2L, integrvel e absolutamente integr-vel, ento a srie de Fourier de f pode ser escrita na forma

    ( ) /in x Lnn

    f x c e

    == , (2.50)

    com ( ) /1 0, 1, 2, 3,2

    Lin x L

    nL

    c f x e dx, nL

    = = " . (2.51)As equaes (2.50) e (2.51) mostram que se pode expandir uma funo em uma srie com-

    plexa, desde que a funo seja peridica com perodo 2L. A pergunta natural que aparece se

    podemos fazer a mesma coisa para uma funo que no seja peridica. razovel tentar re-

    presentar uma funo no peridica fazendo o perodo ( )L,L expandir-se para ( ), + . Vamos tentar esta idia a partir das equaes (2.50) e (2.51). Primeiramente, fazemos

    nn L = e 1n n L + = = . Logo, ( )1 2 2L = . Com essas mudanas, podemos reescrever as equaes (2.50) e (2.51) como seguem:

    ( ) ni xnn

    f x c e

    == (2.52)

    ( ) ( )12 2

    n n

    L Li x i u

    nL L

    c f x e dx f u e duL

    = = (2.53)Na Equao (2.53) mudamos a varivel de integrao x para a varivel de integrao u para

    evitar futuras confuses. Substituindo (2.53) em (2.52), temos

  • 44

    ( ) ( )( ) ( ) ( )

    ( ) ( )

    2

    12 2

    12

    n n

    n

    Li u i x

    n L

    Li x u

    nn nL

    nn

    f x f u e du e

    f u e du F

    f x F ,

    =

    = =

    =

    = = =

    =

    (2.54)

    onde ( ) ( ) ( ) 0, 1, 2,nL i x unL

    F f u e du e n=

    = " (2.55)Observe que a Equao (2.54) tem o aspecto formal de uma soma de Riemann. Lembrando

    que L = ,ento se L teremos que 0 e a Equao (2.54), se transforma em

    ( ) ( )12 n

    f x F d

    = . (2.56)

    A varivel n passa a ser uma varivel contnua, i.e., podemos suprimir o ndice n de . Neste caso, a Equao (2.55) passa a ser escrita como

    ( ) ( ) ( )i x uF f u e du

    = . (2.57)Substituindo (2.57) em (2.56) e rearranjando os termos, temos

    ( ) ( ) ( ) ( )

    ( ) ( ) ( )( ) ( )

    1 12 2

    1 12 2

    i x u

    i x i u i u i x

    i x

    f x F d f u e dud

    f x e d f u e du f u e du e d

    f x g e d ,

    = = = =

    =

    (2.58)

    onde ( )g dado por ( ) ( ) ( )1 1

    2 2i u i xg f u e du f x e dx.

    = = (2.59)

    ( )g a transformada de Fourier de ( )f x . A transformada de Fourier de ( )f x existe quando ( )f x for contnua por parte e for absolutamente integrvel em relao x.

    Exemplo: Encontre a transformada de Fourier de

    0( )

    0 0 k se x a

    f xse x ou x a

    <

  • 45

    ( ) ( )

    ( ) ( )0

    1 12 2 2

    12

    a i ai x i x

    i a

    k k eg f x e dx e dxi

    k eg

    i

    +

    = = = =

    Usando a transformada de f(x), podemos escrever f(x) como ( ) ( )1 .2

    i ai x

    k ef x e d

    i

    = 2.3 Velocidade de um pacote de onda

    Na seo 1.7 lidamos com a hiptese de De Broglie, ou seja, que as partculas apre-

    sentam um carter ondulatrio. Uma onda harmnica plana certamente no pode representar

    uma partcula, pois ela se espalha por todo o espao. Precisamos de uma onda que seja limi-

    tada no espao. Uma maneira de se fazer isso pela superposio de ondas planas com veto-

    res de ondas k ( k= k u e 2 =k ) prximos. Esta superposio chamada de pacote de onda e possui uma extenso espacial limitada com um mximo em ( )x t (Figura 2.5). Como visto anteriormente, a integral de Fourier pode ser usada para representar uma funo, mes-

    ma que ela no seja peridica. Um pacote de onda, resultado da superposio de ondas har-

    mnicas, pode ser representado por uma funo, digamos ( ),t r . Podemos usar a integral de Fourier para representar a funo ( ),t r :

    ( ) ( ) ( )i t,t F e d

    = k rr k k . (2.60)

    Na Equao (2.60), ( )F k a transformada de Fourier da funo ( ),t r dada por ( ) ( ) ( )1

    2i tF ,t e d

    = k rk r r . (2.61)

    Para facilitar nossa discusso, sem perca de generalidade, vamos supor que nosso pacote de

    onda se propaga na direo do eixo-x. Neste caso, pode-se retirar a notao vetorial da Equa-

    o (2.60):

    ( ) ( ) ( )i k x tx,t F k e dk

    = (2.62)

  • 46

    Figura 2.5 Representao esquemtica de um pacote de onda com mximo em ( )x t .

    Supondo que a partcula possa ser descrita por um pacote de onda (Figura 2.5), no

    podemos determinar com preciso a posio da partcula. Porm, razovel supor que a par-

    tcula esteja confinada dentro deste pacote de onda, havendo uma incerteza quanto a sua loca-

    lizao que determinada pela extenso do pacote. Se for verdade que a partcula est no

    pacote de onda, ento a velocidade da partcula deve ser igual velocidade do pacote. Na

    Figura 2.5, a velocidade do pacote na direo do eixo-x dada por

    ( )pacot e

    dx tdt

    = , (2.63)sendo pacot e a velocidade do pacote de onda. No ponto ( )x t o pacote tem um mximo. Nes-se ponto de mximo devemos ter ( ) 0x,t x = :

    ( )( )

    ( ) ( ) 0i k x t tx x t

    x,tF k ik e dk

    x

    =

    = = . (2.64)Derivando a Equao (2.64) em relao a t, temos

    ( ) ( )( ) 0i k x t t dxF k ik e ik i dkdt

    = ( ) ( )( )2 0i k x t tdxF k i k k e dk

    dt

    = (2.65)Na Equao (2.65), a freqncia angular ( k = ) funo de k, isto , ( )k = . De fato,

    2 2k k k = = = = = . (2.66) Os ks so prximos e tm valores nulos para valores afastados de certo valor central 0k , isto

    , os ks distribuem em torno de um valor central 0k . Nestas condies podemos expandir

    ( )k = em torno de 0k usando a srie de Taylor: ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )20 00 0 012!

    d k d kk k k k k k

    dk dk = + + +"

  • 47

    ( ) ( ) ( ) ( )00 0d kk k k kdk + (2.67)

    Substituindo (2.67) em (2.65), temos

    ( ) ( )( )

    ( ) ( ) ( ) ( ) ( )

    ( ) ( ) ( ) ( ) ( )

    ( ) ( ) ( ) ( )

    2

    020 0

    02 20 0

    0 02 2 20 0

    0

    0

    0

    i k x t t

    i k x t t

    i k x t t

    dxF k i k k e dkdt

    d kdxF k i k k k k k e dkdt dk

    d kdxF k i k k k k k e dkdt dk

    d k d kdxF k i k k k k k kdt dk dk

    = =

    + = +

    ( )

    ( ) ( ) ( ) ( ) ( )0 02 2 0 0

    0

    0

    i k x t t

    i k x t t

    e dk

    d k d kdxF k i k k k k e dkdt dk dk

    = =

    ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )0 02 2 0 0 0i k x t t i k x t td k d kdx F k i k e dk k k i F k ike dkdt dk dk

    = De acordo com o resultado da Equao (2.64) a segunda integral da Equao acima nula. A

    primeira integral da Equao acima no nula, pois a derivada segunda ( )2 2x,t x no ponto ( )x t . Logo, devemos ter

    ( ) ( ) ( ) ( )0 00 pacot edx t d k dx t d k dx dk dx dk = = = . (2.68)

    A Equao (2.68) descreve a velocidade do ponto de mximo do pacote de onda. Se o pacote

    mantm sua forma durante a propagao, ento podemos generalizar a Equao (2.68):

    ( )pacot e

    d kdk

    = , (2.69)que a velocidade de propagao do pacote ou grupo de onda. Com a hiptese de De Brogli-

    e, podemos estabelecer uma relao entre a energia (E) e a freqncia angular ( ) e entre o momento (p) e o vetor nmero de onda (k):

    2h hk hE h E

    k = = = = = == = , (2.70)1

    2h kp h h k p k = = = = == = . (2.71)

    Por outro lado, podemos escrever

  • 48

    2 2

    2cinm p dE pE

    2m dp m= = = , (2.72)

    part . part .pp mm

    = = . (2.73)Na Equao (2.73), part . a velocidade da partcula. Comparando as equaes (2.72) e (2.73) conclumos que a velocidade da partcula pode ser expressa por

    part .dEd

    =p

    . (2.74)

    Usando as equaes (2.70), (2.71) e (2.74), obtemos

    ( )part . pacot e

    ddE d dd d k dk dk

    = = = = == == =p . (2.75)A Equao (2.75) mostra que uma partcula livre move-se com a mesma velocidade

    de um pacote de ondas harmnicas. De acordo com a Equao (2.71), para termos preciso

    completa no momento, deve-se usar uma nica onda harmnica, a qual ocupar todo o espa-

    o, de tal forma que a posio da partcula fica totalmente indeterminada. Se quisermos a

    posio da partcula completamente determinada, o pacote de onda deve ter dimenses infini-

    tamente pequenas. Para construir um pacote desse tipo, devemos variar k de a + . Nesse caso, o momento seria completamente indeterminado. Essa anlise nos leva a pensar que deve

    existir uma relao inversa entre a preciso da posio e a preciso do momento da part-

    cula.

    2.4 Argumentos para se chegar equao de Schrdinger

    Nosso problema aqui como encontrar uma equao diferencial que descreva os esta-

    dos de uma partcula considerando o fato de que esta partcula apresenta um comportamento

    ondulatrio (princpio de De Broglie h p = ). Mais adiante, postularemos que a funo de onda de um sistema quntico completamente define seu estado dinmico. Portanto, o pro-blema central da teoria o seguinte: conhecendo a funo de onda ( ),t r de uma partcula em um instante 0t , todos os instantes futuros podero ser descritos pela funo ( ),t r . Para que isto seja factvel, deve-se conhecer a equao de propagao da funo de onda ( ),t r .

    Contudo, devemos ter em mente que tal equao no pode ser obtida a partir de algum

    processo dedutivo. Como geralmente acontece com as equaes da fsica matemtica, ela

  • 49

    deve ser postulada e sua justificativa dever ser fundamentada em resultados experimentais.

    Contudo, a escolha da equao de ondas restrita a algumas condies:

    I) A equao diferencial procurada deve ser linear e homognea em . Isto , se 1 e 2 so solues da equao, ento a combinao linear c11 + c22 tambm ser soluo. Desta maneira fica assegurado o fenmeno da superposio, bastante caracterstica das ondas em geral;

    II) A equao diferencial deve ser de primeira ordem em relao ao tempo, pois especificando para um dado instante inicial, toda evoluo futura fica definida de modo nico pela , de acordo com a hiptese de que o estado dinmico de um sistema fsico fica inteiramente definido uma vez que especificado.

    III) As previses da teoria devem coincidir com as previses da mecnica clssica no domnio em que a mecnica clssica vlida. Isto , a equao deve seguir as mesmas leis para o movimento do pacote de onda de acordo com a teoria de De Broglie no limite onde a apro-ximao da ptica geomtrica vlida. Isto sugere que a equao apresenta uma analogia formal com alguma equao da mecnica clssica (principio da correspondncia).

    Com estas consideraes em mente, poderemos obter a equao de Schrdinger de

    modo bastante natural.

    2.5 A equao de onda para uma partcula livre

    A teoria das ondas de matria de Louis De Broglie nos leva naturalmente obteno

    da equao de onda no relativstica para uma partcula livre. Primeiramente, vamos expres-

    sar a Equao (2.40) em termos do momento p e da energia E. Fazemos isto usando as rela-

    es p h = , E h= , 2k = e 2 = :

    2h h = = = = = =

    k pp k k , (2.76)

    2EE h h = = = = = = . (2.77)

    Usando as equaes (2.76) e (2.77) na Equao (2.40), temos:

    ( ) ( )0 0 0Eexp i t exp i t exp i - Et = = = == =pk.r r p r . (2.78)

    Consideremos agora, a funo ( ), t r formada pelas superposies de ondas planas mono-cromticas ( )exp i E t =p r , isto ,

  • 50

    ( ) ( ) ( ), i E tt F e d = i =p rr p p . (2.79)Na equao acima, a freqncia angular E = = est relacionada com o vetor de propagao ou vetor nmero de ondas = =k p atravs da relao 2 2E m= p , onde m a massa da par-tcula. ( )F p a transformada de Fourier da funo ( ), t r .

    Tomando as derivadas parciais em relao a t e depois em relao a p em ambos os

    lados da Equao (2.79) obteremos sucessivamente:

    ( ) ( ) ( ), i E ti t E F e dt

    = i == p rr p p , (2.80)( ) ( ) ( ), i E tt F e d

    i = i == p rr p p p , (2.81)

    ( ) ( ) ( )2 2 , i E tt F e d = i == p r2r p p p . (2.82)Usando a relao 2 2E m= p na Equao (2.82), obtemos

    ( ) ( ) ( )2 2 ,2

    i E tt E F e dm

    = i == p rr p p . (2.83)Comparando as Equaes (2.80) e (2.83), obteremos a Equao (2.84):

    ( ) ( )2 2, ,2

    i t tt m

    = == r r . (2.84)

    Esta a famosa equao de Schrdinger para uma partcula livre. Ela obedece s

    condies I, II e III descritas na seo 2.4. Alm disso, da maneira como foi obtida satisfaz o

    princpio da correspondncia, pois, formalmente, fizemos uma analogia com a mecnica

    clssica: a Equao (2.84) a transformao para a mecnica-quntica da equao clssica 2 2E m= p , onde a energia e o momento so traduzidos para a linguagem da mecnica qun-

    tica pelos operadores diferenciais atuando sobre a funo de onda ( ),t r de acordo com as regras de correspondncias:

    E i e pt i

    == . (2.85)

    Os operadores (2.85) foram obtidos usando Equaes (2.80