APOSTILHA PPP JUÁ

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Pedagogia

2010.1Projeto Poltico PedaggicoProfessor Rui Barreto da Silva CURSISTA: ___________________________________1

4 SEMESTREJaguaretama -Ce/2011.

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"O projeto da escola depende, sobretudo, da ousadia dos seus entes, da ousadia de cada escola em assumirse como tal, partindo da cara que tem, com o seu cotidiano e o seu tempoespao, isto , o contexto histrico em que ela se insere. Projetar significa lanar-se para a frente, antever um futuro diferente do presente. Projeto pressupe uma ao intencionada com um sentido definido, explcito, sobre o que se quer inovar."Moacir Gadotti

A educao do tamanho da vida! No h comeo. No h fim. S a travessia. E, se queremos descobrir a verdade da Educao, ela ter de ser descoberta no meio da travessia. A teoria e a prtica so inseparveis. Somente uma base terica bem slida fundamenta uma prtica realmente eficaz.Neidson Rodrigues

No h vento favorvel para aquele que no sabe para onde quer ir...3

ApresentaoPrezada(o) Aluna(o), Sua experincia no dia-a-dia j deve ter mostrado como importante todos os segmentos da escola (gestores, alunos, professores, funcionrios, pais) caminharem juntos, procurando resolver os problemas que aparecem e criando novas alternativas para a melhoria da educao oferecida comunidade. Trabalhar coletivamente, apesar de ser muito mais vantajoso para a escola como um todo, no uma tarefa sempre fcil. Mas pela ao coletiva que a escola se fortalece, revelando sua capacidade de se organizar e produzir um trabalho pedaggico de melhor qualidade. A escola precisa preocupar-se em atender s necessidades especficas da comunidade na qual est inserida, planejando seu trabalho a mdio e a longo prazo, com a finalidade de construir uma identidade prpria. Essa identidade tem um nome: projeto poltico-pedaggico. de sua construo coletiva que trataremos nesta disciplina. O Projeto Poltico-Pedaggico torna-se fundamental para a escola por ser o elemento norteador da organizao do seu trabalho, visando ao sucesso na aprendizagem dos alunos finalidade maior da escola como instituio social. Para comear faremos uma retomada da histria da escola no Brasil procurando analisar sua misso como instituio social que torna possvel o acesso ao saber sistematizado. O exame das origens da educao escolar no pas permite constatar a presena de uma escola que atende somente segmentos minoritrios da populao. De incio, o acesso era exclusivamente para os filhos das elites. Somente no sculo XX, por volta dos anos 30, essa situao comea a mudar. Nas ltimas dcadas, o esforo do poder pblico tem-se concentrado na expanso da escolaridade obrigatria para todas as crianas, estando hoje o acesso ao ensino fundamental praticamente universalizado. A escola brasileira, todavia, ainda enfrenta muitos problemas relativos qualidade. A disciplina analisa tambm o papel da escola na sociedade do conhecimento, apresentando alguns desafios para a educao na chamada "era da informao". Em sintonia com um contexto de amplas mudanas que acontecem na passagem do sculo, a escola chamada a responder a novas exigncias impostas pela modernidade. J no cabe escola apenas ensinar, uma vez que o conhecimento armazenado e transmitido facilmente em rede. Nesse cenrio, a escola chamada a incorporar os avanos advindos das novas tecnologias, sem perder de vista a sua especificidade: apresentar s novas geraes as formas de convivncia que tornam possvel a cidadania e o pleno desenvolvimento do ser humano. Analisaremos tambm o processo de construo coletiva do projeto pedaggico como instrumento importante para assegurar no s o sucesso da aprendizagem dos alunos como a sua permanncia numa Escola prazerosa e de qualidade. Buscaremos tambm compreender os princpios que levam conquista da autonomia pela escola, com base em aes compartilhadas por seus vrios atores, uma vez que projeto pedaggico e autonomia andam juntos. Estudaremos, ainda, como o projeto pedaggico pode orientar o trabalho da escola por meio de diversas formas de planejamento, todas elas integradas no dilogo e na busca de soluo dos problemas da escola com base na ao coletiva alunos, professores, gestores, pessoal tcnico-administrativo e de apoio, pais e comunidade local. Entretanto, importante ter em mente que a construo do projeto pedaggico no apenas uma obrigao legal a que a escola deve atender, mas uma conquista que revela o seu poder de organizao, procurando cada vez mais ter autonomia em suas decises. A conquista dessa autonomia importante porque a Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (LDB), de n 9.394/96, no s reconhece os estabelecimentos de ensino como espao legtimo para elaborao do seu projeto pedaggico como, tambm, assegura a participao dos profissionais da educao no desenvolvimento dessa tarefa. A transformao dessa autonomia assegurada pela legislao em uma autonomia construda pelos sujeitos da escola ser uma das reflexes que faremos nesta disciplina. claro que a construo desse projeto pela escola no pode ser feita por uma pessoa ou uma equipe, mas pelos vrios segmentos que dela fazem parte. Tambm algo que sofre influncias diversas do meio social no qual a escola se insere, de forma que os gestores precisam estar atentos para lidar o melhor possvel com os conflitos que aparecerem, porque eles relacionam-se aos interesses dos vrios segmentos presentes na instituio. Como voc pode perceber, o estudo desta disciplina muito importante, porque nele trataremos das possibilidades que a escola tem de organizar coletivamente o seu trabalho pedaggico, buscando cumprir, de forma democrtica, sua funo social.

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PLANO DE ENSINO

EmentaO aluno nesta disciplina identificar o papel da educao escolar e a questo do conhecimento no mundo contemporneo. A coordenao polticopedaggica do trabalho escolar. Princpios, contedos, mtodos, tcnicas, mdias e avaliao no projeto pedaggico, os conceitos de avaliao institucional e as estratgias de implementao.

Objetivo geralPerceber o projeto poltico-pedaggico da escola como uma ferramenta utilizada pela instituio escolar, para o cumprimento de seu papel social, atravs da construo coletiva do projeto poltico-pedaggico articulando-o s vrias formas de planejamento do trabalho da escola. .

Contedo ProgramticoMDULO 1: Porque importante conhecer o papel da escola no mundo contemporneo? MDULO 2: Como fica a escola na sociedade do conhecimento? MDULO 3: Porque construir coletivamente o PPP? MDULO 4: Que dimenses e princpios orientam o PPP? MDULO 5: Como construir coletivamente o Projeto Poltico-Pedaggico? MDULO 6: Como articular projeto Poltico-pedaggico e prtica pedaggica?

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SumrioAPRESENTAO................................................................................................03 PLANO DE ENSINO............................................................................................04 Ementa..............................................................................................................04 Objetivos.............................................................................................................................04 Contedo Programtico..................................................................................................04 MDULO 1: O papel da escola no mundo contemporneo e na sociedade do conhecimento...............................................................................................06 1.1. Como surgiu a escola?..............................................................................06 1.2. Por que no sculo XX as coisas comeam a mudar?.....................................08 1.3. Por que importante conhecer a legislao educacional?...........................11 1.4. O que nos revela o sculo XXI?.................................................................15 1.5 Que novas funes a sociedade do conhecimento exige da escola?..........17 MDULO 2: O Projeto Poltico-Pedaggico e a importncia de sua construo coletiva...........................................................................................21 2.1. O que Projeto Poltico-Pedaggico?.......................................................21 2.2. A autonomia da escola e suas dimenses....................................................... 24 2.3. Cotidiano escolar e desafios profissionais.........................................................27 2.4. A articulao teoria-prtica e a construo do PP.....................................33 2.5. Dimenses do projeto pedaggico......................................................................34 2.6. Princpios orientadores do Projeto Poltico-Pedaggico ...............................35 MDULO 3: Movimentos para a construo coletiva do Projeto Pedaggico?.......................................................................................................40 5.1. Metodologia e movimentos de construo do projeto pedaggico............40 5.2. Como fica a avaliao no processo de construo do PP?..........................50 MDULO 4: Como articular projeto pedaggico e prtica pedaggica? .............................................................................................................................55 6.1. Qual a relao entre planejamento e projeto pedaggico?.......................55 6.2. Qual a relao entre projeto pedaggico e OTE?............................................59 6.3. Qual a relao entre projeto pedaggico e prtica pedaggica?.................62 6.4. Qual a relao entre projeto pedaggico e avaliao institucional?...........63 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS.....................................................................696

1. Por que importante conhecer o papel da escola no mundo contemporneo?Objetivos especficos 1. Explicar o surgimento e o papel da escola no mundo moderno. 2. Comparar as condies de funcionamento da escola brasileira no passado e em nossos dias. 3. Indicar razes para aprofundar o estudo sobre a legislao educacional brasileira. Para compreender a funo social da escola, importante situ-la no mundo moderno, observando os mltiplos papis exercidos por ela ao longo do tempo. primeira vista, verificamos que, mesmo cumprindo a tarefa bsica de possibilitar o acesso ao saber, sua funo social apresenta variaes em diferentes momentos da histria, expressando diferenas entre sociedades, pases, povos e regies. Independentemente de suas modificaes no decorrer da histria, a escola foi a instituio que a humanidade criou para socializar o saber sistematizado. Isto significa dizer que o lugar onde, por princpio, veiculado o conhecimento que a sociedade julga necessrio transmitir s novas geraes. Nenhuma outra forma de organizao at hoje foi capaz de substitu-la. Para cumprir seu papel, de contribuir para o pleno desenvolvimento da pessoa, prepar-la para a cidadania e qualific-la para o trabalho, como definem a Constituio e a LDB, necessrio que suas incumbncias sejam exercidas plenamente. Assim, preciso ousar construir uma escola onde todos sejam acolhidos e tenham sucesso. No Brasil, desde o comeo de nossa histria, temos a forte tradio de uma escola para poucos. Essa situao comearia a mudar j no sculo XX, depois da Proclamao da Repblica. Ainda assim, por muito tempo, a escola exerceu (em alguns lugares ainda exerce) uma funo social excludente, ou seja: a escola atendia apenas uma pequena parcela a camada mais rica da populao. o que veremos ao estudar os ensaios de educao desde a origem aos nossos dias. A discusso sobre a funo social da escola nos encaminha para algumas perguntas fundamentais, como: _ Para que serve a escola? _ A que necessidades sociais e pessoais a escola atende? _ Como a escola responde a essas necessidades? Comecemos por algumas questes que sero foco desta Unidade: como surgiu a escola? Por que no sculo XX as coisas comeam a mudar? Por que importante conhecer a legislao educacional? Como surgiu a escola? A escola para crianas e jovens, como hoje a conhecemos, tem presena recente na histria da humanidade. verdade que, desde um passado bem remoto, existia a tarefa de transmitir s novas geraes o conhecimento sistematizado e as normas de convivncia consideradas necessrias aos mais jovens. J na Antigidade, tanto em Roma como na Grcia, a preocupao com a formao cultural daqueles que iriam constituir as camadas dirigentes estava presente. A educao dos meninos para a convivncia pblica e para a guerra era objeto de muita ateno. O ensino organizado em instituio prpria, todavia, comeou pelas universidades. Eram poucos os que tinham acesso s primeiras letras e formas elementares de aprendizagem,7

preparatrias para as universidades. Quando existia, a escola destinava-se apenas aos filhos das camadas mais ricas da populao. Foi apenas h cerca de 200 anos, com os ideais da Revoluo Francesa e da democracia americana, que a escola passou a ser compreendida como uma instituio importante, no apenas para os filhos das elites como para os filhos das camadas trabalhadoras. E por que essas mudanas polticas resultantes de movimentos revolucionrios tiveram influncia sobre a funo social da escola? Porque tanto a Revoluo Francesa como o movimento pela independncia dos Estados Unidos representaram mudanas na natureza dos processos de participao popular, rompendo com o modelo aristocrtico anterior. A partir desses importantes marcos polticos nos dois pases, a busca pela democracia intensificou-se. H uma ligao muito prxima entre escola e democracia. Por isso, costuma-se dizer que foi a partir de ento que comeou a longa luta para transformar uma escola para poucos em escola para todos. De l para c, muitas coisas mudaram, mas vamos por partes. Vejamos o que aconteceu no Brasil. Enquanto em outros pases, tanto na Europa (Frana, Inglaterra) quanto na prpria Amrica Latina, a exemplo da Argentina, a escola se expandia e o ensino fundamental atendia amplas camadas da populao, as coisas no Brasil se davam de forma muito diferente. Aqui, a educao permanecia como privilgio de poucos, muito poucos. As escolas, quando existiam, abrigavam os filhos das elites, de preferncia os homens. As mulheres mal apareciam na cena social. Tobias Barreto, defensor no passado da educao feminina, argumentava que as mulheres de famlias de elite (as nicas que tinham acesso instruo formal) recebiam alguma iniciao em desenho e msica e, quando muito, sabiam "gaguejar uma ou duas lnguas estrangeiras e ler as bagatelas literrias do dia", como disse em um ensaio sobre "A alma da mulher". Hoje as coisas mudaram. As mulheres esto em "todas". Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) de 1996 mostram que, se at os anos 80 os homens estavam em vantagem em termos de mdia de anos de estudo, essa posio se inverteu nos anos 90. No perodo de 1990 a 1996, a mdia de anos de estudo aumentou de 5,1 para 5,7, entre os homens; e de 4,9 a 6,0 para as mulheres o que significa que elas deram um salto de quase um ano, enquanto eles avanavam meio ano. Mas vamos nos deter um pouco mais sobre o passado, por enquanto. De maneira geral, pode-se dizer que, comeando com os jesutas, nossos primeiros educadores, houve desde o incio muito improviso em nossa educao, e a oferta de matrculas era precria. A Constituio do Imprio, outorgada pela Coroa em 1824, estabelecia que a instruo primria seria gratuita a todos os cidados. A situao educacional, porm, s veio a se modificar j na Repblica, no incio do sculo XX, por volta dos anos 20 e 30. At ento, as escolas, quando existiam, sobreviviam s custas de iniciativas isoladas. Esse era o caso das escolas que funcionavam na "casa da professora", situao de muitas das instituies pblicas. Havia excees, claro, o que em geral acontecia nas capitais ou em centros urbanos maiores. As escolas privadas, por sua vez, sempre foram destinadas s crianas e aos jovens cujos pais podiam arcar com seus custos. interessante observar que, mesmo nas escolas pblicas, como foi o caso do Colgio Pedro II, escola que serviu de modelo para muitas outras, criada na cidade do Rio de Janeiro (1837), ento capital do pas, a maioria dos estudantes pagava por seus estudos. Isso quer dizer que, embora se falasse em "instruo pblica" desde o incio de nossa histria, a educao pblica e gratuita, resultante de iniciativa do Estado, uma conquista da Repblica e, mais especificamente, do sculo XX. Ou seja: a compreenso do que significa educao pblica, assim como da funo social da escola, conceito que se modifica ao longo do tempo. Ao analisar o movimento da histria da educao, importante ter em mente8

a idia de que as instituies permanecem, mas vo se modificando continuamente. Porque, como diz a cano, "tudo muda, o tempo todo, no mundo"... Muda o mundo. Mudam as instituies. Mudam as pessoas. E voc sabe que tambm voc est mudando o tempo todo? Estudar algumas idias sobre a escola no passado e no presente representa uma importante competncia para a gesto escolar, que a capacidade de compreender o contexto e as relaes em que se desenvolve a prtica educativa. A escola onde cada um de ns trabalha no est solta no espao, mas articula-se com o movimento mais amplo e mais largo da histria da educao no mundo e, claro, no Brasil. Se nos situamos nesse mundo e nessa histria, mais facilidade temos de compreender o presente. E compreendendo-o, devemos buscar a mudana daquilo que pode ser mudado. Por que no sculo XX as coisas comeam a mudar? J foi dito que, embora a Repblica tivesse sido proclamada em fins do sculo XIX (1889), somente a partir dos anos 20 e 30 do sculo XX que as coisas comearam a mudar no campo educacional. Isso tem a ver com outras transformaes que acontecem na vida brasileira, algumas ocasionadas por fatores externos. Modificaes ocorrem nos campos poltico, econmico e cultural. A educao no escapa a esse movimento mais amplo que se d na sociedade. Voc, por acaso, se recorda de eventos e/ou datas importantes do perodo? Pense um pouco... Depois, confira no quadro a seguir: Dcadas de 20 e 30: eventos e datas importantes 1922 Semana de Arte Moderna 1929 Quebra da Bolsa de Nova York 1930 Revoluo de 1930 1932 Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova 1937 Incio do Estado Novo Desde o incio do sculo XX, mudanas significativas vm ocorrendo na sociedade brasileira, algumas das quais relacionadas aos eventos acima mencionados, os quais tiveram conseqncia sobre diferentes aspectos da vida brasileira: a cultura (Semana de Arte Moderna), a economia (Quebra da Bolsa de Nova York), a poltica (Revoluo de 1930 e Estado Novo) e a educao (Manifesto dos Pioneiros). Uma decisiva mudana nesse perodo o crescimento da importncia das cidades. At ento, o Brasil era um pas essencialmente voltado para a vida rural. O processo de urbanizao, o surgimento das primeiras indstrias, a emergncia das camadas mdias e a imigrao tm efeitos sobre o campo educacional. Reformas educacionais acontecem em diversos estados, como So Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Cear. Por trs dessas iniciativas esto educadores como Ansio Teixeira, Fernando de Azevedo e Loureno Filho, entre outros. Em 1932, divulgado o Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova, importante movimento que marcou a educao nacional. O Manifesto defende a idia de uma educao pblica, gratuita e laica para todos os cidados brasileiros. S que, entre os ideais expressos no Manifesto e a realidade, havia uma grande distncia. Para voc ter uma idia do contedo desse importante documento da educao brasileira, selecionamos uma passagem que trata justamente da funo social da escola. Embora a forma de escrever seja diferente da nossa, j que a passagem preserva a linguagem da poca, o Manifesto revela grande sintonia com temas que estamos discutindo em nossos dias, a exemplo da relao entre a escola e a famlia. Por enquanto, fiquemos com as palavras do texto produzido por um grupo de9

educadores idealistas, os quais sonhavam com uma educao participativa j em 1932. O papel da escola na vida e a sua funo social ...a escola, campo especfico de educao, no um elemento estranho sociedade humana, um elemento separado, mas "uma instituio social, um rgo feliz e vivo, no conjunto das instituies necessrias vida, o lugar onde vivem a creana, a adolescencia e a mocidade, de conformidade com os interesses e as alegrias profundas de sua natureza (...) Dessa concepo positiva da escola, como uma instituio social, limitada na sua aco educativa, pela pluralidade e diversidade das foras que concorrem ao movimento das sociedades, resulta a necessidade de reorganiz-la, como um organismo malleavel e vivo, apparelhado de um systema de instituies susceptiveis de lhe alargar os limites e o raio de aco (...) Cada escola, seja qual fr o seu gro, dos jardins s universidades, deve, pois, reunir em torno de si as familias dos alumnos, estimulando as iniciativas dos paes em favor da educao; constituindo sociedades de ex-alumnos que mantenham relao constante com as escolas; utilizando, em seu proveito, os valiosos e multiplos elementos materiais e espirituaes da collectividade e despertando e desenvolvendo o poder de iniciativa e o espirito de cooperao social entre os paes, os professores, a imprensa e todas as demais instituies directamente interessadas na obra da educao. Trechos extrados do Manifesto dos Pioneiros da Educao Nova No surpreendente que j na primeira metade do sculo XX houvesse pessoas sensveis a temas como a aproximao entre a escola, a famlia e outros parceiros, sendo que apenas em perodo muito recente essa articulao tenha comeado a ocorrer? Pois , caro(a) aluno(a)! Muitas vezes, as mudanas necessrias educao demoram a ser percebidas. Mas isso tambm est relacionado quantidade de pessoas que tm acesso escola. Nos anos 30, quando foi redigido o Manifesto, esse percentual era ainda bastante reduzido.

Embora bastante expressivo em relao ao passado, o crescimento da oferta de escolas nos anos 30 lento e representa uma quantidade de matrculas ainda pequena, em relao ao conjunto da populao. Nesse perodo, o sistema pblico comea a ultrapassar o particular, tanto em nmero de escolas quanto de matrculas. Parte das idias do movimento da Escola Nova incorporada Constituio de 1934, que estabeleceu a gratuidade e a obrigatoriedade do ensino primrio. Os anos 40 so prdigos em mudanas legais, organizando-se gradativamente os sistemas estaduais de ensino. Em 1961, tivemos a nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educao, de mbito nacional, a LDB (Lei n 4.024/61). Poucos anos depois, com as mudanas polticas ocorridas no pas, provocadas pela Ditadura Militar a partir de 1964, novas reformas viriam, com duas leis importantes para a educao:10

oferta da escolaridade obrigatria de quatro para oito anos, instituindo o ensino de 1 e 2 graus e propondo a profissionalizao do ensino. J nos anos 50, educadores denunciavam que ao aumento das oportunidades educacionais no correspondia melhoria da qualidade da educao. O crescimento ocorrido era insuficiente, do ponto de vista quantitativo, e a oferta apresentava problemas qualitativos. A escola, que antes servia apenas s elites, passa pouco a pouco a abrigar outras camadas da populao brasileira. As turmas passavam a ser mais numerosas. As instalaes escolares nem sempre comportavam essa expanso. Por sua vez, os professores viam-se diante de uma nova clientela, nem sempre estando preparados para a tarefa. Enfrentar essa mudana no foi fcil e teve efeitos importantes sobre os resultados produzidos pela escola. O ganho histrico foi que maior nmero de crianas passou a freqentar a escola. Seu sucesso, todavia, no era garantido. Pelo contrrio: no interior da escola comeou a se produzir uma cultura de fracasso escolar, resultando no aumento dos problemas relativos qualidade da educao. Este tema faz parte das preocupaes dos gestores escolares h dcadas, sendo objeto de ateno das polticas educacionais contemporneas. Todos esses problemas e muitos outros trouxeram para os dias de hoje uma srie de impasses. Em 1996, perto de 29 milhes de pessoas (28.525.815, para sermos mais precisos) na faixa de 7 a 14 anos estavam na escola. Este nmero parece elevado, mas preciso lembrar que, segundo mostrou a contagem da populao, realizada pelo IBGE, constatou-se que ainda havia 2,7 milhes de crianas dessa faixa etria fora da escola. uma situao que continua a nos envergonhar perante o mundo. Apesar do muito j realizado do ponto de vista da oferta escolar, como disse h alguns anos Bernadete Gatti, especialista em educao, o Brasil tem uma populao jovem, iletrada e em movimento. O pas est longe de poder afirmar que ns atingimos a igualdade de oportunidades de educao para todos. Ao lado dos problemas de acesso, preciso considerar o baixo rendimento de nossa escola. Excesso de repetncia e altos ndices de evaso tornam o sistema escolar um caminho lento e tortuoso para nossas crianas. Embora muitas permaneam na escola, poucas completam o ensino fundamental no tempo esperado. Grande parte do alunado vai sendo derrotada ao longo do percurso, gerando problemas adicionais em termos de fluxo escolar. Esta expresso refere-se ao tempo de passagem de um determinado grupo de alunos pela escola e os problemas gerados quando esse caminho interrompido. Os governos estaduais e municipais tm buscado responder a tais desafios por meio de programas como classes de acelerao e ciclos. Embora bem intencionados, nem sempre as respostas a essas iniciativas so as esperadas. Problemas tambm existem com relao ao magistrio, no qual, no raro, a convivncia entre m formao e baixos salrios inviabiliza a profissionalizao desejada. Como se v, os desafios vm do passado e se aprofundam no presente. Super-los significa saldar uma dvida histrica para com a nao. Como diz a nossa Constituio, a educao direito de todos e dever do Estado e da famlia, ser promovida e incentivada com a colaborao da sociedade (art. 205). Mudar a situao existente, portanto, uma tarefa de todos. Por que importante conhecer a legislao educacional? Voc, que desenvolve seu trabalho cotidiano numa escola, sabe que a educao brasileira est mudando. Sabe tambm que, cada vez mais, a educao11

A Lei n 5.540/68, que desencadeou a reforma universitria; e A Lei n 5.692/71, que reformou o ensino primrio e secundrio, ampliando a

ocupa as manchetes dos jornais. A populao reivindica escola para seus filhos porque esse um dos direitos sociais assim como a sade, o trabalho, o lazer, a segurana, a previdncia social, a proteo maternidade e infncia e a assistncia aos desamparados assegurados a todos os brasileiros pela Constituio de 1988 (artigo 6). A reflexo sobre a funo social da escola nos remete tanto Constituio como LDB. E por que isso? Porque os fins da educao brasileira esto definidos nestas duas leis. Na Constituio, esto expressos os princpios da Repblica Federativa do Brasil; os direitos e as garantias fundamentais dos cidados; as formas de organizao do Estado e dos Poderes (Legislativo, Executivo e Judicirio); a ordem econmica, financeira e social. Encontram-se tambm na Constituio as principais determinaes gerais sobre educao (captulo III, seo I, artigos 205 a 214). A LDB complementa a Constituio, reiterando os dispositivos constitucionais em seus ttulos introdutrios (Da Educao, Dos Princpios e Fins da Educao Nacional e Do Direito Educao e do Dever de Educar artigos 1 a 5), definindo as principais orientaes para a organizao da educao nacional e para a educao escolar em seus diferentes nveis. Como voc v, compreensvel a necessidade de conhecer a legislao educacional, da porque dedicamos uma parte da reflexo sobre escola e mundo contemporneo a este assunto. Antes de avanar na discusso sobre o tema central desta parte da Unidade, importante que voc guarde a idia da presena marcante da legislao no cenrio educacional brasileiro, como j vimos em passagens anteriores. preciso lembrar, entretanto, que as leis expressam apenas uma parte da histria educacional, retratando seus diferentes momentos. Muitas de nossas leis representam fruto de lutas de educadores em seus movimentos coletivos. Traduzem tambm e por vezes de forma autoritria, como ocorreu com a legislao do perodo da Ditadura a disposio dos governos de levar adiante um determinado projeto educacional. Devemos conhec-las, na medida em que contm as disposies gerais sobre a educao, assim como podem indicar avanos para a superao dos problemas que afetam a realidade escolar. Mas no podemos nos esquecer de que as mudanas em educao resultam de muitos outros aspectos, e no apenas da legislao. Isto posto, voltemos conversa, deixando com voc um lembrete que no pode ser deixado de lado: a Constituio de 1988 estabelece que a educao um direito de todos e um dever do Estado e da famlia. Sua finalidade o "pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua qualificao para o trabalho" (Constituio, artigo 205). A LDB retoma esse dispositivo, incluindo-o entre os Princpios e Fins da Educao Nacional (LDB, artigo 2). Agora o momento de refletir sobre as implicaes desses fins para a gesto escolar. Pense um pouco sobre o desafio dessa funo. A misso de cada escola, de cada gestor, de cada professor promover o pleno desenvolvimento do educando, preparando-o para a cidadania e qualificando-o para o trabalho. Atente para o significado dessa importante passagem da Constituio e da LDB, em que a expresso pleno desenvolvimento faz toda a diferena. Pleno desenvolvimento significa cuidar no apenas da tarefa de ensinar, mas de dar conta de muitas outras dimenses que fazem de cada pessoa um ser humano perfeito, completo e feliz. Imagine como a escola poderia ser diferente se, em cada momento de seu trabalho, cada membro da equipe escolar estiver concentrado sobre a finalidade fundamental de promover o pleno desenvolvimento do educando! Guarde essa idia com voc, mantendo-a em seu pensamento e em seu corao. Experimente pensar um pouco sobre as mudanas que poderiam acontecer em sua escola se todos levassem essa idia s ltimas conseqncias.12

Uma indicao de que as coisas esto comeando a mudar diz respeito ao fato de que a nova LDB traz um conjunto de dispositivos prprios sobre as funes da escola. Na verdade, a primeira vez em que uma lei de educao define atribuies especficas para os estabelecimentos de ensino, no quadro da organizao nacional. A Lei n 9.394/96 estabelece incumbncias para a Unio, os estados, os municpios e tambm para as escolas e os docentes. Voc j parou para ler o artigo da LDB que se refere s atribuies da escola? Provavelmente sim. Alis, muito provvel que os assuntos de que estamos tratando nesta Unidade no apresentem novidades para voc. Se este o caso, procure se lembrar de que, quando lemos ou estudamos alguma coisa pela segunda vez, temos a possibilidade de estabelecer novos vnculos com o conhecimento j adquirido, de construir novas aprendizagens. Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, tero a incumbncia de: I Elaborar e executar sua proposta pedaggica; II Administrar seu pessoal e seus recursos materiais e financeiros; III Assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aula estabelecidos; IV Velar pelo cumprimento do plano de trabalho de cada docente; V Prover meios para a recuperao de alunos de menor rendimento; VI Articular-se com as famlias e a comunidade, criando processos de integrao da sociedade com a escola; VII Informar os pais e responsveis sobre a freqncia e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execuo de sua proposta pedaggica. Uma das principais caractersticas da LDB a flexibilidade. Com ela, as escolas tm autonomia para prever formas de organizao que permitam atender s peculiaridades regionais e locais, s diferentes clientelas e necessidades do processo de aprendizagem (art. 23). Do mesmo modo, so previstas formas de progresso parcial (art. 24, III), acelerao de estudos para alunos com atraso escolar, aproveitamento de estudos e recuperao (art. 24, inciso V, b, d, e). Essas e outras medidas tm por objetivo promover uma cultura de sucesso escolar para todas as crianas. Tudo isso o que est na lei. Mas, como j disse algum, "a lei... ora, a lei!". Apesar do que est contido na legislao, muitas vezes as leis no so cumpridas e mesmo no compreendidas. A cultura escolar pode caminhar em outras direes cada escola inventa a sua histria, a sua identidade. Assim, a funo social da escola algo que se expressa em muitas dimenses, da porque nesta unidade tratamos de um amplo conjunto de temas que se articulam mutuamente e que sero abordados em seus mltiplos aspectos.

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2. Como fica a escola na sociedade do conhecimento?Objetivos especficos No final desta Unidade, voc dever ter alcanado os seguintes objetivos especficos: 1. Identificar as principais caractersticas da educao na chamada sociedade do conhecimento. 2. Relacionar as conseqncias dessas caractersticas para uma gesto escolar em sintonia com a contemporaneidade. Vimos na unidade anterior que, ao longo da histria, a escola tem exercido uma funo social bsica de transmisso do saber sistematizado. Verificamos tambm que as formas de transmisso variam de sociedade para sociedade e ao longo do tempo em cada uma delas. No Brasil de hoje, assim como em muitos outros pases democrticos, a funo da escola bsica de transmitir o saber sistematizado no um fim em si mesmo, mas o "meio para atingir a finalidade de desenvolver o educando de maneira plena, de preparar-lhe para o exerccio da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores" (LDB, art. 22). Est claro, todavia, que tais finalidades no se alcanam sem o trabalho com o saber sistematizado, expresso na organizao do currculo de cada escola. A formao bsica do educando se faz a partir dos contedos estudados e compreendidos. Ou seja: na escola bsica, como em qualquer outro nvel de ensino, forma (formao) e contedo vo juntos. Se essas so as finalidades e a funo social da escola, avaliar uma escola verificar como ela realiza essas atribuies para todas as crianas e jovens dos 6 aos 18 anos, cumprindo os nove anos do ensino fundamental e os trs do ensino mdio (e/ou profissional), sem perder aluno algum. Vimos que o ideal de todos na escola, defendido por numerosos educadores brasileiros h muitas dcadas e inscrito nas principais leis do pas, ainda no foi totalmente atingido em muitas escolas e regies por vrios motivos. Os dados numricos histricos apresentados mostram uma histria educacional excludente, na qual parte expressiva da nossa populao, em geral a mais pobre, no freqentou a escola na idade adequada. Apenas nas ltimas dcadas, e mais expressivamente nos ltimos anos, que o nmero de matrculas de crianas e jovens em idade escolar comeou a crescer. Esse processo de crescimento das matrculas escolares foi denominado de democratizao do acesso escola, indicando que crianas filhas de pais mais pobres, antes excludas, estavam finalmente entrando na escola bsica e nela permanecendo. Entretanto, logo se verifica que grande parte desses alunos, apesar de chegarem escola, no conseguiam sucesso dentro dela, sendo reprovados continuamente e/ou abandonando-a. Constata-se uma dificuldade da escola em lidar com esses alunos, sendo muitos os fatores atribudos a esse fenmeno, todos contendo uma parcela de razo: condies de funcionamento das escolas (instalaes, equipamentos e material didtico, por exemplo), baixos salrios e m formao dos professores, organizao da escola (pouco flexvel, no atendendo s especificidades da clientela), m gesto, inadequada definio dos conhecimentos curriculares e/ou do ensino etc. Em cada regio ou localidade, esses e outros fatores conduziram aos precrios resultados de aprendizagem dos alunos que permaneciam na escola. Tal situao levou a ser definida hoje, como prioridade no discurso pedaggico, a busca pela melhoria da qualidade do ensino. Esse discurso cobra da escola no s bons resultados de aprendizagem dos alunos como tambm a adequao do que ela ensina, tendo em vista as mudanas que se processam na civilizao mundial e na sociedade brasileira.14

De todas essas questes, estamos, nesse incio de um novo sculo e milnio, com a dupla tarefa de resolver, ao mesmo tempo, problemas de ontem (acesso e permanncia) e de hoje (qualidade de ensino). possvel que, pensando a escola necessria para o atual momento civilizador, possamos propor solues para resolver os problemas que se acumularam. Por onde comear a pensar a escola necessria para o sculo XXI? Tendo como objetivo geral a visualizao dessa escola, nesta Unidade refletiremos sobre as caractersticas do mundo atual. O que nos reserva o sculo XXI? Autores diferenciam os perodos da humanidade a partir das mudanas nas caractersticas centrais do modo de produo dominante e nos grandes ciclos econmicos. Assim, num primeiro longo momento da humanidade, que perdurou at aproximadamente meados do sculo XVIII, o trabalho prioritrio dos homens para a sustentao da vida baseou-se na agricultura. Operando sobre a terra e sob a lgica dos ciclos da natureza (dia e noite; primavera, vero etc.), os homens plantavam e colhiam os alimentos que sustentavam todos, sem necessitar de instrumentos sofisticados ou de alta tecnologia. Desse modo, logo que era iniciado no trabalho agrrio, um jovem rapidamente dominava o modo de realiz-lo. Nesse perodo, possuir grande quantidade de terra era um indicador fundamental de riqueza e de poder de uns homens sobre os outros. O segundo momento da humanidade com relao ao modo de produo iniciase com a Revoluo Industrial, que teve na mquina a vapor dos irmos Watt, na segunda metade do sculo XVIII, seu marco inicial, e desenvolvimento surpreendente a partir do sculo XIX, com o descobrimento das leis da eletricidade. O trabalho industrial liberta-se das leis cclicas da natureza e passa a depender do tempo linear do relgio. Dia e noite so igualmente tempo de trabalho. Por outro lado, o domnio das mquinas demanda maior tempo de aprendizagem por parte do trabalhador, assim como reciclagens constantes para acompanhar as transformaes que ocorrem regularmente na sua constituio e tecnologia. A lgica da produo em srie divide as vrias fases de construo de um produto, cada trabalhador tornando-se mais e mais especializado, muitas vezes sem dominar ou mesmo conhecer todo o ciclo dessa produo. O capital, assim como o lucro que gera a partir da mais-valia obtida com a compra do trabalho dos operrios, o fator principal da produo. O terceiro momento da humanidade relativo ao modo de produo inicia-se na segunda metade do sculo XX, com base, sobretudo, nas mudanas profundas e constantes que ocorrem na tecnologia e nos meios de comunicao. As informaes acumulam-se e se modificam de maneira rpida e constante, exigindo de um trabalhador reciclagem contnua e domnio de conhecimentos tanto especficos quanto gerais. Tendo em vista a facilidade de comunicao, outra caracterstica desse modo de produo que comea a se delinear a de que em muitos casos o local de trabalho no necessita ser o mesmo para todos os empregados de uma empresa. O grfico mostrado a seguir, de Richard Oliver (1999, p. 16), sintetiza esses trs perodos da humanidade com relao ao modo de produo dominante.

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importante assinalar que o aspecto dominante de um modo de produo em um determinado perodo no acaba com os modos de produo antecedentes, mas os influencia. Assim, a agricultura e a indstria continuam a existir, mas tm sua tecnologia influenciada pela tecnologia da informao e pelos meios de comunicao hoje dominantes. De fato, atualmente, assistimos a mudanas profundas ocorrendo na sociedade e mesmo na vida privada das pessoas a partir dos avanos dessa nova tecnologia e dos novos meios de comunicao. Por um lado, verificamos que os conhecimentos sistematizados no esto mais reunidos unicamente nas bibliotecas, nem o acesso a eles se d apenas nas salas de aula. Devido aos avanos tecnolgicos e referentes informao no mundo contemporneo, o conhecimento circula em complexas redes, sendo veiculado no apenas pelos meios tradicionais de comunicao (rdio, jornais, revistas, televiso etc.) como tambm pelo computador e, sobretudo, pela internet. Pensar a escola e sua funo social nesse novo contexto significa pensar tambm sua relao com esses equipamentos e meios de comunicao. Ainda que em muitos lugares esses equipamentos no estejam disponveis no local de trabalho, necessrio que os profissionais da educao estejam cientes de que, hoje, a relao das pessoas com o saber sistematizado passa por muitas outras alternativas e fontes de conhecimento, alm da escola. Por outro lado, a criao de novos conhecimentos nunca foi to acelerada como hoje, provocando a necessidade de rever continuamente o j sabido, reorganizando em novas bases todo o saber acumulado. No acompanhar esse movimento passa a representar uma desvantagem para as pessoas e para os setores nos quais atuam. Essas caractersticas relacionadas ao saber velocidade de criao e renovao, acesso mltiplo e contnua exigncia por atualizao levaram alguns autores a nomear o atual momento da civilizao no apenas como era da informao, mas como sociedade do conhecimento. Uma sociedade do conhecimento clama por uma nova escola, por um novo jeito de ensinar e de aprender. De um jovem, essa sociedade cobrar no somente um diploma ou o mero domnio dos equipamentos modernos e de algumas tecnologias, mas a excelncia do seu conhecimento. Dominar o uso de equipamentos e das novas tecnologias necessrio, mas no suficiente. Nessa direo, afirma um desses estudiosos:16

No se trata aqui apenas de usar a qualquer preo as tecnologias, mas acompanhar conscientemente e deliberadamente uma mudana de civilizao que recoloca profundamente em causa as formas institucionais, as mentalidades e a cultura dos sistemas educativos tradicionais e notadamente os papis de professor e aluno. Lvy, 1999, p. 172

Caro aluno possvel que todas essas questes postas no cenrio da civilizao moderna estejam deixando voc, como ns, como muitos, atnitos. De fato, para uma grande parte das pessoas existe um fosso entre essa tendncia e a realidade vivida. As diferenas existentes na nossa sociedade e nas diferentes regies brasileiras faz com que em muitos lugares seja difcil acompanhar todas essas mudanas da civilizao. Mesmo quando professores submetem-se a programas de formao, a defasagem persiste. Que papel cabe escola num contexto como esse? Aqui interessante lembrar o que diz Emlia Ferreiro, ao discutir "A revoluo da informtica e os processos de leitura/escrita":A escola, sempre depositria de mudanas que ocorrem fora de suas fronteiras, deve pelo menos tomar conscincia da defasagem entre o que ensina e o que se precisa fora de suas fronteiras. No possvel que continue privilegiando a cpia ofcio de monges medievais como prottipo de escrita, na poca da xerox e cia. Ptio, 1999, p.62

Adiante conversaremos mais a respeito do papel da escola na sociedade do conhecimento, retomando essas questes colocadas por Emlia Ferreiro. Por enquanto, vamos refletir a respeito da sua situao, frente a esse panorama da sociedade do conhecimento. As profundas e rpidas mudanas que ocorrem no atual momento da civilizao tm levado muitas pessoas a experimentarem, com freqncia, insegurana e mal-estar, sentindo-se desajustadas. Um caminho produtivo para enfrentar com menos sofrimento e desgaste esse momento certamente passa: a) pela melhor compreenso das prprias mudanas; e b) por maior clareza a respeito das atitudes mais adequadas para enfrent-las, quer na vida privada, quer na profissional. Que novas funes a sociedade do conhecimento exige da escola? A mudana de civilizao, apontada por Pierre Lvy, sinalizada pelo aumento a cada dia da dependncia dos pases, dos governos, das empresas e dos indivduos em relao ao conhecimento. A cincia sempre gerou novos campos e domnios do saber, e hoje a tecnologia tem multiplicado as suas aplicaes e a informtica tambm tem potencializado a divulgao rpida do conhecimento elaborado. Nessa direo, o Papa Joo Paulo II assim se pronuncia na encclica Centesimus Annus, de 1991: "Se antes a terra e depois o capital eram os fatores decisivos da produo, (...) hoje o fator decisivo , cada vez mais, o homem em si, ou seja, seu conhecimento." O conhecimento hoje entendido como um valor especial, mais at do que bens materiais. No passado, a grande maioria dos pais queria principalmente deixar terras, patrimnios e riquezas materiais como herana a seus filhos; hoje, muitos percebem que o melhor a oferecer propiciar conhecimentos, por meio de uma boa formao geral, e maneiras de continuar adquirindo mais conhecimentos, num processo de educao permanente. De fato, em meio s incertezas que o atual momento tende a despertar, num ponto a maioria dos autores parece estar de acordo: a importncia do conhecimento para todos os indivduos, sobretudo o jovem, para enfrentar o presente e o futuro.17

Essa nova relao das pessoas com o conhecimento traz duas conseqncias para a escola brasileira. Uma refora a importncia da escola e de sua funo social nesse momento, j que ela ainda a porta de entrada da maior parte da populao para o acesso ao mundo do conhecimento. De fato, vivemos um perodo no qual a informao est, a um s tempo, disponvel como nunca esteve e, contraditoriamente, inacessvel a grandes parcelas da nossa populao. Estudiosos da era da informao, como Manuel Castells, tm observado que a globalizao marginaliza povos e pases que tm sido excludos das redes de informao. H uma tendncia de concentrao nas economias avanadas de produo entre as pessoas instrudas na faixa de 25 a 40 anos. Segundo a Organizao das Naes Unidas (ONU), apenas 5% da populao esto inseridos no mundo digital. A internet est criando um abismo entre os mais ricos e os mais pobres (Manuel Castells, 2000). A outra conseqncia, aliada perspectiva democratizadora que j consideramos, a necessidade de a escola repensar profundamente a respeito de sua organizao, sua gesto, sua maneira de definir os tempos, os espaos, os meios e as formas de ensinar ou seja, o seu jeito de fazer escola. Temos de jogar fora as roupas velhas e tornar a vestir a escola, a partir da essncia sua funo social que permanece: ensinar bem e preparar os indivduos para exercer a cidadania e o trabalho no contexto de uma sociedade complexa. Para a escola pblica, tais reflexes representam uma oportunidade de reconhecer que as mudanas necessrias no sistema educacional so urgentes e demandam esforo coletivo de todos que fazem educao (profissionais, governos e sindicatos), assim como da sociedade como um todo. A concepo das novas atribuies da educao e, conseqentemente, da funo social da escola tem sido bastante debatida. Nos anos 90, por exemplo, a Unesco (rgo da Organizao das Naes Unidas para a Educao, a Cincia e a Cultura) instituiu a Comisso Internacional sobre a Educao para o Sculo XXI, que veio a produzir um relatrio no qual a educao concebida a partir de princpios que constituem os quatro pilares da educao: Aprender a conhecer significa no tanto a aquisio de um vasto repertrio de saberes, mas o domnio dos prprios instrumentos do conhecimento. Supe aprender a aprender, exercitando os processos e habilidades cognitivas: ateno, memria e o pensamento mais complexo (comparao, anlise, argumentao, avaliao, crtica). Aprender a fazer exprime a aquisio no somente de uma qualificao profissional, mas de competncias que tornem a pessoa apta a enfrentar variadas situaes e trabalhar em equipe. Aprender a fazer envolve, assim, o mbito das diferentes experincias sociais e de trabalho. Aprender a conviver quer dizer tanto a direo da descoberta progressiva do outro e da interdependncia quanto a participao em projetos comuns. Aprender a ser significa contribuir para o desenvolvimento total da pessoa: esprito e corpo, inteligncia, sensibilidade, sentido esttico, responsabilidade pessoal, capacidade para se comunicar, espiritualidade. Significa tambm a pessoa aprender a elaborar pensamentos autnomos e crticos e formular seus prprios juzos de valor, no negligenciando nenhuma de suas potencialidades individuais. A educao assim concebida indica uma funo da escola voltada para a realizao plena do ser humano, alcanada pela convivncia e pela ao concreta, qualificadas pelo conhecimento. Historicamente, as escolas se preocuparam mais em desenvolver as duas primeiras aprendizagens (aprender a conhecer e aprender a fazer); h que se preocupar tambm com as duas ltimas (aprender a conviver e aprender a ser). Todavia, sobre esses elementos de sustentao ou pilares, h que se construir uma escola. Essa construo demanda uma travessia que geralmente se inicia pela passagem do mbito dos princpios para o de um projeto pedaggico, e18

deste para as prticas e aes dos educadores. E essa travessia pressupe uma reflexo de todos os envolvidos sobre todas as decises que do forma a uma escola, desde as relativas ao currculo, passando pelas relacionadas aula e s metodologias, at as que se referem gesto escolar. Tendo em vista as mudanas profundas que ocorrem no mbito da civilizao lembradas nesta Unidade e entendendo o currculo como uma trajetria de formao dos alunos, cuidado especial deve ser dado definio dos contedos escolares. Eles constituem pea importante para ser colocada sobre os pilares de sustentao acima descritos. Nenhum currculo pode fixar-se por muito tempo. Deve haver um repensar constante sobre sua contemporaneidade, ou seja, sua atualidade e sua adequao ao que est acontecendo no mundo real. Os alunos precisam de conhecimentos que lhes sirvam para melhor entender a sociedade global e melhor conviver e agir em sua comunidade e no seu trabalho. As Diretrizes Curriculares Nacionais para a educao bsica, divididas em trs documentos (educao infantil, ensino fundamental e ensino mdio), so um ponto de partida para o debate. Essas diretrizes, discutidas e votadas no Conselho Nacional de Educao, para cumprir o que est disposto no artigo 9 da LDB, norteiam os currculos e contedos mnimos a serem propostos em todas as escolas, de modo a garantir uma formao bsica comum a todos os brasileiros. Porm, em termos de conhecimentos, h muito mais o que discutir e decidir no mbito de cada escola, alm do que est exposto nas Diretrizes Nacionais, para atender s especificidades de sua clientela, de sua localidade, de seus profissionais e das suas condies de trabalho. A boa conduo do debate a respeito da definio dos contedos escolares e de todas as demais questes relativas trajetria de formao dos alunos depende significativamente da ao do gestor escolar. Assim, podemos acrescentar aos pilares definidos pela ONU (Organizao das Naes Unidas) os seguintes, para os gestores: 1. Aprender a conhecer o mundo contemporneo e relacion-lo s demandas de cada escola (sua clientela, seus sonhos, suas necessidades, seus direitos, seus profissionais, sua vizinhana, suas condies etc.). 2. Aprender a planejar e fazer (construir, realizar) a escola que se quer (o seu projeto pedaggico). 3. Aprender a conviver com tantas e diferentes pessoas, definindo e partilhando com elas um projeto de escola. 4. Aprender a utilizar, sem medo, as prprias potencialidades de crescimento e de formao contnua.

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ATIVIDADES1. Algumas heranas da escola brasileira Nesta unidade, conversamos um pouco sobre o surgimento de nossa escola e da funo social que cumpriu ao longo da histria. O desenvolvimento do sistema escolar brasileiro teve algumas caractersticas marcantes. Para verificar se essas idias foram assimiladas, solicitamos que voc observe atentamente as sentenas apresentadas, indicando no espao assinalado entre parnteses se elas so falsas (F) ou verdadeiras (V): a) ( ) No Brasil, como em todos os outros pases da Amrica Latina, a escola teve um nascimento tardio. b) ( ) O crescimento da rede escolar pblica uma conquista da Repblica, j no sculo XX. c) ( ) A legislao brasileira e a realidade educacional sempre caminharam na mesma direo, contribuindo para o crescimento e a melhoria do sistema escolar. d) ( ) Por muito tempo, as escolas sobreviveram custa de solues precrias e improvisadas. e) ( ) As mulheres nem sempre tiveram o mesmo acesso que os homens educao escolar. Hoje, entretanto, a presena da populao feminina na escola superior masculina. 2. Incumbncias da escola na nova LDB Uma das razes para se compreender a nova legislao que ela diz respeito a atribuies prprias da escola no novo contexto legal. Assim, considerando as novas definies da LDB, vistas nesta parte, indique se as proposies a seguir so falsas (F) ou verdadeiras (V): a) ( ) A proposta pedaggica uma incumbncia da escola, sendo a responsabilidade pela sua elaborao uma tarefa exclusiva da direo. b) ( ) O rendimento e a freqncia das crianas devem ser informados aos pais. c) ( ) O cumprimento do plano de trabalho dos professores uma tarefa a ser administrada pela escola e pelas Secretarias de Educao. d) ( ) A integrao entre a escola e a comunidade um dispositivo importante a ser considerado pelo estabelecimento escolar. e) ( ) A administrao financeira e de pessoal tambm uma incumbncia a ser compartilhada com o sistema pela escola.

3. A respeito da compreenso sobre o que mudou ou est mudando, como voc localizaria e identificaria essas mudanas? Assinale na seqncia a seguir a afirmao que melhor caracteriza tais mudanas: a) As mudanas ocorrem em diferentes reas, no s no mbito das tecnologias da comunicao; no caso da escola, as mais importantes esto na rea da legislao e das normas administrativas. b) As mudanas acontecem fundamentalmente no interior da rea pedaggico-educacional e so influenciadas por novos dados ou tecnologias de trabalho, como a utilizao dos indicadores educacionais, desde os institucionais at os de rendimento dos alunos, coletados de diferentes formas. c) As mudanas aparecem indiscriminadamente na sociedade como um todo e devem-se nova fase da humanidade, ou seja, a era da comunicao. Para acompanhar essas mudanas, o mais importante a fazer privilegiar a aprendizagem do manejo do computador para professores e, depois, para os alunos. d) As mudanas mais visveis se do no campo das tecnologias da informatizao e da comunicao, que interferem em todas as reas de conhecimento, tanto na velocidade de sua produo/criao quanto nas suas conseqncias para a populao.

4.A respeito das maneiras de enfrentar as dificuldades de mudana, algumas atitudes podem sermelhores do que outras. Assinale as suas provveis atitudes ou pensamentos, entre as seguintes: a) A superao de tantas mudanas no se d de repente. H um perodo e um processo adequados, que para mim so muito longos e trabalhosos; j sou velha(o) para isso. b) Procurarei buscar parceiros para a caminhada projetada ou a ser projetada. c) Discutirei com meus colegas a respeito dos sentimentos de ansiedade, medo, descrena etc. que acompanham um processo novo de aprendizagem. Por exemplo: o incio da aprendizagem do uso do computador deixa cada um de ns se sentindo analfabeto. d) No vou me expor muito e s darei conta de minha tarefa especfica, o que j muito. Tentar alguma coisa nova pode levar ao erro ou mostrar incompetncia, o que desconfortvel. Os outros vo pensar que no sou suficientemente capaz ou inteligente.

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3. Por que construir coletivamente o projeto pedaggico?Objetivos especficos 1. Conceituar Projeto Poltico-Pedaggico. 2. Identificar as dimenses bsicas autonomia na escola bem como distinguir a autonomia legal da autonomia construda pelos sujeitos de sua escola. 3. Propor a elaborao do projeto pedaggico a partir da sua realidade escolar. 4. Justificar a importncia do trabalho coletivo na construo do projeto pedaggico. O que projeto poltico pedaggico? Projeto: uma prxis determinada, considerada em suas ligaes com o real, na definio concretizada de seus objetivos, na especificao de suas mediaes. a inteno de uma transformao do real, guiada por uma representao do sentido desta transformao, levando em considerao as condies reais e animando uma atividade. Projeto vem do latim projectu, particpio passado do verbo projicere, que significa lanar para adiante. Significa ainda, segundo o dicionrio Aurelio, plano, intento, desgnio; empresa, empreendimento; redao provisria de lei; plano geral de edificao. J Projeto Politico-Pedaggico o plano global da instituio. Pode ser entendido como a sistematizao nunca definitiva de um processo de planejamento participativo, que se aperfeioa e se concretiza na caminhada, que define claramente o tipo de ao educativa que se quer realizar. um instrumento terico-metodolgico para a interveno e para a mudana da realidade. um elemento de organizao e integrao da atividade prtica da instituio nesse processo de transformao. O Projeto Poltico-Pedaggico envolve, tambm, a construo coletiva de conhecimento. Ao construirmos os projetos de nossas escolas, planejamos o que temos inteno de fazer, de realizar. Lanamo-nos para adiante, com base no que temos, buscando o possvel. Isso antever um futuro diferente do presente. Nas palavras de Gadotti(1997): Todo projeto pressupes rupturas com o presente e promessas para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado confortvel para arriscar-se, atravessar um perodo de instabilidade em funo da promessa que cada projeto contm de estado melhor do que o presente. Um projeto educativo pode ser tomado como promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam visveis os campos de ao possvel, comprometendo seus atores e autores. Nessa perspectiva, o Projeto Poltico-Pedaggico vai alm de um simples agrupamento de planos de ensino e de atividades diversas. O projeto no algo que construdo e, em seguida, arquivado ou encaminhado s autoridades educacionais como prova do cumprimentos de tarefas burocrticas. Ele construdo e vivenciado em todos os momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo da escola. O processo de construo do projeto, portanto, dinmico e exige esforo coletivo e comprometimento de todos os envolvidos; desse modo, no se resume elaborao de um documento escrito por um grupo de pessoas para que se cumpra uma formalidade. concebido solidariamente com possibilidade de sustentao e legitimao. Desse modo, o Projeto Poltico-Pedaggico, ao se constituir em processo democrtico de decises, dever preocupar-se em instaurar uma forma de organizao do trabalho pedaggico que supere os conflitos, buscando eliminar as relaes competitivas, corporativas e autoritrias. Rompendo com a rotina do mando impessoal21

e racionalizado da burocracia que permeia as relaes no interior da escola, diminui os efeitos fragmentrios da diviso do trabalho que refora as diferenas e hierarquiza os poderes de deciso. A principal possibilidade de construo do PPP passa pela relativa autonomia da escola, de sua capacidade de delinear sua prpria identidade. Isso significa resgatar a escola como espao pblico, lugar de debate, de dialogo, fundado na reflexo coletiva. Assim, preciso entender que o PPP da escola dar indicaes necessrias organizao do trabalho pedaggico, que inclui o trabalho do professor na dinmica interna da sala de aula. Faz-se necessrio, contudo, que o gestor escolar conhea a lei de Diretrizes e bases da Educao nacional LDB (Lei n 9394/96 de 20 de dezembro de 1996) e tome conscincia de que, a partir da promulgao da lei, a construo do PPP passou a ser de responsabilidade das escolas. No Ttulo II, inciso VIII do artigo 3, a referida lei j garante, nos seus princpios gerais, a gesto democrtica do ensino pblico, na forma dessa lei e da legislao dos sistemas de ensino, mas no inciso I do artigo 14, que fica garantida a participao dos profissionais da educao na elaborao do projeto pedaggico da escola. O Projeto Poltico-Pedaggico o planejamento geral da escola. Ele define as aes dentro da unidade escolar, apontando as linhas de procedimento de todos os envolvidos com a questo educacional. Desde os procedimentos mais simples, como a definio de salas e turmas, ate a democratizao participativa da gesto escolar, passando por toda organizao curricular. Duas caractersticas marcam o PPP: o engajamento de todos na sua produo e a adequao realidade social da qual faz parte. Na qualidade de plano geral, o Projeto Poltico-Pedaggico s pode ter legitimidade na medida em que rene as expectativas, os interesses e as vozes de todos os segmentos que compem o coletivo escolar, comumente constitudo por alunos, pais, professores, pedagogos, merendeiras, auxiliares, enfim, a comunidade interna e externa da escola. O importante que cada um, de acordo com a funo que ocupa, contribua na construo do PPP. Somente com a participao de todos que pode haver cumplicidade e, portanto, graus efetivos de co-responsabilidade pelo funcionamento e pela eficincia de um projeto que de todos. Por outro lado, tambm necessrio que os agentes da escola reflitam sobre a crise paradigmtica que a atinge, apontando para ela e questionando a funo social da escola e seu papel como instituio numa sociedade caracterizada pela globalizao da economia, das comunicaes, da educao e da cultura, pelo pluralismo poltico e pela emergncia do poder local. preciso entender como isso se traduz na escola. Outro ponto importante o discurso de autonomia, cidadania e participao no espao escola, que vem ganhando fora sobretudo pela reinvidicao de um PPP prprio da escola. Para isso, necessrio que todos os envolvidos nesse processo se perguntem sobre qual a importncia do PPP, seu significado, bem como as dificuldades, obstculos e elementos facilitadores de sua elaborao. Nesse contexto, so muitas as questes. Comeamos esclarecendo o prprio titulo: Projeto Poltico-Pedaggico. Entendemos que todo projeto pedaggico necessariamente poltico. Poderamos denomin-lo, portanto, apenas projeto pedaggico, mas, a fim de dar destaque ao poltico junto ao pedaggico, ele est sendo denominado poltico-pedaggico. Um Projeto Poltico-Pedaggico afirma o institudo da escola que sua histria, que o conjunto dos seus currculos, dos seus mtodos, o conjunto dos seus atores internos e externos e o seus modo de vida. No se constri um projeto sem uma22

direo poltica, um norte, um rumo, por isso todo projeto da escola tambm poltico. De quem a responsabilidade pela constituio do projeto da escola? O projeto da escola no responsabilidade apenas de sua direo. Ao contrario, numa gesto democrtica, a direo escolhida a partir do reconhecimento da competncia e da liderana de algum capaz de coordenar, executar um projeto coletivo. Assim, ao indicarmos ou elegermos um diretor de escola, o que estamos legitimando um projeto para a escola. Cada escola resultado de um processo de desenvolvimento de suas prprias contradies. No existem duas escolas iguais. A gesto democrtica exige uma mudana de mentalidade de todos os membros da comunidade escolar. Mudana que implica deixar de lado o velho preconceito de que a escola pblica apenas uma instituio burocrtica do Estado e no uma conquista da comunidade. A gesto democrtica da escola implica a participao e a responsabilidade do seu gerenciamento por seus usurios. Desse modo, todos estaro envolvidos no processo e no apenas meros receptores dos servios educacionais. Na gesto democrtica, pais, alunos, professores, funcionrios e membros do Conselho da escola, assim como a comunidade em geral, assumem sua parte de responsabilidade pelo projeto da escola. Vale lembrar que o diretor faz parte do processo, mas cabe a ele coordenar o processo de gesto da escola. Para Gadotti(1997) existem, certamente, algumas limitaes e alguns obstculos instaurao de um processo democrtico como parte do Projeto PolticoPedaggico da escola. Entre eles, o autor destaca: a) a nossa pouca experincia democrtica; b) a mentalidade que atribui aos tcnicos e apenas a eles a capacidade de planejar e governar e que considera o povo incapaz de exercer o governo ou incapaz de participar de um planejamento coletivo em todas as suas fases. c) a prpria estrutura de nosso sistema educacional que vertical; d) o autoritarismo que impregnou nossa pratica educacional; e) o tipo de liderana que tradicionalmente domina nossa atividade poltica no campo educacional. Lembra, tambm, que o PPP da escola apia-se: a) no desenvolvimento de uma conscincia crtica; b) no envolvimento das pessoas: comunidade interna e externa escola; c) na participao e na cooperao das varias esferas de governo: d) na autonomia, na responsabilidade e na criatividade como processo e como produto do projeto. Um Projeto Poltico-Pedaggico constri-se de forma interdisciplinar. Projetar significa lanar-se para frente, antever um futuro diferente do presente. Todo projeto supe rupturas com o presente e promessas para o futuro. Outra questo apontada pelo autor diz respeito ao tempo a ser considerado na noo de projeto que implica: Tempo poltico define a oportunidade poltica de um determinado projeto; Tempo institucional cada escola encontra-se num determinado tempo de sua histria; o projeto que pode ser inovador para uma escola pode no o ser para outra; Tempo escolar de acordo com o calendrio da escola, o perodo no qual o projeto elaborado tambm decisivo para o seu sucesso; Tempo para amadurecer as ideias s os projetos burocrticos so impostos e, por isso, revelam-se ineficientes em mdio prazo. H um tempo para sedimentar ideias; um projeto precisa ser discutido, e isso leva tempo. O Projeto Poltico-Pedaggico da escola dever ter como princpio bsico o processo de conscientizao e de exerccio de cidadania; dever, portanto, constituirse em um processo de recuperao da funo social da escola e, por conseqncia, da necessidade do planejamento na educao.23

O PPP exige uma profunda reflexo sobre as finalidades da escola, assim como a explicitao de seu papel social e a clara definio de caminhos, formas operacionais e aes a serem empreendidas por todos os envolvidos com o processo educativo. Tal projeto precisa ser concebido com base nas diferenas existentes entre seus autores, sejam eles professores, equipe tcnico-administrativa, pais, alunos e representantes da comunidade local. , portanto, fruto de reflexo e de investigaes coletivas, tais como: Como ocorrem no interior da escola e das salas de aula as relaes pedaggicas? Como concebido, executado e avaliado o currculo escolar? Quais atitudes, valores e crenas so perseguidos? Quais as formas de organizao do trabalho pedaggico? Tais dados servem para clarificar as questes prioritrias e propor alternativas de soluo. Quanto organizao do trabalho escolar, voltamos a mencionar a LDB (Lei 9394/06) em seu artigo 12, I, lembrando que esta legislao prev que os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, tero a incumbncia de elaborar e executar sua proposta pedaggica. Esse preceito legal est sustentado na idia de que a escola deve assumir, como uma de suas principais tarefas, o trabalho de refletir sobre sua intencionalidade educativa. Nunca demais acrescentarmos que para que ocorra a definio do PPP com o indispensvel embasamento terico metodolgico, h necessidade de pesquisas, estudos, reflexes e discusses com professores, especialistas em educao, alunos, ex-alunos, determinando o caminho desse processo. Outro fato importante o de que a legitimidade do PPP est devidamente ligada ao grau e ao tipo de participao de todos os envolvidos com o processo educativo da escola, o que requer continuidade de aes. A autonomia da escola e suas dimenses Dando continuidade nossa reflexo, pensemos na autonomia da escola, como uma questo importante para o delineamento de sua identidade, isso porque a autonomia anula a dependncia. necessrio que tenhamos a autonomia e a gesto democrtica da escola como parte da prpria natureza do ato pedaggico. A gesto democrtica da escola , portanto, uma exigncia de seu PPP. Assim sendo, no podemos entender autonomia como um valor absoluto, fechado em sim mesmo, mas como um valor que resultado e, portanto, determinado por interaes estabelecidas por grupos socais. A autonomia , pois, questo fundamental numa instituio educativa envolvendo quatro dimenses bsicas, relacionadas e articuladas entre si: administrativa, jurdica, financeira e pedaggica. As diferentes dimenses da autonomia so interdependentes. A autonomia administrativa consiste na possibilidade de elaborar e de gerir seus planos, programas e projetos. Refere-se organizao da escola e nela destacase o estilo de gesto, a direo como coordenadora de um processo que envolve relaes internas e externas, ou seja, com o sistema educativo e com a comunidade na qual a escola est inserida. A autonomia administrativa representa um espao de negociao permanente por parte dos atores mais diretamente envolvidos. pela participao, pela interveno e pelo dilogo que a autonomia se constri e internalizada. A autonomia jurdica diz respeito possibilidade de a escola elaborar suas prprias normas e orientaes escolares, como, por exemplo, no que diz respeito matrcula, transferncia de alunos, a elaborao de provas, avaliao de trabalhos acadmicos.24

A autonomia financeira refere-se existncia de recursos financeiros capazes de dar instituio educativa condies de funcionamento efetivo. Atualmente a escola publica vem recebendo recursos financeiros que cabe equipe de gesto escolar administrar. A autonomia financeira pode ser total ou parcial. total quando a escola administra todos os recursos a ela destinados pelo Poder Pblico. parcial quando a escola administra apenas parte dos recursos repassados, mantendo-se no rgo central do sistema educativo a gesto de pessoal e as despesas de capital. A autonomia pedaggica consiste na liberdade de ensino e de pesquisa. Est estreitamente ligada identidade, funo social, clientela, organizao curricular, avaliao, bem como aos resultados e, portanto, essncia do projeto pedaggico da escola. Diz respeito s medidas essencialmente pedaggicas, necessrias ao trabalho de elaborao, desenvolvimento e avaliao do PPP, em consonncia com as polticas pblicas vigentes e as orientaes dos sistemas de ensino. Quando falamos em autonomia pedaggica, bom considerar que opo terica que subsidia as relaes pedaggicas deve ter um carter progressista que atenda s necessidades da prtica social tomando-as como ponto de partida, compromissada em solucionar os problemas da educao, do currculo e do processo ensino-aprendizagem da escola. Escola, autonomia e projeto pedaggico na Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional Lei 9.394/96 Como voc sabe, as leis so fontes de esperana mas no fazem milagres, visto que a realidade social no muda por um simples passe de mgica. Nesse sentido, elas so pontos de partida para que a realidade seja repensada e que, com base em sua aplicao, avanos sejam alcanados. A lei mxima do nosso sistema educacional reflete um processo e um projeto poltico para a educao brasileira. chamada de Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional (n 9.394/96) porque estabelece: As diretrizes que definem os princpios, as finalidades, as intenes e os objetivos da educao brasileira. As bases referentes aos nveis e s modalidades de ensino, aos processos de deciso, s formas de gesto e s competncias e responsabilidades relativas manuteno e ao desenvolvimento do ensino no pas. Na LDB, destacam-se trs grandes eixos diretamente relacionados construo do projeto pedaggico. Veja quais so eles: Flexibilidade Avaliao LiberdadeVincula-se autonomia, possibilitando escola organizar o seu prprio trabalho pedaggico. Refora um aspecto importante a ser observado nos vrios nveis do ensino pblico (artigo 9, inciso VI). Expressa-se no mbito do pluralismo de idias e de concepes pedaggicas (artigo 3, inciso III) e da proposta de gesto democrtica do ensino pblico (artigo 3, inciso VIII), a ser definida em cada sistema de ensino.

Considerando esses trs grandes eixos, a LDB reconhece na escola um importante espao educativo e nos profissionais da educao uma competncia tcnica e poltica que os habilita a participar da elaborao do seu projeto pedaggico. Nessa perspectiva democrtica, a lei amplia o papel da escola diante da sociedade, coloca-a como centro de ateno das polticas educacionais mais gerais e sugere o fortalecimento de sua autonomia. Vejamos a seguir como a LDB delega aos sujeitos que fazem a escola a tarefa de elaborao do projeto pedaggico.25

Art. 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, tero a incumbncia de: I elaborar e executar sua proposta pedaggica. (...) VII informar os pais e responsveis sobre a frequncia e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execuo de sua proposta pedaggica. Art. 13. Os docentes incumbir-se-o de: I participar da elaborao da proposta pedaggica do estabelecimento de ensino. (...) II elaborar e cumprir o plano de trabalho, segundo a proposta pedaggica do estabelecimento de ensino. Art. 14. Os sistemas de ensino definiro as normas da gesto democrtica do ensino pblico na educao bsica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princpios: I participao dos profissionais da educao na elaborao do projeto pedaggico da escola; II participao das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. Veja como importante a tarefa apresentada escola e aos seus profissionais em relao construo do projeto pedaggico! claro que o fato de a lei determinar que cada escola construa o seu projeto pedaggico uma condio necessria, mas no suficiente para o exerccio pleno da autonomia. E voc sabe por qu? Porque preciso fazer surgir, dessa autonomia garantida pela lei, uma outra construda na escola que estimule e assegure a participao de gestores, professores, pais, alunos, funcionrios e representantes da comunidade local na discusso do trabalho pedaggico, numa perspectiva mais ampla. Ao orientar suas prticas para o fortalecimento de sua prpria autonomia, a escola pode construir o seu conceito de qualidade de ensino e adequar melhor a sua funo s necessidades da comunidade. Nesse sentido, organizando o seu trabalho pedaggico, a escola avana para outro nvel de autonomia, mais solidrio e com mais dilogo, que pode levar os segmentos a se envolver no processo de forma mais efetiva, pelas aes desenvolvidas no cotidiano escolar. A temos, de fato, uma autonomia gerada pelas prticas da prpria escola. Quando a escola capaz de construir, implementar e avaliar o seu projeto pedaggico, ela propicia uma educao de qualidade e exerce sua autonomia pedaggica. Ao exercer essa autonomia, a escola, consciente de sua misso, implementa um processo compartilhado de planejamento e responde por suas aes e seus resultados. Essa autonomia construda objetiva ampliar os espaos de deciso e participao da comunidade atendida pela escola, criando e desenvolvendo instncias coletivas como os conselhos escolares ou equivalentes previstas no art. 14 da LDB. verdade que a autonomia assegurada pela LDB tambm resultado de um processo de construo social, uma vez que essa lei produto da discusso de muitos educadores e de outros segmentos da sociedade. Mas a autonomia da escola efetivamente construda, na medida em que resulta da ao dos sujeitos locais e no da determinao legal. claro que quando a autonomia da escola aumenta, tambm cresce o seu nvel de responsabilidade em relao comunidade na qual ela est inserida. Trata-se de uma relao diretamente proporcional: nesse sentido que podemos dizer que a autonomia na escola ocorre medida que existe tambm a capacidade de a instituio assumir responsabilidades, tornando-se mais competente no seu fazer pedaggico. Em outras palavras, a escola mais autnoma quando mostra-se capaz "(...) de responder por suas aes, de26

prestar contas de seus atos, de realizar seus compromissos e de estar comprometida com eles, de modo a enfrentar reveses e dificuldades" (Helosa Luck, 2000, p.11). bem possvel que, ao ler essas palavras, voc esteja pensando: qual o papel do gestor no processo de elaborao do projeto pedaggico da escola, visando ajudar na construo de sua autonomia? Apesar de a resposta a essa questo no ser muito fcil, pode-se afirmar que tal tarefa no se esgota no mbito da competncia legal; ela mais complexa. Trata-se de coordenar o processo de organizao das pessoas no interior da escola, buscando a convergncia dos interesses dos vrios segmentos e a superao dos conflitos deles decorrentes. Nesse sentido, o seu papel como gestor assemelha-se ao de um maestro que coordena uma orquestra para que tudo saia no tom certo, com base na colaborao do conjunto dos msicos.O educador ou o coordenador de um grupo como um maestro que rege uma orquestra. Da coordenao sintonizada com cada diferente instrumento, ele rege a msica de todos. O maestro sabe e conhece o contedo das partituras de cada instrumento e o que cada um pode oferecer. A sintonia de cada um com o outro, a sintonia de cada um com o maestro, a sintonia do maestro com cada um e com todos o que possibilita a execuo da pea pedaggica. Essa a arte de reger as diferenas, socializando os saberes individuais na construo do conhecimento generalizvel e para a construo do processo democrtico. Freire, in: Aguiar, 1999, p.115

Podemos concluir que a construo coletiva do projeto pedaggico deve ocorrer visando, antes de tudo, instalao de uma autonomia construda e dialogada na escola, e no meramente para cumprir um dispositivo legal. Essa autonomia, sim, deve ser criada em torno de um projeto educativo que vise, primordialmente, melhoria da qualidade do ensino e ao sucesso da aprendizagem do aluno. Essa a razo que torna importante a construo do projeto pedaggico. preciso entender que as leis no mudam a realidade como um toque de mgica, devendo ser vistas mais como pontos de partida para os indivduos pensarem suas prprias condies e transform-las. Por isso, no basta a LDB (Lei n 9.394/96) atribuir aos estabelecimentos de ensino a tarefa de elaborar o projeto pedaggico; preciso que a escola, no confundindo autonomia com soberania, encontre alternativas tericas e prticas para mostrar aos seus segmentos a importncia de outra autonomia: construda, solidria e dialogada. A autonomia significa a capacidade de a escola decidir o seu prprio destino, porm permanecendo integrada ao sistema educacional mais amplo do qual faz parte. Nesse sentido, ela no tem a soberania para se tornar independente de todas as outras esferas nem para fazer ou alterar a prpria lei que define as diretrizes e bases da educao como um todo. Cotidiano escolar e desafios profissionais Transformar em atividade Iniciaremos esta parte da Unidade por algo que muito familiar a voc: o dia-adia da escola. Nesse sentido, gostaramos de convid-lo a pensar sobre o fazer escolar, como gestor, porque ele ser o material bsico de nosso estudo. Pretendemos nos aproximar, por meio das relaes vivenciadas na escola, do desejo de mudana, da vontade de inovar que vai se mostrando na sala dos professores, nos horrios vagos, nas conversas entre os professores nos pontos de nibus e em outras situaes parecidas. Aquele desejo que ainda no tem nome, mas que junta as pessoas em torno de possibilidades e de esperanas. Ao assumirmos o papel de gestores de uma escola, nos defrontamos com uma srie de situaes conflitantes e imprevisveis que, na maioria das vezes, nos fazem perder a direo, pois passamos o dia tentando27

resolver problemas de diversas naturezas. Lembrando-se disso, veja como a ao de um gestor de escola relatada no fragmento a seguir: 7h05min Organizei a entrada do turno, busquei o microfone e o equipamento de som para cantarmos uma cano (o que se repete todos os dias) e ajudei a organizar as filas para ir com as professoras para as salas de aula. 7h15min No final da cano, quatro filas permaneceram no ptio porque as professoras ainda no haviam chegado. 7h20min Uma professora chega, mas tem de passar suas matrizes de textos no mimegrafo. Pedi que ela fosse com a turma para a sala de aula, porque que eu resolveria o problema. 7h30min Chega mais uma professora. Ainda tive de providenciar atividades para duas outras turmas, levando-as para assistir, na biblioteca, a um vdeo sobre ecologia. 8h Estavam me aguardando trs pais de alunos para conversar, mas eu ainda tinha que rodar as matrizes. Enquanto atendia os pais, chegaram vrias correspondncias, as quais eu deveria assinar. Num dos envelopes estava escrito projeto pedaggico. 9h A professora manda um aluno pegar as folhas mimeografadas. Explico a ela que, to logo consiga rodar as matrizes, eu levaria as cpias classe. 9h30min Aps o intervalo, seis alunos so encaminhados para conversar com a direo, devido a um problema de disciplina gerado durante o intervalo. Ainda tenho que ver o que fazer com as duas turmas que continuam sem professora. 10h Deixo que as duas turmas fiquem jogando bola no ptio, mas sem perturbar os professores. Ainda tive que redigir, rodar e distribuir, antes do final do horrio, um bilhete avisando sobre o recesso que se aproxima. 11h Distribuo nas salas de aula os bilhetes sobre o recesso. Volto para ver a correspondncia, abro o envelope e leio: "Como promover a construo coletiva do projeto pedaggico?" Ouo um tumulto no ptio: os alunos que terminaram as avaliaes esto sendo dispensados pelos professores antes do trmino do horrio (mesmo sabendo que isso no permitido). Sigo com as turmas sem professores para a sala de aula e ficamos aguardando o sinal. Quase me esqueci de que hoje o meu dia de dar o sinal...Amanh espero poder fazer alguma coisa... Certamente, ao analisar esse relato do dia de trabalho de um gestor escolar, voc deve ter se identificado com algumas das situaes descritas. Na verdade, o dia de trabalho relatado apresenta pontos em comum com o cotidiano de muitos gestores, por isso passamos a consider-lo normal e presente, muitas vezes, na grande maioria de nossas escolas, ainda que de forma angustiante. Considerando isso, vamos analisar a necessidade da elaborao do projeto pedaggico com base na realidade educativa e nos desafios profissionais vivenciados pelos gestores. Por exemplo: um desafio enfrentado pela maioria das escolas consiste em descobrir como compatibilizar as diretrizes do sistema de ensino mais amplo e as propostas e as necessidades da comunidade escolar. Reconhecer a equipe gestora como articuladora e coordenadora do trabalho pedaggico a ser desenvolvido no cotidiano escolar implica, hoje, afirmar que ela seja ativa na organizao do trabalho pedaggico. Nesse sentido, uma pergunta que o gestor escolar pode fazer a si mesmo a seguinte: "Como articular um projeto pedaggico de escola, se muitos segmentos ainda tm dificuldade em pensar solues para os desafios cotidianos vividos na escola?" Observa-se que, muitas vezes, esse gestor ainda costuma chamar outro profissional (da esfera regional de ensino ou seus assessores) para resolver os problemas em seu lugar, no verdade? Para mudar essa realidade, inicialmente, necessrio identificar os desafios cotidianos, o que pode ser feito mediante a investigao da prpria ao desenvolvida28

pela escola. Essa investigao possibilita aos profissionais a identificao dos desafios prticos, vividos diariamente na escola. Alm disso, ajuda a diferenciar aqueles de natureza individual daqueles de carter profissional, possibilitando equipe gestora o acompanhamento das interaes que os diversos sujeitos mantm nesse espao, do uso que fazem dos recursos disponveis, de suas formas de reflexo e suas propostas de ao. Mas como o gestor pode identificar tais desafios? Isso pode ser feito de diversas formas, como, por exemplo, pelo registro sistemtico da prpria ao. Recorrendo a esse tipo de registro, possvel ao indivduo desenvolver a conscincia individual da sua experincia, identificando os desafios de sua ao no que se refere ao que pensa e diz sobre sua prtica. Assim, esse tipo de registro permite identificar o pensamento dos profissionais, de modo que eles reflitam sobre sua atuao profissional, proporcionando um retorno de sua prtica por meio do acompanhamento da evoluo dos seus desafios profissionais. Em dimenso mais ampla, possibilita a anlise dos registros da prpria ao, ou seja, aqueles desafios de natureza coletiva. Mas como podemos fazer isso? Vejamos uma sugesto. O que fazer O registro sistemtico e organizado da prpria ao desenvolvida pela escola. Como fazer Identificando os desafios cotidianos. Agrupando os desafios de acordo com a sua natureza: pedaggicos, administrativos, financeiros etc. Diferenciando desafios coletivos de desafios individuais. Analisando os seguintes aspectos: por que permanece, como se relacionam, quais suas consequncias etc. O trabalho coletivo e a construo do projeto pedaggico Vimos, no item anterior, como os gestores lidam com problemas de diversas naturezas no cotidiano escolar. Esses problemas so desafiadores e precisam ser discutidos pelo coletivo da escola, o qual, por sua vez, bastante heterogneo. E por que esse coletivo heterogneo? Porque ele formado por diversos segmentos: professores, gestores, pessoal tcnico-administrativo e de apoio, alunos, pais e/ou responsveis e representantes da comunidade local que possuem conhecimentos, idias e valores diferentes que podem gerar conflitos. Por isso, bom lembrar que o trabalho de construo do projeto pedaggico no um processo todo harmnico, sem conflitos. Ao contrrio: um processo que apresenta conflitos, existindo nele interesses de segmentos divergentes. Mas exatamente essa diversidade de segmentos que torna o seu processo de construo rico e dinmico, pois em funo dessa interao que surge o coletivo da escola.

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O coletivo da escola estrutura o seu trabalho visando assegurar, acima de tudo, o sucesso dos alunos e o atendimento das necessidades educativas de sua comunidade. Entretanto, precisamos reconhecer o conflito como algo positivo, que ajuda no crescimento do coletivo. Nesse sentido, o conflito pode ser percebido como algo que enriquece o grupo e o leva, pelo dilogo, a buscar solues compartilhadas para os problemas que enfrenta. Da mesma forma que o mundo social constitudo por indivduos e segmentos que esto em constante interao, assim como por confrontos que dizem respeito aos seus interesses, na escola tambm temos situaes de conflito que devem ser trabalhadas pelos gestores, de forma a no se perder a viso de grupo e de ao compartilhada. Pela sua experincia, voc j deve ter observado que a escola sofre, no seu dia-a-dia, interferncias internas relativas aos vrios segmentos que convivem em seu interior e externas, como as de natureza poltica, principalmente quando ela est situada em reas de disputa pelo poder local. Ao basear seu trabalho na discusso coletiva, a escola pode melhorar a qualidade dos servios que presta comunidade e estimular aes compartilhadas entre os seus membros, visando realizao de sua maior tarefa: a construo do seu Projeto Poltico-Pedaggico. Esse projeto pedaggico precisa do trabalho coletivo nos vrios momentos de sua elaborao, com o objetivo de assegurar aes solidrias entre os sujeitos da escola. Por isso, antes de discutir a concepo propriamente dita de projeto pedaggico, interessante refletir sobre a importncia do trabalho coletivo para a busca de uma viso compartilhada na escola. Veja como o texto a seguir chama a nossa ateno para essa questo. Sobre gansos e equipes Quando voc v gansos voando em formao de V, pode ficar curioso quanto s razes pelas quais eles escolhem voar dessa forma. A seguir, apresentamos algumas constataes feitas por pesquisadores em relao a esse fato.Fato medida que cada ave bate suas asas, ela cria uma sustentao para a ave seguinte. Voando em formao V, o grupo inteiro consegue voar pelo menos 71% a mais do que se cada ave voasse isoladamente. Sempre que um ganso sai da formao, ele Verdade Pessoas que compartilham uma direo comum e um senso de equipe chegam ao seu destino mais depressa e facilmente porque se apiam na confiana de cada uma em relao s outras. Existe fora, poder e segurana em grupo 30

repentinamente sente a resistncia e o arrasto de tentar voar s e, de imediato, retorna formao para tirar vantagem do poder de sustentao da ave sua frente. Quando o ganso lder se cansa, ele reveza, indo para a traseira do V, enquanto outro assume a ponta. Os gansos de trs grasnam para encorajar os da frente a manter o ritmo e a velocidade. Quando um ganso adoece ou se fere e deixa o grupo, dois outros gansos saem de formao e o seguem, para ajud-lo e proteg-lo. Eles o acompanham at a soluo do problema e, ento, reiniciam a jornada os trs ou juntam-se a outra formao, at encontrar o seu grupo original.

quando se viaja na mesma direo com pessoas que compartilham um objetivo comum. vantajoso o revezamento de lideranas quando se necessita fazer um trabalho rduo. Todos precisam do apoio ativo e do encorajamento dos companheiros. A solidariedade nas dificuldades imprescindvel em qualquer situao.

O projeto pedaggico sempre parte do que j existe na escola e prope outros significados sua realidade. Em funo disso, ele se torna, ao mesmo tempo, um dever e um direito da escola: Um dever por se tratar do elemento responsvel pela vida da escola em seu tempo institucional. Um direito porque, por meio dele, a escola consolida sua autonomia e os seus vrios atores podem pensar, executar e avaliar o prprio trabalho.

4. Que dimenses e princpios orientam o projeto pedaggico?A articulao teoria-prtica e a construo do projeto pedaggico Voc j parou para pensar como importante no trabalho pedaggico a coerncia entre o pensar e o fazer? Pois , este um pressuposto fundamental no processo de compreenso de qualquer realidade! Ao procurar retratar a realidade da escola como um todo, o projeto pedaggico nunca est pronto e acabado, assumindo um carter contnuo e inconcluso. Assim, ao representar a constante transformao do cotidiano da escola, esse projeto precisa procurar relacionar a teoria prtica, compreendendo a prtica a partir da teoria e realizando a prtica com base na teoria. Nessa discusso, a prtica que a escola desenvolve fundamental, devendo ser objeto de reflexo por todos os seus segmentos. Entretanto, esta reflexo no pode ocorrer no vazio, mas