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APRESENTAÇÃO · uniforme. A política criminal democrática de ultima ratio restringe a aplicação do direito penal e de seus institutos aos casos mais necessários. Atualmente

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APRESENTAÇÃO

O Congresso de Pesquisa de Ciências Criminais tem por objetivo construir

um novo espaço para a difusão de conhecimento com apresentação de pesquisas

recentes no campo das ciências criminais. Apresentaram propostas

pesquisadores/as, mestres/as e doutores/as vinculado/as ou não a instituições

de ensino e centros de pesquisa, além de bacharéis e estudantes de pós-

graduação em Direito e em demais áreas das Ciências Sociais.

Em 2018, acontece o II CPCRIM buscando ampliar a discussão sobre os

temas de ciências criminais e propiciar um ambiente de construção teórica

conjunta, além de fomentar a ampliação da rede de contatos entre

pesquisadoras e pesquisadores em linhas de pesquisas semelhantes.

A edição atual do CPCRIM está dividida em 12 (doze) Grupos de Trabalho:

1. Dogmática jurídico-penal: teorias contemporâneas; 2. Direito Penal

Econômico; 3. Crime e Pena; 4. Prova Penal e Estado Democrático de Direito; 5.

Pena, prisão e encarceramento; 6. Desafios do Processo Penal Brasileiro; 7.

Segurança Pública e Seletividade; 8. Gênero, sexualidade e relações raciais na

justiça criminal; 9. Justiça juvenil; 10. Democratização do Sistema de Justiça. A

ampliação e alteração dos temas e das ementas de cada Grupo de Trabalho em

relação a primeira edição, onde havia apenas 9 GTS, reflete uma avaliação da

coordenação a partir dos trabalho recebidos anteriormente e do estado atual do

debate acadêmico nas Ciências Criminais, possibilitando que o Congresso

alcance a amplitude dos temas e as principais discussões da atualidade.

Este primeiro documento é uma apresentação dos resumos recebidos e

aprovados para o II CPCRIM, o qual precede os Anais do II Congresso de Pesquisa

de Ciências Criminais - 2018, composto pelos artigos dos pesquisadores e

pesquisadoras que realizarão a apresentação oral.

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EXPEDIENTE

COORDENAÇÃO GERAL

Profa. Dra. Jacqueline Sinhoretto

Tem graduação em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (1995),

mestrado em Sociologia pela Universidade de São Paulo (2001) e doutorado em

Sociologia pela Universidade de São Paulo (2007). É professora adjunta da

Universidade Federal de São Carlos / Departamento de Sociologia e PPGS. Lidera

o Grupo de Estudos sobre Violência e Administração de Conflitos da UFSCar.

Realizou estágio pós-doutoral na Université de Toulouse - Le Mirail, com bolsa

Hermès da Fondation Maison des Sciences de L'Homme (Paris). Professora

visitante na Université de Toulouse Jean Jaurès, na Cátedra de Estudos sobre

América Latina do IPEAT (2014). Tem experiência em Sociologia da Administração

da justiça e Sociologia da Violência, atuando principalmente nos seguintes temas:

administração institucional de conflitos, acesso à justiça, violência, segurança

pública, sistema de justiça, prisões, controle estatal do crime. É pesquisadora do

INCT Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de

Conflitos. Lattes: http://lattes.cnpq.br/7743699562476490

Prof. Dr. Silvio de Almeida

Pós-doutor pelo departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da

Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Doutor em Filosofia e

Teoria Geral do Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

(USP). Mestre em Direito Político e Econômico e Bacharel em Direito pela

Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Graduado em

Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade

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de São Paulo (FFLCH-USP). Professor do Curso de Graduação em Direito e

Docente Permanente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito

Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP). Professor de

Filosofia do Direito e Introdução ao Estudo do Direito da Universidade São Judas

Tadeu (SP). Presidente do Instituto Luiz Gama (SP). Advogado em São Paulo.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/6325980837929171

COORDENAÇÃO EXECUTIVA

Ms. Allyne Andrade e Silva

Advogada, mestra e doutoranda em Direitos Humanos pela USP. Supervisora de

Educação do Ibccrim. Lattes: http://lattes.cnpq.br/3782063590023123

Poliana da Silva Ferreira

Mestranda em Direito e Desenvolvimento (FGV Direito SP). Pesquisadora

visitante do Institut pour la recherche interdisciplinaire en sciences juridiques

(JURI), na Université Catholique de Louvain (UCL, 2018). Graduação em Direito

pela Universidade do Estado da Bahia (2016). Pesquisadora do Grupo de Pesquisa

em Criminologia da UNEB e do Núcleo de Estudos sobre Crime e a Pena – FGV.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/0468392946703207

Lorraine Carvalho Silva

Pós-graduanda de Social Innovation Management (Amani Institute). Pós-

graduada em Direito Penal Econômico (FGV Direito SP - 2018). Graduação em

Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2015). Participante do

Projeto Audiência de Custódia do Instituto Pro Bono. Lattes:

http://lattes.cnpq.br/1845601867663999

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SUMÁRIO

1 - DOGMÁTICA JURÍDICO-PENAL: TEORIAS CONTEMPORÂNEAS…............. p. 5

2 - DIREITO PENAL ECONÔMICO…………………………................……..........……...p. 18

3 - CRIME E PENA…………………………….....…………...........................……....……...p. 33

4 - PROVA PENAL E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO………....................p. 50

5 - PENA, PRISÃO E ENCARCERAMENTO………………..............………................p. 61

6 - DESAFIOS DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO…………...……............…...…..p. 99

7 - SEGURANÇA PÚBLICA E SELETIVIDADES……………………...……..............….p. 115

8 - GÊNERO, SEXUALIDADE E RELAÇÕES RACIAIS NA JUSTIÇA CRIMINAL.p. 133

9 - JUSTIÇA JUVENIL………………………………............................….....................p. 163

10 - DEMOCRATIZAÇÃO DO SISTEMA DE JUSTIÇA……………………................p. 187

Os textos presentes neste documento são exatamente os apresentados por

autoras e autores dos trabalhos aprovados. Títulos, grafias de nomes e resumos

foram publicados sem qualquer alteração.

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GRUPO DE TRABALHO 1:

DOGMÁTICA JURÍDICO-PENAL: TEORIAS CONTEMPORÂNEAS:

Ementa: A dogmática tem se mostrado uma técnica eficiente para garantir

segurança jurídica à aplicação do direito penal. Utilizando-se de embasamento

teórico, a prática se aperfeiçoa e garante ao Direito Penal uma aplicação

uniforme. A política criminal democrática de ultima ratio restringe a aplicação do

direito penal e de seus institutos aos casos mais necessários. Atualmente várias

teorias convivem entre doutrina e jurisprudência e, tanto a parte geral como a

especial do Direito Penal, continuam proporcionando debates científicos que

precisam ser devidamente fundamentados com vistas a aperfeiçoar a ciência

penal. Os trabalhos encaminhados ao GT devem aprofundar o estudo em um dos

institutos da parte geral do direito penal e refletir acerca da prática judicial,

apontando, com fundamentos, as tensões entre a dogmática e a jurisprudência.

Coordenador: Prof. Dr. João Paulo Orsini Martinelli

Graduado pela Universidade de São Paulo (USP), possui Extensão Universitária

em Direito Processual Penal pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). É especialista

em Direito Penal pela Universidade de Salamanca, mestre e doutor em Direito

Penal pela USP e pós-doutor em Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra.

Atua como pesquisador visitante na Universidade de Munique e na Universidade

da Califórnia. Lattes: http://lattes.cnpq.br/0279190483460977

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Trabalhos:

1. UMA ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE OS INSTITUTOS DA CEGUEIRA DELIBERADA

E DO DOLO EVENTUAL NO DIREITO PENAL ECONÔMICO

Autor: Alani Caroline Osowski Figueiredo

Coautor: Rodrigo Sánchez Rios

Resumo:

A presente pesquisa teve por objetivo demonstrar, por meio do estudo e das

definições dos critérios de imputação subjetiva nos delitos econômicos, se o

conceito de “cegueira deliberada” empregado pelos Tribunais é equivalente ao

dolo eventual do Código penal brasileiro. Discute-se a implantação de tal instituto

– proveniente do sistema Common law, no sistema jurídico-penal brasileiro.

Ressalta-se a importância de estudos sobre referida categoria subjetiva no

âmbito dos delitos econômicos, sobretudo ante à atual conjuntura do país. Por

intermédio da análise das primeiras formas de aplicação da teoria no

ordenamento pátrio, notadamente onde se tornou conhecida na jurisprudência,

no caso Mensalão até recentemente, nas decorrências da Operação Lava Jato.

De pronto, constata-se a incompatibilidade entre os institutos da cegueira

deliberada e do dolo eventual no ordenamento pátrio, pois além de não se

equivalerem, ampliam o conceito de dolo, possibilitando abarcar na seara das

condenações dolosas situações que fato não o são, tratando-se de, no máximo,

condutas culposas, ou até mesmo casos em que, de outro modo, seria possível a

absolvição. No entanto, a jurisprudência brasileira vem aplicando o instituto

diuturnamente, porém sem se ater à critérios específicos, não se

comprometendo com os fundamentos jurídicos de um direito penal liberal. A

importação de conceitos estrangeiros, sem uma reflexão profunda, pode levar à

consequência de uma expansão indevida da aplicação da norma penal. A

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pesquisa se centra, assim, criticamente, nas incompatibilidades entre os

institutos da cegueira deliberada e do dolo eventual, bem como, sua desvirtuação

promovida pelo Judiciário, afetando os princípios fundamentais que garantem

um sistema punitivo limitado e racional.

2. A IMPUTAÇÃO OBJETIVA NO PROJETO DE LEI DO SENADO 236/12

Autor: Dorcas Marques Almeida

Coautor: Núbio Pinhon Mendes Parreiras

Resumo:

Ao se fazer uma pesquisa jurisprudencial, nota-se que a Teoria da Imputação

Objetiva vem ganhando espaço no ordenamento jurídico nacional. Nesse

segmento, o Projeto de Lei do Senado n° 236 de 2012, que busca instituir o novo

Código Penal, acrescenta a análise da criação ou aumento do risco para fins de

identificação da conduta penalmente relevante e, consequentemente, adota

expressamente a Teoria da Imputação Objetiva. Assim, o presente artigo objetiva

analisar se a referida teoria é efetivamente compatível com os princípios

constitucionais e se contribui para com o aprimoramento de um paradigma

democrático. Marchionatti (2001, p. 96/97) sustenta que “o tipo da teoria da

imputação objetiva possui mais requisitos, possui mais elementos, possui sempre

como elemento normativo o juízo da imputação objetiva, com função normativo-

axiológica” e que, consequentemente, “a juridicização penal dos fatos da vida é

menor à luz da teoria da imputação objetiva do que à luz da teoria finalista. ” Por

sua vez, Luiz Régis Prado e Érika de Carvalho (2005, p. 5) afirmam que “a teoria

finalista pode resolver todos os problemas sugeridos pelas teorias da imputação

objetiva do resultado, e isso sem precisar elencar inúmeros casos concretos -

verídicos ou supostos - e tratar de elaborar um critério para cada um deles ou

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para cada grupo de hipóteses sugeridas”. Os juristas apresentam opiniões

divergentes, de modo que este trabalho realizou uma pesquisa bibliográfica e

analisou textos doutrinários, pareceres e jurisprudências para dirimir essa

controvérsia. Assim, demonstrar-se-á, inicialmente, como o abandono da teoria

causal e a recepção da teoria finalista da ação provocou alterações em toda a

estruturação da Teoria do Crime. A Teoria do Crime foi inteiramente

reestruturada quando o ordenamento jurídico optou por recepcionar a teoria

finalista da ação, logo a proposta de um novo Código Penal e a consequente

recepção da Teoria da Imputação Objetiva deve ser analisada com

responsabilidade. Em seguida, far-se-á um breve estudo da Imputação Objetiva

e das implicações engendradas pelo incremento do risco. A Imputação Objetiva

é classificada como funcionalista por ser construída com o intuito de atender a

políticas criminais. Porém, qual política criminal deve orientar um Estado

Democrático de Direito? Roxin (2002) sustenta que o Direito Penal deve ser

orientado pela prevenção geral. Jakobs (2007), por sua vez, persegue a

estabilização normativa. Da mesma forma, todos os juristas que se dedicam ao

estudo da Imputação Objetiva trazem soluções diferentes para fundamentar a

construção da imputação. Desse modo, a análise da ocorrência do risco acaba

sendo uma análise subjetiva, que poderá vir a fundamentar qualquer decisão.

Além disso, a sociedade está vivenciando o fenômeno do risco, de modo que as

condutas tendem, de modo geral, a serem tidas como arriscadas. A dogmática

precisa dar previsibilidade as decisões judiciais, todavia a abertura axiológica

engendrada pela análise do risco e dos escopos funcionais gerará sentenças

completamente imprevisíveis e tamanha discricionariedade é incompatível com

o princípio da legalidade. Assim, por fim, denunciar-se-á como a Imputação

Objetiva atribui demasiada discricionariedade ao judiciário e, portanto, aumenta

excessivamente o poder de punir do Estado.

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3. FORMAS CONTEMPORÂNEAS DE ESCRAVIDÃO NAS CADEIAS PRODUTIVAS: A

TEORIA DA CEGUEIRA COMO INSTRUMENTO DA TUTELA PENAL

Autor: Gustavo Lelles de Menezes

Coautor: Prof. Dr. Paulo César Corrêa Borges

Resumo:

Muito embora a escravidão tenha sido formalmente abolida pela Lei Áurea em

1888, sua ocorrência persiste. O trabalho escravo adaptou-se às transformações

das relações de capital, trabalho e produção ocorridas ao longo dos últimos

séculos e tomou novas formas.

Tanto é assim, que a maioria das situações de trabalho análogo ao escravo,

detectadas anualmente no Brasil, são provenientes das cadeias produtivas de

modernas atividades econômicas, nas quais figuram em seu ápice empresas

dotadas de enorme poder econômico (GOMES, 2017). O trabalho em cadeias de

produção (sweating system) se desenvolve em uma pirâmide, cuja característica

é a setorização da produção, por meio da terceirização e da subcontratação.

Assim, cria-se uma grande ramificação de empresas, interligadas através da

produção de elementos necessários à elaboração do bem de consumo a ser

criado pela empresa multinacional que figura no ponto mais alto desta pirâmide.

Com efeito, essa multinacional comanda toda a produção, direta ou

indiretamente, seja estabelecendo os prazos, seja especificando as

características dos produtos a serem entregues pelas terceirizadas e

subcontratadas.

Tendo em vista tal posição hierárquica, não raro, desconfia e até mesmo tem

conhecimento dos ilícitos praticados ao longo cadeia produtiva, todavia os

ignora, de modo a se colocar em estado de alienação proposital diante das

situações suspeitas, para que seja beneficiada pelos preços incrivelmente baixos

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cobrados. Dessa forma, é que o trabalho escravo se torna um elemento a mais

na obtenção do lucro.

Assim, conquanto a produção transcenda os limites da empresa tomadora

principal, a responsabilidade decorrente da prática do crime previsto no artigo

149 do CP, não deveria se restringir ao dirigente da terceirizada ou

subcontratada, mas também a quem comanda a produção e “fecha os olhos”

ante a tal práticas criminosa, por agir com dolo eventual. Todavia, a ramificação

estrutural da produção culmina em facilitar a blindagem da empresa

multinacional e dos seus dirigentes, principalmente contra a responsabilidade

penal.

Dessa forma, as nefastas consequências das formas contemporâneas de trabalho

escravo, estreitamente relacionadas à ordem econômica e concorrencial e

preponderantemente à dignidade da pessoa humana, exigem da dogmática

penal, ferramentas aptas a garantir a efetiva tutela; discussão perfeitamente

relacionada ao eixo do GT 1.

Nesse contexto, insere-se a Teoria da Cegueira Deliberada (Willful Blindness),

ficção jurídica utilizada para fixar responsabilidade penal, segundo a qual, ante a

probabilidade real de um resultado criminoso, o agente nada faz, conquanto

finge não perceber determinada situação de ilicitude, sendo beneficiado pela

vantagem pretendida. (SILVEIRA, 2013).

Isto posto, o presente trabalho se propõe a averiguar a (im)possibilidade do uso

da teoria da cegueira na aplicação da norma prevista no artigo 149 do CP, com o

fito de coibir, no âmbito empresarial, a exploração econômica do trabalho em

condições análogas a de escravo e garantir tutela penal dos direitos humanos.

Para tanto utilizar-se-á o método dialético com o fito de discutir as diversas

nuances que envolvem o uso da teoria, notadamente as discussões sobre

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configuração do dolo, de modo a tomar os cuidados para uma aplicação

responsável, condizente com os postulados do Estado Democrático de Direito.

4. A LAVAGEM DE DINHEIRO ENQUANTO DELITO OMISSIVO IMPRÓPRIO: SUAS

IMPUTAÇÕES E SUA PROVA

Autor: Matheus Braga

Resumo:

Propõe-se abordar, a partir do presente artigo, a prática do crime de lavagem de

dinheiro, na sua modalidade “ocultação”, especificamente quando se caracteriza

mediante omissão.

O caminho a ser percorrido pressupõe uma revisitação: a) à teoria do delito,

especificamente no que diz respeito aos problemas ligados à imputação do crime

no plano abstrato, b) à técnica da imputação no plano concreto ou técnica da

acusação e c) à teoria da prova.

A colocação do problema surge com a consideração daqueles crimes praticados

mediante promessa de alguma vantagem (econômica) – corrupção (art. 317, do

Código Penal); homicídio (art. 121, §2, I, do Código Penal) ou mesmo qualquer

outro crime em que pelo menos um dos agentes tenha atuado mediante a

promessa de um pagamento futuro, a depender, ou não, do sucesso da

empreitada criminosa.

Questiona-se, então, se (e em que circunstâncias) seria possível responsabilizar

penalmente aquele sujeito que, segundo o pacto criminoso, assumiu a posição

de credor da vantagem indevida, e omitiu-se, deixando de oficializar (interromper

a ocultação) do ativo auferido de forma oculta/dissimulada.

De outra banda, discute-se acerca da (im)possibilidade do “crédito criminoso”

configurar o objeto material da ocultação. Tal questão, vale dizer, impõe um

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estudo sobre as técnicas da denúncia (art. 41, o Código de Processo Penal), a fim

de desvelar os requisitos para a aptidão da descrição dos fatos então imputados

à esfera de responsabilidade penal do denunciado.

A título ilustrativo, tomemos o caso de um indivíduo, que, em razão da promessa

de pagamento de R$50.000,00, venha efetivamente a matar um desafeto do

“mandante”. Nesse caso (hipotético), o assassino, segundo o pacto criminoso,

receberia o mencionado valor em até dois dias após o cometimento do crime.

Pode-se adiantar que nos parece um tanto absurdo imaginar que esse “crédito”

poderia equivaler a um ativo obtido mediante um crime, uma vez que eventual

crédito só poderia assumir a condição de “objeto material” do crime de lavagem

se configurar um autêntico crédito, isto é, quando representar, de fato, um

“direito de crédito”.

Nesse particular, objetiva-se discutir a partir de que momento a promessa

criminosa – que absolutamente não pode ser considerada um (direito de) crédito

–, passaria à condição de um ativo? Ainda, se seria possível que, sem qualquer

modificação do mundo exterior, o referido bem/valor passe a integrar o

patrimônio do assassino e ser objeto da ocultação/dissimulação criminosa?

Essas respostas, por óbvio, não podem ser obtidas a partir de uma discussão

meramente filosófica ou lógica, muito menos dos comuns “achismos” que agora

são vistos em diversos artigos (pretensamente) científicos.

A solução se dá pela técnica. A salvação, a segurança jurídica, a sobrevivência do

estado de direito se dá pela técnica. Eis o que, precipuamente, pretende-se

demonstrar com o trabalho.

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5. O TRATAMENTO DA INSIGNIFICÂNCIA DA LESÃO NO BRASIL: A

INCOMPATIBILIDADE COM A INTERVENÇÃO MÍNIMA

Autor: Núbio Pinhon Mendes Parreiras

Coautora: Dorcas Marques Almeida

Resumo:

O presente trabalho visa analisar a recepção das agências brasileiras de

criminalização primária e secundária à insignificância da lesão ao bem jurídico

como fundamento para exclusão da tipicidade. Para tanto, inicia-se com uma

breve retrospectiva da evolução histórica do conceito de bem jurídico-penal.

Após, passar-se-á a um estudo sobre o conceito do princípio da intervenção

mínima para demonstrar como ele fundamenta a exclusão da tipicidade penal

diante de lesões insignificantes nas Democracias modernas. Com isto, será

possível uma análise da recepção, tanto jurisprudencial – especialmente dos

Tribunais Superiores –, quanto legislativa – como o Projeto de Lei do Senado n°

236 de 2012, que visa uma reforma global do Código Penal vigente – da noção

de insignificância da lesão ao bem jurídico como causa para exclusão da

tipicidade (art. 26). Perceber-se-á que o entendimento que tem aos poucos se

consolidado, tanto da jurisprudência (como no HC 118853/ES do STF, ou nos

107779/RS e HC 92438/PR do STJ), quanto no âmbito legislativo – como no

referido projeto, à exceção da letra b, que não foi incluída no referido dispositivo

legal – tem sido no sentido de exigir cinco condições objetivas para afastar a

tipicidade, sendo: (a) mínima ofensividade da conduta do agente, (b) nenhuma

periculosidade social da ação, (c) grau reduzido de reprovabilidade do

comportamento, (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada, (e) o agente

com primariedade e bons antecedentes. Assim, constatar-se-á que, quando as

agências brasileiras de criminalização primária e secundária têm recepcionado a

insignificância, ao invés de focar na afetação ao bem jurídico, o têm feito, além

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de com considerações de Direito Penal de Autor (BUSATO, 2017, p. 62), com

critérios tautológicos que praticamente inviabilizam o reconhecimento, na

prática, do princípio. Tal situação acaba por, naturalmente, desconsiderar a

tipicidade material, a ponto de flertar com o funcionalismo sistêmico de Jakobs

(2016) – na medida em que menospreza o bem jurídico. Ou seja, o objetivo do

trabalho é demonstrar que a recepção jurisprudencial e legal da insignificância

tem sido de forma incompatível com o princípio da intervenção mínima. No que

diz respeito à pertinência ao “Grupo de Trabalho Dogmática jurídico-penal:

teorias contemporâneas”, é importante referida discussão de tal modo que

evidenciará que a jurisprudência e a prática legislativa não têm levado em

consideração os estudos científicos sobre a insignificância e a intervenção

mínima, não nos proporcionando a intentada “segurança jurídica à aplicação do

direito penal”.

6. A (A)TIPICIDADE DA CONDUTA DE ENCOMENDAR DROGAS E O TRATAMENTO

JURISPRUDENCIAL DA RESPONSABILIDADE PENAL DO PRESO PELA APREENSÃO DE

DROGAS NAS REVISTAS DE SEUS VISITANTES

Autora: Patrícia Oliveira de Almeida Coelho e Silva

Resumo:

A proclamada e tão aclamada guerra às drogas não impede que o sistema

prisional conviva com a realidade do tráfico de drogas no interior de suas

unidades, mesmo com a existência de sistemas de monitoramento e de revistas

aos visitantes dos presos. E, ante a uma política que tem por finalidade coibir e

punir a qualquer custo referido tipo de criminalidade, verifica-se na prática

judicial a condenação do preso pelo crime de tráfico de drogas, como suposto

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destinatário da droga apreendida junto aos seus visitantes, ainda que sua

conduta não se subsuma àquelas descritas no mencionado tipo penal.

O objeto do presente trabalho é estudar a responsabilidade penal do preso,

diante da constante tensão entre a dogmática e a jurisprudência, nas situações

em que há condenação pelo crime de tráfico de drogas, em razão da apreensão

de substâncias ilícitas com algum de seus visitantes, durante as revistas realizadas

pelos agentes do sistema prisional. Destaca-se que são condenados pelo crime

de tráfico sem ter qualquer contato com as drogas apreendidas, presumindo-se

as drogas teria por finalidade a traficância, sem a observância dos limites do

poder punitivo estatal, em especial, do princípio da legalidade.

O crime previsto no artigo 33 da Lei 11.343/06, embora seja um tipo penal misto

alternativo, descrevendo dezoito condutas incriminadoras e ampliando

sobremaneira a possibilidade de punição sob o espectro da traficância, não

abarca a conduta de “encomendar” drogas. Além disso, observa-se a fragilidade

do entendimento de que a conduta ora analisada estaria inserida no núcleo do

tipo consistente em “adquirir” a droga, pois a propriedade das coisas móveis -

incluindo-se a das drogas - não se transfere pelo negócio jurídico, antes da

tradição (artigo 1267 do Código Civil), ou seja, se for apreendida junto ao visitante

na revista realizada na unidade, não houve a aquisição.

Diante do problema acima apresentado, pretende-se analisar a (a)tipicidade da

conduta daquele que está preso e supostamente encomendou drogas ao seu

visitante, as quais foram apreendidas durante a revista na unidade prisional, de

forma a verificar a pertinência dos fundamentos utilizados na prática judicial para

condená-lo. Para tanto, será analisada a doutrina nacional e as decisões dos

tribunais pátrios. Por fim, pretende-se concluir acerca da possibilidade de

considerar (a)típica referida conduta sob o prisma de um Direito Penal de

garantias do cidadão.

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7. RESPONSABILIZAÇÃO PENAL DE SUPERIORES HIERÁRQUICOS NA

JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS PENAIS INTERNACIONAIS: ANÁLISE DE

APLICABILIDADE NOS DELITOS ECONÔMICOS

Autor: Paulo Roberto Incott Junior

Resumo:

O projeto de pesquisa aqui proposto se debruça sobre o seguinte problema: são

legítimas as importações de teorias relacionadas a responsabilização de

superiores hierárquicos, discutidas na jurisprudência dos tribunais penais

internacionais, para a responsabilização de indivíduos com poder de comando

fora do ambiente militar (ou de aparatos organizados de poder que se estruturam

fora do escopo da licitude)?

O objetivo da pesquisa é revisitar uma discussão que se desenvolve na dogmática

penal da imputação (e também da autoria e participação) já há algum tempo,

tentando, porém, realizar uma análise sob um prisma menos explorado, a saber,

a diferente natureza dos delitos em que esse debate tem sido travado no âmbito

dos tribunais penais internacionais quando comparado ao âmbito em que essas

mesmas teorias vêm sendo propostas como ferramenta de aplicação: o direito

penal econômico. Assim, pretende-se avaliar a aplicabilidade dos pressupostos

utilizados para embasar o resultado a que chegam os tribunais penais

internacionais na hora de aferir a responsabilidade penal de pessoas que ocupam

cargos de comando, para que sejam utilizados como critério de imputação nos

casos em que os delitos não são mais o genocídio, os crimes contra humanidade

ou os crimes de guerra, mas sim a corrupção, o peculato, a lavagem de capitais e

demais delitos atinentes ao direito penal econômico/empresarial.

A hipótese, que se pretende tentar comprovar com a pesquisa, é de que a simples

transposição de construções teóricas elucubradas para lidar com os delitos sob

competência dos tribunais penais internacionais, para serem utilizadas como

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solução de casos envolvendo delitos “econômicos”, não se sustenta diante de

uma análise metodologicamente coerente, uma vez que busca aplicar a mesma

fórmula para estruturas de atuação cujos pressupostos de funcionamento

diferem em demasia. Há ainda o intento de demonstrar que a aproximação

destas soluções ocorre em virtude do conceito de “organização criminosa”,

desenvolvido em documentos internacionais que versam sobre cooperação em

matéria penal, conceito esse que permite abarcar um rol muito amplo e

heterogêneo de situações.

Com o fim de atingir os objetivos propostos, o método de aproximação ao

problema será assim divido: num primeiro momento, pesquisar a jurisprudência

dos tribunais penais internacionais afim de compreender e relacionar os critérios

de responsabilização criminal de superiores hierárquicos aplicado, buscando seus

pressupostos e requisitos de aplicabilidade. Num segundo momento, analisar a

definição do conceito de “organização criminosa”, com interesse especial em

documentos de cooperação internacional em matéria penal. A seguir, analisar a

correspondência entre os pressupostos pesquisados e a natureza dos delitos

econômicos, selecionando um ou dois casos retirados da jurisprudência nacional,

para demonstração de pertinência ou não da aplicação destes pressupostos para

responsabilização penal de dirigentes de empresa ou pessoas que ocupam

posições de comando nestas.

Cabe ressaltar, por fim, que o tema de pesquisa aventado se enquadra do debate

amplo dos conceitos dogmáticos de autoria e participação, assim como da

discussão acerca dos limites da imputação objetiva, motivo pelo qual se adequam

a ser discutidos no Grupo de Trabalho acima apontado.

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GRUPO DE TRABALHO 2: DIREITO PENAL ECONÔMICO

Ementa: Tem por eixo temático as fronteiras do direito penal econômico, isto é,

os requisitos e causas de exclusão dos delitos socioeconômicos e suas condições

de punibilidade. Reunirá trabalhos de pesquisa jurídica sobre Teoria da Norma

Penal e Teoria do Delito aplicadas aos crimes econômicos ou empresariais, ou

sobre o conteúdo e alcance dos tipos de injusto socioeconômicos. Serão

selecionados trabalhos que contribuam para o estado do debate em torno do

tema proposto, problematizando-o, apresentando inovação ou testando

soluções conhecidas, preferencialmente a partir da análise dogmática de casos

concretos, precedentes jurisprudenciais ou do direito comparado.

Coordenador Prof. Dr. Frederico Horta

Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG (2013),

mestre em Ciências Penais pela UFMG (2006) especialista em Direito Penal

Econômico e Europeu pela Universidade de Coimbra (Portugal - 2007) e bacharel

em Direito pela UFMG (2004). Professor Adjunto de Direito e Processo Penal da

Universidade Federal de Minas Gerais, nos cursos de graduação e pós-graduação

em Direito.. É líder do Grupo de Pesquisa Teoria do Delito e Direito Penal

Empresarial (GEPE).

Lattes: http://lattes.cnpq.br/0657217202573863

Coordenador Prof. Dr. Marco Aurélio Florêncio

Doutor em Direito pela PUC/SP. Professor do Programa de Pós Graduação em

Direito Político e Econômico da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Presidente da Comissão de Direito Penal Econômico da OAB/SP. Advogado.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/0602263616755302

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Trabalhos:

1. DA COMPETÊNCIA NOS CRIMES DE SONEGAÇÃO FISCAL COM LESÃO A ENTES

ARRECADATÓRIOS DISTINTOS

Autora: Gabriela Cristina Silveira

Coautora: Priscila Caroline Coelho

Resumo:

Não raramente, o contribuinte, a partir de um mesmo fato, pode sonegar uma

série de tributos, os quais podem ser de competência arrecadatória de entes

federativos distintos. Surge, neste ponto, a problemática de definição de

competência da tramitação de ações penais referentes a crimes contra a ordem

tributária quando o sujeito passivo for um dos Estados da federação e também a

União.

No presente artigo, propõe-se a análise da controvérsia com base em um caso

hipotético, para facilitar o estudo. Suponha-se que o contribuinte X, titular da

empresa Y, a partir de uma determinada operação fraudulenta no âmbito das

atividades da pessoa jurídica, promove a sonegação fiscal de tributos de

competência arrecadatória federal e estadual. Com a constituição dos créditos

tributários em procedimentos administrativos, que tramitaram cada qual no ente

competente, o empresário é denunciado pelo Ministério Público Estadual e

também pelo Parquet Federal, pela prática do delito previsto no art. 1o da Lei n.

8.137/90.

A tendência que se observa nos Tribunais Brasileiros para a definição da

competência é a de que a sonegação de tributo, com vítimas e bens jurídicos

diferentes (fazenda estadual e federal), retira a possibilidade de conexão entre

as ações. Por isto, entende-se justificada a tramitação dos processos em

jurisdições distintas.

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Necessário, porém, averiguar se realmente esta solução se mostra a mais

adequada. Na verdade, o principal questionamento seria o seguinte: não se

estaria diante de crime único, uma vez que a conduta – ou o meio empregado,

descrito em um dos incisos do art. 1o – que deu origem à sonegação fiscal foi a

mesma, ainda que tenha obstado o lançamento de mais de um tributo?

Por outro lado, no que tange à definição da competência, parte da doutrina

defende posição diversa, pois entende-se que na conexão entre delitos de

competência da Justiça Federal e Estadual, a ação penal deverá tramitar na

primeira, inclusive com fundamento na Súmula 122 do Superior Tribunal de

Justiça.

Nesse cenário, dada a complexidade do tema, para a solução do caso, serão

verificadas algumas peculiaridades dos crimes contra a ordem tributária. Adiante,

será estudado se a solução atualmente dada pela jurisprudência, com o cotejo de

casos similares, caracteriza bis in idem, vedado no Direito Penal e, ainda, abre a

possibilidade de serem proferidas decisões conflitantes entre os juízos. Mostra-

se, também, pertinente rever alguns institutos de âmbito processual penal,

especificamente as hipóteses de conexão, para ao final chegar-se à solução

adequada. A pertinência do aprofundamento do tema, dada a certa frequência

que ocorrem situações como a acima exposta, associada à escassez bibliográfica

e jurisprudencial sobre o debate, demonstram a relevância de estudos dessa

natureza para o Direito Penal Econômico. Portanto, estabelecidas as premissas

gerais acima expostas, será analisada, através do método dedutivo, a

competência nos crimes de sonegação fiscal com lesão a entes arrecadatórios

distintos, bem verificar os eventuais desdobramentos da solução constatada.

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2. CRIMINAL COMPLIANCE E OS DESAFIOS DO DIREITO PENAL EMPRESARIAL: OS

PROGRAMAS DE INTEGRIDADE À LUZ DOS PARÂMETROS DE AVALIAÇÃO DO

ARTIGO 42, DO DECRETO 8.420/15

Autor: Gabriel Soares Ribeiro Lopes

Resumo:

O presente artigo tem o objetivo de discutir a aplicação do Direito Penal

Empresarial aos Mecanismos de Autorregulação nas Empresas com a elaboração

de programas de Compliance e a relação com o artigo 42, do Decreto nº

8.420/15, que regulamenta a Lei nº 12.846/13 – dispõe sobre a responsabilidade

administrativa e civil no âmbito das pessoas jurídicas, pela prática de atos contra

a administração pública. O dispositivo citado elenca um rol de parâmetros de

avaliação que devem ser observados pelos Programas de Integridade existentes

nas pessoas jurídicas, para serem avaliadas em um possível Processo

Administrativo de Responsabilização – PAR. O Criminal Compliance como

instrumento preventivo que incentiva a aplicação e a criação de Códigos de Ética,

Disciplina e Conduta das empresas, tem o objetivo de incentivar as denúncias de

possíveis irregularidades presentes dentro da atividade empresarial. Aquele é um

importante meio de evitar a incidência de sanções penais e de resguardar o

tratamento ético das pessoas jurídicas em sua atividade diária, afastando a sua

responsabilização. Pretende-se, portanto, neste artigo, analisar a

compatibilização entre o artigo 42 e os modernos programas de integridade das

empresas, com base na atual teoria do Direito Penal Empresarial.

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3. RESPONSABILIDADE PENAL DE CONSELHEIROS DE ADMINISTRAÇÃO: A

NECESSÁRIA INDIVIDUALIZAÇÃO DAS CONDUTAS

Autora: Giovanna Bakaj

Resumo:

Há um cenário de insegurança jurídica no âmbito do Direito Penal Empresarial,

tendo em vista diversas imputações de condutas fundadas na mera ocupação de

uma posição societária, o que viola frontalmente os princípios constitucionais

conformadores do nosso sistema penal, devido à não individualização das

condutas. Especialmente em relação aos Conselheiros de Administração, a

situação se agrava, pois há um limitado número de estudos sobre a imputação

penal a membros desse órgão colegiado no Brasil.

Diante dessa problemática e dos inúmeros desafios advindos da individualização

da conduta na empresa (SILVA SÁNCHEZ, 2016) é que se propõe o presente artigo

com o objetivo de sugerir um caminho para os órgãos de persecução penal

imputarem condutas delitivas a Conselheiros de Administração, bem como

medidas para que os membros do Conselho de Administração possam mitigar os

riscos de responsabilização penal.

Para isso, tratar-se-á de forma breve sobre estruturas organizacionais e de gestão

fundamentais à definição das competências atreladas a cada função da empresa

nos diversos níveis hierárquicos. Em seguida, passar-se-á a tratar dos princípios

empresariais caracterizadores do funcionamento da empresa e da interação dos

indivíduos, dentre os quais o princípio da hierarquia, da divisão de trabalho, da

delegação de funções e da confiança. (MONTANER FERNÁNDEZ, 2008) A partir

dessa análise, será possível definir os deveres atrelados a cada competência e

função.

Dar-se-á prosseguimento ao artigo, analisando-se dois desafios fundamentais à

imputação penal na empresa, dentre os quais a tipicidade objetiva na omissão

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imprópria (SILVEIRA, 2016) e a distinção entre autoria e participação a partir da

teoria do domínio do fato (GRECO; LEITE; TEIXEIRA; ASSIS, 2014). Por fim,

analisar-se-á a imputação penal aos membros do Conselho de Administração e

sugerir-se-á um caminho a ser seguido pelos órgãos de persecução penal e

medidas de prevenção a serem adotadas pelos membros do órgão colegiado.

O tema insere-se, portanto, no objeto de estudo do Grupo de Trabalho de Direito

Penal Econômico, especificamente na aplicação da Teoria do Delito aos crimes

econômicos ou empresariais. Para o seu desenvolvimento será realizada análise

dogmática de casos concretos e direito comparado.

4. APROXIMAÇÃO A UMA NOVA TEORIA DO TRÁFICO DE INFLUÊNCIA

Autor: Kaíque Rodrigues de Almeida

Resumo:

A Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção recomenda que a venda de

um abuso de influência para a obtenção de um benefício público indevido seja

qualificada como o delito de tráfico de influência (artigo 18). Os elementos

“abuso” e “indevido” têm a natureza de elementos normativos do tipo, pois uma

atividade meramente cognitiva não é suficiente para sua compreensão, sendo

necessária a realização de uma valoração. A hipótese defendida é a de que

Convenção também tem como um de seus objetivos proteger o exercício de

“influência legítima”, recomendando a identificação dos limites razoáveis das

relações de influência, pressão e lobby. Porém, o Código Penal do Brasil tipifica o

tráfico de influência como acerto de vantagem a pretexto de influir em ato

praticado por funcionário público no exercício da função (artigo 332). Em que

pese a doutrina nacional majoritária ainda interpretar este tipo como uma

“venda de fumaça”, a realidade do Direito Penal Econômico e do lobby

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empresarial trazem à tona novas discussões sobre a relação de influência entre

Poder Público e agentes privados. O presente artigo esforça-se no sentido de

precisar o injusto penal do tráfico de influência que preserva as relações de

influência legítima.

5. A TIPICIDADE PENAL E A SUBVERSÃO DOS CRIMES CONTRA ORDEM TRIBUTÁRIA:

INDEVIDA UTILIZAÇÃO DA ULTIMA RATIO COMO INSTRUMENTO PARA A

COBRANÇA DE TRIBUTOS

Autor: Leonardo Oliveira Souza

Resumo:

Em apertada síntese, a presente proposta de trabalho objetiva uma reflexão

sobre a flagrante e indevida disseminação na utilização da seara criminal,

notadamente dos crimes contra ordem tributária, como forma de incutir no

sujeito passivo do tributo uma atividade coercitiva/intimidativa, no afã de

compeli-lo a pagar o débito fiscal cobrado, ou parcelá-lo, sob pena de ser

deflagrada Ação Penal em seu desfavor.

Nesse espectro, observa-se que o Estado está criando uma fonte

anômala/subsidiária de arrecadação tributária, sendo o presente trabalho uma

tentativa de verdadeiro contraponto, tendo como cerne a discussão teórica

acerca dos elementos centrais da Teoria do Delito, com relevante destaque para

o conceito material do crime e a consequente necessidade de violação ao bem

jurídico tutelado pela norma penal incriminadora. Seguindo essa esteira de

raciocínio, o trabalho ainda provocará um debate sobre os elementos do fato

típico, com ênfase para a Tipicidade, de modo a propiciar um paralelo entre o

sobredito requisito e a caracterização dos crimes tributários.

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Hoje, o que se vê, é a proliferação de representações fiscais para fins penais, de

forma que se aflora uma absorta presunção de que o ilícito tributário pode ser

automaticamente convertido em ilícito penal, o qual somente se perfaz com a

incidência de elementos muito mais profundos e robustos, sobretudo por se

tratar da ciência da intervenção mínima.

Pior é saber que essa arbitrária ideia, além de estar cada vez mais sedimentada

na atividade administrativa, policial e, principalmente, no âmbito dos grupos de

atuação específicos do Ministério Público (Estadual e Federal), vem tomando

corpo no seio da jurisprudência brasileira, a evidenciar uma manifesta subversão

do Direito Penal Econômico, sobretudo da Lei 8.137/90, concluindo pela

necessidade de uma atividade teórica e prática de contundente resistência a esse

mecanismo de imputações penais levianas, que buscam reverberar o

ultrapassado e combatido “Direito Penal do Medo”, transformando a ultima ratio

do ordenamento jurídico pátrio em indevido instrumento para cobrança de

tributos.

Assim, mostra-se indubitável o caráter efervescente e a pertinência temática que

permeia a proposta de trabalho em comento, pois o crescimento desenfreado

das Ações Penais que têm como objeto os crimes contra ordem tributária está

intrinsecamente ligado a forma inadequada de tipificar esses delitos, violando

veementemente os pilares da teoria do delito, da responsabilidade subjetiva e do

próprio garantismo penal, o qual já vem sofrendo tantos atentados nos últimos

tempos, sufragando, a passos largos, a mais histórica das conquistas da sociedade

brasileira: O Estado Democrático de Direito.

Por fim, cumpre ressaltar que o trabalho cientifico ora proposto adotará como

base o método de abordagem hipotético-dedutivo, utilizando, de modo auxiliar,

os métodos comparativo e histórico. Noutro turno, a principal fonte de pesquisa

será a bibliográfica, especialmente as legislações pertinentes, jurisprudências,

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artigos científicos e obras literárias que abordam, da forma mais especifica

possível, a matéria em comento.

6. A POLÍTICA CRIMINAL DO PODER JUDICIÁRIO E A CONFORMAÇÃO DE

ELEMENTOS DOGMÁTICOS DO DIREITO PENAL ECONÔMICO

Autora: Paula Nunes Mamede Rosa

Coautora: Ludmila Carvalho Gaspar de Barros Bello

Resumo:

A proposta de trabalho envolve analisar o protagonismo assumido pelo Poder

Judiciário no combate à corrupção no Brasil, tornando-se verdadeiro produtor de

política criminal – em seu sentido mais moderno, de conjunto de princípios e

recomendações para reforma, transformação e aplicação da legislação criminal

(BATISTA, 2007) – e, com isso, conformando diversos elementos dogmáticos

relacionados aos Direito Penal Econômico.

A pesquisa visa, assim, a analisar o papel do Poder Judiciário no atual contexto de

enfrentamento à criminalidade econômica, identificando-se os efeitos das

orientações de política criminal emanadas dele e o impacto dos precedentes na

conformação do Direito Penal. Esse recorte justifica-se principalmente pelo

alcance das decisões não apenas nos casos concretos já submetidos a ele, mas

também nas futuras decisões e, assim, na aplicação do Direito como um todo, em

sua forma mais dinâmica e sentida na realidade social.

Com efeito, a partir do momento em que o Poder Judiciário passa a protagonizar

o movimento de combate à criminalidade econômica, no momento em que

aplica a lei penal, fazendo direito no caso concreto, já embute nessa aplicação as

suas próprias orientações de política criminal, ditando não apenas o que é a lei

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no caso concreto, mas criando lei de acordo com a política adotada por si. Dai

exsurge a relevância de se analisar esse papel do Poder Judiciário.

Para tanto, selecionou-se, partindo da prática profissional, algumas inovações

protagonizadas pelo Poder Judiciário, especificamente os elementos

configuradores do crime de corrupção passiva, o uso da teoria da cegueira

deliberada na lavagem de dinheiro, a aplicação da teoria do domínio do fato para

ampliação da responsabilidade penal e o recurso à condução coercitiva para

realização de interrogatórios de acusados e investigados. Para o estudo que se

propõe são utilizadas decisões paradigmáticas, a título exemplificativo e

ilustrativo das discussões trazidas, não se propondo a um estudo empírico

quantitativo ou qualitativo.

Após a análise dessas orientações de política criminal por parte do Poder

Judiciário, que tem como ponto de partida referidas decisões paradigmáticas,

pode-se concluir que os magistrados acabam ocupando um espaço deixado vazio

por uma História de ausência de sistematização e racionalização de política

criminal e de modelo de intervenção estatal.

Nesse vácuo, recorre-se à atividade de mera responsabilização penal dos

indivíduos, protagonizada de tempos em tempos pelo Poder Judiciário, mas que

não alcançam o nível preventivo e de fato eficaz para os fins almejados. Confirma-

se, assim, mais uma vez o recurso ao Direito Penal, na insuficiência de iniciativas

de outras naturezas, tecendo-se as críticas pertinentes à produção judicial, por

meio das contribuições doutrinárias, que ainda são a maior fonte de limitação à

expansão do poder punitivo vislumbrada.

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7. A INFLUÊNCIA DOS PROGRAMAS DE COMPLIANCE NA CEGUEIRA DELIBERADA

DOS DIRIGENTES EMPRESARIAIS

Autor: Pedro Augusto Amaral Dassan

Resumo:

Em um conturbado contexto dogmático jurídico-penal de uma criminalidade

econômica, cada vez mais a jurisprudência brasileira vem lançando mão de

teorias do direito anglo-saxão para fundamentar a imputação de fatos típicos a

dirigentes empresariais, diante das dificuldades que se encontra no

ordenamento jurídico erigido a partir de um direito penal tradicional iluminista.

Nessa óptica que vem à luz a teoria da cegueira deliberada (Willful Blindness),

segundo a qual o agente, de modo deliberado, se coloca em situação de

ignorância acerca de um fato ilícito para evitar responsabilidades jurídicas. Essa

conjuntura ganha contornos mais sensíveis no ambiente empresarial, em

especial no que diz respeito à omissão e/ou atuação de dirigentes empresariais

em relação a atos de seus subordinados e/ou clientes. A importação de referido

instituto exige cautela diante de sua construção original sob um paradigma de

um sistema de common law, alheio à sistemática da civil law romano-germânica

brasileira. Essa realidade é agravada pelas dificuldades que a dogmática encontra

logo na base da discussão sobre a caracterização do elemento subjetivo do tipo,

notadamente em relação ao dolo eventual, sobre o qual recai a análise acerca da

subjetividade do agente em sua “autocolocação dolosa” em ignorância no plano

de tomadas de decisões no cotidiano das atividades da empresa. Em paralelo,

verifica-se uma cada vez mais acentuada ascensão de programas de Compliance

no âmbito das empresas com vistas à prevenção de atividades ilícitas e

consequentes responsabilizações jurídicas, sejam elas administrativas, civis ou

mesmo penais pelas empresas. Neste sentido, dentro de uma realidade em que

se prima pela responsabilização penal das pessoas físicas, no caso, os sócios,

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administradores ou dirigentes das empresas, é necessário se averiguar qual o

papel que tais programas de integridade podem desempenhar na estrutura de

imputação penal a referidas pessoas, nomeadamente no que concerne à

influência no elemento cognitivo do tipo subjetivo. Assim, dois vieses são

importantes: primeiramente sob o ponto de vista do dirigente da empresa, no

sentido de um programa de Compliance lhe fornecer maior segurança em suas

tomadas de decisões e, ainda, sob o ponto de vista judicial, em fornecer ao

aplicador da lei maior suporte probatório acerca do (des)conhecimento pelos

dirigentes dos elementos circunstanciais que compõem a situação fática em que

se atribui um delito. O presente trabalho, portanto, se propõe a realizar uma

análise global e perfunctória da influência dos programas de Compliance na

cegueira deliberada no contexto das tomadas de decisões dos dirigentes no

ambiente empresarial e suas implicações no direito penal.

8. PREMISSAS DA RESPONSABILIDADE CRIMINAL DO COMPLIANCE OFFICER

Autora: Renata Pereira Mayrink

Coautor: Henrique Viana Pereira

Resumo:

O crescente desenvolvimento econômico e tecnológico vivenciado na

modernidade tardia foi acompanhado pelo surgimento de novos riscos sociais,

gerando um aumento no sentimento de insegurança (BECK, 2011, p. 23). Apesar

de haver outros meios de proteção social, distintos dos meios próprios do Direito

Penal, menos lesivos para os cidadãos, e, com frequência, mais eficazes (MIR

PUIG, 2003, p. 109), a sociedade encontrou a solução para o controle dos novos

perigos sociais, principalmente, no Direito Penal. A partir dessa premissa surge a

expressão Direito Penal da Sociedade de Risco (SILVEIRA, 2006, p. 97).

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Para sanar os riscos modernos, tem-se verificado atualmente uma expansão e

antecipação da tutela penal, principalmente em direção aos crimes cometidos no

âmbito econômico (SILVEIRA, 2006, p. 91). Nesse contexto, os compliance

programs se tornaram importante instrumento utilizado pelas pessoas jurídicas

para prevenção de delitos. São programas destinados a assegurar a observância

da norma penal por parte dos protagonistas da atividade empresária (NEIRA,

2016, p. 469). Esses programas também visam demonstrar incentivos para que a

pessoa atue conforme a lei. Nesse sentido, os agentes decidem se vão cumprir as

normas comparando os custos e benefícios esperados pelo compliance (BECKER,

2008, p. 42).

A responsabilidade penal que recai sob os diretores das pessoas jurídicas,

originariamente responsáveis por conter eventuais riscos gerados com a

atividade da organização, é, por meio da implementação de programas de boas

práticas empresariais, delegada aos compliance officers. Esses agentes assumem,

contratualmente, a responsabilidade de impedir a ocorrência de infrações no

âmbito empresarial, apropriando a função de garante (PLANAS, 2016, p. 247).

A partir do momento que pessoas físicas se encarregam do papel de supervisão,

vigilância e controle das políticas de boa governança, torna-se necessária a

delimitação dos pressupostos e alcance da responsabilidade penal desses

profissionais, sob pena de insegurança jurídica (PLANAS, 2016, p. 246).

Assim, como o Direito Penal clássico rompeu barreiras e abriu espaço para uma

nova feição, denominada Direito Penal Econômico, há premissas imprescindíveis

para justificar a responsabilidade penal do compliance officer. Nesse contexto,

identifica-se a pertinência temática dessas premissas com o Direito Penal

Econômico. O pano de fundo são as garantias fundamentais, no contexto de um

Direito Penal garantista, preocupado com a dignidade da pessoa humana e com

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a racionalidade na intervenção penal. Apesar do expansionismo penal, deve-se

preocupar com os riscos de uma resposta simbólica à sociedade do risco.

Objetiva-se, portanto, através do artigo científico que será apresentado,

estabelecer as premissas necessárias à responsabilização criminal do compliance

officer, o que será feito através do desenvolvimento de um estudo acerca dos

elementos subjetivos dos tipos penais e do princípio da culpabilidade, de modo a

se evitar a possibilidade de uma responsabilidade penal objetiva do agente

encarregado dos programas de conformidade nas pessoas jurídicas.

9. A POLÍTICA CRIMINAL INTERNACIONAL SOBRE A CORRUPÇÃO NO AMBIENTE

PRIVADO E OS REFLEXOS NA DOGMÁTICA JURÍDICO PENAL

Autor: Thaís Regina Santos Saad

Coautor: Fernando Andrade Fernandes

Coautora: Geisa Mariah Bomfim Felício

Resumo:

Em uma era de tendência globalizadora incomparável, a preocupação

internacional com a corrupção, é clara (PEREZ; SANCHÉZ, 2011, p. 23). A luta

contra a corrupção reflete-se em instrumentos jurídicos supranacionais que

buscam promover a inserção gradativa - no ordenamento jurídico de seus

signatários - da figura penal da corrupção privada. O presente artigo tem como

objetivo uma análise político-criminal dos mecanismos internacionais de previsão

da criminalização do delito de corrupção no ambiente privado. Referidos

instrumentos visam uma equiparação ou harmonização das respostas

sancionadoras proporcionadas pelas leis internas e por sua vez, facilitar a

cooperação internacional entre os Estados, bem como promover mecanismos

preventivos eficazes. A pesquisa parte de uma análise dos documentos

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internacionais que preveem a criminalização de condutas relacionadas à

corrupção privada, focando na verificação de como ela foi contemplada em

alguns ordenamentos jurídicos de mesmo entorno cultural que o brasileiro,

especialmente o espanhol e o português. Registre-se, inicialmente, a ausência de

um consenso quanto ao recurso à intervenção penal em relação ao crime de

corrupção privada e mais ainda em relação ao objeto das respectivas normas:

bem jurídico. Destarte, intenta-se, desde uma perspectiva crítica, verificar a

regulamentação penal já existente no Ordenamento Jurídico brasileiro que pode

ser aplicada a esta modalidade de crimes, e eventual necessidade e legitimidade

de alterações legislativas visando adequar à legislação nacional à política criminal

internacional. Analisar-se-á a hipótese de ser a tutela da lealdade na concorrência

o modelo que mais se coaduna com os objetivos formulados pelos instrumentos

internacionais, e se ele se revela compatível com o Ordenamento Jurídico

brasileiro. Não obstante a danosidade dos comportamentos corruptos e a ânsia

em combatê-los, principalmente no contexto atual, questiona-se a existência da

necessidade concreta de se socorrer do Direito Penal. Embora, admita-se a

legitimidade dos interesses defendidos, questiona-se: é necessária a intervenção

penal nestes casos? A criminalização desta conduta, não contraria a própria razão

subsidiária do Direito Penal?

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GRUPO DE TRABALHO 3: CRIME E PENA

Ementa: O GT Crime e Pena tem por objetivo principal discutir os critérios

criminológicos e dogmáticos da criminalização de condutas e da seletividade do

Sistema de Justiça Criminal. O enfoque central do referido grupo será analisar

como a seletividade penal atua no momento de definição legislativa dos crimes

e das penas, bem como na aplicação do direito pelo Sistema de Justiça Criminal

desde a polícia, passando pelo Ministério Público, o Poder Judiciário, o sistema

penitenciário e de penas alternativas. Os trabalhos apresentados devem ser

baseados em pelo menos uma dessas perspectivas

Coordenador Prof. Dr. Humberto Fabretti

Graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie

(2006). Mestre (2008) e Doutor (2013) em Direito Político e Econômico pela

Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professor de Criminologia, Direito Penal

e Direito Processual Penal na Graduação e Pós-Graduação da Faculdade de

Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Avaliador da Revista Brasileira

de Direito - IMED e da Revista do Direito Público - UEL. Membro do Instituto

Brasileiro de Ciências Criminais. Membro da Associação Penal de Direito

Internacional (AIDP). Membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

Lattes: http://lattes.cnpq.br/7771852893427682

Coordenadora Ms. Ana Míria Carinhanha

Doutoranda em Sociologia e Direito pela Universidade Federal Fluminense.

Mestre em Criminologia pela Université Catholique de Louvain, Bacharel em

Direito pela Universidade do Estado da Bahia, Bacharel Interdisciplinar em Artes

com foco em políticas e gestão da cultura pela Universidade Federal da Bahia.

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Pesquisadora do GPCrim (Grupo de pesquisa em Criminologia) e do Anastácia

Bantu (UFF). Lattes: http://lattes.cnpq.br/3337247700188498

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Trabalhos:

1. MEDIDA DE SEGURANÇA: UMA ANÁLISE DO DISCURSO LEGISLATIVO SOBRE O

AUTOR DE ATO INFRACIONAL ACOMETIDO DE SOFRIMENTO PSÍQUICO

Autor: Alana Katiúscia Schütz da Silva

Resumo:

Desde a criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, numerosos Projetos de

Lei foram criados visando à aplicação da medida de segurança àqueles

adolescentes que tenham sido diagnosticados com algum sofrimento psíquico e

o aumento do prazo de internação a estes infracionalizados, de modo que tais

propostas nunca se concretizaram. O presente trabalho buscou responder “de

que maneira se articula o discurso legislativo sobre o sofrimento mental e a

resposta estatal ao ato infracional?”, analisando como o legislador vê o

adolescente autor de ato infracional acometido de sofrimento psíquico nas

propostas de inclusão da Medida de Segurança entre os anos de 2007 e 2016. O

método usado na pesquisa foi predominantemente o indutivo na análise de leis

e projetos legislativos. No presente trabalho foi feita a análise dos discursos

legislativos sobre o autor de ato infracional acometido de sofrimento psíquico,

contextualizando também a internação compulsória como medida jurídica para

manter adolescentes em conflito com a lei institucionalizados mesmo com a

vigência da Lei da Reforma Psiquiátrica (Lei n. 10.216/2001). Concluiu-se que o

“tratamento” proposto pelos legisladores nada mais é que uma medida de

segurança mascarada, mantendo esses adolescentes à mercê do descaso e sem

solução efetiva, de modo que os discursos usados se inclinam para uma punição.

O trabalho encontra sua relevância social ao dispor de atenção científica sobre

um problema que promove discussões objetivamente incompatíveis com um

Estado Democrático de Direito. Discussões tão atuais quanto a da PEC 171,

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aprovada no ano de 2015, e os princípios que regem o Estatuto da Criança e do

Adolescente, além de propor cuidados para os adolescentes acometidos de

sofrimento psíquico a serem estudados no presente trabalho, que, como fins em

si mesmos, nunca deixam de ser tão importantes quanto qualquer ser social.

Dessa forma, a presente pesquisa se mostra pertinente à temática do Grupo de

Trabalho (GT) 3 sobre “Crime e Pena”, pois a institucionalização do

infracionalizado acometido de sofrimento psíquico faz com que o legislativo

caminhe em direção ao paradigma dos chamados perigosos, visto que o

encarceramento é maior que o investimento em políticas sociais e na erradicação

do punitivismo estatal àqueles que não são considerados culpados. Essa

tendência de psiquiatrização, principalmente da juventude pobre, é a justificativa

para mascarar como uma “doença mental” certos processos sociais que

discriminam a pobreza.

2. CRIMES EM "HASHTAGS": A COBERTURA JORNALÍSTICA DO PERFIL

INSTITUCIONAL DO TJDFT EM CASOS DE GRANDE REPERCUSSÃO

Autora: Carolina Costa Ferreira

Coautora: Luiza Guimarães Moreira

Resumo:

O uso de redes sociais para promover a interação de instituições públicas,

especialmente de órgãos do sistema de justiça criminal, em redes sociais como

Facebook ou Twitter. Porém, quais são os limites destas comunicações? Quais

são os limites entre o direito à informação, de todos os cidadãos, a respeito do

julgamento de um determinado crime, e os direitos individuais das pessoas que

estão sendo processadas e, também, das vítimas dos crimes?

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A partir destas questões, o trabalho pretende analisar a cobertura jornalística do

perfil institucional do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios no

Twitter (@TJDFT_Noticias) de dois casos de grande repercussão no Distrito

Federal: um caso de latrocínio de um homem que buscaria seu filho na escola e

foi morto por um adolescente, em fevereiro de 2016, objeto de cobertura nas

redes sociais por meio do uso da hashtag #crimenaportadaescola, e o feminicídio

praticado contra a estudante da Universidade de Brasília Louise Ribeiro

(#casoLouise). O perfil institucional do Tribunal realizou uma cobertura ao vivo

das audiências de instrução e julgamento nos dois casos, e do júri, no primeiro

caso, dando informações sigilosas sobre os processos em muitos dos tweets.

Diante dessa realidade que se faz cada vez mais presente no sistema de justiça

criminal, o trabalho analisará a pertinência de tais coberturas sob a perspectiva

da chamada Criminologia Midiática, discutida por Eugenio Zaffaroni, das teorias

da comunicação a respeito do uso das redes sociais e dos princípios processuais

penais previstos em nossa Constituição.

3. LEI MARIA DA PENHA E A INEFICÁCIA DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE

URGÊNCIA: O RECRUDESCIMENTO PENAL COMO SOLUÇÃO

Autora: Elaine Amancio

Resumo:

O presente artigo tem como objetivo fazer uma reflexão sobre a violência

doméstica, a ineficácia das medidas protetivas e do endurecimento da pena. A

pesquisa bibliográfica mostrou que mesmo com as medidas protetivas, aplicáveis

após a Lei Maria da Penha, as mulheres permanecem vítimas constantes e

primordiais nas relações (PIRES, 2011, p. 125). A violência doméstica contra a

mulher ocorre diariamente e é um problema social que precisa ser sanado.

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A Lei Maria da Penha representa enorme avanço no campo dos direitos

fundamentais, expressa o necessário respeito aos direitos humanos das mulheres

e tipifica as condutas delitivas. De acordo com a Lei Maria da Penha, violência

doméstica e familiar contra a mulher é qualquer ação ou omissão baseada no

gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e

dano moral ou patrimonial.

Uma das grandes inovações da Lei Maria da Penha para o combate à violência

doméstica foi a criação das medidas protetivas de urgência (SANTOS; SANTOS,

2013, p. 15). Tratam-se de ordens judiciais para fazer cessar a violência contra a

mulher, seja para dar a ela o direito de acolhimento nas redes assistenciais, seja

para obrigar o agressor a deixar de praticar determinadas condutas, sob pena de

prisão. A partir de 04 de abril de 2018, entrou em vigor uma lei que criminaliza

especificamente o descumprimento das medidas protetivas de urgência: a Lei nº

13.641/2018. Agora, além das sanções de natureza civil (multa), administrativa

(força policial) e processual (prisão preventiva), existe uma figura criminal

específica que garante a punição do agressor com pena de prisão.

Esta nova norma inseriu na Lei Maria da Penha o artigo 24-A, que prevê pena de

detenção de três meses a dois anos, sem exclusão da aplicação de outras sanções

cabíveis, para quem descumprir decisão judicial que impõe medidas protetivas

previstas na Lei Maria da Penha, ou seja, o agressor, mesmo autuado em

flagrante por esse delito, poderá, de outro lado, ver sua prisão preventiva

decretada nos autos do processo que apura a violência doméstica anteriormente

praticada.

Trata-se de crime próprio, só podendo ser cometido por aqueles que estão

obrigados a respeitar as medidas protetivas decretadas. A Lei 13.641/2018,

criando o tipo penal de descumprimento de medidas protetivas, praticamente

dobrará o volume de ações nos juizados (AMARAL, 2018). Lembrando que o

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endurecimento da legislação penal como meio de garantir a ordem pública não

passa de uma grande ilusão, pois que, na prática, sempre se mostrou ineficaz.

4. A LESS ELEGIBILITY E A SUA PRESENÇA VELADA NO SISTEMA POLÍTICO-

CRIMINAL BRASILEIRO COMO FORMA DE SELETIVIDADE SOCIAL

Autora: Fernanda Pascoal Valle Bueno de Castilho

Coautora: Flávia Chaves Nascimento Brandão Penna

Coautor: Rauali Kind Mascarenhas

Resumo:

Nos primórdios da execução penal o preso era visto como objeto e não como

sujeito de direitos e, muito embora o status de pessoa presa tenha evoluído para

compreensão de um ser dotado de direitos e deveres, a concepção de que as

pessoas privadas de liberdade devem suportar um sofrimento maior do que os

que se encontram em liberdade jamais foi abandonada (ROIG, 2017).

Tal concepção fundamenta-se, em parte, no princípio da less elegibility.

Originalmente, referido princípio estava voltado para as condições de trabalho

dos miseráveis no interior das casas de trabalho (workhouses), cujo objetivo era

forçá-los a aceitar qualquer trabalho que lhes fosse oferecido. Para isso, a vida

nestes locais deveria ser pior que um trabalhador livre do mais baixo estrato

social podia obter (MELOSSI; PAVARINI, 2014).

No entanto, com a ascensão da burguesia e a sua premente necessidade de

trabalhadores e de manutenção no poder, referido princípio foi desvirtuado para

ser aplicado às pessoas presas, justificando, assim, a exploração da mão de obra

barata, além de legitimar o controle social. A less elegibility, portanto, passa a ser

fundamento de domínio de uma minoria detentora do poder econômico e que,

sob justificativa de segurança, faz de tudo para manter os indesejados afastados.

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Sob tal perspectiva, analisar-se-á se a less elegibility, teoricamente há muito

tempo abandonada, exerce influência nas escolhas político-criminais e nas

práticas judiciárias brasileiras e como ela se manifesta. Será analisada igualmente

a sua repercussão na execução penal e no pior tratamento dispensado ao preso.

Para tanto, serão estudados alguns dispositivos legais constantes na Lei de

Execução Penal em cotejo com os tratados internacionais de direitos humanos

dos quais o pais é signatário e com a Constituiçao da Republica, utilizando-se dos

métodos técnico-jurídico, histórico, comparativo e análise de dados.

Ao final, pretende-se concluir que o princípio da less elegibility nunca foi de fato

abandonado, estando presente, ainda que de forma velada, no nosso sistema

político-criminal, legitimando o controle e seletividade sociais. Igualmente

verifica a sua presença nas decisões emandas pelos órgãos judiciais, que, na

maior parte das vezes, consideram os presos meros objetos, fazendo vistas

grossas às diversas violações aos seus direitos fundamentais, pois, do contrário,

a intimidação não suritiria o efeito desejado. Diante destas almejadas conclusões

– a seletividade do sistema político-criminal-, verifica-se que o trabalho se

circunscreve à delimitação temática exigida pelo GT 3.

5. CAMORRA NAPOLITANA, CRIMES AMBIENTAIS E CONTRA A SAÚDE PÚBLICA

EM RAZÃO DA MOVIMENTAÇÃO DE RESÍDUOS TÓXICOS

Autor: Jeferson Brito Gonçalves

Coautor: Anderson Real Soares

Resumo:

A ação da Camorra foi objeto de análise de diversos pensadores e de diversas

manifestações artísticas, através de livros, filmes, documentários, debates

jurídicos em matéria administrativa, civil e penal, por tratar-se uma organização

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criminosa de alta complexidade e com atuação em diversos setores da sociedade

europeia.

No entanto, a proposição desse debate vai além da atuação nesses três ramos do

direito (administrativo, civil e penal), mas se faz necessário analisar os impactos

ambientais da atuação do grupo no tráfico de resíduos, que por sua vez, causou

um efeito devastador à população local, sendo em contrapartida, o lixo, uma

espécie de “ouro sujo” da organização, considerando o alto valor agregado que

os resíduos conferiam às lideranças.

Tal “fluxo de caixa” e a aberta negociação da Camorra com os exportadores dos

resíduos permitiram uma complexa captação e descarte, porém, a ilegalidade do

ato (atuação à revelia das licenças ambientais conferidas pelas autoridades

públicas) e o local do descarte trouxeram impactos que em muito superou a

esfera de violação pura e simples de legislação ambiental italiana. Ou seja,

estamos falando de impactos ambientais que transcendem a violação de uma

legislação de proteção ambiental, ao contrário, os resultados de uma conduta

dessa magnitude, pode por certo, configurar crime contra a humanidade se

adequarmos o caso ao amplo conceito defendido pela comunidade internacional

que se debruçam sobre o Meio Ambiente, como objeto de proteção do Poder

Público em todas as esferas, devendo ser defendido e preservado para as

presentes e futuras gerações.

O problema que envolve o tráfico de resíduos tóxicos, como um catalizador de

recursos econômicos em favor da Camorra foi em certo ponto tratado com

naturalidade e aceito pelas autoridades, de certa forma, por resolver uma

questão problemática na Europa no que tange a falta de aterro sanitário para o

depósito de lixo com certo grau de contaminação, no Velho Continente.

O aterramento de incontáveis barris de resíduos tóxicos na Região de Nápoles

trouxe como consequência para a população a disseminação de câncer e uma

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degradação ambiental praticamente irreparável, repercutindo no solo, na água,

no ar, ao ponto de tornar o lugar inabitável.

6. ANÁLISE CRIMINOLÓGICA: A TUTELA DO USUÁRIO DE DROGAS NO

ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

Autora: Juliana Bastos França David

Resumo:

O presente artigo tem por objeto analisar a forma na qual se dá a tutela do

usuário de Drogas no ordenamento jurídico brasileiro, tendo por escopo estudar

os aspectos do uso e do vício em substâncias psicoativas bem como verificar a

incompatibilidade da criminalização do porte de drogas para uso pessoal com a

Constituição vigente.

7. A REINCIDÊNCIA CRIMINAL E O ETIQUETAMENTO PARA A DECRETAÇÃO DA

PRISÃO PREVENTIVA

Autora: Lisandra Moreira Martins

Coautor: Isael José Santana

Resumo:

Tratando-se de uma medida excepcional e de cunho cautelar, a prisão preventiva

deve atender rigorosamente os requisitos legais previstos no Código de Processo

Penal (art. 311 e seguintes). Como é sabido, para que essa espécie de prisão seja

decretada são necessários alguns requisitos, quais sejam: o fumus commissi

delicti e o periculum libertatis, ou seja, a probabilidade da ocorrência de um

delito e o perigo que decorre do estado de liberdade do investigado ou

denunciado – risco para ordem pública, ordem econômica, conveniência da

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instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal (artigo 312 do

Código de Processo Penal). Além desses requisitos, o artigo 313 do CPP dispõe

sobre as infrações que admitem a medida, destacando-se o inciso II, o qual

preceitua que será admitida a decretação da prisão preventiva se o sujeito tiver

sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado,

ressalvado o disposto no inciso I do caput do artigo 64 do Código Penal.

Mencionado inciso traz a possibilidade de prisão preventiva ao réu reincidente

em crime doloso, não importando se o novo crime é punido com reclusão ou

detenção ou tenha pena igual ou inferior a quatro anos. Desse dispositivo, tem-

se que a Lei 12.403/2011, a qual teve como um dos fundamentos uma forma para

reduzir a utilização da prisão, nada alterou a respeito da prisão preventiva

envolvendo reincidentes, mantendo a linha anterior e a regra automática. Nesse

ponto é que recai a presente proposta, uma vez que o fato de o sujeito ser

reincidente e preso preventivamente pelo único fato dessa condição vem

dividindo opiniões e ensejando decisões divergentes nos Tribunais Superiores.

Desta forma, a presente proposta tem por escopo analisar a prisão preventiva

decretada ao sujeito reincidente com a justificativa única (explícita ou implícita)

desse status, com o viés do estudo da Criminologia Crítica, tangentemente do

direito penal do autor e do etiquetamento penal. Por meio do método dedutivo-

indutivo com pesquisa bibliográfica, análise de doutrina, legislação e recentes

decisões dos tribunais superiores a respeito, serão apresentadas a

fundamentação legislativa e teórica da necessidade da decretação da prisão

preventiva, principalmente voltada ao reincidente, e as nuances em torno da

seletividade penal. Como conclusão inicial, ver-se-á que a condição de

reincidente traz consequências e responsabilidades gravosas unicamente ao réu,

esquecendo-se que o Estado falha ao tomar para si a punição e não cumprir a

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promessa da ressocialização, na maioria dos casos, formando-se um círculo

vicioso de crime-prisão-reincidência.

8. VANDALISMO E OS INDESEJÁVEIS: A LEI ANTIVANDALISMO DE PORTO

ALEGRE/RS SOB A PERSPECTIVA DA CRIMINOLOGIA CULTURAL

Autor: Pedro Henrique Farina Soares

Resumo:

Em 09 de março, foi sancionado pelo prefeito de Porto Alegre Nelson Marchezan

Jr. a Lei Complementar nº 832/2018, intitulada de “Lei Antivandalismo”, além de

ampliar o rol de poderes e punições da Guarda Municipal, prevê, conforme artigo

13, multas de até R$ 400.000,00 para quem “embaraçar ou impedir, por qualquer

meio, o livre trânsito de pedestres ou veículos nos logradouros públicos”.

Modifica também incisos do artigo 20 da Lei Complementar 12/1975 para

ampliar a restrição de manifestações populares, no sentido de haver indicação

do local, do horário e do roteiro para serem previamente aprovadas pelo

Município de Porto Alegre, sob pena de não ocorrerem. A Lei ainda estipula

punição para pichadores, depredadores e para quem urinar e/ou defecar em via

pública.

Em análise de pedido de liminar de ADIN (nº 70077010890) para suspensão da

lei junto do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, o desembargador Arminio

José Abreu Lima da Rosa a indeferiu, alegando dentre outros argumentos que “as

guardas municipais, portanto, podem e devem atuar na defesa da segurança

pública, da preservação da incolumidade pública e do patrimônio, sem previa

anuência, autorização ou interveniência de qualquer outro órgão público”. O

artigo 5º, inciso XVI, da CF, apenas prescreve que é necessário aviso prévio à

autoridade competente não existindo qualquer menção à aprovação.

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A conceituação de inimigo impõe caráter político-valorativo. O Estado, enquanto

mantenedor da segurança estipula quais serão aqueles indivíduos que devem ser

neutralizados e excluídos da comunidade em prol da ordem e do progresso

econômico. Zaffaroni (2011) sustenta que essa construção do inimigo age como

uma maneira de controlar o avanço dos direitos e conquistas sociais daqueles

que sempre viveram na marginalidade.

O crescente avanço de empreendedores morais (BECKER, 2009) no campo da

gestão dos indesejáveis (CASARA, 2017) desde a criação legislativa e políticas

implantadas pelo executivo até a maneira com que o Sistema Criminal de Justiça

se impõe, possibilita que determinados nichos da sociedade estejam assumindo

a condição de delinquentes, seja por uma violência concreta ou simbólica.

Sob essa perspectiva, a presente pesquisa tem por objetivo analisar as questões

criminológicas das condutas tipificadas como infratoras na referida lei, sob o viés

da criminologia cultural, não adentrando no mérito da constitucionalidade da Lei.

Para tanto, se utilizará da perspectiva de Khaled Jr. (2018), com grande

sustentáculo em autores como Ferrel, Hayward e Young, que compreende que a

criminalização do outro é um processo complexo de interação no qual a

Criminologia Cultural possui um papel importante na confrontação da hegemonia

do Estado sobre o “reino da imagem”, eis que volta os seus estudos para

turbulência social ante a implementação de políticas de exclusão.

A partir do exposto, o trabalho se desenvolverá com a adoção de procedimento

de pesquisa bibliográfico e da decisão de indeferimento da liminar da ADIN nº

70077010890, através do método dedutivo, de abordagem qualitativa e

interdisciplinar.

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9. A SELETIVIDADE NOS CRIMES PATRIMONIAIS: UMA PROPOSTA PARA A

INICIATIVA DA AÇÃO PENAL

Autor: Renan Azevedo Leonessa Ferreira

Resumo:

Esta pesquisa se pauta no Grupo de Trabalho 3 (Crime e Pena), tendo como

escopo a apresentação oral consistente em análise e soluções à seletividade no

âmbito dos crimes patrimoniais. Em razão de um marcante encarceramento em

razão de crimes patrimoniais, é de extrema valia uma análise da ideologia por

trás da elaboração dos tipos penais referentes ao patrimônio. De se ressaltar a

predominância da conceituação jurídica, a qual visa à tutela exclusiva da relação

social entre o titular e seu bem, gerando forte abstração normativa. Embora

presentes outras vertentes, notadamente a econômica, o conceito jurídico de

patrimônio prevalece em nosso ordenamento, o que se reflete na dificuldade de

aplicação do princípio da insignificância.

Essa opção do legislador não é aleatória: demonstra a pré-seleção dos indivíduos

atingidos pela norma penal. Realmente, verifica-se a tendência de que os delitos

patrimoniais sejam praticados por indivíduos menos favorecidos contra classes

sociais mais abastadas. Com vistas à manutenção das relações capitalistas, o

legislador voltou-se à gestão da pobreza. Esse raciocínio é respaldado pela

desproporção entre penas cominadas a delitos patrimoniais e contra a vida.

Contudo, nossa Constituição de 1988 deslegitima a hipervalorização do

patrimônio conferida pelo legislador penal. Ora, ao estabelecer a dignidade da

pessoa humana como elemento fundamental, bem como com a marcante

limitação da propriedade por sua função social, o constituinte posicionou a

liberdade individual acima do patrimônio. Há reflexos imediatos sobre o bem

jurídico patrimônio, o qual, por excelência, é disponível em razão de sua

fungibilidade e quantificação pecuniária. Portanto, no ordenamento

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constitucional, cuja autonomia individual é valorizada, deve o patrimônio

fomentar o livre desenvolvimento do indivíduo.

Dentre diversos elementos incoerentes na tutela dos crimes patrimoniais,

destaca-se a iniciativa da ação penal em hipóteses sem violência ou ameaça. Esta

consiste, majoritariamente, em pública incondicionada. Sob esse prisma vigoram

a obrigatoriedade e indisponibilidade, o que se revela em descompasso com a

disponibilidade do patrimônio. Destarte, esta apresentação visa a propor a

transposição da iniciativa da ação penal no âmbito dos crimes patrimoniais a seu

titular, conferindo-se a natureza privada. Afinal, se não houver interesse do

sujeito passivo na persecução penal de um interesse particular, não há que se

promover a ação penal.

No mais, a fim de se viabilizar uma igualdade material a todas as vítimas, propõe-

se o instituto da ação penal pública condicionada à pobreza. Em se tratando de

vítima que tenha a capacidade de arcar com as despesas da ação, esta será de

iniciativa privada. Do contrário, proceder-se-á à representação ao Ministério

Público. De mais a mais, não se pode olvidar a incidência de todos os institutos

inerentes à ação privada, tais como a possibilidade de retratação e perdão do

ofendido a qualquer momento do processo.

Sendo assim, com uma busca pela adequação do conceito do bem jurídico

patrimônio, bem como pela redução do encarceramento em massa, esse tema

mostra-se pertinente à temática do grupo de trabalho escolhido.

10. A CRIMINOLOGIA NO CONTEXTO DO DARWINISMO SOCIAL

Autor: Renato Matsui Pisciotta

Resumo:

O início da era contemporânea assistiu ao desenvolvimento de diversas formas

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de determinismo biológico. Durante o século XIX, por exemplo, foi muito popular

a frenologia, teoria criada pelo alemão Franz Joseph Gall, que pretendia entender

o caráter e as propensões criminosas de uma pessoa através da análise do

formato do seu crânio. À medida que avança o Oitocentos, o entusiasmo pela

Biologia cresce. As descobertas de Pasteur no ramo da microbiologia conduzem

às campanhas de higienização, chegando, por vias nem sempre diretas, à noção

de Medicina Social. Para esta, a sociedade seria como um corpo, que adoece e

padece de males. Esta percepção engendrou, entre outros, um viés

preconceituoso que associou o pobre, o desvalido, aos males sociais, àquilo que

deveria ser varrido pela higienização. O direito penal foi por vezes utilizado para

cumprir esta função.

A forma de determinismo biológico com maiores consequências jurídicas foi o

darwinismo social. Charles Darwin formula sua teoria da evolução das espécies

que tem grande impacto sobre a forma como o Homem se via diante do universo.

Uma das formas mais difundidas do darwinismo foi aquela proposta por Francis

Galton, que utilizou amplamente a ideia de evolução para as sociedades

humanas. É Galton que fala da “sobrevivência do mais forte” e que vai pregar que

apenas os “melhores” devem existir. É o criador da eugenia e fundamentou

teorias racistas.

Passa a existir, no imaginário das elites europeias, norte-americanas e brasileiras,

a noção de que existe o indivíduo evoluído e o “degenerado”. Este último seria o

primitivo, aquele que não evoluiu. A função do Direito, para muitos, passa a ser

livrar a sociedade deste tipo. É neste sentido que veio o que se convencionou

chamar, na época, de Nova Escola Penal. São os famigerados Lombroso, Ferri e

Garofalo.

No Brasil estas concepções chegam a partir da Faculdade de Direito de Recife,

em fins do século XIX. A Faculdade de Direito de São Paulo não tarda a aderir,

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embora com menor entusiasmo. Existem inúmeras políticas públicas e

instituições jurídicas do início do século XX que caminharam nesta direção. A

eugenia estava prevista na Constituição Federal de 1934, por exemplo.

O tema está relacionado ao GT na medida em que explicita a formação do

pensamento criminológico das elites jurídico-políticas do país. Ainda hoje, em

nome de um Direito mais humanista, combatemos noções como higienização

social e racismo na distribuição social da punibilidade. O quadro atual é fruto de

uma História que precisa ser revisitada.

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GRUPO DE TRABALHO 4:

PROVA PENAL E ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Ementa: A prova penal tem passado por profunda revisão ao longo dos últimos

anos. Os conceitos de prova ilícita, cooperação jurídica internacional, standards

de prova e cadeia de custódia encontram profícuo debate na doutrina e na

jurisprudência. O grupo de trabalho busca analisar a prova neste contexto.

Coordenadora profa. Dra. Orly kibrit

Doutora e mestra em Direito Político e Econômico pela Universidade

Presbiteriana Mackenzie. Assessora criminal na Procuradoria Regional da

República da 3ª Região. Professora convidada dos cursos de Pós-Graduação Lato

Sensu em direito penal e processo penal da Universidade Presbiteriana

Mackenzie e do Centro Universitário Toledo Prudente. Professora no Complexo

Educacional Damásio de Jesus.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/4010006120401746

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Trabalhos:

1. A PRODUÇÃO DE PROVAS DE OFÍCIO PELO JUIZ NO PROCESSO PENAL

BRASILEIRO

Autor: Bernado Simões Coelho

Resumo:

O trabalho se insere no grupo de trabalho 4, Prova Penal e Estado Democrático

de Direito, destinando-se a analisar a produção de provas de ofício pelo juiz e

suas consequências para o devido processo legal constitucional.

O estudo se propõe a pesquisar a produção de provas, de ofício, pelo juiz,

autorizada pelo artigo 156, I, do Código de Processo Penal Brasileiro.

O trabalho busca demonstrar a inconstitucionalidade da autorização legislativa,

eis que a mesma contraria o princípio da Imparcialidade do Juiz, insculpido no o

artigo 8º, 1 da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San José da

Costa Rica) e, por consequência, introduzida em nossa legislação como norma de

força constitucional, através do §2 do artigo 5º da Constituição da República.

Inicialmente, será apresentado um estudo a respeito do princípio da verdade real

e das concepções contemporâneas de verdade, com a demonstração de que as

concepções contemporâneas de verdade não admitem a utilização do princípio

como fundamento de validade de qualquer norma jurídica.

Partiremos, então, para uma demonstração de que a busca pela verdade real e a

iniciativa probatória do juiz se circunscrevem em uma forma ultrapassada de

condução do processo penal, profundamente marcada pelo modelo inquisitório

de processo, abandonado pela Constituição de 1988.

Para isso será necessário, além de um estudo sobre o Princípio da Verdade Real

no Direito, demonstrar a evolução, ao longo do tempo, das teorias

processualistas, bem como os avanços nas doutrinas garantistas do direito penal,

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e a inadequação da produção de provas de ofício, por parte do juiz, a esse

contexto. A metodologia utilizada será a metodologia bibliográfica, com análise

de textos e de jurisprudência brasileira.

Será feito um estudo, através, principalmente, da obra do filósofo Hans-Georg

Gadamer sobre a concepção de verdade na filosofia contemporânea, e a maneira

como a renovação do conceito influencia diretamente na Teoria Geral do

Processo e na evolução dos ordenamentos jurídicos.

Também será exposta a evolução das teorias processuais, partindo das teorias

fazzalarianas até algumas noções mais contemporâneas, como a obra dos

autores Rosemiro Pereira Leal e José Alfredo de Oliveira Baracho.

Será então trabalhada a relação entre o sistema inquisitorial de processo penal,

o princípio da verdade real e a produção de provas de ofício pelo juiz,

especialmente da maneira que são tais institutos tratados nas obras de Felipe

Martins Pinto, Ada Pellegrini Grinover, Aury Lopes Júnior e Alexandre Morais da

Rosa.

E, ao fim, serão apresentadas as principais conclusões do trabalho:

a) a inconstitucionalidade do artigo 156, I, do Código de Processo Penal, eis que

o mesmo fere o princípio da imparcialidade do juiz, que por sua vez é parte

fundamental do devido processo legal e está inscrito no Pacto San José da Costa

Rica.

b) A iniciativa probatória, de ofício, por parte do juiz, se circunscreve no atrasado

modelo inquisitorial de processo penal, e fundamenta-se no ultrapassado

princípio da busca pela verdade real, não podendo ser, nos dias de hoje,

fundamento de validade da norma processual ou de decisão judicial.

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2. O “BIG DATA” E A PROVA NO PROCESSO PENAL – A GRANDE QUANTIDADE DE

DADOS PRODUZIDOS NAS OPERAÇÕES REALIZADAS PELA CHAMADAS FORÇAS-

TAREFAS E A DEFESA TÉCNICA

Autora: Carla Silene Cardoso Lisboa Gomes

Coautor: Eduardo Bruno Avellar Milhomens

Resumo:

O objetivo da pesquisa é analisar a massiva produção de provas por parte dos

órgãos de persecução penal, nas hoje tão comuns “mega-operações”, e como

esta grande quantidade de dados “BIG DATA” se transformam em um problema

para a Defesa, tendo em vista a dificuldade material e técnica, de se analisar todo

o acervo probatório.

Questões técnicas envolvidas: A cadeia de custodia de prova, o problema do

elemento probatório oculto “Unclouded and Disclosed” e a dificuldade material

do acusado de analisar e defender.

Metodologia de pesquisa: pesquisa processual, doutrinária, bibliográfica e

jurisprudencial, principalmente no direito comparado.

Apontamentos centrais: O Brasil viu expandir exponencialmente nos últimos

anos, as grandes operações de persecução penal realizadas pelas chamadas

“Força-tarefa”, que são a união de diversos setores do aparato estatal de

controle, objetivando atacar a criminalidade organizada. A grande quantidade de

elementos produzidos por essas operações, sem uma organização e uma cadeia

de custodia da prova bem definida, acabam por sofrerem um filtro pouco

democrático, e, debilitando a defesa técnica, fazendo com que não tenhamos

uma paridade de armas no processo probatório.

Principais conclusões: Sem a capacidade de analisar e gerir a grande quantidade

de dados, a defesa técnica encontra-se em posição desfavorável, já que ficará

submetida ao desejo e filtro dos próprios órgãos de persecução penal, que

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poderão literalmente enterrar elementos pró-defesa e destacar aquilo que lhe

interessa. Sem a capacidade material de pessoal e recursos dos entes estatais, a

defesa se encontra impossibilitada de rebater ou mesmo refutar aquilo que foi

produzido durante o procedimento investigatório preliminar.

Pertinência temática ao GT 4: Desafios a defesa técnica em analisar grande

quantidade de elementos probatórios – a necessidade de uma melhor gerencia

na cadeia de custodia da prova, com o objetivo de limitar o poder do Estado. A

necessária paridade de armas quanto a produção de prova no processo penal

moderno.

3. A (I)LICITUDE DA PROVA PRODUZIDA A PARTIR DA BUSCA E APREENSÃO

REALIZADAS POR GUARDAS CIVIS MUNICIPAIS: LIMITES CONSTITUCIONAIS E

PROCESSUAIS

Autor: Josué Justino do Rio

Coautor: André Luiz Pipino

Resumo:

A presente pesquisa tem por objetivo investigar a licitude da prova produzida

mediante a busca e apreensão realizadas por guardas civis municipais, em razão

das atribuições que lhes foram conferidas pela Constituição Federal e

regulamentada pela Lei n. 13.022/2014, que dispõe sobre o Estatuto Geral dos

Guardas Municipais. A discussão parte do pressuposto de que o papel de polícia

ostensiva é atribuição das forças policiais, por expressa previsão constitucional.

O tema se mostra relevante na medida em que na maioria dos municípios do

interior, ao argumento da necessidade de garantir a segurança dos munícipes e

do número insuficiente de policiais militares, tem investido na compra de

equipamentos e aumentado o efetivo dos guardas civis municipais, atribuindo-

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lhes a responsabilidade pela manutenção da segurança pública, típico de polícia

ostensiva. Esse fenômeno da municipalização da segurança pública tem trazido

algumas consequências de ordem processual, tendo em vista que os guardas civis

municipais têm realizado prisões em flagrante, busca pessoal, domiciliar, em

veículos, etc. No que se refere à prisão em flagrante, não há óbice, desde que

respeitados os limites estabelecidos pela legislação processual, visto que

qualquer do povo pode realizá-la. O problema, em sua grande maioria, decorre

da execução de busca pessoal, domiciliar ou em veículos, por exemplo,

porquanto o procedimento não encontra amparo na Carta Constitucional e na

legislação processual. As discussões têm sido intensas e levadas aos tribunais,

que tem reconhecido, em alguns casos, a nulidade das provas colhidas por meio

de busca e apreensão realizadas por guardas civis municipais durante

abordagens, posto que estariam extrapolando os limites fixados pela

Constituição, pelo Código de Processo Penal e pela Lei n. 13.022/2014. O

dedutivo se mostrou o método adequado para a investigação, assim como

reflexões doutrinárias e análise documental, especialmente de decisões

proferidas pelos Tribunais Superiores e Estaduais. Conclui-se que a prova advinda

de busca e apreensão realizadas por guardas civis municipais quando de

abordagem característica de atuação de polícia ostensiva, é considera ilícita, na

medida em que estão usurpando a competência de ação típica de segurança

pública, de viés preventivo, o que, por expressa previsão constitucional, é

exclusiva das forças policiais. Essa atividade, além de ofender a Constituição

Federal, mais precisamente o art. 144, §8º, também está em desconformidade

com o a Lei n. 13.022/2014, que prescreve ser a função dos guardas civis

municipais de “proteção municipal preventiva”, ressalvadas as competências da

União, dos Estados e do Distrito Federal.

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4. O RECONHECIMENTO DE PESSOA COMO MEIO DE PROVA E O ENTENDIMENTO

DO STJ – A FORMA AINDA É GARANTIA NO PROCESSO PENAL?

Autor: Leonardo Mariozi Russi

Resumo:

No Sistema do Livre Convencimento Motivado, ou da Persuasão Racional, o

Magistrado deve examinar e valorar as provas produzidas nos autos, expondo

democraticamente as razões de fato e de direito que influenciaram sua

convicção. É bem verdade que o sistema em questão confere liberdade ao

Magistrado para considerar as provas. Não se pode, entretanto, confundi-lo com

o antigo sistema da Convicção Íntima (preceito ainda vigente no julgamento em

plenário do Júri), eis que, neste, a Liberdade é Ilimitada. Sobre o assunto, é

sempre imprescindível a lição de GIACOMOLLI: - “O magistrado é livre no sentido

de que pode escolher essa ou aquela prova, dizer qual lhe convenceu e porque

há provas a serem descartadas, mas a liberdade não pode servir para justificar

‘escamotages’ para negativar as regras estabelecidas”.2 O emprego do termo

“Livre Convencimento” se dá no sentido de superar o Sistema da Prova Tarifada

(que, por sua vez, superou o sistema da convicção íntima). No Sistema da Prova

Tarifada, a lei valorava previamente as provas trazidas ao processo. Neste

contexto, o número e a natureza das provas prevaleciam sobre o seu efetivo

conteúdo, retirando toda autonomia do Juiz, de modo que seu convencimento

não era livre. Pois bem, se de um lado é dada ao Magistrado a liberdade da

persuasão racional, no sentido de não poder ser coagido na sua capacidade de

entendimento e determinação, por outro, lhe é exigido que, ao fundamentar as

razões do seu decidir, ainda nas palavras de GIACOMOLLI, emita “um juízo de

valor no que tange à proposição dos meios de prova, aos meios de busca da

prova, à idoneidade dos elementos de prova, à credibilidade das fontes e, por

fim, avaliar o resultado probatório” . Assim, considerando que o “ritual judiciário

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está constituído, essencialmente, por discursos e, no sistema acusatório, forma

é garantia”, para usar as palavras de LOPES JÚNIOR, o Magistrado tem a liberdade

de formar sua convicção nas provas que lhe são apresentadas (e, infelizmente,

naquelas que diretamente produz, malgrado o Dispositivo Acusatório adotado

pela CRFB/88), mas também é sua incumbência verificar a legalidade da prova.

Isso se explica na medida em que o sistema acusatório decorre de regras

processuais gerais – Sistema do Common Law – em que “remedies precede

rights”, como leciona COUTINHO.5 A forma traçada pelo legislador processual

penal é muito mais do que uma instrumentalidade para atingir um objetivo: é ela

o limite aos abusos inevitáveis e inerentes ao poder de punir do Estado.6 E neste

ponto, a menção à legalidade da prova se faz com a consciência de que a prova

ilegal é um gênero, composto pelas espécies prova ilícita e prova ilegítima, sendo

aquela resultado da violação de um direito material, e esta decorrência do

desrespeito de regra procedimental7 . Diante do que dispõe o inciso LVI da

Constituição da República, assim como o art. 157, primeira parte, do Código de

Processo Penal, é juridicamente certo que a prova ilícita é inadmissível, devendo

ser desentranhada do processo. Por outro lado, existe relevante divisão

doutrinária sobre o tratamento dispensado à prova ilegítima. Parte da doutrina

entende que a prova ilegítima submete-se ao sistema de nulidades. Outra parte

leciona que tal prova também é inadmissível, mormente depois de a Lei

11.690/08 ter dado nova redação ao art. 157 do Código de Processo Penal, eis

que o dispositivo diz serem inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do

processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas

constitucionais ou legais. Explica-se. Quando o art. 157 diz considerar-se

inadmissível a prova obtida em violação a norma legal, não distingue se a norma

legal é material ou processual. 8 Não se pode olvidar que, para ter o Magistrado

a capacidade de realizar o juízo de admissibilidade da prova de modo isento, é

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absolutamente indispensável que a gestão da prova seja função conferida às

partes, circunstância que caracteriza um processo penal realmente Acusatório. A

gestão da prova é a espinha dorsal do processo penal, como ensina Jacinto

Nelson de Miranda Coutinho em sua obra: “Daí que a gestão da prova caracteriza,

sobremaneira, o princípio unificador e, assim, o sistema adotado.” 9 No processo

acusatório – teoricamente introduzido pela Constituição da República, que prevê

a competência do Ministério Público para a promoção da ação penal pública em

seu art. 129, inciso I – a gestão da prova deveria ser incumbência das partes. Mas,

a bem da verdade, bem ensina COUTINHO quando diz que “todos os sistemas

processuais penais conhecidos mundo afora são mistos” 10 . COUTINHO

acrescente que o processo penal brasileiro, de fato, é de princípio inquisitivo.

“Sistemas regidos pelo princípio inquisitivo, têm agregados a si elementos

provenientes do sistema acusatório, como vai suceder com o sistema processual

penal brasileiro em vigor e que tem por base o CPP de 1941; ou em sendo regidos

pelo princípio dispositivo, têm agregados a si elementos provenientes do sistema

inquisitório, como vai suceder com o sistema processual penal norteamericano.”

11 Assim, não se pode esperar encontrar um sistema acusatório absolutamente

puro nos dias atuais – mesmo porque não possuem cada um deles bases

filosóficas rígidas, sendo antes reflexos de opções políticas12 – mormente numa

sociedade como a brasileira, marcada pela “sensação de insegurança decorrente

deste modelo de ‘sociedade de risco’, certamente acentuada pela atuação da

mídia” 13, em que a demanda pelo recrudescimento no tratamento à

criminalidade é assunto frequentemente tratado de forma muito leviana. Por

coerência, de uma ótica constitucional, pode-se dizer que o Brasil tem um

ordenamento processual penal Acusatório, ao qual se agregam elementos

inquisitórios pré-constituição e pós-constituição (o que é muito preocupante). Na

prática, entretanto, não nos parece de todo inadequado sustentar que nosso

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processo penal é de viés Inquisitório, apresentando intervenções de elementos

Acusatórios, por ousadia não totalmente efetivada da Constituição Federal (o que

preocupa ainda mais). De qualquer modo, o fato é que a coerência com o modelo

constitucional exige do Magistrado um necessário distanciamento da produção

probatória, de modo que lhe seja reconhecida a imprescindível isenção para

proceder à admissibilidade da prova. Esse rigoroso juízo de admissibilidade da

prova pelo Magistrado deve se dar para garantir que, no processo penal, “campo

por excelência de restrição de direitos e liberdades fundamentais pessoais, se

evitem restrições inadmissíveis, inaceitáveis, e juridicamente censuráveis na

atividade de persecução criminal”.14 Isso também deve se dar em razão de ser –

e dever continuar sendo – o processo penal um instrumento neutro, no qual as

possíveis conclusões (condenação ou absolvição) são axiologicamente

equivalentes. O processo penal constitui elemento neutro da jurisdição, cuja

finalidade consiste tanto em atuar o poder de penar e a função punitiva como

também em declarar de forma ordinária (pela sentença) ou restabelecer

pontualmente a liberdade (através do HC).15 No entanto, vê-se hoje em dia, na

prática da advocacia, um lamento não mais velado de muitos juízes, que parecem

penitenciar-se ao proferirem sentenças de cunho absolutório, como se

dissessem: - “embora tenha tentado, não encontrei meios de condenar o réu”.

Essa “mentalidade inquisitória”, tão bem investigada pelo Observatório presidido

pelo Professor Marco Aurélio Nunes da Silveira, e que vem organizando

congressos e reunindo brilhantes textos sobre o tema, contamina Juízes,

Desembargadores e Ministros. Não é, portanto, despropositada a “perigosa

mania dos Tribunais de flexibilizar as formas processuais através da relativização

das nulidades (e consequente enfraquecimento das garantias do devido

processo)”, fenômeno tão bem identificado e criticado por Aury Lopes Júnior.16

A presente pesquisa, portanto, parte da premissa de que possuímos, no Brasil,

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uma Constituição que deu preferência a uma “estrutura democrática sobre a qual

há que existir e se desenvolver o processo penal” 17. Assim sendo, não nos basta

qualquer processo. Deve ele ser lido sob o paradigma Constitucional. Pois bem,

dadas as premissas, o objetivo do presente texto é investigar a coerência de

decisões como as proferidas pelo STJ, no sentido de entender que “as

irregularidades relativas ao reconhecimento pessoal do acusado não ensejam

nulidade, uma vez que as formalidades previstas no art. 226 do CPP são meras

recomendações legais”. Essa tendência jurisprudencial foi publicada na edição n.

69 do periódico Jurisprudência em Teses, do próprio Superior Tribunal de Justiça.

5. A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL DEFENSIVA NO TRIBUNAL DO JURI

Autora: Renata Tavares da Costa

Resumo:

A proposta é averiguar os efeitos da ICD ( Investigação Criminal Defensiva) feita

pela Defensoria Pública no Tribunal do Júri da Comarca de Duque de Caxias

objetivando reunir elementos de convicção lícitos e relevantes para a Defesa.

A pesquisa será qualitativa e basaeada nos 5 processos onde houve

procedimento investigativo instaurado pela Defensoria Pública e analisará os

aspectos relevantes deste procedimento para fins de efetivar o mandamento

interamericano relacionado à diligencia da Defesa.

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GRUPO DE TRABALHO 5:

PENA, PRISÃO E ENCARCERAMENTO

Ementa: O GT Pena, prisão e encarceramento têm por objetivo principal discutir

os fundamentos da pena e a necessária revisão da adequação e das finalidades

da pena privativa de liberdade, sob uma ótica garantista. Estudos empíricos sobre

o perfil, a vivência e as dinâmicas da população encarcerada também serão

contemplados, a exemplo de estudos sobre o encarceramento de mulheres e de

negros. Trabalhos sobre gestão de políticas prisionais, facções no interior das

prisões também serão debatidos, bem como trabalhos sobre alternativas para a

pena privativa de liberdade. Os resumos apresentados devem ser baseados em

pelo menos uma dessas perspectivas

Coordenador Prof. Dr. Edson Luz Knippel

Doutor, Mestre e Graduado em Direito pela PUC/SP. Professor da Faculdade de

Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado. Lattes:

http://lattes.cnpq.br/1085942840322127

Coordenador Ms. Rogério Cury

Advogado, sócio do Cury e Cury sociedade de Advogados. Mestre em Direito.

Cursou Direito Penal e Direito Processual Penal Alemão, Europeu e Transnacional

na George-August-Universitat, na Alemanha. Professor na Faculdade de Direito

da Universidade Mackenzie. Autor e coautor de diversas obras jurídicas. Lattes:

http://lattes.cnpq.br/4021017117088129

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Trabalhos:

1. MONITORAMENTO ELETRÔNICO: HUMANIZAÇÃO NA EXECUÇÃO PENAL OU

AMPLIAÇÃO MODERNA DO ESTIGMA?

Autor: Adriano Luiz Oliveira

Resumo:

Pretende-se, por meio deste artigo, provocar uma reflexão a respeito do

esquecimento dos postulados do Direito Penal, em especial no que diz respeito à

Execução Penal, em decorrência das exigências sociais por mais segurança e

controle. Tais discursos são produzidos no contexto de uma política neoliberal

que procura ofuscar a desigualdade social, dando relevo à marginalidade urbana

como problema central, como o único a ser resolvido e a qualquer custo. Nessa

linha, abandonam-se as teorias humanistas e a crença na ressocialização em prol

da criminologia da vida cotidiana. A crítica que se propõe articular está ligada ao

processo de agravamento no cumprimento da execução da pena ocorrida com o

advento da Lei n.º 12.258/10, que alterou a Lei de Execuções Penais,

introduzindo a possibilidade do monitoramento eletrônico de presos. A avaliação

se dará sob o ponto de vista da estigmatização que a medida pode provocar no

apenado que, anteriormente à referida lei, poderia sair sem qualquer vigilância

ou equipamento que revelasse sua condição de apenado. O marco teórico é

fundado na criminologia crítica, buscando ressaltar que as funções mais

evidentes do Direito Penal na modernidade são a simbólica e a excludente.

Procura-se articular um diálogo com a filosofia e a biopolítica, em especial com

Agamben e Foucault, na tentativa de compreender melhor a influência do atual

momento vivido pela sociedade na construção destas ideologias, que

abandonam o indivíduo em prol da eficiência e do controle.

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2. MASS INCARCERATION E HYPERINCARCERATION: A REALIDADE BRASILEIRA

ENTRE O SENSO COMUM E A PESQUISA CRIMINOLÓGICA

Autora: Barbara Siqueira Furtado

Coautor: Theuan Carvalho Gomes da Silva

Resumo:

O termo “mass incarceration”, reintroduzido nos debates penalógicos dos

Estados Unidos no final dos anos 90, ganhou célebre releitura de David Garland

em sua famosa conferência “Mass incarceration: social causes and

consequences” na Universidade de Nova York (NYU) em 2000 (WACQUANT,

2015). Segundo Garland (2001, p.2), a denominação viria a descrever um

fenômeno novo sem paralelos no mundo penitenciário. Essa distinção se apoiaria

em duas especificidades: primeiro, a discrepância do agigantamento da

população carcerária e das taxas de aprisionamento, quando em contraste a

modelos penais historicamente comparáveis; e segundo, a concentração dos

efeitos sociais do encarceramento em grupos populacionais específicos,

direcionada, sobretudo, pela falência das políticas de Welfare e pelo

recrudescimento da legislação penal com relação às drogas, reflexo da política

tough on crimes. Em diálogo com as questões estudadas por Garland, Löic

Wacquant (2015) propõe ajustes terminológicos e conceituais ao “mass

incarceration” ou “mass imprisonment”, passando a adotar o uso da expressão

“hyperincarceration”. Esse aperfeiçoamento da nomenclatura teria, assim, a

intenção de desvelar sentidos camuflados pela opacidade da linguagem, pondo

em evidência a distinção entre o encarceramento - desmedido mas direcionado

- e os fenômenos de massa, como a mídia, que atingem pessoas,

indistintamente. Sua abordagem, portanto, não desconsidera o fim das políticas

do Welfare State, nem a influência de demais fatores conjunturais, mas põe em

evidência a seletividade de atuação do sistema de justiça criminal, o qual se

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moveria guiado, majoritariamente, por questões de classe social, raça e local de

origem, em expressão de uma outra face do mesmo projeto de expansão de

Estado neoliberal. Desde a conferência de Garland na NYU, o Brasil viu sua

população carcerária crescer inacreditáveis 312,22%, atingindo a maior taxa de

aprisionamento de sua história: 352,6 para cada 100 mil habitantes (INFOPEN,

2017). À contramão dos debates e iniciativas internacionais pelo

desencarceramento, seguimos expandindo nossas prisões, tanto em suas

dimensões efetivas quanto simbólicas, cerceando liberdades e usando

arbitrariamente dispositivos de orientação, a princípio, garantista. O discurso

criminalizante irresponsável de setores midiáticos, associado à

instrumentalização da justiça penal para fins políticos, tem, cada vez mais,

robustecido a crença da população média em instituições prisionais falidas,

cristalizando, assim, um desejo de dilatação indistinta do cárcere, concebido

como símbolo de luta contra impunidade. Nesse sentido, o reforço do ideal da

prisão como justiça e de sua atual difusão igualitária, tende, à semelhança da

crítica wacquantiana, a ocultar a essência seletiva do sistema penal, que

permanece comprometido com a segregação - e por que não neutralização - de

grupos sociais determinados. Em síntese, a reflexão proposta visa a debater a

questão carcerária brasileira, a partir da aplicabilidade dos aportes teóricos

fornecidos por Garland e Wacquant, destacando em que medida o uso do

sistema penal como panaceia para os problemas sociais se legitimaria pelo senso

comum da prisão como sinônimo de justiça. Com efeito, para que se alcance a

referida análise, o método da revisão bibliográfica se apresenta como ferramenta

adequada, ressalvando, que não há pretensão de se esgotar, completamente, a

matéria.

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3. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA E HUMANIZAÇÃO DA JUSTIÇA - RESULTADOS INICIAIS

Autora: Bartira Macedo de Miranda

Coautora: Franciele Silva Cardoso

Coautora: Brenda Mendes de Castro

Resumo:

A pena privativa de liberdade é a sanção mais rigorosa do nosso ordenamento,

devendo ser aplicada apenas em ultima ratio. No entanto, vivemos em uma

sociedade que crê que somente a prisão retribui adequadamente o crime e trata

o encarcerado como um indivíduo praticamente sem direitos, negando-se, assim,

cotidianamente, a ouvir sua voz.

Essa mentalidade resultou em presídios cada vez mais abarrotados e precários,

diminuindo as possibilidades de ressocialização, uma das mais complexas e,

nesse contexto, sacrificada função da pena no Direito Penal contemporâneo.

Ademais, após a prisão em flagrante, o contato magistrado/preso era bastante

superficial, com a comunicação das prisões prevista no art. 306 do Código de

Processo Penal resumindo-se à simples entrega do Auto de Prisão em Flagrante

ao juiz, um mero fazer burocrático, portanto.

Implantadas no Brasil pelo Conselho Nacional de Justiça em 2015, as audiências

de custódia são uma tentativa de amenizar esses problemas, mas recebe severas

críticas desde então. Assim, a presente pesquisa buscou analisar seus resultados,

buscando maior efetividade na solução dos problemas apresentados.

Para isso, foi utilizado o método indutivo, baseando-se nas estatísticas obtidas

até o presente momento, compreendendo não apenas procedimentos

empíricos, mas também lógicos e indutivos, com enfoque não só processual

como criminológico.

Durante o trabalho, verificou-se que as audiências vêm se mostrando um

instrumento importante no controle de prisões ilegais e desnecessárias, mas que

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a distância entre magistrado e custodiado ainda é imensa – e isso se reflete

principalmente na vasta fronteira linguística e semântica que os separa,

prejudicando uma eficiente comunicação.

Além disso, a carência de infraestrutura é uma realidade palpável, o que põe em

risco tendências importantes – como o aumento das liberdades provisórias. Mas

ainda há muito o que ser melhorado, vez que o encarceramento ainda é a regra

e as denúncias de maus tratos são tímidas.

Muitos dos desafios a serem enfrentados apresentam solução relativamente

simples – como investimento em infraestrutura e capacitação de magistrados.

Outros, todavia, são o reflexo da cultura punitivista que tem o encarceramento

como regra, e o que foge disso considera impunidade.

No mais, a aprovação da Proposta de Lei 6.606 é de extrema importância para

trazer mais segurança jurídica ao instituto, contudo seu texto deve ser

aprimorado, uma vez que propostas como a flexibilização do prazo de realização

da Audiência de Custódia e a possibilidade de sua realização por

videoconferência minariam completamente a efetividade prática do instituto,

que se transformaria em um verdadeiro natimorto.

As audiências estão se mostrando uma viável arma no combate à cultura do

encarceramento, após anos estagnados no status quo. Dessa forma, não pode

ter negada a sua importância, devendo ser aliada a outras medidas no mesmo

sentido – investimento em segurança pública, por exemplo.

Por último, ressalta-se que se deve ter a consciência de que toda grande

transformação começa gradativamente e os obstáculos que enfrenta não são

motivo para desânimo. Devem servir como verdadeiro combustível na busca por

um Processo Penal mais consciente dos direitos de seus tutelados e – quem sabe

– um pouco mais humano.

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4. O TRABALHO PENAL NO CONTEXTO DE CRISE ESTRUTURAL: POTENCIALIDADES

FRENTE À PRIVATIZAÇÃO DOS PRESÍDIOS

Autora: Camilla Marcondes Massaro

Resumo:

As transformações iniciadas na década de 1970 trazem consigo a reestruturação

do processo produtivo e, consequentemente a alteração das formas de trabalho.

Nesse quadro, as condições de trabalho se tornam cada vez mais precárias, além

do aumento do desemprego. A passagem do Estado Social ao Estado Penal

contribui para um processo de criminalização tanto dos movimentos sociais

quanto das parcelas mais pauperizadas da sociedade para as quais, a única

política pública que parece funcionar é a do encarceramento em massa. O Brasil

aparece como o 3º país com a maior população carcerária do mundo e, a

chamada “crise penitenciária” que eclodiu no raiar de 2017 traz à tona duas

questões essências: a manutenção da política de encarceramento em massa –

com a construção de mais unidades prisionais e o aumento da força das

propostas de privatização dos presídios como meio de solucionar tal crise. Tal

proposta faz parte da ofensiva do capital que tem nas privatizações um aumento

de suas fontes de lucro no contexto de crise estrutural. Contraditoriamente, em

momento de desemprego em massa e de alto índice de precarização do trabalho,

a privatização dos presídios potencializa a superexploração do trabalho penal

pois tem como fundamento a oferta de trabalho no interior das unidades

prisionais não só para atividades internas, mas também por empresas e indústrias

de diversos ramos da produção, que se utilizam da ideia da responsabilidade

social e do discurso de que o trabalho contribui para a ressocialização dos

chamados criminosos, para alocarem essa força de trabalho. A partir de pesquisa

realizada em Centros de Ressocialização Femininos no Estado de São Paulo, o

objetivo da presente comunicação é discutir o aumento exponencial do trabalho

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penal como tendência em potencial no contexto de crise estrutural buscando

compreender de forma aprofundada os sentidos da apropriação desta força de

trabalho pelas empresas que oferecem postos de trabalho nas unidades

prisionais de regime fechado não só para a minimização dos custos de produção

e, consequentemente, maximização dos lucros, mas também como meio de

precarização ainda maior da classe trabalhadora, dentro e fora dos presídios.

5. RESPONSABILIDADE POLÍTICO-CRIMINAL: ANÁLISE DA POLÍTICA DE EXPANSÃO

PRISIONAL NO ESPÍRITO SANTO DE 2011 A 2016

Autora: Carolina Assis Castilholi

Resumo:

A pesquisa teve como objetivo geral analisar a política de expansão do sistema

carcerário no Espírito Santo no período de 2011 a 2016 a fim de verificar se ela

se desenvolveu em consonância com a concepção de responsabilidade político-

criminal. O presente estudo utilizou a tipologia descritiva, de abordagem

qualitativa. Os procedimentos de coleta utilizados foram o levantamento

bibliográfico e documental. Foram dados primários utilizados na pesquisa a

legislação em matéria criminal editada no período de 2011 a 2016, os planos

nacionais de política criminal e penitenciária elaborados pelo Conselho Nacional

de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) em 2011 e 2016, as resoluções

editadas pelo CNPCP entre 2011 e 2016, os planos de desenvolvimento ES 2025

e 2030 e os planos plurianuais capixabas 2008-2011, 2012-2015 e 2016-2019.

Dentre os dados secundários utilizados se destacam os disponibilizados pelo

Ministério da Justiça por meio do Levantamento Nacional de Informações

Penitenciárias (INFOPEN). Os dados foram então analisados por meio de

categorização formulada com base nos conceitos de Subirats de “atores”,

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“recursos, “marcos institucionais” e “produtos das etapas de formulação de

políticas públicas”, de modo a possibilitar a subseqüente análise das relações

entre os componentes das referidas categorias. O referencial teórico abordou o

encarceramento em massa e a expansão contínua do sistema prisional bem como

a desvinculação entre encarceramento e estatísticas criminais, visto o caráter

político-cultural da tomada de decisão nessa seara. Abordou-se ainda a

consideração da política penitenciária enquanto política pública, bem como a

tutela da responsabilidade dos gestores públicos no ordenamento brasileiro. Por

fim, o estudo debruçou-se sobre as propostas de estudos de impacto legislativo

e a proposta de lei de responsabilidade político-criminal. Em seguida, teceu-se

um panorama da conjuntura histórica e presente do sistema prisional em âmbito

nacional e estadual, a que se seguiu a análise dos planos e atos formais de

implementação da política de expansão do sistema carcerário no período de

análise (2011-2016), por meio do marco teórico de análise de políticas públicas

de Subirats. Diante dos resultados da análise, traçou-se uma proposta de agenda

descarcerizadora para o Espírito Santo, com vistas a atender a um paradigma de

responsabilidade político-criminal.

6. MASCULINIDADE CRIMINOSA E VIOLÊNCIA MASCULINA: APONTAMENTOS PARA

UM ESTUDO SOBRE IDENTIDADE DE GÊNERO NO INSTITUTO PENAL DE CAMPO

GRANDE (IPCG)

Autor: Daniel Attianesi

Resumo:

O barulho dos portões se fechando atrás de você é a minha primeira lembrança

sobre o começo do campo no “instituto”. Ao olhar, para frente ou para trás, me

vi rodeado por uma fileira de grades. Era o primeiro passo ao adentrar o Instituto

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Penal de Campo Grande (IPCG). O IPCG é reconhecido como um espaço

carcerário de excelência em Mato Grosso do Sul. Já no nome, podemos notar

certo tom higienizante, depois confirmado pela pesquisa de campo. No instituto,

raramente ouviremos as palavras cadeia, prisão ou presídio para referir-se à

instituição. Apesar dessa particularidade, para o recém-chegado não importa

essa valoração. Ao chegar ali, me senti, claramente, preso.

O IPCG é um dos 48 estabelecimentos penais do estado do Mato Grosso do Sul,

administrados pela Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário

(AGEPEN), com uma população atual de 1.376 detentos dos aproximadamente

14.000 detentos do estado. Isso equivale a 9,8% de toda a polução carcerária do

estado em apenas um estabelecimento. Não era de surpreender que, apesar de

sua “excelência”, o IPCG se encontra superlotado. O Instituto comporta 400

vagas e, atualmente, conta uma população 275% acima da sua capacidade

máxima.

Nesse espaço que, diferentemente, da frieza com que Goffman (2015) trata as

“instituições totais”, o IPCG não se mostra nada frio e rígido. O universo

institucional presente no instituto penal se mostra sempre em mudança com

variações quase que diárias de temperamento e ambientação. Os sujeitos se

encontram emaranhados em diversas relações de poderes, que tencionam

práticas e agenciamentos internos. A partir do trabalho etnográfico, com idas

semanais ao estabelecimento penal, busquei, por meio da observação

participante, com foco nos detalhes do cotidiano dessas vidas que por ali passam,

as tessituras que constituem a identidade de gênero dos homens que ali estão,

bem como seus agenciamentos em torno de diversas formas de construções da

masculinidade.

A imersão em um campo como um presídio costuma ser composta por dúvidas e

inseguranças de todas as ordens. Atrai e amedronta mergulhar no universo

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prisional, ao mesmo tempo em que se existe um fascínio, há também um desejo

de um seguro distanciamento, afinal os sujeitos que ali estão, como diria Foucault

(2012), conformam os corpos que ainda não são dóceis e disciplinados. Ao longo

do trabalho de campo no instituto penal, houve uma atenção metodológica

rigorosa. N entanto, a percepção mais presente é a de que os manuais de

metodologia em ciências sociais pouco têm a nos dizer sobre a questão de

segurança em uma “instituição total”. A opção metodológica foi por visitas

regulares ao IPCG, tentando sempre permanecer a maior parte do tempo dentro

do estabelecimento penal, isso não sem resistência dos responsáveis pela

segurança do instituto. Houve uma intensa negociação para facilitar a minha

presença lá. Não foi exatamente como eu queria, nem exatamente com a direção

queria. No entanto, conseguimos um consenso. Esse consenso me permitiu uma

relação continuada, com as visitas semanais, durante seis meses: de outubro de

2017 a abril de 2018. Foram realizadas observações, conversas informais como

agentes penitenciários, entrevistas semiestruturadas com os mesmos agentes,

bem como entrevistas semiestruturadas com 8 detentos.

Apesar das dificuldades do campo, algo que é recorrente nas fases iniciais das

pesquisas de campo, a investigação foi possível. Estudos dentro e sobre

estabelecimentos penais existem nas ciências sociais há muitos anos, Marcelo

Campos e Marcos Alvarez (2017) mostram que nos últimos 10 anos (2000-2016),

foram encontrados 196 artigos apenas em revistas com classificação Qualis A1

sobre a temática. Renato Lima (2008) mostra que no banco de teses e

dissertações da CAPES foram encontrados 2044 trabalhos com a palavra

“violência” e 612 com a palavra “prisão”. A partir dessa produção imensa, a

minha pesquisa, a particularidade da minha pesquisa recai sobre a aproximação

das questões de criminalidade e violência com as questões de gênero e

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masculinidade ao pensar a constituição do homem criminoso em um espaço de

privação de liberdade.

Ao aproximarmos as questões de gênero e violência, o que parece mais comum

em termos de produção no campo das ciências sociais e dos estudos de gênero,

em particular, são as pesquisas que envolvem violência contra mulher. Há uma

ênfase na “vulnerabilidade feminina” o que faz com esses elementos – bastante

justos – pois a violência contra a mulher é muito recorrente no Brasil, quase que

pautem a área quando se aproxima gênero e violência.

Além disso, é preciso apontar a presença de diversos órgãos e campanhas pelo

fim da violência contra as mulheres, como a Campanha UNA-SE Pelo Fim da

Violência contra as Mulheres, lançada pela Organização das Nações Unidas, que

proclamou o dia 25 de cada mês como um Dia Laranja, dia em que, em todo o

mundo, agências da Organização das Nações Unidas e organizações da sociedade

civil deveriam promover atividades para dar mais visibilidade às questões que

envolvem a prevenção e a eliminação da violência contra as mulheres.

Com três volumes específicos para a questão da mulher em um dos maiores

conjuntos de estudos e pesquisas de violência do país, o Mapa da Violência foi

organizado por Júlio Jacobo Waiselfisz (2013). Todo esse conjunto de dados me

causou a dúvida: a percepção de vulnerabilidade da mulher seria construída a

partir de uma oposição linear a uma flagrante invulnerabilidade do homem?

Estaríamos, pois, diante de diversas categorias universalmente dicotômicas?

Masculinidade e feminilidade, força e fragilidade, passiva e ativo, os binômios

sempre em oposição. A mulher é construída como tal e o homem já “nasce”

feito?

As reflexões expostas aqui – que estarão melhor apresentadas no corpo do

paper, bem como no texto final da dissertação – procuram fugir um pouco dos

olhares mais recorrentes sobre o tema e tentam problematizar o outro polo da

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dicotomia. Como dito acima, tenho me debruçado sobre uma costura não muito

fácil, qual seja, a de tecer os fios que conduzem a construção dos homens e de

suas masculinidades, especialmente, atentando para a construção da identidade

de gênero do homem “criminoso” e causador da violência.

A partir das estatísticas do sistema penal brasileiro (a última disponível em

dezembro de 2014), podemos observar que o Brasil possui 584.758 detentos,

94,2% desses são do sexo. Com relação aos dados de Mato Grosso do Sul, a

mesma pesquisa mostra que o número de detentos é de 13.335. Desses, 90,5%

são do sexo masculino e 9,5% do sexo feminino. Ao observar esses dados,

comecei a perceber a possível existência de algumas relações entre o homem

como vítima e o homem como “criminoso”. Com base na inferência estatística,

percebe-se que a maior parte dos crimes ocorre entre indivíduos pertencentes

ao mesmo gênero. Pretendo utilizar essas inferências para pensar, de forma mais

ampla, a relação entre a violência e gênero.

É importante frisar, no entanto, que as inquietações sobre a questão da violência

associada às masculinidades não buscam apagar – ou deixar em segundo plano –

a importância das questões de violência entre os gêneros (especialmente a

violência doméstica), como, por exemplo, o feminicídio, Bonatti (2008) tão em

voga atualmente. Com isso esclarecido, procuro deixar claro que o recorte desse

trabalho pretende se afastar da vasta gama de estudos que destacam o caráter

exógeno da violência de gênero – em outra direção, minha pesquisa busca lançar

luz sobre a perspectiva endógena da violência de gênero, sobretudo a partir dos

discursos sobre masculinidades dentro do Instituto Penal de Campo Grande.

Com isso posto, o questionamento que norteia o artigo, bem como a pesquisa

maior da qual esta comunicação é uma parte, é: como se dá a construção da

identidade de gênero do homem criminoso em uma instituição de privação de

liberdade? Nesse sentido, o artigo persegue a ideia da constituição de uma

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“violência masculina” enquanto parte da identidade (Cunha, 2009), que os

interlocutores buscam visibilizar, a partir de uma narrativa que tem como parte

central uma “masculinidade criminosa”, capaz de tornarem-se inteligíveis (Butler,

2003) como homens no chamado “mundo do crime”.

7. ENCARCERAMENTO E REALISMO DE ESQUERDA: EM BUSCA DE REINTEGRAÇÃO

DO APENADO

Autora: Érica Babini Machado

Coautora: Raissa Lustosa Coelho Ramos

Resumo:

A discussão do presente trabalho inicia-se ante o fenômeno de encarceramento

em massa do Brasil e suas implicações no aumento da criminalidade e da

reincidência, especialmente devido à estrutura de tutela penal que se consolidou

a partir do controle de classes e da política criminal do “Law & Order”. Sabe-se

que o capitalismo contemporâneo criou um paradoxo em que, ao mesmo tempo

em que se pede o menor intervencionismo estatal em virtude do liberalismo

econômico, também se exige que o Estado se torne mais controlador e punitivo.

Como consequência, o Brasil tem importado cada vez mais o modelo norte-

americano, conduzindo o controle de criminalidade de forma ostensiva, com

soluções de curto prazo, midiáticas e assistemáticas (LEMGRUBER, 2001), que

não têm impacto na questão da violência urbana. Nesse sentido, O cárcere

brasileiro, além de não contribuir para a ressocialização do condenado, tem se

mostrado ineficaz para o Poder Público, na medida em que sua utilização

descabida tem não só onerado os cofres públicos, como também gerado o estado

de coisa inconstitucional, declarado pelo próprio STF. Ante essa questão, é

preciso discutir, do ponto de vista filosófico, o próprio conceito de

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ressocialização, que funciona como fundamento da pena. Para tanto, lança-se luz

à questão com a proposta de Alessandro Baratta (2007) em que abandona aquela

tese idealista de que a “prisão produz efeitos úteis”, para pragmaticamente

adotar a perspectiva de reintegração do sentenciado, de modo que “apesar da

pena”, deve-se buscar tornar menos precária a condição de vida no cárcere. Isto

é, partindo do pressuposto de que o melhor cárcere é a não prisão, mas ante o

constrangimento de sua existência, deve-se buscar menos cárcere e “realização

dos direitos dos apenados à educação, ao trabalho e à assistência social”; com

abertura da prisão à sociedade. A partir dessa questão, em confluência com a

proposta da criminologia realista de Roger Matthews (2014), especialmente com

a ótica de trabalhar na redução do Estado punitivo, mas por meio dele, em suas

palavras: “contra e por meio do Estado”, as autoras buscam discutir mecanismos

de intervencionismo efetivo na realidade social. A questão se apresenta porque

a criminologia crítica ao apontar as inúmeras falácias do sistema de justiça de

justiça criminal, não produziu impactos públicos com suas propostas

(MATTHEWS, 2014) como o próprio desencarceramento; e ante essa limitação,

a proposta realista é intervir concretamente na realidade social (MATTHEWS,

2009). A partir desse marco teórico, as autoras buscam refletir sobre mecanismos

de redução de dor e como exemplo propõem discutir mecanismos de incentivo

fiscal para empresas particulares contratarem mão de obra de pessoas egressas

do sistema prisional como forma de combate à reincidência e integração da

pessoa à sociedade.

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8. O DIREITO À SAÚDE DAS PESSOAS ENCARCERADAS

Autor: Érick Vanderlei Micheletti Felicio

Coautor: Marcelo Lamy

Resumo:

Trata-se de estudo de revisão e descritivo do descaso ao direito à saúde e ao

saneamento básico nos estabelecimentos carcerários. Explicita o estado de

coisas inconstitucional e identifica as principais causas pelas quais as políticas não

alteraram o nefasto quadro da saúde prisional. O norte crítico da investigação

fundou-se na amplitude proposta para o direito à saúde dos prisioneiros no

âmbito global. Em 2015, as “Regras Mínimas para Tratamento de Presos”

(elaboradas em 1955, no “1.º Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção

do Crime e Tratamento de Delinquentes”) foram atualizadas e denominadas

“Regras de Mandela”. Tal atualização forneceu orientações para se compreender

a aludida amplitude internacional almejada para o direito à saúde do preso. Essa

é a referência da qual partiu a presente análise. Dados fornecidos pelo Instituto

de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA, 2015) revelaram um crescimento da

população carcerária brasileira de 83 vezes em 70 anos. Segundo o diagnóstico

elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ, em 2014 o Brasil possuía a

quarta população carcerária mundial (com 563.526 presos), atrás apenas dos

Estados Unidos (2.228.424), da China (1.701.344) e da Rússia (676.400). Se

computadas as prisões domiciliares, o Brasil assumiria a terceira posição,

contando 711.463 pessoas encarceradas. Mais de 40% desse total representam

presos sem condenação definitiva. A população carcerária é atingida e exposta a

doenças como AIDS, tuberculose, pneumonias, dermatoses, transtornos mentais,

hepatites, traumas, diarreias infecciosas, hipertensão arterial, diabetes e sarnas,

às epidemias de piolho, pulga e carrapato. Muitos presos vivem despidos entre

fezes e urina, em celas desprovidas de colchões, de água potável e da adequada

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ventilação. A saúde prisional é uma preocupação normativa nacional assegurada

no artigo 14 da Lei n.º 7.210/1984. A Constituição de 1988 e a Lei n.º 8.080/1990

não trataram especificamente da saúde no cárcere, mas asseguram a saúde

como direito de todos e dever do Estado, o qual, portanto, deve desenvolver

políticas dirigidas à redução dos riscos de doenças e de outros agravos, provendo

condições indispensáveis ao pleno exercício desse direito fundamental. Em 2003,

o Estado brasileiro elaborou a “Política de Atenção à Saúde da População

Penitenciária”. Essa política tornou-se algo programático, sem a superação

efetiva da inadequação de recursos humanos e materiais. Faltam equipes de

saúde, remédios, além de transportes para que os presos tenham o atendimento

- fora da unidade prisional - em tempo hábil. Foi substituída pela “Política

Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no

Sistema Prisional”. Em 2016, o CNJ lançou o programa “Saúde Prisional”. Essas

ações não alteraram a realidade violadora da dignidade humana, enfim, a

situação de afronta aos princípios de Direito Sanitário e à garantia de seu objeto

no âmbito carcerário, evidenciando efeitos da seletividade e do sistema penal

subterrâneo (ZAFFARONI, 2002). Do ponto metodológico, buscou-se a

abordagem crítica de dados governamentais e a sistematização de argumentos

verificados em selecionados estudos científicos e obras pertinentes ao tema.

9. MEDIAÇÃO PENAL E JUSTIÇA RESTAURATIVA: UMA POLÍTICA PÚBLICA

ADEQUADA PARA O DESENCARCERAMENTO EM MASSA

Autora: Glicéria Martins Cleter

Coautora: Michele Cristie Pereira

Resumo:

O presente trabalho tem por escopo, apresentar o Instituto da Mediação Penal e

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da Justiça Restaurativa e demonstrar a importância destes, frente a um

aculturamento do sistema punitivista (Sistema Retributivo) do Estado, de que a

pena é a melhor forma de punir o ofensor e de prevenir a violência. Para tanto se

buscou realizar uma reflexão sobre a origem da pena, o delito, e o cárcere, e o

que isso ao longo dos anos contribuiu para o aumento da violência e para o

encarceramento em massa. O grande número de presos no Brasil tem

aumentado a cada ano, e a construção de presídios não tem sido satisfatória

frente a esse aumento exarcebado de pessoas em cárcere, e a violência e a

insegurança jurídica têm causado medo à população. Dessa forma, o presente

texto procura mostrar a origem do Processo Penal brasileiro, e sua função dentro

da atual Carta Magna (Constituição de 1988), fundada em um Estado

Democrático de Direito; e assim esclarece sobre as múltiplas possibilidades de

sua aplicação dentro da Teoria dos Jogos e da Mediação, para promover uma

interatividade na busca das soluções do conflito-crime por meio da cooperação,

e do diálogo entre os envolvidos. Buscou-se demonstrar os projetos que já estão

sendo desenvolvidos dentro do Poder Judiciário no Brasil com a adoção da

Mediação Penal e da Justiça Restaurativa, com a participação dos cidadãos, e de

vários órgãos do Poder Público; e também incentivar a criação de programas

colaborativos (vítima x ofensor x comunidade) que oportunizem aos ofensores

repararem o dano causado às vítimas e à sociedade, por meio do trabalho digno

e qualificador. Buscou-se ainda, clarificar que a Mediação Penal ao ser utilizada

pelo Sistema Jurídico Brasileiro, como instrumento da Justiça Restaurativa é

plenamente eficaz para fomentar o arrependimento do preso, possibilitar a res

(socialização), e contribuir para sua transformação de valores, criando mais

chances do mesmo, não voltar a delinqüir ao sair do encarceramento e retornar

ao convívio social. Por fim, buscou-se demonstrar que a Mediação Penal como

uma nova Política Pública é uma alternativa adequada para desafogar os

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presídios brasileiros (para o desencarceramento em massa), e adotada

conjuntamente com a Justiça Restaurativa (Sistema Restaurativo) é um caminho

para a res (socialização) do preso, para a transformação dos conflitos e

pacificação social.

10. ATÉ QUE PONTO A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE “VALE A PENA” O MITO DO

(DES)CONTROLE SOCIAL POR MEIO DA PUNIÇÃO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO

Autor: Jardel Sabino de Deus

Coautor: Thiago Fabres de Carvalho

Resumo:

Não é dos dias atuais que a punição por meio do encarceramento vem sendo

utilizada como mecanismo de controle das massas sociais. A história das relações

sociais nos demonstra que o homem é um ser competitivo por sua própria

natureza. Não raras as oportunidades esse mesmo homem, enquanto um ser

social, reclama a necessidade de docilização de seus corpos por parte daqueles

sujeitos detentores do poder.

Para tanto, não somente os homens que detinham o poder figuravam como

atores principais dotados do papel disciplinador, mas sobretudo valiam-se das

mais diversas instituições com a finalidade de atingir seu objetivo de

“adestramento” social dos indivíduos e das massas, passando, assim as igrejas, as

escolas, os quarteis, os ambientes fabris e os manicômios a protagonizarem este

papel.

Com o advento da consolidação das formas de produção do capitalismo e com o

consequente aprofundamento das desigualdades sociais trazidas a reboque, os

sistemas penais emergem como novo instrumento, com a promessa de controle

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social sobre àqueles sujeitos alijados naturalmente do processo de concentração

do capital.

O sistema penal, com a incumbência institucional histórica de produção das

normas penais vigentes, parte de práticas notadamente punitivas

compreendidas como manifestações da disciplina, do castigo e da expiação do

mal causado, tendo como pressuposto a retenção dos indesejáveis, por vezes

chamados de inimigos, a pretexto de promoção do (des)controle social.

Nesse contexto, propõe-se analisar o papel do (direito)sistema penal como

ferramenta de controle social, o que, já se adianta, partirmos de uma hipótese

negativa, daqueles considerados não desejáveis para o convívio social. Para

tanto, desenvolver-se-á uma análise das possíveis origens da disciplina na

sociedade, bem como do desenvolvimento de suas abordagens mais atuais de

controle e dominação, partindo de uma das molas propulsoras do poder punitivo

na atualidade, a tão difundida pena privativa de liberdade, compreendida à luz

da seletividade econômico racial brasileira no processo de criminalização por

parte das classes dominantes sobre as comunidades consideradas

marginalizadas.

O referencial teórico deste estudo consiste numa abordagem interdisciplinar à

luz da sociologia jurídica e da criminologia crítica, vez que, para além do aspecto

criminológico pretende-se formular a análise dos amplos e latentes problemas

apresentados sob o viés sociológico do histórico problema da segregação racial e

alijante da pobreza, experimentados na atual sociedade capitalista.

Trata-se de uma pesquisa qualitativa, do tipo exploratória realizada por meio de

uma abordagem teórica que visa compreender o fenômeno em tela, utilizando-

se, também, a necessária revisão bibliográfica de obras de autores que se voltam

ao estudo da questão, tais como: Antoine Garapon e Frédéric Gros (2002),

Massimo Pavarini (1983), Michel Foucault (1987), Loïc Wacquant (2001; 2003;

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2008), Eugênio Zaffaroni (2003; 2011) e Thiago Fabres de Carvalho (2014) que

fornecerão os subsídios necessários à compreensão do problema da segregação

punitiva e racial por meio da utilização da pena privativa de liberdade.

11. CRIMINOLOGIA CRÍTICA, FEMINISMOS SUBALTERNOS E O CONTROLE SOCIAL

DAS MULHERES NEGRAS

Autora: Jéssica Santiago Cury

Coautor: Paulo César Corrêa Borges

Resumo:

O presente trabalho tem como escopo principal propor releituras da criminologia

crítica, abarcando seus principais conceitos e discursos, bem como analisando a

construção da perspectiva de gênero dentro dessa ciência. Posteriormente,

procura introduzir um diálogo entre as práticas e representações da criminologia

com os feminismos subalternos. Tem-se por Feminismo Subalterno o termo

usado para identificar e caracterizar o feminismo terceiro-mundista ou pós–

colonial, o qual propõe uma crítica a colonialidade de gênero. Sua subalternação

remete ao processo paradoxal que constitui na construção do feminismo dos

outros só é possível quando eles se subalternizam em relação ao próprio

feminismo moderno (BALLESTRIN, 2017). Assim, por meio dessa intersecção,

procura abrir espaço para construção dentro do âmbito criminológico discursos

que abrangem as questões de gênero, raça e classe, saindo da esfera genérica e

homogênea, nos quais submetem os discursos da criminologia crítica quanto a

criminalidade feminina. Para isso, buscará incialmente estudar o surgimento da

Criminologia Crítica, quais são os seus fundamentos e como foi realizada a sua

construção, expondo seus principais conceitos. Em um segundo momento, será

analisado como foi realizada a elaboração das questões de gênero dentro do

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âmbito dessa ciência. A partir disso, foi verificado como a criminologia crítica se

posiciona quanto à essa questão de forma universal e genérica, deixando lacunas

quando se atrela essa perspectiva com as de raça e classe. Assim, em um terceiro

momento, como forma de suprir omissões, será estudado os feminismos

subalternos (terceiro mundista ou decolonais) como meio de se pensar novas

formas de tratar gênero e raça dentro da criminologia. A justificativa do objetivo

central dessa pesquisa, baseia-se pelo fato que hoje, conforme o DEPEN

(Departamento Penitenciário Nacional), o perfil das mulheres presas no Brasil, é

composto por 62% de mulheres negras. Diante desse quadro, se fez cada vez

mais urgente um debate crítico quanto a criminalização das mulheres e suas

particularidades, principalmente no que concerne à questão da raça, pois os

corpos negros, em especial, das mulheres, sempre foram criminalizados de forma

sistemática pelas agências informais e formais de controle social. Ademais, é

necessário que, a criminologia crítica assuma o racismo como categoria

substantiva na estruturação do sistema penal, como pressuposto de

intelegibilidade do aparato de controle (FLAUZINA, 2006), e por isso que os

corpos das mulheres negras sofrem de forma mais intensa a criminalização. E,

por entender que, a criminologia é uma ciência munida com um instrumental

teórico capaz de compreender as mazelas da atuação do sistema penal, que este

trabalho propõe um diálogo entre ela e os feminismos subalternos, como forma

de compreender a complexa relação entre raça, gênero e criminalidade. A

realização dessa pesquisa se dará por meio de um recorte bibliográfico e literário

de obras que abarcam essa temática. Para a construção do campo documental,

foram necessárias leituras de criminólogos como Alessandro Baratta, Vera Regina

de Andrade, Eugenio Zaffaroni e de feministas como Maria Lugones, Luciana

Ballestrin e Rita Segato, entre outros.

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12. A ATUAÇÃO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA NO SISTEMA CARCERÁRIO

BRASILEIRO

Autora: Jordana Maria Ferreira de Lima

Coautora: Adriene Domingues Costa

Resumo:

Neste escrito, coloca-se em perspectiva o trabalho do Conselho Nacional de

Justiça nos temas: execução penal e sistema penitenciário brasileiros. A atuação

do CNJ tem início em 2006 com a edição da Resolução nº 19/2006 e passa a se

intensificar com a criação, pela Lei n. 12.106 de 2 de dezembro de 2009, do

Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do

Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), inserido na estrutura

do Conselho. De lá para cá, perceptível que as políticas implementadas tiveram

aptidão para abarcar as duas pontas que importam no sistema carcerário:

entrada e saída de pessoas, chegando mesmo a prever ações para a reinserção

do egresso no mercado de trabalho. Será demonstrado que, em razão da

mudança bienal de gestão no Conselho, as políticas judiciárias sofrem

considerável descontinuidade, tendo em conta que cada presidente possui sua

própria agenda, por vezes, ignorando todo o recurso financeiro e humano

empenhado em determinado programa. Este estudo analisa as medidas

propostas pelo Conselho na seara executiva penal, no intento de identificar

resultados, em especial, aqueles que advieram dos mutirões carcerários e

audiências de custódia, traçando um panorama da atuação do CNJ no que diz

respeito a políticas judiciárias do cárcere e os câmbios de gestão no Conselho.

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13. PRISÕES PROVISÓRIAS NO ESTADO DO PIAUÍ: LITIGÂNCIA ESTRATÉGICA E

ENFRENTAMENTO À CULTURA PUNITIVA

Autor: Lucas Araujo Alves Pereira

Coautora: Savina Priscila Rodrigues Pessoa

Resumo:

Apontamentos Centrais - O presente trabalho parte de uma constatação feita a

partir da análise dos números do sistema carcerário, pois acordo com os dados

mais recentes, o Piauí aparece em segundo lugar na relação dos Estados com o

maior percentual de presos provisórios (63,28%), atrás apenas do estado do

Amazonas (65,77%). Dessa forma, o contexto de produção deste trabalho é

construído mediante a execução de um projeto de litigância estratégica que se

desafia a enfrentar o problema posto, protagonizado pela Associação de

Assessoria Técnica em Direitos Humanos – Coletivo Antônia Flor (PI). Assim, a

atuação têm se orientado por dois eixos centrais de enfrentamento ao problema,

o primeiro de tensionamento acerca do funcionamento das instituições do

Estado, especialmente o poder judiciário, quanto à manutenção e

aprofundamento das prisões provisórias, o segundo a partir do enfrentamento à

cultura punitiva que alimenta a atuação dos juristas e a formação dos estudantes

de Direito.

Problema: Diante do exposto, o presente trabalho pretende responder, a partir

dos diagnósticos já realizados no contexto de execução do projeto, quais

elementos contribuem o Estado do Piauí ser o segundo do país em quantidade

de presos provisórios?

Questões Teóricas Envolvidas e Aspectos Metodológicos: A discussão aqui

empreendida se deu como revisão de literatura para discutir estatísticas oficiais

sobre encarceramento em massa fornecidas pelo Grupo de Monitoramento e

Fiscalização do Sistema Carcerário do Piauí (GMF) e outros órgãos da

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administração penitenciária. A discussão aqui empreendida se deu como revisão

de literatura para discutir estatísticas oficiais sobre encarceramento em massa. A

base teórica do projeto conta com referenciais da criminologia crítica e

constitucionalismo que fundamenta o pressuposto de estrutura simbólica da

realidade que viola garantias constitucionais com base em Zaffaroni (1988),

Bourdieu (1989), Foucault (1987), Baratta (1982), Rosenfeld (2003) e Habermas

(1997), seguindo o itinerário analítico teórico de fazer o diagnóstico com a

perspectiva da criminologia crítica e discutir saídas com a teoria constitucional.

Foucault (1987) identifica que o sujeito no mundo do trabalho do pós revolução

industrial é manipulável e manipulado pela sociedade disciplinar. O autor

percebe o fato em dois registros distintos; um corpo dócil e útil, com uma espécie

de teoria geral do adestramento que tem seu centro na ideia de docilidade do

corpo que une os aspectos de corpo analisável e manipulável por meio da

disciplina.

Principais Conclusões: O elevado número de presos provisórios no Estado do

Piauí é produzido a partir da atuação das agencias penais sob uma seletividade

classista, racial e de gênero consubstanciados na implementação de políticas,

institutos e ferramentas penais precarizados e que não representam os fins para

os quais foram criados inicialmente. Assim, são completamente legitimados ou

deslocados pela atuação dos juristas imbuídos de uma cultura punitiva subjetiva,

atravessada essencialmente pelo preconceito de classe e pelo racismo.

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14. OS LIMITES DA PENALIDADE NEOLIBERAL: ENCARCERAMENTO EM MASSA E

INCLUSÃO SOCIAL NO BRASIL

Autor: Luiz Phelipe Dal Santo

Resumo:

Com base na teoria de Loïc Wacquant (2003), o neoliberalismo tem sido a

principal categoria explicativa relacionada à expansão do sistema penal e ao

endurecimento das penas, notados a partir dos anos 1970, nos Estados Unidos,

e da década seguinte, em diversos países na Europa. Embora inicialmente

formulada para lidar com as transformações no sistema de justiça criminal

estadunidense, a “penalidade neoliberal” é frequentemente incorporada ao

discurso de criminólogos brasileiros (Flauzina, 2006; Batista; Abramovay, 2010;

Batista, 2012a; 2012b; Carvalho, 2013) – e não só deles (Wacquant, 2003b;

Iturralde, 2010; Müller, 2012) – na tentativa de compreender o encarceramento

em massa no Brasil – e na América do Sul, de modo geral. No entanto, as

transformações político-econômicas e sociais verificadas em um considerável

período do século XXI no país sul-americano são aparentemente ignoradas na

literatura criminológica nacional contemporânea. Em um contexto global, alguns

autores já questionam a pertinência da teoria em questão (Matthews, 2005;

Tonry, 2007; Nelken, 2009; Cheliotis; Xenakis, 2010; Downes, 2011; O’Malley,

2015; Sozzo, 2017; Dal Santo, 2018). Não por outra razão, por meio de (i) revisão

bibliográfica sobre a teoria da penalidade neoliberal, bem como sobre a ascensão

e a eventual superação do modelo neoliberal no Brasil (Antunes, 2005; 2006;

Martins, 2011; Pochmann, 2012; Sader, 2013), e de (ii) análise da variação de

indicadores socioeconômicos – como o IDH, o Índice de GINI e a taxa de

desemprego – e do investimento público em distintos setores, o presente artigo

identifica limitações para a “importação” da teoria da penalidade neoliberal

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enquanto teoria capaz de explicar integralmente a contínua expansão do sistema

penal brasileiro, mesmo em tempos de inclusão social.

15. REMIÇÃO PELA LEITURA: EXPERIÊNCIAS E ATIVIDADES DE PESQUISA DE

EXTENSÃO DESENVOLVIDAS NO PRESÍDIO FEMININO SANTA LUZIA

Autor: Hugo Leonardo Rodrigues Santos

Coautora: Mayara Stéffany da Silva Araújo

Resumo:

A referente pesquisa resulta de Projeto de Extensão universitário que iniciou no

ano de 2017 e continua sendo desenvolvido este ano, tendo como objetivo

principal analisar e auxiliar o desenvolvimento do Projeto Lêberdade no Presídio

Feminino Santa Luzia, localizado em Maceió/AL, sendo este um projeto da

Secretaria de Estado de Ressocialização e Inclusão Social, que proporciona a

remição da pena de mulheres condenadas por meio da leitura. Devido ao

aumento vertiginoso do encarceramento feminino nos últimos anos, totalizando

396 mulheres encarceradas em Alagoas, conforme dados fornecidos pelo

relatório do INFOPEN, faz-se necessário a implantação de programas e medidas

que visem reduzir a reincidência destas mulheres na prática das condutas ilícitas,

com o intuito de alcançar a ressocialização e a reintegração social, bem como

programas que atentem para as peculiaridades de gênero, tendo em vista que,

segundo entendimento de Elaine Pimentel e Hugo Leonardo (2016), as mulheres

encarceradas são as mais excluídas entre os excluídos do conjunto mais amplo

de presos brasileiros. Sendo assim, mostra-se a necessidade de revisão da

adequação e da finalidade da pena privativa de liberdade, sob a ótica de uma

gestão de políticas prisionais mais eficientes no âmbito feminino. Considerando

a crítica foucaultiana acerca da incompetência do sistema prisional em cumprir

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sua função ressocializadora, o referido projeto de pesquisa tem como objetivo

primário estimular à leitura dentro do estabelecimento prisional, afim de obter

resultados positivos que transpassem os efeitos da remição, contribuindo

diretamente com uma das finalidades da pena: à ressocialização. O objetivo

secundário consiste na análise da resolução 44 do Conselho Nacional de Justiça,

que implantou a remição por meio da leitura, bem como verificar como ocorreu

a implantação do Projeto Lêberdade em Alagoas e as referidas regras locais

relativas a implementação, bem como averiguar os efeitos práticos que o

Lêberdade produz no campo do sistema prisional. Deste modo, iniciativas de

pesquisa sobre encarceramento com ênfase na perspectiva de gênero desperta

nas reeducandas o interesse em repensar sobre a sua condição de mulher, de

reeducanda e de pessoas que sonham com um futuro oportuno e positivo fora

do sistema prisional. De forma contínua e satisfatória, os pesquisadores

comparecem ao Presídio Santa Luzia para desenvolver oficinas de qualificação e

incentivo à leitura e produção textual, sendo estes momentos de muito

aprendizado, por possibilitar uma troca mútua de saberes entre os pesquisadores

e as reeducandas, proporcionando, assim, uma avaliação positiva desta pesquisa

por diferentes perspectivas. Para alcançar os objetivos, utiliza-se o método de

pesquisa empírico e etnográfico, de rumos adaptáveis, em que se faz uso de

observação participante e interações entre os pesquisadores e a população

pesquisada, bem como os referenciais teóricos que consistem em obras de

Criminologia, Processo Penal e Política Criminal vinculadas a encarceramento e

ressocialização. De tal forma, frente aos resultados já obtidos, compreende-se

que a real efetividade da função ressocializadora da pena é mais eficiente quando

há medidas socioeducativas e programas que permitam o contato entre as

reeducandas e o mundo exterior.

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16. O ENCARCERAMENTO EM MASSA NO BRASIL SOB UMA ANÁLISE DAS POLÍTICAS

DE PUNIÇÃO NA ORDEM NEOLIBERAL

Autora: Kamila Moriyama Nascimento

Coautor: Humberto Barrionuevo Fabretti

Resumo:

De acordo com Garland (2008), a partir da década de 1970, desenvolveu-se nas

sociedades contemporâneas uma nova forma de entender e agir em relação ao

crime e a punição. Nesse sentido, as profundas transformações que ocorreram

no campo do controle do crime foram resultado de processos sociais, políticos,

econômicos e culturais, bem como de rearranjos estruturais e institucionais, os

quais tiveram como fatores principais a nova organização social na pós-

modernidade e a nova ordem econômica – marcada pelo neoconservadorismo e

neoliberalismo. Tais tendências foram identificadas principalmente nos Estados

Unidos e na Grã-Bretanha, entretanto, é possível considerar que também

estiveram presentes em outros países ocidentais, como o Brasil.

No entanto, as mudanças nas concepções e práticas de controle do crime e de

punição a partir da ordem neoliberal geraram políticas de segurança, repressão

e exclusão social de grupos sociais específicos por meio do encarceramento em

massa. Diante do acelerado crescimento da população carcerária brasileira desde

o final do século XX, perdurando ainda esse quadro calamitoso até os dias atuais,

o presente trabalho tem por objetivo analisar o processo de encarceramento em

massa no Brasil a partir da concepção neoliberal das políticas de punição

adotadas pelos Estados Unidos. Portanto, mostra-se pertinente tal abordagem

do fenômeno encarceramento em massa para o Grupo de Trabalho Pena, prisão

e encarceramento.

Nesse sentido, verifica as transformações no debate entre crime e punição,

principalmente quanto às concepções do neoliberalismo e do controle social do

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crime na pós-modernidade, bem como analisa o programa policial “tolerância

zero” da cidade de Nova Iorque. Ademais, tenta compreender a influência das

políticas de punição norte-americana no Brasil, como também analisa a Lei de

Crimes Hediondos e a Lei de Drogas. Por meio da análise do perfil do Sistema

Penitenciário Brasileiro e da sua população encarcerada, foi possível constatar a

seletividade penal através do encarceramento em massa dos jovens brasileiros

negros e pobres, como uma forma de excluí-los da sociedade. Dessa forma,

depreende-se que o fenômeno do encarceramento em massa no Brasil só

intensificou a desigualdade social e os problemas sociais do país, mostrando ser

um meio de eliminar as pessoas consideradas indesejáveis.

Por fim, a presente pesquisa será realizada por meio de revisão de literatura com

análises de autores internacionais e nacionais, como Garland (2008), Wacquant

(2001), Belli (2000) e Shecaira (2009), que contribuíram para a compreensão do

presente objeto de estudo, bem como de análise legislativa em relação à Lei de

Crimes Hediondos e à Lei de Drogas. Ademais, contará com análises quantitativas

acerca do perfil do Sistema Penitenciário Brasileiro e das pessoas presas no Brasil.

17. O GRANDE ENCARCERAMENTO EM ALAGOAS E AS VIDAS MATÁVEIS NO

SISTEMA CARCERÁRIO ENTRE 2006 E 2017

Autor: Manoel Alves da Silva Junior

Coautor: Gabriel Villela Barletta

Coautor: Roberto Barbosa de Moura

Resumo:

O presente trabalho visa analisar, a partir da realidade alagoana, o fenômeno do

encarceramento em massa (GARLAND, 2008) sob a ótica de como isso reverbera

nas mortes das presas e presos dentro do sistema penitenciário, bem como quais

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são os micropoderes que atravessam esta relação mortífera, de tal sorte que

parte, em um primeiro plano, de pesquisa documental extraída do setor de

Estatística da Secretaria de Ressocialização e Inclusão Social - SERIS, pesquisa

qualitativa de análise dos processos judiciais que envolvem os mortos no sistema

penitenciário e por fim análise do perfil de quem está morrendo nos cárceres

através dos prontuários. Assim, constata-se que a Evolução Carcerária de 2011 -

2018 sob o regime fechado, provisórios, internados e condenados, em janeiro de

2011 (SERIS, 2017-A) era de 2.090 (dois mil e noventa) presas e presos, já em

março de 2018 (SERIS, 2018) a cifra totaliza 4.603 (quatro mil, seiscentos e três

presos e presas, totalizando um crescimento de 120% em 7 (sete) anos em que,

deste montante, 3.072 encarcerados estão sob regime provisório, ou seja, não

há execução de pena para 66,7% dos custodiados nos presídios alagoanos, bem

como perpassa por um excedente de 880 encarcerados, no qual totaliza 23,6%

acima da capacidade do sistema penitenciário. Ao mesmo tempo, a pesquisa

documental da mesma fonte relata que entre 2006 e 2017 (SERIS, 2017)

houveram 185 mortes no sistema prisional alagoano, sendo 84 mortes naturais

e 101 mortes violentas. Fundamentalmente, faz-se o recorte de três institutos

que circunscrevem este quadro: 1) o fenômeno do grande encarceramento em

Alagoas; 2) a relação dos agentes penitenciários com os presos, a quantidade de

agentes para cada preso e a forma de controle que a baixa quantidade de agentes

impacta dentro do sistema; 3) os inquéritos das mortes no sistema prisional,

relatando suas causas. Neste sentido, o interesse desta pesquisa é sobrepor estas

categorias para buscar entender, a partir do fenômeno do superencarceramento,

de que forma os sujeitos morrem no sistema prisional. Por fim, através de uma

leitura criminológica crítica marginal (ZAFFARONI, 1991), utilizando o aparato

conceitual de Achille Mbembe (2011), a Necropolítica, este trabalho é uma

tentativa de demonstrar que estas relações estão circunscritas a um poder de

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morte (FOUCAULT, 2010) através de morte real e cultural, incidindo sobre um

território que gera desvalorização do espaço e das vidas, tornando certos grupos

e indivíduos autorizados a matarem determinado grupo.

18. O SISTEMA PRISIONAL ENQUANTO PROBLEMA DE SEGURANÇA PÚBLICA:

ANÁLISE DA SITUAÇÃO DO ESTADO DO RS

Autora: Mariana Py Muniz Cappelari

Resumo:

O Estado do RS sofreu com um aumento significativo da população carcerária nos

últimos três anos. Nesse sentido, diante o déficit de vagas que já apresentava,

tornou-se frequente a detenção de presos e de presas em carceragens de

Delegacias de Polícia, o que tinha se erradicado há muito; em viaturas; ônibus

cela; corrimãos e até em uma lixeira. Por outro lado, a Cadeia Pública de Porto

Alegre, antigo Presídio Central de Porto Alegre, sofre com uma interdição que

data de 1995 e uma medida cautelar deferida pela Comissão Interamericana de

Direitos Humanos, desde dezembro de 2013, a qual reconhece uma série de

violações de Direitos Humanos e exige, entre outras medidas, a redução drástica

de uma população carcerária que só tende a crescer e se avolumar, quanto mais

quando se verifica o aporte de verba pública para a construção de um Centro de

Triagem e de uma Penitenciária no interior do mesmo terreno que já abarca a

Cadeia Pública, a qual já opera muito acima da sua capacidade, com uma

população que gira em torno de mais de 5.000 presos em detrimento de menos

de 2.000 vagas, e, já considerada o pior presídio do país, por CPI do Sistema

Prisional da Câmara Federal em 2009. Nesse contexto, o trabalho objetiva

analisar a atual e real situação carcerária do Estado do RS, por meio da Cadeia

Pública de Porto Alegre, pois entendemos servir de raio-x do sistema como um

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todo, a fim de identificar a política de gestão prisional empreendida pelo Governo

Estadual e a vinculação dessas com discursos populistas e punitivistas, os quais

reforçam o encarceramento enquanto única possibilidade de contenção da

criminalidade, mas que, ao não apresentar condições minimamente dignas de

execução penal, violam os direitos mais comezinhos, inclusive de terceiros, como

dos familiares, e retroalimentam a economia do crime, dando vazão, assim, a

continuidade do círculo de violência, o que afeta sobremaneira a segurança

pública. Para tanto, se fará o cotejo entre dados extraídos de documentos, que

remontam a descrição da realidade atual do sistema carcerário gaúcho, os quais

serão analisados e relacionados à doutrina vigente, a qual trabalha com o

encarceramento, a gestão prisional e segurança pública. Pretendemos, assim,

demonstrar que a centralidade da pena de prisão ainda permanece enquanto

discurso potente a amparar políticas criminais populistas e punitivas; e, assim,

também caminham ao lado das sempre existentes violações de Direitos Humanos

no contexto prisional brasileiro e gaúcho, as quais fortalecem a economia do

crime, diante o comando exercido pelas facções no interior do sistema prisional,

apresentando-se um grave quadro em termos de segurança pública, o qual

exigiria o direcionamento de uma gestão prisional a qual atentasse para políticas

de desencarceramento e de alternativas penais; de definição de diretrizes

mínimas de gestão e de priorização de políticas ao egresso do sistema prisional.

O colapso é sempre premente no âmbito prisional, mas a realidade do contexto

gaúcho não nos fornece perspectivas otimistas, restando ao pesquisador e a

pesquisadora questionar como forma de tencionar mudanças estruturais que

possam intervir minimamente em termos de redução de danos.

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19. O ENCARCERAMENTO PELO ENCARCERAMENTO: RESPOSTAS SOCIAIS

Autor: Paulo José Angelo Andrade

Coautora: Michelle Martins Papini Mota

Resumo:

As temáticas acerca da pena, da prisão e do encarceramento são diversas e se

encontram em evidência no contexto da sociedade, do universo acadêmico e

jurídico. Em um mundo culturalmente globalizado a doutrina jurídica e as

relações sociais contribuem para a padronização de estereótipos influenciados

por interesses econômicos que determinam padrões e condutas sociais.

As ideias e padrões contribuem para os paradigmas da concentração de poder

político, social e econômico de determinados grupos sociais, nesta perspectiva o

presente analisa as reconfigurações do sistema prisional, sob a ótica da pena e

encarceramento, após a intervenção policial na Casa de Detenção do Carandiru,

na cidade de São Paulo em outubro de 1992. Até o início de 2017, o qual foi

marcado por trágicas rebeliões, e conflitos entre forças policias e facções

criminosas dentro e fora do Cárcere. Elenca elementos fáticos, doutrinários e da

legislação protetiva e emendas à Constituição Federal brasileira de 1988, com

vistas a verificar a extensão das medidas tomadas pelo Estado na proteção e

garantia dos direitos dos detentos e da sociedade, em um ciclo que se

retroalimenta transformando os autores, detentos e sociedade, em vítimas de

violência.

Busca-se analisar a preservação de garantias individuais, com destaque, dos

ensinamentos de Jean-Jacques Rousseau e, no âmbito do Direito, para a obra de

Cesare Beccaria e de Michel Focault. A pesquisa objetivou verificar o entrelace

entre a pena, prisão, encarceramento, encarcerado e a concentração de poder

econômico, a exclusão de segmentos sociais em tratamento não igualitário,

negando o Estado Direitos Fundamentais que não se efetivam como direito

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universal. Partindo deste ponto, passa-se a analisar fundamentos e a finalidade

da pena privativa de liberdade, sob uma ótica garantista, propostas de sua

readequação. Neste contexto, a sociedade assimila a tolerância à violência e

repressão, os submetidos às penas se insurgem e outros usufruem das benesses

econômicas do processo massivo de encarceramento, por fim, reafirmam a

relação de poder econômico, da sociedade e políticas de governo no campo

prisional. Sendo grande desafio da pós-modernidade o de romper o paradigma

do encarceramento pelo encarceramento. Por fim, visa o presente trabalho

reflexionar acerca do direito e da sociedade na contemporaneidade no contexto

da pena e do encarceramento. Como procedimento metodológico utiliza-se do

bibliográfico-investigativo.

20. 30 ANOS DE MODIFICAÇÕES NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - PENA,

PRISÃO E ENCARCERAMENTO

Autor: Rogerio Barros Sganzerla

Resumo:

De que forma o Poder Legislativo pretendeu modificar a Constituição de 1988

sobre as penas de prisão? Esta pergunta se justifica na importância de entender

que tipo de propostas estão sendo feitas com o fim de modificar as regulações

sobre penas de prisão. Durante os 30 anos de vigência da Constituição, o Brasil

se tornou o país com 3ª maior população carcerária do mundo. Além das políticas

públicas elaboradas pelo Poder Executivo no intuito de conter a crescente crise

nas prisões e de encarceramento em massa, é necessário entender que de forma

o Poder Legislativo vem propondo alternativas para esse problema,

especialmente na Constituição. Nesse sentido, este aprofunda uma pesquisa

realizada pela FGV Direito Rio, através do projeto Congresso em Números, que

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investigou 3.460 Propostas de Emenda à Constituição (PEC) apresentadas entre

05/10/1988 e 31/12/2017, em razão do tipo de modificação pretendida no

ordenamento jurídico (criação, alteração ou revogação), em cada artigo, inciso,

parágrafo ou alínea da Constituição Federal de 1988. Até o momento, foram

analisadas 1.000 PECs, sendo 11 delas pretendendo modificar os incisos XLV a

LXXVIII do artigo 5º da Constituição Federal de 1988. O planilhamento total estará

concluído até 31/05/2018. Até o dia 29/06/2018 (data de envio do resumo

expandido) e 29/08/2018 (II CPCRIM), todas as análises quantitativas estarão

finalizadas em virtude do prazo interno do projeto Congresso em Números para

divulgação do Relatório da Pesquisa “30 anos de Modificações na Constituição

Federal de 1988”, previsto para junho de 2018. Neste artigo, a pretensão é

entender aprofundar este relatório e analisar qualitativamente as intenções de

modificação (ampliação ou restrição de direitos), as justificativas, bem como

diversas outras informações disponíveis sobre a discussão envolvendo a prisão e

a pena, especialmente as previstas entre os incisos XLV e LXXVIII do artigo 5º da

Constituição Federal de 1988. O objetivo, ao final desta análise, é identificar os

artigos que são objetos de mais tentativas de modificação, assim como entender

os impactos pretendidos pelas Propostas de Emenda à Constituição no

ordenamento jurídico brasileiro. Por fim, a análise conterá ainda

questionamentos sobre os fundamentos e finalidades destas modificações

acerca do problema central: a crise prisional e o encarceramento em massa no

Brasil.

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21. A INEFICÁCIA DO ENCARCERAMENTO FRENTE AO ESTADO ANÔMICO DE

MERTON E O ENFRAQUECIMENTO DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

Autor: Victor Corrêa de Oliveira Filho

Resumo:

O presente trabalho busca desenvolver o estudo das teorias do encarceramento,

bem como provar através de minucioso estudo da teoria da anomia que núcleos

alternativos da sociedade vêm se apresentando mais fortes do que o próprio

estado democrático de direito, fazendo assim com que a aplicação de medidas

de ressocialização no sistema carcerário não ocasione efeito algum. O Brasil

adota a teoria unificadora ou mista quanto às funções da pena, dando destaque

para a função preventiva especial positiva e preventiva geral. No entanto,

percebe-se que os anseios sociais voltam-se mais intensos às funções retributivas

e à prevenção Especial, como forma de neutralização do delinquente.

Atualmente, busca-se de forma incansável dentre os estudiosos do Direito Penal

encontrar uma solução para dar eficácia à ressocialização do delinquente.

Contudo, não se tem encontrado alternativas plausíveis, dentre alguns motivos,

o enfraquecimento do estado democrático de Direito e o consequente

fortalecimento de núcleos anômicos espalhados por toda a sociedade. Segundo

Merton, Anomia consiste no desequilíbrio entre dois fatores da sociedade, a

crença nos objetivos culturais e o acesso aos meios institucionalizados. Este

desequilíbrio faz nascer o delinquente designado como inovação, consistindo no

individuo que acredita nos objetivos culturais, porém, não nos meios

institucionalizados, fazendo assim com que este busque a delinquência como

meio para atingir os objetivos culturais. Este trabalho, vem provar que o

problema da ressocialização está voltado para o enfraquecimento do estado

democrático de direito, que dá espaço ao crime organizado, inclusive a ponto de

comandar o próprio sistema penitenciário. Ademais, deixa de lado a idéia de que

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a ressocialização é ineficaz pelo modelo de pena adotado no Brasil. Utiliza-se do

método dedutivo e é desenvolvido por meio da leitura, análise e registros em

doutrinas, artigos e revistas publicadas, para compreender e analisar as questões

doutrinarias inerentes às funções das penas e das teorias da anomia, e a

conseqüente relação com a ineficácia do encarceramento, desenvolvendo,

portanto, o tipo de pesquisa exploratória.

Pela técnica da pesquisa bibliográfico-documental, é possível realizar a

interpretação do referido instituto penal, com o auxílio de teorias e opiniões de

juristas sobre o assunto, para ao final concluir se a problemática do

encarceramento esta ligada diretamente ao sistema adotado pela política

penitenciaria brasileira ou se é uma questão inerente ao enfraquecimento do

estado democrático de direito em contraste com o fortalecimento de núcleos

anomicos na sociedade.

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GRUPO DE TRABALHO 6:

DESAFIOS DO PROCESSO PENAL BRASILEIRO

Ementa: Trabalhos que versem sobre a reforma do Código de Processo Penal,

formas consensuais de solução do conflito penal, investigação defensiva, meios

extraordinários de investigação, criminalidade organizada e processo penal,

cooperação internacional em matéria penal, interessam a este Grupo de

Trabalho, seja em estudos sobre os institutos do direito nacional, seja em estudos

comparados.

Coordenador Prof. Dr. Antônio Pedro Melchior

Doutorando em Direito pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

(UFRJ); Membro da Associação Latino Americana de Direito Penal e Criminologia

(ALPEC) - Seção Brasileira; Membro da Associação Internacional de Direito Penal

(AIDP- Brasil); Membro da Associação Brasileira de Direito Processual Penal

(ABDPro); Membro do Núcleo de Direito e Psicanálise do Programa de Pós

Graduação da Universidade Federal do Paraná (UFPR); Membro fundador do

Fórum Permanente de Direito e Psicanálise da Escola da Magistratura do Estado

do Rio de Janeiro; Membro da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos

Advogados do Brasil (OAB/RJ). Lattes: http://lattes.cnpq.br/6865616601789018

Coordenadora Ms. Flávia Rahal

Advogada, Mestre em Processo Penal pela Faculdade de Direito da Universidade

de São Paulo, Professora da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas de São

Paulo, Diretora do Innocence Project Brasil e Vice-Presidente do Conselho do

IDDD. Linkedin: https://www.linkedin.com/in/flaviarahal

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Trabalhos:

1. LEGITIMIDADE NEGOCIAL NO ACORDO DE COLABORAÇÃO PREMIADA: LIMITES

DE ATUAÇÃO DO MAGISTRADO, MEMBROS DO MP E TERCEIROS INTERESSADOS

Autor: Alfredo Falcao Junior

Coautora: Amanda Vitória de Araújo Oliveira

Resumo:

Objetivos de pesquisa.

O modelo de colaboração premiada brasileiro é um modelo próprio ou se

aproxima do modelo consensual norte-americano? Quais as vantagens de cada

um? Quais seriam os elementos de validade necessários para um acordo, de fato,

ser um incentivo legal para o investigado colaborar? O modelo legal brasileiro

atenderia esse padrão de validade mínimo a título de incentivo?

Questões teóricas.

A despeito dos poucos estudos sociológicos nacionais sobre quais tipos de crimes

estão ligados à necessidade da técnica de colaboração, é possível dizer que, de

um modo geral, a técnica é útil para elucidar crimes cometidos por pessoas com

significativo poder econômico e que é necessária uma mínima autonomia

gerencial para que o MP ofereça propostas atrativas para o colaborador. Daí

serem importantes estudos da criminologia e da processualística a respeito dos

desafios modernos do processo penal.

Metodologia.

É imprescindível revisar a doutrina especializada sobre o tema, seja a nacional ou

estrangeira. Ainda sim, a análise de jurisprudência é fundamental, para

demonstrar as divergências a respeito do papel do judiciário para rever os

acordos de colaboração. No caso da jurisprudência nacional, a reflexão será

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centrada no Supremo Tribunal Federal (STF); na jurisprudência estrangeira, serão

analisadas decisões que a doutrina do respectivo país toma como paradigma.

Apontamentos centrais e principais conclusões.

A aplicação da Colaboração Premiada, segundo as prescrições do art. 4º da Lei nº

12.850/2013, tem causado dúvidas a respeito dos poderes de homologação

judicial do acordo. A insegurança jurídica se relaciona aos limites do que pode ser

negociado entre Ministério Público (MP) e colaborador e, de outro lado, qual o

poder de revisão que o judiciário detém no exame de homologação do negócio.

Uma postura centralista por parte da Justiça pode resultar no desinteresse em

colaborar, uma vez que o colaborador apenas terá certeza da premiação quando

o juiz homologar o acordo. Se, porém, a postura decisiva for de delegação

negocial, o acordo pode resultar na flexibilização de garantias constitucionais

como a presunção de inocência, inafastabilidade do controle jurisdicional e

outras.

A pesquisa tem um “insight” inicial de que a colaboração premiada no Brasil

pode seguir um modelo de aplicação próprio, haja vista a realidade particular do

país. O importante é que o modelo seja deveras um instrumento importante de

elucidação de crimes, sem que, em contrapartida, seja uma carta para abusos

estatais.

Pertinência Temática ao GT escolhido.

É lugar comum que investigações complexas reclamam técnicas sofisticadas de

coleta de provas, pois, de outra, não haveria eficiência na persecução penal.

Contudo, é preciso raciocinar que a técnica da colaboração não pode ser usada

de modo indiscriminado. A tentativa de equilíbrio entre eficiência e garantias

fundamentais e de algo que ofereça segurança jurídica ao teor dos acordos

depende de melhor estudar os tipos de crime que reclamam o uso dessa técnica

e, ademais, é preciso pensar o papel do judiciário como fiel da balança entre o

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abuso de poder investigatório e a realidade nacional que exige forma eficiente

de persecução.

2. A JUSTIÇA RESTAURATIVA APLICADA AOS CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E

FAMILIAR CONTRA A MULHER

Autora: Bruna Fernanda de Oliveira

Resumo:

Diante do atual cenário brasileiro, a violência doméstica e familiar contra a

mulher é crescente e faz parte da realidade social. A Lei 11.340/2006

denominada “Lei Maria da Penha” foi criada a fim de coibir e prevenir a violência

contra a mulher, tendo em vista os dispositivos constantes na Constituição

Federativa Brasileira, bem como os tratados internacionais ratificados pelo Brasil.

No âmbito do processo penal, diversas alterações foram realizadas com a

finalidade de fortalecer a punição para essa espécie de violência. Não obstante,

nos últimos anos, surge a Justiça Restaurativa e sua aplicação no âmbito da

violência doméstica e familiar começa a ser estudada. Os principais argumentos

na não punição do culpado, no aumento do temor das vítimas, quando reunidas

com o agressor, além de que tal aplicação é inviável juridicamente, uma vez que

só é possível vencer a violência contra a mulher por meio da aplicação de sanções

penais e não por mecanismos despenalizadores. Por outro lado, é nítido que

esses argumentos não merecem prosperar, pois a “simples punição” do agressor

não está sendo eficaz para a solução dos casos da violência doméstica e familiar

contra a mulher. Isso porque, a pena para a lesão corporal prevista artigo 129,

§9º do Código Penal, é de detenção de 03 (três) meses a 03 (três) anos e, na

maioria dos casos, a lesão é leve e o réu não é reincidente, razão pela qual se

aplica a pena mínima em regime inicial aberto, vedada a possibilidade de

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conversão da pena em restritivas de direito, porém é aplicada a suspensão

condicional da pena. Não obstante, sendo a suspensão condicional da pena um

direito subjetivo do sentenciado e, diante da falta de casa de albergado, o regime

aberto acaba sendo mais vantajoso. Portanto, é evidente que essa “punição” não

resolve e não atribui efetividade à Lei Maria da Penha, pois as estatísticas são

claras ao evidenciar o aumento da violência e os níveis de reincidência. Destarte,

por meio do método hipotético-dedutivo, este artigo demonstra que a Justiça

restaurativa deve ser utilizada nos casos de violência doméstica e familiar,

notadamente diante da Resolução 2002/12 da ONU e Resolução nº 225 do CNJ.

O Poder Judiciário deve buscar mecanismos para que a interferência estatal na

vida privada seja efetiva, razão pela qual se constituiu um verdadeiro desafio para

o processo penal brasileiro. A Justiça Restaurativa visa fortalecer e empoderar as

vítimas de violência, reequilibrar os relacionamentos, evidenciar qual o tipo e

nível de violência enfrentada, haja vista a abordagem sem buscar culpados, bem

como possibilita mudanças que, muitas vezes, a pessoa não consegue alcançar

sozinha. Destarte, não tem a finalidade de substituir a Justiça tradicional nem de

fomentar a impunidade, uma vez que pode ser utilizada de forma complementar

e em qualquer fase processual. O fato é que as sanções existentes, porém a

realidade muda pouco.

3. DA AUSENCIA DO DIREITO AO RECURSO NAS DECISOES CONDENATORIAS EM

SEGUNDO GRAU

Autor: Eduardo Bruno Avellar Milhomens

Coautora: Nadia de Castro Alves

Resumo:

O objetivo da pesquisa é analisar as condenações que ocorrem somente em

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segundo grau e a incidência da Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça,

impossibilitando o direito a um recurso que reexamine a matéria, ferindo a

garantia da ampla defesa.

Questões técnicas envolvidas: Direito ao Recurso, Ampla Defesa, Decisão do

Tribunal Constitucional Português, Distinção entre Duplo Grau de Jurisdição e o

Direito ao Recurso.

Metodologia de pesquisa: pesquisa doutrinária, bibliográfica e jurisprudencial,

inclusive no direito comparado, baseando-se em acórdão proferido pelo Tribunal

Constitucional Português.

Apontamentos centrais: Não há na legislação pátria, recurso com objetivo de

trazer a rediscussão do mérito pelas instâncias recursais superiores. Entende-se

que ocorrendo condenação pelo Tribunal, deve-se afastar a vedação da referida

Súmula para satisfazer o direito fundamental ao recurso e à ampla defesa. Nesse

sentido, proibir que o Superior Tribunal de Justiça faça uma nova análise das

provas utilizadas em segundo grau para condenar o réu, viola frontalmente o

exercício à ampla defesa.

Principais conclusões: A superação da Súmula n. 7 do Superior Tribunal de Justiça

no caso de condenação em segundo grau para reestabelecer a garantia do Direito

ao Recurso inerente ao Princípio Constitucional da Ampla Defesa.

Pertinência temática ao GT 6: Desafios do Processo Penal Brasileiro – a reforma

do Código de Processo Penal no tocante aos recursos. A reforma do Código Penal

Brasileiro no tocante à diminuição e limitação de recursos e a sua problemática.

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4. DIREITO PROCESSUAL PENAL DO INIMIGO: A EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA

FIXADA A PARTIR DO JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JURI

Autora: Flávia Chaves Nascimento Brandão Penna

Coautora: Fernanda Pascoal Valle Bueno de Castilho

Coautor: Alexandre Luís Alves de Oliveira

Resumo:

O Estado brasileiro constitucionalizou o Princípio da Presunção de Inocência,

pormenorizando a previsão contida nos tratados internacionais de que é

signatário, afirmando que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em

julgado de sentença penal condenatória”.

Em que pese a clareza da disposição, o Supremo Tribunal Federal tem mantido

entendimento pela constitucionalidade da execução antecipada da condenação

proferida em segunda instância, mesmo que pendente julgamento de recursos

aos Tribunais Superiores.

Não fosse suficientemente grave a decisão, tem ela repercutido na Justiça de

base. Seguindo a mesma fundamentação adotada para execução da pena fixada

em segunda instância, de impossibilidade de rediscussão probatória, verifica-se

a determinação da precoce execução da decisão proferida pelo Tribunal do Júri,

diante da soberania de seus veredictos e da estreita via recursal que lhe pertine.

A fim de evitar discussões como as se apresentam, acerca da

inconstitucionalidade da decretação da prisão-pena antes do trânsito em julgado

da decisão condenatória, têm se apresentado projetos de Lei e de Emenda

Constitucional a fim de tornar formalmente lícita referida medida.

Exemplos disto são os Projetos de Lei n.402/2015, n.147/2018 e n.166/2018,

bem como a Proposta de Emenda à Constituição n.140/2018, que buscam desde

a alteração do significado do “trânsito em julgado” até a deformação do próprio

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princípio da Presunção de Inocência, em afronta ao que dispõe o sistema

constitucional brasileiro acerca das cláusulas pétreas.

Pretende-se a discussão acerca da grave situação em que se encontra o sistema

processual garantista, diante do punitivismo dos Poderes Judiciário e Legislativo,

que, sob pretexto de atendimento a supostas necessidades sociais, cerceia

liberdades individuais e considera culpado o réu até mesmo a partir da primeira

instância, a despeito do que prevê o ordenamento jurídico brasileiro.

O trabalho objetiva, assim, analisar a (in)constitucionalidade das reformas

legislativas supracitadas - razão de sua inclusão entre os “Desafios do Processo

Penal Brasileiro” - bem como da jurisprudência pátria, especialmente a partir de

decisões paradigmáticas sobre o tema, como o Habeas Corpus n.126.292/SP, a

respeito do trânsito em julgado em segunda instância; HC n. 118.770/SP e, a

título de análise de caso, a Ação Penal n.0686.16.003948-9, da comarca de

Teófilo Otoni/MG, referentes à execução provisória da sentença condenatória

proferida pelo Tribunal do Júri, tudo isto a partir da consolidada doutrina

constitucional e processual penal.

5. A INCOMPETÊNCIA DOS JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

CONTRA A MULHER PARA O PROCESSAMENTO DOS CRIMES DE FEMINICÍDIO – UM

ESTUDO DA LEGISLAÇÃO E JURISPRUDÊNCIA PARANAENSES

Autora: Juliana Bertholdi

Coautor: Khalil Vieira Proença Aquim

Resumo:

A previsão constitucional de que a instrução e julgamento dos crimes dolosos

contra vida são de competência absoluta do Tribunal do Júri, insculpida no art.

5º, XXXVIII, “d”, da Constituição da República, vem sendo constantemente

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mitigada no Estado do Paraná sob o argumento de que resolução do Tribunal de

Justiça do Estado do Paraná, em combinação com o Código de Organização e

Divisão Judiciária (Lei Estadual nº 14.277 de 2003 atualizada pela Lei nº 18.787,

de 23 de maio de 2016) levariam à prevalência da competência dos Juizados de

Violência Doméstica e Familiar para instrução dos gravosos delitos de feminicídio,

sendo os autos posteriormente remetidos apenas para realização do plenário.

A rica discussão constitucional e processual, que gerou significativas digressões

na melhor doutrina, parece ter perdido espaço na jurisprudência paranaense

para o pacífico e prejudicial entendimento pela competência do Juizado

Especializado, sendo fulcral que a advocacia se posicione profissional e

academicamente na discussão do tema.

Assim, o presente trabalho tem por escopo analisar a constitucionalidade e a

legalidade do processamento do crime de feminicídio pelos Juizados

Especializados, à luz da Organização Judiciária Paranaense e da melhor doutrina,

que entende ser a competência do Tribunal do Júri firmada em razão da matéria,

o que implica a impossibilidade de se reconhecer validade às decisões proferidas

por outros órgãos jurisdicionais (PACELLI, 2015).

No recorte paranaense, faz coro à Constituição Federal e ao artigo 74, §1º do

Código de Processo Penal, a Lei de Organização Judiciária do Estado do Paraná, a

qual dispõe em seu art. 50, §1º que a competência do Tribunal do Júri é absoluta,

inclusive para a instrução e processamento dos autos.

Impende rememorar que no ano de 2016 dezenas de processos envolvendo o

crime de feminicídio acabaram anulados no Distrito Federal, em prejuízo às

vítimas e ao erário público, justamente com o fundamento de incompetência de

Juizados Especializados para mitigar a competência constitucional do Júri.

Nesse sentido já se manifestaram, na esfera regional, o Tribunal de Justiça do

Estado do Maranhão, do Distrito Federal e Territórios e do Estado do Pará. Mais

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do que isso, o próprio Superior Tribunal de Justiça já exarou decisão consoante,

anulando processo realizado pelo Juizado de Violência Doméstica nos autos de

Habeas Corpus n° 121.214/DF.

Assim, a supressão de competência, além de negar aos réus instrução em juízo

especializado (SARLET, 2011), ainda gera indiscutível prejuízo à proteção dos

interesses tutelados pela Maria da Penha: buscando a proteção de atendimento

especializado à mulher agredida, são submetidas estas vítimas a rito simplificado

que não lhes garante a mesma justiça e proteção que o Tribunal do Júri (NUCCI,

2008).

Conclui-se, portanto, que a competência do Tribunal do Júri possui recorte

constitucional (STRECK, 2001), não podendo ser mitigado por lei

hierarquicamente inferior, como é o caso do Estado do Paraná. Deste modo, toda

decisão em matéria de Júri proferida por Juízo diverso – e, portanto,

incompetente - é absolutamente nula, incluindo-se, por certo, as decisões

proferidas pelo Juizado de Violência Doméstica e Familiar Contra Mulher.

6. LIMITES DE ATUAÇÃO E RESPONSABILIDADE DO ADVOGADO NA INVESTIGAÇÃO

DEFENSIVA CRIMINAL

Autor: Júlio César Faria Zini

Coautora: Ana Luiza Rodarte Bueno

Resumo:

O projeto de reforma do Código de Processo Penal (PL 8.045/10) traz em seu

artigo 13 o instituto da investigação defensiva, que tem como pretensão a busca

pela paridade de armas (LOPES JR, 2014, p. 64) no processo penal e possui como

base os princípios constitucionais da igualdade (CR/88, Art. 5º, caput), do devido

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processo legal (CR/88, Art. 5º, LIV), do contraditório e da ampla defesa (CR/88,

Art. 5º, LV).

Com essa inovação legislativa, a investigação defensiva, que até então era um

instituto estranho ao ordenamento jurídico brasileiro, passa a ser matéria de

importante discussão pela doutrina nacional. Assim, o objetivo dessa pesquisa é

fazer uma análise crítica em torno desse instituto, delimitando as possibilidades

e limites de atuação e responsabilização do advogado, bem como o modo de

exercer a investigação.

A metodologia será jurídico-interpretativa e comparativa, tomando como ponto

de partida (I) a experiência italiana de investigação defensiva, (II) os princípios

processuais penais garantidos constitucionalmente, bem como (III) a forma de

responsabilização e de limites de atuação do contador (Lei nº 9.613/1998) e do

detetive (Lei nº 13.432/17).

O referido artigo 13 do PL 8.045/10, que trata da investigação defensiva, viola o

princípio da legalidade quando é omisso em especificar os limites e formas de

atuação do advogado, bem como de sua responsabilização penal, civil ou

disciplinar.

Em relação à atuação do advogado, seria necessário que houvesse na lei a relação

das ações cabíveis na investigação defensiva, estabelecendo também qual seria

a limitação desses atos. Além disso, o próprio PL 8.045/10 também deveria

estabelecer diretrizes para o exercício desse tipo de investigação, pois apesar de

se tratar de uma atividade privada (BULHÕES, 2018), envolve diversos interesses

públicos, sendo imprescindível que o texto legal estabeleça um direcionamento

para a atuação do advogado.

Outra questão de importância é referente ao modo como esses atos

investigativos podem ser exercidos. Neste ponto, discute-se a falta de poder de

polícia pelo advogado e os problemas decorrentes disso, uma vez que sem um

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poder coercitivo a investigação poderá se tornar inócua, pois haverá uma

submissão do advogado em relação à Polícia Judiciária. Assim, defende-se a

instituição do poder de polícia para o advogado/defensor, dentro de limites

muito bem determinados à luz da constituição (MACHADO, 2009, p. 137).

Por fim, também tem caráter essencial a delimitação das hipóteses de

responsabilização do advogado no exercício da investigação defensiva. O

advogado como profissional possui deveres, como o de sigilo, que devem ser por

ele observados. Neste sentido, é necessário determinar quais serão seus deveres

específicos como investigador e as condutas a serem por ele tomadas em caso

de colisão de deveres, tudo visando o respeito aos direitos de todos os envolvidos

na investigação e sua responsabilização ou não nas diversas esferas (disciplinar,

civil e penal).

Assim, conclui-se que o instituto da investigação defensiva trará benefícios ao ser

recepcionado no ordenamento jurídico brasileiro se for devidamente detalhado

legalmente, estabelecendo para o advogado e seu cliente uma possibilidade de

atuação segura no exercício da ampla defesa, sobretudo da defesa efetiva.

7. PRECISAMOS FALAR SOBRE WHISTLEBOWING

Autor: Rodolfo Macedo do Prado

Resumo:

Especialmente desde a Roma Antiga, tem-se relatos de enriquecimento ilícito,

utilização da máquina pública para interesses privados, evoluções patrimoniais

não condizentes com salários, troca de favores, entre outras formas menores de

corrupção. Na mesma época, surgem os primeiros mecanismos de combate à

corrupção, como a obrigatoriedade de livros fiscais, criação de conselhos ou

tribunais para o controle da administração pública e agentes.

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Um dos grandes instrumentos modernos de combate à corrupção pública e

privada está previsto na Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, bem

como na Convenção Interamericana contra a Corrupção, qual seja, o

whistleblowing (em tradução livre, o ato de “assoprar o apito”), que é um

mecanismo semelhante - porém mais amplo e mais eficaz - à colaboração

premiada, sendo previsto em legislações escritas desde o Século VII. Amplamente

utilizado como técnica de combate à corrupção, já auxiliou na recuperação do

equivalente a dezenas de bilhões de reais desviados por esquemas criminosos e

esteve presente em casos emblemáticos como a Revolução Americana, que levou

à independência dos EUA em 1776, passando pelo Wikileaks e pelo escândalo da

Enron. No Brasil, porém, ainda não há legislação expressa acerca do assunto. A

Lei Anticorrupção apenas tangencia o tema e as duas tentativas de se discipliná-

lo no Congresso Nacional acabaram frustradas.

O whistleblower (aquele que “sopra o apito”), também chamado de "informante

de boa-fé" ou "cidadão de boa-fé" pelos Projetos de Lei já rechaçados, é um

terceiro que denuncia às autoridades ou superior hierárquicos competentes a

ocorrência de algum ilícito, embora não necessariamente participe ou tenha

participado daquele determinado esquema criminoso. Caso provada a conduta

ilícita - e havendo consequência financeira - o denunciante pode, inclusive,

receber uma recompensa baseada no montante efetivamente recuperado.

Porém, a operacionalização não é simples. É necessário um sistema para que haja

proteção aos denunciantes, desde o ponto de vista trabalhista até à vida. Há

muito o que se aproveitar ao passo que há também precauções a serem tomadas

quando da importação da técnica para o Brasil.

Ao passo que a “Operação Lava Jato” trouxe à tona a larga utilização da

colaboração premiada para desvendar esquemas de corrupção no âmbito

público, o whistleblowing pode ser colocado como o “futuro” da delação, uma

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vez que não necessita a participação de um agente que tenha cometido ilícito e

se aplica à esfera pública e privada.

O problema central do trabalho é entender como o whistleblowing está presente

nos ordenamentos brasileiro, dos EUA e da Europa, através do método indutivo,

de pesquisa comparada, explicitar a necessidade do porquê precisamos falar

sobre o whistleblowing, a identificação do momento atual e futuro da técnica no

Brasil, sua diferenciação à colaboração premiada, seus requisitos de aplicação e

os resultados que os países que utilizam o mecanismo já experimentam, que é o

grande objetivo. A hipótese é que será inevitável a importação do

whistbleblowing para o Brasil, mas que, tendo em vista o que o mundo já

experimenta há séculos, o sistema pode ser aprimorado e reprogramado para o

processo penal aqui vigente.

8. ACORDO DE NÃO-PERSECUÇÃO PENAL: UM CASO DE DIREITO PENAL DAS

CONSEQUÊNCIAS LEVADO ÀS ÚLTIMAS CONSEQUÊNCIAS

Autor: Victor Cezar Rodrigues da Silva Costa

Coautor: Leo Maciel Junqueira Ribeiro

Resumo:

A principal característica da política criminal contemporânea é a sua orientação

pelas consequências, o que significa a busca pela aplicação da pena sem qualquer

preocupação com o devido processo constitucional, a idoneidade da legislação

penal ou a fundamentação legítima da culpa (HASSEMER, 2003, p. 149).

Nesse contexto, o “núcleo duro no direito penal liberal” se transforma no

direito penal das consequências, que recebe institutos que lhe eram

tradicionalmente extrínsecos. Como exemplo dessa estrutura destaca-se a

transação penal, pois possui como objeto infrações de baixíssimo potencial

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ofensivo, além de dispensar o processo para imposição imediata de pena e

transformar essa imposição em ato que não é jurisdicional (COUTINHO, 2003, p.

355).

Seguindo essa clara tendência utilitário-economicista, diversos dispositivos

normativos brasileiros buscam importar do direito anglo-saxão o instituto do

“plea bargaining”, visando a confissão do investigado pelas imputações que lhe

foram feitas, em troca da aplicação imediata de uma pena reduzida (RAKOFF,

2014). Vale ressaltar que no direito anglo-saxão esse instituto é duramente

criticado, visto que possui problemas estruturais e sistêmicos que prejudicam os

valores fundamentais do sistema criminal (SCHULOFER, 1992, p. 1979).

Apesar das severas críticas, busca-se importar o “plea bargaining” por meio do

art. 283 do Projeto de Lei (PL) nº 8.045/2010 (Reforma do Código de Processo

Penal), que possibilita a composição do acordo de não persecução penal antes

do recebimento da denúncia. Outro dispositivo de destaque foi a Resolução nº

181/2017, do Concelho Nacional do Ministério Público (CNMP), que prevê a

possibilidade do acordo de não persecução penal a delitos cuja pena mínima seja

inferior a quatro anos. Nesse caso específico da Resolução nº 181/2017 do

CNMP, destaca-se a evidente violação ao princípio da legalidade, visto que

compete privativamente à União legislar sobre matéria de Direito Penal e

Processo Penal (TOLEDO, 1994, p. 21-22).

Tendo como referência a proposta de artigo feita pelo PL nº 8.045/2010 e a

Resolução nº 181/2017 do CNMP, a presente pesquisa busca analisar esse

instituto sob a perspectiva constitucional, discutindo seus problemas estruturais

e sistêmicos e verificando sua compatibilidade com o ordenamento jurídico-

constitucional brasileiro, visto que a vinculação à Constituição Federal é fonte

inafastável de legitimidade da jurisdição no âmbito penal (FERRAJOLI, 2012, p.

237).

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Com esse objetivo, discutem-se questões teóricas como o direito penal das

consequências, o papel das instituições de justiça, a impossibilidade do livre

consentimento na fase de investigação preliminar, os princípios constitucionais

da ampla defesa, do contraditório, do devido processo constitucional e da

culpabilidade. A metodologia empregada será jurídico-interpretativa e

comparativa, buscando referências no direito anglo-saxão e sobretudo nos

princípios constitucionais de direito e processo penal do ordenamento jurídico

brasileiro.

Os apontamentos centrais e as principais conclusões do trabalho podem ser

sintetizados como a consideração de que o acordo de não persecução penal, da

forma como está disposto no PL nº 8.045/2010 e na Resolução nº 181/2017 do

CNMP, é incompatível com o ordenamento jurídico brasileiro e com os princípios

constitucionais que o norteiam.

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GRUPO DE TRABALHO 7:

SEGURANÇA PÚBLICA E SELETIVIDADES

Ementa: Este Grupo de Trabalho receberá e debaterá pesquisas sobre segurança

pública, como debates sobre políticas públicas, práticas institucionais, resultados

da atuação policial. Serão valorizados trabalhos que busquem investigar práticas,

concepções e resultados da segurança pública em face de marcadores sociais de

diferença (gênero, relações raciais, grupos etários, grupos de renda, territórios).

Estudos sobre prevenção ao delito na segurança pública, modelos de

policiamento, educação policial, relações entre segurança, justiça criminal e

encarceramento estão no foco das discussões.

Coordenadora Dra. Giane Silvestre

Socióloga, mestra e doutora em sociologia pela Universidade Federal de São

Carlos (UFSCar). Pesquisadora de Pós-doutorado do Núcleo de Estudos da

Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP).

Lattes: http://lattes.cnpq.br/3990594434455024

Coordenadora Profa. Dra. Maria Gorete de Jesus Marques

Pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV/USP). Doutora em

Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação do Departamento de Sociologia da

Universidade de São Paulo (FFLCH-USP). Mestre em Sociologia pela Universidade

de São Paulo (USP). Especialista em Direitos Humanos pela Faculdade de Direito

da USP. Licenciada e Graduada em Ciências Sociais pela Faculdade de Filosofia,

Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH/USP). Lattes:

http://lattes.cnpq.br/3277182968137071

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Trabalhos:

1. OS DISCURSOS SOBRE A POLÍTICA DE DROGAS NO JULGAMENTO DO RECURSO

EXTRAORDINÁRIO 635.659

Autora: Ana Carolina de Paula Silva

Resumo:

A atual política de drogas, de caráter bélico e matriz racista, foi formulada, de

acordo com o discurso implícito subjacente à criminalização das drogas, com a

finalidade de exercer um controle oficial sobre certos grupos sociais

marginalizados, notadamente os negros no Brasil, os quais foram relacionados ao

uso da maconha, então chamado fumo de angola, no início do século passado,

para suprimi-los do espaço público, embora no discurso oficial a política tenha

sido difundida como um meio de promoção da saúde e do bem-estar sociais.

Quase um século desde a opção do Estado Brasileiro pela criminalização das

drogas, o quadro pintado pela aplicação da atual política pública, sobretudo na

conformação delineada pela Lei nº 11.343/2006, desenha-se com a ineficácia da

medida na prevenção do uso de drogas, com o encarceramento da população

jovem, pobre e negra, grupo no qual tem se destacado as mulheres pobres, cujas

taxas de encarceramento têm crescido em número muito superior às dos

homens.

Além disso, ao contrário do que esperavam alguns criminólogos e juristas durante

a vacatio legis, a atual legislação não tem impedido o encarceramento de

usuários de drogas, que tiveram a conduta despenalizada, mas não

descriminalizada pela lei de drogas. Muitas são as prisões fundamentadas em

pequena quantidade de drogas, que não afastaria a possibilidade de porte para

uso, mas que tem ocasionado a prisão e a consequente condenação dessas

pessoas de acordo com suas circunstâncias pessoais, expressando a seletividade

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na aplicação da política, mas sobretudo em decorrência dos testemunhos

policiais.

Foi em um desses casos, enquadrado no panorama geral acima expresso, que a

Defensoria Pública do Estado de São Paulo interpôs o Recurso Extraordinário

635.659, que questiona perante o Supremo Tribunal Federal a

constitucionalidade do artigo 28, caput e parágrafo 1º da Lei de Drogas, que

criminaliza o porte de drogas e o respectivo plantio para uso pessoal. Assim,

chama-se a Corte a discutir a compatibilização entre a política pública e os

direitos humanos.

Dentre os onze ministros, somente três deles já proferiram votos, tendo o

recurso sido submetido à sistemática da repercussão geral, diante da notável

repercussão da matéria. A análise dos votos dos ministros que se manifestaram

até o momento compreende verdadeira análise do discurso que explicita a

concepção de cada um dos ministros acerca do modo de aplicação da política

criminal de drogas, sua eficácia ou desajuste e o modo como interpretam o papel

da Corte na eventual alteração da política.

Ante o exposto, através do método de pesquisa bibliográfico, por meio da análise

de livros e artigos científicos, o objetivo central do presente artigo científico será

analisar os votos já prolatados, as concepções que expressam acerca da atual

política de drogas, a relação de suas visões com estudos criminológicos sobre esta

política e as proposições que fizeram em seus votos, relacionadas principalmente

com a fixação de critérios objetivos para distinguir tráfico e consumo de drogas.

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2. O DISCURSO LEI E ORDEM E A REPRESSÃO AOS MOVIMENTOS SOCIAIS E

ATIVISTAS DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL

Autora: Ana Carolina de Sá Juzo

Coautora: Mariana Pinto Zoccal

Resumo:

Os aportes do discurso de Lei e Ordem, movimento de política criminal

estadunidense, tornaram-se a base argumentativa da política de segurança

pública brasileira, que cotidianamente se torna mais repressiva e expansiva do

Direito Penal. Este movimento surge nos anos oitenta, depositando toda a

expectativa da segurança pública no recrudescimento da pena.

Partindo dos preceitos existentes na “teoria da janela quebrada”, entendia-se

que quaisquer desvios mantidos impunes representariam um espaço para uma

expansão imensurável da criminalidade. Assim, ainda que se tratasse de um

delito insignificante, o desviante deveria ser punido exemplarmente para que a

função intimidadora da pena se fizesse notável.

Após mais de três décadas, tal discurso de recrudescimento penal ainda

compreende a política de segurança pública adotada pelo governo norte

americano, e nos últimos anos, também pelo Brasil. Desde a esfera municipal até

a federal, o governo brasileiro encontra no discurso de Lei e Ordem uma forma

de angariar votos e de manter os poderes políticos e de controle social.

Este movimento é sustentado por um aparato policialesco repressivo, em que o

Estado usa da força para reprimir condutas praticadas por determinados

indivíduos, que são tratados diferentemente, em uma verdadeira aplicação de

um direito penal do inimigo.

O uso de uma repressão totalitária, sob o pretexto de frear a criminalidade e

alcançar a paz social é antigo e tem por objetivos precípuos a contenção de

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insurgências populares e a manutenção do injusto panorama de exclusão social

vigente.

Foi o que aconteceu com as rebeliões de escravos, as quais ao invés de

manifestações políticas sempre foram chamadas de fatos criminosos. A mesma

justificativa também ocorreu na ocupação das favelas no Rio de Janeiro, com o

anseio de ocupar, controlar e marginalizar ainda mais tais comunidades, calando

ativistas e moradores que fossem contra a ocupação policial.

No mesmo sentido, os ideais da Lei e Ordem vêm sendo utilizados para legitimar

a marginalização de condutas, recrudescer penas, estigmatizar líderes de

movimentos sociais e taxá-los como os principais causadores da insegurança,

impedindo a mobilização de atos que contrariem os interesses de classes

hegemônicas.

Os movimentos sociais que reivindicam pautas críticas e com um viés contrário

ao adotado pela política de segurança pública atual passam a figurar como

vítimas de um processo de criminalização, que é gestado em âmbito dos poderes

Executivo, Legislativo e Judiciário.

Tal processo é comumente verificado em face de ativistas de direitos humanos,

os quais, ao denunciarem à política segurança pública adotada, passam a

representar uma ameaça ao movimento de Lei e Ordem, devendo ser

neutralizados e combatidos.

Partindo destas premissas, o presente trabalho pretende analisar e apontar como

o discurso de Lei e Ordem, que embora represente um exorbitante gasto público

e não disponha de resultados que demonstrem a queda nos índices de

criminalidade, pode se mostrar eficaz ao reproduzir violências, violar direitos

humanos, marginalizar condutas e criminalizar movimentos sociais, fazendo uso

de um método seletivo e discriminatório de manutenção de poder.

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3. ORDEM PÚBLICA NA FRONTEIRA: UMA LEITURA DA ATUAÇÃO DA POLÍCIA

MILITAR NA REGIÃO DO OIAPOQUE

Autor: Alexandre Marcondys Ribeiro Portilho

Coautora: Eliane Superti

Resumo:

Este estudo tem por locus o espaço fronteiriço situado no Município de

Oiapoque, norte do Estado do Amapá, fronteira com o departamento francês das

Guianas, considerando acordos recentes celebrados entre o Brasil e a França no

sentido de autorizar a entrada de pessoas em ambos os territórios seguindo

algumas regras. O objeto da pesquisa é a violência produzida pela atuação da

força policial militar levando em consideração o trânsito de nacionais e

estrangeiros.

O objetivo geral da pesquisa é analisar os elementos que compõem a atuação da

Polícia Militar no Município de Oiapoque evidenciando uma possível

institucionalização da violência. Constituem objetivos específicos do trabalho: i.

Analisar o funcionamento da atividade fim exercida pela corporação militar,

levando em consideração o Procedimento Operacional Padrão –POP, da força; ii.

Levantar relatos de violência praticados por policiais militares no uso de suas

funções, tendo como referência os anos de 2011 a 2016; iii. Analisar a opinião

dos moradores da cidade de Oiapoque acerca da atividade policial militar.

A respeito da metodologia a ser adota durante a pesquisa, considerando o duplo

viés de análise do objeto, há necessidade do emprego de fases distintas na coleta

de dados e produção escrita: quanto aos dados da força policial militar, serão

requeridos ao Comando do 12º Batalhão de Polícia Militar as informações acerca

do quantitativo de homens disponíveis na região, progressão de permanência e

“baixa” para a capital do estado, esquema regular da escala de trabalho e canais

de atendimento à população; será realizado o levantamento dos documentos

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que regulam a atividade policial e os relatórios apresentados aos órgãos de

controle, em especial aos departamentos do Governo Federal que mantém

programas na região a exemplo da Estratégia Nacional de Fronteira (ENAFRON)

e Programa Calha Norte, ambos do Ministério da Defesa.

Ainda a respeito da visão dos policiais, serão aplicados instrumento de

verificação, por meio de entrevistas aos comandantes de companhia e

responsáveis pelas guarnições acerca das percepções sobre suas atividades, em

especial àquelas que exigem além do pronto atendimento, uma tomada de

decisão rápida. A respeito do levantamento de dados sociais, será realizada

análise da bibliografia sobre as questões sociais na fronteira Amapá/Guiana

Francesa, verificação do trato com a percepção dos moradores parte do

levantamento junto à Corregedoria Policial Militar e Ministério Público, os

procedimentos de verificação da conduta dos militares no atendimento à

população e análise dos eventos noticiados na mídia local sobre violência

praticada por militares estaduais.

4. MEDO DO CRIME E A EROSÃO DO MODELO LIBERAL DE DIREITO PENAL: A

DERIVA A UM DIREITO PENAL SECURITÁRIO

Autor: Eduardo Bolsoni Riboli

Resumo:

A pesquisa tem por escopo a análise aprofundada do fenômeno do medo do

crime, a sua transposição à esfera jurídica e as suas repercussões na política

criminal e no Direito Penal. Demonstrar-se-á como o medo do crime adentra as

esferas política e jurídica – através do fenômeno da Ouroboros discursiva do

medo do crime e do populismo penal – e as principais distorções provocadas pelo

medo nas estruturas do modelo liberal de direito penal, mormente na função do

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direito penal e nas finalidades da pena. Verificar-se-á que o medo do crime

modifica o paradigma liberal através da aposta em um direito penal securitário

(e simbólico) como resposta aos medos sociais e aos anseios da população por

segurança.

Embora o sentimento de medo do crime possa ser constatado em diversas

sociedades, podemos afirmar que no Brasil ainda se trata de um fenômeno não

muito bem compreendido. É inegável a importância da contribuição de autores

como Batista (2003), Pastana (2005), Wermuth (2010, 2011), Andrade (2010,

2012), Borges (2011) e Rauter (2017) ao estudo do tema, porém é comum que,

ao versar sobre esta temática, diversos pesquisadores tendam a realizar uma

limitada relação do medo do crime ao capitalismo e aos meios de comunicação,

também com alguma analogia à cultura do medo cunhada por Glassner (2003)

em referência a outras matérias não diretamente relacionadas à criminologia ou

ao direito penal. Ao reduzirmos o problema a tais prismas, esquecemos a

complexidade e a multiface do medo do crime. Pese embora contribuam para o

surgimento e a intensificação de algumas variáveis do medo do crime, o

capitalismo e a mídia não são os elementos fundamentais que dão origem a este

fenômeno, consoante bem observado por Lee (2007, p. 190-192). Propomos,

portanto, a necessária perscrutação do medo do crime, a partir de uma

perspectiva psicológica (JACKSON, 2006, 2005) em que emoção e cognição

operam em conjunto, mediante diferentes variáveis individuais, contextuais e

discursivas, para o surgimento ou intensificação deste fenômeno (FARRALL;

JACKSON; GRAY, 2009; HALE, 1996; SKOGAN, 1993, 1999).

O medo do crime molda, em não raros casos, a legislação penal, o entendimento

jurisprudencial e a política criminal brasileira, distorcendo e até mesmo

eliminando direitos e garantias fundamentais daqueles que são alvo da

persecução penal, com tendência a propagar a seletividade do direito penal.

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Devido à complexidade do tema, a investigação reclama uma abordagem multi e

interdisciplinar para estabelecer a sua base teórica, a partir da Criminologia até

chegar às suas influências na aplicação do Direito, valendo-se, para tanto, de

estudos teóricos e empíricos também de áreas como a Psicologia, a Medicina, a

Sociologia, a Geografia e a Arquitetura. Examinar-se-ão, também, os principais

exemplos legislativos penais e os julgados – brasileiros e europeus – que sofreram

algum tipo de influência do medo do crime em sua fundamentação, com especial

destaque para, porém não se limitando a, os casos relativos aos últimos 10 anos.

Trata-se de uma pesquisa básica, exploratória, descritiva e explicativa, efetuada

a partir de fontes bibliográficas e documentais.

5. CRIMES SEXUAIS EM REGIÕES DE FRONTEIRA: O CASO FRANCO-BRASILEIRO

Autor: Felipe Salorran Trindade Tourinho

Resumo:

O hodierno trabalho apresenta um estudo específico que trata dos crimes contra

a dignidade sexual mais frequentes em regiões de fronteira. Para tanto,

trabalhamos com a fronteira franco-brasileira, localizada no extremo norte do

Brasil, compreendendo o município de Oiapoque (estado do Amapá) e a Guiana

Francesa, departamento ultramarino da França, localizado na costa atlântica da

América do Sul. O interesse pela região de fronteira veio das constantes

ocorrências de conflitos nesses locais, envolvendo, dentre outros, comércio ilegal

e, em grande escala, atentados sexuais. Como problemas, questionamos que,

mesmo no caso de crimes de ação penal sendo incondicionada, presentes no

Título VI do Código Penal, quais justificativas ainda bloqueiam a ação das pessoas

a representarem nos casos frequentemente existentes, aumentando, dessa

forma, a cifra oculta e o índice de criminalidade contra uma parcela da população

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direta (vítima) e outra indiretamente (familiares e próximos)? E de que forma

outras ferramentas estatais podem ser mais eficientes ao alcance da população,

extirpando a espécie de assentimento que existe entre jovens, visando garantir o

que dispõe nossa legislação penal? Em vista de fomentar o debate apresentado,

apresentamos como suporte teórico-metodológico pesquisa bibliográfica e de

campo, pautada esta na observação direta, de natureza qualitativa, cujo emprego

para a compreensão de fenômenos caracterizados por um alto grau de

complexidade interna é fundamental, e nas discussões de OLIVEIRA (2011);

BELLENZANI, R; BLESSA, C; PAIVA, V. (2008); SANTOS (1993), que tratam das

relações de fronteiras, explanando também, representações sociais e a entrada

e saída de brasileiros e estrangeiros em/de ambos os lados; BITENCOURT (2017),

FERRI (2014), SANTOS (2014), GOMES (2017), que contribuem com os apanhados

em linhas jurídico-criminais, assim como o trato com o mote da violência social e

do poder, nessa ordem, além ainda da DECLARAÇÃO UNIVERSAL DE DIREITO

HUMANOS (1948). Com base nos resultados parciais, constatamos a deterioração

jurídica e social de parcela de um povo distinguido, hoje, mais ainda, como

partícipe de uma possível “descriminalização” do que tipificam alguns artigos do

Código. As ferramentas que existem para que as denúncias sejam feitas ainda

não suprem na totalidade a carência de mecanismos de que a população

necessita, assim como falta maior contribuição da mesma população no intuito

de inibir e/ou erradicar essa prática.

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6. CRIMINOLOGIA E MOVIMENTOS SOCIAIS: A PARTICIPAÇÃO DA SOCIEDADE CIVIL

NAS POLÍTICAS DE SEGURANÇA E DE DIREITOS HUMANOS DOS CONSELHOS

NACIONAIS

Autor: Fernando L. C. Antunes

Resumo:

Este trabalho analisa, com estratégias metodológicas empíricas e qualitativas, a

participação dos movimentos sociais e de entidades da sociedade civil na 1ª

Conferência Nacional de Segurança Pública (1ª Conseg), no Conselho Nacional de

Segurança Pública (CONASP) e no Conselho Nacional de Direitos Humanos

(CNDH), no período de 2009 a 2016, que consistem em experiências e espaços

públicos de formulação de políticas de segurança e de direitos humanos no Brasil.

Trata-se de um estudo interdisciplinar, que articula referencias nas áreas jurídica,

na ciência política e na sociologia, e considera prioritariamente: a) as

criminologias críticas, o paradigma da reação social e as problematizações acerca

da seletividade dos processos de criminalização e das tendências de políticas

criminais, bem como as transformações nas políticas nacionais de segurança

pública; b) as teorias democráticas participativas e deliberativas e a construção

da ação coletiva e política na sociedade civil; c) o surgimento de arranjos ou

experiências e espaços de participação social nas políticas públicas brasileiras,

como são exemplos os Conselhos, as Conferências nacionais, as instituições

participativas de segurança públicas (IPs) e as redes sociais de governança

democrática formadas nesses processos; d) a configuração, atuação,

institucionalização e os principais elementos da participação política dos

movimentos sociais e da sociedade civil. Inicialmente a pesquisa aborda os

resultados e a atuação desses grupos no processo participativo da 1ª Conseg em

2009. Em seguida, investiga os desdobramentos da reestruturação democrática

do CONASP, como resultado da 1ª Conseg, em 2009, e da reformulação do CNDH,

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promovida pela Lei nº 12.986, de 2 de junho de 2014. As fontes documentais e

empíricas consistem nas atas das reuniões, nos atos normativos desses

Conselhos nacionais e nos dados obtidos de 26 entrevistas, sendo 15 com

membros do CONASP, e 11 com integrantes do CNDH, de segmentos da

sociedade civil, de profissionais de segurança e de gestores públicos.

Posteriormente, o trabalho efetua uma análise institucional comparada entre o

CONASP e o CNDH, visando aferir potenciais e limitações nos arranjos

participativos e deliberativos criados nesses Conselhos. Essa análise institucional

comparada, associada ao exame das fontes documentais, empíricas e das

entrevistas com membros do CONASP e do CNDH, no período de 2009 a 2016,

permitiram identificar os repertórios de ação, as reivindicações, as redes sociais

formadas e a agenda política dos movimentos sociais e de entidades da

sociedade civil para a questão criminal, o campo da segurança pública e dos

direitos humanos. Ainda que os Conselhos Nacionais examinados careçam de

maior efetividade, de ampliação da autonomia e de aprimoramentos

institucionais para influenciar nas políticas públicas, os movimentos sociais e as

entidades da sociedade civil atuam nesses espaços públicos participativos

problematizando as distorções dos processos de criminalização e da violência

institucional do Estado, contribuindo para democratizar e redimensionar o

conceito, as políticas e as práticas de segurança, em parâmetros de proteção de

direitos e em sintonia com demandas de grupos vulneráveis, como são exemplos

segmentos que desenvolvem ações de promoção e proteção de direitos nas

relações raciais, de gênero, de indígenas, da população em situação de rua, entre

outros.

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7. O "CHEQUE EM BRANCO" NA SEGURANÇA PÚBLICA DO RIO DE JANEIRO: UM

RELATO SOBRE A BANALIDADE DO MAL

Autor: Yanahê Fendeler Höelz

Resumo:

O objetivo desta proposta de trabalho é apresentar algumas ações destinadas ao

campo da segurança pública do Rio de Janeiro e refletir como elas repercutem

no “mandato policial” (MUNIZ; PROENÇA JUNIOR, 2014). Toma-se como

referencial teórico-metodológico Hannah Arendt, em especial, seu trabalho

sobre o julgamento de Adolf Eichmann em Jerusalém, no qual a autora constatou

a “banalidade do mal”.

Considerado um dos maiores criminosos do regime nazista (1933-1945), Adolf

Eichmann se via como um aplicado funcionário do Estado alemão, cumpridor das

ordens de Hitler (Führer da Alemanha nazista) e obediente ao seu papel na

deportação de judeus para os campos de extermínio nazistas. Hannah Arendt fez

a cobertura do julgamento de Eichmann em Jerusalém, em 1961, para a revista

The New Yorker. O que marca a análise de Arendt é o seu olhar para o acusado.

A autora se esforça para retratar o julgamento a partir da compreensão do

“outro”, sob a perspectiva do “outro”. Ao contrário do que se podia esperar,

Arendt descreve o acusado como um burocrata medíocre, um cumpridor de

ordens, um indivíduo sem qualquer anomalia psicológica, um homem “normal”

que sequer tinha a capacidade de mensurar o mal praticado, um ser imerso e ao

mesmo tempo distante da realidade. O olhar de Arendt sobre aquele julgamento

identificou a banalidade do mal, “o fato de que ele [o mal] só se torna imenso

quando se torna banal e, por isso, compartilhado por muitos” (BRESSER-PEREIRA,

2013). Eichmann simplesmente nunca percebeu o que estava fazendo, constatou

Hannah Arendt (1999).

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Como a irreflexão de Eichmann, que revela um mal tão banal, se manifesta no

contexto da segurança pública do Rio de Janeiro? De que maneira o mal,

compreendido como uma violência contra um “outro”, é reproduzido neste

campo? Quais são os efeitos das políticas destinadas à segurança pública no

cotidiano dos policiais militares e da população por eles atendida? São esses os

questionamentos que motivam a abordagem deste trabalho, considerando,

ainda, a atual conjuntura de Intervenção Federal, tornando a reflexão atual e

pertinente ao Grupo de Trabalho indicado (GT 7).

Para tanto, o trabalho relembra o relato de Arendt sobre o referido julgamento

e apresenta as três “soluções” implementadas pelo regime nazista a respeito da

“questão judaica”, abrindo espaço para a reflexão das possíveis permanências

dessas medidas, sob roupagem diversa, no cenário carioca. Em seguida, o

trabalho faz um breve panorama sobre políticas destinadas ao campo da

segurança pública (pós/1980), considerando a atual conjuntura de Intervenção

Federal. Por fim, o estudo abre espaço para a discussão sobre as competências

distintas da Polícia Militar e do Exército e como a confusão de significados,

presente nas intervenções políticas na segurança pública, pode afetar o mandato

policial e comprometer as respectivas capacidades das instituições. A reflexão

aponta que esse cenário opaco favorece medidas irrefletidas e que, portanto,

pode banalizar cada vez mais o mal.

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8. TRÁFICO DE DROGAS: SELETIVIDADE COMO REGRA E JURIDICIDADE COMO

EXCEÇÃO

Autor: Pedro Machado de Melo Romano

Coautor: Bráulio Alves Figueiredo Dias

Resumo:

O presente trabalho visa confrontar a questão da seletividade do sistema de

justiça criminal no que se refere à repressão às drogas, de um lado, e a

dialeticidade do discurso jurídico que permitiria a construção de uma

objetividade necessária à existência do direito e da justiça, do outro. Por uma

metodologia que compare os dados estatísticos coletados na pesquisa do Centro

de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública (CRISP) intitulada, "Audiência

de custódia: um panorama" relacionados aos flagrantes por tráfico de drogas

ocorridos em Belo Horizonte/MG, no período que engloba Setembro de 2015 a

Março de 2016, com a análise de conteúdo da sustentação oral realizada por um

advogado em um caso específico de processo penal em que o acusado por tráfico

de drogas foi sentenciado positivamente, essa temática será desenvolvida. Esse

recurso metodológico comparativo entre as estatísticas e um caso concreto, será

manejado com o objetivo de testar a hipótese de pesquisa de que o tratamento

hierarquizado e seletivo do sistema de justiça criminal na repressão às drogas é

a regra, ao passo que a discussão jurídica em sua dialeticidade supostamente

asseguradora dos direitos e garantias fundamentais do incriminado, é a exceção.

Diante deste desenho metodológico, o marco teórico também descreverá a

dicotomia teórica da relação entre direito e sociedade, representada de um lado

por teorias que deslegitimam a neutralidade jurídica, especificamente as teses

foucaultianas do poder e da função da pena, a sociologia bourdieusiana acerca

do campo jurídico e a teoria criminológica do labeling approach, e do outro a

dialeticidade habermasiana da comunicação e da construção de uma síntese

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objetiva que seja capaz de reificar subjetivismos e assim constituir a base do

direito e da justiça. Este resumo se adequa melhor à temática do GT 7,

"Segurança Pública e Seletividades", pois este trabalho tem como hipótese de

pesquisa justamente a seletividade penal no combate ao tráfico de drogas, em

dissonância ao discurso jurídico formal de igualdade de todos perante a lei. A

seletividade como regra, e a justiça como exceção, verificadas empiricamente

pelo método comparativo sincrético, qualitativo e quantitativo, se situam no

âmbito de significação do perfil seletivo do sistema quando da repressão às

drogas, em detrimento do discurso jurídico de igualdade.

9. PARA ALÉM DA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: ANÁLISE DOS MECANISMOS DE

SILENCIAMENTO DA VIOLÊNCIA POLICIAL A PARTIR DA SELETIVIDADE DO SISTEMA

DE JUSTIÇA CRIMINAL

Autor: Vinicius De Souza Assumpção

Coautora: Camila Ribeiro Hernandes

Resumo:

A realidade histórico-social brasileira é marcada por uma exclusão hiperbólica

ancorada no “preconceito de marca” (NOGUEIRA, 2006), que se utiliza de

diversas ferramentas para a manutenção dos grupos hegemônicos no poder. O

sistema de justiça criminal é exatamente (e apenas) um dos instrumentos de

controle social de grupos etiquetados (MOLINA, 2003, p. 1192-1193; ZAFFARONI,

2014, p. 18; 70-82), construído a partir do desejo de contenção e se manifestando

na gestão diuturna do corpo negro neste país, manejando pessoas, memórias e

identidades, confirmando a existência de um sistema racista, que “é o fiel da

balança que determina a continuidade da vida ou a morte das pessoas”

(FLAUZINA, 2006, p. 12).

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A análise das estruturas formais do sistema de justiça criminal precisa ser feita a

partir de uma perspectiva decolonial, viabilizando-se o debate crítico e a

discussão sobre a renovação das formas de opressão. O debate sobre as

inaceitáveis taxas de encarceramento, notadamente aquelas atreladas ao que

Zaffaroni designa por “sistema penal cautelar”, típico da América Latina (2015, p.

111) precisa ser feito considerando que a ausência de rupturas nas transições

histórico-sociais brasileiras emana reflexos diretos sobre o Direito Processual

Penal (CASARA; MELCHIOR, 2013, p. 12-20). Nesse contexto, a idealização das

Audiências de Custódia (cf. Nicory, 2017, p. 21) como um instrumento de redução

do encarceramento provisório (GIACOMOLLI, 2017, p. 473; MAISE, 2015, p. 83) e

recuperação de um espaço de humanização da avaliação da legalidade das

prisões em flagrante e possibilidade de controle da violência policial tem se

revelado insuficiente, à medida em que as estruturas formais não são suficientes

para romper com as tradicionais maneira de silenciamento dos abusos

historicamente praticados nesse contexto de abordagem policial-apreciação da

legalidade da prisão-efetivação do cárcere provisório.

Em estudo restrito à cidade de Salvador foi possível observar “o descumprimento

da finalidade da audiência de custódia, entendida como instrumento de possível

reparação de violência sofrida nos momentos que circundam a prisão em

flagrante e de prevenção de novos atos violentos” (ROMÃO, 2017, p. 18). Em

âmbito nacional, Ballestros adverte sobre a preocupação da falta de registros em

relação as ocorrências de violência policial: apenas em 5,27% das audiências de

custódia realizadas até 14 de julho de 2016 no Brasil contaram com alegações

dessa natureza (2016, p. 29). É indispensável compreender os mecanismos que

têm permitido a perpetuação das violências institucionais que atingem os

mesmos grupos historicamente vulnerabilizados, sendo possível apresentar

como hipótese que o não enfrentamento do racismo como de maneira um

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problema que demanda políticas públicas transversais (e, portanto, também de

justiça criminal) (CARNEIRO, 2011), tem como consequência natural a não

consecução dos objetivos declarados das medidas alternativas ao cárcere

reiteradamente propostas nos últimos anos.

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GRUPO DE TRABALHO 8:

GÊNERO, SEXUALIDADE E RELAÇÕES RACIAIS NA JUSTIÇA CRIMINAL

Ementa: O tema das diferenças e desigualdades no exercício dos direitos e na

vivência da violência tem ganhado cada vez mais espaço nos estudos sobre

direito e justiça criminal. Este GT visa debater movimentos por conquistas de

direitos, o papel do direito e da justiça penal no enfrentamento das

desigualdades estruturais, as desigualdades vivenciadas pelos sujeitos

subalternizados no acesso à justiça e aos direitos. Serão também aceitos

trabalhos sobre políticas de enfrentamento à violência, machismo, homofobia e

racismo, quer analisem políticas públicas, decisões judiciais ou ativismo por

direitos.

Coordenadora Profa. Dra. Ana Paula Portella

Doutora em Sociologia, pela Universidade Federal de Pernambuco (2014), mestra

em Saúde Pública (2008), pelo Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães/Fiocruz,

Recife-PE. e possui graduação em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica

de Campinas (1984). Atualmente realiza pesquisa de pós-doutorado no Programa

de Pós-Graduação em Sociologia da UFPE. É pesquisadora do Núcleo de Estudos

sobre Políticas Públicas de Segurança da UFPE, consultora autônoma para o

desenvolvimento e monitoramento de projetos e políticas públicas nas áreas de

gênero, direitos sexuais e reprodutivos, violência contra as mulheres e segurança

pública. Lattes: http://lattes.cnpq.br/5980874439920183

Coordenadora Profa. Dra. Thaís Janaina Wenczenovicz

Docente adjunta/pesquisador sênior da Universidade Estadual do Rio Grande do

Sul/UERGS. Professora Titular no Programa de Pós-Graduação em

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Educação/UERGS. Professora Colaboradora no Programa de Pós-graduação

Stricto Sensu em Educação da Universidade Estadual do Paraná- UNIOESTE.

Professora colaboradora no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em

Direitos Fundamentais/UNOESC. Avaliadora do INEP - BNI ENADE/MEC. Membro

do Comitê Internacional Global Alliance on Media and Gender (GAMAG) -

UNESCO. Líder do Grupo de Pesquisa CNPq/UERGS Direitos Humanos e Justiça:

perspectivas decoloniais. Lattes: http://lattes.cnpq.br/1843525898014532

Coordenadora Prof. Dra Thula Pires

Professora-adjunta de Direito Constitucional do Departamento de Direito da

PUC-Rio. Coordenadora do NIREMA (Núcleo Interdisciplinar de Reflexão e

Memória Afrodescendente. Coordenadora Geral do Projeto Cartas do Cárcere

(ONSP/PNUD). Lattes: http://lattes.cnpq.br/7917887243582797

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Trabalhos:

1. A POLÍTICA NACIONAL DE ENFRENTAMENTO AO TRÁFICO DE PESSOAS E AS

OBRIGAÇÕES INTERNACIONAIS DO BRASIL

Autora: Ana Clara Toscano Aranha Pereira

Resumo:

O presente artigo objetiva discutir, a relação entre o tráfico de mulheres, a

realidade econômica e social das mulheres na sociedade contemporânea e as

graves violações dos Direitos Humanos e Fundamentais das mulheres,

considerando o contexto da Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de

Pessoas do Brasil e, a legislação nacional e internacional acerca do tema. O

problema central enfrentado é a verificação se o aparato jurídico brasileiro e

internacional, as políticas de prevenção e enfrentamento, o desempenho de

autoridades policiais, a atuação do judiciário nacional e dos Sistemas

Internacional e Interamericano de Proteção aos Direitos Humanos, as

recomendações dos Comitês Internacionais e os estudos e pesquisas acerca do

tráfico de mulheres, conseguiram ser eficazes em conter e combater o tráfico

interno e internacional de pessoas. Analisando o aparato jurídico brasileiro e

internacional, as políticas de prevenção e enfrentamento e dos estudos acerca

do tráfico de mulheres, questiona-se o fato de que apesar de positivas,

transformadoras e garantidoras de direitos que essas legislações e políticas

sejam, se elas por si só garantiriam o enfrentamento efetivo e,

consequentemente, a eliminação efetiva do tráfico de mulheres, atividade essa

violadora dos direitos humanos e fundamentais das mulheres. Por fim,

questiona-se também, se a opressão de gênero e a violação dos Direitos

Humanos das Mulheres são alicerces na preservação do tráfico de pessoa como

o terceiro maior mercado do crime organizado do mundo.

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2. A LEI N. 13.641/2018 E A CRIMINALIZAÇÃO DO DESCUMPRIMENTO DAS

MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA PREVISTAS PELA LEI MARIA DA PENHA: UMA

ANÁLISE CRÍTICA

Autora: Ana Paula Bimbato de Araújo Braga

Coautora: Marina Carvalho Marcelli Ruzzi

Resumo:

A aprovação da Lei nº 13.641/2018, que criminalizou o descumprimento das

medidas protetivas de urgência previstas na Lei n. 11.340/2006 (“Maria da

Penha”) foi celebrada por movimentos sociais como instrumento capaz de

reforçar seu cumprimento, bem como capaz de reconhecer a violência presente

neste ato. Entretanto, convém explorar de que maneira o direito penal oferece

resposta adequada à conquista de direitos das mulheres.

O presente artigo busca analisar criticamente o dispositivo, cuja metodologia é a

revisão bibliográfica pautada em teorias da criminologia crítica e feminista, sob a

ótica do direito penal mínimo e da violência de gênero. Assim, verifica-se que a

proposta está alinhada com o recorte previsto pelo GT-8.

Os embates entre a criminologia crítica e a feminista já foram abordados pela

literatura jurídica nacional. Acusadas de insistir em um sistema penal punitivista,

as feministas sofreram ataques por parte da criminologia crítica, especialmente

diante de um quadro de inegável encarceramento em massa, que seria

incompatível com a criação de mais tipos penais (CAMPOS; CARVALHO, 2011).

O já existente tipo previsto no art. 359 do CP, da desobediência de decisão judicial

sobre perda ou suspensão de direito, com pena prevista igual à do crime em tela,

poderia sugerir que a criação do novo tipo seria desnecessário e com pitadas de

populismo penal, especialmente diante do levante feminista experimentado nos

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últimos anos. Assim, a criminalização se apresentaria como uma resposta

simplista, mas esperada pela sociedade para a solução de um grave problema

social (MONTENEGRO, 2015). Ademais, o descumprimento da medida protetiva

de urgência já admite a previsão de encarceramento através da prisão preventiva

(art. 20, Lei 11.340/2006), resultado que não será obtido com a condenação pelo

novo tipo criado.

Na contramão, porém, vislumbram-se motivos para reconhecer a importância do

dispositivo, ainda mais quando se adentra nas particularidades da violência de

gênero. Quanto a este ponto, a Lei Maria da Penha deve ser interpretada

conforme “os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições

peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar” (art. 4º).

Seria incompatível não analisar a lei de forma comprometida.

O reconhecimento que o Estado confere ao instituto das medidas protetivas, que

nesse momento se tornam um bem jurídico tutelado pelo direito penal, está em

conformidade com os compromissos assumidos com a Convenção Belém do

Pará. Assim, a tipificação do descumprimento das medidas protetivas viria ao

reforço do chamado direito penal simbólico, como uma manifestação da

sociedade em repúdio a condutas que colocam a mulher em risco de sofrer novas

violências (ANJOS, 2006).

Por fim, com a edição da Lei 13.641/2018, está encerrada qualquer discussão

acadêmica ou jurisprudencial acerca da atipicidade da conduta de

descumprimento das medidas protetivas de urgência1, ou a qual tipo penal

pertenceria (artigo 3302 ou 3593 do CP). A Lei também pacifica o entendimento

de que o crime estará caracterizado independentemente da natureza da medida

protetiva descumprida ser cível ou criminal (art. 24-A, §1º), trazendo maior

segurança jurídica ao ordenamento brasileiro.

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3. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E JUSTIÇA RESTAURATIVA: UM DIÁLOGO POSSÍVEL

Autor: Cláudio Daniel de Souza

Coautora: Laís Gorski

Coautora: Tamires de Oliveira Garcia

Resumo:

O presente escrito apresenta uma análise sobre a violência de gênero no

contexto brasileiro, em especial no âmbito doméstico, e sua forma de tratamento

por meio da legislação. Feito isso, propõe-se um debate sobre a possibilidade de

enfrentamento a essa endêmica forma de violência por meio de experiências de

Justiça Restaurativa. Para isso, é realizada uma revisão bibliográfica que engloba

os temas e análise documental como forma de enriquecer o estudo, por meio da

articulação com recentes pesquisas desenvolvidas junto ao sistema de justiça.

Tem-se por objetivo i) explorar diferentes formas de administração e resolução

dos conflitos envolvendo a violência doméstica não somente a partir da

perspectiva da punição do agressor; e ii) compreender outras propostas de

enfrentamento ao histórico problema social que cerca a temática. É nesse

sentido que além de apresentar o panorama teórico em torno do

desenvolvimento da legislação sobre violência doméstica no país, que culminou

na promulgação da Lei Maria da Penha e das questões pertinentes sobre Justiça

Restaurativa, essa investigação propõe reflexões de um cenário jurídico para

além do tratamento criminal dado a cada caso específico, problematizando como

a arquitetura de um sistema estruturado a partir de uma lei que já completou

mais de dez anos em vigor pode transpor as lacunas deixadas pelo punitivismo e

abarcar a garantia dos direitos de mulheres violadas. O estudo indica que as

lógicas adotadas pelo estado tratam de maneira limitada o fenômeno da

violência de gênero, não conseguindo romper com o ciclo de quebra da dignidade

da pessoa humana. Além disso, a partir da análise de experiências e dados, é

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possível concluir por uma necessária reformulação dos mecanismos de resolução

da questão, conclusão em que a aplicabilidade do instituto da Justiça Restaurativa

pode ser vista como uma também possível solução digna, consensual e humana.

A proposta está voltada aos debates do grupo de trabalho de número 8 em

função do claro recorte de gênero no escopo do estudo, bem como a partir da

análise de um instituto específico como forma de composição de conflitos, tendo

a Justiça Restaurativa tomado cada vez mais espaço na agenda de políticas na

seara penal.

4. DA SUBVERSÃO DOS CORPOS À VITIMIZAÇÃO DE PESSOAS TRANS NO BRASIL

Autora: Erika Aparecida Pretes

Resumo:

Desenvolveremos, a partir da vitimologia e dos estudos de gênero, uma análise

crítica sobre os padrões de violência contra pessoas trans levando em

consideração a contingência e a historicidade das normas de gênero e do

controle dos corpos. Buscamos romper com a análise que culpabiliza as pessoas

trans, e levando em consideração os significados que são atribuídos ao gênero

nessa sociedade, questionando os processos sociais por meio dos quais as

pessoas trans deixam de ser consideradas sujeitos de direitos, bem como os

processos que naturalizam sua vulnerabilidade a se tornarem vítimas (vitimização

primária). E ainda, quais são os processos institucionais que permitem a

banalização de suas demandas e a impunidade de seus agressores (vitimização

secundária). Os estudos sobre as pessoas em situação de violência, também

denominadas vítimas (nomenclatura preferida pelas mais tradicionais teorias das

ciências penais), ganham crescente relevância na contemporaneidade, apesar de

não ser um problema tão recente nos estudos de criminologia, ora que se pode

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encontrar pesquisas sobre as vítimas desde o fim da Segunda Guerra Mundial.

Pode-se afirmar que, ao longo das últimas décadas, os debates emergentes

realizados pelos movimentos sociais a respeito das violações de direitos humanos

em razão da raça, do sexo e da classe contribuíram para a modificação da

percepção das vítimas de crimes nos Sistemas Penais. Estes movimentos

evidenciaram como certas relações de poder eram fundamentais para

determinar a vulnerabilidade das mulheres, dos negros e dos pobres à

vitimização. Contudo, percebe-se que as ciências penais, em especial a

criminologia, embora aberta aos debates de determinados setores sociais, ainda

se mantêm distante das discussões realizadas pelos teóricos que lidam com as

questões sexuais e de gênero. Nesse sentido, ignora as discussões mais

aprofundadas sobre como a sexualidade e a identidade de gênero são fatores

que podem influenciar no grau de vulnerabilidade de algumas pessoas a se

tornarem vítimas de crimes específicos. Para tanto, temos como marco teórico a

obra do Michel Foucault, em especial os trabalhos em que o filósofo se dedicou

a questionar a naturalidade do sexo. Em sociedades como as nossas em que a

sexualidade e também o gênero atuam como dispositivos de poder, todas as

configurações que não alinhem sexo-gênero-sexualidade são vistas como

anormais ou abjetas. Nesse sentido, esta proposta de comunicação oral se insere

na área do GT8: Gênero, Sexualidade e Relações Raciais na Justiça Criminal, pois

busca evidenciar o gênero como um dispositivo de poder de uma ordem

normativa que impõe uma série de proibições, hierarquizações e violências em

desfavor das identidades de gênero consideradas desviantes, no sistema de

justiça criminal.

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5. ENCARCERAMENTO FEMININO POR TRÁFICO DE DROGAS NO BRASIL: A

ESTRATÉGIA NEOLIBERAL DE EXCLUSÃO E EXTERMÍNIO DAS MULHERES À

MARGEM DO SISTEMA CAPITALISTA

Autora: Franciele Silva Cardoso

Coautora: Bartira Macedo de Miranda

Coautora: Priscylla Kethellen Viana

Resumo:

Este trabalho dedica-se a identificar a origem do recente fenômeno que levou ao

aumento exponencial do encarceramento de mulheres, principalmente pobres e

negras, por tráfico de drogas no Brasil. Busca-se analisar como o projeto

capitalista neoliberal mantém os espaços de poder e de acesso à cidadania

(trabalho, habitação, saúde, escola etc.) estruturalmente desiguais em relação a

diversos marcadores sociais, tornando a prisão um destino predeterminado de

grupos historicamente excluídos da integração social.

Para possibilitar a análise, utilizou-se como marco teórico a perspectiva feminista

interseccional de Angela Y. Davis, Heleith Saffioti, Kimberle Crenshaw e Sueli

Carneiro; os estudos sobre raça no Brasil de Lélia Gonzalez e Carlos Hasenbalg;

as análises sobre proibicionismo empreendidas por Juliana Borges, Carl Hart e

Luís Carlos Valois; a produção acadêmica sobre neoliberalismo de Loïc Wacquant

e os estudos criminológicos de Rosa del Olmo e Juarez Cirino dos Santos. Como

metodologia recorreu-se a revisão bibliográfica, análise de dados e estatísticas

oficiais.

Historicamente, as conquistas de direitos pelas mulheres nos últimos anos não

atingiram a todas de forma igualitária. As que possuem mais privilégios possuem

mais direitos. Assim, mulheres da classe trabalhadora, pobres, periféricas,

negras, indígenas, transexuais, lésbicas, estrangeiras, idosas e deficientes, entre

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outros grupos desprivilegiados, têm restringidas suas possibilidades de

oportunidades e de acesso às posições de poder e de cidadania.

Atualmente, o tráfico de drogas é o principal mercado ilícito do mundo,

interligado ao tráfico de armas e de pessoas. No Brasil, a Lei nº 11.434 de 2006,

a “Lei de Drogas”, é consequência da “ideologia da diferenciação” que contribui

para a seleção das pessoas mais vulneráveis nas redes de tráfico de drogas, as

quais serão filtradas pela polícia, julgadas rigorosamente pelos juízes e destinadas

a cumprir longas penas nas prisões.

Quanto mais marginalizada a mulher, mais chances de que ela esteja

desempregada, inserida no mercado informal de trabalho ou, até mesmo,

trabalhando no mercado ilegal, como no caso das que enxergam na rede do

tráfico de drogas uma oportunidade de conciliação entre os dois tipos de

trabalho, produtivo e reprodutivo. Essas mulheres, em sua maioria, têm por

característica o fato de serem facilmente substituíveis na hierarquia deste

mercado quando presas.

Nessa situação, a opção feita pelos Estados Unidos em acabar com as drogas nos

países produtores, expõe sua incapacidade de combatê-las em seu próprio

território. E se, apesar disso, eles continuam a perpetuar esta guerra é por terem

outro alvo, que não são as drogas, mas a classe trabalhadora e a juventude latino-

americana, a população negra e os imigrantes.

Por todo o exposto, esta produção mostra-se pertinente ao tema do GT escolhido

para sua submissão, já que pretende aprofundar-se nas questões relativas às

relações entre desigualdades e violência, com o intuito de identificar as raízes do

problema apontado. Desta forma, visa contribuir com a construção de

alternativas para a superação da política de encarceramento em massa do Estado

brasileiro, fomentada pelo imperialismo norte-americano.

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6. DIREITO PENAL E DECOLONIALIDADE: REPENSANDO A CRIMINOLOGIA CRÍTICA E

O ABOLICIONISMO PENAL

Autor: Isaac Porto dos Santos

Coautora: Lívia Miranda Müller Drumond Casseres

Resumo:

O objetivo do presente trabalho é o de enxergar o direito penal como uma

consequência da colonialidade. Com isso, quer-se pensar, de um lado, que o

sistema jurídico-penal no Brasil é fruto de um processo violento de colonização.

De outro, quer-se verificar, também, como a própria criminologia crítica e o

abolicionismo penal podem fazer perpetuar elementos importantes dessa

colonialidade.

De antemão, é preciso dizer que, assim como Thula Pires entende em recente

artigo (PIRES, 2017), não se pretende, aqui, listar uma série de limitações e

incapacidades de ambos os ramos criminológicos e inviabilizar as possibilidades

de diálogo.

Antes, quer-se realizar um recentramento epistemológico, a fim de possibilitar

uma construção conjunta entre a criminologia e os saberes produzidos por

mulheres, negros/as, LGBTI+ e demais grupos subalternizados.

Assim, pretende-se se dar uma perspectiva decolonial aos estudos

criminológicos, entendendo que a conquista colonial engendra uma cultura

punitiva que continua viva em nossa sociedade. A decolonialidade, aqui, será

entendida nos termos de Ochy Curiel, para quem tal posicionamento significa

uma capacidade de reconhecer a dependência de processos culturais e políticos

resultados do capitalismo, da modernidade ocidental, da colonização europeia e

de seus processos de racialização e sexualização das relações sociais, da

heterossexualidade obrigatória e da legitimação do pensamento único. (CURIEL,

2011).

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A perspectiva decolonial, portanto, permite pensar o direito penal e os órgãos da

justiça criminal para além do argumento da seletividade penal, tendo em vista

que, como a colonialidade é integralmente impregnada, de maneira imbricada,

pelos códigos da raça, do gênero, da classe e da sexualidade, não é possível se

falar em direito penal sem enxergá-lo como um resultado, justamente, das

tensões de raça, gênero, classe e sexualidade.

Por outro lado, a metodologia decolonial também requer que se pense não

somente nos efeitos do direito penal para negros/as, mulheres, LGBTI+ e para a

classe trabalhadora, mas, também, em como o direito penal perpetua privilégios

e vantagens historicamente usufruídos por homens, brancos, heterossexuais e

proprietários (PIRES, 2017).

Com isso, pergunta-se: ao não abordarem o privilégio branco, masculino,

heterossexual e proprietário, estariam a criminologia crítica e o abolicionismo

penal fazendo perpetuar, ainda que inconscientemente, um sistema de

dominação colonizador? Teriam a criminologia crítica e o abolicionismo penal

repetido algumas fórmulas euronorcêntricas à realidade brasileira?

Obviamente, não se pretende deslegitimar nenhum dos campos criminológicos,

nem deixar de reconhecer a sua importância para a discussão de grupos

subalternizados no campo da criminologia. De fato, entender que o sistema penal

recai sobre os mais pobres, bem como enxergar as relações entre o direito penal

e o capitalismo, foram passos essenciais para a discussão criminológica

progressista.

No entanto, entender o direito penal desde uma perspectiva decolonial pode

permitir maiores possibilidades de diálogo entre a criminologia crítica, o

abolicionismo penal e os movimentos negros, feministas e LGBTI+, a partir de

conversas horizontalizadas e desierarquizadas,

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7. VIOLÊNCIA CONTRA MULHER E ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO NA

SOCIEDADE

Autor: Isael José Santana

Coautora: Jéssica Lima Zanardo

Resumo:

O fenômeno da violência doméstica praticada contra a mulher é um tema

absolutamente arcaico, que se faz presente desde muito cedo nas sociedades e

continua existente, de forma cada vez mais preocupante na realidade social. A

violência contra mulheres, de acordo com os ensinamentos de Claudia Piori

(2007 – pág.16): [...] “é qualquer conduta de discriminação, agressão ou coerção,

ocasionada pelo simples fato de a vítima ser mulher e que lhe cause dano, morte,

constrangimento, limitação, sofrimento físico, sexual, moral, psicológico, social,

político ou econômico ou perda patrimonial. [...] É uma manifestação de relações

de poder historicamente desiguais entre homens e mulheres, que conduziram à

dominação e à discriminação pelos homens e impedem o pleno avanço das

mulheres”.Nesse sentido, tendo em vista o alto índice de violência registrado em

Paranaíba – MS, elaborou-se um projeto de extensão na Universidade Estadual

de Mato Grosso do Sul – Unidade Universitária de Paranaíba denominado de

“Crimes de violência doméstica: prevenção sob a perspectiva da Justiça

Restaurativa”, o qual encontra-se em andamento e objetiva a prevenção e

informação a respeito dos crimes de violência doméstica praticados contra a

mulher.Além disso, em parceria com o curso de Psicologia da Universidade

Federal do MS, são produzidos encontros com as vítimas de violência com o

objetivo de informar e auxiliar na conscientização no que tange à garantia dos

seus direitos (objetivos e subjetivos) e no que diz respeito ao exercício dos

mesmos.No entanto, sob um olhar criminológico, levando em consideração a

cultura enraizada de opressão e submissão da figura feminina regida por um

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sistema patriarcal,percebe-se a necessidade de trabalhar não só com a vítima,

mas também com os ofensores. Nesse aspecto, a Ciência da Criminologia, de

acordo com Edwin Sutherland, (1996 – pág. 25) é o “conjunto de conhecimentos

que estudam o fenômeno e as causas da criminalidade, a personalidade do

delinquente e sua conduta delituosa e a maneira de ressocializá-lo”. Diante desta

perspectiva, elucida-se também a recuperação e conscientização do ofensor por

meio da Justiça Restaurativa, de modo a proporcionar espaços de reflexão para

os autores da violência buscando estratégias que resolvam não apenas a punição,

mas a reparação ampla do crime.Assim, contando com equipes profissionais da

área, como psicólogos, juízes, professores, assistentes sociais e com o apoio do

Tribunal de Justiça do Mato Grosso do Sul, serão proporcionados espaços de

reflexão sobre questões de gênero, igualdade de direitos e assuntos afins para os

ofensores, uma vez que o procedimento da Justiça Restaurativa visa a

possibilidade de reparação de danos, de atendimento das necessidades da vítima

e da responsabilização do ofensor, na intenção de pacificar as relações sociais.

Além disso, a aplicação desta técnica busca também oportunizar o diálogo, bem

como o reconhecimento e conscientização dos atos praticados pelo ofensor. É

importante ressaltar que o Poder Judiciário do MS fornecerá cursos de

capacitação para profissionais que atuarão na figura de facilitador restaurativo,

visando à aplicação adequada da técnica e traçando a utilização da Justiça

Restaurativa como método alternativo e complementar à Justiça Tradicional.

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8. VIOLÊNCIA SIMBÓLICA DE GÊNERO: UMA ANÁLISE DE SUAS RAÍZES HISTÓRICO-

CULTURAIS E SUA MANIFESTAÇÃO EM DECISÕES JUDICIAIS

Autor: Leonardo Abido

Resumo:

No presente estudo, analisa-se a violência de gênero ocorrente no âmbito

brasileiro, mais especificamente acerca do instituto da violência simbólica de

gênero. Através de um breve aporte histórico da violência de gênero e utilizando-

se o método de pesquisa hipotético-dedutivo, procura-se responder ao problema

de pesquisa: Há ou não, e de que maneira se manifesta, a violência simbólica de

gênero em decisões judiciais? Como forma de agregar exemplos ao trabalho e

facilitar a visualização das formas que a violência de gênero se manifesta na

sociedade contemporânea, traz-se decisões judiciais em que haveria

demonstração de preconceitos relacionados a uma violência simbólica de

gênero.

Assim, o presente trabalho estrutura-se em três partes. Inicialmente, procurou-

se estabelecer algumas definições básicas e conceituais acerca da violência de

uma maneira geral. Neste aspecto, analisou-se de uma forma ampla,

abrangendo-se as diversas formas e manifestações da violência, principalmente

visando romper a ideia de que a violência precisa ser necessariamente física para

ser considerada existente. Posteriormente, realizou-se uma análise histórica de

como a violência de gênero se instalou no Brasil, dando-se ênfase especialmente

a questão do patriarcalismo como uma das principais causas da violência de

gênero. Ainda foi realizada uma conceituação da violência de gênero, tomando-

se por base principal o conceito de violência de gênero talhado por Heleieth

Saffioti, ampliando-se o espectro de verificação da ocorrência dessa violência

para além das identidades tradicionais de gênero, abrangendo-se também as

chamadas identidades alternativas de gênero. Por fim, trouxe-se a questão da

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violência simbólica. Primeiramente em uma abordagem ampla, utilizando-se

principalmente do conceito construído pelo sociólogo Pierre Bourdieu e, após,

tratando-se essencialmente como a violência simbólica se manifesta em relação

ao gênero. Como forma de exemplificação, trouxe-se alguns exemplos de

decisões judiciais a fim de demonstrar como essa forma de violência se manifesta

de diferentes formas em todos os nichos da sociedade.

Em conclusão, vislumbra-se que a violência simbólica de gênero é um fenômeno

que se manifesta cotidianamente na sociedade, estando presente nos mais

diversos setores da sociedade. Propôs-se também em conclusão, a adoção de

medidas para evitar casos de violência simbólica de gênero, como a

implementação de políticas públicas que visem tal fim. Tais políticas, contudo,

esbarram no conservadorismo ainda latente na sociedade, que não enxerga as

problematizações relativas ao gênero como algo realmente preocupante e que

mereça atenção dos poderes públicos.

9. A CRIMINALIZAÇÃO E A PRECARIZAÇÃO DA VIDA DAS COMUNIDADES

QUILOMBOLAS DE CONTENTE E BARRO VERMELHO NA CONSTRUÇÃO DA

FERROVIA TRANSNORDESTINA: RACISMO INSTITUCIONAL COMO INSTRUMENTO

DE DOMINAÇÃO DESENVOLVIMENTISTA

Autor: Lucas Araujo Alves Pereira

Resumo:

A presente proposta trata-se de um recorte de uma pesquisa em andamento,

que estuda os mecanismos de controle social das comunidades quilombolas

Contente e Barro Vermelho, localizadas no munícipio de Paulistana-PI. Este

fenômeno ocorre no processo de construção da Ferrovia Transnordestina, que

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criminaliza e precariza a vida das referidas comunidades quilombolas em

questão.

Pois no ano de 2013, as mencionadas comunidades ocuparam o canteiro de

obras da Construtora Odebrecht (responsável por construir a ferrovia), o que

evidenciou um processo de criminalização da resisistência destes povos

tradicionais, pois essa mobilização por direitos fez com que os representantes do

empreendimento registrassem a ocorrência de um crime junto ao distrito policial

local, o que ocasionou a abertura de procedimento investigativo para apurar o

caso (SOUSA et al, 2013).

Dessa maneira, esse processo de resistência é uma reação à sequência de

violações aos direitos humanos destas comunidades quilombolas, que podem ser

verificadas por diversos impactos causados pela construção da ferrovia (SOUSA

et al, 2015, p. 88).

2. Problema de Pesquisa

Diante disso, o problema que deve ser enfrentado no trabalho é saber em que

medida a política de desenvolvimento representada pela construção da ferrovia

transnordestina exerce um controle social de criminalização e precarização da

vida sob as comunidades quilombolas Contente e Barro Vermelho?

3. Aspectos Metodológicos

O levantamento das informações também se dará de maneira a articular o

levantamento documental e bibliográfico relacionado aos referenciais teóricos

centrais, como a noção de criminalização secundária de Zaffaroni (2001),

mecanismos formais e informais de controle social de que tratam Castro (2005)

e Andrade (2012), o debate sobre a Biopolítica de Focault (2002) e Mbemb

(2011), além da categoria de desenvolvimento na perspectiva de Ribeiro (2012)

e a discussão relativa de hierarquia de raças feita por Sueli Carneiro (2005).

4. Questões Teóricas

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A fundamentação teórica que orienta a pesquisa é feita em dois vieses: a

natureza excludente, colonialista e racista do desenvolvimento, com base em

Ribeiro (1992), Doneles (2003) e Sousa et al (2015); sendo o outro viês a

perspectiva epistemológica que denuncia as várias formas de racismo como

controle social com Foucault (2002) e Achille Mbemb (2012).

Considerando essa concepção, o que se opera são duas dimensões do controle

social, sendo a criminalização realizada no âmbito formal e a precarização da vida

imposta de maneira informal ou difusa (ANDRADE, 2012; CASTRO, 2005).

5. Principais Conclusões do Tabalho

À vista disso, a matriz epistemológica do desenvolvimento se constitui em uma

estrutura ideológica universal, e, portanto, subverter esta ordem direciona as

comunidades quilombolas ao que Barata (1991) chamou de controle social do

desvio, operando, dentre outras maneiras, a partir da criminalização e da

precarização da vida, observados na construção da Ferrovia Transnordestina.

Afere-se então, que a ideia de desenvolvimento econômico imprime uma ordem

social que se materializa na concepção das políticas públicas direcionadas ao

atendimento dessa expectativa hegemônica e produz controle social em razão

de direcionar as formas de viver e produzir.

10. UMA NOVA ABORDAGEM AO COMBATE Á VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

Autora: Michelle Martins Papini Mota

Coautor: Paulo José Angelo Andrade

Resumo:

Existem vários tipos e formas de violência contra as mulheres, sendo as temáticas

as mais diversas e abrangentes possíveis. No presente, serão evidenciadas as

representações da violência doméstica passando pela discussão de gênero,

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sexualidade e atos contra a mulher sob a mirada dos direitos humanos e garantias

fundamentais.

Neste ciclo de violência doméstica contra a mulher há de se ter um olhar nos

partícipes diretos e indiretos, em especial na atuação do Estado, através de sua

força policial, bem como as políticas públicas e as ações afirmativas.

Este elenca elementos da legislação protetiva, disposições do texto da

Constituição Federal brasileira de 1988, fará uma análise da Lei Maria da Penha,

bem como do modelo procedimental adotado pela Polícia Militar no Estado de

Minas Gerais, no atendimento a ocorrências de violência doméstica e a sua

prevenção. A pesquisa visa verificar a extensão do problema, das medidas

tomadas e, realizar ponderações, tudo na direção da garantia dos direitos das

mulheres vítimas de violência doméstica. Busca-se analisar a preservação de

garantias individuais das mulheres, com destaque, ao conceito de gênero

apresentado por Maria Lugones e Anibal Quijano. Objetiva-se, ainda, fazer uma

abordagem histórica do papel da mulher e a sua exclusão, como causa da

violência doméstica. Desta perspectiva, passa-se a verificar dados, acerca dos

direitos às mulheres vítimas de violência no Brasil, bem como analisar o ciclo de

vitimização. Como procedimento metodológico utiliza-se do bibliográfico-

investigativo.

11. EXPLORAÇÃO VS. TRABALHO SEXUAL - PERSPECTIVA CRÍTICA DA LEI BRASILEIRA

DE COMBATE AO TRÁFICO DE PESSOAS

Autora: Micaela Amorim Ferreira

Coautor: Paulo César Corrêa Borges

Resumo:

O Brasil, signatário do Protoloco de Palermo e país-membro da Organização das

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Nações Unidas, se vincula às disposições ali presentes, principalmente no que

refere à definição de condutas que tipifica o tráfico de pessoas. Entretanto, tal

instrumento, oficialmente conhecido como “Protoloco Adicional à Convenção

das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à

Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e

Crianças”, apesar de enfatizar a proteção às mulheres e crianças e apontar - em

seu art. 3º - a “exploração da prostituição de outrem ou outras formas de

exploração sexual” como um dos principais preceitos a ser combatido, não define

de forma eficiente tais conceitos. Consequentemente, a partir da leitura estrita

do Protocolo, é possível depreender entendimento de que a prostituição, para

ser caracterizada como tráfico, deve incluir um terceiro elemento: o explorador.

No entanto, em razão de lacuna conceitual, as medidas repressivas relacionadas

ao tráfico de mulheres e a prostituição mudam drasticamente de nação para

nação, pois, no caso de uma mulher maior de idade, que decide trabalhar

legalmente e por iniciativa própria em um país onde tal profissão é

regulamentada, a depender da política anti-tráfico adotada pelo país, pode sofrer

repreensão por parte do governo ou não. Obviamente, não há tal dicotomia no

caso de uma menina de 11 anos raptada e prostituída contra sua vontade. A partir

do exposto, o objetivo da presente pesquisa é analisar a anterior disposição do

Código Penal, que determinava que qualquer assistência ao movimento

internacional ou nacional de prostitutas caracterizava tráfico de pessoas, sem

qualquer valoração acerca da violação dos direitos humanos destas,

contradizendo a ampla definição adotada pelo Protocolo de Palermo e gerando

impossibilidade das profissionais do sexo exercerem dignamente sua profissão. E

com base em tal análise, busca-se observar a recente alteração da tipificação do

crime de tráfico de pessoas, realizada pela Lei 13.344 de 2016, colocando a

legislação brasileira em consonância com o instrumento internacional

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mencionado, conjuntamente com a tratativa estatal interna sobre a questão da

prostituição como profissão legal, questionando se houve avanço em relação a

essa discussão. Essa temática se relaciona com o GT 8 ao debater o movimento

pela conquista de direitos das profissionais do sexo, observando o papel do

direito e da justiça penal no enfrentamento das desigualdades vivenciadas pelas

mulheres vítimas do tráfico de pessoas para fins de exploração sexual em

oposição aos indivíduos que buscam ser profissionais do sexo de forma livre e

consciente. Para elaboração desse estudo, pressupõe a utilização de intensas

análises bibliográficas de obras que estão direita e indiretamente relacionados ao

tema proposto, em especial autores renomados como Ela Wiecko de Castilho,

Adriana Piscitelli, Kamala Kempadoo, Laura Maria Augustin, entre outros. Além

da análise de fontes legislativas internacionais e nacionais. Para tanto, utiliza-se

o método dedutivo para se chegar à conclusão a partir das premissas

estabelecidas, além do método dialético, permitindo o estudo das normas

jurídicas como fruto de construções culturais.

12. NECROPOLÍTICA e FEMINICÍDIO: A MORTE E AS MORTES DAS MULHERES

Autora: Priscilla Placha Sá

Resumo:

“A Confissão da Leoa”, obra literária de Mia Couto (2012), é a chave para discutir

– no recorte do assassinato de mulheres” – o que pode ser pensado como a

expressão máxima do biopoder sobre a vida das mulheres: a necropolítica

(MBEMBE, 2016). Os assassinatos ao cair da noite e ao nascer do dia das

mulheres numa aldeia moçambicana partilham experiências de uma constituição

– em certa medida – universalizada no registro da expressão “corpo de mulher,

perigo de morte”, como se percebe nos trabalhos de Segato (2005, 2006, 2011)

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sobre o assassinato de mulheres no México. Fenômeno que também é objeto da

literatura de Jennifer Clement (2015), em “Reze pelas Mulheres Roubadas”, que

conta a saga de mães que transmudam suas filhas em meninos, cortando seus

cabelos e modificando suas roupas, para evitar violências e sequestros numa das

regiões mais terrificantes do México. Assassinato, aqui, é expressão escolhida

deliberadamente a partir da controvertida descrição legal do feminicídio no

marco legislativo brasileiro que designa somente alguns tipos de mortes de

mulheres, como já ocorrera em outros países da América Latina (PASINATO,

2011). O objetivo do presente trabalho é analisar, a partir da categoria do

biopoder (2005) e sua matriz foucaultiana que representa não apenas o deixar

viver, mas o fazer morrer uma razoável quantidade de gente, a manifestação da

necropolítica quanto ao feminino e aos corpos feminizados (SEGATO, 2006). A

inscrição e os registros inclusive no corpo, a partir dos instrumentos utilizados e

da sede das lesões (MENEGHEL e HIRAKATA, 2011) convocam a atenção para esse

modo particular do ápice da biopolítica. Fenômeno que ultrapassa o locus da

esfera doméstica e inscreve-se como prática estrutural (SEGATO, 2006); prática

que torna tanto as ruas quanto as casas espaços perigosos para o viver das

mulheres. Com breves remissões aos trabalhos e à intervenção política de Russel

e Jilford (1992) e Lagarde (2007), o texto será norteado, além da categoria

foucaultiana, pelas proposições de Segato (2005, 2006, 2011) a respeito de uma

comunhão fratriárquica que é a um só tempo discursiva e real. E que autoriza a

continuidade do desígnio letal como o destino único de muitas mulheres. A

metodologia utilizará do aporte teórico de Foucault (2005, 2008) e Segato (2005,

2006, 2011), tangenciando as teorias feministas (Portella e Ratton, 2015; Campo,

2015) e trazendo as categorias anteriormente indicadas para fazer a análise dos

dados registrados em relatórios disponíveis sobre a letalidade de mulheres, em

especial, o Mapa da Violência (INSTITUTO SANGARI / FLACSO), Atlas da Violência

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(DataSenado) e Anuário de Segurança Pública (Fórum Nacional de Segurança

Pública). Nesses instrumentos é possível verificar tanto um “perfil” da vítima,

quanto das condições em que as mortes ocorreram. As conclusões parciais

parecem indicar um fenômeno mais complexo do que aquele evidenciado por

uma violência circunscrita ao espaço doméstico e nomeada pela lei, associando-

se aos eventos da violência urbana, com memórias de prática de guerra e vertida

na estruturação social em marcos nos quais as práticas necropolíticas ditam

quem está sujeito ao assassínio e quem será o seu algoz.

13. A CONSTRUÇÃO DA REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA E O PROCESSO DE

CATEGORIZAÇÃO LINGUISTICO SOCIAL DA MULHER VÍTIMA DE VIOLÊNCIA

DOMÉSTICA EM INQUÉRITOS POLICIAIS

Autora: Rebeca Lins Simões De Oliveira

Coautora: Isabela Cavalcante Santos

Resumo:

O presente trabalho busca o estreitamento teórico entre o Direito, de natureza

social crítica, e a Linguística Crítica Discursiva. Destina-se à análise de inquéritos

policiais selecionados na Delegacia da Mulher, Recife/Pernambuco em 2017 e

2018, com objetivo é investigar a (des) construção discursiva e ideológica da

imagem da mulher e como a mesma é representada no suporte textual “inquérito

policial” quando é vítima de violência doméstica, Lei 11.340, resultante de

comportamento machista, sexista e/ou misógino por parte do cônjuge. Para

efetivar este trabalho, analisamos os textos numa perspectiva sincrônica e das

relações entre língua, história, cultura, relações de poder e sociedade,

compreendendo o discurso, como um modo de representação social e uma ação

sobre o mundo e sobre o outro. O percurso teórico utilizado será baseado na

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perspectiva da Análise Crítica do Discurso textualmente orientada a partir de uma

dinâmica que busque identificar os elementos linguístico-discursivos que operam

no processo de interface entre os “macroaspectos” (contexto social) e os

“microaspectos” (linguísticos). Tem como marco teórico Norman Fairclough,

apoiando-se ainda em Arendt, Baratta, Bourdieu, Colares, Foucault e Thompson.

Essa perspectiva teórica ampara nosso estudo devido ao seu aspecto

multidisciplinar e seu direcionamento sobre as relações entre linguagem, poder,

denominação, discriminação e controle. A metodologia empregada quanto à

abordagem dos dados, tipologia, é de cunho bibliográfico e documental e a

metodologia empregada caráter qualitativo - explicativo. Foram cotejadas as

teorias da Análise Crítica do Discurso Jurídico e da Criminologia crítica no que

concerne aos conceitos de Ideologia, Relações de Poder, Legitimação,

Dominação e Representação através dos os modos gerais de operação da

ideologia (Thompson). Investigou-se como as estruturas discursivas utilizadas,

no corpus coletado, utiliza estratégias que externam as vozes hegemônicas da

perspectiva ideológica do machismo. Por essa razão, esse trabalho apresenta

especial pertinência ao GT-8 Gênero, Sexualidade e Relações Raciais na Justiça

Criminal, pois demonstra como o machismo estrutural impacta negativamente a

forma de tratamento promovida pelo sistema penal às vítimas de violência

doméstica, fazendo com que a Justiça Criminal, que deveria atuar no amparo de

mulheres vítimas, na verdade, não as protege de modo efetivo quanto a sua

representação e as expõe ao que denominamos de violência institucional.

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14. MÚLTIPLAS FACETAS DO ENCARCERAMENTO FEMININO:

SUPERENCARCERAMENTO, ABANDONO E MATERNIDADE

Autor: Taiguara Libano Soares e Souza

Coautora: Betânia de Oliveira Almeida de Andrade

Coautor: Lukas dos Santos Costa

Resumo:

O presente trabalho se insere em um conjunto de pesquisas que visam indagar a

relação de gênero e privação de liberdade. A metodologia incorpora a realização

de pesquisa sociojurídica, com base em indicadores obtidos de órgãos

governamentais e instituições da sociedade civil, pesquisa bibliográfica e

realização de pesquisa quantitativa e qualitativa em uma Unidade Prisional

Feminina do Rio de Janeiro. A partir dos dados obtidos, sinalizamos o aumento

exponencial da população carcerária feminina, a seletividade penal verificada no

encarceramento feminino e, por fim, como a pena de prisão consiste em uma

pena restritiva aos direitos da mulher, mas também dos filhos que necessitam

dos seus cuidados.

Dados do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias do Ministério da

Justiça (Infopen) revelam que enquanto a taxa total de aprisionamento geral

aumentou 119% entre 2000 e 2014, a taxa de aprisionamento de mulheres

aumentou 460% no mesmo período. Diante disto, em contraposto à escassa

produção teórica sobre mulheres em privação de liberdade, apresentamos uma

realidade que marca o expressivo aumento da população carcerária feminina. O

que a Criminologia Crítica denomina de “Era do Grande Encarceramento”

(SOOUZA, 2015).

Verificamos uma realidade sistêmica de abandono das mulheres privadas de

liberdade que se manifesta por múltiplas facetas, fato identificado na absoluta

insuficiência de políticas públicas para atender às demandas da mulher

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encarcerada, com características tão particulares, bem como, no abandono

familiar a esta mulher quando a mesma quebra a expectativa social

(LEMGRUBER, 2015). Há uma grande precariedade quanto ao fornecimento de

remédio, atendimento médico ou produtos de higiene básicos como: absorvente,

papel higiênico e sabonete.

A violência como forma de manutenção do poder é percebida nesta realidade

(BOURDIEU, 2002). A mulher criminosa deixa de ocupar o papel esperado para

ela enquanto sujeito na sociedade, não se adequa a expectativa social, e é julgada

não só pela prática de uma conduta criminosa, mas por ser classificada como

mulher desviante. O contexto de privação de liberdade da mulher representa

mais uma forma de manifestação das relações de poder históricas entre homens

e mulheres (BOURDIEU, 2002). O poder punitivo opera sobre a mulher através

de múltiplas facetas (PANCIERI, 2014, p. 74).

Por fim, como se não bastassem os direitos fundamentais da mulher presa,

ressaltamos o princípio constitucional da intranscendência das penas (art. 5º,

inciso XLV, CRFB/88) aliado ao princípio constitucional da presunção de inocência

(art. 5º, LVII, CRFB/88). Tratamos da transposição do estigma da Mãe para o Filho.

Abordamos como o aprisionamento desta mulher/mãe impõe, por via reflexa,

ofensa a princípios constitucionais no que tange a direitos e garantias

fundamentais da mulher presa, bem como à integridade física e à vida do

nascituro e da criança.

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15. VIOLÊNCIA EM ESCALA E PRISÃO DE INDÍGENAS: REFELXÕES

CONTEMPORÂNEAS

Autora: Thais Janaina Wenczenovicz

Resumo:

Diversas tem sido as forma de violências exercidas contra as Comunidades

Indígenas na América Latina e Brasil. Para compreender essas violências em

oposição as Comunidades Nativas no Brasil contemporâneo, faz-se necessário

partir de uma análise sistêmica e de longa duração, considerando sua inter-

relação com o poder. Poder utilizado no processo de ocupação e povoamento,

nas disputas por terra, ou nos processos de aldeamento, aculturação e

assimilação.

Respostas simples para problemas complexos, costumam circundar o senso

comum e se difundir com muita velocidade como é o caso das comunidades

nativas, especialmente quando se reconhece o grau de violência aplicado sobre

as centenas de grupos que povoavam a América antes da chegada do

colonizador. Através do ideário de colonialidade se efetivou o genocídio e o

etnocídio o que colocou as comunidades indígenas sobreviventes a total

subalternidade e vulnerabilidade sócio-econômica e cultural.

Sabe-se que a questão da sobrevivência física impõe iniciativas objetivas:

atendimento médico; garantia de território; punições a práticas de genocídio. Já

a sobrevivência cultural apresenta problemas de outro tipo, sendo que o primeiro

é defini-la. Para tanto, objetiva-se, nesse artigo, fazer uma reflexão do que se

entende por "liberdade", "prisão" e violência na conjuntura pós-constituição

federal brasileira de 1988.

Segundo dados do DEPEN/InfoPen, havia, em dezembro de 2010, um total de 748

(setecentos e quarenta e oito) indígenas internos no sistema penitenciário, sendo

56 (cinquenta e seis) mulheres e 692 (seiscentos e noventa e dois) homens. Sabe-

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se, no entanto, que estes dados são de aproximação, pois o perfil racial da

população carcerária é realizado pelos gestores das unidades por meio do

preenchimento de um questionário padrão a qual não se ouve o apenado. Essa

diferença na coleta dos dados, a exemplo da metodologia seguida pelo PNUD

também minimizam importantes variáveis socioeconômicas dos apenados

indígenas

Enquanto procedimento metodológico utiliza-se do método etnográfico e

bibliográfico-investigativo, acompanhado de documentos jurídicos como a

Convenção nº 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes da

Organização Internacional do Trabalho (OIT, 1989); a Declaração das

Organizações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (ONU, 2007); a

Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais

da UNESCO; a Convenção para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial;

cartas e decretos da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) e a

Constituição do Brasil de 1988. Para a comparação de dados e bases estatísticas

emprega-se os indicadores da Comissão Econômica para a América Latina e o

Caribe (CEPAL), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o

relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil/2015 - publicado pelo

Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e dados da Fundação Nacional do índio

(FUNAI) e DEPEN/InfoPen.

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16. RAÇA E GÊNERO NA CRIMINOLOGIA: A DESUMANIZAÇÃO DAS MULHERES

NEGRAS COMO FERRAMENTA DE UM SISTEMA PENAL GENOCIDA

Autora: Camilla de Magalhães Gomes

Coautora: Nathália Cesário Santos Cecílio

Resumo:

O sistema penal brasileiro, como já apontou a criminologia crítica, possui funções

declaradas que escondem suas funções reais. Tomando, então, a criminologia

crítica, o gênero como categoria de uma análise decolonial e a teoria crítica da

raça como referenciais teóricos, este texto procura pensar que funções reais o

sistema esconde em sua atuação em relação às mulheres negras – cissexuais,

transexuais e travestis - em situação de cárcere ou que tenham sua vida de algum

modo afetada pelo cárcere. De modo mais detalhado: tomando por base a tese

de Flausina da existência de um projeto genocida contra a população negra,

executado por meio do sistema penal, entendemos ser fundamental partir da

afirmação de que a chave da atuação do sistema é a negação da humanidade da

população negra. Quando pensamos, contudo, que, no marco da colonialidade,

gênero e raça se articulam e se constroem mutuamente, colocamos uma outra

pergunta ao sistema: como esse processo de desumanização atua nos marcos de

gênero e raça, como essa atuação do sistema face às mulheres negras promove

processos de desumanização específicos contra elas como parte desse grande

projeto genocida?

Com essa forma de analisar o sistema penal em mente, o artigo propõe realizar

uma primeira aproximação a respeito da atuação deste em face das mulheres

negras. Afinal, se até aqui muito se disse a respeito da seletividade operada

contra e sobre o jovem negro, é preciso reconhecer que uma alteração – ou uma

inclusão, já que se trata muito mais de uma expansão do sistema do que de uma

substituição de atingidos - significativa tem sido promovida no perfil do

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selecionado, com o significativo aumento do encarceramento de mulheres no

país. Assim, cinco componentes são analisados para buscar algumas respostas às

perguntas feitas: os dados baseados em critérios de raça/cor que não permitem

uma leitura adequada dos números do encarceramento em termos de raça; a

inexistência ou precariedade da garantia de atendimento médico e produtos de

higiene íntima; o controle da sexualidade por meio de limites às visitas íntimas; o

destino de mulheres transexuais, transgêneros e travestis e as revistas vexatórias.

Com tudo isso em mente, discutimos, ao final, que as práticas de desumanização

de gênero e raça nada tem com um desvio do sistema, um excesso diante do

perigo ou apenas uma prática abusiva; são mesmo o seu retrato e o retrato de

suas funções reais não declaradas, que se desenvolvem como controle dos

corpos e que assim podem se desenvolver por sustentar-se em um processo de

desumanização: corpos desumanizados são corpos manipuláveis e violáveis, uma

vez que as investidas contra eles produzidas não são percebidas como violência.

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163

GRUPO DE TRABALHO 9:

JUSTIÇA JUVENIL

Ementa: O objetivo deste GT é fomentar o debate a respeito do sistema de justiça

juvenil, das políticas de segurança pública e das instituições de controle em que

os jovens adolescentes sejam o foco. Neste sentido, o GT se abre como um

espaço para discussões teóricas e apresentações de achados empíricos na área

do direito e das ciências sociais. Serão selecionados trabalhos que abordem a

temática da violência juvenil, bem como as respostas das instituições estatais

para os conflitos infracionais e criminais. Serão priorizadas as propostas que

apresentem reflexões sobre questões de raça e gênero, em uma perspectiva

crítica à seletividade do sistema de justiça juvenil e criminal, às demandas

punitivistas e às propostas de redução da maioridade penal.

Coordenadora Dra. Mariana Chies

Doutora em Sociologia (2018) pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Concluiu o Mestrado (2013)

em Ciências Criminais na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

(PUCRS), onde também fez especialização em Ciências Penais (2011). Bacharel

em Ciências Sociais pela UFRGS (2013) e em Direito pela PUCRS (2009). É

Coordenadora-Chefe do Departamento da Infância e Juventude do Instituto

Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM). Lattes:

http://lattes.cnpq.br/0902400941116843

Coordenadora Ana Claudia Cifali

Mestre e Doutoranda pelo Programa de Pós-graduação em Ciências Criminais da

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Mestre em Cultura de Paz,

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Conflitos, Educação e Direitos Humanos pela Universidade de Granada.

Colaboradora do Programa Interdepartamental de Práticas com Adolescentes em

Conflito com a Lei da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Pesquisadora

do Grupo de Pesquisa em Políticas de Segurança e Administração da Justiça Penal

(GPESC/PUCRS). Coordenadora-Adjunta do Departamento de Infância e

Juventude do IBCCRIM. Advogada. Lattes:

http://lattes.cnpq.br/9865957374821514

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Trabalhos:

1. DESIGUALDADE NO SISTEMA PENAL JUVENIL: UMA CRÍTICA À SELETIVIDADE DO

SISTEMA DE JUSTIÇA JUVENIL NA PERSPECTIVA DE GÊNERO

Autora: Ana Claudia Souza Valente

Coautor: Antonio Henrique Graciano Suxberger

Resumo:

A massa de mulheres presas tem um perfil semelhante de vulnerabilidade: são

jovens, pobres, negras, trabalhadoras informais e com pouca escolaridade. A

sobrevivência, no entanto, parece ser ainda mais difícil para aquelas com

passagem pela medida socioeducativa de internação na adolescência (DINIZ,

2017, p.06). O objeto de pesquisa está centrado nas adolescentes em conflito

com a lei, pois, em geral, todas as adolescentes que cumprem a medida

socioeducativa de internação sofreram, antes de serem submetidas ao regime de

privação de liberdade, violências de toda ordem (físicas, psíquicas e emocionais),

evidenciando que como as dimensões de gênero repercutem no sistema punitivo

de modo essencialmente seletivo (HERRERA FLORES, 2005, p.24). Será que as

adolescentes, têm todas os mesmos problemas sem distinção e sofrem as

mesmas dominações e situações de exploração? Elege-se como marco teórico a

teoria crítica dos direitos humanos (HERRERA FLORES, 2009), em especial no seu

recorte de gênero, caracterizado pela abordagem “opressões sobrepostas”. A

utilização do aporte crítico permitirá uma análise do desvio e dos processos de

controle do sistema de justiça penal juvenil. O destaque dirige-se ao risco de

vivenciarmos eternamente aquilo que Emílio Garcia Mendéz chama de “crise

implementação” e “crise de interpretação” do Estatuto da Criança e do

Adolescente (GARCIA MÉNDEZ, 2000, p. 01). A raça, a etnia e a classe social, além

das diversas formas de violências cometidas contra as crianças e adolescentes,

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devem ser objeto de questionamento dos atores jurídicos envolvidos no processo

judicial de responsabilização penal das adolescentes, em especial do julgador

quando da escolha da medida socioeducativa a ser aplicada ao caso concreto,

considerando que a adolescente é um ser humano ainda em desenvolvimento e

que a medida extrema traz consequências irreversíveis. O artigo problematiza a

necessidade de romper com o ciclo vicioso que leva adolescentes em situação de

vulnerabilidade extrema ao cárcere, por meio da negação da opressão e da

regulação vertical social imposta pela visão hegemônica do mundo informada

pelo patriarcalismo (HERRERA FLORES, 2005, p.40). Como hipótese, busca-se

demonstrar que não há desigualdade universal e homogênea, já que as mulheres

sofrem diferencialmente dependendo de sua situação, posição, hierarquia

subordinada no âmbito dos processos de divisão social/sexual/racial do trabalho

(HERRERA FLORES, 2005, p.18). Esse tema possui pertinência temática com o

Grupo de Trabalho n. 9, Justiça Juvenil, por abordar achados empíricos na área

do Direito e das Ciências Sociais na seara do sistema de responsabilização juvenil,

bem assim por permitir a reflexão sobre gênero no campo infracional, temática

pouco discutida entre os operadores do direito e que merece ser melhor

observada no campo jurídico. A metodologia empregada será a revisão

bibliográfica e análise de dados obtidos por meio de pesquisas nos órgãos oficiais

do governo, sites de transparência e pesquisas empíricas divulgadas.

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2. AS IDEIAS FOUCAULTIANAS E O FENÔMENO DAS REBELIÕES NOS CENTROS

SOCIOEDUCATIVOS AO ADOLESCENTE: A INVISIBILIDADE DO ADOLESCENTE

NEGRO

Autora: Ana Paula Cristina Oliveira Freitas

Coautora: Maria Gabriela Silva Martins da Cunha Marinho

Resumo:

O artigo pretende discutir o fenômeno das rebeliões dentro dos Centros

Socioeducativos ao Adolescente como forma de resistência ao poder do sistema

disciplinar. A discussão será realizada a partir das ideias foucaultianas sobre

resistência, sistema disciplinar e poder, para assim entendermos a relação

existente entre Estado/Sociedade e os adolescentes submetidos à medida

socioeducativa de internação.

O artigo será realizado com um recorte étnico-racial, considerando a

preponderância de adolescentes negros no Sistema Socioeducativo, 59,8%

(SINASE, 2018), e mesmo sendo maioria no Sistema esses adolescentes

permanecem invisíveis para o Sistema de Justiça que não faz apontamentos

quantitativos com relação a raça/cor dos jovens. Essa invisibilidade tem relação

direta com a história da infância no Brasil, que tinha como objetivo a

institucionalização de crianças e adolescentes que pudessem ameaçar o futuro

da nação, em regra essas crianças eram negras, pobres e oriundas de famílias

desestruturadas.

Para FERREIRA (2010), a prática do ato infracional é um movimento de inclusão

e resistência do adolescente negro, pois, desde o período escravocrata, os negros

encontravam diversas formas de oposição ao sistema, sendo a primeira e

principal a fuga. Após anos de luta, os adolescentes ainda precisam resistir ao

sistema determinado a eles, e à falta de oportunidades para alcançar as

demandas sociais impostas pela elite.

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Considerando o sucesso ou fracasso da primeira forma de resistência, a prática

de ato infracional, o objetivo do artigo é analisar a mesma sob o viés das rebeliões

nos Centros Socioeducativos. – “A rebelião como forma de ser ouvido, de gritar....

Os jovens precisam falar e serem ouvidos.” (BOMBARDI, 2008). Nesta perspectiva

temos as revoltas como forma de se manifestar contra o sistema imposto que

objetiva a mudança do eu no adolescente.

O artigo será elaborado com base em uma revisão bibliográfica e na análise de

artigos jornalísticos que noticiaram as ocorrências das rebeliões, para, assim,

entender se há visibilidade das motivações que levam os adolescentes a se

rebelarem.

3. JUSTIÇA RESTAURATIVA JUVENIL: UMA VIA DE APLICABILIDADE DA

SEGURANÇA CIDADÃ NO CONTEXTO DA VULNERABILIDADE

Autora: Arnelle Rolim Peixoto

Coautora: Arkaitz Pascual Martin

Resumo:

É inegável a discussão sobre o aumento dos adolescentes dentro do sistema

socioeducativo no Brasil. Diante da realidade, o movimento de justiça

restaurativa no âmbito juvenil é de extrema importância para estabelecer

resoluções pacíficas e que possam evitar esse aumento contínuo de adolescentes

dentro dessas instituições. A aplicabilidade da prática restaurativa faz com que

seja possível falar na garantia de uma segurança cidadã, visando uma proteção

efetiva dos direitos humanos, principalmente os direitos da criança e do

adolescente, tanto na resolução do conflito como na prevenção futura de uma

infração. Ante este parâmetro, o objetivo neste artigo é partir do estudo sobre

justiça restaurativa juvenil e do conceito de segurança cidadã para que seja

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evidenciado que a prática restaurativa é relevante para garantir uma segurança

cidadã principalmente dentro de um contexto de vulnerabilidade que se

encontram os adolescentes no Brasil.

4. APLICAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NO CUMPRIMENTO DE MEDIDA

SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO ENTRE ADOLESCENTES EM ATOS DE

INDISCIPLINA

Autor: Eduardo Moureira Gonçalves

Resumo:

Tem por objetivo o presente estudo a compreensão e aplicação da Justiça

Restaurativa nos atos de indisciplinas entre adolescentes em cumprimento

socioeducativa privativa de liberdade, especialmente aquelas praticadas com

grave ameaça ou violência.

A Justiça Restaurativa advém de um movimento de jurista para modernização e

eficiência ao engessado Sistema de Justiça para a Seara Criminal com a inserção

da vítima como uma das protagonistas na apuração do delito e não mais como

um dos elementos de prova para fins de configuração da autoria e materialidade,

geralmente arrolada pelo órgão de acusação.

Desta feita, abre-se um diálogo entre agressor e vitima com a finalidade clara de

composição e esclarecimento sobre o episódio que resulto na violação do texto

da lei, ampliando as percepções de lado a lado, desde identificar dor e

sofrimento, e, até mesmo superar a sensação de injustiça caracterizada pelo

distanciamento de pessoas e maior valorização ao processo e procedimento

penal. “Busca, também, de se possibilitar a qualificação e humanização dos

procedimentos adotados e utilizados cotidianamente pelos profissionais em seus

espaços institucionais.” (OLIVEIRA, 2007)

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Feita tais considerações, imperioso o recorte para a aplicação deste instituto

(Justiça Restaurativa), para adolescentes em cumprimento de medida

socioeducativa de internação, quando estes se envolvem em atos de indisciplina,

praticando novo ato infracional tendo por vítima outro educando também

inserido no ambiente de socioeducação.

Ato infracional praticado durante o cumprimento de medida de internação dá

ensejo à responsabilização administrativa e judicial, devendo tal situação ser

reduzida a termo, para uma sindicância interna (Comissão de Avaliação

Disciplinar – CAD, dirigido pelo diretor do Centro de Internação) e lavrado Boletim

de Ocorrência para apuração efetiva.

Vale destacar que esta é a única hipótese que pode ser ultrapassada o prazo

limite de três anos de privação de liberdade para adolescentes (art. 45, §1º da Lei

nº 12594/2012), a prática de outro ato infracional durante a execução da medida

de internação.

Assim, temos o seguinte cenário: (i) a vítima, em cumprimento de medida

socioeducativa de internação, que tem seus direitos violados estado sobre a

guarda do Estado, e, de outro (ii) agressor, que, burlando todo um sistema de

segurança, consegue praticar lesão relevante a terceiro, mesmo estando em

processo de proteção integral e educação supervisionada.

Neste cenário, a Justiça Restaurativa com exclusividade pode ser uma das

respostas adequadas ao conflito existente, sem a necessidade do uso das

ferramentas jurídicas tradicionais, bem como a possibilidade de o adolescente

entender as consequências de seus atos para além da responsabilização judicial,

compreender as implicações e reações que acarreta na vida do outro educando,

considerando que a medida imposta aos dois internos tem o caráter de mudar o

“eu” do adolescente.

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Para tanto, a metodológica escolhida para solução do problema se deu por meio

de levantamento bibliográfico, especialmente das Resoluções Administrativas e

Diretrizes do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), e das principais obras

doutrinárias que permeiam a Justiça Restaurativa.

5. A CORRESPONSABILIDADE DO ESTADO EM RELAÇÃO AOS ADOLESCENTES EM

CONFLITO COM A LEI

Autora: Elisa Stroberg Schultz

Coautor: Paulo Fernando Pinheiro

Resumo:

Este trabalho tem por finalidade analisar as ações presentes/ ausentes do Estado

resultantes da corresponsabilidade do Estado em relação aos adolescentes em

conflito com a lei no cometimento do ato infracional. O mesmo encontra-se em

andamento e é objeto da tese de Doutoramento em Ciências Crminais na PUCRS.

Considerou-se dados coletados em pesquisa de graduação e de mestrado, onde

apontou a Juventude, categoria que incorpora uma parte da adolescência com

uma visão negativa dos mesmo apontando a responsabilização em sobrecarga da

família e ausência do Estado dentro do Princípio da Corresponsabilidade em

relação às crianças e adolescentes, no caso, em relação ao adolescente em

conflito com a lei (autores de ato infracional). Trata-se de um contexto que tem

fatores econômicos, sociais, culturais, históricos, antropológicos e políticos junto

a relações de biopoder e biopolitica como determinantes de um contexto

excludente, que acabou desenvolvendo uma sociedade de castas onde impera a

desigualdade social, e é das catas ou classes mais pobres que os adolescentes em

conflito com a lei geralmente são oriundos; e é na faixa da população que mais

sofre com a desigualdade social que geralmente esses adolescentes se

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encontram. Para tanto traçou-se como procedimento metodológico a pesquisa

qualitativa delineada exploratória, através de um estudo de caso, sendo que o

caso é o Estado, em âmbito federal, estadual e municipal, no locus da cidade de

Ponta Grossa – PR. Para tanto definiu-se como objetivo geral do problema

estabelecer uma relação entre o ato infracional cometido por adolescentes em

conflito com a Lei e a ausência/presença do Estado junto as relações de poder

dinâmicas em nossa sociedade dentro do Princípio da Corresponsabilidade no

acesso aos direitos fundamentais deste adolescente. E como objetivos

específicos Analisar o Princípio da Corresponsabilidade da Família, da Sociedade

e do Estado, focando na atuação do Estado; levantar o aparelhamento do Estado

no locus da pesquisa; Identificar e analisar a atual conjuntura brasileira e apontar

os elementos históricos, sociais, econômicos, culturais e antropológicos para

entender o papel do Estado frente ao problema de pesquisa; e estabelecer uma

relação entre a ausência/presença do Estado com o ato infracional cometido por

adolescentes. Junto a isso, entender como as relações de biopolitica e biopoder

com Foucalt e Aganben se manifestam interferindo na realidade em questão,

além de perpassar um contexto histórico embasado nas história das idéias. Como

base teórica do presente anteprojeto de tese, utilizou-se de referencial

bibliográfico e da pesquisas empíricas já realizadas. Como resultados, os mesmos

ainda são parciais, mas já capazes de identificar que onde existe ausencia ou

inexistencia do Estado através de politicas públicas e instrumentais, existe um

“favorecimento’ para o comentimento do ato infracional.

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6. COM MAIS GARANTIAS, MAIS PUNIÇÃO UMA PESQUISA SOBRE A INCIDÊNCIA

DA RACIONALIDADE PENAL NA JUSTIÇA JUVENIL FLUMINENSE

Autora: Flora Sartorelli Venâncio de Souza

Resumo:

Com a promulgação do ECA, deixou-se para trás no plano das leis o amplamente

criticado modelo tutelar, para se adotar o modelo de proteção integral. Com isso,

enquanto garantias penais e processuais penais foram asseguradas a jovens,

medidas privativas de liberdade foram reguladas pelos princípios da

excepcionalidade e brevidade, devendo ser preteridas em face de medidas em

meio aberto. Entretanto, contrariamente ao esperado, houve acentuado

aumento de jovens privados de liberdade nos últimos anos, maior ainda do que

as taxas de encarceramento adultas.

Esta pesquisa tem com objetivo compreender esse aumento do encarceramento

juvenil em contexto legislativo progressista, partindo de análise empírica

multimetodológica das práticas judiciais de execução de medias socioeducativas

de internação, tendo como base o caso do Rio de Janeiro. Alguns diagnósticos de

efetividade do ECA, trazidos em pesquisas empíricos sobre práticas judiciais e em

reflexões dogmáticas, interpretam a onda punitiva na justiça juvenil como

consequência da perpetuação da racionalidade tutelar e da visão da medida

como um bem para o adolescente (cf. MENDEZ, 2006). Em outro sentido, outra

interpretação: as práticas da justiça juvenil teriam sido colonizadas pela

racionalidade penal adulta, com a absorção de garantias penais e incidência da

lógica retributiva na responsabilização de jovens (PIRES, 2006; GISI, 2017),

fazendo com que a justiça especializada também experimentasse um

recrudescimento no molde do ocorrido com a justiça criminal. Neste trabalho,

dar-se-á foco à essa segunda perspectiva, com o objetivo especifico de saber se

houve, efetivamente, uma colonização da justiça juvenil por uma racionalidade

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penal e se seria este o fator de aumento no número de internações nos últimos

anos.

Foram analisados empiricamente autos judiciais, incluindo decisões e pareceres

psicossociais, e acompanhadas audiências de reavaliação de medida, produzindo

dados quantitativos e qualitativos. A Teoria Fundamentada nos Dados, método

predominantemente indutivo, foi a base metodológica elegida de análise e

construção dos resultados.

Olhando para a execução como um todo, conclui-se que ela está exercendo um

papel paradoxal. De um lado, serve como forma de resistência a uma política

criminal mais ampla; de outro, não deixa de exercer seu papel na engrenagem

das políticas de superencarceramento. Verificou-se nas práticas judiciais a

incidência de uma filosofia retributiva, baseada principalmente no princípio da

proporcionalidade. Se este, de um lado, forma barreiras para evitar a internação

por delitos leves, por outro, reforça a obrigação de punir os casos considerados

graves. A gravidade do ato, relacionado com o tempo de medida, é o argumento

e critério central para manter um adolescente internado, junto com outros

argumentos e critérios típicos da justiça criminal adulta. A ideias tutelares se

limitam ao uso, muitas vezes contraditório, de argumentos “ressocializadores”

na manutenção da medida, não encontrando ressonância nas práticas judiciais.

Entretanto, a aproximação da maneira de julgar da justiça juvenil com a justiça

penal não explica por si só o aumento do encarceramento. Ressalte-se que o juízo

de execução estudado também é responsável por uma série de mediadas paras

redução da superpopulação nas unidades

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7. A GARANTIA DE DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE PRESSUPÕE O

ENFRENTAMENTO AO RACISMO

Autora: Haydée Paixão Fiorino Soula

Resumo:

Neste artigo, pretendemos traçar estratégias de transformação da cultura

punitivista judicial aplicada ao sistema de justiça infanto-juvenil, com o escopo

de construir boas práticas para torná-lo mais acessível e sensível às crianças e

adolescentes.

O primeiro percurso da pesquisa foi identificar o histórico de formação,

destacando as principais normativas nacionais e internacionais, cuja abordagem

referente às crianças e adolescentes seja de proteção ou punição. Considerar

crianças e adolescentes sujeitos de direitos é prática recente no país. Durante

todo o período Colonial e Imperial (1500 a 1889) o Estado fora constituído por

uma ordem social escravocrata. Nunca houvera preocupação com a situação de

crianças e adolescentes, principalmente àquelas descendentes de africanos

escravizados no Brasil.

Não obstante toda a normativa nacional no tocante à regulamentação da

garantia de direitos fundamentais à criança e ao adolescente pós-abolição e

fundação da República, muitas violações de direitos humanos ainda são

verificadas na prática.

Dada a complexidade da situação de vulnerabilidade e violência as quais

encontram-se o segmento infanto-juvenil no país nas mais diversas áreas, fruto

de uma herança escravocrata e colonial, e devido a negligência estatal em boa

parte dos casos, premente se faz a mobilização da sociedade civil organizada com

poder de barganha e influência nos órgãos públicos.

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É premente sensibilizar os integrantes do Sistema de Garantia de Direitos para

que assumam uma postura proativa, sobretudo o Ministério Público e o Poder

Judiciário. O incentivo à Justiça Restaurativa no Sistema Socioeducativo, a

formação de Magistrados para que estabeleçam uma atuação integrada com os

equipamentos públicos e com os órgãos de gestão das políticas de assistência

social, educação e saúde, nos âmbitos municipal e estadual, especialmente no

que se refere à aplicação de medidas protetivas para crianças e adolescentes.

Isto posto, promover uma mudança de interpretação quanto à realidade das

crianças e adolescentes que chegam ao sistema de justiça, em sua maioria

oriundas de um contexto de pobreza e miserabilidade das periferias, marcadas

pelo racismo estruturante das relações sociais, exige que seu direito e garantia

da dignidade da pessoa humana seja um pilar inderrogável, conduzindo à

mudanças hermenêuticas basilares. À luz das problemáticas descritas no texto

visamos à produção de um material teórico e científico que possa server de

inspiração para magistrados e operadores de direito transformadores em todo o

Brasil.

8. O CARÁTER MORALIZANTE DA MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO E

SUA INCOMPATIBILIDADE COM O SISTEMA GARANTISTA

Autor: Rafael Barros Bernardes da Silveira

Resumo:

O objetivo do presente estudo é revelar – a partir de detalhada pesquisa

bibliográfica e análise normativa e jurisprudencial no campo da justiça juvenil – o

caráter moralizante da medida socioeducativa de internação, destacando que tal

qualidade, para além de indesejada, é inconstitucional, pois ofende pressupostos

basilares do sistema garantista, consagrado em nosso ordenamento jurídico.

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De início, este estudo analisará o atual estado da sistemática de execução da

medida socioeducativa de internação, em especial atenção às ideias de Rosa

(2007) e Shecaira (2015).

Destacar-se-á que, na prática, a lógica de avaliação quanto ao cumprimento da

medida em questão – que não comporta prazo determinado e deve ser

reavaliada em intervalos periódicos de até seis meses – se dá a partir do

desenvolvimento de eixos definidos no plano individual de atendimento do

adolescente. Tais eixos contemplam diversos atributos e são pensados a partir da

ideia de efetivação de direitos fundamentais e do oferecimento ao adolescente

de oportunidades de vida que não envolvam a prática infracional. É dizer, tratam

da ressocialização do adolescente. Ademais, a medida impõe a adoção de

práticas que contribuam para a reflexão do adolescente sobre o ato infracional,

desaprovando a conduta delinquente e exigindo que este se responsabilize por

seu ato. Assim, para além da privação da liberdade, o indivíduo precisa assumir

que o que fez foi errado – daí seu caráter moralizante.

Não se quer defender que a medida socioeducativa não deva atuar sobre a

efetivação de direitos e garantias fundamentais do adolescente, intervenção tida

como necessária, especialmente diante da condição peculiar de pessoa em

desenvolvimento e do perfil da clientela habitual do sistema (indivíduos em

especial condição de vulnerabilidade socioeconômica). O problema que se

detecta é que, em síntese, a medida socioeducativa condiciona a liberdade do

adolescente à satisfação destes objetivos de caráter ressocializante e

moralizante. Há que se discutir se tal postura é justificável e se encontra respaldo

em nosso ordenamento jurídico.

Tal análise se dará à luz das ideias do jurista italiano Luigi Ferrajoli (2014) e sua

teoria do garantismo penal. Para isso, serão apresentados delineamentos gerais

do sistema garantista, a partir dos quais se discutirão as características

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fundamentais do modelo proposto pelo autor, notadamente quanto à

estruturação do Estado (FERRAJOLI, 1997), bem como quanto à configuração de

um sistema punitivo compatível com as diretrizes garantistas (FERRAJOLI, 1999).

Na sequencia, se discutirá a adoção do sistema garantista pelo ordenamento

jurídico brasileiro, no intuito de revelar as disposições normativas que consagram

os princípios fundamentais desse sistema, em especial as presentes no texto da

Constituição de 1988.

Por fim, será discutida a incompatibilidade entre o sistema garantista e a atual

configuração da execução da medida socioeducativa de internação, discussão

que revelará a contradição entre as duas perspectivas, por existir, em concreto,

uma oposição entre: I) um sistema que se funda na defesa irrestrita da separação

entre direito e moral e que se opõe às noções de sanção como medida de

reeducação ou ressocialização; e II) Um modelo que condiciona o

restabelecimento da liberdade ao atendimento de objetivos moralizantes e de

ressocialização.

9. SELETIVIDADE NA JUSTIÇA PENAL JUVENIL: A SUJEIÇÃO CRIMINAL DA

JUVENTUDE NEGRA

Autora: Sara Luz

Coautor: Diego Marques da Silva

Coautora: Erica Babini Lapa do Amaral Machado

Resumo:

O jovem negro passa por um processo de estigmatização social que o coloca em

constante situação de vigilância e perseguição pelos aparatos penais. A evidência

está não apenas no fato de maioria das mortes ocorridas no país serem de jovens

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negros (FBSP, 2018), mas porque compõem a maior população carcerária do país

(BRASIL, 2016).

Ressalte-se que o quantitativo de mortes no país é provocada por atividade

policial. Estudos nacionais indicam, por exemplo, que o estado do Rio de Janeiro

em 2007 teve o record histórico de 902 vítimas na capital e 1330, no Estado de

casos de "Homicídios Provenientes de Auto de Resistência" (MISSE, 2011). Em

São Paulo, em 2010 foram vítimas de atividade policial 419 pessoas e 286 em

2011, totalizando 905, dos quais, 96% eram jovens negros. Para o período de

2012 e 2013, em Minas Gerais, o quantitativo cai entre dez a vinte vezes

(SINHORETTO, 2015). Em Pernambuco (2018), o número de pessoas mortas, nos

cálculo de mensal de criminalidade violenta letal e intencional – CVLI, entre

agosto de 2017 e janeiro de 2018, varia entre 411 e 448 pessoas.

A partir desses dados, o problema lançado é: as raízes autoritárias nacionais,

fincadas no contexto colonial de escravidão da população negra, podem guiar o

faro policial que resultam na construção da seletividade penal de negros e

recorrentemente pobres? Metodologicamente serão adotados dados de fontes

secundárias (SINHORETTO, 2014).

O pressuposto teórico é que o estigma dirigido tem função não apenas de criar

um discurso de “verdade” que permita o exercício do controle, como de manter

a distância social entre grupos; pois a medida que se macula de negatividade a

identidade social do outro, cria-se uma distância que dificulta ou impede a

empatia entre os indivíduos, tornando-se mais fácil legitimar um discurso que

associa negritude e criminalidade. O estigma é uma marca produzida

socialmente, relacionada a algum atributo considerado negativo que

praticamente desumaniza o seu portador. Essa marca social, relacionada a algum

estereótipo, é vista como uma desvantagem, uma diferença quanto ao que se

considera o normal. (GOFFMAN, 1988). Assim é relevante perceber que

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além de uma relação de interação de grupos sociais o estigma é claramente uma

relação de poder instrumentalizada para subjugar

Outrossim, outro elemento de interpretação, é que historicamente, a população

negra passa por um processo de desumanização que foi basilar desde o período

da escravidão, quando os negros eram tomados por indivíduos sem alma para

justificar a exploração e abusos, um discurso conformador à lógica econômica e

à manutenção de uma legitimidade hierárquica de dominadores e dominados

(RIBEIRO, 1995).

Finda a escravidão, e com um boom populacional nas cidades, o objeto de receio

das elites passou a ser a pobreza urbana em função disso, novos esforços são

empreendidos num sentido de controle dessa nova demanda, a população

urbana pobre, tida como “degenerada, delinquente”, tornando-se o alvo

preferencial do controle punitivo (ALVAREZ, 2002).

Não é sem razão que as raízes autoritárias nacionais, fincadas no contexto

colonial de escravidão da população negra, podem guiar o faro policial que

resultam na construção da seletividade penal: negros e recorrentemente pobres.

O gesto de suspeitar parte do pressuposto do não confiar, de fazer uma leitura

da subjetividade como indigna de credibilidade. Tal como evidencia Sinhoretto,

(2014, p. 133): “[...] A fundada suspeita é fruto, segundo os interlocutores, da

experiência que o policial adquire nas ruas para identificar um suspeito ao

primeiro olhar e os signos da suspeição”.

Quer dizer: os elementos que indicam que um tipo social – pessoas portadoras

de determinados signos sociais - são indignas e, nesse sentido, representam uma

negatividade (MISSE, 2008), cuja caça é tão naturalizada que não causa suspeição

(FLAUZINA, 2006). O problema é ainda mais delicado quando se trata do sistema

de justiça juvenil, devido a duas questões: a primeira se refere à peculiaridade

dessa fase específica da vida (adolescência) que perpassa a formação de sua

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identidade e um momento biológico-emocionalmente conturbado; inclusive a

condição peculiar de desenvolvimento justificam a justiça especializada. A

segunda questão volta-se aos juízos de responsabilização, por parte da

magistratura, que, muitas vezes, está voltada à personalidade do indivíduo; dado

o argumento eufemista e confuso da socioeducação (MACHADO, 2014; SAL,

2010; ALVAREZ, SALLA, SCHRITZMEYER, 2010; PAULA, 2015; ALMEIDA, 2016;

CORNELLIUS, 2017).

Note-se que a estruturação classe e raça são formalmente (não há pudor de

ocultação porque naturalizadas) postas pelos entes do sistema de justiça: entre

o faro policial, guiado pelo assujeitamento e a condenação judicial, movida pelas

deficiências sociais, há um funil condenatório dirigido ao adolescente negro e

pobre.

Desde a origem, o sistema menorista no Brasil foi dirigido a determinadas

parcelas populacionais - “menores abandonados e delinquentes” – que, em sua

esmagadora maioria, são jovens pobres e negros, devido à metamorfose da

incorporação da Doutrina da Situação Irregular (ALVAREZ, 1989).

Enfim, ainda que se tenha criado, hodiernamente, uma retórica que remete a um

conceito de infância universal, crianças e adolescentes são construídos

socialmente de maneira desigual, de modo que, o discurso retido ao âmbito do

dever ser concede maior ênfase nos “adolescentes perigosos” (destinatários de

medida socioeducativa) do que “crianças que necessitam de proteção”

(destinatários de medida de proteção) (SHUCH, 2005).

Vale salientar que apesar do Estado de Direito, ainda há resistências para que

determinados grupos acessem e efetivem seus direitos, porquanto têm sua

subjetividade marcada por um estigma social tão dilacerante que sua cidadania

é aviltada. O estigma gera uma perspectiva negativa com relação o

comportamento do individuo estigmatizado e o sistema legal do Estatuto da

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Criança e do Adolescente em seus espaços de discricionariedade favorece esse

mecanismo (vide por exemplo, arts. 172 do ECA).

Com isso percebe-se que esse processo de perseguição aos negros que ocorre

desde a escravidão até os dias atuais também é praticado pelas policias, em suas

abordagens cotidianas. Os policiais são movidos pela “suspeição” que é um ato

coordenado e dirigido para distinguir em meio de um grupo social aqueles que

se quer punir. O processo de filtragem racial direcionado às periferias brasileiras

busca não uma conduta suspeita, mas sim uma cor.

Aqui atua o racismo permanentemente atualizado, pois os preconceitos são

absorvidos nesse processo de seleção e filtragem, os tipos criminalizados são,

geralmente, os socialmente hostilizados e caracterizam uma exclusão criminal. É

este lugar que ocupa a juventude negra.

10. A DEFESA COMO MEIO DE GARANTIA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS FRENTE

AOS PROCESSOS DE CRIMINALIZAÇÃO DA JUVENTUDE NO RIO DE JANEIRO

Autora: Tatiana Lourenco Emmerich de Souza

Resumo:

A criminalização de adolescentes em conflito com a lei é um problema social que

se perpetua ao longo da história brasileira. Desde meados do século XIX, esses

adolescentes, denominados “menores” delinquentes ou abandonados, em sua

maioria advindos das classes mais pobres e vulneráveis da população, em sua

maioria negra, com pouco/nenhum acesso à educação, inseridos em famílias

categorizadas como típicas de “ambientes de marginalização”, considerados

locais de “maus hábitos” onde eram exercitados: uso de drogas, prostituição e

pequenos crimes, são alvo constante da polícia e da justiça.

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Em pleno século XXI, a conjuntura não se modificou, no que tange aos sujeitos

sobre os quais a norma vigente recai, o processo por meio do qual isso se dá

configura-se como sujeição criminal, conforme atesta Misse (1999).

Dessa maneira, se faz necessário uma reflexão sobre os discursos estigmatizantes

que incidem sobre os adolescentes em conflito, principalmente na cidade do Rio

de Janeiro, locus de pesquisa empírica deste artigo. Também deve ser ressaltada

a política criminal que tem como alicerce a repressão violenta pelo estado, das

camadas mais pobres da população.

A maioria dos adolescentes, internados na comarca do Rio de Janeiro, praticaram

crimes análogos ao de tráfico de drogas e de roubo, segundo a pesquisa do

Conselho Nacional de Justiça (2012). No período que corresponde a Junho de

2017, de acordo com a Coordenação de Medidas Socioeducativa do DEGASE, só

na capital a instituição mantém no total 2.279 adolescentes do sexo masculino,

em cumprimento de medidas privativas de liberdade, seja internação provisória,

internação ou semiliberdade, pelo cometimento de atos infracionais. Desse total,

1.310 jovens cumprem medida socioeducativa de internação nas unidades do

DEGASE, revelando uma prevalência da escolha da privação de liberdade como

medida a ser aplicada pelo Juízo da Infância e Juventude.

Desta maneira, pode-se pensar, que o Estado promove mais políticas de

internação do que programas que aceleram o processo de afirmação de direitos

básicos (educação, saúde, profissionalização, arte, cultura e lazer). Isso sugere

características de um sistema, assistido pelo poder judiciário, que abusa do poder

punitivo estatal ao invés de afastar a punição.

Isso sugere características de um sistema de justiça, assistido pelo poder

judiciário, que abusa do poder punitivo estatal ao invés de afastar a punição,

caracteristicas de um modelo inquisitorial. Neste ponto, o trabalho trouxe o

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debate sobre a defesa desses adolescentes como garantia de direitos

fundamentais dos mesmos.

A metodologia deste resumo é mista, por se tratar de uma pesquisa teórica –

onde busquei esgotar as referências bibliográficas sobre o tema, tanto na área

do direito quanto da sociologia, bem como, de uma pesquisa quantitativa, onde

utilizei pesquisas realizadas por órgãos do governo federal e do Estado do Rio de

Janeiro, por exemplo, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ e DEGASE/RJ, para

ilustrar a atual realidade dos jovens em conflito com a lei que estão inseridos no

sistema socioeducativo.

Dentre os resultados encontrados, destacam-se a participação mitigada da

defesa ao longo do processamento, mais medidas de internação que medidas

alternativas e a presença de um sistema acusatório com características

inquisitoriais.

11. EXPERIÊNCIAS HUMANAS NO TEMPO: CRIMINALIZAÇÃO OU PROTEÇÃO AO

"MENOR DE IDADE" NOS ANOS 20

Autora: Érica Oliveira Fortuna

Resumo:

O objetivo deste artigo é investigar a produção de sentidos que criminalizam o

“menor de idade” na década de 1920, sob a perspectiva de mediação dos veículos

de comunicação. Fixaremos nosso olhar na cobertura jornalística do jornal A

Manhã sobre casos de violência urbana que envolvam jovens e meninos, tanto

acusados quanto vítimas dentro do construto narrativo. Utilizamos como

metodologia a análise de narrativas, com autores que nos ajudem a observar a

história da comunicação atravessada pela criminologia. Nesse sentido, será

necessário nos debruçarmos sob os estudos de Paul Ricoeur (1994) e Fernand

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Braudel (1992), buscando entender o conceito de temporalidade que nos remete

a história de curta e longa duração. Já por uma perspectiva criminológica,

utilizaremos a “criminalização”, nos moldes oferecidos por Zaffaroni e Nilo

Batista (2003), além do diálogo com Vera Malaguti (2014), Howard Becker (2008)

e Michel Misse (2008). Concentramos nossa análise nas reportagens dos anos de

1926, 1927, 1928 e 1929 do jornal A Manhã. Analisaremos a construção narrativa

do jornalismo que mediou a criminalização do “menor de idade” na década em

que ocorreu o “boom” do jornalismo sensacionalista, de acordo com Marialva

Barbosa (2008). O estudo parte da hipótese que experiências humanas foram

mediadas pela comunicação e colocadas no tempo, criminalizando e

contribuindo para que leis fossem estabelecidas com o aparente objetivo de

proteger o “menor”. Problematizar as matérias do jornal A Manhã, publicadas na

década de 1920 se mostra importante, pois no ano de 1927 fora promulgada a

primeira lei específica que abarcaria a proteção de crianças e adolescentes: o

Código de Menores do Brasil. Acreditamos que o processo cíclico das narrativas

jornalísticas gera uma sensação de medo que auxilia na estigmatização do jovem

“menor de idade” negro e pobre como “bandido”. Dessa forma, há uma

construção de narrativas jornalísticas que reforça sobremaneira esse processo,

“aprisionando” o jovem no ciclo de violência que ocorre em nossa sociedade.

Graves questões sociais não são problematizadas, dando a ver que elas são

discursivamente reduzidas a “problema”, “solução” e suposta “proteção” quando

o assunto é legislação da criança e do adolescente. As reportagens dão pistas do

que a sociedade compreende por violência e quais as suas necessidades que

reverberam em processos de endurecimento de penas. Este gesto de

interpretação se afina a interesses políticos, apontando para a centralidade do

jornalismo sobre as possíveis soluções na contenção de crimes que “afetam” a

cidade. A pertinência temática ao GT Justiça juvenil se mostra evidente, uma vez

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que o artigo ilumina as complexidades do passado para entender esse construto

de criminalização e seletividade que etiqueta o jovem negro e pobre,

problemática cara ao nosso país.

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GRUPO DE TRABALHO 10: DEMOCRATIZAÇÃO DO SISTEMA DE JUSTIÇA

Ementa: A transição da ditadura para um regime baseado em uma “Constituição

cidadã” colocou o direito, os direitos e as instituições responsáveis por sua

efetivação no centro dos processos políticos e de mobilização social dos últimos

40 anos. Por outro lado, a persistência de problemas de acesso à justiça civil e de

seletividade da justiça criminal, somados ao crescente protagonismo judicial no

contexto de crise, suscitam questionamentos sobre os projetos de reforma e

democratização da justiça formulados nas últimas décadas. O objetivo deste

Grupo de Trabalho é abarcar pesquisas e debates sobre reformas e políticas

judiciais; acesso à justiça; experiências de democratização da justiça; formas

alternativas de solução de conflitos; seleção, organização e politização das

carreiras jurídicas; e controle social das instituições judiciais.

Coordenador Prof. Dr. Frederico de Almeida

Bacharel em Direito, Mestre e Doutor em Ciência Política pela USP. Professor do

Departamento de Ciência Política e do Programa de Pós-Graduação em Ciência

Política do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP. Coordenador

do PolCrim - Laboratório de Estudos em Política e Criminologia da UNICAMP e

pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Estudos sobre

Estados Unidos (INCT-INEU). Coordenador-chefe do Departamento de

Monografias do IBCCRIM. Lattes: http://lattes.cnpq.br/3248067565648091

Coordenadora Ms. Elizabete Pellegrini Garcia

Advogada, mestra e doutoranda em Ciência Política pela UNICAMP. Integrante

do PolCrim - Laboratório de Estudos sobre Política e Criminologia da UNICAMP.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/3741722585131108

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Trabalhos:

1. DEFENSORIA PÚBLICA, ESTADO CAPITALISTA E DISCURSO JURÍDICO-PENAL:

LIMITES A UMA EMANCIPAÇÃO LIBERTÁRIA

Autor: André Vaz Porto Silva

Coautora: Fernanda Cavalcanti Costa

Resumo:

Pensar a democratização do Sistema de Justiça é tarefa que não permite ignorar

a complexidade da articulação de interesses que caracteriza o Estado como uma

relação de forças, atravessado por lutas e contradições da sociedade (O’Donnell,

1978). O sistema de justiça criminal, especificamente definido por Pachukanis

como “terror de classe organizado” (2017, p. 172) exerce a forma mais grave de

constrição sobre os corpos e almas humanas, com especial peso sobre os

vulneráveis, dada a conhecida e comprovada seletividade do sistema penal.

Em um sistema político que tem na forma jurídica um instrumento de dominação

e opressão, a reflexão acerca do papel dos excluídos como agentes

transformadores desse quadro é ao mesmo tempo imprescindível e desafiadora.

Como interferir, como criar e integrar espaços de decisão na sociedade, como

ditar os rumos da própria história são questões que se colocam, sobretudo em

um contexto histórico de ruptura constitucional, que tem sido marcado pela

aniquilação de direitos básicos dos indivíduos.

Os discursos criminológicos que pairam no âmbito do Estado seguem a mesma

lógica dos interesses que o atravessam, se superpõem, conflitam entre si e

podem ser manipulados pelo poder político à medida de suas necessidades. A

materialização de tais discursos – tidos aqui como formadores de uma “teia de

representações ideológicas”, que sustenta a “normatização da repressão e do

controle social” (Neder, 2012, p. 20) – se exerce por construção de diversas

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agências (Alagia, et al., 2003): midiática, universitária, entre outras. Tem papel

central a atuação dos mais diversos órgãos estatais diretamente ligados à punição

criminal, tais como polícias, Ministério Público e Magistratura.

Contudo, existe um órgão relacionado ao punitivismo, mas estrategicamente

orientado à sua redução: a Defensoria Pública. A seletividade do sistema penal,

evidencia que sua clientela preferencial é composta massivamente por assistidos

desta instituição estatal, conforme atesta o perfil da população carcerária

brasileira acima apresentado.

A ascendência do neoliberalismo no Brasil, coincidente com a

constitucionalização da Defensoria Pública e o período democrático, trouxe

consigo o recrudescimento do punitivismo, com a elevação exponencial das taxas

de encarceramento em um sistema penal já historicamente brutalizado. Chama

atenção, portanto, que a introdução no ordenamento e o processo de

estruturação da agência estatal sob estudo tenham sido paralelos a esse

fenômeno. Nesse sentido, faz-se necessário verificar eventuais descompassos

entre, por um lado, o prestígio constitucional da instituição estatal e, por outro,

as limitações a seu potencial para induzir mudanças efetivas na sociedade,

principalmente no que tange à solidez do discurso jurídico-penal dominante. A

pesquisa busca investigar as razões de fundo dessa contradição sob a

perspectiva, ao início desse resumo assinalada, da insuficiência das lutas travadas

no interior do Estado para fins de uma emancipação efetiva, ainda que veiculadas

por aparelhos destinados especificamente ao exercício da contra-hegemonia.

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2. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA E SISTEMA ACUSATÓRIO: LIMITES E POSSIBILIDADES

A PARTIR DA ANÁLISE DA ATUAÇÃO DOS ATORES JURÍDICOS NA CIDADE DE

SALVADOR-BA

Autora: Camila Ribeiro Hernandes

Coautor: Lucas Vianna Matos

Coautora: Ana Luisa Leão de Aquino Barreto

Resumo:

A audiência de custódia foi introduzida no ordenamento jurídico brasileiro a

partir da promulgação da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e o

Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas. O instrumento

só seria regulamentado, contudo, no ano de 2015, através da Resolução n. 213

do CNJ, possuindo dois objetivos declarados: diminuir a quantidade de presos

provisórios no país e combater a cultura de violência institucional no interregno

entre o flagrante e o encaminhamento do conduzido à unidade prisional. A partir

dessa perspectiva, cria-se um momento processual, em tese marcado pela

oralidade, qualificando o contraditório e a possibilidade de defesa em torno da

legalidade da prisão em flagrante e da possibilidade/necessidade de prisão

cautelar.

A análise da audiência de custódia em uma perspectiva crítica exige um exercício

epistemológico de desconfiança em relação à potência garantidora de inovações

processuais. Essa postura parte da reconhecida capacidade do poder punitivo em

operar inversões ideológicas em institutos abstratamente limitadores, que, em

última análise, acabam contribuindo para a ampliação das malhas de punitividade

e controle. Nesse contexto, este trabalho apresenta uma análise da atuação dos

atores jurídicos que operacionalizam as audiências de custódia, a partir da

ancoragem empírica do Núcleo de Flagrantes de Salvador-Ba.

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O trabalho se relaciona com o GT 10 (Democratização do Sistema de Justiça) na

medida em que visa problematizar as tensões entre a perspectiva acusatória e as

interações dos atores jurídicos envolvidos, compreendendo a centralidade

dessas dinâmicas para avaliação das possibilidades e limites do instituto. O artigo

parte de base documental coletada no âmbito de pesquisa realizada pelo

Instituto Baiano de Direito Processual Penal, com coordenação acadêmica dos

autores: 590 decisões proferidas em sede de audiência de custódia dos meses de

janeiro, junho e dezembro de 2016, em autos de prisão em flagrante envolvendo

crimes de tráfico de drogas, roubo e/ou furto. A partir de análise exploratória

foram construídas as variáveis da investigação: presença ou não de cada um dos

atores jurídicos mencionados nas audiências, os pedidos principais formulados

pelas partes, a correlação entre pedidos e decisões, os fundamentos das decisões

e o resultado da audiência em relação à situação prisional do acusado.

Dentre as problemáticas identificadas, a pesquisa evidenciou a realização de

audiências de custódia sem a presença do Ministério Público, tendo sido,

contudo, na ampla maioria dos casos, aplicadas medidas cautelares em desfavor

das pessoas conduzidas. Ademais, o confronto entre o resultado das audiências

de custódia e os pedidos formulados pelo órgão acusatório sugere uma

vinculação constante entre as duas variáveis, ensejando a necessidade de

aprofundamento das reflexões quanto ao efetivo potencial da defesa em

influenciar na decisão proferida ao final do ato.

A partir desse caminho de pesquisa empírica, a investigação propõe uma

abordagem metodológica capaz de complexificar a análise das audiências de

custódia, produzindo resultados quantitativos em torno das questões levantadas,

além de análise qualitativa do conteúdo discursivo das decisões. Dessa forma,

objetiva-se contribuir com o debate acadêmico em torno das possibilidades,

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desafios e limites do instituto como vetor de democratização do processo penal

brasileiro.

3. APROXIMAÇÕES ENTRE COMPORTAMENTO DECISÓRIO E O PERFIL DO

JULGADOR: UMA ANÁLISE A PARTIR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ

Autora: Maria Eugenia Trombini

Resumo:

Este trabalho busca investigar em que medida o perfil do decisor afeta o

comportamento decisório. A intenção que se coloca é fugir de soluções guiadas

pelos ideais de justiça e de direito que supõem a desinstitucionalização do

Judiciário e diagnosticar o perfil das câmaras criminais do Tribunal de Justiça do

Paraná. Esse objetivo se alinha com a literatura sobre a tomada da decisão judicial

sociológica e com o reconhecimento de que o julgador pode ser tratado com uma

pessoa ordinária, sujeita à ação de variáveis internas, de ordem pessoal, e

externas, contextuais, na hora de decidir. (PRITCHETT, 1940; SPAETH, 1979;

ULMER, 1960; NAGEL, 1961; HART, 1961)

Partindo da teoria realista da tomada da decisão judicial, e observando os habeas

corpus em matéria de tráfico de drogas julgados pelas câmaras criminais do

Tribunal de Justiça do Paraná de 2013 a 2016. A partir da análise jurisprudencial

de decisões sobre um crime de baixo capital social o objetivo específico do

trabalho é investigar como formação e carreira orientam o posicionamento dos

magistrados e como reagem à concessão de liberdade provisória aos acusados

por tráfico. Como a tendência majoritária dos tribunais brasileiros é determinar

que o suposto traficante de drogas permaneça encarcerado no curso da ação

penal, a posição daqueles juízes e juízas que decidem pela liberdade

possivelmente se explica a partir de variáveis não legalistas, considerando que as

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regras de Direito são as mesmas (Código Penal, Código de Processo Penal, Lei de

Drogas).

As características sociodemográficas, acadêmicas e de carreira dos indivíduos são

os atributos mobilizados na presente investigação, alinhada à corrente

sociológica do comportamento judicial. A variância nos votos foi discutida com o

auxílio de categorias de decisões e tipos de decisores.

Do total do corpus, 280 ordens foram denegadas, ou 94%, e apenas 19,

correspondente a 6% dos habeas corpus, concedidas. Em menos de metade da

amostra das decisões denegatórias (45,7%) os julgadores se debruçaram sobre a

possibilidade de substituição da prisão por cautelares alternativas (Artigo 319 do

Código de Processo Penal). Apesar do posicionamento do Ministério Público em

favor da concessão da ordem, ou seja, de que o acusado fosse posto em

liberdade, em 26 julgados os desembargadores foram pela manutenção da

prisão, confirmando a reticência dos julgadores prevista na formulação da

pergunta de pesquisa.

A análise da produção decisória demonstra que na maioria dos casos a

quantidade de droga apreendida é baixa e os acusados primários, as

circunstâncias do fato e do réu não parecem ser os aspectos mais relevantes para

a manutenção da prisão. A “garantia da ordem pública”, por outro lado, conceito

carregado de abstração, aparece como um ponto comum entre as decisões

denegatórias, e o principal fundamento para justificar a segregação cautelar.

Os resultados encontrados demonstram que os julgadores recrutados no Estado,

frequentadores das instituições de elite da capital, com carreiras monolíticas

estão mais inclinados a reproduzir a orientação normativa do tribunal do que

colegas de origem regional diversa e trajetórias menos ortodoxas. Juízes

substitutos e mulheres, duas minorias no universo da corte, orientam seu

comportamento segundo a utilidade reputacional, estando mais vulneráveis a

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sofrer pressão em sua performance e menos inclinados a divergir da tendência

majoritária.

4. A (IN) EFETIVIDADE DO DIREITO DE MANIFESTAÇÃO E O SISTEMA DE JUSTIÇA

CRIMINAL: UMA ANÁLISE DA ATUAÇÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

EM CONFLITOS OCORRIDOS EM PROTESTOS

Autora: Mariana Pinto Zoccal

Resumo:

As manifestações que eclodiram em junho de 2013, a princípio lideradas pelo

Movimento Passe Livre, buscaram romper com a passividade de uma conjuntura

de “inferno urbano” caracterizada pelo sucateamento do ensino e da saúde

pública, o aumento do desemprego, a precariedade do acesso ao lazer e ao

transporte público, bem como reivindicar uma real efetivação do direito à cidade.

A partir de então, uma conjuntura favorável à mobilização de massas instaurou-

se no Brasil, de modo que protestos encampando uma vasta diversidade de

pautas, nos espectros políticos da esquerda e da direita, passaram a ser

comumente observados nas ruas do país.

Ocorre que manifestantes que reivindicam pautas críticas e avessas aos

interesses das classes hegemônicas passaram a figurar como vítimas de um

truculento processo de criminalização orquestrado pelo Estado. Inúmeras

práticas vem sendo implementadas em âmbito dos poderes Executivo, Legislativo

e Judiciário com o objetivo de cercear o exercício do direito de protesto.

O presente trabalho pretende realizar uma análise de acórdãos e decisões

monocráticas proferidas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em incidentes

posteriores a junho de 2013 ocorridos em manifestações, utilizando-se do

método da análise de discurso, que busca estudar as motivações, atitudes,

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valores, crenças e ideologias existentes nos textos que, à simples vista, não se

apresentam claramente expostos. Buscar-se-á perceber as contradições entre

determinadas falas oficiais e a realidade política e social que permeia os textos

dos documentos analisados.

Segundo consta no relatório “Nas ruas, nas leis, nos tribunais”, produzido pela

ONG Artigo 19, as principais tipificações penais utilizadas pelo Judiciário para

deter manifestantes são: dano ao patrimônio público e privado, perturbação da

ordem pública, vandalismo, resistência, desacato, desobediência, corrupção de

menores, preparativos para ação incendiária, porte de armas brancas, esbulho

possessório, associação criminosa, dano qualificado e simples na forma tentada,

injúria, incitar a invasão de prédio público e invasão de domicílio, etc.

Tem-se por hipótese de pesquisa o latente afastamento do Judiciário de sua

função precípua de salvaguarda da Constituição, haja vista a sua conivência em

face da prática das “prisões para averiguação” comumente denunciadas por

manifestantes, das arbitrariedades cometidas pelas polícias militares durante a

cobertura de atos de protesto, o acolhimento de denúncias sem o devido lastro

probatório em face de manifestantes, que por sua vez culminam em sentenças

condenatórias e em recursos a serem julgados pelos tribunais do país.

O presente trabalho, em consonância com a temática deste GT, irá dispor sobre

a urgência de tornar o Judiciário um poder de fato democrático, de modo que ele

seja capaz de alocar vozes e demandas de diferentes movimentos, como os

feministas, LGBTs, negros e operários, julgando seus conflitos de forma sensível

e humana.

Deve-se, portanto, alterar o paradigma de exceção vigente, que criminaliza as

vozes e demandas destas minorias, pois são elas que atuam rumo à construção

de um projeto emancipatório de sociedade e que lutam, por meio do exercício

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do direito de protesto, pela efetivação de princípios como os da equidade e da

liberdade em nossa conjuntura política, social e econômica.

5. O PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA NO BRASIL: O PRAGMATISMO DA

JURISPRUDÊNCIA E O DISCURSO DO FUTURO MELHOR

Autor: Mauro Guilherme Messias dos Santos

Resumo:

A pesquisa objetiva reunir os principais argumentos trabalhados na última

década pelos ministros do STF em seus votos acerca da (in)validade da execução

da sentença penal condenatória confirmada em segundo grau, submetendo tais

ponderações ao crivo da doutrina, especialmente da Teoria do Direito, e

analisando qual concepção do direito o STF vem adotando no enfrentamento dos

controvertidos argumentos tangentes à aplicação do princípio da não

culpabilidade. A primeira questão teórica envolvida reside na conceituação do

princípio da presunção de inocência (FERRAJOLI, 1995, p. 539), inclusive o seu

desenvolvimento ao longo da história (LOPES JR., 2016, p. 95), sem olvidar a

abordagem da proteção internacional que lhe é dada (RAMOS, 2014, p. 434), a

sua compreensão como regra probatória e regra de tratamento (LIMA, 2016, p.

20) e as considerações tecidas acerca da exigência, desde a Assembleia Nacional

Constituinte, do trânsito em julgado para a formação da culpa penal. Uma

segunda etapa teórica perpassa a exposição das interpretações conferidas pelo

STF ao princípio do estado de inocência, especialmente na última década,

referenciando os principais argumentos a favor e contrários à execução

antecipada da pena após julgamento em segundo grau, sobretudo a partir do HC

nº 84.078/MG, em 2009, do HC nº 126.292/SP, em fevereiro de 2016, das ADCs

nº 43/DF e 44/DF, em outubro de 2016, da ARE RG nº 964.246/SP, em novembro

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de 2016, e do recente HC nº 152.752/PR, em abril de 2018. Por fim, como terceira

questão teórica abarcada, o trabalho introduz a crítica da doutrina, sobretudo da

Teoria do Direito, ao teor dos votos proferidos nos julgamentos acima,

investigando especialmente os vícios do pensamento pragmático contido em

muitos deles, promitentes de um futuro melhor, sobretudo aqueles de cunho

político e temente à opinião pública, como preconizado por Posner (2010, p.

280), contrários à visão de Dworkin (2010, p. 105-106) do direito como

integridade. Vale também destacar, em sede de apontamentos centrais, que

vários ministros do STF, desbordando os lindes jurídicos, ao serem acometidos

por apelos de ordem política, têm utilizado argumentos pragmáticos como razão

de decidir (STRECK, 2018, p. 3). Dito isso, apresenta-se a metodologia da presente

pesquisa como teórico-prática (MEZZAROBA; MONTEIRO, 2009, p. 116), pois

busca, num primeiro momento, promover uma revisão bibliográfica e solidificar

um modelo teórico capaz de explicar determinado fenômeno, a fim de que,

posteriormente, seja viável verificar, na prática, o alcance da sugestão teórica.

Por fim, como principal conclusão do trabalho, tem-se que a maioria dos

ministros do STF, sobretudo a partir do HC nº 126.292/SP, vem adotando uma

concepção pragmática do direito, em decisões que negam à pessoa humana a

garantia constitucional do trânsito em julgado para o afastamento da presunção

de não culpabilidade, com nítidas consequências para o acesso à justiça,

sobretudo às pessoas mais vulneráveis. Daí resulta a pertinência temática ao GT

escolhido: o contexto de crise política vivida no país tem cobrado do STF um

verdadeiro protagonismo judicial, uma atitude pragmática por parte do tribunal,

que, ao ceder a tais apelos, tem limitado o acesso à justiça.

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6. ATIVISMO JUDICIAL, INQUISITORIEDADE E VIOLAÇÃO AO NÚCLEO ESSENCIAL

DE GARANTIAS FUNDAMENTAIS PROCESSUAIS PENAIS: UMA ANÁLISE DA

ATUAÇÃO DO STF NOS 30 ANOS DA ATUAL CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA

Autor: Thiago Allisson Cardoso de Jesus

Coautor: Nereu José Giacomolli

Resumo:

Mentalidade inquisitória, ativismo e mitigação de garantias fundamentais no

processamento criminal pelo STF no contexto dos 30 anos da Constituição

Brasileira, 70 anos da Declaração Universal dos Direitos do Homem e 10 anos das

grandes reformas processuais penais. Considerando o processamento criminal

como uma faceta da política criminal (FERNANDES, 2001) desenvolvida pelo

Estado Brasileiro, dito democrático de Direito e marcado por um intenso conflito

de ideologias (REALE, 2010) no contexto visto como de redemocratização do país,

analisa-se a efetivação das garantias fundamentais processuais penais, vistas

como medidas de contenção do poder punitivo (BARBOSA, 1995; GIACOMOLLI,

2016; STRECK, 2012) a partir da atuação recente do STF, verificando eventuais

descompassos com a axiologia constitucional e compromissos, alguns declarados

e outros não, com as lógicas e racionalidades fundantes das mentalidades e

sistemas processuais penais inquisitivos, experimentados e fomentadores de

diversas marcas e sofrimentos nos regimes ditatoriais, supostamente

suplantados. Faz uso de metodologia pautada na sociologia reflexiva (BOURDIEU,

2012; FOUCAULT, 2010, 2012), com pesquisa exploratória de abordagem

qualitativa, e das técnicas para pesquisa documental, bibliográfica, análise de

conteúdo e de discurso. O problema de pesquisa gira em torno das relações em

torno das mitigações de garantias fundamentais, elegendo a ampla defesa e o

Estado de Inocência para análise, considerando o legado ditatorial e a

permanente eleição de inimigos públicos (ZAFFARONI, 2011); a espetacularização

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do processo penal (DEBORD, 2000) e a cultura punitivista contemporânea em

números e dores; e a busca por legitimidade (SCHMITT, 2007) democrática do

Poder Judiciário, que ativista (RAMOS, 2010) reconstrói conceitos jurídicos

processuais penais de historicidade e precisa epistemologia mitigando conteúdos

essenciais de diversas garantias, nesses tempos de descrédito (FGV, 2016),

práticas endêmicas de corrupção e de crise do monopólio estatal do direito de

punir ante a formação de microfocos de poder paraestatal, insurgências da

vingança privada e do fenômeno dos linchamentos (JESUS, 2016). Além da

introdução, divide-se em duas seções e ao final considerações conclusivas com o

fito de contribuir com o debate e com a visibilidade da temática aqui

problematizada, demarcando, sobretudo, a necessidade de rever os

fundamentos epistemológicos da atuação judiciária em ambientes declarados

constitucionalmente como democráticos, realçando a técnica, o compromisso

com a axiologia constitucional de proteção à pessoa em conflito com a lei e a

efetivação de um juízo (e tessitura social) de garantias e racionalidade

humanitária.

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