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@QU@RIUM A Cadeia de Ilhas de Króton Bleeds A Cadeia de Ilhas de Króton Bleeds A Cadeia de Ilhas de Króton Bleeds A Cadeia de Ilhas de Króton Bleeds Paloma Ortega Paloma Ortega Paloma Ortega Paloma Ortega LIVRO I

Aquarium - Paloma Ortega

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Pippa, Eron e Mel embarcam na maior aventura de suas vidas após o desaparecimento misterioso de seus pais e um encontro nada habitual com uma criatura mitológica que vive próximo a eles, um rabugento e sábio leprechaun morando em um sistema de esgoto de um beco no Rio de Janeiro. Os irmãos Cury conhecerão a dimensão de Aquarium e cada uma de suas sete ilhas, que abrigam seres espetaculares e mistérios assombrosos. Juntos, precisarão enfrentar inumeráveis perigos e desvendar os segredos por trás do desaparecimento dos pais, descobrindo a si mesmos e o valor da família em suas vidas.

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Paloma OrtegaPaloma OrtegaPaloma OrtegaPaloma Ortega LIVRO I

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@QU@RIUM@QU@RIUM@QU@RIUM@QU@RIUM A Cadeia de Ilhas de Króton Bleeds

1ª edição São Paulo 2014

Paloma Ortega

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Ilh[ B[guroo — Capítulo 9

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Este livro é dedicado ao meu pai, à minha mãe, minha

família e meus amigos. Sem vocês, ainda estaria presa no Bosque Infinito.

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SUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIO

Capítulo 1...........O começo de tudo.....................................................................7

Capítulo 2...........Meus pais desaparecem misteriosamente................................19

Capítulo 3...........Nosso novo amigo Sophos......................................................31

Capítulo 4...........Ilha Minimim...........................................................................48

Capítulo 5...........Nós quase fomos devorados....................................................65

Capítulo 6...........Uma visita à Ilha Azul..............................................................80

Capítulo 7...........A Batalha do Sétimo Céu........................................................94

Capítulo 8...........Como um passo de mágica....................................................114

Capítulo 9...........Um elfo é o nosso protetor....................................................127

Capítulo 10.........O Bosque Infinito..................................................................141

Capítulo 11.........A Árvore da Razão.................................................................152

Capítulo 12.........O néctar da verdade...............................................................169

Capítulo 13.........Lázuli......................................................................................182

Capítulo 14.........Eu me torno o acessório de um gigante................................197

Capítulo 14.........Descubro um sombrio destino..............................................210

Capítulo 16.........A pérola de Syreni.................................................................221

Capítulo 17.........O Espelho da Consciência.....................................................240

Capítulo 18.........Pegando fogo..........................................................................254

Capítulo 19.........O pântano dos Kribits............................................................268

Capítulo 20.........O destino se cumpre..............................................................283 Algumas curiosidades sobre o enredo...............................................................304

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― Capítulo 1 ―

o começo de tudo

Liembro-me muito bem de quando despertei uns minutos antes do

alarme tocar. Abri lentamente os olhos, visualizando o sol que nascia através da janela. Olhei o relógio. Eram 05h55min. Faltavam apenas cinco minutinhos para o alarme soar, com aquele barulho irritante de todas as manhãs.

Vi-me na cama pensando novamente naquele pesadelo, que se repetira por três dias seguidos. Pela primeira vez em muito tempo não acordei assustada, com o coração acelerado e a terrível agonia no peito. Era como se alguém ou alguma coisa quisesse me avisar de algo.

No sonho, eu via meus pais sendo levados por uma sombra enorme. Não era sólida, era como uma fumaça negra que deslizava sobre eles e os arrancava do chão. Eu tentava desesperadamente salvá-los, correr atrás deles ou gritar seus nomes, mas tudo em vão. Minha mãe insistia em repetir uma frase, antes do sonho finalmente se dissipar, mas por mais que eu me esforçasse, eu nunca conseguia ouvi-la claramente. Ao final, me via só numa rua deserta. Tão deserta que nem mesmo havia sinais da fumaça negra daquela criatura funesta que levara meus pais. Eu tinha lágrimas nos olhos e o terror me dominava.

Meus pensamentos foram interrompidos pela minha mãe, que abria a porta silenciosamente.

— Pippa, acorde! Já está na hora de ir para a escola. Eu não respondi. Fazia já muito tempo que eu adotara um aspecto rebelde

e ignorante. Tratava minha mãe e meu pai com muita arrogância, meus irmãos

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também eram atingidos. Eron era a pior vítima disso tudo, eu descontava as minhas frustrações e raivas nele. Brigávamos mais do que cão e gato.

Minha mãe, Mary Anne, era uma linda mulher de quarenta anos, de cabelos encaracolados e louros. Seu nome era em homenagem à minha bisavó, que era norte-americana. Para sua idade, possuía um corpo de adolescente. Era tão calma que quando se irritava eu ficava muito surpresa. Quando ela brigava comigo eu ia para um canto, e ela para outro. Uma hora depois ela voltava para se desculpar. No entanto, depois que mudei o meu jeito e o meu visual, as coisas ficaram obscuras. Nós brigávamos muito e discutíamos quase todos os dias. Eu soltava sempre algumas frases horríveis para ela, e ela rebatia com outras, mas por mais que se esforçasse, ela nunca conseguia ser muito rígida. Era tão doce que era difícil para ela me fazer calar. Um tempo depois, ela desistiu. Tratava-me com aquela calma que me deixava maluca, e ignorava o fato de eu respondê-la tão mal. Ela realmente fingia que eu estava bem e que era aquela garota quietinha e obediente de antes.

— Vamos, Pippa. Você vai se atrasar, querida. — Eu sei muito bem o que pode acontecer, mãe — bufei. Minha mãe desistiu de me entender faz tempo. No início, ela tentava de

todas as maneiras possíveis para que eu voltasse a ser aquela menininha meiga e tímida de antes, mas nada mudou. Meu pai nunca se importou muito, dizia que era só uma fase e que tudo isso iria passar. Os dois estavam muito errados.

Eu admito que às vezes sentia falta daquela menina, sonhadora e iludida, que ninguém conhecia e ninguém se importava.

Ninguém legal falava comigo na escola. Quando se referiam a mim, era apenas para debochar do meu jeito quieto e inventar apelidos maldosos. Não gostava de mim daquela maneira, sempre fugindo das pessoas e me tornando cada vez mais antissocial. Eu descobri um jeito de não precisar mudar de escola para mudar de vida. Se o meu jeito não agradava e não me tornava popular na escola, era só mudá-lo. Simples assim. E foi o que fiz.

Enfrentei todos os meus medos, todas as vergonhas, e comecei a conversar com algumas pessoas da minha escola. De início, pensei que isso tudo seria em vão, mas as poucas amizades que fiz me apresentaram novas pessoas. E assim, eu fui fazendo cada vez mais amizades, até ficar conhecida na escola como Cury, meu sobrenome.

A menina doce, Pippa, de olhar ingênuo, dava lugar à Cury, a rebelde. Fiquei ausente por muito tempo. Diziam que era só uma fase, mas o tempo passava e eu gostava cada vez mais a sensação de ser conhecida e adorada por

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todos. Não larguei minha personagem, cheguei a acreditar que aquela era eu de verdade.

Os meninos começaram a me cortejar, as meninas me respeitavam e gostavam de mim. De garota invisível eu me tornei a menina mais conhecida da escola.

Mais uma vez a minha mãe gritou: — Pippa, você não me ouviu? Eu já me apressava a levantar da cama e vestir o uniforme da escola. Vesti

a blusa branca e justa do colégio, que tinha o símbolo e o nome da escola: Colégio Sócrates.

Peguei os tênis All Star e as meias. Minha mãe me chamava mais uma vez e eu respondia o clássico Já vou, mãe! Só que ele sempre soava mais rude do que eu queria que fosse. Rapidamente, eu desci as escadas ainda com as meias na mão. Minha mãe preparava o café da manhã, enquanto o meu irmão quase dormia apoiado na mesa da cozinha.

Meu irmão, Eron Cury, tem doze anos e uma aparência meiga e simpática. Mas não é bem assim que eu o vejo. Para mim, ele é uma pessoa infernal quando se convive, mas que não vivemos sem. Quem tem irmãos ou irmãs sabe exatamente do que estou falando. Engraçado como uma pessoa com quem você tem brigas frequentes e, muito coincidentemente, é a maior causa das suas dores de cabeça, pode ser uma das pessoas que você mais ama no mundo.

À mesa havia um pote de margarina, um de manteiga, geleias de diversas cores e sabores. Pães fresquinhos estavam sobre a mesa ao nosso dispor. Minha mãe já terminara de preparar um suco de laranja para mim e um copo de leite para o meu irmão. Sentei-me e tentei ser educada.

— Alguém pode me passar a geleia de morango? — perguntei. — Por que você não se levanta e pega? — meu irmão respondeu. — Basta dizer a palavrinha mágica! — disse minha mãe com um sorriso. Respirei fundo e tentei não enterrar minhas unhas na palma da mão. — Será que dá para alguém passar a droga da geleia? Eu não estava muito a fim de pedir “por favor” para minha mãe. Eu estava

tentando ser educada ao máximo, mas não estava dando muito certo. “Que tal uma gentileza de vez em quando?” Certo, eu fazia gentilezas de vez em quando, mas tem horas que meu irmão consegue me tirar do sério com poucas palavras. E essa era uma dessas horas.

— Você deveria aprender a pedir “por favor” — minha mãe ponderou, calmamente.

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— E você deveria concorrer ao recorde de Mãe mais lenta do mundo no quesito “passar o pote de geleia para a filha no café da manhã”.

Eu tomei o último gole do suco de laranja e me levantei sem comer nada. Apanhei minha mochila que estava em cima do sofá e desci as escadas do prédio. Eu não estava com fome mesmo, resmunguei para mim mesma. Quando desci, o porteiro me abordou com o “Bom dia!” alegre de sempre. Eu não respondi. Esperei que ele abrisse o portão automático preto que havia na saída do prédio e saí.

Meu prédio era situado em uma rua de paralelepípedos pouco movimentada e muito agradável. Havia pequenas árvores na calçada, com uma distância de pouco mais de cinco metros entre elas. E eu, como de costume, estava caminhando de punhos cerrados, odiando o amanhecer com todas as minhas forças. Isso porque o sol já despontava atrás do morro, anunciando mais um dia quente de verão.

Para ser sincera, minha cidade era conhecida por ter um “calor infernal”. Por ser carioca, eu deveria supostamente gostar de ir à praia para deitar sobre uma canga e me deixar fritar ao sol enquanto a sensação térmica ultrapassa os quarenta graus. No entanto, eu não era muito fã de me sujar de areia e me sentir literalmente um bife à milanesa. Eu esperava ansiosamente pelos dias frios, só para que eu pudesse vestir minha jaqueta de couro.

Apesar disso, depois que eu atravessava os portões da escola, sentia que finalmente estava em meu território. Ali era o lugar onde todos reconheciam a minha existência e, mais importante: onde também estudava o garoto por quem eu era apaixonada.

Cristhian era o menino mais bonito da escola. Eu tinha uma atração secreta por ele desde que eu era apenas a nerd que sentava na primeira fileira. Naquela época, talvez apenas uma pequena porcentagem dos meus colegas de classe soubessem meu nome. Viviam me chamando de “Pi-alguma-coisa” ou zombando do meu apelido. Embora meu nome seja Priscila, desde que eu era criança todos sempre me chamaram de Pippa.

Entre tantas ofensas cruéis, Cris foi o único que jamais disse uma palavra sobre mim. Eu me pergunto se era porque ele não sabia sequer que eu existia e vivia ignorando boa parte das coisas que eu dizia. Sinceramente, aquilo não me incomodava. Ele era tão bonito que eu conseguia perdoá-lo facilmente em meu coração.

Avancei apressadamente pelo portão da escola. Retirei da mochila o meu cartão escolar, que era preciso passá-lo todos os dias para registrar presença. Nele, a foto 3x4 estava totalmente apagada e com um colante por cima, para

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ninguém relembrar a antiga menina besta que eu era. Entrei e logo vi o gramado da escola, bem verde e cheio de flores. Era primavera.

O Colégio Sócrates era uma escola particular muito bem estruturada. Possuía ótimos professores e uma base de ensino sólida e eficiente. Havia duas quadras, duas piscinas — uma pequena para as crianças e uma grande para os adolescentes —, uma biblioteca, uma cantina com lanches maravilhosos e um grande refeitório. Havia muitas salas, seja no térreo ou nos três andares do outro prédio. Era uma escola enorme. Tínhamos também um lugar para jogar pingue-pongue e sinuca e uma sala de informática para acessar a internet.

A minha parte favorita eram os jardins. Na hora do recreio eu saía com as minhas amigas e perambulava por entre árvores floridas que lá havia, alimentando as tartarugas e devorando o croissant da cantina.

Conversávamos principalmente sobre garotos, o que com as minhas antigas amigas seria impossível. É claro que é bom ser uma menina estudiosa, mas a vida não é só estudar. Minhas notas caíram consideravelmente desde que eu me rebelei, mas ainda estavam boas o suficiente para que eu passasse no exame final. A verdade é que a vida estava muito mais divertida desde que eu conheci a minha melhor amiga, Mayara Fernandes.

Mayara era uma ruiva muito bonita que tinha tantos piercings espalhados pelo corpo que eu não seria capaz de contar. Eu me sentia muito bem com ela, pois através dela pude ter o meu primeiro contato com o sexo masculino na escola. Eu sei que pode parecer besteira, mas para uma garota de quinze anos conhecer garotos é indispensável. Ela conhecia muitas pessoas e logo me apresentou muitas delas. Em uma das nossas primeiras conversas, ela me disse:

— Pippa é um apelido muito esquisito e Priscila é um nome ainda pior. Posso te chamar de Cury?

Eu tentei responder, mas ela foi mais rápida. — Ok. Então, eu vou chamá-la de Cury. Já que eu fui com a sua cara, vou

te dar a honra de poder me acompanhar no recreio. No fundo, eu sabia que ela não era nenhuma flor que se cheirasse, mas eu

não podia arriscar perder toda a popularidade que conseguira até aquele momento.

Fora ela que me apresentara Cristhian. Ela sempre me mantinha informada sobre as garotas com quem ele saía, mas sempre insistia que de quem ele realmente gostava era dela. Por essa razão, jamais confessei meus sentimentos, assim como também omiti o fato de nunca ter sido beijada. Eu tinha medo de parecer idiota, por isso eu acabava me unindo à Mayara nas coisas cruéis que ela fazia. Caçoar dos alunos tornou-se nossa especialidade.

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Certa vez, ela me disse: — Eu sei que Cristhian sempre sai com essas meninas ridículas, mas ele só

tem olhos para mim. — Ele beija todas essas meninas? — perguntei. — Não sei, talvez não todas. Mas algumas ele deve beijar sim. — Credo! — disse. — E você fica com ele mesmo assim? Ela soltou uma gargalhada e me olhou como se eu fosse burra. — Ele escova os dentes, Cury! Vou apresentá-lo a você qualquer dia desses. Assim que conheci Cristhian, meu coração bateu mais forte. Eu me

culpava por me sentir atraída pelo mesmo garoto que Mayara gostava, mas o que eu podia fazer se ele era lindo? E além de lindo, era legal comigo. Coisa que era difícil de acontecer.

Naquele dia eu avistei Mayara me esperando em frente à nossa sala. Ela parecia zangada. Aproximei-me dela e a abracei.

— Mayara, o que houve? Ela me olhou com tristeza. — Não quero ver Cristhian nunca mais! — Por quê? O que aconteceu? — Aquele infeliz me magoou e vai ter que me pagar — ela disse com raiva.

— E você vai me ajudar com isso, é claro. — Eu? — Sim, você. Ainda hoje vamos armar alguma coisa para pegá-lo. Você sabe

o que ele fez? — balancei a cabeça. — Ele simplesmente me dispensou, dizendo que estava a fim de outra garota. Quem será que é a idiota? Não sei, mas acho que deve ser a Carol. Ela sempre chama muita atenção, é bonita e deve ter se aproximado de Cristhian. Como eu pude ser tão burra? Vamos pegá-los hoje.

Eu sentia pena dela, apesar de torcer para que eu fosse a menina que Cristhian estava a fim. Que sonho! Eu sentia pena da Mayara. Ela era uma delinquente e eu sabia disso, mas ele não podia tê-la deixado assim. Quando uma amiga está sofrendo dessa maneira, eu nunca sei o que dizer. Nem para as minhas antigas amigas e nem para ela. Acho que até hoje eu não sei o que dizer.

Não sabia como escolher as palavras, apenas disse: — Vamos pegar a vadia! Naquela tarde eu não pensei muito naquilo, achei que Mayara iria

esquecer rapidinho o que Cristhian lhe havia feito. Mas sempre me engano a respeito dela, e não foi diferente dessa vez. Pela sua expressão, percebi que ela já sabia o que fazer.

— Já sei o que vamos fazer para pegá-lo — disse-me ela.

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— O quê? — perguntei. — Está vendo isso? — ela me mostrou o que pareciam ser... Era isso mesmo? — Drogas! — ela disse. — Vamos colocar na mochila dele e incriminá-lo,

assim ele será expulso e eu não terei que olhar na cara dele nunca mais. — Você está falando sério? — perguntei assustada. — Mayara, você não pode

fazer isso. Isso é muito sério. E se alguém descobrir? Estaremos em apuros! É uma coisa muito grave...

— Já está escolhido. Será este o castigo! — ela me olhou nos olhos. — Você está dentro ou você vai amarelar?

— A briga é entre vocês. Deixe-me fora disso. Mayara ficou irritada. — Você é minha amiga, não é, Cury? — Eu balancei a cabeça

afirmativamente. — Então você vai me ajudar. Amigas são para isso, ajudar umas as outras.

— Isso não é uma ajuda. Está me pedindo para ser cúmplice de um crime! — Um crime? — ela gargalhou. — Fala sério, Pippa! Quem era você na escola

antes de mim? Isso não é um crime, ele merece isso e muito mais. Lembre-se de que eu fiz a sua fama, posso removê-la a qualquer momento. Você é quem sabe, se aceitar me ajudar, encontre-me no jardim perto do pátio daqui a meia hora.

Eu não disse nada. Fiquei boquiaberta. Como ela podia me pedir uma coisa dessas? Drogas são coisas muito sérias para brincar. Eu não queria perder a amiga, e muito menos Cristhian. Achei melhor avisá-lo. Quando o alarme do recreio tocou, fui procurá-lo. Ele estava no jardim sozinho, alimentando uma tartaruga que passava por ali. Fiquei envergonhada de ter que contar isso para ele, mas não pude evitar.

— Cristhian... — Loirinha! — ele disse quando me viu. — Como você está? Ele me chamava de loirinha, o que eu achava muito fofo. Naquele

momento, vi que ele olhava para a minha blusa que estava curta demais e deixava aparecer um pouco da minha barriga.

— Cuidado com essa blusa curtinha — alertou ele. — A inspetora vai te levar para a diretoria se a pegar desse jeito.

— Não gosta da minha blusa? — eu perguntei. Ele hesitou, mas esperei pela sua resposta. — Gosto — ele sorriu. — A inspetora é quem não vai gostar muito.

Cuidado! Eu sorri para ele. — Fique tranquilo, eu sei me cuidar.

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— Aposto que sim — disse ele. — Já que nunca vi ninguém cuidando de você.

— Eu não preciso — disse friamente. — Já sou independente o suficiente. — Mas você não gostaria de cuidar de alguém? Ou então, ser cuidada? — ele

disse, olhando-me nos olhos. Seus olhos acinzentados estavam me olhando, e eu não desviei o olhar. — Talvez — respondi. — Sei que Mayara deve ter lhe dito coisas horríveis sobre mim, mas eu não

sou assim, Cury. Eu só fui sincero com ela. Disse a ela que estava gostando de outra garota. Ela se revoltou, e talvez ela tente fazer alguma coisa...

— Quanto a isso... Ele me interrompeu. — Você quer saber de quem eu estou a fim? — ele me perguntou. Eu devia ir direto ao ponto, falar que Mayara planejava expulsá-lo

colocando drogas na sua mochila. Mas por que eu não falava? As palavras não saíam da minha boca. Eu estava com medo de trair minha amiga, era uma decisão difícil. E agora ele me perguntava se eu queria saber de quem ele estava a fim. Se eu queria saber? Ele devia ter dito logo!

A minha respiração estava acelerada. E se ele dissesse que estava a fim de mim? O que eu faria? Dispensaria a amizade de Mayara para ficar com ele ou desistiria do menino mais lindo da escola? Será que valeria a pena optar pela amizade de uma menina que era tão louca a ponto de colocar drogas na mochila de alguém?

— Você gosta... da Carol? — arrisquei. — Não, Cury. Não é dela que eu gosto. — E por que não? Ela é linda! Todos os meninos gostam dela. — Eu gosto de loiras — ele respondeu, sorrindo para mim. Será que eu ouvira errado? Ele mal dispensara Mayara e já queria se

envolver comigo? Fazia sentido, já que ele tinha se envolvido com todas as garotas da escola, menos eu. Que idiota! Ele magoou a minha amiga e agora queria me magoar? Podia ser uma invenção da minha cabeça. Eu podia não ter escutado aquilo e estava ali alimentando esperanças e raiva dentro de mim.

— Como disse? — Eu gosto de loiras — ele repetiu. Nesse momento, eu escutei um barulho atrás árvores. — Não é nada, devem ser as tartarugas — disse Cristhian, desviando a

minha atenção.

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Tartarugas não fazem tanto barulho, pensei. Mas logo esqueci. Eu precisava me focar no meu objetivo, que era alertá-lo sobre Mayara. Eu digo ou não digo a ele? Deixo-o ser expulso e participo dessa loucura? Tentei analisar. Se eu ajudasse Mayara, poderia me dar muito mal e até ser expulsa também. Se eu não a ajudasse, ela não seria mais minha amiga e eu diria adeus para sempre à “Cury legal”. Mas e se eu falasse para Cristhian sobre o plano de Mayara? Eu poderia conquistá-lo... Não, pensei, não posso fazer isso com Mayara, mas tenho que alertá-lo.

— Cristhian... Há algo que eu preciso lhe contar. Ele pareceu surpreso. — Eu é que preciso lhe contar algo. E então ele me surpreendeu. Contar-me algo? Ele iria se declarar? Fala

sério, essas coisas só acontecem em filmes. Será que eu o deixava falar primeiro ou eu falava? Ah, resolvi falar logo.

— Eu falo primeiro! — eu disse. — Cristhian, você cometeu um grande erro ao dispensar Mayara. Ela é uma boa menina, não mereceu o seu desprezo. Seja lá quem for essa menina de quem você está a fim, esqueça-a. Mayara é boa para você. Você vai ficar a fim dessa garota e logo depois vai dispensá-la como você fez com todas as outras. Quando a menina não lhe agradar mais, quando você enjoar dela, irá descartá-la como se ela fosse um lixo. A menina vai se iludir com a sua conversa e depois vai se sentir um nada.

— Foi Mayara que te disse tudo isso? Ela pediu para você me procurar e dizer essas bobagens?

— Ei! — eu protestei. — Ela não me mandou aqui, Cristhian. E não são bobagens, estou dizendo de coração.

— Cury, você é boa menina. É por isso que eu acho que você é idiota demais por não saber o seu lugar.

A frieza daquelas palavras fez com que eu ficasse imóvel, sem saber o que fazer. Estava aterrorizada porque eu sabia que ele tinha razão. Aquela Cury que sempre se metia em encrencas não era eu. Soube disso assim que Mayara me contara sobre o seu plano naquela manhã.

— Cristhian, tome cuidado com a Mayara. — Mayara? Ela não vai fazer nada, confie em mim. — Ela vai. E não é mais uma de suas brincadeiras, ela vai pegar pesado. Ela

está querendo colocar drogas na sua mochila! Ela quer incriminá-lo e expulsá-lo do colégio.

— Para que isso? — Ela disse que não quer te ver nunca mais.

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— Por que ela não pediu com jeitinho? Talvez eu sumisse — ele disse, debochando.

— Não sei. Ela é a Mayara, é preciso tomar cuidado com ela sempre. Bem, era isso o que eu tinha para falar. Eu não planejo mais ter qualquer contato com ela a partir de agora.

— Isso significa que eu devo incluí-la na minha coleção pessoal antes que você se torne uma nerd patética novamente, certo? — Cristhian perguntou, aproximando-se de mim como se fosse um predador.

“Não!”, eu queria gritar. Mas eu não consegui dizer nada. Um ruído se fez ouvir e Cristhian me agarrou nos jardins, fingindo que ia

me beijar. A próxima coisa de que me lembro é de sentir dor, meus cabelos sendo puxados até o chão, enquanto a voz de Mayara repetia ferozmente:

— Sua idiota! Traidora! Eu gritei. Vi quando Cristhian se afastou e sumiu por detrás das árvores.

Mayara continuava puxando os meus cabelos. Eu não conseguia reagir. Até que eu vi uma plateia de adolescentes se formar ao nosso redor. Eu não posso perder essa luta, pensei. Se eu perdesse todos caçoariam de mim para sempre. Com o meu braço direito agarrei a perna dela até que ela tombasse no chão. Por um instante, ela largou os meus cabelos, e eu pulei em cima dela.

— Vai, Mayara! Acaba com ela! — algumas meninas gritavam, agitando os punhos.

— Olhem! Cury se levantou, sempre soube que morava uma fera dentro dela! — dispararam outras.

Eu tinha pulado em cima dela, mas não sabia o que fazer. Foi quando um soco me atingiu no nariz, e ele começou a sangrar. Eu senti o sangue ferver e dei uma bofetada na cara dela.

— Não acredito que fez isso, Pippa! — Ela disse, caçoando do meu nome. — Sua nerdzinha desgraçada!

Ela me atingiu nas costas. Eu gritei de dor. Ela era forte demais, eu iria perder feio. Mas, apesar disso, havia pessoas gritando o meu nome na “plateia” e isso me encorajou.

— Você é uma delinquente! Cristhian nunca gostou de você! — eu gritei. Eu não sabia que ele estava lá, bem atrás de mim. Quando me virei e o vi

assistindo a briga, me arrependi de ter falado aquilo. Ela também olhou para ele, com a sua expressão de raiva. Eu me distraí e ela virou o jogo, saltou contra as minhas costas. Começou a me socar e eu comecei a morder meus lábios de raiva.

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Dei um tranco com as costas para trás, e a minha cabeça bateu contra a dela. Que dor!

— Aaaaaai! — ela gritou. Pulei em cima dela e comecei a puxar os seus cabelos, minhas pernas

prenderam os seus braços e ela tentava debater as pernas para me derrubar, sem sucesso. As pessoas que estavam em volta começaram a gritar o meu nome.

— Dá um soco na cara dela! — diziam. Outros estavam ao lado de Mayara e gritavam: — Vamos, Mayara. Derrube-a! Saia daí! Eu comecei a rir. Ela não podia se mexer e eu estava sentada em cima dela.

Eu podia fazer o que eu quisesse com ela, mas eu não era rebelde de verdade. Eu sei que se fosse ela em cima de mim, me espancaria sem ressentimentos. Mas eu não era assim, no fundo não seria capaz de fazer mal nem a uma mosca. Eu sou uma farsa, eu pensei. Todos verão isso hoje.

Ela começou a se debater pela última vez, mas desistiu. Ela estava irritada e me fitou incrédula.

— Você me imobilizou. Pode fazer o que quiser comigo. O que está esperando?

— É bom te ver aí sem poder fazer nada — respondi. A multidão parou de gritar para poder ouvir o que falávamos. — Quer me bater? Vá em frente, me dê um soco bem dado! — O que eu vou ganhar com isso? — Pare de perguntar. Acerte ela! — gritou alguém da multidão. — É, Cury. Por que não me acerta logo e acabamos com isso? — Porque eu não preciso acertar um soco na sua cara para provar que sou

melhor do que você. Mayara e eu estávamos descabeladas e as pessoas começaram a gritar

querendo briga. Eu não avancei nela, ia me levantar e tentar alertá-la sobre Cristhian, quando... Todos se silenciaram. Vi-me sendo arrancada de cima dela por um segurança da escola. Olhei, e lá estava Cristhian acompanhado do diretor da escola e uma coordenadora. O diretor olhou para mim.

— Então, Srta. Cury, causando problemas outra vez? É claro que eu sempre levava a culpa por tudo. Em casa também era assim.

Meu irmão provocava, me batia, eu revidava e minha mãe chegava bem na hora errada. Eu esperei que Mayara falasse que a culpa não era apenas minha e que ela que avançara em mim, mas ela não se manifestou.

— Eu não fiz nada — consegui dizer. A coordenadora se intrometeu, falando em tom sarcástico:

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— Ah não, Pippa? Então como você me explica o fato de a Srta. Fernandes estar embaixo de você, toda descabelada e vermelha?

— O quê? Acha que ela também não me atacou? — Não venha se fingir de boazinha! — Mayara respondeu. — As duas podem me acompanhar? — perguntou o diretor. O diretor perguntou para as pessoas que assistiram a cena se foi realmente

Mayara que causara a briga. Todos sabiam que sim, mas ninguém se atrevia a acusá-la. Nenhum deles, além de Cristhian, viu o que aconteceu ou quem bateu em quem primeiro, mas a resposta foi unânime: Pippa Cury.

— Srta. Cury, me acompanhe até a diretoria. Vou chamar os seus pais. Eu. É claro, eu sempre levo a culpa. Por que pensei que seria diferente? — Eu sou a mais atingida — disse ao diretor. — O meu nariz está sangrando,

isso significa que Mayara também me bateu. Não vai levá-la também? — É claro que vou levá-la também — respondeu o diretor. Enquanto caminhava para a diretoria, comecei a pensar no rumo em que

minha vida seguiria a partir daquele momento. Todos os títulos de popularidade que eu ganhara já não valiam mais nada, ou talvez nunca tivessem realmente valido algo. Será que eu perdera tanto tempo sem perceber o que realmente era importante?

— Me desculpe, Mayara — eu sussurrei para ela enquanto aguardávamos no corredor. — Eu e o Cristhian não fizemos nada. Eu juro!

A reação dela realmente me surpreendeu. Ela começou a rir e cobriu a boca para abafar o barulho. Em seguida, franziu a testa e apertou os olhos, como se quisesse avançar novamente sobre mim.

— Eu não sei por que você está pedindo desculpas — ela respondeu, de maneira muito ríspida. — Eu sei que vocês não fizeram nada.

— Mesmo? Mas... Ela deu um sorriso debochado. — Acho que você não entendeu o verdadeiro sentido disso tudo, Pippa. Se

for mais fácil para você, pense como se isso fosse um trabalho. Nesse caso, eu e Cristhian fomos contratados para fazer da sua vida um inferno.

Incapaz de responder àquelas palavras, eu apenas vi quando ela se virou de costas e desapareceu atrás da porta da sala do diretor. Naquele momento, eu tive a sensação de que a minha vida iria virar de cabeça para baixo.

Aquele era apenas o começo de tudo...

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― Capítulo 2 ―

Meus pais desaparecem misteriosamente.

Ainda incrédula, adentrei a sala do diretor. Ele removeu o telefone do

gancho e começou a discar para os nossos pais. Eu tremia de medo só de pensar no meu pai bravo comigo ou minha mãe decepcionada. Naquele momento, a rebelde dentro de mim perdeu força, muita força. Eu parecia uma criança com medo do escuro.

Ele discou para o número da minha casa. Ninguém atendeu. para o celular da minha mãe. Ela não atendeu. Ligou para o celular do meu pai, mas estava desligado. Perguntou-me então se eu não possuía outro número de telefone, mas logo desistiu. Ele seria burro demais para perguntar isso a mim.

— Vou ver se não há outro número de telefone com a secretária.Ele nos deixou aguardando sob a supervisão da

dez minutos para voltar, mas trazia um papel. Descobriram o telefone do trabalho do meu pai! Eu estava perdida, meu pai iria me matar. Meu painessa minha rebeldia que ele chamava de “fase”. Ficava quieto no canto dele. Mas se fizéssemos algo errado na escola ele ficava muito bravo. Se possível, ele iria voando até lá para saber o que eu fiz.

O diretor discou o número. Meu coração se apertou e me faltou ar. agora, pensei. Apesar de minhas preces, meu pai atendeu ao telefone.

— Alô. Sr. Cury? — pausa. — Olá, como está o senhHumberto do Colégio Sócrates — pausa. — Estou muito bem, obrigado — Então, Sr. Cury, seria melhor falar-lhe pessoalmente

Meus pais desaparecem misteriosamente.

a sala do diretor. Ele removeu o telefone do

Eu tremia de medo só de pensar no meu pai bravo comigo ou minha mãe decepcionada. Naquele momento, a rebelde dentro de mim perdeu força, muita força. Eu parecia uma criança com

Ele discou para o número da minha casa. Ninguém atendeu. Ufa! Ligou para o celular da minha mãe. Ela não atendeu. Ligou para o celular do meu pai,

me então se eu não possuía outro número de telefone, mas logo desistiu. Ele seria burro demais para perguntar isso a mim.

há outro número de telefone com a secretária. Ele nos deixou aguardando sob a supervisão da coordenadora. Demorou

Descobriram o telefone do trabalho do Eu estava perdida, meu pai iria me matar. Meu pai não se intrometia

”. Ficava quieto no canto dele. as se fizéssemos algo errado na escola ele ficava muito bravo. Se possível, ele

ção se apertou e me faltou ar. É , pensei. Apesar de minhas preces, meu pai atendeu ao telefone.

Olá, como está o senhor? Aqui é o diretor stou muito bem, obrigado — pausa.

lhe pessoalmente — pausa. — Posso dizer

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que sua filha se envolveu em uma briga feia. E me parece que ela que começou. — pausa. — Tenho certeza sim, senhor.

Não pude ouvir a conversa, mas imaginei o que ele estava dizendo do outro lado. Assim que o diretor afirmou, a voz dele se fez ouvir pelo telefone.

— Diga a ela que eu estou a caminho! Não a deixe sair daí! Droga! A coisa estava feia. Meu pai só dizia “Droga!” quando algo realmente não o

agradava. Era como dizer Eu gasto uma fortuna em um colégio particular para minha filha fazer isso e me decepcionar desse jeito? Não vou deixá-la ver o sol nunca mais. Ela vai apodrecer no quarto para o resto da eternidade. Não vai mais comer chocolate, sair com os amigos, não vai namorar ninguém e nem assistir suas séries favoritas na televisão. E em vez disso ele só dizia “Droga!”.

Era preferível que ele me dissesse que eu estava proibida de ver televisão ou sair. Tudo era melhor do que ouvir Droga!

O primeiro a chegar foi o pai de Mayara. Era um homem carrancudo, estranho e nada bonito. Eu o imaginara como um homem de classe, elegante, rico e poderoso. Ele não era nada disso. Era apenas um homem cabisbaixo, ruivo e com sardas no rosto. Ele parecia ser um pai muito sereno, nada rígido. Ele se sentou acompanhado da mulher.

A senhora Fernandes era uma mulher bonita de meia-idade. Impressionava-me o fato de ela ter se casado com um homem como aquele. Ela, no entanto, parecia mais velha que ele. Não parecia um casal feliz, mas eu não quis exagerar em minha análise, pois eles deviam estar zangados de saberem que a filha se metera numa briga. Com certeza era isso.

Eu estava aguardando a hora em que meus pais chegariam. O que a minha mãe diria? O que o meu pai diria? Era melhor o meu pai dizer algo, pois o silêncio dele é uma arma perigosa. Aprendi ao longo dos anos que o silêncio podia ser ainda mais ameaçador do que uma chuva de palavreados ofensivos.

De repente, a porta da sala se abriu. Meus pais entraram com a pior expressão que eu já vira. Parecia que eles iriam saltar sobre mim e me estrangular. Eu estava muito nervosa. A rebeldia se dissipou no ar. Pude perceber que até mesmo Mayara estava envergonhada pela presença dos pais. Ela também estava com medo.

— Estou aqui para comunicar uma briga que aconteceu entre essas duas meninas. No recreio, as duas tiveram uma discussão muito feia e se estapearam, chamando a atenção dos alunos e formando uma multidão de expectadores. Vou pedir para que cada uma delas dê a sua versão da história. A sós.

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Mayara foi a primeira. Eu e meus pais ficamos do lado de fora enquanto eu imaginava as mentiras horríveis que ela deveria estar contando. Eu torcia os dedos, nervosa. Tentava ao máximo não olhar para minha mãe ou para meu pai. Estava pedindo em pensamento para que ela me ajudasse, para que não mentisse. Por favor, Mayara. Fale a verdade. Se ela contasse a verdade, talvez eu pudesse me livrar da culpa. Tudo estaria resolvido.

Os minutos custavam a passar. Parecia uma eternidade esperando. Eu estava já ensaiando o que dizer, quando a porta se abriu e Mayara saiu com os pais. Estava cabisbaixa e muito irritada.

O diretor pediu para que entrássemos na sala e fez um gesto para que nos sentássemos, e então falou:

— Muito bem, mocinha. Pode começar. Eu gelei. Ainda não tinha ensaiado bem o que dizer. — Eu... é...bem... Cheguei à escola hoje e me encontrei com a Mayara. Ela

me disse que queria “pegar” o Cristhian, porque ele estava gostando de outra garota. Passou a tarde inteira pensando em como fazer isso e eu achei que ela acabaria desistindo, mas não foi o que aconteceu. Ela me disse que queria colocar drogas na mochila dele e incriminá-lo, assim ele seria expulso do colégio e ela se vingaria dele.

— Como disse? — perguntou o diretor. — Ela iria colocar drogas na mochila dele?

Eu assenti. — Isto é muito grave, Srta. Cury. Está certa dessa acusação? — Bom... Eu não sei se ela realmente o faria. Mas ela pediu a minha ajuda

e... — E você ajudou. — Não! — protestei. — É claro que não. Ela disse que se eu não aceitasse,

não seriamos mais amigas, me chamou de covarde... — eu fiz uma pausa. — E eu sou. Não tive coragem para fazer isso com Cristhian, ainda mais porque eu não faria isso nem se tivesse coragem — me corrigi. — Droga é uma coisa muito séria.

— Eu entendo — disse o diretor. — E como começou a briga? — Eu tentei avisar Cristhian sobre o plano de Mayara, mas ele não me

escutava. Mudava de assunto sempre que eu tentava iniciar a conversa. Eu estava meio receosa, mas estava certa de que essa era a coisa certa a fazer.

— Então você contou a ele? — Contei. Ele me olhou com aquela cara de “Em quem devo acreditar?”

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— Acredite em mim, diretor. Eu contei a ele e Mayara chegou em seguida. E, por algum motivo, ele fingiu que ia...bem...ele fingiu que ia me beijar.

— Beijar é proibido aqui na escola, Srta. Cury. — Mas ele não me beijou! Ele só fingiu, porque viu a Mayara chegar. E ela

ficou brava e começou a puxar os meus cabelos. Não posso dizer a ele que tudo isso foi um plano para me envergonhar, pensei.

Isso só iria confundi-lo e piorar as coisas. — Não foi exatamente isso que ela nos contou — disse o diretor. — Ah, não? Cristhian deve ter pedido para ela mentir. — Está fazendo acusações muito sérias, Pippa — disse minha mãe. Eu sabia que eram acusações muito sérias, mas dessa vez eu não estava

mentindo. Infelizmente, meu histórico de “mentiras” era muito preocupante. E eu pressentia que não iriam acreditar em mim. Droga! Além disso, Mayara era persistente e não deixaria que a expulsassem tão fácil assim. Ela tinha Cristhian do lado dela. Quem eu tinha do meu lado? Nem as pessoas que estavam torcendo por mim se manifestaram.

— Mayara disse que foi você quem partiu para cima dela porque Cristhian não quis beijá-la.

— Isso é mentira! — Todos afirmam que Mayara está falando a verdade, mas pode ser que

estejam apenas encobrindo-a. Não sei qual é a verdade, mas as duas deverão ser punidas.

Graças a Deus, pensei. Finalmente um pouco de justiça! O diretor convidou Mayara e sua família para se sentarem ao nosso lado.

Um silêncio desagradável se instalou na sala. — Vou fazer algumas perguntas — ele disse. — E quero que sejam

absolutamente francas. Está certo? — Nós assentimos. — Quem de vocês começou a briga?

Eu apontei para Mayara e Mayara apontou para mim. Meu sangue ferveu quando ela disse:

— Foi ela, diretor. Todos sabem disso. — E por qual motivo essa briga começou? — perguntou o diretor à Mayara. Ela respondeu prontamente: — É claro que é por ciúmes. Ela gosta do meu namorado e tentou agarrá-lo

nos jardins. — Mentira! — eu gritei. — Por favor, Srta. Cury. Mantenha-se em silêncio.

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Ele olhou para os pais de Mayara e perguntou se eles acreditavam na filha. Eles assentiram. E, em seguida, o que eu mais temia: ele perguntou a meus pais se eles acreditavam em mim. Meu corpo tremeu todo e eu lancei um olhar raivoso para eles. Eu sei que deveria estar com cara de inocente e coitadinha, mas não consegui conter o meu rancor. E a minha raiva só aumentou quando eles responderam:

— Não temos certeza... — Sinto muito — disse minha mãe, abaixando o olhar. O diretor me fuzilou com os olhos. Parecia que queria dizer “Nem mesmo os

seus pais acreditam em você, hein? Como eu poderia acreditar?” — Dada as circunstâncias, eu presumo que você e sua família já podem sair

— disse o diretor à Mayara. Mayara e seus pais saíram. Eu fiquei lá, transtornada. Meus pais nem

conseguiam olhar nos meus olhos. Eu estava me sentindo envergonhada, abandonada. Era triste não ter ninguém que confiasse em mim. Senti saudades daquela menina que eu era antes, meiga e tímida, jamais duvidariam de mim naquela época. Começava a me perguntar se tinha valido a pena mudar tão radicalmente. O único lado bom da tristeza é que ela traz consigo algum ensinamento. Pena que eu só fui aprender isso tarde demais.

— Sinto muito, Srta. Cury — disse-me o diretor. — Você fez acusações muito graves. Brigou e espancou sua colega...

Por favor, não diga aquilo que eu estou pensando que você vai dizer, eu torci. — Srta. Cury... — sua voz era pausada e calma. — É com pesar que eu

comunico a sua expulsão do Colégio Sócrates.

Rumamos em silêncio no carro de volta para casa. Através da janela eu

via as pessoas, as ruas, as lojas, os casais felizes. Eu estava imersa em meus próprios pensamentos, não havia nada mais no que pensar a não ser aquele incidente horrível. Meus pais não falaram nenhuma palavra dentro do carro. Até eu disparar, dizendo:

— Eu não menti. Eu pensei que eles rebateriam, brigariam comigo ou qualquer outra coisa.

O silêncio era terrível. Eu não esperava por aquilo, de fato. Por que não me insultavam? Eu preferia mil vezes que eles gritassem comigo. Em vez disso, eles

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fingiam que eu não existia. E não era exatamente isso o que eu fazia com eles desde a minha radical mudança? Usando da amarga indiferença?

Chegamos em casa e adentramos a sala. Eron estava quieto no sofá, o que não era lá muito normal. Ele sabia que a coisa estava feia. E realmente estava. Eu segui meus pais até o meu quarto. Minha mãe começou a dobrar minhas roupas e colocá-las dentro de uma mala. Lá tinha também minha escova de dente, acessórios úteis, xampu e creme, alguns cadernos e mais algumas coisas que eu não lembro bem.

— Vamos viajar? — eu perguntei. Minha mãe não me respondeu, em vez disso ela colocou mais uma coisa

na minha mala. Era um colar de prata ligado a uma forma rochosa e irregular. Sua superfície era tão bonita e brilhante que sequer se assemelhava a uma pedra. O símbolo gravado em seu centro parecia ser algo entre uma cruz e uma espada com a empunhadura voltada para cima.

No verso estava entalhado o desenho de ondas, acompanhado de suas

iniciais. Ela guardou o colar no bolso da frente da mala que ela estava preparando

para mim. — Tome muito cuidado com este colar. Não o perca nunca, não importa o

que aconteça — ela disse. — É importante. Prometa-me que vai protegê-lo, que não vai perdê-lo.

Eu não entendia porque ela parecia tão ansiosa. — Tudo bem, mãe. Eu prometo, mas... que símbolos são esses? É algum

colar que pertenceu à minha avó? Eu nunca chegara a conhecer meus avós maternos. Quando eu ou meu

irmão perguntávamos, apenas nos era dito que moravam nos Estados Unidos e que não possuíam condições financeiras para nos visitar. No entanto, o modo como minha mãe evitava o assunto me dizia que ela já não mantinha contato com seus pais.

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— Essas ondas representam meu signo, Aquário. É algo muito valioso para mim, então trate de mantê-lo sempre consigo.

Enquanto ela preparava a minha mala, eu sentei no sofá da sala. — E aí, Eron? — perguntei ao meu irmão. — O que foi? — ele perguntou, quase sussurrando. — Relaxa, irmãozinho. Sou eu que estou em apuros, não você. Ele tentou abafar uma risada. — Bem, isso é verdade. Talvez eu devesse agradecer você por desviar a

atenção deles de mim. Parabéns! As suas idiotices agora superaram as minhas... — Ei, cale a boca! Eron era um menino de doze anos, cabelos lisos e castanhos. Seu nariz era

pequenino e perfeitinho. Era um lindo menino. Sabíamos que teríamos muitos problemas quando ele crescesse. Iria ficar muito bonito. Ele era magro, baixo para a idade. Eu tinha 1,65 de altura e ele tinha 1,45. Mas ele não era o meu único irmão, eu também tinha uma irmãzinha. Melanie Cury.

Mel tinha apenas um ano de idade. Seus cabelos eram louros encaracolados e seus olhos eram de um azul escuro. Ela estava no berço brincando com um urso panda de pelúcia, que estava sujo de batom. Eu fui até lá e a peguei no colo. Ela sorriu para mim.

— O que vai acontecer agora? — eu perguntei a ela, mesmo sabendo que ela era incapaz de me dar uma resposta. — O meu mundo está desmoronando... e agora estou com uma sensação horrível de que tudo irá mudar.

Minha mãe estava me observando de longe. Fiquei constrangida com a presença dela. Constrangida não é bem a palavra, acho que envergonhada ficaria melhor. Eu acabara de sair de uma briga e estava lá conversando com Mel, que não entendia nada do que eu falava, mas ria para mim. Ela devia estar rindo do sangue no meu nariz.

Minha mãe entrou no cômodo e me entregou um lenço umedecido para limpar o nariz.

— Isto está feio demais, filha. Limpe este nariz. — Obrigada — balbuciei. — Para onde é que vamos? Minha mãe estava visivelmente preocupada. — Nós vamos até a casa da vovó. — Mãe, me desculpe — eu disse, de cabeça baixa. — Eu realmente sinto

muito por preocupar vocês por tanto tempo. A verdade é que eu mereço tudo isso. Eu me sinto um pouco aliviada por ter sido expulsa, porque agora eu não precisarei ouvir todas as coisas que as pessoas dirão sobre mim.

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Eu comecei a soluçar e deixei-me cair no colo dela. Fiquei lá bastante tempo chorando enquanto ela me acariciava e me dizia palavras confortadoras. Até que uma hora eu adormeci e acordei pouco depois. Eu estava deitada na cama e minha mãe já não estava mais lá. Quando ela entrou no quarto e me viu acordada, disse:

— E então? — ela perguntou. — Será que agora que as coisas se acalmaram... eu posso ter a minha filha de volta?

— Eu mudei muito — respondi, ainda um pouco sonolenta. — Não acho que será fácil mudar do vinho para a água, mas eu prometo que vou tratar todos um pouco melhor.

Ela me olhou um pouco esperançosa. — Vá se trocar, Pippa. Vamos para casa da sua avó. Nunca visitávamos a minha avó, mas eu adorava ir lá. Ela fazia sopas

maravilhosas. O que eu mais gostava era da canja, com muito frango desfiado. Vovó era uma idosa rechonchuda, cheia de dores em todo lugar. E mesmo assim, ela sempre fazia tudo para nós quando estávamos lá.

Vovó morava em uma casinha agradável e pequenina. Os únicos que moravam lá era ela e meu avô. Meu avô era magro, cabelos grisalhos e olhos pequenos. Tinha um bigode grisalho também. Ele nunca foi de falar muito, sempre ficava sentado no sofá assistindo ao jogo de futebol e bebendo uma latinha de cerveja.

Quando chegávamos lá, ele sempre nos abordava com “Oi, benzinho. Como você está?” Ou então “Eron! Que grande você está. Cresceu, hein? E essa princesa aí? Já está uma moça.” E depois ele simplesmente voltava a se jogar no sofá e sorver um gole da sua cerveja. Minha avó era muito atenciosa, estava sempre em cima de nós com “Querem beber ou comer alguma coisa? Tem certeza que não querem nada? Querem Coca-Cola? Querem assistir televisão?”.

E estes eram os pais de meu pai, meus avôs paternos. Minha mãe me chamou: — Pippa, traga a Mel para cá, por favor. Estamos indo. — Já? — perguntei. — Já — disse ela. — Venha, vamos logo. Eu desci com a minha irmã no colo. — As malas já estão aí? — Está tudo pronto. Eu tinha vestido calças jeans, tênis All Star de couro branco e uma

camiseta branca e roxa. Prendi os cabelos em um rabo-de-cavalo e retoquei a

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maquiagem. Borrifei meu perfume Maï e desci as escadas com minha irmã no colo. Entrei no carro e fechei a porta. Estávamos todos lá. Pedi para minha mãe ligar o rádio e ela ligou sem questionar. Começou a tocar Green Day.

Eu abri a janela do carro e senti o vento soprar no meu rosto. Era uma ótima sensação. Eu já não estava mais preocupada com nada. Eu cantava Green Day alegremente e tudo do lado de fora do carro parecia mais animado. A grama parecia mais verde, os animais mais dóceis, as pessoas mais felizes e eu em paz. Vasculhei o bolso da mala, procurando alguma coisa útil. Acabei pegando o colar que a minha mãe me dera e o coloquei no pescoço.

Até que combina comigo, pensei. Notei, porém, que o silêncio ainda estava presente. Talvez meu pai não

soubesse que eu havia pedido desculpas. Mas será que desculpas bastavam? Ferir os sentimentos de alguém é como quebrar um copo de vidro. Não importa quantas vezes você peça perdão ou se arrependa, isso não fará com que o copo fique inteiro novamente.

— Como é bom estar indo para a casa da vovó! — exclamei. — Eu adoro a vovó — disse Eron sem muita animação, como se não tivesse

vontade de dizer aquilo. — Eu também adoro a vovó. Adoro também essa estrada que vai para a

casa dela, tem muitas árvores e animais pastando e... — eu parei abruptamente de falar. — Espere aí, este não é o caminho para a casa da vovó!

— Pegamos um atalho — disse-me meu pai. — É mentira! — eu gritei. Para onde será que estavam me levando? Aquela estrada não me era

estranha, já havia passado por lá. Ela ao internato. A ficha caiu. Eles vão me colocar em um colégio interno!

— Pai, pare o carro! — eu gritei. — Não vou para o colégio interno, desista! — Filha, se acalme — disse ele, mas sua voz tremia de inquietação. — Mãe, faça alguma coisa! — eu gritava. Meu irmão estava assustado e não falava nada. Mel começou a chorar tão

alto que fomos obrigados elevar ainda mais nosso tom de voz. Logo o carro estava aos gritos.

— Pare de gritar! — Eron berrava. — Fique quieto, pirralho. Não se meta nisso! — eu disse. — Mãe, fale para

papai parar o carro ou então eu vou abrir a porta do carro e pular! — Não brinque com essas coisas! — respondeu ela.

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— Você não vai pular coisa nenhuma! Você vai para o colégio interno aprender a ser você de novo. Você está patética, aprenda a ser mais educada e aí você volta.

— Não vou voltar nunca mais! — gritei mais alto. Mel chorava cada vez mais alto e Eron gritava:“Parem com isso! Parem

com isso!” — Pare o carro, pai. Agora! — Eu pulei em cima da cabeça dele e mandei-o

parar o carro. Ele me afastou com a outra mão. — Seu idiota! — gritei para o meu irmão. — Você não me avisou nada! Ele me bateu no braço. — Não grita comigo! — ele disse. Eu revidei e ele me bateu novamente. Logo estávamos nos batendo no

banco detrás do carro. Gritando e brigando. Minha mãe mandava a gente parar. — Parem com isso, vão fazer o seu pai bater o carro! — ela disse, em um

misto de raiva e preocupação. — Cadê a Mel? Ah, meu Deus! Mel? Nesse momento meu pai olhou pelo retrovisor do carro para ver o que

estava acontecendo lá atrás. Quando viu que Mel estava em segurança, seu olhar novamente voltou-se para a frente.

— Pai, cuidado! O veículo à nossa frente freou repentinamente. Nós tentamos avisar, mas

não deu tempo. Eu abracei Eron com força e ele segurou Mel, que estava ao lado dele em uma cadeirinha de segurança. A nossa dianteira bateu com tanta força na traseira do outro veículo que o nosso carro voou para o lado e capotou. Sorte que não havia ninguém na estrada. Sorte é claro, para os outros. Porque nós tínhamos acabado de capotar com o carro.

Senti o impacto de quando os carros colidiram. A sensação foi horrível. Parecia estar em câmera lenta. O carro voando pelos ares e capotando na estrada. Senti meu rosto sendo amassado pelo cotovelo de Eron. Senti também o vidro do carro no meu corpo, não me lembro onde. Doeu, e muito. Eron gritava e eu não consegui mais falar durante o acidente. Não ouvi Mel chorar e nem meus pais gritarem. Quando o carro já estava no chão, tudo estava em silêncio.

Estão todos mortos, e eu também morrerei. Este era o meu pensamento. Comecei a chorar e coloquei a mão no vidro que me atingira para retirá-lo do corpo, mas ele não estava mais lá. Como eu estava na porta direita, que estava virada para o chão, não podia sair. Eron estava caído em cima de mim, de olhos fechados. Eu o cutuquei.

— Pippa... — ele respondeu, com uma voz rouca e baixa. Ele respondeu! Que maravilha! Ele está vivo!, pensei. Mas tudo que disse foi:

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— Precisamos sair. Rápido! Ele retirou o cinto de segurança, tirou alguns vidros do caminho e abriu a

porta sem nenhuma dificuldade. Eu também ia saindo, até que ouvi Mel chorar. Ela estava no chão do carro sem nenhum arranhão. Que estranho, pensei. Eu a carreguei e saí do veículo. Vi que Eron também estava intacto.

— Eron, olhe isso! Você e Mel estão sem nenhum ferimento. Ele me olhou, parecendo muito surpreso. — Você também. — Como é? — Eu estiquei meus braços e os analisei. Eu realmente estava

inteira, não parecia ter acabado de sofrer um acidente. Eu poderia dizer que estava sonhando ou coisa assim, mas o carro estava lá

totalmente destruído na minha frente. E nós três, intactos. Será que nossos pais também estavam bem como nós? Agachamo-nos para olhar o banco do motorista e do passageiro. Estavam vazios. Não havia vestígio de sangue ou de pessoas. Parecia que meus pais nem haviam se sentado ali.

— Onde eles estão? — perguntei a Eron. — Eu não sei — ele respondeu com lágrimas nos olhos. — Pippa, o que é

tudo isso? O que está acontecendo? Eu não entendo... Abraçamo-nos e choramos. A rua estava deserta, mas nesse instante um

carro parou para nos ajudar. Queriam nos levar ao hospital, mas para que? Estávamos sem nenhum ferimento. Ele ficou maravilhado com o acontecido. Perguntou pelos nossos pais e dissemos:

— Não sei. Eles sumiram. — Eles estavam no carro com vocês? — o homem perguntou. — Sim, os dois estavam nos bancos da frente. — Isso é alguma pegadinha? Eu entendia o motivo pelo qual ele era incapaz de acreditar em nós, até

mesmo porque eu sequer tinha ideia do que poderia ter acontecido. Como eles podiam ter sumido assim? Eu sei que devíamos nos preocupar

com o nosso estado de saúde, mas eles sumiram sem motivo algum e nós estávamos totalmente ilesos. Como saber se eles estavam mortos se não vimos seus corpos? Eu não quis mais pensar nisso. Peguei a mala que minha mãe deixara e pedi que o homem nos levasse de volta para casa.

O homem foi muito bondoso. Levou-nos até em casa e só foi embora quando o policial chegou. Ele se apresentou para nós, mas eu não me lembro do nome dele.

Estava tudo tão estranho! Parecia o meu pesadelo, mas na vida real havia um carro destruído e nenhum sinal de fumaça negra. Eu não gritei por eles, pois

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não os vi sendo levados. Apenas chorei por não saber onde estavam e um estranho nos ajudou. Eu não tinha nem sequer um arranhão no meu corpo. Eron, Mel e eu sobrevivemos.

E meus pais? Sumiram misteriosamente. Não houve fumaça como no meu sonho, eles simplesmente sumiram sem nem ao menos eu ouvir as suas vozes.

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― Capítulo 3 ―

Nosso novo amigo Sophos.

Chegamos em casa ao entardecer. Os policiais trataram de cuidar de nós

até que descobrissem o paradeiro de nossos pais. Foi uma semana muito difícil. Os policiais não conseguiram avisar meus avós do incidente, pois capazes de contatá-los. Até que tudo se resolvesse e eles conseguissem encontrar meus pais e meus avós, teríamos de ficar num orfanato.

Meu Deus!, pensei. O que será de nós? Durante nosso último dia em casa, algo incrivelmente estranho aconteceu.

Enquanto reuníamos nossos pertences para nos mudarmos para o orfanato, peguei também o colar que minha mãe me dera na semana anteriorno bolso da frente da mochila. Ele brilhava com ainda mais intensidade naquele dia.

Fui ao banheiro de casa pela última vez e tomei um banho. Enroleitoalha e fui vestir minhas roupas. Coloquei a minha calça jeans favorita eblusa branca, com minha jaqueta de couro por cima. Calcei os tênis que ganhara um ano antes no meu aniversário. Ele era branco e cinza. Eu nunca o usaraachava que não era rebelde o suficiente.

Quando voltei para buscar a escova de cabelos, vi que o espelho estava embaçado pelo vapor. Ele não estava tão embaçado quando eu saí, mas quando voltei, ele estava tanto que eu nem conseguia enxergar a minha imagem. Logo

Nosso novo amigo Sophos.

Os policiais trataram de cuidar de nós

pais. Foi uma semana muito difícil. Os policiais não conseguiram avisar meus avós do incidente, pois não foram

tudo se resolvesse e eles conseguissem encontrar ficar num orfanato.

rivelmente estranho aconteceu. nos mudarmos para o orfanato,

bém o colar que minha mãe me dera na semana anterior e o coloquei e brilhava com ainda mais intensidade naquele

Fui ao banheiro de casa pela última vez e tomei um banho. Enrolei-me na . Coloquei a minha calça jeans favorita e uma

por cima. Calcei os tênis que ganhara branco e cinza. Eu nunca o usara, pois

Quando voltei para buscar a escova de cabelos, vi que o espelho estava embaçado pelo vapor. Ele não estava tão embaçado quando eu saí, mas quando voltei, ele estava tanto que eu nem conseguia enxergar a minha imagem. Logo

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notei algo escrito no espelho. De inicio não liguei muito, pensei que meu irmão estava tentando me pregar uma peça, mas depois que li, senti os pelos em meus braços se arrepiarem.

Se desejarem seus pais de volta, venham me encontrar.

Estejam no beco do final da rua às duas horas. Contanto que vocês mantenham isso em segredo,

nada de mal acontecerá a vocês.

Aquilo não poderia ter sido escrito com o dedo. A caligrafia era tão fina e elegante que as palavras pareciam talhadas no espelho. Era muito estranho. Mesmo assim, eu perguntei a Eron:

— Eron, você escreveu alguma coisa no espelho? Ele me olhou, perplexo. — Caramba! Tudo aqui é minha culpa! Eu não fiz nada, eu ju... — Há algo muito estranho escrito lá. — O que está escrito? — Venha ver você mesmo. Eu o peguei pela mão e o levei até o banheiro. Eron entrou no banheiro e não ficou muito feliz com o que viu. Depois de

ler, ele tentou passar a mão no espelho para apagar o que estava escrito. De início, as letras se apagaram e o espelho não ficou mais embaçado. Porém, as palavras novamente apareceram no espelho.

— Que droga! — ele se queixou. — Essa porcaria não quer apagar. Eu estava muito preocupada. — O que vamos fazer? — ele me perguntou. — Eu não sei — respondi. — Acho que temos que ir até lá. — Você está louca, Pippa? Vamos morrer também. Isso é uma armadilha! — Nossos pais não estão mortos! Eles devem ter sido sequestrados. Se esse

for o caso, não acha que deveríamos ir? — Temos que avisar a polícia! — Não, isso não! — rebati. — Ele disse que não podemos contar para

ninguém! — Ele quem? — Não sei quem ele ou eles são, mas... o acidente foi culpa minha. Não

posso ficar parada enquanto eu sei que posso fazer alguma coisa para vê-los de novo. Não sei como explicar, mas algo me diz que devemos ir.

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— Você é idiota? — ele rosnou. — O que deu em você e nesse seu “complexo de heroína”?

Contei-lhe sobre os sonhos que tivera nas últimas semanas e ele ficou extremamente surpreso. Ao invés de discutir, começamos a questionar o desaparecimento deles. Eu estava muito triste, mas como ainda não sabia se eles estavam mortos, isso me confortava. É claro que nada era certo. Aquilo podia ser mesmo uma armadilha. Eles podiam estar mortos, mas não era nisso que eu queria acreditar.

Eu fui a culpada pelo acidente. Se eu não tivesse gritado com meus pais e armado uma confusão dentro do carro, isso não aconteceria. E era por esse motivo que eu iria até o beco se isso nos ajudasse a encontrá-los. Eu conseguiria, eu sei que conseguiria. Meus pensamentos eram positivos, e isso já era um ótimo começo.

Estava quase na hora de partir rumo ao orfanato. Logo os policiais chegariam para nos levar para lá. Eu arrumei as coisas de Mel em uma grande mochila azul-bebê, troquei a sua fralda e a carreguei escada abaixo. Eron estava me esperando do lado de fora do prédio com nossas mochilas. Certifiquei-me de que o colar que minha mãe me dera ainda estava em meu pescoço e partimos.

— Você está preparado? — eu perguntei a Eron. — Preparado para quê? Encontrar alguns bandidos em um beco escuro?

Claro, eu mal posso esperar! — ele respondeu sarcasticamente. Eron carregava as nossas mochilas e eu carregava Mel e suas coisas. O beco

era fétido e mal iluminado. Os paralelepípedos no chão já estavam parcialmente rachados, quebrados ou fora de seus lugares.

— É este o beco, não é? — perguntou Eron. — Só pode ser este. Embora já passassem das suas horas da tarde, não havia ninguém por

perto. Abracei Mel com força, tentando evitar que ela aspirasse aquele ar malcheiroso. Meu irmão prendeu a respiração e me seguiu. Eu pensei em desistir, estava com medo de isso ser realmente uma armadilha para nos sequestrar. Se esse fosse o caso, estar em um lugar sem saída seria extremamente conveniente para executar o plano deles. Assim que eu me virei de costas ouvi um ruído pavoroso vindo do bueiro circular que havia no chão. Parecia um monstro, mas provavelmente era apenas o som produzido pelos encanamentos abaixo de nós. Ouvi também uma voz abafada em algum lugar muito longe e recuei, temendo que os criminosos finalmente aparecessem.

Que idiota!, eu me repreendi. O que eu estava pensando? Vindo até aqui para encontrar bandidos!

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— Eron, vamos embora! — AAAAAH! Quando a tampa do bueiro repentinamente se abriu, eu e meu irmão

gritamos e nos afastamos. Um homenzinho nanico de apenas um metro e quarenta, vestindo roupas maltrapilhas verdes e um sapatinho mais do que bizarro, saiu de dentro do bueiro como se aquilo fosse algo completamente normal. Tinha uma barba alaranjada e sobrancelhas da mesma cor. Era um homenzinho aborrecido. Ficou visivelmente incomodado com a nossa presença.

— Criancinhas azucrinantes! O que fazem aqui? — ele disse impaciente. — Vão embora da minha casa. Xô!

Ele já estava nos empurrando para fora do beco, quando eu protestei: — Espere! Onde estão nossos pais? — Por que é que eu deveria saber? Agora saiam daqui! Xô! Ele me empurrou novamente. — Um momento, senhor — eu disse. — Você precisa nos ajudar. — Não, não preciso — ele resmungou. — Não posso ajudar ninguém. Ele nos atirou para fora do beco, fechou o bueiro e se sentou em cima de

uma caixa velha de madeira. Eu tentei falar, mas ele fez um gesto com a mão e me ignorou. Sujeitinho abusado! Eu precisava da ajuda dele, então comecei a falar mesmo que ele não me ouvisse.

— Mas... não foi você que nos chamou aqui? Recebemos um aviso muito estranho. Nós sofremos um acidente e não nos machucamos nem sequer com um arranhão, mas nossos pais sumiram misteriosamente, sem deixar pistas. Depois disso, um aviso no meu espelho dizia para vir aqui e...

— Senhor dos Céus! — ele suspirou, visivelmente irritado. — Você fala pra caramba, hein! Eu já disse “Xô!”. O que mais é preciso fazer para manter esses fedelhos longe daqui?

Inesperadamente, algo incrível aconteceu. O colar em meu pescoço começou a se brilhar intensamente, como se tivesse uma luz própria. Como se não bastasse, notei que ele também estava flutuando na direção do homenzinho, como se uma houvesse uma força de atração entre eles.

O nanico de barba alaranjada ergueu a cabeça na minha direção, visivelmente interessado. Ele parecia estar sem palavras tanto quanto nós.

— Isto é... — ele disse, apontando para o objeto. — Quem deu isso para você, garota?

— Minha mãe — respondi —, por quê? Você sabe o que é isso? Ele pareceu pensativo por um instante. Começou a se mover apressado de

um lado para outro.

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— Você não deveria deixar ninguém ver isso — ele disse, parecendo preocupado. — Isto significa que vocês precisam muito da minha ajuda. Vocês deveriam vir comigo.

Eu sorri. Estava feliz que aquele homenzinho iria nos ajudar. — Não! — Eron replicou. — Não podemos simplesmente seguir um anão

qualquer só porque ele disse que vai nos ajudar! — Anão o caramba, garoto! Meu nome é Sophos — disse ele, estendendo a

mão para que o cumprimentássemos. — Eu moro aqui neste beco faz muitos anos. Não pensem que minha casa é um horror, estão enganados. Há muita coisa que vocês vão precisar aprender se quiserem mesmo se aventurar pelas ilhas de Króton Bleeds. Será complicado, sendo vocês mortais comuns...

— Ilhas de Króton o quê? Mortais comuns? — Eron perguntou. — Acalme-se, menino. Vai precisar de muita calma para entender tudo

isso. Não peço que confiem em mim imediatamente, mas vocês precisam fazer uma escolha o mais rápido possível. Vejam!

Ele apontou para a parede na entrada do beco, onde sombras negras se aproximavam lentamente, como se um braço feito de fumaça se esforçasse para se mover, agarrando-se nos tijolos. No entanto, as sombras pareciam ter dificuldade em avançar.

— Há algo funesto se aproximando — explicou Sophos. — Este lugar normalmente é protegido contra as trevas, mas parece que o equilíbrio foi quebrado. Vocês precisam sair daqui o mais rápido possível. Há uma antiga magia élfica protegendo este beco, mas ela não vai aguentar muito tempo. Venham comigo!

Sophos nos levou até o bueiro redondo, destampou-o e nos apresentou uma escada de cordas. Parecia firme, mas eu não queria de jeito nenhum descer lá. Não que não confiasse na corda, eu não queria entrar em um lugar tão sujo. Eu não estava apreensiva em seguir um estranho, o que era algo definitivamente surpreendente. Por algum motivo eu sabia que deveria descer lá, meu instinto me dizia isso.

Eles desceram pela escada e eu os segui. Descemos as mochilas primeiro e Sophos carregou Mel até lá embaixo.

Para ser sincera, eu não esperava encontrar um sistema subterrâneo de esgoto imenso escondido alguns metros abaixo de nós. Havia centenas de entradas escuras, onde grandes portas falsas pareciam ter sido pintadas. No entanto, pareciam extremamente reais.

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No centro, havia um córrego repleto de garrafas e outros objetos plásticos, que flutuavam sem rumo. O ruído dos encanamentos que antes ouvíamos ao longe, quase inaudível, agora estava extremamente alto.

— Esses canos precisam urgentemente de um conserto — disse Eron, como se lesse meus pensamentos.

— Canos? — perguntou Sophos, confuso. — O que quer dizer com isso? Nesse momento, algo muito grande emergiu das profundezas do córrego.

O ruído se tornou tão alto que Mel começou a chorar, o que era bastante raro, já que ela era uma criança muito calma.

— Aaaaah, o que é isso?! A cabeça do monstro surgiu em meio às ondas que se formaram ao redor

de si. Seus olhos imensos e amarelados nos encaravam na escuridão. A superfície de sua pele parecia ser áspera e esverdeada, como uma peça de couro velha.

— Ah, isso? — Sophos respondeu, casualmente. — É apenas a Rosalinda, um dragão imperial inofensivo. Não se preocupem com o barulho. Ela só está mal-humorada porque as visitas não trouxeram nenhuma comida. Da próxima vez, não se esqueçam de trazer algo para agradá-la. Pode ser qualquer coisa, menos plástico. Ela definitivamente detesta plástico...

Eron e eu nos entreolhamos. “Esse cara é completamente maluco?”, ele parecia querer dizer. No

entanto, um dragão imperial gigantesco estava a apenas alguns metros de nós. Como podíamos ignorar algo como aquilo?

Paramos em frente a uma parede que parecia uma entrada e Sophos recitou duas palavrinhas esquisitíssimas em uma língua que eu não sabia qual era. Pensei que nada aconteceria, mas um sensor eletrônico apareceu. Sophos colocou o seu polegar no dispositivo e uma porta se abriu.

Havia um corredor longo e escuro. Imagine-se entrando em um lugar onde não há luz alguma, ou seja, não conseguíamos ver nada. Eu estava um pouco insegura, mas mesmo assim caminhei com Mel no colo até o final do corredor. Mel começou a chorar, mas assim que Sophos se aproximou dela e disse algo que também não entendi, ela silenciou.

No final do corredor havia uma porta de madeira não muito grande, era do tamanho de Sophos. Ele bateu duas palmas e a porta se abriu. Abaixamo-nos para passar pela porta e finalmente visualizamos a sua casa. Eu nunca vira algo tão incrível em toda a minha vida. Era um lugar imenso. Como aquilo tudo podia caber ali? Havia várias camas, uma cachoeira pequena e escorregadores por todos os lados.

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— Videogame! — Eron disse, avistando um tipo de Playstation que havia na sala.

— Você pode jogar, se quiser — disse Sophos. — Mas há coisas mais legais ainda. — Ele abriu outra porta e um enorme salão de jogos surgiu à nossa frente. Todos os jogos já inventados e não inventados estavam lá. — Divirtam-se.

Eron se atirou em uma piscina de fichas para jogos, para escolher qual iria inserir nas máquinas. Eu estava com Mel no colo e não pude aproveitar muito as máquinas de jogos. Até que avistei uma piscina de bolas infantil, mergulhei lá com Mel e brinquei com ela.

Eron não tirava os olhos do videogame. Havia muitos jogos que ainda não haviam sido inventados. Meus olhos percorreram toda a sala. Foi quando vi um videogame pequenino com uma qualidade de imagem esplêndida, não me contive e perguntei a Sophos sobre ele.

— É um Playstation. — Playstation 2? Ele riu. — O dois? — dizia ele, gargalhando. — Está brincando? Esse já é o

Playstation 12. Muito mais avançado. — Muito? — eu perguntei, boquiaberta. — Você nunca jogou? — ele perguntou. Eu balancei a cabeça. — Ele já está

velho e fora de moda. Como nunca ouviu falar dele? A esta altura, Eron já abandonara os jogos e se juntara a mim e Sophos na

conversa sobre o Playstation. — Eu quero jogá-los — disse Eron a Sophos. — Onde estão os controles? Sophos começou a gargalhar. — Controles? Venha, garoto. — Puxou Eron para uma cadeira e ligou o

videogame. — Vou mostrar como se joga. É fácil, basta usar o pensamento. — O pensamento? — É, menino mortal. Seu cérebro comanda o videogame. Vamos lá, tente

uma vez. Eron apertou os olhos e se concentrou. 3, 2, 1... Começou uma corrida de

carros em 4D bem diante de nossos olhos. Era como se estivéssemos realmente dentro do carro. Era tudo muito real. O jogo podia ser disputado entre três pessoas ou mais. Lá estava meu carro, uma Ferrari preta com desenhos de chamas que começavam nas portas dianteiras e terminavam nas traseiras.

Também me concentrei. Eu não estava indo muito bem, era muita informação para me concentrar e fazer as curvas. O carro de Sophos me atingiu na traseira e lançou chamas negras no meu. Eu olhei para ele e exclamei um

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“Ei!”. Mel parecia estar se divertindo bastante, observando os hologramas coloridos surgirem ao nosso redor. Foi só depois disso que notei que as cadeiras em que estávamos sentados não estavam no chão. Estávamos em cadeiras flutuantes.

— Como você fez isso? — Eron perguntou. — Também quero tentar! — Use o pensamento, garoto — ele respondeu. — Use o pensamento. Eron se aproximou do meu carro e um canhão de pedras gigantes estava

mirando em mim. Ele atirou e eu me desviei com facilidade, usando a força do meu pensamento. Consegui criar buracos na pista e o carro de Eron rodopiou. Do meu carro saíram centenas de armas de fogo e eu atirei nele. Seu carro explodiu e no lugar dele apareceu:

GAME OVERGAME OVERGAME OVERGAME OVER.... — Droga! — lamentou Eron. — Você é boa nisso. Eu sorri. Continuei jogando, me aproximando cada vez mais do carro de

Sophos. Enquanto isso, Mel se divertia com uma babá robô que Sophos arranjou para mim. Eu encostei meu carro no dele e ia me preparando para lançar chamas, mas ele foi mais esperto do que eu. Ele freou, deixando o meu carro muito a frente. Em seguida, lançou uma bola rochosa de fogo na minha Ferrari, que começou a pegar fogo e perder velocidade, enquanto ele avançava acelerando a 200 quilômetros por hora e vencia a corrida.

A tarde na casa de Sophos foi maravilhosa. Jogamos muitos jogos, descemos por todos os escorregadores (que davam para vários cômodos fantásticos da casa), mergulhamos na cachoeira e jantamos pratos que eu nunca havia provado antes. Todos deliciosos.

A babá robô aproximou-se de nós com Mel em um carrinho de bebê. Ela parecia com sono. Então a robô nos comunicou com uma voz quase perfeitamente humana:

— Mel está cansada. Vocês também não gostariam de descansar? Eu e Eron concordamos. Estávamos muito cansados. — Partiremos amanhã cedo — avisou Sophos. — Preparem-se. Assentimos mesmo não sabendo para onde iríamos. Por algum motivo,

sabíamos que podíamos confiar em Sophos. A babá robô levou Mel e nós para um quarto enorme. Entramos e nos

acomodamos um em cada cama, enquanto a robô colocava Mel, já adormecida, em um berço.

Estávamos tão cansados que não podíamos desfrutar da cachoeira de chocolate, a televisão de 300 polegadas e de muitas outras coisas deslumbrantes

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que havia lá. Assim que eu encostei a cabeça no travesseiro macio, eu adormeci instantaneamente, pensando o que o futuro estaria reservando para nós dali para frente.

No dia seguinte fomos despertados pela babá robô. Ela nos avisou que

deveríamos nos arrumar e partir em quinze minutos. Levantamos e trocamos de roupa. Com a ajuda da robô, vesti Mel e troquei sua fralda. Em dez minutos já estávamos prontos para sair.

— Não vamos comer nada antes de sair? — eu perguntei. Sophos sorriu despreocupado. — Fique tranquila. Eu já cuidei disso. Ele tirou um vidro de pílulas coloridas e nos pediu para escolher entre os

sabores: Lasanha, Strogonoff, Pizza, Hambúrguer, Carne com batata e Macarrão com molho quatro queijos. Eu escolhi a lasanha, Eron escolheu pizza e demos a de carne com batata para Mel. Quem nunca comeu pílulas de sabor, não recuse quando lhe oferecerem. O sabor não era nada artificial, melhor até que a lasanha de muitos chefs de cozinha.

Sophos preparara uma grande mochila com coisas essenciais para a viagem. Guardei o colar que minha mãe me dera em uma das mochilas, assim como me fora aconselhado.

Despedimo-nos da babá robô e da maravilhosa casa de Sophos. Passamos pelo corredor escuro e voltamos novamente para onde estávamos. O esgoto exalava fortes odores, então andamos apressadamente. Infelizmente, o sistema subterrâneo era maior do que eu podia imaginar.

— Apenas afastem-se das águas. Caminhem o mais longe possível — alertou Sophos. — Rosalinda está realmente zangada, mas não temos tempo para agradá-la.

Obedecemos sem questionar. Mesmo que tudo houvesse acontecido muito repentinamente e eu ainda possuísse muitas dúvidas sobre tudo que estava acontecendo, tudo aquilo começava a parecer absolutamente normal.

— Sophos significa alguma coisa, não é? — eu perguntei. — Sim, significa “sabedoria” ou “aquele que é sábio” — ele respondeu. —

Meu nome é composto pelas palavras Philos e Sophia, em latim. Eron interrompeu, mudando completamente o assunto da nossa conversa.

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— Para onde é você está nos levando? — Para a Cadeia de Ilhas de Króton Bleeds — ele sussurrou. — Para a cadeira de quê? — eu falei mais alto. — Psiiiiiiu! Fale baixo. Não se pode falar isso assim, sem mais nem menos. — Por quê? — Olhe só. Este lugar é em outra dimensão, na dimensão de Aquarium.

Antes de resmungar que nada disso existe, é melhor vê-lo primeiro. Confie em mim, você vai adorar o lugar. Precisamos caminhar até o final do beco. É lá que estão as passagens.

— Passagens? — perguntou Eron. — Passagens secretas, portais... Chamem do que quiserem. Mas quando

chegarem lá, não se assustem com os seres especiais. — Como assim seres especiais? Você não é um... — eu me interrompi. — Eu sou um leprechaun — ele completou. — Eu ia dizer anão, mas... um o quê?! — Que legal! — disse meu irmão entusiasmado. — O que é um leprechaun? — Leprechaun é uma espécie de gnomo. Sou um gnomo irlandês, por isso

as roupas verdes e o sapato estranho. Diz a lenda que o leprechaun sempre vive trabalhando em meio às folhas de um arbusto em um único pé de sapato, mas os tempos mudaram. É tudo muito moderno atualmente. Um leprechaun sabe onde se escondem tesouros e, para obter esses tesouros, é preciso se apoderar de nós e não nos perder de vista.

— Eu conheço a lenda — eu disse. — Mas você não deveria ser minúsculo? E onde está o barrete vermelho?

— Humanos... — ele revirou os olhos. — Sempre nos diminuindo. Hum, literalmente... Não somos minúsculos de verdade como diz a lenda, apenas baixos. Esses objetos estão aqui na minha mochila. É perigoso ser um leprechaun na frente dos humanos. Aqui eu sou só um mendigo.

— Por que não continuou caçando tesouros para os homens? — Porque o Rio de Janeiro é muito melhor — ironizou. — A gente vive no

lixo dos outros e se diverte muito! — Fala sério. — É claro que o leprechaun é uma criatura muito alegre e festiva, mas nem

sempre é possível ser feliz em meio ao lixo. — Mas a sua casa é linda! — E quem disse que eu não sou feliz? — ele disse sorrindo. — Era apenas

um exemplo. — Você acreditou nessa besteira, Eron? — perguntei.

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— E por que não? Você tem certeza que viu a casa dele do mesmo jeito que eu vi? Ele é nanico, tem uma casa com coisas que ninguém normal tem, jogamos videogames usando o pensamento, ele falou que tinha um dragão no esgoto e sentamos em cadeiras flutuantes. No que é que você não acredita?

Eron tinha razão. Havia muitas coisas estranhas desde o começo. Uma cadeira flutuante e eu me preocupando se ele é um ser mágico ou não? Ele ainda se esqueceu de falar da passagem para a casa dele. O modo como ele recitou aquelas palavras estranhas e um sensor eletrônico apareceu como mágica. Sem falar que a passagem secreta para a casa de Sophos era em um esgoto!

E mesmo com tantas coisas estranhas, eu me recusava a acreditar. — Você por acaso é um maníaco? — perguntei a Sophos. — Não. — Já foi internado em alguma clínica de reabilitação? — Não. — Possui algum problema psicológico? — Não. — Nasceu com deficiências mentais? — Não. Eu me irritei. Eu estava ali perguntando coisas ofensivas para ele, que

sequer se importava. Respondia com uma calma perturbadora. Como ele se atrevia? Era ridículo acreditar nas coisas que ele dizia.

— Esse homenzinho me tira do sério. Não conversamos mais até chegarmos ao fim do extenso corredor. Havia

várias portas falsas como aquela que levava à casa de Sophos, mas estas eram diferentes. Os desenhos inscritos nas portas eram mais detalhados, com imagens de ilhas e um extenso oceano. Nosso novo amigo leprechaun soprou a porta e os desenhos brilharam. Era como se ganhassem vida e ficassem coloridos.

Outras portas mostravam desenhos de extensos desertos, continentes flutuantes ou cidades de fogo. Aproximei-me de cada uma delas, que possuíam diferentes nomes. Pisces, Taurus, Arietis, Capricorni, Sagittarius, Scorpion, Virgo, etc. De fato várias delas possuíam nomes de signos, mas outras se chamavam Ignis, Aeris, Salttus.

Sophos pronunciou uma palavra em outra língua, mas desta vez reconheci a palavra e o idioma. Era latim, sem dúvidas. Ele havia dito “Aperire!”, que mais à frente descobri significar “Abra!”. Ela se abriu lentamente e um nome cintilou. AQUARIUM. Um velhinho corcunda, que parecia ter surgido da escuridão, nos ultrapassou e adentrou a entrada.

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— Estão prontos? — perguntou Sophos. — Essa é a passagem para a dimensão de Aquarium. E logo estaremos na Cadeia de Ilhas de Króton Bleeds.

Passamos pela porta e atravessamos outro corredor escuro, iluminado apenas por pequenas fontes de luz, que eu não fazia ideia de onde vinham. O chão que antes era de terra e concreto, começou a se tornar metalizado, como se estivéssemos entrando em uma estação rodoviária moderna e tecnológica. Telas apareceram de repente nas paredes, mostrando-nos que estávamos sendo observados.

De repente, todas as luzes se acenderam e uma voz feminina anunciou: — Vocês estão na estação BCC (Bairro Celta Clássico). O rosto da mulher surgiu em todas as telas ao mesmo tempo, o que me

deixou muito confusa. Ela era bonita, mas as orelhas eram pontudas e peludas. E pior. Quando seu corpo aparecia inteiro na tela e ela se virava, víamos seu rabo castanho, que era peludo como a orelha. — Bem vindos! Querem bebidas enquanto esperam?

Das paredes surgiram mesas com refrigerantes e hambúrgueres deliciosos. Já havíamos ingerido as pílulas, mas não deixamos de aproveitar a oportunidade. Sophos aceitou uma bebida azul que vinha em uma garrafa de vidro. Resolvemos experimentar. No rótulo estava escrito Suco de Hirnum. E o que era isso? É melhor você não saber, porque quando descobrimos cuspimos tudo no chão metálico. Mas, para ser franca, a bebida era ótima.

Quando a moça na tela sorriu, percebi que os seus dentes caninos eram maiores do que o normal. Mas, tudo bem. Porque desde o dia anterior, nada mais parecia normal.

— Aqui estão seus tickets. — Três papéis pequenos com orientações em latim foram lançados das paredes. — Eles são como passagens para a dimensão de Aquarium. Aguardem dez segundos na área de embarque.

Uma porta se abriu e entramos. Havia um lugar com jogos e revistas virtuais para passar o tempo, mas a mulher das orelhas peludas falou sério quanto aos dez segundos. Tudo voltou a ficar escuro e no tempo exato, nosso transporte chegou à área de embarque. O homem mais feio que eu já vi pegou nossas passagens e nós entramos. O velhinho da bengala também estava lá, resmungando:

— Essas viagens estão sendo exaustivas para mim. Eu já não sou o garotão que eu era mil anos atrás!

O coitado parecia muito velho e acabado, mas eu não chutaria mil anos. O transporte era todo transparente e havia várias cabines esféricas que

ficavam uma atrás da outra. Ele andava por trilhos, mas não se parecia nada com

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um trem. Tivemos alguma dificuldade para encontrar nossos lugares no escuro, mas logo outra tela apareceu em cada uma das cabines. A moça sorria na tela, aguardando para dar as instruções.

— Por favor, permaneçam sentados e com o cinto de segurança durante todo o percurso. A estação BCC não se responsabiliza por danos cerebrais, ferimentos no corpo ou mortes. Se gritos de terror forem realmente necessários nessa viagem, tentem ser breves. Agradeço a preferência e boa viagem.

Aquilo realmente não me deixava tranquila. A tela se apagou e estávamos novamente no escuro, mas não por muito tempo. À medida que as cabines esféricas se moviam pelos trilhos, eles se iluminavam em cores diferentes. O transporte começou a aumentar a velocidade e aconteceu uma coisa inesperada: nós entramos na terra.

Estávamos em alta velocidade, economizando nos gritos. As cabines atravessavam a terra e a única coisa que podíamos ver eram os trilhos coloridos e iluminados ao nosso redor. No meio do trajeto as esferas se separaram, tomando caminhos, curvas e voltas impossíveis. Não gostei muito de virar de cabeça para baixo, mas só depois disso consegui entender o transporte. Era uma montanha-russa no escuro, que atravessava a terra.

Logo as cabines se juntaram e fomos lançados para fora da terra. Saímos em segurança das nossas esferas, sem danos cerebrais ou mortes. O velhinho, porém, havia sumido. O mais estranho era que aquele lugar não se parecia com nada que eu tivesse visto antes. Procurei por Mel e descobri que ela estava sã e salva na cadeira da cabine, que possuía um dispositivo de proteção admirável.

— Uma montanha-russa? — eu perguntei. — Você não falou nada sobre isso, Sophos. Não poderíamos simplesmente atravessar uma porta e já chegar aqui? Precisava disso tudo?

Sophos deu de ombros. — Achei que vocês jovens gostassem de um pouquinho de aventura. Ele tirou um cachimbo da bolsa e começou a fumá-lo. — Eu achei bem divertido! — exclamou Eron. — Irônico, não? Porque você estava gritando igual a uma garotinha —

caçoei. Eron me deu um soco no braço, mas eu não estava interessada em iniciar

uma briga de irmãos. Seguimos Sophos até uma estradinha reformada. Onde estávamos? Eu

nunca vira um lugar assim. A rua era feita de um material eletrônico, que, quando pisávamos, desenhos se formavam embaixo de nossos pés. Podíamos desejá-los se quiséssemos. No meu caso, desejei borboletas coloridas, e elas

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imediatamente se formaram sob meus pés. Eron escolheu carrinhos de corrida. Sophos escolheu uns símbolos esquisitos que eu não sabia o que significavam. E a pobre Mel nem tocou os pés no chão.

Não havia sinal de casas por lá. Parecia que estávamos no meio de uma floresta tecnológica. Havia computadores para uso grátis debaixo das árvores e uns dispositivos que adivinhei serem telefones ou celulares. A grama era bem verde e o céu azul-claro. Era um lindo lugar.

Caminhamos até chegar perto de uma montanha. Uma pedra gigantesca cobria a passagem do que eu supunha ser uma enorme caverna. Nem mesmo um super-herói poderia movê-la, pensei sorrindo. Sophos pediu que nos aproximássemos ainda mais.

— Chegamos — ele avisou. — Esta é a entrada da Cadeia de Ilhas. O interessante é que aqui é realmente um lugar. Acho que vocês o chamam de... Triângulo das Bermudas.

— Triângulo das Bermudas? Estamos nele? — Sophos assentiu e Eron espantou-se ainda mais. — Como é possível?

Olhei para o céu, cismada. — Mas e se os humanos voassem de helicóptero ou de avião, por exemplo,

não veriam o que existe do outro lado? Sophos balançou a cabeça. — Impossível — ele disse. — Os mortais comuns não possuem ainda

capacidade suficiente para ver as ilhas ou qualquer coisa da dimensão de Aquarium. Eles só conseguem ver aquilo que os olhos físicos são capazes de ver. Um dia eles também serão capazes de ver além... — suspirou Sophos.

— E se navegassem até as ilhas, não bateriam o barco ou o navio em alguma delas?

— Também é impossível. Lembre-se de que estamos falando de outra dimensão. Se as ilhas ficam em outra dimensão, nesta dimensão eles não conseguem ver a outra. E muito menos senti-las. Mas então surge resposta para os mitos de aviões e navios desaparecidos aqui. Pode acontecer de uma pessoa entrar em outra dimensão sem querer. E, na maioria das vezes, essa pessoa não sabe como voltar.

— Entendi — eu disse. — Então, como fazemos para atravessar? Há uma pedra gigantesca, não sei se você percebeu.

— É fácil — disse ele naturalmente. — Veja. Ele se aproximou da pedra rochosa e disse novamente a frase que eu não

entendera antes, mas agora me parecia muito clara:

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— Placere, Aperire! A segunda palavra eu já ouvira, mas a primeira era nova. Juntas

significavam “Por favor, abra!”. E a pedra deslizou para o lado direito para que pudéssemos atravessar a

caverna.

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ippa, Eron e Mel embarcam na maior aventura de suas vidas após o desaparecimento misterioso de seus pais e um encontro nada habitual com uma criatura mitológica que vive próximo a eles, um rabugento e sábio leprechaun morando em um beco do Rio de Janeiro.

Juntos, precisarão enfrentar inumeráveis perigos e desvendar os segredos por trás do desaparecimento dos pais, descobrindo a si mesmos e o valor da família em suas vidas.

P

e Mel embarcam na maior aventura de suas vidas após o desaparecimento misterioso de seus pais e um encontro nada habitual com uma criatura mitológica que vive próximo a eles, um rabugento e sábio leprechaun morando em um beco do Rio de

ecisarão enfrentar inumeráveis r os segredos por trás do

desaparecimento dos pais, descobrindo a si mesmos e o valor da família em suas vidas.