Aragão, Isabella. Quando cinema se torna gráfico.pdf

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    Red de Revistas Cientficas de Amrica Latina, el Caribe, Espaa y PortugalSistema de Informacin Cientfica

    Isabella AragoQuando o cinema se torna grfico: um estudo sobre configuraes grficas em filmes contemporneos

    Revista Design em Foco, vol. I, nm. 1, julho-dezembro, 2004, pp. 9-17,Universidade do Estado da Bahia

    Brasil

    Como citar este artigo Fascculo completo Mais informaes do artigo Site da revista

    Revista Design em Foco,ISSN (Verso impressa): [email protected] do Estado da BahiaBrasil

    www.redalyc.orgProjeto acadmico no lucrativo, desenvolvido pela iniciativa Acesso Aberto

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    9Quando o cinema se torna grfico: um estudo sobreconfiguraes grficas em filmes contemporneosWhen cinema becomes graphic: a study on graphic configurationsat contemporary movies

    ResumoNeste artigo apontamos para o crescente uso de elementos grficosesquemticos em filmes contemporneos, representaes visuais renegadasda linguagem cinematogrfica. Abordamos como essas configuraesgrficas se relacionam com as imagens filmadas. Atravs de dois exemplosanalisados pela semitica social, retirados dos filmes Magnlia (1999) eDogville (2003), demonstramos que a integrao de palavras, formas eimagens tambm funcionam no cinema tanto quanto no design grfico epodem ajudar no discurso narrativo do filme.

    AbstractIn this article we point to the increasing use of schematic graphic ele-ments at contemporary movies, such representations are denied fromthe cinematographic language. We approach how these graphics con-figurations relate with the live action. Through two examples analyzedby social semiotic, from Magnlia (1999) and Dogville (2003), we giveevidence that the integration of words, forms and images can work inthe cinema as much as work in graphic design, helping the narrativediscourse of the movie.

    Palavras-chaveCinema, linguagem cinematogrfica, linguagem grfica.

    KeywordsCinema, cinematographic language, graphic language.

    1. IntroduoA busca pela representao de imagem em movimento comea muito antesda fotografia e do que se pode imaginar. O longo caminho do cinemainiciou-se com os homens pr-histricos e seus desenhos sequenciais emcavernas, passou pela inveno da cmara escura e da fotografia atchegar em vrios aparatos pr-cinematogrficos que tentavam sintetizaro movimento, como o fenaquisticpio. No entanto, o ser humano teve queevoluir bastante para aprimorar a stima arte. E, atravs dodesenvolvimento tecnolgico, no perdeu a vontade de aperfeio-la. Emum sculo de existncia, o cinema passou por vrias transformaes. Desdea introduo da narrao, a possibilidade do uso da cor e do som, at autilizao dos efeitos especiais. Pode-se afirmar que o cinema, comoestamos habituados a assistir hoje em dia, se diferencia totalmente dasprimeiras exibies cinematogrficas.

    Essas transformaes tecnolgicas possibilitaram seudesenvolvimento como meio de comunicao e, por conseguinte, de sualinguagem. Atualmente diferentes signos visuais interagem num filme paragerar significado. Tudo possvel e principalmente aceitvel, inclusivetrocar o modo de representao de um de seus elementos, o cenrio. Assim,Dogville (2003) transforma ruas, casas, rvores em formas geomtricas.

    No mundo contemporneo em que vivemos estamos cada vez mais

    Isabella AragoDesigner graduada pela Universidade

    Federal de Pernambuco no ano de 2002,na ocasio ganhou o Prmio Gasto de

    Holanda pelo melhor projeto degraduao, que foi desenvolvido em duas

    publicaes em congressos nacionais einternacionais na rea de design.

    Atualmente est cursando o primeiroano do Mestrado em Design da UFPE.

    Participou da equipe de design doCESAR (Centro de Estudos e SistemasAvanados do Recife) de novembro de2000 a outubro de 2002 e colabora na

    rea de interface de sistemas na empresade informtica ZAITE desde ento.

    Paralelamente, participa, junto commais trs designers, do projeto Quattorque investe em pesquisa na rea audio-visual e atua nas reas de multimdia e

    projetos grficos editoriais.

    Sobre a autora:

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    10circundados de complexas formas de representaes visuais, diagramas,mapas, e notaes musicais so alguns exemplos do que podemos chamarde linguagem visual, que foi definida por Horn (1998) como sendo aintegrao de palavras, imagens e formas em uma nica unidade decomunicao. Isso significa que a linguagem visual no trata de seuselementos separados, para ele, imagens sozinhas, palavras sozinhas eformas sozinhas no fazem parte de uma verdadeira linguagem visual.

    Neste artigo abordamos semanticamente como a linguagem visualest sendo trabalhada no cinema.

    2. NarraoDamos forma ao nosso pensamento atravs da linguagem e atravs dalinguagem contamos histrias. Alm de um texto literrio, uma pea deteatro relata uma histria, as histrias em quadrinhos narram histrias eum filme conta uma histria. Com o intuito de se comunicar, narramalguma coisa cada uma possuindo sua linguagem peculiar e uma sintaxepara tecer seus significados. Nesses exemplos podemos perceber que noestamos somente nos referindo a linguagem verbal.

    Para todas essas diferentes formas de comunicao narraremprecisam possuir algo em comum, que vai alm de suas linguagens, algoque defina uma estrutura narrativa. Portanto, o que necessrio para secontar uma histria? Existem elementos fundamentais para caracterizaressas obras de narrativas, cada uma delas tem que possuir enredo,personagens, narrador e nos informar sobre o tempo e espao da obra.Mais especificamente, como definiu Cardoso (1997), os eventos estopresentes como fices ou representaes, mas ausentes como realidades.Ou seja, contam algo que ocorreu ou ocorrer em um determinado tempoe num determinado lugar.

    Como estamos falando de cinema, discutiremos a partir de agorade quais elementos o cinema se utiliza para contar suas histrias.

    3. Linguagem CinematogrficaInicialmente os filmes tinham um carter reprodutivo e ainda nopossuam uma linguagem especfica que os denominassem como umamanifestao artstica, como a pintura e a literatura. A introduo danarrao, com os filmes de George Miles e David W. Griffith, marcou oincio do percurso da definio da linguagem cinematogrfica.

    Segundo Marie (1995, p.158), durante as primeiras dcadas deexistncia do cinema, alguns estudiosos, de Bla Balzs a Cristian Metz,tentaram decifrar o que significava essa tal linguagem cinematogrfica.Porm, o que interessa quando se trata desse assunto no a atribuiode uma linguagem ao cinema, querendo compar-la a linguagem verbal etentando criar uma gramtica cinematogrfica, e sim entender como ocinema funciona como meio de significao em relao s outraslinguagens.

    semanticamente falando que o cinema transforma as imagensem movimento em elementos significantes. Caracterizando-se assim comouma linguagem. Para Mitry (1963, apud MARIE, 1995, p.174), existesim uma linguagem cinematogrfica, mesmo que seu material significanteno seja figuras convencionais.

    As linguagens so classificadas de homogneas e heterogneas deacordo com seu material de expresso1 . A heterogeneidade do cinema explicada quando se olha para os seus materiais de expresso e se deparacom materiais distintos e tambm pelo encontro, no filme, dos elementosprprios do cinema e daqueles que no o so (MARIE, 1995, p.192).Segundo Marie, a linguagem cinematogrfica composta por imagensfotogrficas (filmadas) e notaes grficas na trilha da imagem e som

    1 O material da expresso a naturezamaterial (fsica, sensorial) do significante

    ou, mais exatamente, do tecido no qual sorecortados os significantes (HLELMSLEV

    apud MARIE, 1995, p.193).

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    11fnico (fala), som musical (msica) e som analgico (rudo) na trilhasonora. O nico desses materiais que especfico do cinema o da imagemem movimento (ibid, p.192-194).

    No entanto, a eletrnica trouxe ao cinema uma abrangncia nosmateriais sgnicos, mudando apenas a superfcie do significante. Isto ,os filmes podem ser filmados por cmeras de vdeos ou digitais e depoistransportadas para pelcula, assim como imagens gerados pelocomputador. O cinema comea a dialogar com outras linguagens diferentescomo televiso, vdeo, holografia e as tecnologias informatizadas. Aeletrnica comandou ganhos avassaladores aos filmes, desde a concepoat a ps-produo, e tambm no livre trnsito das imagens entre o cinemae a televiso, alimentando assim suas indstrias.

    3.1 Cinema EletrnicoAntes da introduo dos suportes eletrnicos na produocinematogrfica, o cinema j tinha avanado tudo em relao ao seusistema de representao e estava num momento estagnado, como suportetcnico e como indstria, afirmou Nunes (1996, p.24).

    A caracterstica temporal do vdeo de operar com o tempopresente trouxe ao cinema uma facilidade na manipulao de suasimagens. Primeiro que as imagens filmadas na pelcula s poderiam servisualizadas depois de reveladas, e depois a montagem artesanal damoviola requeria uma preciso absurda, j que eles no tinham refernciade como ficariam a sequncia. Com o vdeo sendo utilizado durante asfilmagens (numa cmera acoplada a cmera cinematogrfica), os diretorestm uma visualizao de como esto saindo os planos, a iluminao, etc.e na fase da montagem, podem realizar uma pr-montagem eletrnicapara depois ir a moviola (Costa, 1989, p.147).

    Porm, o mais importante aspecto da insero da eletrnicadigital no cinema no campo esttico e se refere ao emprego de computergraphics, isto , de imagens produzidas diretamente com o computador,em lugar dos tradicionais efeitos especiais, fsico-mecnicos e ticosdefiniu Costa (1989, p.148). Abrangendo essa definio de Costa, Nunes(1996, p.84) inclui o conceito de infografia, referindo-se no somente aosefeitos especiais, mas a todo o potencial de manipulao de imagem geradapelo computador (cenrios artificiais, colorizao de filmes antigos,animao 3D, grafismos eletrnicos, etc.), antes utilizadas poeticamentepela videoarte. Chegando at a chamar essa nova linguagemcinematogrfica de impura, mas sem deixar de exaltar seu hibridismo(com imagens totalmente geradas por computador, imagens fora desintonia, rudos, a utilizao da eletrnica em todas as fases de produo,etc.), de mencionar que a infografia trouxe uma nova qualidade de signos,gerando imagens inditas e reascendendo a chama da indstriacinematogrfica.

    Indstria essa que usar e abusar dessa nova qualidade deimagens das tecnologias digitais, impulsionada pela nsia do espectador,para fins comerciais, com a produo de filmes recheados cada vez maisde efeitos especiais. Em contrapartida, para poder produzir esse tipo defilme, necessrio um investimento em pesquisas que possibilitaroinovaes qualitativas e podero ser usadas para fins mais criativos, emfilmes de obras poticas como disse Nunes (ibid, p.54). Filmes que jcomeam a utilizar as tecnologias digitais, em A ltima tempestade dePeter Greenaway (1991) pginas de livros so animadas e se transformamem quadros do filme.

    Se o cinema do sculo 20 era todo fundamentado nas imagensfotoqumicas, hoje, esse material torna-se apenas uma das opes de umfilme. Assim define Manovich (2001) o cinema digital, uma composio

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    12de seis materiais (relacionados a imagem): filmagem ao vivo, pintura,processamento de imagem, composio, animao 2D e animao 3D.

    O material ao vivo, como j foi esclarecido, pode ser vdeo,pelcula ou digital. A pintura, o processamento de imagem e a composioso as manipulaes do material filmado ou a criao de novas imagens.

    O material flmico contemporneo, ento, tanto pode ser todofilmado sem nenhuma alterao quanto montado com cenas 3D geradasno computador ou pintado. Essas alteraes leva a produocinematogrfica atual a se parecer com o cinema mudo, quando osfotogramas eram pintados um a um para conseguir o tom apropriadopara a cena. No filme, Forest Gump (1994) a boca do Presidente Kennedyfoi alterada quadro a quadro para ele pronunciar novas palavras(MANOVICH, 2001).

    Ento, chegamos num cinema em que basicamente tudo possvel,no campo esttico e tecnolgico. Com essa nova roupagem da linguagemcinematogrfica, o que poderamos considerar como sendo elementogrfico nos filmes? Para tanto, primeiro precisamos definir o que linguagem grfica.

    4. Linguagem Grfica importante ressaltar que trataremos nesse artigo s da trilha da imagem,mais especificamente s do canal visual como props Twyman (1982) emseu modelo, exibido na Figura 1, para definir a linguagem grfica.

    Twyman (1982) divide as mensagens recebidas em doiscanais: o auditivo e o visual. Subdividindo o canal visual tem-se a linguagem grfica e no grfica (onde se encontra, porexemplo, a linguagem gestual). A grfica possui trs modos desimbolizao: o verbal, o pictrico e o esquemtico (tudo oque no for decididamente verbal, numrico ou pictrico).

    Comparando com a definio de linguagem visual deHorn (1998), o modo de simbolizao verbal so as palavras,o modo de simbolizao pictrico as imagens e o modo desimbolizao esquemtico so as formas.

    Na linguagem cinematogrfica, um pouco mais complexaque a grfica, pois trabalha com os dois canais, o auditivo e o

    visual, as imagens fotogrficas so elementos do modo de simbolizaopictrico e as notaes grficas, por definio, so elementos verbais.Contudo necessrio exemplificar melhor essas notaes grficas, quechamaremos aqui de configuraes grficas, e mostrar que assim como odesign grfico se utiliza de todos os seus elementos para se comunicarmais eficientemente, o cinema, como linguagem visual, tambm estutilizando outros elementos visuais, como formas geomtricas e setas,para criar planos mais expressivos e impactantes.

    4.1. Breve Histrico da Linguagem Visual do CinemaO material bsico da linguagem cinematogrfica a imagem, como definiuMartin (1963), porm desde o comeo do cinema encontram-se elementosgrficos como configuraes significantes. Foram definidos somente comoelementos verbais e eram geralmente usadas como legendas decontinuidade (fazendo economia de cenas suprfluas) e legendas dedilogo, assim definidas por Bamba (2002). Formas tambm eramutilizadas, provavelmente como bordas ornamentais das legendas.

    Mesmo depois que os filmes se tornaram sonoros, as palavrasescritas continuaram tendo seu papel na narrativa. Nessa etapa participamda paisagem flmica e so sobrepostas as imagens. Alguns diretores(Godard e Eisenstein), tentando romper com a prtica cinematogrfica,utilizaram tantos elementos grficos que surge o fenmeno hipergrafismo.

    Figura 1 - Modelo desenvolvido porTwyman para juntar a viso doslingistas e designers sobre linguagem.(Fonte: TWYMAN, 1982, p.7).

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    13Futuramente a informtica tornar os filmes interativos, com

    muitas possibilidades de escolhas, entre elas como a histria ser narrada,podero ser escolhidos que elementos sero includos ou excludos do filme.Nessa fase os elementos grficos podem se tornar to fundamentais quantoas imagens filmadas.

    Constatamos atravs das notaes grficas definidas por Marie(1995) que o modo de simbolizao nmerico/verbal est definitivamenteincorporado na linguagem cinematogrfica. Seguindo seus exemplos denotaes grficas nos filmes, temos:

    a. notaes grficas inseridas sobre as imagens filmadas, a frasedu musst caligari verde em O gabinete do doutor Caligari(Figura 2) por exemplo;b. notaes grficas como peas grficas filmadas, a pgina dejornal de Cidado Kane (Figura 3), por exemplo;c. notaes grficas fazendo parte da paisagem flmica, como ocartaz de O anjo azul (Figura 4).Relacionando as configuraes grficas com o filme,

    abrangeremos essa definio obtendo:a. configuraes inseridas sobre as imagens filmadas (Figura 2);b. configuraes inseridas entre as imagens filmadas (Figura 3);c. configuraes inseridas no filme (Figura 4).Descrevendo os trs tipos acima definidos, as interferncias

    inseridas sobre a imagem filmada so produzidas separadamente e depoisconjugadas com os fotogramas. As configuraes intercaladas com osfotogramas (entre as imagens), so tambm produzidas a parte, porm,aparecem sem sobreposio das imagens flmicas, o caso do jornal deCidado kane, ele foi produzido especialmente para o filme, filmado eapresentado na sua totalidade na tela do cinema. E, por ltimo, asconfiguraes apresentadas no filme, isto , fazem parte da paisagem ouso sobrepostas a objetos, como em O livro de cabeceira, alguns textosso projetados e escritos nos corpos dos personagens. Todas as categoriaspossuem duas subdivises, as configuraes estticas e as dinmicas.Exemplos de configuraes inseridas sobre o filme, mas que aparecemora estaticamente ora dinamicamente, so os nomes dos livros em O livrode cabeceira e a letra de uma msica escrita em francs, respectivamente.

    Para as configuraes que se localizam no filme necessria umadefinio de critrios para sua escolha. Se fssemos considerar todas asconfiguraes dessa categoria, teramos que analisar qualquer placa decarro ou cartaz nas ruas captadas aleatoriamente pela cmera. Nopretendemos uma catalogao dos aparecimentos desta linguagem no filme,assim sendo, a pesquisa assemelhar-se-ia a identificar erros decontinuidade e aparies do microfone.

    Utilizando a definio de que as imagens so utilizadas paracomunicar, no podemos deixar de levar em considerao a inteno doautor, porm algumas vezes ocorre uma distncia entre o que a figurasignifica e o que seu produtor quis significar. Torna-se essencial diferenciara inteno do produtor em dois tipos: a primeira sendo uma intenoespecfica de produzir uma imagem (colocando informaes quehabilitaro o observador identificar alguma coisa atravs de um modo deidentificao pictorial) e o segundo tipo como sendo uma inteno geralde representar alguma coisa de qualquer maneira. Ento teramos ainteno pictorial, como sendo a de produzir um trabalho identificvelpictoriamente e a inteno comunicativa, a de representar alguma coisa.(LOPES, 1996)

    Fazendo um paralelo com as configuraes inseridas na paisagemflmica, distinguiremos dois tipos em relao inteno em si. Asconfiguraes intencionais seriam as que so utilizadas com a intenode representao grfica, de gerar significados graficamente e as

    Figura 2 - O gabinete do doutor Caligari, deRobert Wiene, 1920.(Fonte: MARIE, 1995, p.179)

    Figura 3 - Cidado Kane, de Orson Welles,1940. (Fonte: MARIE, 1995, p.180)

    Figura 4 -O anjo azul, de Josef vonSternberg, 1927. (Fonte: MARIE, 1995,p.180).

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    14configuraes no-intencionais so captaes aleatrias da cmara. Assim, importante esclarecer que so desprezadas as informaes grficas no-intencionais inseridas na paisagem flmica.

    Outra questo relevante abrange os elementos pictricos,enquanto os elementos verbais e esquemticos so facilmente identificadoscomo grficos, uma figura pode gerar dvida j que a imagem o materialbsico da linguagem cinematogrfica, como definiu Martin (1963, p.17).Poderemos utilizar a definio de linguagem cinematogrfica e somentedefinir como elemento pictrico imagens que no sejam mveis, mltiplase colocadas em srie como definiu Marie (1995, p.193).

    5. Semitica SocialSegundo Jewitt e Oyama (1999, p.134), a semitica social da comunicaovisual envolve a descrio de recursos semiticos, pesquisa o que podeser dito e feito com imagens. No trata de cdigos e regras entre referentee significado como os estruturalistas da escola semitica de Paris, e simde recursos de representao, que so escolhidos atravs de critriossubjetivos do fabricante do signo, num determinado momento e contexto.De acordo com eles (ibid, p.140), essas formas de representao foramdesenvolvidas para realizar diferentes trabalhos semiticos, que foramreconhecidos por Halliday (apud Jewitt e Oyama, p.140) em trs tiposdistintos e chamados de metafunes. A funo ideacional que criarepresentaes; a funo interpessoal que produz interao entre oescritor e o leitor; e a funo textual que arranja elementos em tiposespecficos de textos. Ento, qualquer imagem alm de representar omundo (funo ideacional), tambm participa de alguma interao com oleitor (funo interpessoal) e se constitue um tipo reconhecido decomposio (funo textual), uma pintura, propaganda, ou mapa, porexemplo.

    Utilizaremos a classificao de semitica social de Kress eLeeuwen (1996). Segundo eles (1996, p.40), a linguagem visual, assimcomo as outras linguagens, tem que conseguir comunicar diferentesacontecimentos se quiser funcionar como um sistema de comunicaocompleto. vista disso, adotaram a noo de metafuno de MichaelHalliday descrita acima, utilizando outra terminologia: padres derepresentao, padres de interao e padres de composio. O padrorepresentacional trata dos elementos e das diferentes maneiras como elesesto relacionados, o padro interativo lida com a relao entre produtor,observador e objeto representado. Enquanto o padro composicionalanalisa recursos de composio, como a relao direita esquerda entreimagem e texto.

    Visto que estamos interessados em descobrir que relaes asconfiguraes grficas estabelecem com as imagens fotogrficas, osexemplos a seguir sero analisados pelo padro representacional.

    O padro de representao dividido em dois tipos deestruturas, como mostra a Figura 5. As estruturas narrativas,que representam os participantes fazendo algo para algumou com ele mesmo e as estruturas conceituais, querepresentam os participantes no como fazendo algo, masem termos de classe, estrutura e significado. Elas definem,

    analisam ou classificam e so divididas em trs tipos de processosprincipais: classificatrio, analtico e simblico.

    5.1. Relaes entre as Configuraes Grficas e Imagens Filmadasou Elementos PictricosEm Magnlia (1999) de P. T. Anderson, existe uma cena no comeo dofilme onde narrada a trajetria de um suicdio. Um homem se joga de

    Figura 5 - Estruturas representacionais.(Fonte: Kress e Leeuwen, 1996, p.56).

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    15cima de um edifcio e atingido por uma bala enquanto cai, porconseqncia do tiro ele morre antes mesmo de se chocar no cho. Essacena alm de ser narrada verbalmente, e mostrada visualmente pelasimagens filmadas, tambm traada na tela por formas e linhas, comomostra a seqncia da Figura 6.

    Como as imagens filmadas ficam paralisadas em toda a cena, quedura 23 segundos, a ateno do espectador se dirige para as configuraesgrficas. Nesse exemplo, quem narra a trajetria visual do corpo so oselementos esquemticos. Para Kress e Leeuwen (1996) o que caracterizauma representao narrativa a presena de um vetor (linha obliquaformada pelos elementos representados que fazem parte da ao). Nessecaso, o vetor no est implcito, como acontece com as imagens analisadaspor eles, porm mostrado ao espectador, a prpria configuraogrfica. Portanto, sua relao com as imagens filmadas narrativa.

    Para analisar Dogville (2003) no podemos isolaruma cena em particular, pois os elementos grficosfazem parte de praticamente todo o filme. Ao invsde ser filmado ao ar livre, o diretor preferiuutilizar um cenrio fictcio onde no existem casas,ruas, rvores e at cachorros. Esses sorepresentados atravs de formas geomtricas epalavras (Figura 7).

    O processo existente na imagem analtico, comodefiniu Kress e Leeuwen (1996) a mais elementaropo no sistema de representao visual, seriaequivalente a descrever tudo o que a imagempossui, seus atributos possessivos. Os elementosgrficos informam, por exemplo, o tamanho e area da casa, onde se localiza e os nomes das ruas.So elementos que no dizem nada sobre algumaao, mas sobre como suas partes se organizampara formar um todo.

    6. Futuras PesquisasA pesquisa inova ao estudar a linguagem grfica em movimento.Principalmente, ao propor um mapeamento dessa linguagem no cinema,visa descobrir que relaes existem entre os elementos grficos e anarrativa flmica, se esses participam do discurso narrativo significanteassim como os outros elementos flmicos. Trar benefcios para o design eo cinema, pois explorar a utilizao desses elementos demonstrando suaspossibilidades de significao, ajudando designers e cineastas na produoe interpretao de suas mensagens.

    Para dar continuidade a investigao ser realizada uma pesquisade campo com especialistas sobre cinema que possam sugerir filmes paraa anlise, atravs de uma entrevista no estruturada focalizada.

    Posteriormente para delimitar o universo do trabalho ser feitauma pesquisa exploratria em fontes retrospectivas e contemporneas de

    Figura 6 - Configurao Esquemtica sobre as imagens filmadas (Fonte: Fotografia do filme).

    Figura 7 - Configurao verbal/esquemticano filme (Fonte: http://www.tvropa.com/Dogville).

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    16filmes narrativos atravs de uma observao sistemtica para tentar obteruma primeira amostra abrangendo todas as possibilidades de elementosgrficos (pictricos, verbais e esquemticos) inseridos nos filmes. Levando-se em considerao que existem milhares de filmes que se encaixem nessasituao, sero selecionados os citados nas bibliografias especializadas,indicados pelos especialistas da pesquisa de campo e vistos pela autora.

    Aps a coleta da primeira amostra, utilizaremos uma adaptaoda tcnica de anlise de contedo para afunilarmos e definirmos que filmessero utilizados na anlise.

    Primeira etapa - Amostra de fontesFilmes narrativos de ficoSegunda etapa - Amostra de datasFilmes das quatro fases do cinema (cinema mudo, cinema sonorodos anos 30 aos 50, cinema moderno e cinema ps-moderno).Terceira etapa - Amostra de unidades

    Fazendo uma analogia das unidades com os elementos dalinguagem cinematogrfica, a unidade selecionada a configurao grficainserida durante o filme que se apresentem sobre e no filme, seroexcludos os crditos de abertura e os crditos finais. No sero abordadasas configuraes inseridas entre as imagens filmadas, porque elaspoderiam ser consideradas como peas grficas filmadas. E principalmenteporque no existe relao entre os elementos grficos e as imagens filmadasnum mesmo plano, j que a prpria configurao grfica o plano.

    Como o objetivo da anlise no quantificar, e sim definirsemanticamente que tipo de relao existe entre esses elementos e anarrativa do filme, sero selecionadas configuraes de cada classificaodefinida na pesquisa exploratria:

    Configuraes inseridas sobre as imagens filmadas com:Elementos verbais;Elementos esquemticos eElementos verbais/esquemticos. Configuraes inseridas no filme com:Elementos verbais;Elementos esquemticos eElementos verbais/esquemticos.

    Desse modo podemos traar um panorama de como a linguagemgrfica est se relacionando com os filmes e mais especificamente queelementos esto sendo usados para obter tais relaes.

    7. ConclusoCom os dois exemplos de representao de configuraes grficas nocinema mostrados nesse artigo apontamos para sua utilizaocomunicativa e no como adornos ou configuraes sem significados,demonstramos que os elementos grficos podem assumir diferentesrelaes, ajudando de vrias maneiras os filmes a contar suas histrias.

    8. Referncias BibliogrficasBAMBA, Mahomed. Letreiros e grafismos nos processos flmicosfuncionalidade narrativa, plstica e discursiva da lngua escrita nafigurao cinematogrfica. 2002. Tese (Doutorado em Cincias daComunicao) Escola de comunicao e artes, USP, So Paulo, 2002.

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