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ÁREA TEMÁTICA: Sociologia da Educação [ST] COMO PODE A ESCOLA MITIGAR A DESIGUALDADE DE OPORTUNIDADES? – ESTUDOS DE CASO EM ESCOLAS DO ENSINO BÁSICO DA ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA SEABRA, Teresa Doutora em Sociologia ISCTE-IUL [email protected] VIEIRA, Maria Manuel Doutora em Sociologia ICS-UL [email protected] CASTRO, Leonor Mestre em Educação e Sociedade CIES-IUL [email protected] BAPTISTA, Inês Mestre em Educação e Sociedade CIES-IUL [email protected]

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ÁREA TEMÁTICA: Sociologia da Educação [ST]

COMO PODE A ESCOLA MITIGAR A DESIGUALDADE DE OPORTUNIDADES? – ESTUDOS

DE CASO EM ESCOLAS DO ENSINO BÁSICO DA ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA

SEABRA, Teresa

Doutora em Sociologia

ISCTE-IUL

[email protected]

VIEIRA, Maria Manuel

Doutora em Sociologia

ICS-UL

[email protected]

CASTRO, Leonor

Mestre em Educação e Sociedade

CIES-IUL

[email protected]

BAPTISTA, Inês

Mestre em Educação e Sociedade

CIES-IUL

[email protected]

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Palavras-chave: sucesso escolar; efeito-escola; sociologia da educação; ensino básico

Keywords: school success; school-effect; sociology of education; basic school

COM0752

Resumo

Tendo por base a problemática do “efeito-escola” e do efeito-professor”, o projeto “Escolas que fazem

melhor: o desempenho escolar dos descendentes de imigrantes na escola básica”, em fase de

conclusão, explora os resultados dos alunos do 4º e 6º ano de escolaridade nas provas de aferição de

Língua Portuguesa e Matemática, em três anos consecutivos, considerando as condições socioculturais

dos alunos e os resultados obtidos por cada escola. Tendo sido possível identificar escolas que, tendo

populações escolares em semelhantes condições sociais (escolaridade, classe social dos pais origem

nacional), obtiveram resultados significativamente distintos, foram desenvolvidos estudos de caso

comparativos em três escolas do ensino básico da AML. O texto dá conta dos resultados obtidos

nestes estudos de caso, cujas questões orientadoras foram as seguintes: que variáveis escolares

sustentam esta diferença de resultados observadas? Que práticas e representações específicas

produzem esta mais-valia no desempenho escolar? Através do confronto entre as dinâmicas, processos

e condições intraescolares existentes nestas escolas, as que revelaram um desempenho acima do

“expectável” e as que, tendo populações escolares com perfil social semelhante, não conseguem esses

bons resultados, identificaremos um conjunto de especificidades escolares produtoras de (in)sucesso

escolar.

Abstract

Based on the problem of "effect-school" and effect-teacher, "project" Schools that do best: academic

achievement of children of immigrants in elementary school, "nearing completion, explores the results

of students in the 4th and 6 years of education in the levels tests of Portuguese language and

mathematics, in three consecutive years, considering the socio-cultural conditions of the students and

the results obtained by each school. Having been possible to identify schools that have school

populations in similar social (education, social class of parents national origin), had significantly

different results, comparative case studies were developed in three primary schools of AML. The text

gives an account of the results of these case studies, whose guiding questions were: school variables

that hold this observed difference in results? What specific practices and representations that produce

capital gains in student performance? Through the confrontation between the dynamics, processes and

the existing conditions in these schools, which showed performance above the "expected" and that

having school populations with similar social profile, cannot these good results, we identify a set of

specific school-producing (in) school success.

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1. Pontos de partida

Desde os anos sessenta do século passado, se tem procurado identificar o que pode potenciar a eficácia de

uma escola e diagnosticar os efeitos que os professores podem ter no processo de aprendizagem dos seus

alunos. Tem sido possível identificar um conjunto de variáveis que revelam ter um efeito positivo sobre o

desempenho escolar dos alunos mas, como salienta Thrupp (1999), “a classe social tem estado ausente do

foco das pesquisas sobre eficácia e melhoria das escolas” (p.5-6), resultando numa falta de contextualização

e, consequentemente, num falso sentimento de que estes fatores de desigualdade estrutural podem ser

simplesmente anulados.

O conhecimento científico produzido em torno do desempenho escolar tem revelado a forma como este se

entrecruza com uma constelação muito diversificada de variáveis (Seabra, 2010) e tem sido inequivocamente

confirmada a relevância das condições sociais das famílias dos alunos na explicação da variação dos

resultados.

No que respeita às variáveis escolares, há fortes indícios que as políticas de formação das turmas adotadas na

escola têm um efeito significativo nos resultados escolares dos alunos (Seabra, 2008; Seabra et al., 2010),

mas não se conhece com precisão qual o alcance desta influência e da de outras variáveis de escola (contexto

organizacional, representações e práticas dos professores, relações com a comunidade local).

Com o projecto em cursoi pretende-se contribuir para este debate, ao identificar, por um lado, as escolas que,

tendo populações escolares com semelhantes condições sociais (escolaridade e classe social dos pais e países

de origem), apresentam resultados significativamente melhorados (recorrendo à média e ao desvio-padrão

estandardizados das classificações obtidas a Língua Portuguesa e Matemática) e, por outro, as condições e os

processos que estas escolas implementam e que sustentarão esse bom desempenho. Este trabalho representa

o alargamento de um anterior (Seabra et al., 2010), em que foi possível demonstrar existirem algumas

escolas que “fazem melhor”, na medida em que apresentam níveis de resultados médios nas Provas de

Aferição acima dos de outras cujas populações escolares têm um perfil social semelhante.

2. Objectivos e metodologia

A pesquisa orienta-se em torno de três principais objectivos: i) relacionar resultados escolares e condições

sociais e culturais dos alunos; ii) comparar o desempenho das escolas, considerando o perfil sociocultural da

população escolar e iii) apreender as especificidades escolares que potenciam o poder da escola de promover

a igualdade de oportunidades.

Para o efeito, foi necessário desenvolver o trabalho em duas etapas, correspondentes a diferentes

metodologias de investigação: i) uma componente extensiva que integrou a análise dos resultados nas Provas

de Aferição do 4º e 6º ano da AML, entre 2008/09 e 2010/11 e ii) uma componente intensiva (estudos de

caso) que integrou o estudo em profundidade de 4 escolas.

Tendo por base a informação estatística que nos foi disponibilizada pelo GEPE/ME com indicação do perfil

social de cada aluno que realizou prova nacional e da turma e escola a que pertence, foi possível caracterizar

socialmente a população de cada escola e de cada uma das suas turmas. As condições socioculturais dos

alunos recobrem a formação académica, a profissão e situação na profissão, a naturalidade e nacionalidade

dos pais e, ainda, a naturalidade e nacionalidade do aluno. A partir destes indicadores construíram-se

variáveis agregadas de caracterização da população escolar: o nível académico familiar, a classe social e a

origem nacional dos alunos.

No total foi analisada informação dos alunos das escolas da AML que prestaram provas de aferição, o que

corresponde a cerca de 55 000 alunos repartidos quase equitativamente entre o 4º e o 6º anos de escolaridade,

inseridos em 615 escolas do 1º ciclo e 163 escolas do 2º ciclo, respectivamente.

Para analisar a relação entre o desempenho escolar e as condições sociais e origens nacionais dos alunos,

procedeu-se à construção de clusters de escolas, tendo sido posteriormente projectados num gráfico

cartesiano. A análise prosseguiu fazendo a comparação tão fina quanto possível de diferentes pares de

escolas, seleccionados de acordo com os objectivos do estudo, de modo a eleger as escolas mais

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representativas da diferença de desempenho em igualdade de condições sociais ou de igual desempenho com

condições sociais muito díspares.

A componente intensiva da pesquisa consistiu no estudo comparativo de 4 escolas: 2 com o 4º ano e 2 com o 6º

ano. Como referido, pretendeu-se explorar o “efeito escola” e o “efeito professor” na produção do sucesso escolar.

Foram consideradas dimensões como a organização e funcionamento de cada escola; as interacções intraescolares

e as relações com a comunidade; o clima organizacional; as práticas e as representações dos docentes,

funcionários e alunos e pais. A recolha de informação foi realizada através de: i) entrevistas semi-diretivas (a

membros da direção de cada escola; a professores titulares das turmas de 4º ano; a diretores de turma do 6º ano; a

funcionários não docentes e a técnicos de apoio educativo), ii) da observação em espaços comuns (recreios,

cantina, ginásio...), iii) da recolha de textos elaborados pelos alunos que prestaram as referidas provas de aferição

e, ainda, iv) da consulta de um conjunto muito diverificado de documentos presentes na escola ou disponíveis on-

line (projeto educativo, regulamento interno, dossiers das turmas).

A presente análise reporta-se apenas aos resultados nas provas do 4º ano de escolaridade e a informação do estudo

comparativo das escolas constitui uma primeira sistematização de uma pequena parte dos dados recolhidos.

3. Relação entre o desempenho da escola e as condições socio culturais dos alunos: a selecção das

escolas

Para analisar a relação entre o desempenho escolar e as condições sociais e origens nacionais dos alunos,

procedeu-se à construção de clusters de escolas, utilizando as variáveis: i) escolaridade dos pais (percentagem de

pais com formação superior - até ao 2º ciclo); ii) classe social (percentagem de pais Profissionais Técnicos e de

Enquadramento - PTE - e Operários Industriais - OI) e iii) origem nacional (percentagem de alunos descendentes

de imigrantes e percentagem com origem nos PALOP).

Foram identificados 3 clusters a que correspondem 3 perfis sociais diferenciados: 21 % das escolas concentram

população escolar mais desfavorecida; quase metade das escolas (43%) tem uma população escolar que foi

considerada socialmente intermédia; e 36% concentra população socialmente mais favorecida.

Como se pode observar no quadro 1, a escolaridade dos pais aumenta do cluster 1 para o 3, diminuindo a

percentagem de pais com um nível de escolaridade baixo e aumentando a percentagem de pais com um nível de

escolaridade mais alto. Também no que diz respeito à classe social, aumenta progressivamente o peso dos PTE e

diminui a presença dos OI. Quando se atenta na presença de descendentes de imigrantes (e entre estes de

PALOP), esta é mais acentuada no primeiro cluster, diminuindo no segundo e terceiro.

A cada perfil sociocultural da população escolar corresponde um diferente resultado médio nas provas: a média

aumenta à medida que melhora a condição social. O desvio padrão também diminui à medida que a população

escolar é mais favorecida o que evidencia uma menor dispersão dos resultados obtidos pelos alunos desta

condição social.

1. Pop. soc.

desfavorecida

(nº90=21%)

2. Pop soc. intermédia

(nº184=43%)

3. Pop. soc.

Favorecida

(nº157=36%)

Média DP Média DP Média DP

% Escolaridade familiar alta (Ens. Sup.) 7,4 6,2 11,8 7,4 35,6 13,3

% Escolaridade familiar baixa (até 2ºC) 36,0 15,0 29,3 14,0 10,8 6,6

% Classe social familiar PTE 14,8 9,0 18,9 8,8 36,7 10,9

% Classe social familiar OI 22,3 10,2 18,8 9,8 9,1 5,9

% Alunos descendentes de imigrantes 44,0 11,1 16,8 9,1 17,9 9,5

% Alunos de origem PALOP 31,2 13,0 7,8 6,3 7,1 6,4

Resultados médios nas PA 3,07 0,33 3,30 0,31 3,49 0,24

Quadro 1 - Caracterização dos clusters de escolas

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Projetando as escolas do 1º ciclo onde se realizaram as provas do 4º ano (cada ponto no gráfico representa uma

escola), de acordo com a média estandardizada e a percentagem de pais que completaram no máximo o 2º ciclo do

ensino básico (gráfico 1), evidencia-se que:

i. À medida que aumenta a presença de pais com baixa escolaridade, reduzem-se as notas médias obtidas

(tendência marcada pela linha reta traçada no gráfico) – a intensidade da relação entre as duas variáveis é

significativa, embora baixa (r2 linear = 0.280);

ii. Contudo, existe uma grande amplitude da variação dos resultados médios obtidos pelas escolas e é possível

identificar estabelecimentos que conseguem fazer melhor quando as circunstâncias sociais da população

escolar são as mesmas (escolas com semelhantes perfis sociais apresentam resultados distintos ou que, ao

contrário, com notas médias semelhantes, têm perfis sociais distintos, inclusive dentro do mesmo cluster);

iii. Considerando os diferentes grupos de escolas, verifica-se que existe uma menor dispersão nas escolas com os

perfis sociais mais favorecidos, ao contrário do que acontece com as escolas socialmente mais desfavorecidas.

Quer isto dizer que o contexto educativo afeta mais os resultados dos alunos provenientes de meios sociais

mais desfavorecidos, o que corrobora o que outros estudos tinham já comprovado.ii

Em suma, se é verdade que a grande maioria das escolas da AML alcança um dos desígnios da escola nas

sociedades modernas, como Bourdieu e Passeron indicaram na sua visão crítica (1964), que consiste na tradução

das desigualdades sociais pré-existentes em desigualdades educativas, também é notória a possibilidade de cada

escola poder agir com consequências nos resultados dos seus alunos e a amplitude desse efeito parece ser ainda

maior quando predominam na escola alunos de populações escolares socialmente mais desfavorecidas.

Depois desta primeira análise realizada exclusivamente com a escolaridade familiar, impôs-se aprofundar a

comparação entre vários pares de escolas de forma a potenciar a consistência da selecção de escolas para o estudo

comparativo aprofundado. Para o efeito, foi considerado o conjunto dos indicadores disponíveis (proporção de

alunos segundo o sexo, a ascendência nacional, o número de reprovações, a escolaridade familiar (alta), as

fracções de classe social, o subsídio da Ação Social Escolar).

Do confronto entre dados de diferentes pares de escolas, foi seleccionado um par de escolas que tendo

desempenho médio semelhante tivessem uma população escolar com condições sociais claramente diferenciadas:

a escola A, apesar de ter levado à prova nacional alunos com um perfil social claramente mais favorecido que os

da escola B teve resultados semelhantes à escola B (quadro 2). Assim sendo, a escola B foi considerada uma das

escolas que faz melhor e a escola A assume o lugar de escola de controlo. Situadas no concelho de Sintra e de

Lisboa, respectivamente, demos início ao estudo comparado destas duas escolas, tentando, sempre que possível,

reconstruir a situação das mesmas à data a que se reportam os resultados obtidos nas provas de aferição.

Gráfico 1 - Média estandardizada dos resultados (2008/09 a 2010/11) segundo a percentagem de pais até 2º ciclo

A

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Escola A Escola B

% total de

alunos

% não

respostas

% total de

alunos

% não

respostas

Alunos do sexo feminino 54,1 0 45,4 0

Alunos descendentes de imigrantes 18,0 4,9 40,2 6,2

Alunos com origem nos PALOP 3,3 4,9 38,1 6,2

Alunos com Ação Social Escolar (ASE) 45,9 0 50,6 0

Pais com baixa escolaridade (até 2º EB) 23,0 4,9 24,7 30,9

Pais com alta escolaridade (curso superior) 31,1 4,9 4,1 30,9

Profissionais Técnicos e de Enquadramento

(PTE)

41,0 11,5 7,2 43,3

Operários industriais (OI) 4,9 11,5 10,3 43,3

Classificação média nas provas de aferição 3,03 3,80

Quadro 2 - Caracterização da população escolar do 4º ano (2009/10)

4. No terreno com as escolas seleccionadas

4.1 N(o) acesso

Numa primeira reunião com os respectivos directores de agrupamento a equipa de investigação apresentou o

projecto e solicitou a colaboração do agrupamento para o cumprimento dos seus objectivos e em ambos os

casos o convite de participação foi bem acolhido e prontamente aceite. Este acordo deu origem à celebração

de um protocolo de colaboração entre a escola e o ISCTE-IUL.

Em cada escola, procurou-se aceder aos docentes que tiveram os alunos que prestaram prova nacional nos

anos em estudo, estando presentes na escola a quase totalidade dos mesmos. Para além da entrevista a

realizar a cada um destes docentes, tentámos conhecer de modo aprofundado as respectivas turmas e alunos

em estudo, recorrendo, por regra, ao dossier que reúne a informação relativa a cada turma, designado por

Plano Curricular da Turma. Enquanto a escola A não detém informação sobre si (esta encontra-se na sede) e

o fornecimento dos materiais de consulta necessários foi condicionado à autorização de cada professor, numa

aceção que tem subjacente a ideia que a informação de cada turma é “propriedade” de cada um”, a escola B

detém informação sobre si mesma e o acesso aos materiais de consulta foi-nos facultado sem condições, pois

é considerado material da escola.

Escola A Escola B

Número de docentes do 4º ano 8 13

Número de professores entrevistados 3 4

Planos Curriculares de Turma consultados 4 9

Quadro 3 - As turmas de 4º ano em estudo e o acesso à respectiva informação

4.2 O perfil das escolasiii

As escolas integravam-se em agrupamentos de diferente tipologia (um vertical e outro horizontal) iv e a

escola A, apesar de pertencer a um agrupamento com maior presença de alunos, tem um número mais

reduzido de alunos e de turmas. Em ambos os casos o corpo docente tem sido estável, sendo um pouco mais

novo no caso da escola B. A maior diferença encontra-se no regime de funcionamento horário: enquanto a

escola A tem alunos em horário normal (das 9 às 17 horas) a escola B não tem salas para todos os alunos e

vê-se obrigada a funcionar em horário duplo, podendo assim a mesma sala receber dois turnos de alunos.

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Ambas as escolas tinham 1 docente que exercia as funções de coordenador e que não sendo titular de uma

turma presta apoio pedagógico às turmas num horário pré-estabelecido e a escola A dispunha ainda de uma

docente de PLNM e uma docente do Ensino Especial.

Escola A Escola B

Agrupamento em que se insere Vertical: 2 JI; 2 EB1; 1

EB2/3

Horizontal: 2 JI; 2 EB1

Alunos do Agrupamento (aprox.) 1400 700

Professores titulares de turma da escola 13 16

Idades dos docentes 45-55 anos 30-40 anos

Flutuação do corpo docente reduzida reduzida

Alunos da escola 280 350

Turmas da escola 13 16

Nº de alunos por turma 21,5 21,9

Alunos inscritos no 4º ano 60 100

Turmas do 4º ano 3 5

Horário da escola Normal Duplo

Quadro 4 - Caracterização das escolas – anos letivos de 2008/09 a 2010/11

4.3 Características organizacionais

O quadro 5 condensa os principais resultados obtidos na comparação entre as duas escolas no que concerne

as suas dinâmicas de funcionamento. A dimensão mais contrastante refere-se ao trabalho docente: se, na

escola A, a individualização das práticas pedagógicas constitui a regra, na escola B tais práticas beneficiam

da troca coletiva de experiências, sobretudo quando se trata de encontrar respostas a situações educativas (de

aprendizagem ou comportamentais) mais exigentes. Por sua vez, a relação famílias-escola segue sentidos

opostos: na escola A, a mobilização parental em torno da escolaridade dos filhos traduz-se numa intervenção

muito atuante na vida escolar; na escola B, ela é ativada insistentemente junto das famílias, através de

iniciativas que apelam à participação parental.

Escola A Escola B

Interação

interna

Individualização pedagógica (docentes

trabalham de forma isolada); trabalho

comum só nos momentos formais de

coordenação

Cooperação pedagógica informal entre

docentes (trocam estratégias, ideias, etc.),

para além dos momentos formais de

coordenação

Relações com

a comunidade

Parcerias consolidadas: CML e Jfreguesia

(CAF)

Parcerias consolidadas: AECs, ATLs,

Biblioteca local

Associação de Pais muito atuante (ex:

contrata AECs com apoio da Câmara

Municipal)

Associação de Pais pouco atuante e

representativa

Não há referências à participação das

famílias na escola; pais só chamados à

escola em casos de problema

Trabalho com as famílias: pais acolhidos

desde o início do ano e mobilizados pela

escola para colaborar (Ex: trabalhos,

exposições)

Direção disponível para os pais em

qualquer altura/horário

Quadro 5 - Dinâmicas de funcionamento das escolas

4.4. Organização pedagógica

Sinalizámos atrás a importância decisiva que, ao nível das variáveis escolares, as políticas de formação das

turmas podem assumir nos resultados escolares dos alunos.

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Em ambas as escolas em análise observam-se diferenciações nítidas na composição das turmas, embora os

critérios que as suportam sejam distintos. Na escola A é clara a segmentação social na constituição das

turmas, concentrando a turma 1 os alunos inseridos em famílias mais escolarizadas (70% têm secundário ou

superior) e a turma 3 tem a menor proporção de alunos inseridos em contexto familiares com o ensino

superior (16%) (Gráfico 2). Na escola B não é tão forte a diferença no que se refere à escolaridade dos pais

mas a segmentação dos alunos relacionada com a ascendência imigrante é bem visível, especialmente no

contraste entre as 2 primeiras turmas e as restantes (Gráfico 3).

Gráfico 2 - Composição das turmas da escola, segundo a escolaridade dos pais

Gráfico 3 - Constituição das turmas da escola, segundo a origem nacional dos alunos

8,7 15,8

38,9

13,6 9,5

47,1 47,4

25

21,7

21,1

16,7

27,3 33,4

29,4 21,1

5

13

21,1

16,7

27,3 28,6

11,8 21,1

40 13

26,3

22,2 31,8 19

11,8 5,3

30

43,5

15,8 5,6 9,5 5,3

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Turma 1 Turma 2 Turma 3 Turma 1 Turma 2 Turma 3 Turma 4 Turma 5

SUP

SEC

3º CEB

Até 2ºCEB

% NR

85 82,6

68,4 72,2

86,4

33,3

58,8

42,1

15 13

21,1

27,8

13,6

66,7

41,2

52,6

4,3 10,5

5,3

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

100%

Turma 1 Turma 2 Turma 3 Turma 1 Turma 2 Turma 3 Turma 4 Turma 5

%NR

D.Imi

Autoctones

Escola B Escola A

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Finalmente, as duas escolas contrastam também nas suas dinâmicas pedagógicas. A escola A parece

privilegiar os resultados através da concentração da sua ação nas aprendizagens básicas e sua exercitação

rotineira, eventualmente reforçadas através das visitas de estudo proporcionadas aos seus alunos. A escola B

parece privilegiar os processos, ensaiando diferentes aproximações aos saberes, de acordo com as

características da turma e seus alunos e explorando mais intensivamente o trabalho por projeto – o que requer

o envolvimento dos vários atores escolares. Para o reforço das aprendizagens, contam ativamente com os

apoios dos ATL.

Escola A Escola B

Estratégias para o

sucesso

Professores não parecem ensaiar várias

estratégias pedagógicas

Professores tentam várias estratégias

pedagógicas (compreensão, não só

memorização)

Ênfase na consolidação das aprendizagens via

realização de exercícios de aplicação

Mobilização dos pais para a resolução conjunta

dos problemas de aprendizagem

Importância conferida aos concursos e

competições matemáticas

Importância dos apoios para reforço das

aprendizagens: os ATLs (tpc, estudo, projetos

articulados, etc)

Valorização do esforço - “diploma de mérito” e

“diploma de excelência”

Atividades

paralelas

Projetos: não há praticamente registos de

projetos, seguem o plano de atividades do

agrupamento (semanas temáticas, concursos

matemáticos)

Projetos: vários projetos de escola, para além

do plano de atividades do agrupamento

(Alimentação Saudável, Horta Pedagógica,

semanas temáticas….)

Visitas de estudo: bastantes: média de 2 por

período e ainda visitas pontuais integradas no

plano do agrupamento

Visitas de estudo: algumas; visita turmas do 4º

ano à escola EB23 onde a maioria dos alunos

prossegue estudos.

AEC: Inglês, apoio ao estudo, natação (todas

as turmas em parceria com a CMLisboa) AEC: inglês, música e desporto

Quadro 6 - Dinâmica pedagógica das escolas

Conclusão

Esta breve incursão comparativa a duas escolas do 1º ciclo selecionadas por critérios que decorrem das

questões teóricas do estudo permite evidenciar algumas pistas para a compreensão da “mais-valia” das

escolas que “fazem melhor”. Como se constatou, apesar de ambas as escolas recrutarem uma população

socialmente heterogénea, a escola B apresenta um perfil de alunos claramente mais desfavorecido – embora

os resultados médios obtidos nas provas nacionais de aferição sejam idênticos aos dos alunos da escola A.

Admite-se que os ingredientes que compõem essa “mais-valia” possam variar sensivelmente de acordo com

tipo de alunos ou o nível de ensino considerado. No caso em análise, referente a duas escolas do 1º ciclo

inseridas num contexto territorial próximo – a AML – o estudo evidencia a importância decisiva que uma

dinâmica de funcionamento cooperativa, na busca de soluções para os constrangimentos enfrentados, e pró-

ativa, na mobilização de famílias e parcerias para o envolvimento na ação educativa, parece ter na criação de

um clima escolar mais propício ao desbloqueamento de contrariedades e à adesão dos mais novos às

aprendizagens. Nesse sentido, o desenvolvimento de práticas pedagógicas atentas à singularidade do aluno,

adaptadas às dificuldades identificadas, espaldadas em outro tipo de apoios complementares (de que o

trabalho de reforço desenvolvido nos ATL é exemplo paradigmático), parece ser um esforço coletivo de que

resultam frutos globalmente positivos.

Talvez também por isso acabem, na escola B, por ser amortecidas as consequências potencialmente nefastas

que poderiam advir de um processo de constituição de turmas que, em ambas as escolas, se revela bastante

diferenciador...

Vejamos o que o desenvolvimento do estudo – e a análise comparativa resultante dos estudos de caso

referentes às escolas 6º ano – nos poderá ainda elucidar a este respeito.

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Bibliografia

Bourdieu, P. e J.C. Passeron (1964), Les heritiers- les étudiants et la culture, Paris, Ed. Minuit.

Duru-Bellat, M. (2002), Les inégalités sociales à l'école. Genèse et Mythes, Paris PUF.

Seabra, Teresa (2010), Adaptação e Adversidade - O Desempenho Escolar dos Alunos de Origem Indiana e

Cabo-Verdiana no Ensino Básico, Lisboa, Imprensa de Ciências Sociais.

Seabra, Teresa et al. (2010), (In)sucesso escolar dos descendentes de imigrantes - Origens nacionais e

condições sociais e escolares na escola básica portuguesa, Relatório Final, CIES, ISCTE-IUL.

Thrupp, Martin (1999), Schools making a difference: Let’s be realistic!, Buckingham, Open University

Press.

i Projecto “Escolas que fazem melhor: o sucesso escolar dos alunos descendentes de imigrantes na escola básica”

(PTDC/CS-SOC/119797/2010) em curso no CIES-IUL. ii Como destaca Duru-Bellat, em contexto de resultados de provas internacionais, “(…) as diferenças entre países no

desempenho alcançado são mais acentuadas para os alunos provenientes de contextos desfavorecidos. Inversamente, o

sucesso dos jovens de contextos socialmente mais favorecidos é claramente mais homogéneo de um país (e portanto de

um sistema educativo) para o outro. Isto confirma que estes alunos são menos sensíveis ao contexto.” (2002:165,

tradução própria) iii

Informação reporta-se à situação existente nos anos lectivos em análise, estando à data da recolha de dados

parcialmente desactualizada. iv Desde 2012/2013, a escola A integra um agrupamento com 6 escolas, com sede numa escola secundária e um total de

2000 alunos e a escola B integra um mega-agrupamento com 12 escolas, com sede numa escola secundária e um total

de 4000 alunos.