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Cursos de Especialização para o quadro do Magistério da SEESP Ensino Fundamental II e Ensino Médio Rede São Paulo de Arte como Cultura: Concepções e Problematizações d05 http://1.bp.blogspot.com/_H1bdI-A5MFE/S-QN7Cci4iI/AAAAAAAAA8E/1H0tXTcHaH8/s1600/christies_andy_warhol_mao.JPG

Arte Como Cultura

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Cursos de Especializaccedilatildeo para o quadro do Magisteacuterio da SEESPEnsino Fundamental II e Ensino Meacutedio

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Arte como Cultura

Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildeesd05

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Ensino Fundamental II e Ensino Meacutedio

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extras

SumaacuterioCultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos 5

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito 5

2 Entre Cultura e Natureza 9

3 Versotildees de Cultura 13

Arte como Sistema Cultural 16

1 Hierarquia e Relativismo Cultural 16

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte 20

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel 24

4 Induacutestria e Arte 29

A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura 33

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual 33

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos 37

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura 40

Referecircncias Bibliograacuteficas 46

Extras 48

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Cultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Os conceitos de cultura e de civilizaccedilatildeo foram ao longo da histoacuteria ora considerados sinocircn-imos ora tidos como diferentes mas com significaccedilotildees aproximadas A palavra cultura deriva do latim colere com sentido de cultivar a terra o termo aparecia na antiga Roma em expressotildees como agri-cultura denominando um campo cultivado como cultus

Foi somente partir do seacuteculo XVIII que cultura comeccedilou a significar ldquocultivo do espiacuteritordquo Surgia ao mesmo tempo neste mesmo seacuteculo o vocaacutebulo ldquocivilizaccedilatildeordquo originaacuterio do termo civilitas do latim tardio civitas que designava ldquocidaderdquo

O conceito de civilizaccedilatildeo ldquoque em texto francecircs parece remontar ao ano de 1766rdquo (Aze-vedo 1958 p 20) exprimia o auge do desenvolvimento humano em oposiccedilatildeo agrave barbaacuterie e agrave natureza Segundo Fernando de Azevedo o vocaacutebulo ldquoservia para marcar um estado contraacuterio agrave barbaacuterie estabelecendo uma distinccedilatildeo entre povos policiados e povos selvagensrdquo (Azevedo 1958 p 20)

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A noccedilatildeo guardava assim um sentido extremamente elitista e excluiacutea da civilizaccedilatildeo grande parte das sociedades humanas existentes fora da Europa No final do seacuteculo XIX houve uma imbricaccedilatildeo dos sentidos de cultura e civilizaccedilatildeo nos trabalhos sobretudo de antropologia Os conceitos perderam nos estudos antropoloacutegicos os conteuacutedos elitistas que ateacute entatildeo ostentavam

Na perspectiva antropoloacutegica a cultura era entendida como uma ldquototalidade complexa pro-duzida pelos homens em sua experiecircncia histoacutericardquo ou ainda como um ldquomodelo de pensar e de agir que perpassa as atividades de um povo e o distingue de todos os outrosrdquo (Hell 1989 p 6)

Ampliava-se assim a acepccedilatildeo de cultura que passava a ldquo[compreender] sob o mesmo ter-mo tanto os produtos da atividade mental moral artiacutestica e cientiacutefica como as bases materiais da evoluccedilatildeo socialrdquo (Azevedo 1958 p 21) Dessa forma todos os povos desde os considerados primitivos ateacute as sociedades definidas como evoluiacutedas possuiacuteam uma cultura na concepccedilatildeo antropoloacutegica Natildeo haveria povos sem padrotildees culturais presentes e atuantes nas suas existecircn-cias cotidianas

Os haacutebitos e os produtos da atividade mental de um povo como tambeacutem os elementos ma-teriais formavam nessa significaccedilatildeo abrangente conferida ao termo uma cultura O adjetivo ldquocultordquo continuou entretanto a designar os indiviacuteduos tidos como superiores no que tange aos saberes eruditos e que se distinguiriam da massa de seus contemporacircneos pelas qualidades intelectuais

De acordo com os seus significados antropoloacutegicos cultura e civilizaccedilatildeo tornaram-se termos sinocircnimos aludindo agraves formaccedilotildees sociais em geral Leacutevi-Strauss assim se referiu agravequelas noccedilotildees

ldquoNatildeo se deve confundir dois significados da palavra cultura Em sua acepccedilatildeo geral cultura designa o enriquecimento esclarecido do julgamento e do gosto Na linguagem teacutecnica dos antropoacutelogos eacute outra coisa segundo a definiccedilatildeo claacutessica [] que eu posso repetir tanto que ela eacute para noacutes essencial acuteconhecimentos crenccedilas arte moral direito costumes e todas outras aptidotildees ou haacutebitos adquiridos pelo homem como membro da sociedadeacute De acordo com esse segundo sentido de cultura tudo eacute objeto de estudo tanto as produccedilotildees julgadas mais baixas quanto as mais nobresrdquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

Os ldquohaacutebitos adquiridosrdquo por geraccedilotildees humanas satildeo por sua vez transmitidos agraves geraccedilotildees seguintes por meio de aprendizagem social Aleacutem das informaccedilotildees geneacuteticas chamadas de

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natureza os seres humanos recebem da sociedade em que nascem informaccedilotildees culturais igualmente necessaacuterias para a sua sobrevivecircncia A cultura seria assim informaccedilatildeo transmitida por aprendizagem social (cf Capomanes passim 2000)

Box 1O filme O Enigma de Kaspar Hauser (1974) do cineasta alematildeo Werner Herzog refere-se agrave vida de um personagem que foi criado fora do conviacutevio social e que somente na sua

idade adulta comeccedilou adquirir e receber informaccedilotildees e padrotildees culturais e a ser portanto socializado Se ainda natildeo conhece o filme este eacute um bom momento para conhece-lo para

quem jaacute conhece fica o convite para rever

A concepccedilatildeo ldquoelitistardquo de cultura permaneceu entretanto ao lado das definiccedilotildees elaboradas por antropoacutelogos etnoacutelogos filoacutesofos historiadores socioacutelogos O senso comum continuava a atribuir ao conceito uma espeacutecie de aura reservada a uma minoria de indiviacuteduos que osten-tavam saberes especializados

Assim aleacutem de abranger fenocircmenos coletivos como cultura popular cultura ocidental cul-tura chinesa cultura regional o conceito pode se referir a indiviacuteduos que adquiriram conhe-cimentos em diferentes campos do saber Em suma a noccedilatildeo de cultura pode ser ampla ou restrita de forma que seus limites conceituais natildeo satildeo frequentemente muito claros

De fato o uso amplo da noccedilatildeo de cultura pode tornaacute-la demasiadamente elaacutestica com condiccedilotildees de englobar um universo heterogecircneo de fatos e paradoxalmente nada de signifi-cativo No outro extremo estaacute a reduccedilatildeo excessiva do conceito como alusatildeo a um elenco de atividades consideradas nobres como cultura literaacuteria filosoacutefica cientiacutefica artiacutestica etc

A visatildeo mais ampla e generalizada de cultura eacute aquela que a associa indelevelmente agrave civili-zaccedilatildeo Vimos que eacute esse o procedimento tiacutepico da reflexatildeo de antropoacutelogos e etnoacutelogos

De qualquer forma como haacute ao mesmo tempo um uso amplo e um uso limitado para o emprego do termo cultura deve-se precisar o sentido que lhe estaacute sendo atribuiacutedo em tais ou quais circunstacircncias ou situaccedilotildees

ldquoCultura eacute uma palavra imprecisa com muitas definiccedilotildees concorrentes a minha definiccedilatildeo eacute a de acuteum sistema de significados atitudes e valores partilhados e as formas simboacutelicas (apre-sentaccedilotildees objetos artesanais) em que eles satildeo representados ou encarnadosacute A cultura nesta

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acepccedilatildeo faz parte de todo um modo de vida mas natildeo eacute idecircntica a elerdquo (Burke 1989 p 15)

O socioacutelogo Fernando de Azevedo na Introduccedilatildeo da Histoacuteria da Cultura Brasileira apoacutes discutir e problematizar os diversos usos do termo considerou que o seu uso restrito era mais uacutetil ao objetivo a que se propunha entendendo pois cultura como ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28)

A noccedilatildeo de civilizaccedilatildeo ao contraacuterio permaneceria ancorada no seu amplo significado abrangendo os fatos culturais definidos por oposiccedilatildeo agrave natureza em geral e agrave animalidade em particular

Freud por exemplo associou cultura e civilizaccedilatildeo definindo civilizaccedilatildeo por oposiccedilatildeo agraves pulsotildees naturais que precisam ser controladas ou contidas pela sociedade humana

Em textos como O Mal Estar na Civilizaccedilatildeo publicado em 1930 Freud definiu civilizaccedilatildeo como forccedila contraacuteria agrave natureza

ldquo[Civilizaccedilatildeo] designa a totalidade de obras e organizaccedilotildees cuja instituiccedilatildeo nos distancia do estado de animalidade de nossos ancestrais e que servem a duas finalidades a proteccedilatildeo do homem contra a natureza e a regulamentaccedilatildeo das relaccedilotildees dos homens entre sirdquo (apud Wun-enburger Jean-Jacques 1985 p 356)

Percebe-se portanto que a noccedilatildeo abrangente de civilizaccedilatildeo depende de sua relaccedilatildeo com o seu ldquooutrordquo e portanto de sua distinccedilatildeo para com o conceito de natureza

Embora o vocaacutebulo civilizaccedilatildeo tenha surgido somente no seacuteculo XVIII a atribuiccedilatildeo de uma antinomia entre as sociedades humanas e a natureza remonta ao iniacutecio do pensamento filosoacutefico no Ocidente a Greacutecia antiga

ldquoA cultura e a esteacutetica (que se constituiu na segunda metade do seacuteculo XVIII) tecircm uma caracteriacutestica em comum a histoacuteria de ambas eacute anterior agrave invenccedilatildeo dos dois termos Por causa do significado cultural do pensamento poliacutetico dos gregos e de sua praacutetica a ideacuteia de cultura estaacute profundamente arraigada na tradiccedilatildeo grego-latinardquo (Hell 1989 p 19)

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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
                    1. Paacutegina 4 Off
                      1. Botatildeo 13
                        1. Paacutegina 4 Off
                          1. Botatildeo 44
                            1. Paacutegina 5 Off
                            2. Paacutegina 6
                            3. Paacutegina 7
                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
                            6. Paacutegina 10
                            7. Paacutegina 11
                            8. Paacutegina 12
                            9. Paacutegina 13
                            10. Paacutegina 14
                            11. Paacutegina 15
                              1. Botatildeo 45
                                1. Paacutegina 5 Off
                                2. Paacutegina 6
                                3. Paacutegina 7
                                4. Paacutegina 8
                                5. Paacutegina 9
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SumaacuterioCultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos 5

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito 5

2 Entre Cultura e Natureza 9

3 Versotildees de Cultura 13

Arte como Sistema Cultural 16

1 Hierarquia e Relativismo Cultural 16

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte 20

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel 24

4 Induacutestria e Arte 29

A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura 33

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual 33

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos 37

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura 40

Referecircncias Bibliograacuteficas 46

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Cultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Os conceitos de cultura e de civilizaccedilatildeo foram ao longo da histoacuteria ora considerados sinocircn-imos ora tidos como diferentes mas com significaccedilotildees aproximadas A palavra cultura deriva do latim colere com sentido de cultivar a terra o termo aparecia na antiga Roma em expressotildees como agri-cultura denominando um campo cultivado como cultus

Foi somente partir do seacuteculo XVIII que cultura comeccedilou a significar ldquocultivo do espiacuteritordquo Surgia ao mesmo tempo neste mesmo seacuteculo o vocaacutebulo ldquocivilizaccedilatildeordquo originaacuterio do termo civilitas do latim tardio civitas que designava ldquocidaderdquo

O conceito de civilizaccedilatildeo ldquoque em texto francecircs parece remontar ao ano de 1766rdquo (Aze-vedo 1958 p 20) exprimia o auge do desenvolvimento humano em oposiccedilatildeo agrave barbaacuterie e agrave natureza Segundo Fernando de Azevedo o vocaacutebulo ldquoservia para marcar um estado contraacuterio agrave barbaacuterie estabelecendo uma distinccedilatildeo entre povos policiados e povos selvagensrdquo (Azevedo 1958 p 20)

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A noccedilatildeo guardava assim um sentido extremamente elitista e excluiacutea da civilizaccedilatildeo grande parte das sociedades humanas existentes fora da Europa No final do seacuteculo XIX houve uma imbricaccedilatildeo dos sentidos de cultura e civilizaccedilatildeo nos trabalhos sobretudo de antropologia Os conceitos perderam nos estudos antropoloacutegicos os conteuacutedos elitistas que ateacute entatildeo ostentavam

Na perspectiva antropoloacutegica a cultura era entendida como uma ldquototalidade complexa pro-duzida pelos homens em sua experiecircncia histoacutericardquo ou ainda como um ldquomodelo de pensar e de agir que perpassa as atividades de um povo e o distingue de todos os outrosrdquo (Hell 1989 p 6)

Ampliava-se assim a acepccedilatildeo de cultura que passava a ldquo[compreender] sob o mesmo ter-mo tanto os produtos da atividade mental moral artiacutestica e cientiacutefica como as bases materiais da evoluccedilatildeo socialrdquo (Azevedo 1958 p 21) Dessa forma todos os povos desde os considerados primitivos ateacute as sociedades definidas como evoluiacutedas possuiacuteam uma cultura na concepccedilatildeo antropoloacutegica Natildeo haveria povos sem padrotildees culturais presentes e atuantes nas suas existecircn-cias cotidianas

Os haacutebitos e os produtos da atividade mental de um povo como tambeacutem os elementos ma-teriais formavam nessa significaccedilatildeo abrangente conferida ao termo uma cultura O adjetivo ldquocultordquo continuou entretanto a designar os indiviacuteduos tidos como superiores no que tange aos saberes eruditos e que se distinguiriam da massa de seus contemporacircneos pelas qualidades intelectuais

De acordo com os seus significados antropoloacutegicos cultura e civilizaccedilatildeo tornaram-se termos sinocircnimos aludindo agraves formaccedilotildees sociais em geral Leacutevi-Strauss assim se referiu agravequelas noccedilotildees

ldquoNatildeo se deve confundir dois significados da palavra cultura Em sua acepccedilatildeo geral cultura designa o enriquecimento esclarecido do julgamento e do gosto Na linguagem teacutecnica dos antropoacutelogos eacute outra coisa segundo a definiccedilatildeo claacutessica [] que eu posso repetir tanto que ela eacute para noacutes essencial acuteconhecimentos crenccedilas arte moral direito costumes e todas outras aptidotildees ou haacutebitos adquiridos pelo homem como membro da sociedadeacute De acordo com esse segundo sentido de cultura tudo eacute objeto de estudo tanto as produccedilotildees julgadas mais baixas quanto as mais nobresrdquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

Os ldquohaacutebitos adquiridosrdquo por geraccedilotildees humanas satildeo por sua vez transmitidos agraves geraccedilotildees seguintes por meio de aprendizagem social Aleacutem das informaccedilotildees geneacuteticas chamadas de

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natureza os seres humanos recebem da sociedade em que nascem informaccedilotildees culturais igualmente necessaacuterias para a sua sobrevivecircncia A cultura seria assim informaccedilatildeo transmitida por aprendizagem social (cf Capomanes passim 2000)

Box 1O filme O Enigma de Kaspar Hauser (1974) do cineasta alematildeo Werner Herzog refere-se agrave vida de um personagem que foi criado fora do conviacutevio social e que somente na sua

idade adulta comeccedilou adquirir e receber informaccedilotildees e padrotildees culturais e a ser portanto socializado Se ainda natildeo conhece o filme este eacute um bom momento para conhece-lo para

quem jaacute conhece fica o convite para rever

A concepccedilatildeo ldquoelitistardquo de cultura permaneceu entretanto ao lado das definiccedilotildees elaboradas por antropoacutelogos etnoacutelogos filoacutesofos historiadores socioacutelogos O senso comum continuava a atribuir ao conceito uma espeacutecie de aura reservada a uma minoria de indiviacuteduos que osten-tavam saberes especializados

Assim aleacutem de abranger fenocircmenos coletivos como cultura popular cultura ocidental cul-tura chinesa cultura regional o conceito pode se referir a indiviacuteduos que adquiriram conhe-cimentos em diferentes campos do saber Em suma a noccedilatildeo de cultura pode ser ampla ou restrita de forma que seus limites conceituais natildeo satildeo frequentemente muito claros

De fato o uso amplo da noccedilatildeo de cultura pode tornaacute-la demasiadamente elaacutestica com condiccedilotildees de englobar um universo heterogecircneo de fatos e paradoxalmente nada de signifi-cativo No outro extremo estaacute a reduccedilatildeo excessiva do conceito como alusatildeo a um elenco de atividades consideradas nobres como cultura literaacuteria filosoacutefica cientiacutefica artiacutestica etc

A visatildeo mais ampla e generalizada de cultura eacute aquela que a associa indelevelmente agrave civili-zaccedilatildeo Vimos que eacute esse o procedimento tiacutepico da reflexatildeo de antropoacutelogos e etnoacutelogos

De qualquer forma como haacute ao mesmo tempo um uso amplo e um uso limitado para o emprego do termo cultura deve-se precisar o sentido que lhe estaacute sendo atribuiacutedo em tais ou quais circunstacircncias ou situaccedilotildees

ldquoCultura eacute uma palavra imprecisa com muitas definiccedilotildees concorrentes a minha definiccedilatildeo eacute a de acuteum sistema de significados atitudes e valores partilhados e as formas simboacutelicas (apre-sentaccedilotildees objetos artesanais) em que eles satildeo representados ou encarnadosacute A cultura nesta

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acepccedilatildeo faz parte de todo um modo de vida mas natildeo eacute idecircntica a elerdquo (Burke 1989 p 15)

O socioacutelogo Fernando de Azevedo na Introduccedilatildeo da Histoacuteria da Cultura Brasileira apoacutes discutir e problematizar os diversos usos do termo considerou que o seu uso restrito era mais uacutetil ao objetivo a que se propunha entendendo pois cultura como ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28)

A noccedilatildeo de civilizaccedilatildeo ao contraacuterio permaneceria ancorada no seu amplo significado abrangendo os fatos culturais definidos por oposiccedilatildeo agrave natureza em geral e agrave animalidade em particular

Freud por exemplo associou cultura e civilizaccedilatildeo definindo civilizaccedilatildeo por oposiccedilatildeo agraves pulsotildees naturais que precisam ser controladas ou contidas pela sociedade humana

Em textos como O Mal Estar na Civilizaccedilatildeo publicado em 1930 Freud definiu civilizaccedilatildeo como forccedila contraacuteria agrave natureza

ldquo[Civilizaccedilatildeo] designa a totalidade de obras e organizaccedilotildees cuja instituiccedilatildeo nos distancia do estado de animalidade de nossos ancestrais e que servem a duas finalidades a proteccedilatildeo do homem contra a natureza e a regulamentaccedilatildeo das relaccedilotildees dos homens entre sirdquo (apud Wun-enburger Jean-Jacques 1985 p 356)

Percebe-se portanto que a noccedilatildeo abrangente de civilizaccedilatildeo depende de sua relaccedilatildeo com o seu ldquooutrordquo e portanto de sua distinccedilatildeo para com o conceito de natureza

Embora o vocaacutebulo civilizaccedilatildeo tenha surgido somente no seacuteculo XVIII a atribuiccedilatildeo de uma antinomia entre as sociedades humanas e a natureza remonta ao iniacutecio do pensamento filosoacutefico no Ocidente a Greacutecia antiga

ldquoA cultura e a esteacutetica (que se constituiu na segunda metade do seacuteculo XVIII) tecircm uma caracteriacutestica em comum a histoacuteria de ambas eacute anterior agrave invenccedilatildeo dos dois termos Por causa do significado cultural do pensamento poliacutetico dos gregos e de sua praacutetica a ideacuteia de cultura estaacute profundamente arraigada na tradiccedilatildeo grego-latinardquo (Hell 1989 p 19)

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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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                                                            3. Paacutegina 50
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                                                                3. Paacutegina 50
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Cursos de Especializaccedilatildeo para o quadro do Magisteacuterio da SEESP

Ensino Fundamental II e Ensino Meacutedio

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extras

SumaacuterioCultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos 5

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito 5

2 Entre Cultura e Natureza 9

3 Versotildees de Cultura 13

Arte como Sistema Cultural 16

1 Hierarquia e Relativismo Cultural 16

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte 20

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel 24

4 Induacutestria e Arte 29

A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura 33

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual 33

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos 37

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura 40

Referecircncias Bibliograacuteficas 46

Extras 48

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Cultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Os conceitos de cultura e de civilizaccedilatildeo foram ao longo da histoacuteria ora considerados sinocircn-imos ora tidos como diferentes mas com significaccedilotildees aproximadas A palavra cultura deriva do latim colere com sentido de cultivar a terra o termo aparecia na antiga Roma em expressotildees como agri-cultura denominando um campo cultivado como cultus

Foi somente partir do seacuteculo XVIII que cultura comeccedilou a significar ldquocultivo do espiacuteritordquo Surgia ao mesmo tempo neste mesmo seacuteculo o vocaacutebulo ldquocivilizaccedilatildeordquo originaacuterio do termo civilitas do latim tardio civitas que designava ldquocidaderdquo

O conceito de civilizaccedilatildeo ldquoque em texto francecircs parece remontar ao ano de 1766rdquo (Aze-vedo 1958 p 20) exprimia o auge do desenvolvimento humano em oposiccedilatildeo agrave barbaacuterie e agrave natureza Segundo Fernando de Azevedo o vocaacutebulo ldquoservia para marcar um estado contraacuterio agrave barbaacuterie estabelecendo uma distinccedilatildeo entre povos policiados e povos selvagensrdquo (Azevedo 1958 p 20)

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tema1

A noccedilatildeo guardava assim um sentido extremamente elitista e excluiacutea da civilizaccedilatildeo grande parte das sociedades humanas existentes fora da Europa No final do seacuteculo XIX houve uma imbricaccedilatildeo dos sentidos de cultura e civilizaccedilatildeo nos trabalhos sobretudo de antropologia Os conceitos perderam nos estudos antropoloacutegicos os conteuacutedos elitistas que ateacute entatildeo ostentavam

Na perspectiva antropoloacutegica a cultura era entendida como uma ldquototalidade complexa pro-duzida pelos homens em sua experiecircncia histoacutericardquo ou ainda como um ldquomodelo de pensar e de agir que perpassa as atividades de um povo e o distingue de todos os outrosrdquo (Hell 1989 p 6)

Ampliava-se assim a acepccedilatildeo de cultura que passava a ldquo[compreender] sob o mesmo ter-mo tanto os produtos da atividade mental moral artiacutestica e cientiacutefica como as bases materiais da evoluccedilatildeo socialrdquo (Azevedo 1958 p 21) Dessa forma todos os povos desde os considerados primitivos ateacute as sociedades definidas como evoluiacutedas possuiacuteam uma cultura na concepccedilatildeo antropoloacutegica Natildeo haveria povos sem padrotildees culturais presentes e atuantes nas suas existecircn-cias cotidianas

Os haacutebitos e os produtos da atividade mental de um povo como tambeacutem os elementos ma-teriais formavam nessa significaccedilatildeo abrangente conferida ao termo uma cultura O adjetivo ldquocultordquo continuou entretanto a designar os indiviacuteduos tidos como superiores no que tange aos saberes eruditos e que se distinguiriam da massa de seus contemporacircneos pelas qualidades intelectuais

De acordo com os seus significados antropoloacutegicos cultura e civilizaccedilatildeo tornaram-se termos sinocircnimos aludindo agraves formaccedilotildees sociais em geral Leacutevi-Strauss assim se referiu agravequelas noccedilotildees

ldquoNatildeo se deve confundir dois significados da palavra cultura Em sua acepccedilatildeo geral cultura designa o enriquecimento esclarecido do julgamento e do gosto Na linguagem teacutecnica dos antropoacutelogos eacute outra coisa segundo a definiccedilatildeo claacutessica [] que eu posso repetir tanto que ela eacute para noacutes essencial acuteconhecimentos crenccedilas arte moral direito costumes e todas outras aptidotildees ou haacutebitos adquiridos pelo homem como membro da sociedadeacute De acordo com esse segundo sentido de cultura tudo eacute objeto de estudo tanto as produccedilotildees julgadas mais baixas quanto as mais nobresrdquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

Os ldquohaacutebitos adquiridosrdquo por geraccedilotildees humanas satildeo por sua vez transmitidos agraves geraccedilotildees seguintes por meio de aprendizagem social Aleacutem das informaccedilotildees geneacuteticas chamadas de

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natureza os seres humanos recebem da sociedade em que nascem informaccedilotildees culturais igualmente necessaacuterias para a sua sobrevivecircncia A cultura seria assim informaccedilatildeo transmitida por aprendizagem social (cf Capomanes passim 2000)

Box 1O filme O Enigma de Kaspar Hauser (1974) do cineasta alematildeo Werner Herzog refere-se agrave vida de um personagem que foi criado fora do conviacutevio social e que somente na sua

idade adulta comeccedilou adquirir e receber informaccedilotildees e padrotildees culturais e a ser portanto socializado Se ainda natildeo conhece o filme este eacute um bom momento para conhece-lo para

quem jaacute conhece fica o convite para rever

A concepccedilatildeo ldquoelitistardquo de cultura permaneceu entretanto ao lado das definiccedilotildees elaboradas por antropoacutelogos etnoacutelogos filoacutesofos historiadores socioacutelogos O senso comum continuava a atribuir ao conceito uma espeacutecie de aura reservada a uma minoria de indiviacuteduos que osten-tavam saberes especializados

Assim aleacutem de abranger fenocircmenos coletivos como cultura popular cultura ocidental cul-tura chinesa cultura regional o conceito pode se referir a indiviacuteduos que adquiriram conhe-cimentos em diferentes campos do saber Em suma a noccedilatildeo de cultura pode ser ampla ou restrita de forma que seus limites conceituais natildeo satildeo frequentemente muito claros

De fato o uso amplo da noccedilatildeo de cultura pode tornaacute-la demasiadamente elaacutestica com condiccedilotildees de englobar um universo heterogecircneo de fatos e paradoxalmente nada de signifi-cativo No outro extremo estaacute a reduccedilatildeo excessiva do conceito como alusatildeo a um elenco de atividades consideradas nobres como cultura literaacuteria filosoacutefica cientiacutefica artiacutestica etc

A visatildeo mais ampla e generalizada de cultura eacute aquela que a associa indelevelmente agrave civili-zaccedilatildeo Vimos que eacute esse o procedimento tiacutepico da reflexatildeo de antropoacutelogos e etnoacutelogos

De qualquer forma como haacute ao mesmo tempo um uso amplo e um uso limitado para o emprego do termo cultura deve-se precisar o sentido que lhe estaacute sendo atribuiacutedo em tais ou quais circunstacircncias ou situaccedilotildees

ldquoCultura eacute uma palavra imprecisa com muitas definiccedilotildees concorrentes a minha definiccedilatildeo eacute a de acuteum sistema de significados atitudes e valores partilhados e as formas simboacutelicas (apre-sentaccedilotildees objetos artesanais) em que eles satildeo representados ou encarnadosacute A cultura nesta

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acepccedilatildeo faz parte de todo um modo de vida mas natildeo eacute idecircntica a elerdquo (Burke 1989 p 15)

O socioacutelogo Fernando de Azevedo na Introduccedilatildeo da Histoacuteria da Cultura Brasileira apoacutes discutir e problematizar os diversos usos do termo considerou que o seu uso restrito era mais uacutetil ao objetivo a que se propunha entendendo pois cultura como ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28)

A noccedilatildeo de civilizaccedilatildeo ao contraacuterio permaneceria ancorada no seu amplo significado abrangendo os fatos culturais definidos por oposiccedilatildeo agrave natureza em geral e agrave animalidade em particular

Freud por exemplo associou cultura e civilizaccedilatildeo definindo civilizaccedilatildeo por oposiccedilatildeo agraves pulsotildees naturais que precisam ser controladas ou contidas pela sociedade humana

Em textos como O Mal Estar na Civilizaccedilatildeo publicado em 1930 Freud definiu civilizaccedilatildeo como forccedila contraacuteria agrave natureza

ldquo[Civilizaccedilatildeo] designa a totalidade de obras e organizaccedilotildees cuja instituiccedilatildeo nos distancia do estado de animalidade de nossos ancestrais e que servem a duas finalidades a proteccedilatildeo do homem contra a natureza e a regulamentaccedilatildeo das relaccedilotildees dos homens entre sirdquo (apud Wun-enburger Jean-Jacques 1985 p 356)

Percebe-se portanto que a noccedilatildeo abrangente de civilizaccedilatildeo depende de sua relaccedilatildeo com o seu ldquooutrordquo e portanto de sua distinccedilatildeo para com o conceito de natureza

Embora o vocaacutebulo civilizaccedilatildeo tenha surgido somente no seacuteculo XVIII a atribuiccedilatildeo de uma antinomia entre as sociedades humanas e a natureza remonta ao iniacutecio do pensamento filosoacutefico no Ocidente a Greacutecia antiga

ldquoA cultura e a esteacutetica (que se constituiu na segunda metade do seacuteculo XVIII) tecircm uma caracteriacutestica em comum a histoacuteria de ambas eacute anterior agrave invenccedilatildeo dos dois termos Por causa do significado cultural do pensamento poliacutetico dos gregos e de sua praacutetica a ideacuteia de cultura estaacute profundamente arraigada na tradiccedilatildeo grego-latinardquo (Hell 1989 p 19)

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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
                    1. Paacutegina 4 Off
                      1. Botatildeo 13
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                          1. Botatildeo 44
                            1. Paacutegina 5 Off
                            2. Paacutegina 6
                            3. Paacutegina 7
                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
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SumaacuterioCultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos 5

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito 5

2 Entre Cultura e Natureza 9

3 Versotildees de Cultura 13

Arte como Sistema Cultural 16

1 Hierarquia e Relativismo Cultural 16

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte 20

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel 24

4 Induacutestria e Arte 29

A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura 33

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual 33

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos 37

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura 40

Referecircncias Bibliograacuteficas 46

Extras 48

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Cultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Os conceitos de cultura e de civilizaccedilatildeo foram ao longo da histoacuteria ora considerados sinocircn-imos ora tidos como diferentes mas com significaccedilotildees aproximadas A palavra cultura deriva do latim colere com sentido de cultivar a terra o termo aparecia na antiga Roma em expressotildees como agri-cultura denominando um campo cultivado como cultus

Foi somente partir do seacuteculo XVIII que cultura comeccedilou a significar ldquocultivo do espiacuteritordquo Surgia ao mesmo tempo neste mesmo seacuteculo o vocaacutebulo ldquocivilizaccedilatildeordquo originaacuterio do termo civilitas do latim tardio civitas que designava ldquocidaderdquo

O conceito de civilizaccedilatildeo ldquoque em texto francecircs parece remontar ao ano de 1766rdquo (Aze-vedo 1958 p 20) exprimia o auge do desenvolvimento humano em oposiccedilatildeo agrave barbaacuterie e agrave natureza Segundo Fernando de Azevedo o vocaacutebulo ldquoservia para marcar um estado contraacuterio agrave barbaacuterie estabelecendo uma distinccedilatildeo entre povos policiados e povos selvagensrdquo (Azevedo 1958 p 20)

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A noccedilatildeo guardava assim um sentido extremamente elitista e excluiacutea da civilizaccedilatildeo grande parte das sociedades humanas existentes fora da Europa No final do seacuteculo XIX houve uma imbricaccedilatildeo dos sentidos de cultura e civilizaccedilatildeo nos trabalhos sobretudo de antropologia Os conceitos perderam nos estudos antropoloacutegicos os conteuacutedos elitistas que ateacute entatildeo ostentavam

Na perspectiva antropoloacutegica a cultura era entendida como uma ldquototalidade complexa pro-duzida pelos homens em sua experiecircncia histoacutericardquo ou ainda como um ldquomodelo de pensar e de agir que perpassa as atividades de um povo e o distingue de todos os outrosrdquo (Hell 1989 p 6)

Ampliava-se assim a acepccedilatildeo de cultura que passava a ldquo[compreender] sob o mesmo ter-mo tanto os produtos da atividade mental moral artiacutestica e cientiacutefica como as bases materiais da evoluccedilatildeo socialrdquo (Azevedo 1958 p 21) Dessa forma todos os povos desde os considerados primitivos ateacute as sociedades definidas como evoluiacutedas possuiacuteam uma cultura na concepccedilatildeo antropoloacutegica Natildeo haveria povos sem padrotildees culturais presentes e atuantes nas suas existecircn-cias cotidianas

Os haacutebitos e os produtos da atividade mental de um povo como tambeacutem os elementos ma-teriais formavam nessa significaccedilatildeo abrangente conferida ao termo uma cultura O adjetivo ldquocultordquo continuou entretanto a designar os indiviacuteduos tidos como superiores no que tange aos saberes eruditos e que se distinguiriam da massa de seus contemporacircneos pelas qualidades intelectuais

De acordo com os seus significados antropoloacutegicos cultura e civilizaccedilatildeo tornaram-se termos sinocircnimos aludindo agraves formaccedilotildees sociais em geral Leacutevi-Strauss assim se referiu agravequelas noccedilotildees

ldquoNatildeo se deve confundir dois significados da palavra cultura Em sua acepccedilatildeo geral cultura designa o enriquecimento esclarecido do julgamento e do gosto Na linguagem teacutecnica dos antropoacutelogos eacute outra coisa segundo a definiccedilatildeo claacutessica [] que eu posso repetir tanto que ela eacute para noacutes essencial acuteconhecimentos crenccedilas arte moral direito costumes e todas outras aptidotildees ou haacutebitos adquiridos pelo homem como membro da sociedadeacute De acordo com esse segundo sentido de cultura tudo eacute objeto de estudo tanto as produccedilotildees julgadas mais baixas quanto as mais nobresrdquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

Os ldquohaacutebitos adquiridosrdquo por geraccedilotildees humanas satildeo por sua vez transmitidos agraves geraccedilotildees seguintes por meio de aprendizagem social Aleacutem das informaccedilotildees geneacuteticas chamadas de

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natureza os seres humanos recebem da sociedade em que nascem informaccedilotildees culturais igualmente necessaacuterias para a sua sobrevivecircncia A cultura seria assim informaccedilatildeo transmitida por aprendizagem social (cf Capomanes passim 2000)

Box 1O filme O Enigma de Kaspar Hauser (1974) do cineasta alematildeo Werner Herzog refere-se agrave vida de um personagem que foi criado fora do conviacutevio social e que somente na sua

idade adulta comeccedilou adquirir e receber informaccedilotildees e padrotildees culturais e a ser portanto socializado Se ainda natildeo conhece o filme este eacute um bom momento para conhece-lo para

quem jaacute conhece fica o convite para rever

A concepccedilatildeo ldquoelitistardquo de cultura permaneceu entretanto ao lado das definiccedilotildees elaboradas por antropoacutelogos etnoacutelogos filoacutesofos historiadores socioacutelogos O senso comum continuava a atribuir ao conceito uma espeacutecie de aura reservada a uma minoria de indiviacuteduos que osten-tavam saberes especializados

Assim aleacutem de abranger fenocircmenos coletivos como cultura popular cultura ocidental cul-tura chinesa cultura regional o conceito pode se referir a indiviacuteduos que adquiriram conhe-cimentos em diferentes campos do saber Em suma a noccedilatildeo de cultura pode ser ampla ou restrita de forma que seus limites conceituais natildeo satildeo frequentemente muito claros

De fato o uso amplo da noccedilatildeo de cultura pode tornaacute-la demasiadamente elaacutestica com condiccedilotildees de englobar um universo heterogecircneo de fatos e paradoxalmente nada de signifi-cativo No outro extremo estaacute a reduccedilatildeo excessiva do conceito como alusatildeo a um elenco de atividades consideradas nobres como cultura literaacuteria filosoacutefica cientiacutefica artiacutestica etc

A visatildeo mais ampla e generalizada de cultura eacute aquela que a associa indelevelmente agrave civili-zaccedilatildeo Vimos que eacute esse o procedimento tiacutepico da reflexatildeo de antropoacutelogos e etnoacutelogos

De qualquer forma como haacute ao mesmo tempo um uso amplo e um uso limitado para o emprego do termo cultura deve-se precisar o sentido que lhe estaacute sendo atribuiacutedo em tais ou quais circunstacircncias ou situaccedilotildees

ldquoCultura eacute uma palavra imprecisa com muitas definiccedilotildees concorrentes a minha definiccedilatildeo eacute a de acuteum sistema de significados atitudes e valores partilhados e as formas simboacutelicas (apre-sentaccedilotildees objetos artesanais) em que eles satildeo representados ou encarnadosacute A cultura nesta

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acepccedilatildeo faz parte de todo um modo de vida mas natildeo eacute idecircntica a elerdquo (Burke 1989 p 15)

O socioacutelogo Fernando de Azevedo na Introduccedilatildeo da Histoacuteria da Cultura Brasileira apoacutes discutir e problematizar os diversos usos do termo considerou que o seu uso restrito era mais uacutetil ao objetivo a que se propunha entendendo pois cultura como ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28)

A noccedilatildeo de civilizaccedilatildeo ao contraacuterio permaneceria ancorada no seu amplo significado abrangendo os fatos culturais definidos por oposiccedilatildeo agrave natureza em geral e agrave animalidade em particular

Freud por exemplo associou cultura e civilizaccedilatildeo definindo civilizaccedilatildeo por oposiccedilatildeo agraves pulsotildees naturais que precisam ser controladas ou contidas pela sociedade humana

Em textos como O Mal Estar na Civilizaccedilatildeo publicado em 1930 Freud definiu civilizaccedilatildeo como forccedila contraacuteria agrave natureza

ldquo[Civilizaccedilatildeo] designa a totalidade de obras e organizaccedilotildees cuja instituiccedilatildeo nos distancia do estado de animalidade de nossos ancestrais e que servem a duas finalidades a proteccedilatildeo do homem contra a natureza e a regulamentaccedilatildeo das relaccedilotildees dos homens entre sirdquo (apud Wun-enburger Jean-Jacques 1985 p 356)

Percebe-se portanto que a noccedilatildeo abrangente de civilizaccedilatildeo depende de sua relaccedilatildeo com o seu ldquooutrordquo e portanto de sua distinccedilatildeo para com o conceito de natureza

Embora o vocaacutebulo civilizaccedilatildeo tenha surgido somente no seacuteculo XVIII a atribuiccedilatildeo de uma antinomia entre as sociedades humanas e a natureza remonta ao iniacutecio do pensamento filosoacutefico no Ocidente a Greacutecia antiga

ldquoA cultura e a esteacutetica (que se constituiu na segunda metade do seacuteculo XVIII) tecircm uma caracteriacutestica em comum a histoacuteria de ambas eacute anterior agrave invenccedilatildeo dos dois termos Por causa do significado cultural do pensamento poliacutetico dos gregos e de sua praacutetica a ideacuteia de cultura estaacute profundamente arraigada na tradiccedilatildeo grego-latinardquo (Hell 1989 p 19)

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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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Cultura e Civilizaccedilatildeo Histoacuteria de dois Conceitos

1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Os conceitos de cultura e de civilizaccedilatildeo foram ao longo da histoacuteria ora considerados sinocircn-imos ora tidos como diferentes mas com significaccedilotildees aproximadas A palavra cultura deriva do latim colere com sentido de cultivar a terra o termo aparecia na antiga Roma em expressotildees como agri-cultura denominando um campo cultivado como cultus

Foi somente partir do seacuteculo XVIII que cultura comeccedilou a significar ldquocultivo do espiacuteritordquo Surgia ao mesmo tempo neste mesmo seacuteculo o vocaacutebulo ldquocivilizaccedilatildeordquo originaacuterio do termo civilitas do latim tardio civitas que designava ldquocidaderdquo

O conceito de civilizaccedilatildeo ldquoque em texto francecircs parece remontar ao ano de 1766rdquo (Aze-vedo 1958 p 20) exprimia o auge do desenvolvimento humano em oposiccedilatildeo agrave barbaacuterie e agrave natureza Segundo Fernando de Azevedo o vocaacutebulo ldquoservia para marcar um estado contraacuterio agrave barbaacuterie estabelecendo uma distinccedilatildeo entre povos policiados e povos selvagensrdquo (Azevedo 1958 p 20)

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A noccedilatildeo guardava assim um sentido extremamente elitista e excluiacutea da civilizaccedilatildeo grande parte das sociedades humanas existentes fora da Europa No final do seacuteculo XIX houve uma imbricaccedilatildeo dos sentidos de cultura e civilizaccedilatildeo nos trabalhos sobretudo de antropologia Os conceitos perderam nos estudos antropoloacutegicos os conteuacutedos elitistas que ateacute entatildeo ostentavam

Na perspectiva antropoloacutegica a cultura era entendida como uma ldquototalidade complexa pro-duzida pelos homens em sua experiecircncia histoacutericardquo ou ainda como um ldquomodelo de pensar e de agir que perpassa as atividades de um povo e o distingue de todos os outrosrdquo (Hell 1989 p 6)

Ampliava-se assim a acepccedilatildeo de cultura que passava a ldquo[compreender] sob o mesmo ter-mo tanto os produtos da atividade mental moral artiacutestica e cientiacutefica como as bases materiais da evoluccedilatildeo socialrdquo (Azevedo 1958 p 21) Dessa forma todos os povos desde os considerados primitivos ateacute as sociedades definidas como evoluiacutedas possuiacuteam uma cultura na concepccedilatildeo antropoloacutegica Natildeo haveria povos sem padrotildees culturais presentes e atuantes nas suas existecircn-cias cotidianas

Os haacutebitos e os produtos da atividade mental de um povo como tambeacutem os elementos ma-teriais formavam nessa significaccedilatildeo abrangente conferida ao termo uma cultura O adjetivo ldquocultordquo continuou entretanto a designar os indiviacuteduos tidos como superiores no que tange aos saberes eruditos e que se distinguiriam da massa de seus contemporacircneos pelas qualidades intelectuais

De acordo com os seus significados antropoloacutegicos cultura e civilizaccedilatildeo tornaram-se termos sinocircnimos aludindo agraves formaccedilotildees sociais em geral Leacutevi-Strauss assim se referiu agravequelas noccedilotildees

ldquoNatildeo se deve confundir dois significados da palavra cultura Em sua acepccedilatildeo geral cultura designa o enriquecimento esclarecido do julgamento e do gosto Na linguagem teacutecnica dos antropoacutelogos eacute outra coisa segundo a definiccedilatildeo claacutessica [] que eu posso repetir tanto que ela eacute para noacutes essencial acuteconhecimentos crenccedilas arte moral direito costumes e todas outras aptidotildees ou haacutebitos adquiridos pelo homem como membro da sociedadeacute De acordo com esse segundo sentido de cultura tudo eacute objeto de estudo tanto as produccedilotildees julgadas mais baixas quanto as mais nobresrdquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

Os ldquohaacutebitos adquiridosrdquo por geraccedilotildees humanas satildeo por sua vez transmitidos agraves geraccedilotildees seguintes por meio de aprendizagem social Aleacutem das informaccedilotildees geneacuteticas chamadas de

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natureza os seres humanos recebem da sociedade em que nascem informaccedilotildees culturais igualmente necessaacuterias para a sua sobrevivecircncia A cultura seria assim informaccedilatildeo transmitida por aprendizagem social (cf Capomanes passim 2000)

Box 1O filme O Enigma de Kaspar Hauser (1974) do cineasta alematildeo Werner Herzog refere-se agrave vida de um personagem que foi criado fora do conviacutevio social e que somente na sua

idade adulta comeccedilou adquirir e receber informaccedilotildees e padrotildees culturais e a ser portanto socializado Se ainda natildeo conhece o filme este eacute um bom momento para conhece-lo para

quem jaacute conhece fica o convite para rever

A concepccedilatildeo ldquoelitistardquo de cultura permaneceu entretanto ao lado das definiccedilotildees elaboradas por antropoacutelogos etnoacutelogos filoacutesofos historiadores socioacutelogos O senso comum continuava a atribuir ao conceito uma espeacutecie de aura reservada a uma minoria de indiviacuteduos que osten-tavam saberes especializados

Assim aleacutem de abranger fenocircmenos coletivos como cultura popular cultura ocidental cul-tura chinesa cultura regional o conceito pode se referir a indiviacuteduos que adquiriram conhe-cimentos em diferentes campos do saber Em suma a noccedilatildeo de cultura pode ser ampla ou restrita de forma que seus limites conceituais natildeo satildeo frequentemente muito claros

De fato o uso amplo da noccedilatildeo de cultura pode tornaacute-la demasiadamente elaacutestica com condiccedilotildees de englobar um universo heterogecircneo de fatos e paradoxalmente nada de signifi-cativo No outro extremo estaacute a reduccedilatildeo excessiva do conceito como alusatildeo a um elenco de atividades consideradas nobres como cultura literaacuteria filosoacutefica cientiacutefica artiacutestica etc

A visatildeo mais ampla e generalizada de cultura eacute aquela que a associa indelevelmente agrave civili-zaccedilatildeo Vimos que eacute esse o procedimento tiacutepico da reflexatildeo de antropoacutelogos e etnoacutelogos

De qualquer forma como haacute ao mesmo tempo um uso amplo e um uso limitado para o emprego do termo cultura deve-se precisar o sentido que lhe estaacute sendo atribuiacutedo em tais ou quais circunstacircncias ou situaccedilotildees

ldquoCultura eacute uma palavra imprecisa com muitas definiccedilotildees concorrentes a minha definiccedilatildeo eacute a de acuteum sistema de significados atitudes e valores partilhados e as formas simboacutelicas (apre-sentaccedilotildees objetos artesanais) em que eles satildeo representados ou encarnadosacute A cultura nesta

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acepccedilatildeo faz parte de todo um modo de vida mas natildeo eacute idecircntica a elerdquo (Burke 1989 p 15)

O socioacutelogo Fernando de Azevedo na Introduccedilatildeo da Histoacuteria da Cultura Brasileira apoacutes discutir e problematizar os diversos usos do termo considerou que o seu uso restrito era mais uacutetil ao objetivo a que se propunha entendendo pois cultura como ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28)

A noccedilatildeo de civilizaccedilatildeo ao contraacuterio permaneceria ancorada no seu amplo significado abrangendo os fatos culturais definidos por oposiccedilatildeo agrave natureza em geral e agrave animalidade em particular

Freud por exemplo associou cultura e civilizaccedilatildeo definindo civilizaccedilatildeo por oposiccedilatildeo agraves pulsotildees naturais que precisam ser controladas ou contidas pela sociedade humana

Em textos como O Mal Estar na Civilizaccedilatildeo publicado em 1930 Freud definiu civilizaccedilatildeo como forccedila contraacuteria agrave natureza

ldquo[Civilizaccedilatildeo] designa a totalidade de obras e organizaccedilotildees cuja instituiccedilatildeo nos distancia do estado de animalidade de nossos ancestrais e que servem a duas finalidades a proteccedilatildeo do homem contra a natureza e a regulamentaccedilatildeo das relaccedilotildees dos homens entre sirdquo (apud Wun-enburger Jean-Jacques 1985 p 356)

Percebe-se portanto que a noccedilatildeo abrangente de civilizaccedilatildeo depende de sua relaccedilatildeo com o seu ldquooutrordquo e portanto de sua distinccedilatildeo para com o conceito de natureza

Embora o vocaacutebulo civilizaccedilatildeo tenha surgido somente no seacuteculo XVIII a atribuiccedilatildeo de uma antinomia entre as sociedades humanas e a natureza remonta ao iniacutecio do pensamento filosoacutefico no Ocidente a Greacutecia antiga

ldquoA cultura e a esteacutetica (que se constituiu na segunda metade do seacuteculo XVIII) tecircm uma caracteriacutestica em comum a histoacuteria de ambas eacute anterior agrave invenccedilatildeo dos dois termos Por causa do significado cultural do pensamento poliacutetico dos gregos e de sua praacutetica a ideacuteia de cultura estaacute profundamente arraigada na tradiccedilatildeo grego-latinardquo (Hell 1989 p 19)

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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
                    1. Paacutegina 4 Off
                      1. Botatildeo 13
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                          1. Botatildeo 44
                            1. Paacutegina 5 Off
                            2. Paacutegina 6
                            3. Paacutegina 7
                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
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A noccedilatildeo guardava assim um sentido extremamente elitista e excluiacutea da civilizaccedilatildeo grande parte das sociedades humanas existentes fora da Europa No final do seacuteculo XIX houve uma imbricaccedilatildeo dos sentidos de cultura e civilizaccedilatildeo nos trabalhos sobretudo de antropologia Os conceitos perderam nos estudos antropoloacutegicos os conteuacutedos elitistas que ateacute entatildeo ostentavam

Na perspectiva antropoloacutegica a cultura era entendida como uma ldquototalidade complexa pro-duzida pelos homens em sua experiecircncia histoacutericardquo ou ainda como um ldquomodelo de pensar e de agir que perpassa as atividades de um povo e o distingue de todos os outrosrdquo (Hell 1989 p 6)

Ampliava-se assim a acepccedilatildeo de cultura que passava a ldquo[compreender] sob o mesmo ter-mo tanto os produtos da atividade mental moral artiacutestica e cientiacutefica como as bases materiais da evoluccedilatildeo socialrdquo (Azevedo 1958 p 21) Dessa forma todos os povos desde os considerados primitivos ateacute as sociedades definidas como evoluiacutedas possuiacuteam uma cultura na concepccedilatildeo antropoloacutegica Natildeo haveria povos sem padrotildees culturais presentes e atuantes nas suas existecircn-cias cotidianas

Os haacutebitos e os produtos da atividade mental de um povo como tambeacutem os elementos ma-teriais formavam nessa significaccedilatildeo abrangente conferida ao termo uma cultura O adjetivo ldquocultordquo continuou entretanto a designar os indiviacuteduos tidos como superiores no que tange aos saberes eruditos e que se distinguiriam da massa de seus contemporacircneos pelas qualidades intelectuais

De acordo com os seus significados antropoloacutegicos cultura e civilizaccedilatildeo tornaram-se termos sinocircnimos aludindo agraves formaccedilotildees sociais em geral Leacutevi-Strauss assim se referiu agravequelas noccedilotildees

ldquoNatildeo se deve confundir dois significados da palavra cultura Em sua acepccedilatildeo geral cultura designa o enriquecimento esclarecido do julgamento e do gosto Na linguagem teacutecnica dos antropoacutelogos eacute outra coisa segundo a definiccedilatildeo claacutessica [] que eu posso repetir tanto que ela eacute para noacutes essencial acuteconhecimentos crenccedilas arte moral direito costumes e todas outras aptidotildees ou haacutebitos adquiridos pelo homem como membro da sociedadeacute De acordo com esse segundo sentido de cultura tudo eacute objeto de estudo tanto as produccedilotildees julgadas mais baixas quanto as mais nobresrdquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

Os ldquohaacutebitos adquiridosrdquo por geraccedilotildees humanas satildeo por sua vez transmitidos agraves geraccedilotildees seguintes por meio de aprendizagem social Aleacutem das informaccedilotildees geneacuteticas chamadas de

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natureza os seres humanos recebem da sociedade em que nascem informaccedilotildees culturais igualmente necessaacuterias para a sua sobrevivecircncia A cultura seria assim informaccedilatildeo transmitida por aprendizagem social (cf Capomanes passim 2000)

Box 1O filme O Enigma de Kaspar Hauser (1974) do cineasta alematildeo Werner Herzog refere-se agrave vida de um personagem que foi criado fora do conviacutevio social e que somente na sua

idade adulta comeccedilou adquirir e receber informaccedilotildees e padrotildees culturais e a ser portanto socializado Se ainda natildeo conhece o filme este eacute um bom momento para conhece-lo para

quem jaacute conhece fica o convite para rever

A concepccedilatildeo ldquoelitistardquo de cultura permaneceu entretanto ao lado das definiccedilotildees elaboradas por antropoacutelogos etnoacutelogos filoacutesofos historiadores socioacutelogos O senso comum continuava a atribuir ao conceito uma espeacutecie de aura reservada a uma minoria de indiviacuteduos que osten-tavam saberes especializados

Assim aleacutem de abranger fenocircmenos coletivos como cultura popular cultura ocidental cul-tura chinesa cultura regional o conceito pode se referir a indiviacuteduos que adquiriram conhe-cimentos em diferentes campos do saber Em suma a noccedilatildeo de cultura pode ser ampla ou restrita de forma que seus limites conceituais natildeo satildeo frequentemente muito claros

De fato o uso amplo da noccedilatildeo de cultura pode tornaacute-la demasiadamente elaacutestica com condiccedilotildees de englobar um universo heterogecircneo de fatos e paradoxalmente nada de signifi-cativo No outro extremo estaacute a reduccedilatildeo excessiva do conceito como alusatildeo a um elenco de atividades consideradas nobres como cultura literaacuteria filosoacutefica cientiacutefica artiacutestica etc

A visatildeo mais ampla e generalizada de cultura eacute aquela que a associa indelevelmente agrave civili-zaccedilatildeo Vimos que eacute esse o procedimento tiacutepico da reflexatildeo de antropoacutelogos e etnoacutelogos

De qualquer forma como haacute ao mesmo tempo um uso amplo e um uso limitado para o emprego do termo cultura deve-se precisar o sentido que lhe estaacute sendo atribuiacutedo em tais ou quais circunstacircncias ou situaccedilotildees

ldquoCultura eacute uma palavra imprecisa com muitas definiccedilotildees concorrentes a minha definiccedilatildeo eacute a de acuteum sistema de significados atitudes e valores partilhados e as formas simboacutelicas (apre-sentaccedilotildees objetos artesanais) em que eles satildeo representados ou encarnadosacute A cultura nesta

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acepccedilatildeo faz parte de todo um modo de vida mas natildeo eacute idecircntica a elerdquo (Burke 1989 p 15)

O socioacutelogo Fernando de Azevedo na Introduccedilatildeo da Histoacuteria da Cultura Brasileira apoacutes discutir e problematizar os diversos usos do termo considerou que o seu uso restrito era mais uacutetil ao objetivo a que se propunha entendendo pois cultura como ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28)

A noccedilatildeo de civilizaccedilatildeo ao contraacuterio permaneceria ancorada no seu amplo significado abrangendo os fatos culturais definidos por oposiccedilatildeo agrave natureza em geral e agrave animalidade em particular

Freud por exemplo associou cultura e civilizaccedilatildeo definindo civilizaccedilatildeo por oposiccedilatildeo agraves pulsotildees naturais que precisam ser controladas ou contidas pela sociedade humana

Em textos como O Mal Estar na Civilizaccedilatildeo publicado em 1930 Freud definiu civilizaccedilatildeo como forccedila contraacuteria agrave natureza

ldquo[Civilizaccedilatildeo] designa a totalidade de obras e organizaccedilotildees cuja instituiccedilatildeo nos distancia do estado de animalidade de nossos ancestrais e que servem a duas finalidades a proteccedilatildeo do homem contra a natureza e a regulamentaccedilatildeo das relaccedilotildees dos homens entre sirdquo (apud Wun-enburger Jean-Jacques 1985 p 356)

Percebe-se portanto que a noccedilatildeo abrangente de civilizaccedilatildeo depende de sua relaccedilatildeo com o seu ldquooutrordquo e portanto de sua distinccedilatildeo para com o conceito de natureza

Embora o vocaacutebulo civilizaccedilatildeo tenha surgido somente no seacuteculo XVIII a atribuiccedilatildeo de uma antinomia entre as sociedades humanas e a natureza remonta ao iniacutecio do pensamento filosoacutefico no Ocidente a Greacutecia antiga

ldquoA cultura e a esteacutetica (que se constituiu na segunda metade do seacuteculo XVIII) tecircm uma caracteriacutestica em comum a histoacuteria de ambas eacute anterior agrave invenccedilatildeo dos dois termos Por causa do significado cultural do pensamento poliacutetico dos gregos e de sua praacutetica a ideacuteia de cultura estaacute profundamente arraigada na tradiccedilatildeo grego-latinardquo (Hell 1989 p 19)

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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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                                                            3. Paacutegina 50
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natureza os seres humanos recebem da sociedade em que nascem informaccedilotildees culturais igualmente necessaacuterias para a sua sobrevivecircncia A cultura seria assim informaccedilatildeo transmitida por aprendizagem social (cf Capomanes passim 2000)

Box 1O filme O Enigma de Kaspar Hauser (1974) do cineasta alematildeo Werner Herzog refere-se agrave vida de um personagem que foi criado fora do conviacutevio social e que somente na sua

idade adulta comeccedilou adquirir e receber informaccedilotildees e padrotildees culturais e a ser portanto socializado Se ainda natildeo conhece o filme este eacute um bom momento para conhece-lo para

quem jaacute conhece fica o convite para rever

A concepccedilatildeo ldquoelitistardquo de cultura permaneceu entretanto ao lado das definiccedilotildees elaboradas por antropoacutelogos etnoacutelogos filoacutesofos historiadores socioacutelogos O senso comum continuava a atribuir ao conceito uma espeacutecie de aura reservada a uma minoria de indiviacuteduos que osten-tavam saberes especializados

Assim aleacutem de abranger fenocircmenos coletivos como cultura popular cultura ocidental cul-tura chinesa cultura regional o conceito pode se referir a indiviacuteduos que adquiriram conhe-cimentos em diferentes campos do saber Em suma a noccedilatildeo de cultura pode ser ampla ou restrita de forma que seus limites conceituais natildeo satildeo frequentemente muito claros

De fato o uso amplo da noccedilatildeo de cultura pode tornaacute-la demasiadamente elaacutestica com condiccedilotildees de englobar um universo heterogecircneo de fatos e paradoxalmente nada de signifi-cativo No outro extremo estaacute a reduccedilatildeo excessiva do conceito como alusatildeo a um elenco de atividades consideradas nobres como cultura literaacuteria filosoacutefica cientiacutefica artiacutestica etc

A visatildeo mais ampla e generalizada de cultura eacute aquela que a associa indelevelmente agrave civili-zaccedilatildeo Vimos que eacute esse o procedimento tiacutepico da reflexatildeo de antropoacutelogos e etnoacutelogos

De qualquer forma como haacute ao mesmo tempo um uso amplo e um uso limitado para o emprego do termo cultura deve-se precisar o sentido que lhe estaacute sendo atribuiacutedo em tais ou quais circunstacircncias ou situaccedilotildees

ldquoCultura eacute uma palavra imprecisa com muitas definiccedilotildees concorrentes a minha definiccedilatildeo eacute a de acuteum sistema de significados atitudes e valores partilhados e as formas simboacutelicas (apre-sentaccedilotildees objetos artesanais) em que eles satildeo representados ou encarnadosacute A cultura nesta

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acepccedilatildeo faz parte de todo um modo de vida mas natildeo eacute idecircntica a elerdquo (Burke 1989 p 15)

O socioacutelogo Fernando de Azevedo na Introduccedilatildeo da Histoacuteria da Cultura Brasileira apoacutes discutir e problematizar os diversos usos do termo considerou que o seu uso restrito era mais uacutetil ao objetivo a que se propunha entendendo pois cultura como ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28)

A noccedilatildeo de civilizaccedilatildeo ao contraacuterio permaneceria ancorada no seu amplo significado abrangendo os fatos culturais definidos por oposiccedilatildeo agrave natureza em geral e agrave animalidade em particular

Freud por exemplo associou cultura e civilizaccedilatildeo definindo civilizaccedilatildeo por oposiccedilatildeo agraves pulsotildees naturais que precisam ser controladas ou contidas pela sociedade humana

Em textos como O Mal Estar na Civilizaccedilatildeo publicado em 1930 Freud definiu civilizaccedilatildeo como forccedila contraacuteria agrave natureza

ldquo[Civilizaccedilatildeo] designa a totalidade de obras e organizaccedilotildees cuja instituiccedilatildeo nos distancia do estado de animalidade de nossos ancestrais e que servem a duas finalidades a proteccedilatildeo do homem contra a natureza e a regulamentaccedilatildeo das relaccedilotildees dos homens entre sirdquo (apud Wun-enburger Jean-Jacques 1985 p 356)

Percebe-se portanto que a noccedilatildeo abrangente de civilizaccedilatildeo depende de sua relaccedilatildeo com o seu ldquooutrordquo e portanto de sua distinccedilatildeo para com o conceito de natureza

Embora o vocaacutebulo civilizaccedilatildeo tenha surgido somente no seacuteculo XVIII a atribuiccedilatildeo de uma antinomia entre as sociedades humanas e a natureza remonta ao iniacutecio do pensamento filosoacutefico no Ocidente a Greacutecia antiga

ldquoA cultura e a esteacutetica (que se constituiu na segunda metade do seacuteculo XVIII) tecircm uma caracteriacutestica em comum a histoacuteria de ambas eacute anterior agrave invenccedilatildeo dos dois termos Por causa do significado cultural do pensamento poliacutetico dos gregos e de sua praacutetica a ideacuteia de cultura estaacute profundamente arraigada na tradiccedilatildeo grego-latinardquo (Hell 1989 p 19)

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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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acepccedilatildeo faz parte de todo um modo de vida mas natildeo eacute idecircntica a elerdquo (Burke 1989 p 15)

O socioacutelogo Fernando de Azevedo na Introduccedilatildeo da Histoacuteria da Cultura Brasileira apoacutes discutir e problematizar os diversos usos do termo considerou que o seu uso restrito era mais uacutetil ao objetivo a que se propunha entendendo pois cultura como ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28)

A noccedilatildeo de civilizaccedilatildeo ao contraacuterio permaneceria ancorada no seu amplo significado abrangendo os fatos culturais definidos por oposiccedilatildeo agrave natureza em geral e agrave animalidade em particular

Freud por exemplo associou cultura e civilizaccedilatildeo definindo civilizaccedilatildeo por oposiccedilatildeo agraves pulsotildees naturais que precisam ser controladas ou contidas pela sociedade humana

Em textos como O Mal Estar na Civilizaccedilatildeo publicado em 1930 Freud definiu civilizaccedilatildeo como forccedila contraacuteria agrave natureza

ldquo[Civilizaccedilatildeo] designa a totalidade de obras e organizaccedilotildees cuja instituiccedilatildeo nos distancia do estado de animalidade de nossos ancestrais e que servem a duas finalidades a proteccedilatildeo do homem contra a natureza e a regulamentaccedilatildeo das relaccedilotildees dos homens entre sirdquo (apud Wun-enburger Jean-Jacques 1985 p 356)

Percebe-se portanto que a noccedilatildeo abrangente de civilizaccedilatildeo depende de sua relaccedilatildeo com o seu ldquooutrordquo e portanto de sua distinccedilatildeo para com o conceito de natureza

Embora o vocaacutebulo civilizaccedilatildeo tenha surgido somente no seacuteculo XVIII a atribuiccedilatildeo de uma antinomia entre as sociedades humanas e a natureza remonta ao iniacutecio do pensamento filosoacutefico no Ocidente a Greacutecia antiga

ldquoA cultura e a esteacutetica (que se constituiu na segunda metade do seacuteculo XVIII) tecircm uma caracteriacutestica em comum a histoacuteria de ambas eacute anterior agrave invenccedilatildeo dos dois termos Por causa do significado cultural do pensamento poliacutetico dos gregos e de sua praacutetica a ideacuteia de cultura estaacute profundamente arraigada na tradiccedilatildeo grego-latinardquo (Hell 1989 p 19)

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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
                    1. Paacutegina 4 Off
                      1. Botatildeo 13
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2 Entre Cultura e Natureza

A palavra natureza deriva do latim natura (de nascer) significando portanto aquilo com que se nasce O vocaacutebulo natura traduzia para o latim a palavra grega physis com formas derivadas de ldquofiacutesicardquo e ldquofiacutesicordquo e foi amplamente empregada por Aristoacuteteles para explicar o desenvolvimento dos seres vivos

Como mais tarde o vocaacutebulo cosmos - aquilo que eacute regido por leis necessaacuterias - foi denomi-nado de natureza esta uacuteltima foi definida como o impeacuterio da necessidade das leis inflexiacuteveis logo da ausecircncia de liberdade

Se o homem fosse somente um ser natural ele seria movido exclusivamente por forccedilas inflexiacuteveis e portanto natildeo seria livre A questatildeo da liberdade humana foi um dos primeiros temas tratados no iniacutecio do pensamento filosoacutefico da histoacuteria do Ocidente

O que se colocava na filosofia grega era a discussatildeo sobre a liberdade do ser humano fato que exigia a reflexatildeo sobre as suas relaccedilotildees com outros seres da natureza Surgia assim a questatildeo da distinccedilatildeo e da semelhanccedila do homem para com os animais

Uma das primeiras preocupaccedilotildees dos filoacutesofos gregos foi a de distinguir o homem da na-tureza ou a liberdade da pura necessidade Foi isso que em certa medida Aristoacuteteles procurou discernir ao defini-lo como ldquoanimal racionalrdquo ou como ldquoanimal poliacuteticordquo

De qualquer forma circunscrevia-se o espaccedilo da cultura humana distinguido-o do seu outro os animais ou do seu relativamente outro os animais novamente considerando-se que o ser humano seria tambeacutem natureza Tratava-se de distinguir em meio a natureza o espaccedilo humano cultural embora os termos aristoteacutelicos ndash ldquoanimal racionalrdquo e ldquoanimal poliacuteticordquo ndash jaacute as-sinalassem semelhanccedilas e diferenccedilas entre seres culturais e animais Em suma natildeo haveria um ser humano somente cultural ou absolutamente mergulhado na natureza

Percebe-se pois nessas breves referecircncias agrave civilizaccedilatildeo claacutessica que a ideacuteia de cultura tatildeo particular ao seacuteculo XVIII tem raiacutezes na tradiccedilatildeo filosoacutefica greco-latina A Enciclopeacutedia di-rigida por Diderot e DacuteAlambert no Artigo Homem do tomo 8 publicado em 1765 pro-curava como no pensamento grego da eacutepoca claacutessica definir o ldquohomemrdquo comparativamente aos ldquoanimaisrdquo

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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

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Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

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bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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ldquoHomem ser que sente reflete pensa anda livremente pela superfiacutecie terrestre parece estar agrave frente de todos os outros animais sobre os quais exerce domiacutenio vive em sociedade inventa as ciecircncias e as artes bondade e maldade que lhe satildeo proacuteprias estabelece senhores para si mesmo institui leis [] Eacute composto de duas substacircncias uma que se chama alma [] outra conhecida com o nome de corpordquo (apud Hell 1989 p 40)

Ver-se e definir-se no espelho da natureza foi a marca da reflexatildeo filosoacutefica desde os seus iniacutecios na Greacutecia antiga Homero autor da Iliacuteada e da Odisseacuteia sustentou que os animais eram uma espeacutecie de modelo por meio dos quais os homens poderiam alcanccedilar o entendimento de si mesmos ldquoos animais satildeo o espelho mediante o qual o ser humano pode se verrdquo

Acrescentou aleacutem disso que os deuses constituiacuteam relativamente aos homens outro limite desta vez superior ldquoos homens satildeo mortais infelizesrdquo e os ldquodeuses felizes e imortaisrdquo A dife-renccedila do ser humano para com os deuses estava pois definida faltava distingui-lo dos animais E foi nesse diapasatildeo que o pensamento filosoacutefico criou algumas categorias distintivas da cul-tura humana

O Ser Classificador

Platatildeo escreveu no livro O Poliacutetico que os homens se distinguiriam dos outros animais pelo fato de terem o poder de definir e de colocar em classes distintas os diversos seres da natureza

Exemplificava com alguma ironia que caso as aves pernaltas os grous tivessem a habili-dade classificatoacuteria dos homens restaria saber como eles nos classificariam

ldquo outro ser vivo dotado de inteligecircncia ndash o que parece verificar-se com os grous ou com outras espeacutecies de animais ndash poderia classificar do mesmo modo [como noacutes classificamos] oporia os grous como integrando um gecircnero a todos os outros seres vivos e orgulhoso con-sideraria os demais seres vivos inclusive os homens como pertencentes a uma mesma famiacutelia dando-lhes talvez o nome de acuteanimaisacuterdquo (Platatildeo 1970 p 279)

O Senhor do Mundo

A cultura grega claacutessica exaltava a supremacia humana sobre a natureza Na peccedila traacutegica Antiacutegona escrita por Soacutefocles e representada em Atenas por volta de 430 a C o Coro na

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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edefor bull Moacutedulo III bull D

isciplina 05TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia extras

1

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sua segunda apresentaccedilatildeo louva o poder humano ressaltando a sua capacidade de domiacutenio da natureza

ldquoHaacute muitas maravilhas no mundo mas nenhuma eacute tatildeo maravilhosa quanto o homem Ele atravessa ousado o mar grisalho impulsionado pelo vento sul tempestuoso indiferente agraves vagas enormes na iminecircncia de abismaacute-lo e exaure a terra eterna infatigaacutevel deusa suprema abrindo-a com o arado em sua ida e volta ano apoacutes ano auxiliado pela espeacutecie equina Ele cap-tura a grei das aves leacutepidas e as geraccedilotildees dos animais selvagens e prende a fauna dos profundos mares nas redes envolventes que produz homem de engenho e arte inesgotaacuteveis Com suas armadilhas ele prende a besta agreste nos caminhos iacutengremes e doma o potro de abundante crina pondo-lhe na cerviz o mesmo jugo que amansa o fero touro da montanhardquo (Soacutefocles 1989 p 210)

Numa passagem da Odisseacuteia de Homero Ulisses vagando pelas regiotildees do Mar Mediterracirc-neo espantou-se ao perceber o abandono em que se encontrava um espaccedilo natural que muito poderia servir aos homens

ldquoOra ergue-se diante do porto uma ilha coberta de mato nem proacutexima nem afastada da terra dos Ciclopes [] Natildeo se enxergam ali pastagens nem campos de cultivo natildeo eacute habitada por homens e nela soacute pastam balantes cabras [] Como aquelas gentes podiam ter valorizado uma ilha tatildeo bem situada Pois natildeo sendo esteacuteril seria capaz de produzir frutos em todas as estaccedilotildees do anordquo (Homero 2002 p 117)

O Animal Poliacutetico (zocircn politikoacuten) Racional e Artista

Aristoacuteteles procurou distinguir o ser humano aproximando-o e separando-o do seu ldquoespe-lhordquo no mundo os animais Na Poliacutetica definiu como o espaccedilo proacuteprio da cultura humana a sociabilidade

ldquoClaramente se compreende a razatildeo de ser o homem um animal sociaacutevel em grau mais elevado que as abelhas e todos os outros animais que vivem reunidos [] O homem soacute entre todos os animais tem o dom da palavra a voz eacute o sinal da dor e do prazer e eacute por isso que ela foi tambeacutem concedida aos outros animais Estes chegam a experimentar sensaccedilotildees de dor e de prazer e se fazer compreender uns aos outros A palavra poreacutem tem por fim fazer

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compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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isciplina 05TEMAS

ficha sumaacuterio bibliografia extras

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tema1

compreender o que eacute uacutetil ou prejudicial e em consequumlecircncia o que eacute justo e injusto O que distingue o homem de um modo especiacutefico eacute que ele sabe discernir o bem do mal o justo do injusto e assim todos os sentimentos da mesma ordem cuja comunicaccedilatildeo constitui precisa-mente a famiacutelia do Estadordquo (Aristoacuteteles 1970 p 1819)

Nesse mesmo livro o filoacutesofo atribuiu aos homens a racionalidade considerando-os por-tanto como seres capazes de resistir as imposiccedilotildees das leis naturais

Na Poeacutetica Aristoacuteteles depois de definir a ldquoarterdquo como ldquonatural aos homensrdquo e como ldquoimi-taccedilatildeordquo das coisas do mundo escreveu que o que distinguia os homens dos animais era a sua extraordinaacuteria capacidade imitativa Embora os animais sejam tambeacutem capazes de imitarem o seu poder de imitaccedilatildeo eacute limitado restringindo-se no mais das vezes a repetirem comporta-mentos ancestrais

ldquoImitar eacute natural aos homens e se manifesta desde a infacircncia (o homem difere dos outros animais porque ele eacute mais apto a imitar e eacute pela imitaccedilatildeo que ele adquire seus primeiros conhe-cimentos) e em segundo lugar todos os homens tecircm prazer em imitarrdquo (Aristoacuteteles 1975 p 33)

As diferenccedilas entre homens e animais adviriam pois do fato deles serem racionais poliacuteti-cos e artistas

Karl Marx num texto de 1857 Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica distinguiu tambeacutem a sociedade humana vendo-a no espelho da natureza No entender do autor a sociedade hu-mana produz necessidades inexistentes no mundo natural

Alimentar-se eacute um ato natural uma imposiccedilatildeo da natureza mas a fome satisfeita com garfo faca e carne cozida constituiria um fato cultural

ldquoA fome eacute a fome mas a fome que se satisfaz com carne cozida que se come com faca ou garfo eacute uma fome muito distinta da que devora carne crua com unhas e dentesrdquo (Marx 1982 p 9)

A perspectiva marxista entende a separaccedilatildeo entre o ser humano e a natureza considerando que a sociedade humana produz necessidades tatildeo imperiosas quanto as naturais Assim as sociedades humanas seriam dinacircmicas factiacuteveis de mudanccedila enquanto a natureza tenderia a repor sempre os mesmos movimentos e a repetir sempre as mesmas necessidades Logo o ato de comer concerne ao mesmo tempo agrave natureza bioloacutegica do ser humano e agrave sua cultura

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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

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Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

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bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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A imagem empregada por Marx da presenccedila da cultura na satisfaccedilatildeo de uma necessidade natural teve livre curso ao longo da reflexatildeo sobre os viacutenculos entre natureza e sociedade de forma que foi assim expressa por um autor contemporacircneo

ldquo a oposiccedilatildeo tradicional entre natureza e cultura natildeo significa que o homem que se acredita evoluiacutedo tendo se tornado sujeito pensante possa se emancipar do ciclo bioloacutegico a que per-tencem outros seres vivos comer alimentar-se eacute um processo bioloacutegico e cultural uma cultura tambeacutem eacute julgada em funccedilatildeo do papel que ela atribui ao ato da refeiccedilatildeordquo (Hell 1989 p 13)

Considerar a alimentaccedilatildeo como uma atividade histoacuterica logo cultural significa entender que a cultura estaacute ligada agrave vida humana sob todos os seus aspectos Assim qualquer forma de existecircncia humana apresenta alguns fenocircmenos essenciais como comer morar falar comu-nicar deslocar curar Entretanto as maneiras especiacuteficas como as pessoas comem moram falam comunicam curam-se deslocam-se constituem o diversificado quadro cultural em que se dividem as sociedades humanas

Alimentar-se eacute um ato bioloacutegico alimentar-se com carnes cozidas utilizando garfo e faca constitui um fato de civilizaccedilatildeo comer broa de milho com cafeacute ralo vatapaacute ou buchada de bode exprime particularidades culturais eacute especiacutefico de indiviacuteduos de alguns agrupamentos humanos ou de certas sociedades

3 Versotildees de Cultura

As concepccedilotildees desses fenocircmenos essenciais bioloacutegicos e culturais da vida humana origi-naram uma seacuterie de definiccedilotildees e de conceitos como o de civilizaccedilatildeo material As naccedilotildees so-ciedades regiotildees paiacuteses apresentam de maneira particular traccedilos de sua civilizaccedilatildeo material

Nesse quadro de diversidade histoacuterica surgiram concepccedilotildees classificatoacuterias de culturas superi-ores e inferiores Natildeo se trata agora de distinguir cultura e natureza mas de distinguir diversas formas de cultura O homem continua a exercer o poder de classificaccedilatildeo que lhe atribuiu Platatildeo mas natildeo classifica mais somente as aves os grous mas tambeacutem outros seres humanos

Os gregos antigos denominavam os povos que natildeo falavam o seu idioma como baacuterbaros Os cristatildeos classificavam os povos que professavam crenccedilas diferentes das suas como increacutedulos No seacuteculo XIX foi elaborada a noccedilatildeo de evoluccedilatildeo e os pensadores europeus que a criaram e empregaram definiam vaacuterias naccedilotildees do mundo como ldquoatrasadasrdquo ou pouco desenvolvidas

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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
                    1. Paacutegina 4 Off
                      1. Botatildeo 13
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                          1. Botatildeo 44
                            1. Paacutegina 5 Off
                            2. Paacutegina 6
                            3. Paacutegina 7
                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
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As classificaccedilotildees estendiam-se e distinguiam igualmente grupos sociais no interior de mes-mas formaccedilotildees sociais Nos paiacuteses industrializados do seacuteculo XIX surgiu a expressatildeo ldquoclasses perigosasrdquo para designar aqueles grupos que eram vistos como ameaccediladores agrave sociedade capi-talista e industrial A classificaccedilatildeo permanecia entretanto como fundamental para o exerciacutecio da dominaccedilatildeo social

A classificaccedilatildeo como uma espeacutecie de arma capaz de dominar o outro foi retomada pela sociologia contemporacircnea Pierre Bourdieu na sua aula inaugural do Collegravege de France (1988) sustentou que o que seria particular agraves ldquociecircncias humanasrdquo eacute o fato delas operarem classifi-cando os grupos sociais que estudam

Mas diferentemente do grou aludido pelo diaacutelogo platocircnico os seres classificados pelos cientistas sociais as sociedades ou agrupamentos humanos satildeo tambeacutem classificadores

Ou seja o poder que a classificaccedilatildeo conferiria aos homens sobre a natureza na perspectiva platocircnica poderia ser de certa forma atenuada ou contestada nas ciecircncias sociais

Box 2Ver texto anexo de Pierre Bourdieu

De fato o poder de classificaccedilatildeo como forma de exerciacutecio de domiacutenio natildeo somente sobre a natureza mas tambeacutem sobre os proacuteprios seres pensantes os homens ganhou expressotildees cult-urais diversas ao longo da histoacuteria

O conto ldquoO Alienistardquo de Machado de Assis publicado no livro Papeacuteis Avulsos em 1882 eacute a narrativa da constituiccedilatildeo de um poder despoacutetico na pequena vila de Itaguaiacute no estado do Rio de Janeiro pelo renomado cientista Simatildeo Bacamarte

O poder do alienista derivou de sua competecircncia meacutedica a fixaccedilatildeo ou o conhecimento dos limites entre a loucura e a sanidade Distinguindo esses estados da alma Bacamarte pode inserir a populaccedilatildeo de Itaguaiacute em duas categorias antagocircnicas e assim aplicar nos doentes os meacutetodos de cura apropriados

A pequena populaccedilatildeo de Itaguaiacute ficou assim sob o poder do cientista que dispunha metodicamente de seus destinos ora classificando alguns como satildeos ou normais ora definindo

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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
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outros como enfermos e passivos de serem trancafiados na Casa Verde Novamente seria a capacidade classificatoacuteria que permitiria o poder e o controle sobre os seres classificados

Box 3Ver texto anexo de Machado de Assis

Entretanto como sustentou Bourdieu haacute um campo tenso de forccedila proacuteprio agraves classifica-ccedilotildees Haveria classificaccedilotildees e contra-classificaccedilotildees A classificaccedilatildeo por exemplo de culturas inferiores foi contestada pelos elaboradores e defensores da noccedilatildeo de ldquorelativismo culturalrdquo

De fato como resposta agraves concepccedilotildees de culturas superiores e inferiores apareceu a noccedilatildeo de relativismo cultural ldquoO relativismo cultural contenta-se em afirmar que uma cultura natildeo dispotildee de algum criteacuterio absoluto que a autorizaria aplicar essa distinccedilatildeo agraves produccedilotildees de outra culturardquo (Strauss e Didier 1988 p 229)

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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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Arte como Sistema Cultural

1 Hierarquia e Relativismo Cultural

O relativismo cultural abolia as hierarquias culturais e insistia no caraacuteter culturalmente profiacutecuo das relaccedilotildees entre civilizaccedilotildees As relaccedilotildees entre sociedades ldquoprimitivasrdquo e ldquodesenvolvi-dasrdquo foram e satildeo objetos de reflexatildeo e de trocas culturais

O movimento artiacutestico cubista seria um exemplo de absorccedilatildeo criativa de objetos de tribos africanas (maacutescaras esculturas) pela arte europeacuteia A releitura cubista daqueles objetos foi um dos fatores das modificaccedilotildees culturais ocorridas nas sociedades ocidentais industrializadas na primeira metade do seacuteculo XX

Ao lado da utilizaccedilatildeo do conceito de cultura na anaacutelise das sociedades primitivas ou sem escrita como preferia definir Leacutevi-Strauss o conceito eacute habitualmente empregado para distin-guir estratos culturais no interior das sociedades

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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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                  5. Botatildeo 12
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Uma das dicotomias mais recorrentes empregadas tanto pelos pesquisadores quanto pelo senso comum eacute a que opotildee a cultura erudita agrave cultura popular A distinccedilatildeo entre as artes e as culturas proacuteprias agraves classes populares e as outras formas culturais e artiacutesticas proacuteprias agraves elites cultas eacute habitual nas sociedades estratificadas embora a noccedilatildeo de arte popular tenha surgido apenas no final do seacuteculo XVIII na Europa

O movimento histoacuterico de afirmaccedilatildeo dos direitos dos povos de decidirem sobre seu proacuteprio destino deu origem a imagem do povo como sujeito da histoacuteria e simultaneamente como objeto de estudo de disciplinas eruditas que foram nomeadas no seacuteculo XIX como folclore e etnografia

A valorizaccedilatildeo da cultura e da arte populares naquele momento derivava tambeacutem do des-pertar da consciecircncia nacionalista Assim foram atribuiacutedos agraves artes e agraves culturas populares certos valores positivos como a simplicidade a sinceridade e ateacute mesmo a ingenuidade de suas criaccedilotildees

Os opositores da cultura popular ao contraacuterio enxergavam nos seus produtos ausecircncia de estilo rudeza e falta de habilidade De qualquer forma as relaccedilotildees entre cultura popular e cultura erudita foram objeto de reflexatildeo de trabalhos significativos no seacuteculo XX como os de Mikhail Bakhtin Franccedilois Rabelais e a Cultura Popular da Idade Meacutedia e da Renascenccedila publi-cado em 1965 do historiador Carlo Ginzburg O Queijo e os Vermes (1989) e de Peter Burke Cultura Popular na Idade Moderna (1989)

Esses viacutenculos podem ser considerados de maneira vaacuteria como imposiccedilatildeo da alta cultura so-bre a cultura popular como degradaccedilatildeo ou rebaixamento da alta cultura quando absorvida pelas camadas populares como empreacutestimo muacuteltiplo de acordo com a noccedilatildeo de circularidade cultural

No entender de Leacutevi-Strauss ldquoatraacutes do que chamamos de ldquoarte popularrdquo haacute algo extrema-mente complexo existe um duplo movimento por um lado de conservaccedilatildeo e por outro de vulgarizaccedilatildeo ou de popularizaccedilatildeo de temas que satildeo na origem nobres ou considerados como taisrdquo (Strauss e Charbonnier 1989 p 95-96)

Bakhtin discerniu um movimento contraacuterio ao referido por Leacutevi-Strauss notou a presenccedila ativa de estratos de cultura camponesa popular nas obras do escritor erudito francecircs do seacuteculo XVI Franccedilois Rabelais autor de Gargacircntua e Pantagruel

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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bibliografiaU

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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Ginzburg analisando um processo da Inquisiccedilatildeo em que Domenico Scandella conhecido por Menocchio um moleiro da regiatildeo do Friuli italiano no final do seacuteculo XVI foi reacuteu consta-tou a presenccedila de elementos da alta cultura nas explicaccedilotildees propagadas por ele sobre a origem do mundo Mennochio interpretava os livros que lia por meio das lentes da cultura oral dos camponeses do Friuli ldquoNatildeo o livro em si mas o encontro da paacutegina escrita com a cultura oral eacute que formava na cabeccedila de Menocchio uma mistura explosivardquo (Ginzburg 1989 p 116)

Ginzburg conclui em O Queijo e os Vermes que o curso da histoacuteria demonstra haver dife-renccedilas de linguagem e analogias entre culturas ldquosubalternasrdquo e ldquodominantesrdquo Explicar as se-melhanccedilas como difusatildeo de cima para baixo implica sustentar que as ideacuteias nascem somente em meio agraves classes dominantes

Box 4O filme brasileiro Deus e o Diabo na Terra do Sol (1963) de Glauber Rocha

eacute um exemplo de incorporaccedilatildeo da forma narrativa da literatura de cordel nordestina numa expressatildeo de cultura erudita Vocecirc conhece esse filme

No entender do autor entre a alta cultura e a cultura popular haveria trocas subterracircneas que podem ser discernidas pelas anaacutelises dos fatos sociais e das expressotildees artiacutesticas

Box 5Ver o conto O Duelo de Guimaratildees Rosa que reproduz a maneira

de falar de um barqueiro do sertatildeo brasileiro

A dicotomia cultura popular e alta cultura reveste-se agraves vezes dos significados de cultura dominada e cultura dominante O argumento que sustenta haver uma cultura dominante e uma cultura dominada supotildee a existecircncia de dominaccedilatildeo entre grupos de homens fraccedilotildees de classes ou classes sociais Esse tipo de anaacutelise presente tanto na teoria marxista quanto na sociologia weberiana explica os fenocircmenos de forccedila relativos agraves ideacuteias assim como as praacuteticas culturais reportando-as agraves forccedilas sociais dos grupos que seriam os seus suportes

Desse ponto de vista a cultura popular seria um sub-produto da cultura dominante ou erudita No lugar de circularidade cultural esse ponto de vista baseado na noccedilatildeo de ldquodomiacutenio ideoloacutegicordquo entende a cultura popular como receptora simplificadora e divulgadora da cultura dominante

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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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No transcorrer do seacuteculo XX surgiram expressotildees que procuravam abarcar fenocircmenos cul-turais tiacutepicos das sociedades contemporacircneas Por exemplo os conteuacutedos divulgados pelos meios de comunicaccedilatildeo como o raacutedio a televisatildeo as revistas em quadrinhos receberam a des-ignaccedilatildeo de cultura de massa

As relaccedilotildees entre a cultura erudita e a cultura de massa satildeo objetos recorrentes de reflexatildeo dos pesquisadores Omar Calabrese no capiacutetulo ldquoPormenor e Fragmentordquo de A Idade Neo-Barroca (1988) argumentou que existiria um princiacutepio comum que atravessaria a cultura de experimentaccedilatildeo artiacutestica das Bienais de Veneza os programas de esporte e de auditoacuterio da televisatildeo italiana

Calabrese utilizou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo para discernir esse princiacutepio que alinhavaria fenocirc-menos culturais aparentemente heterogecircneos numa eacutepoca ou sociedade determinadas

O autor empregou a noccedilatildeo de ldquorecaiacutedardquo criada pelo pesquisador Severo Sarduy no seu livro Barroco publicado em 1975 No entender de Sarduy o barroco italiano formaria um sistema cultural integrado porque constituiacutedo por uma mesma visatildeo de mundo que se expressaria nos quadros do pintor Caravaggio nas arquiteturas de Borromini nos poemas de Gocircngora e nas descobertas das oacuterbitas eliacutepticas dos planetas pelo Kepler Calabrese sustentou que na nossa contemporaneidade uma espeacutecie de espiacuterito do tempo uniria tambeacutem formas culturais diacutes-pares e diversas

Outros teoacutericos entretanto insistiram na separaccedilatildeo entre cultura de massa e cultura erudita considerando a cultura de massa como mecanismo popular de alienaccedilatildeo poliacutetica ou de neutral-izaccedilatildeo da consciecircncia criacutetica das populaccedilotildees

Mesmo assim natildeo parece ter deixado de haver empreacutestimos e aproximaccedilotildees entre cultura de massa e cultura erudita no transcurso do seacuteculo passado de que eacute exemplo frisante a pop art Movimentos de vanguarda no seacuteculo XX inspiraram-se na cultura de massa a pop art apropriou-se e apropria-se criativamente das imagens divulgadas e consagradas pelas revistas em quadrinhos e pelo cinema

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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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Box 6O pintor Andy Warhol apropriava-se e fazia uma releitura da cultura de massa nas suas

representaccedilotildees de iacutedolos e siacutembolos do glamour da sensualidade e da contestaccedilatildeo poliacutetica da sociedade contemporacircnea Veja nos sites de busca as representaccedilotildees que o artista fez da atriz

Marilyn Monroe e do liacuteder da revoluccedilatildeo chinesa Mao Tseacute Tung

Mas retomando a definiccedilatildeo de cultura apresentada por Fernando de Azevedo ldquoproduccedilatildeo conservaccedilatildeo e progresso dos valores intelectuais das ideacuteias das ciecircncias e das artesrdquo (Azevedo 1958 p 28) falta distinguir nesse escopo ainda abrangente as expressotildees artiacutesticas No interior do amplo universo cultural atuam as formas artiacutesticas que seratildeo a seguir consideradas agrave parte

2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte

O vocaacutebulo arte da maneira como eacute entendido nos tempos atuais data do seacuteculo XVIII Poreacutem a primeira definiccedilatildeo desses objetos particulares considerados mais contemporanea-mente como artiacutesticos ocorreu na Greacutecia antiga com Platatildeo

Antes os filoacutesofos pitagoacutericos haviam definido a beleza como relaccedilatildeo harmoniosa entre as partes de um todo referindo-se ao universo O universo seria belo assim como o corpo humano as composiccedilotildees musicais porque os viacutenculos entre suas partes constitutivas seriam proporcionais e necessaacuterias Sabe-se que as ligaccedilotildees entre as partes seriam de fato necessaacuterias e natildeo contingentes desde que nenhuma parte pudesse ser retirada ou acrescentada sem que o todo se alterasse

Concebia-se uma ordem recocircndita no Universo que foi expressa por Heraacuteclito no seacuteculo V aC ldquoO Cosmos o mesmo de todas as coisas nem um deus nem um homem o fizeram mas eacute e seraacute eternamente o fogo que vive para sempre acendendo em quantidades certas e apagando-se em quantidades medidasrdquo (Fragmento 30)

Box 7No texto O Duelo de Joatildeo Guimaratildees Rosa um personagem do conto descreve o mundo

como um cosmo ordenado Aos olhos dos homens a ordem coacutesmica parece estranha e bizarra

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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
                    1. Paacutegina 4 Off
                      1. Botatildeo 13
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                            2. Paacutegina 6
                            3. Paacutegina 7
                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
                            6. Paacutegina 10
                            7. Paacutegina 11
                            8. Paacutegina 12
                            9. Paacutegina 13
                            10. Paacutegina 14
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                                3. Paacutegina 7
                                4. Paacutegina 8
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Platatildeo foi o primeiro pensador na histoacuteria do Ocidente a definir os objetos de arte como ldquoseres de imitaccedilatildeordquo Sua perspectiva tendia no entanto a desclassificar essas imitaccedilotildees argu-mentando que elas se encontrariam demasiadamente afastadas do mundo das ideacuteias logo da verdade e seriam produtos da irracionalidade ou segundo suas palavras da alma irracional

Considerava que a atividade do artesatildeo que fabricava camas e mesas seria mais uacutetil e im-portante que a dos ldquoartistasrdquo que imitavam as camas e as mesas feitas pelos artiacutefices

No diaacutelogo com Glaucoacuten no livro X de A Repuacuteblica o Soacutecrates platocircnico concluiu que na ci-dade governada pelos filoacutesofos natildeo haveria lugar para os imitadores ldquoartistasrdquo O rude veredicto que excluiacutea os ldquoartistasrdquo da polis era poreacutem temperado por uma afirmaccedilatildeo de Soacutecrates quase no final do diaacutelogo segundo a qual ele aceitaria dialogar com os ldquoimitadoresrdquo e mudaria de ponto de vista caso eles o convencessem da utilidade dos seres de imitaccedilatildeo para a vida dos cidadatildeos

Soacutecrates impunha entretanto uma condiccedilatildeo para o diaacutelogo os ldquoimitadoresrdquo deveriam se apresentar para o debate desprovidos dos elementos de seduccedilatildeo e de convencimento dos in-terlocutores que constituiriam a natureza mesma de suas atividades

ldquo se a poesia imitativa voltada para o prazer tiver argumentos para provar que deve estar presente numa cidade bem governada a receberemos com gosto pois temos consciecircncia do encantamento que sobre noacutes exerce mas seria impiedade trair o que julgamos verdadeiro Ou natildeo te sentes tambeacutem seduzido pela poesia meu amigo sobretudo quando a contempla atraveacutes de Homero [] Logo eacute justo deixaacute-la regressar uma vez que ela se justifique em metros liacutericos ou em quaisquer outros [] Concederemos certamente aos seus defensores que natildeo forem poetas mas forem amadores de poesia que falem em prosa em sua defesa mostrando como eacute natildeo soacute agradaacutevel como uacutetil para os Estados e a vida humanardquo (Platatildeo 1993 p 476)

A criacutetica platocircnica confere como se vecirc um poderoso poder de convencimento aquilo que seraacute definido muitos seacuteculos mais tarde de forma artiacutestica O Soacutecrates platocircnico aceitava dialogar com os ldquoamadores de poesiardquo desde que eles sustentassem os seus argumentos desnu-dados de cores meacutetricas e ritmos artiacutesticos No entender de Soacutecrates as formas artiacutesticas sem aqueles procedimentos pareceriam rostos envelhecidos que tiveram na juventude frescor mas natildeo beleza

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O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

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Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

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Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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ficha sumaacuterio bibliografia extras

O livro A Poeacutetica de Aristoacuteteles foi em certa medida uma resposta agrave exclusatildeo platocircnica das ldquoartesrdquo na cidade Aristoacuteteles manteve a definiccedilatildeo de Arte como mimesis embora tenha alterado ou nuanccedilado a concepccedilatildeo de imitaccedilatildeo platocircnica

No livro X de A Repuacuteblica a mimesis foi associada a um ldquoespelhordquo que refletiria as coisas e os seres do mundo Jaacute Aristoacuteteles criou a noccedilatildeo de verossimilhanccedila segundo a qual no lugar de imitaccedilatildeo como espelho de objetos e de fatos acontecidos as ldquoartesrdquo imitariam acontecimentos possiacuteveis mas natildeo reais que natildeo ocorreram mas que poderiam ter ocorrido

No caso da poesia traacutegica ou eacutepica a faacutebula ou seja o conjunto das accedilotildees representadas ou narradas deveria ser convincente internamente procedente habilmente arranjada pelos imitadores de modo a fazer o puacuteblico do teatro ou os leitores dos livros confundirem a ficccedilatildeo com a realidade

A argumentaccedilatildeo aristoteacutelica pressupotildee pois a existecircncia de uma diferenccedila entre os seres de imitaccedilatildeo e a realidade tangente Aleacutem disso procurando responder agrave criacutetica platocircnica da ldquoarterdquo como expressatildeo da ldquoalma irracionalrdquo Aristoacuteteles conferiu importacircncia agraves regras ldquode fabrica-ccedilatildeordquo que deveriam ser atendidas e cumpridas pelos criadores de faacutebulas Haveria um modo de operaccedilatildeo uma ldquoteacutecnicardquo na criaccedilatildeo das imitaccedilotildees um regime canocircnico que deveria ser conhe-cido e cumprido pelos imitadores

A palavra grega teacutechnecirc foi traduzida pelo latim como arte de forma que a palavra ldquoarterdquo teraacute como significado ateacute o seacuteculo XVIII conhecimento teacutecnico Os conteuacutedos dos termos teacutechnecirc e arte eram basicamente os mesmos ldquoconhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadasrdquo

Foi nesse sentido que ldquoarterdquo apareceu na abertura do poema Os Lusiacuteadas de Luiacutes Vaz de Camotildees publicado em 1572

ldquoCantando espalharei por toda parte Se a tanto me ajudar o engenho e arterdquo Engenho e arte recobrem as duas condiccedilotildees fundamentais para a elaboraccedilatildeo do poema criatividade men-tal e saber teacutecnico de composiccedilatildeo do canto eacutepico

No Renascimento Cultural italiano do seacuteculo XV a definiccedilatildeo mimeacutetica da pintura ganhou com Leo Baptista Alberti um sentido imponente No entender de Alberti no livro Da Pin-tura de 1436 o quadro seria uma janela aberta para o mundo definiccedilatildeo que reforccedilava o seu significado mimeacutetico

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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

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bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

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bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

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bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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                                                                      1. Botatildeo 55
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ldquoAqui deixadas de lado outras coisas direi apenas o que faccedilo quando pinto Inicialmente onde devo pintar traccedilo um quadracircngulo de acircngulos retos do tamanho que me agrade o qual reputo ser uma janela aberta por onde possa eu mirar o que aiacute seraacute pintadordquo (Alberti 1999 p 94)

Embora Alberti continuasse descrevendo minuciosamente a ldquoarterdquo de pintar o seu livro conteacutem recomendaccedilotildees praacuteticas para a feitura de um quadro ele acentuou enfaticamente o lado da criatividade do pintor que deveria exprimir nos seus trabalhos grandes e significativas ideacuteias Alberti tentava assim diminuir a importacircncia do trabalho teacutecnico manual em benefiacute-cio da engenhosidade criativa

Este ponto de vista albertiano foi incorporado por Leonardo da Vinci no Tratado de Pintura que constatando a importacircncia do trabalho manual para a escultura considerou-a uma mani-festaccedilatildeo cultural inferior agrave pintura O Renascimento cultural procurou diminuir a relevacircncia do trabalho manual na produccedilatildeo artiacutestica

Aleacutem disso a definiccedilatildeo de ldquoarterdquo como mimesis garantia no entender de Leonardo a prima-zia da pintura a mais mimeacutetica das ldquoartesrdquo num periacuteodo em que a sugestatildeo de profundidade na superfiacutecie plana do quadro condiccedilatildeo essencial para a boa reproduccedilatildeo visual do mundo era produzida por meio da utilizaccedilatildeo de princiacutepios da geometria euclidiana na distribuiccedilatildeo espa-cial das figuras Concebia-se agrave pintura o poder de exprimir o amplo universo da cultura seja ele filosoacutefico ou artiacutestico

Box 8A Escola de Atenas do pintor Rafael Sacircnzio exprime esse reconhecimento renascentista da extraordinaacuteria capacidade da pintura de ldquoespelharrdquo o mundo Veja no afresco de Rafael como

a pintura acolhe as demais linguagens artiacutesticas

A pintura de par com seu efeito mimeacutetico reinou por assim dizer na histoacuteria cultural do Ocidente ateacute o final do seacuteculo XIX quando foi revalorizado o trabalho estritamente manual na produccedilatildeo de objetos artiacutesticos

Antes disso uma dupla ruptura cultural ocorreu no seacuteculo XVIII A primeira foi o surgi-mento da Esteacutetica propriamente dita como uma das disciplinas filosoacuteficas A segunda foi a concepccedilatildeo que a beleza artiacutestica independia da imitaccedilatildeo da natureza transgredindo a antiga definiccedilatildeo da arte como mimesis

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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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O vocaacutebulo arte mudou tambeacutem de significado deixando de estar associado a regime canocircnico conhecimento e aplicaccedilatildeo refletida de regras determinadas para a fabricaccedilatildeo dos seres de imitaccedilatildeo A arte passou a ser compreendida como produtos culturais nascidos da sen-sibilidade liberdade ou subjetividade de indiviacuteduos excepcionais

No lugar de cumprir cacircnones estritos o grande artista produziria obras excepcionais se-guindo seu gecircnio criador No lugar da aprendizagem de cacircnones de confecccedilatildeo de obras de arte postulava-se a vocaccedilatildeo original do artista como forccedila criadora O objeto artiacutestico poderia assim jaacute ser produzido dotado de beleza e considerado belo sem que a natureza fosse obriga-toriamente bela

3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel

A visatildeo da natureza alterou-se no ritmo das novidades culturais do seacuteculo do Iluminismo No lugar de se conceber a natureza como acabada como ldquoser para semprerdquo segundo a definiccedilatildeo grega claacutessica a natureza passou a ser vista como o espaccedilo de atuaccedilatildeo humana

ldquoA imitaccedilatildeo da natureza natildeo eacute servil o artista completa a obra da natureza que eacute ao mesmo tempo uma das fontes de suas percepccedilotildees esteacuteticas e um guia indispensaacutevel para a sua criaccedilatildeordquo (Hell 1989 p 44)

A razatildeo iluminista acentuava o poder de intervenccedilatildeo humana no mundo natural de forma a dominaacute-lo alteraacute-lo e trazecirc-lo para a convivecircncia social O jardim passou desde entatildeo a ser definido como uma das belas artes A intervenccedilatildeo humana na natureza visava apaziguaacute-la e de certa forma socializaacute-la

A este respeito escreveu Giulio Carlo Argan

ldquo jaacute nos meados do seacuteculo XVIII o termo romacircntico eacute empregado como equivalente de pitoresco e referido agrave jardinagem isto eacute a uma arte que natildeo imita e nem representa mas em consonacircncia com as teses iluministas opera diretamente sobre a natureza modificando-a corrigindo-a adaptando-a aos sentimentos humanos e agraves oportunidades e vida social isto eacute colocando-a como ambiente de vidardquo (Argan 1996 p 12)

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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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A concepccedilatildeo de ldquopitorescordquo como sustentou Argan estaacute ligada agraves primeiras manifestaccedilatildeo do Romantismo no seacuteculo XVIII A literatura romacircntica brasileira descreveu com sensibili-dade e precisatildeo a natureza brasileira em consonacircncia com essa nova visatildeo artiacutestica de que satildeo exemplos os textos anexos de Joseacute de Alencar e Bernardo Guimaratildees

Acompanhando essas concepccedilotildees sobre a relaccedilatildeo do homem frente agrave natureza surgiram escolas de paisagistas na arte europeacuteia como a inglesa em que se distinguiram John Constable William Turner e um movimento pictoacuterico francecircs a Escola de Barbizon da qual participa-ram Jean-Franccedilois Millet Theacuteodore Rousseau Camille Corot entre outros

Box 10Ver exemplos da pintura de paisagem inglesa dos seacuteculos XVIII e XIX e do paisagismo

francecircs da Escola de Barbizon do seacuteculo XIX

No final do seacuteculo XIX novos paisagistas se distinguiram no quadro da arte pictoacuterica oci-dental como os impressionistas e seus sucessores como Van Gogh Gauguin e tantos outros

A noccedilatildeo de arte contemporacircnea tem sua origem no seacuteculo de transformaccedilotildees e de rup-turas culturais que foi o seacuteculo XVIII Ao mesmo tempo surgia o mercado de arte e o artista libertava-se do sistema de mecenato

Mas nem todas as manifestaccedilotildees artiacutesticas libertaram-se ao mesmo tempo das imposiccedilotildees de um patrocinador onipresente no ato da criaccedilatildeo artiacutestica o mecenas Algumas ldquolibertaram-serdquo primeiro como foi o caso da literatura favorecida por poliacuteticas de alfabetizaccedilatildeo empreen-didas por alguns Estados europeus Outras permaneceram mais tempo atadas aos mecenas como a muacutesica

O livro de Norbert Elias Mozart Sociologia de um Gecircnio (1994) analisa a condiccedilotildees estritas e estreitas da vida e da produccedilatildeo do compositor submetido agraves exigecircncias de dois mecenas o Arcebispo de Salzbourg e o Imperador da Aacuteustria

O drama pessoal de Mozart derivou segundo a tese do autor do fato do compositor expri-mir-se livremente nas suas composiccedilotildees sem atender agraves consideraccedilotildees e agraves exigecircncias musicais de seus protetores

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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Box 5

Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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De Mozart a Beethoven teria se constituiacutedo na Europa o mercado consumidor de obras musicais de forma que Beethoven pode agir com a desenvoltura e a liberdade de Mozart sem sofrer as consequumlecircncias que pesaram dramaticamente sobre a vida do seu antecessor

Mozart morreu isolado e foi enterrado numa vala comum enquanto Beethoven recebeu em vida as gloacuterias devidas agrave sua genialidade Com os movimentos de vanguarda no iniacutecio do seacuteculo XX novas rupturas se apresentaram ressalte-se desta vez a subversatildeo realizada pelos movimentos de vanguarda sobre espaccedilo plaacutestico criado pelo Renascimento

Retomava-se ao mesmo tempo a concepccedilatildeo do artista como trabalhador manual e como tal produtor de objetos reais e natildeo imitaccedilotildees da realidade No entender de Argan foi a ecircnfase atribuiacuteda ao trabalho manual que explicaria a importacircncia da xilogravura na pintura expres-sionista da Alemanha no iniacutecio do seacuteculo XX

Box 11As gravuras expressionistas satildeo pelos motivos referidos no texto xilografias As pinturas dos artistas do grupo expressionista de ldquoA Ponterdquo procuram igualmente reproduzir as feiccedilotildees da

xilogravura Ver em sites de busca exemplos de gravuras expressionistas

Os artistas-artesatildeos insistiam na importacircncia do trabalho manual sobre a mateacuteria resistente a madeira Como trabalhadores manuais eles se viam como produtores de objetos reais assim como os artesatildeos Consideravam que os seus produtos nasciam de atos de liberdade e de suas experiecircncias de vida os quais se exprimiam no produto final e eram reversivamente alterados por ele O oposto ocorreria com o trabalho operaacuterio submetido agraves linhas de produccedilatildeo sem poder manifestar qualquer veleidade de liberdade

Essa identificaccedilatildeo do artesatildeo com o artista remontava agrave histoacuteria cultural do Ocidente do periacuteodo anterior ao quattrocento italiano Na Greacutecia antiga a identificaccedilatildeo do ldquoartistardquo com o artesatildeo (demiourgoacutes) implicou na sua depreciaccedilatildeo social Observe-se aleacutem disso que a asso-ciaccedilatildeo entre o artista e o artesatildeo ressurgiu no movimento expressionista alematildeo num periacuteodo histoacuterico em que o trabalho produtivo era sobretudo industrial O artista-artesatildeo produziria por oposiccedilatildeo ao trabalho industrial ldquouma obra individualizada em que se expressaria a person-alidade do autorrdquo (Campomanes 2000 p 215)

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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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De qualquer forma permaneceu a distinccedilatildeo do artista para com o operaacuterio industrial produtor de mercadorias padronizadas em seacuterie e impessoais Os cubistas insistiram igual-mente na importacircncia da atividade manual para a fabricaccedilatildeo artiacutestica e procuraram incorporar a teacutecnica dos pintores de parede nos seus trabalhos empregando assim no lugar dos pinceacuteis dos grandes mestres da pintura inclusive renascentistas os pinceacuteis dos pintores operaacuterios

Por detraacutes dessa revoluccedilatildeo que ocorreu no iniacutecio do seacuteculo XX com os movimentos de vanguarda pulsavam concepccedilotildees inovadoras sobre arte e o fazer artiacutestico No lugar de imita-ccedilatildeo da realidade a arte passou a ser entendida como produtora de objetos reais Em meio aos objetos utilitaacuterios que nos cercam existem tambeacutem os objetos artiacutesticos que embora dotados da mesma realidade se particularizariam pelo fato de terem sido produzidos pelo trabalho desalienado criativo e livre O trabalho operaacuterio nas faacutebricas seria ao contraacuterio marcado pela ausecircncia de liberdade e pela alienaccedilatildeo

Em certa medida a arte passava a ser entendida como trabalho em substituiccedilatildeo das concep-ccedilotildees romacircnticas do artista guiado pelo entusiasmo ou pela chama criadora O fazer artiacutestico livre funcionaria assim no interior da sociedade capitalista de sujeiccedilatildeo do trabalho como um exemplo de liberdade que conteria potencialidade criacutetica e capacidade de modificaccedilatildeo social

Ao longo do seacuteculo XX o conceito de arte foi extraordinariamente alargado abrangendo de forma relativamente semelhante como havia ocorrido na Inglaterra do seacuteculo XIX com John Ruskin e William Morris no movimento das Artes e Ofiacutecios a atividade artesanal elevando os artesatildeos agrave condiccedilatildeo de artistas

Box 12Procurar nos sites de busca a biografia de William Morris e

dados ou informaccedilotildees sobre a sua participaccedilatildeo no Movimento inglecircs de Artes e Ofiacutecios

Pierre Francastel no livro A Realidade Figurativa referindo-se aos formatos dos objetos utilitaacuterios observou

ldquoTodo objeto [comporta] necessariamente um aspecto praacutetico e um aspecto esteacutetico [] Os trabalhos recentes dos etnoacutegrafos tornaram mais evidente do que nunca essa verdade O instrumento eacute feito para um certo uso mas natildeo existe determinismo absoluto entre a neces-

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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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sidade que faz fabricar o instrumento e a forma particular e infinitamente variada para um mesmo utensiacutelio na qual se deteacutem cada grupo humano As teacutecnicas primitivas personalizam esquemas de instrumental gerais em que o determinismo rigoroso do emprego caracteriza apenas um princiacutepio tratando-se do anzol ou da enxada de uma povoaccedilatildeo primitiva existe efetivamente dezenas de foacutermulas equivalentes ao ponto de vista praacutetico A forma pura o tipo soacute existe como abstraccedilatildeo Donde se conclui pela intervenccedilatildeo de um certo elemento de gosto se natildeo pessoal mais exatamente coletivo ou social na fixaccedilatildeo dos modelos de ferramentasrdquo (Francastel 1973 p 50)

No Ocidente europeu o movimento Bauhaus vinculou o fazer artiacutestico aos objetos de uso utilitaacuterio A arte recuperava ao que parece o seu significado original de atividade teacutecnica que pressupunha natildeo somente imaginaccedilatildeo criativa mas saber agir conhecer e aplicar na confecccedilatildeo de objetos teacutecnicas determinadas O que natildeo significava que a atividade artiacutestica pudesse se resumir a pura aplicaccedilatildeo de saberes teacutecnicos Considerava-se entretanto o fazer a etapa de produccedilatildeo do objeto como tatildeo essencial para a criaccedilatildeo como a ideacuteia original ou a inspiraccedilatildeo

Box 13A Escola de Arquitetura Bauhaus foi fundada em 1919 por W Gropius Sua finalidade era recompor o viacutenculo da arte com a induacutestria da maneira

como existiu no passado entre arte e artesanato A escola foi fechada em 1933 pelo governo nazista Ver sites de busca sobre a Bauhaus

O pintor Joan Miroacute afirmava que ldquo[las] formas van tomando realidad conforme trabajo Mas que ponerme a pintar algo empiezo pintando y conforme pinto el cuadro empieza a afirmarse o sugerise bajo mi pincelrdquo (apud Campomanes 2000 p 216) Picasso dizia que espe-rava a chegada da inspiraccedilatildeo no trabalho ldquoQue cuando la inspiracioacuten me llegue me encuentre trabajandordquo (apud Campomanes 2000 p 216)

A arte como trabalho produtivo foi um dos aspectos considerados pela reflexatildeo esteacutetica do seacuteculo passado de que eacute exemplo o livro de E Fisher A Necessidade da Arte talvez devido agrave importacircncia da produccedilatildeo industrial para o cotidiano das pessoas e agraves propostas poliacuteticas de transformaccedilatildeo e revoluccedilatildeo sociais que eram acompanhadas pela criacutetica agrave exploraccedilatildeo do oper-ariado e agraves formas de trabalho alienado

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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
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                            2. Paacutegina 6
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                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
                            6. Paacutegina 10
                            7. Paacutegina 11
                            8. Paacutegina 12
                            9. Paacutegina 13
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4 Induacutestria e Arte

Os viacutenculos da produccedilatildeo artiacutestica com a induacutestria satildeo variados O Futurismo italiano inten-tava imprimir nas suas esculturas e pinturas o ritmo veloz do mundo industrial incensando ao mesmo tempo os seus produtos Marinetti escreveu no Manifesto Futurista de 1909 que ldquoo esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova a beleza da velocidade Um au-tomoacutevel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de focirclego explo-sivo um automoacutevel rugidor que parece correr sobre a metralha eacute mais belo que a Vitoacuteria de Samotraacuteciardquo (citado Teles 1986 p 91)

O ready made estabelecia tambeacutem uma relaccedilatildeo estreita e visceral com os objetos fabrica-dos mas no sentido diferente e mesmo antagocircnico dos pontos de vistas futuristas Tratava-se de descontextualizar transgredindo as funccedilotildees para as quais foram feitos os objetos utilitaacuterios produzidos em seacuterie pela economia industrial Marcel Duchamp enviou em 1917 para uma exposiccedilatildeo artiacutestica em Nova York um urinol de banheiro masculino intitulado Fontaine (fonte)

No acircmbito dessas experimentaccedilotildees culturais as significaccedilotildees de arte modificavam-se As artes eram consideradas cada vez mais como os objetos propostos como artiacutesticos Era arte o que era apresentado por algueacutem e aceito por um grupo de indiviacuteduos como arte Insistia-se assim no caraacuteter estritamente cultural do objeto artiacutestico

Os ready made por exemplo eram objetos fabricados que foram apropriados por um ar-tista e enviados a um espaccedilo expositivo reservado para objetos de arte como salotildees museus etc Um ready made somente ganha significado cultural quando expostos nesses ambientes artisticamente consagrados quando propostos deliberadamente como objetos artiacutesticos ou anti-artiacutesticos

Box 14Procurar nos sites de busca dados e informaccedilotildees sobre o Ready

Made de Marcel Duchamp de 1917 A Fonte

No iniacutecio da reflexatildeo filosoacutefica sobre arte na histoacuteria do Ocidente Aristoacuteteles havia escrito que imitar era natural aos homens e nisso eles se distinguiam dos animais O pensamento claacutessico considerava no entanto que nem tudo poderia ser arte e logo no iniacutecio da Poeacutetica

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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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                  2. Botatildeo 3
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Aristoacuteteles definiu com precisatildeo os seres de imitaccedilatildeo a epopeacuteia o poema traacutegico a muacutesica a danccedila a pintura

Jaacute nos movimentos de vanguarda do seacuteculo passado esfumaccedilaram-se os limites precisos dos objetos artiacutesticos Como a arte eacute um fato cultural portanto exclusivo das relaccedilotildees huma-nas seraacute arte aquilo que for definido considerado e tido socialmente como arte

Assim mesmo os objetos mais aparentemente anti-artiacutesticos acabaram incorporados mui-tas vezes contrariamente agraves intenccedilotildees originais dos seus criadores ou propositores no sistema cultural das artes E Gombrich no prefaacutecio do seu manual de A Histoacuteria da Arte ldquoSobre Arte e Artistasrdquo escreveu que ldquonada existe realmente a que se pode dar o nome de Arte Existem somente artistas () Arte com A maiuacutesculo natildeo existerdquo (Gombrich 1993 p 3)

Deduz-se dessas afirmaccedilotildees do autor que existiria arte com ldquoardquo minuacutesculo considerando que os diversos periacuteodos histoacutericos definem arte de forma diferente Gombrich acentuava ainda que o conceito de arte eacute relativamente recente e que a Humanidade embora tenha forjado artefatos esculturais pictoacutericos arquitetocircnicos raramente se preocupou em precisaacute-los e defini-los

Concluiu ainda que como natildeo existiu e nem existe uma definiccedilatildeo absoluta para a Arte ao historiador da cultura caberia captar e analisar o que tal ou qual sociedade pensou e considerou como sendo arte insistindo no entanto que grandes civilizaccedilotildees como a egiacutepcia produziram objetos ldquoartiacutesticosrdquo sem designaacute-los com termos palavras ou vocaacutebulos especiacuteficos

As sociedades industrializadas contemporacircneas denominaram de arte tanto os ready made do Marcel Duchamp quanto o ldquoPorco Empalhadordquo de 1967 do Nelson Leiner que se encon-tra atualmente na Pinacoteca do Estado de Satildeo Paulo

No ritmo dessas experimentaccedilotildees culturais mais diversas e radicais modificaram-se natildeo so-mente o conceito de arte mas tambeacutem a imagem e o papel criativo do artista De apresentador de uma obra acabada ele se torna cada vez mais um propositor de situaccedilotildees artiacutesticas em que a participaccedilatildeo ativa do ldquofruidorrdquo eacute fundamental

Os Parangoleacutes (1964) de Heacutelio Oiticica capas mantos roupas estandartes por exem-plo exigem a participaccedilatildeo do ldquopuacuteblicordquo a ldquoobrardquo somente cumpre a intenccedilatildeo artiacutestica de seu

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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
                    1. Paacutegina 4 Off
                      1. Botatildeo 13
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                          1. Botatildeo 44
                            1. Paacutegina 5 Off
                            2. Paacutegina 6
                            3. Paacutegina 7
                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
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propositor com a participaccedilatildeo efetiva do ldquopuacuteblicordquo que deixa de ser somente observador para se tornar co-autor da experimentaccedilatildeo cultural

Nos Parangoleacutes os observadores se transformam em participantes no momento em que vestem as capas as roupas os estandartes para danccedilarem No entender de Heacutelio Oiticica o artista natildeo seria mais um criador para a contemplaccedilatildeo mas um motivador para a criaccedilatildeo Os Parangoleacutes apenas se tornam obra quando vestidos pelos participantes

Haacute uma trajetoacuteria delineada pela arte de Heacutelio Oiticica uma espeacutecie de migraccedilatildeo da arte da tela para o espaccedilo e do espaccedilo para o corpo de que satildeo exemplos os Parangoleacutes

Box 15Haacute diversas imagens de danccedilarinos vestidos com os Parangoleacutes do Oiticica Haacute imagens do Mosquito garoto passista da Escola de Samba Mangueira vestido com os Parangoleacutes

Procurar essas imagens nos sites de busca

A arte tecnoloacutegica da nossa atualidade repotildee a mesma exigecircncia da presenccedila atuante do ldquoobservadorrdquo O pressuposto nessa transformaccedilatildeo do observador em participante eacute que qual-quer pessoa pode ser artista Qualquer coisa pode ser arte e qualquer indiviacuteduo pode ser artista

Ao mesmo tempo as ideacuteias de beleza foram dissociadas do objeto artiacutestico O ldquoPorco Em-palhadordquo de Nelson Leiner sem ser dotado de qualquer atributo de beleza foi tido como objeto artiacutestico O feio pode ser arte

As mudanccedilas das concepccedilotildees da beleza artiacutestica podem ser medidas tomando-se dois ob-jetos como pontos de referecircncia No iniacutecio do seacuteculo XIX a escultura em maacutermore ldquoApolo do Belvedererdquo coacutepia romana de um original em bronze do periacuteodo claacutessico da Greacutecia atribuiacutedo a Leoncares era definida como a realizaccedilatildeo perfeita do ideal artiacutestico O Imperador francecircs Napoleatildeo Bonaparte gabava-se de tecirc-la levado da coleccedilatildeo do Vaticano para a Franccedila

Box 16Procurar nos sites de busca a escultura Apolo do Belvedere e

algumas Maacutescaras Africanas do iniacutecio do seacuteculo XX

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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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Cem anos depois as transformaccedilotildees artiacutesticas mais radicais ocorridas na Europa inspira-vam-se nas maacutescaras e esculturas africanas que artistas como Picasso e Apollinaire conhece-ram no Museu de Etnografia de Paris Como analisar as razotildees dessa mudanccedila profunda de perspectiva cultural

Box 17Assista o viacutedeo ldquoIsto eacute Arterdquo do Itauacute Cultural no endereccedilo eletrocircnico httpwwwitauculturalorgbristoearteindexhtmlcd_pagina=1245

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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
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                            2. Paacutegina 6
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                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
                            6. Paacutegina 10
                            7. Paacutegina 11
                            8. Paacutegina 12
                            9. Paacutegina 13
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A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura

1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Gombricht na introduccedilatildeo da Histoacuteria da Arte escreveu que nada existe realmente a que se possa dar o nome de arte Argumentou que arte com A maiuacutesculo natildeo existe e que a palavra arte e a noccedilatildeo de arte aleacutem de muito recentes na histoacuteria da Humanidade tiveram significados diferentes ao longo da histoacuteria

Uma questatildeo essencial dirigia as reflexotildees de Gombrich sobre a histoacuteria da arte e da pin-tura em particular o da representaccedilatildeo pictoacuterica das mudanccedilas dos modos de representaccedilatildeo pictoacuterica atraveacutes dos seacuteculos O que determinaria as mudanccedilas na maneira de pintar entre os diversos momentos da histoacuteria da arte

Descartando as explicaccedilotildees evolucionistas do pensamento e das teacutecnicas de expressatildeo que consideram as sociedades mais recentes como mais desenvolvidas o autor num texto de 1954 procurou explicar o sistema de figuraccedilatildeo da antiga arte egiacutepcia

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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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No seu entender o que explica as mudanccedilas no modo de pintar ao longo da histoacuteria seria o fato das sociedades verem o mundo de maneira diferente Gombrich insistia no argumento que o artista natildeo retrata o que capta pelos sentidos mas ao contraacuterio reproduz o que pensa ser o mundo e a realidade Pinta mais o que julga saber do mundo do que o que efetivamente vecirc Entre o olho de um pintor e a paisagem que retrata haveria muito mais coisas em jogo que devem ser consideradas discernidas e analisadas pelo historiador das artes

Gombrich escreveu uma histoacuteria das manifestaccedilotildees artiacutesticas procurando contextualizaacute-la no momento soacutecio-cultural em que vieram agrave luz Escreveu assim uma histoacuteria da arte apa-rentada com a histoacuteria do intelecto e da cultura entrelaccedilada com a antropologia a histoacuteria das religiotildees com a psicologia com o conhecimento da Antiguidade claacutessica

Insistia que um pintor das cavernas na preacute-histoacuteria natildeo era pior desenhista que um artista contemporacircneo As diferenccedilas de sua arte para com as produccedilotildees atuais residiriam na maneira peculiar como via e entendia o mundo Gombrich descartava dessa forma as explicaccedilotildees base-adas nas teorias do ldquodesenvolvimento histoacutericordquo em favor do conceito de cultura e de histoacuteria cultural

Box18Procurar nos sites de busca reproduccedilotildees das pinturas preacute-histoacutericas da Caverna de Altamira

na Espanha e refletir sobre o argumento do Gombrich segundo o qual os pintores preacute-histoacutericos satildeo tatildeo refinados desenhistas e coloristas como os atuais

Talvez pudeacutessemos apresentar alguns exemplos de aplicaccedilatildeo na histoacuteria da arte do meacutetodo gombrichiano considerando a ruptura cultural ocorrida nos seacuteculos XVIII e XIX O substan-tivo artista somente foi criado nesse seacuteculo das Luzes Algumas razotildees talvez expliquem o surgimento dessa novidade cultural dessa ideacuteia de artista

Nesse mesmo periacuteodo entre os dois seacuteculos acima citados o trabalho artiacutestico foi consid-erado distinto do trabalho produtivo cada vez mais exercido nas induacutestrias que se expandiam da Inglaterra para outras sociedades europeacuteias

De fato com o surgimento do trabalho industrial substituindo o trabalho artesanal o modo de criaccedilatildeo artiacutestico distinguiu-se tornou-se mais niacutetido e visiacutevel no interior das sociedades em fase de industrializaccedilatildeo Se antes pudesse haver algumas semelhanccedilas entre a operaccedilatildeo artiacutestica

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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Box 5

Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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e a atividade artesanal agora ficava patente a diferenccedila do modo de proceder dos artistas para com o dos operaacuterios industriais

Ao mesmo tempo constituiacutea-se o mercado consumidor de objetos de arte libertando por assim dizer o artista das imposiccedilotildees do sistema de mecenato O criador deixou entatildeo de ter viacutenculos proacuteximos e diretos com os seus patrocinadores Entre o pintor por exemplo e o seu puacuteblico apareceu a figura do comerciante de quadros que distribuiacutea os produtos no mercado

A autonomia e a liberdade alcanccediladas pelos criadores satildeo essenciais para a definiccedilatildeo de uma categoria de produtores denominados de artistas Aleacutem disso a industrializaccedilatildeo impulsionava a urbanizaccedilatildeo das sociedades como a inglesa e a francesa Em meio as populaccedilotildees expulsas do campo nascia um sentimento de nostalgia duma existecircncia recentemente perdida que se exprimia e refletia no advento da pintura de paisagens na Inglaterra e na Franccedila a partir da segunda metade do seacuteculo XVIII

O historiador Keith Thomas em O Homem e o Mundo Natural mudanccedilas de atitude em rela-ccedilatildeo agraves plantas e aos animais ndash 1500 ndash 1800 ligou esse sentimento de afeto pela vida campestre e natural na Inglaterra agrave expansatildeo industrial

ldquoEssa afeiccedilatildeo pelo campo real ou imaginaacuteria natildeo se confinava agraves classes altas sendo comum a muitos indiviacuteduos da primeira naccedilatildeo industrial [] Agrave medida que as faacutebricas se multipli-cavam a nostalgia do morador da cidade refletia-se em seu pequeno jardim nos animais de estimaccedilatildeo nas feacuterias passadas na Escoacutecia ou no Distrito dos Lagos no gosto pelas florestas silvestres e a observaccedilatildeo de paacutessaros e no sonho de um chaleacute de fim de semana no campordquo (Thomas 1988 p 16)

Resumindo considerando a arte como sistema cultural pode-se entendecirc-la por meio da pro-cura e da fixaccedilatildeo de seus viacutenculos estreitos com o local social e momento histoacuterico em que surgiu

Tambeacutem Erwin Panofsky elaborou um meacutetodo de entendimento dos fenocircmenos artiacutesticos inserindo-os no momento soacutecio-cultural de sua produccedilatildeo A iconologia na maneira em que o autor a apresenta no Prefaacutecio de Estudos de Iconologia (1995) propotildee a inserccedilatildeo gradual da obra de arte em trecircs patamares complementares

Num primeiro momento o preacute-iconograacutefico ou o icocircnico observa-se a dimensatildeo plaacutestica do objeto artiacutestico considerando-o internamente em si mesmo No caso da pintura trata-se

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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
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de discernir linhas cores volumes na superfiacutecie pintada Em seguida no niacutevel iconograacutefico importa ao analista o conteuacutedo temaacutetico secundaacuterio o mundo das imagens as convenccedilotildees pic-toacutericas dos quais a obra participa e que permite a sua identificaccedilatildeo como fenocircmeno tambeacutem coletivo O objeto artiacutestico eacute referido ao movimento cultural de que faz parte

O terceiro momento o iconoloacutegico descerra a visatildeo de mundo subtendida pela imagem o seu significado intriacutenseco e simboacutelico A iconologia divide a obra de arte em trecircs partes pro-duzindo trecircs pormenores para melhor consideraacute-la na sua totalidade

Pode-se indagar pelos conteuacutedos icocircnicos iconograacuteficos e iconoloacutegicos da Santa Ceia pin-tada por Leonardo da Vinci nas paredes do Mosteiro do Convento Santa Maria das Graccedilas em Milatildeo entre 1495 e 1498

Num primeiro momento consideram-se as cores o desenho os volumes a distribuiccedilatildeo das figuras no espaccedilo a teacutecnica do afresco empregada pelo artista etc No aspecto iconograacutefico a Santa Ceia eacute uma pintura do Renascimento italiano as figuras tecircm volume e o espaccedilo pic-toacuterico eacute tridimensional sugerido pela perspectiva geomeacutetrica

O desvelamento do seu significado simboacutelico iconoloacutegico exige o conhecimento dos pre-ceitos religiosos do cristianismo Natildeo se trata simplesmente de uma Ceia a pintura de Leon-ardo eacute um aacutegape a celebraccedilatildeo de um amor universal em que se anuncia o sacrifiacutecio do Cor-deiro pascal na figura de Cristo em benefiacutecio da redenccedilatildeo da Humanidade Na uacuteltima Ceia eacute instituiacutedo o Sacramento da Eucaristia a transformaccedilatildeo do patildeo e do vinho no corpo e no sangue de Cristo

Box 19(Link 19) Procurar nos sites de busca imagens de A Santa Ceia de Leonardo da Vinci e

rever re-aplicando ao afresco o caminho de anaacutelise proposto por Panofsky

Omar Calabrese em a Idade NeoBarroca (1988) perfaz igualmente uma anaacutelise contextu-alizada das expressotildees artiacutesticas contemporacircneas veiculando-as a um ldquogosto comum do nosso tempordquo um ldquohorizonte comum de gostordquo um ldquoespiacuterito do tempordquo a projeccedilatildeo do fragmento a perda da totalidade nas sociedades contemporacircneas

A arte do fragmento dialogaria assim com outras expressotildees culturais como o pensamento filosoacutefico o Michel Foucault da Arqueologia do Saber a micro-histoacuteria de Carlo Ginzburg de O Queijo e os Vermes a cultura de massa dos programas de auditoacuterio de televisatildeo

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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
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                            2. Paacutegina 6
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                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
                            6. Paacutegina 10
                            7. Paacutegina 11
                            8. Paacutegina 12
                            9. Paacutegina 13
                            10. Paacutegina 14
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A perda da noccedilatildeo de totalidade explicaria segundo Calabrese a crise dos grandes sistemas explicativos das sociedades humanas como o marxismo e o estruturalismo

2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

A expressatildeo ldquoArte como Sistema Culturalrdquo encerra trecircs conceitos os conceitos de arte de sistema e de cultura As noccedilotildees de cultura e de arte jaacute foram apresentadas falta precisar a noccedilatildeo de sistema

O conceito de cultura foi como vimos elaborado no final do seacuteculo XVIII assim como o de civilizaccedilatildeo Na sociologia na antropologia e na psicanaacutelise freudiana houve uma fusatildeo entre as noccedilotildees de cultura e de civilizaccedilatildeo que passaram a ser vistas como constituindo uma unidade conceitual

Preferimos ao longo desse texto discernir cultura e civilizaccedilatildeo e ainda no interior do uni-verso cultural proceder a uma nova divisatildeo isolando a atividade artiacutestica dos demais fenocircme-nos culturais As artes foram portanto compreendidas como ldquoelementordquo do universo cultural dotado de caracteriacutesticas relativamente proacuteprias ou especiacuteficas

Essas divisotildees progressivas (entre cultura e civilizaccedilatildeo entre arte e ciecircncia por exemplo) satildeo condiccedilotildees essenciais para que a arte seja pensada como ldquosistema culturalrdquo E aqui faz-se necessaacuterio definir o que se entende por ldquosistemardquo

Sistema eacute a totalidade constituiacuteda por partes em que cada uma delas manteacutem uma relaccedilatildeo ordenada com as outras e com o todo O conceito de sistema supotildee a existecircncia de um todo orgacircnico formado por partes integradas

Pode-se falar num sistema de arte pensando-se o universo artiacutestico integrado por vaacuterias linguagens artiacutesticas como a literaacuteria a pictoacuterica a musical a escultural a arquitetural a teat-ral etc Dessa forma eacute possiacutevel entender a arte como sistema de relaccedilotildees de expressotildees e de objetos artiacutesticos

A histoacuteria da arte eacute em certa medida a anaacutelise dos diaacutelogos das linguagens artiacutesticas No Renascimento Cultural italiano dos seacuteculos XIV XV e XVI a pintura absorveu elementos da linguagem escultoacuterica As figuras renascentistas passaram a manifestar uma impressatildeo de

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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
                    1. Paacutegina 4 Off
                      1. Botatildeo 13
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                            2. Paacutegina 6
                            3. Paacutegina 7
                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
                            6. Paacutegina 10
                            7. Paacutegina 11
                            8. Paacutegina 12
                            9. Paacutegina 13
                            10. Paacutegina 14
                            11. Paacutegina 15
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                                4. Paacutegina 8
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tridimensionalidade inexistente por exemplo na pintura bizantina Ganharam portanto uma sugestatildeo de relevo escultural

Pensar os diaacutelogos entre linguagens artiacutesticas pressupotildee pensaacute-las como ldquosistemardquo O con-ceito contemporacircneo de ldquotraduccedilatildeo inter-semioacuteticardquo que se aplica aos diaacutelogos artiacutesticos ba-seia-se na concepccedilatildeo de arte como sistema

Pode-se apresentar como exemplo de traduccedilatildeo inter-semioacutetica a musicalidade de alguns textos literaacuterios de que satildeo exemplos os poemas simbolistas As poesias melodiosas recebem a designaccedilatildeo de melopeacuteias Alguns poemas dialogam com as artes plaacutesticas e como tais satildeo definidos como fanopeacuteias

Imagens pictoacutericas foram traduzidas para a linguagem cinematograacutefica O filme de Stanley Kubrick Barry Lyndon lanccedilado em 1975 procurou inspirar-se nas imagens e captar a atmos-fera da pintura de paisagem inglesa do final do seacuteculo XVIII e iniacutecio do XIX

Box 20Sugestatildeo Assistir ao filme Barry Lyndon de Stanley Kubrick buscando estabelecer seu

diaacutelogo com a pintura de paisagem

A adaptaccedilatildeo de textos literaacuterios para a linguagem cinematograacutefica eacute fato recorrente na histoacuteria do cinema Mesmo no cinema brasileiro haacute exemplos de adaptaccedilotildees bem sucedidas

O livro do escritor Graciliano Ramos Vidas Secas publicado em 1938 foi levado para o cinema por Nelson Pereira dos Santos em 1963 O diretor procurou ser fiel ao ldquodiscurso livre indiretordquo em que eacute narrado o romance

A trama eacute vista por meio dos olhares e dos sentimentos das personagens Da mesma forma que no romance haacute no filme poucos diaacutelogos O cinema pode ser fiel ao discurso livre indi-reto por meio do emprego do recurso formal da cacircmara subjetiva que exprime o olhar e os sentimentos das personagens A relaccedilatildeo entre cinema e literatura ocorre no interior do sistema das artes

Box 21Sugestatildeo ler alguns capiacutetulos do romance Vidas Secas por exemplo

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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
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                            2. Paacutegina 6
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                            4. Paacutegina 8
                            5. Paacutegina 9
                            6. Paacutegina 10
                            7. Paacutegina 11
                            8. Paacutegina 12
                            9. Paacutegina 13
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o capiacutetulo ldquoO Menino Mais Novordquo e em seguida observar como esse mesmo personagem apareceu no filme de Nelson Pereira dos Santos

Extrapolando o sistema das artes pode-se refletir sobre o fenocircmeno artiacutestico no interior de um sistema cultural mais amplo e abrangente Gombrich como vimos escreveu que um artista representa mais diretamente a sua visatildeo de mundo do que os objetos pessoas paisagens que observa Dessa forma os saberes do mundo determinariam em larga medida as expressotildees artiacutesticas

Para muitos teoacutericos a espacialidade das pinturas cubistas expressaria plasticamente os con-hecimentos sobre o mundo trazidos pela Lei da Relatividade Restrita divulgada em 1905 pelo cientista Albert Einstein

Se compararmos um quadro de Picasso com pinturas por exemplo do seacuteculo XIX ver-emos que o cubismo aboliu a distinccedilatildeo de tratamento plaacutestico entre figura e fundo O espaccedilo eacute representado de maneira semelhante agrave representaccedilatildeo das figuras Segundo alguns criacuteticos o cubismo procuraria conferir forma agrave concepccedilatildeo do dinamismo espacial da mutabilidade do espaccedilo da fiacutesica einsteiniana

De acordo com a Lei da Relatividade um objeto que se deslocasse na velocidade da luz produziria um encolhimento do espaccedilo Assim o espaccedilo deixou de ser concebido como neutro e invariaacutevel

A pintura renascentista figuraria o espaccedilo seguindo os postulados da geometria claacutessica a pintura cubista de acordo com as descobertas da ciecircncia do seacuteculo XX Logo no cubismo esfumaccedila-se a distinccedilatildeo entre figuras e fundo

Box 22Procurar nos sites de busca o quadro de Pablo Picasso

ldquoRetrato de Ambroise Vollardrdquo (1910 Museu Puchkin Moscou) e o quadro de Jacques-Louis David ldquoRetrato de Madame Recamierrdquo (1800 Museu do Louvre Paris)

Comparar o tratamento do espaccedilo num e noutro

Pode-se ainda analisar os objetos artiacutesticos inserindo-os numa esfera ainda mais ampla e abrangente e buscar neles seus diversificados viacutenculos com as condiccedilotildees materiais da vida

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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
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                            4. Paacutegina 8
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social A Seacuterie Sertaneja de Cacircndido Portinari pintada entre 1944 e 1945 pertencente ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) retrata em grandes paineacuteis famiacutelias de retirantes do nordeste brasileiro vitimadas pela seca

A Seacuterie aleacutem de representar a miseacuteria social exprime mesmo que implicitamente uma visatildeo da arte como fator de esclarecimento de consciecircncia poliacutetica e de denuacutencia social As te-las satildeo uma denuacutencia crua das condiccedilotildees de vida de parcela substancial da populaccedilatildeo brasileira

Box 23Procurar nos sites de busca os paineacuteis da Seacuterie Sertaneja de Portinari

Os Retirantes Enterro na Rede e Crianccedila Morta

Finalizando pode-se ainda entender a arte como sistema considerando que os diversos estratos culturais manifestam-se por meio de obras literaacuterias musicais plaacutesticas particulares Tanto quanto existiria uma cultura de massa haveria uma arte de massa por exemplo A uma cultura popular corresponderia uma arte popular a uma cultura marginal uma arte marginal

Em suma ver a arte como sistema exige que se atente para um amplo e variado universo de relaccedilotildees culturais e histoacutericas

3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

A cultura entendida como uma sorte de complementaccedilatildeo humana agraves imposiccedilotildees da vida natural tem como pressuposto a noccedilatildeo que a vida social eacute construiacuteda logo mutaacutevel variada e transitoacuteria Em meados do seacuteculo XIX novos padrotildees culturais e artiacutesticos foram instaurados nos paiacuteses ou naccedilotildees que passavam por um ritmo acelerado de crescimento econocircmico fato que impulsionou a emergecircncia de grandes cidades

O ritmo das transformaccedilotildees foi percebido e sentido pelos pensadores e artistas daquele periacuteodo Marx e Engels no Manifesto do Partido Comunista publicado em 1848 escreveram que a forccedila da economia capitalista movida pela procura do lucro financeiro transformaria a avassalaria o mundo

ldquoA burguesia rasgou o veacuteu do sentimentalismo que envolvia as relaccedilotildees de famiacutelia e reduziu-as a simples relaccedilotildees monetaacuterias [] Foi a primeira a provar o que pode realizar a atividade

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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

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bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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humana criou maravilhas maiores que as piracircmides do Egito os aquedutos romanos as cat-edrais goacuteticas conduziu expediccedilotildees que empanaram mesmo as antigas invasotildees e as cruzadasrdquo (Marx e Engels 1977 Vol III p 24)

O poeta francecircs Charles Baudelaire exprimiu num dos seus poemas ldquoA Passanterdquo publi-cado em 1857 no livro As Flores do Mal as modificaccedilotildees por que passou o sentimento amo-roso no mundo ruidoso e vertiginoso das grandes cidades

Box 24Ler e interpretar o poema ldquoA Passanterdquo de Baudelaire relacionando e problematizando a

descriccedilatildeo poeacutetica da beleza com o lugar ou o meio social de sua apariccedilatildeo

De fato a emergecircncia das metroacutepoles alterou substancialmente o modo de vida social e instaurou novos padrotildees culturais A esse respeito Raymond Williams observou

ldquoPor uma variedade de razotildees sociais e histoacutericas a metroacutepole da segunda metade do seacuteculo XIX e da primeira metade do seacuteculo XX moveu-se rumo a uma direccedilatildeo bastante nova Ela era agora muito mais do que a cidade imensa ou mesmo muito mais do que a capital de uma na-ccedilatildeo importante A metroacutepole era o lugar no qual novas relaccedilotildees sociais econocircmicas e culturais comeccedilavam a ser formadas relaccedilotildees que iam aleacutem tanto da cidade como da naccedilatildeo em seus sentidos herdados uma nova fase histoacuterica que seria de fato estendida na segunda metade do seacuteculo XX a todo o mundo ao menos potencialmenterdquo (Williams 2011 p 20)

Mais agrave frente o autor concluiu sobre este mesmo tema

ldquoAssim o fator cultural chave da mudanccedila no modernismo estaacute no caraacuteter da metroacutepole tanto nas condiccedilotildees gerais discutidas anteriormente quanto de forma ainda mais decisiva nos seus efeitos diretos sobre a forma O elemento geral mais importante das inovaccedilotildees na forma estaacute na realidade da imigraccedilatildeo para a metroacutepole e nunca eacute demais enfatizar quantos dos principais inovadores eram nesse sentido preciso imigrantes [] Liberados e rompendo com suas culturas nacionais e provinciais situados em meio a relaccedilotildees bastante novas diante de outras liacutenguas ou tradiccedilotildees visuais nativas encontrando nesse meio tempo um ambiente comum novo e dinacircmico do qual muitas das formas antigas estavam obviamente distantes os artistas escritores e pensadores dessa fase encontraram a uacutenica comunidade disponiacutevel e eles a comunidade do meio a comunidade de suas proacuteprias praacuteticasrdquo (Williams 2011 p 22)

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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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Raymond Williams disserta sobre uma metroacutepole produzida natildeo somente pelo desenvolvi-mento capitalista e pela concentraccedilatildeo de riquezas mas pela dominaccedilatildeo imperialista de amplos territoacuterios fora do continente europeu As capitais desses Estados imperialistas agregavam populaccedilotildees de ldquoprocedecircncias sociais e culturais variadasrdquo Essas massas de receacutem-chegados deslocados de sua cultura de origem e agora inseridos nas metroacutepoles tenderam a formar grupos dissidentes e divergentes da cultura estabelecida e oficial

No entender do autor essa nova sociabilidade cultural natildeo teria sido possiacutevel caso seus agentes artistas e pensadores permanecessem dispersos e enclausurados nas suas tradicionais sociedades de origem Dessa forma teria surgido o ambiente social de emergecircncia de uma cultura e de uma arte de vanguarda caracterizadas pela ruptura para com a situaccedilatildeo artiacutestica estabelecida

O Impressionismo teria nascido dessa conjugaccedilatildeo especial do dinamismo da vida na metroacute-pole com a constituiccedilatildeo de grupos de inovadores e experimentadores culturais Arte dupla-mente urbana o Impressionismo ao mesmo tempo em que descobriu a qualidade da paisagem urbana comeccedilou a enxergar o mundo por meio de um olhar tambeacutem urbano olhares de indi-viacuteduos socialmente formados pela existecircncia metropolitana

A era das metroacutepoles eacute tambeacutem a eacutepoca da expansatildeo da industrializaccedilatildeo para fora da In-glaterra e da utilizaccedilatildeo dos conhecimentos cientiacuteficos na produccedilatildeo de mercadorias como a aplicaccedilatildeo da quiacutemica agrave induacutestria e agrave agricultura

A ciecircncia revolucionou tambeacutem as formas de deslocamento humano encurtou distacircncias com o navio e a locomotiva a vapor facilitou os contatos humanos com os novos meios de co-municaccedilatildeo como o teleacutegrafo eleacutetrico A locomotiva a vapor criou um novo conceito de espaccedilo a velocidade ganhou lugar no cotidiano do homem citadino cada vez mais imerso nas grandes multidotildees

Surgiram igualmente como produto da industrializaccedilatildeo novas formas de arte como a foto-grafia na primeira metade do seacuteculo XIX e o cinema no uacuteltimo dececircnio do seacuteculo A fotogra-fia provocou uma alteraccedilatildeo na arte pictoacuterica agrave medida que a liberou da sua tarefa tradicional de representaccedilatildeo veraz da realidade Com a forccedila de realidade manifestada pela fotografia essa antiga funccedilatildeo de captar o real que era ateacute entatildeo apanaacutegio da pintura foi substituiacuteda pelo registro fotograacutefico

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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
                  4. Botatildeo 15
                  5. Botatildeo 12
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O tiacutetulo do quadro a oacuteleo de Claude Monet que deu nome ao movimento ldquoImpressatildeo nascimento do solrdquo natildeo deixa de ser um manifesto resumido das intenccedilotildees dos novos pintores eacute a impressatildeo sobre o nascimento do sol que importava e natildeo a coacutepia perfeita do amanhecer

Essa tela de Monet participou da Primeira Exposiccedilatildeo de Conjunto dos Impressionistas re-alizada no Estuacutedio Fotograacutefico de Nadar em 1874 no Boulevard des Capucines A exposiccedilatildeo patenteou a aproximaccedilatildeo entatildeo existente entre fotoacutegrafos e pintores de vanguarda

Box 25(Link 25) Ver texto de Roger Bastide em que eacute discutida e problematizada essa noccedilatildeo da

isenccedilatildeo fotograacutefica na captaccedilatildeo de imagens reais

A linguagem fotograacutefica modificou igualmente o proceder pictoacuterico de outra maneira As pinturas sobretudo impressionistas comeccedilaram a ostentar enquadramentos tiacutepicos do in-stantacircneo fotograacutefico Nas pinturas de Edgar Degas como a seacuterie das bailarinas algumas figuras satildeo cortadas em accedilatildeo ficando parte de seu corpo fora do quadro como braccedilos e pernas

Box 26 Ver e analisar a ldquoCanoa sobre o Epterdquo pintura de Claude Monet que pertence ao Museu de Arte de Satildeo Paulo (MASP) Discuta a questatildeo da incorporaccedilatildeo nessa tela do registro raacutepido

e instantacircneo da maacutequina fotograacutefica

Como a fotografia o cinema eacute um produto da era da maacutequina A maacutequina estaacute na ori-gem da captaccedilatildeo das imagens e nas condiccedilotildees de sua divulgaccedilatildeo ou de sua apresentaccedilatildeo nas salas escuras O movimento mecacircnico eacute o fenocircmeno de base do cinema considerando que a maacutequina se coloca entre o sujeito criador e sua obra assim como entre os receptores (as pessoas reunidas nas salas de exibiccedilatildeo) e a sua fruiccedilatildeo artiacutestica

A princiacutepio ainda muito vinculada agraves experimentaccedilotildees das fotografias animadas e agrave lin-guagem teatral a linguagem cinematograacutefica foi sendo construiacuteda nos trinta primeiros anos do seacuteculo por artistas de gecircnio como o diretor norte-americano David Griffith o criador do close ou do grande plano e por cineastas sovieacuteticos como Dziga Vertov Sergueiuml Eisen-stein Lev Koulechov Vsevolod Poudovkine que elaboraram e aplicaram nos seus filmes os princiacutepios da teoria da montagem cinematograacutefica

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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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De fato o cinema sobretudo nos anos vinte procurou dar ecircnfase ao que era particular a sua linguagem artiacutestica caracterizada pela interpenetraccedilatildeo e extrema fluidez das fronteiras do tempo e do espaccedilo No cinema o espaccedilo torna-se dinacircmico adquirindo caracteriacutesticas do tempo histoacuterico no sentido que o espaccedilo eacute captado por pequenas tomadas e depois montado e apresentado por partes de forma sucessiva

Aleacutem disso o tempo perde na linguagem cinematograacutefica a sua direccedilatildeo irreversiacutevel a sua continuidade ininterrupta considerando que acontecimentos simultacircneos podem ser mostra-dos sucessivamente e acontecimentos distintos podem ser mostrados simultaneamente por meio por exemplo do uso das sobreposiccedilotildees de imagens

De uma maneira geral pode-se afirmar que eacute proacuteprio agrave linguagem cinematograacutefica uma liberdade tempo-espacial procedimento formal que muito modificou e alterou a narrativa literaacuteria contemporacircnea com o fluxo de consciecircncia em romances como Ulisses de James Joyce publicado em 1922 o os volumes da seacuterie Agrave Procura do Tempo Perdido de Marcel Proust

O modernismo brasileiro dos anos vinte voltou-se tambeacutem para a linguagem cinematograacute-fica de que eacute exemplo o livro de Antocircnio de Alcacircntara Machado publicado em 1926 Patheacute ndash Baby nome tirado de uma maacutequina de exibiccedilatildeo cinematograacutefica O livro relaciona o icocircnico e o verbal dialogando com as imagens do cinema mudo e das histoacuterias em quadrinhos

A pintura a fotografia as gravuras o cinema inauguraram por assim dizer uma era de predominacircncia cultural das imagens A proacutepria poesia foi se tornando desde o final do seacuteculo passado cada vez mais visual com Steacutephane Mallarmeacute por exemplo que publicou em 1897 ldquoO Jogo de Dadosrdquo

A era da imagem atravessa o seacuteculo XX sendo ainda de certa forma radicalizada pela lin-guagem televisa e pelos novos meios eletrocircnicos de comunicaccedilatildeo surgidos mais para o final do seacuteculo passado A tendecircncia agrave uniformizaccedilatildeo cultural das sociedades humanas facilitada pela internacionalizaccedilatildeo crescente desses meios de comunicaccedilatildeo produzidos pelos avanccedilos cientiacute-ficos sofreu ao longo do seacuteculo grandes resistecircncias

As tendecircncias agrave uniformizaccedilatildeo cultural internamente aos paiacuteses e em escala global assim como as imposiccedilotildees de padrotildees culturais dominantes deram origem a princiacutepio nos EUA nos anos sessenta ao movimento de contracultura cujas proposiccedilotildees essenciais podem ser resumidas

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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

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A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

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Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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na mobilizaccedilatildeo popular em benefiacutecio da paz no respeito agraves minorias raciais e culturais na ecircnfase na vida comunitaacuteria no anticosumismo na liberdade nos relacionamentos sexuais e amorosos na criacutetica aos meios de comunicaccedilatildeo de massa etc O movimento de contracultura exprimiu-se na literatura com Jack Kerouac na muacutesica com Janis Joplin Jimi Morrison Jimi Hendrix

As noccedilotildees de identidade e de diversidade cultural surgiram igualmente como anteparos poliacuteticos agraves fortes tendecircncias de uniformizaccedilatildeo cultural e globalizadora O tema da diversidade cultural visa garantir a variedade a distinccedilatildeo das culturas inclusive nacionais num quadro de homogeinizaccedilatildeo cultural global

O conceito de diversidade cultural aplica-se para aleacutem da esfera da globalizaccedilatildeo ao con-texto da diversidade dentro de sociedades especiacuteficas com a preocupaccedilatildeo da manutenccedilatildeo de direitos e de democracia cultural de grupos minoritaacuterios

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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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Referecircncias Bibliograacuteficasbull ARISTOacuteTELES A Poliacutetica Trad Nestor Silveira Chaves RJ Ediccedilotildees de Ouro 1970

__________ Poeacutetique Trad J Hardy Paris Les Belles Lettres 1975

bull ARGAN G C Arte Moderna do Iluminismo aos movimentos contemporacircneos Trad Denise

Bottmann e Frederico Carotti SP Cia das Letras 1996

bull AZEVEDO F A Cultura Brasileira Tomo I 3ordf Ed SP Ediccedilotildees Melhoramentos 1958

bull BOURDIEU P Liccedilotildees da Aula Trad Egon de Oliveira Rangel SP Aacutetica 1988

bull BURKE P Cultura Popular na Idade Moderna Trad Denise Bottmann SP Cia das Letras

1989

bull CAMPOMANES C T Aacutegora ndash Filosofia Madrid Ediciones SM 2000

bull FRANSCATEL P A Realidade Figurativa Trad Mary Amazonas Leite de Barros SP Perspecti-

va Ed Da Univ de Satildeo Paulo 1973

bull ELIAS N Mozart sociologia de um gecircnio RJ Jorge Zahar Editor 1994

bull GINZBURG C O Queijo e os Vermes O cotidiano e as ideacuteias de um moleiro perseguido pela

Inquisiccedilatildeo Trad Maria Betacircnia Amoroso SP Cia Das Letras 1989

bull GOMBRICH E H A Histoacuteria das Arte 15ordf EdTrad Aacutelvaro Cabral RJ Ed Guanabara

Koogan 1993

bull HELL V A Ideacuteia de Cultura Trad Halumi Tateyama Takahashi SP Martins Fontes 1989

bull HOMERO Odisseacuteia 3ordf Ed Trad Frederico Lourenccedilo SP Nova Cultural 2002

bull MARX K Para a Criacutetica da Economia Poliacutetica Trad Edgard Malagoli SP Abril Cultural 1982

bull MARX K e ENGEL F ldquoO Manifesto do Partido Comunistardquo In Textos Vol III Satildeo Paulo Edi-

tora Alfa-Ocircmega 1977

bull PANOFSKY E Estudos de Iconologia Temas humaniacutesticos na arte do renascimento 2ordf Ed

Trad Olinda Braga de Sousa Lisboa Editorial Estampa 1995

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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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ExtrasBox 2

O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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bull PLATAtildeO A Repuacuteblica 7ordf EdTrad Maria Helena da Rocha Pereira Lisboa Fundaccedilatildeo Calouste

Gulbenkian 1993

bull __________ Diaacutelogos Feacutedon Sofista Poliacutetico Trad Jorge Paleikat e J Cruz Costa RJ Ediccedilotildees de

Ouro 1970

bull SOacuteFOCLES A Trilogia Tebana Eacutedipo Rei Eacutedipo em Colono Antiacutegona 3ordf Ed Trad Maacuterio da

Gama Kury RJ Jorge Zahar Editor 1993

bull STRAUSS C L e ERIBON D De Pregraves et de Loin Paris Editions Odile Jacob 1988

bull STRAUSS C L e CHARBONNIER G Arte Linguagem Etnologia Entrevista com Claude

Leacutevi-Strauss Trad Niacutecia Adan Bonatti Campinas SP Papirus 1989

bull TELES G M Vanguarda Europeacuteia e Modernismo Brasileiro 9 ordf Ed Petroacutepolis Ed Vozes 1986

bull THOMAS K O Homem e o Mundo Natural Mudanccedilas de atitude em relaccedilatildeo agraves plantas e aos

animais (1500 ndash 1800) Trad Joatildeo Roberto Martins Filho SP Cia Das Letras 1988

bull WILLIAMS R Poliacutetica do Modernismo Contra os Novos Conformismos Trad Andreacute Glaser

Satildeo Paulo Editora Unesp 2011

bull WUNENBURGER J J Sigmund Freud Paris Eacuteditions Balland 1985

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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

Box 3

O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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O socioacutelogo francecircs Pierre Bourdieu retomou a questatildeo presente no livro Poliacutetico de Platatildeo das classificaccedilotildees das espeacutecies naturais como apanaacutegio dos homens uacutenico animal dotado de razatildeo Em-pregou no entanto esta noccedilatildeo no universo das relaccedilotildees dos grupos da sociedade humana

ldquoA classificaccedilatildeo antropoloacutegica distingue-se das taxionomias zooloacutegicas ou botacircnicas pelo fato de os objetos que ela potildee ndash ou repotildee ndash em seus lugares serem sujeitos classificantes Basta pensar no que aconteceria se como nas faacutebulas os cachorros as raposas e os lobos tivessem voz no capiacutetulo relativo agrave classificaccedilatildeo dos caninos e aos limites aceitaacuteveis de variaccedilatildeo entre os membros reconhecidos da espeacutecie [] Em resumo para grande desespero do filoacutesofo-rei que ao lhes atribuir uma essecircncia pretende obrigaacute-los a ser e a fazer o que lhes cabe por definiccedilatildeo os classificados e os desclassificados podem recusar o princiacutepio de classificaccedilatildeo que lhes reser-va o pior lugarrdquo (Liccedilotildees da Aula ndash Aula Inaugural no Collegravege de France em 23 de abril de 1982)

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O poder exercido pelos seres classificadores foi objeto de um conto claacutessico da literatura brasileira escrito por Machado de Assis Neste conto o classificador eacute o reconhecido cientista Simatildeo Bacamarte

ldquoSimatildeo Bacamarte refletiu um instante e disse

- Suponho o espiacuterito humano uma vasta concha o meu fim Sr Soares eacute ver se posso extrair a peacuterola que eacute a razatildeo por outros termos demarquemos definitivamente os limites da razatildeo e da loucura A razatildeo eacute o perfeito equiliacutebrio de todas as faculdades fora daiacute insacircnia insacircnia e soacute insacircnia [] Quatro dias depois a populaccedilatildeo de Itaguaiacute ouviu consternada agrave notiacutecia de que um certo Costa fora recolhido agrave Casa Verde [hospiacutecio] Muita gente correu agrave Casa Verde e achou o pobre Costa tranquumlilo um pouco espantado falando com muita clareza e perguntando por que motivo o tinham levado para ali Alguns foram ter com o alienista Bacamarte aprovava esses sentimentos de estima e compaixatildeo mas acrescentava que a ciecircncia era a ciecircncia e que ele natildeo podia deixar na rua um mentecaptordquo (O Alienista 1882)

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Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
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Box 5

Segundo a filosofia claacutessica o Cosmos o oposto do Caos eacute regido por leis necessaacuterias Poreacutem esta concepccedilatildeo de uma ordem recocircndita ao universo foi aleacutem da filosofia grega e ganhou na histoacuteria da cultura expressotildees literaacuterias como estas palavras do Chico Barqueiro personagem do conto ldquoO Duelordquo de Guimaratildees Rosa

ldquoSei o jeito deles Conheccedilo esse gadinho de asa Eles vivem pacutera laacute e pacutera caacute aciganados nunca param de mudar Agraves vezes passam os bandos arrumadinhos em quina parece que pacutera vento natildeo poder esparramar E arribam em tempos a ver que estaacute tudo de combinaccedilatildeo [] Agraves vezes daacute doacute quando chegam no tempo da seca uns patinhos cansados que devem de ter vindo de longe demais [] Gente vecirc que eles estatildeo natildeo aguumlentando de ir mas que natildeo eacute capaz de terem sossego ficam arando de asas parece que tem algueacutem com ordem chamando chupando os pobres de de longe sem folgar Pacuteraacute mim muitos desses hatildeo de ir caindo mor-tos por aiacute Natildeo crecirc que tudo eacute o regrado esquisito amigordquo (Sagarana 1946)

Box 9

A literatura romacircntica brasileira exprimiu em vaacuterios momentos as concepccedilotildees das relaccedilotildees entre homem e natureza formuladas no seacuteculo XVIII europeu A natureza deixou de ser vista como in-variaacutevel como ldquoser para semprerdquo em benefiacutecio das noccedilotildees de intervenccedilatildeo humana no mundo natural

ldquoNo acircngulo [da casa] havia uma coisa que chamaremos jardim e de fato era uma imitaccedilatildeo graciosa de toda a natureza rica vigorosa e esplecircndida que a vista abraccedilava do alto do rochedo Flores agrestes das nossas matas pequenas aacutervores copadas um estendal de relvas um fio de aacutegua fingindo um rio e formando uma pequena cascata tudo isto a matildeo do homem tinha cri-ado no pequeno espaccedilo com uma arte e graccedila admiraacutevelrdquo ( Joseacute de Alencar O Guarani 1857)

ldquoParece esmero de arte o siacutetio apraziacutevel natildeo que possa o gecircnio do homem jamais atingir os primores da criaccedilatildeo ordena poreacutem muitas vezes e resume em breve quadro cenas que a natureza soacute desdobra em larga tela e colige em uma soacute paisagem coacutepia de belezas que andam esparsas por vaacuterios siacutetiosrdquo ( Joseacute de Alencar Til 1872)

ldquoEra um edifiacutecio de harmoniosas proporccedilotildees vasto e luxuoso situado em apraziacutevel vargedo

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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nespRedefor bull M

oacutedulo III bull Disciplina 05

TEMAS

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ao sopeacute de elevadas colinas cobertas de mata em parte devastada pelo machado do lavrador Longe em derredor a natureza ostentava-se ainda em toda a sua primitiva e selvaacutetica rudeza mas por perto em torno da deliciosa vivenda a matildeo do homem tinha convertido a bronca selva que cobria o solo em jardins e pomares deleitosos em gramais e pingues pastagens sombreadas aqui e acolaacute por gameleiras gigantescas perobas cedros e copaiacutebas que atestavam o vigor da antiga florestardquo (Bernardo Guimaratildees A Escrava Isaura 1875)

Box 25

Roger Bastide referindo-se a um trabalho de sociologia dirigido por Pierre Bourdieu sobre a fotografia e que foi publicado num livro por ele organizado Uma Arte Meacutedia atenuou o caraacuteter isento do registro fotograacutefico

Novas formas de arte a fotografia importacircncia para as transformaccedilotildees da pintura a morte do figurativo o nascimento de uma arte concreta Uma vez que a fotografia oferecia ldquoa reali-daderdquo a arte natildeo precisava mais ldquofigurarrdquo podia a partir de entatildeo seguir o seu proacuteprio camin-ho isto eacute ldquoexprimirrdquo uma visatildeo do mundo ou uma estrutura psiacutequica depreendia-se assim de todas as influecircncias exteriores com que a sociedade a sobrecarregara

ldquoCom efeito a fotografia natildeo eacute abandonada aos acasos da fantasia individual mas interessa o sistema de valores comum agrave classe social do fotoacutegrafo ldquode tal forma que a fotografia mais insignificante exprime () o sistema de valores e a visatildeo do mundo de todo um grupo Isto eacute a aacuterea que para uma dada classe social se propotildee como realmente fotografaacutevel (isto eacute o contin-gente das fotografias ldquorealizaacuteveisrdquo ou ldquopor realizarrdquo em oposiccedilatildeo ao universo das realidades que satildeo objetivamente fotografaacuteveis) encontra-se definida por modelos impliacutecitosrdquo de tal forma que a ldquoas normas que organizam a apreensatildeo fotograacutefica do mundo segundo a oposiccedilatildeo entre o fotografaacutevel e o natildeo fotografaacutevel satildeo indissoluacuteveis do sistema de valores impliacutecitos proacuteprios a uma classe uma profissatildeo ou uma capela artiacutesticardquo O estudo dessas capelas como por exemp-lo os fotoclubes eacute sob este ponto de vista particularmente interessanterdquo (Bastide Roger Arte e Sociedade Trad Gilda de Mello e Souza 3ordf ed Satildeo Paulo Editora Nacional 1979 p 202)

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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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Ficha da Disciplina

Arte como Cultura Concepccedilotildees e Problematizaccedilotildees

Jose Leonardo do Nascimento

Sou Doutor em Histoacuteria da Cultura pela Universidade de Paris Franccedila e Livre-Docente em Histoacuteria da Arte pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista Ministro na graduaccedilatildeo do Instituto de Artes as disciplinas Esteacutetica Histoacuteria da Arte e Sociologia da Arte Sou tambeacutem professor do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Artes da mesma Instituiccedilatildeo Publiquei em 2008 pela Editora da UNESP O Primo Basiacutelio na Imprensa Brasileira do Seacuteculo XIX Esteacutetica e Histoacuteria e em 2011 Euclides da Cunha e a Esteacutetica do Cientificismo tambeacutem pela Editora da UNESP e Satildeo Paulo no Seacuteculo XIX pela Imprensa Oficial do Estado de Satildeo Paulo

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Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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                  2. Botatildeo 3
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fichaficha sumaacuterio bibliografia extras

UnespR

edefor bull Moacutedulo III bull D

isciplina 05TEMAS

1

3

2

Ementa

Versotildees de cultura A ideacuteia da arte como sistema cultural As culturas na escola e na vida A hegemonia da cultura erudita Relaccedilotildees das artes com a cultura visual e a cultura popular Questotildees sobre diversidade cultural multicultaralismo identidade e diferenccedila cultural no ensino de artes Concepccedilotildees de cultura presentes no curriacuteculo de Artes para rede estadual paulista

Estrutura da Disciplina

SUMAacuteRIO

CULTURA E CIVILIZACcedilAtildeO HISTOacuteRIA DE DOIS CONCEITOS

Toacutepico 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito

Toacutepico 2 Entre Cultura e Natureza

Toacutepico 3 Versotildees de Cultura

ARTE COMO SISTEMA CULTURAL

Toacutepico 1 Hierarquia e Relativismo Cultural

Toacutepico 2 As Fronteiras Precisas da Ideacuteia de Arte

Toacutepico 3 A Histoacuteria eacute Dinacircmica e o Conceito Mutaacutevel

Toacutepico 4 Induacutestria e Arte

A PESQUISA EM ARTE E CONCEPCcedilOtildeES CONTEMPORAcircNEAS DE CULTURA

Toacutepico 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual

Toacutepico 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos

Toacutepico 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura

UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
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                  2. Botatildeo 3
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UNESP ndash Universidade Estadual PaulistaProacute-Reitoria de Poacutes-GraduaccedilatildeoRua Quirino de Andrade 215CEP 01049-010 ndash Satildeo Paulo ndash SPTel (11) 5627-0561wwwunespbr

Governo do Estado de Satildeo Paulo Secretaria de Estado da EducaccedilatildeoSecretaria Estadual da Educaccedilatildeo de Satildeo Paulo (SEESP) Praccedila da Repuacuteblica 53CEP 01045-903 ndash Centro ndash Satildeo Paulo ndash SP

Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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Governo do estado de satildeo PauloGovernador

Geraldo alckmin

seCretarIa estadual da eduCaCcedilatildeo de satildeo Paulo (seesP) secretaacuterio

Herman Jacobus Cornelis voorwald

unIversIdade estadual PaulIstavice-reitor no exerciacutecio da reitoria

Julio Cezar duriganChefe de Gabinete

Carlos antonio GameroProacute-reitora de Graduaccedilatildeosheila Zambello de Pinho

Proacute-reitora de Poacutes-GraduaccedilatildeoMarilza vieira Cunha rudge

Proacute-reitora de PesquisaMaria Joseacute soares Mendes Giannini

Proacute-reitora de extensatildeo universitaacuteriaMaria ameacutelia Maacuteximo de arauacutejo

Proacute-reitor de administraccedilatildeoricardo samih Georges abi rached

secretaacuteria GeralMaria dalva silva Pagotto

FundunesP - diretor Presidente luiz antonio vane

Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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Proacute-Reitora de Poacutes-graduaccedilatildeoMarilza Vieira Cunha Rudge

Equipe CoordenadoraElisa Tomoe Moriya Schluumlnzen

Coordenadora Pedagoacutegica

Ana Maria Martins da Costa SantosClaacuteudio Joseacute de Franccedila e Silva

Rogeacuterio Luiz Buccelli

Coordenadores dos CursosArte Rejane Galvatildeo Coutinho (IAUnesp)

Filosofia Luacutecio Lourenccedilo Prado (FFCMariacutelia)Geografia Raul Borges Guimaratildees (FCTPresidente Prudente)

Antocircnio Cezar Leal (FCTPresidente Prudente) - sub-coordenador Inglecircs Mariangela Braga Norte (FFCMariacutelia)

Quiacutemica Olga Maria Mascarenhas de Faria Oliveira (IQ Araraquara)

Equipe Teacutecnica - Sistema de Controle AcadecircmicoAri Araldo Xavier de Camargo

Valentim Aparecido ParisRosemar Rosa de Carvalho Brena

SecretariaAdministraccedilatildeo Vera Reis

NEaD ndash Nuacutecleo de Educaccedilatildeo a Distacircncia(equipe Redefor)

Klaus Schluumlnzen Junior Coordenador Geral

Tecnologia e InfraestruturaPierre Archag Iskenderian

Coordenador de Grupo

Andreacute Luiacutes Rodrigues FerreiraGuilherme de Andrade Lemeszenski

Marcos Roberto GreinerPedro Caacutessio Bissetti

Rodolfo Mac Kay Martinez Parente

Produccedilatildeo veiculaccedilatildeo e Gestatildeo de materialElisandra Andreacute Maranhe

Joatildeo Castro Barbosa de SouzaLia Tiemi Hiratomi

Lili Lungarezi de OliveiraMarcos Leonel de Souza

Pamela GouveiaRafael Canoletti

Valter Rodrigues da Silva

  • Marcador 1
  • Cultura e Civilizaccedilatildeo
  • Histoacuteria de dois Conceitos
    • 1 O Cultivo da Terra e do Espiacuterito
      • 3 Versotildees de Cultura
      • 2 Entre Cultura e Natureza
      • Arte como Sistema Cultural
        • 1 Hierarquia e Relativismo Cultural
          • 2 As fronteiras precisas da ideacuteia de arte
          • 3 A histoacuteria eacute dinacircmica e o conceito mutaacutevel
          • 4 Induacutestria e Arte
          • A Pesquisa em Arte e Concepccedilotildees Contemporacircneas de Cultura
            • 1 Caminhos e Procedimentos da Anaacutelise Contextual
              • 2 Sistema Cultural e Artiacutestico Diaacutelogos e Empreacutestimos
              • 3 Visotildees Contemporacircneas de Cultura
              • Referecircncias Bibliograacuteficas
              • Extras
                  1. Botatildeo 2
                  2. Botatildeo 3
                  3. Botatildeo 14
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