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ARTICULANDO TEORIA E PRÁTICA NA RELAÇÃO UNIVERSIDADE E
ESCOLA: AS CONTRIBUIÇÕES DO PIBID PARA A FORMAÇÃO INICIAL
DE PROFESSORES DE QUÍMICA E BIOLOGIA
Ivete Maria dos Santos
Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC
Resumo
Este trabalho tem por finalidade verificar sob o ponto de vista dos bolsistas de Iniciação
à Docência (ID), em que medida o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
Docência - PIBID vem contribuindo para a articulação entre teoria e prática e a
aproximação do espaço de formação e do exercício profissional, e quais as implicações
para a formação e desenvolvimento profissional. Inicialmente fez-se uma breve análise
histórica do papel da universidade pública na formação de professores para a Educação
Básica, destacando os dilemas enfrentados ao longo dos anos, principalmente no que se
refere à articulação teoria-prática e a relação universidade-escola. Nesse sentido,
buscou-se diferenciar o conceito de prática e práxis docente, sendo o último utilizado
para fundamentar o estudo. Posteriormente, fez-se a descrição da finalidade e
características gerais do PIBID, enfatizando como o programa busca aproximar a
universidade e a escola pública, favorecendo ao licenciando a vivência prática da teoria.
Para atingir o objetivo da pesquisa buscou-se conhecer o ponto de vista de dez
licenciandos em Química e Biologia do PIBID/UESC que participaram do programa
entre os anos de 2011/2013. O instrumento de coleta de dados utilizado foi o
questionário, composto por treze questões discursivas onde os sujeitos poderiam
manifestar suas impressões acerca do programa e as possíveis contribuições para a sua
formação. Os resultados indicaram que os licenciandos consideram o programa como
uma possibilidade de estreitamento da relação universidade-escola, sendo um elemento
importante na articulação teoria e prática. Além disso, nos relatos dos licenciandos
identificamos a necessidade de valorização e melhorias das condições de trabalho do
professor da Educação Básica.
Palavras-chave: formação inicial. PIBID. Ensino de Ciências.
Introdução
A formação de professores continua sendo um território fértil para investigação
educacional. A pesquisa em Ensino de Ciências têm se aprofundado no assunto e os
estudos apresentam relevantes contribuições. (CARVALHO & GIL-PEREZ, 1998;
PEREIRA, 1999; POZO & CRESPO, 2009). A avaliação crítica do modelo formativo e
a busca por alternativas que possam atender as necessidades da sociedade atual, tem
impulsionado um crescimento relevante no número de pesquisas que visam contribuir
na implementação e aprimoramento das políticas públicas de formação desses
profissionais.
A preocupação com a relação entre teoria educacional e prática docente, vem
ocupando destaque na pesquisa. A propósito, a visão de formação baseada na
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supremacia do domínio do conteúdo específico e de algumas técnicas de ensino, tem
sustentado ao longo do tempo o modelo da aplicabilidade técnica na formação do
professor. Essa realidade tem contribuído para que a universidade seja considerada o
único espaço de formação, sendo a escola apenas um espaço de aplicação. Essa visão
desconsidera a escola como unidade de formação, responsável pelo desenvolvimento e
aprendizagem profissional dos professores, podendo contribuir para superação do
distanciamento entre a teoria e a prática docente.
Buscando contribuir na solução dos problemas enfrentados na formação inicial
de professores, o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID)
apresenta nos seus objetivos a inserção do licenciando no seu futuro espaço de trabalho,
além de contribuir para a articulação entre teoria e prática tão necessárias à formação
dos discentes. Nesse sentido, procuramos compreender de que maneira os licenciandos
que participaram do programa analisam a relação entre a universidade e a escola? Como
ocorre a articulação entre teoria e prática no programa? E, de que maneira o PIBID
influencia no desenvolvimento profissional dos licenciandos?
Diante desses questionamentos, a pesquisa em questão tem como objetivo
verificar, sob o ponto de vista dos licenciandos em Química e Biologia, em que medida
o PIBID vem contribuindo para a articulação entre teoria e prática e a aproximação dos
espaços da formação e do exercício profissional, e quais as implicações para a formação
e desenvolvimento profissional.
A Universidade Pública e a Formação de Professores
No Brasil, a instalação dos primeiros cursos de formação de docentes
antecedeu à instalação da universidade, tendo por finalidade a preparação de
profissionais para atender o ensino primário (PENIN, 2001). Contudo, é no início do
século XX, mais precisamente na década de 30, que se manifesta a preocupação com a
formação de professores para o “secundário” (correspondendo aos atuais anos finais do
ensino fundamental e ao ensino médio), em cursos regulares e específicos. Até então,
esse trabalho era exercido por profissionais liberais ou autodidatas. A partir da formação
de bacharéis, nas poucas universidades existentes, acrescentou-se mais um ano com
disciplinas da área de educação para a obtenção da licenciatura, cuja finalidade era a
formação de docentes para o atendimento do ensino secundário (GATTI, 2010).
Ao longo dos anos, desde a sua criação até os dias atuais, a formação de
professores no país ainda sofre com antigos problemas decorrentes de sua origem.
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Primeiro o processo aligeirado e improvisado de formação docente, no intuito de
atender a crescente demanda das redes pública e privada de Ensino Fundamental e,
segundo, das consequências advindas da adoção do modelo chamado de "3+1":
bacharelado em área disciplinar e apenas um ano de formação em educação para
obtenção de licenciatura, o que permitia ao profissional lecionar em escolas. Este
modelo pauta-se no princípio da racionalidade técnica, onde o perfil de formação
supervaloriza a teoria em detrimento da prática, reservando a esta espaços isolados no
currículo.
De acordo com Duarte et al (2009), o Ensino de Ciências talvez seja o ramo da
Educação como um todo que tem sofrido esta influência mais diretamente. Estudos
realizados deixam claro que os cursos de licenciatura, em especial de Química e
Biologia, apresentam problemas, tendo em vista que não estão formando profissionais
capazes de atuar eficientemente nas escolas de Ensino Fundamental e Médio de nosso
país.
A reflexão já produzida por vários autores sobre a formação de professores de
Ciências (CARVALHO e GIL-PÉREZ, 1998; MALDANER, 2006; SILVA e
SCHNETZLER, 2008) tem apontado e criticado o predomínio do modelo de formação
no qual o professor é concebido como técnico, e sua atividade profissional como
aplicação de teorias e técnicas na solução de problemas, ou seja, dirigida por uma
racionalidade instrumental ou técnica. Os autores supracitados têm destacado a
necessidade da integração das contribuições teóricas da pesquisa acadêmica aos
problemas envolvidos na prática, de modo que se possa refletir sobre essa prática e agir
de maneira a produzir reformulações teórico-práticas nos cursos de ciências.
A aproximação universidade-escola contribuindo para a articulação entre teoria e
prática
Os cursos de formação inicial de professores, da maneira como vêm sendo
desenvolvidos não são suficientes para que este profissional desempenhe uma prática
pedagógica consciente que leve a transformação de si próprio e dos seus futuros alunos.
Vários autores (PIMENTA, 1995; NÓVOA, 1997; ZEICHNER, 2010) evidenciam a
importância da unidade entre a prática e teoria durante a formação dos professores, bem
como, uma maior aproximação entre a universidade e a escola.
A articulação dos conhecimentos acadêmicos e dos conhecimentos escolares
constitui um aspecto relevante para formação docente. De acordo com Roldão (2007) é
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preciso superar a visão desses dois campos como entidades separadas, para
compreendê-los como domínios que se integram no saber profissional requerido pela
ação de ensinar. Contribuindo com esta discussão, Zeichner (2010) tem questionado os
modelos tradicionais de formação de professores, que tomam o conhecimento
acadêmico como a fonte legítima de conhecimento, desqualificando o conhecimento
escolar. A partir da análise de diferentes experiências de aproximação entre
universidade e escola o autor propõe a criação de espaços híbridos que possam reunir de
forma mais igualitária os conhecimentos dos professores da educação básica e da
universidade, na construção dos conhecimentos profissionais.
Corroborando com essa ideia, Canário (2001) ressalta a necessidade de maior
aproximação entre o conhecimento acadêmico e o conhecimento dos práticos. O autor
questiona a visão dicotômica das relações teoria-prática predominante nos cursos
universitários de formação de professores, que se reflete em uma organização curricular
“em que se procede a uma justaposição hierarquizada de saberes científicos, mais
saberes pedagógicos, mais momentos de prática” (CANÁRIO, 2001, p.32).
Nesse contexto, a indissociabilidade entre teoria e prática é um elemento
necessário na construção dos conhecimentos profissionais, de modo a propiciar ao
futuro professor a construção de uma práxis pedagógica que o permita fazer com que
seus alunos sejam capazes de intervir e transformar a sociedade de que faz parte, sendo
cada vez mais participativo.
Contudo, para aprofundarmos o conceito de unidade entre teoria e prática, é
necessário compreenderemos o conceito de prática e práxis pedagógica. A palavra
prática deriva do grego “praktikós”, de “prattein”, e tem o sentido de agir, realizar,
fazer. Diz respeito à ação. Ação que o homem exerce sobre as coisas, aplicação de um
conhecimento em uma ação concreta efetiva (JAPIASSU e MARCONDES, 1993,
p.199). A prática tem uma dimensão prático-utilitária quando tenta resolver apenas as
necessidades imediatas.
Já a práxis, por sua vez, é “a atividade humana que produz objetos, sem que
por outro lado essa atividade seja concebida com o caráter estritamente utilitário que se
infere do prático na linguagem comum” (VÁZQUEZ, 1977, p. 5). Nesse contexto, a
práxis tem um caráter consciente e intencional. Nesse trabalho a prática pedagógica é
compreendida como forma específica de práxis, pois se fundamenta em uma prática
social dirigida por objetivos, finalidades e conhecimentos.
Diante disso, consideramos que a teoria e a prática encontram-se em
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indissolúvel unidade. Nesse sentido, Pimenta (1995) ressalta que
A atividade teórica por si só não leva à transformação da realidade;
não se objetiva e não se materializa, não sendo, pois práxis. A prática
também não fala por si mesma; teoria e prática são partes constituintes
da práxis (PIMENTA, 1995, p 63).
Nesse contexto, a prática pedagógica não pode ser compreendida como uma
simples aplicação de teoria numa lógica espontaneísta e com resultados imediatos. A
prática pedagógica se constitui enquanto ação reflexiva guiada por intenções
conscientes e planejada.
O PIBID
O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) foi criado
pelo governo federal por meio da CAPES em 2007 e tem como base legal a Lei nº
9.394/1996, a Lei nº 12.796/2013 e o Decreto nº 7.219/2010. Segundo a portaria nº 096,
de 18 de julho de 2013, o programa tem por finalidade “fomentar a iniciação à docência,
contribuindo para o aperfeiçoamento da formação de docentes em nível superior e para
a melhoria da qualidade da educação básica pública brasileira” (BRASIL, 2013, p.1).
O programa funciona por meio de projetos propostos pelas instituições de
ensino superior (IES) que concorrem por meio de editais públicos, podendo ser
reprovado, aprovado parcialmente ou totalmente. Os projetos denominados
institucionais são formados por subprojetos de acordo com as áreas das licenciaturas
existentes nas IES, as quais também podem propor subprojetos interdisciplinares.
Quando aprovado, o projeto institucional será coordenado por um coordenador
institucional auxiliado pelo coordenador de gestão, sendo desenvolvido por grupos de
licenciandos chamados de bolsistas de Iniciação à Docência, que serão orientados pelo
professor da educação básica, chamado bolsista supervisor e pelo professor das IES,
chamado coordenador de área. Todos os integrantes do programa recebem uma bolsa
auxílio de acordo com tipo de função que desempenha no projeto. Além disso, o projeto
contará com repasse de recursos financeiros para custear suas atividades.
De acordo com a portaria nº 096/2013, entre as principais finalidades do PIBID
podemos destacar:
- Elevar a qualidade da formação inicial de professores nos cursos de
licenciatura, promovendo a integração entre educação superior e
educação básica;
- Inserir os licenciandos no cotidiano de escolas da rede pública de
educação, proporcionando-lhes oportunidades de criação e
participação em experiências metodológicas, tecnológicas e práticas
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docentes de caráter inovador e interdisciplinar que busquem a
superação de problemas identificados no processo de ensino-
aprendizagem;
- Contribuir para a articulação entre teoria e prática necessárias à
formação dos docentes, elevando a qualidade das ações acadêmicas
nos cursos de licenciatura (BRASIL, 2013, p.1).
Nesse contexto, o programa oferece a oportunidade de reconhecimento da
Universidade e da escola como espaço articulado de formação. Além disso, ao
adentrarem no espaço da escola, os licenciandos terão a oportunidade de conhecer e
atuar nas situações reais de ensino de maneira consciente e planejada podendo promover
maior articulação entre teoria e prática.
Percurso Metodológico
Para responder ao objetivo proposto neste trabalho, nos apoiamos na
abordagem qualitativa, pois permite a descrição, análise e avaliação dos dados de forma
articulada e aprofundada, sendo o pesquisador seu principal instrumento (LUDKE E
ANDRÉ, 1986). Com o propósito de analisar as implicações do PIBID, na formação e
desenvolvimento profissional de futuros professores, o caminho metodológico orientou-
se para conhecer o ponto de vista de dez licenciandos de Química e Biologia da
Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) que participaram do programa entre os
anos de 2011/2013.
O instrumento de coleta de dados utilizado foi o questionário aberto, composto
por treze questões discursivas onde os sujeitos poderiam manifestar suas impressões
sobre o programa e as possíveis contribuições para a sua formação.
As questões foram selecionadas a partir de aspectos considerados relevantes,
de modo que os objetivos desta pesquisa fossem alcançados. Para a análise dos dados
foi utilizado a Análise Textual Discursiva (ATD) que consiste em um processo auto-
organizado de construção de compreensão que emerge de uma sequência recursiva de
três componentes: “desconstrução dos textos do corpus, a unitarização; estabelecimento
de relações entre os elementos unitários, a categorização; o captar do novo emergente
em que a nova compreensão é comunicada e validada” (MORAES, 2003, p. 193).
Resultados e discussão
Conforme mencionado anteriormente foram 10 sujeitos que integraram a
pesquisa, sendo cinco do PIBID de Química e cinco do PIBID de Biologia, com idade
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entre 20 e 28 anos, e com tempo de participação no programa entre 8 e 24 meses. Os
indivíduos foram identificados através de números seguido do nome do curso e as
respostas obtidas foram agrupadas e analisadas de acordo com as três categorias a
seguir:
A relação entre universidade-escola
Na visão dos estudantes é evidente a contribuição do PIBID na aproximação
universidade-escola, conforme podemos identificar nos fragmentos.
Eu percebo que o PIBID estreita a relação entre a escola e universidade,
fortalecendo a parceria entre essas duas instâncias que eu considero crucial para a melhoria da qualidade do ensino público no Brasil.
(Estudante 1- Biologia)
O PIBID é uma ponte entre a universidade e a escola. Além da
possibilidade de devolver profissionais para as escolas que hoje são
atendidas pelos PIBID, o programa estreita as relações escola-universidade, pois por muito tempo as instituições de ensino superior só
estavam preocupadas com projetos que envolviam apenas o âmbito acadêmico. (Estudante 2 - Biologia)
Os relatos dos licenciandos apresentam dois aspectos que merecem destaque:
na visão do estudante 1 a aproximação entre as duas instituições possibilita melhorias
para educação pública. Para o estudante 2, essa proximidade também possibilita a
formação continuada do professor da escola. Vale ressaltar que os aspectos apresentados
pelos estudantes não se encontram entre objetivos do PIBID, tendo em vista que sua
finalidade está centrada na figura do licenciando, no que diz respeito ao seu
desenvolvimento profissional. Todavia, a partir desses relatos é possível identificar
outras possíveis contribuições do programa.
Contudo, o estudante 2 também ressalta o fato de que nem sempre a
universidade teve a preocupação de se aproximar da escola, ficando durante muito
tempo isolada, se restringindo as atividades acadêmicas. Roldão (2007) tem destacado a
necessidade de articulação dos conhecimentos acadêmicos e dos conhecimentos
escolares, considerando esse aspecto fundamental para formação docente. Sendo
necessário superar a visão desses dois campos como espaço compartimentado de
produção de conhecimento. Essa visão reduz as intervenções que as instituições
produzem em seu cotidiano, perpetuando a ideia equivocada de que a universidade que
produz o conhecimento e a escola que o coloca em prática.
Embora os estudantes admitam as contribuições do programa na relação
universidade-escola, observamos em suas narrativas alguns aspectos que fragilizam essa
aproximação, conforme são apresentados nos relatos a seguir:
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Sim ainda é um pouco tímida essa relação mais acredito que com mais
esforço e simpatia dos seus coordenadores o PIBID tende a ser bem mais
aceito e incorporado pela gestão escolar. (Estudante 3 - Química)
O programa pode contribuir bastante na relação escola e universidade,
mas é preciso maior participação do coordenador do projeto na escola,
pois ele representa à universidade e o supervisor a escola, mas o supervisor vai mais à universidade e o coordenador vai pouco à escola.
Isso atrapalha essa relação. (Estudante 4 - Química)
De acordo com os fragmentos acima é possível perceber que os estudantes
atribuem ao coordenador do projeto uma função importante nessa aproximação. Nos
relatos fica evidente que ainda existe um distanciamento entre o professor da
universidade e a escola. A portaria nº 096, de 18 de julho de 2013 (BRASIL, 2013)
destaca entre as funções do coordenador de área, elaborar, desenvolver e acompanhar as
atividades previstas no subprojeto. Contudo o documento não esclarece como deve ser
realizado esse acompanhamento.
De acordo com Maldaner (2006) a interação entre professores da escola, pro-
fessores da universidade e alunos da graduação é benéfica para ambos, pois possibilita
discutir as dificuldades encontradas no ensino e, além disso, permite desenvolver a ideia
da pesquisa como princípio educativo na prática, tanto na formação inicial quanto na
formação continuada de professores.
1. Aproximação entre teoria-prática
Nos relatos que seguem os pesquisados falam sobre a relação entre a teoria
abordada no curso e a prática no PIBID. Segundo as estudantes 10 e 5 é possível
observar a relação entre os conceitos estudados e situações práticas como, por exemplo,
na aplicação de metodologias.
Eu sempre achei que a teoria é uma coisa e a prática é outra, pois
geralmente não é mostrada pra gente a relação entre elas na universidade. A minha experiência no PIBID me ajudou a perceber essa
relação. Ir pra escola acompanhar as aulas, elaborar atividades usando
metodologias que antes só lia na universidade, me ajudou a perceber essa relação, e também a compreender as limitações na aplicação das
metodologias, o que antes eu ouvia na sala e achava que era como uma receita de bolo era só aplicar e pronto. (Estudante 10 - Química)
Hoje eu leio os textos de maneira mais crítica e discuto mais na sala de aula, pois tenho mais experiência. Por exemplo, quando estudamos
algumas metodologias no curso, às vezes eu já trabalhei com ela na
escola, assim eu posso contar minha experiência para os colegas e a discussão fica mais real. (Estudante 5 - Biologia)
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A partir dos relatos é possível perceber que as experiências vivenciadas no
PIBID contribuem para aprimorar e aproximar a teoria e prática na universidade. Além
disso, também é possível identificar como ocorre a articulação entre teoria e prática no
programa. Nos fragmentos a seguir, os estudantes 6 e 7 relatam alguns momentos
importantes:
No PIBID eu consigo perceber a relação existente entre a teoria e
prática, pois a teoria não fica solta, distante. Nós procuramos por meio da teoria compreender as questões que ocorrem na escola e assim pensar
alternativas de melhorar a situação. Nossas ações são planejadas e
constantemente avaliadas. Por exemplo, quando planejamos o ensino de algum conceito novo, nós levamos em consideração o que a literatura
fala sobre o assunto, às dúvidas que os alunos costumam apresentar e as
sugestões para o ensino daquele conceito. Mas a gente também não descarta a realidade dos alunos daquela escola, pois também fazemos
sondagem sobre o que eles já sabem, etc. A partir daí, nós discutimos no grupo e propomos algo na classe, assim fica mais fácil relacionar a
teoria e a prática. (Estudante 6 - Biologia)
No PIBID eu vivo essa relação de teoria e prática. Nós não pegamos a
teoria e aplicamos de qualquer jeito na escola. Nós primeiro temos que
conhecer a realidade e a partir daí pensar nas ações que iremos fazer. Pra isso nós discutimos todos os passos, antes, durante e depois, pois
assim dá próxima vez podemos fazer sempre melhor. (Estudante 7 -
Química)
Os relatos acima apresentam um conceito de prática pedagógica como uma
ação reflexiva guiada por intenções conscientes e planejada. Nesse sentido, essa
concepção está em consonância com a ideia de práxis defendida por Vázquez (1997)
como uma atividade humana que produz objetos, sem que por outro lado essa atividade
seja concebida com o caráter estritamente utilitário.
Na medida em que os licenciandos buscam conhecer a realidade da escola eles
passam a interpretar a teoria a partir do contexto da escola possibilitando assim o
desenvolvimento de uma visão crítica da teoria e da prática. Nesse sentido, Silva e
Schnetzler (2008) destacam que a interface teoria-prática compõe-se de uma interação
constante entre o saber e o fazer, entre conhecimentos acadêmicos e o enfrentamento de
problemas decorrentes da vivência de situações próprias do cotidiano escolar.
2. Implicações para a formação e o desenvolvimento profissional
Os depoimentos analisados apresentam os desafios enfrentados pela profissão
docente atualmente. Os licenciandos apresentam aspectos positivos que foram
agregados mediante a experiência no PIBID. Contudo também mostram aspectos
relevantes que acabam interferindo no exercício da profissão, conforme podemos
identificar nos relatos a seguir:
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Eu sempre vi o exercício da docência como algo de muita
responsabilidade, pois é um compromisso muito grande ser um
auxiliador da construção do conhecimento de alguém. O PIBID me fez
ver que apesar dos desafios eu não podia fugir da responsabilidade de ser professor. (Estudante 2 - Biologia)
O PIBID ajuda me tornar um profissional mais preparado para exercer a profissão. Mas a vivência na escola também mostra o quanto a nossa
profissão é desvalorizada pelos governantes, pois as condições de trabalho não são boas. A professora da escola que faz parte do projeto
tem todo o suporte para realizar as coisas que ela deseja, pois pode
contar com os bolsistas para ajudar. Eu vejo que ela tem muitas aulas e muitos alunos, não seria possível fazer a quantidade de coisas que já
realizamos se ela estivesse sozinha. O professor da escola tem pouco tempo para elaborar coisas diferentes e levar para a escola. Quando vejo
essa realidade fico angustiada com o exercício da profissão. (Estudante 8
- Química)
A experiência na docência é sempre bem vinda quando falamos de
atuação como docente e na formação de professor. A experiência nunca é demais e nos leva a ter mais estratégias e ferramentas para trabalharmos
a favor da educação de qualidade e igual a todos. (Estudante 9 -
Biologia)
O PIBID me faz ter mais clareza sobre o que é a docência, hoje eu me sinto mais segura sobre como agir na escola e isso com certeza vai me
ajudar muito quando me tornar professora, mas a experiência também me mostra as dificuldades no exercício da profissão, o trabalho do
professor ainda é pouco valorizado. (Estudante 3 - Química)
É possível identificar que os relatos apontam a vivência no contexto escolar
como um importante elemento na construção da identidade dos futuros professores,
tornando-os capaz de analisar a sua prática de maneira crítica. Além disso, o contato
direto com o ambiente escolar possibilita aos licenciandos compreender a complexidade
do trabalho docente, bem como, as questões referentes à valorização da profissão. De
acordo com Gatti (2010), a carreira docente tem se mostrado cada vez menos atraente,
um número significativo de licenciandos não pretende exercer a profissão, ou acabam
desistindo no início da carreira pelas condições de exercício e/ou salariais da profissão.
Algumas Considerações
Os licenciandos pesquisados reconhecem a contribuição do PIBID na sua
formação. No que se refere a relação universidade e escola, os licenciandos identificam
o programa como uma possibilidade de estreitamento das relações entre a duas
instituições. Contudo, destacam que essa aproximação ainda é tímida em virtude da
universidade não ter manifestado sempre essa preocupação. Além disso, é preciso maior
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participação do coordenador de área (professor universitário) no espaço escolar como
uma forma de contribuir na aproximação da universidade e escola.
Quanto à relação teoria e prática, o estudo destaca que o PIBID tem contribuído
para essa articulação tanto nas atividades realizadas no programa quanto na vivência dos
licenciandos nos respectivos cursos. Vale ressaltar que a compreensão de prática
manifestada pelos entrevistados está distante da perspectiva utilitarista, pois, percebe-se
uma ação planejada e refletida dos participantes do programa no desenvolvimento das
atividades.
No tocante as implicações para o desenvolvimento profissional, são perceptíveis
as contribuições do programa, na medida em que possibilita a vivência orientada dos
licenciandos no futuro espaço de exercício profissional. Todavia essa experiência
também permite que os futuros professores identifiquem os problemas enfrentados na
profissão, principalmente no que se refere à valorização do professor.
Essa constatação alerta para o fato de que embora seja fundamental a existência
de programas como o PIBID que contribua para formação docente, também, é
importante destacar que ações pontuais não interligadas com a implementação de
políticas que visem melhorias na perspectiva da carreira docente, poderão distanciar o
licenciando do exercício profissional. Nesse sentido, para a valorização do magistério é
necessário além de programas como o PIBID, o reconhecimento social da profissão que
requer salários mais dignos e melhores condições de trabalho.
Referências
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