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AEMS Rev. Direito e Sociedade Três Lagoas, MS Volume 3 Número 1 Ano 2015 23 SÚMULA N. 11 DO STF: A história das Algemas e sua Utilização Hodierna. Paola Queiroz Discente do curso de Direito FITL/AEMS. Zigslayne Martins Discente do curso de Direito FITL/AEMS. Daniela Borges Freitas Mestre em Teoria do Estado e Direito pela Fundação Eurípedes Soares da Rocha. Professora do curso de Direito FITL/AEMS. RESUMO O presente trabalho suscita o uso da algema no direito brasileiro, tanto quanto sua historicidade. Os pontos positivos e negativos suscitados por muitos a época da edição da súmula n. 11 pelo STF, desde a restrição à liberdade dos policiais no exercício de suas funções, que contrapõe com princípios Constitucionais, podendo de imediato citar o princípio da dignidade da pessoa humana que é garantia fundamental da Constituição Federal do Brasil, como também analisar a hermenêutica da palavra excepcionalidade. E por meio de pesquisa de campo indicar o posicionamento dos Policiais Civis e Federais da cidade de Três Lagoas/MS, sobre a aplicação na atualidade da súmula n.11, visto que já decorreram 6 (seis) anos de sua edição. PALAVRAS-CHAVE: Algemas; Súmula; Policiais; Excepcionalidade; Pesquisa de campo. INTRODUÇÃO Este artigo tem como principal objetivo a polêmica súmula n. 11 do STF que fora editada em agosto de 2008. Foram diversos posicionamentos e conclusões à época de sua edição acerca de sua real eficácia, pois muitas foram às críticas direcionadas a ela, já que para muitos limitava o exercício da função policial, sendo assim busca-se por meio desta pesquisa, a real aplicabilidade na atualidade, visto que, já se passaram anos da data de sua edição. Para a conclusão que se pretende chegar, inicialmente o foco será na parte histórica das algemas, onde será abordado sua origem, conceito e evolução. Em seguida se irá tecer algumas considerações do uso das algemas no Direito brasileiro, prosseguindo até chegar à elaboração da súmula n. 11. Algumas considerações serão elencadas quanto aos princípios constitucionais relacionados ao tema, o posicionamento de quem defende o emprego da súmula e os que condenam sua aplicabilidade baseados em alguns

Artigo 3 - SÚMULA N. 11 DO STF a História Das Algemas e Sua Utilização Hodierna

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  • AEMS Rev. Direito e Sociedade Trs Lagoas, MS Volume 3 Nmero 1 Ano 2015

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    SMULA N. 11 DO STF: A histria das Algemas e sua Utilizao

    Hodierna.

    Paola Queiroz Discente do curso de Direito FITL/AEMS.

    Zigslayne Martins

    Discente do curso de Direito FITL/AEMS.

    Daniela Borges Freitas Mestre em Teoria do Estado e Direito pela Fundao Eurpedes Soares da Rocha.

    Professora do curso de Direito FITL/AEMS.

    RESUMO O presente trabalho suscita o uso da algema no direito brasileiro, tanto quanto sua historicidade. Os pontos positivos e negativos suscitados por muitos a poca da edio da smula n. 11 pelo STF, desde a restrio liberdade dos policiais no exerccio de suas funes, que contrape com princpios Constitucionais, podendo de imediato citar o princpio da dignidade da pessoa humana que garantia fundamental da Constituio Federal do Brasil, como tambm analisar a hermenutica da palavra excepcionalidade. E por meio de pesquisa de campo indicar o posicionamento dos Policiais Civis e Federais da cidade de Trs Lagoas/MS, sobre a aplicao na atualidade da smula n.11, visto que j decorreram 6 (seis) anos de sua edio.

    PALAVRAS-CHAVE: Algemas; Smula; Policiais; Excepcionalidade; Pesquisa de campo.

    INTRODUO

    Este artigo tem como principal objetivo a polmica smula n. 11 do STF que

    fora editada em agosto de 2008. Foram diversos posicionamentos e concluses

    poca de sua edio acerca de sua real eficcia, pois muitas foram s crticas

    direcionadas a ela, j que para muitos limitava o exerccio da funo policial, sendo

    assim busca-se por meio desta pesquisa, a real aplicabilidade na atualidade, visto

    que, j se passaram anos da data de sua edio.

    Para a concluso que se pretende chegar, inicialmente o foco ser na parte

    histrica das algemas, onde ser abordado sua origem, conceito e evoluo. Em

    seguida se ir tecer algumas consideraes do uso das algemas no Direito

    brasileiro, prosseguindo at chegar elaborao da smula n. 11.

    Algumas consideraes sero elencadas quanto aos princpios

    constitucionais relacionados ao tema, o posicionamento de quem defende o

    emprego da smula e os que condenam sua aplicabilidade baseados em alguns

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    princpios que sero sucintamente citados, e finalmente a aplicabilidade hodierna,

    tendo como referncia a cidade de Trs Lagoas/MS.

    1 HISTRIA DAS ALGEMAS

    A palavra algema origina-se do rabe AL-djamaa = pulseiras, sendo um

    instrumento de ferro ou ao, formado por duas argolas interligadas, para tolher os

    movimentos dos braos ou das pernas.

    Sinnimos menos usados so grilheta, grilho e cadeia. Tais

    sinnimos, como tambm a palavra algema, encontram-se em algumas passagens

    da Bblica, um livro de diferentes eras, usados nas religies judaicas e crists. Nos

    livros individuais do novo testamento, existem passagens, onde se pode encontrar

    referncia algema:

    Timteo; 2, 2:9, pelo qual estou sofrendo at algemas, como malfeitor: contudo, a palavra de Deus no est algemada. Marcos 5:4, porque, tendo sido atado por muitas vezes com grilhes e com cadeias, tinha quebrado as cadeias e despedaados os grilhes [...]. Atos 28:20, [...] porquanto, por causa da esperana de Israel que estou preso com esta cadeia (GRIFO NOSSO).

    Pode-se dizer, provando por meio de documentos e relatos deixados com o

    passar dos sculos, que desde a antiguidade h registros de combate desordem.

    O indivduo que desobedecia aos usos e costumes de sua sociedade era de alguma

    forma banido, necessariamente com o uso de algum meio, como: cordas, correntes,

    barras de ferro etc. que assegurassem a proteo dos indivduos que aplicavam os

    castigos, inibindo a pessoa violadora de certas normas impostas em esboar reao,

    ficando assim, impossibilitado de resistir.

    As algemas passaram por modificaes considerveis ao longo dos anos.

    Os relatos do sculo XIX que se tem conhecimento demonstram sua rpida

    evoluo. Possuam bloqueios, mas em um tamanho nico, causando problemas ao

    adaptar na pessoa, pois em algumas ficava apertada e em outras, folgada. O

    modelo conhecido atualmente com travas, adaptvel em qualquer pessoa e

    impede o preso de se auto lesionar (em anexo alguns modelos, como sua respectiva

    evoluo em pases como Alemanha, Rssia, EUA etc.). A evoluo das algemas

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    continua buscando sempre melhores formas para inibio da fuga, como tambm o

    zelo pela integridade fsica do preso.

    Vale ressaltar que muitos pases usam para abertura das algemas o mesmo

    mecanismo de chaves, para facilitar a abertura em casos de perder a chave da

    algema especfica.

    Em breve sntese, tem-se a parte histrica do uso das algemas no Brasil:

    a) Desde o sculo XVII j havia regulamentao do uso de algemas com as

    ordenaes Filipinas;

    b) Sculo XIX - Decreto de 23 de maio de 1821 providenciado pelo Prncipe

    Dom Pedro I para garantir as liberdades individuais, ordenando o afastamento do

    uso de algemas em pessoas que ainda no tivessem sido julgadas;

    c) 1830 - Prevista pena de Gals para os rus, excetuando as mulheres, os

    menores de 21 anos e os maiores de 60;

    d) 1832 - Promulgao do Cdigo de Processo Criminal de Primeira

    Instncia do imprio do Brasil, prevendo em seu artigo 180: Se o ru no obedecer e

    procurar evadir-se, o executor tem direito de empregar o grau de fora necessria

    para efetuar a priso; se obedecer, porm o uso da fora proibido;

    e) 1872 Estabelecia que o preso no seria conduzido com utilizando

    algemas, salvo caso extremo de segurana, devendo ser justificado pelo condutor,

    caso contrrio seria penalizado por meio de multa e pena;

    f) 1891 - Constituio proporciona s unidades federativas competncia para

    legislar sobre o processo penal, algumas limitaram adoo legislao do imprio;

    g) 1935 - Agosto de 1935 foi apresentado o Projeto de Cdigo de Processo

    Penal em que era vedado o uso de algema, que foi possvel devido o advento da

    Constituio da Repblica de 1934, que ocorreu a reunificao processual;

    h) 1941 - Surge Decreto-Lei n. 3.689 (Cdigo de Processo Penal) que

    proibia o emprego de fora indispensvel em caso de resistncia ou tentativa de

    fuga do preso;

    i) 1969 - Cdigo de Processo Penal Militar elenca que o uso de algemas

    deve ser evitado, desde que no haja perigo de fuga ou agresso por parte do

    preso;

    j) 1984 - Lei de Execuo Penal (Lei n. 7.210/84), em seu artigo 199

    determina que o emprego de algema ser disciplinado por Decreto Federal;

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    l) 1988 - Compete privativamente a Unio legislar em matria penal e

    processual Penal;

    m) 2008 - Lei n. 11.689 de junho de 2008, incluiu o 3 no art. 474 do CPP,

    vedando o uso de algemas durante o perodo que o acusado permanecer no

    plenrio do jri, salvo se absolutamente necessrio ordem dos trabalhos,

    segurana das testemunhas ou garantia da integridade fsica dos presentes.

    A palavra algema s foi introduzida no Cdigo de Processo Penal no

    advento da Lei n. 11.689 de junho de 2008, mencionada no art. 474,3 e art. 478,

    inciso I, ambos do CPP:

    Artigo 474, in verbis. A seguir ser o acusado interrogado, se estiver presente, na forma estabelecida no Captulo III do Ttulo VII do Livro I deste Cdigo, com as alteraes introduzidas nesta Seo. 3 - No se permitir o uso de algemas no acusado durante o perodo em que permanecer no plenrio do jri, salvo se absolutamente necessrio ordem dos trabalhos, segurana das testemunhas ou garantia da integridade fsica dos presentes. Artigo 478, in verbis. Durante os debates as partes no podero, sob pena de nulidade, fazer referncias: Inc. I deciso de pronncia, s decises posteriores que julgaram admissvel a acusao ou determinao do uso de algemas como argumento de autoridade que beneficiem ou prejudiquem o acusado.

    O Supremo Tribunal Federal tambm em 2008 aprova no ms de agosto a

    Smula de n.11, delimitando em quais as ocasies seria lcito o uso de algemas nos

    presos.

    Vale frisar, apesar de no ser o foco de tal artigo, que se passaram 30 anos

    do advento da Lei n.7.210/84 no havendo regulamentao legal sobre o tema, visto

    que no poder ser regulamentado por meio de decreto, pois a lei anterior a

    Constituio Federal de 1988 e nela explcito a determinao privativa de

    competncia da Unio legislar em matria penal e processual penal (art. 22, inc. I,

    CF), por meio de lei ordinria, pois das espcies normativas do art. 59, o decreto

    legislativo instrumento normativo em que sero materializadas as competncias

    as competncias exclusivas do Congresso Nacional.

    2 A SMULA N. 11 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

    A smula foi embasada nos artigos 1 e 5, ambos da CF, prezando pela

    dignidade da pessoa humana, preocupando-se com os direitos fundamentais

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    inerentes ao cidado. Focando, como no poderia deixar de ser, nos artigos 284 e

    292 do CPP, tratando dos limites que se deve ter ao efetuar uma priso.

    A Lei n.11.689/08, que alterou o art. 474 do CPP, tambm foi foco para o

    STF editar a smula, e estabelece no pargrafo 3 que: No se permitir o uso de

    algemas no acusado durante o perodo em que permanecer no plenrio do Jri,

    salvo se absolutamente necessrio ordem dos trabalhos, segurana das

    testemunhas ou garantia da integridade fsica dos presentes.

    No posicionamento de muitos, a regulamentao do uso de algemas no

    sistema ptrio j se fazia necessria, mas s foi possvel em 2008 aps o

    julgamento do HC n. 91952-SP em 07.08.08, tendo como relator a poca o Ministro

    Marco Aurlio, onde um pedreiro acusado de homicdio permaneceu de algemas na

    sesso de julgamento na cidade de Laranjal Paulista, em 2005. O julgamento foi

    anulado, tendo por justificativa o desrespeito a Dignidade da Pessoa Humana, pois o

    ru no apresentava risco para os que estavam presentes no Tribunal, prejudicando

    dessa forma sua possvel absolvio, pois j estava pr-condenado aos olhos dos

    jurados, que por serem leigos no viriam o uso da algema de uma forma imparcial,

    ou seja, como suspeito, mas sim como condenado. O uso de algemas virou

    polmica aps operaes e prises espetaculosas que foram realizadas pela Policia

    Federal.

    Muitos tambm alegam sua edio por causa das operaes e prises

    espetaculosas que foram realizadas pelo Polcia Federal, coincidentemente na

    poca em que ricos empresrios e autoridades da repblica, estavam sendo presos

    e algemados. Alegavam a falta de denncia e a exposio da imagem algemados na

    mdia, comovendo os ministros do STF que se viram obrigados em posicionar

    sobre o assunto.

    Diante de toda a polmica surgida aps tal julgamento ser anulado, e a

    mega operao que estava sendo realizada pela Polcia Federal, surgiu assim a

    necessidade de regulamentao do uso das algemas, de modo que o STF editou no

    mesmo ano do HC n. 91952-SP a Smula n. 11.

    3 TEOR DA SMULA E SUA EDIO

    Analisa-se diretamente a Smula n. 11 do Supremo Tribunal Federal:

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    S lcito o uso de algemas em casos de resistncia e de fundado receio de fuga ou de perigo integridade fsica prpria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da priso ou do ato processual a que se refere, sem prejuzo da responsabilidade civil do Estado.

    De se ver que a Smula editada pelo STF apresenta o uso das algemas como

    excepcionalidade, deixando claro que as algemas devero ser usadas nos casos

    mencionados na Smula.

    3.1 A palavra excepcionalidade na Smula n. 11 do Supremo Tribunal Federal

    Derivando da restrio que a mesma faz ao uso das algemas quando da

    priso de indivduos, faz-se necessrio para melhor compreenso, a hermenutica,

    ou seja, entender o motivo da palavra excepcionalidade na smula, editada como

    uma medida coercitiva excepcional.

    A excepcionalidade ficou restrita para se utilizar em casos que ocorram: a)

    resistncia priso; b) fundado receio de fuga ou; c) perigo integridade fsica do

    preso e/ou de terceiros, sob pena de responsabilizao civil, disciplinar e penal do

    agente pblico coautor, sem prejudicar a responsabilidade civil do Estado.

    4 ASPECTOS POSITIVOS E NEGATIVOS QUANTO AO USO DAS ALGEMAS

    ALIADO AOS PRINCPIOS CONSTITUCIONAIS

    Com a polmica aps operaes e prises espetaculosas que foram

    realizadas pela Policia Federal e o HC n. 91952-SP em 2008, desrespeitando dessa

    forma alguns princpios constitucionais essenciais para a manuteno da chamada

    presuno de inocncia e dignidade da pessoa humana, que ser abordado os

    aspectos positivos e negativos quanto ao uso ou abuso das algemas.

    O policial, como agente da lei e amparado pelo direito, ao fazer o uso de

    algemas, enfoca principalmente na sua integridade fsica. Seu uso considerado

    lcito nos casos de resistncia e de fundado receio de fuga ou de perigo a

    integridade fsica prpria ou alheia, justificando a excepcionalidade por escrito.

    Porm em certos casos, alguns entendem como obrigatrio o uso de algemas no

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    caso do suspeito estar sob efeito de drogas, ou ainda no caso de ter doena mental,

    estar sob forte emoo e apresentar resistncia a priso. A deciso de algemar ou

    no o preso subjetiva e cabe ao policial ou a autoridade competente, porm no se

    pode esquecer, mesmo sendo o preso um criminoso, que no decaiu de seus

    direitos fundamentais.

    Tendo as algemas, uso indiscriminado, o procedimento provocado ser

    humilhante e incompatvel com o princpio da dignidade humana. H que se

    evidenciar que no Brasil sempre houve regulamentao pelo uso de algemas, tanto

    de forma tcita como expressa, desde as ordenaes Filipinas no sculo XVII,

    depois atravs do Cdigo Criminal do Imprio em 1830 e chegando aos dias atuais

    com a entrada do Cdigo de Processo Penal em 1941.

    Porm, atravs da restrio da liberdade que se d a quebra de um direito

    fundamental, no configurando atravs da algema o uso abusivo de fora, mas sim,

    sendo ela, uma forma legal para a preveno do uso da fora policial. Verifica-se

    assim, que nem todos os direitos fundamentais do preso sero preservados, a

    comear pela sua liberdade de locomoo.

    Quando foi editada a smula n. 11 esqueceu-se dos princpios

    constitucionais, sendo eles, o direito preservao da vida, incolumidade fsica do

    policial e de terceiros, e o da igualdade. Alm disso, ainda se deixou passar

    despercebidos os princpios da eficincia e da responsabilidade do agente, quando

    no ato da priso, o policial ou autoridade deve evitar danos previsveis e inevitveis

    para si, ao preso ou para terceiros.

    Para se fazer respeitar, o princpio da dignidade da pessoa humana precisa

    de polticas pblicas, para isso a Declarao Universal dos Direitos Humanos institui

    mecanismos para proteg-la. Dessa forma, possvel analisar at que ponto as

    algemas podem ser usadas, quando e se devem us-las, respeitando o direito do

    cidado, mas sem deixar de respeitar a sociedade, ou seja, o direito individual no

    poder sobrepor aos direitos da coletividade.

    A quebra do princpio da Dignidade Humana acontece por vrias formas, na

    medida em que se banaliza a priso, ao expor publicamente a vida do ser humano,

    que esta tendo sua liberdade restringida, por algum ato ilcito cometido, atravs do

    sensacionalismo da mdia, maculando a imagem de pessoas conhecidas ou no. Ou

    ao exibir o preso, com as mos algemadas para frente, faz com que ele se sinta

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    envergonhado, e nos casos onde esse preso nem mesmo responsvel pelo crime

    a ele imputado, caso de priso ilegal, tem sua integridade fsica e moral abaladas

    quando as algemas so colocadas em seu pulso. Como se sabe, ningum deve ter

    sua dignidade ferida ou ser considerado culpado sem que seja julgado, como

    asseguram os art.1, inc. III e art.5, inc. LVII da CF/88.

    Nossa Constituio Federal dispe o respeito integridade fsica e moral

    dos presos, proibindo, a todos, submeter algum a tratamento desumano e

    degradante, devendo ser respeitadas a dignidade da pessoa humana e a presuno

    de inocncia, o constrangedor e aviltante uso de algemas devendo ser usada

    quando demonstrada e justificada caso a caso pela autoridade ou seu agente, no

    podendo a necessidade ser deduzida da gravidade dos crimes nem da presuno de

    periculosidade do detento, porque ilegal. evidente que o uso de algemas, em

    situaes mpares, pode ser imprescindvel na conduo de presos.

    No entanto o que se pretende sustentar que a dignidade da pessoa

    humana, na condio de valor e princpio normativo fundamental que atrai o

    contedo de todos os direitos fundamentais, exige e pressupe o reconhecimento e

    proteo dos direitos fundamentais de todas as dimenses.

    No se busca recriminar o uso das algemas, at porque o policial e

    autoridade visando, no momento da priso, oitiva ou demais situaes, onde se

    encontra ou sozinho ou sem o contingente suficiente de policiais, para que possa

    prosseguir com seu mister, a sua segurana e integridade fsica. O que no

    podemos admitir que haja abuso, tanto em relao a maus tratos aos presos, ou

    abuso por parte de policiais e at para evitar as prises ilegais.

    Como forma de conter uma agresso, fuga ou resistncia o uso de algema

    torna-se um meio necessrio, e no como meio de punio e exposio vexatria

    realizada contra qualquer pessoa. A Constituio Federal prev em seu artigo 5,

    inc. X, que por violao contra a imagem e a honra das pessoas, cabe indenizao.

    O que importa para a Policia Militar prender quem infringe a lei, que

    mesmo sendo um ato que viole a dignidade da pessoa humana, visto que o abuso

    de Autoridade amparado pela Lei n. 4898/65, e gera consequncias disciplinares.

    A escolta dos infratores sem algemas, conforme foi proposto pela smula se

    tornaria invivel, pois teria que aumentar o contingente de policiais, hiptese

    incabvel nos dias atuais.

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    Quanto ao fundado receio de fuga e ao perigo integridade fsica de

    qualquer pessoa, surge uma questo aps a edio da Smula, se seria aceito pelo

    STF, e se o uso de algemas deve ser baseado na natureza do crime? Sendo assim,

    aqueles que cometem o crime de homicdio deveriam ser sempre algemados,

    mesmo apresentando bom comportamento ao passo que os estelionatrios, no. E

    ao ser algemado, visto que todas as pessoas desejam sua liberdade de locomoo,

    no teria a um caso de fundado receio de fuga quando se executa uma priso?

    A Smula n. 11, ao ser criada tinha por finalidade amainar as discusses

    acerca desse assunto, e tambm reduzir o nmero de recursos s instncias

    superiores, em especial ao STF.

    CONCLUSO

    A pesquisa de campo realizada na cidade de Trs Lagoas/MS utiliza o

    mtodo exploratrio, pois tem como objetivo o levantamento e anlise das opinies

    de uma parcela determinada da sociedade, a Polcia Civil e a Polcia Federal da

    cidade de Trs Lagoas/MS, a cerca de um tema especfico, a Smula Vinculante

    n.11, em seus aspectos jurdicos e aplicao prtica.

    Em pesquisa realizada com o delegado Marclio Pereira Leite da Delegacia

    Civil e com Daniel Coraa Jnior delegado da Polcia Federal, o procedimento

    adotado dentro das delegacias, principalmente nos plantes, tem sido no sentido de

    respeito a smula n.11, mas deixando claro que no houve mudana significativa do

    procedimento adotado anterior a edio do STF. Evidenciando que o uso da algema

    tem por finalidade a proteo do policial ou autoridade. Ocorre que na priso

    encontram-se os mais variados tipos de criminosos, entre eles os usurios de

    drogas, que esto querendo ir embora para continuar o uso de drogas e se mostram

    violentos ou sem controle de seus atos, e ao se fazer a oitiva, que geralmente

    realizada sem a presena de policiais, o torna necessrio o uso de algemas para a

    proteo do prprio funcionrio pblico.

    A justificativa de seu uso feita no prprio auto de priso, situao onde se

    depara com algum dos tipos excepcionais descritos na smula, p.ex. o preso se

    encontrava nervoso e precisou ser algemado para se fazer sua oitiva, ou em casos

    que o indivduo apresenta extrema fora fsica. Mas o principal motivo excepcional

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    pelo receio integridade fsica do prprio policial ou autoridade. A inteno ao se

    algemar o preso, no buscar a humilhao do mesmo, e sim assegurar a

    integridade fsica de todos os envolvidos.

    Da pesquisa realizada com os delegados, obteve-se a mesma concluso. A

    opinio de ambos foi que a restrio tem por finalidade evitar os abusos.

    importante para garantir os direitos do preso, mas tambm deve haver a viso da

    necessidade de preservar a integridade da coletividade, de todos os envolvidos, no

    caso as autoridades policiais ou terceiros, visto que deve zelar pela segurana das

    pessoas no entorno do detido. Devendo respeitar a discricionariedade do policial que

    tem como objetivo sua proteo e no finalidade de humilhar a pessoa do algemado.

    Com a edio da smula, o STF, na opinio de ambos, a inteno precpua

    foi de evitar abusos e no a de prejudicar diretamente quem lida com essas

    pessoas. Sendo difcil, pois os detidos simulam o abuso das mais variadas formas,

    como por exemplo, arranhes, se auto flagelam, apertam as algemas com o objetivo

    de deixar marcas e acusar os policiais de abuso no exerccio de sua funo.

    Quanto ao uso de algemas em adolescentes, deve-se ter um cuidado ainda

    maior. Estes no podem ser transportados na parte traseira do veculo, e sim nos

    bancos de trs. O procedimento para colocao das algemas deve ser ainda mais

    cauteloso por se tratar de menores de idade, pois os mesmos so considerados

    relativamente capazes, sua famlia ou o conselho tutelar devem ser contatados para

    se fazer presente durante a oitiva. dever da autoridade cumprir os requisitos da

    smula e do Estatuto da Criana e Adolescente para que seja possvel utilizar as

    algemas.

    O delegado Daniel Coraa Jnior da Polcia Federal finalizou a entrevista

    fazendo a citao do Sr. Leandro Daielli Coimbra, Superintendente Regional da

    Polcia Federal de So Paulo, que contraria a smula n. 11 relatando que no

    algemar o preso seria prend-lo em cela de porta aberta, ou seja, seria colocar os

    policiais em risco desnecessrio.

    REFERNCIAS

    11 Smula Vinculante do STF limita o uso de algemas a casos excepcionais. Notcias STF, Supremo Tribunal Federal. Postado em: 13 de agosto

  • AEMS Rev. Direito e Sociedade Trs Lagoas, MS Volume 3 Nmero 1 Ano 2015

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