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1 Jornal Hora H: o estigma de uma região impresso diariamente Erick Oliveira Cassiano 1 Resumo: O objetivo deste artigo é refletir sobre a importância adquirida pelo chamado jornalismo popular em época de crise na imprensa tradicional e qual o papel da violência no atual momento do jornalismo, o qual se torna cada vez mais sensacionalista. Como objeto de estudo, a análise do jornal Hora H trará reflexões sobre a relação da espetacularização da violência na mídia e a imagem estigmatizada da região onde o jornal circula, a Baixada Fluminense. Palavras-chave: Jornalismo popular, sensacionalismo, violência, Baixada Fluminense, jornal Hora H. Introdução O jornalismo vive uma crise no seu meio de produção. Na era digital, muito se discute sobre o futuro dos jornais impressos no Brasil e no mundo. Em território nacional, o maior exemplo desta crise das empresas de comunicação é o do tradicional Jornal do Brasil, que deixou de ser impresso em 2010. Para refletir sobre esse atual cenário, este artigo pretende abordar a relação da crise no jornalismo com a presença cada vez maior de notícias sensacionalistas, especialmente no que iremos tratar como jornalismo popular, pois partiremos da hipótese de que sensacionalismo é o que mais se vende na mídia, por isso consegue manter pequenos jornais impressos que priorizam o espetáculo. “O espetáculo é ao mesmo tempo parte da sociedade, a própria sociedade e seu instrumento de unificação” é o que afirma Guy Debord em sua obra clássica A 1 Bancário; Estudante do 5º período do curso de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, das Faculdades Integradas Hélio Alonso – FACHA – RJ.

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Jornal Hora H: o estigma de uma região impresso diariamente

Erick Oliveira Cassiano1

Resumo:

O objetivo deste artigo é refletir sobre a importância adquirida pelo chamado

jornalismo popular em época de crise na imprensa tradicional e qual o papel da

violência no atual momento do jornalismo, o qual se torna cada vez mais

sensacionalista. Como objeto de estudo, a análise do jornal Hora H trará reflexões sobre

a relação da espetacularização da violência na mídia e a imagem estigmatizada da

região onde o jornal circula, a Baixada Fluminense.

Palavras-chave:

Jornalismo popular, sensacionalismo, violência, Baixada Fluminense, jornal

Hora H.

Introdução

O jornalismo vive uma crise no seu meio de produção. Na era digital, muito se

discute sobre o futuro dos jornais impressos no Brasil e no mundo. Em território

nacional, o maior exemplo desta crise das empresas de comunicação é o do tradicional

Jornal do Brasil, que deixou de ser impresso em 2010. Para refletir sobre esse atual

cenário, este artigo pretende abordar a relação da crise no jornalismo com a presença

cada vez maior de notícias sensacionalistas, especialmente no que iremos tratar como

jornalismo popular, pois partiremos da hipótese de que sensacionalismo é o que mais se

vende na mídia, por isso consegue manter pequenos jornais impressos que priorizam o

espetáculo.

“O espetáculo é ao mesmo tempo parte da sociedade, a própria sociedade e seu

instrumento de unificação” é o que afirma Guy Debord em sua obra clássica A

1 Bancário;

Estudante do 5º período do curso de Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, das

Faculdades Integradas Hélio Alonso – FACHA – RJ.

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sociedade do espetáculo. Além de Debord, o artigo vai dialogar com conceitos de

outros autores, como Roland Barthes, Muniz Sodré, Ana Lucia Silva Enne, Ana Rosa

Ferreira Dias, Márcia Amaral, Danilo Angrimani e Rosa Nívea Pedroso.

Vinte e cinco anos de tradição, com capas e reportagens que evidenciam a

identidade que fora estigmatizada para a Baixada Fluminense, credenciam o jornal Hora

H, do município de Nova Iguaçu, a ser o objeto de estudo para este trabalho. O diário

popular tornou-se sinônimo de “sensacionalista”, suas fotos e matérias não fazem

questão de poupar a violência e apelam às sensações.

É importante analisar as capas do jornal Hora H para identificar a

espetacularização das notícias e entender como as manchetes e a linha editorial do

jornal favorecem para que a região receba o eterno estigma de violenta. Para que o

estudo se torne satisfatório, haverá uma contextualização histórica tanto da região

quanto da ação jornalística naquela localidade. Propõe-se, então, uma discussão sobre o

processo de produção de notícias da imprensa local, sobretudo os jornais impressos.

A região da Baixada Fluminense já foi considerada como o lugar mais violento

do mundo. Essa pesquisa fez com que, em 1980, o jornalista Percival de Souza

escrevesse um livro denominado “A maior violência do mundo – Baixada Fluminense”,

o qual é considerado uma denúncia clara, objetiva e direta. Por seu conteúdo altamente

explosivo, é visto por alguns estudiosos como documento da maior atualidade.

BAIXADA FLUMINENSE E O ESTIGMA DE LOCAL VIOLENTO

A região da Baixada Fluminense é uma região da área metropolitana do estado

do Rio de Janeiro composta por doze municípios, dos quais se pode destacar Nova

Iguaçu, Duque de Caxias, São João de Meriti, Nilópolis, Mesquita e Belford Roxo. Este

destaque se dá pela importância destes municípios dentro da própria região, como

também em relação ao estado e ao país, como é o caso dos dois maiores da região: Nova

Iguaçu e Duque de Caxias.

Com uma economia super aquecida, que movimenta milhões diariamente, a

região tornou-se extremamente importante para a consolidação da balança comercial do

estado do Rio de Janeiro. Nas últimas décadas, a Baixada serviu de reduto para muitos

cariocas que fugiam do caos, da violência e do domínio das facções criminosas na

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capital e muitos outros fluminenses que projetavam ascensão na vida pessoal,

profissional e empresarial. Dessa maneira, a região, que já possuía uma matriz bastante

diversificada, devido a “intensificação do fluxo migratório a partir do término da 2ª

Guerra Mundial”, segundo Maria Aparecida Figuerêdo, torna-se cada vez mais

heterogênea.

A Baixada Fluminense já apresentou jornais tradicionais, como o extinto Correio

da Lavoura, de Nova Iguaçu. Porém, em sua grande maioria, a imprensa local é

constituída por jornais populares, como Luta Democrática, de Duque de Caxias e os

iguaçuanos Jornal de Hoje e Hora H. Este último sendo o mais sensacionalista deles.

Os veículos de comunicação exploram de maneira excessiva a violência e a pobreza da

Baixada Fluminense. Muitas vezes, o discurso midiático focaliza apenas os aspectos

negativos da região.

“As revelações produzidas pelas investigações farão com que a

imprensa funcione ao mesmo tempo como elemento de segregação da

Baixada, identificando-a como outra sociedade, terra sem lei, lugar

onde a feiúra se associa ao crime ou câncer vizinho, e como

instrumento de pressão no aprofundamento das investigações

promovidas pela Delegacia de Homicídios. Uma ambigüidade que se

estabelece entre a solidariedade e a rejeição”. (ALVES, 2003, p. 154)

A maneira mais prática que os jornais populares e sensacionalistas, em especial

o Hora H, puderam disseminar o estigma de violenta sobre a Baixada Fluminense foi

através de suas capas e manchetes, a partir do fait-divers, termo introduzido por Roland

Barthes, no livro Essais Critiques (1964), que significa fatos diversos que cobrem

escândalos, curiosidades e bizarrices, que davam um tom de comicidade às tragédias,

assassinatos e outros aspectos explorados pela imprensa sensacionalista.

Para Danilo Angrimani,

“O fait-divers, como informação auto-suficiente, traz em sua

estrutura imanente uma carga suficiente de interesse humano,

curiosidade, fantasia, impacto, raridade, humor, espetáculo, para

causar uma tênue sensação de algo vivido no crime, no sexo e na

morte. Conseqüentemente, provoca impressões, efeitos e imagens. A

intenção de produzir o efeito de sensacionalismo no fait-divers visa

atrair o leitor pelo olhar na manchete que anuncia um acontecimento

produzido, jornalística ou discursivamente, para ser consumido ou

reconhecido como espetacular, perigoso, extravagante, insólito, por

isso, atraente”. (ANGRIMANI, 1995, p.26)

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Sensacionalismo e sua origem

Tocar às sensações do público, principalmente utilizando-se de fait-divers,

embora pareça, não é algo inovador. Essa prática ocorre desde o século XV, na França,

com os primeiro periódicos franceses: Nouvelles Ordinaires e Gazette de France.

Estudiosos apontam algumas matrizes que originaram o sensacionalismo nos jornais

impressos: a pornografia, o melodrama, o folhetim, a literatura fantástica e de horror e o

romance policial. Iremos nos ater, resumidamente, a duas delas.

O crescimento urbano, devido a ampliação do processo industrial, juntamente

com o desenvolvimento de novas técnicas de produção, transporte e comunicação, além

de mudanças políticas e econômicas ocorridas após a Revolução Francesa, as quais

consolidam uma idéia de república, de direitos igualitários. Nesse contexto, a

comunicação vai exercer um papel essencial.

A pornografia irá criticar pilares da sociedade monárquica, sobretudo o clero. A

exploração do sexo transgride a ordem, é um desestabilizador e fica sendo

compreendido como artifício revolucionário. Era responsável por realizar críticas à

hipocrisia vigente na sociedade, defendendo condições mais igualitárias. Assim, havia

uma convergência entre um discurso apelativo ao emocional e sua imbricação com o

viés político racionalista.

O melodrama, contido intrinsecamente no folhetim, começa a se consolidar no

século XIX. Publicado no rodapé das páginas, o folhetim é considerado elemento

essencial para a consolidação de periódicos comerciais e diários. Apresenta

características advindas do gótico e do fantástico. São, então, colocados em cena

personagens populares, fazendo com que os folhetins ganhassem uma extraordinária

repercussão, obtendo uma expressiva resposta da população.

O primeiro jornal estadunidense – Publick Occurences, que não passou do

primeiro número – também já possuía características sensacionalistas. A partir do século

XIX, esse modelo de jornalismo começa a se tornar atrativo. Essa atração muito se deu

a uma disputa editorial entre dois poderosos jornais de Nova Iorque: o New York World

e o Mornig Journal. Joseph Pulitzer, proprietário do New York World, é considerado o

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grande inovador do jornalismo impresso estadunidense, adotando em seus jornais:

impressão a cores, amplas ilustrações e manchetes e reportagens que exploravam um

tom sensacional. Márcia Amaral descreve a atuação desses dois jornais:

“Os jornais utilizavam manchetes escandalosas em corpo

tipográfico largo; publicavam notícias sem importância, informações

distorcidas; provocavam fraudes de todos os tipos, como falas

entrevistas e histórias e também quadrinhos coloridos e artigos

superficiais. Promoviam premiações e sorteios. Os repórteres estavam

“a serviço” do consumidor e faziam campanhas contra os abusos

sofridos pelas pessoas comuns, numa mistura de assistência social e

produção de histórias interessantes. Hearst e Pulitzer lutaram com

todos os meios para expandir suas circulações e voltaram-se para

truques sensacionalistas, protagonizando uma guerra comercial entre

os jornais.” (AMARAL,2006, p. 18)

Para ENNE (2007), as seguintes observações são recorrentes, quando se referem

aos jornais sensacionalistas:

a) a ênfase em temas criminais ou extraordinários, enfocando preferencialmente o corpo

em suas dimensões escatológica e sexual;

b) a presença de marcas da oralidade na construção do texto, implicando em uma

relação de cotidianidade com o leitor;

c) a percepção de uma série de marcas sensoriais espalhadas pelo texto, como a

utilização de verbos e expressões corporais (arma “fumegante”, voz “gélida”, “tremer”

de terror etc.), bem como a utilização da prosopopéia como figura de linguagem

fundamental para dar vida aos objetos em cena;

d) a utilização de estratégias editoriais para evidenciar o apelo sensacional: manchetes

“garrafais”, muitas vezes seguidas por subtítulos jocosos ou impactantes; presença

constante de ilustrações, como fotos com detalhes do crime ou tragédia, imagens

lacrimosas, histórias em quadrinhos reconstruindo a história do acontecimento etc.;

e) na construção narrativa, a recorrência de uma estrutura simplificadora e maniqueísta;

f) relação entre o jornal sensacionalista e seu consumo por camadas de menor poder

aquisitivo, que, por diversas razões, seriam manipuladas e acreditariam estar

consumindo uma imprensa “popular” quando, no fundo, estariam consumindo um

jornalismo comercial feito para vender e alienar.

Jornalismo popular

Alguns estudiosos costumam dividir a imprensa brasileira em Grande Imprensa

e Imprensa Popular, de acordo com o que é produzido e como é recebido o produto

elaborado por cada uma delas. Para Rosa Nívea Pedroso, a chamada imprensa popular

obedece fins mercadológicos, assim como a chamada grande imprensa.

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“Se não consegue explicá-lo como algo autônomo, com

determinantes próprios de realização, é porque ela não existe como

um tipo de imprensa que se opõe a outro, mas é uma divisão aparente,

ou seja, um segmento que pertence a grande imprensa e a reproduz”

(Pedroso, 2001:46).

Para PEDROSO (2001), a imprensa popular não é vista como um modelo de

jornalismo, mas sim como um desdobramento do modo de produção (uma ramificação

da grande imprensa).

Assim sendo, o modo de produção do jornalismo popular se faz pensando-se no

gosto de seu público consumidor, neste caso, as classes C, D e E. É desta maneira que o

sensacionalismo adentra no jornalismo popular, como recurso de marketing. Temas

como sexo e, sobretudo, violência são corriqueiros, sendo tratados de maneira

humanizada, ou seja, retratados de um modo familiar. O enfoque sensacionalista adquire

um tom de intimidade com o leitor. O indivíduo se vê na notícia. O leitor sofre,

diariamente, o mesmo tipo de violência, por exemplo, que as personagens da notícia.

Trata-se de uma experiência catártica, que aproxima o leitor do veículo e,

consequentemente, aumenta a vendagem do jornal diário, o que é do interesse das

empresas de comunicação.

Em contrapartida de PEDROSO (2001), PREVEDELLO (2008) prefere

estabelecer uma aparente dicotomia entre o jornalismo impresso tradicional e o

jornalismo impresso popular. Para a autora, a crise que muitos estudiosos afirmavam

que sucumbiria o jornalismo impresso no século XXI não existe.

“A crise não é do jornalismo diário impresso como um todo;

aliás, para o setor não existe crise, mas crescimento. A crise é do

jornalismo impresso diário tradicional, que vê a cada dia sua

circulação diminuir, enquanto novos títulos, mais populares, vão

conquistando mercado. Assim, o setor de jornalismo diário impresso

não está em crise, mas em mudança.”

(FLIZIKOWSKY, 2007 apud PREVEDELLO, 2008, P. 33)

Esse crescimento se dá pelo aumento do poder aquisitivo das camadas mais

populares e pela mudança de hábitos, que agora permite interesse em ler as notícias que

se identifiquem, mostrando que a estratégia se espetacularizar a informação nos jornais

populares foi bem sucedida.

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Análise do Jornal Hora H

Vejamos alguns exemplos de capas do jornal Hora H, as quais apresentam fait-

divers e apelo sensacionalista em sua manchete principal e em suas imagens:

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Dentro do jornal, há mais espaços para a publicidade que para o jornalismo. Em

(1), com o objetivo de atrair o leitor, é usado um tom irônico para se referir à maneira

como se encontra o cadáver. A reportagem que deveria trazer esclarecimentos sobre a

morte da capa apresenta apenas algumas linhas, com poucas informações. Em (2), a

edição do jornal faz questão de expor a mochila a qual fora deposita a cabeça de um

homem. O que vale para o jornal é a imagem pela imagem. É a espetacularização da

informação.

As maiores vítimas da ironia do jornal são os marginais. Corriqueiramente, a

morte ou a prisão de um deles é “comemorada” pela edição do Hora H. O indivíduo é

insultado sem que haja qualquer respeito a sua família ou a sua memória. É como se não

existisse a moral para o malfeitor, o que pode ser explicado pelo argumento de Muniz

Sodré: “Sabemos que, do ponto de vista dramático, a violência é um recurso de

economia discursiva: o soco ou o tiro do herói no vilão poupa o espectador de longas

pregações morais contra o mal. É uma elipse semiótica com grande poder de sedução”.

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Em (1), (2) e (4), além de outras características sensacionalistas, cuja

principal é a temática criminal, há uma ênfase no corpo em sua dimensão sexual,

representado pela figura da “Gata da Hora”, que nos remete à pornografia e à

origem do sensacionalismo, nos jornais franceses.

Em (3) e (7), as manchetes principais apresentam marcas da oralidade na

construção do texto, no que se refere à “horizontal” e “putaria”, implicando em

uma relação de cotidianidade com o leitor, ou seja, ao comentar a notícia com

um amigo, por exemplo, o leitor usaria as mesmas palavras que a edição do

jornal utilizou.

Em (4), (5) e (6), há presença de fotos com detalhes de crimes, imagens

lacrimosas. Além disso, foram produzidas três manchetes quase que idênticas,

evidenciando, talvez, uma falta de qualidade na edição, onde foi utilizada a

mesma fonte, a qual personifica o sangue da matéria, dá vida àquela manchete,

sob figura de linguagem.

Em síntese, todas as capas do jornal Hora H utilizam estratégias

editoriais que evidenciam o apelo sensacional: manchetes garrafais, seguidas por

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subtítulos jocosos e impactantes. Além dessa e outra características já

analisadas, as capas do diário apresentam uma característica da inovação do

jornalismo estadunidense no século XIX, com o New York World: sempre muitas

cores, o que chama a atenção do leitor.

Não cabe ao artigo discutir a influência da violência veiculada sobre a mudança

comportamental de quem a consome. Contudo, é relevante ressaltar uma das

conseqüências desse tipo de prática jornalística: a banalização da violência. As imagens

da violência, reproduzidas recorrentemente, contribuem para banalizá-la, para torná-la

normal e integrada ao cotidiano do leitor.

“(...) a imprensa sensacionalista canaliza boa parte das

atenções quando o assunto é violência. A exposição chocante de fatos,

acontecimentos e idéias, visando a emocionar para além dos graus

normais da tensão psicológica, caracteriza a contribuição mais

evidente desse tipo de jornalismo para tornar a violência irreal e

banalizada.” (DIAS, 1996, p. 103)

Muitos dos leitores do jornal Hora H já enxergam a Baixada Fluminense sob

essa violenta perspectiva veiculada pela imprensa, instaurando-se um senso comum

acerca da região. Segundo Debord, quanto mais o leitor contempla o jornal, menos vive;

quanto mais aceita reconhecer-se nas imagens dominantes, menos ele compreende a sua

própria existência. A espetacularização da informação não se constitui nas imagens que

são produzidas, mas sim na relação social entre as pessoas, midiatizada por essas

imagens.

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Considerações finais

A partir das reflexões contidas no presente artigo, pode-se constatar que, diante

da crise no meio de produção do jornalismo, (que não é entendida como crise por alguns

estudiosos) a prática sensacionalista se configura uma boa opção para manter pequenos

jornais.

Foi observado que os fait-divers, essencialmente utilizados no jornalismo

sensacionalista, atraem leitores, pois são capazes de tocarem nas sensações do

indivíduo. O leitor se vê na notícia a partir de uma experiência catártica. Também se

constatou que a violência midiática se configura numa elipse semiótica que exerce um

grande poder de sedução, ao qual adentrou ao jornalismo popular.

Certamente, além de seus anunciantes, o grande responsável para que o jornal

Hora H ainda esteja “vivo” é o seu gênero jornalístico, sem essas características, ele já

teria sido sucumbido pela crise. Os veículos sensacionalistas, que não deixam de ser

empresas, de uma maneira, aproveitam-se da crise para sobreviver no mercado.

Todavia, é importante salientar que, ao realizar um jornalismo sensacionalista, o

jornal Hora H – e todos os outros do gênero – estão contribuindo para que a violência

neles veiculada seja banalizada dentro da sociedade.

Essa banalização se consolida, sobretudo, entre as camadas mais populares, que

consomem os jornais sensacionalistas, como o Hora H. O leitor se identifica com a

leitura, se vê como vítima do crime que estampa a capa do jornal.

A imagem da violência vinculada à Baixada Fluminense, então, torna-se cada

vez mais banalizada para seus habitantes e cada vez mais estigmatizada para aqueles

que não conhecem, de fato, a realidade da região.

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Referências bibliográficas:

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Fluminense. Rio de Janeiro: APPH, CLIO, 2003.

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ANGRIMANI SOBRINHO, Danilo. Espreme que sai sangue: um estudo do

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http://www.uff.br/mestcii/enne1.html Acesso em: Novembro de 2013.

ENNE, Ana Lucia S. “O Sensacionalismo como processo cultural”. Artigo

apresentado na «COMPÓS/2007». Curitiba, 2007.

MUNIZ, S. Sociedade, mídia e violência. Porto Alegre: Sulina – Edipucrs, 2002.

PEDROSO, Rosa Nívea. A construção do Discurso de sedução em um jornal

sensacionalista. São Paulo: Annablume, 2001.