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Artigo O Rock na Amazônia

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Page 1: Artigo O Rock na Amazônia

O ROCK NA AMAZÔNIA: PECULIARIDADES DESSE GÊNERO NA HISTÓRIA DA MÚSICA URBANA EM BELÉM DO PARÁ

KEILA MICHELLE SILVA MONTEIRO

[email protected]

Introdução

Em fevereiro de 2011 defendi minha dissertação de Mestrado “O Peixe Vivo na Amazônia:

um mundo-açu nas canções da banda Cravo Carbono” com um olhar atento aos Estudos

Culturais e principalmente, aos autores da área da Etnomusicologia, sendo que a banda em

questão emergiu de uma cena classificada pela imprensa local como rock. Meu interesse em

abordar esse mundo-açu, ou seja, o multiculturalismo no álbum Peixe Vivo, da Cravo Carbono

e na música produzida pelas bandas contemporâneas surgiu desde a pesquisa da graduação,

que considero imprescindível para abordar as peculiaridades de algumas bandas que já

entraram para a história do rock no Pará.

Em 2001, para concluir o curso de Ed. Artística com Habilitação em Música, na

Universidade do Estado do Pará, escrevi o TCC intitulado “A Releitura do Rock na Capital

Paraense” por conta da cena rock local que, na época estava tomada por uma efervescência

cultural e uma mescla de ritmos que, de certa forma descaracterizavam o rock entendido como

tradicional, ou como muitos amantes do gênero consideram como rock’n’roll. Havia, portanto,

no final da década de 90, bandas com uma produção que chamava a atenção para a fusão entre

gêneros musicais que anteriormente eram considerados muito distintos para fazerem parte de

uma mesma composição. A imprensa local classificava essas composições como rock, mesmo

por conta de guitarras com efeito de distorção que elas usavam. O público desse gênero, que

na década anterior dividia-se ente o punk e o heavy metal, foi se tornando mais tolerante e a

fusão que sempre aconteceu, inclusive na música produzida no Brasil, tornou-se mais evidente

chamando a atenção, inclusive, da crítica local.

Essa fusão proveniente, de certa forma, da série de informações culturais e musicais que

chegam à Amazônia de diversas partes do mundo, de modo cada vez mais rápido por conta

dos avanços tecnológicos desde o surgimento da modernidade, traz consigo questionamentos

sobre a identidade do amazônida, dos integrantes das bandas, nativos ou migrantes e sobre a

evolução que o rock sempre sofreu, inclusive quando sua nomenclatura passou do termo

“rock’n’roll” para “rock”. Pretendo, portanto, fazer uma espécie de resumo breve da história

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do rock em Belém desde a chegada do gênero até as suas novas tendências de modo a

considerar esta evolução, da qual praticamente qualquer gênero musical fica vulnerável, visto

que a música é produto do homem que vive em sociedade, conforme Gerard Béhague (1999)

ao afirmar que o pesquisador deve conceber o compositor como indivíduo e como ser social e

cultural para que se entenda o processo da criação musical e as palavras de Ana Carolina D.

Escosteguy (2001) que esclarece que o foco central dos estudos culturais seria perceber as

intersecções entre as estruturas sociais e as formas e práticas culturais. Deixo claro que não

pretendo esgotar o tema e que minha abordagem é apenas uma entre várias possibilidades.

Para a audição das canções das bandas citadas neste artigo, recomendo acessar o site

http://musicaparaense.blogspot.com/.

1. Chegada do rock em Belém

Em Belém, conforme o jornalista Edgar Augusto, em entrevista no ano de 2001, nos anos

60 havia bandas que não eram numerosas e que reproduziam a imitação que a bandas do Rio

de Janeiro e de São Paulo faziam das bandas norte-americanas. Nesses primórdios do rock em

Belém estavam Jane Duboc como vocalista e guitarrista de uma banda formada só por

mulheres e Bob Freitas como guitarrista do grupo The Kings, que tocava inclusive música

instrumental e lembrava The Beatles, em que os integrantes usavam ternos e cabelos com

franja. Havia um grupo de uma colônia japonesa, chamado Os Orientais e muitas bandas de

baile que tocavam rock, como por exemplo, Os Incas e Os Panteras, sendo que essas bandas

tocavam em clubes e colégios da cidade.

No final de 1974 e início de 1975 surgiu o grupo “Sol do Meio Dia”, com composições

próprias e influenciadas pelo rock chamado progressivo (uma mescla de vários ritmos, como

jazz, blues, música erudita com rock); sua formação mais conhecida é: Rafael Lima no vocal,

Mini Paulo no contrabaixo, Magrus Borges na bateria, Odorico na guitarra e Zé Macedo na

percussão. O grupo variou seus componentes e o instrumental utilizando por vezes piano,

flauta, sax e violão e durou cerca de cinco anos.

2. A evolução do gênero no Pará

No início dos anos 80, enquanto o público brasileiro consumia os sucessos de bandas de

rock de Brasília, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul; em Belém, a banda Stress,

com Roosevelt Bala (voz e baixo), Leonardo Renda (teclados), André Lopes (bateria e voz) e

Pedro Valente (guitarra) foi a primeira a lançar nacionalmente um LP com composições da

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vertente heavy metal. O lançamento foi em 1982, na sede da Curuzu (Estádio Leônidas Sodré

de Castro), onde a banda The Podres, dos irmãos Beto e Regi, considerada a primeira banda

local da vertente punk, “abriu” o evento junto a outras bandas como a Chronos e a

Apocalipse. No ano seguinte a banda Stress partiu para o Rio de Janeiro e fez vários shows no

Circo Voador, tornando-se conhecida nacionalmente.

Era evidente nessa época o domínio do heavy metal e do punk na cena local; e ainda, a

realização do primeiro Rock in Rio, em 85, e outros festivais como o Hollywood Rock

popularizavam principalmente o heavy metal no Brasil e contribuíram, de certa forma , como

incentivo ao movimento rock em Belém.

Os shows aconteciam em colégios, bares, praças da cidade e logo o Teatro Experimental

Waldemar Henrique, localizado na Praça da República de Belém serviu como local de shows

de rock, encontros entre músicos e amantes do gênero e troca de fanzines, espécie de revista

de fãs que contém diversos assuntos, entre eles informações de shows, bandas e músicas. Em

1988, foi realizado o primeiro grande evento de rock no Teatro, que durou quatro dias, a

coletânea “Rock 1 – Independência ou Morte, em que tocaram bandas de punk, punk-oi,

transmetal, hardcore e até jazz, blues, reggae e outros gêneros com maior ou menor mistura

de ritmos, destacando-se as bandas Delinquentes, Morfeus, Baby Loyds, O Crack, Ácido

Cítrico, Nó Cego, Elmo de Zinco e Eccus.

No ano seguinte, aconteceu o Underground Festival, no Colégio Estadual Paulo

Maranhão, organizado por Jorge Luís “Pezão”, na época vocalista da banda Crepúsculo. Com

o intuito de congregar as bandas que existiam para “cavar” um espaço, Pezão conseguiu o

apoio da Secretaria de Cultura e levou onze bandas para o evento, o qual deveria ocorrer uma

vez por ano; porém, o governo Collor deu um golpe na poupança e na cultura fazendo com

que a organização ficasse parada por dois anos, realizando outra edição do evento apenas em

92.

Mesmo com dificuldades, na passagem dos anos 80 para os 90, surgiam vários eventos

com caráter de festivais, incentivando inclusive certo profissionalismo nas bandas, na dita

periferia, no centro da cidade e em distritos de Belém, como o Rock in Rio Guamá (na

Universidade Federal localizada no bairro do Guamá), o projeto Variasons que ocorria no

Sesc e no Centur (Fundação Cultural do Pará Tancredo Neves), o Fest Rock e o Baíto in

Rock, realizado pela Clandestina Produções, no Parque dos Igarapés, com um telão cedido

pelo Museu da Imagem e do Som e com premiação em dinheiro, bem como troféus para

grupos e/ou artistas que haviam se destacado no cenário rockeiro da cidade. O Baíto in Rock

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constituía uma homenagem aos músicos que compunham rock no Pará e já era considerado o

melhor do norte do Brasil.

No início dos anos 90 surgiam programas de rádio dedicados ao rock que incluía o

trabalho autoral produzido no Pará, nas rádios Cidade FM, Belém FM e Cultura FM;

merecendo destaque uma canção de Beto e Regi,da banda Insolência Públika (ex The Podres),

“Beirute está Morta”, iniciando com sons de metralhadora, com uma letra que relatava a

realidade da cidade de Beirute, tomada pela guerra. A rádio Cultura FM ainda possui o

mesmo programa, o Balanço do Rock, considerado pelo jornalista Beto Fares como “uma

porta aberta ao rock mais ‘pesado’ de Belém”. Esse programa estabeleceu um padrão de

qualidade para tocar as músicas das bandas locais de modo que estas, ao serem comparadas

com as de fora, não “deixassem a desejar”. Já havia estúdios bons, mas as próprias bandas não

se preocupavam com a qualidade, segundo o jornalista; foi então que em 1991 foi criado o

Estúdio Edgar Proença, nas instalações da FUNTELPA (Fundação de Telecomunicações do

Pará) para atender às necessidades da rádio e produzia gravações das bandas. Paralelamente

surgia uma loja com artigos específicos de rock, a Histeria, do Marcelo, vocalista da banda

Zênite; e também o empresário Ná Figueredo, que antes vendia camisas nas feiras de

artesanato, fundou sua loja homônima, com artigos voltados, em especial, ao gênero rock;

então o material dos grupos, como camisas, bonés, fitas k7, Lps e posteriormente CD’s, teve

lugar fixo para ser consumido. Hoje, o empresário possui um selo para gravação e distribuição

do trabalho das bandas, sendo um dos trabalhos mais conhecidos desse selo a coletânea Açaí

Pirão, lançada em 1999, a qual traçava um panorama da cena rock da época.

A partir dos anos 90, a cena começou a se fortalecer, inclusive com a vinda de bandas

nacionais, como Ratos de Porão e Sepultura, e internacionais da Alemanha e dos Estados

Unidos, para fazer show na cidade.

3. O auge do rock no Pará

O ano de 1992 iniciou com o Underground Festival II que, segundo Pezão, serviria para

consolidar o rock “pesado” paraense. O evento ocorreu no Teatro Waldemar Henrique que, na

época, era dirigido por César Machado, apresentando duas bandas por dia, totalizando doze e

recebeu no período de 21 a 26 de janeiro, sempre a partir das 21 horas e 30 minutos, um

público de headbangers radicais, punks e alternativos de todas as espécies, os quais ouviram

rock “pauleira”, heavy metal, trash, punk e até blues.

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Ao observar que a cena rock crescia, mesmo em espaços alternativos e sem grandes

apoios, e formava um grande público, alguns empresários, gravadoras, a imprensa e o

Governo do Estado resolveram investir no gênero. Foi então que surgiu o projeto mais ousado

até então: o Rock na Praça 24 Horas no Ar; um superprojeto que chamou a atenção da

diretoria do Teatro Waldemar Henrique para promovê-lo e que justificava essa realização

como uma homenagem às bandas que lotavam a pauta da casa. A Secretaria de Estado de

Cultura (SECULT) também apoiaria o evento que estava programado para os dias 4 e 5 de

abril de 1992, reunindo 25 bandas de diversos estilos e tendências do pop e do rock produzido

na capital, dividindo um espaço inédito na história do rock no Pará.

O espetáculo teria início às 21 horas do dia 4, num sábado, e só terminaria às 21 horas do

dia seguinte, sem qualquer pausa que desse para as pessoas voltarem para casa e retornarem

com os ânimos recuperados para a próxima atração. Foi então o momento das bandas já

consagradas e das iniciantes mostrarem seu trabalho a um público de aproximadamente duas

mil pessoas concentradas na Praça da República, no centro de Belém; e ainda, apreciando as

apresentações estava um representante da emissora MTV no Brasil. O projeto também

apresentava duas campanhas: uma direcionada a aguçar a consciência da população sobre a

necessidade da limpeza e conservação da cidade e a outra, a cargo da República do Pequeno

Vendedor que recolhia, durante o festival, doações dos populares com sentido de apoiar o

projeto de profissionalização dos meninos de rua que atuavam na área da Praça.

O rock, então, virou notícia nas rádios e nos jornais da cidade, pois conseguira atrair um

grande público e, aos poucos, vinha ampliando seus espaços. Contudo, esse evento jamais

teria duração suficiente para apresentar todo o universo do rock em Belém, visto que, pelos

registros do Teatro, cerca de 20 bandas ficaram de fora e ainda havia aquelas que nunca

chegaram a se apresentar no local.

Devido ao sucesso do evento, não tardou a SECULT programar a sua segunda edição, a

qual foi realizada nos dias 28 e 29 de novembro de 92, agora com 36 bandas na pauta. O

evento começou a chamar mais atenção nacionalmente e, na época, o rock já havia se tornado

um dos movimentos mais expressivos do campo cultural da cidade, pois até então 106 bandas

possuíam cadastro no Teatro, sendo quatro do interior do Pará. Mas, acreditava-se que faltava

um reconhecimento maior, de modo que as bandas fizessem suas obras serem apresentadas a

todo o Brasil, e havia as que escreviam seu release em inglês visando a chegada do seu

trabalho aos países de língua inglesa. A mídia local apoiava o movimento, mas havia o

preconceito com a cultura, a música produzida na região Norte, em geral, em detrimento da

produção no chamado eixo Rio-São Paulo. Na própria cidade de Belém ainda não havia o

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investimento esperado pelos músicos, por parte de donos de casa de show, empresas, entre

outros.

A terceira edição do Rock 24 Horas estava programada para o mês de abril de 1993. Neste

intervalo da segunda para a terceira edição, vários eventos aconteceram na cidade com o

público efervescente de sempre, como o Festival do Rock, na Casa do Rock, em 92, com

duração de seis dias; o projeto Chico’s Bar; a I Semana Rock, no Teatro Waldemar Henrique,

sob a direção de Fernando Rassy em 93, também por seis dias e o Troféu Edgar Augusto, pela

SECULT, em 93.

Antes da realização da próxima edição do 24 Horas, ocorreram alguns fatos: devido a

reclamações, principalmente de moradores dos arredores da Praça da República, afirmando

que a mesma ficava depredada, a SECULT resolveu mudar o evento para a descampada Praça

Kennedy (atual Praça Waldemar Henrique, localizada na Av. Marechal Hermes). Feita a

seleção de bandas que iriam participar do evento, duas bandas desclassificadas entraram com

recurso na coordenação do evento, pedindo que cinco bandas aprovadas fossem

desclassificadas por não terem 1 ano de atividade comprovada, como exigia o regulamento,

saindo, portanto, uma banda e entrando outra que estava na lista de espera, somando-se 22

bandas no total.

O evento iniciou no dia 24 de abril de 93, num sábado, às 20 horas e terminaria no

domingo, no mesmo horário, com intervalos às 6 horas e às 13 horas; além das bandas locais,

a banda mineira Virna Lisi também iria se apresentar. Porém, mais ou menos às 3 horas da

madrugada de domingo, durante o show da banda Jolly Jocker, segundo o depoimento de

coordenadores do evento, de barraqueiros e de algumas pessoas que formavam o público de

quase dez mil pessoas, conforme os jornais da época, um rapaz da plateia subiu ao palco e foi

abordado por dois homens da empresa de segurança Gang Mexicana, contratada para o

evento; resistindo à abordagem, o rapaz foi agredido e depois atirado ao meio do público, e

ainda, uma testemunha não identificada contou que o vocalista da banda teria incitado o

público a agredir os seguranças. Foi então que integrantes de gangues que estavam infiltradas

entre os expectadores, como dos Carecas e do Terror, armaram-se de pedaços de pau, pedras e

garrafas, investindo contra o palco na tentativa de agredir os seguranças, gerando uma

pancadaria geral, de onde saíram barracas, o camarim, instrumentos e equipamentos

quebrados e várias pessoas feridas. A polícia militar só chegou após o início da confusão.

No dia 25 de abril de 1993, o secretário de Estado de Cultura, Guilherme de La Penha

decretou o fim do projeto Rock 24 Horas. Mesmo assim, o projeto foi elogiado pelo produtor

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Pena Schimit que estava no momento do incidente e até hoje é referência histórica do rock

produzido no Pará.

Contudo, a maioria das bandas de rock, principalmente na atualidade, prega a não

violência na tentativa de desmistificar a imagem deturpada que as pessoas têm do movimento,

além da campanha contra as drogas, no intuito de romper a associação que as pessoas fazem

destas unicamente ao rock. Inclusive, após essa fatalidade, as bandas locais reforçaram isso

nos cartazes de shows, principalmente por meio de frases como “rock é diversão, não é

violência” e “no drugs”, sendo que as apresentações de bandas diminuíram

consideravelmente, ocasionando certo ócio à cena rock local, pois além desse episódio, em

que se fecharam inclusive as portas do Teatro Waldemar Henrique a pedido do secretário de

cultura Paulo Chaves, no governo de Almir Gabriel, em Belém não havia mercado com

informação suficiente para assimilar o trabalho das bandas. As próprias bandas não

conseguiram, em sua maioria, manter a sua produção.

Os integrantes das bandas sonhavam com a gravação de discos, como por exemplo, as

bandas Álibi de Orfeu e Mosaico de Ravena já vinham fazendo com um rock mais “pop”;

outras bandas recorriam a questões mais “regionais”, como a banda Adrenalina; talvez até por

conta da melhor aceitação por parte de um determinado público. E assim o rock vinha

passando por mais experimentações.

4. Um rock cada vez mais híbrido

Para que se entenda melhor a tendência do rock, ou de qualquer gênero musical, a se

mesclar a outras concepções musicais e literárias, principalmente quando repousa fora de suas

fronteiras culturais, geográficas e linguísticas, tomo por base o pensamento de Néstor García

Canclini (2008), estudioso do convívio hibridizado entre elementos “tradicionais”,

“modernos”. “locais” e “globais” nas sociedades e na cultura da América Latina. Este autor

afirma que as artes se desenvolvem em relação com outras artes: “o artesanato migra do

campo para a cidade; os filmes, os vídeos e as canções que narram acontecimentos de um

povo são intercambiados com outros. Assim as culturas perdem a relação exclusiva com seu

território, mas ganham em comunicação e conhecimento” (GARCÍA CANCLINI, 2008, p.

348). Portanto, na Amazônia, fonte riquíssima de culturas, informações, onde se vê o

crescimento da tecnologia, há um terreno fértil para a hibridação de que fala o autor.

Na passagem dos anos 80 para os anos 90, muitas bandas ousavam mais no que diz

respeito à mistura de gêneros em suas composições, e ainda sim figuravam no cenário rock,

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como relatei em minha monografia após ler alguns recortes de jornais numa biblioteca pública

em Belém:

Às vezes com um nome bem bolado ou com uma música bem arrumada, essas bandas figuravam a cena rockeira paraense de fim dos anos 80 e início dos anos 90. Em sua maioria, mostravam que era possível aclimatar o rock numa terra permeada por músicas do seu folclore, comidas típicas, lendas amazônicas etc., cantá-lo em língua portuguesa e até misturar estilos, como fazia o Orador, as ecléticas Nika, Ácido Cítrico, Paradoxo e a banda O Crack, que misturava rock, reggae e merengue, ou a Tribo que misturava rock e funk, por exemplo. E, mais tarde, vão aparecer bandas misturando o rock aos sons próprios da região amazônica (...) (MONTEIRO, 2001, p. 39).

Além destas, no final dos anos 80, surgiram grupos que começaram a fazer

experimentações rítmicas bastante relevantes, como o “Álibi de Orfeu”, que segundo o

baterista Rui Paiva, em entrevista em 2001, trabalhava numa linha “progressista

experimentalista”, cujo método consistia em juntar sons do dia-a-dia ao rock, como, por

exemplo, o ruído produzido por uma máquina de escrever. Posteriormente, o grupo passou a

usar computadores em suas apresentações. Também trabalhavam fusões, como a do jazz

tradicional com o baião do nordeste, buscavam inclusive elementos da música “negra” e

outros ritmos.

Essas experimentações tornaram-se mais evidentes nos anos 90, principalmente após o

período não favorável que coincidiu com o fim do Rock 24 Horas, com o surgimento de

bandas e um público mais aberto a experimentações novas cujas misturas apresentavam sons

“regionais”, aos acordes da guitarra, com efeitos de distorção, por exemplo; isso considerando

a “cena rock” em Belém. Também, nos anos 90, houve forte tendência em aliar músicas mais

universalizadas com músicas tradicionalmente ouvidas na região em que vive o compositor,

merecendo destaque o movimento Manguebeat que surgiu em Recife-PE e repercutiu no

Brasil e no mundo. Desse modo, os músicos brasileiros recebiam influências de músicas

‘atuais’ que vinham de fora e eram influenciados também pelos acontecimentos e sotaques de

suas respectivas localidades. Isto acontece, hoje, no Brasil e, é claro, com os músicos

paraenses. Observe-se parte do artigo de um jornal local anunciando um evento da época, em

que se percebe o encontro de bandas bem diversificadas num único evento:

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Heavy, death, alternativo, pop, punk são alguns dos rótulos sonoros misturados na terceira edição do “Rock Seis Horas”, que acontece neste domingo, a partir das 15 horas, no Complexo de São Brás. As bandas Corsário, Retaliatory, Master Satan, Moonshadon, Elegia, Soledad, Delinqüentes, Cravo Carbono, Carmina Burana, Jolly Joker, Mitra e Mohamed, consideradas destaques nos dois primeiros festivais, fazem cinco horas e meia de show, deixando o fechamento ao cargo da banda maranhense Ânsia de Vômito. (O LIBERAL, Caderno “Cartaz”, primeira página, Belém, sábado, 6 de dezembro de 1997)

Convém dizer que o termo “alternativo”, neste artigo, refere-se a bandas que não se

enquadravam no metal, no punk ou sequer no pop : “A tendência alternativa, “um rótulo para

a falta de rótulo” da mistura de levadas diferentes, fica por conta de Mohamed e Cravo

Carbono, que foi uma das selecionadas no Festival Feira do Som, com a música “Ver-o-

Peso”‟(idem). Curiosamente, o baterista da banda “Moonshadon”, com influências de MPB,

participou da primeira formação da banda Cravo Carbono e o baixista da “Mohamed” era

Bruno Rabelo que se tornou integrante permanente da Cravo Carbono. Em Belém ocorre

muito esse fenômeno de músicos que participam de várias bandas, levando suas influências

musicais para todas elas, e de uma banda que se desfaz e dois músicos, por exemplo, criam,

cada um, uma banda. Mesmo que esses músicos sempre se aproximem ou criem bandas

buscando sempre o mesmo estilo, encontrarão outros músicos com ideias rítmicas

diversificadas tornando o trabalho mais híbrido.

A imprensa enfatizava, portanto, a questão da mistura de gêneros e de bandas da cidade

com as de outras localidades num festival de rock e, neste mesmo artigo, pode-se observar

que os próprios organizadores desses festivais, geralmente músicos de bandas do gênero,

buscavam formar um público mais diversificado:

Segundo Kleber Tyrone, guitarrista do Jolly Joker e um dos produtores do festival, o “Rock Seis Horas” será uma pequena mostra dos trabalhos das bandas de rock paraenses (...). A intenção de fazer o público conhecer todos os estilos produzidos em Belém definiu a ordem das bandas. Kleber exemplifica: “Quem quiser assistir a todas as bandas de heavy vai ter que segurar um alternativo pelo meio. Aí o cara pode começar a gostar de outras bandas. (idem)

Eu estive presente na última edição desse evento, alguns anos depois deste anunciado

no jornal e pude perceber como isso funcionava. Um mercado “tradicional”, de arquitetura

neoclássica, em Belém abrigava pessoas de todas as idades para apreciarem canções com

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instrumental e letras com temas “modernos”; havia respeito por parte do público a todos os

estilos, entretanto, cheguei a ouvir o comentário de alguns músicos de que nos anos 80 havia

muito preconceito entre artistas e público de gêneros diferentes. Lázaro Magalhães, vocalista

da banda Cravo Carbono chega a comentar que, ainda nesta época, sofreu discriminação por

músicos que concentravam mais suas composições no gênero rock:

Era meio difícil, realmente, distinguir quem era quem, né, porque já era misturado, um pouco, a história e isso gerou algumas discussões, assim, entre grupos (...) em termos gerais, houve uma cisão, assim, a gente era chamado a banda da “baianada” e [havia] a[s] banda[s] que fazia[m] “o verdadeiro rock’n’roll” (...) em plenos os anos 90 você imaginar que alguém defendesse, ainda, um pouco isso, do que é legítimo, “fazer rock’n’roll”, aí tu ficas parando pra pensar assim: “- como assim, o cara quer defender “fazer rock’n’roll” no meio da Amazônia, no meio do Brasil, o Brasil já é complexo, 500 anos de complexidade, de “mistureba” danada!” e o rock já tinha se libertado disso; aí alguém levanta essa bandeira, tipo assim...aí, a pergunta é “– o que é rock’n’roll, realmente?”. Aí houve um certo distanciamento: havia uma galera que queria ser rock’n’roll e havia o Mangabezo, havia o Cravo Carbono, havia um pessoal que tocava na mesma célula, mas havia uma distância mesmo de pensamento, uma coisa meio esquisita. (Lázaro Magalhães, em entrevista em 18 de dezembro de 2010).

Com essas informações percebo que o cenário musical, em Belém, tornava-se cada vez

mais híbrido, porém, as bandas que optavam por mesclar o rock a outros elementos ou utilizar

vários elementos em suas composições, estando entre eles o rock, como no caso da banda

Cravo Carbono, acabavam por se apresentar muito ao lado daquelas que se voltavam mais ao

rock, tomando-o como seu único “estilo”, como se ele fosse “puro”, o que não é verdade ao se

considerar que este surgiu da fusão do rhythm-and-blues com o country and western, nos

Estados Unidos e sofreu, ainda, várias modificações até chegar ao Brasil, o que reflete a

indignação de Lázaro Magalhães.

5. As bandas e suas peculiaridades

Para exemplificar esse cenário musical híbrido em Belém, traçarei, agora, o perfil de

algumas bandas de meados doas anos 90 de modo que se note o ambiente cultural e musical

em que elas estavam inseridas.

Havia a banda “Epadu”, que surgiu entre 94 e 95, apostando em seus percussionistas para

imitar os sons da mata, com apitos, folhas de flandres, ossos, cascas de coco, pedaços de

ostra, telha etc. num ritmo mais “tribal”, usando curimbó, maracás, berimbau e outros

instrumentos, originalmente africanos, para dar um ritmo de carimbó, lundu, entre outros,

Page 11: Artigo O Rock na Amazônia

considerados da tradição paraense. Estes vão ao encontro dos sons da guitarra distorcida, do

contrabaixo elétrico e da bateria, instrumentos considerados modernos. Além de trabalharem,

também, com a fusão do rock a outros ritmos, incluindo brega, música indiana, indígena,

eletrônica. Posteriormente, esses inovadores fizeram experiências com música eletrônica e o

brega da região. O brega, por sua vez, é uma adaptação do ritmo rock da Jovem Guarda que

chegou a Belém nos anos 60. O resultado, portanto, seria uma mistura de rock, ska1, brega,

carimbó, música indiana, indígena, entre outras. Os integrantes desse tipo de composição

afirmam que “não dá para viver na Amazônia sem olhar o meio em que se vive”.

Nessa mesma linha, surgiu o grupo “Mangabezo” concomitante ao Manguebeat citado

anteriormente, com influências de músicas paraenses, brasileiras, frevo, jazz, música indiana,

africana, chinesa, mantras. O nome peculiar da banda se deve ao fato dos fiapos de manga

(fruta muito comum na cidade) ficarem entre os dentes e o beiço dos moleques que viviam

correndo pelas praças em busca da fruta, daí a fusão entre manga e beiço. A banda compunha

fazendo experiências com mistura de todos os ritmos que chegavam aos seus ouvidos, como

os já citados, e inovava também no instrumental, com a utilização de elementos antes

considerados “não musicais”, como cascas de ostras, chapas de raio-x, folhas de flandres,

pedaços de cano, panelas e frigideiras e, ainda, cornetas feitas de garrafas de refrigerante

descartáveis, tudo misturado ao som do contrabaixo, da guitarra e da bateria.

Em 1996, a banda de heavy metal, “Jolly Joker”, após gravar sua terceira demotape, ou

seja, um fita K-7, recurso de áudio das bandas, na época, elogiada pela imprensa nacional,

lançou o primeiro CD da história do “rock paraense”. A banda já inovava com misturas

momentâneas do heavy metal com a disco music e, neste CD, aconteciam as primeiras fusões

entre heavy metal e boi-bumbá.

As toadas de boi também foram utilizadas pela cantora Lu Guedes que, à frente da banda

“Maria-Fecha-a-Porta”, (nome de uma planta medicinal popularmente conhecida por ajudar

na cura de pedra nos rins) fazia releitura dessas toadas, numa interpretação mais falada que

cantada, lembrando rappers2, associada a uma batida mais eletrônica do boi e guitarras

distorcidas, com alguns fraseados de rock.

1 Gênero musical que surgiu entre a classe trabalhadora da Jamaica no fim da década de 50, com a combinação de ritmos caribenhos, como o calipso, por exemplo, e norte-americanos, como o jazz e o rhythm and blues.

2 Segundo Paul Gilroy (2001), cantores de rap, termo alternativo usado para o hip-hop por ser mais etnicamente marcado por influências africano-americanas que o próprio hip-hop, que considera uma cultura fruto das culturas vernaculares afro-americanas com seus equivalentes caribenhos .

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Para falar das próximas bandas, chamo a atenção para um fato recorrente no gênero

chamado MPB, o qual vem consolidando a união entre poesia e música, visto que a

convivência de músicos e poetas aumentou a partir do Modernismo e há a atração de músicos

por poemas contemporâneos de todas as tendências3. Interessante é observar nesse tipo de

composição, o fato de a mesma estabelecer um diálogo entre sons e ritmos da tradição

regional, como o baião e o samba, e sons e gêneros musicais provenientes de outras culturas

inseridas na cultura moderna, como o jazz e o rock. No caso da região amazônica,

especificamente em Belém, um multiculturalismo se apresenta nas obras de Ruy e Paulo

André Barata, grandes expoentes da MPB no Pará, e de outros artistas. No contexto do gênero

rock, destaco quatro bandas, em especial: a banda Norman Bates, a já citada Cravo Carbono, a

banda A Euterpia e a banda Coisa de Ninguém, ambas caracterizadas, principalmente por suas

letras poéticas.

A banda Norman Bates, criada em 1995, apesar de manter a formação clássica de guitarra,

baixo e bateria, o uso de distorção e dissonância na música, tinha nas letras de Carlos

Bremgartner, Nicolau Amador e Giovani Villacorta muitas metáforas, antíteses, jogo de

palavras que questionavam a relação do indivíduo com o meio em que vive, relatando a

realidade, as inconstâncias, as crises, as fraquezas e as contradições do ser humano, conforme

as palavras do vocalista Giovani. A banda chegou, inclusive, a musicar o poema “A

Esperança” de Augusto dos Anjos, poeta considerado pré-modernista.

A Cravo Carbono, criada entre 1996 e 1997 além de misturar timbres, harmonias e

melodias “tradicionais”, “modernas”, “locais” e “globais”, como guitarrada4 e rock, por

exemplo, mostrava também esses elementos nas letras de Lázaro Magalhães, com termos

típicos da região: “mano” ( para amigo ou irmão), água “minerar” (variação linguística que

suprime o “l” e coloca o “r” no fim da palavra) ou neologismos, como “cucicristo” (para

crucifixo) e Mundo-açu (o termo ‘açu’,do tupi, com a significação de ‘grande’ foi usado para

dar ideia da diversidade cultural da região amazônica). Essas ocorrências aliadas à liberdade

na métrica dos versos, entre outras características poéticas, dão continuidade, de certa forma,

ao movimento Modernista da década de 20 no Brasil.

3 Revela Antonio Manoel professor e doutor em Literatura Espanhola e Hispano-Americana, co-autor, junto a Carlos Daghlian de Poesia e Música (1985).

4 Tipo de lambada instrumental caracterizada pelo uso da guitarra elétrica solo como elemento principal da composição.

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A união de vários traços literários também se apresentou nas letras da banda A Euterpia,

das quais Antônio Novaes era o principal compositor. Criada em 1998, tinha como forte

característica a tendência a esse Modernismo, com liberdade total na escrita dos versos, em

que se encontravam citações de personagens históricos da literatura, como o gigante

Adamastor, de Camões, neologismos, como o título da canção “Gramótica” e muita sinestesia

ao se ouvir os termos “voz”, “dor”, “fumaça”, “concreto” nas composições cantadas e/ou

faladas, e que na maioria das vezes retratavam o caos, a confusão da cidade da era Moderna.

A Euterpia se diferenciava da Cravo Carbono que possuía guitarra, baixo e bateria procurando

extrair sons diversificados com esta formação, e acrescentava ao seu instrumental violão,

flauta, saxofone, escaleta numa mistura de ritmos bastante diversa, reinventando o brega, o

rock, o funk, o ska, entre outros.

O caos também foi um assunto muito presente nas composições da banda Coisa de

Ninguém, tanto na música quanto na letra. A banda, criada em 1998, nas universidades de

Belém, procurava reproduzir a angústia, a nostalgia, a revolta do homem que vive numa

sociedade permeada por injustiças sociais e políticas. A parte musical, com violão de cordas

de nylon com efeito de distorção, percussão e dois vocais, sendo um masculino falado e um

feminino cantado, buscava uma estética punk, porém mesclava ritmos que correspondessem

ao sentimento coletivo de então, ou seja, a música se tornava o próprio caos. As letras se

aproximavam da produção poética pós-concreta e eram escritas majoritariamente pelo poeta e

vocal Clei Sousa que escrevia com certo sarcasmo e ironia utilizando-se de muitas metáforas

e neologismos para (re) tratar fatos do cotidiano e denunciar alguns absurdos cometidos pelo

estado, por meio de seus aparelhos ideológicos.

Esse período, principalmente com essas bandas, marcou a história da música em Belém

como o início de uma fase de muitas misturas de estilos musicais. As ressonâncias,

tendências, parecem que pairam no ar e, de tempos em tempos, ou de forma cada vez mais

acelerada, alguns antenados captam as ondas criativas, transgressoras e as põem em prática.

As bandas citadas neste tópico acabaram, à exceção da Norman Bates, contudo, hoje a cidade

vive novamente uma efervescência artístico-cultural voltada para o rock que sempre encontra

músicos que tentam manter a sua essência e outros que o transformam em apenas mais um

elemento de suas composições.

Page 14: Artigo O Rock na Amazônia

6. As novas tendências

Atualmente, a cena musical em Belém encontra todas as possíveis maneiras que o rock

possa se apresentar. Há bandas conhecidas fora de Belém, fato que se concretizou melhor com

a ajuda dos recursos da internet, e isso engrandece a cena local. Bandas como Turbo, Madame

Saatan, Suzana Flag, Navalha, A Red Nightmare, Tábita Veloso & os Forjadores,

Crisantempo, A República Imperial, Renato Menezes & o Ministério Imaginário, Aeroplano,

Álibi de Orfeu, Ataque Fantasma, Buscapé Blues, Coletivo Rádio Cipó, Zeromou, Folha de

Concreto, La Orchrestra Invisíel, Nó Cego, O Outro, Os Egoístas, Os Grileiros, Redima,

Dharma Burns, The Baudelaires, Iza e os Agregados, All Still Burns, Hellride, Gaia Rock

Band, Silence for Salvation, Ut Opia, Codex, Mathilde, Blind for Giant, Junior Saldanha,

Muyrak, Cais Virado, Vinyl Laranja, Mymeses, Retrívia, Kadafalso, Molho Negro, Consenso

Ilusivo, The Tump, Antcorpus, Lauvaite Penoso, Rennegados, Telaviv Metal, Scream of

Death, Seven Foot, Methastasy, Bixo Morto, 16-Bits, Disgrace and Terror, Clepsidra,

Sequelas, Licor de Xorume, Gibbamones, Resistência Suburbana, O Teju de Terno,

Adipocera, Johny Rockstar, Morte Suicida, Prima-Matéria, Baixo Calão, DNA; algumas bem

antigas outras recém-formadas, de vários lugares do Pará, para todos os gostos, pesadas,

alternativas ou pops compõem um mosaico musical cada vez maior e mais profissional.

A banda Delinquentes, da vertente hardcore, merece destaque como a mais antiga (desde

1985) que permanece na ativa e que é talvez a mais conhecida do gênero rock Brasil afora; já

trocou muito seus componentes, porém, o vocal Jayme Katarro se mantém firme e tem hoje

um estúdio de ensaio por onde passam praticamente todas as bandas que fazem a cena do rock

em Belém. Como grande incentivador cultural, realiza o evento Fabrikaos, que já vai para a

sua 6ª edição. A banda possui dois álbuns oficiais e lançou seu primeiro DVD intitulado

“Planeta dos Macacos”, dia 8 de junho de 2013, no bar Mormaço, que há um bom tempo

recebe o público rock na cidade. Após o evento, Jayme comemorou o sucesso no site de

relacionamento da banda:

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Até os donos do local parabenizaram o evento, dizendo que nunca mais havia dado tanta gente num sábado, em festa de rock autoral. Um público contagiante lotou o bar localizado estrategicamente na beira do rio da cidade. Foi uma satisfação enorme ver uma galera que nunca mais havia aparecido em shows, se misturando com a nova geração e outros nem 8 nem 80. O som e iluminação estavam ferozes, o que garantiu o excelente resultado final.5

Outros eventos, neste mesmo espaço e em outros lugares, como teatros (inclusive o Teatro

Experimental Waldemar Henrique), praças, espaços públicos como o Memorial dos Povos,

acontecem razoavelmente. O CCAA Fest, o Madruga Fest, o Infesto Cultural Expresso

Marituba, o Rock na Veia Ananindeua, o Festival Eco Rock, o Festival Se Rasgum, o Projeto

Invasão Caipira e o Festival Belém Rock Contra a Fome são alguns dos eventos que movem a

cena rock no Pará; alguns mais antigos, outros mais recentes. E, como sempre aconteceu,

surgem bandas novas e outras acabam, mas a cena permanece tornando Belém do Pará um

local que construiu uma trajetória própria em torno desse gênero.

Considerações Finais

O rock tomou muitos outros rumos em várias partes do mundo, inclusive no local onde

foi criado. A história e o campo das composições das bandas citadas revelam que as mesmas,

inseridas no contexto latino-americano, absorveram e absorvem várias identidades e um

multiculturalismo que se mostra presente no Brasil, e em especial na região amazônica. A

trajetória, a vivência cultural do músico, em determinada época e espaço influenciam

diretamente as suas composições musicais, conforme o pensamento de John Blacking (1990)

que entende a música como o som humanamente organizado. Mesmo os músicos que

pretenderam ou pretendem se aproximar do rock ouvido diretamente do seu local de origem,

jamais conseguirão reproduzi-lo da mesma forma, considerando-se que Belém tem outras

linguagens, outras culturas; em contraposição, os músicos que não pretendem enfatizar o

gênero em suas composições, por vezes tem sua produção associada a ele, seja pelo uso de

uma guitarra elétrica, seja, por algum tipo de atitude, alguma ousadia na sua música, letra ou

performance, visto que o rock é tido como sinônimo de atitude. A tecnologia tem contribuído

muito para o acúmulo de informações de diversas fontes e observo que os músicos, em

Belém, vivem numa constante busca pelo novo, novos equipamentos, novos timbres, novas

combinações de acordes ou de palavras, no caso da canção; fazem, então seu produto musical

5 Jayme Katarro, disponível em: < https://www.facebook.com/delinquentes.hc?directed_target_id=0>

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e querem devolvê-lo para o mundo. E o mundo está “de olho” na música “paraense”.

Considero importante fonte de pesquisa o músico que produz esse gênero que já foi

considerado “jovem” e que arrasta multidões para seus shows, seja aquele que prima pelo

bom e velho rock’n’roll, seja aquele que nem menciona o gênero em suas entrevistas, cada um

com o seu sotaque, sua criatividade, deixando o seu legado para a história do rock

considerado paraense.

Page 17: Artigo O Rock na Amazônia

Referências Bibliográficas

BÉHAGUE, Gerard. A etnomusicologia latino-americana: algumas reflexões sobre sua

ideologia, história, contribuições e problemática. In: II SIMPÓSIO LATINO-AMERICANO

DE MUSICOLOGIA, 1999, Curitiba. Anais.... p. 41-69.

BLACKING, John. How musical is man? Seattle: University of Washington Press, 1990.

DAGHLIAN, Carlos (org.). Poesia e música. São Paulo: Perspectiva, 1985.

ESCOSTEGUY. Ana Carolina D. Cartografias dos estudos culturais – uma versão latino-

americana. Belo Horizonte: Autêntica, 2001.

GARCÍA CANCLINI, Néstor. Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da

modernidade. 4. ed. Trad Heloísa Pezza Cintrão; Ana Regina Lessa. São Paulo: Editora da

Universidade de São Paulo, 2008.

GILROY, Paul. O atlântico negro: modernidade e dupla consciência. Trad. Cid Knipel

Moreira. São Paulo: Ed. 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de

Estudos Afro-Asiáticos, 2001

MONTEIRO, Keila. A releitura do rock na capital paraense. 2001. 94 f. Trabalho de

Conclusão de Curso (Graduação em Educação Artística – Habilitação em Música) – Centro de

Ciências Sociais e Educação, Departamento de Artes, Universidade do Estado do Pará,

Belém.

MONTEIRO, Keila. O Peixe Vivo na Amazônia: um mundo-açu nas canções da banda

Cravo Carbono. 2011. 99 f. Dissertação (Mestrado em Artes) – Instituto de Ciências da Arte,

Universidade Federal do Pará, Belém.

Discográficas

AÇAÍ PIRÃO. Belém: Ná Figueredo Rec, 1999. 1 CD.

A EUTERPIA. Revirando o Sótão. Belém: Ná Records, 2006.1 CD.

ÁLIBI DE ORFEU. Álibi de Orfeu. Belém, 1992. 1 disco sonoro.

COISA DE NINGUÉM. Coisa de Ninguém. Belém: Ná Figueredo Rec, 2006. 1 CD.

Page 18: Artigo O Rock na Amazônia

MOSAICO DE RAVENA. Cave Canem. Belém, 1992. 1 disco sonoro.

CRAVO CARBONO. Peixe Vivo. Belém: Cardume Produções, c 2001. 1 CD.

NORMAN BATES. Norman Bates. Belém: Ná Figueredo Rec, 2002. 1 CD.

PAULO ANDRÉ BARATA. Nativo. Rio de Janeiro, 1978. 1 disco sonoro.

STRESS. Stress. Rio de Janeiro, 1982. 1 disco sonoro.

Eletrônicas

http://musicaparaense.blogspot.com/.

http://issuu.com/revistapzz/docs/rafaelima

http://pt.wikipedia.org/wiki/Stress_(banda)

http://www.metalpara.com.br/2013/07/clipe-verde-mar-alibi-de-orfeu.html

http://www.paramusica.com.br/pagina/bafafadetalhe/ID/1003

http://pt.wikipedia.org/wiki/Fanzine

http://belemrockcontrafome.blogspot.com.br/

http://www.diarioonline.com.br/noticia-250762-.html

http://www.diarioonline.com.br/noticia-253945-.html

https://www.facebook.com/IvFestivalRockNaVeiaAnanindeua

http://delinquenteshc.blogspot.com.br/2012/06/resenhas-de-outros-blogs.html

http://toscotodo.blogspot.com.br/2012/08/entrevista-com-jayme-katarro-do.html