26
UMA ANÁLISE CRÍTICA DO ENSINO DO DETERMINANTE Marco A. P. Cabral (IM-UFRJ) [email protected] 1. Introdução Para contextualizar o ensino de determinante dentro da Álgebra Linear (AL daqui por diante), iniciamos apresentando algumas diretrizes gerais. Uma referência importante no ensino de AL na Universidade é o estudo financiado pela NSF (National Science Foundation, o CNPq americano) feito em 1990 por quatro pesquisadores de Matemática e Educação Matemática (publicado oficialmente somente em 1993) que formaram o Linear Algebra Curriculum Study Group (LACSG). Eles organizaram um Workshop com professores de Matemática e com clientes dos cursos (departamento de engenharia por exemplo). Descrita em Carlson et al (1993), apresenta cinco recomendações quanto ao ensino de AL em um primeiro curso na Universidade: (a) ementa deve corresponder às necessidades dos clientes; (b) primeiro curso deve ser orientado para matrizes; (c) considerar interesse e necessidade dos alunos; (d) utilizar tecnologia; (e) deve-se ter um segundo curso. É dito que no novo papel da AL para cientistas e indústria deve-se de-enfatizar abstração e colocar mais ênfase em resolução de problemas e aplicações que motivem,

Artigo para ser submetido ao ENEM

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Artigo para ser submetido ao ENEM

UMA ANÁLISE CRÍTICA DO ENSINO DO DETERMINANTE

Marco A. P. Cabral (IM-UFRJ) [email protected]

1. Introdução

Para contextualizar o ensino de determinante dentro da Álgebra Linear (AL daqui por

diante), iniciamos apresentando algumas diretrizes gerais. Uma referência importante no

ensino de AL na Universidade é o estudo financiado pela NSF (National Science

Foundation, o CNPq americano) feito em 1990 por quatro pesquisadores de Matemática

e Educação Matemática (publicado oficialmente somente em 1993) que formaram o

Linear Algebra Curriculum Study Group (LACSG). Eles organizaram um Workshop

com professores de Matemática e com clientes dos cursos (departamento de engenharia

por exemplo). Descrita em Carlson et al (1993), apresenta cinco recomendações quanto

ao ensino de AL em um primeiro curso na Universidade:

(a) ementa deve corresponder às necessidades dos clientes;

(b) primeiro curso deve ser orientado para matrizes;

(c) considerar interesse e necessidade dos alunos;

(d) utilizar tecnologia;

(e) deve-se ter um segundo curso.

É dito que no novo papel da AL para cientistas e indústria deve-se de-enfatizar

abstração e colocar mais ênfase em resolução de problemas e aplicações que motivem,

preservando o nível atual de rigor. Com relação aos determinantes recomenda:

(a) determinantes surgem naturalmente na resolução de sistemas 2x2 e 3x3;

(b) as propriedades elementares são facilmente descobertas ou ilustradas com as

expressões correspondentes;

(c) verificações formais devem ser evitadas;

(d) tópicos principais devem ser: expansão em cofatores, determinantes e operações

nas linhas; det AB = det A det B e regra de Cramer.

O eixo desta proposta segundo Day e Kalman (2001) é utilizar aplicações como

motivação para o estudo. Ela veio como resposta ao fato que os currículos de AL de

muitas escolas não se adequavam às necessidades dos alunos que eles serviam

(MINGUS (1995)). Como conseqüência a ênfase passou para matrizes e aplicações,

Page 2: Artigo para ser submetido ao ENEM

reduzindo o tempo com conceitos abstratos. Esta influência foi muito grande nos livros

textos modernos (inclusive no título dos livros: somente para citar dois, Anton – Rorres:

Álgebra Linear com Aplicações e Lay: Álgebra Linear e suas Aplicações).

Uma visão histórica desta evolução curricular é dada por Cowen (1997). Nos últimos

anos o curso de AL passou de um curso abstrato de matemática para um primeiro curso

em demonstrações e se tornou em um curso orientado para matrizes e aplicações. A

modificação de ênfase mais recente pode ser explicada pelo fato que a introdução dos

computadores tornou práticos a resolução de sistemas que eram impossíveis há algumas

décadas atrás. Um exemplo recente é o programa Matlab, baseado em matrizes e

popular em aplicações na engenharia. Esta pressão é forte para modificar de um curso

de espaços vetoriais abstratos em curso de computação com matrizes e teoria que

suporte isso.

Com relação ao ensino médio no Brasil, consultando o PCNEM+ observamos que as

diretrizes não fazem menção do determinante diretamente. Fala-se sobre “a resolução de

sistemas de duas equações e duas incógnitas para sistemas lineares 3 por 3, aplicando

esse estudo à resolução de problemas simples de outras áreas do conhecimento” e

também, dentro de parte flexível do currículo de “cada escola, fazer uma abordagem

mais qualitativa e profunda”. É, portanto, bastante vaga.

Por contraste, ainda no ensino médio, mas nos EUA, o currículo oficial do estado da

Califórnia (vide California State Board of Education (1997)) determina, com relação à

determinante que os alunos saibam computar determinantes 2x2 e 3x3 além de se

familiarizar com interpretação geométrica como área e volume. Note que se faz aqui,

de forma explicita, a associação com interpretação geométrica.

Um risco em todos os cursos básicos, mas que afeta bastante o ensino de AL é (HAREL

(1997)) a multiplicação de teoremas de forma redundante. Um exemplo disso é chamar

de lema (ou teorema) o fato do determinante de uma matriz diagonal ser igual ao

produto dos elementos da diagonal: isto é um mero exercício. Ao facilitar o acesso aos

resultados para resolução dos exercícios, treinam o aluno a ser meros buscadores de

teoremas ao invés de incentivar o entendimento e dedução de conseqüências triviais.

Isto torna os livros em tratados enormes, que acabam não somente assustando os alunos

2

Page 3: Artigo para ser submetido ao ENEM

como desestimulando-os a ler e estudar o texto: vão diretamente fazer exercícios e

somente buscar resultados necessário. Os textos devem ser organizados em torno de

poucas idéias centrais, apresentando também a necessidade das definições e teoremas,

com motivações para as demonstrações.

2. Dificuldades no Aprendizado de Álgebra Linear

Segundo Carlson (1993) os alunos não encontram dificuldade na parte inicial do curso

de AL (resolver sistemas, matrizes) mas, quando começa parte mais abstrata

(subespaços, espaço gerado, independência linear) parece que uma névoa atinge a

classe: eles ficam confusos e desorientados. Algumas razões são:

(a) AL é ensinado muito cedo (segundo período) para alunos imaturos;

(b) tópicos com subespaços e independência linear são conceitos, e não algoritmos;

(c) algoritmos diferentes são necessários em contextos distintos: para se determinar

independência linear de vetores e de funções por exemplo;

(d) conceitos são introduzidos sem conexão com experiência anterior do aluno e sem

exemplos significativos de aplicações.

Existem segundo Day e Kalman (1998) e (2001) uma visão divergente quanto ao papel

do primeiro curso de AL: continuação da seqüência de cálculo, com ênfase em Rn ou

um primeiro curso de estrutura matemática (construção e entendimento de

demonstrações)? Estas duas visões divergentes são expostas por Uhlig (2006) como

transmitir fatos e formulas (como numa seqüência de cálculo) ou entendimento (e

intuição) matemática.

A proposta do LACSG é criticada por Dubinsky (1997) pois a identificação aparente

(embora não fosse a intenção do grupo) de abstrato com inútil e portanto a associação

de concreto com útil é errada. Dá a entender que o concreto seria calcular com matrizes,

correndo o risco de dar ênfase em procedimentos mecânicos ao invés de enfatizar

conhecimento. Por outro lado, Mena (1997) faz uma autocrítica de sua postura anterior

que generalização é (sempre) positiva. Argumenta que pessoas se comunicam através de

exemplos concretos: o abstracionismo é natural para os matemáticos, mas não para a

maioria das pessoas.

3

Page 4: Artigo para ser submetido ao ENEM

Uma saída para este dilema (concreto x abstrato) (Uhlig (2002b)) é fazer a transição de

métodos e fórmulas para conceitos abstratos ao longo do semestre do curso. No início se

evita abordagem sofisticada do tipo definição-lema-prova-teorema-prova para se

preparar, ao longo do curso, lentamente, para provas e rigor matemática.

São criticadas em Uhlig (2006) diversas abordagens alternativas. Álgebra abstrata

(maneira pré-1960; van der Waerden (1936), Halmos (1942), Dieudonné (1948

'Bourbaki`) é abstrata e não desenvolve conceitos numéricos úteis com fatoração de

matrizes. Software proporciona aprendizado muito lento. Ensino através de problemas

(aplicações) é agradável para professores e alunos mas deixa pouco conhecimento

permanente com os alunos. A solução apresentada é ensinar através de primeiros

princípios e conceitos básicos simples que podem ser utilizados em aplicações e em

teoria mais abstrata. Utilizar a intuição geométrica pode ser limitante quando se tenta

passar para dimensão n.

Outro que alerta para os perigos da motivação geométrica é Harel (1999). Não obstante

as boas intenções, quando a geometria é introduzida antes do conceito ter sido formado

o aluno fica restrito ao mundo geométrico (dimensão 2 ou 3) dos vetores, não

conseguindo mover para o caso geral em Rn. Ressalta que a geometria deve ser utilizada

para solidificar os conceitos depois que eles estão ou começaram a ser formados. Um

exemplo é independência linear, onde a introdução via vetores colineares forma uma

imagem mental tão poderosa que é difícil de ser apagada depois.

3. Possibilidades para definir o Determinante

Existem diversas alternativas para a definição inicial da função determinante. As três

que aparecem normalmente nos livro-textos de AL são:

(a) Combinatória. Define-se permutação par/impar e depois o determinante como o

produtório de permutações de elementos com sinal. Conhecida como fórmula de

Leibnitz;

4

Page 5: Artigo para ser submetido ao ENEM

(b) Recursiva. Através da expansão (recursiva) em cofatores. Conhecida como

fórmula de Laplace;

(c) Forma multi-linear alternada. Determinante é a única forma multilinear alternada

tal que aplicada na matriz identidade vale 1. Segundo Elon (1996) feita

originalmente por Weistrass;

Outras possibilidades, bem menos conhecidas, são:

(d) Geométrica. Num trabalho ousado, Hannah (1996) propõe que se defina o

determinante, em analogia com a definição de integral dada em cálculo como

“área embaixo do gráfico”, como a área/volume (com sinal) do

paralelogramo/paralelepípedo gerado pelas colunas da matriz. Baseado nesta

definição ele prova que o determinante é uma forma multilinear alternada. A

propriedade de ser alternada é comparada com o fato de .

Outra referencia para esta abordagem é Kalman (2007);

(e) Operações elementares. Definir como função que se modifica de acordo com

operações elementares na matriz (BOGART (1989)). É uma variante (menos

abstrata) da definição como forma multilinear alternada;

(f) Autovalores. Axler (1995) e Uhlig (2003) desenvolvem a teoria de

autovalores/autovetores sem determinante. Depois definem o determinante como

o produto de autovalores (com multiplicidade). Ver a Seção 7 (Apêndice) para

detalhes;

(g) Propriedade do produto. Numa abordagem pouco conhecida Cullen e Gale (1965)

mostra que existe uma única função que possui a propriedade

det(AB)=det(A)det(B) e com uma certa normalização (não basta que determinante

da identidade seja 1). Nesta abordagem, uma das principais propriedades vira

definição.

Observe que algumas definições são focadas no cálculo do determinante ((a), (b) e (f)) e

outras em algumas de suas propriedades ((c), (d), (e) e (g)). Isto indica dois caminhos

possíveis: definir fórmula e deduzir propriedades ou definir através de propriedades e

depois deduzir fórmulas.

5

Page 6: Artigo para ser submetido ao ENEM

De forma geral, definir através de propriedades é um ponto de vista mais sofisticado.

Por outro lado é mais elegante. Neste sentido, a definição geométrica (d) se encontra no

meio do caminho: é mais sofisticada do que definir fórmula mas se conecta com a

intuição por ser de natureza geométrica. Discutiremos mais estes pontos de vista na

Seção 6.

4. Como os livros apresentam

Fizemos um levantamento em livros de álgebra linear de diversas gerações: pré-1970,

1970-1990, pós-1990. Dividimos os livros quanto a como define determinante.

(a) combinatória: Shilov (1971), Boldrini (1978), Steinbruch e Winterle (1987),

Lipschutz (1994) , Anton e Rorres (2001), Anton e Busby (2006);

(b) recursiva: Lang (1972), Banchoff e Wermer (1992), Lay (1997), Leon (1998),

Uhlig (2002a);

(c) forma multilinear: Halmos (1942), Hoffman e Kunze (1961)1, Rudin (1964),

Courant e John (1965), Strang (1993), Janich (1994), Lima (1996).

O Halmos (1942), considerado (COWEN (1997)) o primeiro livro texto de AL de

graduação, não define explicitamente determinante: define casualmente usando a idéia

de forma multilinear alternada. Mesmo livros tão recentes quanto Carvalho (1974)

simplesmente não falam sobre determinantes.

Note que a definição por forma multilinear aparece nos livros mais antigos (HALMOS

(1942)) e continua em livros modernos de caráter mais avançado (JANICH (1994) e

Lima(1996)) e em livros elementares de autores com motivação mais matemática (como

o Strang(1993)) pela elegância do tratamento.

A definição combinatória surge depois e permanece popular. No livro-texto de Boldrini

et al (1978), antes de iniciar a definição combinatória de determinante, alerta ao leitor

que “talvez seja conveniente avisá-lo de que o conceito de determinante envolve muitos

1 Na realidade definem como forma multilinear tal que se duas linhas são iguais a função vale zero (equivalente a simetria quando no corpo do espaço vetorial ).

6

Page 7: Artigo para ser submetido ao ENEM

símbolos, o que dificulta sua leitura...”. Quase que pede desculpa pelo desenvolvimento

que vai começar …

A definição recursiva, cuja primeira aparição detectei em Lang (1972), em consonância

com recomendação do LACSG, foi escolhida por diversos autores envolvidos

diretamente com o estudos sobre ensino de AL: Lay (1997), Leon (1998) e Uhlig

(2002a).

Outro ponto que avaliei é onde aparece a definição de determinante.

(a) Inicio, logo após sistemas lineares: Shilov (1971), Lay (1997), Leon (1998),

Anton e Rorres (2001);

(b) antes autovalores/autovetores: Rorres e Busby (2006), Hoffman e Kunze (1961),

Halmos (1942), Banchoff e Wermer (1992), Lima (1996), Lipschutz (1994), Lang

(1972), Strang (1993), Boldrini (1978), Janich (1994);

(c) final: Steinbruch e Winterle (1987).

Embora seja possível abordar determinante no início do curso (em torno do segundo

capítulo) poucos o fazem. Note que o Anton trocou a posição entre seu livro de 2001 e

de 2006.

Finalmente pesquisamos quais livros apresentam ligação entre determinante e volume.

Embora seja uma ligação essencial, por exemplo, na mudança de variáveis em integrais

múltiplas, não está presente na maioria dos livros. Pela mesma razão – sua conexão com

integrais – encontramos abordagem de determinante em livros de cálculo tais como

Apostol (1964), Courant e John (1965) e Rudin (1964). Uma abordagem muito boa mas

um pouco mais sofisticada está em Lima (1993), que mostra a relação entre

determinante e volume de transformações afins.

Relaciona determinante e volume: Lang (1972), Banchoff e Wermer (1992), Lima

(1993), Strang (1993), Lipschutz (1994), Lay (1997), Uhlig (2002a), Anton e Busby

(2006) (não aparecia em Anton e Rorres(2001).

Note que aqui aparecem, com exceção do Leon, todos os livros que definem

determinante de forma recursiva, incluindo o precursor deles Lang (1972).

7

Page 8: Artigo para ser submetido ao ENEM

Quanto a uma das preocupações do LACSG, começar motivando 2x2 e 3x3, aparece

em: Lang (1972), Boldrini (1978), Banchoff e Wermer (1992), Strang (1993), Lipschutz

(1994), Leon (1998), Lay (1997), Anton e Busby (2006). Em livros de cálculo antigos

como o Apostol (1964) e Courant e John (1965) já acontecia esta preocupação, pois o

foco de um curso básico de cálculo de várias variáveis é em R2 e R3.

Este tipo de abordagem aparece de forma ainda mais intensa, não somente para o

determinante como para toda AL em Banchoff e Wermer (1992), um livro

contemporâneo do LACSG. pois apresenta um capitulo para AL em dimensão 1,

dimensão 2, dimensão 3 e depois dimensão n. Em cada um destes capítulos aparecem

todos os conceitos e geometria das transformações lineares. Somente depois disso passa

a falar de espaços vetoriais.

5. Propriedades do Determinante

As propriedades mais importantes e suas utilidades são:

(a) relação entre determinantes e operações elementares. Implica em método para o

cálculo do determinante que envolve menor numero de operações. O determinante

é o produto de pivots, contabilizando o sinal pela troca de linhas;

(b) det(AB)=det(A)det(B); utilizada em toda a teoria;

(c) det(At)=det(A); passar todas as propriedades de linha para colunas (e vice-versa);

estudo de matrizes ortogonais;

(d) determinante e volume; mudança de variáveis em integrais;

(e) regra de Cramer; solução de sistema, fórmula da inversa.

Vamos agora relacionar a definição escolhida para o determinante e como provar as

propriedades acima.

A propriedade (a) é a mais fácil de todas independente da definição utilizada. No caso

das definições por forma multilinear e por operações elementares, esta propriedade é

praticamente a definição. Com definição geométrica a propriedades (b) é fácil e a (c)

8

Page 9: Artigo para ser submetido ao ENEM

difícil. Com definição combinatória, se inverte: a (c) é fácil e a (b) difícil. Com a

definição recursiva tanto a (b) quanto a (c) são difíceis.

A propriedade (b) det(AB)=det(A)det(B) pode ser provada de diversos modos.

1. Força bruta partindo da definição combinatória, fazendo manipulação dos índices.

2. Com a definição recursiva, por indução.

3. Uma construção mais elegante é utilizar a decomposição em matrizes elementares.

Utiliza-se as propriedades do determinante com relação às operações elementares.

4. Numa construção ainda mais elegante e menos conhecida, seguindo Rudin (1964),

Strang (1993), Janich (1994) e Hannah (1996), defina f(A)=det(AB)/det(B).

Mostre que f é multilinear simétrica (ou f é o volume) e f(I)=1. Portanto, pela

unicidade, f(A)=det(A).

A propriedade (c) det(At)=det(A) pode ser provada de diversos modos.

1. Força bruta partindo da definição combinatória.

2. Decompor em matrizes elementares, tomar transposta dos dois lados, utilizar

propriedade do produto e calcular determinante dos dois lados. Caso se tenha

introduzido decomposição LU, pode ser traduzido como escrever PA=LU e

aplicar este procedimento.

3. Usando definição recursiva Janich (1994), embora seja caminho difícil.

6. Impactos no Ensino e Conclusões

Devemos, de acordo com o LACSG, pensar nas necessidades dos alunos. Por isto a

pergunta básica é qual a utilidade do determinante para os alunos do ensino médio e do

ensino superior:

(a) cálculo de áreas e volumes;

(b) mudança de variáveis em integrais múltiplas (determinante jacobiano);

(c) cálculo de autovalores;

9

Page 10: Artigo para ser submetido ao ENEM

(d) resolução de sistemas lineares e inversão de matrizes (regra de Cramer).

O cálculo de áreas e volumes é, sem dúvida, uma aplicação fundamental do

determinante. Deve ser o foco no ensino médio. Uma parte mais avançada, omitida

usualmente da teoria, mas que pode ser encontrada em Lima (1993) ou nos exercícios

de Shilov (1971), é o determinante de Gram, que permite calcular áreas e volumes de

figuras em Rn.

No ensino superior concordamos com Axler (1995) que o uso principal do determinante

é na fórmula de mudança de variáveis em integral múltipla. Acrescentamos também o

cálculo dos autovalores, embora seja mostrado por ele (vide Apêndice) que isto pode ser

feito sem o uso de determinante.

Quanto a aplicação de resolução de sistemas lineares, é consenso na comunidade

científica que no computador não pode ser feita utilizando determinante: é muito

custoso e gera erros grandes nas soluções. Isto tem que ser levado em conta no ensino

de determinante em todos os níveis. Um livro antigo como Hoffman e Kunze (1961) já

dizia que “não existe dúvida da beleza da regra de Cramer mas é uma ferramenta

ineficiente para se resolver sistemas lineares pois envolve muitos cálculos ….

esperamos que o leitor coloque mais ênfase no entendimento do que a função

determinante é e como ela se comporta (suas propriedades) do que em como se calcula

o determinante de matrizes específicas”.

Com relação ao ensino médio é importante notar que a regra usual (regra de Sarrus)

deve ser abandonada pois funciona somente para matrizes 3x3. Conforme mostrado por

Osborn (1960) ela não pode ser generalizada para matrizes 4x4 e maiores. Ela deve ser

substituída pela recursiva (expansão em cofatores), ainda que se apresente somente

determinante de matriz 3x3 pois esta se generaliza e permite que aluno explore estrutura

da matriz (zeros em algumas colunas ou linhas) para facilitar o cálculo. Enquanto a

regra de Sarrus é mera memorização, a expansão em cofatores permite manipulações

inteligentes do determinante. Deve-se deduzir a relação entre determinante e área do

triângulo/paralelogramo pois a geometria é muito simples. Conforme observamos na

introdução, o PCNEM+ não faz menção a determinante. Este tratamento mais detalhado

10

Page 11: Artigo para ser submetido ao ENEM

deveria ser colocado numa versão futura do PCNEM+, pois a omissão deixa o campo

aberto para qualquer tipo de tratamento.

Com relação ao nível superior, num primeiro curso de AL creio que são mais

apropriadas as definições geométrica e a recursiva (expansão por cofatores).

A recursiva é adequada desde o ensino médio, e permite explorar propriedades de

matrizes esparsas, expandindo o determinante por linhas ou colunas com muitos zeros.

Ele serve não somente como definição como também regra prática de cálculo de

matrizes pequenas. Como principal desvantagem é bem mais difícil provar as

propriedades do produto e transposta. Outra dificuldade é que utilizamos a primeira

linha (ou coluna) para a expansão e depois queremos fazê-la por qualquer linha (ou

coluna). Uma saída (Leon (1998)) é incluir esta propriedade como parte da definição ou

incluir como teorema sem prova (Lay (1997)).

A geométrica lança mão da intuição mas é um pouco abstrata. Ela pode ajudar os alunos

a superar uma dificuldade levantada por Dubinsky (1997), a interpretação geométrica da

ação de uma transformação linear. Através dela a propriedade do produto do

determinante é imediata. Hannah (1996) diz que as definições algébricas (combinatória

e recursiva por exemplo) não são apropriadas para alunos do primeiro ano. Creio ser

necessário pesquisas para validar esta abordagem, pois a intuição geométrica, como

levantado na Seção 2, pode ser limitante no longo prazo.

A definição combinatória do determinante permite deduzir com facilidade propriedades

do determinante da transposta mas não é utilizada para o cálculo de determinantes em si

pela sua complexidade. Ela é desmotivante pois necessita uma discussão súbita de

permutações pares/impares. O risco (vide Seção 2) é o conceito ser introduzido sem

conexão com experiência anterior do aluno. Creio que não somente não se deva definir

deste modo como ela possa ser omitida num primeiro curso. É freqüente nos livros texto

(e mais ainda nos cursos) as demonstrações serem omitidas. Neste caso não tem sentido

utilizar a definição combinatória, cuja principal vantagem é a facilidade para provar

propriedades.

11

Page 12: Artigo para ser submetido ao ENEM

Como método de cálculo tanto a definição combinatória como a recursiva são

inapropriadas pois contém n! (fatorial) termos. Para n grande isto é completamente não

prático, devendo-se utilizar operações elementares e suas propriedades com relação ao

determinante. Desta forma o determinante é calculado como o produto de pivots com

sinal.

Aa definições por forma multilinear (e sua versão menos abstrata por operações

elementares) e por propriedade do produto são muito abstratas para um primeiro curso.

Poderiam fazer surgir (vide Seção 2) uma névoa mental nos alunos. São, no entanto,

propriedades muito importantes que devem ser apresentadas através da relação com

operações elementares.

A definição por autovalores, embora elegante, distancia o determinante de seu

significado geométrico. Creio que seja um exercício (avançado) interessante.

Em um segundo curso de AL sem dúvida a melhor abordagem é como forma

multilinear alternada. Neste ponto Jänich (1994) observa que “esta definição não possui

nenhuma utilidade prática para o cálculo do determinante ... Se você ainda acha que a

informação mais importante acerca de um objeto matemático é uma fórmula para

'calcular o seu valor', certamente você compartilha o pensamento da maioria das pessoas

medianamente educadas, mas com conhecimentos apenas superficiais de matemática”

Quanto a resolução de sistemas em todos os níveis, deve-se, como afirma Dorier et al

(2002) enfatizar métodos algoritmicos (tipo eliminação de Gauss) pela sua natureza

sistemática, evitando-se determinantes, que dominaram o assunto desde 1750 até o

início do século XX.

Tendo em vista o dilema concreto x abstrato apresentado na Seção 2, deve-se introduzir

o determinante com matrizes 2x2 e 3x3. Desta forma pode-se mesclar formalização com

intuição, ajudando o aluno a fazer a transição do concreto para o abstrato.

7. Apêndice

12

Page 13: Artigo para ser submetido ao ENEM

A definição (f) de determinante como produto dos autovalores com multiplicidade é

pouco conhecida e merece uma explicação maior.

O uso principal do determinante em cursos de AL (faz com que apareça imediatamente

antes do capítulo de autovalores e autovetores) é para determinar

autovalores/autovetores. No entanto, o trabalho polêmico de Axler (1995) defende a

exclusão do ensino de determinantes em AL. Em seu artigo, com o título provocativo

“Down with determinants!”, ele mostra como é possível apresentar todos os tópicos de

AL sem a necessidade de determinantes, incluindo a existência e cálculo de autovalores

e autovetores. A mesma abordagem aparece em Uhlig (2003).

Ao invés da forma histórica e clássica de determinar autovalores através das raízes do

polinômio característico gerado pelo determinante, se procede do seguinte modo. Dado

um vetor não nulo y, encontre a primeira dependência linear do conjunto de vetores

através da redução a forma escada. Com isto obtêm-se o polinômio

anulador da matriz, cujas raízes são autovalores de A.

Dois livros-texto foram escritos com este ponto de vista: S. Axler “Linear Algebra Done

Right” – Springer Verlag e Uhlig (2002a) .

Referências

ANTON, H.; BUSBY, R. (2006). Algebra Linear Conteporânea; Bookman.

ANTON, H.; RORRES, C.(2001); Algebra Linear com Aplicações; Bookman.

APOSTOL, TOM M. (1964). Calculus vol. 2; Blaisdell.

AXLER, SHELDON (1995). “Down with Determinants!”; The American

Mathematical Monthly 102, no. 2, p. 139-154.

BANCHOFF, THOMAS; WERMER, JOHN (1992). Linear Algebra Through

Geometry; Springer-Verlag.

13

Page 14: Artigo para ser submetido ao ENEM

BOGART, KENNETH P. (1989). “A Fresh(man) Treatment of Determinants”; The

American Mathematical Monthly 96, no. 10, p. 915-920.

BOLDRINI, JOSÉ LUIZ; ET AL (1978). Álgebra Linear; Harper and Row.

BRASIL. Ministério da Educação (2002). PCNEM+ Ensino Médio: Orientações

Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais; MEC.

CALIFORNIA STATE BOARD OF EDUCATION (1997). Currículo do ensino médio

de álgebra linear do estado da Califórnia (EUA). Adotado em dezembro de 1997.

http://www.cde.ca.gov/be/st/ss/mthlinearalgebra.asp

CARLSON, DAVID (1993). “Teaching Linear Algebra: Must the Fog Always Roll

In?”; College Mathematics Journal, 24 (1); p. 29-40.

CARLSON, DAVID; JOHNSON, CHARLES R. ; LAY, DAVID C., PORTER; A.

DUANE (1993). “The Linear Algebra Curriculum Study Group Recommendations for

the First Course in Linear Algebra”; College Mathematics Journal, 24 (1) p. 41-46.

CARVALHO, JOÃO PITOMBEIRA (1974). Introdução à Algebra Linear; LTC.

COURANT, RICHARD; JOHN, FRITZ (1965); Introduction to Calculus and Analysis

Vol. 2;  Interscience Publishers; p. 160-202.

COWEN, CARL C. (1997). “On the Centrality of Linear Algebra in the Curriculum”;

Versão resumida em FOCUS, 17, no. 4; p. 6-7. Versão completa em

http://www.maa.org/features/cowen.html.

CULLEN, C. G.; GALE, K. J (1965). “A Functional Definition of the Determinant”;

The American Mathematical Monthly 72, no. 4, p. 403-406.

DAY, JANE M; KALMAN, DAN (1998). “Teaching Linear Algebra: What are the

Questions?”; Relatório técnico do programa de verão de 1998 do Undergraduate

14

Page 15: Artigo para ser submetido ao ENEM

Faculty Program (UFP) no Park City Mathematics Institute (PCMI). Disponível em

http://pcmi.knox.edu/.

_____________________________ (2001). “Teaching Linear Algebra: Issues and

Resources”; The College Mathematics Journal 32, no. 3; p. 162-168.

DORIER, JEAN-LUC; ROBERT , ALINE; ROGALSKI, MARC (2002). “Some

comments on the role of proof in comprehending and teaching elementary linear

algebra by F.Uhlig”; Educational Studies in Mathematics 51; p. 185 - 191.

DUBINSKY, ED (1997). “Some Thoughts on a First Course in Linear Algebra at the

College Level”; In: Carlson, D. et al (Eds.), Resources for Teaching Linear Algebra

MAA Notes Vol. 42. The Mathematical Association of America, Washington, DC, p.

85-105.

HALMOS, P. (1942). Finite Dimensional Vector Spaces; Princeton University Press.

HANNAH, JOHN (1996). “A Geometric Approach to Determinants”; The American

Mathematical Monthly 103, no. 5, p. 401-409.

HAREL, GUERSHON, (1997). “The Linear Algebra Curriculum Study Group

Recommendations: Moving Beyond Concept Definition”; In: Carlson et al (Eds.),

Resources for Teaching Linear Algebra MAA Notes Vol. 42. The Mathematical

Association of America, Washington, DC, p. 107-126.

___________________ (1999). “Students understanding of proofs: a historical analysis

and implications for the teaching of geometry and linear algebra”; Linear Algebra and

its Applications 302-303; p. 601-613.

HOFFMAN, K.; KUNZE, R. (1961); Linear Algebra; Prentice-Hall.

JÄNICH, KLAUS (1994). Álgebra Linear; LTC.

15

Page 16: Artigo para ser submetido ao ENEM

KALMAN, DAN (2007); “Outline on Determinants”; Texto disponível em março de

2007 em http://www.american.edu/cas/mathstat/People/kalman/.

LANG, SERGE (1972). Linear Algebra; Addison-Wesley;

LAY, DAVID C. (1997). Linear Algebra and its Applications; Addison-Wesley.

LEON, STEVEN (1998). Álgebra Linear com Aplicações; LTC.

LIMA, ELON LAGES (1993). Coordenadas no Espaço; IMPA.

LIMA, ELON LAGES (1996). Algebra Linear; IMPA.

LIPSCHUTZ, SEYMOUR (1994). Álgebra Linear; Makron Books.

MENA, ROBERT (1997). “Reflections (1988)” In: Carlson et al (Eds.), Resources for

Teaching Linear Algebra MAA Notes Vol. 42. The Mathematical Association of

America, Washington, DC, p. 145-149.

MINGUS, TABITHA T. (1995). “Explorations in Linear Algebra Using Group Work

and Technology”; In: Proceedings of the Eighth Annual International Conference on

Technology in Collegiate Mathematics (ICTCM); Houston, Texas, 1995. Disponível em

http://archives.math.utk.edu/ICTCM/

OSBORN, ROGER (1960). “Concerning Fourth-Order Determinants”; The American

Mathematical Monthly 67, no. 7, p. 682-683.

RUDIN, WALTER (1964). Principles of Mathematical Analysis. McGraw-Hill.

SHILOV, GEORGI (1971). Linear Algebra; Prentice-Hall.

STEINBRUCH, A.; WINTERLE, P.(1987); Algebra Linear; McGraw-Hill.

STRANG, GILBERT (1993). Introduction to Linear Algebra; Cambridge Press.

16

Page 17: Artigo para ser submetido ao ENEM

UHLIG, FRANK (2002a). Transform Linear Álgebra; Prentice-Hall.

______________ (2002b). “The role of proof in comprehending and teaching

elementary linear álgebra”; Educational Studies in Mathematics 50; p. 335 - 346.

______________ (2003). “A new unified, balanced, and conceptual approach to

teaching linear álgebra”; Linear Algebra and its Applications 361; p. 147-159.

______________ (2006). “Certain Dilemmas in Teaching Elementary Linear Algebra

Today and Tomorrow”; Palestra do Workshop on the Teaching of Linear Algebra na

Drexel University (março/2006); Disponível em

http://www.drexel.edu/coas/math/workshop/pdf/Uhlig.pdf

17