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Artigo - (Re) Construção do Conceito de Cidadania - quebra de paradigmas

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IV ENCONTRO ANUAL DA ANDHEP08 a 10 de OUTUBRO, Vitória – ES

GT2 – CULTURA E EDUCAÇÃO EM DIREITOS HUMANOS

FLÁVIA FANTIN COLODETTE

MARCELO RODRIGUES NOGUEIRA

MARCELO SANT’ANNA VIEIRA GOMES

FACULDADE DE DIREITO DE VITÓRIA – FDV

(RE)CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE CIDADANIA:

QUEBRA DE PARADIGMAS

VITÓRIA

2008

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INTRODUÇÃO

O direito, como todo o ramo da ciência, possui alguns temas que possuem

relevância, no plano acadêmico, com o intuito de proporcionar uma reflexão crítica.

Neste sentido, o artigo que segue abordará a temática do conceito de cidadania que

é passado ao aluno durante sua vida estudantil, até o momento em que ingressa no

ensino superior. Os dados apresentados, neste artigo, têm por base um pré-

questionário aplicado aos alunos do primeiro período do mesmo curso, como parte

de uma pesquisa realizada. Tal questionário visava verificar qual a concepção de

cidadania para estes alunos, o conceito de cidadania que eles aprenderam durante

os ensinos, fundamental e médio, pois são ingressantes no curso.

A pesquisa enunciada conta com exatamente três etapas, em que a primeira faz

referência à uma pesquisa bibliográfica e a elaboração do questionário-diagnóstico.

A segunda etapa teve por escopo a aplicação desses questionários aos alunos. Por

fim a terceira etapa, é a que nos prestamos a apontar desde já que é a elaboração

dos questionários, pautado pelos resultados obtidos após a aplicação do

questionário.

O referido tema foi escolhido pelos autores pelo fato de que foi constatado que

muitos dos alunos que responderam o questionário tinham clareza sobre o que é

cidadania e aqueles que apresentaram, muitas vezes, tinham uma concepção

preconceituosa. Percebeu-se que muitos alunos restringiam o conceito de cidadania

ao mero exercício de direitos civis e políticos e que muitos deles consideravam

cidadãos somente as pessoas com as quais convivem, pessoas de sua classe

social.

Espera-se que, com tal abordagem, possamos unificar a concepção de cidadania,

ao mostrar quais, a nosso ver, foram as falhas cometidas na educação desses

alunos. Além disso, espera-se que seja possível conscientizar da importância de

colocarmos em prática o conceito de cidadania. Provocar uma reflexão acerca da

posição do aluno que, em tese, deveria ter tido acesso ao conceito de cidadania,

possa ver, efetivamente, como se dá o exercício da mesma.

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No nosso ponto de vista, este trabalho tem importância elevada para a sociedade,

uma vez que estamos abordando questões respondidas por pessoas que, hoje, são

apenas “calouros” do curso de direito, mas que, em um futuro, não tão distante

serão os intérpretes e os aplicadores das normas brasileiras.

1 CIDADANIA

A cidadania é um direito a ter direitos, pois a igualdade em dignidade e direitos humanos não é um dado. É um construído na convivência coletiva, que requer o acesso ao espaço público. É este acesso que permite a construção de um mundo comum através do processo de asserção dos direitos humanos. (Hannah Arendt)1

Nas palavras do professor Boaventura de Souza Santos2, a cidadania possui o seu

espaço-tempo, o qual é constituído pelas relações entre a sociedade e o Estado.

Segundo esse entendimento, o espaço-tempo da cidadania é também fundado

através das relações sociais que os indivíduos desenvolvem na sociedade, ao

estabelecerem identidades coletivas de vizinhança, de região, de raça, de etnia, de

religião. Desta forma, os indivíduos permanecem vinculados a territórios aos dogmas

pré-estabelecidos pelo grupo social no qual se encontram.

Para se entender melhor a concepção de cidadania, faz-se necessário fazer uma

breve alusão de princípios históricos. Assim, Dallari3 afirma que a idéia de cidadania

havia sido utilizada na Roma antiga, com intenção de designar os direitos políticos

de uma pessoa e a forma como ela poderia exercê-los. Segundo o mesmo autor, os

romanos excluíam alguns da participação no processo democrático, segregando-os

de acordo com as suas classes sociais.

Acresça-se que o desenvolvimento histórico de cidadania, segundo Corrêa4, está

diretamente ligado a três fases ou elementos dos Direitos Humanos (direitos civis,

políticos e sociais). A primeira fase corresponde aos direitos civis de liberdade

1 Arendt, Hannah apud CORRÊA, Darcísio. A construção da cidadania: reflexões histórico-políticas. 4.ed. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 2006.2 SANTOS, Boaventura de Souza. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2001. p 314-315.3 DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos humanos e Cidadania. 2.ed. reformulada. São Paulo: Moderna, 2004. p. 17.4 CORRÊA, Darcísio. Cidadania: a construção conflitiva do espaço público. In:_____. A construção da cidadania: reflexões histórico-politicas. 4. ed. Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 2006. p. 213-214.

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individual. A segunda corresponde ao elemento político, o qual está ligado à

participação no exercício do poder político. A terceira diz respeito ao elemento

social, concernente aos direitos ligados ao bem-estar econômico e à herança social.

A partir de então, nota-se que o conceito de cidadania e o seu exercício têm

evoluído gradativamente, Mazzuoli5 apresenta a ascensão desse conceito como

advindo do século XVIII, também conhecido como século das luzes, ou seja, com a

consagração dos direitos civis. Neste sentido, deve-se ressaltar que o conceito de

cidadania, naquela época, era relativo ao direito de ir e vir, de manifestação política

e ideológica, ou mesmo da simples participação na vida em sociedade, tendo em

vista que o que predominava, na época anterior, era a vontade dos senhores

feudais, dos membros da nobreza e do clero. Desta forma, restando à população, às

massas, a subordinação a estas categorias superiores. Assim, pode-se dizer que,

com a decadência do Antigo Regime e a ascensão, posteriormente, de um Estado

Liberal, surgiu o conceito de cidadania.

No que é pertinente à evolução do conceito de cidadania, após a queda do antigo

regime, segundo Mazzuoli6, pode-se dizer que a Declaração dos Direitos do Homem

e do Cidadão, no fim do século XVIII, trouxe à tona uma concepção de cidadania

que, nos dias de hoje, ainda é citada. Destaca-se a idéia de que a expressão

‘Direitos do Cidadão’ está diretamente voltada ao conjunto dos direitos políticos de

votar e ser votado e dos direitos civis, como o direito à igualdade e à propriedade

privada.

Nas palavras de Dalmo de Abreu Dallari7, acerca da Revolução Francesa:

Esse movimento foi muito importante porque influiu para que grande parte do mundo adotasse o novo modelo de sociedade, criado em conseqüência da Revolução. Foi nesse momento e nesse ambiente que nasceu a moderna concepção de cidadania, que surgiu para afirmar a eliminação de privilégios, mas que, pouco depois, foi utilizada exatamente para garantir a superioridade de novos privilegiados. (grifo nosso)

5 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Direitos humanos, cidadania e educação. Uma nova concepção introduzida pela Constituição Federal de 1988. jus navigandi, Teresina, ano 5, n.51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2074>. Acesso em: 09 abr. 2008. p. 016 Op. cit. p. 027 DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos humanos e Cidadania. 2.ed. reformulada. São Paulo: Moderna, 2004. p. 19

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Em meados do século XX, com o surgimento da ONU e a aprovação da Declaração

Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, nas palavras de Mazzuoli8, “trata-se

de uma época considerada como verdadeiro marco divisor do processo de

internacionalização dos direitos humanos”. Por certo, o mesmo autor afirma que o

ser humano passou a ser a égide sob a qual o direito se pôs, de maneira que os

seus direitos estariam até mesmo sobrepostos ao poder estatal. Sendo assim, é

construída a noção de “sujeito de direito internacional”9, o cidadão deixa de ser

apenas o nacional de um Estado/país e passa a ser um “cidadão do mundo”.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, reuniu, em seus artigos, os

direitos e garantias individuais, também conhecidos como direitos civis e políticos e

os direitos sociais, econômicos e culturais. Neste sentido, pode-se dizer que a

referida carta de direitos humanos reuniu o discurso liberal e o discurso social,

formando um conjunto precedido pelos valores da liberdade e da igualdade10,

universal e indivisível. No que tange a tal assunto, José Afonso da Silva (SILVA

apud Mazzuoli11) afirma que deixa de existir a dicotomia existente entre os direitos

civis e políticos e os direitos sociais, culturais e econômicos, ou seja, a doutrina

passa a afirmar que os direitos são universais, indivisíveis e interdependentes. Cabe

ressaltar que há uma quebra de paradigmas, uma vez que os direitos políticos e

civis deixam de ser vistos como de aplicação imediata, ou seja, sem que haja

necessidade de intervenção estatal e os direitos sociais, culturais e econômicos

como de aplicação progressiva, na qual há necessidade de intervenção estatal para

que sejam validados.

No Brasil, de acordo com Carvalho12, o conceito de cidadania, ou até mudanças que

relacionam-se ao exercício da mesma, não demonstraram progresso entre 1822 e

1930, com exceção apenas no que se refere ao processo de abolição da

8 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. op. cit. p.59 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. op. cit p. 510 Idem. p. 6.11 SILVA, José Afonso apud MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direitos humanos, cidadania e educação. Uma nova concepção introduzida pela Constituição Federal de 1988. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2074>. Acesso em: 09 abr. 2008.

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CARVALHO, Jose Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 10. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. p. 17

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escravatura. No entanto, o “ex-escravo” obteve apenas a inserção no contexto dos

direitos civis, mesmo assim, de maneira formal.

A partir de 193013, desenvolveu-se outro marco na concepção de cidadania do país.

Com o fim da República Velha, verificou-se a tentativa de destituir as oligarquias que

até então mantinham o controle político e econômico brasileiro. Neste sentido,

importa ressaltar que houve mudanças sociais e políticas e que os direitos sociais

obtiveram bastante relevância, principalmente com a criação das leis trabalhistas.

No entanto, os direitos políticos não obtiveram uma consagração tão esplendida,

uma vez que o governo passou por períodos de instabilidade, alternando entre a

ditadura e a democracia, contando, inclusive, com demonstrações de insatisfação

popular, a partir de 1945. Neste contexto, os direitos civis também não obtiveram

destaque, tendo em vista a suspensão de muitos deles e a dificuldade em se validar

aqueles que estariam “disponíveis”.

Sendo assim, nota-se que, durante o período de 30 até 64, a sociedade brasileira

conviveu com avanços e progressos, no que diz respeito ao processo de construção

da cidadania. Entretanto, importa salientar que, após a chamada “Revolução de

1964”, poucos avanços foram observados no que tange à construção da cidadania,

principalmente, no que concerne aos direitos civis e políticos14. José Murilo de

Carvalho15, neste ponto, enfatiza que o período de ditadura militar em muito

contribuiu para com a restrição e a estagnação do exercício dos direitos civis e

políticos, contudo demonstrou-se um período dos direitos sociais, neste sentido faz a

seguinte asserção16:

A avaliação dos governos militares, sob o ponto de vista da cidadania, assim que levar em conta a manutenção do direito do voto combinada com o esvaziamento de seu sentido e a expansão dos direitos sociais em momentos de restrição de direitos civis e políticos.

Após o término da ditadura militar, o qual se manteve no Brasil de 1964 a 1985,

constatou-se a tentativa de instaurar no país uma nova ordem jurídica, através da

qual se institui no Estado brasileiro o regime democrático e houve a assimilação da

13 CARVALHO, Jose Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 10. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. p. 87-111.14 CARVALHO, José Murilo de. op. cit. p. 170.15 Idem. p.171-17216 Ibidem. P. 172.

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proteção aos direitos humanos, seguindo parâmetros da ordem jurídica

internacional17. Nesse diapasão, pode-se dizer que a Constituição de 1988,

“constituição cidadã”, elenca, em seu primeiro artigo, a dignidade da pessoa humana

como princípio fundamental da República Federativa Brasileira, art.1, III,18. A partir

da análise de tal artigo, deve-se depreender que o princípio da dignidade humana é

fundamento para a análise de qualquer dispositivo presente no ordenamento jurídico

brasileiro.

Além disso, deve-se salientar que os tratados internacionais ratificados pelo Brasil

que versam sobre direitos humanos são também adotados pela Constituição como

se fizessem parte dela, como se estivessem assegurados pelo rol de direitos e

garantias constitucionais, fato que concede uma margem ainda mais ampla no que

diz respeito a proteção dos direitos humanos. Versa sobre tal assunto o artigo 5º,

§2º. Neste mesmo sentido, o §1º, do mesmo artigo, enfatiza que a aplicação dessas

normas de direitos e garantias deve ser imediata, o que permite entender que os

tratados de direitos humanos internacionais podem ser incorporados de forma

instantânea pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Ainda no que se refere à aplicação e à vigência de normas internacionais19 no

ordenamento jurídico brasileiro, convém destacar o seguinte entendimento, se tais

normas são incorporadas ao nosso sistema jurídico e possuem aplicação imediata,

assim como as normas que versam sobre direitos e garantias fundamentais

originariamente impostas na Constituição de 1988, não podem ser passíveis de

restrição ou abolição. Destaque-se o artigo 60, §4, IV o qual versa sobre este

assunto.

Em virtude dessas declarações, convém lembrar que, de acordo com a evolução do

conceito de cidadania, a Declaração Universal, de 1948, contribuiu de maneira

contundente para a inserção do conceito de cidadania no ordenamento jurídico

brasileiro. Enfatize-se que o conceito de cidadão20 abrange, em tempos atuais, todos

aqueles que estão sob a égide de um Estado e devem ter por ele ressalvados os

17 MAZZUOLI. op. cit. p. 818 BRASIL. Constituição [da] República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2007.

19 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. op. cit. p. 10.20 Idem. p. 11.

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seus direitos e garantias fundamentais. Neste âmbito, é importante salientar que o

conceito teórico deixou de envolver apenas os direitos políticos e civis, que perdurou

desde a Constituição Brasileira de 1824.

Em que pese, alguns conceitos básicos foram inseridos na Carta Constitucional,

para alterar o quadro de repressão que pairava na ordem político-jurídica, desde a

ditadura. Sem dúvida a garantia desses direitos, serviu de base para que o cidadão

brasileiro, retornasse à vida política da nação, partindo da idéia que agora poderiam,

definitivamente atuar na sociedade, sem estarem sujeitos às retaliações por parte

daqueles que governavam o país. A cidadania passa a ter uma nova proporção,

principalmente com a inclusão de remédios constitucionais, a fim de evitar

arbitrariedades de poder. De acordo com as palavras de Márcia Alvim 21, foi através

de direitos fundamentais, como o ‘habeas corpus’ e o ‘habeas data’, que os cidadãos

conseguiram com que seus direitos líquidos e certos fossem garantidos.

Em suma, importa citar que o Título I e o II da Constituição de 1988, quase que em

sua totalidade, referem-se ao exercício da cidadania e aos direitos do cidadão, os

quais nos referimos até então. Tendo em vista que o os assuntos elencados

condizem aos Princípios fundamentais da Magna Carta e aos Direitos e Garantias

Fundamentais, frisem-se os direitos e os deveres fundamentais e coletivos, os

direitos sociais e os direitos políticos22.

Ainda no que diz respeito a tal assunto, releva ponderar que não são apenas esses

dispositivos que remetem ao exercício da cidadania, no Título VIII, Capítulo II, Seção

I, no artigo 205, a referida Carta dispõe que “A educação, direito de todos e dever do

Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade,

visando ao pleno da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua

qualificação para o trabalho”23.

21ALVIM, Márcia Cristina de Souza. Educação, Cidadania e o Acesso à Justiça. Revista Mestrado em Direito. Osasco, ano 6, n.2, p.97-106, 2006. Disponível em:<www.fieo.br/edifieo/index.php /rmd/article/viewfile/39/77>. Acesso em: 10 jun. 2008. p. 102.22 BRASIL. Constituição [da] República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2007.

23 BRASIL. Constituição [da] República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2007.

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Por fim, como se pode perceber, a Constituição de 1988 estendeu o conceito de

cidadão e cidadania. Nos preceitos de José Afonso da Silva24:

decorre da idéia de Constituição dirigente, que não é apenas um repositório de programas vagos a serem cumpridos, mas constitui um sistema de previsão de direitos sociais, mais ou menos eficazes, em torno dos quais é que se vem construindo a nova idéia de cidadania.

Em virtude dessas constatações, percebe-se que, tratar do tema cidadania,

inserindo-o no contexto sócio-político atual, significa aferir uma análise construtiva

acerca do caminho que se percorreu.

2 UMA PROPOSTA DE CIDADANIA

Nesse diapasão, tem-se, por evidente, que o conceito de cidadania veio evoluindo

ao longo dos séculos, conforme foi dito, o que nos faz perceber que o mesmo não se

manteve estagnado em um só contexto histórico.

O problema surge quando se evidencia que, de uns anos para cá, após a

promulgação da Constituição de 1988, não tivemos grande avanço quanto à sua

conceituação, tampouco uma efetiva observância de conceitos básicos de Direito na

sociedade contemporânea.

Isso nos faz depreender que, talvez a população, devido à grande repressão sofrida

durante a ditadura militar, esteve descrente de que medidas eficazes poderiam

alterar o quadro da população e deixaram de se interessar por questões relativas ao

respeito aos seus direitos (logicamente sem generalizações).

No intuito de disseminar conceitos jurídicos básicos aos cidadãos, principalmente

aos hipossuficientes, que são lesados diariamente, estando à “margem” da

sociedade, em 2008, fomos convidados pela professora Valdeciliana da Silva Ramos

Andrade para participar de um projeto, do qual a mesma é a idealizadora, cujo título

é “O Direito vai à Escola: a construção da cidadania”, com aprovação e

financiamento do FAPES (Fundação de Apoio à Pesquisa do Espírito Santo) órgão

24 SILVA, José da. Faculdades de Direito e construção da cidadania. In_____ Poderconstituinte e poder popular: estudos sobre a Constituição. São Paulo: Malheiros, 2000, p.141.

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ligado ao Governo do Estado, sendo realizado pela docente, professora da

Faculdade de Direito de Vitória (FDV) e por nós, discentes desta mesma instituição.

A idéia primordial deste projeto seria a de buscar a integração da academia de

Direito, com as Escolas da Rede Pública Municipal, de ensino fundamental, a fim de

levar a eles conhecimentos básicos de Direito que todo o cidadão deve ter para

poder exigir um respeito mínimo à sua dignidade.

Pelo exposto, partimos de um amplo estudo bibliográfico sobre o tema, quando

pudemos analisar criticamente os ideais transpassados por diversos doutrinadores e

buscar a construção de um pensamento próprio, convergindo para a idéia do que

realmente deveríamos abordar em nossas ações, que realmente atingiriam o escopo

pretendido.

Nesse sentido, a capacitação de todos os componentes foi fundamental e pôde-se

perceber o nível de integração com causas sociais que todos os que ali se

encontravam tinham e o quanto estes estavam ansiosos por contribuir, mesmo que,

minimamente, para alterar a realidade posta.

Preliminarmente, era necessário um pré-teste, para que termos um resultado prático

daquilo que estávamos produzindo e para verificarmos se estávamos sendo

compreensíveis nas questões propostas. Desde então, surgiu a idéia de aplicação

de um questionário-diagnóstico para alunos ingressantes no primeiro período do

curso de Direito, a fim de vislumbrarmos qual a visão destes indivíduos.

Fez-se interessante essa abordagem, pois querendo ou não, tais cidadãos são

provenientes de famílias com certo poder aquisitivo e que tem uma formação

profissional, cultural e intelectual melhor do que aqueles que não têm acesso a uma

educação de qualidade.

Tal experiência foi interessante e, ao mesmo tempo, assustadora. Como pode

indivíduos, com certo nível cultural, ter concepções sociais tão deturpadas? Isso foi

o que mais no chamou atenção e que será tratado mais analiticamente em ponto

específico.

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Valores tidos como básicos em uma sociedade para viver em harmonia, desrespeito

a direitos fundamentais à garantia do bem-estar de todos, em alguns casos não são

do interesse desses “cidadãos” e, em outros casos, tampouco são respeitados por

outros.

É importante consignar, mais uma vez, que se trata de alunos, em sua grande

maioria, provenientes de escolas particulares e com uma formação familiar

adequada. Portanto, analisando sob esse ponto de vista, pudemos perceber que,

infelizmente, os objetivos traçados pela escola e pela família, não têm conseguido

atingir níveis satisfatórios para a formação de um indivíduo que a nação brasileira

almeja: um indivíduo: justo, solidário, participativo e atuante no corpo social.

Obviamente que é possível uma alteração desse quadro e que esse processo

necessita de uma construção gradativa.

Ocorre que pudemos, ao longo desses quase 7 meses de pesquisa, a importância

de um projeto como esse para a quebra de alguns paradigmas que a sociedade

impõe. Acreditamos que um estudante, em sua formação social e profissional, no

ramo de uma ciência humana, não deve estar somente atrelado a uma concepção

dogmática e positivista da academia, sem a possibilidade do rompimento das

“barreiras” físicas da universidade e sua interpenetração nas questões sociais de

relevância e que é o escopo fundamental do curso.

A pesquisa, neste sentido, nos faz alterar essa dicotomia – vida estudantil e vida

profissional. Para nos tornarmos profissionais condizentes com a realidade que é

posta, devemos atuar com uma visão da prática real do Direito, estando em contato

com as questões fáticas que ocorrem diariamente na sociedade e, buscando com

isso, solucionar os problemas que nos são oferecidos à apreciação. Isso vai de

encontro à prática simulada que é perceptível em algumas academias jurídicas, que

resumem o aprendizado a um ensino dogmático e zetético do “dever-ser”,

esquecendo-se do mundo do “ser”, ou seja, o mundo fático.

Portanto, a experiência e a gama de conhecimento adquirido nos faz entender que a

universidade, sem dúvida nenhuma, terá um papel fundamental na mentalidade

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desses calouros, buscando adequá-los ao novo contexto que estes estão inseridos

em que terão sua vida pessoal e profissional, “lapidada”, a fim de que se evitem

retrocessos.

Nesse sentido, acreditamos que o papel das universidades será fundamental nessa

formação, a fim de desconstituir alguns desses pensamentos equivocados. Além

disso, têm-se presente que os dados são de extrema relevância e que devem servir,

mesmo que minimamente, de parâmetro para a tentativa de mudança paradigmática

de concepções um tanto retrógradas.

3 CIDADANIA DETURPADA: VISÃO DE “CALOUROS” DO CURSO DE DIREITO

Ao analisarmos os dados coletados das pesquisas com alunos do primeiro período

de Direito, conforme já dito acima, ficamos assustados. Tal fato decorre da análise

de questões básicas, das quais acreditávamos que a grande maioria teria um certo

senso de responsabilidade para responder, acabamos por vislumbrar o oposto.

Iniciamos, tratando de uma das questões que causou surpresa a todos os

participantes, sem exceção. Em uma dessas questões, resolvemos incluir imagens

que evidenciassem várias classes incluídas em uma sociedade, para reconhecer

qual seria a análise feita pelos calouros, das imagens que estavam ali postas e quais

eles acreditavam realmente que poderiam ser titulados como cidadãos. Dentre as

imagens, colocamos: um deficiente físico, um idoso, um casal homossexual, um

mendigo, uma criança, uma mulher grávida, um homem de terno e uma criança

desenvolvendo atividade análoga à de escravo (trabalho infantil).

Entretanto, algumas figuras que acreditávamos que seriam as mais assinaladas, por

se tratar de algo bastante comentado, e já haver um senso comum quanto à

consideração destes como cidadãos, acabou chamando muito a atenção, quando foi

possível observar a não marcação delas. Exemplo disso foi em relação a figura do

deficiente físico como cidadão.

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Ao analisarmos os questionários, vimos que somente 83% daqueles que

responderam, considerou o deficiente físico como cidadão. Isso não se demonstra

proporcional no meio acadêmico-jurídico. Temos que a carta Constitucional é

enfática no que tange à garantia do direito dos deficientes físicos, existindo inclusive

um Pano Nacional de Inserção do Deficiente Físico, a fim de desobstruir exclusões a

que os mesmos ainda são submetidos. É possível citar como exemplo a reserva de

cotas nos concursos públicos, nas empresas privadas, além dos benefícios de

gratuidade de transporte público, que são elaborados, com o objetivo de suprir

omissões Estatais e são voltados exclusivamente para essa parcela excluída da

sociedade.

Somamos aqui os dados relativos à criança desenvolvendo trabalho infantil e ao

mendigo. Essas duas imagens tiveram respectivamente 77% e 79%, o que

demonstra, mais uma vez, uma distorção da realidade por parte desses discentes,

que ao ingressarem em curso de Direito, ainda trazem consigo concepções arraigadas acerca de determinadas classes da população.

Constatamos tais concepções, quando analisamos a imagem referente ao homem

de terno. Este último teve 98% de aceitação por parte dos alunos, ilustrando bem

parcela conservadora da classe média que ainda não adquiriu uma visão global de

mundo, ao estar voltada para o mundo que vivem, avessa a preocupações externas.

Porém, a contradição não provém exclusivamente desse contexto. Quando se

analisa o questionamento sobre quais os requisitos identificariam quem seria

considerado cidadão, os mesmos afirmam que o ser humano é um cidadão sem maiores requisitos, totalizando 74% que tiveram essa concepção. Por seu turno,

ainda existiram 11%, que afirmaram que nem todos os seres humanos são cidadãos. Sendo assim, importa analisar que há uma contradição entre o total que

acredita não acreditar ter requisitos para ser cidadão e o total que afirma que nem

todos os seres humanos são cidadãos, excluindo os deficientes, os idosos e os

mendigos.

Em suma, isso nos faz entender que ainda há uma dificuldade por parte destes de

vislumbrar um mundo em coletividade e respeitar todos como cidadãos. Extrai-se

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dessa que eles estão adstritos à realidade próxima a eles, ou seja, a uma sociedade

de classes.

Enunciamos ainda mais uma questão que nos despertou atenção, quando os

discentes foram questionados sobre o que eles sentiam quando viam uma pessoa dormindo na rua, a resposta foi impactante. Aproximadamente 72% de

todos os que responderam não estão nem um pouco interessados com essa

situação. Constatamos isso, devido às respostas, em que 65 % deles responderam

que “sentiam pena, mas isso era problema dos políticos”. Além destes, 7% disseram

que “não sentiam nada, que achavam aquilo normal”.

Por conseguinte, nos deparamos com um distanciamento da realidade vivida por

estes alunos e moradores de rua, tendo em vista que estes não se encontram

naquela situação porque desejam, mas porque não tiveram tantas oportunidades,

como as que nós que temos: o acesso à educação, saúde, segurança. Portanto, não

há como se tentar fazer uma comparação como essa, se não estamos inseridos

naquele contexto. Por esse motivo, vemos claramente que há uma visão deturpada do verdadeiro conceito de cidadania.

A partir de toda a nossa construção teórica, comparada com a nossa pesquisa de

campo (empírica), o que se percebe é que conceito de cidadania foi elaborado e que

esse passou por uma evolução, apenas o que não se constatou foi a aplicação

dessa teoria na prática.

5 (RE)CONSTRUÇÃO DO CONCEITO DE CIDADANIA

No senso comum, tem-se a idéia de que cidadania consiste apenas nos direitos

políticos que o sujeito possui. Tal posição é confirmada pelo pensamento de

Larrubia, ao afirmar que

Cidadania é a condição da pessoa natural que, como membro de um Estado, se acha no gozo dos direitos que lhe permitem participar da vida política. A cidadania é, portanto, o conjunto dos direitos políticos de que

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goza um indivíduo e que lhe permitem intervir na direção dos negócios públicos do Estado. (Larrubia) 25

Como se pode ver, o conceito de cidadania, na prática, está restrito ao direito de

participar da vida política do país, seja de forma direta ou indireta, ao votar ou ao ser

votado. Tal problema é constatado por um resquício que prevalece na cabeça de

alguns estudantes. De acordo com a análise gráfica dos questionários, 6% dos

acadêmicos que responderam o questionário acreditam que o voto é requisito

fundamental para considerar alguém como cidadão. Porém, estas são as mesmas

pessoas que afirmam que todo indivíduo é cidadão, sem maiores requisitos.

Na nossa concepção, cidadania consiste em uma tríade formada pelos direitos

políticos, civis e sociais. A consideração de que o exercício de apenas um destes

satisfaria a posição de cidadão é ilusória, uma vez que esta seria uma cidadania

incompleta. Consoante Maria Victoria Benevides Soares,

os direitos do cidadão englobam direitos individuais, políticos e sociais, econômicos e culturais e, quando são efetivamente reconhecidos e garantidos, podemos falar em “cidadania democrática”, a qual pressupõe, também, a participação ativa dos cidadãos nos processos decisórios da esfera pública. (Soares, 2004) 26

De acordo com o discurso da autora, percebemos que o pensamento de Larrubia

encaixa-se na perspectiva de Benevides, uma vez que esta engloba os direitos

políticos como um dos direitos do cidadão, e não apenas limita-se a dizer que

cidadania consiste no exercício do voto.

Esse conceito restritivo de cidadania é equivocado, na nossa concepção, pois a

cidadania é algo muito mais amplo, e consiste, sim, na participação política, mas

consiste também no exercício dos direitos e deveres que o sujeito possui. Entende-

se que o conceito de cidadania é polissêmico.

25 LARRUBIA, Bruno. O que é cidadania? Disponível em: <www.pt.shvoong.com/humanities/ 475324-que-%C3%A9-cidadania/>. Acesso em: 22 abr. 2008.

26 SOARES, Maria Victoria Benevides. Cidadania e Direitos Humanos. In: CARVALHO, José Sérgio (org.). Educação, Cidadania e Direitos Humanos. Petrópolis/RJ: Vozes, 2004. p.43.

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Assim sendo, parece-nos mais apropriado a defesa do argumento de que todos

deveriam ser reconhecidos como cidadãos, independentemente, inclusive de

registro de nascimento ou de carteira de identidade.

Depreende-se que a Constituição Federal, quando dispõe que todos são iguais sem

distinção de raça, cor, religião (art. 5, caput), deve ser lido de forma extensiva,

devendo englobar todos sem distinção, ou seja, não se pode deixar de considerar

um cidadão única e exclusivamente, porque não teve condições de ser registrado,

ou não teve oportunidade de crescer profissionalmente.

Mais uma vez aqui, remetemo-nos ao questionário-diagnóstico aplicado, pois ainda

temos dentre os calouros analisados, que 14% acreditam que, para se considerar

uma pessoa cidadã, esta deve ter carteira de identidade e registro de nascimento.

Para que o indivíduo seja reconhecido juridicamente, é necessário o registro de

nascimento, pois é quando há a declaração ao Estado sobre a existência de mais

um ser humano, nascido vivo. Mas, se admitirmos famílias que moram nos interiores

do Brasil, ou em áreas de difícil acesso, onde, para registrar seus filhos demoram

horas e mais horas, esse preceito não pode ser tido como razoável.

Não admitimos tal situação como proporcional, pois desde que seja ser humano,

deve ser considerado cidadão, sem maiores requisitos. Além disso, não existem

requisitos eficazes para fazer essa distinção e nós, meros operadores de Direito,

não temos como criar critérios objetivos para distinguir quem é e quem não é

cidadão.

No entanto, é importante ressaltar que, apesar de todo ser humano ser cidadão,

nem todos exercem a sua cidadania, no sentido amplo. Depreende-se que, o sujeito

passará a ser efetivamente reconhecido como cidadão perante a sociedade, a partir

do momento em que começar a exercê-la. Durante essa jornada de construção da

cidadania, a educação é um quesito fundamental para ajudar o indivíduo possa

alcançá-la de forma plena.

A partir da análise dos questionários, pudemos ver claramente que atuação da

escola na formação cidadã do aluno resultou em uma concepção fragmentada de

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cidadania. Na melhor das hipóteses, os alunos tinham uma idéia básica sobre a

teoria do que é ser cidadão, tendo vista que 85% afirmaram serem cidadãos, porque

são seres humanos.

Por isso, consideramos que as escolas de ensino fundamental e médio não

estabelecem um parâmetro apropriado para seus alunos, no que se refere ao

conceito de cidadania, se é que ao menos tentam passá-lo. É necessário o

comprometimento da instituição de ensino, para que seja possível formar alunos

com consciência cidadã, de modo que esta não se restrinja apenas à idéia de

cidadania como o exercício do voto ou de que cidadania consiste apenas no fato de

não jogarmos lixo na rua.

Logicamente que, não há como se restringir a responsabilidade unicamente à escola

pela difusão de alguns conhecimentos um tanto equivocados, porém ela possui uma

parcela fundamental de influência sobre a formação desses indivíduos.

É importante esclarecer que as escolas mencionadas acima são responsáveis

diretamente pela base educacional do estudante. Assim, cabe à escola apresentar

ao estudante o conceito apropriado de cidadania. Além de apresentar-lhe a sua

prática efetiva, pois não basta apenas ensinar às crianças que todos são cidadãos,

se também não mostramos que, todos são iguais, em direitos e deveres.

Nas palavras de José Murilo de Carvalho27,

”Percorremos um longo caminho, 178 anos de história do esforço para construir o cidadão brasileiro. Chegamos ao final da jornada com a sensação desconfortável de incompletude. Os progressos feitos são inegáveis, mas foram lentos e não escondem o longo caminho que ainda falta a percorrer.”

Concordamos com o jurista, quando o mesmo afirma sobre o caminho percorrido

para a evolução da cidadania e que, apesar de tudo isso, não obtivemos êxito na

sua consagração. Porém, compreendemos que ainda não se chegou ao final dessa

jornada e que temos muito caminho a percorrer.

27 CARVALHO, Jose Murilo de. Cidadania no Brasil: o longo caminho. 10. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasilieira, 2008.p. 219.

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6 CONCLUSÃO

Diante de toda essa construção, fica clara a importância que o aluno de hoje tem,

para o futuro da sociedade brasileira. Vê-se que a difusão desses conceitos de

forma apropriada, é fator fundamental, para que essas pessoas tenham a real

consciência do conceito e da aplicação da cidadania.

Esclareça-se que própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394, de 20

de dezembro de 1996)28 afirma que

“Art. 1º. A educação abrange os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas manifestações culturais[...]Art. 2º. A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.(grifo nosso)

Portanto, vê-se que o Estado, através de seu legislador infraconstitucional, buscou

delimitar aquilo que considerava fundamental para que o indivíduo tivesse durante

sua formação, a fim de que conseguíssemos atingir o que determina a própria

Constituição, no que se refere a uma sociedade livre, justa e solidária. (art. 3º, I,

CF/88)29.

Para tanto, acreditamos que é necessário mudar, uma vez que se deve aludir ao

seguinte fato, muitos desses ingressantes no curso de Direito irão, possivelmente,

assumir cargos de relevância social. Mas, para que essa mudança seja eficaz e

plena, devemos estabelecer esse conceito através de uma base de ensino

construída por meio de um conceito amplo de cidadania voltada para crianças.

Sendo assim, frise-se que este processo de mudança visa introduzir as noções de

cidadania nos futuros pensadores brasileiros.

28 Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br /arquivos/pdf/ldb.pdf>. Acesso em: 04/10/0829 BRASIL. Constituição [da] República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2007.

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Como já foi dito anteriormente, é necessário que haja o comprometimento das

instituições de ensino. Ainda assim, estas não devem ser apenas as que se situam

no âmbito público, cabe também ao setor privado investir na (re)construção do

conceito de cidadania. Ressalte-se que deve ser de interesse desse a formação de

cidadãos para o “mundo” e que a cidadania seja difundida, com o acesso aos

direitos de forma ampla.

Importa elucidar que a iniciativa mais importante, não é a do setor público ou a

privado, é a iniciativa de cada cidadão em particular, da sociedade como um

conjunto. Nós também somos cidadãos, temos nossos direitos, mas também temos

deveres, e um desses deveres é difundir a cidadania, não se deve deixar que ela

esteja limitada a uma determinada classe ou grupo social.

A (re)construção do conceito de cidadania perpassa por um âmbito muito aquém do

que está na norma jurídica, ou mesmo da beleza de lecionar o que o ordenamento

jurídico visa proteger. Este processo aborda questões muito mais complexas do que

isto, ser cidadão e exercer a cidadania. Seria a tentativa de se aproximar a Teoria da

Prática, de levar em conta o que está normatizado, positivado, atendo-se, antes de

tudo, a uma realidade social que anda bem longe das Câmaras Legislativas, do

Palácio do Planalto e, inclusive, das Faculdades de Direito. Estas últimas, como

formadoras de profissionais, mesmo que não atuem como funcionários ou servidores

públicos, formam aqueles que estarão a serviço da Ordem Pública.

Por fim, chegamos à conclusão que a cidadania realmente evoluiu, ao longo dos

períodos históricos, buscando uma alteração gradativa, onde adaptou-se ao

contexto que estava inserida.

Porém, essa evolução está aquém daquela que se almeja ser a melhor definição de

cidadania. Admitiríamos, no máximo, uma possível “mutação” dessa concepção,

mas dificilmente um real rompimento.

7 REFERÊNCIAS

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ALVIM, Márcia Cristina de Souza. Educação, Cidadania e o Acesso à Justiça.

Revista Mestrado em Direito. Osasco, ano 6, n.2, p.97-106, 2006. Disponível em:

<www.fieo.br/edifieo/index.php/rmd/article/viewfile/39/77>. Acesso em: 10 jun. 2008.

BRASIL. Constituição [da] República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva,

2007.

CORRÊA, Darcísio. A construção da cidadania: reflexões histórico-políticas. 4.ed.

Ijuí: Ed. UNIJUÍ, 2006.

DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna,

1998.

LARRUBIA, Bruno. O que é cidadania? Disponível em: <www.pt.shvoong.com/

humanities/475324-que-%C3%A9-cidadania/>. Acesso em: 22 abr. 2008.

BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996: lei de diretrizes e bases da

educação. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br /arquivos/pdf/ldb.pdf>. Acesso

em: 04 out. 2008.

MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Direitos humanos, cidadania e educação. Uma nova

concepção introduzida pela Constituição Federal de 1988. Jus Navigandi, Teresina,

ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/

doutrina/texto.asp?id=2074>. Acesso em: 09 abr. 2008.

SILVA, José da. Faculdades de Direito e construção da cidadania. In_____ Poderconstituinte e poder popular: estudos sobre a Constituição. São Paulo: Malheiros,

2000, p.141

SOARES, Maria Victoria Benevides. Cidadania e Direitos Humanos. In: CARVALHO,

José Sérgio (org.). Educação, Cidadania e Direitos Humanos. Petrópolis/RJ:

Vozes, 2004.

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