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Artº Recepção de Marx Em Portugal, 1850-1930

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Filosofia.

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Revista Portuguesa de ilosofia

Evolução do marxismo em Portugal (1850-1930)Author(s): Alfredo DinisSource: Revista Portuguesa de Filosofia, T. 35, Fasc. 1/2, Marxismo II (Jan. - Jun., 1979), pp. 133-

 170Published by: Revista Portuguesa de Filosofia

Stable URL: http://www.jstor.org/stable/40338382Accessed: 29-02-2016 19:01 UTC

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 Evolu^ao do marxismo

 em Portugal ( 1850 1930 )

 Escrever sobre a evolugao do marxismo em Portugal no

 periodo que vai de 1850 a 1930 nio 6 trabalho f&cil e pareceri

 at£ k primeira vista de reduzido interesse, visto que esta corrente

 politica nao assumhi naquele periodo uma importancia muito

 grande no nosso pais, nem conquistou muitos adeptos, sendo por

 outro lado escassoe os elementos disponiveis para o estudo dest?

 assunto. Parece-nos apesar de tudo existir elementos suficientes

 que nos permitem assinalar a imporUuicia relativa da tendencia

 marxista no interior do movimento socialista em Portugal, e com-

 preender melhor este mesmo movimento, e ainda esclarecer que

 os afrontamentos e as alternativas, de ordem te6rica e pr&tica,

 que desde os fins do s6culo passado dividiam os socialistas por-

 tugueses, continuam a ser actualmente o porno da disc6rdia.

 Ck)m efeito, questdes-chave como as que se referem ao E^stado, k

 propriedade e ao processo de transigao do capitalismo para o

 socialismo (reformismo ou revolu^ao) eram jk entao entre n6s

 discutidas.

 Uma vez que nos interessa delinear o contribute* especifico

 do marxismo no movimento socialista portugu§s e que este, por

 seu lado, se enquadra na corrente do socialismo europeu, torna-se

 imprescindivel, para uma apreciagao correcta do problema, a sua

 perspectivagao ao nivel da movimentagao europeia para assinalar

 os tragos originais do pensamento e acgao de Karl Marx, proce-

 dendo em seguida ao seu reconhecimento em Portugal.

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 134 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 I - A EUROPA DO SfcC. XIX

 1. O ambiente socio-polftico na 1.' metade do s£culo

 Consumada a ascensao da burguesia franceea ao poder poli-

 tico com a Revolugao de 1789, a proclama<*ao das liberdades indi-

 viduals e da igualdade de todos os homens nao tinha fundamen-

 talmente modificado as estruturas geradoras das desigualdades

 e injustigas sociais. Por outro lado, a Revolugao Industrial

 ingles a, se provocara um rapido desenvolvimento t6cnico e eco-

 n6mico, produzira tamb&m toda a esp6de de exploragao e de

 mis6ria. O capitalismo nascente cedo conhecia as suas primeiras

 crises que levavam muitas empresas a fal&ncia, provocando

 desemprego em massa, fome, misSria, epidemias e todo um oor-

 tejo de injusti$as. Um tal estado de coisas nao podia deixar de

 provocar reacQoes, quer da parte do proletariado, quer da parte

 de alguns intelectuais da pequena e m6dia burguesia. Os operarios

 destruiam as maquinas que os lan^avam no desemprego, e assal-

 tavam os armaz6ns de mantimentos para poderem subsistir.

 Estas revoltas eram isoladas, sem nenhuma finalidade que nao

 fosse a luta por objectivos imedlatos de subsistftncia. Foram os

 intelectuais, saidos em geral das baixas camadas da burguesia,

 que come^aram por diagnosticar a crise por que passava a socie-

 dade europeia e a delinear alternativas, caminhos e objectivos a

 atingir, atrav^s de transfornMujoes socials, econ6micas e politicas

 que se afiguravam indispensaveis. No Manifesto do Partido Comu-

 nista Marx e Engels referem a contribui^ao de varios autores

 cujo pensamento foi suficientemente importante para formar

 escola, embora, na perspectiva marxista, as suas analises tenham

 sido insuficientes. Sismondi (1773-1842), economista e histo-

 riador genovfis, 6 considerado o cheffe do socialismo pequeno-

 -burgufis que no inicio do s6culo conquistara adeptos especial-

 mente em Franga e Inglaterra. Sismondi representava, segundo

 Marx, a perspectiva da pequena burguesia, tendo «aplicado na

 sua critica do regime burguSs criterios pequeno-jburgueses» e

 « tornado ipartido peios operarios do ponto de vista da pequena

 burg-uesia* '. Apesar de tudo, o seu contributo e considerado

 importante: «Este socialismo analisou com muita sagacidade as

 i Marx-OBBngels, Werke, vol. 4, Dietz Verlag, BerUm, 1060, p. 484.

 [21

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 135

 contradigoes inerentes ao regime de produgao moderna. P6s a

 nu as hipocritas apologias dos economistas. Demonstrou de uma

 maneira irrefutavel os efeitos criminosos da mecanizagao e da

 divisao do traibalho, a concentragao dos capitals e da proprie-

 dade agraria, a superprodugao, as crises, a fatal decad&noia dos

 {>equenos burgueses e dos camponeses, a revoltante desproponjao

 na distribuigao das riquezas, a guerra de exterminio das nagoes

 entre si, a dissolugao dos antigos costumes, das velhas relagSes

 familiares, das velhas nacionalidades» *. Todavia, para Marx e

 Engels este socialismo assentava numa s6rie de ambiguidades e

 eontradigoes que o tornaram rapidamente decadente, pelo menos

 do ponto de vista do prole tar iado: «ou este socialismo pretende

 restabelecer os antigos meios de produgao e de troca e, com eles,

 o antigo regime de propriedade e toda a antiga sociedade, on

 entao pretende fazer entrar pela violfrncia os meios modernos de

 produc&o e de troca no quadro estreito do antigo regime de pro-

 priedade que foi destruido, e irremediavelmente destruido, por

 eles. Num e noutro caso este socialismo £ simultaneamente reac-

 cionario e ut6pico» 3.

 Por outro Iado, Proudlhon (180»-1865) 6 considerado o repre-

 sentante do socialismo burguSs erigido em sistema, que apenas

 procurava remediar os desequiliibrios sociais para consolidar a

 posi^ao de dominio da burguesia. «Os socialiatas burgueses que-

 rem as condigoes de vida da sociedade moderna sem as lutas e

 os perigos que dela derivam fatalmente. Querem a sociedade

 actual, mas expurgada dos elementos que a revolucionam e a

 dissolvem» 4.

 Proudhon parte de uma crftica sobre a propriedade bur-

 guesa, isto 6, a que penraite obter rendimento sem trabalho, par-

 tindo do suposto que s6 o trabalho e produtivo. Admite contudo

 a apropriagao pelos trabalhadores do fruto do seu trabalho. A

 reforma da sociedade, assentando na transformagao das formas

 de propriedade, deve fazer-se nao ao nivel da produ$ao ou da

 repartigao, mas ao nivel da troca, por um regresso ao sistema

 de troca directa. A sociedade passaria entao a ser constitulda

 apenas por produtores que trocam a sua pr6pria produgao ao

 2 Ib.t pp. 484-486

 • K>., p. 485.

 « Xb., p. 488

 [3]

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 136 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 prego de custo. Capital e trabalho identificam-se, portanto, e o

 Estado acaba por sobrar. Um novo sistema 6001161111*00 tornara

 supferfluo qualquer sistema politico. A reforma social far-se-a

 pois nao por qualquer revolugao politica, mas apenas ao nivel eco-

 n6mico. Adiante se ver& a repercussao que a doutrina de Prou-

 dhon teve em Portugal.

 Quanto aos representantes do socialismo e do comunismo

 «critico-ut6picos», Saint-Simon (1760-1825), Fourier (1772-1837),

 Owen (1772-1858), etc., eles «apercebem-se bem do antagonismo

 das classes (...) mas nao se apercebem, do lado do prolatariado,

 de nenhuma espontaneidade histdrica, nenhum movimento poli-

 tico que lhe seja pr6prio», nao compreendem «como o desenvol-

 vimento do antagonismo das classes vai a par com o desenvolvi-

 mento da industria e tambem nao se apercebem das condigoes

 materials da emancipagao do proletariado, pondo-se 4 procura de

 uma cifincia social, das leis sociais, com o fim de criar essas con-

 dicoes» (...)

 «Repudiam, por outro lado, toda a acgao politica e sobre-

 tudo toda a acgao revolucion&ria; procuram atingir o seu fim por

 meios pacificos e tentam desbravar um caminho ao novo evange-

 Iho social pela forga do exemplo, por experi&ncias em ponto

 pequeno que, naturalmente, falham sempre* 5. Mas as suas pro-

 postas cont&m elementos criticos valiosos: «supressao do antago-

 nismo entre a cidade e o campo, aboligao da familia, do lucro

 privado e do trabalho assalariado, proclamagao da harmonia

 social e transformagao do E^stado numa simples administraQao

 da produgao - todas estas propostas nao f azem mais do que

 anunciar o desaparecimento do antagonismo das classes* 6. Tra-

 ta-se por^m de um socialismo ut6pico, uma vez que os seus

 representantes se op5em a toda a movimentagao politica da

 classe oper&ria.

 Reconhecida a insufici€ncia de todas estas correntes, qual

 seria entao a contribui$ao original do marxismo para o projecto de

 uma nova sociedade? Tal contributo vem esclarecido no texto do

 Manifesto. Engels resume no pref&cio k edigao alema de 1883

 o pensamento fundamental deste documento. atribuindo-o exclu-

 sivamente a Marx, nos seguintes tr§s t6picoB

 s Ib., p. 490.

 « Ib., p. 491

 [4]

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 137

 1.° - «... a produgao econdmica e a estrutura social que

 necessariamente decorre dela constituem em cada

 6poca hist6rica a base da bist6ria politica e intelec-

 tual dessa epoca»;

 2.° - «por conseguinte (desde a dissolugao do regime pri-

 mitivo da propriedade comum da terra) toda a His-

 t6ria tern sido uma hist6ria de luta de classes, de lutas

 entre as classes exploradas e as classes exploradoras,

 entre as classes dominantes e as classes dominadas,

 nos diferentes est&dios do desenvolvimento social*;

 3.° - «actualmente, esta luta atingiu urn est&dio em que a

 classe explorada e oprimida (o proletariado) nao pode

 mais liber tar-se da classe que a explora e oprime (a

 burguesia) sean libertar ao mesmo tempo e para sem-

 pre da exploragao, da opressao e das lutas de classes,

 toda a sociedade» \

 Por outro lado, o mesmo Manifesto estabelece que «a finali-

 dade imediata dos comunistas 6 a mesma que a de todos os par-

 tidos oper&rios:

 - constituigao dos prolet&rios em classe;

 - derrubamento da dominagao burguesa;

 - conquista do poder politico pelo proletariado* \

 Quais sao entao as caracteristicas que distinguem o pensa-

 mento de Marx das outras correntes socialistas? Jk tinha sido

 denunciada a oposigao entre as classes exploradora e explorada

 (a nogao de «luta de classes* j& vinha sendo vulgar izada desde o

 s6c. XVHI), jk tinha sido apontado o regime de propriedade at£

 entao praticado como fonte ultima da exploragao e de todas as

 injustigas. A originalidade de Marx pode entao ser situada a dois

 nlveis:

 1.° Ao nivel teorico: uma compreensao nova da Hist6ria

 - formulagao do materialismo hist6rico como explicagao rigo-

 rosa da evolugao hist6rica da Humanidade e como compreensao

 exacta das manifestagoes politicas, intelectuais, religiosas, etc.

 de cada 6poca como necessariamente decorrentes das relagoes de

 T Marx-Engels, Werke, vol. 21, p. 3.

 « Marx-Engels Werke, vol. 4, p. 474.

 15)

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 138 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 produgao dessa epoca as quais, por sua vez, asseguram o dominio

 da classe no poder; o marxismo constitui-se em «socialismo cien-

 tifico* em contraste com o «socialismo oitopico* representado

 pelas outras correntes.

 2.° Ao nivel prdtico: uma nova estrat6gia, visto que a domi-

 nagao da burguesia so sera destruida com a conquista do poder

 politico pelo proletariado. Uma vez que «o governo moderno nao

 e mais que uma comissao que gere os neg6cios comuns da classe

 burguesa no seu conjunto* w constituindo-se em poderosa coluna

 das relagoes de produgao do regime capitalista, tornara-se ina-

 diavel a tarefa da conquista do Estado de ffonma a transforma-lo

 num instrumento ao servigo do proletariado para a alteragao

 radical das relagdes de produgao.

 Foi sem duvida esta nova estrat£gia que iria ser o porno de

 disc6rdia em relagao as demais correntes aocialistas, partidarias

 do abstencionismo politico e da restrigao da luta de classes ao

 campo das reivindicaQoes econ6micas. Cam efeito, o marxismo

 proclama que a luta no campo econdmico £ abeolutamente indis-

 soci&vel da luta no campo politico.

 Marx soube ganhar pouco a pouco adeptos para a sua causa,

 de tal maneira que no ultimo quartel do s£c. XDC o marxismo era

 uma das correntes mais importantes do socialismo europeu. No

 entanto, a doutrina de Proudhon ha via sido largamente difundida e

 apoiada em toda a Europa tornando-se outra corrente importaute

 em oposigao ao marxismo. Esta oposigao foi suficientemente dura

 e profunda para marcar indelevelmente o movimento socialista

 em todos os pafses da Europa.

 2. O ambiente portugues

 Os condicionalismos politicos, sociais e economicos, bem

 como os conflitos dai emergentes, que ean meados do s^c. XIX

 existiam por toda a Europa, eram praticamente os mesmos que se

 verificavam em Portugal, porventura de forma menos acesa que

 noutros paises, em especial na Inglaterra e Europa central. O nivel

 cultural da populagao era em geral extremamente baixodada a ele-

 vada taxa de analfabetismo (cerca de 75% K e isto reduzia bas-

 tante o numero dos que podiam tomar contacto com as novas

 correntes europeias atraves da leitura dos poucos textos que che-

 » ib.f p. 464.

 [6]

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 139

 gavam at6 a6s. A separagao entre o campo e a cidade era acen-

 tuada. Igualmente flagrante era a dist&ncia entre o povo em

 geral e o reduzido numero de inteiectuais que iam alimentando

 as suas discussdes inais ou menos acad&nicas com os ecos que

 chegavam da Europa. O desenvolvimento industrial era bastante

 inferior ao dos outros paises e, em si mesmo, incipient*. O sistema

 de trabalho por conta pr6pria estava ainda bastante generalizado

 e as poucas empresas que existiam em regime de assalariado

 eram em reduzido n6mero e de pequenas dimensoes. Por tudo

 is to, nao se pode falar da existencia em Portugal de urn operariado

 fabril significativamente activo como o que nos restantes paises

 da Europa industrializada iria absorver rapidamente as palavras

 de ordem de Karl Marx e de outros homens de aogao. Os ideais

 socialistas eram entre n6s predaminantemente acariciados por

 alguns inteiectuais saidos da pequena e m6dia burguesia, e por

 urn pequeno numero de oper&rios de espirito mais desperto mas

 sem uma suficiente capacidade critica.

 O socialismo que em meados do seculo passado gozava de

 inaior simpatia em Portugal era o que se inspire va em Proudhon :

 «€om Proudhon a grande maioria ou at6 a totalidade dos socia-

 listas Portugueses pretendia quase exclusivamente eliminar o

 lado mau do capitalismo, mas nao destrui-lo, e aemelhante 6ptica

 adaptava-se perfeitamente k situagao portuguesa, visto faltar ao

 proletariado portiugufis uma s61ida base organizacionab 10.

 Podemos dizer, em tragos geraia, que o processo de intro-

 iugao e divulgagao do marxiamo em Portugal seguiu duas vias

 paralelas :

 1/ - uma primeira, em estreita ligagao com o movimento

 oper&rio que mantinba algum interc&inbio com as organizagdes

 oper&rias de outros palses, nao s6 atrav^s de relagoes epistolares,

 jornais e revistas, como tamb6m atrav^s da participagao em con-

 ^ressos oper&rios internacionais onde se davam frequentes afron-

 tamentos entre as correntes entao em voga no interior do movi-

 mento sooialista. Existia entre n6s uma pequena «vanguarda ope-

 raria>, se assim lhe podemos chamar, que consegnia manter

 alguma imprensa, noaneadamente jornais, folhetos e alguns livros.

 Todavia, ao operariado portuguSs interessavam mais as conse-

 '« Alfredo Margarldo, A divulgaQ&o do marxismo em Portugal, pref&clo

 da 8ua tradug&o de O Capital, de K. Marx, na versAo-resumo de Gabriel D^vllle,

 Gulmarftes A C ' EkUtores, Llsboa, 1075, p. XXVX

 rn

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 140 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 quSncias pr&ticas e imediatas das teorias em discussao do que a

 sua coerencia te6rica ou o seu interesse filos6f ico. As discussoes

 a estes niveis eram minimas, e nao poderia ser de outra forma

 tendo em conta o que se disse sotore as caracteristicas da socie-

 dade portuguesa desta 6poca. Por isso mesmo, uima parte conside-

 ritvel do proletariado portugu§s foi conquistado para as fileiras

 do Partido Republicano, o qual conseguia fazer crer a muitos que

 a exploragao e a injustiga social de que eram vitimas decorriam

 simpleamente do regime politico mon&rquico, cessando por isso

 logo que fosse implantada a Reptiblica. Os poucos marxistas por-

 tugueses, bem como os demais socialistas nunca conseguiram con-

 veneer a maior parte do proletariado da ilusao em que viviam.

 2." - Usna segunda via diz respeito ks an&lises te6ricas feitas

 em confer§ncias, folhetos e livros, sempre em pequeno numero,

 por alguns intelectuais geralmente sem ligagao directa com o

 movimento oper&rio. Estas an&lises situam-se em geral ao nivel

 puramente te6rico e as suas consecpufincias pr&ticas sao quase

 nulas.

 Situa/ndo o marxismo no movimemto socialista portugu6sf e

 este no contexto da Europa, quer ao nivel das movimentagoes

 oper&rias, quer no piano politico geral, podemos, no espago que

 vai de 1850 a 1930, assinalar trfis periodos fundaimentais marca-

 dos por acontecimentos que determinaram modificagoes impor-

 tantes no pensamento e, mais ainda, no comportamento das forgas

 que, reclamando-se do socialismo, se movimentavam em Portugal.

 ln Periodo - de 1850, quando comegaram a chegar a Por-

 tugal os primeiros ecos da polemica Marx-Proudhon e da Revolu-

 gao (francesa de 1848, at6 1871, ano da foindagao em Portugal de

 uma secgao da Associagao Internacional dos Trabalhadores.

 2.° Periodo - de 1872, ano da realizagao do Congresso de

 Haia da Internacional, que determinou a constituigao de partidos

 socialistas, at6 k l.a Grande Guerra.

 S.° Periodo - da Revolugao Russa de 1917 ate 1930, quando

 Bento Gongalves tenta/va reestruturar o Partido Comunista Por-

 tugu§s na base do marxismo-leninismo.

 II _ l.o PERfODO (1850-1871)

 Neste primeiro periodo nao se pode falar ainda propriamente

 de qualquer tend§ncia marxista em Portugal, mas a estrat6gia

 [8]'

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 141

 marxista no campo da luta politica comegava ja a ser canhecida,

 ainda que no meio de miuitas confusdes e ambiguidades.

 At6 k fundagao em Portugal de uma secgao da Associagao

 Internacional dos Traibalhadores, os socialists Portugueses jun-

 tamente com os republicanos agrupavam-se k volta do «Centro

 Promotor de Melhoramentos das Classes Laiboriosas», fundado

 em 1852, cujos objectivos se situavam no campo da instrugao

 tAcnica, intelectual e moral. Um dos vultos mais proemimentes

 do Centro foi Sousa Bramdao que vivera em Paris a Revolugao

 de 1848 e era partid&rio das ideias de Fourier e Proudhcm. Na

 liuha de Sousa Brandao outros entusiastas pelo ideal do socia-

 liamo associacionista Be entretinham ali a discutir as noticiafl

 que chegavam da Europa, como as que se referiam k Comuna de

 Paris e a Internacional. Inicialmente, no Centro Promotor mis-

 turavam-se socialistas e republicanos, todos interessados em cons-

 pirar, emlbora com objectivos diversos. No seu trabalho sobre a

 Formagao da Ideologia Republiocma (1820-1880), Joaquim de Car-

 valho descreve a actividade do Centro Promotor nos seguintes

 termos: «Oper4rios, burgueses, intelectuais e politicos, colaboram

 solidariamente na vida do Centro, sob a dnspiragao do romantismo

 social e humanit&rio. A acgao do Centro nada teve de revoluciona-

 rio at6 1872, isto 6, at6 k primeira invasao do marxismo, limitando

 os seois objectivos k propaganda do associacionismo e mutualismo,

 ao aperfei<;oamento dos m^todos de trabalho, k difusao do ensino

 elementar e t6cnico, a criagao de asilos para inv&lidos, etc.» ll.

 fi manifestamente exagerada a expressao «at6 1872, isto 6, at*

 a primeira invasao do marxismo*. O autor refere-se certamentc

 ao Congresso de Haia onde a estrat£gia marxista triunfou da

 linha bakuninista como adiamte se veriL Se 6 verdade que este

 facto teve algum eco entre n6s, nao foi certamente nada que se

 compare a uima « invasao do marxismo*.

 Um facto importante na vida do Centro foram os contactos

 estabelecidos com tr§s emissarios espanh6is com vista k fundagao

 em Portugal de uma secgao da Associagao Internacional dos Tra-

 balhadores. Vejamos rapidamente o que se passava no seio desta

 11 Joaquim de CanvaHio, Formagao da Ideologia Republioana (1820-

 -1880), In cHist6ria do Regime Republicano em Portugal*, vol. I, pp. 234-

 -235, clt. por Joa6 Tomas de Sousa, O SocidHsmo de Antero de QuentaX,

 Uvraria dasslca Editora, Usboa, 1^42, pp. 153-^54.

 cei

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 142 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 Associagao quando em 1871 foram estabelecidos os primeiros

 contactos em Portugal.

 A I INTERNATIONAL EM PORTUGAL

 1. O afrontamento Marx-Bakunlne no seio da International

 Em 28 de Setembro de 1864 Marx colaborava activamente

 na fundagao da cAssociagao Internacional dos Trabalhadores*,

 mais conhecida como I Internacional, juntamente com partidarios

 de Proudhon, Lassale e outros, tendo influido decisivamente na

 elaboragao dos Estatutos daquela Associa$ao. No pref&cio k edi-

 §&o alema de 1890 do Manifesto, Engels escreve que «o preambulo

 dos estatutos da Internacional foi redigido por Marx com tal

 precisao que foi reconhecido mesmo por Bakunine e ananquis-

 tas» ". No entanto os partidarios de Proudhon eram em grande

 niimero e Marx oompreendeu logo de inicio que teria de travar

 uma luta persistence e tenaz para conseguir imprimir k Interna-

 cional o rumo ditado pelas suas pnSprias concep$des.

 Em 1868 Bakunine foi aceite na Internacional juntamente

 com um tgrupo de sequazes. Com eles f umdara em 25 de Setembro

 do mesmo a/no a «Alian$a Internacional da Democracia Socia-

 lista», a qual possuia estatutos proprios redigidos pelo te6rico

 do anarquiamo. A filiagao da Alianga na Internacional s6 foi

 aceite em Julho de 1869 e nao como associagao internacional.

 Somente as suas federagoes nacionais e locals foram reconihe-

 cidas. As relagoes entre Marx e Bakunine foram sexnpre tensas.

 Bakunine era mais proudhoniano que marxista, manifestando

 poucas simpatias por Marx, embora lhe reconhecesse os m6ritos

 intelectuais: «Proudhon compreendeu e sentiu a libendade muito

 melhor que Marx (...). £ possivel que, em teoria, Marx tivesse

 chegado a um sistema da liberdade mais racional que o de

 Proudhon - mas falta-lhe o instinto de Proudttion. Como alemao

 e judeu 6 autoritario dos p£s a caibega^ l8.

 Marx e Bakunine estavam de acordo quanto a eliminacao

 do Estado e do sistema capitalista por ele sustentado e fonte de

 12 Marx-Engels, Werke, vol. 4, p. 584.

 it Cf. A. Machado, «O Soclalismo em Portugal ha um 86culo», In

 Seara Nova, n.° 1501, Novemtoro de 1970, p. 309.

 [10]

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 143

 todas as injustigas. Divergiam porem quanto aos m&odos a

 utilizar para a consecugao daquele obrjectivo e ainda quanto a

 organizagao e funcionamemto da futura sociedade socialista.

 Bakunine preconizava o abstencionismo em mat&ria politica, isto

 e, a recusa das lutas eleitorais e parlaraentarea, optando pela

 actuagao ao nivel das reivindicagoes estritamente econ6micas e

 laborais, tais ccxmo hor&rios de tralbalho, sal&rios, direito k greve,

 assistgncia social, etc. A medida que os trabalhadores fossem

 conseguindo veneer neste campo e obrigassem os Govemos a

 sucessivas reformas, o velho sistema capitalista ruiria pela base

 at6 se desmoronar por si mesmo, desaparecendo consequente-

 mente o Estado para dar lugar a uma sociedade an&rquica, isto

 e, nao ajutarit&ria. Bern ao contrario, Marx e os seus adeptos

 sustentavam a tese de que a conquista do poder politico pela

 classe operaria se tinha tornado um objectivo absolutamente prio-

 rit&rio pois era a unica maneira de derrubar a classe capitalista

 no poder e apressar o advento da sociedade comunista. Enquanto

 Bakunine se preocupava apenas com a luta no campo econ&nico,

 Marx acentuava a indissolubilidade das lutas nos campos econ6-

 mico e politico.

 A corrente marxista foi-se impondo pouco a pouco, de tal

 modo que em 1871 a Conferencia da cAssociagao Internacional

 dos Traibalihadores» aprovava em Londres a 9eguinte Resoloigao.

 «Tendo em vista as consideragoes dos Estatutos originais onde se

 diz: 'A emancipagao econ6mica dos trabalhadores 6 o grande

 objectivo ao qual deve ser subordinado qualquer movimento poli-

 ti>co como meio'; tendo em vista o 'Adresse* inaugural da Asso-

 ciagao Internacional dos Trabalhadores (1864) que diz... 'A con-

 quista do poder politico tornou-se entao a primeira obrigagao da

 classe oper&ria1; tendo em vista a Resolugao do Congresso de

 Lausane (1867) a este prop6sito: *a emancipagao dos trabalha-

 dores e inseparavel da sua emaincipagao politica'; ...A Confe-

 rencia lembra aos meanbros da Internacional: que no estado mili-

 tante da classe operaria, o seu movimento economico e a sua acgao

 politica estao indissociavelmente ligados* M. Era de facto o

 triunfo de Marx. Os anarqaiistas discipulos de Bakunine nao

 poderiam subscrever uma Resolugao nestes termos. Por isso a

 cisao entre as duas tendencias era cada dia mais not6ria no seio

 J* Cit. por Alfredo Maxgarido, op. cit., pp. XXVU-XXVUI.

 [HI

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 144 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 da 'Internacional. Referindo-se a estas desavengas Gongalves

 Viana, anarquista, escreveria mais tarde: «1& fora, os marxistas

 a um lado e os bakuninlstas a outro guerreavam-«e tenazmente*. 15.

 Foi neste moment© em que a luta interna se agudizava que veio

 a Portugal uma delegagao da Internacional encarregada de fundar

 em Lidboa uma secgao dafqoiela associag&o.

 2. Fundagao em Ltoboa de uma secg&o da I Internacional

 A fundagao em Lisboa de uma secgao da Internacional 6

 importante na medida em que ajuda a compreender melhor o

 atraso e a dificuldade de penetracjao do marxismo em Portugal.

 Funcionava em Madrid o Conselho Federal Espanhol da

 Internacional composto de cinco membros. Pressionados pela

 perseguigao de que eram alvo por parte do govenno espanhol, e

 para dar cumprimento k decisao tomada no Congresso de Barce-

 lona em Junho de 1870 de knplantar em Portugal a Internacional,

 decidiram que trfis deles viessem a Lisboa. Aqui chegaram em

 Jun ho de 1871 Anselmo Lorenzo, Gonzales Morago e Francisco

 Mora, tendo-se realizado duas entrevistas com Jos6 Fontana,

 Antero de Quental, Batalha Reis e outros. Uma vez que nesta

 altura se digladiavam no seio da Internacional duas correntes,

 marxista e bakuninista, qual destas posiQoes teria prevalecido

 nos encontros dos trSs espanh6is com os Portugueses?

 Notemos em primeiro lugar que os mesmos trfis espanhois

 que vieram a Portugal tinham recebido em Madrid em 1868 um

 dos colaboradores mais intimos de Bakunine, Giuseppe Fanelli,

 e dele ouviram explicagoes acerca da Internacional, por conse-

 guinte segundo a perspectiva de Bakunine e, pior ainda, bastante

 conftisas. fi prov&vel que o proprio Fanelli nao tivesse ainda per-

 cebido completamente a posiqao de Bakunine no seio da Interna-

 cional, tendo confundido os madrilenos ao apresentar-lhes os esta-

 tutos da «Alianga» como se fossem os da International. Bakunine

 lamentara o facto em carta a Morago: «ao principio isso pare-

 ceu-me um grande triunfo, mas na realidade con,verte-se agora

 em causa de «confusao e desorganizagao para uma e outra (asso-

 '» J. M. GonQalves Viana, A EvoIuq&o Anarquista em Portugal, ed. Seara

 Nova, Usboa, 1975, p. 97.

 [121

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 145

 ciagao)»16. Por tudo isto, a secQao da ciAssociagao International

 dos Tralbalhadores» fumdada em Espanha em 24 de Janeiro de

 1869 «nada tinlha que ver com o Conselho Geral de Londres: era

 realmente uma organizagao a/narquista» 1T.

 Todavia, Batalha Reis escreveria acerca do encontro com os

 tr&s espanh&s: «Estes tr£s h omens, sem duvida muito not&veis

 e, depois, muito conhecidos em todo o moindo, disseram-nos o

 piano da vasta organizagao, expuseram as doutrinas de Karl

 Marx e as teorias que, jk mesmo entao, dividiam o socialismo

 nascente sob esta nova forma de combate* lg. E Antero, na sua

 carta autobiogi&fica a W. Stordk, escreveu referindo-se a este

 periodo: «ao mesmo tempo que conspirava a favor da Uni&o

 Ib^rica, f undava com a outra mao sociedades oper&rias e introdu-

 zia, adepto de Marx e Engels, em Portugal a Associagao Interna-

 cional dos Trabalhadores* 19.

 Ficariamos assim sem saber ao certo quais foram as ideias

 que os tr6s espanhdis apresentaram como sendo as que orien-

 tavam a Internacional se o mesmo Antero as nao tivesse exposto

 com muita €lareza num opuaculo intitulado «O que 6 a Interna-

 cional>, onde se ve que foram os ideals de inspira^ao bakuninista

 que os Portugueses acolberam inicialmente como sendo os da

 Internacional. Mas, tal como em Batalha Reis, tamb&m em Antero

 se nota uma certa conf usao entre as posiQdes de Marx e Bakunine,

 emibora se manifested ambos coahecedores das duas grandes

 tend€ncias que entao se confrontavam.

 Antero resume o programa da Internacional nos seguintes

 termos : «toda a doutrina da Internacional, e a sua originalidade,

 pode dizer-se que est& contida muma definiQao nova da proprie-

 dade - numa rigorosa e fundamental distingao entre a proprie-

 dade individual, sobre a qual o individuo tern um direito extenso

 e absoluto de usar e dispor, e a propriedade oolectiva, que 6 o

 patrimdnio da humanidade, da qual o individuo, por isso mesmo

 i« Cf. A. Machado da Rosa, «O Socialismo em Portugal...*, In Seara

 Nova, n.° 1502, Dezembro de 1970, p. 395.

 it ib., p. 395.

 i« Cit. por Cesar Nogueira, Not as para a Histdria do Socialismo em

 Portugal (1811-1910), vol. I, Portugalia Editora, Lisboa, 1964, p. 22.

 i» Clt. por J. Carreiro, Antero de Quental, vol. I, ed. Instituto Cultural

 do Ponta Delgada, Usboa, 1949, p. 36.

 10 IW

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 146 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 que faz parte da humanidade, nao tern direito de dispor» *°. Na

 linha de Proudhon, Antero afirma ser legitimo que cada traba-

 lhador receba o produto integro do seu trabalho. A propriedade

 colectiva 6 constituida apenas pelos instrutnentos de produgao.

 Mas onde Antero se demarca com maior nitidez do marxismo

 e manifesta as suas conoepgoes proudhonianas 6 ao referir-se ao

 metodo a seguir para alcangar os objectivos que a Internacional

 se propoe atingir: «a questao estk toda em levantar e melhorar

 cada vez mais as condigoes do trabatho, e cortar os privilegios do

 capital, enfraqueceMo, bloquefc-lo, torn&-lo dia a dia mais depen-

 dente e prec&rio, at6 que se renda e desaparega: numa palavra,

 transferir a forga econ&nica, que reside nas maos dos capitalistas,

 para as maos dos trabalhadores. Isto alcan<*a-se por meio da

 reaistencia, com a arma legal e franca da greve, conquistando ora

 o aumento do sal&rio, ora a dintinuigao das horas de trabalho, ora

 garantias para a dignidade e liberdade do oper&rio dentro da

 fabrica. Alcanga-ee ainda por meio da associagao cooperativa,

 sobretudo a de consumo, que liberta o consumidor do jugo da

 especulagao* fl. E a exposigJo de Antero culmina numa afirmagao

 tipicamente «aliancista> : «o programa politico das classes traba-

 lhadoras, segundo o Socialismo, cifra-se etm uma s6 palavra:

 abstencionismo. Deixeonos que esse mundo velho se desorganize,

 apodrega, se esfacele, por si, pelo efeito do virus interior que

 o mina» ".

 Eim carta a Engels datada de 24 de Juniho de 1872, Nobre

 Franga, pertencente ao grupo reunido k volta de Antero, escrevera

 que este «parece vacilar entre as duas solugoes: a politica (pela

 revolugao legal), e a econ6mica» 2I. Um mfes depois escrevera

 novamente ao mesmo Engels, dando conta de qoie «Antero con-

 fessa que historicamente nao se pode realizar uma revoluQao

 como a concelbemos crendo que a ernancipagao dos trabalhadores

 s6 se poder4 efectuar em tempos remotos por meio de evoluQoes

 politicas» 24.

 20 Antero de QuentaJ, Prosas 11, ed. Couto Martins, Usboa, 1926

 pp. 176-177.

 ** Ib., pp. 187-188.

 a* Ib.t pp. 191-192.

 a* 15 Cartas de Portugal para EngeU e Marx, recolha, pref&cio e notas

 He Cesar de Oliveirk, Inlclatlvas Editorials, Usboa, 1978, p. 25.

 *« Ib., p. S?.

 [14)

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 147

 Do que fica exposto coiuclui-se que foi sob a perspectiva

 «aliancista» que foi acolhida a exposigao de Anselmo Lorenzo ou,

 pelo menos, que foi nessa perspectiva que ela foi divulgada por

 Antero, o qual foi indicado k Internacional por Francisco Mora

 como o elemento respons&vel a quern deveria ser enviada toda

 a correspondencia inicial daquela Associagao para Laisfcoa. Toda-

 via Nobre Franga, que nao estaria s6, pretende j4 demarcar-se

 da perspectiva de Antero, ainda que mais tarde, em 1876, o socia

 lista Azedo Gneco escreva a Engels dizendo que «o Franga ainda

 se ressente das teorias da Alian$a» 2\ A influ&icia da «Alianga»

 foi sennpre reconhecida como preponderante pelo menos nos pri-

 meiros tempos do movimento socialista portugufis. Em 1885 o

 jornal «O Protesto Oper&rio* afirmari que foi deste grupo da

 Alianga entao fundado em Portugal que saiu o movimento socia

 lista portugues, e Azedo Gneco escrever& em 1885 que «a influfen-

 cia da Alianga da Democracia Socialista (...) afastara irresisti-

 velmente da politica o movimento oper&rio na sua iniciagao* ' .

 Entretanto, e no seguimento dos contactos estabelecidos com

 os trfis e8panh6is, criara-se em Litfboa em meados de 1871 a

 «tAssociagao Protectora do Trabalho NacionaU. Logo no seio

 desta associaQao se verificou o confronto das duas correntes prin

 cipais que dividiam o movimento socialista: «Comegou a funcio-

 nar com muitos associados, existindo por&n diverg&ncias cntrc

 eles. Essas diverg&ncias tinham a sua origem em dois modos do

 ver que alguns dos fundadores ten tar am consignar na Associagao.

 Uns optavam que ela devia aforanger as questoes politicas e seguir

 uma politica avangada, outros, pelo contritrio, que ela devia

 abster-se de toda a acgao politica e tratar puramente das ques-

 t5es econ6micas do seu interesse. Depois de discussoes acaloradas.

 adoptou-se por grande maioria que a Associagao devia abster-st

 de quest5es politicas* 27. Azedo Gneco escreveria mais tarde que

 foi Antero quern convenceu a maioria a decidir-se pelo albsten-

 cionismo.

 Entretanto, a 14 de Janeiro de 1872, era fumdada em Lisboa

 a «Fraternidade Oper&ria» por urn grupo chefiado por Jos6 Fon-

 tana, desiludido com o Centro Promotor que entretanto entrara

 em decadencia. Tambfen a Fratemidade enveredou pelo caminho

 2ft Ib.f p. 56.

 2« Cf. C6sar Nogneira, op. cii., p. 21.

 « Ib., pp. 15-16.

 [15]

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 148 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 das reivindicagoes econ6mi<cas pondo de parte a luta politica,

 como refere o mesmo Gneco: «nos principles de 1872, ao ser

 fundada a Fraternidade OperAria, consequftneia da organizagao

 da Internacional no nosso pafs, a politica foi posta de parte pelo

 proletariado com entusiasmo, com furor at6» M. A Fraternidade

 desagregar-se-ia tamlbem em virtude das diverg&ncias ideol6gicas

 que progressivamente se acentuavam.

 Ainda neste mesmo ano de 1872 a revista «O Pensamento

 Social » publicava o Manifesto do Partido Comunista.

 in - 2. PER1ODO (18721917)

 1. Do Oongresoo de Haia k fandagao do Partido Socialist*

 Portugues

 A luta interna que as duas facgSes, marxista e bakuninista,

 travavam no selo da Internacicmal veio a ter o seu desfecho no

 Congresso daquela associagao realizado em Haia em Setembro

 de 1872, tendo triunfado a linha marxista. Para Gongalves Viana,

 anarquista, tratou-se de urn autfintico «golpe de Eatado» prepa-

 rado por Marx: «de 1869 a 1872, Bakunine, na Federagao Juras-

 sienne, desenvolve activamente o movimento revolucion&rio anar-

 quista, em oposigao ao golpe de Estado de Marx, dado no Con-

 gresso de Haia em 1872» tf. A ^Fraternidade Oper&ria» esteve

 I>re8eiite em Haia, representada por Paul Lafargue, genro de

 Marx. Referindo-se k posi^ao dos socialistas Portugueses escreveu

 Lafargue: «em presen^a das intrigas aliancistas de Portugal e

 Espanha, os internacionalistas Portugueses retiraram-se desta

 sociedade secreta; e, no Congresso da Haia, reclamaram, como

 medida de salvagao pfilblica, a expulsao dos aliancistas do seio da

 Internacional* ao. Por outro lado Max Nettlan, filiando o movi-

 mento oper&rio revolucionirio portuguSs na linha bakuninista,

 considera que cBakunine julgou, e com razao, poder discutir

 seriamente a Internacional com Jos6 Fontana; e 6 lament^vel

 que este, ou os seus amigos, se tenham tornado tao facilmente

 vitimas da intriga marxista* M.

 28 Ib., pp. 21-22.

 t» Gongalves Vlana, op. cit., p. 91.

 »o Of. O6sar Nogruelra, op. cit., p. 29.

 •i Ib., p. 82.

 [I6J

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 149

 A clarif icagao ideol6gica ia-se tazendo lentamente no sentido

 de uma acentuagao da ruptura entre marxistas e bakuninistas.

 A cFraternidade Operaria* acabaria por sucmraJbir a esta divisao,

 «nao so por nao ter grande consistencia na consciencia oper&ria

 como por motivo de varias desinteligencias que surgiram entre

 O8 seus elementos a proposito de uns serein aliancistas, isto e,

 partidarios do anarquiamo de Bakunine e outros socialistas mar-

 xistas, o que era urn reflexo das desavengas que predominavam

 na Associagao Internacional dos Trabalihadores* S2.

 Uma das principals resolugdes do Congresso de Haia foi a

 criagao de Partidos Socialistas em todos os paises com o fim de

 oiganizar e promover a luta do proletariado no campo politico.

 Esta resolugao foi recebida com agrado por uma parcela dos

 socialistas Portugueses, como adiante se veriL Logo em Outubro

 de 1872 Antero publicou um artigo sobre aquele Congresso, pare-

 cendo albandonar a linha bakuninista e aderir inteiramente as

 resolugoes tomadas. Na sua opiniao o Congresso seguiu um meio

 termo entre as correntes autorit&ria e anarquista. Resume em

 quatro as conclusdes daquele Congresso : 1.* - «O proletariado

 saioi definitivamente do campo das hip6teses (...) dando k luta

 uma feigao ao mesmo tempo econ6mica, politica e moral (...).

 2/ - Organizagao do proletariado cosmopolita como u<m partido

 politico, distinto essencialmente de todos os partidos burgueses

 e a eles oposto (...). O proletariado passa a ter uma exist&ncia

 hist6rica: toma no Forum o seu assento, um lugar seu, donde

 fala, vota e se afirma em cada dia e hora em face dos seus inimi-

 gos (...). A constituigao politica do proletariado 6 um verdadeiro

 acontecimento hist6rico, porque e na politica que todos os ele-

 mentos humanos afirmam a sua acgao hist6rica (...). 3/ - O Con-

 gresso seguiai com um tacto perfeito a lirxha exacta e justa entrt

 as tendencias autoritarias daqueles que quiseram uma verdadeira

 ditadura no seio da Internacional, e as tend&ncias desorganiza-

 doras de outros que, em nome da autonomia dos grupos locais,

 quelbrariam entre esses mesmos grupos todos os lagos de solida-

 riedade e unidade de acgao* isto no que se referia k reestrutu-

 ragao do Consetho Geral e dos Estatutos da Internacional.

 4.a - cResoluQao unanime a respeito da fonmagao das unioes

 internacionais de offcios (...) Uma vez formadas as unides, o

 »* lb.f p. 96

 [17J

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 150 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 capital achara por toda a parte diante de si uma barreira infle-

 xivel. A reforma das condigSes industrials sera entao uma neces-

 sidade para os proprios capitalistas, reclamada por eles mais do

 que por ningu&n, e essa relfonna poderA entao ser tal que importe

 toda uma revolugao econ6mica, porque nao pode ser menos do

 que a liquidagao social* M. Antero distancia-se de Bakunine ao

 aceitar a necessidade da luta no campo politico. Mas subjacente a

 todo o artigo continua ainda a ideia de um desmoronamento

 natural do velho mimdo capitalists ideia jk exposta no opusculo

 «O que 6 a International*, como se viu. Antero continua ainda a

 acreditar que as refonmas serao pedidas pelos proprios capita-

 listas mais do que por ningu&n. A sua raiz proudhoniana revela-

 -se ainda na intuigao de que o fundo da questao social nao Be

 reduz apenas ao aspecto econ6mico e politico, mas que toca tam-

 b^m o aspecto moral.

 De qualquer modo, a ruptura de Antero e outros com o anar-

 quismo foi decisiva para a criagao em Portugal do «Partido

 Socialista», o qual acalbara por vir a reclamar-se do marxismo,

 como adiante se verk. C6sar Nogueira confirma que «a deciaao

 de Antero e tamb&n a de Fontana muito deveria ter influenciado

 a imentalidade dos socialistas Portugueses, os quais, acatando as

 resolugoes do Congresso da Haia, decidiram romper com os

 anarquistas e os republicanos, formando o Partido Socialista

 e a Associagao dos Trabalhadores na R^giao Portuguesa* ", res-

 pecuvamente para as lutas politica e e€on6mica. Os ideais

 anarquistas tinham por&m langado raf^s demasiado profundas

 para poderem ser arrancadas de um dia para o outro. Este facto

 muito iria contribuir para a ambiguidade que logo desde o inicio

 e durante decadas marcaria a actividade do Partido Socialista,

 cniado em Janeiro de 1875 «por proposta de Azedo Gneco e

 com o apoio ainda decisivo de Jose Fontana* *n. C6sar Nogueira

 refere que «logo nos primeiros dias surgiram dificuldades. Os

 operarios agrupados em volta do programa abstencionista, mos-

 traram absoluta repugnancia pela ac^ao politica; e mesmo alguns

 dos mais not&veis pugnadores do socialismo cientifico negaram-

 -se a aceitar a luta politica como uma necessidade revolucionS-

 *• Of. J. Carrelro, op. dt., vol. H, pp. 303-304.

 >* O6sar Nogueira, op. dt., p. 42.

 « Ib., p. 51.

 1*181

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 151

 ria ". No entanto as cfipulas do partido estavam em geral muito

 pr6ximas do marxiamo, eendo Azedo Gneco um doe principals

 doutrinadore8 desta corrente. J& em Dezembro de 1873 Jos6 Fon-

 tana escrevia a Marx pedindo-lhe «algum escrito» destinado a

 ser lido «nuui sarau socialista para ajudar dois companheiros

 nossos perseguidos pelos industrials e governor 87. Em Janeiro

 de 1876 Azedo Gneco escrevia a Engels pedindo colaboragao para

 o jornal «O Protestor, 6rgao do Partido Socialista: «Se me

 pudesse enviar algumas correspond&ncias muito me auxiliaria

 e se pedisse a Lafargue, Larvalheur, a Marx e Odgar e a todos

 O8 nossos amigos de ai para nos mandarem correspond€ncias

 e consentissean que as public&ssemos assinadas, grande favor

 me faziam, nao a mim, mas k causa dos trafoalhadores porque

 dava muita import&ncia ao pobre peri6dico» ts. E em Abril do

 mesmo ano o mesmo Gneco relate ainda a Engels a forma como

 f oi constituMo o Partido Socialista : «Comecei a veneer a repugn&n-

 cia dos meus companheiros pelo genuino movimento da Inter-

 nacioraal propondo audazmente que se discutisse o programa da

 Alianga. Nao faltaram defensores a esse programa, mas como eu

 e os meus amigos 6ramoe mais eloquentes e estimados tivemos o

 prater de ver rejeitar uma por uma todas as proposigdes esta-

 pafdrdias do papa Bakounine. Por f im vibrei o Ultimo golpe pro-

 pondo por meio de um amigo meu, que a assembleia descobriu

 a necessidade de ser canstituido o partido politico do proletariado

 socialista* 80. Este partido cotnegou pois sob o signo da hetero-

 geneidade ideol6gica e assim se manteria nas d^cadas seguintes.

 Em 1876 celebra-se em Paris um Congresso oper&rio ao qual

 o Conselho Central do Partido Socialista enviou uma mensagem

 realQando a importAncia do acesso do proletariado aos parla-

 mentos burgueses: «iAs questoes que pretendeis tratar nesse

 Congresso sao da mais alta importancia, e uma delas, a da repre-

 senteQao directa do proletariado ao Parlamento, chama sobre

 todas a nossa atengao. O Eetado, no nosso modo de ver, 6 uma

 delegagao das classes dominantes, destinado a vigiar e a superin-

 tender sobre os seus interesses colectivos, e logo que o opera-

 riado lhe modifique este modo de ser, as classes possuidoras per-

 t« ib., p. 4T.

 •t is Cartas de Portugal para Engela e Marx, p. &1.

 «» Ib., p. 56.

 •t ib., p. as.

 [191

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 152 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 derao parte da sua forga. Esta modif icagao do Estado e o mais

 seguro esteio da revolugao social, uma vez que seja secundada

 com a organizagao de tralbalho, effectuada pelos trabalhadores* 4O.

 Nesta mensagem o Partido Socialista nao faz mais que copiar

 quase k letra o Manifesto do Partido Cormmista: «O govern o

 moderno nao 6 mais do que uma comissao que gere os negocios

 camuns da classe burgmesa no sen con junto* u. Apesar de tudo

 o Conselho Central afirma na mesma ocasiao nao estar vincu-

 lado a qualquer escola socialista: «talhar moldes k aspiragao e

 k revolugao prolet&ria parece-nos ildgico e a causa do fracciona-

 mento do proletariado em grupos dissidentes e rivais* 42. Apesar

 destas boas intengoes o «Partido Socialista> nunca se libertaria

 de continuas dissid&icias e rivalidades, muitas vezes de cunho

 meramente pessoal.

 (Em 1878 este partido realizou o seu 2.° Oongresso Nacional,

 o qual, considerando a necessidade de unlr esforgos e conjugar

 a luta nos campos politico e econ6mico, tomou a seguinte reso-

 lugao: cA Associagao dos Trabalhadores na Regiao Portuguesa

 e o Partido Socialista em Portugal dissolvem-se e os seus mem-

 bros agrupam-se numa s6 associagao denominada Partido dos

 Oper&rios Socialistas de Portugal* 4R. fi significativo que a este

 Congresso tenham chegado as saudagoes de Karl Marx, Frede-

 rico Engels e Lafargue, entre outros. A actuagao deste partido

 limitou-se por6m s6 ao campo eleitoral. A corrida is eleigoes

 estava ali&s na 16gica das decisoes toanadas no Congresso de

 Haia, como se viu, inserindo-se entre n6s no projecto de criagao

 de um «estado popular pela transformagao sucessiva e oportuna

 do estado burgu§s» 4*. Os ganhos eleitorais do partido foram

 todavia sempre insignlficantes.

 Em 1881 o anarquismo renascia no Porto com a Associagao

 Uniao dos Trabalhadores. Com effeito, a preferimcia pela luta

 no campo econ6mico, relegando para segundo piano ou recusando

 at6 a luta no campo politico, continuava a ter numerosos adeptos

 40 Of. CSsar Nogrueira, op. dt., p. 65.

 «i Marx-dBngels, Werke, vol. 4, p. 464.

 42 Of. O§8ar Nognelra, op. dt., p. 65,

 4* Ib., p. 80.

 44 «Aos eleitores proletarios», apelo langado pelo Partido Socialista em

 14 de Setembro de 1879, aquando da realizagfto de elet<?ftes para deputados,

 cf. Cesar Noguelra, op. cit., p. 101.

 £20]

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 153

 conforme refere urn relat6rio enviado pelo Conselho Central do

 Partido dos Operarios Socialistas em Portugal ao Congresso

 Socialista Universal de Zurique em 1881. Historiando o movi-

 mento operario em Portugal e apontando as caracteristicas do

 proletariado porUigues, resignado e pouco combativo, o docu-

 mento lamenta que os v&rios congressos do Partido Socialista

 se tenham alheado das teorias sobre a propriedade, referindo

 que o programa do partido se limita a «impor como reivindica-

 Qoes transit6rias e imediatas, alguns artigos de ordem econo-

 mica e political *\ Reconhece-se ainda a imaturidade do opera-

 riado portuguSs, a sua falta de espirito revolucion&rio ao acre-

 ditar que bastaria a Lnstauragao de um regime republicano para

 que se realizassem as transformagdes sociais que reclamavam,

 e que «esta transigao seria facilmente aplic&vel dentro duma

 Republica sem a intervengao revolucion&ria do proletariado

 como classe distinta* 4<1. Com efeito, a propaganda do Partido

 Republicano conseguia atrair grande parte do operariado, fazen-

 do-o crer que o primeiro grande objectivo nacional era o derrube

 da monarquia. O documento chama k maioria dos operirios por-

 tugueses « proletariado inv&lido», em relagao ao qual os traba-

 lhadores das industrias do Porto e Lidboa sao uma minoria. Era

 neste operariado minoritArio que o Partido Socialista se apoiava,

 podendo-se assim ajuizar da importancia relativa que poderia ter

 no panorama politico. Apesar de a sua influfincia ser geralmente

 reconhecida como muito pequena, acompanhareonos ainda um

 pouco mais a actividade deste partido, visto que nele se conserva-

 rao persistentemente alguns germes da estrategia marxista.

 Assim, em 1882, a l.a Ck>nferencia Nacional Socialista aprovou

 um novo programa, cujos considerandos sao, na opiniao de Benoit

 Malon, «notorios pela sua precisao cientifica, que mais faz sobres-

 sair ainda a perfeita ortodoxia marxista* 4T. Tais considerandos

 sao os seguintes:

 «1.° Considerando que a lei do desenvolvimento das socie-

 dades tern sido a luta constante das classes;

 2.° Considerando que na sociedade actual duas classes

 estao em luta pelo antagonismo dos interesses: uma,

 «« Cf. C6sar Nogueira, op. cit., pp. 125-126.

 46 ib.f p. 126.

 <t lb.f p. 132.

 [21]

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 154 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 representativa do capital, que se constitui por uraa

 aninoria; ooitra, representativa do traJbaliho, constituida

 pela grande massa dos trabalhadores, ou seja, a maio-

 ria da sociedade;

 3.° Considerando que seja qual for a forma de governo,

 mon&rquico ou republicans onde impera a classe capi-

 talista, nunca as classes trabalhadoras deixarao de ser

 exploradas;

 4.° Considerando que a tutela que o capital impoe &s clas-

 ses trabalhadoras nao pode desaparecer senao pelo

 edforgo dos pr6prios trabathadores» 4\

 Estes considerandos eetao de facto de acordo com as linhas

 mestras do Manifesto, mas nao se poderfi. dizer que def inam pro-

 priamente tuna «perfeita ortodoxia marxista*. Qualquer anar-

 quista os poderia ter escrito. O que 6 pr6prio da estrat£gia mar-

 xista 6 a luta simult&nea no campo econ6mico e politico, como se

 disse. Realmente, nesta alfcura os membros mais destacados do

 Partido Socialista concentravam as suas forgas na actuagao ao

 nfvel politico, demarcando-se assim cada vez mais dos anarquistas

 e recusando ao mesmo tempo a colaboragao com os republicanos,

 visto que seriam por eles rapidamente absorvidos.

 2. O afrontamento entre possibilistas e marxistas

 Como nao podia deixar de ser, as divergftncias no seio do

 partido nao tendiam a desaparecer, antes pelo contr&rio. Acen-

 tuaram-se em 1889, ano em que se realizaram em Paris dois con-

 gressos internacionais, urn possibilista e outro marxista. C6sar

 Nogueira refere que «um dos dois era promovido pelo partido

 que segue mais k risca as doutrinas de K. Marx, com Julio Garde

 e Paulo Lafargue como seus cabos de guerra, mais activos e con-

 siderados pela sua fidelidade inquebrant&vel aos principios do

 mestre. O outro Congresso era promovido pelo grupo de associa-

 <joes operarias federadas na Bolsa do Trabalho de Paris, e a sua

 orientagao obedecia k feigao moderada, que lhe imprimia o grupo

 chamado *possibilista* com Paulo Brousse e Jofrin k frente da

 organizagao politica denominada Federa^ao dos Trabalhadores

 w ib., p. 133.

 (22J

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 155

 Socialistas de Franga* 4". Os possibilistas enviaram k Peninsula

 Ib6rica um delegado, Andre G61y, encarregado de con veneer por-

 tugueses e espanh6is a fazerem-se representar no seu Congresso,

 tendo conseguido esse objectivo. Os participantes Portugueses

 foram Manuel Luis de Figueiredo e Francisco Vitertoo de Campos,

 representando as organizagoes oper&rias de Liefooa e Porto, res-

 pectivamente.

 As diverg&ncias entre os dois Congressos nao parecem ter

 sido importantes, respeitando essencialmente a questdes de t&ctica

 a adoptar no campo da actuagao revolucion&ria. Otaar Nogueira

 nota a prop6sito que Viterbo de Campos «esteve quase resolvido,

 em Paris, a passar para o Congresso do partido marxista, por

 nao concordar em absolute* com as regras de t&ctica adoptadas

 pelos da facgao possibilista» nu. Parece at£ que os dois Congressos

 estiverajn prestes a fundir-se num s6, o que todavia nao chegou

 a acontecer. Carlos Costa, numa das notas ao livro de Gongalves

 Viana A EvoIuq&o Anarquista em Portugal, esoreve que «as riva-

 lidades entre possibilistas e 'marxistas' se resumem a questoes

 acad&nicas e de pura doutrina», afirmando logo a seguir que

 «a intransig&icia dos ortodoxos nao impediu a perfeita identi-

 dade das duas pr4ticas militantes». Por outro lado, faz remontar

 a origem das divergfencias entre os dois grupos k discussao acerca

 da teoria do valor, posta em causa em 1874 pelo economista Albert

 Sdhaeffle, alfirmando que «os ortodoxos defenderam k sua ma-

 neira este elemento fundamental da critica da economia poli-

 tica»ftl. Segundo esta perspectiva, as divergfencias seriam por-

 tanto mais doutrinais que tacticas. Historicamente, a corrente

 possibilista s»urgiu no congresso de Saint-^Etienne, em Setembro

 de 1882, liderada por Paul Brousse e Jean Allemane. Tratava-se

 de uma facgao moderada do socialismo francos que decidiu aceitar

 a colaboragao com os partidos burgueses para conseguir refor-

 nias imediatas. Esta oposigao que se desenhava em Franga entre

 os possibilistas e os socialistas que seguiam a orientagao do socia-

 lismo alemao de feigao marxista, foi mais uma fonte de divisao

 para o movimento socialista portugu§s. As dissidfincias entre

 }x>ssibilistas e marxistas manter-se-iam acesas durante algum

 tempo, ate a ruptura final e definitiva.

 ♦» Ib., p. 167

 «o ib., p. \e&.

 « P. 46

 [23]

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 156 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 Em 1890 realizava-se um Congresso das Associagoes Opera -

 rias tendo como primeiro ponto da sua ordem de trabalhos a «uni-

 f icagao do movimento oper&rio - determinagao duma linha de

 conduta que conduza o proletariado a sua emancipagao» 52. As

 divergencias acerca da participagao ou nao do proletariado nas

 lutas politicas continuavam, conforme se deduz do numero dois

 da mesma ordem de trabalhos : «Deve aconselhar-se aos operarios

 a sua intervengao nas lutas da politica? (...) Como e de que ma-

 neira deve ser estabelecida a luta no campo economico?* B\ O Con-

 gresso viria a aprovar um parecer segundo o qual «os operarios

 devem intervir nas lutas politicas, assim como ( . ) f azer recensear

 todos os seus membros, para a conquista dos cargos electivos

 no parlamento* 54.

 •Em 1891 verificaram-se novas dissidencias acerca da parti -

 cipagao ou nao do cPartido Socialista» em eleigoes municipals,

 em Lisboa. C6sar Nogueira refere que «destes factos resultou

 Nobre Franga aproximar-se mais do Partido Republicano e Azedo

 Gneco iniciar a dissidencia que resultou na organizagao do Par-

 tido Socialista Portugufis, em 1895» 6\

 Entretanto as divergencias entre possibilistas dirigidos por

 Luis de Figueiredo e marxistas do grupo de Azedo Gneco acen-

 tuaram-se em 1892. Em conseq«u§ncia disto «o movimento oper&-

 rio e socialista ia actuando sempre de harmonia com as duas

 correntes* 5a. A facgao marxista publicou neste ano o Manifesto

 do Partido Comunista no jornal «O Eco Socialista*.

 Em Lisboa a revista «A Questao Social >, socialista, iniciava

 no mesuno ano a sua publicagao com um interessante artigo sobre

 Marx: cDeve-se a Karl Marx a explicagao cientifica do socialismo.

 Nao 6 nosso intento discutir aqui o sistema de Marx. Nao se trata

 agora de saber se a hist6ria 6 apenas o resultado da luta de

 classes ou se hia fen6menos politicos, morais ou religiosos, inde-

 pendentes de factores econ6micos. Queremos apenas constatar

 que & da aplicaQao da teoria evolucionista aos fen6menos da pro-

 dugao, aplicagao que ele foi o primeiro a fazer, que resultou o

 socialismo contemporaneo. Queremos frisar bem que 6 4 sua

 »2 Cf. O6sar Nogueira, op. cit.f p. 175.

 " Ib., p. 175.

 »* Ib., p. 176.

 »i Ib., pp. 190-181.

 •• Ib., p. 191.

 [24]

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 157

 obra imorredoura que se deve a organizagao do proletariado como

 forga politica que hi-de tranaformar a velha sociedade. Dando

 como base cientifica as reivindicagoes socials, Marx atraiu is

 novas ideias uma multidao de s&bios e de pensadores cuja inter-

 fergncia resolveu, k luz do novo sistema, todo o campo da socio-

 logia. Assim, usou-se uma moral nova pela alterag&o de rela-

 <j5es dos sexos e uma nova politica pela mudanga da fungao do

 Estado. Aboliu-se o velho direito de propriedade e organizou-se

 a produgao* ST. Nao deixa de ser curioso constatar mais uma vez

 urn certo desinteresse pelas questoes te6ricas, neste caso o mate-

 rialismo hist6rico, em favor de aspectos pr&ticos como a organi-

 zagao politica do proletariado.

 Ainda no mesmo ano se realizou no Porto urn «Congresso

 Nacional das Associagdee de Classes* no qual se terao registado

 novamente «di<verg§ncias nao de princfpios, nao de ideias, mas

 de factos* 6t, enquanto continuava «o agravamento das dissidSn-

 cias entre os socialistas possibilistas representados pela «Asso-

 ciagao dos Trabalhadores na Regiao Portuguesa», quer no sul,

 quer no norte, e os socialistas marxistas ou revolucion&rios, ali-

 nhados no «Centro Oper&rio de Propaganda Socialistas, no Porto,

 e no «Centro Socialista Oper&rio», em Lisboa> ••.

 As sucessivas tentativas de reconciliaQ&o fracassaram. A cor-

 rente marxista acalbou por assumir a ruptura definitiva com os

 possibilistas em 1895, com a realizagao de uma ConferSncia

 Nacional Socialista e de um Congresso em Tomar, de 14 a 16 de

 Outubro. «Na Conferftncia socialista foi votado um programa,

 confeccionado pela mao de mestre de Azedo Gneco e um novo

 regulamento partidirio, o qoie marcava definitivainente a divisao

 do socialismo portuguSs em dois grupos: os possibilistas e os

 marxistas, ou revolucion&rios» eo. Os socialistas marxistas fiase-

 ram-se representar por Azedo Gneco num Congresso Interna-

 cional Socialista, em Londres, em 1896, no qual foi votada a

 expulsao dos anarquistas, facto que o delegado portugufis apoiou.

 Ainda neste ano a facgao possibilista congregou muitas

 associagoes de trabalhadores que se opunham k corrente mar-

 ot Ib.t p. 193.

 •• Ib., p. 196.

 «• Ib., p. 202.

 •o Ib., p. 216.

 [25)

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 158 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 xista, fundando a «Liga das Associagoes Operarias». No seu mani-

 festo-programa a Liga situava-se no mavimento socialista, mas

 deraarcandose claramente da linha revolucionaria, declarando-se

 independente de partidos e regimes politicos. afastando-se da

 pratica politica partid&ria e optando por um reformismo que

 produza as transformagoes knediatas que as circunetancias per-

 mitirem. Estes prop6sitos pofem nao foram muito longe: «A de-

 sorientagao no meio operario e socialista ( ) contaminava todas

 as boas intengoes* 61.

 Em 1897 comegaram a notar-se dissidSncias s&rias na cor-

 rente marxista. Ernesto Silva e Teodoro Ribeiro censuraram

 Azedo Gneco por nao promover a aproximagao com os republi-

 canos que gozavam de grande prestigio. Estas divergSncias leva-

 ram a que em 1899 existissem tres partidos socialistas: o «Par-

 tido Socialista Portugu8s», de Azedo Gneco, marxista; o grupo

 liderado por Ernesto Silva e Teodoro Ribeiro, republicano-socia-

 lista; e o cPartido dos Oper&rios Socialistas de Portugal*, che-

 fiado por Luis de Figueiredo, possibilista. Em Janeiro deste ano

 socialistas de varias correntes reuniram-se para tentar de novo

 a unificagao do movimento, tendo cfaegado a acordo quanto a

 formagao de uma «concentra$ao revolucionaria*, a qual acabou

 por ser dominada pelos possibilistas e libertarios que dec id tram

 abandonar a luta no campo eleitoral. Esta «concentragao» socia-

 lista tomou o name de «Uniao Socialista*, mas tamb6m nao teve

 os resultados esperados, «nao s6 pela heterodoxia dos seus ele-

 mentos, como porque as trfis dissidSncias eram profundas* •■-'.

 Em Abril de 1900 Azedo Gneco demite-se do Conselho Central

 do Partido Socialista PortuguSs, o que 6 signifkativo. A orien-

 tagao dominante era com efeito a do socialismo possibilista.

 Apesar de tudo 6 ainda Azedo Gneco quern em 1904 6 enviado

 como representante do Partido Socialista ao Conselho Interna-

 cional Socialista.

 Em Maio de 1907 numa reuniao de socialistas foi elaiborado

 um documento assinado por Azedo Gneco e outros «elementos das

 duas tendencias socialistas* os que apontava mais uma vez para

 a necessidade de conjugar esforgos. Porem o Partido Republicano

 ganhara demasiado terreno e apoios, triunfando jxnico depois.

 «i Ib., p. 231.

 «* Ib., p. 246.

 «• Ib., p. 291.

 f26]

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 159

 At£ k primeira Grande Guerra o movimento socialista decli-

 nou bastante, pois o triunfo da revolugao republicana refrearia

 ainda mais a acgao }k bastante restrita dos socialistas. Apesar

 de tudo, 6 de ass in alar a publicagao em 1913 de uma colecgao de

 textos seleccionados de 0 Capital pela Livraria Internacional.

 Em 1915 a imprensa port/uguesa publicava o {Manifesto da Con-

 fer§ncia de Zimmerwald* na qual tinham participado Rosa

 Luxemburgo, Lenine, Trotsky e outras fignras do marxismo.

 3. Repercussao da H internacional no movimento socialista

 portugues

 A I Internacional desfez-se pouco depois do Congresso

 de Haia.

 Era 1891, sob a acgao de Engels, Bernstein, Kautsky e Rosa

 Luxemburgo, entre outros vultos do marxismo, nascia num Con-

 gresso marxista de Brnxelas a II Internacional. Por&n, algumas

 das teses de Marx viriam pouco a pouco a ser revistas e postas

 em causa, facto que provocou violentas divisoes e afrontamentos

 no interior da corrente marxista. Bernstein defendia a tese de

 uma transigao gradual e pacifica do capitalismo para o socia-

 liamo, visto que o capitalismo tinha mecanismos reguladores que

 lhe permitiriam sobreviver muito mais tempo do que aquele pre-

 visto por Marx. Kautsky via nesta posigao o perigo da submissao

 do proletariado aos interesses da burguesia e do apagamento

 do espirito revolucion&rio. Apesar de tudo, defendia a partici-

 pagao dos socialistas nos parlamentos e minist&rios dos governos

 burgueses, tendo sido por isso duramente criticado por Lenine.

 Rosa Luxemburgo, por seu lado, pretendia manter-se na linha

 da ortodoxia marxista, rejeitando quer o reformismo de Bernstein

 e de Kautsky, quer o leninismo que se fortalecia cada vez mais,

 especialmente no que se referia k concepgao leninista de partido

 e k concretizagao da ditadura do proletariado. Lenine preconi-

 zava um partido elitista, consciencia da classe oper&ria, clan-

 destine conspirativo e violento. Rosa Luxemiburgo era por um

 partido de massas, tendo acusado Lenine de ter transformado

 a ditadura do proletariado numa «ditadura sobre o prole tariado*.

 No seu livro O Socialismo na Mcmarquia (1944) F. A. Oli-

 veira Martins escreve que «em 1880 F. S. Oliveira Martins ence-

 tou relagoes epistolares com Eduardo Bernstein, tendo com ele

 [27]

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 160 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFTA

 colaborado no «Anu&rio de Cifincia Social*. No meamo livro vem

 reproduzido parte do fac-simile duma carta de Bernstein a Oli-

 veira Martins, na qual aquele pede para «enviar-nos o relat6rio

 sobre a primeira quinzena de Agosto»t referindo ainda um «tiltimo

 relat6rio, que ocupa trfis p&ginas impressas* 64. Oliveira Martins

 colaborava com Antero, Nofore Franga e outros no «Pensamento

 Social », peri6dico fundado para divulgar os ideiais socialistas.

 Todavia o seu pensamento nao se enquadra nem no marxismo nem

 no colectivismo bakuninista. A semelhan$a de Proudhon, parecia

 tender mais para a fusao da burguesia e do proletariado numa

 nova classe m£dia. Apesar disso C6sar Nogueira, que tamb6m

 trocou correspondfincia com Bernstein em 1912 considera que «6

 possivel que naquela correspondSncia, se ela de facto existe,

 possam haver elementos que ponham mais a claro certas passa-

 gens do movimento open&rio e socialista portugufis nos seus pri-

 meiros passos, que sao ainda muito obscuros. £ uma questao a

 investigar» 8\

 O pensamento de Bernstein, apelidado de revisionista pela

 social-democracia de entao, iria contudo influenciar grande parte

 dos partidos filiados na II Internacional. Bernstein conjuga uma

 posiQao te6rica essencialmente marxista, com uma pr&tica poli-

 tica parlamentar, abandonando a via rervolucion&ria.

 As divergSncias no interior do pensamento marxista eram, de

 resto, inevit&veis. O pr6prio texto do Manifesto deixara aberta

 esta possibilidade pela ambiguidade de algumas passagens, par-

 ticularmente no que se refere k posiqao dos comunistas em rela-

 qSlo ao conjunto dos prolet&rios. Com eifeito, Marx e Engels come-

 garam por afirmar que «os comunistas nao formam um partido

 distinto, oposto aos outros partidos operarios. Nao tSm quaisquer

 interesses que os separem do conjunto do proletariado. Nao pro-

 clamam principios partioulares sobre os quais queiram modelar

 o movimento oper&rio» °6. Afirmam por&m, logo a seguir, que os

 comunistas se distinguem dos outros partidos oper&rios em dois

 pontos :

 «♦ F. A. Oliveira Martins, O SodaHsmo na Monarquia, ed. Parcerla

 Ajitdnio Maria Pereira, Lisboa, 1944, p. 31.

 « C^sar Nogueira, Antero de Quental, edlqao do autor, Lisboa.

 t»50k p. 28.

 •• Marx-Bngels, Werke, vol. 4, p. 474.

 [28]

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 A. DIN1S - MARXISMO EM PORTUGAL 161

 1 - cNas lutas nacionais dos prolet&rios, poem acima de tudo

 e fazem prevalecer os interesses comuns a todo o proletariado,

 independentemente da nacionalidade;

 2 - Nas diferentes fases que atravessa a luta entre prole-

 t&rios e burgueses, eles representam sempre os interesses do mo-

 vimento na totalidade».

 Por outras palavras:

 «Praticamente - os comunistas sao, pois, a fracgao mais

 resoluta dos oper&rios de todos os paises, a fracgao que arrasta

 todas as outxas;

 Teoricamente - Um, sobre o resto do proletariado a van-

 tagem duma compreensao clara das condigoes, da marcha e dos

 fins gerais do movimento prolet4rio» ".

 Mais k f rente, esta posigao vem resumida em duas palavras:

 «0s comunistas combatem pelos interesses e pelos fins imediatos

 da classe oper&ria; mas no momento presente, defendem e repre-

 sentam ao mesmo tempo, o futuro do movimento* M. Estava aqui

 praticamente estabelecida a concepgao de partido como van-

 guarda do movimento oper&rio largamente desenvolvida e apli-

 cada por Lenine.

 £ dificil precisar ate que ponto os socialistas Portugueses

 tiveram conhecimento das novas pol&nicas suscitadas no seio

 do marxismo europeu. No entanto veremos adiante que o Partido

 Socialista Berk considerado o representante do socialismo refor-

 mista.

 4. Marx visto por algous comentedores portugmefies

 Em 1874 Jose Frederico Laranjo proferiu em Coimbra uma

 confer§ncia sobre O Capital.

 Em 1893 Sampaio Bruno publica nas suas Notaa do exilio

 uma an&lise do pensamento de Marx baseada na leitura de

 O Capital. Bruno considers que a doutrina de Marx conhecia na

 Europa uma grande popularidade <sem razao 16gica>) apenas

 devida ao «mal estar das sociedades modernas e especialmente

 das suas classes trabalhadoras* ••. Refere-se ao Manifesto do

 •» ib., p. 474.

 •« Ib.f p. 402.

 «• Sam pal o Bruno, Notas do Exuio, Livrana cnaruron, Porto,

 1893, p. 125.

 n C29J

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 162 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 Partido Comunista como «um manifesto (...) que tivera pouco

 cursor 70.

 Quanto a aceitagao e divulgagao das ideias marxistas em

 Portugal e de opiniao que «entre n6s, as doutrinas de Marx sao

 quase desconheoidas e o livro fundamental do socialista O Capital

 presta-se dificilmente aos nossos entendimentos, pelo car&cter

 avidamente albstracto que possui, agravado pela germ&nica falta

 de ordem na dedug&o 16gica das mat6rias> 7I. Por isso Bruno

 n&o consegue entender a teoria do valor chamando-lhe «questao

 embrulhada e confusa». Prefere referir-se demoradamente a

 teoria marxista acerca da evolugao hist6rica do modo de produ-

 $ao dos bens materials, e ao projecto de cblectivizagao dos meios

 de produQ&o, terminando com uma critica k teoria da «alienagao

 capitalista*. Desenvolve depois a teoria da acumulag&o de capital

 pela an&lise da taxa de mais-valia, ponto que considera «o funda-

 mental e o mais lnteressante» ". Mas esforga-se por minimizar

 o valor real da doutrina marxista, terminando por dizer que «a

 descoberta de Marx n&o tern senio uma import&ncia de ordem

 moral e juridical Tt.

 Contra os ideals revolucion&rios de Marx, Bruno mostra-se

 conservador, adepto de uma evolugfio pacffica, reformista, de tipo

 proudhoniano pois, a prevalecerem os ideais marxistas, «enquanto

 a socializagao do trabalho n&o ohega, vai-se morrendo de frio e

 de fome. Por isso, julgo bem aconselhados aqueles que se reduzem

 is reclamaQoes possiveis na ocasiao* 74.

 Em 1895 Afonso Costa, num estudo critico que publicou

 acerca da enciclica pontiffcia Rerum Novanem, refere-se tamb6m

 a Marx, especialmente a sua teoria do valor, revelando embora

 conhecimentos pouco seguros.

 Em 1896 Silva Mendes publica uma obra intitulada Socia-

 lismo Libertdrio ou Anarquismo, na qual afirma que o marxismo

 perde terreno em Portugal a favor do anarquismo.

 Em 1901 Basilio Teles, nos seus Estudos Hist&ricos e Eco-

 ndmicos II precede tamb^m a uma an&lise da teoria econ6mica

 de Marx, especialmente da teoria do valor, em torn de certo modo

 to Ib., p. 126.

 ** Ib., p. 125.

 " Ib., p. 102.

 n ib., p. 1CS.

 T* Ib., p. 168.

 [30]

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 A. DIN-IS - MARXISMO EM PORTUGAL. 163

 depreciativo, parecendo nao ter compreendido inteiramente cate-

 gorias fundamentals do marxismo, como «mais-valia», «acum<u-

 lagao capitalista», etc.

 IV - 3." PERIODO (1917-1930)

 1. A Revolu$ao Russa de 1917 e as mas repercossoes

 em Portugal

 A Revolugao Russa de Outubro de 1917 veio dar novo 4nimo

 aos socialistas de todo o mundo, e tamlb&n em Portugal se fez

 sentir a sua influencia. Elm Margo de 1918 o peri6dico «A Bata-

 ta* elogia Lenine e Trotsky. A imprensa republicana 6 natural-

 mente hostil kquela revolugao.

 Sob a inspiragao da experi£ncia sovietica surgia em Portugal

 a «Federagao Maximalista Portuguesa* cujo objectivo, conflig-

 nado no art. 1.° dos seus estatutos, era «difundir os principioe dou-

 trin&rios tendentes ao estabelecimento do sindicalismo comu-

 nista, admitindo transitoriamente a acgao do poder revolucio-

 n4rio exercido em ditadura pelos conselhos de oper&rios ou sovie-

 tes» 7ft. Por outro lado, o art. 2.° estipulava que «tanto a ditadura

 como o regime dos sovietes sao considerados pr&ticas experimen-

 tais imediatas, sem nenhum caracter filos6fico> 7*. As con trad i-

 qoea no interior da Federagao Maximalista cedo se evidenciaram,

 jk que nela se confoindiam socialistas marxistas e nao marxistas,

 anarquistas, etc. A confusao entre anarquismo, sindicalismo revo-

 lucion&rio e marxismo-leninismo levou a que os seus estatutos

 afirmassem que «a revolugao russa vai im plantar o comunismo

 Iibert4rio» 77f identificando bolchevismo e anarquismo.

 Em 5 de Outubro de 1919 surge «A Bandeira Vermelha»t

 orgao da Federagao, que se debruga sobre a revolugao russa e

 divulga textos de Lenine, Trotsky, Bukarine e Rosa Luxemburgo,

 entre outros. Na sua declaragao de principios, eivada de ambi-

 guidades e confusoes, este jornal afirma que «todos os compo-

 75 Of. O6sar de Oliveira, pref4cio ao livro O Primeiro Congreaso do

 Partido Cowuniata Portugute, ed. Seara Nova, Lieboa, 1975, p. 29.

 ™ it)., p. zw.

 ft Of. CKsar de Oliveira, pref&cio ao livro de Carlos Rates, A Russia

 dos SoxHetes, ed. Seara Nova, Usboa, 1976, pp. 10-11.

 [3D

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 164 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 nentes da Federagao Maximatlista Portuguesa e seus conselhos

 sao em principio anarquistas e sindicalistas revolucion&rios, adop-

 tando contudo a designagao de bolchevistas, comunistas, maxima-

 listas ou sovietistas (...) todo o individiuo que em Portugal se

 declare bokhevista 6 anarquista ou sindicalista revolucion&rio» ™.

 Em Outubro de 1919 o dPartido Socialista* votava em Con-

 gresso a adesao k Til Internaoional, fundada por Lenine. Todavia,

 as contradigdes e coiufusdes dentro deste partido, herdadas das

 d£cadas anteriores e continuamente reavivadas pelas dissengoes

 no interior do marxismo europeu entre os partid&rios das II e

 in Internacionais, continuavam. O grande porno de discdrdia

 situava-se entio na participagao ou n&o no corpo ministerial do

 governo republicano-burgufis. C6sar Nogueira, socialista anti-

 -intervencionista, publicava em 1922 uma Carta Aberta ao Par-

 tido Socialista na qual reclama o seguimento estrito da orientagio

 marxista: «... quando a burguesia em todo o mundo estA for-

 mando uma frente finica, n5o se pode consentir, nao fa& o direito

 de colaborar com a burguesia, de fazer a revolugao por conta-

 -gotas. Nao, isso 6 contra os fundamentos das doutrinas mar-

 xistas, que estabelecem o principio da luta de classes, o tinico

 terreno em que o proletariado deve combater, posto que o alvo

 deste 6 a «organizagao do proletariado como classe, destruig&o

 da supremacia burguesa e conquista do poder politico pelo prole-

 tariado* (cf. Manifesto de 1848, de Marx e Engels), o que ele

 «realizar& conquistando revolucionariamente os seus advers&rios

 de classe, juntamente com o poder politico, a for$a por eles desti-

 nada a conservar intactos os seus monop61ios econ6micos

 (O Capital, Carlos Marx)>. E continua, resumindo os objectivos

 do csocialismo cientff ico» : «A luta de classes, a conquista do

 Estado capitalista por meio da revolusao, 6 pois o objectivo hist6-

 rico do proletariado. ft isto que se define do socialismo cientifico,

 posto que Marx aplicou k economia o novo critSrio sociol6gico,

 chegando k conclusao histdrica de que a produgao econ6mica e

 as classificagoes sociais, que sao a sua consequSncia necess&ria,

 criara, para cada 6poca, a base da sua hist6ria politica e intelec-

 tual> 79. No mesmo ano de 1922 o Partido Socialista votava num

 Congresso em Toanar a sua intervengao no ministerio republi-

 cs Of. C6sar de Olivelra, O Prknetro Congresso .., pp. 28-29.

 t§ Of. Ofesar Nogueira, Notas. ., vol. II, pp. W-«4.

 T321

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 165

 cano-burgues, dando assim, segundo C6sar Nogueira «a (iltima

 raaohadada nas suas tradigoes revolucion&rias, no seu programa

 puramente marxista* Ho. E ainda O§sar Nogueira quern afirma

 ter sido oonvidado a preparar o terreno para a constituigao em

 Portugal de urn partido comunista, encargo que nao aceitou, mani-

 festando o seu desagrado pela estrat&gia leninista: <A minha

 simpatia pela revolugao russa era profunda. Mas a acgao comu-

 nista nao me atraia. Nao concordo com os seus m6todos de agir

 nem com o predominio da influemcia russa nos outro© paises, que

 devem ter uma livre autonomia* 81.

 2. Fundagao do Partido Comnnista Portugues

 Em Margo de 1921 fundava-se em Portugal o «Partido Comu-

 nista* gragas ao esforgo de alguns sindicalistas revohicion&rios,

 anarquistas e anarco-sindicalistas, desiludidos com a pratica do

 anarco-sindicalismo. O primeiro secretario-geral do PGP foi Car-

 los Rates o qual ja ha vArios anos militava no sindicalismo revo

 lucionario que tinha «a greve geral insurrecional e revolucionaria

 como oibjectivo fundamental, a partir do qual o governo burgues,

 o Estado e o capitalismo cairiam como que numa bandeja doirad^

 nas maos dos trabal hadores» h2. Carlos Rates nao conseguiu do tar

 o oPartido Comunista* nascente de uma dooitrina marxista coe-

 rente: «a divulgagao te6rica do marxismo e do leninismo que Cat

 los Rates intenta fazer e urn documento vivo das confusoes exis-

 tentes no corpo doutrinario de um partido que encontrava grandt*

 concorrencia nos anarco-sindicalistas e na C. G. T.» *•.

 A partir de 1921 acentuaram-se as diverg§ncias entre a

 C. G. T.t a <rFederagao Maximalista Portuguesa», ja bastante

 enfraqueoida, e o PCP. «£, com efeito, a Nova Politica ©con6mi( a

 'a NEP) que Lenine defende e faz aplicar nesse mesmo ano. ;<

 repressao k volta dos marinheiros de Cronstadt ainda ness*

 «o Ib., p. 71.

 »« ID., pp. YV-'tfU.

 82 Cf. Cesar de Oliveira, A Russia dos Soviet es, p. 11.

 8» Ib., p. 12. «cConfederacao Geral do Trabalho», organismo anaro.

 -sdndicalista crindo em Setembro de 1919 como alternativa ao impasse a q»i<4

 tinha chegado o «Partido SocialLsta*. mi n ado par incessantes dissensofs

 internas. No periodo de 1919-1922 foi o organiamo de maior audifincia junto

 das classes trabalhadoras, tendo sobrevivido at^ 1934.

 [33)

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 166 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 mesmo ano e sobretudo a questao da adesao 4 M Internacional

 e a Internacional Sindical Vermelha que provocam as divergen-

 cias que nunca mais seriam sanadas» M4.

 Em 1923 o POP realiza o seu 1.° Congresso. Os debates entao

 efectuados reflectem toda a debilidade te6rica de urn partido que

 ainda nao tinha conseguido encontrar uma linha de rumo sufi-

 cientemente definida. Muitas das dissengoes internas eram fruto da

 oposigao entre duas facades, uma que seguia Caetano de Sousa,

 o qual estivera jk em Moscovo como delegado ao IV Congresso

 Mundial da IEI Internacional, e outra que seguia Carlos Rates.

 Com efeito, «os membros do partido de todas as tend£ncias pare-

 ciam mais ligados a homens do que ks ideias e k acgao da Inter-

 nacional Comunista. Eles eram a favor ou contra Sousa, por ou

 contra Rates e nao simplesmente pelo triunfo da causa comu-

 nista em Portugal (...) as facgoes que se tinham defrontado nao

 se tinham oposto no terreno dos principios, mas sobre irritantes

 questoes pessoais. Eles nao possuiam base ideologica capaz de

 se sobrepor 4s lutas intestinas em que a calunia e a injuria se

 substifcuem ao argumento e k ideia» HS. Estas rivalidades pessoais

 foram sempre ali&s uma constante ao longo de todo o movimento

 socialista, como se viu atr&s. Para ilustrar a falta de assimilagao

 dos principios te6ricos do marxismo pelos dirigentes do PC8P

 Droz, delegado da HI Internacional ao 1° Congresso deste partido

 escreve: «claro que eu nao tinha Husoes sobre a maturidade comu-

 nista da direcgao do partido. Ela propunha uma tese sobre o pro-

 bleraa colonial - muito importante em Portugal - que preco-

 mzava a venda das colon ias portuguesas 4 Inglaterra Tive

 grande dificuldade em conseguir que o Comite Central retirasse

 esta proposta, em fazer-lhe compreender que a libertagao dos

 I>ovos coloniais nao pode ser uma mudanga de senhor e que esta

 tese fazia do partido um mercador de escravos* Mi.

 Depois de uma viagem 4 Uniao Sovietica Carlos Rates

 publica em 1924 A Russia dos Bovietes na qual expoe os princi-

 pios do marxismo e do leninismo, historia o movimento socialista

 internacional desde a fundagao da I Internacional, e expoe toda

 a gSnese da revolugao sovi^tica. Apesar de tudo, acabar& por

 84 Of. C£sar de Oltvelra, O Primeiro Congresso % p. 35.

 •» Ib., pp. 86-87.

 »« Ib., p. 89.

 [94]

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 A. DIN1S - MARXISMO EM PORTUGAL 167

 aderir k Uniao Nacional e ao salazarismo, o que mostra provavel-

 mente a debilidade da sua formagao teorica.

 3. A acgfco de Bento Gongalves

 Bento Gongalves (1902-1912) seria o primeiro grande reor-

 ganizador do «Partido Comunista Portuguese, sobretudo a partir

 de 1929, ano em que k eleito seu secretirio geral. Anteriormente

 a eata eleigao f izera jk pelo menos duas viagens k Russia, uma

 das quais em 1928 para participar num Congresso da «Interna-

 cional Smdical Vermelha*.

 Em 1929 apareoe no Porto o jornal «O ProletArio* no qua

Bento Gongalves fari a defesa intransigents do leniniamo, com-

 batendo o reformismo da H Internacional, ohamando-lhe «defor-

 ma$ao socialista do marxismo*. «ao mesmo tempo que os par-

 tidos politicos nacioaaui socialistas abdicam dos principios fun-

 damentals da teoria que Marx legara ao proletariado para seu

 uso quotidiano na luta contra a exploragao capitalista, os seus

 chefes, ainda que rotulando-ee de marxistaa foram, no mundo

 moderno da luta de classes, os maiores deformadores da cite-

 cia marxista - que 6 como quern diz, do materialismo dial^-

 ctico - e a tai ponto o f izeram que, no momento actual, entre a

 doutrina de Marx e a doutrina pseudo-prolet&rla do capitaliamo

 oficial, estende-se uma epoca histdrlca completa* iT. Acusa os

 chefes da H Internacional de terem felto urn trabalho de revisao

 do materialismo histxSrico e de terem langado o proletariado dos

 diversos paises num combate reciproco ao aconselharem o seu

 envolvimento nas lutas nacionais da 1/ Grande Guerra. Denun-

 cia em seguida a recuperagao do movimento socialista pela

 pequena burguesia com o fim de servir os seus interesses de

 classe: cNo seu aspecto geral, a ideologia da corrente predomi-

 nante do socialismo contempor&neo 6 a ideologia da pequena bur-

 guesia citadina, a qual em virtude dos interesses essenciais da

 classe que os propaga substitui o principio da luta de classes pelo

 da colaiboraQao de classes, jk porque 6 na pequena burguesia ou

 por entre os individuos ao servigo dela, que os partidos socia-

 listas recrutam os seus efectivos, j& porque esta classe (...) para

 " Bento Gongalvea, Btcrttos (19*7-1930), ed. Seara Nova, Uaboa.

 lyre, p. n.

 m\

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 168 REVISTA PORTUGUESA DE FILOSOFIA

 assegurar a sua posig&o como entidade produtora, pretende ele-

 var-se k categoria de classe dominante e, nesse sentido, carece de

 neutralizar os efeitos mal6ficos sobre si causados pela grande

 burgue8ia» ". No meamo artigo Bento Gonsalves denuncia ainda

 a posigao social-reformista do «Partido Socialista Portugu§s».

 Com dfeito o jornal «O Protestor, socialista, afirmava em 1929

 que o acesso da classe oper&ria ao poder politico «nao quer dizer

 exercer-se a acgfio govemativa do Estado, mas sim, e visto que

 o operariado constitui a maioria da populagfto e a parte reco-

 nhecidamente mala fitil, ser tida na mais alta considerag&o nas

 regiSes da governa$ao, a fim de qoie as leis e a causa publica

 n&o sirvam interesses quaisquer com prejuizo moral ou mate-

 rial dos trabalhadores* ••. Para Bento Gon$alves «isto 6 o que

 se chama bater o record da deformas&o, (...) a ren&ncia aos

 ensinamentos de Mara* M.

 Num outro artigo Bento Gongalves aponta as diferengas

 entre a democracia burguesa e a democraoia prolet&ria. Situa

 a primeira na linha revisionista, defensora da colaboragao de

 classes: «fLogo que E. Bernstein e consortes empreenderam o

 revisionismo, preconizando a ideia da atenua$&o e da concilia-

 qko dos antagonismos de classes, a sua primeira taref a consistiu

 em negar precisamente o m&odo mandsta, isto 6, a dialfetka

 materialista» 91. Para o «socialismo oficiab, como para Kautsky,

 figura importante do revisionismo, «o conceito de ditadura do

 proletariado, que representa no faindo o resumo de toda uma teo-

 ria revolucion&ria, fundamentada nas revoluqoes de 1848 e 1871,

 nao signif icava sen&o urn pequemo termo de Marx» 9\

 Bento Gongalves defende intransigeintemente o marxismo

 -leninismo como a «teoria revolucion&ria do proletariado*, con-

 siderando desvios todas as demais correntes socialistas em Por-

 tugal, as quais eram, na altura em que escrevia, fundamental-

 mente o socialismo do Partido Socialista e o anarco-sindkalismo.

 Os seus adeptos sao considerados os culpados da desorganiza-

 gfto do proletariado portugufis. Tal situagao reflectia por6m o

 que se passava a nivel europeu: «depois da passagem dos socia-

 •« ib., p. 79.

 •• ID., p. 82.

 •o ID^ p. 82.

 •i Ib., p. 86.

 ts Ib., p. 88.

 [981

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 A. DINIS - MARXISMO EM PORTUGAL 169

 liBtas ao campo da burguesia, em todos os paises de grande movi-

 mento da luta de classes, os social-reformistas nacionais imi-

 taram os seus correligionirios de al6m-f ronteiras 91. O articulista

 assinala por outro lado «a evolugao do anarco-sindicalismo quase-

 -revolucion&rio ao anaroo-reformismo» *4.

 Uma das questdes levantadas pelos reformistas acerca da

 Revolugao de Outubro era a de que esta parecia nao se enquadrar

 na doutrina do materialismo hist6rico, tal como fora enunciada

 por Marx. Com etfeito, segundo Marx a revolugao prolet&ria eclo-

 diria em determinados paises que atingissem urn nivel de indus-

 trializagao tao elevado que o conflito relagdes de produgao-for-

 gas produtivas se resolveria necessariamente por uma alteragao

 radical daquelas relagdes, com a ascensao do proletariado ao

 poder. Ora a Russia nao era em 1917 um pais industrializado, e a

 revolugao s6 conseguiu triunfar com o apoio dos camponeses.

 Como se explicaria isto numa perspectiva marxista? Bento Gon-

 galves considera que este facto s6 6 compreensivel k luz dos

 desenvol-vimentos te6ricos de Lenine visto que, citando Estaline,

 «a maneira de encarar a revolugao proletariana, o seu caricter,

 as suas grandes linhas, a sua amplitude e a sua profundidade,

 nao 6 a mesma de outrora (...) Outrora tinha-se o h&bito de falar

 da exist^ncia ou da ausSncia das condig5es otojectivas da revo-

 lugao proletariana em alguns paises isolados, ou, mais exacta-

 mente, em tal ou tal pais avangado. Este ponto de vista 6 actual-

 mente insuficiente.

 Onde comegari a revolugao? Li onde a industria 6 mais

 aperfeigoada, onde o proletariado forma a maioria, onde a civi-

 ltoagao 6 mais desenvolvida, respondia-se outrora. Nao, responde

 a teoria leninista da revolugao. O cFronU do capital nao Berk

 necessariamente furado 16. onde a industria 6 mais desenvolvida;

 ele aerk furado 1& onde a cadeia do imperialismo 6 mais fraca,

 porque a revolugao prolet&ria 6 o resultado da ruptura da cadeia

 do front imperialista mundial no lugar mais fraco (...). Em 1917

 a cadeia do front imperialista mundial achava-se mais fraca na

 Russia do que em qualquer outro pais do mundo» M. A Revolugao

 sovi&ica triunfou porque o descontentamento generalizado da

 9t Ib., p. 98.

 « Ib., p. 99.

 •« n>.( pp. 102^108.

 [37)

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 170 REVISTA PORTUGUE8A DE FILOSOFIA

 populagao russa levou os camponeses a lutarem ao lado do pro-

 letariado contra o czariamo, «o representante mais odioso do

 ixnperialismo». Assim se explica como «a revolu<jao de Outubro,

 longe de surpreender os revolucioo&rios russos com Lenine k

 cabe$a, longe de negar o materialismo hist6ricof confirmou pelo

 contr&rio, toda a teoria leninista que, em Ultima an&lise, vem a

 ser o marxismo da 6poca do imperialismo* M.

 Apesar de todas estas e outras explicagdes, o certo 6 que o

 anarco-sindicalismo da «Confederag&o Qeral do Trabalho» con-

 tinuava a atrair para a sua pr&tica uma parte consider&vel do

 proletariate Bento Gongalves continuarA durante alguns n4me-

 ros do jornal «O Prolet&rio» a sua tarctfa de demarcar as ten-

 dfinciaa que dividiam o movlmento socialista. «A luta contra os

 desvios do movimento oper&rio portugufis, contra a confusao das

 ideias, a mentalidade embrulhada, t&o caracteristica da presente

 fase da hist6ria da acg&o dos chefea «cAg6tistas»y baseada na pr&-

 tica da actuagio anarco-sindicalista, na sua fal&ncia nacional,

 reve8te[-se] de uma necessidade inadi&vel» t7.

 Em 1930 Bento Gon^alves & preso e no ano seguinte i trans-

 ferido para a prisao polftica de Cabo Verde. Amnistiado em 1933,

 entra na dandestinidade nesse mesmo ano. Em 1936 participa

 em Moscovo no VH Congresso da clnternacional Comunista»

 sendo preso pouoo depois de regressar a Portugal. Levado para

 o Tarrafal ai morreu em 1942. Durante todo este tempo n&o oes-

 sou de lutar pela reorgamizagao do Partido Comunista e pela sua

 fidelidade k linha marxista-leninista que sempre tinha defendido.

 Em 1933, com a entrada em vigor de uma nova Constituigio

 Polftica reflectindo o condicionalismo s6cio-politico saido da

 Revolus&o de 28 de Maio de 1926 sfto extintos todos os partidos

 politicos e sindicatos. O movimento socialista passa assim k

 dandestinidade.

 ALFREDO DINI8

 - Ib., p. 103.

 •t Ib., p. 107.