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CENTRO UNIVERSITRIO CATLICO DE VITRIA
ELIANE OLIOSI MAZIM SILVA
AS CARACTERISTICAS E OS PRINCIPAIS MOTIVOS QUE LEVAM CRIANAS E
ADOLESCENTES AO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NO MUNICPIO DE VILA
VELHA/ES
VITRIA
2016
ELIANE OLIOSI MAZIM SILVA
AS CARACTERISTICAS E OS PRINCIPAIS MOTIVOS QUE LEVAM CRIANAS E
ADOLESCENTES AO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NO MUNICPIO DE VILA
VELHA/ES
Trabalho de Concluso de Curso apresentado ao
Centro Universitrio Catlico de Vitria, como
requisito obrigatrio para obteno do ttulo de
Bacharel em Servio Social.
Orientador: Prof. Jaqueline Silva
VITRIA
2016
ELIANE OLIOSI MAZIM SILVA
AS CARACTERISTICAS E OS PRINCIPAIS MOTIVOS QUE LEVAM CRIANAS E
ADOLESCENTES AO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NO MUNICPIO DE VILA
VELHA/ES
Trabalho de Concluso de Curso apresentado ao Centro Universitrio Catlico de Vitria, como
requisito obrigatrio para obteno do ttulo de Bacharel em Servio Social.
Aprovado em _____ de ________________ de ____, por:
________________________________
Prof. Ms. Jaqueline da Silva - Orientador
________________________________
Prof. Ms. Alasa de Oliveira Siqueira, Instituio
________________________________
Gabriella Scardua, Assistente Social
1 Vara Especializada da Infncia e da Juventude de Vila Velha - ES
A Luisa e Laura minhas fontes mais inesgotveis de amor.
AGRADECIMENTOS
Agradeo primeiramente a Deus por toda a fora e pacincia, por nunca ter me
desamparado nos momentos de fraqueza, por ter me concedido sade, sabedoria,
fora e o dom da vida.
A minha me do cu por ter intercedido junto ao pai para que esse dia acontece-se.
todos os meus familiares, em especial a minha me Maria Dolores Oliosi, pelos
seus cuidados e ensinamentos, minha irm Cristina e todos os meus irmos pelo
incentivo e pacincia, sempre me apoiaram e estiveram presente em toda a minha
trajetria.
A minha sogra Deuzenir por cuidar do bem mais precioso, minhas filhas Luisa e
Laura.
Ao meu marido Wendel pela pacincia, companheirismo e ausncia.
A minhas amigas e companheiras de todas as horas Jessica e Penha, que tanto
compartilhou os momentos de alegria e de aflies.
A toda equipe tcnica do Servio Social da 1 Vara Especializada da Infncia e da
Juventude de Vila Velha, que sempre me acolheram com carinho, vocs
contribuiram para o meu aprendizado e na elaborao deste trabalho.
A todos os professores obrigada pelos incentivos e confiana em meu potencial.
A minha professora e orientadora Jaqueline Silva que um exemplo de profissional,
o meu sincero agradecimento pela pacincia e por dividir tantas vezes seus
conhecimentos com essa aluna, saiba que jamais irei esquecer suas histrias e seus
ensinamentos.
Suba o primeiro degrau com f. No necessrio que voc veja toda a escada.
Apenas d o primeiro passo.
Martin Luther King
RESUMO
Este trabalho de concluso de curso aborda a temtica que envolve crianas e
adolescentes de 0 a 18 anos institucionalizadas em casas de acolhimento no
municpio de Vila Velha no ano de 2015. A partir de uma perspectiva histrica no
que concerne ao processo de institucionalizao no Brasil, o estudo teve
embasando e fundamento em anlises de normativa e marcos legais. O trabalho
apresenta a evoluo da Legislao desde o Cdigo de Menores 1927 com o
principio da Situao Irregular e o Cdigo de 1979, que dentre as medidas de
proteo estava institucionalizao. Com a promulgao do Estatuto da Criana e
do Adolescente, os mesmos passam a ser sujeito de proteo integral e o
acolhimento passa a ser medida excepcional, recentemente foram atualizadas com
Lei da Adoo 12.010/2009, que alterou alguns artigos do ECRIAD. Com o resultado
do estudo possibilitou a analise do objetivo que identificar e analisar as
caractersticas e os principais motivos que levam crianas/adolescentes a serem
acolhidos. Com base em uma abordagem quanti-qualitativa analisamos os
documentos atravs da tcnica de analise de contedo, o estudo documental e
descritivo foi coletado a partir de registros advindos de relatrios elaborados pelo
Servio Social de uma instituio pblica vinculada ao poder Judicirio do Estado do
Espirito Santo, que atende as demandas de violaes de direitos de crianas e
adolescentes daquele municpio.
.
Palavras-chave: Acolhimento Institucional. Criana e Adolescente. Famlia. Perfil.
Motivos do Acolhimento.
ABSTRACT
This course conclusion work deal with the theme involving children and adolescents
institutionalised in shelters in the municipality of Vila Velha. From a historical
perspective regarding the institutionalisation process in Brazil, the research had basis
in analysis of normative and legal boundaries. The work shows the evolution of
legislation from the Juvenile Code of 1927 with the principle of irregular situation and
the 1979 Code, which among the protective measures was the institutionalisation.
With the enactment of the Children and Adolescent, they become subject to full
protection and the host becomes exceptional measure, recently been updated with
Adoption of Law 12.010 /2009, that amended some ECRIAD items. With the results
of the research enabled the objective of the analysis is to identify the profile and the
main reasons that children/adolescents to be admitted. Based on a quantitative and
qualitative approach we analyse the contents of documents, documentary and
descriptive study were collected from records arising from reports elaborated by the
Social Service of a public institution bounded to the judicial power of the State of
Esprito Santo, which attend the demands of rights violations of children and
adolescents of that municipality.
Keywords: Institutional welcome. Child and. teenager. Family. Profile. Home of reasons.
LISTA DE GRFICOS
Grfico 01 Populao por Faixa Etria ................................................................... 68
Grfico 02 Composio da Receita Tributria 2010 ............................................... 69
Grfico 03 Sexo das crianas e adolescentes ........................................................ 83
Grfico 04 Etnia das crianas e adolescentes ........................................................ 84
Grfico 05 Faixa etria de crianas e adolescentes............................................... 85
Grfico 06 Tempo de acolhimento crianas e adolescentes .................................. 87
Grfico 07 Principais motivos para o acolhimento crianas e adolescentes .......... 89
LISTA DE SIGLAS
ASA Ao Social Arquidiocesana
CAPS Centro de Ateno Psicossocial
CEMAS Centro Municipal de Ateno Secundria
CEO Centro de Especialidades Odontolgicas
CEREST Centro de Sade do Trabalhador
CNAS Conselho Nacional de Assistncia Social
CNCGJ/ES Cdigo de Normas da Corregedoria Geral da Justia do Esprito Santo
CONANDA Conselho Nacional dos Direitos das Crianas e Adolescentes
CPI Comisso Parlamentar de Inqurito
CRAS Centro de Referncia de Assistncia Social
CREAS Centro de Referncia Especializados de Assistncia Social
CT Conselhos Tutelares
DNCr Departamento Nacional da Criana
ECRIAD Estatuto da Criana e do Adolescente
FNBEM Fundao Nacional de Bem-Estar do Menor
Frum DCA Frum Nacional Permanente de Direitos da Criana e do Adolescente
FUNABEM Fundao Nacional do Bem estar do Menor
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica
IDH ndice de Desenvolvimento Humano
IDHM ndice de Desenvolvimento Humano Municipal
IJSN Instituto Jones dos Santos Neves
INAM Instituto Nacional de Assistncia a Menores
IPEA Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada
IPTU Propriedade Predial e Territorial Urbana
IRRF Imposto de Renda Retido na Fonte
ISS Imposto sobre Servios de Qualquer Natureza
ITBI Imposto sobre a Transmisso de Bens Imveis Inter Vivos
LBA Legio Brasileira de Assistncia
LDB Lei de Diretrizes e Bases
LOAS Lei Orgnica da Assistncia Social
MDS Ministrio de Desenvolvimento Social
MJC Ministrio da Justia e Cidadania
MP Ministrio Pblico
NOB Norma Operacional Bsica
ONU Organizao das Naes Unidas
PAIF Servio de Proteo e Atendimento Integral Famlia
PMVV Prefeitura Municipal de Vila Velha
PNAS Poltica Nacional de Assistncia Social
PNCFC Proteo e Defesa do Direito de Crianas e Adolescentes a Convivncia
Familiar e Comunitria
PPCAAM Programa de Proteo a Crianas e Adolescentes Ameaados de Morte
PSB Proteo Social Bsica
PSE Proteo Social Especial
SAM Servio Nacional de Assistncia aos Menores
SIGA Sistema de Informao e Gerncia da Adoo e Acolhimento
STSJ Servio Tcnico Scio Judicirio (STSJ)
SUAS Sistema nico da Assistncia Social
SUS Sistema nico de Sade
TJ-ES Tribunal de Justia do Estado do Esprito Santo
UAPS Unidade de Ateno Primria Sade
VIJVV Vara Especializada da Infncia e da Juventude de Vila Velha
SUMRIO
1 INTRODUO ....................................................................................................... 21
2 REVISO DE LITERATURA ................................................................................. 27
2.1 HISTRICO DO PROCESSO DE INSTITUCIONALIZAO DE CRIANAS NO
BRASIL.......................................................................................................................27
2.2 ESTATUTO DA CRIANA E ADOLESCENTE....................................................42
3 METODOLOGIA .................................................................................................... 63
4 RESULTADOS E DISCUSSO DA PESQUISA ................................................... 67
4.1 CARACTERIZANDO O MUNICPIO DE VILA VELHA.........................................67
4.2 RESULTADO DA PESQUISA DE CAMPO..........................................................82
5 CONSIDERAES FINAIS....................................................................................97
REFERNCIAS........................................................................................................101
APNDICE A ROTEIRO PARA A COLETA DOS
DADOS.....................................................................................................................109
APNDICE B TERMO DE RESPONSABILIDADE DE UTILIZAO DE
DADOS.....................................................................................................................111
APNDICE C DECLARAO DE RESPONSABILIDADE DO
PESQUISADOR.......................................................................................................113
21
1 INTRODUO
A medida de acolhimento institucional de crianas e adolescentes est includa
dentre as denominadas Medidas de Proteo, que sero aplicadas a esses sujeitos
que tiveram em algum momento seus direitos ameaados ou violados, seja pelo
Estado, sociedade ou a famlia, conforme preconizado pelo Estatuto da Criana e do
Adolescente (ECRIAD) no seu artigo 101, que estabelece que o acolhimento
institucional e o acolhimento familiar so medidas provisrias e excepcionais, e
somente sero utilizadas depois de esgotadas todas as possibilidades de
manuteno da criana ou adolescente em sua famlia natural (FACHINETTO,
2008).
Na histria da institucionalizao das crianas e adolescentes, nem sempre foi a de
garantia de direitos, antes da promulgao do ECRIAD o acolhimento institucional
no pas percorreu longos caminhos tortuosos, iniciados no Brasil Colnia com o
recolhimento de ndios pelos jesutas com o fim de catequiza-los. Outra modalidade
de acolhimento surgiu no perodo colonial por iniciativa da Santa Casa de
Misericrdia e somente extinta na Repblica, que foi o sistema das Rodas de
Expostos, ou tambm conhecida como roda dos enjeitados. O sistema das Rodas
dos Expostos surgiu na Europa e implantado no Brasil recebia crianas e preservava
o anonimato de quem as entregava (RIZZINI; RIZZINI, 2004).
A institucionalizao de crianas e adolescentes no Brasil ganha visibilidade, do
ponto de vista da higiene e das altas taxas de mortalidade infantil que aconteciam
nas Casas dos Expostos, chamando a ateno de juristas e mdicos higienistas que
se manifestaram contrrio ao modelo de acolhimento imposto, visto a no garantia
do mnimo necessrio prpria sobrevivncia de tais crianas.
O pas inicia debates sobre a infncia e juventude surgindo s leis menoristas por
volta do fim do sculo XIX, a forma como os acolhimentos so realizados passa a ter
um olhar voltado para si, e atravs de influncias internacionais iniciam os debates
acerca da problemtica que envolve a criana e o adolescente. Outros grandes
acontecimentos surgem na histria do pas, com a participao de movimentos
sociais, para o fim da ditadura militar instaurada em 1964, que chega ao fim com o
incio de uma nova histria com a instituio da Constituio da Repblica de 1988
(FALEIROS, 2009).
22
A legislao citada se tornou um importante instrumento legal para crianas e os
adolescentes, que passaram a partir de ento a ser compreendido como sujeitos de
direitos em condio peculiar de desenvolvimento fsico, mental, moral, espiritual e
social e, assim detentores de prioridade absoluta.
O texto constitucional de 1988 dispe no seu art. 227 a responsabilidade da famlia,
Estado e sociedade, de maneira solidria, na defesa e garantia dos direitos das
crianas e adolescentes, independentemente de sua condio social ou
comportamental.
dever da famlia, da comunidade, da sociedade em geral e do poder pblico assegurar, com absoluta prioridade, a efetivao dos direitos referentes vida, sade, alimentao, educao, ao esporte, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria (BRASIL, 1988).
Desta forma, se antes as crianas e adolescentes eram retiradas de suas famlias
por carncia material, agora a Lei traduz o oposto, convivncia em famlia passa a
ser um direito e deve ser articulada por aes entre o Estado, a comunidade e a
prpria famlia (FACHINETTO, 2008).
Nessa tica, percebe-se a importncia do fortalecimento da famlia como instituio
para a devida garantia do pleno desenvolvimento da identidade pessoal e social do
sujeito, especialmente quando peculiar condio de formao, como no caso da
criana e do adolescente.
Assim o ECRIAD foi promulgado em 13 de julho de 1990, vindo a substituir a
repressiva doutrina do Cdigo de Menores de 1979, e estabeleceram novas
referncias polticas, jurdicas e sociais para o trato com a infncia e juventude
brasileira, surgindo a Doutrina da Proteo Integral e o acolhimento institucional
passa a ser uma Medida de Proteo, excepcional e provisria (PASSIONE; PEREZ,
2010).
Com a instituio do ECRIAD, novos organismos legais surgem, principalmente para
o auxlio na efetivao das novas concepes do Estatuto. Para organizao e
implementao das polticas assistenciais, em 1991 surge o Conselho Nacional dos
Direitos da Criana e do Adolescente (CONANDA), em 1993 criada a Lei Orgnica
da Assistncia Social (LOAS), em 2004 a Poltica Nacional de Assistncia Social
(PNAS), o Plano Nacional de Promoo, Proteo e Defesa do Direito de Crianas e
Adolescentes a Convivncia Familiar e Comunitria (PNCFC) em 2006, que dita s
23
diretrizes que devero nortear as aes e a formulao das polticas pblicas, para a
efetivao do direito convivncia familiar e comunitria, o guia tcnico como a
Cartilha de Orientao para os Servios de Acolhimento no ano de 2009, bem como
a Lei 12.010, no mesmo ano, e em 2013, a Tipificao Nacional de Servios
Socioassistenciais.
Todos esses instrumentos legais visam contribuir na preveno ao rompimento dos
vnculos familiares, ao direito convivncia familiar e comunitria de crianas e
adolescentes, e a partir do novo sistema buscar garantir e regulamentar os
diferentes tipos de servio de acolhimento.
Na anlise de Rizzini e Rizzini, (2004) a histria da institucionalizao de crianas e
adolescentes no Brasil tem gerado reflexes at os dias atuais. Documentos
histricos revelam que a assistncia infncia dos sculos XIX e XX revela que:
[...] crianas nascidas em situao de pobreza e/ou em famlias com dificuldades de criarem seus filhos tinham um destino quase certo quando buscavam apoio do Estado: o de serem encaminhadas para instituies
como se fossem rfs ou abandonadas (RIZZINI; RIZZINI, 2004, p.13).
Segundo Rizzini e outros (2007), no Brasil crianas so acolhidas em instituies,
devido s condies sociais e econmicas que recaem sobre suas famlias,
situaes das mais diversas como negligncia, abandono, dependncia qumica,
envolvimento com ato criminoso. Soma-se ainda ao fato de que diversas no
conseguem suprir adequadamente as necessidades materiais, afetivas e sociais de
seus filhos, no recebendo, em inmeros casos, investimento estatal, apesar da
existncia legal de todo o suporte de rede.
O interesse pelo tema do acolhimento institucional de Crianas e Adolescentes foi
despertado atravs da experincia enquanto estagiria, no perodo do estgio
curricular obrigatrio, no setor de Servio Social da 1 Vara Especializada da
Infncia e da Juventude de Vila Velha/ES (VIJVV), onde se pode observar a
realidade das instituies de acolhimento e o trabalho executado pelo Judicirio no
processo de soluo dos elementos ensejadores do acolhimento, incluindo ai, a
colocao em lar substituto.
O grande nmero de processos de institucionalizao de crianas e adolescentes
no municpio de Vila Velha fez surgir indagaes e inquietaes que levaram a
elaborao da pesquisa, cujo tema As Caracteristicas e os Principais Motivos que
24
levam Crianas e Adolescentes ao Acolhimento Institucional no Municpio de Vila
Velha/ES.
Esse estudo prope caracterizar crianas e adolescentes de 0 a 18 anos que esto
institucionalizadas no municpio de Vila Velha e identificar os principais motivos que
levam essas crianas/adolescentes a serem acolhidas dentro da perspectiva da
proteo.
A relevncia deste estudo est na apropriao de um novo conhecimento a ser
adquirido, podendo acrescentar a academia e ao Servio Social, em sua prtica
cotidiana, uma nova percepo das questes que levam ao acolhimento institucional
de crianas e adolescentes.
Na busca de se atingir os objetivos propostos e permitir a anlise dos dados,
decidiu-se por estruturar o trabalho da seguinte maneira: a parte de reviso de
literatura, optou-se por dividir em dois tpicos - sendo o primeiro tpico sobre o
processo histrico da institucionalizao de crianas no Brasil, com abordagem
sobre os abandonos nas Santas Casas de Misericrdia e nas Rodas dos Expostos
como uma nova forma de cuidados destinados s crianas e aos adolescentes em
situao de vulnerabilidade social, at o surgimento de leis de proteo e assistncia
como os conhecidos cdigos de menores de 1927 e 1979.
No segundo tpico vamos discorrer sobre a promulgao do Estatuto da Criana e
do Adolescente, vindo a substituir a repressiva doutrina do Cdigo de Menores de
1979, instaurando a doutrina da proteo integral e os considerando sujeito de
direitos, e atravs do Plano Nacional de Promoo, Proteo e Defesa do Direito de
Crianas e Adolescentes a Convivncia Familiar e Comunitria, que visa promover a
criana e adolescentes sua convivncia em sociedade, a Cartilha de Orientao
para os Servios de Acolhimento que norteiam os diferentes tipos de servio de
acolhimento e a Lei de Adoo n 12. 010/2009 que lana um novo olhar sobre a
forma de acolhimento institucional.
Antes da anlise dos dados, discorremos sobre os caminhos percorridos e os
procedimentos metodolgicos adotados para a produo dos dados, que
possibilitaram todo o processo de anlise deste Trabalho de Concluso de Curso.
Finalizando, contextualizamos o municpio de Vila Velha, apresentando a 1 Vara
Especializada da Infncia e as 06 instituies de acolhimento que compe a rede
25
assistencial, com a apresentao do material documental, em conjunto com os
dados estatsticos colhidos na Vara Especializada da Infncia e Juventude,
fornecidos pelos Assistentes Sociais, que foram construdos para respaldar
solicitaes das mais diferentes aes, com vistas proteo integral das crianas e
adolescentes.
26
27
2 REVISO DE LITERATURA
2.1 HISTRICO DO PROCESSO DE INSTITUCIONALIZAO DE CRIANAS NO
BRASIL
A presente pesquisa vem discorrer a partir de referenciais tericos sobre o tema
acolhimento institucional de crianas e adolescentes, sendo apresentados alguns
apontamentos e posicionamentos sobre as funes do Estado, da famlia e da
sociedade civil no que se refere assistncia infncia, em especial aquelas que se
encontram em vulnerabilidade e que so encaminhadas para acolhimento
institucional.
Segundo Rizzini (2008), o abandono de crianas no recente na histria do Brasil,
durante o sculo XVIII e parte do sculo XIX, ou seja, desde o perodo Colonial e do
Imprio, crianas eram deixadas nas portas das igrejas, de conventos, de
residncias e nas ruas expostas a ataques de animais ou morriam de fome e frio,
mediante situao, ordenou o governador da Capitania que o poder pblico
custeasse a criao dos expostos, o que no aconteceu, sendo a Roda construda a
partir de doaes de nobres, o que se constituiu no smbolo da filantropia.
Com o crescente nmero de abandonos e enjeitados foram criadas no Brasil as
primeiras instituies de acolhimento de crianas, que antes eram conhecidas como
asilos de menores abandonados ou designadas como Casas dos Expostos ou Roda
dos Expostos, destinados a receber essas crianas. Dentre as mais diversas
explicaes para o grande nmero de recm-nascidos abandonados na roda
estavam as de famlias que no tinham condies de prover o sustento de seus
filhos, os filhos de mes solteiras e de escravas, que eram alugadas como amas-de-
leite, ou mesmo para as crianas que chegavam doentes ou mortas, tivessem um
enterro digno (RIZZINI; PILOTTI, 2009). Dessa forma, foram criadas instituies na
Bahia no ano de 1726, no Rio de Janeiro em 1738, So Paulo no ano de 1825 e em
Minas Gerais no ano de 1831.
Segundo Rizzini e Pilotti (2009, p. 19) o sistema de roda, um cilindro giratrio na
parede que permitia que a criana fosse colocada da rua para dentro do
estabelecimento, sem que se pudesse identificar qualquer pessoa [...]. O objetivo
conforme indicado era encobrir a origem da criana e preservar a honra das famlias,
28
j que essas crianas eram nascidas fora do casamento, e abandonadas pela
condio de pobreza da famlia. De acordo com Rizzini e Pilotti (2009) as rodas
buscavam evitar os abandonos selvagens e os infanticdios, embora para Faleiros
(2009) nem todas as crianas pobres eram encaminhadas para as rodas, havendo
outras formas dos pais protegerem seus filhos como a doao ou adoo.
As crianas deixadas na Roda dos Expostos permaneciam pouco tempo na
instituio, eram direcionadas para amas-de-leite alugadas ou entregues a outras
famlias, que recebiam um pequeno salrio (penso) at aproximadamente sete
anos de idade, aps esse perodo eram devolvidas s instituies, merc da
determinao do juiz, que decidia sobre seu destino (RIZZINI; PILOTTI; 2009).
De acordo com Faleiros (2009) um dos grandes problemas encontrados na roda foi
o que se refere alta mortalidade dos acolhidos, levantando questionamentos
quanto a sua qualidade de assistncia como enquanto poltica de assistncia, pois o
intuito da roda era a relativa proteo ofertada s crianas que eram enjeitadas.
Com base em argumentos respaldados na moral e na cincia mdica, a assistncia
caritativa foi questionada pelos higienistas e demais moralistas, polemizando
exatamente a quantidade de crianas deixadas nas rodas, higiene dos asilos, os
filhos ilegtimos, as unies ilcitas e a alta mortalidade infantil, [...] em poucos anos
os princpios da higiene infantil, foram amplamente divulgados pelo Doutor Moncorvo
Filho, criador do Instituto de Proteco e Assistncia Infncia (1891)[...](RIZZINI,
2008, p. 112, grifo do autor)1.
No texto de Rizzini (2008) nos apresenta que Doutor Moncorvo foi um dos principais
defensores da causa da infncia, apontando que ao deixar de cuidar da infncia
estava deixando de cuidar no s do pas, mais sim, da raa humana, com duras
crticas aos asilos, do ponto de vista da higiene e das altas taxas de mortalidade
infantil, assim o Dr. Moncorvo foi um dos denunciadores do descaso do Brasil em
relao ao estado de pobreza em que vivia a populao (RIZZINI, 2009, p. 106).
Logo surgiram iniciativas para regulamentao dos asilos e para o estabelecimento
de maiores critrios para recrutamento das amas-de-leite. A forma como a igreja
lidava com a ilegitimidade dos filhos de seus paroquianos, eram bem controladas, as
1 O instituto destinava-se a amparar e proteger a infncia necessitada tratava-se um projeto mdico,
assistencial e filantrpico.
29
mulheres aps parir, precisavam trabalhar por um ano em asilos, as que
conseguiam empregar como amas-de-leite em hospcios, eram s vezes aquelas
que abandonavam seus filhos, consideradas como da pior espcie, de forma
humilhante por sua condio moral e social eram punidas, levando as
descarregarem seus piores sentimentos sobre os bebs, contribuindo para o
aumento do ndice de mortalidade (RIZZINI, 2008).
Segundo Silva (1997) devido forte imigrao estrangeira para o Brasil, aps
abolio da escravatura em 1888, houve a criao de vrias sociedades cientficas,
que tinham a funo de controlar doenas epidmicas, nos espaos pblicos e
coletivos, incluindo escolas, internatos e prises. Nesse perodo deu-se a
supremacia do mdico sobre o jurista no tratamento dos assuntos referentes ao
amparo da criana [...] (SILVA, 1997, p. 35).
Os mdicos higienistas em geral, eram apresentados como pessoas preocupadas
com a questo da mortalidade infantil no Brasil, promovendo debates para que
consolida-se melhorias na Casa dos Expostos [...] tinham como proposta intervir no
meio ambiente, nas condies higinicas das instituies que abrigavam crianas, e
nas famlias [...] (RIZZINI; PILOTTI, 2009, p. 21).
As crianas inseridas nos asilos de rfos, os quais eram responsveis pelo
acolhimento da infncia e da adolescncia, eram identificados em detrimentos cor,
sexo e idade, guiada pela ideia de educar conforme a funo social, ou seja,
meninos para educao industrial e meninas para educao domstica, preparando-
os para ocupar os cargos mais baixos na sociedade (RIZZINI; PILOTTI; 2009), assim
tambm a roda dos expostos a partir do Imprio tornou-se um reprodutor de mo-de-
obra e de servios domsticos para a casa de famlias, oficinas de artesos e
pequenas fbricas.
[...] o sistema funcionava como troca de benefcios: para os patres, que tinham mo-de-obra dcil e gratuita; e para as crianas e jovens, que tinham oportunidade de treinamento e aprendizagem em uma atividade profissional alm da experincia [...] (MARCLIO, 1998, p. 290).
Na anlise dos autores Marcilio (1998) e Rizzini (2008) na fase denominada
interveno da Medicina e das Cincias Jurdicas, o termo criana foi mais utilizado
para as famlias que tinham sob seus cuidados os filhos naturais, menor para a
infncia desfavorecida, delinquente, carente e abandonada, mantidas sob vigilncia
30
do Estado, sendo objeto de medidas filantrpicas, educativas, repressivas e
assistenciais.
Para a autora Rizzini (2008) nos anos que seguiram o sculo XIX, o termo infncia
era usado para caracterizar os anos de desenvolvimento de um sujeito, at que ele
alcana-se a maioridade. O termo menor na legislao penal abarcava todos que
ainda no completaram a maioridade que estava por volta dos 21 anos, no
havendo nenhuma distino entre a infncia e adolescncia.
No incio do sculo XX, o termo menor passa a ser usado diferentemente do
anterior, tornando-se uma categoria jurdica e socialmente construda para designar
a infncia pobre - abandonada [...] ser menor era carecer de assistncia, era
sinnimo de pobreza, baixa moralidade e periculosidade (RIZZINI, 2008, p. 134), do
ponto de vista econmico, toda e qualquer criana estava sujeita a ao da Justia-
Assistncia.
Havendo necessidade de assistir e proteger o menor, esse passaria a ser objeto de
investigao, para ser definido qual tipo de tutela seria mais indicado a ele, bem
como sua famlia, com objetivo de julgar sua capacidade legal e moral para t-lo
sob sua guarda, assim conforme exposto por Rizzini (2008) havia necessidade de
interveno na famlia, no que se refere autoridade sobre os filhos.
De acordo com a autora as leis de proteo infncia no Brasil nas primeiras
dcadas do sculo XX, faziam parte da estratgia de educar o povo e sanear a
sociedade, as leis destinavam a:
[...] prevenir a desordem, medida em que ofereciam suporte s famlias nos casos em que no conseguissem conter os filhos insubordinados, os quais poderiam ser entregues tutela do Estado [...] a interveno sobre a famlia, retirando-lhe a autoridade sobre os filhos era entendida como necessidade dos tempos modernos [...] (RIZZINI, 2008, p. 64).
Diante das condies de precariedade e de violncia infanto juvenil, as intervenes
estatais, especialmente do judicirio requerem uma especializao na temtica,
surgindo a Justia Menorista.
A Justia de Menores no Brasil surge no final do sculo XIX, seu alvo era a criana
pobre onde a famlia no era considerada capaz de educar seus filhos, de acordo
com os padres de moralidade, aqueles que no se encaixavam eram passveis de
interveno judicial, assim sendo identificados como menores, termo
contemporaneamente substitudo por criana e adolescente, na criao do Estatuto
31
da Criana e Adolescente (ECRIAD), onde as crianas passaram a ser
compreendidas como sujeitos de direitos.
Necessitando de uma sede prpria no julgamento dos processos dos menores de
idade, surgem os Tribunais de Menores, que ficariam sob o comando de Juzes com
apoio e suporte de especialistas para a misso jurdico-social. Com o advento do
cdigo de menores os juzes de rfos passa a ser juiz de menores, travando uma
batalha para o fim da roda dos expostos, e assim acabar o anonimato de quem os
abandonava (SILVA; ROBERTO, 1997).
No incio do sculo XX, a institucionalizao no era questionada como forma de
preveno e tratamento, era necessrio e benfico sada da criana do meio
considerado enfermo e imoral. Rizzini (2008, p. 137) ressalta que os menores
moralmente abandonados aqueles no viciosos ou pervertidos, eram indicadas as
escolas de preservao [...], para os meninos seria oferecido instruo bsica e
dedicao ao trabalho, onde a sociedade via com bons olhos seu aproveitamento
para o trabalho nas fbricas. J para os menores delinquentes, restava a escola de
reforma, que se dividia em duas sees, industrial que eram destinados aos que
tivessem sido absorvidos e uma seo agrcola para os condenados.
Assim em 1920 realizado o 1 Congresso Brasileiro de Proteo infncia
tornando a agenda da proteo social mais debatida no cenrio nacional. No ano
prximo 1921, foi promulgada a lei oramentria federal Lei n 4.242, objetivando
acordar estratgias de assistncia ao menor abandonado (FALEIROS, 2009).
Durante a dcada de XX no perodo republicano, a interveno do Estado nas
prticas ligadas infncia, esteve vinculada com a criminalidade juvenil. Em 1927 foi
promulgado o primeiro Cdigo de Menores do Brasil, elaborado sob a superviso do
Doutor Mello Mattos, Juiz de menores. O Cdigo de Menores de 1927 foi institudo
pelo Decreto n 5.083, consolidado atravs do Decreto n 17.943A, no que se refere
s crianas expostas e abandonadas. O Documento determinava que:
Art. 1 O menor, de um ou outro sexo, abandonado ou delinqente, que tiver menos de 18 anos de idade, ser submetido pela autoridade competente s medidas de assistncia e proteo contidas neste Cdigo. [...] Art. 14. So considerados expostos os infantes at sete anos de idade, encontrados em estado de abandono, onde quer que seja. Art. 15. A admisso dos expostos assistncia se far por consignao direta, excludo o sistema das rodas (BRASIL, 1927).
32
Em relao s crianas abandonadas, o cdigo de 1927 afirma:
Art. 26. Consideram-se abandonados os menores de 18 annos: I. que no tenham habitao certa, nem meios de subsistencia, por serem seus paesfallecidos, desapparecidos ou desconhecidos ou por no terem tutor ou pessoa sob cuja, guarda vivam; II. que se encontrem eventualmente sem habitao certa, nem meios de subsistencia, devido a indigencia, enfermidade, ausencia ou priso dos paes. tutor ou pessoa encarregada de sua guarda; III, que tenham pae, me ou tutor ou encarregado de sua guarda reconhecidamente impossibilitado ou incapaz de cumprir os seus deveres para, com o filho ou pupillo ou protegido; IV, que vivam em companhia de pae, me, tutor ou pessoa que se entregue pratica de actoscontrarios moral e aos bons costumes; V, que se encontrem em estado habitual do vadiagem, mendicidade ou libertinagem; VI, que frequentem logares de jogo ou de moralidade duvidosa, ou andem na companhia de gente viciosa ou de m vida. VII, que, devido crueldade, abuso de autoridade, negligencia ou explorao dos paes, tutor ou encarregado de sua guarda, sejam: a) victimas de mos tratos physicoshabituaes ou castigos immoderados; b) privados habitualmente dos alimentos ou dos cuidados indispensaveis saude; c) empregados em occupaesprohibidas ou manifestamente contrarias moral e aos bons costumes, ou que lhes ponham em risco a vida ou a saude; d) excitados habitualmente para a gatunice, mendicidade ou libertinagem; VIII, que tenham pae, me ou tutor, ou pessoa encarregada de sua guarda, condemnado por sentena irrecorrivel; a) a mais de dousannos de priso por qualquer crime; b) a qualquer pena como co - autor, cumplice, encobridor ou receptador de crime commettido por filho, pupillo ou menor sob sua guarda, ou por crime contra estes (BRASIL, 1927).
Os menores eram diferenciados entre vadios, mendigos e libertinos, conforme
determinava o Cdigo de 1927:
Art. 28. So vadios os menores que: a) vivem em casa dos pais ou tutor ou guarda, porm, se mostram refratrios a receber instruo ou entregar-se a trabalho srio e til, vagando habitualmente pelas ruas e Iogradourospblicos; b) tendo deixado sem causa legitima o domicilio do pai, me ou tutor ou guarda, ou os Iugares onde se achavam colocados por aquele a cuja autoridade estavam submetidos ou confiados, ou no tendo domicilio nem algum por si, so encontrados habitualmente a vagar pelas ruas ou logradouros pblicos, sem que tenham meio de vida regular, ou tirando seus recursos de ocupao imoral ou proibida. Art. 29. So mendigos os menores que habitualmente pedem esmola para si ou para outrem, ainda que este seja seu pai ou sua me, ou pedem donativo sob pretexto de venda ou oferecimento de objetos. Art. 30. So libertinos os menores que habitualmente: a) na via publica perseguem ou convidam companheiros ou transeuntes para a prtica de atos obscenos; b) se entregam prostituio em seu prprio domicilio, ou vivem em casa de prostituta, ou freqentam casa de tolerncia, para praticar atos obscenos; c) forem encontrados em qualquer casa, ou lugar no destinado prostituio, praticando atos obscenos com outrem; d) vivem da prostituio de outrem (BRASIL, 1927).
33
Segundo ainda Faleiros (2009, p. 47) o cdigo de 1927 incorpora tanto a viso
higienista de proteo do meio e do indivduo, como a viso jurdica repressiva e
moralista, vale ressaltar que o olhar repressivo e moralista, era previsto a vigilncia
no cuidado com a sade da criana, buscando intervir no abandono fsico e moral da
criana.
[...] os abandonados tem a possibilidade (no o direito formal) de guarda, de serem entregues sob a forma de soldada, de vigilncia e educao, determinadas por parte das autoridades [...] o encaminhamento pode ser feito famlia, a instituies pblicas ou particulares, o vadio poder ser repreendido ou internado, caso a vadiagem seja habitual (FALEIROS, 2009, p. 47).
O cdigo de 1927 configura o que se convencionou chamar de doutrina da situao
irregular, permanecendo em vigor at 1979, quando foi editado novo cdigo de
menores, que manteve, todavia, a mesma doutrina.
Apesar da manuteno da mesma corrente doutrinria no Brasil, j existia por
indicao da Organizao das Naes Unidas (ONU), a implementao da doutrina
da proteo integral. Assim Silva (1997, p. 52) relata:
A doutrina da situao irregular foi uma criao doutrinria que teve, no
Brasil, o juiz de menores Allyrio Cavalieri como principal mentor. A inovao
doutrinria que ela trouxe consistiu, sobretudo, na eliminao das diferentes
categorias pelas quais se classificava o menor, quais sejam: abandonado,
delinqente, transviado, exposto, vadio, libertino, etc., para introduzir uma
nica categoria: a do menor em situao irregular [...].
Pelo fato da Doutrina constar de documentos legais, interpretados e aplicados aos
juristas, Silva (1997) apresenta que existiam no direito, de acordo com o Ubaldino
Calvento, trs diferentes escolas que envolviam o direito do menor:
A doutrina da situao irregular, quando os menores so sujeitos de direito
quando esto em estado de patologia social essa doutrina estava presente
no cdigo de menores de 1927 no governo de Getlio Vargas.
A doutrina do direito penal do menor, ganha importncia jurdica, quando
pratica algum ato de delinquncia.
A doutrina da proteo integral possibilitava atender todas as demandas dos
menores de idade, no que se refere sade, educao, profissionalizao,
etc, passando a ser inserida no cdigo de menores de 1979.
Ainda para Silva (1997, p. 60) o processo de abandono no cdigo de 1927 se dava
quando no prazo de trinta dias, o menor fugitivo ou perdido, estivesse em situao
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irregular, no fosse reclamado por quem de direito, o juiz, declarando-o
abandonado, dar-lhe-ia o cabvel destino, seria internado, entretanto at o cdigo
de 1979, prevalece o processo de abandono com a sentena de abandono.
O processo e sentena de abandono eram, portanto instrumentos jurdicos, que se
equivalem sentena de destituio do ptrio poder, decretado o abandono, a
criana ou adolescente, seguia para internao, onde poderia permanecer at a
aquisio da maioridade penal, 18 anos, desta forma, o conceito de abandono foi
definido juridicamente e diante dessa definio foram criadas medidas legais para
sua aplicao (SILVA, 1997).
A partir das pesquisas realizadas por Silva (1997), at 1935 todas as crianas
recolhidas das ruas eram mantidas no mesmo abrigo, independente de idade e
motivo, s havendo alguma separao no caso do menor infrator quando houvesse
determinao do judicial.
Em 1963 que se teve a separao entre os menores desvalidos e menores
infratores que seriam separados dos 14 aos 18 anos, sendo, pois aplicada de
maneira clara a doutrina da situao irregular.
Segundo Irma Rizzini (2009), no perodo ditatorial iniciado em 1937 em pleno Estado
Novo, o ento presidente Getlio Vargas, inicia uma poltica clara de proteo e
assistncia ao menor e a infncia, consolidando ainda mais a distino entre menor
e criana sem, contudo alterar os preceitos da Doutrina da Situao Irregular.
Para Faleiros (2009) em relao ao trabalho e educao, o Governo designa aos
menores, um sistema nacional com juno do Estado e das instituies privadas. Ao
setor pblico caber ser conduzido pelos seguintes rgos: Conselho Nacional de
Servio Social (1938) que se vincula ao Ministrio da Educao e Sade decidindo
sobre as subvenes das instituies privadas; Departamento Nacional da Criana
(DNCr) em 1940, que possua funo de fortalecer a criao de creches, prestava
auxlio aos idosos e doentes; o Servio Nacional de Assistncia aos Menores (SAM)
em 1941, formado para o controle da ordem social orientando a criao de
polticas pblicas; e por fim a Legio Brasileira de Assistncia (LBA) em 1942, coube
a primeira dama a presidncia, responsvel em prestar assistncia s famlias em
que seus chefes estivessem mobilizados militarmente. A entidade juntamente com o
35
DNCr oferece estmulos a creches, alm de auxlio a idosos, doentes e grupos de
lazer.
Ao que se referem assistncia pblica, os problemas que envolviam o menor,
vinham sendo cuidados pela esfera jurdica, atravs dos juizados de menores e pela
atuao particular de algumas organizaes privadas. At 1941 no havia no pas
um rgo federal responsvel pelo controle da assistncia, oficial e privada, sendo
criado pelo presidente Vargas um rgo centralizador para a assistncia ao menor,
inicialmente no Distrito Federal, depois em todo territrio nacional, surgindo assim, o
Servio de Assistncia aos Menores (SAM), este era:
[...] uma tentativa de centralizar a assistncia no distrito federal e resolver os problemas enfrentados pelo juzo de menores na sua ao jurdico-social como, por exemplo, a falta de continuidade nos servios prestados, quando o menor estudado e classificado pelo juzo no encontrava local adequado para ser educado ou reeducado (RIZZINI, 2009, p. 263).
Conforme Faleiros (2009, p. 54) a implantao do SAM tem mais a ver com a
questo da ordem social que assistncia, vinculado ao Ministrio da Justia e aos
Juizados de menores, sua competncia seria:
[...] orientar e fiscalizar os educandrios particulares, investigar os menores para fins de internao e ajustamento social, proceder exame, abrigar e distribuir os menores pelos estabelecimentos, promover a colocao de menores, incentivar a iniciativa particular de assistncia a menores e estudar as causas do abandono [...].
A finalidade do SAM foi instituda segundo o Decreto-lei n 3.799 de 05/11/1941:
Art. 2 O S. A. M. ter por fim:
a) sistematizar e orientar os servios de assistncia a menores desvalidos e delinqentes, internados em estabelecimentos oficiais e particulares; b) proceder investigao social e ao exame mdico-psico-pedaggico dos menores desvalidos e delinqentes; c) abrigar os menores, disposio do Juzo de Menores do Distrito Federal; d) recolher os menores em estabelecimentos adequados, afim de ministrar-lhes educao, instruo e tratamento smato-psquico, at o seu desligamento; e) estudar as causas do abandono e da delinqncia infantil para a orientao dos poderes pblicos; f) promover a publicao peridica dos resultados de pesquisas, estudos e estatsticas (BRASIL, 1941).
Sob o Decreto-lei n 6.865 de 11/9/1944 que o SAM adquiriu a esfera nacional,
passando a prestar aos menores desvalidos e infratores das leis penais, em todo o
territrio nacional, assistncia social sob todos os aspectos, ou seja, ao invs de
abrigar somente os menores sob ordem do Juzo de Menores do Distrito Federal,
36
tambm o SAM acolheria os menores mediante autorizao dos Juzos de Menores
conforme o artigo 2 alnea C (RIZZINI; IRMA, 2009).
Ainda neste perodo usando como estratgia de manuteno da ordem surge as
Delegacias de Menores, que articulada com o SAM e com o Juizado exercia a
funo repressiva. A partir de 1948 iniciam as denncias de ex-juzes da infncia
apontando que a delinquncia estava relacionada causa dos abandonos. As fortes
crticas ao SAM despontavam atravs da imprensa e do Parlamento, por atores de
oposio a Getlio Vargas (FALEIROS, 2009).
Nesse quadro, revelam-se graves problemas relacionados ao SAM, como fraudes,
denuncia de maus tratos e corrupo. Assim o rgo passou a ser condenado por
ex-juzes e sociedade como no sendo um lugar adequado, passando pelo
imaginrio das pessoas como escola do crime, fbrica de criminosos, delinquentes
entre outros. J com sua imagem bastante denegrida, o SAM tinha sua atuao
restrita, que consistia basicamente pela triagem e a internao de menores
encaminhados pelo Juizado de Menores, nos estabelecimentos oficiais e nos
particulares (FALEIROS, 2009).
Faleiros (2009) relata que a extino do SAM ocorreu devido oposio ao Governo
Vargas por pessoas ligadas Ao Social Arquidiocesana (ASA) do Rio de Janeiro,
que se posicionaram contra o sistema desumano do SAM, a pedido do bispo em
1958 ASA prepara um projeto que instituiu o Conselho Nacional de Menores.
Aps o golpe militar de 1964 a Ao Social Arquidiocesana requisita que se d
encaminhamento ao projeto que extingue o SAM, criando um novo rgo, a
Fundao Nacional do Bem estar do Menor (FUNABEM), esse rgo passa a no
ser subordinado ao Presidente e nem ao Ministrio da Justia (FALEIROS, 2009).
A autora Irma Rizzini (2009) aponta alguns fatores que impossibilitaram o SAM a
cumprir seu papel, surgindo assim uma comisso presidida por Paulo Nogueira Filho
que apresenta o anteprojeto para a criao do Instituto Nacional de Assistncia a
Menores (INAM), ao presidente da Repblica e ao Congresso Nacional em
17/8/1955, a ento proposta visava compor uma diretoria e um conselho formado de
representantes da comunidade e de grupos sociais interessados nas atividades do
instituto.
37
O SAM torna-se objeto de uma Comisso Parlamentar de Inqurito (CPI) em 1955,
para apurar irregularidades, mas no obteve xito, somente em 1961 aps nova
sindicncia e denncias que de fato foi constatada a veracidade das denncias, e
atravs da Lei 4.513 torna extinto o SAM e cria-se em dezembro de 1964 a
Fundao Nacional de Bem-Estar do Menor - FNBEM e depois FUNABEM.
Silva (1997) ressalta que o modelo institudo pelo militarismo, se baseava nos
moldes industriais, educacionais, administrativos e de comunicao, modelo
americano adotado pelo Brasil. Nesta fase de institucionalizao deu-se incio o
princpio da destituio do ptrio poder, onde a sentena de abandono retirava da
responsabilidade dos pais, da comunidade e da sociedade e as entregava ao
Estado.
Segundo Vogel (2009, p. 288), de acordo com a lei que deu origem a FUNABEM,
esta seria uma entidade autnoma, na esfera administrativa e na esfera financeira.
Cabe ainda ressaltar que:
[...] por fora da lei, caber-lhe-ia formular e implantar a Poltica Nacional do Bem-Estar do Menor, mediante o estudo do problema e planejamento das solues, a orientao, coordenao e fiscalizao das entidades que executem essa poltica [...].
No entanto, para Faleiros (2009), a FUNABEM passa a moldar-se ao autoritarismo e
tecnocracia do governo repressivo que operou at 1985.
A articulao entre os setores pblicos e privados era praticada pela FUNABEM,
atravs de convnios e assim criou-se e manteve instituio no Rio de Janeiro a
qual foi denominada centro-piloto, pois serviria de modelo para todo o Brasil e
instalao de centros de Recepo e Triagem para diagnsticos (FALEIROS, 2009).
As instituies que prestariam assistncia e proteo aos menores seriam
elaboradas pelo Poder Pblico, ofertando centros especializados de recepo,
triagem e observao e permanncia de menores, dessa forma surgiram as
Febems, presente em vrios estados do Brasil, eram instituies de internamento
que abrigavam crianas carentes, desamparadas e com condutas antissociais
(MARCILIO, 1998).
Dentro da lgica do acolhimento, em 1949 a Lei n 560 cria o Servio de Colocao
Familiar juntamente com o Juizado de Menores, cujo servio visava acolher em
casas de famlias, menores com idade entre 0 a 14 anos, que no pudessem
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permanecer na companhia da famlia natural. Para as famlias que acolhessem tais
crianas em estado de abandono, ficou estabelecido o pagamento pelos servios
prestados. Mais tarde, o Judicirio, atravs do Juiz de Menores, entendeu por
estender o auxlio para a prpria famlia natural extensa da criana ou adolescente
que os mantivesse em acolhimento familiar, evitando a institucionalizao ou ruptura
integral dos vnculos familiares biolgicos (SILVA, 1997).
Alm do pagamento s famlias substitutas, houve incluso das instituies
particulares que abrigavam crianas em regime de semi-internato, no rol de
beneficiados ao recebimento de recursos para os cuidados e manuteno dessas
crianas e adolescentes, nascendo assim, a parceria entre Estado e instituies
privadas e conveniadas (SILVA, 1997).
Em 1979 depois de dcadas de debates e com o objetivo de realizar reviso no
ento cdigo de menores, surge o Novo Cdigo de Menores, que veio empregar a
noo do menor em situao irregular de forma ainda mais efetiva, cabendo ao Juiz
de Menores interferirem na suposta irregularidade, segundo o qual [...] os menores
so sujeitos de direito quando se encontrarem em estado de patologia social,
definida legalmente (RIZZINI; PILOTTI, 2009, p. 28).
Para melhor apresentar o Cdigo de Menores de 1979, recorreu-se ao autor Alyrio
Cavallieri, Juiz de menores do antigo Juizado de menores do Estado do Rio de
Janeiro, 1 Vice-Presidente da Associao Internacional de Juzes de menores e de
Famlia e Professor de Direito do Menor, em seu livro 1.000 Perguntas Direito do
Menor.
Segundo os elementos histricos sobre o nascimento do Cdigo de Menores, h um
consenso entre os autores consultados em identificar, que surgiu por apelos dos
Juzes de Menores que levaram ao Congresso e a Presidncia da Repblica novas
regras para aplicao no que concerne aos Direitos da criana e do adolescente,
para coincidir com o Ano Internacional da Criana.
Assim, o novo Cdigo de Menores foi promulgado no dia 10 de outubro de 1979, na
presena de representantes dos Juzes de Menores e apresentado pelo Ministro da
Justia ao Congresso da Associao Brasileira de Juzes de Menores, no dia 12 de
outubro, Dia da Criana, em Vitria, Esprito Santo, mas com entrada em vigor
39
apenas em 8 de fevereiro de 1980, 120 dia aps sua publicao
(CAVALLIERI,1983).
Na obra citada, Cavallieri (1983, p. 16) em suas primeiras argumentaes apresenta
a diferena entre criana e menor, que tecnicamente no teria distino, mas no que
concerne ao termo menor, a palavra tem sentido jurdico e refere-se a uma pessoa
cuja idade a coloca em posio distinta das demais, perante as leis, mas que existe
um consenso social de que a palavra menor mesmo no ano de 1983, ainda em
plena vigncia do Cdigo de Menores, possua uma carga pejorativa.
Sobre a diferenciao entre Direito do Menor e os Direitos da Criana, Cavallieri
(1983, p. 17) apresenta que a Declarao dos Direitos da Criana, proclamada pela
ONU em 1959, sendo uma carta de princpios gerais, quando que o Direito do
Menor cincia, disciplina jurdica, direito escrito, voltado, pois para os elementos
do Direito, que todavia, colocava o dito menor, inscrito como em situao irregular,
que para o mesmo autor, corresponde a um estado de patologia (doena) social.
Ainda segundo Cavallieri (1983, p. 20), a base etimolgica da palavra informa que
irregular o contrrio de regular, ou seja, regular o que est de acordo com a
norma, no caso, a norma jurdica, atingindo especificamente aqueles considerados
como sujeitos a uma jurisdio especial, a qual deveria ser solucionada pela via de
deciso do judicirio. Todavia, argumenta que no se enquadra na abordagem da
irregularidade a pobreza, que em seu estudo, deveria ser encaminhada para
atendimento junto assistncia.
Apesar do avano do Cdigo de Menores, o autor acentua a necessidade poca,
de adaptaes, as quais apresentavam que,
O Cdigo Penal de 1940 fixou a idade da responsabilidade penal em 18 anos e o Cdigo de Menores seguindo a legislao antiga, mantinha-a, de certa forma, em 14 anos, submetendo os menores a partir dessa idade a processo especial. [...] A lei de emergncia (Dec.-Lei n 6.026 de 24 de novembro de 1943) adaptou o Cdigo de Menores ao Cdigo Penal que, em seu art. 23 determinou sejam os menores de 18 anos submetidos legislao especial, por serem penalmente irresponsveis. (CAVALLIERI, 1983, p. 48).
O Cdigo de Menores, em seu artigo 1 evidencia para quem se dirige e dispe
sobre assistncia, proteo e vigilncia dos menores.
Art. 1 Este Cdigo dispe sobre assistncia, proteo e vigilncia a menores: I - at dezoito anos de idade, que se encontrem em situao irregular; II - entre dezoito e vinte e um anos, nos casos expressos em lei.
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Pargrafo nico - As medidas de carter preventivo aplicam-se a todo menor de dezoito anos, independentemente de sua situao (BRASIL, 1979).
Nas palavras de Cavallieri (1983, p. 59), a Assistncia se configura como:
Conjunto de medidas legais de recursos materiais e humanos de natureza pblica ou privada, destinado a possibilitar o acolhimento e o atendimento a menores em suas necessidades essenciais, durante o tempo que se mostrar adequado em cada caso.
No que tange Proteo, desta que compreende o conjunto de medidas tendentes
a preservar o bem-estar do menor (CAVALLIERI, 1983, p. 59).
Sobre o significado de Vigilncia, traduz como sendo dirigida [...] prevenir a
ocorrncia de situaes que possam levar risco ao bem-estar do menor
(CAVALLIERI, 1983, p. 59), e finaliza com o conceito de Bem-estar, caracterizado
como o conjunto de condies que dizem respeito integridade fsica, mental e
moral, subsistncia, sade, instruo obrigatria (CAVALLIERI, 1983, p. 60).
Interessante apresentar tais definies, especialmente do autor citado, pois se trata
de algum que traduz o entendimento jurdico doutrinrio vigente durante a
execuo do Cdigo de Menores de 1979. Tais dados demonstram que muito se
falava de Bem-Estar, mas na realidade a efetividade das aes era encaminhada ao
controle e vigilncia coercitiva e culpabilizante, tanto do menor quanto de sua
famlia.
No artigo 2 da citada lei, o legislador descreve o que entende sobre a situao
irregular.
Art. 2 Para os efeitos deste Cdigo, considera-se em situao irregular o menor: I - privado de condies essenciais sua subsistncia, sade e instruo obrigatria, ainda que eventualmente, em razo de: a) falta, ao ou omisso dos pais ou responsvel; b) manifesta impossibilidade dos pais ou responsvel para prov-las; Il - vtima de maus tratos ou castigos imoderados impostos pelos pais ou responsvel; III - em perigo moral, devido a: a) encontrar-se, de modo habitual, em ambiente contrrio aos bons costumes; b) explorao em atividade contrria aos bons costumes; IV - privado de representao ou assistncia legal, pela falta eventual dos pais ou responsvel; V - Com desvio de conduta, em virtude de grave inadaptao familiar ou comunitria; VI - autor de infrao penal. Pargrafo nico. Entende-se por responsvel aquele que, no sendo pai ou me, exerce, a qualquer ttulo, vigilncia, direo ou educao de menor, ou
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voluntariamente o traz em seu poder ou companhia, independentemente de ato judicial (BRASIL, 1979).
No que se refere preveno no Cdigo de Menores encontra-se, como j
acentuado na vigilncia, esta dirigida a todos os menores, no apenas aos descritos
como em situao irregular, o que demarca o carter funcionalista e positivista da lei
no que tange ao controle do sujeito e no efetivamente sua proteo.
O Cdigo de 1979 define como situao irregular: a privao de condies essenciais subsistncia, sade e instruo, por omisso, ao ou irresponsabilidade dos pais ou responsveis, por ser vtima de maus tratos, por perigo moral, em razo de explorao ou encontrar-se em atividades contrrias aos bons costumes, por privao de representao legal, por desvio de conduta ou autoria de infrao penal [...] (FALEIROS, 2009, p. 70).
Dentre as medidas de proteo destinadas queles em situao irregular estava
institucionalizao. Tal medida encarada como proveitosa para o menor em situao
irregular apresentava o afastamento familiar e destinao de seus cuidados para as
instituies, tanto pblicas quanto privadas, como forma de corrigir possveis
comportamentos desviados, controlando e punindo o sujeito, entendido aqui como
objeto de direitos e no como sujeitos de direitos.
Art. 41. O menor com desvio de conduta ou autor de infrao penal poder ser internado em estabelecimento adequado, at que a autoridade judiciria, em despacho fundamentado, determine o desligamento, podendo, conforme a natureza do caso, requisitar parecer tcnico do servio competente e ouvir o Ministrio Pblico. 1 O menor sujeito medida referida neste artigo ser reexaminado periodicamente, com o intervalo mximo de dois anos, para verificao da necessidade de manuteno de medida. 2 Na falta de estabelecimento adequado, a internao do menor poder ser feita, excepcionalmente, em seo de estabelecimento destinado a maiores, desde que isolada destes e com instalaes apropriadas, de modo a garantir absoluta incomunicabilidade (BRASIL, 1979).
Apesar do quadro de institucionalizao frequente e sem cuidados especiais, o
Cdigo de Menores, trazia que as instituies de acolhimento pblico e privado
deveriam se submeter a registro e formalidades de funcionamento:
Art. 9 As entidades de assistncia e proteo ao menor sero criadas pelo Poder Pblico, segundo as diretrizes da Poltica Nacional do Bem-Estar do Menor, e tero centros especializados destinados recepo, triagem e observao, e permanncia de menores. [...] 2 A escolarizao e a profissionalizao do menor sero obrigatrias nos centros de permanncia. 3 Das anotaes sobre os menores assistidos ou acolhidos constaro data e circunstncias do atendimento, nome do menor e de seus pais ou responsvel, sexo, idade, ficha de controle de sua formao, relao de seus pertences e demais dados que possibilitem sua identificao e a individualizao de seu tratamento.
42
Art. 10. As entidades particulares de assistncia e proteo ao menor somente podero funcionar depois de registradas no rgo estadual responsvel pelos programas de bem-estar do menor, o qual comunicar o registro autoridade judiciria local e Fundao Nacional do Bem-Estar do Menor. Pargrafo nico. Ser negado registro entidade que no se adequar s diretrizes da Poltica Nacional do Bem-Estar do menor e ao disposto nesta Lei. Art. 11. Toda entidade manter arquivo das anotaes a que se refere o 3 do art. 9 desta Lei, e promover a escolarizao e a profissionalizao de seus assistidos, preferentemente em estabelecimentos abertos (BRASIL, 1927).
Para Esther Arantes (2009) o aprofundamento da dicotomia entre
criana/adolescente e menor, deixava clara tendncia na aplicao de medidas
punitivas e nenhuma poltica de insero social, essa clara distino que levou os
movimentos sociais a lutarem no ano 1987, para a adoo da Proteo Integral que
abrangesse toda infncia.
Diante do exposto, a partir da Constituio da Repblica de 1988, nascida de
esforos de diversos seguimentos ligados defesa dos direitos da criana, o
Estatuto da Criana e Adolescente (ECRIAD), se distancia do direito do menor,
representado anteriormente pelo Cdigo de Menores, onde no se reconhecia na
criana e no adolescente pessoa de direito, e a partir do ECRIAD reconhecidos
como sujeitos de direito, havendo uma clara transformao no processo de
acolhimento institucional, conforme ser apresentado no prximo item.
2.2 ESTATUTO DA CRIANA E ADOLESCENTE
Conforme apresentadas anteriormente, as medidas mdica-jurdica-assistenciais
voltadas criana e ao adolescente, podem ser simplificadas no quadro que segue,
onde se apresentam as normatizaes e as caractersticas do atendimento desse
pblico entre o perodo de 1889 a 1985, podendo assim, perceber as nuances de
transformaes e o momento em que se tornam no contexto jurdico, sujeitos de
direito.
O perodo pretrito a 1889 foram demonstrados no debate terico do item anterior,
onde se observa uma utilizao religiosa no processo de doutrinao, bem como
uma ao muito mais de proteo moral familiar do perodo, que a efetiva proteo
infncia, como no caso das rodas dos expostos, to amplamente utilizada para a
preservao da maternidade indesejada.
43
Entre 1889 e 1930, algumas leis que atingem a infncia foram realizadas, tais como
a lei do Ventre Livre, que colocava liberto o filho da escrava, bem como em 1927, a
primeira Lei Brasileira destinada exclusivamente criana e ao adolescente.
QUADRO 1 - Contextualizao Histrica do Atendimento Infncia no Brasil
(1889-1990)
Perodos Principais normatizaes e
legislaes Principais Caractersticas
Primeiros passos: marcos legais e normatizaes (1889-1930)
Cdigo Criminal do Imprio (1830) Lei do Ventre Livre (1871) Cdigo Penal da Repblica (1890) Cdigo de Menores (1927)
Infncia como objeto de ateno e controle do Estado Estratgia mdica-jurdica-assistencial
Autoritarismo Populista e o Servio de Assistncia ao Menor (1930-1945)
Departamento Nacional da Criana (Decreto-Lei n. 2.024 de 1940) Servio de Assistncia ao Menor (Decreto n. 3.799 de 1941) Estabelece a Legio Brasileira de Assistncia
Avano estatal no servio social de atendimento infantil Organizao da proteo maternidade e infncia
Democracia populista (1945-1964)
Servio de Colocao Familiar (Lei n. 560 de 1949) Servio Nacional de Merenda Escolar (Decreto n.37.106 de 1955) Instituto de Adoo (Decreto-Lei n. 4.269 de 1957) Leis das Diretrizes e Bases da Educao (Decreto-Lei n. 4.024 de 1961)
Manuteno do aparato legal Regulamentao dos servios de adoo
Ditadura militar e a Fundao Nacional do Bem-Estar do Menor (1964-1985)
Fundao Nacional do Bem-Estar do Menor (Decreto n. 4.513 de 1964) Diminuio da idade penal para 16 anos (Lei n. 5.258 de 1967) Acordo entre o Fundo das Naes Unidas para Infncia e o Governo dos Estados Unidos do Brasil (Decreto n. 62.125 de 1968) Cdigo de Menores (Lei n. 6.697 de 1979) Doutrina da Situao Irregular do menor.
Reordenamento institucional repressivo Instituio do Cdigo de Menores de 1979 Contradies entre a realidade vigente e as recomendaes das convenes internacionais sobre o direito da infncia
Constituio da Repblica ao Estatuto da Criana e Adolescente (1988-1990)
Constituio da Repblica Federativa do Brasil (1988) Adoo da Conveno Internacional dos Direitos das Crianas (Decreto Legislativo n. 28 de 1990) Estatuto da Criana e do Adolescente (Lei n. 8.069 de 1990)
Doutrina da Proteo Integral Integrao entre Estado e sociedade civil
Fonte: (PEREZ e PASSONE, 2010, p. 652-653).
Feita a recuperao das mudanas que se efetivaram no Brasil at o advento do
ECRIAD, percebe-se que em muito se avanou no horizonte do Direito, mesmo com
a implantao do Cdigo de Menores, pois demonstra a necessidade de
aprimoramento e desenvolvimento de uma rea importante do Direito.
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Segundo Faleiros (2009, p. 74), desde a dcada de 80 o Brasil passava por
transformaes polticas, e a partir das lutas e presses sociais, e dentro das
correlaes de foras possveis, em 1986, o Congresso Nacional funciona tambm
como Assembleia Constituinte [...]. Foras contrrias acabam por vetar a
participao da assembleia exclusiva, acirrando o debate constituinte, havendo uma
grande mobilizao tanto dos lobbies de conservadores, como de empresas e
organizaes populares.
No cenrio nacional os movimentos sociais ganham fora, sendo aliados na
realizao de debates, pesquisas e seminrios, e assim, os direitos da criana so
colocados em visibilidade por inmeras organizaes, destacando-se o Movimento
Nacional de Meninos de Rua (organizao no governamental, composta por uma
rede de educadores sociais), Pastoral do Menor, entidades de direitos humanos,
ONGs, que prope emendas para defesa dos direitos da criana e do adolescente,
que estudam tambm as discusses internacionais, consubstanciadas nas Regras
de Beijing (1995), nas Diretrizes de Riad (1988) e na Conveno das Naes Unidas
sobre os Direitos da Criana (1989) (FALEIROS, 2009).
Fachinetto (2008) aponta que atravs da articulao nacional em defesa dos direitos
das crianas e dos adolescentes foi que se consolidou a criao da Comisso
Nacional da Criana e Constituinte, que tinha como trabalho, sensibilizar e mobilizar
a opinio pblica e os constituintes sobre a realidade da infncia no pas.
Conforme Faleiros (2009) a Comisso Nacional da Criana e Constituinte foi
instituda por Portaria Interministerial, com a colaborao de rgos do governo e da
sociedade, recolhendo mais de um milho de assinaturas para a sua emenda,
criando a Frente Parlamentar suprapartidria pelos direitos da criana e adolescente
passando a influenciar no processo legislativo instalado no Congresso Nacional.
Acolhendo as bases tericas da Doutrina da Proteo Integral, o texto constitucional
de 1988, traz no seu art. 227 a responsabilidade da famlia, Estado e sociedade, de
maneira solidria, na defesa e garantia dos direitos das crianas e adolescentes,
independentemente de sua condio social ou comportamental.
Art. 227. dever da famlia, da sociedade e do Estado assegurar criana, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito vida, sade, alimentao, educao, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria, alm de coloc-los a salvo de toda forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso (BRASIL, 1988).
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De acordo com Vogel (2009) ainda na dcada de 80, do sculo XX, o campo das
polticas de atendimento infncia e adolescncia, passou por um momento de
transformao, havendo maior participao e integrao entre Estado e sociedade
civil. Assim, foi possvel transformar em princpio constitucional as concepes
fundamentais da Conveno Internacional dos Direitos da Criana. Esse processo
s atingiu seus objetivos em 1988/90 com a aprovao do Estatuto da Criana e
Adolescente (ECRIAD) Lei Federal n 8.069 de 13/7/1990, que atribuiu criana e
adolescente a doutrina da proteo integral, os considerando sujeito de direitos.
O ECRIAD foi promulgado em 13 de julho de 1990, vindo a substituir a repressiva
doutrina do Cdigo de Menores de 1979, e estabeleceram novas referncias
polticas, jurdicas e sociais para o trato com a infncia e juventude brasileira
(PASSIONE; PEREZ, 2010).
Costa (2004, p. 02) traz uma reflexo importante acerca do direito da criana,
Crianas e adolescentes so sujeitos no s de direitos fundamentais, universalmente reconhecidos a toda pessoa humana, mas, principalmente, de direitos especiais derivados de sua condio de vulnerabilidade, dependncia e continuo desenvolvimento revelados pela cincia moderna e contempornea.
Segundo Souza (2001) a doutrina da proteo integral criana, j existente no
plano internacional, somente foi efetivamente discutida no Brasil por volta de 1985,
por entidades no governamentais e segmentos da sociedade civil, por ocasio dos
novos rumos que tomava a poltica nacional.
Paralelamente ao processo de elaborao e implementao das polticas sociais destinadas ao atendimento criana e ao adolescente, o perodo de redemocratizao se caracterizou pela reforma administrativa do Estado, que envolveu a descentralizao e a municipalizao de polticas pblicas e, tambm, a institucionalizao do controle social, com a criao de conselhos e espaos pblicos de interlocuo e cogesto poltica, bem como a mobilizao e participao social de diversos setores da sociedade civil (PEREZ e PASSONE, 2010, p. 665).
Para Souza (2001) por ocasio da elaborao da Constituio de 1988, e em funo
da enorme mobilizao nacional com o apoio, principalmente, do Frum Nacional
Permanente de Direitos da Criana e do Adolescente Frum DCA, instrumento que
contou com extremo apoio do Unicef e outras entidades no-governamentais, a Lei
n 8.069/90, o Estatuto da Criana e Adolescente, teve como base para sua
elaborao os princpios e dispositivos enunciados pela Conveno, adaptando-os
nossa conjuntura poltica, social, cultural e econmica (SOUZA, 2001, p. 129).
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Conforme se exps, a doutrina da proteo integral diverge totalmente da doutrina
da situao irregular prevista no antigo Cdigo de Menores, atendendo aos anseios
e lutas dos movimentos da sociedade:
O Estatuto da Criana e do Adolescente (Lei 8.069/90) institui a doutrina da proteo integral criana e ao adolescente, considerando criana a pessoa com at doze anos incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos fixando-lhes os direitos e os deveres e prevendo as medidas aplicveis queles que afrontem os seus preceitos legais. O Estatuto substituiu o antigo Cdigo de Menores (Lei 6697/790 e a sua doutrina da situao irregular, mas fundamentalmente foi uma resposta aos movimentos da sociedade que pediam uma nova poltica de atendimento s crianas e aos adolescentes que no se baseasse no assistencialismo nem na represso herdada da poca da Funabem e ratificada pelo Cdigo de Menores. [...] (JESUS, 2006, p. 13).
No que diz respeito s medidas de proteo destinadas criana e ao adolescente,
at a Constituio Federal de 1988, as polticas e as Leis destinadas populao
infanto-infantil atravs do Cdigo de Menores contriburam para anulao dos
valores sociais, fazendo com que persistisse a cultura asilar, coercitiva, punitiva,
deixando um cenrio de excluso e abandono dessas crianas.
Nesse sentido, a Constituio Federal e o Estatuto da Criana e Adolescente
buscaram romper com tal cultura excludente e segregadora, entendendo pela
necessidade da convivncia familiar e comunitria para o pleno desenvolvimento do
sujeito.
Desta forma, o Estatuto da Criana e Adolescente (1990), estabelece:
Art. 3 A criana e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes pessoa humana, sem prejuzo da proteo integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento fsico, mental, moral, espiritual e social, em condies de liberdade e de dignidade. Art. 4 dever da famlia, da comunidade, da sociedade em geral e do poder pblico assegurar, com absoluta prioridade, a efetivao dos direitos referentes vida, sade, alimentao, educao, ao esporte, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria (BRASIL,1990).
Para o jurista Vercelone (2003, p. 32), a partir da entrada em vigor do ECRIAD,
todos os poderes do Estado, os rgos pblicos da comunidade e em particular o
Poder Judicirio tem a obrigao de interpretar todas as normas, luz daqueles
princpios fundamentais [...].
No que se refere ao artigo 3 na anlise de Van Well (2015),
A criana e ao adolescente so reportados os direitos fundamentais inerentes ao ser humano, qual pessoa nascida com vida. Esse artigo est em consonncia com o art. 227 da Constituio Federal e com o art. 11 e
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seguintes do Cdigo Civil. Os direitos fundamentais so irrenunciveis, intransmissveis, inalienveis e imprescritveis, no podendo seu exerccio sofrer limitao voluntria. Os direitos fundamentais conferidos a criana e ao adolescente devem ser garantidos por leis e polticas pblicas que assegurem ao menor o pleno desenvolvimento fsico, mental, moral, espiritual e social.
Segundo Coelho (2003, p. 36), o art. 3 do Estatuto inicia com a abrangncia dos
direitos fundamentais da pessoa humana criana e ao adolescente, vinculados
proteo integral. Mas em suas palavras uma sociedade ser justa no momento
em que oportunizar a todas as crianas e aos seus adolescentes estas condies de
desenvolvimento ntegro, nas diferentes dimenses fundamentais do ser humano
[...].
Fachinetto (2008) apresenta sua observao do art. 4 do ECRIAD, onde deve ser
compreendido de tal forma a permitir e viabilizar a plena eficcia das normas
protetivas previstas na legislao (Constituio, ECRIAD, LDB, LOAS, etc.), inclusive
aquelas decorrentes da normativa internacional e incorporadas ao Direito interno.
Numa primeira anlise, pode-se relacionar ou at atribuir o princpio da prioridade absoluta quele da condio peculiar de pessoa em desenvolvimento, j que os direitos das crianas e dos adolescentes devem ser validados com a presteza necessria para que sirvam, no tempo certo, como alicerces do desenvolvimento pessoal e garantias da integralidade. Em face dessa imprescindvel presteza no atendimento contemporneo das suas necessidades que, sabiamente, o constituinte cunhou como dever da famlia, da sociedade e do Estado assegurar os direitos das crianas e dos adolescentes de modo pleno e prioritrio. Nenhum outro segmento social foi distinguido com to expressa e contundente fora normativa como o dispensado criana e ao adolescente (FACHINETTO, 2008, p. 42).
Na viso de Van Well (2015) no que se refere ao artigo 4, o dispositivo invoca o
compromisso do Estado para com a famlia em garantir a todos os seus membros
dignidade e tratamento igualitrio e na efetivao dos direitos fundamentais da
criana e do adolescente. Para isso o fortalecimento da famlia como instituio
fundamental, a fim de garantir assistncia integral na formao da personalidade da
criana.
Nessa tica, percebe-se a importncia do fortalecimento da famlia como instituio
para a devida garantia do pleno desenvolvimento da identidade pessoal e social do
sujeito, especialmente quando peculiar condio de formao, como no caso da
criana e do adolescente.
Desta forma, se antes as crianas e adolescentes eram retiradas de suas famlias
por carncia material, agora a Lei traduz o oposto, convivncia em famlia passa a
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ser um direito e deve ser articulada por aes entre o Estado, a comunidade e a
prpria famlia (FACHINETTO, 2008).
Tais elementos mostram a superao do antigo discurso higienista que, segundo
Costa (2004) devido os altos ndices de mortalidade presente na sociedade
brasileira at os anos de 1980 do sculo XX, a famlia era definida como incapaz de
cuidar e proteger a vida das crianas e adolescentes, as condies de precariedade
da sade dos adultos eram delegadas aos higienistas, que impunham famlia
pobre, educao fsica, moral, intelectual e sexual das crianas e adolescentes, num
processo de culpabilizao da famlia por todos os problemas enfrentados pela
infncia e juventude.
No quadro seguinte verificamos a evoluo do aparato legal, na criao das
condies de assegurar as diretrizes de polticas sociais bsicas com capacidade de
atender s necessidades primordiais das famlias e seus dependentes como sade,
educao, cultura, alimentao, esporte e lazer, levando ao acesso aos direitos
sociais a uma dimenso da cidadania.
O quadro apresenta as principais regulamentaes legais ps ECRIAD, que visam
efetivao de seus preceitos, no direcionados exclusivamente a tal categoria social,
mas que impactam no exerccio de seus direitos e garantias, como no caso a Lei
Orgnica da Assistncia social.
Quadro 2 - Contextualizao histrica do atendimento infncia e adolescncia no
Brasil (1990-2016)
(continua)
Perodos Principais normatizaes e
legislaes Principais Caractersticas
Redemocratizao (1990-2016)
Conselho Nacional dos Direitos da Criana e do Adolescente (Lei n. 8.242 de 1991) Lei Orgnica da Sade Lei Orgnica da Assistncia Social (Lei n. 8.742 de 1993)
Novo padro poltico, jurdico e social Institucionalizao da infncia e da adolescncia como sujeito de direitos
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Quadro 2 - Contextualizao histrica do atendimento infncia e adolescncia no
Brasil (1990-2016)
(concluso)
Redemocratizao
(1990-2016)
Criao do Ministrio da Previdncia e Assistncia Social (Medida Provisria n. 813 de 1995) Lei de Diretrizes e Bases da Educao (Lei n. 9.394 de 1996) Programa de Erradicao do Trabalho Infantil (Portaria n. 458 de 2001) Criao da Secretaria Especial dos Direitos Humanos (Lei n. 10.683 de 2003) Criao do Programa Bolsa-Famlia (Lei n. 10.683 de 2003) Substituio do Ministrio da Previdncia e Assistncia Social pelo Ministrio de Desenvolvimento Social e Combate Fome (Lei n. 10.869 de 2004) Poltica Nacional de Assistncia Social (Resoluo CNAS n. 145 de 2004) Norma Operacional Bsica do Sistema nico de Assistncia Social (Resoluo CNAS n. 130 de 2005) Lei Orgnica de Segurana Alimentar (Lei n. 11.246 de 2006) Plano Nacional de Promoo, Proteo e Defesa do Direito de Crianas e Adolescentes Convivncia Familiar e Comunitria (Resoluo n. 1 de 2006/Conanda) Nova Lei da Adoo (Lei n. 12.010 de 03/08/2009) Cdigo Penal - dos crimes sexuais contra vulnervel (Lei n. 12.015 de 07/08/2009) Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Lei n. 12.594 de 18/01/2012) Estatuto da Juventude (Lei n. 12.852 de 05/08/2013) Lei da Palmada (Lei n. 13.010 de 26/06/) Cdigo de Processo Civil (Lei n.13.105 de 16/03/2015) Estatuto da Pessoa com Deficincia (Lei n. 13.146 de 06/07/2015)
Descentralizao, municipalizao, controle e participao social Consolidao de um sistema de proteo social (sade, previdncia, educao, assistncia e desenvolvimento social, trabalho) Reestruturao do aparato de controle e policiamento Prioridade na convivncia familiar e comunitria instituies de acolhimentos como medida provisria e excepcional.
Fonte: elaborao prpria, adaptado do Caderno de pesquisa, v. 40, n. 140, p. 664, maio./ago. 2010.
No modelo atual, conforme preceituado na Constituio Federal de 1988, a famlia
deve ser protegida e no culpabilizada e simplesmente punida. Desta forma, o
artigo 203, 204 e 226 do referido diploma legal estabelece que:
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Art. 203. A assistncia social ser prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuio seguridade social, e tem por objetivos: I - a proteo famlia, maternidade, infncia, adolescncia e velhice; II - o amparo s crianas e adolescentes carentes; Art. 204. As aes governamentais na rea da assistncia social sero realizadas com recursos do oramento da seguridade social, previstos no art. 195, alm de outras fontes; [...] Art. 226. A famlia, base da sociedade, tem especial proteo do Estado. 8 - O Estado assegurar a assistncia famlia na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violncia no mbito de suas relaes (BRASIL, 1988).
Conforme exposto, a assistncia social assegurada nos artigos 203 e 204 da
Constituio Federal de 1988, e tambm pela Lei n 8.742, de 07 de dezembro de
1993 - Lei Orgnica da Assistncia Social (LOAS), poltica social pblica, a
assistncia social inicia seu trnsito para um campo novo: o campo dos direitos, da
universalizao dos acessos e da responsabilidade estatal (PNAS, 2004).
Nas palavras de Simes (2010, p. 295) a LOAS sistematizou e institucionalizou,
como permanentes, os servios assistenciais s famlias em situao de
vulnerabilidade e de risco social.
De acordo com o artigo 1 da LOAS:
A assistncia social, direito do cidado e dever do Estado, Poltica de Seguridade Social no contributiva, que prov os mnimos sociais, realizada atravs de um conjunto integrado de aes de iniciativa pblica e da sociedade, para garantir o atendimento s necessidades bsicas. (BRASIL, 2011, p. 31).
Nessa perspectiva, a constituio do sistema de proteo social no pas se baseou
nos modelos tradicionais de programas destinados transferncia monetria
contemplando famlias em situao de vulnerabilidade social por intermdio de
polticas sociais compensatrias e complementares (PEREZ; PASSIONE, 2010, p.
665).
A Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS) foi aprovada no ano de 2004
atravs do Conselho Nacional de Assistncia Social (CNAS), resoluo n 145, de
15/10/2004, que define as diretrizes, atribuies e competncias para a efetivao
da assistencial social, trazendo a importncia de se associar a outras polticas
pblicas no enfrentamento da questo social e suas mltiplas expresses (SIMES,
2010).
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Simes (2010) aponta que a Poltica Nacional de Assistncia Social consolidou-se
com o SUAS, como um sistema descentralizado e participativo, construdo em 2005,
lei n. 12.435/11. A implantao do SUAS tinha como marco inicial a Norma
Operacional Bsica NOB/SUAS.
A administrao da PNAS de responsabilidade do Sistema nico de Assistncia
Social (SUAS), o SUAS um sistema pblico descentralizado e participativo,
estabelecendo condies para garantir sua eficcia e eficincia explicitando uma
concepo norteadora da descentralizao da assistncia social. (BRASIL, 2005, p.
10).
Segundo a Tipificao Nacional de Servios Socioassistenciais (2013) a
estruturao dos servios de assistncia social foram organizados por dois nveis de
complexidade do SUAS: Proteo Social Bsica (PSB) e Proteo Social Especial
(PSE).
A Proteo Social Bsica (PSB) destinada a parte da populao em situao de
vulnerabilidade pessoal e social, que ainda no houve rompimento de vnculos
familiares, tendo carter preventivo, de promoo e incluso social (SIMES, 2010).
O trabalho social com famlias, assim, apreende as origens, significados atribudos e as possibilidades de enfrentamento das situaes de vulnerabilidade vivenciadas por toda a famlia, contribuindo para sua proteo de forma integral, materializando a matricialidade sociofamiliar no mbito do SUAS (BRASIL, 2013, p. 10).
De acordo com a Tipificao os principais servios ofertados na Proteo Social
Bsica so: Servio de Proteo e Atendimento Integral Famlia (PAIF); Servio
de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos; Servio de Proteo Social Bsica no
Domiclio para pessoas com Deficincia e Idosas (BRASIL, 2013, p. 08).
Conforme exposto acima, a PSB tem seus servios executados no Centro de
Referncia de Assistncia Social (CRAS), que uma unidade pblica estatal
descentralizada da poltica de assistncia social, responsvel pela organizao e
oferta de servios da proteo social bsica [...] (BRASIL, 2009a, p. 09).
O CRAS funciona como referncia para as famlias em situao de vulnerabilidade
social do territrio, sendo a porta de entrada das famlias que visam acesso rede
de proteo social bsica. O CRAS atua com famlias e indivduos na orientao e
no fortalecimento do vnculo familiar e comunitrio (SIMES, 2010).
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Na Proteo Social Especial (PSE) subdiviso desse servio est em Proteo
Especial de Mdia e Alta complexidade. Dessa forma so considerados: Servios de
mdia complexidade aqueles que oferecem atendimentos s famlias e indivduos
com seus direitos j violados, mas cujos vnculos familiares e comunitrios no
foram rompidos (BRASIL, 2013).
Segundo a Tipificao integram a Proteo Social Especial de Mdia Complexidade:
Servio de Proteo e Atendimento Especializado a Famlias Indivduos (PAEFI); Servio Especializado em Abordagem Social; Servio de proteo social a adolescente em cumprimento de medida socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) e de Prestao de Servios Comunidade (PSC); Servio de Proteo Social Especial para Pessoas com Deficincia, Idosas e suas famlias; Servio Especializado para Pessoas em Situao de Rua (BRASIL, 2013, p. 08).
Na anlise de Simes (2010), a Proteo Social Especial de alta complexidade, se
d quando os vnculos familiares foram rompidos ou fragilizados, necessitando o
indivduo ser retirado do seu ncleo familiar e comunitrio, a fim de garantir proteo
integral. Dentro da sua organizao o servio dever garantir privacidade, o
respeito aos costumes, s tradies e diversidade de: ciclos de vida, arranjos
familiares, raa/etnia, religio, gnero e orientao sexual (BRASIL, 2013, p. 40).
E os servios prestados pela Proteo Social Especial de Alta Complexidade so:
a) Servio de Acolhimento Institucional, nas seguintes modalidades: - abrigo institucional; - Casa-Lar; - Casa de Passagem; - Residncia Inclusiva. b) Servio de Acolhimento em Repblica; c) Servio de Acolhimento em Famlia Acolhedora; d) Servio de Proteo em Situaes de Calamidades Pblicas e de Emergncias
Os servios de Proteo Social Especial (PSE) so ofertados no Centro de
Referncia Especializados de Assistncia Social (CREAS), sendo uma unidade
estatal que presta servio em conjunto com as famlias e seus membros em sua
comunidade, devendo esta priorizar a reestruturao dos servios de abrigamento
dos indivduos que, por uma srie de fatores, no contam mais com a proteo e o
cuidado de seus familiares (BRASIL, 2008, p. 6).
A proteo social especial a modalidade de atendimento assistencial destinada a famlias e indivduos que se encontram em situao de risco pessoal e social, por ocorrncia de abandono, maus tratos fsicos e, ou, psquicos, abuso sexual, uso de substncias psicoativas, cumprimento de medidas scio-educativas, situao de rua, situao de trabalho infantil, entre outras.
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Os servios de proteo especial tm estreita interface com o sistema de garantia de direito exigindo, muitas vezes, uma gesto mais complexa e compartilhada com o Poder Judicirio, Ministrio Pblico e outros rgos e aes do Executivo (ESPIRTO SANTO, 2015).
Tendo em foco que este estudo aborda o tema Acolhimento Institucional, nos
ateremos discusso do assunto que envolve o a