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1 As Crianças Espertas de Hojantigamente As pessoas dizem serem crianças de hoje mais espertas que as de antigamente, quer dizer, de uma ou duas gerações antes, por exemplo, que as de 1976 e as de 1946; isso tanto é verdade quanto não é. É verdade pela memória, pois dispondo de maior quantidade de dados podem transformá-los em informações, dados categorizados. Há uma imensidão de dados circulando e informações dadas por outros transformadores. É falso pela inteligência, que continua basicamente a mesma de uma, duas, quatro, oito, 16 gerações antes. Não estamos mais inteligentes. O que há é mais liberdade, maior oportunidade de mostrar opinião desde cedo. Quando éramos crianças não se podia conversar à mesa quando os adultos de fora estavam; e antes disso sequer à mesa ficavam as crianças, iam comer em separado. E assim por diante cada vez mais para trás: ninguém perguntava a opinião de um infante e se ele a manifestasse espontaneamente era rapidamente calado. Viviam vexadas as crianças na presença de adultos, mas não entre elas: todo mundo se lembra de como éramos espertos, sabidos quando entre nós. Ou você se sentia um idiota? Entrementes, quando de voltava ao convívio dos maduros aquietávamos, virávamos uns mongóis. Os guris fingiam ou apenas calavam. As PESSOAS (indivíduos, famílias, grupos e empresas) se protegem em todas as fases de suas vidas, até “se fazendo de bestas para poderem viver”, como diz o povo. As crianças não ficaram mais inteligentes, apenas ficaram mais livres, gozam agora de uma liberdade nunca havida antes na Terra. Vitória, quinta-feira, 21 de setembro de 2006. José Augusto Gava. ESPERTEZA DA INTERNET Entrevista com Tatiana Belinky Tatiana Belinky é uma das escritoras de livros infantis mais conhecidas no Brasil. Curiosamente, ela nasceu na Rússia, em 1919, e veio pequena ao Brasil, com apenas dez anos de idade. Além dos

AS Criancas Espertas de Hojantigamente

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as crianças SEMPRE foram espertas, senão não teríamos sobrevivido (é preciso prestar mais atenção a elas)

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As Crianças Espertas de Hojantigamente

As pessoas dizem serem crianças de hoje mais espertas que as de antigamente, quer dizer, de uma ou duas gerações antes, por exemplo, que as de 1976 e as de 1946; isso tanto é verdade quanto não é.

É verdade pela memória, pois dispondo de maior quantidade de dados podem transformá-los em informações, dados categorizados. Há uma imensidão de dados circulando e informações dadas por outros transformadores.

É falso pela inteligência, que continua basicamente a mesma de uma, duas, quatro, oito, 16 gerações antes. Não estamos mais inteligentes. O que há é mais liberdade, maior oportunidade de mostrar opinião desde cedo. Quando éramos crianças não se podia conversar à mesa quando os adultos de fora estavam; e antes disso sequer à mesa ficavam as crianças, iam comer em separado. E assim por diante cada vez mais para trás: ninguém perguntava a opinião de um infante e se ele a manifestasse espontaneamente era rapidamente calado. Viviam vexadas as crianças na presença de adultos, mas não entre elas: todo mundo se lembra de como éramos espertos, sabidos quando entre nós. Ou você se sentia um idiota? Entrementes, quando de voltava ao convívio dos maduros aquietávamos, virávamos uns mongóis. Os guris fingiam ou apenas calavam. As PESSOAS (indivíduos, famílias, grupos e empresas) se protegem em todas as fases de suas vidas, até “se fazendo de bestas para poderem viver”, como diz o povo.

As crianças não ficaram mais inteligentes, apenas ficaram mais livres, gozam agora de uma liberdade nunca havida antes na Terra.

Vitória, quinta-feira, 21 de setembro de 2006. José Augusto Gava. ESPERTEZA DA INTERNET

Entrevista com Tatiana Belinky

Tatiana Belinky é uma das escritoras de livros infantis mais conhecidas no Brasil. Curiosamente, ela nasceu na Rússia, em 1919, e veio pequena ao Brasil, com apenas dez anos de idade. Além dos

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livros infantis, Tatiana ficou famosa por ter sido responsável pela primeira adaptação do "O Sítio do Pica-Pau Amarelo", de Monteiro Lobato, para a televisão. Já recebeu muitos prêmios pelas suas histórias e trabalhos realizados na televisão e no teatro. Nesta

entrevista concedida ao CRE, a escritora reafirma a importância do hábito da leitura para as crianças.

Ilustração: Maria Eliana Delarissa

ENTREVISTA

De que maneira podemos incentivar as crianças e os adolescentes para a leitura?

TB: Eu acho que tem de expor o livro à criança e expor a criança ao livro. A criança deve viver cercada de livros. A família deve ter livros em casa. Os

pais devem ler. Se a criança não ver o livro, não vai se interessar.

Como a Internet e a televisão influenciam no processo da leitura? TB:Eu sou do tempo do livro.

Tem campo para todos os meios de comunicação?

TB: Claro! E o livro não vai acabar. Mesmo com a televisão, a Internet, o livro eletrônico, sempre haverá o livro de papel, aquele de segurar na mão.

A senhora já fez adaptações de obras do Monteiro Lobato para a televisão?

TB: Sim. De 1951 até 1968. Fiz adaptações do 'Sítio do Pica-Pau Amarelo' e de muitos outros livros.

Como ocorre a adaptação de um livro para um programa de televisão? Como

as crianças encaram isso? TB: Muito bem! As crianças sempre encararam bem. No meu tempo, havia

televisão, cinema, rádio, não tinha Internet. Com as adaptações, eu promovia o livro. O roteiro para televisão era assumidamente para promover o livro. Sempre havia uma corrida do público para a livraria, em busca dos livros e das histórias que eu adaptava. E as crianças liam, comentavam,

criticavam e achavam o livro melhor que a televisão e vice-versa.

Um dos grandes sucessos editoriais dos últimos anos, Harry Potter está disponível em livro e em filme. O que a senhora pensa sobre esses formatos? TB: São válidos. Se for de boa qualidade, vale tudo. Não existe nada melhor, nem pior. Assim como não existe gente melhor, nem pior. Cada caso é um

caso. Se for de boa qualidade, qualquer veículo é bom.

Qual é sua opinião em relação aos livros clássicos que são reescritos, utilizando uma linguagem mais atual?

TB: Eu prefiro o original. Quando eu era criança e pré-adolescente, li adaptações de grandes clássicos, como Dom Quixote e de vários outros, mas

isso foi um aperitivo para, depois, maior, ler o texto original. Se for uma adaptação inteligente e interessante, vai despertar a vontade do público de ler o original. É importante que a adaptação seja feita por um bom escritor

para tenha qualidade.

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O que Monteiro Lobato significou na sua vida pessoal e profissional?

TB: O primeiro texto que tive em mãos, aos dez anos de idade, no Brasil, foi um do Monteiro Lobato. Mas não era livro, nem era o Sítio do Pica-Pau

Amarelo. Tratava-se de um folheto do Laboratório Fontoura sobre o Jeca Tatu, que foi escrito por ele. Depois, li todos os seus livros e fiquei fascinada.

Conheci o Monteiro Lobato quando já era casada e tinha filhos pequenos.

Qual é o segredo de uma boa literatura infantil? TB: Ser de boa qualidade e interessante. Quer dizer, a condição sine qua non

é que a criança goste. Mas, eu, a autora, também tenho de gostar. Não há veículo ruim, a carne é que tem de ser boa.

E qual estilo literário é o preferido entre o público infanto-juvenil?

TB: Cada caso é um caso. Não há dois escritores iguais, nem dois livros iguais. Quando me perguntam se eu prefiro isso ou aquilo, música clássica ou

popular, eu digo: 'Depende do dia e da hora. Tem dia que prefiro a música popular, outro quero ouvir a clássica ou até mesmo o rock and roll'.

Tem alguma experiência recente que gostaria de relatar?

TB: Em 84 anos de vida, eu tenho um milhão de experiências para contar. Mas, o que eu gosto mesmo é de escrever. Eu leio sem parar, desde os quatro anos de idade. Converso muito com crianças, com bibliotecárias, professores,

pais. É uma delícia! Muito bom! Criança é um público maravilhoso, interessado, inteligente. Nunca se deve subestimar a inteligência de uma criança. Fazem perguntas que precisamos estar prontos para responder ou honestos o suficiente para dizer 'não sei'. Uma menininha de nove anos me perguntou se eu era a favor do aborto. As crianças sempre foram rápidas. Hoje em dia elas são 'bombardeadas', porque ouvem e vêem muita coisa e

captam. Algumas coisas elas entendem, outras não e querem saber.

(Renata Pérez)